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Manual de

Emergências
Clínicas para
Estudantes

Curitiba - 2018
Liga Acadêmica de Emergências Clínicas – HCV Paraná

Orientadora:
Dra. Lorete Follador

Diretoria 2018:

Presidente:
Jessika Cazarotto Masquieto

Vice-Presidente:
Douglas de Lima Negrão

Diretora Acadêmica:
Mariana de Moura de Souza

Diretora Científica:
Caroline Boschetto
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Edição do Material

Capa:
Guilherme Ernesto Militz

Edição:
Niels Vinicius Pádua Carvalho
Álvaro Luiz Teixeira de Freitas
Mariana de Moura de Souza

Autores:

Thaise de Araújo Wrubleski Marina Machado Ramos

Jordana Lima Braga Niels Vinícius Pádua Carvalho

Douglas de Lima Negrão Álvaro Luiz Teixeira de Freitas

Anderson Vilela de Freithas Thais Nagano

Catharina Iagla Borssuk Jhony Maciel de Oliveira

Jessika Cazarotto Masquieto Oona Tomiê Daronch

Lucas Olandoski Erban Caroline Boschetto

Caio Henrique Yoshikatsu Gabriel Sobejeiro Rigoni

Gabriel Koech Brati Fabiane Karen Miyake

Ana Carolina Fernandes Dall’Stella de Regina Benatti Gondolfo


Abreu Schmidt
Carolina Labigalini Sampaio
Lucas Latchuk Martins
SUMÁRIO

CAPÍTULO 1 – PARADA CARDIORRESPIRATÓRIA .............................................. 4


CAPÍTULO 2 - CHOQUE.......................................................................................... 12
CAPÍTULO 3 – SEPSE NO DEPARTAMENTO DE EMERGÊNCIA ....................... 17
CAPÍTULO 4 – DOR TORÁCICA NO DEPARTAMENTO DE EMERGÊNCIA ........ 24
CAPÍTULO 5 – URGÊNCIAS E EMERGÊNCIAS HIPERTENSIVAS ...................... 34
CAPÍTULO 6 – ICC DESCOMPENSADA ................................................................ 42
CAPÍTULO 7 – ECG NA EMERGÊNCIA ................................................................. 47
CAPÍTULO 8 – RADIOGRAFIA NA EMERGÊNCIA CLÍNICA ................................ 51
CAPÍTULO 9 – DPOC DESCOMPENSADA ............................................................ 58
CAPÍTULO 10 - TEP ................................................................................................ 64
CAPÍTULO 11 – HEMORRAGIA DIGESTIVA AGUDA ........................................... 71
CAPÍTULO 12 – COMPLICAÇÕES AGUDAS DO DIABETES ............................... 81
CAPÍTULO 13 – INTROXICAÇÕES EXÓGENAS ................................................... 87
CAPÍTULO 14 – EMERGÊNCIAS PSIQUIÁTRICAS ............................................... 94
CAPÍTULO 15 – CUIDADOS PALIATIVOS EM UNIDADES DE EMERGÊNCIA ...103
CAPÍTULO 16 – ACIDENTE VASCULAR ENCEFÁLICO ......................................108
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CAPÍTULO 1

PARADA CARDIORRESPIRATÓRIA
Acadêmicos: Thaise de Araújo Wrubleski e Jordana Lima Braga
Revisor: Dr. Gustavo Lenci Marques

1 ABORDAGEM INICIAL DO PACIENTE

A cadeia de sobrevida é constituída por cinco passos principais: reconhecimento da


parada cardíaca e desencadeamento do sistema de emergência, início imediato das
manobras de ressuscitação cardiopulmonar (RCP), desfibrilação precoce seguida das
medidas de suporte avançado de vida e cuidados pós-parada de qualidade.

O atendimento da PCR pode ser dividido em duas etapas: avaliação primária (basic
life suport – BLS) e avaliação secundária (advanced life suport – ACLS), descritas a
seguir.

2 MANOBRAS DE SUPORTE BASICO DE VIDA (BLS)

2.1 RECONHECIMENTO

O primeiro passo da avaliação primária consiste no reconhecimento da PCR. A não


responsividade ao chamado associado a ausência de movimentos respiratórios ou
presença de gasps agônicos indicam que o paciente está em parada cardíaca. Neste
momento, ainda, deve-se buscar pulso central (carotídeo ou femoral) – esta etapa não
deve ultrapassar 10 segundos.

2.2 DESENCADEAMENTO DO SISTEMA DE EMERGÊNCIA.

Após a definição da PCR, é de suma importância o acesso rápido ao desfibrilador.


Dentro do ambiente hospitalar deve-se acionar o time de resposta rápida.
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2.3 COMPRESSÕES TORÁCICAS

Esta é a etapa mais importante da RCP e deve ser iniciada imediatamente após a
identificação da PCR. As compressões torácicas de alta qualidade devem ser rápidas
e eficientes, realizadas terço inferior do esterno, capazes de deprimir o tórax de 5 a 6
cm, permitindo seu retorno completo após cada compressão e mantendo uma
frequência de 100 a 120 compressões/minuto.

2.4 MANUSEIO DAS VIAS AÉREAS/VENTILAÇÃO

Para a abertura das vias aéreas, os profissionais habilitados devem utilizar a manobra
de elevação da mandíbula e hiperextensão da coluna cervical, exceto na suspeita de
lesão cervical, quando está indicada a manobra de tração da mandíbula sem
hiperextensão cervical.

Quando a RCP é realizada por profissionais de saúde a cada 30 compressões


torácicas devem ser realizadas 2 ventilações – 30:2 (para pacientes sem uma via
aérea avançada). O tempo máximo para cada ventilação é de 1 segundo, com volume
corrente suficiente para elevar o tórax (6 a 7 ml/kg), evitando a hiperventilação.

A partir do momento que uma via aérea avançada for estabelecida, as ventilações
passam a ser realizadas numa frequência de 8 a 10 por minuto (em média 1 ventilação
a cada 6 segundos) não sincronizadas com as compressões torácicas, que passam a
ser realizadas sem pausa, checando o pulso a cada 2 min.

3 MANOBRAS DE SUPORTE AVANÇADO DE VIDA (ACLS)

A aplicação de manobras de suporte avançado de vida consiste em uma espécie de


avaliação secundária do atendimento de uma PCR. Ela envolve o uso de dispositivos
invasivos de via aérea, o estabelecimento de acesso venoso, o uso de drogas,
desfibrilações elétricas e estabilização do paciente pós-PCR.
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3.1 MOV

Um mnemônico bastante útil no manejo avançado de uma PCR é o MOV. Suas letras
revelam condutas essenciais durante o atendimento na emergência, são eles:
monitorização cardíaca + oxigenação + acesso venoso periférico ou intraósseo.

3.2 VIA AÉREA AVANÇADA

Para garantir uma melhor oxigenação ao paciente durante uma parada


cardiorrespiratória opta-se preferencialmente por garantir uma via aérea avançada
através da intubação orotraqueal ou máscara laríngea. Em qualquer um dos
procedimentos escolhidos, deve-se averiguar, ao final, o correto posicionamento do
tubo, além de ausculta pulmonar não audível em epigástrio e expansão simétrica dos
campos pulmonares. Deve-se administrar 1 ventilação a cada 6 segundos enquanto
as compressões torácicas são aplicadas, de modo a garantir uma frequência de 10
ventilações/min e 100 a 120 compressões contínuas/min. De acordo com as
resoluções de 2015 da American Heart Association, no paciente intubado, baixos
teores de CO2 exalados (ETCO2 <10mmHg) após 20 minutos de reanimação indicam
pior prognóstico e podem auxiliar na tomada de decisão quanto à interrupção da RCP.

4 RITMOS CHOCÁVEIS

4.1 TAQUICARDIA VENTRICULAR SEM PULSO:

Ocorre quando 3 ou mais complexos ventriculares prematuros aparecem


sucessivamente em uma frequência maior que 100 batimentos/min;

• Pode ocorrer como um evento curto/não sustentado (< 30 segundos) ou, mais
comumente, de forma sustentada (>30 segundos);
• De acordo com o ACLS: QRS alargado rápido + ausência de pulso + choque
ou insuficiência cardíaca = TV (até que se prove o contrário).
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4.1.1 TIPOS

• Monomórfica (complexos QRS da TV têm o mesmo tamanho e amplitue).


Causada por doença cardíaca (disfunção valvular, isquemia, sínd.
coronarianas, miocardiopatia, prolapso da válvula mitral, trauma), desequilíbrio
ácido-básico; uso abusivo de cocaína, intoxicação digitálica; desequilíbrio
eletrolítico (hipopotassemia, hiperpotassemia, hipomagnesemia), overdose de
antidepressivos tricíclicos. Suas características são FC (101/250
batimentos/min); Presença ou não de pulso; Ritmo regular; Onndas P não
visíveis (se presentes, não possuem relação com QRS) e Duração de QRS
(0,12 seg ou mais) dificl diferenciar QRS de T.
• Polimórfica (complexos QRS variam em forma e amplitude de um battimento
para outro). Dentre suas causas estão alteração congênita, uso de
antiarrítmicos, hipopotassemia, estresse, exercício físico, síndrome de Brugada
e isquemia. Suas características são FC: 150-300bpm (200-250 mais comum);
Ritmo regular ou irregular; Ondas P ausentes; Intervalo PR ausente e Duração
QRS: (0,12s ou mais) – alteração gradual na amplitude e direção dos
complexos QRS (ciclo típico – 5 a 20 complexos QRS).

4.1.2 Fibrilação ventricular

A FV é um ritmo cardíaco que começa nos ventrículos. Nessa situação, não há


despolarização organizada dos ventrículos, fazendo com que o músculo ventricular
estremeça resultando em uma contração miocárdica pouco efeitva e ausência de
pulso. Dentre suas causas estão as índromes coronárias agudas; antiarrítmicos e
outros medicamentos; disrritmias; desequilíbrio eletrolítico; fatores ambientais
(eletrocussão); insuficiência cardíaca; aumento da atividade do sistema nervoso
simpático e estimulação do nervo vago. Suas características, entre outras, são: FC
não pode ser determinada (não há ondas detectáveis ou complexos mensuráveis);
Ritmo rápido e caótico, sem padrão ou regularidade; Ondas P não detectáveis;
Intervalo PR não detectável e Duração de QRS não detectável.
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4.2 CONDUTA

As prioridades do atendimento na parada cardíaca por FV ou TV sem pulso são RCP


de alta qualidade e desfibrilação. O choque é administrado com energia monofásica
(360J) ou bifásica (120-200J) e antes de procedê-lo, assegurar que ninguém está em
contato com a vítima no momento. Após o primeiro choque, retoma-se a RCP por 2
minutos para então checar o ritmo. Se este continuar chocável, aplica-se um novo
choque com a mesma energia empregada anteriormente, seguido de RCP por 2
minutos, e ainda se administra epinefrina (1mg a cada 3 a 5 minutos). Caso o ritmo
continue chocável, aplica-se o terceiro choque, com posterior RCP por 2 minutos e
aplicação de amiodarona (primeira dose: 300mg, em bolus; e se necessário, segunda
dose: 150mg). A atualização da American Heart Association de 2015 preconiza que a
vasopressina não oferece nenhuma vantagem como substituto da dose padrão de
epinefrina em PCR.

4.3 RITMOS NÃO CHOCÁVEIS

4.3.1 Assistolia

É a total ausência de atividade elétrica ventricular. Não há FC ou ritmo ventricular,


pulso ou débito cardíaco. Alguma atividade elétrica atrial pode ser observada, nesse
caso, o ritmo é denominado de assistolia “onda P”.

Características: FC ventricular não detectável, mas a atividade atrial pode ser


observada (assístole de onda P); Ritmo ventricular ausente, mas atrial pode existir;
Ondas P geralmente ausentes; Intervalo PR não mensurável e Duração de QRS
ausente.

Sempre que se suspeitar de assistolia, iniciar protocolo de linha reta, conferindo-se


cabos (conexão dos eletrodos), aumentar ganho do monitor cardíaco e checar o ritmo
em duas derivações.
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4.3.2 AESP – Atividade elétrica sem pulso

A AESP é observada quando uma atividade elétrica organizada (que não TV ou FV)
é observada no monitor cardíaco, mas o paciente está irresponsivo, não respira e não
tem pulso.

Características: a AESP pode compreender ritmos idioventriculares, ritmos de escape


ventriculares, ritmos idioventriculares pós-desfibrilação, ritmo sinusal e outros.

4.3.2.1 Causas

• 5Hs: Hipovolemia, Hipóxia, H+ (acidose), Hipotermia, Hipo/hipercalemia


• 5Ts: Tamponamento cardíaco; TEP (trombose pulmonar); Trombose
coronariana; Tensão (pneumotórax hipertensivo); Tóxicos.

4.3.2.2 Conduta

O tratamento de AESP e assistolia inclui RCP de alta qualidade em ciclos de 2 min,


com intervalo de, no máximo 10 segundos, para avaliar o ritmo. Além disso, faz-se a
administração de epinefrina tão logo possível (1mg de 3 a 5 minutos) e busca por
causas reversíveis de PCR (5Hs e 5Ts). Essas etapas se repetem até que ocorra RCE
(retorno da circulação espontânea) ou até que o ritmo evolua para chocável, e adota-
se então a conduta já apresentada para ritmos chocáveis.

A RCP extracorpórea pode ser considerada entre determinados pacientes com parada
refratários à RCP convencional inicial, em ambientes em que se possa implementá-la
rapidamente.

5 RETORNO NA CIRCULAÇÃO ESPONTÂNEA (RCE)

A identificação do retorno da circulação espontânea envolve:

• Avaliação de pulso e pressão arterial;


• Aumento abrupto prolongado no PETCO2 (geralmente ≥ 40 mmHg);
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• Observar sinal de onda espontâneo na pressão arterial através de


monitorização intra-arterial.

6 CUIDADOS PÓS-RESSUCITAÇÃO

Os cuidados pós parados visam melhorar função cardíaca e respiratória, além de


normalizar a perfusão tecidual dos órgãos vitais. Para isso, algumas medidas são
fundamentais, dentre elas as preconizadas pelas atualizações de 2015 da American
Heart Association:

• Transferir para hospital apropriado ou UTI com sistema de tratamento pós-


PCR.
• Otimizar a ventilação e a oxigenação: SO2 ≥ 94%. Não hiperventilar. Manter
PaO2 em 100mmHg e PaCO2 entre 40-45mmHg.
• Tratar a hipotensão: volume, vasopressor, investigar e tratar causas e ECG de
12 derivações. É aconselhável que se mantenha uma PAM (pressão arterial
média) entre 65 e 90mmHg.
• Controle direcionado da temperatura. Todos os pacientes adultos comatosos
(ou seja, sem resposta a comandos verbais) com RCE após a PCR devem ser
submetidos a CDT (controle direcionado da temperatura) tendo como alvo uma
temperatura entre 32º e 36ºC mantida constantemente por, pelo menos, 24
horas;
• Não é recomendado o resfriamento pré-hospitalar rotineiro de pacientes com
infusão rápida de fluidos EV frios após RCE; pois, ao contrário do que se
imaginava, esse procedimento não oferece benefício, além de poder
desenvolver complicações para o paciente.
• A angiografia coronária de emergência é recomendada para os pacientes que
apresentem supradesnivelamento do segmento ST e para pacientes com
instabilidade hemodinâmica ou elétrica sem supradesnivelamento ST, para os
quais haja suspeita de lesão cardiovascular.
• Todos os pacientes que evoluírem para morte cerebral ou circulatória após a
PCR inicial devem ser considerados possíveis doadores de órgãos.
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REFERÊNCIAS

AEHLERT, Barbara. ACLS, suporte avançado de vida em cardiologia: emergência em cardiologia.


4.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013.

GUIMARÃES, H.P et al. Destaques da Atualização das Diretrizes da American Heart Association
2015 para RCP e ACE. Guidelines 2015.

MARTINS, H.S et al. Emergências clínicas: abordagem prática. 11.ed. Barueri, SP: Manole, 2016.
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CAPÍTULO 2

CHOQUE
Acadêmico: Douglas de Lima Negrão
Revisor: Dr. Mathias Augusto Ramos Lima

1 INTRODUÇÃO

Choque por definição é perfusão inadequada de oxigênio nos tecidos por meio de
etiologias variáveis, como veremos, que ocorrem quando os mecanismos
compensatórios na hemodinâmica não resolvem o dano e ocorre anoxia celular.
Condição fisiopatológica caracterizada clinicamente por hipotensão severa, pressão
arterial sistólica menor que 90 mmHg, ou ainda sistólica menor que 30 mmHg do basal
conhecido e rapidamente evolui para parada cardiorrespiratória. O choque é uma
emergência tanto clinica quanto cirúrgica e aqui vamos focar no reconhecimento de
tal situação, pois o diagnóstico deve ser precoce a fim de obter sucesso no tratamento.

A falta de O2 devido a uma hipotensão faz com que ocorra uma mudança metabólica
de aeróbio para anaeróbio e há ativação dos mecanismos compensatórios. Tais
mecanismos trabalham pela liberação de catecolaminas as quais resultam em
aumento da frequência cardíaca (FC) e da resistência vascular periférica (RVP) para
manter a pressão arterial (PA) em níveis aceitáveis. Caso a PA continue caindo ocorre
uma vasoconstrição da artéria esplênica por ação do sistema adrenérgico, com isso
há uma transferência de sangue da microcirculação para os grandes vasos, essa
medida é uma emergência para preservação de órgãos nobres (cérebro e coração)
em detrimento da circulação periférica.

1.1 MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS

Os sintomas do choque são os de uma má perfusão orgânica. E, os dois grandes


satélites que podem anunciar a apresentação de um choque na pratica são: oligúria –
hipofluxo renal - e alteração do nível de consciência – hipofluxo cerebral.
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As manifestações clinicas clássicas dos diversos sistemas na presença do choque


são taquicardia, taquipneia, sintomas neurológicos, queda na pressão sistólica e
diastólica, geralmente queda na pressão de pulso, presença de um tempo de
enchimento capilar lentificado, manifestações em pele e alterações no débito urinário.
Esses sintomas gerais serão melhor abordados ao dividir os tipos de choque, visto
que não estão presentes em todos e alguns tipos não seguem esse quadro.

1.2 CLASSIFICAÇÃO

Para classificar um choque é preciso entender o que o estado hemodinâmico é dado


por equilíbrio entre bomba cardíaca, volume intravascular e tônus vascular. Alterações
nesses componentes fazem a divisão dos tipos de choque em: hipovolêmico,
obstrutivo, cardiogênico, séptico e, por fim, distributivo. O choque distributivo, assim
como o séptico, não será muito comentado nesse capítulo, pois, seu principal
mecanismo é a sepse, que terá uma discussão em um capítulo próprio.

1.2.1 Choque Hipovolêmico

O choque hipovolêmico (CHV) é a perda de volume intravascular, é o tipo de choque


mais presente na sala de emergência e é uma situação tão aguda que o tratamento
já vem com a suspeita clínica. Os dois grandes grupos são o hemorrágico e não
hemorrágico, e a principal etiologia é o trauma. Mas também para interesse na área
clínica os tipos de CHV muito prevalentes em nosso meio podem ser por alterações
em trato gastrointestinal por meio de vômitos e diarreias, perda de líquido para um
terceiro espaço como na pancreatite aguda e obstrução intestinal, alterações renais
como em uma nefropatia perdedora de sal, estado hiperosmolar hiperglicêmico e
também até mesmo em quadros febris.

O diagnóstico do CHV é clinico, e deve sempre se lembrar do aumento da FC para


manter a boa pressão através de um debito adequado para esse tipo de choque uma
vez que o sinal mais precoce é a taquicardia. Palidez cutaneomucosa intensa, com
pele fria e pegajosa são sinais que indicam a contração microvascular esplênica, esse
é o ponto ideal para reposição volêmica. Mas antes da reposição, é importante saber
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em qual classe o paciente se enquadra, visto que são quatro e o tratamento muda de
uma para outra.

Tabela 1 – Classificação do choque hipovolêmico

Classe I Classe II Classe III Classe IV

FC ≤ 100 ≥ 100 ≥ 120 ≥ 140

PA N N ou ↓ ↓ ↓

FR ≤ 20/min 20-30/min 30-40/min ≥ 35/min

Diurese ≥ 30 20- 30 5-20 Desprezível


(ml/hora)

Enchimento Sem alteração Prolongado Prolongado Prolongado


capilar (≥4,5s)

Nível de Pouco ansioso Ansioso Ansioso - Confuso –


consciência confuso letárgico

Perdas em % ≤ 15% 15-30% 30-40% ≥ 40%

Fonte: Emergências clinicas: abordagem pratica. 8.ed.

Para o tratamento do CHV o princípio básico é a reposição de volume por meio de


cristaloides e hemoderivados. De início, deve-se obter dois acessos venosos em
membro superior com cateteres curtos e calibrosos para uma reposição volêmica mais
rápida. Iniciar com cristaloide isotônico por meio de solução de Ringer lactato,
lembrando que o volume é variável conforme o quadro do paciente monitorizado, e o
melhor parâmetro é a diurese – obtido por sondagem vesical. Em linhas gerais é
admistrado de modo rápido 50% do volume perdido estimado sob monitorização
continua. Em termos de quantidade pode ser reposto até 2-3 o volume perdido
estimado. Para a classe I e II apenas o Ringer lactato deve ser ministrado, e nas
classes III e IV os hemoderivados juntos ao cristaloide são o tratamento de escolha.
Por fim, quanto ao CHV por etiologia de trauma o ABCDE do trauma jamais pode ser
esquecido.
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1.2.2 Choque Cardiogênico

Choque cardiogênico é proveniente da falha do coração de manter o debito cardíaco.


É caracterizado por uma hipoperfusão sistêmica e hipotensão que se retroalimentam
uma vez que agravam o quadro cardíaco piorando ainda mais o choque, se prolongar
muito tempo há comprometimento ainda maior do miocárdio que pode levar até a uma
lesão isquêmica. O principal mecanismo protetor nesses casos é o aumento da RVP.

Os principais mecanismos que levam ao choque cardiogênico são problemas


relacionados diretamente ao músculo cardíaco como bomba e incluem a síndrome
coronariana aguda, arritmias, doença valvar grave, cardiomiopatia e insuficiência
cardíaca descompensada.

A sintomatologia inicial inclui principalmente hipotensão junto a extremidades fria e


pegajosas. Outros sintomas podem estar presentes que são aliados a etiologia do
problema, e podem ser a dor típica do infarto de miocárdio, estertores pulmonares
fazendo ou não congestão pulmonar e sintomas hepáticos que se traduzem em um
fígado congesto, palpável e doloroso.

O tratamento em linhas gerais se dá em tratar a causa base que está levando ao


quadro sintomatológico. No caso de uma síndrome coronariana aguda, por exemplo,
deve ser manejada com o protocolo de dor torácica, que é abordado em um capítulo
a parte.

Em um tratamento geral para o choque cardiogênico a droga de eleição é a


dubutamina. Uma droga inotrópica simpatomimética de ação beta agonista
pronunciada que ocasiona elevação do inotropismo aumentando a contração do
miocárdio, ação sobre o retorno venoso. Melhora o volume sistólico e a elastância
arterial que são grandes problemas desse choque. Além disso, faz parte um
tratamento supurativo que inclui fornecimento de O2, morfina e hidratação cautelosa
com base na pressão venosa central.
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1.2.3 Choque Obstrutivo

Entrando no choque obstrutivo que nada mais é que a obstrução mecânica do coração
podendo ser causado por um tamponamento cardíaco, trombo embolia pulmonar,
pneumotórax hipertensivo dentre outras causas. Déficit de débito cardíaco diferente
do choque cardiogênico é de causa extra cardíaca.

Quanto a clínica, é também uma síndrome de má perfusão que se manifesta por


hipotensão, taquicardia, oligúria, extremidades frias e isquêmicas como em outros
tipos. Um grande diferencial clínico com choque hipovolêmico é abafamento de bulhas
cardíacas e a turgência jugular, esse último sintoma não vem acompanhado de edema
de pulmão (lembrar-se da tríade de Beck).

O tratamento do choque obstrutivo se dá em duas etapas. Na primeira deve ser


ministrada uma infusão de cristaloide e no segundo momento o paciente deve ser
encaminhado com urgência a uma sala cirúrgica. Diferente dos outros tipos de
choque, aqui o tratamento resolutivo passa mais para as mãos do cirurgião.

REFERÊNCIAS

Saad Junior, Roberto. Salles, Ronaldo Antonio Reis Vianna [et al.]. Tratado de cirurgia do CBC. 2.ed.
São Paulo: Editora Atheneu, 2015.
Herlon Saraiva Martins [et al.]. Emergências clinicas: abordagem pratica. 8.ed. rev. e atual. Barueri,
SP : Manole, 2013.
CARTA, Adriana; LUCCA, Maria Gabriela de; PIRES, Milton D. and LOBO, Suzana
Margareth. Sepsis-associated organ dysfunction and increased supportive care are associated
with high serum interleukin-6 levels. J. Bras. Patol. Med. Lab. [online]. 2016, vol.52, n.6 [cited 2017-
10-19], pp.367-373.
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CAPÍTULO 3

SEPSE NO DEPARTAMENTO DE EMERGÊNCIA


Acadêmicos: Anderson Vilela de Freithas e Catharina Iagla Borssuk
Revisor: Dr. Cristiano da Silva Ribas

1 INTRODUÇÃO

Múltiplas patologias podem ter seu caminho final a sepse, uma síndrome grave e
muitas vezes fatal a qual é caracterizada por uma disfunção ameaçadora a vida em
decorrência da presença de resposta desregulada à infecção. Segundo o Sepsis-3,
além dos novos conceitos de sepse também foi esclarecido o conceito de choque
séptico como a sepse com necessidade de tratamento vasopressor para manutenção
de pressão arterial média maior ou igual a 65 mmHg e lactato maior que 2 mmol/L,
mesmo após adequada ressuscitação volêmica.

Quando se fala em prognóstico de sepse se fala em tempo, ou seja, quanto mais cedo
for realizado o diagnóstico, maior a chance de um paciente obter um melhor
prognóstico, porém, atualmente, não existe nenhum exame complementar que por si
só consiga ter uma sensibilidade e especificidade alta para se tornar o padrão ouro no
diagnóstico. Visto que o diagnóstico precoce é primordial para o melhor prognóstico,
em 2017 começou-se a utilizar o escore chamado quick SOFA (q-SOFA), o qual
pontua com ECG <15, FR>22/min e PAS< 100 mmHg. Se o paciente apresentar um
score ≥2 é considerado alto risco para sepse e se tratamento deve ser rapidamente
instituído.

2 APRESENTAÇÃO CLÍNICA

A sepse é um desafio para a medicina e o diagnóstico de sepse e de choque séptico


é clínico. Os pacientes podem apresentar variadas manifestações clínicas que podem
ser influenciadas pela idade, comorbidade, germe causador, sítio infeccioso, lesões e
medicamentos.
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A apresentação clínica desta síndrome é dinâmica. Inicialmente, os sinais e sintomas


manifestos tendem a serem inespecíficos como febre ou leucocitose. Já os sintomas
e parâmetros laboratoriais mais evidentes, em geral, são tardios e associados com
pior prognóstico. Portanto, o ideal é uma identificação precoce para que se obtenham
melhores desfechos clínicos.

Os principais sinais e sintomas da sepse podem ser: febre ou hipotermia, taquicardia,


taquipnéia, dispnéia, icterícia, elevação das bilirrubinas, oligúria, elevação da
creatinina, queda de plaquetas, leucocitose ou leucopenia e presença de células
imaturas no sangue periférico, alteração no nível de consciência e hipotensão arterial.
No entanto, vale ressaltar que pacientes idosos, com comorbidades, câncer ou
imunossuprimidos podem apresentar manifestações clínicas menos evidentes.

3 TRATAMENTO NA SALA DE EMERGÊNCIA

Sepse e choque séptico são emergências médicas e é necessário iniciar as


intervenções terapêuticas imediatamente após serem diagnósticas, uma vez que, uma
intervenção precoce e um tratamento correto alteram as taxas de mortalidade e de
morbidade nesses pacientes.

A Surviving Sepsis Campaing, de 2004, contemplou dois pacotes de intervenções


para o tratamento e manejo da sepse e choque séptico: o pacote de 6 horas a ser
realizado na sala de emergência e o pacote de 24 horas a ser realizado na Unidade
de Terapia Intensiva.

O pacote de 6 horas se baseia em seis pilares importantes, a saber: reconhecimento


precoce, coleta de culturas, coleta de lactato, antibioticoterapia da primeira hora,
fluidoterapia e ressuscitação precoce guiada por metas.

De maneira geral, o tratamento da sepse é dividido em dois momentos: na sala de


emergência e depois na unidade de terapia intensiva (UTI). Segue o algoritmo 1
proposto por MARTINS (2016) para pacientes com sepse na emergência.
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Algoritmo 1 - Suspeita de Sepse na Emergência

Fonte: MARTINS, et al. 2016.

Em 2015, o comitê da Campanha Sobrevivendo à Sepse (SSC) preconiza que dentro


do pacote das 6 horas, algumas medidas terapêuticas devem ser instituídas em no
máximo até 3 horas e algumas em no máximo até 6 horas do início da apresentação
clínica de sepse ou choque séptico no departamento de emergência.
20

3.1 INTERVENÇÕES TERAPÊUTICAS - PACOTE DE 3 HORAS

3.1.1 Diagnóstico precoce

Através de protocolos estabelecidos dentro do hospital, como por exemplo o qSOFA,


após a identificação precoce deve se instituir as medidas preconizadas
internacionalmente para o tratamento de pacientes sépticos. Após a realização de
monitorização, estabilização do paciente e coleta de exames laboratoriais, como:
gasometria arterial, hemograma completo, creatinina, bilirrubina, coagulograma e
proteína C reativa. Dentro de até 3 horas após o diagnóstico precoce ou suspeita de
sepse, deve-se: coletar lactato, coletar duas amostras de hemoculturas, prescrever
antibioticoterapia de amplo espectro e realizar reposição volêmica agressiva caso o
paciente se apresente hipotenso.

3.1.2 Antibioticoterapia da primeira hora

O ideal é que antibiótico de amplo espectro, por via endovenosa, seja prescrito dentro
da primeira hora após o diagnóstico ou a SUSPEITA de sepse, uma vez que, tal
medida reduz a mortalidade desses pacientes. As doses devem ser sem ajustes para
a função renal ou hepática, pois visam otimizar a redução da carga bacteriana ou
fúngica. Deve-se considerar o uso de diferentes classes de antibióticos para um
mesmo agente em pacientes com choque séptico ou uso de terapia combinada. Deve-
se realizar o descalonamento do antibiótico conforme evidência de resposta clínica ou
resolução da infecção.

3.1.3 Ressuscitação hemodinâmica

Em pacientes hipotensos (PAS < 90 mmHg, PAM < 65 mmHg ou redução da pressão
sistólica em 40 mmHg da pressão habitual) ou com sinais de hipoperfusão ou com
hiperlactatemia inicial, devemreceber ressuscitação hemodinâmica. Esse volume, de
30mL/kg, deve ser infundido o mais rápido possível dentro das primeiras 3 horas de
atendimento. Porém, é necessário cautela na reposição volêmica em pacientes
cardiopatas que apresentem disfunção diastólica ou sistólica moderada a grave.
21

3.2 INTERVENÇÕES TERAPÊUTICAS - PACOTE DE 6 HORAS

As medidas terapêuticas do pacote de 6 horas devem ser instituídas caso o paciente


séptico se apresente com hipotensão, hiperlactatemia ou sinais clínicos de
hipoperfusão tecidual.

3.2.1 Aplicar vasopressores

Caso a pressão arterial média (PAM) permaneça menor que 65 mmHg após a infusão
inicial de volume ou lactato sérico maior ou igual a 4 mmol/L (36 mg/dL) deve-se iniciar
vasopressores. A droga de escolha é a noradrenalina, podendo ser associada à
vasopressina em pacientes com choque refratário apesar de adequado ressucitação
volêmica ou quando se está utilizando elevadas doses de noradrenalina. Dopamina
pode ser utilizada quando exista evidência de baixo débito cardíaco ou sinais clínicos
de hipoperfusão tecidual e a dobutamina apenas pode ser utilizada em pacientes com
baixo risco de taquiarritmias e absoluto ou reduzido risco de bradicardia. Deve ser
realizar monitoramento da pressão venosa central (PVC) e saturação de oxigênio
venoso central (ScvO2).

3.2.2 Recoleta do lactato arterial

Em pacientes com hiperlactatemia (níveis de lactato duas vezes acima do valor de


referência), a meta terapêutica é o clareamento do lactato até os valores normais. É
recomendado, após o início do protocolo de sepse com reposição volêmica adequada
e manejo hemodinâmico apropriado, a coleta de novas dosagens de lactato arterial.

3.3 REAVALIAÇÃO DO VOLUME CORPORAL E DA PERFUSÃO TECIDUAL

• Repetir o exame direcionado (após a ressuscitação inicial de volume) que deve


ser realizado por médico, incluindo: sinais vitais, ausculta cardiopulmonar,
enchimento capilar, pulso e achados cutâneos.
22

3.4 OUTROS TÓPICOS SOBRE MANUSEIO DO PACIENTE EM SEPSE

3.4.1 Uso de corticoides

O uso de corticóides é indicado apenas para pacientes com choque séptico refratário.

3.4.2 Profilaxia de trombose venosa profunda

Pacientes devem receber profilaxia para trombose venosa profunda farmacológica


com Heparina de Baixo Peso Molecular (HBPM) subcutânea diária.

3.4.3 Controle da glicemia

Pacientes que apresentam hiperglicemia na fase aguda secundária a resposta


endócrino-metabólica ao trauma é recomendado o uso de protocolo específico
visando uma meta de 80 a 180 mg/dL.

3.4.4 Transfusão de hemoderivados

É recomendado a transfusão de hemácias somente quando a concentração de


hemoglobina for menor que 7 g/dL e após a resolução da hipoperfusão tecidual e na
ausência de circunstâncias atenuantes (isquemia miocárdica, hipoxemia grave,
hemorragia aguda ou doença isquêmica do coração).

3.4.5 Uso de bicarbonato

Não está indicado o uso de bicarbonato para melhorar os parâmetros hemodinâmicos


ou reduzir o uso de drogas vasoativas em pacientes com acidose láctica.

3.4.6 Ventilação mecânica

Em pacientes sépticos com SARA que esteja em ventilação mecânica, o volume


corrente previsto deve ser de 6 ml/Kg e a pressão de platô deve ser menor ou igual a
30 cm H2O. E manobras de recrutamento devem ser usadas em pacientes com sepse
23

com hipoxemia refratária grave. Para evitar o risco de broncoaspiração e prevenir o


desenvolvimento de pneumonia associada à ventilação mecânica nesses pacientes,
a cabeceira deve ser elevada entre 30 e 45 graus.

REFERÊNCIAS

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REMI, N. Sepsis syndromes in adults: Epidemiology, definitions, clinical presentation,


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http://www.uptodate.com (Acessado em 10 de janeiro de 2017).

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em 10 de janeiro de 2017).
24

CAPÍTULO 4

DOR TORÁCICA NO DEPARTAMENTO DE EMERGÊNCIA

Acadêmicos: Jessika Cazarotto Masquieto e Lucas Olandoski Erban


Revisor: Dr. Valdir Lippi Jr

1 CAUSAS DE DOR TORÁCICA AMEAÇADORAS DA VIDA

1.1 SÍNDROME CORONARIANA AGUDA (SCA)

1.1.1 Fisiologia

Na maior parte dos casos ocasionados pela ruptura de placa aterosclerótica e


formação de trombos a partir de adesão, ativação e agregação plaquetária levam a
redução do fluxo coronariano e consequente isquemia miocárdica.

1.1.2 Anamnese

Dor torácica início gradual, retroesternal ou no hemitórax esquerdo, de forte


intensidade, do tipo opressão ou queimação, irradiada para membros superiores, mais
comumente membro superior esquerdo, mandíbula ou dorso, duração de 10 – 30
minutos, que piora com estresse ou esforço físico (embora na maioria dos casos não
tenha fator desencadeante, melhora com nitrato). Pode ter náuseas, diaforese,
vômitos, dispneia associados.

Não sugerem SCA: dor pleurítica (ventilatório-dependente), dor em


mesogástrio/hipogástrio, dor que se localiza com a ponta do dedo, dor que se reproduz
a palpação ou movimentação dos braços, dor constante, persistente por várias horas,
episódios breves de dor que duram poucos segundos, dor irradiada para membros
inferiores.
25

1.1.3 Fatores de risco

Homens > 45 anos, Mulheres > 55 anos, tabagismo, hipertensão arterial sistêmica
(HAS), diabetes mellitus (DM), HDL baixo, LDL aumentado, história familiar positiva
para doença cardíaca prematura, doença cardíaca em parentes homens de 1o grau <
55 anos, doença cardíaca em parentes mulheres de 1o grau < 65 anos, obesidade
(IMC > 30 kg/m2), sedentarismo, uso de cocaína.

1.1.4 Exames complementares

• Eletrocardiograma (ECG): mostra sinais de isquemia, como


supradesnivelamento do segmento ST, BRE novo ou desconhecido,
infradesnivelamento de ST, inversão de onda T, onda Q patológica. Vale
ressaltar que pacientes com ECG alterado têm pior prognóstico do que aqueles
com ECG normal ou inespecífico.
• Marcadores de necrose miocárdica: troponina ultrassensível (Us) aumentada.
• Raio X de tórax: pode mostrar aumento de área cardíaca e congestão se tiver
insuficiência cardíaca associada.

1.2 TROMBOEMBOLISMO PULMONAR (TEP)

Abordado em um capítulo específico.

1.3 PNEUMOTÓRAX HIPERTENSIVO

1.3.1 Fisiologia

Acúmulo de ar no espaço pleural, que pode levar a pneumotórax hipertensivo, com


consequente compressão do mediastino e choque obstrutivo.

1.3.2 Anamnese e Exame Físico

Sintoma predominante é dispneia, mas pode ter dor torácica início abrupto, forte
intensidade, sempre do lado acometido, tipo pleurítica ou facada, pior a medida que
26

aumenta a quantidade de ar no espaço pleural. Sintomas pioram se baixa reserva


pulmonar. Pode causar choque obstrutivo.

Murmúrio vesicular abolido e hipertimpanismo do lado acometido. Pode ter enfisema


subcutâneo. Sinais de instabilidade (hipotensão, hipoxemia, taquicardia,
ingurgitamento jugular) sugerem pneumotórax hipertensivo.

1.3.3 Fatores de risco

Pneumotórax espontâneo primário: tabagismo, história familiar positiva, Sd de Marfan,


homocistinúria, endometriose torácica, mergulho. Pneumotórax espontâneo
secundário: trauma, DPOC, fibrose cística, neoplasia pulmonar, pneumonia
necrotizante, asma, pneumocistose.

1.3.4 Exames complementares (não devem retardar o manejo)

• Gasometria arterial: pode mostrar hipoxemia;


• US a beira do leito: para instáveis;
• Rx de tórax: hipertransparência, ausência de trama vascular;
• Tc de tórax: para estáveis, confirma diagnóstico de causa secundária.

1.4 DISSECÇÃO AÓRTICA

1.4.1 Fisiologia

Estresse na parede da aorta faz ruptura entre a camada íntima e a média, gerando
fluxo sanguíneo pulsátil que propaga a dissecção, com obstrução subsequente dos
ramos da aorta e isquemia dos órgãos perfundidos por eles.

1.4.2 Anamnese e Exame Físico

Variabilidade de sintomas. Dor torácica início abrupto (85%), retroesternal ou dorso,


forte intensidade desde o início, do tipo facada, “rasgando”, com irradiação para dorso
ou abdome (depende de qual ramo está acometendo), pode migrar seguindo o
27

percurso da aorta (70%), pode ter IAM associado (se dissecar coronária) ou isquemia
mesentérica (se dissecar aorta abdominal e ramos). Pode ter náuseas e vômitos
associados ou síncope, sintomas neurológicos e autonômicos (diaforese, palidez
cutânea).Discrepância no pulso ou na PA (> 20 mmHg), sinais de insuficiência aórtica,
déficit de pulso.

1.4.3 Fatores de risco

HAS (principal), idosos, sexo masculino, aneurisma de aorta, fatores de risco para
aterosclerose, uso de cocaína e doenças que enfraquecem a parede da aorta (tecido
conjuntivo): Síndrome de Marfan, valva aórtica bicúspide, gravidez, aneurisma de
aorta, coartação de aorta, Síndrome de Turner, vasculites.

1.4.4 Exames complementares

• Eletrocardiograma (ECG): sinais de isquemia miocárdica (15%), normal


(31%).
• Marcadores de necrose miocárdica: troponina ultrassensível (Us) pode
estar aumentada se acometer coronárias.
• D-dímero: quando coletado nas primeiras 24h, valores abaixo de 500 ng/ml
são úteis para descartar dissecção aórtica.
• Raio X de tórax: 90% apresentam alterações: alargamento do mediastino,
sinal do cálcio (calcificação > 1cm longe da borda do arco aórtico).
• AngioTC de tórax: escolha na maioria dos casos, quando paciente estável.
• Eco TE: escolha para pacientes instáveis. Na impossibilidade do Eco TE,
pode ser usado o ecoTT, na tentativa de fazer o diagnóstico, porém tem
menor sensibilidade e especificidade.

1.5 TAMPONAMENTO CARDÍACO

1.5.1 Fisiologia

Acúmulo de líquido pericárdico sob pressão, com redução do débito cardíaco.


28

1.5.2 Anamnese

No tamponamento agudo: dor torácica, dispneia, taquipneia, síncope. Se pericardite:


dor torácica retroesternal ou hemitórax esquerdo, pleurítica, pior ao deitar, melhora
em ortostase e ao inclinar-se para frente (prece maometana), piora ao deglutir. Pode
ter febre e atrito pericárdico, quadro gripal anterior, edema de MMII, fadiga. Pode ter
dispneia e tosse associadas, independente da etiologia.

No tamponamento: taquicardia, jugulares ingurgitadas, bulhas abafadas, hipotensão,


pulso paradoxal (queda de > 10 mmHg na PAs durante inspiração), choque obstrutivo.
Na pericardite: atrito pericárdico.

1.5.3 Fatores de risco

Pode ser consequente a trauma torácico, dissecção aórtica, pericardite aguda


(idiopática, infecção, neoplasia, uremia, imuno-mediada).

1.5.4 Exames complementares

• Hemograma: leucocitose se pericardite


• ECG: taquicardia, efeito dielétrico, baixa voltagem. Pericardite pode
mimetizar SCA: depressão PR, elevação ST, inversão T, porém mais
difusos.
• Rx tórax: pode ter área cardíaca aumentada (se > 200 ml acumulados)
• Ecocardiograma: vê variação dos volumes com a respiração, colapso de
câmaras cardíacas, dilatação da veia cava inferior.

2 MANEJO DO PACIENTE COM DOR TORÁCICA NA EMERGÊNCIA

Três questões regem a avaliação clínica de pacientes com dor torácica na


emergência, em ordem de prioridade: o paciente apresenta instabilidade
hemodinâmica? Se estável, apresenta causa ameaçadora da vida? Se não, é seguro
dar alta para este paciente para acompanhamento ambulatorial?
29

Sendo assim, o manejo inicia-se pela avaliação rápida de estabilidade hemodinâmica.


Como em qualquer situação de emergência, o 1o passo deve ser chamar por ajuda.
Em seguida, seguir as recomendações do protocolo do ACLS:

• C: checar responsividade, se ausente proceder à checagem do pulso carotídeo


em no máximo 10 segundos;
• A: checar e permeabilizar via aérea;
• B: checar respiração.

Em seguida, iniciar a monitorização cardioscópica, da pressão arterial e oximetria de


pulso, glicemia capilar, fornecer oxigênio e obter acesso venoso calibroso.
Concomitantemente, fazer anamnese e exame físico direcionados para dor torácica,
além de eletrocardiograma, coleta de exames laboratoriais e solicitação de Raio x de
tórax.

2.1 ANAMNESE

O acrônimo ILICIDAS pode ajudar a fazer a anamnese objetivamente. É importante


perguntar: I – inicio: quando começou a dor? Acordou à noite? L – localização: mostre-
me onde está doendo! I – intensidade: está muito forte? De zero a dez, o quanto está
doendo? C – caráter: que tipo de dor? Queimação, aperto, facada, rasgada? I –
irradiação: essa dor corre pra algum lugar? D – duração: é uma dor contínua ou vai e
volta? A – alívio/piora: a dor piora com esforço físico? Estresse? Melhora com nitrato?
Com alimentação? Piora ao deitar? Tossir? S – sintomas associados: está sentindo
mais alguma coisa? Náuseas? Vômitos? Diaforese? Tontura? Síncope? Tosse?
Hemoptise?

Se o paciente não estiver em condições para responder, deve-se conversar com a


família para coleta de dados da história clínica. Sobre os antecedentes e hábitos de
vida, no contexto de dor torácica, é importante perguntar: Episódios prévios
relacionados ao quadro e exames prévios realizados. Comorbidades e medicamentos
em uso, além de alergias, internamentos prévios e contraindicação para uso de
trombolíticos. Perguntar sobre hábitos de tabagismo, etilismo e outras drogas, com
enfoque em cocaína e anfetamina.
30

2.2 EXAME FÍSICO

Lembrar de fazer uma monitorização contínua dos dados vitais. No exame neurológico
lembrar da escala de coma de Glasgow, déficits focais e pupilas. No exame de cabeça
e pescoço, lembrar da jugular e verificar sopro carotídeo. No cardiovascular, avaliar
as bulhas, procurar sopros e medir PA em ambos os membros. Já no respiratório ver
o MV, ruídos adventícios e sinais de esforço respiratório. Abdome: RHA, peritonite e
visceromegalias. Nos MMII, buscar por edema, empastamento e pulsos.

2.3 ELETROCARDIOGRAMA

Deve ser realizado e avaliado pelo médico em no máximo 10 minutos após a admissão
do paciente. Procurar sinais de isquemia, arritmias, outras características presentes
em doenças ameaçadoras da vida. Se ECG inespecífico e dor torácica persistente ou
suspeita alta de SCA, repetir o ECG em 1 hora.

2.4 EXAMES LABORATORIAIS

Inicialmente, solicitar: hemograma, eletrólitos, função renal, troponina, d-dímero.

2.5 TIPOS DE DOR TORÁCICA

• Dor tipo A: definitivamente anginosa. Possui as características já citadas;


• Dor tipo B: provavelmente anginosa. A SCA é a principal hipótese, mas
ainda é necessário confirmação por exames e exclusão de diagnósticos
diferenciais;
• Dor tipo C: provavelmente não anginosa. A SCA não é a principal hipótese,
mas ainda é necessária sua exclusão por métodos diagnósticos;
• Dor tipo D: definitivamente não anginosa. Os sintomas não incluem a DAC
como uma hipótese diagnóstica.

O manejo é realizado de acordo com o tipo de dor do paciente (A,B,C ou D) e segue


o fluxograma (Figura 1) a seguir:
31

Figura 1 – Manejo do paciente com dor torárica

Fonte: Martins, et al. 2017

2.6 ROTAS

2.6.1 Rota 1

São pacientes com dor tipo A. Administrar AAS 200 mg e nitrato sublingual 5mg a
cada 5 min, até 3 x (exceto se uso de inibidor da 5-fosfodiestesase nas últimas 24 h,
sinais de infarto de parede inferior/VD).

Na sequencia, verificar o ECG. Se o ECG inicial mostrar supra-ST compatível com


IAM, o médico deve entrar em contato imediatamente com a equipe de hemodinâmica
do hospital (ATC em até 90 minutos) e iniciar medidas para IAM com supra: AAS,
clopidogrel ou ticagrelor, b-bloqueador, enoxaparina, estatina +/- nitrato, morfina,
oxigênio.

Se não há perspectiva de angioplastia em 90 min (ou 120 min se está em outro


hospital), iniciar terapia trombolítica em até 30 minutos (se o início dos sintomas foi há
< 12 horas).
32

Bloqueio de ramo esquerdo (BRE) novo ou desconhecido em pacientes com dor


torácica persistente também deve ser manejado desta forma. IAM por uso de cocaína
deve receber benzodiazepínicos adjuvante.

2.6.2 Rota 2

Entram nessa rota os pacientes com dor A que apresentem Infradesnivelamento de


ST, ondas T invertidas e simétricas ou ECG normal, além dos pacientes com dor B
com bloqueio de ramo esquerdo prévio.

A conduta a ser tomada para esses pacientes inclui:

• Dosagem de marcadores de necrose miocárdia e o ECG.


• Caso todos os exames realizados tenham resultados negativos e o paciente
não possua outras queixas, deve-se realizar uma prova funcional/ergométrica.
Se, mesmo assim, a prova funcional não mostrar alterações, o paciente pode
ter alta hospitalar.
• Se, em algum dos exames realizado, houver alterações compatíveis com SCA,
o paciente deve ser tratado como ROTA 1.

2.6.3 ROTA 3

Nessa rota estão os pacientes com dor tipo C e sem alterações no eletrocardiograma.
Assim como os pacientes da rota 2, devem realizar de forma seriada a dosagem de
marcadores de necrose miocárdica e o ECG.

Caso todos os exames realizados tenham resultados negativos e o paciente não


possua outras queixas, deve-se realizar uma prova funcional/ergométrica. Se, mesmo
assim, a prova funcional não mostrar alterações, o paciente pode ter alta hospitalar.
Se, em algum dos exames realizado, houver alterações compatíveis com SCA, o
paciente deve ser encaminhado para a unidade coronariana, para ser tratado como
ROTA 1.
33

2.6.4 ROTA 4

Pacientes com dor tipo D e sem alterações verificadas no ECG podem receber alta da
unidade de emergência, caso não haja outra queixa relevante.

REFERÊNCIAS

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[database on the Internet]. Centers for disease control and prevention. 2005.

Owens PL, Barrett ML, Gibson TB, Andrews RM, Weinick RM, Mutter RL. Emergency department
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Epub 2010/04/03.

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Cardiovascular Medicine: Elsevier Health Sciences; 2011.

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Kontos MC, Diercks DB, Kirk JD. Emergency department and office-based evaluation of patients
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Judd E Hollander MC, Robert S Hockberger, Jonathan Grayzel. Evaluation of the adult with chest
pain in the emergency department. UPTODATE; 2016 [cited 2017];

Martins HSBN, Rodrigo Antonio; Scalabrini Neto, Augusto; Velasco, Irineu Tadeu. Emergências
Clínicas - Abordagem Prática. 12, editor: Manole; 2017. 1580 p.
34

CAPÍTULO 5

URGÊNCIAS E EMERGÊNCIAS HIPERTENSIVAS

Acadêmicos: Caio Henrique Yoshikatsu Ueda e Gabriel Koech Brati


Revisor: Dra. Letícia Concato

1 INVESTIGAÇÃO E QUADRO CLÍNICO

A avaliação inicial deve incluir uma boa anamnese e um bom exame físico, porém
sucintos. Alguns itens devem ser abordados, quando o paciente estiver estável, para
entender melhor a situação, incluindo: duração e gravidade de uma hipertensão
prévia; história prévia de lesão de órgão-alvo; uso de medicações anti-hipertensivas,
aderência terapêutica e controle da PA; uso de drogas simpaticomiméticas ou drogas
ilícitas.

Deve ser avaliada a PA nos dois braços, palpação de pulsos em todos os membros,
ausculta pulmonar, ausculta cardíaca, exame de fundo de olho, e avaliação do estado
neurológico. Apesar de pouco aplicável na prática, cabe aqui também pesquisar
sopros vasculares. Abaixo (Quadro 1), algumas patologias que podem causar
emergência hipertensiva e seus achados:
35

Quadro 1 - Achados de história e exame físico das diferentes emergências hipertensivas

Fonte: FILHO et al. (2008).

2 EXAMES COMPLEMENTARES

Para todos os pacientes com crises hipertensivas deverão ser solicitados os seguintes
exames gerais: hemograma completo, ureia, creatinina, sódio, potássio, parcial de
urina, radiografia de tórax, eletrocardiograma e glicemia capilar. E de acordo com a
suspeita clínica devem ser realizados exames específicos para cada patologia. A
seguir (Quadro 2), mostra-se alguns dos exames que podem ser solicitados conforme
a etiologia da crise hipertensiva.

Quadro 2 – Exames específicos conforme cada etiologia de crise hipertensiva.

Fonte: FILHO et al. (2008).


36

3 TRATAMENTO

Deve-se diferenciar a urgência da emergência hipertensiva, como mostrado abaixo no


Quadro a seguir:

Quadro 3 - Diferenças no diagnóstico, prognóstico e conduta nas UH e EH.

* LOA – lesão de órgão alvo

Fonte: MALACHIAS et. al. (2016)

É importante diagnosticar quadros clínicos críticos que necessitem de redução


imediata da PA, pois nestes pacientes recomenda-se o uso de anti-hipertensivos
parenterais. Paralelamente, deve-se investigar a presença de lesões de órgão alvo.
Na ausência de lesão aguda de órgão alvo, não se emprega o uso de medicações de
ação rápida (parenteral ou sublingual), sobretudo nos hipertensos prévios (crônicos)
devido ao risco de hipotensão sintomática e hipoperfusão de órgãos vitais.

Já em pacientes com emergência hipertensiva, deverão ser hospitalizados,


manejados inicialmente em sala de emergência com posterior encaminhamento para
a UTI. Solicita-se monitorização (oximetria de pulso, ECG e controle da PA), oxigênio
e acesso venoso para administração de fármacos. Durante todo manejo o paciente
deverá estar euvolêmico. Ainda nesse contexto, são pacientes de maior risco aqueles
com história de doença coronariana, insuficiência cardíaca, acidente vascular cerebral
ou doença renal crônica avançada.
37

3.1 URGÊNCIAS HIPERTENSIVAS

As UH são situações clínicas sintomáticas em que há elevação acentuada da PA


(segundo AHA PA>180/120 mm Hg, segundo SBC PAD ≥ 120 mmHg) sem lesão de
órgão alvo aguda e progressiva.

Após observação clínica em local calmo e afastar causas benignas do aumento de


PA, como dor e agitação, trata-se a crise hipertensiva com anti-hipertensivos orais.
Inibidores da ECA (captopril), clonidina e betabloqueadores são os mais utilizados. A
redução dos níveis pressóricos deverá ser realizada de forma gradual nas primeiras
24 a 48 horas. A redução abrupta da PA pode resultar em isquemia renal, cerebral e
coronariana.

3.2 EMERGÊNCIAS HIPERTENSIVAS

As EH são situações clínicas sintomáticas em que há elevação acentuada da PA


(segundo AHA PA>180/120 mmHg, segundo SBC PAD ≥ 120 mmHg) com lesão de
órgão alvo aguda e progressiva.

O objetivo é a redução rápida e controlada da PA, a fim de evitar lesão de órgãos alvo.
A recomendação é uma redução ≤ 25% na primeira hora, com posterior redução dos
níveis pressóricos para valores < 160/100-110 mmHg em 2 a 6 horas e reduzir para
135/85 mmHg nas próximas 24 a 48 horas. Entretanto, no manejo da emergência
hipertensiva há particularidades de acordo com o órgão acometido.

Segue abaixo causas frequentes de emergências hipertensivas:

3.2.1 Dissecção aguda de aorta

Desconfiar se: dor torácica de início agudo de forte intensidade, sintomas


adrenérgicos (palidez, sudorese, taquicardia), pulsos e/ou PA assimétricos em
membros superiores, sinais de tamponamento cardíaco e/ou derrame pleural,
sintomas neurológicos focais, entre outros.
38

Em sala de emergência, deve-se estabilizar o paciente. Monitorar, oxigenar, obter


aceso venoso e coletar exames. Incialmente, radiografia de tórax e ECG. Para
confirmação, TC de tórax (se paciente estável) ou ecocardiograma na sala de
emergência. Uma PAS ideal (120 mmHg) deve ser atingida em 20 minutos.

A terapêutica de escolha é nitroprussiato de sódio associado um betabloqueador


(metoprolol 5 mg EV repetir 10/10 min, se necessário até 20mg). Reduzir a FC em
torno de 60 bpm. O uso isolado do nitroprussiato de sódio não é recomendado, pois
aumenta FC e a velocidade de fluxo aórtico, podendo piorar o quadro de dissecção.
Morfina 2 a 4 mg EV até adequada analgesia.

3.2.2 Doença coronariana aguda

Pacientes com suspeita de SCA associado ao aumento da PA devem ser manejados


como emergência hipertensiva. Nestes pacientes, em resposta a isquemia do
miocárdio, há aumento da resistência vascular periférica (RVP) e da demanda de
oxigênio para musculatura cardíaca. Dessa forma, o uso de nitratos (venodilatadores)
reduz a RVP, reduz a pré-carga e o consumo de oxigênio miocárdico, melhorando o
quadro do paciente. Já o uso do nitroprussiato de sódio deve ser evitado devido a
teoria do roubo de fluxo coronariano, onde haveria desvio do sangue das áreas
isquêmicas para áreas com perfusão mantida em decorrência da vasodilatação
predominante de coronárias isentas de lesão ateromatosa significativa.

Deve-se solicitar um ECG o mais breve possível. Monitorizar, oxigenar, obter acesso
venoso e coletar exames. Inicialmente, nitrato sublingual e morfina EV. Seguido de
metoprolol 5 mg EV em 5 minutos e nitroglicerina EV contínuo (10 a 20 mcg/ minuto).
A nitroglicerina é contraindicado, se uso recente (24 a 48 horas antes) de inibidores
da fosfodiesterases. O betabloqueador deve ser evitado se sinais de insuficiência
cardíaca ou evidências clínicas de baixo débito cardíaco.

Após estabilização, ao menos 6 horas após o evento agudo, o inibidor da enzima de


conversão da angiotensina (IECA) é essencial, mesmo em pacientes normotensos,
pois age no remodelamento ventricular, melhorando assim o prognóstico do paciente.
39

Lembrar que o tratamento da hipertensão não substitui o manejo inicial da SCA, ou


seja, devem ocorrer concomitantemente. Esse se encontra no capítulo 4.

3.2.3 Edema agudo de pulmão cardiogênico

O progressivo aumento da PA, seguido de sobrecarga e estresse ventricular, culmina


na piora da função miocárdica (predominantemente diastólico) e no edema pulmonar
agudo. Constitui o quadro clínico: dispneia intensa, ansiedade, sudorese, má perfusão
periférica e cianose. Estes pacientes devem ser manejados na sala de emergência.
Deve ser solicitado ECG, radiografia de tórax, enzimas de necrose miocárdica e
exames gerais. Pode ser solicitado também ultrassom de beira de leito e dosagem de
BNP.

Monitorizar, oxigenar, obter acesso venoso e coletar exames. Ventilação não invasiva
precoce se necessário. Nitroprussiato de sódio EV é a droga anti-hipertensiva de
escolha (0,3 a 0,5 mcg/kg/min). Associa-se furosemida EV 2 a 4 ampolas (ampola =
20 mg), podendo ser repetida conforme resposta clínica. Amplamente utilizada, a
morfina não tem evidência bem esclarecidas para o manejo do edema agudo de
pulmão. O uso da morfina pode ser indicada para alívio sintomático em paciente com
dispneia grave, entretanto possui como efeitos colaterais possíveis o rebaixamento de
nível de consciência, bradicardia, hipotensão e depressão respiratória, principalmente,
em pacientes depletados. Se crise hipertensiva com PAS <180 mmHg, nitroglicerina
EV é opção.

3.2.4 Acidente vascular cerebral

O principal fator de risco para AVE é a HAS. Deve-se realizar o exame neurológico
completo, avaliar a gravidade pela escala do NIHSS (National Institute of Health Stroke
Scale), além de definir o caráter hemorrágico ou isquêmico. De maneira geral,
aproximadamente 85% dos casos de AVE são isquêmicos, apesar de a crise
hipertensiva ter grande associação com casos de AVE hemorrágicos. A TC de crânio
e a RNM esclarecem o tipo e área envolvida.
40

AVE hemorrágico: se PAS entre 150 e 220 mmHg e ausência de contraindicações,


recomenda-se a redução da PAS para 140 mmHg (na primeira hora com anti-
hipertensivo EV e monitorização da PA a cada 5 minutos). Já caso PAS > 220 mmHg,
recomenda-se a infusão contínua EV de anti-hipertensivo para redução agressiva da
PA e monitorização continua.

AVE isquêmico: pacientes sem indicação para trombólise e PA inicial > 220/120
mmHg, não se deve reduzir mais que 15 a 20% e deve-se manter PAD > 100 a 110
mmHg, nas primeiras 24 horas. Caso os níveis pressóricos com PAS ≤ 220 mmHg e
PAD ≤120 mmHg é consenso que não se deve instituir terapia anti-hipertensiva no
atendimento inicial. Considerar protocolo de trombólise depois do controle da PA. Em
pacientes com indicação para uso de trombolíticos e PA inicial > 185/110 mmHg,
deve-se reduzir a PA para <185/105 mmHg por pelo menos 24 horas após realização
do trombolítico.

Nos casos de hemorragia subaracnóidea (HSA), valem as mesmas recomendações


do tratamento do AVE hemorrágico. Entretanto, associa-se nimodipina como um dos
principais fármacos utilizado, pois reduz risco de infarto cerebral por vasoespasmo.

3.2.5 Encefalopatia hipertensiva

Ocorre quando a elevação aguda da PA supera o limite de auto-regulação do fluxo


sanguíneo cerebral. O hiperfluxo gera uma disfunção endotelial, quebra da barreira
hematoencefálica, edema cerebral e micro-hemorragias. Solicita-se TC para
diagnóstico diferencial com AVE. O paciente pode apresentar confusão mental,
letargia, cefaleia, distúrbios da visão e convulsão. O objetivo nesses casos é reduzir
a PA em torno de 20%. A droga de escolha é o nitroprussiato de sódio EV.

3.2.6 Hipertensão maligna

Neurorretinopatia associado com lesão renal aguda ou subaguda. O paciente


apresenta astenia, mal-estar, emagrecimento, sintomas cardiovasculares e
neurológicos. Nesses casos, recomenda-se nitroprussiato de sódio com redução de
41

20% em 2 horas, seguido de controle pressórico gradual em 2 a 3 dias com anti-


hipertensivos via oral.

3.2.7 Crise simpática

Ocorre devido a um excesso de catecolaminas. São exemplos de causas:


feocromocitoma (cefaleia, sudorese e hipertensão grave), uso comcomitante de
inibidores da MAO e alimentos com tiramina, uso de drogas ilícitas e interrupção
abrupta de anti-hipertensivos (clonidina e betabloqueadores).

No caso das drogas ilícitas (cocaína, crack, anfetaminas e ecstasy) a elevação da PA


se deve a ação simpaticomimética dessas substâncias. No geral, estão associados
também a ingesta de altas doses de cafeína (energéticos, nicotina, álcool), que agrava
o quadro. O tratamento dessas intoxicações deve incluir benzodiazepínicos,
alfabloqueadores (fentolamina – não disponível no Brasil) e bloqueadores de canal de
cálcio (segunda linha). O betabloqueador é contraindicado na suspeita de síndrome
coronariana por potencializar a isquemia devido à redução do bloqueio da estimulação
alfa-adrenérgica.

REFERÊNCIAS

MALACHIAS, M.V.B., SOUZA, W.K.S.B.; PLAVNIK F.L.; RODRIGUES C.I.S.; BRANDÃO A.A.; NEVES
M.F.T.; et al. 7ª Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial; Arquivos Brasileiros de Cardiologia; 2016;
107 (3); p. 79-82.

FEITOSA-FILHO, G.S.; LOPES, R.D.; POPPI, N.T.; GUIMARÃES, H.P. Emergências hipertensivas;
Revista Brasileira de Terapia Intensiva; 2008; 20(3); p.305-312.

MARTINS, H. S.; NETO, R. A. B.; VELASCO, I. T. Medicina de emergência: abordagem prática; 12ª
ed; São Paulo: Manole; 2017.

FURTADO, R. G.; COELHO, E. B.; NOBRE, F. Urgências e emergências hipertensivas; Medicina,


Ribeirão Preto, 36: 338-344, abr./dez. 2003.

FERREIRA, R. F.; JAZBIK, C. E.; BRANDÃO, A. A. Emergências Hipertensivas; Revista do Hospital


Universitário Pedro Ernesto; UERJ; Rio de Janeiro; 2008.
42

CAPÍTULO 6

INSUFICIÊNCIA CARDÍACA DESCOMPENSADA

Acadêmica: Ana Carolina Fernandes Dall’Stella de Abreu Schmidt


Revisor: Dra. Rosangela Fernandes de Abreu Schmidt

1 CAUSAS DE DESCOMPENSAÇÃO

A identificação do agente provocador da IC pode indicar algum tratamento específico,


inferir sobre o prognóstico e orientar a terapêutica medicamentosa do quadro. Alguns
dos fatores mais comumente associados à descompensação estão expostos no
quadro abaixo (Quadro 1).

Quadro 1 – Fatores de descompensação da IC

Fatores de descompensação da IC

Síndromes coronarianas agudas Piora da função renal

Hipertensão arterial não controlada Infecções, febre, hipoxemia

Embolia pulmonar Anemia

Fibrilação arterial aguda ou não controlada Descompensação do diabetes melito

Outras arritmias (taqui ou bradiarritmias) Hipo ou hipertireoidismo

Não adesão ao tratamento farmacológico Distúrbios hidroeletrolíticos

Ingestão excessiva de sódio e líquidos Gravidez

Consumo de álcool e abuso de drogas Falta de acesso à atenção primária

Uso de anti- inflamatórios e corticóides Falta de acesso a medicações efetivas para IC

Início recente de diltiazem, verapamil, Tratamento farmacológico inadequado


betabloqueadores ou antiarrítimicos
43

Fonte: MANGINI. 2013

2 MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS

O sintoma mais característico da ICD é a dispnéia. Outros sintomas frequentes são


ainda tosse paroxística noturna, sibilos ou estertores pulmonares e edema de
membros inferiores. Todavia, esses sintomas são pouco específicos, podendo estar
presentes em outras condições clínicas. Em contrapartida, a presença de terceira
bulha, ortopneia e dispneia paroxística noturna são sinais e sintomas, mas específicos
de IC.

Com base em achados de exame físico à beira do leito, é possível classificar o


paciente de acordo com o seu grau de congestão e perfusão, sendo tal classificação
importante para estratificação de risco e para a terapêutica do paciente. Vamos
chamar os pacientes que estão congestos de “úmidos” e os pacientes sem congestão
de “secos”. Pacientes com perfusão inadequada são classificados como “frios”,
enquanto que pacientes com boa perfusão são classificados como “quentes”. Dessa
maneira, são definidos quatro perfis clínico- hemodinâmicos: categoria A ( “quente” e
“seco”); categoria B (“quente” e “úmido”); categoria C (“ frio” e “úmido”, com pior
prognóstico); categoria L (“frio” e “seco”). No quadro abaixo (Quadro 2) encontra-se
essa mesma classificação de forma mais didática:

Quadro 2 – Classificação do paciente com IC

Perfusão + Perfusão -

Congestão + B C

Congestão - A L

*Legenda: A: quente e seco; B: quente e úmido; C: frio e úmido; L: frio e seco

Fonte: MANGINI. 2013


44

Para auxiliar na classificação do paciente é importante conhecermos ainda alguns


sinais e sintomas característicos de congestão e de má perfusão, expostos no quadro
abaixo (Quadro 3).

Quadro 3 – Sinais e sintomas

Evidências de má perfusão Evidências de congestão

Membros frios e pegajosos Pressão venosa jugular elevada

Pressão de pulso reduzida Crepitações

Sonolência B3

Hipotensão Edema/ ascite

Hiponatremia Ortopneia

Piora da função renal Reflexo hepatojugular

Fonte: MANGINI. 2013

3 DIAGNÓSTICO

Apesar do diagnóstico de ICD ser realizado com base na história e no exame físico, a
realização de exames complementares é importante, pois, além de confirmarem o
diagnóstico, fornecem dados sobre a etiologia, a causa da descompensação, a
existência de comorbidades e grau de remodelamento cardíaco. Dentre os exames
complementares existentes, os importantes no caso de ICD são:

• Eletrocardiograma (ECG): pode mostrar isquemia, sobrecarga de câmeras,


arritmias, bloqueios e sinais de pericardite.
• Raio-X de tórax: pode mostrar derrame pleural, pneumotórax, sinais de
congestão pulmonar, hiperinsuflação pulmonar e condensações pulmonares.
• Oximetria de pulso e gasometria arterial.
• Exames laboratoriais: hemograma, ureia, creatinina, glicemia, eletrólitos e urina
I podem ajudar a avaliar fontes de descompensação como doença renal,
anemia, distúrbios hidroeletrolíticos ou infecção.
45

• Troponinas: podem ser úteis na avaliação de pacientes com suspeita de SCA


associada. Na grande maioria dos casos de ICD as troponinas estarão
negativas, estando elevadas em casos mais graves (troponina aumentada em
paciente com IC indica pior prognóstico). Assim, é recomendável solicitar
troponinas como ferramenta para avaliação da gravidade da ICD
(recomendação I: evidência A).
• Ecocardiografia: poderá ser útil na avaliação de próteses, alterações
valvulares, trombos ventriculares, etc. Apenas solicitada em circunstâncias
especiais.
• Peptídeos natriuréticos (BNP/NT- proBNP): valores normais (baixos) excluem
IC descompensada e valores muito elevados apontam para IC com alto valor
preditivo positivo. Recomenda-se solicitar como suporte adicional ao
julgamento clínico.

4 TRATAMENTO

Em um primeiro momento, o objetivo do tratamento da ICD é a restauração


hemodinâmica e melhora dos sintomas. O tratamento deve ser individualizado e
respeitar os sinais e sintomas apresentados pelo paciente, bem como sua história
clínica e estado de perfusão/congestão. Assim, após a confirmação do diagnóstico
feita a partir da história, exame físico e exames complementares, é necessário
classificar o paciente com base em sua perfusão e presença ou não de congestão.
Uma vez feita essa classificação é possível iniciar medidas adequadas para o
tratamento do paciente. O quadro abaixo (Quadro 5) descreve de forma prática as
medidas de restauração para os pacientes com ICD em todos os cenários possíveis.

Quadro 5 - Tratamento

Perfil hemodinâmico Tratamento recomendado

Perfil A – quente e Recomendado o ajuste da medicação oral e tratamento de fatores


seco desencadeantes.
46

• Furosemida IV (1 a 2 ampolas)

Se PAM elevada usar nitroglicerina

Se PAM extremamente elevada usar nitroprussiato

Assim que possível iniciar vasodilatador oral

Perfil B – quente e Checar exames complementares


úmido

Considerar iniciar dobutamina

Se possível, iniciar furosemida IV

Perfil C – frio e úmido Considerar vasodilatador IV se a PA se elevar

Não prescreva diuréticos

Prescreva 250 ml de SF em 30% e reavalie

Perfil L – frio e seco Caso o paciente são responda ao volume considere inotrópicos ou
vasodilatadores

Fonte MANGINI. 2013

REFERÊNCIAS

Brasil. Ministério da Saúde. Datasus: morbidade hospitalar do SUS por local de internação – Brasil
[Internet]. Brasília (DF):Ministério da Saúde; c2008. [citado 2013 Set 18]. Disponível em:
http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi. exe?sih/cnv/niuf.def

Filippatos G , Parissis JT. Heart failure diagnosis and prognosis in the elderly: the proof of the
pudding is in the eating. Eur J Heart Fail 2011;13:467–471.

The CONSENSUS Trial Study Group. Effects of enalapril on mortality in severe congestive heart
failure. Results of the Cooperative North Scandinavian Enalapril Survival Study (CONSENSUS). N Engl
J Med 1987;316:1429–1435.

MANGINI, Sandrigo et al . Insuficiência cardíaca descompensada. Einstein (São Paulo), São Paulo
, v. 11, n. 3, p. 383-391, Sept. 2013 .

MW, Montera et al . II Diretriz Brasileira de Insuficiência Cardíaca Aguda. Arq. Bras. Cardiol., São
Paulo , v. 93, n. 3, supl. 3, p. 2-65, 2009 .

PEREIRA-BARRETTO, Antonio Carlos et al . O nível sérico de NT-proBNP é um preditor


prognóstico em pacientes com insuficiência cardíaca avançada. Arq. Bras. Cardiol., São Paulo
, v. 87, n. 2, p. 174-177, ago. 2006 .

MANGINI, Sandrigo et al . Insuficiência cardíaca descompensada na unidade de emergência de


hospital especializado em cardiologia. Arq. Bras. Cardiol., São Paulo , v. 90, n. 6, p. 433-
440, jun. 2008 .

Elkayam U, Janmohamed M, Habib M, Hatamizadeh P. Vasodilators in the management of acute


heart failure. Crit Care Med. 2008;36(1 Suppl):S95-105.
47

CAPÍTULO 7

ECG NA EMERGÊNCIA – ARRITMIAS

Acadêmico: Lucas Latchuk Martins


Revisor: Dr. Niraj Mehta

1 INTERPRETAÇÃO DO ECG

Taquiarritmias: taquicardia paroxistica supra ventricular, taquicardia ventricular,


fibrilação atrial, dentre outras.

Bradiarritimias: distúrbios na formação do impulso, distúrbios de condução do impulso


(Bloqueios atrio ventriculares).

• ‘’Milk the QRS’’: Começar a interpretação pelo complexo QRS promove a noção
do que está ocorrendo com a atividade elétrica ventricular. Se o QRS for normal
( QRS <120ms ) em pelo menos dois traçados do ECG, então o ritmo é
supraventricular. Se for anormal e largo ( QRS ≥ 120ms, ou seja, 3
quadradinhos no traçado), o ritmo é ou de origem ventricular ou
supraventricular com distúrbios na condução.
• “Cherchez le P”: Se após a análise do QRS, a origem arritmogênica ainda for
incerta, o próximo passo é procurar (‘’Cherchez’’) a onda P. Tal tarefa pode ser
complicada, especialmente em taquiarritmias. Para tanto, pode ajudar olhar a
derivação com menor disturbio na linha de base do ECG (com o menor
complexo QRS) – ‘’haystack principle’’. Outra observação que pode ajudar, é
verificar se há ondas P equidistantes de dois complexos QRS. Se sim, suspeitar
que há outras ondas P camufladas pelo complexo QRS, que podem ser
desmascaradas com manobras vagais - ‘’Bix rule’’.

Observar e confirmar enlace atrio ventricular (P-QRS): Verificar as relações entre as


ondas, se cada P precede um QRS, e se há intervalos entre as ondas (ex: ondas P
dissociadas de intervalos QRS no bloqueio atrioventricular total).
48

2 ABORDAGEM NA EMERGÊNCIA DE PACIENTE COM TAQUIARRITMIA

2.1 PACIENTE TAQUIARRITMICO COM PULSO

Algoritmo 1 – abordagem ao paciente taquiarritmico com pulso

CVE até 200 J bifásico (ou 360 J


monofásico). Se QRS estreito e regular,
considerar adenosina.

Legenda: CVE: cardioversão sincronizada. Sinais de instablidade hemodinâmica: Baixo débito


(palidez associado a hipotensão, enchimento capilar prejudicado, sudorese), baixo fluxo cerebral
(síncope, alteração no nível de consciência, confusão), isquemia (angina, padrão isquêmico no ECG),
falência de ventrículo esquerdo (congestão associado a dispneia, edema pulmonar).

Fonte: Martins. 2016

2.2 PACIENTE COM QRS ESTREITO

Algoritmo 2 – Resposta à adenosina

Legenda: BAV: bloqueio atrioventricular; FA: fibrilação atrial; TV: taquicardia ventricular

Fonte: Martins. 2016


49

Algoritmo 3 – tratamento de fibrilação atrial (o mesmo se aplica para flutter atrial, em linhas gerais).

FA: fibrilação atrial; H.instável/estável: hemodinamicamente instável/estável; CVE: Cardioversão


elétrica sincronizada; AVC: acidente vascular cerebral; ETE: ecocardiograma trans esofágico; IC:
insuficiência cardíaca; FE: fração de ejeção.

Fonte: Martins. 2016

2.3 ABORDAGEM DO PACIENTE COM QRS LARGO

Algoritmo 4 – Abordagem ao paciente com QRS largo

Legenda: TV: Taquicardia ventricular; FA fibrilação atrial; CVE: cardioversão elétrica sincronizado.
Sinais de instablidade hemodinâmica: Baixo débito (palidez associado a hipotensão, enchimento
50

capilar prejudicado, sudorese), baixo fluxo cerebral (síncope, alteração no nível de consciência,
confusão), isquemia (angina, padrão isquêmico no ECG), falência de ventrículo esquerdo (congestão
associado a dispneia, edema pulmonar).

Fonte:Martins. 2016

3 ABORDAGEM NA EMERGÊNCIA DE PACIENTE COM BRADIARRITMIA

Algoritmo 5 – abordagem de pacientes bradiarritmicos

Bradicardia (FC<50 bpm)

Legenda: FC: frequencia cardíaca; VA: Via aérea; TC: trans cutâneo; TV: trans venoso.Sinais de
instablidade hemodinâmica: Baixo débito (palidez associado a hipotensão, enchimento capilar
prejudicado, sudorese), baixo fluxo cerebral (síncope, alteração no nível de consciência, confusão),
isquemia (angina, padrão isquêmico no ECG), falência de ventrículo esquerdo (congestão associado
a dispneia, edema pulmonar).

Fonte: Martins. 2016

REFERÊNCIAS

Wagner, G. S., & Strauss, D. G. (2013). Marriott’s Practical Electrocardiography

Sociedade Brasileira de Cardiologia. (2009). Diretrizes sobre análise e emissão de laudos


eletrocardiográficos. Arquivo Brasileiro de Cardiologia, 93(3–2), 1–19. https://doi.org/10.1590/S0066-
782X2010001700001

OLIVEIRA, Reynaldo Gomes de. BLACKBOOK: CLÍNICA MÉDICA. 2. ed. Belo Horizonte: Blackbook,
2014. 810 p

MARTINS, Herlon Saraiva; BRANDÃO NETO, Rodrigo Antonio; VELASCO, Irineu Tadeu. Medicina de
Emergência: Abordagem Prática. 11. ed. Barueri: Manole, 2016. 1509 p.

2014 AHA/ACC/HRS guideline for the management of patients with atrial fibrillation.
51

CAPÍTULO 8

RADIOGRAFIA NA EMERGÊNCIA CLÍNICA

Acadêmica: Marina Machado Ramos


Revisor: Dr Filipe Furtado

1 EDEMA AGUDO DE PULMÃO

Imagem 1

Fonte – NACIF. 2013

-
O edema agudo de pulmão (EAP) consiste sobremaneira em uma urgência clínica,
caracterizado por um acúmulo de fluidos nos espaços alveolares e intersticiais dos
pulmões, desencadeando quadros de dispneia intensa, cianose e agitação, com
52

rápida evolução para depressão respiratória e, possivelmente, parada cardíaca. Entre


as principais etiologias tem-se as não cardiogênicas - como doenças venoclusivas,
fibrose pulmonar com fluxo elevado, hipervolemia e estenose congênita - e, sobretudo,
as cardiogênicas - insuficiência cardíaca congestiva descompensada, crise
hipertensiva, IAM, estenose mitral e cardioversão sincronizada, por exemplo.

As manifestações clínicas do paciente com EAP de origem cardiogênica, a mais


comumente encontrada, consistem em dispneia intensa, ortopneia, tosse, escarro
róseo, sudorese fria e sistêmica, palidez, agitação e uso da musculatura acessória. A
radiografia de tórax é imprescindível para a confirmação do diagnóstico, indicando
edema septal e intersticial, com a formação das linhas A, B e C de Kerley, edema peri-
hilar bilateral, também denominado de Sinal da Asa de Morcego ou Borboleta, que
corresponde ao edema alveolar. Muitas vezes, o padrão radiológico pode se
assemelhar ao da broncopneumonia.

As medidas inicias para os pacientes com EAP são oxigênio suplementar, diuréticos
potentes, como a Furosemida IV, vasodilatadores - exceto nos casos de hipotensão
pulmonar - e morfina.

2 PNEUMONIA

A pneumonia caracteriza-se por uma doença infecciosa que acomete alvéolos e


bronquíolos e pode ser subdividida em pneumonia adquirida na comunidade (PAC) e
nosocomial, aquela que surge até 48 horas após internação hospitalar. A
sintomatologia é caracterizada pela presença de tosse, expectoração, sudorese,
febre, mialgia e dor torácica. Nos idosos, no entanto, o quadro clínico pode ser menos
específico, com confusão mental, hiporexia e descompensação da doença de base,
por exemplo. A confirmação da suspeita clínica se dá por exames de imagem,
sobretudo, a radiografia de tórax.

O método de escolha, portanto, para a abordagem inicial da pneumonia é a radiografia


de tórax, que permite não só a confirmação diagnóstica, mas avalia ainda a gravidade
do quadro, o grau de acometimento multilobar, se há derrame pleural e abscessos,
por exemplo. Os principais achados radiográficos são: consolidação parenquimatosa,
53

infiltrado focal com aumento da radiodensidade, broncogramas aéreos e consolidação


alveolar. Quando presente, o infiltrado intersticial pode indicar etiologia viral.

Ademais, há outros métodos para avaliação da gravidade, como a presença de


hipoxemia e leucopenia, índices de Fine e CURB-65, que determina ainda a indicação
ou não de internamento hospitalar.

Imagem 2

Fonte – NACIF. 2013

Consensos preconizam que o tratamento


- da PAC deve ser empírico com o uso de
antibióticos, seja hospitalar ou ambulatorial, de início precoce, sem esperar o
resultado de culturas.

3 PNEUMOTÓRAX ESPONTÂNEO

O pneumotórax caracteriza-se pelo acúmulo de ar no espaço virtual entre as pleuras


visceral e parietal, podendo ser de origem traumática ou espontânea. O pneumotórax
espontâneo pode ser primário, acometendo, sobretudo, indivíduos jovens, quando não
54

há vigência de doença pulmonar desencadeante ou secundário - o mais comumente


encontrado -, proveniente de doença pulmonar prévia, como DPOC, por exemplo.

O quadro clínico típico do paciente com pneumotórax espontâneo consiste em dor


torácica pleurítica, dispneia, MV reduzido ou ausente, bem como timpanismo
acentuado à percussão e redução da expansibilidade no hemitórax comprometido.
Achados esses diretamente relacionados ao volume do pneumotórax.

Imagem 3

Fonte – NACIF. 2013


55

Na suspeita clínica do pneumotórax espontâneo, deve ser solicitada radiografia de


tórax como conduta imediata, diferentemente do pneumotórax hipertensivo, em que a
descompressão deve ser a primeira conduta impreterivelmente. O exame de imagem
permite ainda a avaliação de possíveis diagnósticos diferenciais, como
pneumomediastino, pneumonia e DPOC, por exemplo. O principal achado radiográfico
consiste na visualização da pleura viceral, que não é visível em condições normais.
Nos pneumotórax considerados pequenos, a separação da pleura visceral e parietal
pode ser percebida nas incidências radiográficas obtidas em expiração, em que o
volume pulmonar é reduzido mas o do pneumotórax permanece constante, ocupando
maior proporção em hemitórax.

Quando o paciente está em posição ortostática, o ar permanece em regiões supero-


laterais do hemitórax acometido, facilitando sua visualização. Em posição supina, no
entanto, o ar desvia para regiões basais e mediais, caracterizando o sinal do sulco
profundo, em que há aprofundamento do ângulo constofrênico.

O tratamento do pneumotórax espontâneo tem como fim último a reexpansão


pulmonar e depende sobremaneira da extensão da lesão e das condições
hemodinâmicas do paciente, podendo ser realizada de três formas distintas:
tratamento conservador, drenagem pleural com cateter e drenagem pleural com dreno
tubular.

4 TROMBOEMBOLISMO PULMONAR
56

Imagem 4

Fonte – NACIF. 2013

O tromboembolismo pulmonar (TEP) é caracterizado pela obstrução aguda da


circulação pulmonar devido à presença de coágulos provenientes, na maioria dos
casos, da circulação venosa dos membros inferiores. A suspeita clínica de TEP ocorre
nos pacientes com quadro clínico compatível e na presença de fatores de risco, como
traumatismo recente, fratura, hospitalização com imobilização por mais de 3 dias,
idade avançada e uso de anticoncepcionais orais, por exemplo. A sintomatologia pode
incluir taquidispneia, dor torácica pleurítica, taquicardia, tosse, estertores edema e dor
em membros inferiores.

A partir da suspeita clínica, deve ser determinado o grau de probabilidade de


confirmação diagnóstica por meio de escores e exames complementares, como
57

dímero-D e exames de imagem. O escore de Wells e o de Genebra são os mais


utilizados, levando em consideração achados da história clínica e exame físico para
estabelecer a probabilidade diagnóstica do TEP.

A radiografia de tórax é um importante exame inicial para avaliar os possíveis


diagnósticos diferenciais do tromboembolismo pulmonar, tendo em vista que não
apresenta achados radiográficos específicos o bastante para determinar isoladamente
o diagnóstico de TEP agudo. Entre os achados mais comuns tem-se atelectasia
laminar em base, elevação de cúpula diafragmática, oligoemia regional, aumento das
artérias pulmonares centrais e opacidade periférica em cunha. Classicamente dois
sinais podem ser identificados, o de Westermark e o da Corcova de Hampton. O
primeiro é o sinal da oligoemia regional, marcado por uma hipertransparência devido
à hipoperfusão distal ao êmbolo. E a Corcova de Hampton, por sua vez, é uma
consolidação periférica localizada no ângulo costofrênico, secundário à transudação
hemorrágica ou infarto pulmonar.

REFERÊNCIAS

SARAIVA MARTINS, H. et al. Pronto-Socorro: Condutas do Hospital das Clínicas da Faculdade


de Medicina da Universidade de São Paulo. Barueri: Editora Manole, 2007.

ANDRADE FILHO, Laert Oliveira; CAMPOS, José Ribas Milanez de; HADDAD, Rui. Pneumotórax. J.
bras. pneumol., São Paulo , v. 32, supl. 4, p. S212-216, Aug. 2006.

SOUZA JUNIOR, Arthur Soares de. Curso de diagnóstico por imagem do tórax: Capítulo II -
Imagenologia da pleura. J. Pneumologia, São Paulo , v. 25, n. 2, p. 102-113, Apr. 1999.

Mendonça RM, Jorge TC, Albuquerque FN. Tromboembolismo pulmonar: como eu trato. Revista
Hospital Universitário Pedro Ernesto. 2009;8(2):67-76.

LAUAND, Lygia de Souza Lima et al. Contribuição da interpretação da radiografia simples de tórax
na sala de emergência. Arq Med Hosp Fac Cienc Med Santa Casa São Paulo, São Paulo, v. 53, n. 2,
p.64-75, nov. 2008.
58

CAPÍTULO 9

DPOC EXACERBADA

Acadêmico: Niels Vinícius Pádua Carvalho


Revisor: Dr. Ricardo Alves

1 AVALIAÇÃO INICIAL

A exacerbação da DPOC pode ser definida como uma piora dos sintomas da doença
de base. Ela pode ser infecciosa ou não infecciosa, pode ser decorrente de outra
doença pulmonar ou não pulmonar que piore os sintomas de DPOC. Podemos,
portanto, usar vários critérios para definir uma exacerbação. Na prática e, ao longo
deste capítulo, consideraremos exacerbação da DPOC o quadro caracterizado
pela exacerbação dos sintomas próprios da doença (dispnéia, tosse,
expectoração), podendo esta exacerbação ser infecciosa (viral ou bacteriana)
ou não infecciosa. Exemplo de uma exacerbação infecciosa é a broncoinfecção (não
confundir com pneumonia), que é o “protótipo” da exacerbação aguda da DPOC.
Exemplo de uma exacerbação não infecciosa (ou pelo menos, inicialmente não
infecciosa) é a bronquite. Entenda-se por bronquite, neste caso, ao processo
inflamatório da via aérea, caracterizado por edema de mucosa com aumento da
secreção de muco, podendo haver broncoconstrição da musculatura lisa dos
brônquios, e que pode ser induzido por mudanças bruscas de temperatura ou
exposição a poluição atmosférica (material particulado, gases). O acúmulo de
secreção pode predispor à colonização bacteriana e à posterior broncoinfecção, bem
como uma bronquite viral pode preceder uma broncoinfecção bacteriana.

A avaliação inicial da DPOC exacerbada constitui um momento importante para


confirmar o diagnóstico, identificar possíveis causas que levaram a esse quadro,
incluindo as comorbidades e avaliar a severidade do quadro para definir a melhor
opção para tratamento.
59

Devemos estar atentos para o diagnóstico correto. Num paciente que já tem um
diagnóstico estabelecido de DPOC, ou seja, que conta na história que é portador da
doença ou que seu diagnóstico pode ser inferido pela história clínica (sintomas
crônicos, histórico de tabagismo, medicamentos que está usando, etc) é mais fácil
definir que se trata de uma exacerbação da DPOC. Mas, em um paciente que não tem
um diagnóstico prévio de DPOC, pode ser mais difícil diagnosticar a exacerbação.

O diagnóstico é baseado, praticamente e unicamente, na apresentação clínica do


paciente. Ou seja, num paciente com diagnóstico de DPOC, definem uma
exacerbação aguda infecciosa (broncoinfecção) os seguintes achados:

• Aumento da dispneia.
• Aumento no volume de expectoração ou quantidade de tosse.
• Presença de escarro purulento.

Normalmente estes pacientes não apresentam febre, não apresentam alterações


novas nas radiografias de tórax (sem consolidações) nem alterações infecciosas nos
exames laboratoriais iniciais (hemograma, proteína C reativa), o que não afasta a
indicação se antibióticos se preenchidos os critérios acima descritos.

A estratificação de risco dos pacientes varia entre diretrizes e protocolos, sendo


destacado a seguir a estratificação segundo as Diretrizes Brasileiras para o Manejo
da DPOC, publicado pela Socidade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (DPOC –
SBP), de 2016:

1.1 DPOC – SPB, 2016:

• Exacerbação leve à aumento do uso de beta agonistas de curta ação


(SABAs) caracterizado por 3 ou mais jatos adicionais por pelo menos 2
dias consecutivos.
• Exacerbação moderada à piora dos sintomas que requerem o uso de
corticoides e/ou antibióticos orais.
60

• Exacerbação grave à piora dos sintomas que querem o uso de


corticoides e/ou antibióticos por via endovenosa, tratamento
hospitalizado em enfermaria.
• Exacerbação muito grave à piora dos sintomas que põem em perigo a
vida do paciente e que requer uso e corticoides e/ou antibióticos por via
endovenosa e, por vezes, o uso de suporte ventilatório.

Dentre os diagnósticos diferenciais de uma exacerbação da DPOC, devemos pensar


em doenças pulmonares e não pulmonares. Dentre as pulmonares, devem ser
consideradas: tromboembolismo pulmonar, pneumonia, derrame pleural,
pneumotórax, obstrução da via aérea e broncoaspiração. Das não pulmonares, deve-
se pensar em: arritmias, insuficiência cardíaca, cardiopatias isquêmicas, crises de
pânico e uso de drogas.

Deve-se, ainda, ser feita a triagem para definir se o tratamento será hospitalar ou
ambulatorial. Dentre os critérios para hospitalização dos pacientes com crises de
DPOC, estão:

• Estratificação de risco em exacerbação grave ou muito grave.


• Paciente incapaz de cuidar de si próprio.
• Falha no tratamento ambulatorial ou no departamento de emergência.
• Comorbidades significativas, como pneumonia, diabetes, insuficiência hepática
e renal e disfunções cardiovasculares.
• História de 3 ou mais exacerbações no último ano.
• Presença de novos sinais, como cianose, alteração do nível de consciência,
edema periférico, respiração paradoxal, taquipneia com FR> 30 irpm.
• Hipoxemia grave (SpO2<90%) e hipercapnia com acidose respiratória.

2 TRATAMENTO DA DPOC EXACERBADA

Dentre os objetivos do tratamento da DPOC exacerbada, estão a redução dos


sintomas da agudização, retorno ao estado de saúde anterior à exacerbação e
prevenção de novas exacerbações. Dentre os manejos farmacológicos para a DPOC
61

exacerbada estão os broncodilatadores, os corticosteroides sistêmicos e os


antibióticos.

A monitorização desses pacientes deve incluir, entre outras coisas: FC, FR, SpO2
(saturação de oxigênio medida por oximetria de pulso) e PA. A gasometria arterial
muitas vezes é realizada para identificar possível acidose respiratória e confirmar a
saturação arterial de oxigênio (SaO2).

O tratamento pode incluir alguma ou todas as terapias abaixo:

2.1 OXIGENIOTERAPIA

Suplementação de oxigênio é importante para esses pacientes, uma vez que


apresentam um quadro de dispneia que pode ser auxiliado com essa medida. Deve-
se fornecer oxigênio suficiente para manter a saturação de O2 entre 88-92%, ou uma
PaO2 (gasometria) entre 60 e 70 mmHg. Uma reposição excessiva pode levar a uma
piora do quadro de hipercapnia. A escolha do dispositivo para suplementação de
oxigênio deve-se levar em conta a FiO2 que pretenda atingir e o fluxo de oxigênio que
se deseja, lembrando que esses pacientes, em sua maioria, não precisam de uma
FiO2 elevada para corrigir a hipoxemia.

2.2 AGONISTAS BETA-ADRENÉRGICOS DE CURTA DURAÇÃO

São os principais fármacos na terapia desses pacientes, devido a sua rápida ação e
eficácia na broncodilatação. Dentro do hospital esses fármacos são administrados
através de nebulização. Um dos fármacos mais utilizados dessa classe é o Sulfato de
Salbutamol e o fenoterol.

2.3 AGENTES ANTICOLINÉRGICOS

Há uma controvérsia na literatura sobre a otimização dos pacientes com DPOC


exacerbada quando os agentes anticolinérgicos são administrados juntamente aos
agonistas beta-adrenérgicos. Independente disso, os pacientes que precisam de
62

internação hospitalar normalmente utilizam agentes anticolinérgicos, como o brometo


de ipatrópio, em associação aos agonistas beta-adrenérgicos.

2.4 GLICOCORTICÓIDES SISTÊMICOS

Quando administrado juntamente ao tratamento broncodilatador com os beta-


agonistas e anticolinérgicos, os glicocordicóides melhoram a função pulmonar e
diminuem os sintomas pulmonares dos pacientes. Além disso, eles estão relacionados
a períodos de internação mais curtos. Estudos não mostratam diferença significativa
entre o uso por via oral ou intravenosa. Quanto a dose, o GOLD 2017 sugere um uso
equivalente a 40mg de prednisona por dia na maioria das exacerbações por 5 dias,
não excedendo 14 dias.

2.5 ANTIBIÓTICOS E ANTIVIRAIS

Embora a maioria das diretrizes recomendem o uso de antibióticos em pacientes com


uma exacerbação de moderada a severa que exija internação, o melhor fármaco e
tempo de uso não foram determinados. Essas decisões devem ser tomadas caso a
caso, através de estratificação de risco. Antivirais não são utilizados de rotina em
exacerbações da DPOC, salvo se associado a quadro de gripe (influenza) dentro das
recomendações usualmente aceitas para o tratamento da gripe.

2.6 VENTILAÇÃO MECÂNICA

Um suporte ventilatório pode ser necessário naqueles pacientes com exacerbação


severa, que apresentem dispneia severa, fatiga muscular e acidose respiratório. A
ventilação não-invasiva (VNI) pode ser a 1ª escolha para esses pacientes e, se não
conseguirem reverter o quadro, deve-se pensar em uma ventilação invasiva.

REFERÊNCIAS

VOGELMEIER, Claus F. et al. Global strategy for the diagnosis, management and prevention of
chronic obstructive lung disease 2017 report. Respirology, v. 22, n. 3, p. 575-601, 2017.

Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tissiologia. Diretrizes brasileiras para o manejo da DPOC.


2016, p. 1-144
63

STOLLER, James K. Management of exacerbations of chronic obstructive pulmonary disease.


UpToDate. 2017.
64

CAPÍTULO 10

TROMBOEMBOLISMO PULMONAR

Acadêmico: Álvaro Luiz Teixeira de Freitas


Revisor: Dr. Ricardo Alves

1 INTRODUÇÃO

O TEP é definido como a obstrução do fluxo arterial pulmonar por trombos de origem
na circulação venosa sistêmica. Sua fisiopatologia está diretamente ligada com a
trombose venosa profunda (TVP), pois aproximadamente 79% dos pacientes com
TEP possuem um quadro concomitante de TVP e cerca de 50% dos pacientes com
trombose venosa profunda evoluem para TEP.

2 FISIOPATOLOGIA E FATORES DE RISCO

Para abordar a fisiopatologia do TEP, precisa-se conhecer a fisiopatologia da


formação de trombos, que compreende à tríade de Virchow: estase venosa,
hipercoagulabilidade e lesão endotelial. Esses três fatores são os que predispõem o
paciente à formação de trombos e estão relacionados a situações a que o paciente é
submetido (como cirurgias e imobilizações por um longo período) ou fatores
predisponentes do próprio paciente, relacionados na tabela a seguir:
65

Tabela 1 – Fatores de risco para TEP

Fonte: Povoa. 1996

A partir da formação do trombo, uma vez que ele se desprende e acompanha a


circulação, o TEP ocorre quando esse trombo obstrui o fluxo arterial pulmonar.

As principais repercussões fisiopatológicas do TEP são hemodinâmicas e ocorrem


após 30-50% de obstrução do leito arterial pulmonar, ocasionando em aumento da
pressão da artéria pulmonar, que pode levar à falência do ventrículo direito e,
consequentemente, à morte. Um achado fisiopatológico importante é o efeito de
espaço morto, que corresponde ao achado de áreas pulmonares bem ventiladas, mas
mal perfundidas. O infarto pulmonar é menos frequente, visto que os pulmões
possuem irrigação arterial dupla.
66

3 QUADRO CLÍNICO

Os sintomas são pouco específicos e o quadro clínico é bastante variável, o que


dificulta o diagnóstico. O principal achado é dor torácica do tipo pleurítica associada a
dispneia e taquipneia, podendo ou não serem acompanhadas de hemoptise. Sintomas
de baixo débito como síncope ocorrem quando há uma obstrução mais importante.
Outro achado importante é o edema unilateral de membros inferiores, indicando TVP.
Os sinais e sintomas podem ter início súbito ou ter uma evolução mais longa, como
dias ou até semanas, dependendo da gravidade do quadro.

De forma bastante simplificada e didática poderíamos dividir as apresentações


clínicas em TEP pequeno, acometendo ramos arteriais periféricos; TEP maciço,
acometendo tronco da artéria pulmonar e/ou artérias pulmonares de maior calibre e
um TEP moderado, algo situado entre os dois extremos.

No quadro de TEP pequeno / periférico, os principais sintomas seriam a dor torácica


tipo pleurítica e a hemoptise, sem causar instabilidade hemodinâmica, dispnéia ou
hipoxemia. Nestes casos o diagnósico é mais difícil e atualmente tem se questionado
até a necessidade de tratamento com anticoagulação oral. O TEP maciço se
apresenta como um quadro grave, com hipoxemia, colapso circulatório, dispneia,
hipoxemia e risco iminente de morte. Já o quadro moderado situando-se entre estes
extremos – dispneia leve a moderada, com algum grau de hipoxemia, sem colapso
circulatório. Obviamente, a condição clínica prévia do paciente influencia na
exuberância dos sinais e sintomas. Num indivíduo de idade mais avançada e/ou com
insuficiência cardíaca grave, por exemplo, mesmo um TEP relativamente pequeno
pode causar grande instabilidade e, no outro extremo, num paciente jovem e hígido,
mesmo um evento mais grave pode não se traduzir num quadro tão crítico.

4 ESCORES DE DIAGNÓSTICO

Todo paciente com suspeita de TEP deve ser submetido a avaliação clínica para
estratificação da probabilidade pré-teste do diagnóstico antes dos exames
complementares. Para isso, há dois escores principais: o de Wells e o de Genebra
67

modificado. Ambos reúnem sinais e sintomas clínicos para a estratificação e o mais


usado é o escore de Wells, exemplificado na tabela a seguir:

Tabela 2 – Escore de Wells

Fonte: Martins. 2013

5 PRINCIPAIS EXAMES COMPLEMENTARES

5.1 ELETROCARDIOGRAMA

O ECG é útil na sala de emergência para descartar principalmente alterações


isquêmicas do miocárdio como diagnóstico diferencial de dor torácica. O achado mais
comum é a taquicardia sinusal.

No TEP pode indicar sobrecarga de VD (ventrículo direito) com o padrão S1Q3T3


(onda S em DI, onda Q em DIII e inversão da onda T também em DIII), mostrado na
figura 1, embora esse padrão não seja encontrado na maioria dos pacientes.
68

Figura 1 – Padrão eletrocardiográfico da sobrecarga de VD

5.2 RAIO X DE TÓRAX

Também faz parte do protocolo de dor torácica para diagnóstico diferencial de


patologias como dissecção de aorta e, no TEP, pode ser totalmente normal, mas
podem ser encontrados derrame pleural, atelectasias, dilatação da artéria pulmonar,
sinal de Westmark (hipoperfusão na área próxima ao trombo), áreas
hipotransparentes em cunha (indicando infarto pulmonar).

5.3 ECOCARDIOGRFIA

Podem ser encontrados sinais de hipertensão pulmonar pelo valor estimado da PSAP
(pressão sistólica da artéria pulmonar). Além de avaliar o grau de comprometimento
do ventrículo direito (a dilatação de VD é encontrada em até 25% dos pacientes com
TEP, mas deve-se atentar ao diagnóstico diferencial de doenças estruturais do
coração preexistentes).

5.4 D-DÍMERO

Produto da degradação da fibrina está aumentado em condições com formação de


trombos. Sua sensibilidade é de 97%, com especificidade de 42%, tornando-o um
teste com alto valor preditivo negativo para pacientes de baixa probabilidade pré-teste,
isto é, com um D-dímero negativo, as chances de o diagnóstico ser TEP são baixas.
69

5.5 ARTERIOGRAFIA PULMONAR

Por muito tempo foi o método diagnóstico de escolha, porém tem perdido espaço para
a angiotomografia, por ser um teste invasivo, necessitando da cateterização das
artérias pulmonares e da exposição do paciente a uma quantidade muito alta de
radiação. Hoje, seu uso é reservado para casos selecionados, em que os outros
métodos diagnósticos são contraindicados.

5.6 ANGIOTOMOGRAFIA DE TÓRAX

É o exame de escolha para o diagnóstico. É rápido, exclui outros diagnósticos


diferenciais e não é invasivo. Permite avaliar, também, o VD e estruturas adjacentes,
além do tamanho do trombo, podendo ser usada na estratificação do risco e no
prognóstico do paciente. Possui alta sensibilidade para TEP maciço ou moderado e
baixa sensibilidade para o TEP periférico. Portanto, frente a um quadro grave, com
instabilidade hemodinâmica, uma angiotomografia normal afasta o diagnóstico de
TEP, pois um quadro periférico não seria responsável pela instabilidade do paciente.

6 TRATAMENTO

Primeiramente, deve-se focar na estabilização inicial. Normalmente se faz necessário


o uso de O2 e, em casos mais graves, de ventilação mecânica. Para instabilidade
hemodinâmica, avalia-se a necessidade de aminas vasoativas, visto que a reposição
volêmica pode diminuir ainda mais o débito cardíaco por conta da dilatação do
ventrículo direito.

O pilar principal do tratamento é a anticoagulação plena. Se não hover


contraindicaçõs, deve ser iniciada imediatamente a partir do momento do diagnóstico,
mesmo que não confirmado. A anticoagulação é feita inicialmente com heparina não
fracionada ou heparina de baixo peso molecular (enoxaparina), podendo, conforme o
quadro, ser iniciado anticoagulantes orais já a partir do segundo dia. Dentre estes
podemos optar por anticoagulantes inibidores da vitamina K (varfarina) ou novos
anticoagulantes (rivaroxabana, dabigatrana, apixabana). Para a varfarina a dose deve
ser ajustada conforme o RNI alvo é entre 2,0 e 3,0. Os novos anticoagulantes
70

dispensam controles laboratoriais para titulação de dose. Para os pacientes


hemodinamicamente instáveis, há indicação de tratamento com trombolíticos nas
primeiras 48h. No entanto, deve-se pesar as contraindicações do uso dessas drogas,
relacionados no quadro a seguir:

Tabela 3 – Contra-indicações ao uso de trombolíticos

Fonte: Volpe. 2010

REFERÊNCIAS

MARTINS, Herlon Saraiva et al. Emergências clínicas: abordagem prática. Manole, 2013.

CARAMELLI, Bruno et al. Diretriz de embolia pulmonar. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, v. 83, p.
1-8, 2004.

PÓVOA, Rui. Tromboembolismo Pulmonar. Quadro Clínico e Diagnóstico. Arq Bras Cardiol, v. 67,
n. 3, p. 197-199, 1996.

VOLPE, Gustavo Jardim et al. Tromboembolismo pulmonar. Medicina (Ribeirao Preto. Online), v. 43,
n. 3, p. 258-271, 2010.
71

CAPÍTULO 11

HEMORRAGIA DIGESTIVA AGUDA

Autor: Jhony Maciel de Oliveira

Revisor: Dr. Alcindo Pissaia Júnior

1 HDA

1.1 INTRODUÇÃO

Definida como perda de sangue proximal ao ângulo de Trietz a hemorragia digestiva


alta (HDA) tem como manifestações mais comuns a hematêmese, melena e vômito
tipo borra de café, podendo ter ou não repercussões hemodinâmicas. Dependendo do
volume do sangramento podem estar presentes tanto hematoquezia como sangue
oculto nas fezes.

1.2 ETIOLOGIA

Quanto à etiologia, a HDA é classicamente dividida de acordo com a origem em


varicosa, que é frequentemente causada por ruptura de varizes de esôfago devido à
hipertensão porta, e não varicosa, que possui diversas causas como: síndrome de
Mallory-Weiss, lesões neoplásicas, anomalias vasculares, lesões erosivas da mucosa,
não esquecendo sua principal gênese, a úlcera péptica. A mortalidade varia de acordo
com a etiologia sendo mais alta no sangramento varicoso. São fatores de risco
associados à mortalidade: idade, hipotensão inicial, alteração do estado mental,
ressangramento, sangramento ativo durante hospitalização, necessidade de uso de
drogas vasoativas e comorbidades do paciente.

1.3 MANEJO INICIAL

O paciente com HDA deve ser tratado como um politraumatizado devido à gravidade
do quadro, dessa forma inicia-se com o controle da via aérea e ventilação adequada,
72

podendo ser necessária a intubação orotraqueal em pacientes com alteração de nível


de consciência e hematêmese maciça seguindo, só então, para o manejo do estado
hemodinâmico do paciente. Inicialmente a intensidade do sangramento é classificada
de acordo com a perda estimada de sangue (tabela 1) e conforme sinais e sintomas
de hipovolemia.

Após determinação da intensidade da HDA, realiza-se a reposição volêmica de acordo


com a estimativa de perda sanguínea. Para perdas de até 1500 ml de sangue a
reposição com cristaloide é a recomendada, acima disso pode ser necessário
hemotransfusão. Certo grau de cautela é necessário para a ressuscitação volêmica,
uma vez que a reposição exagerada de fluidos pode levar a novos sangramentos ou
exacerbar os ativos, vale lembrar que pacientes cirróticos podem apresentar, mesmo
sem sangramento, taquicardia e pressão arterial baixa.

TABELA 1 – GRAVIDADE DO SANGRAMENTO DA HDA

Perda
Pressão Frequência
Hemoglobina Sintomas sanguínea
arterial cardíaca
(Volume)

Leve Normal < 100 bpm Normal Tontura <500 ml

Sincope, sede,
Moderada Diminuída 100-120 bpm < 10 g/dl 500-1500 ml
oligúria

Sistólica
Confusão,
Grave >120 bpm <7 g/dl >1500 ml
extremidades frias
<80mmHg

FONTE: ADAPTADO DE ALVES E RODRIQUES, 2008 E BAI E LI, 2016

.
A meta da reposição volêmica deve ser PA sistólica de 90-100 mmHg, para a
reposição de concentrado de hemácias a meta é manter a hemoglobina acima de 7g/dl
em pacientes jovens, ASA I/II, entre 7-8g/dl em cirróticos e acima de 9g/dl para idosos,
pacientes com baixa reserva fisiológica ou com comorbidades importantes (ex. ICC).
73

O desaparecimento dos sinais e sintomas de choque hipovolêmico e uma diurese >30


ml/hora são indicativos de reposição volêmica efetiva.

A reposição de plasma fresco é necessária em pacientes com distúrbio de coagulação


documentado (RNI >1,5) e a infusão de plaquetas é sugerida no caso de
plaquetopenia abaixo de 50.000/mm3 na vigência de sangramento ou para profilaxia
caso abaixo de 10.000/mm3, no caso de pacientes cirróticos o RNI não é um indicador
confiável e essas recomendações não se aplicam.

1.4 DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO

Uma anamnese bem feita é crucial para determinação da etiologia da HDA, pacientes
cirróticos compensados ou não nos levam a pensar em etiologia varicosa assim como
pacientes com história ou provenientes de áreas endêmicas de esquistossomose.
Múltiplos episódios de vômitos podem estar associados à síndrome de Mallory-Weiss;
histórico de H. Pylori pode sugerir úlceras ou causas neoplásicas e o uso crônico ou
abusivo de anti-inflamatórios podem predispor a úlceras.

A terapia farmacológica, utilizada principalmente para sangramento varicoso ou em


HDA não varicosa incontrolável, consiste em vasoconstritores esplâncnicos, como
vasopressina e somatostatina e seus respectivos análogos, e venodilatadores. O
octreotide, análogo da somatostatina, é seguro e pode ser usado continuamente por
até mais de 5 dias.

A endoscopia digestiva alta (EDA) é o método de diagnóstico de primeira escolha,


pois além de conseguir identificar o foco e possivelmente definir a etiologia do
sangramento, oferece a possibilidade de tratamento sendo associada à diminuição do
risco de ressangramento, da necessidade de cirurgia e da mortalidade. Deve ser feita
tão logo quando possível após a estabilização inicial do paciente e preferencialmente
dentro das primeiras 24 horas do sangramento. A lavagem do estômago com sonda
nasogástrica pode ser utilizada como preparo para o procedimento endoscópico,
paciente crítico deve ser monitorado durante o procedimento e nos casos de evidência
de ressangramento uma segunda endoscopia pode ser necessária.
74

1.4.1 HDA NÃO VARICOSA

Um inibidor de bomba de prótons (IBP) deve ser utilizado no sangramento de origem


não varicosa, pois atua na estabilização do coágulo e diminui a proporção de
pacientes com estigmas de alto risco de sangramento reduzindo a necessidade de
intervenção endoscópica embora não diminua os índices de ressangramento e
mortalidade. O omeprazol pode ser utilizado na via endovenosa tanto na forma de
bolus seguido de infusão contínua como de forma intermitente. Após confirmação da
etiologia ulcerosa do quadro o IBP deve ser mantido na forma endovenosa por 72
horas alterando então sua administração para via oral.

Anti-inflamatórios não esteroidais não devem ser utilizados durante a fase aguda do
sangramento, o ácido acetilsalicílico como terapia antiagregante deve ser
descontinuado até que a hemostasia seja conseguida e reintroduzido após 1 – 3 dias
caso prevenção de eventos trombóticos seja necessária, o uso de clopidogrel e
antitrombóticos depois de conseguida a hemostasia deve ser avaliado caso a caso.

O tratamento cirúrgico (figura 1) é opção para pacientes que apresentem sangramento


continuo com falha do tratamento endoscópico e farmacológico.

FIGURA 1 - MANEJO HDA NÃO VARICOSA

FONTE: ADAPTADO DE BAI E LI, 2016


75

1.4.2 HDA VARICOSA.

No caso de sangramento de origem varicosa em até 50% dos pacientes um quadro


infeccioso pode estar presente, ou durante a apresentação inicial ou durante a estadia
hospitalar, sendo assim, é recomendável um rastreio infeccioso com hemocultura,
parcial de urina, radiografia de tórax e analise do liquido ascítico. Se ascite presente,
a profilaxia com antibióticos de amplo espectro deve ser considerada.

Nos pacientes cirróticos a antibioticoprofilaxia deve ser instituída desde a admissão,


a escolha do medicamento apropriado leva em conta o risco individual do paciente e
o padrão de resistência do serviço. No caso de cirrose avançada o uso de ceftriaxona
pode ser uma boa escolha quando a profilaxia com quinolona já fora instituída.
Pacientes Child-Pugh A tem baixo risco infecção bacteriana e de mortalidade,
entretanto, não existe consenso de quando a profilaxia pode ser evitada. A prevenção
de encefalopatia hepática pode ser feita com lactulose ou rifaximina.

Para sangramento de varizes esofágicas a falha terapêutica fica em torno de 10 - 15%


sendo mais frequente em pacientes com cirrose descompensada, nessa situação, a
insuflação de balão esofágico é uma alternativa. O balão de Sengstaken-Blakemore,
embora tenha alta incidência de severos efeitos adversos, controla o sangramento em
até 90% dos casos com índice de recidiva de 50%, pode permanecer insuflado por
até 24 horas, com monitoração e considerando intubação orotraqueal, devido ao risco
de lesão isquêmica do esôfago, consiste, portanto, como um tratamento de espera
para o tratamento definitivo (figura 2) nos casos de sangramento esofágico refratário
e de grande monta. O TIPS (Transjugular intrahepatic portosystemic shunt) diminui a
pressão no sistema porta e apresenta vantagens em relação à morbimortalidade
quando comparado com shunts cirúrgicos.
76

FIGURA 2 - MANEJO DA HDA VARICOSA

FONTE: ADAPTADO DE COELHO ET AL, 2014

2 HDB

2.1 INTRODUÇÃO

A hemorragia digestiva baixa (HDB) é classicamente definida como sangramento por


fonte distal ao ângulo de Treitz. Podemos classificá-la como aguda quando tem
duração menor que três dias, que pode resultar em instabilidade hemodinâmica e em
anemia com possível necessidade de transfusão sanguínea. A forma crônica é
definida como a passagem de sangue pelo reto por muitos dias sendo uma perda de
sangue intermitente ou em um sangramento contínuo e lento.

2.2 DIAGNÓSTICO

A apresentação clínica, em casos de sangramento intenso ou de origem mais distal,


se dá por hematoquezia que pode variar de vermelho brilhante até coágulos escuros
ou como melena em casos de sangramentos lentos ou de origem proximal. A HDB é
77

menos grave, mais intermitente e cessa de forma espontânea mais frequentemente


que a HDA.

A lesão esta localizada no cólon em mais de 90% das vezes embora a fonte do
sangramento pode não ser identificada em 15% dos casos. As principais causas de
HDB aguda são a doença diverticular e as angiodisplasias enquanto que na forma
crônica predominam as doenças neoplásicas e as hemorroidas (tabela 2).

TABELA 2 - PRINCIPAIS ETIOLOGIAS DA HEMORRAGIA DIGESTIVA BAIXA

Etiologia %

Divertículos 20 – 65

Colite isquêmica 1 – 19

Angiectasia 3 – 15

Doença inflamatória intestinal 5 – 11

Neoplasia 7 – 10

Doenças anorretais 4–9

Causas desconhecidas 9 - 12

FONTE: ADAPTADO DE HREINSSON ET AL, 2013, LONGSTRETH, 1997 E SHABANA, 2014

Na anamnese, além de caracterizar o sangramento, busca-se por dor abdominal e


diarreia (que podem sugerir colite), alteração de hábitos intestinais e perda de peso
(neoplasia), eventos similares anteriores, cirurgias abdominais ou vasculares, úlceras,
radioterapia, medicamentos que podem influenciar no risco de sangramento como
AINES, anticoagulantes, antiagregantes e por comorbidades que possam influenciar
no desfecho.

O exame físico deve incluir sinais vitais buscando por possível hipovolemia, exame
cardiopulmonar, abdominal e exame digital do reto para evidenciar possíveis causas
78

anorretais. O exame laboratorial inicial conta com hemograma, eletrólitos, testes de


coagulação, provas hepáticas e renais, sempre levando em consideração as
comorbidades do paciente.

2.3 MANEJO

A primeira necessidade é determinar se uma intervenção urgente é necessária ou não.


A maioria dos pacientes a HDB, que se manifesta na forma crônica, como sangue
oculto nas fezes ou hematoquezia escassa, pode ser investigada ambulatorialmente.
Já o paciente com sinais de sangramento agudo, com comorbidades significativas ou
idoso requer tratamento hospitalar. Todo paciente deve passar por uma anamnese
focada e exame físico e laboratorial buscando determinar a localização da lesão e
possível etiologia.

Pacientes com sangramento severo em andamento ou com sinais de instabilidade


hemodinâmica podem precisar de acompanhamento em UTI. Hematoquezia com
instabilidade hemodinâmica pode sugerir uma HDA e uma EDA deve ser realizada, o
aspirado ou a lavagem nasogástrica podem ser utilizados em casos selecionados,
mas não de rotina, principalmente quando a hipótese de HDA não é tão forte.

A ressuscitação com reposição volêmica é prioridade em pacientes com instabilidade


hemodinâmica. A meta é normalizar a pressão arterial e frequência cardíaca, a
hemoglobina deve ser mantida acima de 7g/dl em pacientes hígidos e acima de 9 g/dl
em pacientes com comorbidades severas.

A colonoscopia é o procedimento inicial para diagnostico de HDB na maioria dos


casos. Ela tem vantagem importante em relação a outros métodos, é tanto diagnostica
quanto terapêutica, entretanto na vigência de sangramento ou instabilidade
hemodinâmica é difícil fazer o preparo adequado do cólon o que dificulta a
visualização e impede o tratamento, nesses casos a angiografia ou a cirurgia,
dependendo da possível etiologia, podem ser melhores indicações.

Na literatura não existe consenso sobre a abordagem da HDB aguda, STRATE sugere
o fluxo descrito na figura 3.
79

FIGURA 3 - MANEJO DA HDB AGUDA

FONTE: ADAPTADO DE STRATE E GRALNEK, 2016


80

REFERÊNCIAS

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na medicina baseada em evidências. Rev. Fac. Ciênc. Méd. Sorocaba, Sorocaba, v. 10, n. 1, p. 5-10,
jan. 2008.

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ANDREI, G. N. et al. Highlighted Steps of the Management Algorithm in Acute Lower Gastrointestinal
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BARACAT, F. et al. Endoscopic hemostasis for peptic ulcer bleeding: systematic review and meta-
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set. 2015.

BITTENCOURT, P. L. et al. Variceal bleeding: consensus meeting report from the Brazilian Society of
Hepatology. Arq Gastroenterol, Salvador, v. 24, n. 2, p. 202-216, abr./jun. 2014.

CLERC, D. et al. Lower gastrointestinal bleeding—Computed Tomographic Angiography, Colonoscopy


or both?. World Journal of Emergency Surgery, Lausanne - Switzerland, v. 12, n. 1, jan. 2017.
Disponível em: <https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5215140/>. Acesso em: 01 out. 2017.

COELHO, F. F. et al. Tratamento da hemorragia digestiva alta por varizes esofágicas: conceitos atuais.
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Royal College of Physicians, London, v. 15, n. 5, p. 481-485, out./201.
81

CAPÍTULO 12

COMPLICAÇÕES AGUDAS DO DIABETES

Acadêmica: Caroline Boschetto

Revisão: Dr. Bruno Ribeiro Batista

1 INTRODUÇÃO

Existem, de modo geral, dois tipos de complicações agudas do diabetes: hipoglicemia


e hiperglicemias (que incluem cetoacidose diabética e estado hiperglicêmico
hiperosmolar).

2 CRISES HIPERGLICEMICAS AGUDAS

Cetoacidose diabética (CAD) e estado hiperosmolar hiperglicêmico (EHH) são as duas


principais complicações graves, associadas ao diabetes melito. Diferem entre si de
acordo com a presença e cetoácidos, grau de hiperglicemia e de desidratação e
manifestações clínicas. Apesar de diferentes, possuem pontos chave para o
tratamento que é semelhante.

2.1 CETOACIDOSE DIABÉTICA (CAD)

2.1.1 Definição

Complicação aguda, típica (mas não exclusiva) do paciente diabético do tipo 1. Define-
se por hiperglicemia com cetonemia e acidose metabólica com ânion gap elevado.
Desencadeada por deficiência absoluta de insulina, por vezes ao diagnóstico e
primeira manifestação do diabetes e noutras por má aderência ao uso da insulina.
Doenças agudas (IAM, AVE, queimaduras, hemorragias digestivas, pancreatite), uso
de medicações (corticoides, antipsicóticos atípicos) e ingesta excessiva de álcool
também podem precipitar cetoacidose.
82

2.1.2 Diagnóstico

Muitas vezes o início é abrupto, mas pode apresentar pródromos de poliúria,


polidipsia, polifagia e mal estar indefinido (como fraqueza acentuada, náuseas,
vômitos). Outros achados incluem hálito cetônico, taquipneia (em situações mais
graves, respiração de Kussmaul), desidratação, dor abdominal (51% dos casos).

A desidratação intensa torna doloroso o deslizamento dos folhetos da pleura e do


peritônio, sendo possível observar defesa muscular abdominal localizada ou
generalizada, devendo ser importante o diagnóstico diferencial de abdômen agudo
inflamatório.

2.1.2.1 Critérios diagnósticos

a. Glicemia ≥ 250 mg/Dl


b. pH arterial ≤ 7,3
c. Bicarbonato sérico ≤ 15 mEq/l
d. Graus variáveis de cetonemia.

Em alguns casos, a glicemia pode encontrar-se normal ou levemente alta, em razão


do uso prévio e inadequado de insulina, uso de medicamentos glicosúricos ou
ingestão de álcool.

2.2 ESTADO HIPERGLICÊMICO HIPEROSMOLAR (EHH)

2.2.1 Definição

Hiperglicemia que, habitualmente, ocorre no diabetes do tipo 2. Causada por


quantidade insuficiente de insulina ou resistência insulínica diminuindo a utilização da
glicose nos tecidos periféricos, porém de maneira suficiente para impedir a lipólise e
cetogênese.
83

2.2.2 Diagnóstico

A hiperglicemia em geral se instala de maneira insidiosa, causando desbalanço entre


ingesta de líquidos e diurese. A hiperglicemia aumenta a diurese, tornando o balanço
hídrico negativo. Pacientes acamados, com demência prévia ou sequelas
neurológicas estão mais vulneráveis pelo mecanismo de sede ser menos efetivo. Em
idosos, o principal fator desencadeante é infecção, sendo as mais frequentes as do
trato respiratório superior, as pneumonias e as infecções de vias urinárias, bem como
quadros de diarreia e vômitos. Essas doenças agudas aumentam a resistência
insulínica, ao mesmo tempo que precipitam quadros de delirium. Casos não
infecciosos destacam-se os eventos cardiovasculares (AVE e IAM).

Alguns fatores podem auxiliar no diagnóstico entre CAD e EHH. A faixa etária mais
encontrada é superior a 40 anos, bem maior se comparada a CAD. Para EHH, o
quadro clínico é mais arrastado – os sintomas relacionados à poliúria, polidipsia,
astenia e desidratação bem acentuada costumam ocorrer durante semanas. Pode
apresentar sinais de déficit neurológico, seja focal ou mesmo sonolento e comatoso
(coma é mais frequente no EHH).

2.2.2.1 Critérios diagnósticos:

a. Glicemia > 600 mg/dl


b. Osmolalidade sérica > 320 mOsm/kg
c. Bicarbonato ≥ 15 mEq/l
d. Discreta cetonemia

2.3 EXAMES COMPLEMENTARES PARA CRISES HIPERGLICÊMICAS:

Os seguintes exames auxiliam no diagnóstico das hiperglicemias. Dependendo do


quadro clínico outros exames podem ser solicitados, assim como nem todos devem
obrigatoriamente fazer parte da avaliação:

• Glicemia
• Gasometria arterial
84

• Eletrólitos: potássio, sódio, cloro, magnésio e fósforo.


• Hiponatremia em 77%, devido à transferência osmótica de líquidos do espaço
intra para o extracelular, vômitos e perda renal associada aos corpos cetônicos.
• O potássio sérico pode ser elevado em 37% dos casos, secundário à acidose,
normal em 58% ou inferior em 5% dos casos, conforme reservas prévias nos
espaços intra e extracelulares, e exige muito cuidado durante o tratamento pelo
risco de arritmias ou até parada cardíaca.
• β-hidroxibutirato sérico deve ser feito a beira do leito para confirmar cetonemia
(maior acurácia que a pesquisa de cetonúria).
• Hemograma: pode haver leucocitose com desvio à esquerda sem que
signifique infecção, o aumento pode ser por intensa atividade adrenocortical.
• Ureia e creatinina: elevados por alto catabolismo e pela intensa desidratação.
• Parcial de urina.
• Eletrocardiograma: busca de achados de hipercalemia e isquemia (mais útil no
EHH)
• Radiografia de tórax

2.4 TRATAMENTO DAS CRISES HIPERGLICÊMICAS

A correção da desidratação e da acidose é o principal objetivo inicial do tratamento. A


evolução do quadro pode evoluir com choque hipovolêmico e morte.

As metas do tratamento das crises hiperglicêmicas agudas são:

a. Manutenção das vias respiratórias pérvias. Em caso de vômitos, indicação


de sonda nasogástrica.
b. Correção da desidratação
c. Correção dos distúrbios eletrolíticos e acidobásico
d. Redução da hiperglicemia e da osmolalidade.
e. Identificação e tratamento do fator precipitante.
• Realizar monitorização (controle diurese) e fornecer O2 por cateter nasal se
PO2< 80 mmHg.
85

3 HIPOGLICEMIA

3.1 DEFINIÇÃO

Em pacientes diabéticos, especialmente em uso de insulina, a hipoglicemia é a


complicação aguda mais comum, bem mais frequente que a cetoacidose ou o estado
hiperosmolar.

A hipoglicemia, com exceção dos pacientes diabéticos, é uma condição incomum.


Para que se confirme o diagnóstico de hipoglicemia, é necessário que esteja presente
a tríade: (1) Hipoglicemia, (2) Sintomas de hipoglicemia e (3) Melhora dos sintomas
após administração de glicose.

Manifestações neuroglicopênicas: cefaleia, sonolência, tonturas, ataxia, astenia,


dificuldade de concentração, lentificação dos pensamentos, confusão, irritabilidade,
alterações de comportamento, déficits neurológicos focais, convulsões e coma.

Manifestações adrenérgicas: palpitações, taquicardia, ansiedade, tremores, sudorese,


fome e parestesias. Idosos com diabetes de longa data podem não apresentar
sintomas adrenérgicos, o que retarda o diagnóstico da hipoglicemia e aumenta o risco
de sequelas neurológicas permanentes (mais frequentemente se associa à disfunção
autonômica ou ao uso de β-bloqueadores).

3.2 EXAMES COMPLEMENTARES

Glicemia capilar no momento da crise.

3.3 TRATAMENTO

O tratamento agudo da hipoglicemia baseia-se fundamentalmente no nível de


consciência do paciente.

Paciente consciente: ingesta de alimentos com 15g de carboidratos de absorção


rápida (como um copo de água com uma colher de sopa de açúcar, um copo de suco
de laranja). Repetir a glicemia capilar após 15 minutos da ingesta. Caso a hipoglicemia
continue, o procedimento deve ser repetido da mesma forma. Após a correção do
86

quadro é importante orientar o paciente para ingerir algum alimento que contenha
carboidrato complexo tal como massas, pão, bolacha.

Paciente inconsciente em ambiente não hospitalar: aplicar 1 ampola de glucagon 1


mg IM ou SC (este procedimento também se aplica em ambiente hospitalar na
impossibilidade de obtenção de acesso venoso)

Paciente inconsciente em ambiente hospitalar: estabelecer acesso venoso e aplicar


20 a 40 ml de glicose a 50% EV, manter acesso venoso com soro glicosado a 5%.
Repetir glicemia capilar após 5 a 10 minutos, se a hipoglicemia persistir, repetir a
medicação.

Em pacientes com hipoglicemia grave secundária ao uso de sulfoniluréias manter o


controle da glicemia capilar por 16 a 72 horas (a depender da meia-vida da
medicação).

REFERÊNCIAS

HIRSCH, I. B.; EMMETT, M.; NATHAN, D. M.; MULDER, J. E. Diabetic ketoacidosis and
hyperosmolar hyperglycemic state in adults: Treatment. Literature review current through: Sep
2017. | This topic last updated: Jan 13, 2017. UpToDate, 2017.

MARTINS, H. S.; NETO, R. A. B.; VALESCO, I. T. Hiperglicemias. Medicina de Emergência:


abordagem prática. 11 ed ver e atual, Barueri, SP: Manole, p.1339 – 1367, 2016.

MILECH, A. [et. al.]; organização José Egidio Paulo de Oliveira, Sérgio


Vencio Crises Hiperglicêmicas Agudas. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes (2015-2016).
São Paulo: A.C. Farmacêutica, p. 166 – 171, 2016.

NETO, D. N.; PIRES, A. C. Crises Hiperglicêmicas Agudas no diabetes mellitus, Aspectos Atuais.
Revista Brasileira de clínica Médica, V. 8, N.3, P. 246 – 253, 2010.

SERVICE, F. J.; VELLA, A.; HIRSCH, I. B.; MULDER J. E. Hypoglycemia in adults without diabetes
mellitus: Diagnostic approach. Literature review current through: Sep 2017. | This topic last updated:
Sep 18, 2017. UpToDate, 2017.
87

CAPÍTULO 13

INTOXICAÇÕES EXÓGENAS

Acadêmica: Fabiane Karen Miyake

Revisor: Dr. Jacques Cassidori Couto

1 INTRODUÇÃO

A intoxicação exógena engloba um amplo espectro de manifestações clínicas, devido


a vários fatores envolvidos, como a substância ingerida, se a ingestão é crônica ou
aguda, se o paciente faz uso de medicamentos de uso contínuo, por exemplo. A
anamnese e o exame físico são de grande ajuda para o reconhecimento da
intoxicação ocorrida. É importante lembrar que a anamnese pode estar prejudicada
nos casos de intoxicação intencional ou até pelos próprios efeitos da intoxicação.
Nestas situações, é interessante correlacionar a história com as manifestações
clínicas e laboratoriais esperadas pela intoxicação.

2 SÍNDROMES DE MANIFESTAÇÃO

De acordo com a anamnese e o exame físico, os pacientes podem ser classificados


em síndromes. De um modo geral, situações em que há excitação psicológica, como
estimulação do sistema nervoso central, aumento da frequência cardíaca (FC), da
pressão arterial (PA), da frequência respiratória (FR), e da temperatura (T), são
causadas por medicamentos anticolinérgicos, simpaticomiméticos ou agentes
alucinógenos centrais, ou estados de abstinência por uma droga. Já, por outro lado, a
depressão fisiológica, como rebaixamento do nível de consciência, diminuição da FC,
da PA, da FR e da temperatura, são causadas comumente por etanol, agentes
sedativos-hipnóticos, opiáceos, agentes colinérgicos (parassimpaticomiméticos) e
agentes simpaticolíticos. Efeitos mistos podem ocorrer em overdoses por várias
drogas ou exposição a certos tóxicos (agentes hipoglicemiantes, salicilatos), agentes
membrana-ativos(inalantes voláteis, drogas anti-arritmicas, anestésicos locais),
metais pesados, ou agentes com múltiplos mecanismos de ação (tricícilos).
88

3 MANEJO INICIAL

O manejo inicial se foca na estabilização do quadro agudo, ou seja, direcionado para


o cuidado suportivo, prevenção da absorção da droga e, quando possível, o uso de
antídotos e técnicas de eliminação da substância.

É importante a avaliação dos dados vitais, do estado mental, reflexos, temperatura


corporal, avaliação da perfusão periférica e proceder à monitorização multiparamétrica
contínua, acesso venoso calibroso (16 gauge de preferência) e proteção de vias
aéreas quando indicado. Em complementação à anamnese e ao exame físico devem
ser realizadas coletadas de amostras para análise laboratorial e realização de
eletrocardiograma na sala de emergência. Dosagem de glicemia, eletrólitos,
creatinina, lactato, gasometria arterial (incluindo nível de carboxi-hemoglobina e
metahemoglobina) e provas de função e agressão hepáticas são essenciais. Quando
houver suspeita de algum agente específico poder ser solicitada dosagem sérica da
substância como níveis de paracetamol, fenitoína, lítio, digoxina, salicilatos, etanol e
drogas ilícitas.

Quando o exame físico e a anamnese não forem condizentes com o estado clínico,
existe a possibilidade de ter ocorrido uma coleta equivocada de dados da história
clínica assim como a possibilidade de ter havido um intervalo de tempo mutio breve
ou muito prolongado em relação ao temo de exposição à substância. Neste caso as
reavaliações subsequentes, tanto do exame físico como de novas coletas de dados
da história, devem ser realizadas com frequência para determinar a evolução da
intoxicação e avaliar a necessidade de maiores intervenções.

O tratamento engloba cuidados suportivos, descontaminação, terapia com antídoto


específico e técnicas de eliminação de substâncias inclusive através de plasmaférese
e hemodiálise.
89

4 CUIDADOS SUPORTIVOS

Os cuidados suportivos são a base do tratamento de intoxicação e frequentemente


são suficientes para a recuperação do paciente. Geralmente similar ao usado em
outros pacientes criticamente doentes, deve-se realizar a sequência ABCDE, a saber:

A) Vias aéreas: a intubação orotraqueal (IOT) deve ser feita nas situações em que
houver rebaixamento do nível de consciência (Escala de Coma de Glasgow menor ou
igual a 8) ou sinais de insuficiência respiratória (hiper ou hipoventilação, agitação
excessiva, cianose, acidose grave, hipoxemia, hipercapnia). A IOT deve ser
imediatamente realizada nesses casos mas pode ser postergada desde que algum
suporte ventilatório efetivo possa ser ofertado e quando houver evidência de causa
rapidamente reversível como na hipoglicemia e nas intoxicações por opióides ou
benzodiazepínicos pois a ação destas substâncias pode ser rapidamente revertida
com antídotos específicos desde que disponíveis no local (naloxona e flumazenil
respectivamente). Nos casos em que, após análise da gasometria, identifica-se um
distúrbio ácido-base grave a IOT também pode ser indicada por haver necessidade
de melhora de correção do distúrbio através de ventilação mecânica. Uma possível
exceção para esta situação é na intoxicação por salicilato que também causa
desequilíbrio ácido-base mas que requer tratamento específico em conjunto às
medidas suportivaas, como o uso de carvão ativado, a indução de diurese alcalina e
a eliminação através de hemodiálise.

B: Avaliação da ventilação (padrão respiratório, frequência respiratória, saturação


periférica de oxigênio).

C: Avaliação do circulação: se não houver pulso central, seguir recomendações de


PCR. Avaliar necessidade de infusão de fluidos e drogas vasoativas.

D: Avaliação do estado neurológico. A tiamina deve ser administrada em pacientes


etilistas com rebaixamento do nível de consciência para a prevenção da Encefalopatia
de Wernicke. A alteração do nível de consciência pode se dever a hipoglicemia,
devendo ser administrado 25 gramas de dextrose neste caso.
90

E: Expor o paciente e procurar por sinais de trauma, de uso de drogas, lesões de pele
ou mucosas e possíveis focos de infecções.

Feita a estabilização inicial do paciente, deve-se verificar a necessidade e indicações


ou não de métodos de auxílio para eliminação do tóxico, como a descontaminação
gastrintestinal e técnicas que otimizam a eliminação da droga, como a diurese forçada,
hemodiálise e hemoperfusão, e possibilidade da administração de antídotos
específicos.

5 DESCONTAMINAÇÃO GASTRINTESTINAL

A descontaminação gastrointestinal consiste na remoção da toxina ingerida para


diminuir sua absorção. Não é feita de rotina, mas pode ser útil em casos especiais.
Basicamente, fatores como substância ingerida, tempo de ingestão até a procura de
atendimento, sintomas e a toxicidade da substância determinam a necessidade ou
não de descontaminação. Este método não deve ser empregado nos casos em que a
substância e a quantidade ingerida não causam toxicidade e quando o tempo de
ingestão for prolongado (geralmente maior que 2 horas).

Alguns métodos de descontaminação gastrointestinal são: lavagem gástrica, uso do


carvão e de laxativos (principalmente para toxinas não eliminadas por carvão ativado)

Além desses métodos citados, pode se realizar a endoscopia ou a cirurgia quando


uma toxina letal foi ingerida e não pode ser removida por meios menos invasivos,
como quantidades letais de metais pesados e na presença de bezoares. A remoção
cirúrgica é indicada em pacientes que demonstram toxicidade depois da ingestão de
grande quantidade de cocaína embalada. Nestes cados a endoscopia não é
recomendada devido ao risco de ruptura da embalagem durante o procedimento.

6 SITUAÇÕES CLÍNICAS ESPECÍFICAS

A seguir, estão listadas algumas situações clínicas de intoxicação que podem ocorrer
devido a um agente específico e seu respectivo tratamento:
91

a. Bradicardia com hipotensão: sugestivo de overdose por digoxina, bloqueadores


de canal de cálcio, ou beta bloqueadores. Existe terapia específica para cada
agente.

b. Taquicardia ventricular monomórfica: ocorre devido ao bloqueio dos canais de


sódio. Muitos medicamentos podem causar bloqueio dos canais de sódio, como
antidepressivos tricíclicos, anti-histamínicos e cocaína. O tratamento é
bicarbonato de sódio, até o intervalo QRS for menor que 100 ms nas derivações
periféricas, ou até o pH arterial se aproximar de 7,55.

c. Taquicardia ventricular polimórfica – ocorre devido à overdose de anti-


arritmicos tipo IA, IC e III, anti-psicóticos, anti-fúngicos, anti-histamínicos.
Tratamento se faz com administração intravenosa de sulfato de magnésio.

d. Taquicardia com complexo QRS estreito e hipertensão devido a overdose ou


abstinência: geralmente ocorre devido a estados hiperadrenérgicos, como na
cocaína, anfetamina e outros simpaticomiméticos. O tratamento consiste na
administração de benzodiazepínico.

e. Bradicardia com alteração hemodinâmica: os agentes mais relacionados a essa


situação são os carbamatos e organofosforados (tratamento: atropina),
digoxina (tratamento: anticorpo antidigoxina), beta bloqueadores
(tratamento:glucagon), e bloqueadores de canal de cálcio (tratamento:
gluconato de cálcio).

f. Hipotensão – deve ser manejada inicialmente com bolus de fluidos EV


isotônicos. Vasopressores são necessários quando a hipotensão não se
resolve com a expansão de volume.

g. Hipertensão – em pacientes agitados, o melhor é o tratamento com sedativos


não específicos como benzodiazepínico.

h. Convulsões – de maneira geral, tratado com benzodiazepínico. Se necessário


o uso de fenitoína ou barbitúricos também pode ser feito.
92

i. Agitação: agitação devido a intoxicação normalmente responde bem ao uso de


benzodiazepínico ou de neurolépticos de alta potência, como o haloperidol.

j. Hipertermia – Pode ocorrer em situações como overdose por drogas


simpaticomiméticas, na síndrome serotoninérgica, ou na síndrome neuroléptica
maligna. O tratamento objetiva a redução agressiva da temperatura corporal
inclusive atráves da hipotermia dirigida atráves de métodos físicos.

k. Depressão do centro respiratório – relacionado principalmente aos opioides e


aos hipnótico-sedativos. Lembrar que o flumazenil não deve ser usado em
pacientes com história de convulsão, ou nos casos de intoxicação com
antidepressivos tricíclicos. Se houver suspeita de de intoxicação por opioides
esta deverá ser tratada com naloxona.

7 ALGUNS ANTÍDOTOS

A lista a seguir faz uma relação dos principais antídotos e tratamentos específicos
disponíveis:

▪ Paracetamol: acetilcisteína

▪ Benzodiazepínicos: flumazenil

▪ Beta bloqueadores: glucagon

Bloqueadores de canal de cálcio: gluconato de cálcio e glucagon

▪ Digoxina: anticorpo antidigoxina

▪ Opioides: naloxona

▪ Metanol e etilenoglicol: álcool etílico ou formepizole

▪ Isoniazida: piridoxina
93

8 CENTRO DE CONTROLE DE ENVENENAMENTO

Em Curitiba, existe um centro de serviço especializado em intoxicações, o Centro de


Controle de Envenenamentos. Em caso de qualquer dúvida, deve-se ligar pelo
número (41) 3264-8290 e pedir auxílio. Lembrar que todas as intoxicação exógenas
são agravos de notificação compulsória.

REFERÊNCIAS

MARTINS, H.S.; NETO, R.A.B.; VELASCO, I.T. Medicina de Emergência - Abordagem prática: 11
ed. São Paulo: Editora Manole, 2016

RYHEE, S. H. General approach to drug poisoning in adults.

SIVILOTTI, M. L. A. Initial management of the criticaly ill adult with an uknown overdose.
94

CAPÍTULO 14

EMERGENCIAS PSIQUIÁTRICAS

Acadêmico: Carolina Labigalini Sampaio


Revisor: Dra. Raquel Tatiane Heep e Dr. Francisco Jaime Barbosa

1 AGITAÇÃO PSICOMOTORA

Agitação psicomotora pode ser identificada atentando-se para movimentação


excessiva, reatividade aumentada a estímulos externos, agressividade verbal ou
física, sinais como punhos e dentes cerrados, tendência a aproximação excessiva em
direção ao entrevistador e elevação da voz. As principais causas são intoxicação ou
abstinência de drogas e álcool, dor intensa, alteração do nível de consciência e
transtornos psiquiátricos (depressão, mania, transtornos psicóticos ou de
personalidade). Além destes também pode ser reultado de transtornos cerebrais
(epilepsia, alteração de lobo frontal e temporal), trauma ou neoplasias.

Patologias orgânicas associadas a comportamento violento:

• Abuso de substânicas
o Alcool, barbitúricos e benzodiazepínicos
o Cocaína, anfetaminas, fenciclidina e alucinógenos
o Hidrocarbonetos aromáticos (cola, tinta, gasolina)
o Esteróides
• Patologias intracranianas
o Trauma (recente ou passado)
o Infecções
o Neoplasias
o Defeitos anatômicos
o Malformações vasculares
o Acidentes vasculares cerebrais
o Doenças degenerativas
95

• Epilepsia ou síndromes epileptiformes


o Incluindo comportamento nos períodos ictais, pós-ictais e interictais
o Síndromes parciais complexas, delirium pós-ictal
• Patologias sistêmicas
o Metabólicas (p. ex., hipoglicemia)
o Endócrinas (p.ex., hipercortisolismo)
o Hipovitaminoses (p.ex., anemia perniciosa)
o Infecciosas
o Exposição ambiental (p.ex., inseticidas organofosforados)
o Patologias reumáticas (como LES)

(Fonte: Kapczinski)

Pacientes com alto potencial de agressão devem ser contidos. A restrição física deve
durar o mínimo possível e ser feita com faixas ou lençóis por uma equipe treinada
utilizando técnicas específicas para evitar lesões. O paciente deve ser medicado
rapidamente para que se acalme e possa ser liberado da contenção fisica. A
contenção química deve ser realizada com medicamentos de rápida ação, facilidade
de administração, mínimos efeitos colaterais e mínimas interações medicamentosas.
Usualmente usa-se haloperidol (5 mg intramuscular, com aumento de dose de 30 em
30 minutos, até máximo de 45 mg em 24 horas), lorazepan (1 a 2 mg via oral) ou
midazolam (15 mg intramuscular). Como outras opções também pode-se utilizar
Diazepan (5 a 10 mg sempre via oral), olanzapina (10 mg intramuscular) ou
ziprasidona (20 mg intramuscular).

2 DELIRIUM

Síndrome de início agudo e curso flutuante que cursa com prejuízo cognitivo e
alterações comportamentais. Trata-se de um distúrbio da consciência, atenção,
cognição e sensopercepção, também sendo comum alterar a psicomotricidade, sono
e humor. É secundária a patologias orgânicas (traumas, distúrbios metabólicos,
infecções, doenças do SNC, uso de medicações, intoxicação ou abstinência por
drogas, entre outros). Sempre se apresenta com alteração do nível de consciência,
podendo ser hipocinético, hipercinético ou misto de acordo com a classificação de
96

Lipowski, porém não caracteriza quadro de coma ou estupor. Alterações


psicomotoras, de ciclo sono-vigília e transtornos emocionais também são comuns.
Outros sintomas são: declínio súbito e significativo do funcionamento prévio,
orientação temporal alterada, discurso vago e incoerente, alucinações, delírios
paranoides transitórios, prejuízo à retenção de memórias. O diagnóstico pode ser
realizado pela escala CAM (Confusion Assessment Method) na Tabela 1, sendo
necessário que o paciente apresente os critérios 1, 2 e 3 ou 1, 2 e 4. Outras alterações
(itens 5 a 9) também podem estar presentes.

Tabela 1 – Escala CAM

CRITÉRIO CARACTERÍSTICA

Critério 1 Início agudo e flutuação no curso

Critério 2 Desatenção (paciente com dificuldade em


focar, distraído facilmente)

Critério 3 Pensamento desorganizado ou incoerente

Alteração no nível de consciência


Critério 4
(hiperalerta, letárgico, estupor ou coma)

Critério 5 Desorientação (tempo e/ou espaço)

Critério 6 Prejuízo da memória

Disturbios de percepção (alucinações,


Critério 7
ilusões ou interpretações errôneas)

8a) Agitação psicomotora


Critério 8
8b) Retardo psicomotor

Critério 9 Alteração do ciclo sono-vigília

Fonte: Cordeiro. 2007 / Mansur


97

Pacientes idosos internados por doença física são a população de maior risco.
Delirium está correlacionado a agravamento do prognóstico e aumento da
mortalidade. Diagnóstico diferencial com outras doenças psicológicas e neurológicas
(demência, depressão, esquizofrenia).

Antes de qualquer intervenção é necessário dosar a glicemia e checar sinais vitais.


Depois disso, o principal é buscar e tratar a causa orgânica, com identificação e
correção dos fatores etiológicos. Manter boa iluminação durante o dia e limita-la
durante a noite, fornecer dicas de memória (calendários, fotos, relógio), permitir uso
de lentes corretivas e aparelho auditivo, permitir deambulação. Caso os sintomas
promovam risco ao paciente ou à equipe de saúde, recomenda-se o tratamento
medicamentoso conforme Tabela 2.

Tabela 2 – Tratamento farmacológico do Delirium

Delirium leve a moderado Delirium grave

1. Haloperidol em baixa dose 1. Haloperidol ou antipsicótico atípico. Caso


o efeito seja insuficiente, aplicar
2. Antipsicóticos atípicos como novamente o antipsicótico escolhido.
quetiapina, risiperidona e onlazapina.
2. Benzodiazepínicos (preferencialmente de
ação curta como lorazepam) – usado
para delirium secundário à abstinência de
álcool
3. Eletroconvulsoterapia

Fonte: Martins. 2017

3 SÍNDROME DE ABSTINÊNCIA ALCOÓLICA

A ingestão aguda de álcool estimula liberação de opioides endógenos causando


euforia e reforço para o uso contínuo. Há ativação dos receptores inibitórios GABA
que atuam causando efeitos ansiolíticos, sedativos, descoordenação e inibindo os
receptores excitatórios glutamatérgicos. O uso crônico causa alteração do número e
da função dos receptores atuantes nesta via em resposta ao efeito depressor do álcool
(há diminuição de receptores GABA tipo A e aumento de receptores glutamatérgicos).
98

Ao cessar ou reduzir o consumo, há desequilíbrio favorecendo os receptores


glutamatérgicos, o que causa hiperexcitabilidade neuronal.

A Síndrome de Abstinência Alcoólica (SAA) define-se por:

a. Diminuição ou cessação do uso de álcool em indivíduo que faz uso crônico e


excessivo.
b. Presença de pelo menos dois dos seguintes sintomas:
• Tremor de extremidades e língua
• Hiperatividade autonômica (sudorese, taquicardia, hipertensão sistólica,
hipotensão ortostática e febre menor que 38ºC)
• Náuseas e vômitos
• Insônia
• Cefaleia
• Alucinações visuais, auditivas ou táteis: são sintomas precoces (24 a 48
horas após última dose) e aparecem em 25% dos casos
• Agitação psicomotora
• Ansiedade

O curso é bastante variável dependendo da quantidade de álcool consumida, das


condições médicas associadas e da ocorrência de SAAs prévias. Sintomas
usualmente iniciam de 5 a 10 horas após a última dose ingerida, tendo um pico entre
48-72 horas e duração de 5 a 14 dias. SAA não tratada pode evoluir para convulsões
e delirium tremens.

História clínica e exame físico adequados são essenciais para caracterizar o quadro,
buscar complicações, buscar fatores desencadeantes e orientar solicitação de
exames complementares. Os preditores de gravidade são: história de SAA prévia, uso
de sedativos, idade avançada e comorbidades (hipertensão arterial sistêmica,
hipoglicemia e distúrbios metabólicos). Exames complementares são: hemograma,
glicemia, ureia, creatinina, sódio, potássio, magnésio, cálcio, enzimas de função
hepática, amilase, lipase, urina tipo I, eletrocardiografia, radiografia de tórax. A
tomografia computadorizada de crânio pode ser utilizada em casos específicos
(convulsões, história de trauma craniano, confusão mental e déficit neurológico focal).
99

Deve-se atentar para condições clínicas que podem coexistir com a SAA, como
trauma cranioencefálico, hematoma subdural, acidente vascular cerebral, meningite,
encefalite, síndromes coronarianas agudas, insuficiência cardíaca, infecções, hepatite
alcoólica, pancreatite aguda, hipo e hiperglicemia, hemorragia digestiva, entre outras.
Além disso, deve-se monitorar o desenvolvimento de complicações (listadas na tabela
4).

Tabela 4 – Complicações da SAA

COMPLICAÇÃO CARACTERÍSTICAS

Convulsões Geralmente ocorrem em 6 a 24 horas após a


última dose. Generalizadas e autolimitadas
(menos de 3% culminam em mal epiléptico)

Risco aumentado em pacientes que já


tiveram SAA prévia.

Delirium tremens Complicação tardia (após 48 horas). Cursa


com redução do nível de consciência,
(é uma urgência médica, com mortalidade de desorientação têmporo-espacial, confusão,
até 15%) ideação paranoide, ilusões, alucinações,
agitação intensa, taquicardia, hipertensão,
febre, comprometimento da atenção e
memória)

Síndrome Wernicke-Korsakoff Causada por deficiência de vitamina B1


(tiamina) e por lesões na massa cinzenta.
Tríade da Encefalopatia de Wernicke:
oftalmoplegia, ataxia e confusão. Se
associada demência caracteriza Síndrome
de Korsakoff.

Fonte: Cordeiro. 2007

4.1 TRATAMENTO

O tratamento inclui: suporte hídrico com correção dos distúrbios hidroeletrolíticos,


oxigenação, repouso em local calmo sem estimulações audiovisuais.
Benzodiazepínicos para controle de sintomas e evitar complicações (Diazepam ou
Lorazepam e haloperidol em casos de agitação psicomotora intensa ou alucinações).
100

Se SAA leve ou moderada, prescrever via oral por poucos dias diminuindo
gradativamente a dose até descontinuação. Carbamazepina é indicada em SAA leve
e moderada pelo seu efeito anticonvulsivante sem causar depressão do sistema
nervoso central.Tiamina para evitar Síndrome de Wernicke-Korsakoff.

5 TENTATIVA DE SUICÍDIO

Qualquer paciente que tenha tentado suicídio, verbalizado pensamentos ou


planejamento suicida, agido de forma que sugira desejo de morrer devem ser
cuidadosamente avaliados. O principal instrumento para esta avaliação é a anamnese
e entrevista com familiares. Os sentimentos mais comuns envolvidos na ideação
suicída são (os 4Ds): Depressão, desesperança, desamparo e desespero. O paciente
refere comumente que sua situação é interminável, intolerável e inescapável. É
importante perguntar sobre a ideação ou tentativa de suicídio para o paciente de forma
compreensiva, franca e livre de julgamentos e buscar fatores de risco para suicídio.
Esses fatores são: sexo masculino, idade entre 14 e 40 anos ou acima de 65,
separados ou divorciados, desempregados ou aposentados, moradores de áreas
urbanas, doença crônica e/ou incapacitante, traumas (agressões físicas e sexuais),
perdas pessoais, baixa autoestima, história familiar de suicídio, problemas com a
aceitação de orientação sexual, depressão ou alcoolismo, tentativa pregressa,
instabilidade familiar, isolamento social e transtornos de humor e de personalidade.
Nunca se deve minimizar a tentativa de suicídio.

3.4 FATORES DE RISCO PARA SUICÍDIO:

• Tentativa prévia de suicídio:


o 5 a 6 X mais chance de tentar novamente
o 50% dos que se suicidaram já haviam tentado antes
• Doenças Psiquiátricas:
o 35,8% Transtorno de humor
o 22,4% Transtorno por uso de substância psicoativa
o 11,6% Transtorno de personalidade
o 10,6% Esquizofrenia
• Condições sociodemográficas:
101

o sexo masculino
o faixas etárias entre 15 e 35 anos e acima de 65 anos
o estratos econômicos extremos
o desempregados (principalmente perda recente do emprego)
o Aposentados
o isolamento social
o solteiros, viúvos ou separados
o Migrantes
o sem filhos
• Condições psicológicas:
o perdas recentes
o perdas de figuras parentais na infância
o dinâmica familiar conturbada
o datas importantes
o personalidade com traços significativos de impulsividade
o agressividade, humor lábil
o eventos adversos na infância e adolescência
o História familiar e genética
o Traços de personalidade rígida e constricta
• Condições clinicas
o doenças orgânicas incapacitantes
o dor crônica
o lesões desfigurantes perenes
o Epilepsia
o trauma medular
o neoplasias malignas
o Aids

A segurança do paciente deve ser privilegiada. É importante retirar objetos perigosos


e em casos de alto risco pode ser necessária restrição física. Pelo menos um membro
da equipe deve observar o paciente até que seja feita avaliação completa. Usualmente
métodos mais violentos como enforcamento e armas de fogo e tentativas bem
planejadas denotam maior gravidade. Deve-se avaliar se há arrependimento (se não
houver, há maior risco para nova tentativa) do paciente e também se existe suporte
102

familiar adequado (avaliar possibilidade de tratamento ambulatorial). Lembrando que


esta situação justifica quebra do sigilo médico.

Após estabilização deve-se decidir entre manter paciente internado, encaminhar para
unidade especializada (pacientes graves – psicóticos, agitados ou gravemente
deprimidos) ou encaminhar para tratamento ambulatorial (bom suporte familiar,
arrependimento, sem ideação suicida e concordando em buscar atendimento se voltar
a ter, retirada de objetos letais de seu ambiente).

A eletroconvulsoterapia pode ser utilizada em casos agudos. Alguns medicamentos


são importantes no manejo da tentativa de suicídio. O Lítio e Ketamina reduz as taxas
de suicídio, as tentativas e recidivas. A clozapina reduz as taxas de suicídio em
pacientes esquizofrênicos. Lembrar que os antidepressivos não tem efeito protetor
contra o suicídio

REFERÊNCIAS

MARTINS, Herlon Saraiva.; NETO, Rodrigo Antônio Brandão; VELASCO, Irineu Tadeu. Medicina de
Emergência: Abordagem Prática. 22ª edição. São Paulo: Editora Manole, 2017.

CORDEIRO, Daniel Cruz; BALDAÇARA, Leonardo. Emergências Psiquiátricas. São Paulo: Editora
Roca, 2007.

CORDÁS, TákiAthanássios; MORENO, Ricardo Alberto. Condutas em Psiquiatria: Consulta Rápida.


Porto Alegre: Editora Artmed, 2008.

MANSUR, Carlos Gustavo. Psiquiatria para o médico genralista. Porto Alegre: Artmed, 2013.

KAPCZINSKI, Flávio; QUEVEDO, João; SCHMITT, Ricardo; CHACHAMOVICH, Eduardo.


Emergências psiquiátricas. Porto Alegre: Editora Artmed, 2001
103

CAPÍTULO 15

CUIDADOS PALIATIVOS EM UNIDADES DE EMERGÊNCIAS

Acadêmica: Regina Benatti Gondolfo

Revisor: Paulo Fabricio Nogueira Paim

1 INTRODUÇÃO

A abordagem de pacientes em fim de vida ou idosos frágeis com múltiplas


comorbidades em unidades de urgência e emergência ainda é um desafio para toda
a equipe de saúde.

O primeiro passo para conseguir melhorar os cuidados desse perfil de paciente é


compreender e aplicar os princípios básicos dos (CPs) Cuidados Paliativos. Segundo
a (OMS) Organização Mundial de Saúde, os CPs têm como finalidade prevenir e aliviar
o sofrimento de pacientes com doenças progressivas e irreversíveis, promovendo a
qualidade de vida do indivíduo e de sua família. O paliativismo apoia-se nos princípios
bioéticos da ortotanásia, que considera a morte como um processo natural e
irreversível, devendo esta acontecer em seu tempo natural, garantindo a dignidade do
indivíduo e promovendo o seu bem estar através do adequado controle dos sintomas
de natureza física, emocional e espiritual. O grupo de pacientes inseridos nesse
conceito não inclui apenas aqueles com neoplasias malignas, mas também portadores
de quaisquer patologias qualificadas como ameaçadoras da vida. Isso inclui doenças
neurodegenerativas avançadas como síndromes demenciais, doença de Parkinson, e
insuficiências orgânicas crônicas avançadas como insuficiência cardíaca, doença
pulmonar obstrutiva crônica, insuficiência renal e hepática.

Um ponto importante é definir a capacidade que o paciente tem ou não de tomar


decisões sobre sua saúde em um determinado tempo. Por exemplo, se o paciente se
recusa a realizar as condutas recomendadas, ou opta por não receber intervenções
invasivas, os médicos apoiados pela equipe multiprofissional assistencial devem estar
aptos a avaliar se o paciente tem ou não essa capacidade de julgamento com a
104

finalidade de auxilia-lo e aos seus familiares em suas melhores decisões. Existem


várias ferramentas próprias para esse tipo de abordagem, entretanto um grupo de
pesquisadores da Universidade Johns Hopkins desenvolveu uma forma mnemônica
para uma evolução rápida na sala de emergência que avalia a capacidade do paciente
tomar decisões. As habilidades requeridas formam a mnemônica CURVES e
consistem em:

• C – Choose and Communicate: o paciente tem que estar apto a escolher


entre as opções oferecidas pelo profissional de saúde, e comunicar a
sua preferência seja verbalmente, através da escrita ou uso de sinais.
• U – Understand: o paciente deve entender os riscos, benefícios,
alternativas e consequências de qualquer decisão tomada.
• R – Reason: o paciente tem que ser capaz de apresentar uma
justificativa racional para sua decisão de aceitar ou recusar a intervenção
oferecida.
• V – Value: a decisão que o paciente tomar deve ser consistente com os
valores que ele apresenta.

Caso o paciente não apresente as habilidades acima descritas, ele não apresenta
capacidade de tomar decisões sozinho. Cabe ao médico responsável avaliar duas
situações:

• E – Emergency: se existe alguma emergência que coloque o paciente


em risco.
• S – Surrogate: se não existe substituto para tomar decisões em
relação ao paciente, ou algum documento legal detalhando os
desejos do paciente para esse momento.

Quando ambas situações estão presentes o médico responsável pode tomar as


decisões sem um consentimento explícito, sempre pautando pelos princípios
bioéticos, pelas melhores evidencias cientificas, e usando habilidades de
comunicação para o consenso, considerando os valores e costumes do paciente e de
seus familiares . É importante deixar claro que tais decisões não ocorrem na completa
ausência de consentimento, mas sim sob a presunção de um consentimento implícito.
105

2 MANEJO DOS SINTOMAS

Os pacientes portadores de doenças avançadas apresentam frequentemente vários


sintomas de forma concomitante. Os sintomas mais frequentes são dor, fadiga,
dispneia, insônia, delirium, ansiedade, náusea/vômito, depressão, entre outros
sintomas que causem desconforto. O alívio dos sintomas multidimensionais deve ser
sempre o objetivo primordial do plano terapêutico, logicamente, concomitantemente a
terapias factíveis que prolonguem a vida dentro de uma reflexiva analise do custo-
benefício, resguardando sempre a dignidade humana e o direito a morte natural, no
tempo justo. Este paradoxo talvez seja o maior dos desafios da equipe médica ao
aplicar os CPs.

3.1 DOR

A terapia multimodal através do uso de terapias físicas, analgésicos comuns, opioides,


medicações adjuvantes como neuromoduladores, corticoides e intervenções
invasivas é o padrão ouro, pois esta eficiente associação possibilita o alivio da dor
com menores efeitos colaterais. Os princípios do controle da dor propostos pela OMS
podem ser resumidos em seis princípios:

Pela boca: A via de escolha para medicação sempre que possível deve ser a via oral,
poupando o paciente do incômodo das injeções.

Pelo relógio: Medicação analgésica para dor deve ser realizada em intervalos fixos
de tempo a fim de que a próxima dose seja aplicada antes que o efeito da anterior
tenha passado.

Pela escada: Para pacientes com dor leve a moderada o primeiro degrau é usar droga
não opiácea, associada ou não a um adjuvante. Se a droga não opiácea não aliviar a
dor mesmo na dose e frequência adequadas o próximo degrau é adicionar um opiáceo
fraco. Caso essa combinação ainda não for efetiva substitui-se por um opiáceo forte.
106

Para o indivíduo: Cada paciente apresenta uma necessidade individual para


analgesia, variando em sua dosagem. A dose certa do medicamento é aquela que
alivia a dor do paciente sem efeitos colaterais indesejaveis.

Uso de adjuvantes: Com a finalidade de aumentar a analgesia, como corticoides e


anticonvulsivantes, ou para controlar efeitos colaterais de opioides como antieméticos
e laxativos.

Atenção aos detalhes: Orientar bem o paciente e seus cuidadores com relação a
medicação que está sendo oferecida, às dosagens e intervalos bem como os
possíveis efeitos colaterais.

3.2 DISPNEIA

O manejo da dispneia envolve tanto medidas não farmacológicas quanto


farmacológicas. As medidas não farmacológicas consistem em elevação da
cabeceira, evitar muitas pessoas em volta do paciente, temperatura ambiente
adequada. As medidas farmacológicas envolvem oxigenoterapia, uso de opiáceos e
ansiolíticos. O uso de oxigênio deve ser guiado pela sintomatologia do paciente e não
pela oximetria, a fim de prover conforto. Os opioides podem ser prescritos para alívio
de dispneia com uma dose inicial menor do que a destinada para tratamento da dor.
Caso a ansiedade seja um fator contribuinte para sensação de falta de ar do paciente
o uso de ansiolíticos, como benzodiazepínicos podem ser utilizados em baixa
dosagem.

3.3 NÁUSEA E VÔMITOS

A investigação de náusea e/ou vômito consiste em conhecer a doença do paciente


bem como os medicamentos que ele esteja utilizando, a fim de buscar possíveis
efeitos colaterais. Também importante realizar um exame físico completo, buscando
sinais de desidratação, distensão abdominal, localização neurológica e sinais
meníngeos. O manejo medicamentoso deve ser guiado sempre pelo mecanismo
fisiopatológico que esteja envolvido.
107

Caso esses sintomas sejam causados por indução química, ou seja, efeito adverso a
algum medicamento, as opções são metoclopramida, pela ação antidopaminérgica e
gastrocinética, por via subcutânea ou infusão continua; caso não seja possível
administrar essa droga uma segunda opção é o haloperidol ou ondansetrona.

Se o mecanismo fisiopatológico for estase gástrica é indicado utilizar inibidores de


bomba de prótons ou antagonistas H2. Caso haja distensão abdominal ou
sintomatologia muito intensa pode-se considerar realizar sondagem nasogástrica de
alívio, desde que este ultimo método não cause mais desconforto que o próprio
sintoma, racionalizar e aplicar estas equações é uma arte e exige estudo, dedicação,
sensibilidade, empatia e habilidade de comunicação.

Nos casos de vômito por hipertensão intracraniana -se utilizar corticoide em dose
elevada por via parenteral como escolha terapêutica.

REFERÊNCIAS

In book: Condutas em Urgências e Emergências da Faculdade de Medicina de Botucatu, Edition:


1, Chapter: Cuidados paliativos em um serviço de urgência e emergência, Publisher: Cultura
Acadêmica, Editors: Regina Helena Garcia Martins, Silvana Artioli Schellini, pp.387-394

M Cardona-Morrell JCH Kim RM Turner M Anstey IA Mitchell K Hillman. Non-beneficial treatments in


hospital at the end of life: a systematic review on extent of the problem; 2016

Halls S, Petkova H, Tsouros A, Constantini M, Higginson JJ. World Health Organization: Palliative care
for older people: better practices. Copenhagen: World Healt Organization; 2011

Silva CF et al. Concepções da equipe multiprofissional sobre a implementação dos cuidados


paliativos na unidade de terapia intensiva. Ciênc. saúde coletiva [online]. 2013, vol.18, n.9, pp.2597-
2604. ISSN 1413-8123.

Chow GV, Czarny MJ, Hughes MT, Carrese JA. CURVES: A mnemonic for determining medical
decision-making capacity and providing emergency treatment in the acute setting.

BRASIL. Ministério da Saúde. Instituto Nacional de Câncer Cuidados paliativos oncológicos:


controle da dor. - Rio de Janeiro: INCA, 2001

Manual de cuidados paliativos / Academia Nacional de Cuidados Paliativos. – Rio de Janeiro:


Diagraphic, 2009
108

CAPÍTULO 16

ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL

Acadêmica: Oona Tomiê Daronch


Revisor: Maria Carolina Zavagna Witt

1 DEFINIÇÃO E ETIOLOGIA

O acidente vascular cerebral pode ser conceituado como um déficit neurológico focal
súbito, ocasionado por uma lesão vascular, podendo ser isquêmico, quando ocorre
interrupção da passagem de oxigênio e glicose para o cérebro, ou hemorrágico, a
partir de um sangramento anormal para dentro das áreas extravasculares do cérebro.
O AVC tem etiologia multifatorial, que inclui hipertensão, diabetes, dislipidemia,
aterosclerose, tabagismo, etilismo, sedentarismo e obesidade, entre outros.

A determinação do tipo de AVC depende do mecanismo que o originou. Sendo assim,


existe o AVC isquêmico (80% dos casos) e o AVC hemorrágico, que por sua vez
apresentam alguns subtipos:

Tabela 1 – Tipos de AVC

Tipos de AVC Subtipos de AVC

Isquêmico Lacunar

Trombótico

Embólico

Hemorrágico Intraparenquimatoso
109

Subaracnóide

Fonte: Polese, et al. 2008

O AVC trombótico é o mais comum (40% dos AVCs) e é causado pela aterosclerose
e trombose cerebral. Há o desenvolvimento de um coágulo de sangue ou trombo no
interior das artérias cerebrais ou dos seus ramos, o que vai originar enfarto ou
isquemia.

O AVC embólico ocorre em 30% dos casos de AVC e é criado por êmbolos cerebrais.
São pequenas porções de matéria como trombos, tecido, gordura, ar, bactérias ou
outros corpos estranhos, que são libertados na corrente sanguínea e que se deslocam
até às artérias cerebrais, produzindo oclusão ou enfarto.

O AVC lacunar é provocado em 20% dos casos de AVC é ocasionado por enfartes
muito pequenos, geralmente menores de 1,5 cm, por alteração da pequena circulação.
É comum o déficit motor puro ou sensitivo puro.

A maioria dos fatores de risco para AVC são passíveis de intervenção, portanto é
possível se fazer um tratamento preventivo (prevenção primária). Entre os fatores de
risco que podem ser modificados destacam-se: Hipertensão; Diabetes; Tabagismo;
Consumo frequente de álcool e drogas; Estresse; Colesterol elevado; Doenças
cardiovasculares, sobretudo as que produzem arritmias; Sedentarismo; Doenças
hematológicas.

O AVC hemorrágico intracerebral (intraparenquimatoso) é responsável por 10-20%


das doenças cerebrovasculares. A principal etiologia é a hipertensão arterial. Outras
causas incluem angiopatia amiloide, etilismo e hipocolesterolemia.

O AVC subaracnoide tem como principal causa, entre os pacientes jovens, o trauma
e a ruptura de malformações vasculares, sobretudo os aneurismas intracranianos e
os angiomas arteriovenosos, enquanto nos idosos predomina a angiopatia amiloide.
110

2 DIAGNÓSTICO

O ingresso de um doente com queixas de ocorrência súbita de déficit neurológico


(principalmente redução ou perda da função), com ou sem perda de consciência, deve
levar imediatamente a suspeita de uma doença vascular encefálica. Algumas das
manifestações clinicas características de eventos vasculares encefálicos são
apontadas na tabela abaixo:

Tabela 2 – Quadro clínico sugestivo de AVC

Início súbito de:

Fraqueza ou dormência em um lado do corpo

Confusão mental ou rebaixamento do nível de consciência

Dificuldade para falar ou entender o que é dito

Dificuldade para enxergar com um ou ambos os olhos

Dificuldade para andar

Tontura

Cefaleia intensa e súbita sem causa aparente

Incoordenação

Fonte: Polese, et al. 2008

Em contrapartida, o ataque isquêmico transitório corresponde a obstruções


temporárias do sangue a uma determinada área do cérebro. Geralmente, originada
do acúmulo de plaquetas agregadas em placas nas paredes dos vasos ou formação
de coágulos no coração. Os sinais e sintomas desse ataque são os mesmos do AVC,
contudo tem duração menor a 24 horas (geralmente poucos minutos), e deve servir
de alerta para que o paciente procure assistência médica imediatamente, pois nesses
casos o risco de um AVC é iminente.
111

2.1 SÍNDROMES RESULTANTES DA OCLUSÃO DAS ARTÉRIAS


CEREBRAIS

1. Artéria Carótida Interna: Esta artéria é qualificada pela hemianópsia, afasia (se
for o hemisfério dominante), hemiplegia contra lateral e hemianestesia contra lateral.
Pode ocorrer um extenso edema cerebral, levando frequentemente ao coma e à
morte.
2. Artéria Cerebral Anterior: As lesões nesta artéria são raras. E é caracterizada
pela confusão mental, afasia (se for o hemisfério dominante), hemiplegia contra lateral
(com predomínio do membro inferior), hemianestesia contra lateral (com predomínio
do membro inferior), e pode haver apraxia de marcha, reflexo de sucção, reflexos de
preensão e incontinência urinária e fecal.

3. Artéria Cerebral Média: Esta artéria é o local mais comum de AVC. E é


especializada pelo coma, hemianópsia, hemiplegia (com predomínio do membro
superior), hemianestesia (com predomínio do membro superior), afasia (se for o
hemisfério dominante), e agnosia visual.
4. Artéria Cerebral Posterior: Esta artéria é representada pela hemianópsia, afasia,
agnosia visual, alexia, hemiplegia e hemianestesia, muitas vezes são sintomas
temporários.
5. Artéria Vértebro Basilar: Esta artéria é assinalada pelo coma, diplopia,
hemiplegia, paralisia pseudo bulbar, tetraplegia e anestesia completa.

A avaliação clínica dos pacientes com quadro suspeito de AVE é incapaz de distinguir
tratar-se de lesão isquêmica ou hemorrágica. A utilização de exames complementares
definirá se a lesão é isquêmica ou hemorrágica. Os métodos de imagem aceitos para
a avaliação inicial são a tomografia computadorizada (TC) e a ressonância magnética
(RM) de crânio e tem como principal objetivo diferenciar o AVE isquêmico do AVE
hemorrágico, sendo a tomografia de crânio sem contraste o exame mais utilizado por
ter custo mais baixo, maior disponibilidade e menor tempo necessário para realização.
O edema isquêmico, sinal da artéria hiperdensa e edema cerebral são as alterações
potencialmente visíveis numa TC de crânio realizada nas primeiras horas após um
112

AVC isquêmico, porém a maioria do AVEs isquêmicos não provoca alterações visíveis
precocemente na TC de crânio, podendo esta estar normal nas primeiras 24 horas
após o AVE. É prudente que a TC seja repetida aproximadamente 48 horas do ictus,
para confirmação do infarto, caso o primeiro exame tenha sido normal. Já o AVC
hemorrágico costuma vir com imagem na tomografia indicando sangramento.

Recomenda-se realizar em caráter de emergência os seguintes exames sanguíneos:


hemograma, glicose (hipoglicemia pode simular AVC), creatinina, ureia, eletrólitos,
gasometria arterial, coagulograma e eletrocardiograma. Se houver indícios clínicos de
hipoxemia ou broncoaspiração, deve-se incluir uma radiografia de tórax.

Deve-se realizar investigação etiológica em todo paciente com doença vascular


encefálica, conforme a necessidade, geralmente são realizados eletrocardiograma,
Doppler de carótidas e vertebrais e ecocardiograma transtorácico ou transesofágico

3 TRATAMENTO

O paciente deve ser internado em regime de UTI pela gravidade do quadro e de suas
possíveis complicações. Realizar monitorização cardíaca, oximétrica e pressórica.

3.1 MANEJO GERAL DO PACIENTE COM DIAGNÓSTICO AVE ISQUÊMICO NÃO


ELEGÍVEL PARA TROMBÓLISE:

- Decúbito dorsal com cabeceira elevada a 30 graus facilita a drenagem venosa pelas
jugulares e resulta em diminuição do edema encefálico;

- Acesso venoso de bom calibre devendo-se evitar sua realização em membros


paréticos para não aumentar o risco de trombose;

- Oxigênio complementar 2-3L/min por cateter nasal ou máscara caso PO2<95%.


Considerar intubação orotraqueal em casos refratários ou diminuição do sensório;

- Glicemia capilar 4/4 horas, objetivando glicemia capilar entre 80 e 140 mg/dL;

- Tratar hipertermia e investigar possíveis causas;


113

- Escala do NIHSS a cada 3 horas até 24 horas após a instalação do ictus considerar
piora clinica quando aumenta 4 pontos em cada avaliação ou 02 pontos em 2
avaliações seguidas;

- Estatina independente dos níveis séricos de lipídios;

- Evitar administração de fluídos hiperosmolares (ex: SF 5,0%) pois estes podem


piorar o edema cerebral;

- Anticoagulação profilática (heparina 5.000 U SC 8/8h ou enoxaparina 40mg/dia;

- Ácido acetil salicílico 100 a 300mg/dia;

- Sonda nasogástrica se necessário;

- Reduzir PA apenas se PAS>220 mmHg e PAD> 120mmHg ou se emergências


hipertensivas. Não reduzir mais de 15% dos valores pressóricos nas primeiras 24
horas. Se houver deterioração clínica (insuficiência cardíaca, renal, dissecção arterial
ou transformação hemorrágica) e PAS > 220 mmHg, PAD > 120 mmHg ou PAD > 130,
usar metoprolol ou nitroprussiato de sódio. Deterioração clínica com PAS < 220 mmHg
ou PAD < 120 mmHg, sedar e, se necessário, usar captopril, 12,5 mg, 8/8h, ou
enalapril 10 mg, 12/12h;

- Se hipotensão, elevar a uma pressão arterial média acima de 90mmHg mediante a


administração de fluídos isotônicos, e se necessário, expansores de volume ou drogas
vasoativas.

Manejo do paciente com diagnóstico AVE isquêmico elegível para trombólise:

- Ictus com <4,5 horas: Protocolo de trombólise;

- Paciente com diagnóstico AVE isquemico, com NIHSS entre 4 e 24 e dentro dos
critérios de inclusão e fora dos critérios de exclusão são elegíveis para trombólise que
deve ser realizada em centros treinados para tal procedimento, sob rigoroso controle
clínico;

- O trombolítico de escolha é a altaplase, na dose de 0,9 mg/kg (máximo 90 mg)


sendo infundidos 10% em bôlus e o restante em bomba de infusão em 1 hora.
114

Quadro 3 – Critérios de inclusão para trombólise

Diagnóstico clínico de AVC isquêmico em qualquer território arterial

Persistência de deficit neurológico

Hemoglucoteste > 50mg/dL ou > 400mg/dL

TC de crânio sem evidencia de hemorragia cerebral e/ou hipodensidade >1/3 do território da


artéria cerebral média, sem evidencia de tumor, abscesso ou hematoma subdural mimetizando
o AVC

Início dos sintomas < 4,5 horas

Idade entre 18 e 80 anos

Pressão arterial < 185/110mmHg

Fonte: Polese, et al. 2008

3.1.1 Critérios de exclusão para trombólise

- Doença vascular encefálica (DVEI) com pouca sintomatologia (NIHSS<4),


exceto afasia;

-NIHSS > 25;

-DVEI com rápida melhora neurológica;

- Suspeita clínica de sangramento ativo;

- História de hemorragia cerebral ou malformação arteriovenosa/aneurisma


cerebral;

- AVCi ou traumatismo crânio encefálico grave (TCE) nos últimos 3 meses;

- Punção arterial em local não compressível ou biópsia nos últimos 7 dias,

IAM recente (nos últimos 21 dias);


115

- Glicemia < 50 mg/dL ou > 400 mg/dL;

- Cirurgia de grande porte ou procedimento invasivo nos últimos 14 dias;

- Suspeita de dissecção carotídea ou vertebral;

- Uso de heparina nas ultimas 48 horas;

- Uso atual de anticoagulante;

- Alteração no coagulograma com tempo de protrombina (TP) >15 ou RNI> 1,7;

- Hemorragia geniturinária ou gastrointestinal (nas últimas 3 semanas), ou


história de varizes esofagianas ou doença inflamatória intestinal;

- Crise convulsiva precedendo ou durante a instalação do AVC;

- Evidência de pericardite ativa, endocardite, êmbolo séptico, aborto recente


(nas últimas 3 semanas), gravidez e puerpério.

3.2 PARTICULARIDADES DO TRATAMENTO NO AVC HEMORRÁGICO

3.2.1 AVC intraparenquimatoso

- Deve-se repetir a tomografia de crânio após 24 horas para definição do volume


final do hematoma ou sempre que houver piora clínica;

- Repouso no leito;

- Cabeceira elevada a 30 graus;

- Se necessário usar emolientes fecais, antieméticos e antitussígenos;

- Se agitação aumentar analgesia e sedar o paciente com benzodiazepínico de


curta duração;
116

- Realizar profilaxia de TVP com enoxaparina 40 mg/dia ou heparina 5000U 8/8


horas;

- Controle rigoroso da pressão arterial: manter PA abaixo de 180/110 mmHg,


exceto se hipertensão intracraniana, quando a PA deve ser mantida acima de
90mmHg, devendo-se, nesse caso, realizar medida de pressão intracraniana
(PIC).

3.2.2 AVC por hemorragia subaracnoidea

Os objetivos fundamentais no manejo clínico dos doentes com HSA são:

1. prevenção do ressangramento;

2. prevenção do déficit neurológico isquêmico tardio (vasoespasmo cerebral).

São recomendadas as seguintes medidas para se evitar estas complicações: dieta


adequada; repouso no leito; controle hidroeletrolítico rigoroso; analgesia e sedação
sempre que necessárias; controle da PA (reduções drásticas da PA são contra-
indicadas, pois estão associadas com aumento nos índices de complicações
isquêmicas); controle de agitação com analgesia e sedação (com benzoadizepínico
de curta duração); nimodipino; Profilaxia de TVP. O melhor momento para o
tratamento endovascular ou cirúrgico, se indicado, ainda não é consenso na literatura.
Outras medidas:

Deve ser realizado controle pressórico rigoroso até que seja realizado o tratamento
da causa deste AVE. Deve-se usar anti-hipertensivos não vasodilatadores
(objetivando uma PAM<130 mmHg ou uma PAS <180mmHg)

- Controle diário do sódio (risco de SIADH)

- Balanço hídrico positivo

- Doppler transcraniano diário ou em dias alternados do 3ro ao 4to dia após o


evento hemorrágico para avaliar vasoespasmos
117

Nesses casos, o manejo clínico inicial deve ser igual ao do AVCI tratado como
urgência neurológica. No caso de sangramento devido ao uso de drogas
anticoagulantes, a reversão deve ser realizada o mais rápido possível, com plasma
fresco congelado e/ou complexos pró-trombínicos. No caso de inibidores da vitamina
K, a reposição desta na forma intravenosa deve ser realizada conjuntamente. Não há
indicação para profilaxia primária de crises epilépticas.

O tratamento cirúrgico do AVCH é reservado para casos de hematomas cerebelares


> 3 cm, com sinais de compressão do tronco encefálico ou hidrocefalia, devendo ser
feita craniectomia posterior com drenagem do hematoma e, em caso de hidrocefalia,
derivação ventricular externa. Em se tratando de hematomas lobares volumosos (> 30
cm3 e distância do córtex < 1 cm) em sonolentos com ECG 9-12, pode ser feita
drenagem.

REFERÊNCIAS
FERRAZ, I.; NORTON, A.; SILVEIRA, C. Depressão e acidente vascular cerebral: Causa ou
consequência?. Arq Med, Porto, v. 27, n. 4, p. 148-153, ago. 2013.

HATANO, S. Experience from a multicenter stroke register: a preliminary report. Bull World Health
Org 1976; 54: 541–53.

FREITAS, J. V. Ocorrência de acidente vascular cerebral no Brasil segundo o DATASUS.

LIMA, C.; et al. Características epidemiológicas e clínicas dos pacientes acometidos por acidente
vascular cerebral. Disponível em:

POLESE, J. C.; TONIAL, A.; JUNG, F. K.; MAZUCO, R.; OLIVEIRA, S. G.; SCHUSTER, R. C.;
Avaliação da funcionalidade de indivíduos acometidos por acidente vascular encefálico: manual
de AVC. Rev Neurocienc. 2008;16(3):175-8.

PRABHAKARAN, S.; RUFF, I., BERNSTEIN, R. A. Acute stroke intervention: a systematic review.
JAMA. 2015;313(14):1451-62.

HEMPHILL III, J. C.; GREENBERG, S. M.; ANDERSON, C. S.; BECKER, K., BENDOK, B. R. Cushman
M etal. Guidelines for the management of spontaneous intracerebral hemorrhage. A guideline
for healthcare professionals from the American Heart Association/American Stroke Association.
Stroke. 2015;46(7):2032-60.

Manual de rotinas para atenção ao AVC - Prefeitura de São Paulo (2013). Disponível em:
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_rotinas_para_atencao_avc.pdf. Acesso em 10 set
2017.

STÉVALE, M. Bases da terapia intensiva neurológica: fisiopatologia e princípios terapêuticos.


2.ed. ampl. e revisada. 2011. Santos.

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