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Revista de Filosofia Moderna e Contemporânea, Brasília, v.6, n.2, dez. 2018, p. 21-36 21
ISSN: 2317-9570
DOI: https://doi.org/10.26512/rfmc.v6i2.18883
DIOGO HENRIQUE BISPO DIAS
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mundo. Neste caso, dizer que uma Em primeiro lugar, podemos ter
lógica é a lógica verdadeira é afir- um pluralismo puro, que consiste
mar que existe apenas uma lógica em afirmar a existência de dis-
que captura os aspectos formais tintas lógicas puras, isto é, for-
desta correspondência. mulações completamente abstra-
As noções de adequação e cor- tas da noção de consequência ló-
reção, por outro lado, geralmente gica, sem nenhuma preocupação
são invocadas quando não há o com a eventual aplicação desta
pressuposto de uma correspon- noção a algum domínio extraló-
dência necessária entre linguagem gico de objetos.
e mundo, e se está meramente Podemos ter, também, um plu-
interessado na relação entre uma ralismo teórico, que se preocupa
noção informal de consequência com aplicações teóricas da lógica.
em determinado domínio e a no- Neste nível, ser um pluralista ló-
ção formal de consequência em al- gico consiste em defender que
guma lógica. Assim, uma lógica existem lógicas distintas igual-
seria adequada ou correta se ela mente adequadas para formalizar
representa corretamente a relação um mesmo domínio3 . Por exem-
informal de consequência em um plo, em domínios inconsistentes,
dado domínio de objetos. lógicas paraconsistentes são mais
Nossa abordagem, como dito adequadas do que a lógica clás-
anteriormente, será considerar as sica, visto que, nesta, tudo se se-
críticas que um monista lógico gue de contradições. Não obs-
propõe ao pluralismo e relati- tante, muitas lógicas paraconsis-
vismo lógico, e mostrar que elas tentes são equivalentes à lógica
são, ou infundadas, ou insufici- clássica em domínios consistentes
entes para rejeitar tais posições. e, portanto, são igualmente ade-
Sendo assim, não nos preocupare- quadas nesta situação.
mos em escolher uma noção parti- Por fim, há o chamado plura-
cular de coerência, ou adequação. lismo canônico, que defende que
Utilizaremos as noções propostas mesmo quando o domínio a ser
pelos monistas, e mostraremos os investigado é o da linguagem na-
problemas com as mesmas. tural, isto é, investiga os cânones
O próximo passo para avaliar tradicionais de inferência, é pos-
o debate é distinguir níveis nos sível ter mais de uma lógica ade-
quais um pluralismo pode surgir. quada. Feitas as devidas distin-
3 Isso não significa, obviamente, que, existe mais de uma lógica adequada para a formalização de todos os domí-
nios.
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ções, podemos levantar as seguin- cia, nada poderia ser dito de fora
tes perguntas: Alguma dessas for- da lógica. Assim, não só questões
mas de pluralismo está correta? metalógicas estão ausentes nos es-
Quais as consequências filosóficas critos desses autores, mas a pró-
destas posições? Analisemos caso pria possibilidade de lógicas dis-
a caso. tintas e rivais é excluída de prin-
Alguns monistas lógicos defen- cípio5 . Ainda que eles tenham efe-
dem que um pluralismo puro, tuado mudanças profundas na no-
ainda que coerente, é simples- ção de lógica, seu caráter univer-
mente trivial4 . Bueno (2002) sal permanece o mesmo desde, ao
afirma que, se um pluralismo menos, Aristóteles. A aceitação de
puro é trivial, o é, no máximo, de um pluralismo lógico, ainda que
um ponto de vista sociológico, ou do ponto de vista puramente abs-
seja, é trivial que hoje há várias ló- trato, é um marco na história da
gicas puras. Mas, o fato de que lógica, e muda significantemente
isso é um fenômeno recente na ló- o debate de questões centrais da
gica mostra que não se trata de lógica, tais como a determinação
algo filosoficamente trivial, e pode do significado dos conectivos ló-
ser comparado com a revolução gicos, e a relação entre lógica e
que as geometrias não-euclidianas racionalidade. Outrossim, qual-
causaram na matemática. Não quer outro tipo de pluralismo ló-
obstante, o interessante não é me- gico pressupõe a possibilidade de
ramente o fato de que há várias ló- desenvolver múltiplas lógicas pu-
gicas diferentes, mas como deve- ras. Portanto, a existência de um
mos interpretar essa pluralidade. pluralismo teórico não pode ser
Do ponto de vista filosófico, considerada meramente trivial.
esta pluralidade é extremamente O pluralismo teórico também é
importante. Por exemplo, Frege e uma forma de relativismo, visto
Russell, dois dos maiores nomes que uma lógica seria correta re-
da formulação da lógica clássica, lativamente ao fenômeno que se
defendiam uma visão universal da pretende representar. Um mo-
lógica, de tal modo que suas leis nista lógico tende a argumentar
eram necessárias, a priori, e irres- que há critérios para escolher en-
tritas com relação ao seu domínio tre lógicas rivais na aplicação em
de aplicação. Como consequên- um dado domínio6 . Critérios
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sendo formalizada. Assim, os tra- cas, pode não haver uma forma de
tamentos dados por K1 e K2 são combiná-las ou, pior ainda, essa
igualmente adequados, e não te- combinação pode levar a resulta-
mos, necessariamente, um critério dos indesejados, como o problema
para decidir qual deve ser usado. do colapso10 : a combinação entre
Uma possível objeção a essa es- duas lógicas pode ser equivalente
tratégia de discutir a adequação a uma das lógicas iniciais, ou essa
de lógicas relativa ao seu domínio combinação pode gerar novas e in-
de aplicação é a seguinte9 : ainda desejáveis interações entre os co-
que possamos falar que lógicas di- nectivos das lógicas inicias11 . De
ferem em domínios diferentes, o um lado, isso pode fazer com que
que fazer quando precisamos ra- a lógica resultante seja conside-
ciocinar em múltiplos domínios? rada muito forte, no sentido de
Ora, neste caso, temos um novo que ela tem um poder de inferên-
domínio e, portanto, podemos ter, cia muito maior do que as lógi-
novamente, mais de uma lógica cas iniciais. Por outro lado, esta
adequada para formalizá-lo. Por combinação pode ser muito fraca,
exemplo, podemos raciocinar em e falhar em inferir certas propo-
um domínio construtivo e incon- sições importantes que eram cap-
sistente. Assim, precisamos de al- tadas pelas lógicas iniciais. Por-
guma combinação entre uma ló- tanto, a combinação de lógicas não
gica paraconsistente e uma intui- exclui a possibilidade de algum
cionista para estudá-lo. A obje- pluralismo lógico. Aceitar ou re-
ção, então, afirmaria que a solu- jeitar a ideia de que a lógica é
ção para a rivalidade entre lógicas relativa ao domínio de implica-
seria combiná-las e produzir uma ção tem sérias consequências para
única lógica para formalizar um questões centrais da lógica. Veja-
dado domínio. Assim, esta lógica mos isto em detalhes. Um dos pre-
resultante seria a única lógica ade- cursores desta noção pluralista de
quada para tal tarefa. variação do domínio é Newton da
Costa, que afirma que:
A falha desta abordagem é que,
a princípio, não há nenhum mé- É claro que, para objetos
todo geral para combinar lógicas. comuns, como um livro
Isto significa que, dadas duas lógi- ou uma pessoa, (. . . ) [o
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13 Para uma análise do pluralismo subjacente ao Princípio de Tolerância, bem como uma investigação do seu
limite, cf. DIAS (2015).
14 Cf. PRIEST (1979).
15 Cf. PRIEST (2008), pp.122-4.
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19 Para uma apresentação detalhada deste procedimento, cf. de SOUZA; COSTA-LEITE & DIAS (no prelo).
20 Há, na verdade, uma mudança na definição de dedução.
21 O fato de que as lógicas são equivalentes em contextos consistentes reforçam a ideia de que elas têm os mesmos
conectivos.
22 A prova deste resultado encontra-se em de SOUZA; COSTA-LEITE & DIAS (no prelo).
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