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CLÁUDIA NG DEEP
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Sal e Luz
Viver em assertividade
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Pré-impressão: PAULUS Editora
Capa:
Nata Design
Impressão e acabamento:
Empresa do Diário do Minho, Lda.
Depósito legal:
ISBN: 978-972-30-1519-5
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida ou transmitida de qualquer forma ou por quaisquer meios,
electrónicos ou mecânicos, incluindo fotocópias, gravações ou qualquer sistema de armazenamento e recuperação de informação sem autorização prévia,
por escrito, do editor.
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Introdução
Ser sal e luz no mundo abrange uma forma de pensar e de sentir, uma postura e uma
atitude, uma forma de comunicar com o próprio e com a humanidade baseada na
capacidade de influenciar e marcar positivamente os outros, bem como deixar-se
influenciar por aquilo que é positivo, benéfico e construtivo. Penso que envolve a
possibilidade de temperar, saudavelmente, a vida dos outros bem como deixar-se
temperar. Envolve a capacidade de conservar e apurar o que é digno, verdadeiro e
justo. Envolve a capacidade de iluminar e de facilitar aos outros meios de
crescimento e de desenvolvimento pessoal e social bem como o andar na luz, o estar
iluminado, deter o conhecimento e o saber. Este saber não é apenas o saber científico
e tecnológico, é muito mais e mais profundo, é o saber do eu e o conhecimento do
outro: é o auto e heteroconhecimento que permitem o reconhecimento do valor da
vida com as suas facilidades e dificuldades, é o conhecimento do que é capaz de
permitir a mudança e o crescimento pessoal e social. É, igualmente (não menos
importante, mas essencialmente complementar), conhecer Deus!
Através deste manual espero que juntos nos consigamos tornar mais assertivos.
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Espero que consigamos um maior conhecimento dos nossos verdadeiros valores, das
nossas emoções, dos pensamentos que guiam o nosso agir, espero que aprendamos a
lição dada por Deus por meio da Sua Palavra, aceitemos mudar o que deve ser
mudado e aprendamos o caminho da auto-estima. Espero também que reconheçamos
a inevitável influência que temos sobre os outros e a aprendamos a usar
positivamente, bem como reconheçamos a influência que os outros têm sobre nós e
aprendamos a seleccionar o que deles absorvemos, assimilando o que é justo e
verdadeiro e refutando o que é injusto e falso. A isto chamamos comunicação e
relação assertiva (baseada no conhecimento de Deus).
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1. Sal e luz do mundo
É interessante iniciarmos esta caminhada, no âmbito da assertividade, falando do sal e
da luz. O sal e a luz surgem como dois elementos altamente assertivos e é curioso
como Jesus os escolheu como medida de identificação dos Seus que O amam e como
objectivo de santificação. Ser santo, ser como Ele é, passa por ser sal e luz. Vamos
estudar estes dois elementos assertivos?
O que é ser sal da terra e luz do mundo? Quem, primeiro, fez esta afirmação? Esta é
uma afirmação bíblica proferida por Jesus no Evangelho de Mateus, capítulo 5,
versículos 13 e 14.
Estas palavras de Jesus eram dirigidas às pessoas que O seguiam e se diziam Suas
testemunhas. Jesus estava a falar para os Seus seguidores e disse-lhes que eles eram
sal e luz, num sentido figurativo! Estava a falar para os que O haviam aceitado, falava
para os Seus. E qualquer um que O aceite seguir e O siga torna-se sal e luz.
O sal
Na altura em que Jesus proferiu estas palavras o uso do sal não era excessivo e,
consequentemente, não trazia malefícios para a saúde dos seus consumidores. Na
verdade, o sal era altamente valorizado: o bom sal era caríssimo e dele dependia a
conservação de alguns bens alimentares. Desde a antiguidade reconhece-se a
imprescindível utilização do sal na conservação e preservação dos alimentos; na
verdade, o seu valor chegou a ser tão alto que se assemelhou ao ouro. A palavra
salário, por exemplo, surgiu porque a recompensa pelo trabalho era muitas vezes em
sal. Por haver pouco sal, e devido ao seu elevado preço, as pessoas não o consumiam
em excesso mas moderadamente.
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Todos reconhecemos que o sal (ou cloreto de sódio) está no grupo dos sais minerais
tal como o cálcio, o fósforo, o magnésio, o flúor e outros tantos. O sódio é um ião
imprescindível à circulação sanguínea e à função renal contribuindo para o equilíbrio
do organismo. Facilita a transmissão dos impulsos nervosos, a contracção muscular e
permite o equilíbrio do fluxo de água para dentro e para fora das células (osmose) e
assim influencia a concentração de líquidos no corpo (tão vital).
Sabe-se que o excesso de sal contribui para a hipertensão arterial e para problemas
cardiovasculares. Alimentos que são fontes não naturais de sódio podem contribuir
para esta desarmonia, como o presunto, o toucinho (com cerca de 1400-
1600mg/100g), as salsichas, o chouriço, os patés, o queijo, a manteiga com sal, os
enlatados e outros tantos alimentos como o pão branco, as bolachas e a margarina. Ou
seja, em termos de saúde é importante consumir alimentos naturalmente ricos em sal
bem como evitar os alimentos cuja fonte não é natural. As fontes naturais de sódio
mostram-se suficientes para uma alimentação saudável e as fontes não naturais (e que
sugerem alimentos processados) já constituem um perigo de excesso. Jesus dizia aos
Seus seguidores que eles eram uma fonte natural de sal cuja função (mais do que
condimentar) assentava na preservação da vida e constituía um obstáculo à expansão
da corrupção no mundo. Jesus estava a usar uma linguagem simbólica. Para Jesus, se
os Seus seguidores defendessem os valores que Ele estava a ensinar conseguiriam
contribuir para a preservação da humanidade e para uma vivência saudável.
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-valia para todos. A sua visão não é egoísta, mas atenta ao mundo que o cerca e a sua
postura é activa e empreendedora. Tem visão porque detecta necessidades e parte no
sentido de as colmatar. Jesus afirmou que o Seu reino não era deste mundo e, como
tal, ensinava sobre o Seu Reino espiritual e sobre o fruto que mais valorizava: amor,
alegria, paz, paciência, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão e domínio
próprio (G á l a t a s 5,22). A ausência do sal e a sua disfuncionalidade levaria ao
apodrecimento da própria humanidade.
Por vezes fico a pensar se uma das razões para tanta corrupção e pecado, para tanto
distanciamento e rejeição de Deus por parte do ser humano, não se deve à postura
pouco (ou nada) assertiva da Igreja. Os filhos de Deus não têm assumido a sua função
de salgar e iluminar. Será que essa não é uma das razões para o apodrecimento do
mundo? Se somos o sal do mundo deveríamos ser o elemento a que o mundo recorre
como forma de preservar os bons alimentos, os mais importantes e que não se querem
perdidos ou apodrecidos. A Igreja deveria ser aquela a quem todos recorrem como
forma de preservar o amor, a paz, a alegria, a fidelidade, a paciência, a tolerância
entre os homens, o amor a um Deus de Amor! Cada filho de Deus precisa de assumir
a sua função de salgar os frutos mais valiosos, conservando-os!
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atribuída prejudica todos. O mundo anseia por uma Igreja universal cujos membros
sejam capazes de assumir as suas funções de salgar e iluminar. A própria Igreja
anseia por membros activos, capazes de descobrirem a sua função no corpo e com
ousadia para a executarem. O ir à igreja ao domingo, sentar, ouvir, levantar e
continuar pela segunda-feira adentro como se existissem dois mundos (dentro da
igreja e fora da igreja) fará de nós cristãos nada assertivos e apodrecerá o local no
qual estamos.
Outra verdade do sal é que uma pequena quantidade pode afectar uma volumosa
massa. O sal consegue permear e atribuir um paladar salgado, o sal naturalmente
influencia e tempera. A esta função pode chamar-se de liderança. O sal lidera,
prevalece e faz-se sentir naturalmente. O sal não precisa de se impor para liderar e se
fazer notar, ele ganha naturalmente estatuto e todos sentem a sua presença e
reclamam por ele na sua ausência. Ser assertivo é liderar naturalmente, sem forçar a
situação, é fazer-se sentir quando está presente e contribuir para que alguém reclame
por si, na sua ausência. Consequentemente, estas palavras de Jesus remetem para
outra verdade: a face social de todos os seres humanos. Vivemos no mundo, fazemos
parte dele e temos um papel a desempenhar na família e na comunidade. O que Jesus
estava a dizer é que os Seus seguidores (afinal Ele estava a falar para os Seus
discípulos no cimo de um monte) estão no mundo, devem viver activamente no
mundo, devem influenciar positivamente a sua comunidade, temperando-a e
conservando-a. Essa é a sua função e se não a desempenharem perdem a utilidade do
sal e não servem para mais nada senão para serem pisados por quem passa.1 O sal que
não desempenha um papel de conservação sobre o alimento não está a desempenhar a
sua principal função e apenas servirá para “deitar fora e ser pisado por quem passa”.
A liderança natural é marcada pela originalidade, o líder natural orienta e marca os
outros que o cercam de forma original e sem o uso da força… é ouvido e os seus
conselhos são apetecidos e seguidos. É valorizado por quem o cerca, a manifestação
dos seus dons é reconhecida e humildemente ele impulsiona outros a agirem da
mesma maneira. Tudo surge facilmente. Ele não precisa de gritar nem de subir ao
pódio para ser ouvido, não precisa de assinalar a sua chegada, todos notam que ele
está lá (mesmo quando ele se ausenta).
Ser assertivo remete, consequentemente, para a ousadia pessoal, ousadia para afirmar
o que se é! Remete para cada um ser quem é afirmando a sua singularidade, ainda que
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num contexto social de relacionamentos capazes de influenciar e marcar quem deles
desfruta. E é nesta postura ousada de auto-afirmação e valorização dos
relacionamentos sociais que o Homem encontra parte do seu bem-estar psicológico,
altamente valorizado por Deus.
A luz
Quando Jesus disse «vocês são a luz do mundo», em Ma t e u s 5, 14, Ele estava a falar
para homens simples, humildes, sem posses e que haviam deixado tudo para O
seguir; estava a dizer que aqueles homens, que aparentemente não tinham qualquer
valor especial (eram comuns e alguns desprovidos de instrução), eram a luz. Vemos o
valor que Jesus atribuía aos Seus: eles eram a luz! Imagino o que estas palavras terão
feito na auto-estima destes homens, provavelmente alguns deles até incrédulos
perante tais informações!2
Interessante notar que Jesus fala daquilo que os Seus seguidores SÃO e só depois
daquilo que eles FAZEM. Os Seus seguidores são sal e luz e naturalmente agem
como tal. Nota-se a ênfase no ser e o fazer (as obras!) surge como consequência
espontânea e natural desse ser. Somos algo antes de conseguirmos agir como tal.
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Consulte a PriMeira Ca rt ade Pedro 2,9: «Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio régio, nação santa, povo adquirido por Deus, para proclamar
as obras maravilhosas d’Aquele que vos chamou das trevas para a sua luz maravilhosa.» Estas palavras foram escritas por Pedro, o pescador
(na altura estava em Roma), e destinavam-se a cristãos de diversas comunidades da Ásia Menor. Estes cristãos suportavam perseguições por
causa da sua fé em Jesus, e Pedro exorta-os a permanecerem na luz, mesmo na adversidade. Realmente Pedro bebeu as palavras que ouviu
da boca de Jesus no Sermão da Montanha (afinal ele estava lá quando Jesus havia dito que eles eram o sal e a luz) e agora transmite a mesma
ideia aos seus irmãos na fé.
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E como se comporta a luz? A luz apaga a escuridão e traz sabedoria, a luz mostra o
que existe, não permite esconder nada, a luz revela a verdade. A luz é a honestidade e
a escuridão é a hipocrisia, o cinismo, a mentira e a ocultação. A luz esclarece as
situações e é atrevida. A luz atreve-se a iluminar e a revelar a verdade mesmo quando
alguém não a quer ver. A luz é afirmativa, afirma-se e afirma o que está à sua volta,
não compactua com o oculto e assertivamente aponta o caminho. Se Deus é luz, então
Ele é assertivo e convida-nos também a sê-lo. Toda a postura de Jesus pautava-se
pela proclamação da verdade, fazia-o mesmo quando tinha de ser atrevido e quando
tinha de desafiar o desmoronar das máscaras da religiosidade. Chamava alguns
líderes religiosos de sepulcros caiados exactamente porque ocultavam quem
realmente eram, os seus reais instintos e motivações, eram hipócritas e escondiam-se
em falsas vidas (vidas que interiormente não viviam, mas que queriam que os outros
acreditassem que eram vividas).
A função da luz é iluminar, é a sua função natural, é esperado que ela ilumine, não se
discute a sua função. Jesus continuou as Suas palavras dizendo que uma cidade
situada no alto de um monte não se pode esconder, mesmo que o desejasse não se
pode esconder nem dos que procuram o seu abrigo e protecção, nem dos inimigos que
buscam a sua destruição. Ele continuou a falar procurando que os Seus seguidores
entendessem o Seu propósito, entendessem como Ele percebe a vida, e afirmou que
não se acende um candeeiro para o pôr debaixo de uma caixa, pelo contrário, põe
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-se sim num lugar que alumie bem a todos os que estiverem em casa.3 Ou seja, para
Jesus, qualquer um de nós no seu pleno juízo não acende um candeeiro para o
esconder. Não faz sentido! O que Ele quis transmitir é que a luz serve para iluminar,
essa é a sua função. Ele espera que cada um ilumine, afirme o que traz consigo numa
atitude baseada na verdade. Isso é assertividade. Aquele que não é assertivo, que não
se afirma como sal e luz, perde a sua função e torna-se inútil. A ocultação da forma
como sente, pensa e age sugere escuridão e propicia a perda de si mesmo, a perda da
essência e do que o distingue dos outros. A manifestação da identidade permite o seu
reconhecimento, a sua distinção face aos outros e permite a sua solidez. Daí as
psicoterapias valorizarem o autoconhecimento, a procura do que eu sou e a sua
afirmação. O crescimento saudável passa muito pela possibilidade de descobrir as
capacidades e limitações pessoais, passa por conhecer e valorizar os dons e talentos
individuais. Estar feliz e em paz significa, de certo modo, estar a fazer algo que sei
que gosto, passa por contactar com a minha identidade deixando-a manifestar-se na
relação com os outros. Igualmente, o crescimento saudável passa pela coragem em
afirmar e admitir as limitações pessoais (os medos, as inseguranças, os erros) porque
é nessa auto-afirmação que a autoconsciencialização abre portas à auto-renovação ou,
biblicamente, “santificação”. A confissão dos erros (algo que poucos de nós
compreendemos e aceitamos!) no fundo permite a autoconsciencialização necessária
à auto-renovação. Assim, ao confessar um fracasso ou erro, mais do que um suposto
acto de auto
-humilhação, constitui-se a possibilidade de crescimento. Trazer à luz o que
verdadeiramente somos (com os nossos dons e talentos bem como dificuldades,
limitações e fracassos) permite uma maior autoconsciencialização, permite
relacionamentos mais verdadeiros e livres de máscaras e abre portas ao crescimento
pessoal. Trazer à luz não significa colocarmo-nos em cima de um banco, em praça
pública e com um megafone afirmarmos o que sentimos, pensamos ou como nos
comportamos. Não. Significa apenas não nos ocultarmos dos outros e principalmente
de nós mesmos. Sim, porque muitos ocultam-se de si mesmos recusando ver o que
realmente sentem, pensam ou porque agiram de determinada forma. E isso é andar na
escuridão. A Palavra de Deus ensina o Homem a examinar-se a si mesmo.
3 Nesta altura, em que Jesus está a falar com os Seus discípulos, as casas, maioritariamente, eram constituídas por uma única divisão!
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não é uma cruz pendurada ao pescoço ou uma ida tradicional à igreja ao domingo de
manhã. Também não é participar em obras de caridade. É muito mais do que isso, é
ter a identidade de Cristo, é ter o Seu carácter sendo sal e luz tal como Ele mesmo é.
Por isso se fala em santificação, que é apenas a aquisição e manifestação assertiva do
carácter de Cristo em cada um dos que se dizem cristãos.
Por falar em identidade… vamos debruçar-nos sobre ela, mas antes ficam algumas
questões para reflexão.
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Então… esperem lá… auto-afirmação não é o objectivo? Eu não devo ser capaz de
me afirmar doa a quem doer? Não devo mostrar o que penso, sinto ou agir como me
apetece e os outros que aceitem? Afinal falamos de assertividade!
Pois é… você deve afirmar-se no que pensa, sente ou como pretende agir ou já agiu!
Mas a assertividade na sua essência também salienta a importância do respeito,
tolerância e do sábio autocontrolo perante o outro! E Jesus mostra-Se sábio nesse
campo. Desenvolver a identidade de Deus significa tornarmo-nos como Ele,
mortificarmos os nossos desejos de anulação ou destruição dos outros bem como
reflectirmos sobre valores como o respeito, a tolerância e o amor incondicional. E
neste campo nem todos os nossos ímpetos devem ganhar espaço. Ao longo do manual
perceberemos melhor este aspecto do autocontrolo.
Não ter uma identidade sólida abre portas à perda de si mesmo. O não saber quem
somos, de onde vimos, o que gostamos e para onde queremos ir associa-se a um
quase “não ser”. Deus reconhece a necessidade de ser. Ele apresentou-se como o «Eu
Sou».4
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É saudável a pessoa descobrir quem é. Descobrir o que gosta e desgosta, o que a motiva e desmotiva, descobrir quais os seus sonhos e para
onde quer ir, descobrir as suas potencialidades e limitações, descobrir o impacto dos outros na sua vida e descobrir o que está errado na sua
forma de pensar, sentir e comportar-se. Ao descobrir este último espera-se que descubra se pretende mudar e caso queira, de que forma. É
um processo lento e profundo. Porém, é um processo saudável que leva ao encontro com o Eu, à autodescoberta e à liberdade.
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valorizam e definitivamente desvalorizam. Depois de tanta observação, elas copiam!
É a identificação que servirá de base à construção da sua identidade. A grande
dificuldade é que nem sempre a identificação é feita com o melhor exemplo. Temos
alguns comportamentos disfuncionais porque os observámos e copiámos, como a
tendência para fugir dos problemas sem os querer resolver (tapar o sol com a
peneira), responder às situações quotidianas de forma agressiva (andar com sete
pedras na mão) ou mesmo a tendência para dramatizar (fazer tempestades em copos
de água). Mas atenção porque a aprendizagem não é suficiente para determinada
característica do outro se tornar nossa: é como semear uma semente, ela só cresce se
encontrar terreno propício para tal. As características dos outros permanecem em nós,
adultos, se as alimentarmos. Enquanto adultos que somos já não podemos atribuir a
“culpa” do nosso comportamento ao nosso pai ou mãe, a responsabilidade é nossa!
Nós é que decidimos manter determinado padrão disfuncional ou substituí-lo por
outro. Convém substituir, é mais saudável!
Para que haja identificação com alguém é necessária uma ligação profunda com esse
alguém. Assim, para que haja identificação com Jesus é necessária uma ligação
profunda com Ele, é necessário procurar conhecê-l’O e deixar que as Suas
características impregnem o eu. Estes afectos e comportamentos funcionais são
aqueles que se baseiam no amor e na verdade e que prolongam a saúde física, social,
emocional e espiritual. É a santificação!
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Claro que neste caso é só mesmo sobreviver psiquicamente, não é viver!
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Claro que todas estas teorias apresentam limitações, apesar de todas elas terem algo
de verdade a ensinar. Descubra por si mesmo. Limitar-me-ei a apresentá-las
sumariamente, com alguns comentários pessoais.
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pessoa, a fim de conseguir diminuir a intensidade da ansiedade, começa a exercer
sobre si e sobre os outros determinadas exigências e regras e a ter pensamentos
recorrentes reconhecidos como produto da sua mente. Quando tais exigências não são
cumpridas, a ansiedade aumenta tanto que o desconforto se torna aparentemente
intolerável. Essas exigências podem ser várias: lavar repetida e compulsivamente as
mãos ou outra parte do corpo, limpeza exageradíssima com a casa, verificação
contínua de simetria – com os quadros e outros objectos decorativos – bem como
outros rituais de verificação. O problema é que o superego sacrifica o ego exigindo o
cumprimento de certos protocolos e não permite o descanso psíquico enquanto o ego
não “obedecer”. A pessoa deixa-se escravizar pelas exigências apenas para conseguir
o alívio temporário da ansiedade. Claro que não é este o plano do Criador para a
humanidade! Não somos chamados a ser escravos, muito menos do produto da nossa
mente! Somos chamados a ser livres. A doença mental não faz parte da vida saudável
planeada por Deus para cada um de nós! Já agora… para esta perturbação da
ansiedade há tratamentos eficazes, nomeadamente a psicoterapia!
Paralelamente, a carência de superego não é benéfica. O não ter a noção das
consequências dos pensamentos, afectos e comportamentos errados gera aquilo a que
Jesus denominaria de pecado recorrente, ausência de regras e tolerância para com o
mal. São os pais (e a sociedade em geral) que ensinam às crianças o que está certo e o
que está errado. Uma educação inadequadamente permissiva leva ao erro recorrente,
também por desconhecimento dos limites. O que Deus espera é que sejamos capazes
de educar os nossos filhos no respeito por si mesmos e pelos outros. O que Ele espera
é que tenhamos capacidade de autodomínio e sejamos capazes de cumprir regras,
quando as mesmas contribuem para a qualidade de vida pessoal e social. É
interessante perceber que as crianças pequenas não têm capacidade de autodomínio.
Não se nasce com esta capacidade! São os pais que ensinam os filhos a treiná-la, que
os ensinam em que situações a devem exercer e em que situações não precisam de a
exercer! Se os pais não ensinarem (e a sociedade também não o fizer), estas crianças
tornar-se-ão adolescentes e adultos imparáveis na arte de pensar, sentir e praticar o
mal! É autodestrutivo e consequentemente destrói quem estiver por perto!
Um caso extremo de tolerância para com o mal é a Perturbação Anti-Social da
Personalidade, marcada por um calo emocional. Nesta perturbação há um padrão
persistente de desrespeito e violação dos direitos dos outros, há uma inconformidade
com as normas sociais, há falsidade e mentira constante para obter lucro ou prazer
próprio, há impulsividade ligada a instintos agressivos, bem como irritabilidade fácil.
Claro que a irresponsabilidade e a ausência de remorsos completam o bolo! Mais lá à
frente voltaremos a falar dela.
Em relação ao ego, como se sabe a sua afirmação é determinante para um clima de
saúde mental. A anulação do ego gera mal-estar psíquico e desejos de morte. A
escravidão do ego eu) por uma das outras duas instâncias gera perturbação e mal-estar
psicológico. O esperado é que as três instâncias convivam harmoniosa e
equilibradamente. Para Freud, a personalidade resulta da relação entre estas três
instâncias: ego, id e superego.
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Os sonhos também surgem como manifestação do id.
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Mas atenção… por vezes os pais nem sequer são assim tão rígidos, mas por alguma outra influência exterior os filhos aprendem a exercer
esse autocontrolo exagerado (patológico!) sobre si mesmos.
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■ Adler (1870) apresentou a personalidade como o estilo de vida ou a forma
característica de reagir aos problemas quotidianos, bem como objectivos de vida.
Adler fundou a Psicologia Individual e defendeu que a fragilidade e o desamparo na
infância conduzem a sentimentos de inferioridade. Esta dinâmica é, segundo Adler,
um factor básico do desenvolvimento da personalidade. Se inerente a esses
sentimentos existir uma fragilidade orgânica, real ou imaginada, eles tendem a
aumentar e pode mesmo desencadear-se um complexo de inferioridade. As mulheres
(na altura alvos de muita discriminação) e os grupos minoritários estariam mais
propensos a esse complexo de inferioridade. Ao sentirem-se inferiores, estas pessoas
travariam uma luta no sentido de vencer e alcançar o poder. Essa busca do poder
poderia assumir uma forma excessiva e manifestar
-se na tentativa de dominar os outros, em alguma hostilidade na competição e até
numa certa anti-sociabilidade própria da delinquência e criminalidade. Para Adler, os
sentimentos excessivos de inferioridade levariam a pessoa a ter uma noção exagerada
do seu próprio valor (como se a autovalorização excessiva escondesse, no fundo,
sentimentos de inferioridade e como se os excessos escondessem verdadeiras
carências). Estes indivíduos tenderiam a imaginar-se em situações de vida em que a
luta é uma constante da qual sairiam vencedores, aniquilando os seus inimigos. Este
modo de vida estaria na base da perturbação psíquica e os sentimentos de
inferioridade influenciariam a motivação de cada pessoa.
Adler percebeu algo que Deus já sabia: a necessidade de cada Homem ser valorizado
pelos outros para que, posteriormente, aprenda a autovalorizar-se. Adler entendeu a
necessidade de os pais valorizarem os seus filhos, não os irritarem e não os
conduzirem a sentimentos de desamparo e fragilidade. O amor é a única dádiva que
em “excesso”8 não faz mal. Este “valorizar o outro” relaciona-se com o reconhecer
qualidades e limitações, relaciona-se com uma apreciação correcta do outro: sem
esconder os seus limites, sem negar as suas aptidões e sem sobrevalorizar as suas
qualidades ou falhas. Mas sempre valorizando-o enquanto pessoa criada por Deus à
Sua imagem e semelhança.
8 Efectivamente, nunca é em excesso!
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equilíbrio é alcançado quando os pais transmitem paz, alegria e bem-estar aos seus
filhos (ensinando
-os a andar na luz e a repudiar a escuridão), não os irritando e quando, em simultâneo,
transmitem disciplina (regras de bem-estar e bom comportamento, saber ser, saber
estar, saber fazer). O andar na luz é o andar sob o foco do que é verdadeiro e
amoroso, é fazer aquilo que não precisa de ser escondido. É, igualmente, dar de
“graça” facilitando o perdão em caso de erro. O amor deve ser temperado com a
disciplina. Amar será disciplinar de forma amorosa e disciplinar será amar ensinando/
/corrigindo.
Adler reconheceu a importância de declarar o valor de cada pessoa, contribuindo para
a diminuição dos seus sentimentos de inferioridade, e reconheceu como estes
sentimentos propiciam desajustes e mal-estar.
Biblicamente não se encontra nenhum comportamento ou atitude de Deus de
desvalorização e inferiorização do ser humano. Não se encontra qualquer tentativa de
escravidão por parte de Deus face ao Homem, Ele até ofereceu o livre arbítrio! Ele é
amor, lembra-se? Ele é! Ele não precisa de se esforçar para o ser, já é! Faz parte da
Sua personalidade e como tal é uma característica constante. A escravidão do ser
humano não é exercida por Deus e o sofrimento normalmente é um resultado natural
das escolhas que fazemos (ou que outros fazem por nós e infelizmente nos afectam).
Verdadeiramente colhe-se aquilo que se semeia. Como pode semear batatas e esperar
colher tomates? E ainda ficar zangado e maldizer a Deus se colher tomates? Não faz
sentido! Hoje você colhe aquilo que escolheu semear no passado! E pior, as suas
escolhas vão influenciar a vida dos outros, bem como as escolhas dos outros vão
influenciar a sua vida. Escolha, então, hoje semear boas sementes para colher,
amanhã, bons resultados! Quando estou no consultório muitas vezes apercebo-me de
que o sofrimento que inunda a vida de alguns pacientes desesperados é resultado das
suas más escolhas passadas. Lamento e entristeço-me pela falta de sabedoria que por
vezes temos e que nos leva a escolher mal. Mais tarde ou mais cedo colhemos as
consequências!
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de trabalhar! Mas o excesso rouba espaço à nossa primeira missão: lapidar outros
seres humanos que carregam a nossa herança genética!
■ Segundo Sheldon (1898), o tipo de corpo diz muito sobre o tipo de personalidade.
Por exemplo, pessoas com corpos mais atléticos (mesomorfia) tendiam a apresentar
um tipo de personalidade mais afirmativa, agressiva, activa, corajosa e dominante,
enquanto pessoas com corpos mais gordinhos (endomorfia) tendiam a ser mais
apreciadores do conforto, sociáveis, glutões e de “bom temperamento”. Sheldon falou
também do corpo alto, magro e frágil (ectomorfia) como pessoas inibidas, temerosas
e autoconscientes.
Sheldon e Kretschmer relacionaram a personalidade com o temperamento. O
temperamento é a predisposição para uma determinada reacção. Para LaHaye (2006),
o temperamento influencia todas as acções e existem quatro tipos de temperamento
que podem ser combinados e dar origem a 12 combinações diferentes. Os quatro
básicos são: Sanguíneo (são pessoas expressivas, comunicativas, entusiastas e
emocionalmente instáveis), Melancólico (são pessoas analíticas, autodisciplinadas,
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sensíveis e autocentradas), Fleumático (são pessoas calmas, quietas, diplomatas e
condescendentes) e Colérico (são pessoas decididas, práticas, dominadoras, por vezes
insensíveis). E esse temperamento define a personalidade da pessoa influenciando as
suas vocações, emoções, relacionamentos e vida espiritual. Para LaHaye, o
temperamento é determinado pela combinação de genes e cromossomas dos pais no
momento da concepção. O temperamento é a combinação de características herdadas
dos progenitores, é ele que nos torna mais introvertidos ou extrovertidos. Claro que o
temperamento não é a única influência sobre o comportamento. O treino e a educação
também têm o seu contributo. No entanto, esta combinação de genes afecta o sujeito,
quer no seu inconsciente, quer no seu comportamento mais visível, como as suas
reacções. O temperamento natural modificado pelo treino recebido na infância, pela
educação, pelas crenças, princípios e valores, bem como motivações dá origem ao
carácter (laHaye, 2006).
■ Erikson (1902) defendeu que à medida que o indivíduo vai crescendo, vai
passando por vários estádios. Em cada estádio existe uma tarefa a realizar ou conflito
a resolver, sem o qual não poderá passar para o estádio seguinte.
A resolução destes conflitos influencia o sujeito na relação consigo mesmo e com os
outros e influencia toda a sua personalidade. Uma boa resolução do conflito
contribuirá para uma personalidade mais ajustada socialmente e de bem consigo
mesma. A dificuldade em resolver os conflitos internos dará origem a formas de estar
e sentir mais desajustadas. Veja o quadro seguinte.
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É interessante como Erikson descreve a necessidade de descentralização positiva de si
como algo saudável. Para ele, o Homem maduro e saudável é aquele que é capaz de
sair de si mesmo para dar aos outros. O egocentrismo e o isolamento surgiriam
apenas como resultado de imaturidade e perturbação entre os 30 e os 65 anos de
idade. No entanto, antes desta fase altruísta e descentralizada de si, a pessoa está
(enquanto criança e adolescente) centrada em si: nas suas capacidades e limitações.
Segundo Erikson, só depois de passarmos um longo tempo centrados em nós mesmos
é que estamos disponíveis para nos centrarmos outros. E é esperado que o tempo de
autocentração seja saudável: permita ao sujeito autoconhecer-se (as suas limitações e
as suas capacidades), auto-aceitar-se e auto-estimar
-se! E aqui faz todo o sentido recordar as palavras de Jesus “ama o teu próximo como
a ti mesmo!”
28
sermos aceites (tal como as crianças) tendemos (por vezes e patologicamente) a negar
ou a distorcer as próprias percepções, emoções, sensações e pensamentos. Quando tal
acontece a auto-imagem fica distorcida, incompleta e irreal. É como se perdêssemos
partes de nós para agradar aos outros, para garantir a consideração, o amor e a
atenção dos outros. Esta negação do eu é propícia a problemas de identidade, à fraca
noção de quem sou eu, o que gosto e para onde quero ir. Para Rogers, as pessoas
ajustadas têm um autoconceito realístico, têm consciência das suas características,
estão conscientes do seu mundo interior, estão abertas a novas experiências10 e
autoconsideram-se positivamente. Estas pessoas sentem-se livres para tomarem
decisões ponderadas e não receiam a mudança. Assim, Rogers apela à necessidade de
aceitar verdadeiramente as pessoas, de forma a promover o seu crescimento. Jesus
aceitava verdadeiramente as pessoas, lidava com aqueles que a sociedade desprezava
porque entendia que só numa relação de aceitação elas concordariam em deixar as
suas más escolhas e substituí-las por outras mais saudáveis: Zaqueu, o cobrador de
impostos odiado pelo seu próprio povo por o roubar e entregar as divisas a Roma, só
mudou depois de Jesus repousar em sua casa. A aceitação do outro11 permite-lhe
baixar as defesas, as armas, diminui a resistência à mudança e abre portas a uma nova
vida. Isto é Graça, um dos fundamentos do Cristianismo. Quanto mais criticarmos
algo em alguém, mais dificilmente esse alguém consentirá e conseguirá mudar esse
algo. A crítica levanta muros e aguça a autodefesa: a graça e o amor quebram
barreiras e tornam o outro favorável à mudança. Porque ao não ter de lutar contra o
outro mais facilmente se aceita pensar sobre a mudança proposta por esse outro e leva
-la adiante.
■ Cattell (1905) definiu a personalidade como aquilo que permite prever o que a
pessoa fará numa dada situação. Sabemos qual a sua essência, logo sabemos como se
comportará em dada situação.
Conhecemos a essência da luz e sabemos que ela iluminará sempre. Igualmente
reconhecemos que o verdadeiro sal não conseguirá deixar de salgar. Será impossível!
Assim, a previsibilidade do comportamento marca a personalidade de alguém.
10
Porque tendo a noção segura de quem são não temem deixar-se “contaminar” pelo diferente. O sal não teme ser misturado com o açúcar
porque mesmo misturado mantém a sua identidade salgada, e a luz não teme misturar-se com a escuridão, porque mesmo misturada não
deixará de iluminar.
11
É a aceitação da pessoa enquanto pessoa, não é a aceitação e concordância com o seu erro! Não aceitamos o erro mas aceitamos a pessoa.
Jesus ama o pecador mas opõe-se ao pecado.
Estas são algumas das teorias apresentadas ao longo dos tempos para definir o que é a
personalidade. Muitas outras foram concebidas!
29
e a capacidade de autocompreensão facilitam o processo de auto
-estima. Ou seja: passar tempo a pensar sobre si mesmo (mesmo sobre os aspectos
que considera desagradáveis e que gostaria de mudar) numa atitude de
autocompreensão (e ponderação) abre portas a uma auto-estima mais equilibrada. No
entanto, pensar sobre nós mesmos nem sempre é fácil. Existem realidades difíceis de
consciencializar e admitir, das quais muitas vezes (mais do que devíamos!) nos
escondemos. Igualmente pensar sobre nós mesmos nem sempre é um processo
realista porque tendemos a basear-nos em falsas realidades e a confundir o que somos
realmente com o que gostaríamos de ser (o nosso ego ideal). É neste percurso de
pensar sobre nós mesmos que, por vezes, surge a necessidade de o fazermos a dois.
Um amigo com sabedoria, um familiar íntimo ou um psicoterapeuta podem facilitar
esse caminhar que não é, nada mais nada menos, do que mergulhar em nós mesmos
para depois sair de forma a voltarmos aos outros. E voltar aos outros com mais
consciência de quem somos é saudável! Se, sozinhos, este regresso se torna difícil,
acompanhados custa menos porque o outro (uma espécie de auxiliar do nosso ego)
indica o caminho de regresso. Explico melhor: quando sozinhos, mergulhamos em
nós mesmos, corremos o risco de nos perdermos12 e não conseguirmos encontrar o
caminho de volta (como que numa perda egocêntrica). Se mergulharmos num eu
sofrido, amargurado e melancólico, afundamo-nos na tristeza e possível depressão; se
mergulharmos num eu eufórico, que se considera maravilhoso, superpotente e
independente, afundamo-nos na mania, na vaidade e deixamos de ter uma imagem
realista de nós mesmos. Por vezes um ego auxiliar ajuda-nos a encontrar o caminho
de volta! O bom é mergulhar em nós mesmos, ver o que está dentro, analisar e voltar
a sair13 promovendo o autocrescimento (através da mudança) e o altruísmo. Neste
sair, já com consciência de mim, regresso fortalecido para operar mudanças que
facilitem a minha adaptação ao mundo real e pronto para dar e dar-me aos outros.
Dou e dou-me aos outros porque, graças ao autoconhecimento e à autocompreensão,
não receio perder-me também nos outros. Só posso dar-me aos outros (altruísmo)
depois de ter noção de quem sou, quanto valho e para onde vou. O mergulhar em nós
mesmos faz todo o sentido se fortalecer a relação que travamos com o eu e a relação
que travamos com os outros. Aí não há egocentrismo, não há egoísmo, mas há
crescimento pessoal, há auto-afirmação e valorização do outro (assertividade). Neste
percurso há a possibilidade de ser sal e luz: de temperar e iluminar os outros,
simplesmente porque já somos temperados (há conservação do ego – protecção da
identidade) e já somos iluminados (altruísmo e possibilidade de indicar aos outros um
caminho a seguir baseado nas verdades de Deus).
12 É um risco! Nem sempre nos perdemos, mas pode acontecer com alguns de nós. 13 Com ou sem ajuda!
Quem não dá aos outros ou, melhor dizendo, quem não se dá aos outros, fá-lo por
insegurança… não se dá e nem dá algo ao outro por pura desconfiança. Há quem diga
que quem não dá, quem não partilha é egoísta! E o que é o egoísmo senão o estar
demasiado centrado em si mesmo? O egoísta é aquele que mergulhou em si e perdeu-
se em si mesmo, esquecendo-se dos outros. O egoísta é aquele que numa tentativa
desenfreada de autoconhecimento e de autoprotecção entrou em si e esqueceu o
caminho de regresso ao outro, à interacção e, no fundo, a si mesmo enquanto
30
indivíduo social. Esqueceu-se, ou nunca aprendeu, que pode ser sal e luz e que sê-lo é
saudável, não apenas para beneficiar o outro mas, essencialmente, como estratégia de
crescimento pessoal.
É na relação com o outro que me conheço, pois o outro funciona sempre como meu
espelho. No egoísmo há uma recusa do espelho e o sujeito apenas pretende ver-se
pelos seus próprios olhos, correndo o risco de errar na avaliação que faz de si mesmo
(e consequentemente na avaliação que faz dos outros).
Se pensarmos em Jesus e na forma como Ele se entregou aos soldados, como Ele
permitiu deixar-se prender, ferir e matar sem ripostar, se pensarmos na vida que Ele
viveu de entrega, dedicação e acompanhamento dos outros, salienta-se o Seu
autoconhecimento e a Sua enorme auto-estima. Foi por Ele saber quem era (Filho de
Deus), por se considerar e por ter plena consciência do Seu estatuto de Rei do
Universo, Senhor dos Senhores e Príncipe da Paz, que Ele aceitou sofrer tamanha
humilhação e injustiça! Ele sabia quem era e autoconsiderava-se pela Sua natureza
divina, esse Seu autoconhecimento e auto-estima permitiu amar a humanidade e
entregar-se como servo a ela. Quem se autoconhece e se auto-estima entrega-se pois
tem plena consciência de quem é! Ele não se via pelos olhos dos Seus acusadores, Ele
sabia que era mais do que aquilo que os homens e mulheres da época estavam a dizer
d’Ele. Ele não foi uma esponja que, na insegurança da Sua identidade absorveu o que
diziam de Si. Ele sabia quem era e auto
-estimava-se por isso. O caminho possível nestas condições é o altruísmo.
Quem está inseguro quanto ao que é e quanto ao seu valor não se entrega, pois na sua
insegurança receia perder-se.14 Quem está seguro quanto à sua natureza e ao seu alto
valor dá-se a si mesmo pois a segurança acompanha-o.
Então, a auto-estima é algo valorizado por Deus pois Ele ama a Si mesmo e tem um
profundo conhecimento de Si mesmo.
Quando na Bíblia lemos «ama o teu próximo como a ti mesmo» entende-se que para
Deus só faz sentido o Homem autoconsiderar
-se. E é nessa autoconsideração, é nessa segurança do próprio valor, que é possível
amar o outro. Pois o sujeito que se autoconsidera não está preso a si mesmo, é capaz
de mergulhar em si e é capaz de sair de si para desfrutar dos outros. Não é egoísta!
14 Igualmente, a todo o custo, procura economizar o pouco que acredita ter ou ser. Não dá e não se dá por
receio de ficar mais desfalcado do que acredita já estar.
31
Encontramos, então, uma grande diferença entre auto-estima e egocentrismo!
Não falaremos mais da auto-estima pois adiante trabalharemos mais esta questão.
Fique atento! Está claro como a auto-estima pode ser saudável, contribuindo para o
equilíbrio pessoal e social (para um bom relacionamento do próprio com o próprio e
com os outros). No entanto… o equilíbrio psicológico beneficia e é beneficiado,
igualmente, pelo equilíbrio físico! Vamos falar da noção de saúde mais alargada e
integrada na qual se baseia este manual!
32
2. Uma noção integrada de saúde
A Organização Mundial de Saúde, criada em 1948, definiu a saúde como um estado
de bem-estar físico, psíquico e social e não apenas como a ausência de doença. A 21
de Novembro de 1986 surgiu, no Canadá e na cidade de Ottawa, a Carta de Ottawa
como resultado da Primeira Conferência Internacional sobre a Promoção da Saúde.
Nessa carta foram definidas algumas orientações de forma a atingir-se uma saúde
para todos em 2000 (já lá vai muito tempo, não é?). O objectivo era proporcionar um
movimento de saúde pública, a nível mundial, que promovesse a capacidade dos
indivíduos e das comunidades para controlarem a sua saúde, no sentido de a
melhorar. Esta carta definiu directrizes que ajudam as pessoas a atingir um estado
completo1 de bem-estar físico, mental e social. Segundo esta carta, para que tal estado
de saúde fosse atingido, os indivíduos (bem como a sua comunidade de pertença)
deveriam ser capazes de identificar e realizar as suas aspirações, satisfazer as suas
necessidades e modificar ou adaptar-se ao meio. A saúde é valorizada como um
recurso para a vida e não como uma finalidade de vida.
1 Se é que o “completo” é possível!
Esta obra defende a noção de “saúde integrada” no sentido em que entende a saúde
como um estado de bem-estar físico, psíquico e social. Estas três componentes do ser
humano encontram
-se indubitavelmente interligadas, influenciando-se positiva e negativamente. O bem-
estar psíquico promove o bem-estar físico e o inverso também acontece, tal como
sucede com o bem
-estar social. Igualmente a saúde é entendida como dependente das escolhas do
indivíduo. A promoção da saúde individual2 não depende apenas do sector da saúde,
das decisões governamentais e da política ou serviços de saúde. Depende igualmente
das escolhas individuais, exige a selecção de um estilo de vida saudável!
2 E também comunitária!
33
A saúde é entendida como um conceito positivo porque salienta os recursos físicos,
psíquicos e sociais da pessoa envolvida – destaca as suas capacidades físicas, as suas
aptidões psíquicas (intelectuais e emocionais) bem como as suas competências sociais
(estar em sociedade assertivamente). A promoção da saúde pressupõe o
desenvolvimento pessoal e social através da melhoria e aumento da informação
disponível, através da educação para a saúde (aprender a ser saudável adoptando um
estilo de vida saudável) e através do reforço das competências que contribuam para
uma vida saudável. O que se pretende é que as pessoas fiquem mais capazes de tomar
decisões conscientes promotoras da sua saúde geral.
A saúde resulta dos cuidados que cada um dispensa a si mesmo e aos outros e
relaciona-se com a capacidade de tomar decisões conscientes (reflectidas!) e de
assumir o controlo sobre as circunstâncias da própria vida. Nesta perspectiva
encontra-se, igualmente, a noção da saúde integrada, porque não chega apenas cada
um cuidar de si mesmo estando todos nós interligados. Ao promover a saúde dos
outros, efectivamente promovemos também a nossa, em termos individuais.
Segundo a Carta de Ottawa, existem pré-requisitos para a saúde tais como a paz, o
abrigo, a educação, a alimentação, os recursos económicos, um ecossistema estável
(numa perspectiva ecológica global), recursos sustentáveis, justiça social e equidade.
E a melhoria da saúde e da qualidade de vida depende da garantia destas condições
básicas.
Do ponto de vista físico, a saúde depende das características genéticas herdadas dos
progenitores e dos aspectos do funcionamento fisiológico tais como defeitos
estruturais, protecção contra infecções e, também, reacções alérgicas. A maneira
como estes componentes reagem entre si influencia o funcionamento saudável.
A sua saúde física depende da forma como você trata o seu corpo. Você cuida dele
com amor? Alimenta-o adequadamente ou só lhe dá substâncias nocivas? Exercita-o
34
ou leva-o a uma vida sedentária e disfuncional? Trata da sua higiene ou descura-a?
Como está a tratar o seu corpo? O pensamento de Deus é claro: o corpo também
merece a nossa especial atenção.
❏ O comportamento é o conjunto de acções, que, por sua vez, podem promover a
saúde (regime alimentar adequado, exercício físico, cumprimento da medicação
prescrita pelo médico, visitas regulares ao médico de família e dentista, passeios ao ar
livre e outros comportamentos saudáveis). O comportamento é, igualmente, o
conjunto de acções que podem comprometer a saúde (alimentação desequilibrada,
inércia, automedicação, fumar, beber em excesso e outros comportamentos
promotores de doenças).
35
instintos de vida, na necessidade de conservar o ego, afirmando-o. Igualmente assenta
na conservação dos outros contribuindo para a sua restauração.
Do ponto de vista social, a saúde depende da interacção que a pessoa estabelece com
o meio que a cerca. Verdadeiramente, as relações têm um papel importantíssimo na
vida e no bem-estar de cada um de nós. O facto de não decorrerem como o desejado
pode perturbar o sono e conduzir à perda de apetite. Somos seres sociais e estar em
sociedade (contactos com a comunidade e a cultura) é crucial para a qualidade de
vida. Já ouviu dizer que a solidão mata? E falo de toda a sensação de solidão!
Mas a saúde, para nossa surpresa, não é apenas definida como dependendo do que é
social, físico, mental ou comportamental! A Organização Mundial de Saúde fala
numa outra vertente, infelizmente pouco referida e valorizada pelo mundo ocidental:
a vertente espiritual! Na verdade, o Alto Comissariado da Saúde, através da
Coordenação Nacional para as Doenças Oncológicas, ao definir o Plano Nacional de
Prevenção e Controlo das Doenças Oncológicas 2007-2010, privilegiou a
complementaridade de recursos com o objectivo final de promover a qualidade dos
serviços prestados a quem está em tratamento (neste caso oncológico).
Consequentemente, focou a indispensabilidade de uma reabilitação biopsicossocial,
capaz de abarcar vários domínios do paciente: o físico, o psíquico, o social e o
espiritual.
A Organização Mundial de Saúde reconhece que o ser humano tem uma necessidade
espiritual que precisa de ser saciada. Todos necessitamos de Deus, mesmo quando
não o reconhecemos! E a vida saudável ou a recuperação de um estado doentio deve
privilegiar a satisfação dessa necessidade. Certos investigadores, de forma tímida,
têm procurado compreender o impacto da crença em Deus na vida das pessoas e
muitos têm conseguido provar a sua importância para a saúde da humanidade.
36
37
38
3. A assertividade e a sua importância
A assertividade é uma postura perante mim, perante os outros e a vida em geral,
directa, honesta e respeitosa. É provavelmente o comportamento humano mais
desejado, necessário à construção de relacionamentos saudáveis e capaz de abrir
caminho ao sucesso pessoal, familiar e profissional, facilitando a resolução de
conflitos.
Há pouco falámos de empatia e quando penso neste traço gosto daquela imagem que
remete para a necessidade de calçar os sapatos do outro! Lembro-me das meninas que
ao calçarem os sapatos da sua mãe sentem, ainda que por breves momentos, que
deixam de ser elas mesmas e passam a ser a mãe. Nesses momentos, nos quais lhes é
permitido calçar os sapatos da mãe, elas sentem-se dotadas do poder e da beleza da
mãe, já não são elas mesmas e empatizam, ou seja, saboreiam a possibilidade de
experimentar o lugar do outro, pisam o seu chão, “compreendem” o seu sentir, pensar
e agir (algumas comportam-se como a mãe, copiando as suas palavras, gestos e
olhar). Isto é empatia: sem deixar de ser eu, por breves momentos calço os sapatos do
outro, coloco-me no seu lugar e compreendo as suas alegrias e preocupações, para
depois voltar a ser eu mesmo!
39
Segundo relata o livro bíblico do Êxodo, Moisés teve um encontro com Deus. Foi
assim: Moisés apascentava o rebanho de seu sogro, Jetro, até que chegou a Horeb
(conhecido como o monte de Deus) e quando lá chegou Deus chamou-o e disse-lhe
para se descalçar porque o chão que estava a pisar era santo. Moisés obedeceu e Deus
apresentou-Se como sendo o Deus de seus pais. Moisés, atemorizado, escondeu o
rosto. Foi aí que Deus lhe começou a dizer que estava a ver a aflição do Seu povo
escravizado pelos egípcios e que estava a programar libertá-lo, enviando Moisés para
falar com o Faraó. Moisés ouviu tudo atentamente e disse ao Senhor «Quando eu for
ter com os filhos de Israel, dir-lhes-ei: “O Deus dos vossos antepassados enviou-me a
vós”; e se eles me perguntarem: “Qual é o nome d’Ele?”, o que é que eu vou
responder?» Então Deus respondeu a Moisés «Eu sou Aquele que sou.» Mais adiante,
Deus abreviou o Seu nome para «Eu Sou» (Êxodo 3,1-15). Este é um dos nomes de
Deus, «Eu sou Aquele que sou», e ainda no versículo 15 Deus afirmou que este é o
Seu nome eternamente e assim será lembrado de geração em geração.
Este episódio relata a natureza de Deus, o Deus que nos criou e que nos conhece
desde o ventre da nossa mãe, Ele é o que é! E afirma sê-lo! Em toda a Escritura
encontramos um Deus que não só se conhece a Si mesmo como ainda se apresenta
aos homens e de Si mesmo fala. Deus revela um profundo autoconhecimento e uma
profunda auto-estima. Ele conhece-Se e convive bem Consigo mesmo. Convive bem
Consigo mesmo porque, por se conhecer tão bem, não vai contra a Sua natureza. Ele
não ofende o Seu Ego, o Seu Eu. Ele sabe o que aprecia e não aprecia, sabe de onde
vem e para onde quer seguir, conhece as regras com as quais pode agir sem se
contrariar a Si mesmo. Sabe o que O alegra e o que O frustra. E a Si mesmo é fiel.
O autoconhecimento e a capacidade de auto-revelação1 previnem desajustes
emocionais e facilitam as relações sociais por permitirem um maior contacto do eu
com o eu e uma maior transparência nos relacionamentos.
40
Mas atenção, o bom senso também faz parte da assertividade! Assertividade ou auto-
afirmação, sem bom senso, não faz sentido! Isto remete para o facto de que não é
pressuposto revelar
-se a todos os que passam pela sua vida e em qualquer momento! Na verdade, há
pessoas a quem menos falar de si, melhor! E há alturas adequadas para falar e outras
para permanecer calado.
Não podemos definir assertividade sem reflectir sobre o estilo agressivo e o passivo.
Vamos defini-los e aprender algo com os mesmos!
41
4. O estilo (de comunicação e relação)
agressivo
A agressividade é uma forma de comunicar e estabelecer relações apoiadas no
autoritarismo e no exercício da força que não precisa, obrigatoriamente, de ser
explícita. Na verdade, existem formas mascaradas e astutas de agressividade.
O estilo agressivo encontra-se em íntima relação com a ira, sendo que, no entanto,
nem todos os que se iram são agressivos. Vamos reflectir sobre esta emoção…
A ira
A ira é um estado emocional experimentado por todos, ainda que uns experimentem
mais do que outros e alguns consigam escondê-la melhor do que outros. Alguns
experimentam-na por um período curto de tempo, outros levam décadas com ela
42
“atravessada na garganta” sob a forma de amargura, ressentimento e ódio. A ira,
persistindo no tempo e sendo alimentada, pode tornar
-se destrutiva e associar-se à ausência de perdão e desejos de vingança. Facilmente
encontramos pessoas iradas, zangadas com a vida e propensas a variados problemas
psicológicos, físicos (como as doenças cardíacas) e espirituais. Verdadeiramente a má
gestão da ira pode contribuir para a diminuição da saúde física e emocional de quem
a vivencia.
A vivência da ira não só perturba a saúde física como ainda perturba a capacidade de
raciocínio e avaliação lúcida das situações vividas bem como a capacidade de
estabelecer relações sociais seguras. Quanto mais irada, mais desconfiada e receosa
de aproximação a pessoa irada estiver, maiores serão os muros construídos que a
separam e “protegem”2 dos outros… e isto não é saudável. Assim, a má gestão da ira
é uma porta aberta para a solidão, depressão, ansiedade, medos, disfunções sexuais,
conflitos conjugais e familiares, conflitos sociais e laborais, problemas de adição
como o álcool e outras drogas, entre muitos outros desajustes. Talvez daí Deus fazer
tanto apelo ao controlo e resolução da ira. Verdadeiramente, se esta emoção não for
convenientemente gerida, e em determinada altura travada, poderá dar origem a
muito sofrimento não só aos outros mas ao próprio. Creio que o nosso Criador nos
conhece mais do que ninguém, e quando Ele apela ao controlo de algo como a ira e
desejo de vingança, o objectivo não é aprisionar, diminuir ou retirar a capacidade e
direito de auto
-afirmação ou autoprotecção, não é também diminuir a razão que a justifica (caso
tenhamos razão, ela é nossa porque a verdade será sempre a verdade, mesmo não
sendo reconhecida pelos outros), e nem sequer é apenas proteger o outro de nós. O
Seu objectivo é controlar um pequeno fogo, antes que o mesmo se torne num grande
incêndio em que não só os outros serão vítimas (da ira e desejo de vingança) mas o
próprio será a principal.
2 Pensa ela que protegem!
Na Bíblia encontramos várias situações de ira e torna-se claro que esta emoção é não
apenas comum a todos os seres humanos como também é uma característica de Deus
(fomos feitos à Sua imagem e semelhança: «Então Deus disse: “Façamos o homem à
nossa imagem e semelhança.”» Gé n e s i s 1,26) E sendo ela um predicado divino é
impossível considerá-la, em si mesma, negativa. Verificamos, assim, que a ira pode
também ser construtiva se surgir devido ao desejo e necessidade de promover a
justiça contra situações de injustiça. No Evangelho de São João, capítulo 2, versículos
13 a 17, encontramos a descrição de uma situação que provocou a ira a Jesus:
Aproximava-se a Festa da Páscoa e Jesus foi a Jerusalém para a celebrar, como era
43
tradição para qualquer judeu, e sendo uma das maiores festas comemorava a
libertação dos israelitas da escravidão do Egipto (Êxodo 12 e deuteronóMio 16,1-8).
Quando Jesus lá chegou dirigiu-se ao Templo e encontrou vendedores e cambistas a
desempenharem a sua actividade profissional. Ao ver isto fez, com umas cordas, um
chicote e expulsou-os de lá. Virou as mesas dos cambistas e deitou por terra o seu
dinheiro, igualmente mandou embora os vendedores, advertindo-os para não fazerem
da casa de Seu Pai uma casa de negócio. Claramente Ele estava irado, não escondeu
nem dissimulou o que sentia, revoltou-se contra a situação e tomou atitudes
(consideradas por muitos agressivas, mas que outros compreendem, afinal a casa de
Deus não é sítio para negociar e ganhar dinheiro). Então, Deus também se ira?
Também se zanga e se revolta? Sim! Segundo a Bíblia, zangou-se também com
Lúcifer3 quando ele desobedeceu e arrastou anjos com ele contra Deus. Zangou-se
tanto que os expulsou de Sua casa!
Mas o que diferencia a ira divina da ira humana? Será o autodomínio de Deus, que
apesar de irado O leva a não perder o controlo? Será a natureza graciosa de Deus que
o faz dar-se de graça ao Homem sem este merecer? Será que é por esta ira divina só
estar assente no desejo de promover a justiça e erradicar a injustiça? Provavelmente
são todas estas e mais algumas as razões que tornam a ira divina uma ira santa e justa,
ao contrário de algumas iras humanas.
Nesta passagem bíblica entende-se que é possível e aceitável a ira contra alguém ou
contra alguma situação. A ira, por si só, não é má mas pode tornar-se prejudicial e
destrutiva. Torna-se prejudicial em duas situações: quando é manifestada de forma
descontrolada (explosão) ou quando é internalizada (alimentando-a em pensamentos
e emoções). Nas duas situações não só o outro sai magoado, como o próprio também
se magoa.
44
crítica.4
Curar as feridas provocadas pela ira e pelo desejo de vingança, bem como pelas
palavras ditas sem pensar, poderá acontecer muito tarde e em alguns casos nunca
acontecer. Muitos têm morrido ainda magoados, feridos na alma e abusados
verbalmente. Segundo o Novo Testamento, aquele que ventila os seus pensamentos e
sentimentos de forma irada, impulsiva e irracional, perdendo a calma, é descrito
como insensato e, como tal, é pressuposto ser tardio para falar e tardio para se irar.
Não se está a defender que jamais se deverá expressar a ira ou falar sobre ela,
defende-se apenas que deve ser tardio, mais tarde, mais logo, quando a calma chegar.
Parece que há um tempo para tudo, até para expressar a ira que vai na alma. Convém
que seja quando as labaredas estiverem mais controladas.
45
São várias as causas da ira: a injustiça, a frustração, a ameaça5, a existência de
mágoas bem como a aprendizagem6.
A injustiça é provavelmente a razão mais aceitável e compreensível para a ira. Em
algumas conjunturas encontram-se pessoas que ao detectarem situações de injustiça
ficam iradas e essa ira impulsiona-as a agir de forma a reverter a situação. Esta ira
poderá contribuir para o aumento da qualidade de vida dos injustiçados, para a
diminuição do abuso e negligência social. A injustiça surge como a única razão capaz
de provocar a ira de Deus. Alguns homens e mulheres têm-se irado com a fome, a
doença e a morte, o abuso e a violência sexual, a negligência e agressão contra seres
humanos, o abandono e maus-tratos de animais, bem como outras questões, como as
ambientais. Esta ira contra as injustiças tem permitido o surgimento de movimentos
associativos capazes de lutar pela protecção dos mais desfavorecidos. E isso é bom!
5
Ser efectivamente ameaçado ou sentir-se ameaçado. Há diferença! Alguns de nós não precisam de ser ameaçados para reagir com ira…
basta sentirem-se ameaçados. Como é consigo?
6 Sim, podemos aprender e ensinar a reagir com ira! Observar os outros (nomeadamente figuras de referência) a reagir com ira, pode levar-
nos a solidificar essa forma de reacção. Igualmente a reacção de ira cristalizada pode levar a que outros aprendam, connosco, a reagir dessa
forma. Daí ser importante aprender a gerir a ira.
46
-estar individual e social nem possibilita a resolução do problema. Na verdade, a
adaptação ao meio não se encontra facilitada, pelo contrário, pode surgir um mal-
estar pessoal (porque a pessoa não fica bem consigo mesma), mal-estar social (porque
todos à volta são chamuscados pelas labaredas da ira e da frustração comprometendo
as relações sociais) e nem por isso a frustração inicial é digerida (com a agravante de
poder aumentar).
47
adultos durante mais tempo que os restantes animais. Enquanto os pais experimentam
um período sensível após o nascimento dos seus filhos (contribuindo, por vezes, para
alguma instabilidade emocional e dificuldades de vinculação com o bebé8), com
poucos dias de vida o bebé distingue e prefere o cheiro e a voz da sua mãe, com mais
algum tempo de vida procura o contacto visual e sorri na presença de quem cuida
dele. Muito antes de completar o primeiro ano de vida assiste-se, no bebé, a um claro
vínculo com os pais, tentando conservá-los perto da sua vista e mostrando sinais de
ansiedade quando ficam na presença de estranhos.
7
Fomos criados à Sua imagem e semelhança. Ele também tem necessidade de vinculação. O Pai, o Filho e o Espírito Santo anseiam
contactar com a Sua criação: nós! É confortante saber que Deus não está lá longe… Ele está bem perto de si, esperando que você se vincule
a Ele.
A propósito: vincular = ligar, apegar-se, amar.
8 Há quem refira que a vinculação dos pais face aos filhos recém-nascidos tende a aumentar com o passar do tempo. Quanto mais relação
houver e quanto mais prematura for, maior e mais rápida será essa vinculação. Daí os recém-nascidos ficarem nas enfermarias com as mães
e não em salas isoladas!
❏ A carência de estima e reconhecimento por parte dos outros está claramente
relacionada com a forma como o sujeito se vê e avalia. Estas necessidades abarcam a
capacidade para se auto
-apreciar, auto-estimar, a autoconfiança bem como a necessidade de aprovação social
e prestígio.
❏ E, por último, a carência de realização pessoal está muito associada ao sucesso
profissional nos adultos. A sua não satisfação gera frustração que pode ser expressa
sob a forma de ira voltada contra os outros (família, sociedade em geral e governo) ou
contra o próprio.
Todas estas necessidades são intrínsecas ao ser humano e quando não satisfeitas
tendem a gerar uma certa frustração. O nível de frustração, a sua gravidade, varia de
sujeito para sujeito e relaciona-se com o valor pessoalmente atribuído ao objecto ou
situação em falta. A pirâmide de Maslow aborda estas carências e o seu grau de
importância para o ser humano, em termos gerais. As mesmas são apresentadas como
motivações pois tendem a impulsionar/motivar os pensamentos, os sentimentos e os
comportamentos do sujeito numa dada direcção. Ou seja, cada um de nós tende a agir
consoante as suas motivações, tende a comunicar e relacionar-se com os outros
também de acordo com as necessidades que apresenta. Todo o comportamento tem
uma razão de ser, nada acontece por acaso. No fundo, está tudo justificado e pode ser
quase tudo compreendido pelo principal protagonista (você!) num processo de
autodescoberta psicoterapêutica. Basta envolver
-se nesse processo, que muitas vezes é um cavar a alma à procura de um tesouro
escondido. Esse tesouro é o autoconhecimento.
48
É nesta compreensão das motivações que se entende que a forma de agir (e mesmo de
sentir e pensar) pode ter na sua base vários motivos e a mesma necessidade pode ser
satisfeita por vários comportamentos (uns mais adequados e saudáveis do que outros).
Cabe a cada um a selecção de comportamentos satisfatórios num plano pessoal e
social.
A resposta à frustração varia de pessoa para pessoa e pode ser uma resposta baseada
na agressividade, na racionalização, na regressão e adopção de atitudes infantilizadas,
pode ser a fuga (consumo de drogas) ou mesmo a resignação. Ou seja, perante a
frustração você pode responder ou reagir de várias formas:
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“saudável” para o agressor projectar a sua frustração interior para algo ou alguém fora
de si (projecção) do que manter esse sofrimento interno e generalizado, contaminando
todo o seu ser.10 Claro que essa projecção da frustração e da agressão para um bode
expiatório é negativa para quem projecta e para quem se torna vítima (muitas vezes
sem entender porquê). É negativa para quem projecta pois fá-lo sem perceber o que
faz e sem, verdadeiramente, resolver o motivo da frustração. E é negativa para o bode
expiatório pois este é vitimado injustamente sem perceber o porquê.
9No deslocamento, a pessoa que desloca atribui características de uma pessoa a outra pessoa. Neste caso, as características negativas e que
despertam frustração e agressão são deslocadas de uma pessoa para outro “bode expiatório” alvo de vingança!
A Palavra de Deus instrui a não pagar o mal com o mal, mesmo quando somos
injustamente vítimas da frustração e agressão de alguém. Deus, que é o maior
psicólogo de todos os tempos (afinal conhece a Sua criação: nós!), sabe do que fala.
Repare que se o bode expiatório responder com agressão ao seu agressor, apenas
confirmará as suspeitas e certezas do agressor: as suspeitas de que o bode expiatório é
mesmo má pessoa e merece todo o sofrimento infligido. Isto aumentará a agressão do
agressor, vitimando ainda mais o bode expiatório. Mas… se o bode expiatório não
responder com agressão ao seu agressor, confundi-lo-á e levá-lo-á a questionar toda a
sua agressão e projecção da frustração. Neste caso, a possibilidade de resolução do
problema torna-se mais provável. Atenção, não estamos a falar de resignação! O bode
expiatório não tem de se resignar à agressão do agressor, só tem de não responder
com agressividade.11 Está confuso? Continue a ler… mais tarde entenderá!
10 Parece que lidamos melhor com o que está fora de nós e objectivamente localizado do que com o que está dentro de nós. É mais fácil
culpar o outro, responsabilizando-o por tudo e por nada, do que olhar para dentro e consciencializarmo-nos das nossas próprias limitações,
erros e fracassos (sem esquecer inseguranças e medos). Na projecção atribuímos ao outro características nossas, neste caso específico
características que desprezamos e então acusamo-lo não tendo a consciência de que verdadeiramente acusamo-nos a nós mesmos. A mente
humana é muito complexa!
50
da paixão! Os profissionais de saúde tendem, muitas vezes, a procurar intelectualizar
os casos clínicos e a tratá-los apenas como processos clínicos de forma a protegerem-
se das relações emocionais, que, em caso de perda e morte, desencadeariam lutos
sucessivos.
11
Jesus nunca se resignou, nem perante os religiosos da época, nem perante o povo ou os líderes políticos. Ele foi à cruz por escolha própria
e porque tinha um propósito: comprar-nos de volta com o Seu sangue! Resignação significa perda e entrega ao inimigo. Se ser santo é ser
como Jesus, então não temos de nos resignar… temos apenas de não responder com agressão!
12 Ainda que sejam pouco funcionais e estejam assentes em bases pouco seguras!
51
eu psiquicamente me sinto atacado por algo (ex: vindo de mim mesmo como
pensamentos de medo, solidão e desespero, ou vindo de outras pessoas como patrão,
colegas, familiares ou amigos) o que faço é levantar barreiras psíquicas de forma a
proteger o meu ego.13 Essas estratégias são os mecanismos de defesa e cada um tem
os seus, uns são mais resistentes e outros menos resistentes. É importante conhecê-los
para observar a sua actuação e evitar tornar-se escravo deles uma vez que muitos
agem ao nível da inconsciência. O não conhecer os mecanismos defensivos abre
portas a reacções que o próprio não compreende e não consegue gerir.
Verdadeiramente aquilo que é desconhecido por si, em si, não pode por si ser gerido,
adaptado ou mesmo substituído. É uma escravatura, digna de um funcionamento
psíquico rígido e consequentemente patológico!
13 É uma “guerra” travada ao nível psíquico. É um conflito psíquico.
Voltando à ira …
A ira pode realmente ser um resultado de padrões de pensamento assentes em
emoções agressivas e anti-sociais. No entanto, a existência de ameaças e mágoas
poderão, igualmente, causar ira. Uma pessoa que se sinta rejeitada, humilhada,
criticada injustamente ou ameaçada poderá experimentar a ira como forma de
mascarar a mágoa. Ou seja, a ira poderá mascarar a mágoa relacionada com a
frustração da rejeição e humilhação. Daí ser importante não responder “na mesma
moeda”. Se alguém trata alguém com ira pode acontecer que essa ira não seja uma ira
resultante de um padrão de funcionamento agressivo, mas sim resultado de uma
mágoa, um receio de ser humilhado ou rejeitado. E nestas situações devolver na
mesma moeda apenas confirma ao sujeito magoado que ele é, efectivamente,
rejeitado, aumentando a sua mágoa e, paralelamente, abrindo portas a outra explosão
de ira. Daí, provavelmente, entre outras razões, Deus alertar-nos para a necessidade
de pagar o mal com o bem e não devolver na mesma moeda. Responder à ira com
agressividade apenas aguça mais ira, porque contribui para que o outro comprove a
sua necessidade de atacar como mecanismo de autoprotecção. “Ataco para não ser
atacado e como forma de me proteger do outro que, tal como já esperava, é
verdadeiramente agressor.” Então, a ira gerará mais ira.
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E como já vimos, de certa forma as explosões de ira podem ser respostas aprendidas.
Lidar com pessoas que normalmente reagem iradas perante situações frustrantes pode
contribuir para que quem observa acredite que essa é a única forma de reagir e a
adopte enquanto mecanismo de resposta pessoal.
Considero saudável fornecer algumas orientações que possam ajudar a gerir a ira,
caso esteja a passar por ela. De certa forma, lidar maturamente com a ira parece
implicar uma certa fraqueza e cobardia, como se permitíssemos que o outro “use e
abuse”, “pise e repise” da paciência e auto-estima do inocente. Parece que o “dar a
outra face”, defendido por Jesus, é inconcebível e abre portas ao abuso. Assim, na
tentativa de evitar ser capacho de alguém, e na tentativa de defender a própria auto-
estima e auto-imagem, são assumidas posições rígidas que em nada permitem a
resolução do conflito e a negociação de posições anteriormente defendidas. Sabe-se
que o estilo comunicacional assertivo ou auto-afirmativo nada tem que ver com a
passividade que caracteriza a suposta “dá a outra face” nem com a agressividade que
caracteriza a suposta “dá outra estalada”. Se Jesus era assertivo, em que ficamos?
Algumas estratégias poderão ajudar a gerir a ira de forma mais assertiva e algumas
delas implicam, directa ou indirectamente, o “dar a outra face”. Vamos vê-las:
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gerida e controlada. Todos, em qualquer altura da vida, podem, ocasionalmente,
perder o seu controlo. Se você raramente tem controlo sobre a sua ira, reconheça-o.
Saiba que o seu controlo é possível.
❏ Não negue nem mascare a sua ira. Admiti-la é preferível a ocultá-la numa tentativa
de manter a paz. A sua motivação para esconder a ira pode ser elogiável, mas o
resultado é nefasto; o ofensor jamais saberá que fez mal e que magoou alguém,
jamais procurará reflectir sobre os seus actos e mudar. Em simultâneo, quem reprime
a ira tem maior probabilidade de tornar-se amargo e ressentido, além de estar a ser
falso. «O que em si esconde a ira é um hipócrita.» (Provérbios 10,18a) É sempre
preferível mostrar que fomos magoados, ainda que com certas condições preenchidas,
(analisadas adiante). Antes de conseguir afastar a amargura e a ira, ódio ou desejos de
vingança, deve admitir a sua presença, no mínimo para si mesmo. Muitas vezes, o
alívio e a capacidade de raciocínio surgem após desabafar com um amigo. Derramar
o que se sente contribui para o reequilíbrio. Quando falamos, ouvimos a nossa própria
voz e isso permite-nos reflectir sobre o que estamos a afirmar; permite uma
reavaliação da situação e das emoções presentes e permite redefinir a forma como
avaliamos e compreendemos o sucedido e como agiremos futuramente. Quando
falamos do que nos magoa tornamo-nos espectadores de nós mesmos, o que constitui
uma porta aberta para a auto-reflexão e surgimento de novas considerações, muitas
vezes mais saudáveis. A ira admitida e reflectida perde muita da sua força.
❏ Não amue nem dê ao outro o tratamento do silêncio. Fale da sua mágoa a quem o
magoou. Seja activo e não passivo, assuma a posição de ir e falar directamente com
os envolvidos. E neste comportamento directivo evite ser agressivo, não precisa de se
descontrolar para ter razão!
❏ Não faça uma retirada. Talvez esta seja a forma mais fácil de lidar com a ira, mas
será também a menos eficaz. Retiramo-nos quando assumimos posições como deixar
o local, tirar férias, evitar o problema mergulhando no trabalho ou em outras
actividades, pensando em outros temas, consumindo substâncias como o álcool e
outras drogas, negando, consciente ou inconscientemente, que a ira existe. Os
problemas não ficam resolvidos negando-os ou afastando-nos deles, o melhor que
pode acontecer é aliviar, temporariamente, a tensão mas a probabilidade de esta
explodir mais tarde é grande. Quando a ira é reprimida mostramos uma aparente
calma, mas a raiva encontra
-se no íntimo gerando sintomas físicos como dores de cabeça e úlceras, reacções
psicológicas como ansiedade e depressão, comportamentos de autoprejuízo como
acidentes, pensamentos de autopiedade e ruminação e lutas espirituais como resultado
de estar mergulhado em amargura. Enfrente o problema, ainda que com humildade e
sem agressividade.
54
casais: partem do princípio que é mais adequado agredir o esposo ou esposa pelas
angústias vividas no local de trabalho ou nos relacionamentos sociais. Torna-se
impossível resolver a ira quando não somos capazes de responsabilizar quem deve ser
responsabilizado por ela. Assim, ao lidar com a ira procure descobrir quem realmente
a provocou, sinalize o responsável e não se permita, a si mesmo, arranjar substitutos.
E caso alguém esteja a ser o seu “bode expiatório” reconheça-o e peça perdão,
contribuirá para a clarificação do seu próprio raciocínio e salvará a relação (no
mínimo).
❏ Cada vez mais percebo o efeito terapêutico do perdão e do pedir perdão. Mais uma
vez compreendo que o nosso Criador nos conhece melhor do que ninguém. Pedir
perdão não é meramente um capricho de um Deus desejoso de nos humilhar ou nos
ver humilhados perante Ele ou outros iguais a nós. Não, não é! Há um efeito
terapêutico, há saúde mental no admitir a culpa, assumir a responsabilidade por algo
inoportuno e no pedir perdão aos lesados. Quando peço perdão a alguém a quem
ofendi eu liberto-o da ira que provavelmente sente por mim, o que claramente
contribuirá para a sua saúde e qualidade de vida. E quando peço perdão contribuo,
igualmente, para a minha própria saúde mental: percebo e admito onde errei e
mobilizo esforços e coragem que permitem um mais rápido crescimento pessoal e
social. Verdadeiramente, coloco-me na probabilidade de não voltar a cometer a
mesma falha pois tornei-a consciente e reconheço-a e confirmo não a apreciar. Mais
tarde quero voltar à questão do perdão… por agora chega.
❏ Perceba qual a causa da sua ira: ao delimitar a causa concreta impedirá que a
mesma se disperse por falsas causas. Se você souber o que causa a sua ira poderá
procurar solucionar directamente a origem. Mas não se prenda em falsas causas como
“o meu pai era igual, herdei a sua personalidade”, porque enquanto for assim não
enfrentará a verdadeira causa da sua ira, não a compreenderá e a mesma persistirá. O
que se sabe é que, muitas vezes, o que justifica o comportamento agressivo é a
existência de sentimentos de inferioridade. Certas pessoas com baixa auto-estima, e
que se sentem inferiores, assumem atitudes de hostilidade e de ira. Isto porque a
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pessoa sente-se insegura e indefesa e, como tal, perde a capacidade de raciocinar e
assume uma posição primitiva de ataque e autodefesa, como qualquer animal que se
sinta ameaçado. Assim, se o que motiva a sua agressividade são os sentimentos de
inferioridade, peça ajuda psicoterapêutica.
❏ As explosões de raiva, por palavras ou actos, não são a melhor forma de resolver a
ira nem o seu problema originário, além de, muitas vezes, provocarem mais ira.
Como tal, as explosões devem ser reprimidas. O acting out (agir impulsivamente)
deve dar lugar à reflexão. A chamada ventilação ou a catarse, além de ser
biblicamente condenável (pois sugere “deitar tudo cá para fora doe a quem doer”,
desresponsabilizando o sujeito pelas consequências dos seus actos), não comporta
certezas quanto à eficácia na gestão da ira e resolução do conflito. E não parece que a
ira fique mais controlada após a explosão de raiva. Existe, sim, um certo alívio da
tensão interna, mas também se abrem as portas para o aumento do conflito. Quer o
outro responda agressivamente, quer vire as costas com medo, o conflito mantém-se
sem resolução, as feridas permanecem abertas e, um dia mais tarde o leão pode voltar
a rugir. A chamada ventilação jamais é sugerida na Bíblia como medida de gestão da
ira e do conflito. Expressar a raiva raivosamente, para desanuviar, esconde um efeito
perverso.
56
❏ Coloque de lado e resista à “necessidade” de remoer dificuldades, pensamentos de
vingança, desejo de desforra, palavras de vingança. Hoje sabe-se que tais atitudes
produzem essencialmente mais ira. A natureza ensina que a árvore mais alimentada é
a que cresce mais e melhor. Regar e alimentar a árvore da ira naturalmente trará mais
ira, tal como regar a árvore do pensamento pessimista trará mais pessimismo. Você
tem o direito de afirmar estar magoado, tem o direito de se defender e se sentir mais
justiçado, mas há formas mais adequadas e eficazes para atingir esse objectivo.
Remoer a ira não é, seguramente, a forma adequada, porque enquanto fica a remoer o
outro continua a sua vida impávido e sereno. Quem mastiga a raiva pára no tempo,
cristaliza-se no momento da ofensa, vive-a repetidamente como se fosse algo presente
e permanece intoxicado. Para evitar remoer:
❏ E por último, faça o bem a quem o magoou – estará a quebrar as suas defesas e a
confundi-lo. No fundo é você que ganha! Ao tomar a iniciativa de abençoar quem o
magoou está a ser assertivo! Está a dizer que as suas acções não dependem dos actos
dos outros. São livres e determinadas por si. No fundo está a auto-afirmar-se e não a
subjugar-se e determinar-se pela forma como o outro o tratou. Volto a referir… é
você que ganha!
57
15
Os Dez Mandamentos e algumas outras orientações apresentadas ao longo dos livros bíblicos.
Em todas estas medidas encontra-se o “dar a outra face”, que em si mesmo não
implica nem uma atitude passiva, nem uma agressiva, implica sim uma atitude
assertiva. Dar a outra face, mais do que algo dirigido ao outro, é algo dirigido ao
próprio. Dou a outra face a mim mesmo na medida em que me permito gerir a ira e
resolver a situação de conflito de forma mais assertiva, menos agressiva e sem
assumir uma posição de passividade.
Aqui está algo que também provoca “comichão” nos dias de hoje: negar-me a mim
mesmo! Este apelo é, por muitos, considerado descabido. É difícil para o homem e
mulher actual pensar em negar-se a si mesmo! Mesmo porque toda a mensagem
publicitária (e não só) vai no sentido de “segue os teus instintos”, “vive a ocasião”,
“não te preocupes”. Negar a mim mesmo provoca “comichão” e vontade de
abandonar quem o aconselha. Mas também remete para algo importante como
controlar o meu primeiro desejo de vingança e destruição do outro. Remete para a
necessidade de substituir a emoção raiva pela capacidade de pensar sobre ela e toda a
circunstância envolvente. É fácil? Não, não é!
Dar a outra face sugere uma postura pessoal activa, ou seja, sou eu que decido dar e
sou eu que dou a outra face independentemente do que o outro escolha fazer. Dar a
outra face sugere a coragem de se colocar em posição de abertura ao diálogo com
alguém (em princípio agressor) necessário à negociação e resolução de conflitos.
Jesus não disse que só eu devo dar a outra face. As mesmas palavras são dirigidas ao
meu suposto agressor, e se ambos dermos a outra face estaremos disponíveis para
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conversar, assumir responsabilidades, negociar e resolver o conflito. Mas atenção
porque o facto de dar a outra face não me garante que o outro também a dê e,
efectivamente, existem pessoas propensas a aproveitar a outra face dos outros para
efectivar a ameaça, o desejo de vingança e a agressão. Assim, dar a outra face
constitui sempre um risco ainda que necessário ao diálogo. E isto sugere um traço de
personalidade de Jesus – sempre disposto ao diálogo.
Por vezes, todo este processo de gestão da ira e, no fundo, cura interior só é possível
com a ajuda de um psicoterapeuta. Se for este o seu caso não se embarace, procure
ajuda sabendo que a psicoterapia não é mergulhar num mar de rosas, mas sim sair de
um mar de espinhos. E neste sair dos espinhos, por vezes, há também choro e
sofrimento necessários ao renascer. Outras vezes, a ajuda de um amigo ou amiga, de
um familiar ou de um líder religioso é suficiente para percorrermos o caminho da
libertação.
No entanto, não devemos esquecer que a ira, sendo uma emoção partilhada por Deus,
em si mesma, não deve ser evitada ou eliminada. Deve, sim, ser adequadamente
gerida através do controlo da emoção e impulso agressivo, bem como através do uso
da racionalização e capacidade de auto-reflexão. O autocontrolo será mais fácil se
houver uma preocupação com a prevenção da expressão inadequada da ira, ou seja, se
tomar medidas no sentido de prevenir a explosão de raiva. Algumas dessas medidas
poderão ser:
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“na mó de baixo”, afinal permite fantasiar sobre a própria superioridade, permite
reequilibrar a auto-estima e autoconfiança (e, à partida, parece ser importante e
saudável). No entanto, este modelo de gestão da ira e do conflito, assente na
agressividade, tem um efeito perverso: envenena o próprio! A ira torna-se tão grande
que leva à perda da capacidade de raciocínio, impede a resolução do conflito e
aumenta a solidão do indivíduo, além de o predispor para o ataque ao outro. É um
modelo destrutivo e prejudicial: «Ocupai-vos com tudo o que é verdadeiro, nobre,
justo, puro, amável, honroso, virtuoso, ou o que de algum modo mereça louvor.» (Fi l
i P e n s e s 4,8)
Depois de fantasiar sobre a sua superioridade sobre o outro e sobre as estratégias de
vingança, quando o ruminador se consciencializa da realidade, a frustração volta a
tomar conta de si, o desespero e o ódio reacendem para chamuscar tudo à sua volta.
De facto, não é fácil percorrer caminhos de mudança. Este manual pretende propor
mudanças na sua forma de pensar, sentir e reagir perante as situações. O caminho a
percorrer exige alguma determinação, mas percorra-o pela sua saúde física e mental.
Percorra-o, igualmente, para a saúde dos que ama e que de si dependem. Costumo
dizer que, muitas vezes, abandonamos os processos psicoterapêuticos simplesmente
porque doem e ninguém gosta da dor. Concluindo, a pessoa com um estilo de
comunicação e relação agressiva quer afirmar-se, quer ser assertiva! Ela quer, mas
não o sabe ser! Estas pessoas estão desejosas de partilhar o que sentem (normalmente
mágoas!), como pensam e porque agem de determinada forma tão castradora. No
entanto, neste ímpeto de comunicar recorrem a estratégias erradas (baseadas na
agressão pessoal e aos outros), geram conflitos e saem magoadas. O desafio será
encontrarem formas sadias de comunicar e partilhar as suas frustrações de maneira a
serem ouvidas e compreendidas, sem magoar os outros. A isso chamamos
assertividade!
60
5. O estilo (de comunicação e relação)
manipulador
Antes de iniciarmos o estudo deste estilo de comunicação gostaria de relembrar que
todos queremos ser amados e todos buscamos ser verdadeiramente amados! Estamos
cansados de máscaras e à noite, quando encostamos a cabeça na almofada para
dormir, ficamos aliviados por poder, finalmente, tirá-las. Os manipuladores também
querem ser verdadeiramente amados e o seu comportamento tem esse objectivo,
ainda que não siga “os trâmites legais”!
Enquanto a pessoa agressiva se afirma “doe a quem doer” de forma pronta e directa, a
pessoa com um estilo de comunicação e relação manipuladora afirma-se mas de
forma pouco ou nada clara. Falta-lhe sinceridade e transparência na maneira como
fala do que pensa e sente e de como pretende agir ou agiu. Esconde, dissimula e altera
o conteúdo do que realmente tem para dizer por receio de não alcançar os seus
objectivos. E o objectivo final é sempre sentir-se superiormente amado, abastado,
confortado em relação aos outros (que no fundo não respeita). A manipulação decorre
de um sentimento de inferioridade: manipula os outros não apenas por não os
respeitar, mas essencialmente por não confiar na eficácia do seu verdadeiro ser. Não
confia no que é e nas próprias capacidades para alcançar o que pretende ou necessita
e, como tal, reveste-se de uma máscara que viabilize o projecto. O grande problema é
que as máscaras também se colam à cara e assim traduzem-se em consideráveis
problemas na e de identidade. O que caracteriza este estilo de comunicação é a
máscara e o disfarce associados à necessidade de controlar os outros. Tudo serve os
propósitos do próprio não tendo em conta as necessidades alheias. Assim acaba-se
por conseguir o apoio dos outros sem os mesmos perceberem o contexto real no qual
estão inseridos. Na verdade, estão a ser manipulados ou ludibriados.
61
manipulador procura rebaixar alguém específico que ele pensa estar a fazer-lhe
sombra. A zombaria é uma estratégia que visa dissimular o real sentimento de
inferioridade do qual é vítima. Assim, o manipulador rebaixa a outra pessoa para que
ela se sinta inferior e ele possa trepar, sentindo-se menos inferior do que ela. Quanto
mais em perigo se sentir, maior a probabilidade de gozar e inferiorizar os outros. No
fundo, quem recorre a sarcasmos sente-se “na corda bamba” e para não ficar em
desvantagem procura arrastar outros consigo. O sarcasmo surge como uma estratégia
que visa aumentar a sensação de segurança através da inferiorização dos outros.
Deixar-se-á inferiorizar quem se sentir mais inseguro e tiver tendência para a
autodesvalorização. As pessoas com formas de funcionamento mais passivo ou mais
agressivo serão as mais atingidas, reagindo ou com agressão autodirigida (se for
passivo) ou com agressão dirigida ao outro (se for do estilo agressivo).
62
❏ Insinuações – o manipulador procura transmitir uma ideia sua mas colocando-a
no boca de outros “ouvi dizer por aí que…”. O que procura é alcançar um objectivo
mas sem se envolver directamente com as palavras que usa. Assim, responsabiliza
outros pelas mesmas. E para se proteger coloca-as em “pessoas” vagas, não definindo
conveniente e objectivamente a pessoa que as proferiu. A insinuação surge porque o
manipulador não tem coragem para assumir as palavras como suas. Na verdade sente-
se incapaz e com medo e por isso diz o que tem a dizer mas protegendo-se sempre.
Como habitualmente, ele pretende obter algo que considera capaz de o dignificar mas
não tem a audácia necessária para ser frontal. Ele quer ser ouvido e atendido mas
receia não o ser1 e por isso recorre a estratégias pouco claras. No fundo revela
insegurança e baixa autoconfiança e denuncia a sua dificuldade em acreditar numa
estima verdadeira dos outros pela sua pessoa. Se ele confiasse no amor verdadeiro e
desinteressado assumiria o que pensa e sente sem necessitar dissimular.
63
considerar a manipulação como uma forma mascarada de agressividade. Nesta
situação, a inteligência do manipulador começa a faltar porque deixa de ter em conta
a capacidade de discernimento de quem ele está a querer manipular. E os outros
também são inteligentes, também têm capacidade de adaptação a um ambiente hostil
e sobre ele desenvolvem estratégias de resolução dos problemas. E isto pode ser fatal
para os planos tão bem orquestrados pelos manipuladores.
É interessante reparar que enquanto escrevo sobre os manipuladores, o faço sempre
no masculino! Mas a verdade é que também se encontram altos níveis de
manipulação no género feminino (talvez até maiores). O facto de as mulheres não
serem detentoras de muita força física pode explicar a necessidade de desenvolver
outras estratégias que lhes permitam “levar a água ao seu moinho”. Os homens,
devido à sua maior força física, podem mais facilmente impor-se por ela. Algo parece
ressalvar: enquanto o estilo manipulador parece consistir no exercício da força pelas
ideias, o estilo agressivo parece impor-se não só pela força das ideias como pela força
física. Verifica-se, nestas pessoas, um discurso agressivo ainda que mascarado, como
já se viu. No fundo, a pessoa manipuladora é uma pessoa agressiva, mas que
aprendeu a mascarar os seus maus instintos de forma a conseguir, dos outros, o que
pretende, deixando
-os confusos quanto ao facto de terem sido ou não vítimas e, muitas vezes, com
sentimentos de auto-recriminação. Há uma vitimização ainda que indirecta e difícil de
perceber enquanto tal. Há uma dissimulada anti-sociabilidade capaz de enganar
muitos e a astúcia é uma característica estrutural, jamais se aceitando um não como
resposta. Para eles os fins justificam os meios, mesmo se distorcerem a realidade,
apelando à mentira e ao engano. A patologia mental tende a surgir com a cristalização
desta forma de reagir perante o mundo.
Sabe-se que nestas pessoas há um certo prazer em representar. Para o manipulador a
vida é um palco e as pessoas actores alvo. Ele está em constante cena e o objectivo é
ganhar vantagem. Como pontos fortes e positivos da sua personalidade (sim, porque
não somos totalmente maus e nem totalmente bons!) destacam-se a vontade forte e
persistente, a independência, o ser visionário e prático, o ser produtivo (pois gosta de
atingir os objectivos) e decidido.
1 Porque lhe falta confiança quer em si mesmo, quer no amor dos outros.
Uma das grandes dificuldades das pessoas que estabelecem este tipo de relação com
os outros é a falta de confiança. Na verdade elas não conseguem confiar nos outros,
não acreditam que os outros possam beneficiá-las motivados por um verdadeiro
interesse e amor. Para elas os outros jamais suprirão as suas necessidades se não
64
forem obrigados a tal e assim tendem a forçá-los, ainda que indirectamente, por medo
da retaliação.2 A pessoa manipuladora não confia no amor do próximo, não confia na
relação que possa ter com ela. Não sente que o outro a possa amar de forma
transparente e real e como tal (por não se sentir digno de tal relação transparente e
incondicional) procura tirar partido. A agressividade pode surgir, também, como
consequência da falta de confiança. Como não tem confiança no amor dos outros pela
sua pessoa, começa a odiá-los e por isso tende a atacar. Esta falta de confiança nos
outros, que os leva a procurar obter o que pretendem “pela porta das traseiras”, tem a
sua raiz bem lá atrás, numa fase ainda primária do desenvolvimento. O que se pensa é
que provavelmente esse desenvolvimento foi marcado por carências (materiais e/ou
emocionais) com as quais o sujeito não soube viver3, por alguma violência sentida e
pela perda de confiança no amor verdadeiro e desinteressado. Assim, para estas
pessoas, que estabelecem um tipo de relação baseada na manipulação, a vida é uma
luta na qual só sobrevivem os mais fortes.
2
O manipulador tende a não expressar a sua agressividade directamente não apenas porque assim é mais rápido e “limpo” obter dos outros o
que pretende, mas também porque, no fundo, ele é um medroso. Esconde a agressividade por medo da retaliação. E agride, directa ou
indirectamente, também como forma de autoprotecção. E quando é descoberto diz sempre que nada fez e que teve sempre boas intenções! 3
Passar por necessidades não faz de nós obrigatoriamente carentes e muito menos manipuladores. No entanto, certas pessoas vivem o que não
têm e gostariam de ter de forma altamente angustiante e destrutiva. A sensação de carência leva-as não ao impulso da construção sadia mas
ao impulso da autoconstrução pela via da destruição dos outros. Outro aspecto interessante a recordar é que ter carências não significa que
ninguém lhes tenha dado amor e carinho, pode significar que apesar de lhe ter sido dado, por alguma razão, elas não souberam receber.
Ao ler este capítulo penso que você está em condições de saber qual a sua posição: se
manipula ou se é mais facilmente manipulado. Se manipula os outros reflicta sobre
este capítulo e peça, rapidamente, ajuda psicológica, e se é facilmente manipulado
considere, igualmente, as seguintes advertências a fim de proteger-se dos
manipuladores…
❏ Desconfie quando a esmola for tão grande que até enjoa! Quando os elogios e as
ofertas forem desproporcionadas ao que aparentemente as motivou. E investigue as
reais motivações de quem o elogia. Pode pedir conselhos a um amigo mais sensato.
❏ Desconfie quando alguém apelar ao “fica entre nós”. Tudo o que é ocultado e não
pode vir à luz é para desconfiar! Esta é uma regra de Deus! Toda a verdade e tudo o
que é digno e justo acompanha-se de luz e a luz não pode ser ocultada! O ocultar algo
sugere erro e falsidade.
❏ Desconfie quando alguém promete ajudar mas em seguida recorre a “se”, “mas”,
“talvez”. Investigue a situação!
65
A preocupação surge quando esta forma de funcionamento (baseada na manipulação)
se torna estrutural. O que quero dizer é que todos nós em algumas alturas da nossa
vida recorremos a alguma forma de manipulação. Até aí é “aceitável”. No entanto,
quem funciona apenas neste registo denuncia uma certa tendência anti-social, uma
certa personalidade perturbada e isso é doentio. Aí convém pedir ajuda, quando ainda
há consciência para tal. Mas não esqueça que todos nós tentamos manipular os outros
desde o berço. O problema surge quando o conseguimos, na maior parte das vezes, e
não somos repreendidos e essa forma de funcionamento se torna estrutural.
66
6. O estilo (de comunicação e relação)
passivo
O estilo passivo assenta na dificuldade em expressar opiniões, vontades e sentimentos
próprios. Como tal, assenta numa atitude de submissão fácil ao outro, dependência e
receio. É um estilo que considera necessária a subordinação e a fuga como formas de
solucionar os conflitos. Claro que não os soluciona! Estas pessoas normalmente
dizem que não gostam de alimentar os problemas, que é desnecessário discutir porque
afinal nada se ganhará com isso e desfazem-se em desculpas e lamentações quando
são arrastadas para determinados problemas. Este receio do outro e esta incapacidade
de auto-afirmação expressa-se em risos nervosos e forçados, em posturas corporais
descaídas, numa voz quase inaudível e pouco transparente, num olhar difícil de
encontrar. Facilmente ficam ansiosos, não toleram o confronto e tendem a aceitar
tarefas que mais ninguém quer desempenhar. Claro que há quem se aproveite sempre
desta fragilidade da pessoa passiva, despertando nela, posteriormente, sentimentos de
desvalorização pessoal (baixa auto-estima), perda de energia (apatia), ressentimentos
e até fantasias e desejos de vingança.
As pessoas com estilo de comunicação e comportamento passivo normalmente são
“usadas e abusadas” por pessoas com comportamentos manipuladores ou agressivos.
Este estilo de vida passiva parece trazer algumas vantagens (como alguma
tranquilidade, ainda que falsa e efémera), no entanto, não conduz à realização
pessoal.
67
comportamental, o indivíduo não define directrizes, dá total liberdade aos outros para
agirem como quiserem, tem uma participação limitada no grupo, não se assume e
tende a ser esquecido. Estes sujeitos (no local de trabalho, na escola, em casa ou nas
instituições religiosas) tendem a provocar nos outros instabilidade, individualismo,
desmotivação, frustração e incapacidade para focar e seguir um objectivo, atingindo-
o. Por vezes chegam a ser desrespeitados e desconsiderados pelos supostos liderados.
A passividade tem, na sua origem, várias vertentes. Gostaria de reflectir sobre duas
delas: a sensação de culpa e a baixa auto
-estima.
68
autonomia e vitalidade do sujeito. Neste caso, quem fere está tão refém do erro
cometido que não é capaz de planear a reparação da pessoa lesada (e por isso
contribui para a continuação da destruição emocional de quem foi magoado) e nem é
capaz de planear a sua própria libertação. A reparação da pessoa magoada fica
dificultada se a pessoa que magoou se centrar na culpa em si e não na reparação, e
isso é doentio: não é saudável para nenhuma das partes envolvidas. Por isso estranho
que tantos usem a culpabilização doentia como forma de controlo social. Certos pais
treinam os filhos para sentirem culpa mas esquecem-se de ensinar-lhes o caminho
saudável da reparação. Verdadeiramente, a culpa subjectiva (complexos de culpa,
sensações generalizadas de culpa) pode ser aprendida, é possível aprender a sentir
culpa por tudo e por nada. Essa aprendizagem gera sentimentos posteriores de
inutilidade pessoal, de desadequação social e desejos de autodestruição. Há muito
sofrimento!
A forma como a religião tem lidado com a questão da culpa tem contribuído para que
muitos percam a curiosidade em conhecer Deus. Na realidade, a religião tem
apresentado uma visão doentia da culpa: sublinha-se o pecado e o pecador sem
considerar a capacidade de reparação quer como acto divino, quer como acto
humano. Esta postura religiosa de culpa e castigo foi tão usada pela Igreja como
forma de controlo social que despertou hostilidade e afastamento dela.
69
O Cristianismo, na sua essência, não desperta sentimentos de culpa subjectivos.
Apoia-se, sim, na culpa objectiva e é essa que todos os evangelhos sublinham.
Infelizmente, vários cristãos têm procurado alimentar nos outros o complexo de culpa
para, dizem eles, levar ao arrependimento e à conversão. No entanto, têm sido
criticados por despertarem sentimentos pouco saudáveis! E efectivamente despertam!
A tristeza que Deus quer, relacionada com a culpa, é a tristeza surgida por
verdadeiramente se ter transgredido a Sua Lei. Não é uma tristeza associada a uma
culpa generalizada e subjectiva. É uma tristeza associada a uma razão objectiva (um
pecado específico). Igualmente é uma tristeza que não se concentra no autocastigo, na
autodestruição, na morte do eu. É uma tristeza que se concentra no arrependimento
construtivo. Esse arrependimento é aquele que leva a pessoa a admitir que errou, a
ficar triste por isso e a mudar de vida: reparar. Salvação é reparar. Quando a pessoa
70
que errou admite a responsabilidade da sua falha e se move no sentido de reparar, ela
contribui para a vida e salvação. Vejamos:
71
responsável pela angústia, apatia, medo de falhar, submissão e dependência dos
outros. Gera passividade e em alguns casos pode também gerar agressividade, ódio,
competição desenfreada. O sentir-se fracassada abre portas à autocondenação, à
autocrítica e sugere sentimentos de inferioridade. Muitos de nós crescemos com esta
disfuncionalidade e incompetência emocional.
O crescer num lar em que é permitido a todos os seus membros errar e posteriormente
arrepender-se permite ao menor entender que a perfeição de actos e pensamentos é
humanamente impossível e que o perdão faz toda a diferença. Estas crianças crescem
aprendendo a ter coragem para assumirem os seus erros sem se sentirem inferiores,
procurando a reparação dos seus descuidos. Aprendem acima de tudo a perdoar-se a
elas mesmas, porque alguém as perdoa, e aprendem a perdoar os outros com graça ou
de graça! São crianças que aprendem a não sucumbir em auto
-recriminações.
Assim, qualquer culpa mal gerida pode provocar uma imensa destruição: atitudes de
autodefesa (como culpar desmesuradamente os outros), atitudes de auto-ataque (como
culpar-se a si mesmo sem dó e sem piedade), afastamento e quebra dos
relacionamentos sociais bem como diminuição da saúde em geral.
Mediante estas consequências, como lidar com a culpa? Se o desejo é ser assertivo e
libertar-se da passividade e do medo do outro, bem como do sentimento de
inferioridade provocado por alguma culpa, é necessário tomar algumas providências.
Como pode você libertar-se do sentimento de culpa de forma a tornar-se mais
assertivo?
– Verifique se realmente tem culpa. A sua culpa é objectiva? Se sim, corrija o erro.
❏ Fale com a pessoa a quem ofendeu. Por vezes não falamos para não nos
inferiorizarmos e porque pensamos que ao não falar pode ser que ninguém imagine o
quanto somos culpados. É uma espécie de segredo entre nós e a nossa consciência. O
ofendido na verdade não sabe (pensamos nós na nossa “ingenuidade”) que tem razão
para estar magoado, como se algo não confessado não fosse verdade. Mentira! A
verdade será sempre a verdade, quer a confesse quer a negue! Se objectivamente é
culpado, então é-o independentemente de confessar ou negar o erro. Confessar abre
portas à restauração, liberta quem está cativo e diminui o sofrimento de quem ficou
magoado e de quem está a esconder-se da verdade dos factos. É a verdade que liberta!
Também confessar o erro aumenta a auto-estima do confesso porque é preciso uma
grande dose de coragem para o fazer. Ir ter com o agredido e estender a mão,
inicialmente contribui para que o ex-agressor se sinta na mão do agredido (e ninguém
gosta de sentir-se assim tão pouco poderoso, tão frágil!), mas posteriormente é o
agredido que fica na mão do agressor! Vamos lá explicar melhor: quem pede perdão
sente-se temporariamente nas mãos do agredido. Mas o que vem a seguir é
permanente e não temporário. Ou o agredido perdoa e restabelece a confiança no ex-
agressor (significa que o ex-agressor ganhou um irmão) ou o agredido não perdoa,
mas ao não perdoar fica refém do seu próprio ódio e mágoa enquanto o outro segue
72
livre! Deus apela ao perdão porque essa atitude salva psiquicamente as partes
envolvidas, restaura a quem o pede e a quem o concede.5 É uma questão de
sobrevivência espiritual e psíquica! O saber e reconhecer que se errou permite o
surgimento de uma profunda tristeza que é construtiva, pois dá lugar à reparação. Já o
complexo de culpa não é construtivo, é apenas autodestrutivo.
5 E lembre-se que custa tanto a quem pede como a quem dá. Não é fácil pedir perdão, mas também não é fácil concedê-lo. No entanto, o
preço a pagar por ambas as partes vale a pena.
– Se não há culpa objectiva e mesmo assim a culpa subjectiva está presente, há muito
a fazer! Vamos ver:
73
verdadeiramente culpados e os outros reconhecem-no e sublinham-no. No entanto,
como é algo que vai de encontro ao esperado, produz uma estranha sensação de paz
muito desejada, ainda que falsa e pouco duradoura. Não se apoia na verdade, não
ilumina como a luz e não conserva como o sal. Não é assertiva!
❏ Tendo tudo uma origem, até mesmo os complexos de culpa, importa saber qual a
sua. Reflicta sobre si mesmo, e se chegar ao ponto de sentir que está demasiado
afogado nos pensamentos, emaranhado nas emoções, demasiado confuso e a perder a
objectividade, então procure ajuda terapêutica. Reflicta sobre si mesmo, mas
acompanhado, para não se perder. Caso queira tentar reflectir sobre si mesmo sozinho
siga algumas questões aqui sugeridas:
❏ Se for relevante para si, investigue o ensino bíblico sobre a culpa e o perdão.
Entenda que Deus é um Pai de perdão e não de acusação. Claro que Ele espera que os
Seus filhos ajam correctamente, mas Ele não se deleita na acusação. O Seu prazer
está em levar a pessoa que errou a reconhecer o seu erro para posteriormente mudar
de rumo optando por caminhos mais higiénicos para si mesmo e para os outros. A
essa mudança atribui-se o nome de arrependimento. Existe, actualmente, algum
74
preconceito face à palavra pecado. Biblicamente, pecado remete para más escolhas.
Remete para a aceitação de pensamentos e comportamentos nada sadios para o
próprio que os tem e para os outros que o cercam. O objectivo de Deus Pai é que os
Seus filhos vivam saudavelmente e o pecado rouba esse bem-estar! Só isso mesmo! O
pecado não foi inventado por um Deus tirano, controlador e que apenas quer
manipular as Suas criaturas levando-as a sentirem-se presas, sem liberdade de
escolha, escravas a uma moral ou código tirano. O pecado nem foi inventado por
Deus. Como um filho desobedece ao pai entristecendo-o, o nosso pecado entristece o
Pai. E no ensino bíblico sobre o perdão entende-se que ninguém tem de ser escravo
do complexo de culpa. Após o reconhecimento do erro e arrependimento, bem como
pedido de perdão, há lugar para a liberdade e paz interior. O continuar a sentir-se
indefinidamente culpado colide com a verdade bíblica da libertação.
O Pai sabe que o complexo de culpa traz sofrimento interior (preocupação, medo,
sentimentos de inferioridade, solidão, angústia e tristeza profunda) e que tem
repercussões ao nível da saúde física, inspirando doenças variadas e outros males
estares, sem esquecer que potencia o desprendimento de Deus. Jamais Deus recorreu
ao complexo de culpa para garantir que alguém O siga verdadeiramente. Deus é sábio
e sabe que não é contribuindo para a sensação de culpa que garante mais seguidores.
Essa estratégia é a das igrejas feitas por homens (bem como outras entidades como
alguns pais, professores e patrões) que esperam que, ao induzirem a culpa e o medo,
os seus seguidores sejam mais e cada vez mais fiéis. Verdadeiramente, induzir o
outro a sentir-se culpado pode temporariamente ajudar a controlar o seu
comportamento num determinado sentido. No entanto, a médio e longo prazo a
angústia e o desespero experimentados por quem se sente permanentemente culpado
dão lugar à desilusão profunda, ao desamor por si mesmo, ao desapego e à falta de
confiança nas próprias capacidades, bem como na capacidade de perdão ao outro.
Perante esta profunda perda de esperança em si mesmo e no outro, o sujeito encontra-
se mais disponível para desistir de procurar o bem, entregando-se a más escolhas.
Desvincula-se de si mesmo e dos outros. Quando eu desisto de mim, por excesso de
culpa e por baixa auto-estima, então, nada parece restar senão a morte psíquica:
entregar-se a pensamentos e comportamentos para-suicidiários, que não são nada
mais e nada menos do que o caminho das más escolhas! É o caminho do “perdido por
cem, perdido por mil”.
75
culpa tende a desejar afastar-se de si. O mal-estar interno é tão assustador e punitivo
(tão tirano!) que o sujeito precisa de fugir “de si mesmo”. O problema é que ninguém
pode fugir totalmente de si e, por isso, a tirania mantém-se ainda que, por vezes,
mascarada e mais ou menos anestesiada. A qualquer momento o complexo de culpa
pode reacender e voltar a queimar tudo à sua volta e consequentemente a paz interior
do indivíduo. Neste sentido, os complexos de culpa castram as pessoas que graças a
eles sofrem, limitando as suas escolhas e impedindo a sua espontaneidade.
A aventura do risco
Correr riscos não é fácil, no entanto, por vezes é vital. Quando se pondera a
possibilidade de correr um risco é necessário considerar a possibilidade de ganhar e a
76
possibilidade de perder algo. E o correr risco acalenta uma probabilidade alta de
perder algo, por isso é considerado risco!
O risco caracteriza-se pela possível perda e pelo sucesso pouco provável. Caracteriza-
se pela possível queda e claro que quanto maior o complexo de culpa, maior o
sentimento de rejeição e maior a certeza de insucesso. Daí evitar-se correr riscos.
Claro que correr riscos deve ser altamente ponderado. Como o fazer? Aqui ficam
algumas orientações:
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❏ Defina claramente o risco que quer correr. Escreva-o a seguir. Seja objectivo!
❏ Descubra quais são as suas motivações. Porque vai correr o risco? Vale a pena? A
motivação é certa?
❏ Defina as suas emoções. O que sente quando se imagina perante o risco? O que
sentirá (imagine!) se for bem sucedido? E se perder, como se sentirá? Quais serão as
reacções ao ganho e à possível perda?
❏ Pondere as vantagens e desvantagens de correr o risco. O que vai perder se não for
bem sucedido? E o que vai ganhar se for bem sucedido?
❏ Os objectivos que está a traçar são realistas?
❏ Converse com alguém (da sua confiança) e peça conselhos a três pessoas que
considere idóneas no assunto. O que dizem elas sobre o risco que pretende correr?
São favoráveis a que você corra esse risco ou não?
❏ Se correr esse risco e for bem sucedido, de que forma influenciará os que
dependem de si? E quais serão as consequências para os que dependem de si se você
não obtiver os ganhos previstos?
78
Quando há um maior controlo da situação e um maior autocontrolo há uma maior
probabilidade de tomar a decisão sábia. Claro que muitos, após ponderar, concluem
que não vale a pena correr o risco e outros concluem que vale a pena. Quando a zona
de conforto é grande11, então corre-se o risco!
Correr o risco após ponderação também engloba permitir-se errar. As pessoas que
correm riscos parecem ser mais tolerantes consigo do que as que não correm riscos.
Quem corre riscos, após ponderar, já se confrontou com a possibilidade de errar e
perder e de certa forma já quase se perdoou por essa falha. Estas pessoas reconhecem
o seu direito de errar. Claro que o melhor é acertar o alvo, mas a falha pode ocorrer e
esta é uma realidade a não negar! Todos gostam de acertar o alvo. Somos
programados nesse sentido. O espermatozóide, quando é depositado na mulher, tem
um alvo: encontrar primeiro do que os seus colegas o óvulo. Os que não acertam o
alvo morrem: os espermatozóides lentos e pouco determinados morrem pelo caminho
e os outros que têm vitalidade, determinação e correm o risco de entrar na corrida e
perder, se não acertam primeiro o alvo também morrem. Somos “programados” para
acertar o alvo, para vencer desde os nossos primórdios. E é sempre triste correr o
risco e perder. No entanto, quem corre o risco após ponderar e reconhecendo a
probabilidade de errar e perdoando-se por isso, terá mais condições de sobreviver
psiquicamente após a queda.
11 Zona de conforto – é um espaço psíquico, uma certeza racional e emocional de que os ganhos serão superiores à perda. Aqui há paz
interior, há satisfação e um desejo enorme de “pôr as mãos na massa”! O sujeito avança ao longo do percurso já com as estratégias definidas,
os olhos postos nos objectivos bem traçados e detectando os problemas, ainda muitas vezes antes de eles se manifestarem. Ele está
determinado e imparável. Dá gosto ver!
Engraçado como, por vezes, mais facilmente se concede aos outros o direito de errar
do que ao próprio. Esta facilidade aumenta quanto menos a pessoa estiver relacionada
e depender de quem errou. Por vezes é mais difícil lidar com o próprio erro do que
com o erro do outro, devido ao factor auto-responsabilização e autoculpabilização.
79
alguma tendência para a desculpabilização desse outro. Ao desculpabilizar e ao
encontrar justificações para a falha do outro (que se ama e com quem se identifica)
permite-se, inconscientemente, uma espécie de autodesculpabilização. Quem
desculpabiliza pensa que salva o outro e se salva a si mesmo. Fá-lo como estratégia
de sobrevivência psíquica: como forma de protecção do outro, protecção da relação
que tem com esse outro e como forma de, igualmente, continuar a sentir-se bem
consigo mesmo, afinal sente que o outro é parte, é extensão de si! Por exemplo, certos
pais desvalorizam e desculpabilizam os erros dos filhos como mecanismo de
protecção. Chegam ao ponto de negar a situação de falhas cometidas pelos filhos,
esforçam-se por tapar e esconder as consequências das suas más escolhas porque
olhar para elas funciona como espelho!12
Não adopte a postura “perdido por cem, perdido por mil”, “morra gato, morra farto”,
“quando morrer vou deitado”! – Isso é insensato e pode conduzir a grandes perdas.
Escrever sobre a auto-estima é algo fácil e simultaneamente difícil. Já tanto foi escrito
sobre ela. Todos falam dela, todos reconhecem a sua importância (ou quase todos!),
mas nem todos sabem pô-la em prática, incentivar e estimular. Encontro-me perante
um enorme icebergue.13 Vamos falar dele porque claramente facilita o ser sal e luz do
80
e no mundo. Para tal basear-nos-emos em vários autores (cujos nomes você talvez já
ouviu falar).
Debruçar sobre a auto-estima, neste manual, faz todo o sentido porque quem não se
estima não se afirma equilibradamente. A assertividade está condenada a servir
apenas aqueles que se estimam. Apenas os que se estimam conseguem valorizar os
outros e a si mesmo de forma equilibrada. Apenas os que se estimam conseguem dar
lugar aos outros sem se sentirem humilhados. Apenas esses detêm o equilíbrio entre a
valorização do eu e a valorização do outro.
13Icebergue devido à sua dimensão e porque aquilo que vemos e conhecemos é mínimo comparando com o
que ela (a auto-estima) realmente envolve.
A sua origem está lá atrás. Está na herança emocional transmitida pelos pais, avós,
bisavós, sociedade, comunidade em geral.
Amar-se de forma equilibrada depende de um processo de espelho e aprendizagem.
São os pais (principalmente!) e outros educadores, bem como a sociedade em geral,
que ensinam o menino e a menina a apreciar-se. E quem não se sentiu
suficientemente amado terá dificuldade em demonstrar amor. As pessoas amam
-se quando descobrem que alguém as ama. Se são amados então crescem acreditando
que são dignos de amor, e nesse caso porque não amar-se? Consideram! Quando a
criança olha para os seus pais e para a forma como é tratada retira ilações de qual é o
seu valor: “Se me tratam bem, se ouvem o que eu digo, se deixam de fazer outras
coisas para brincarem comigo então é porque eu tenho valor. Se eu tenho valor então
sou digna e posso amar-me. Sou importante!” Mas se “mal me vêem, se é mais
importante ver televisão do que brincarem comigo, se estão sempre a ralhar e não
reparam no quanto me esforço para agradar, então, talvez, eu não tenha valor. Eu não
sou tão importante!” pensa a criança. O problema aumenta quando ela cresce fixada
nesta crença porque, à medida que amadurece, a mesma tende a cristalizar e aí é cada
vez menos provável que alguém a consiga contradizer.
É triste ver como alguns educadores (inclusive pais) usam o ataque à auto-estima
como forma de controlo do menor, tal como usam o complexo de culpa! Fazem
ataques constantes à criança quer com palavras «és feio porque és um menino
teimoso», «já não gosto mais de ti», quer com actos (virar as costas, apertar o pulso,
empurrar e arrastar o corpo da criança) e atitudes como desviar o olhar reprovando
algo. Estes ataques são feitos porque acredita-se que assim a criança começará a
obedecer, a fazer o que lhe mandam. E com certas crianças esse objectivo até pode
81
ser atingido, começam a obedecer não pela motivação certa, mas porque não querem
ser consideradas feias e precisam de garantir o amor do adulto. Já com outras crianças
tal não sucederá… a revolta tomará o seu lugar e os comportamentos indesejados
assumirão maiores proporções.
Spitz referia que o bebé desembarcava num mundo completamente estranho e que o
seu maior desejo era sentir-se em segurança, em paz e com bem-estar. Este
investigador fez vários estudos sobre as carências afectivas e conseguiu demonstrar
que os recém-nascidos, mesmo quando têm as necessidades básicas preenchidas
(sede, fome e higiene), se não forem reconhecidos/ /amados pela mãe ou um
substituto, tendem a enfraquecer e até a morrer. Parece que a necessidade de nos
sentirmos estimados vem desde muito cedo e é uma necessidade básica, uma vez que
contribui para a sobrevivência psíquica da criança e mais tarde do adulto. O sentir-se
estimado abre portas à auto-estima, o saber-se estimado credibiliza e incentiva o auto-
estimar-se. Tudo começa com a vinculação (vinculação significa apego14 a alguém).
Auto-estima e bem-estar. Qual a relação?
14 Uma relação de apego, de laços fortes, é uma das bases de sobrevivência! É impossível desprezar uma verdadeira relação… ninguém o
faz com consciência.
Entre os 18/20 anos de idade até aos 30 anos o conflito surge entre a necessidade de
intimidade e o medo dela, ou seja entre Intimidade e Isolamento (recordando o que já
anteriormente foi visto). Nesta fase, o adulto procurara estabelecer relações de
82
intimidade com os outros e desenvolver a capacidade para o amor íntimo que é muito
mais do que físico, é emocional, com a partilha de pensamentos e afectos! Nesta
situação surge a inevitável possibilidade de temperar, conservar e iluminar o outro,
bem como deixar-se ser por ele temperado, conservado e iluminado. Ou seja, nesta
fase de desenvolvimento o sujeito poderá desenvolver a noção de amor e filiação
(saudável) ou isolar-se dos outros (patológico). Mas para desenvolver a noção de
amor e filiação precisa de ter aprendido a confiar nos outros, precisa de algum
altruísmo e uma identidade segura. O facto de ter vencido os anteriores conflitos
(referentes às anteriores etapas do desenvolvimento15) permite-lhe superar mais uma
etapa, estabelecendo relações íntimas de verdadeira intimidade.
83
Sabe-se que a percepção de controlo aumenta o bem-estar geral e sedimenta a auto-
estima!
84
obsessivamente à aprovação dos outros, reenvia para a noção de autonomia e para um
saudável funcionamento. O funcionamento pleno só é alcançado quando cada um
encontra o seu próprio sentido de vida e quando cada um se permite a si mesmo
novas experiências, necessárias ao crescimento pessoal. Assim, para Rogers, os
indivíduos com pleno funcionamento têm um autoconceito realista18 e estão
conscientes do seu mundo interior, estão disponíveis a novas experiências e
autoconsideram-se positivamente. Estes indivíduos confiam nas suas experiências
para tomarem decisões e sentem-se livres para as tomar: procuram o crescimento
pessoal e exercitam as suas potencialidades.
18 Observam e aceitam a realidade tal como ela é, impedindo-se a si mesmos de estratégias como a negação da realidade, a repressão, a
racionalização ou mesmo a projecção. Olham para si e nem desvalorizam as suas limitações e falhas e nem sobrevalorizam as suas
capacidades e conquistas. Têm uma percepção real de si.
Uma pessoa com auto-estima estará disponível para, com toda a segurança, afirmar a
sua fé, sem depender da avaliação que sofrerá por parte dos outros, ou da opinião das
massas sociais. Assim, vive plenamente o sentido que encontrou para a sua vida e
nesse sentido procura a santificação baseada na geração de uma nova forma de pensar
e sentir o mundo. Essa pessoa terá um autoconceito realista: sendo capaz de
reconhecer as suas capacidades, reconhece igualmente as suas limitações e falhas,
bem como recorre a estratégias no sentido de se autocorrigir. Fá-lo sem mágoa ou
zanga de si mesmo e com imenso autocuidado. Autocorrige-se com auto-amor.
85
Allport concluiu que um dos sinais da maturidade é a capacidade de o sujeito se auto-
aceitar abrindo portas ao estabelecimento de relações sociais entusiásticas.
Igualmente considerou que a maturidade se encontra interligada com a capacidade de
executar um conjunto de actividades capazes de exercer domínio sobre o ambiente
circundante.
86
aceitação real, não fingida, da outra pessoa. A Psicologia tem descoberto aquilo que
Deus já havia sublinhado: a aceitação dos outros começa na auto-aceitação. Os dois
estão fortemente associados. Jesus igualou estes dois tipos de amor tornando-os
indissociáveis: «Ama o teu próximo como a ti mesmo.»
Na Bíblia encontramos uma história de amizade bastante profunda entre dois jovens:
David e Jónatas. Encontra-se no Primeiro Livro de Samuel, capítulo 18, e relata que
Jónatas (filho do rei Saul) gostava de David (pastor de ovelhas e guerreiro) como de
si mesmo. Não diz que Jónatas substituiu o amor por si mesmo pelo amor a David.
Não. Ele amava David tanto quanto se amava a si mesmo e esse grande carinho por
David só existia porque, igualmente, existia face a si mesmo. Foi esse enorme
autocarinho que abriu portas ao enorme carinho pelo outro. Deus reconhece a
importância da auto-aceitação. Ele sabe como essa auto-aceitação contribui para a
saúde de quem a vive e como a mesma contribui para a saúde de quem a cerca e
observa. Em toda a Bíblia encontra-se a direcção da auto-estima e da auto-aceitação.
O que não se encontra é a aceitação do egoísmo: pensamentos, sentimentos e actos
promotores de doença física, mental e social.
Aceitar algo em nós não é sinónimo de resignação (volto a lembrar). Devemos aceitar
o que somos, com clara consciência do que está adequado com os princípios de Deus
e com clara consciência do que não está bem e precisa de ser mudado. A resignação
impede-nos de melhorar, a aceitação de nós mesmos abre portas ao crescimento
pessoal. Auto-aceitação é sinónimo de amabilidade consciente face a si mesmo. E é
essa amabilidade e autopaciência que impede atitudes autodestrutivas e abre portas à
aceitação consciente dos outros. É a auto-estima que permite a cada sujeito não recear
confrontar-se com os seus erros, assumindo-os conscientemente bem como aceitar
outros, sem preconceitos.
87
Nota: Jónatas era guerreiro e filho do rei. Ele era o príncipe e aparentemente sucessor,
futuro rei. Na sua posição, quer como guerreiro quer como sucessor ao trono, entregar
a capa, a roupa militar, a espada, o arco e o cinturão era sinal de profunda amizade e
admiração por David. Jónatas não estava a humilhar-se (ele sabia que continuaria a
ser o filho do rei – não havia problemas de identidade ou autoconceito!), ele tinha
plena consciência do seu poder e posição real e foi esse pleno autoconhecimento que
o levou a oferecer os seus bens (de protecção e ataque em situação de guerra) a um
pastor e iniciante nas artes bélicas. O segredo é estar cheio de auto-estima e ter
consciência de quem se é (autoconhecimento). Quando se tem plena consciência de
quem se é e quando há auto
-estima, não há receio de dar aos outros porque não se sente estar a perder algo.
Basta-se a si mesmo e reconhece-se que aquilo que se dá não é fundamental para a
manutenção da auto-estima ou sobrevivência psíquica. Na verdade, dá-se ao outro
sem se sentir mais pobre. A baixa auto-estima sugere uma sensação de pobreza
psíquica, carência de afectos e, por isso, quem dá nessas circunstâncias, acaba por
sentir-se mais pobre! De forma a evitar voltar a sentir-se mais pobre começa a
economizar afectos… procura poupar o que dá aos outros porque crê que poupando
evita a crise. Claro que está enganado… porque o segredo é investir!
Igualmente não dá aos outros porque não tem para dar. Na verdade, quem não se
sente amado também tem dificuldade em se amar e nesse caminho tem dificuldade
em amar os outros. É bom recordar que provavelmente o amor é o único “alimento”21
que em excesso não faz mal. E esse alimento é a base do Cristianismo.
88
❏ As relações positivas com os outros relacionam-se com as necessidades sociais,
como a capacidade de amar e estabelecer relações de amizade e intimidade. É na
vivência com o outro que o indivíduo se actualiza (desenvolve e amadurece). A
capacidade de confiar no outro e com ele estabelecer vínculos é sinal de
funcionamento pleno, permitindo outros critérios de saúde como a intimidade, a
responsabilidade e a orientação para o cuidado das gerações futuras.
A satisfação social remete para a noção de relações positivas e satisfatórias (que
satisfazem e que amortizam a frustração), nas quais prevalece o sentir-se estimado, o
apoio informativo (partilha de informações), o acompanhamento nas actividades
diárias e a ajuda física. Este apoio social influencia positivamente a saúde dos
indivíduos envolvidos. E o mais engraçado é que ambos se sentem bem, tanto aquele
que recebe como aquele que dá!
Nos relacionamentos positivos, o sujeito não usa máscaras, assume ser quem é
(porque se estima e se sente estimado!) e aceita naturalmente a outra pessoa. Quem se
auto-estima não necessita de viver em função da avaliação do outro e é nessa
naturalidade que relacionamentos reais e desmascarados acontecem. A possibilidade
de tal liberta os envolvidos e favorece o amor, a amizade e a intimidade real e
completa que permite a partilha de pensamentos e sentimentos assumindo-se o que
verdadeiramente se sente e pensa.
89
Tenho pensado bastante nas palavras de Jesus quando Ele afirmou que mais feliz é
aquele que dá, do que aquele que recebe. Já falámos sobre isso, não é?
90
construção ou destruição. Gosto de reflectir sobre a importância que as Sagradas
Escrituras dão às relações sociais saudáveis nas quais cada um pensa nos outros antes
de pensar em si mesmo. Se cada um pensar primeiro no outro, então todos ocuparão o
primeiro lugar… todos tentarão colocar todos em primeiro lugar… e todos ficarão em
primeiro lugar. Mas se cada um pensar só em si mesmo procurará colocar-se em
primeiro lugar, nem que para isso tenha de derrubar os outros do pódio! O problema é
que ninguém gosta de ser derrubado do pódio, o ser derrubado permite o surgimento
de emoções como a injustiça social, o desejo de vingança, o egoísmo, e por vezes a
clara destruição de quem alto e seguro pensa estar. Assim, a destruição do outro pode
abrir portas à destruição do próprio.
22 Nas pessoas com psicopatia anti-social encontramos uma personalidade cruel (desde a infância), instável e impulsiva associada a vários
delitos graves e por vezes uso e abuso de tóxicos. A sua prevalência é cerca de 3% nos homens e menos de 1% nas mulheres. Quando
adultos, estas pessoas, além de apresentarem dificuldade em aceitar normas sociais, apresentam igualmente muita dificuldade em cumprir
com as obrigações familiares (alimentação, educação e segurança dos filhos) e laborais (faltam ao trabalho sistematicamente e são muitas
vezes despedidas). Também não apresentam qualquer preocupação com a verdade, recorrendo a constantes mentiras e abusando da
confiança dos outros. Para piorar, não têm remorsos e acham que os outros é que estão sempre errados, eles não! (Gonçalves, Rodrigues &
Brazette, 1997).
Além disto, encontra-se, novamente, implícito o tal princípio: “Ao ser correcto com a
outra pessoa não estou apenas a beneficiá
-la, isso é o mínimo! Não estou apenas a dar-lhe uma esmola, a fazer-lhe um favor,
ou a simplesmente humilhar-me!” Na verdade, ao ser correcto com o outro eu ganho
de duas maneiras:
Existem tantas atitudes de boa educação que não custam assim tanto e promovem a
qualidade das relações e da vida, em geral. Vamos ficar apenas com algumas…
91
92
❏ A autonomia remete para a emancipação da pessoa. Remete para a necessidade de
o sujeito se auto-avaliar justamente, não dependendo da avaliação exterior e da
aprovação dos outros. A autonomia sublinha a noção de locus de controlo interno,
condensa a individuação e constitui um critério de saúde mental. Ou seja, ser
autónomo (ainda que todos estejamos, até certo ponto, dependentes uns dos outros)
contribui para a saúde mental. A individuação sublinha um processo através do qual
as partes se diferenciam do todo, sublinha a individualização. Quando somos bebés
não conseguimos ter a percepção da nossa individualidade, sentimos que nós e os
nossos pais somos um. Como se houvesse uma continuidade. O desenvolvimento
neurobiológico e o amadurecimento psíquico ensina que somos pessoas individuais e
nesse caso há um processo em que as partes (eu) se separam do todo (os outros).
Surge a individuação ou individualização. Assim, a autonomia remete para uma
forma de estar saudável própria de um desenvolvimento e amadurecimento esperado.
Claro que, para sobreviver (física e psiquicamente!), enquanto espécie humana,
somos todos dependentes uns dos outros e estamos todos interligados, no entanto, a
autonomia deve ser um bem de cada um.
A autonomia também remete para esta estranha expressão “locus de controlo interno”
e ensina a necessidade de cada um encontrar em si mesmo, e não nos outros, a
responsabilidade e justificações do que lhe acontece na vida. A pessoa com locus de
controlo interno sente-se responsável pelos acontecimentos que norteiam a sua vida,
sente que tem poder para alterar, transformar esses acontecimentos, não se sentindo
vítima dos outros ou do acaso. Estas pessoas assumem posturas mais pró-activas e
com maior relevo, assumem estratégias de actuação e resolução dos problemas, não
se sentindo à mercê da vida ou das escolhas dos outros. Têm a noção de
responsabilidade pessoal (eu assumo a responsabilidade dos meus actos!) necessária à
93
manutenção da saúde e associada ao autocontrolo. Ou seja, quem tem noção de
responsabilidade pessoal mais facilmente assume o controlo da sua vida e empreende
estratégias no sentido de solucionar os problemas com que se depara. Isto é saudável!
No oposto, encontra
-se o “locus de controlo externo”, em que a culpabilização do meio exterior é uma
constante. As pessoas com locus de controlo externo sentem-se vítimas do exterior,
não assumem responsabilidades porque sentem que nada depende delas, não
assumem posturas pró-activas porque a autoconfiança não é grande.
❏ O sentido da vida remete para uma vivência plena na qual o indivíduo sente que é
ele que leva a sua vida e não está a ser levado por ela. Remete para uma vivência com
sentido, com direcção e propósito. Esta vida com sentido relaciona-se com uma
prontidão comportamental na qual o sujeito não tem apenas a intenção de adoptar um
determinado comportamento mas adopta-o de forma pronta (executa-o).
O sentido da vida sublinha a sensação de uma vida com propósitos. Esta forma de
94
viver permite uma maior sensação de segurança porque a pessoa sabe de onde veio e
para onde quer ir. Não anda ao sabor do vento ou da vontade momentânea mas sim de
projectos pensados e mentalmente ensaiados. Quem encontrou um sentido para a sua
vida e definiu um caminho coloca os seus recursos (materiais e psíquicos) na
concretização do mesmo, mostra-se focado ou concentrado em dado objectivo e
dificilmente se perde de si mesmo. As fronteiras da identidade encontram-se mais
definidas! E a sensação de segurança é maior.
❏ Procure uma imagem cuidada – veja-se ao espelho! O que pode ser melhorado?
Falo sim, dos aspectos físicos! Não sou daquelas que acredita que o que conta é só o
interior. Claro que conta e é o mais importante, sem dúvida! Mas se eu olho para o
meu corpo e vejo particularidades que podem ser cuidadas com alguma atenção,
então porque não? Não temos de ser escravos da imagem, não temos que viver em
função dela e nem sacrificar o ordenado em SPA e tratamentos estéticos. Não temos
de ser escravos de dietas e regimes alimentares que são apenas sacrifícios e em nada
contribuem para a nossa felicidade e bem-estar. Mas há pequenos gestos, realistas,
que permitem melhorar a imagem e isso não pode ser descuidado. A higiene do corpo
e da roupa, a alimentação saudável, o exercício físico e outros cuidados podem ajudá-
lo a alcançar uma imagem mais cuidada e valorizada por si. Força, vá em frente!
Cuide da sua imagem sem se sentir culpado ou escravo. A auto-estima assenta nos
factos. E se os factos dizem que o nosso odor não é dos melhores, que há muita
gordurinha a sair pela roupa fora, que os cabelos estão espigados, as borbulhas e
pontos negros marcam as bochechas e o nariz e que os dentes estão amarelados, então
é difícil sorrir perante esta imagem! Claramente você pode e deve fazer mudanças
pela sua imagem, pela sua auto
-estima e pela sua saúde em geral (física e emocional).
95
❏ Recompense-se pelas vitórias alcançadas – porque não? Se finalmente alcançou
uma vitória dê uma recompensa a si mesmo. Mostre carinho e apreço por si: pelo
esforço dispendido, pela determinação e por ter vencido. Não precisa de gastar rios de
dinheiro e nem precisa de se recompensar materialmente. Tenha imaginação! Pense
no que gosta e que esteve impedido de fazer enquanto esteve em maratona e faça-o!
❏ No final de cada dia elabore uma lista do que fez bem feito
– esta lista permite consciencializar-se dos seus feitos. Quem tem baixa auto-estima
esquece-se facilmente dos seus feitos. Então, registe e recorde o que correu bem e o
que o orgulha em si mesmo. Essa lista é positiva no presente e, em tempos de crise,
ajudá-lo-á a subsistir. Não falo de vanglória, isso é artificial! Falo de uma auto-
avaliação realista e que não receia admitir as qualidades. Falo de uma postura
equilibrada perante o eu, capaz não só de se autocorrigir mas também capaz de se
autofelicitar.
❏ Igualmente faça uma lista do que correu menos bem e como pretende fazer no
futuro de forma a acertar o alvo. É possível aprender com os erros e as falhas, e a sua
substituição por comportamentos mais certos facilita a saúde pois impede as auto-
recriminações – claramente é desajustado amar o que está incorrecto. O que está
incorrecto e precisa de correcção deve ser corrigido. Se você não consegue amar os
seus defeitos está no caminho do bem e da saúde mental! Quem ama os defeitos não
muda para melhor. Subsiste no erro magoando os que estão à sua volta e magoando-
se também, para além de ser um amor com bases frágeis. Assim, altere o que deve
alterar, redefina as suas reacções e comportamentos. Peça ajuda terapêutica se
precisar e proceda à mudança. O amor não pode ser cego, nem quando é por nós
mesmos!
96
soluções, vou lutar, para adaptar-me”. A adaptação não é ao problema, é à solução do
problema com tudo o que isso implica.
23 Já estamos cansados de relembrar isto, não é?
A propósito do realismo, por vezes deseja-se acreditar em algo que efectivamente não
existe e força-se a realidade como que forçando a mentira a tornar-se verdadeira.24
Isto acontece com algumas pseudo-relações amorosas. Dizem-se mentiras ao próprio
e crê-se numa relação que, muitas vezes, não é partilhada pelo outro lado. Alguns
chegam ao ponto de manipular a verdade de forma a confundir o outro (e por vezes
ele quase acredita que também está apaixonado ou poderá vir a ficar). Às tantas ficam
todos enrolados numa rede de mentira marcada por uma pseudo-relação, na qual mais
do que a verdade há um prevalecer do desejo. Cuidado! O que é mentira, é mentira!
24 Como se isso fosse possível!
Voltando à auto-estima, as suas vantagens são imensas. Uma delas prende-se com a
atracção que exerce sobre os outros. A auto-estima atrai os outros, todos se sentem
atraídos pelos assertivos porque manifestam elevadas expectativas concretas e
positivas sobre o seu progresso futuro. E, claramente, quem tem expectativas
positivas mais facilmente atinge o sucesso, em comparação com quem tem
expectativas negativas.
97
Eventualmente, poderão surgir alguns problemas a serem reparados na auto-estima.
Eles são:
❏ Presunção ou exagero dos sucessos – há uma sobrevalorização dos feitos bem
conseguidos.
98
7. O estilo (de comunicação e relação)
assertivo ou auto-afirmativo
«Qualquer um pode zangar-se – isso é fácil. Mas zangar-se com a pessoa certa, na
medida certa, na hora certa, pelo motivo certo e da maneira certa – não é fácil.»
ar i s t ó t e l e s in Ética a Nicômaco
Na comunicação e relação assertiva o sujeito aceita debater ideias, não impõe as suas
a ninguém nem segue as dos outros sem, previamente, reflectir. Ele assiste e estimula
o grupo, promove a amizade e o bom relacionamento, é espontâneo, franco e cordial.
Transmite segurança aos outros e é naturalmente respeitado. Enquanto líderes, estes
sujeitos tendem a influenciar os outros através da comunicação aberta e do diálogo
sincero.
Mas porquê desenvolver este estilo? Porque ao desenvolvê-lo permite-se que todos
ganhem:
99
satisfação. Permite-lhe ganhar confiança no exterior e deixar-se por ele influenciar,
mudar, crescer. Permite
-lhe descentralizar-se de si mesmo e olhar para os outros numa posição altruísta.
1
Este apreciar é um apreciar no sentido em que não se desvaloriza a forma de estar do outro, respeita-se. No entanto é, igualmente, alvo de
ponderação: verifica-se se o pensamento, o sentimento e a acção do outro está em concordância com os valores do eu. Adopta-se o que vem
do outro apenas se se considerar que é adequado e saudável para o eu. O ser esponja em todas as situações, o absorver tudo sem previamente
analisar pode intoxicar e destruir o eu. Antes de absorver o que vem de fora, convém avaliar.
■ O outro ganha no relacionamento com os outros: porque faz aos outros o que lhe
fizeram. Ao sentir-se aceite e respeitado no que pensa, sente e como age, tenderá a
fazer o mesmo aos outros. Tenderá a ser mais tolerante com os outros.
E será que não é isto que Deus quer? Que se construam relações autênticas, livres de
máscaras e repletas de segurança, sem receio de ser criticado e desprezado por se ser
quem é? São essas relações autênticas que levam a ter a confiança necessária para
mudar, levam a “baixar as armas” e permitir que o outro influencie positivamente o
eu. Aí são construídas e mantidas as pontes entre ilhas anteriormente isoladas.
Como já vimos, a zanga pode e deve ser expressa numa atitude assertiva. Claro que
para que tal aconteça alguns requisitos precisam de ser cumpridos, como a
capacidade psíquica de localizar o objecto de zanga, circunscrever a razão objectiva
da zanga, determinar a quantidade de zanga, encontrar a altura certa para a manifestar
e colocar em prática a forma adequada de a manifestar.
100
❏ Determine a quantidade de zanga – a zanga que você sente está proporcionada ao
que realmente a provocou? Não está a transformar um mosquito num abutre? A
tendência é para dizermos que não estamos a transformar mosquitos em abutres! E
quanto mais zangados maior a possibilidade de não conseguirmos admitir uma
proporcionada quantidade de zanga.
Você é assertivo?
101
Atribua uma pontuação a cada afirmação usando a seguinte escala:
102
Agora que já reflectiu sobre si mesmo e sobre as bases da sua forma de pensar, sentir
e agir, agora que já se compreende um pouco melhor (e os outros!), talvez possa
começar a pensar sobre a mudança efectiva. Mudança do que está menos bem.
Vamos continuar a viagem?
103
8. Como desenvolver a assertividade,
como ser sal e luz?
Como sabe, a personalidade não pode ser alterada. Na verdade, ela forma-se durante a
infância solidificando-se até ao princípio da vida adulta, pelo que na vida adulta se
fala apenas no “limar determinadas arestas”. Assim, enquanto adulto é apenas
possível actualizar convicções, atitudes e comportamentos, propósitos, expectativas e
a forma de comunicar consigo mesmo e com o exterior. Nesse “limar arestas” precisa
ajustar a maneira como pensa e sente o mundo1, bem como as acções e reacções
perante ele.
Há quem diga que tudo começa no pensamento, no que se pensa e acredita. Sendo
assim, a mudança também deve começar por aí… enquanto você pensar agressiva ou
passivamente comportar-se-á enquanto tal. Ser assertivo requer questionar e
actualizar o que pensa sobre si mesmo (e de que forma pensa), sobre os outros e sobre
a vida em geral. Os pensamentos são as suas convicções e crenças mais profundas,
são as suas expectativas (o que espera de si, dos outros e da vida) e são as suas
normas morais e de conduta (aquilo que permite e o que não permite). Os
pensamentos antecedem os sentimentos e ambos contribuem para a acção ou reacção.
As expectativas sobre si mesmo, sobre os outros ou sobre a vida em geral têm o poder
de influenciar (positiva ou negativamente) o seu futuro. Daí ser importante vigiar o
104
pensamento. Se crê que grandes coisas poderão acontecer, inconscientemente
começará a desenvolver estratégias para que tal suceda. Mas se crê que o futuro não
será favorável também acontece contribuir para tal. Este processo de realização de
autoprofecias não é sobrenatural, é algo natural e logicamente explicável. As
expectativas condicionam as emoções e a acção do sujeito, levando-o a determinado
caminho (escolhas e acções). Pode transmitir essas expectativas aos outros sem dar
por isso, através da expressão corporal, facial, palavras e comportamentos e
consequentemente, muitas vezes, condiciona e influencia o que recebe deles. Incrível
como se diz tanto sem falar e como os outros entendem o que realmente é
comunicado, mesmo quando não se deseja!
Isto significa que a assertividade surge naturalmente se acreditar nela. Se você pensa
agressivamente é possível transmitir uma mensagem dupla em alturas que deseja ser
assertivo. É importante começar por corrigir a sua forma de pensar, daí este manual
sublinhar tanto a auto-reflexão. A auto-reflexão permite questionar os constructos
mentais que alicerçam o eu e ao questioná-los é possível substituir alguns por outros
mais adaptados. A capacidade de auto-reflexão é sinal de maturidade e inteligência
emocional.
❏ Desenvolva uma consciência do que realmente pensa. Crie um diário com os seus
pensamentos, escreva o que crê. Não negue a si mesmo a sua verdade e pense sobre
esses pensamentos. É tão fácil enganarmo-nos a nós mesmos escondendo certas
verdades! Veja a sua veracidade, questione o que pensa, oiça outras formas de pensar
e aumente o seu autoconhecimento.2 Conheça o que pensa bem e o que pensa e deve
ser questionado. Muitas vezes só se toma consciência das verdadeiras e mais
profundas crenças em alturas de crise. Não espere por uma para aumentar o seu
autoconhecimento. Claro que muito só conhecerá em altura de tempestade, mas muito
pode conhecer antes!
2 Ao tomar contacto com outras formas de pensar, muitas vezes toma-se consciência da própria! Relembre que todos somos espelhos uns
dos outros. Quando você ouve outros a falar sobre eles mesmos, pode rever-se neles (toma consciência do que eu sou!) mas, igualmente,
pode não se rever neles (e toma consciência do que eu não sou). Ambos são positivos!
105
No fundo, o que se quer dizer é que é importante o diálogo interno (que é aquilo que
você diz a si mesmo). Quanto mais marcado pela expectativa positiva e realista for,
maior a probabilidade de você ser assertivo. Se por outro lado o seu pensamento for
marcado pela confusão ou pelo desespero fará nó. E alguns de nós não os
conseguimos desatar sozinhos. Precisamos de orientação, até à libertação!
A verdadeira mudança normalmente começa de dentro para fora (claro que após um
impulso muitas vezes exterior). Mas começa no que se pensa e no que se espera.
106
desânimo aprendida e memorizada sentir-se-á desanimada quer perca o último
autocarro para casa, quer apanhe uma maravilhosa boleia até à porta do destino. Quer
o dia corra bem, quer corra mal, o desalento está presente. Não falo das emoções que
surgem como consequência de uma perturbação do humor, como a tristeza profunda
da depressão ou a fobia/medo extremo da ansiedade, apesar de muitas destas também
estarem relacionadas com a aprendizagem emocional. Falo daquelas emoções que nos
acompanham quase diariamente, com ou sem justificação para a sua ocorrência.
Conhece alguém que se sinta quase sempre triste, ansioso ou preocupado ou mesmo
alegre, independentemente das situações que esteja a viver? Essas pessoas estão tão
habituadas a sentir de determinada forma que, por vezes, não sabem sentir de forma
diferente. Se forem questionadas quanto à legitimidade e adaptabilidade desses
sentimentos, sentem o chão tremer e preferem permanecer como estão. Realmente
mudar dá trabalho e por vezes prefere-se ficar como se está, sentir o que já
habitualmente se sente, pelo menos é familiar e com isso já se sabe lidar!3
3 Ou pensa-se que se sabe!
107
Sabe-se que a aprendizagem nunca termina. Ainda hoje, em adultos, pode-se
continuar a sentir da forma aprendida no passado, ou pode-se aprender outras formas.
Assim acentuo o que Lloyd (1999) já afirmou: «As emoções são uma escolha!»
Enquanto adulto, você pode escolher continuar a sentir o que sente e como sente, ou
pode escolher a revolução e mudar o que está menos bem. É você que escolhe
continuar a sentir ódio, inveja, rancor, desconfiança ou questionar tudo isto e passar a
uma reorganização da sua vida interior. Tudo começa com o diálogo interior, aquilo
que diz a si sublinha o que sente. Se não tem consciência do que diz a si, faça um
registo (de pensamentos e emoções consequentes) durante uma semana, volto a
repetir! No final da semana ficará a conhecer o que normalmente caracteriza o seu
diálogo interior e se é saudável ou patogénico.
Outro aspecto da gestão das emoções é perceber o seguinte: ninguém deve ter mais
poder para controlar o que você sente do que você mesmo. Isto significa que cada um
é responsável pelo que sente. Você escolhe o que sente e os outros também têm essa
possibilidade. Quando se compreende este princípio percebe-se que não há porque
culpar os outros pelo que se sente ou pela forma como se reage. Claro que o outro
pode influenciar os seus sentimentos, mas só controlará a sua vida afectiva se você
lhe der poder para tal!
108
Nestes casos tende-se a ficar encolerizado se alguém sugere o autodomínio e defende-
se que é importante ser espontâneo, livre e deitar tudo cá para fora, doe a quem doer!
Quem defende esta posição pensa que isso é ser saudável4 e que nesses momentos é
livre e pode sentir, agir e reagir impulsivamente. Mas isso, na verdade, não é
liberdade, porque nesses casos a pessoa está, quase sempre, a reagir em consequência
de um dado acontecimento exterior (algo que lhe foi dito ou feito). Na verdade, está a
dar o poder aos outros, a perder o senhorio sobre a sua própria pessoa. E isso não é
liberdade… é exactamente perda da liberdade. Na assertividade é o próprio que
comanda o próprio e não permite que a sua forma de sentir e agir sejam determinadas
pelo exterior, pelo que lhe fizeram ou disseram. Já estamos a falar dos
comportamentos porque os mesmos alimentam os sentimentos, é como uma
pescadinha de rabo na boca! Os comportamentos advêm de prévios sentimentos e
acabam por reforçar outros futuros com a mesma origem.
4 Já vimos que não é saudável.
Na verdade você tem liberdade para se sentir triste, zangado, irado, irritado, como já
estamos cansados de saber! Tudo é possível. O grande passo está em determinar o
que fazer com esse sentimento inicial… alimentá-lo e descontrolar por conta dele, ou
digeri-lo e exercer o autodomínio? Você pode chegar perto do chefe e dizer que
determinada situação o entristeceu… mas como o diz? Está autocontrolado ou está
completamente dominado pelo sentimento?
109
controlado. Vamos ver!
110
Na assertividade os sentimentos são expressos, ainda que com autodomínio. É
pressuposto afirmar o que se sente, o que não é pressuposto é fazê-lo
descontroladamente. Assim:
❏ Tome consciência do que realmente sente – não do que gostaria de estar a sentir
ou do que “viu” alguém sentir numa situação parecida com a que está a viver, não
confunda sentimentos ou formas de sentir.
❏ Procure perceber qual a raiz do que sente – aprendeu a sentir assim, com quem e
em que situações? É recorrente o que está a sentir?
❏ Defina qual o diálogo interior que está a alimentar esse sentir – o que está a dizer
a si mesmo que leva a continuar a sentir dessa forma?
❏ É necessário alterar o que sente? Se sim, comece por alterar o diálogo interior. Se
não consegue sozinho e precisa de ajuda, peça, pela sua saúde.
Se não tem um claro conhecimento do que sente, tem de parar enquanto sente e
questionar o que sente. Pergunte-se a si mesmo «estou mesmo furioso ou triste com o
que me fizeram?», «o que sinto é irritação ou insegurança?», «estou mesmo feliz ou
estou apenas maníaco para, no fundo, esconder o meu medo?» Isto é diálogo interior
capaz de evitar a confusão de sentimentos. Toda esta confusão e dificuldade de
perceber e gerir as emoções denomina-se de analfabetismo emocional. O facto de
estar alfabetizado na ciência da escrita e dos números não garante um quociente
emocional (QE) satisfatório. O ensino do alfabeto dos sentimentos tem sido,
111
infelizmente, negligenciado.
Honesta – use honestidade consigo e com os outros. Não dissimule nem mascare os
verdadeiros e conscientes pensamentos e sentimentos. Conheça-se e não se esconda
atrás do “não quero magoar ninguém”. Todos beneficiam com a honestidade. Claro
que magoar os outros não deve ser um objectivo a atingir, a assertividade baseia-se
tanto na auto-afirmação como na valorização dos outros.
❏ Ex: «Eu fico triste e com vontade de me ir embora quando sinto agressividade nas
tuas palavras.»
Directa – use direcção, afirme numa direcção segura. Diga o que tem a dizer sem
tornear ou escamotear. Se não afirmar o que tem a afirmar de forma directa estará a
dar hipótese ao outro para interpretar o que você quer dizer, à sua maneira. E as
interpretações podem não corresponder exactamente ao que quis sublinhar,
aumentando a possibilidade de posterior erro.
112
trabalho.»
Realista – use realismo, não exagere no que tem para dizer e nem retire o seu
impacto quando pensar que este será grande sobre os outros. Até pode não ser!
Igualmente seja preciso e objectivo a comunicar desejos e expectativas. Baseie-se na
verdade e no realismo.
❏ Ex: «Este penteado não está ao meu gosto, prefiro o risco ao lado.»
Respeitosa – use respeito para consigo (não se ofenda e nem permita sentir-se
ofendido por alguém) e respeito para com os outros (se ofender os outros surgirão
más consequências para eles e para si mesmo).
❏ Ex: «Eu gostaria de ler o livro sem ser constantemente interrompido, por favor.»
Ser directo com as outras pessoas e honesto não é necessariamente falta de educação.
Realmente certas pessoas foram educadas a pensar que sim, mas não é sinal de
113
desrespeito. Falar directamente facilita a comunicação, porque apoia-se na verdade
sem dar espaço para possíveis interpretações que só confundem e se distanciam da
mensagem real. O querer ser tão cauteloso acaba por impedir a transmissão do que
realmente se pretende afirmar, confundindo os receptores. Igualmente propicia a
perda de objectividade.
O que diz aos outros é sempre acompanhado da forma como o diz: é a sua linguagem
corporal! O tom de voz, o volume, a entoação dada a certas palavras, o ritmo, o olhar
nos olhos, a expressão da sua face, os gestos das mãos, a postura do corpo, a tensão
muscular, o ruborizar, a forma de vestir, a higiene pessoal, enfim, tudo comunica…
É impossível ter total controlo sobre a linguagem não verbal. No entanto, há aspectos
que podem ser trabalhados e refinados, com tempo, claro.
Este manual pretende apenas alertar para alguns aspectos considerados fundamentais.
Procure ter atenção ao que transmite sem falar pois a linguagem dupla confunde e
compromete a relação.
114
Como não se consegue mudar a personalidade, admitem-se vários tipos de
assertividade.
Alguns de nós tenderão a afirmar-se de determinada forma e outros tenderão a
apresentar outras estratégias de auto-afirmação. Vamos ver cada um dos tipos de
assertividade conhecidos:
115
É importante acrescentar que, por vezes, se adoptam estilos assertivos diferentes
consoante as situações, ainda que um deles prevaleça em detrimento dos outros.
Como exemplo, certas pessoas poderão adoptar uma postura mais calorosa em
ambiente doméstico e no local de trabalho serem mais guias ou analíticas, ainda que
possam ser essencialmente calorosas. No entanto, seja qual for o contexto, quando
você pensa e sente assertivamente, age assertivamente!
116
problema tende a pensar apenas no problema, deixando-se controlar e, por vezes,
afundar nele. Quando gravita em torno de si, num movimento introspectivo, o que
acontece é a possibilidade de você ponderar as suas soluções para o problema. Quem
pensa só no problema pode até conseguir resolvê-lo, mas será numa posição
distanciada de si mesmo, porque não se tem em conta (esquecendo-se de si mesmo e,
por vezes desumanizando a solução encontrada). Nestas situações, emocionalmente
fica mais debilitado em consequência do distanciamento de si. Quem se concentra em
si recorda os seus propósitos para a sua vida, os seus desejos, os caminhos que quer e
como quer trilhar e nessa auto-reflexão encontra a solução que mais se adequa a si e
que permitirá resolver o problema satisfatória e assertivamente. Não é sensato perder
o contacto com o eu pois arrisca-se a perder-se de si. Assim, considero que devemos
estar concentrados na resolução dos problemas e nas tarefas a executar para tal sem
descurar, no entanto, os próprios princípios, valores e objectivos de vida. Isto para
podermos continuar a ser fiéis a nós mesmos, continuando a sentir a sensação de
integração egoica!
❏ 1.º – De dentro para fora – saio de mim para ouvir os conselhos e opiniões sobre
determinado assunto, mas não fico por aí… ❏ 2.º – De fora para dentro –…
regresso a mim mesmo, pondero todos os conselhos e decido o meu caminho.
Muitas vezes não se sai de si para ouvir os outros, porque se receia perder e esquecer
o caminho de regresso ao eu e, numa atitude de protecção da identidade5 e da
liberdade de decisão, prefere-se não ouvir os outros. É a insegurança que leva a
deixar de pedir, ouvir e ponderar os conselhos. Outras vezes é a arrogância e a
confiança exagerada em nós mesmos que leva ao desprezo do que os outros têm para
dizer. Em ambas as situações a possibilidade de errar o alvo constitui zona de perigo.
Até os reis têm conselheiros escolhidos… escolha os seus!
5 Pensamos nós que estamos a proteger o eu e a afirmar o direito à autodeterminação!
117
118
9. Inicie a mudança!
Qualquer mudança representa um desafio e um risco. Daí tantos optarem por
continuar como estão, pelo menos já lhes é familiar! Ter medo do risco e do
desconhecido impede a mudança e, efectivamente, muitos acabam por abandonar
planos psicoterapêuticos exactamente porque ponderam o risco de mudar e decidem
não o correr. E além de ser um risco, dá muito trabalho! Não é fácil reorganizar as
crenças sobre o mundo e a forma de o sentir, na verdade é difícil e trabalhoso
proceder à limpeza e arrumação da casa interior. Para mudar, inclusivamente, muitos
recursos têm de ser canalizados. Quem está a procurar alterar algo em si, quem está a
treinar a assertividade, precisa de canalizar os seus esforços nesse sentido, precisa
despender mais tempo a olhar para dentro (e por vezes encontra coisas que frustram!)
e a olhar para os efeitos do seu comportamento no exterior. Ou seja, precisa de estar
muito mais alerta, o que constitui uma tarefa exigente.
Para que uma mudança seja possível e efectiva, alguns critérios precisam de estar
preenchidos… vamos ver quais:
1 – Se não se sentir seguro para a mudança o mais provável é ela não ocorrer, ou
ocorrer por um curto período de tempo (e neste caso não é uma clara mudança!) – a
sensação de insegurança surge porque mudar envolve sempre algum receio, por vezes
difícil de explicar e identificar, é vago e desconcertante. Mudar significa colocar em
causa toda a anterior construção do real, como se tivesse pintado uma tela e fosse,
agora, necessário repintar com outras cores. Reconstruir exige confiança e segurança
de que a próxima construção será melhor do que a actual. Ninguém destrói
deliberadamente uma casa se não tiver alguma confiança de que conseguirá construir
uma nova mais segura e que ofereça maior protecção contra a chuva, o vento, o frio e
o calor… e contra os ladrões! O mesmo acontece com o mundo interior. Os
sentimentos e pensamentos são a casa interior porque é neles que nos refugiamos e
encontramos alguma protecção.1 Claro que qualquer um, na sua plena consciência, só
se disponibilizará para mudar se tiver a certeza de que os próximos são mais
adequados. Assim, se tem consciência de que precisa de mudar a sua forma de pensar
sobre a vida, a forma como a sente ou como se comporta perante ela…
❏ … escolha uma altura propícia, uma altura em que se sinta mais seguro e confiante
e prepare-se para o abanão de alguns alicerces. Não serão todos, mas alguns
provavelmente serão bem questionados! E isso se não dói pelo menos cria algum
mal-estar, ainda que temporariamente;
119
1 Por vezes!
2 Há mudanças que sucedem sem se ter uma real consciência delas… por vezes só no final do plano terapêutico é que se sente diferença e se
verifica que o comportamento, as atitudes, as reacções até mudaram, para surpresa! E engraçado porque, por vezes, nem se sabe ao certo
quando ocorreram as mudanças ou o que efectivamente proporcionou essa mudança, sabe-se apenas que resultou de um processo contínuo.
2 – Verifique se quer mesmo mudar. O que ganha com essa mudança? E o que perde?
Ganha mais ou perde mais? Se quer mudar então assegure-se de que tem
consentimento (carta branca, luz verde!) para tal. Permita-se a si mesmo o
crescimento pessoal. E se possível converse com alguém (familiar ou amigo) sobre o
que quer mudar, verifique qual a sua opinião sobre essa mudança e veja se tem o seu
apoio. Engraçado porque nestas questões o apoio de algum amigo ou familiar é
importante para cristalizar a mudança. Se você for casado o aplauso e a ajuda do seu
cônjuge serão determinantes. Claro que não precisa do apoio de todas as pessoas
significativas da sua vida. Mas se tiver o apoio daquelas que mais contactam consigo
será mais compreendido, as pessoas serão mais tolerantes e pacientes consigo,
exercerão uma pressão mais adequada e o reforço positivo3 estará mais presente.
Igualmente, de uma forma amorosa, poderão corrigi-lo4 quando não estiver a acertar
o alvo! Assim…
❏ … tome atenção à opinião de quem ama e de quem você sabe que o ama. Estão em
sintonia consigo? Se não estiverem converse com eles e explique o que se passa: o
que quer mudar e o que está a fazer para o conseguir. Peça o seu apoio.
3 É o aplaudir as suas vitórias. 4 Espero, eu!
3 – Não se esqueça que mudar não acontece da noite para o dia, é um processo activo
(feito de avanços e recuos) e demorado no tempo. Qual a sua idade? A sua idade é o
tempo que provavelmente precisou para ficar como é hoje. Mudar essa estrutura não
será tão longo no tempo mas também não é de ontem para hoje! Tenha paciência,
principalmente consigo. Não se esqueça que a assertividade resulta de um processo
em que por vezes se avança a vapor e outras vezes se recua ligeiramente. O problema
não é recuar, o problema é não entender o que correu mal, porque se recuou. As
quedas, os recuos, podem ser pedagógicos no sentido de ensinarem sempre algo mais
sobre si. Assim…
❏ …mude um aspecto de cada vez e comece pelo que considera mais simples e fácil,
avançando para o mais complexo e difícil.
❏ Defina contextos onde pode treinar (ex: em casa ou no trabalho), em que relações
ou com que pessoas;
120
❏ permita-se a cometer erros! E aprenda algo com eles... ❏ ... e pratique!
Isto é assertividade assente numa forma de pensar, sentir e actuar directa e honesta. É
um estilo de comunicação e de relação baseado num profundo respeito por si e pelos
outros. O objectivo é que todos ganhem e por isso contempla a capacidade para
negociar e reavaliar as suas posições. Esta postura favorece o sucesso baseado em
relacionamentos verdadeiros e não retaliados.
121
10. Previna a recaída
O estilo de comunicação assertivo e o tipo de relacionamento interpessoal baseado na
auto-afirmação saudável dependem de uma escolha sua (dependem, igualmente, da
escolha da pessoa com quem você se relaciona, mas tendo em conta que esse aspecto
não pode ser por si dirigido pense agora no que você consegue controlar: você
mesmo). É você quem escolhe, diariamente, ser assertivo! E as vitórias alcançadas ao
longo do processo devem ser vigiadas de forma a não se perderem. É como
conquistar uma cidade… depois da conquista os muros devem continuar a ser
vigiados! É neste sentido que a prevenção da recaída passa por uma atitude contínua e
atenta. A grande questão que se coloca é como prevenir recaídas. Quero deixar
algumas dicas:
1.
2.
3.
4.
122
-se? Dissemos que a identidade de cada um surge no relacionamento íntimo com
alguém (em primeira análise com os pais), e é através do processo de identificação
que nos tornamos parecidos com eles. Partindo desta verdade gostaria de reflectir
consigo sobre a identidade cristã! A identidade cristã é claramente assertiva!
A assertividade cristã
Após receber o convite de Deus para com Ele conviver e depois de você abrir a porta
da sua vida, Ele seguramente entra e, se você deixar, ficará consigo. Deus promete
não lançar fora quem O recebe e promete fazer morada nessa vida. Este convite surge
quando um de nós percebe como tem estado errado longe de Deus e que a sua vida,
sem Ele, não tem sentido, quando se arrepende e pede perdão pela distância existente
entre o Pai amoroso e um filho altamente amado. E quando O convida a entrar algo
de muito poderoso começa a acontecer: a convivência diária permite a identificação
com Cristo. Deixamos de ser nós e começamos a adoptar as características de Deus.
Dá-se um processo de identificação no qual dia-a-dia (quer pela leitura da Sua
Palavra, quer pela oração e convívio com outros cristãos) as nossas próprias
características são naturalmente substituídas pelas características de Deus. É o
processo de santificação!
E esta realidade coloca-nos perante uma verdade: Deus tem uma identidade e deseja
que todos os Seus filhos se assemelhem a Ele! Deus deseja relacionar-Se intimamente
com cada um de nós, permitindo que nos identifiquemos com Ele. Claro que este
processo de identificação com o Criador só surge com a convivência diária, aí não
somos estranhos mas filhos e amigos de Deus.
Você não surgiu neste mundo por acaso! Nenhum de nós é um acidente! Todos fomos
criados à Sua imagem e semelhança, não para nós mesmos, mas para a Sua glória! A
Bíblia ensina que tudo começa e tudo acaba n’Ele, por Ele e para Ele foram criadas
todas as coisas e só n'Ele encontramos a razão da nossa existência.
123
-se autocentradas, egoístas e geradoras de mal-estar. É apenas olhando para os pais e
demais seres humanos que desenvolvem uma identidade socialmente tolerada. Nós
também devemos olhar para o Pai e evitar a atitude autocentrada!
Ainda antes de sermos concebidos pelos nossos pais já Deus nos havia planeado.
Somos parte do Seu propósito e estamos aqui com o objectivo de O adorar. A nossa
identidade passa por sermos verdadeiros adoradores! Passa por sermos eternos, como
o Pai o é! Passa por vivermos cada dia nesta terra não como se fossemos viver nela
eternamente, mas com plena consciência de que aqui os nossos dias estão contados,
pelo que cada um deles é mais uma oportunidade para O servir. A nossa identidade
passa pela convicção de que a eternidade é para ser vivida junto a Deus!
Conhecer Deus faz todo o sentido para cada um de nós! É no conhecimento do que
Ele é e deseja que nos assemelhamos a Ele! O nosso Deus é assertivo em toda a Sua
essência e no contacto diário com Ele tornamo-nos tal como Ele. Neste
relacionamento diário surge uma amizade entre nós e Deus que naturalmente acaba
por inundar todos os outros relacionamentos: o relacionamento com Deus marca
todos os outros com o amor. E o amor é assertividade! A comunhão verdadeira surge
quando somos assertivos: quando afirmamos o que pensamos e sentimos e quando
somos transparentes nas nossa acções! E apenas conseguimos sê-lo porque exercemos
compreensão, perdão e expectativas realistas face a cada pessoa. É conseguida apenas
quando há compromisso e responsabilidade, sinceridade, cortesia e sigilo, quando há
uma gestão adequada dos conflitos e a humildade (que é pensar menos em nós
mesmos e não menos de nós mesmos).
124
com um propósito, um objectivo, uma missão dada por Deus! A missão de cada um é
descobrir os seus dons e talentos e usá-los em prol da glória de Deus e do bem-estar
da humanidade. Cada um de nós tem talentos, capacidades, atributos que precisa de
descobrir e exercitar! Deus jamais pede que façamos algo que não conseguimos
fazer! Todos estamos dotados de capacidades… a missão de cada um é pôr em
prática! Apenas pessoas seguras quanto ao seu valor e identidade aceitam servir!
Todos os outros querem ser servidos!
É neste contexto de identidade cristã que surge um estilo de vida sereno ainda que,
por vezes, no meio de tempestades! Um estilo de vida baseado em caminhos dignos
de confiança: são os pastos verdejantes e os mananciais de água cristalina. É o Bom
Pastor que guia o Seu rebanho provendo tudo o que é necessário, por trilhos
conhecidos por Ele e em contínuo afecto capaz de preencher a vida e recrear a alma.
Deus tem vários nomes que, originalmente, apontam para a Sua identidade. Cada
nome de Deus faz referência ao que Ele é! Vamos ver alguns desses nomes:
– Jeová Rohi aponta para a ideia “O Senhor é o meu pastor”. O pastor que alimenta,
que guia e cuida de cada ovelha, advertindo face aos perigos. É o pastor presente na
vida de cada ovelha, que reconhece cada uma delas e que nota a sua ausência quando
esta se afasta. Quer você queira aceitar este Deus, quer decida rejeitá-l'O, Deus ama-
o! Deus é o Pastor que deseja cuidar de si: deseja ouvir os seus lamentos, saciar as
suas necessidades e caminhar consigo.
Este traço característico de Deus reenvia para a nossa natureza social: interessamo-
nos uns pelos outros, desejamos cuidar uns dos outros. Estar apenas concentrados em
nós mesmos em atitudes repetidas de autocuidado esvazia a vida. Somos espelhos uns
dos outros e necessitamos de pastorear uns aos outros para que a vida ganhe sabor a
sal e permaneça iluminada! Jeová-Rohi relembra a nossa natureza altruísta, pois
fomos criados à imagem do Bom Pastor. Pastoreando com amor, seguindo o Seu
exemplo, permite-nos encontrar satisfação, pois entramos em concordância com a
natureza de Deus, que também é parte do que somos.
– Jeová Jireh aponta para a ideia de que nada nos faltará! É Deus que supre as
necessidades. É o Deus atento e que no Seu poder tudo coloca ao dispor do Seu
rebanho. É o Deus que está tão disponível para ouvir e saciar que muitas vezes não
“entende” o porquê de irmos a outras fontes buscar consolo. Fontes limitadas e
muitas vezes erradas e contra a Sua vontade. Porquê ir a menores se pode ir
directamente ao Trono de Deus? Vá! Certamente será bem recebido!
125
É o Deus Jeová-Jireh que tudo supre! E na verdade, fora d’Ele apenas encontraremos
formas falsas de satisfação. Este Deus é o próprio pasto! Ele é o Pastor que nos guia
pelo Caminho certo, pelo pasto certo e que é Ele mesmo! Porque não só de pão
material viverá o Homem, mas também do pão espiritual que é o próprio Deus.
Jeová-Jireh recorda que Ele tudo supre, em si mesmo, pois apenas Ele é o pasto mais
verdejante que qualquer ovelha pode encontrar e nele saciar-se. Ele é o Pastor, Ele é o
Caminho, Ele é o Pasto e Ele é o Pão da Vida. E todo aquele que com Ele andar,
certamente viverá e do seu interior correrão rios de água viva! Essa água provém da
fonte que é Jesus!
– Jeová Shalom significa que Deus é paz. Ele, simplesmente, é paz, harmonia e bem-
estar. A paz surge perante a ausência de culpa. Surge quando, após reconhecermos os
nossos erros e nos lamentarmos por eles, adoptamos medidas correctivas e iniciamos
um percurso limpo. A paz serve de barómetro à nossa vida emocional! A sua falta
sinaliza que algo está errado. Sentir paz reenvia para a ideia de que estamos no
caminho correcto, tomámos a decisão certa, optámos pelo melhor!
Jeová-Shalom relembra-nos o gosto que temos pela paz, pela harmonia e bem-estar.
Relembra-nos que, no fundo, todos desejamos solucionar os conflitos que inundam a
nossa vida interior e a interacção com outras pessoas. Claramente desejamos
ultrapassar os nossos estados neuróticos, curar as feridas da alma e continuar nesta
jornada em paz. Claramente preferimos trabalhar em ambientes nos quais os conflitos
se resolvem e não amontoam, todos desejamos abrir a porta da nossa casa com alegria
por estarmos de volta à família depois de um dia de trabalho, todos desejamos
construir relacionamentos sinceros e livres de pressão. Desejamos isto porque fomos
criados à imagem de Jeová-Shalom, o Deus da Paz!
– Jeová Rophe remete para a ideia “O Senhor Que Sara”. É o pastor que procura a
ovelha que está ferida, trata dela, acompanha e supervisiona-a em todo o processo de
restauração. É o Deus que não se agrada com o sofrimento, o mal-estar, a doença seja
qual for. É o Deus disponível para curar as nossas ansiedades, depressões, paranóias,
baixas auto-estimas e tantos outros problemas, como os de relacionamento
interpessoal e até do foro físico.
Jeová-Rophe relembra o nosso desejo de cuidar de quem sofre, cuidar dos doentes e
tratar as suas feridas. Por vezes, a vida, ao ser vivida, afasta-nos desta nossa
característica herdada do Pai. Por vezes, o calo emocional e espiritual afasta-nos do
que verdadeiramente somos. Mas quando ele é raspado e a sua raiz retirada (graças a
algum episódio marcante na vida) podemos reaprender a desfrutar da sensação de
limpar as feridas uns dos outros.
– Jeová Tsidkenu, que significa “Senhor Justiça Nossa”. É desejo de Deus que
andemos no caminho da justiça por amor ao Seu nome e para a Sua glória. Deus é
justo, é justiça e não se pode negar a Si mesmo. Se você começar a andar no caminho
da injustiça Deus não o poderá acompanhar. Você ficará entregue à sua própria sorte!
Porque Ele é justo e só trilha caminhos justos. Muitos de nós zangamo-nos com Ele
126
quando as coisas correm mal, mas será que não estaremos apenas a colher o resultado
dos caminhos injustos que optámos percorrer? Deus não caminhou connosco nesses
momentos, mas espera que regressemos ao caminho da justiça.
Jeová-Tsidkenu relembra a nossa sede de justiça. Ansiamos pela justiça e por ela
lutamos: guerras têm sido travadas de forma a que a justiça seja estabelecida!
– Jeová Shammah significa “Jeová está presente”. É o Deus que promete consolar e
dar esperança. Este nome de Deus evoca sentimentos de conforto e segurança em
tempos de terror. Reenvia para a ideia de alívio emocional, tranquilidade e consolo
perto! É a esperança de que Ele está presente e tudo fará para nos proteger! Ele é o
nosso socorro bem presente!
-nos que é n’Ele que encontramos a nossa identidade! É Jesus a nossa bandeira, é Ele
que nos representa diante do Pai e diante de todas as potestades e forças espirituais
neste mundo!
127
Como diria o salmista: Quem temos nós no céu senão a Ti? E na Terra não há
ninguém a quem mais desejemos do que Tu!
128
Índice
Introdução 6
1. Sal e luz do mundo 9
2. Uma noção integrada de saúde 33
3. A assertividade e a sua importância 39
4. O estilo (de comunicação e relação) agressivo 42
5. O estilo (de comunicação e relação) manipulador 61
6. O estilo (de comunicação e relação) passivo 67
7. O estilo (de comunicação e relação) assertivo ou auto-
99
afirmativo
8. Como desenvolver a assertividade, como ser sal e luz? 104
9. Inicie a mudança! 119
10. Previna a recaída 122
129