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FACULDADE DE TECNOLOGIA E CIÊNCIAS

COMUNICAÇÃO SOCIAL COM HABILITAÇÃO EM CINEMA E VÍDEO

NAPOLEÃO RÊGO CUNHA

GUIA PRÁTICO DE CAPTAÇÃO DE SOM DIRETO

SALVADOR
2008
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NAPOLEÃO RÊGO CUNHA

GUIA PRÁTICO DE CAPTAÇÃO DE SOM DIRETO

Trabalho apresentado à Faculdade de Tecnologia e Ci-


ências (FTC) como requisito parcial para a obtenção do
grau de Bacharel em Comunicação Social com Habili-
tação em Cinema e Vídeo.

Profa. Orientadora: Marise Berta.

SALVADOR
2008
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AGRADECIMENTOS

Escrever este Guia de Captação de Som Direto como Trabalho de Conclusão de


Curso me proporcionou um grande prazer e aprendizado. A revisão dos conteúdos,
a organização das idéias e a análise e registro das práticas de captação de som ex-
perimentadas nesses últimos anos fortaleceram de modo definitivo meu desejo de
aprofundamento na área de sonorização de audiovisuais.

Agora, no momento de agradecer às pessoas que motivaram e ajudaram meu pro-


cesso criativo, gostaria de compartilhar a felicidade da realização do meu projeto.

Agradeço ao corpo de professores do Curso de Cinema e Vídeo da FTC, pela com-


petência, dedicação e amizade com que sempre pude contar, em especial ao pro-
fessor Guilherme Maia, primeiro incentivador e orientador do projeto de conclusão, e
ao professor Roberto Duarte, que contribuiu definitivamente e de forma generosa
para ampliar minha visão sobre o que é a linguagem cinematográfica e a professora
e amiga Adriana Telles que acompanhou minha trajetória durante o curso e me pre-
senteou carinhosamente com revisão do texto final. Nesses últimos meses, contei
com a orientação da professora Marise Berta, que me acolheu com paciência e a-
tenção, e me proporcionou valorosos conselhos que me nortearam e contribuíram
para o resultado do trabalho. Obrigado pela dedicação, mestra.

Quero agradecer também ao apoio e entusiasmo dos meus pais, irmãos e amigos
que, mesmo sem se darem conta, estão presentes nestas páginas. Por fim, quero
agradecer e dedicar este projeto à minha esposa, Clarissa, por seu companheirismo,
amor e suporte incondicional. Essa alegria, compartilho-a com todos vocês.
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SUMÁRIO

O autor e o projeto................................................................ 5

Como usar o guia................................................................. 8

Antes, um passo atrás.......................................................... 9

O que é som direto............................................................... 13

A equipe de som direto......................................................... 15

As locações.......................................................................... 21

O silêncio no set................................................................... 24

O kit básico de captura de som direto.................................. 26

Os microfones....................................................................... 31

Operando o boom................................................................. 37

Gravando som direto na câmera de vídeo........................... 41

Captando som com um gravador de áu- 44


dio...........................

Dicas: gravando documentários e ficções............................ 49

Agora, um passo adiante...................................................... 54

Referências........................................................................... 56
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O AUTOR E O PROJETO

A paixão pelo som sempre fez parte da minha vida. Desde criança, lá em meados dos anos
1970, interessava-me muito pelas coisas que emitissem sons: pianos, cornetas, espoletas, tam-
bores, matracas, bombinhas juninas e uma infinidade de outros brinquedos que atualmente o
Inmetro não aprovaria para o uso infantil por causa do excesso de ruído. Mas os sons fortes,
felizmente, não me ensurdeceram, muito pelo contrário. Lembro do meu primeiro instrumento
musical de verdade: um órgão de três oitavas, comprado por meus pais em um supermercado,
que me ajudou a descobrir as melodias de uma série de cantigas de roda. Sempre fui – e ainda
sou – muito intuitivo com a música, tenho boa percepção e bom ouvido. Isso, porém, me afas-
tou do estudo teórico da música. A música era meu prazer solitário e eu não me interessava
muito pelas aulas, solfejos, partituras e, principalmente, pelos exercícios em clave de fá para a
mão esquerda.

Logo descobri o mundo da percussão e desviei-me completamente das melodias e harmonias


rumo ao ritmo. Foi um período difícil para os ouvidos, latas e panelas de minha casa. Contu-
do, sempre apoiado por meus pais, ganhei minha primeira bateria aos catorze anos e, desde
então, os tambores e pratos mudaram minha vida. As bandas formadas com os amigos, os
ensaios nos fins de semana, a década de 1980 com nosso “rock nacional”, tudo isso ajudou na
formação do meu eu, me construiu e definiu minhas sensibilidades. É preciso ressaltar que,
paralelamente à música, sempre gostei de desenho e pintura, o que mais tarde me inclinaria ao
curso de arquitetura, abandonado poucos anos depois, após profundos conflitos pessoais e
conselhos familiares. Hoje percebo que gostar de cinema tem muito da minha atração pelos
universos sonoro e iconográfico. Quando realmente desisti da carreira de arquiteto, foi a mú-
sica que me permitiu conhecer pessoas, viajar, ganhar dinheiro e me conduziu na passagem
para o mundo adulto.

Dentro desse mundo musical, descobri logo que algo chamava minha atenção tanto quanto
tocar um instrumento: a técnica de captação e registro do som. Dos pequenos festivais estu-
dantis até os maiores palcos, dos menores estúdios revestidos com caixas de ovos até os mais
profissionais com seus consoles cheios de canais, eu sempre orbitei os técnicos de som. Inva-
riavelmente, envolvia-me na preparação das sessões de gravação e fazia contatos e amizade
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com os “ratos” de estúdio. Nesse momento, o aprendizado empírico e orientado pelos amigos
mais experientes parecia insuficiente. Eu queria mais. Contudo, onde buscar mais? Nessa é-
poca, final dos 90, eu já produzia peças publicitárias para rádio e TV e gravava artistas inici-
antes no estúdio que montei em minha própria casa (meu ex-quarto!). Comecei a comprar
livros importados (não existia nada publicado no Brasil sobre técnicas de gravação), e seguir
uma rotina pessoal de estudos foi extremamente saudável e construtivo. Esse processo de a-
prendizado ocorreu em paralelo à popularização do áudio digital – os preços mais acessíveis
dos equipamentos e a massificação da internet deram um empurrão a mais nas minhas possi-
bilidades de acesso à informação e troca de experiências.

Em 2002, resolvi “chutar o balde”. Depois de definir uma estratégia de sobrevivência, ven-
dendo o carro e meu instrumento (a bateria tão querida!), fui para a Espanha fazer um curso
específico sobre gravação e produção musical. Essa vivência no curso, as aulas com excelen-
tes professores, a possibilidade de operar equipamentos de altíssima qualidade e a exposição
ao modo de vida em uma terra estrangeira obviamente me fizeram refletir muito sobre minha
abordagem acerca de estudo, trabalho e carreira. Não foram os equipamentos de milhares de
Euros – que os alunos usavam à vontade – que mais me impressionaram. O que me marcou
mais profundamente foi o constante cuidado e o compromisso com a qualidade de ensino, a
seriedade dos processos didáticos, o cumprimento de horários e metas e a tentativa de convi-
vência construtiva entre criatividade e disciplina. Por outro lado, a característica principal de
alguns colegas de curso era a velha idéia de que “o talento é tudo e define o sucesso”. Resul-
tado: os alunos mais talentosos sempre pediam mais prazo para a entrega dos trabalhos e nem
sempre alcançavam o “sucesso”.

Quando retornei, em 2003, continuei trabalhando com música e publicidade, mas estava deci-
dido a voltar a estudar. Procurei informação sobre os cursos de graduação nas diversas facul-
dades da cidade e dei de cara com o curso de Cinema e Vídeo da Faculdade de Tecnologia e
Ciências (FTC). Não tive dúvida: era o curso que eu estava procurando. Sempre gostei muito
das narrativas cinematográficas, tanto ficcionais quanto documentais, e as técnicas do cinema
exercem um fascínio enorme sobre mim. Por causa do trabalho com publicidade e comunica-
ção, a produção audiovisual já era uma área com a qual eu convivia e tinha afinidade. Obvia-
mente, acima de qualquer coisa, eu estava buscando um curso que me proporcionasse prazer.
Esta é uma das vantagens de se graduar após atingir uma certa estabilidade econômica: pode-
se escolher o curso simplesmente pelo prazer.
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O tiro acertou o alvo em cheio. No curso de cinema encontrei espaço para pensar a comunica-
ção, a narrativa, a expressão artística, a indústria do entretenimento, o poder das imagens e
também pude contemplar minha paixão: o som. As técnicas de captação, as estratégias de
produção sonora, a finalização da banda sonora e a recepção por parte do público são temas
que me interessaram desde o início da graduação. Após vários anos trabalhando em estúdios
de gravação, encontrei no som para audiovisuais uma área de atividade muito atraente. Os
desafios de fazer uma boa captação fora de uma sala de gravação são inúmeros, exigem muita
preparação e trabalho em equipe. O meu background ajudou muito no entendimento e na a-
plicação das técnicas específicas do cinema e do vídeo, e a prática desses quase quatro anos
foi essencial para que eu decidisse apresentar, como trabalho de conclusão de curso, um guia
introdutório de captação de som direto para audiovisuais. Outro motivo para desenvolver este
projeto foi a percepção da brutal ausência de material de referência para os interessados em
som direto. Infelizmente, só há livros estrangeiros sobre o tema, os quais, na maioria das ve-
zes, contemplam um nível de produção complexo e caro, que não equivale ao encontrado pe-
los estudantes e realizadores locais. O guia é simples, fácil de ler, sem complexidades técnicas
que impeçam o iniciante de se sentir à vontade e atraído pelos conhecimentos transmitidos.
Neste guia se encontra uma parte essencial dos conhecimentos que adquiri com a experiência
em gravar sons dentro e fora do estúdio. A humilde pretensão deste trabalho é introduzir o
leitor no universo da captação do som direto, como um primeiro passo para quem se interessar
em dar continuidade ao aprendizado. Desejo a todos uma boa leitura.
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COMO USAR O GUIA

A estrutura deste guia está organizada em capítulos que seguem um fluxo estratégico. Essa
organização busca proporcionar um melhor entendimento do conteúdo e aponta, proposital-
mente, para a ideologia de que, antes de tudo, um produto audiovisual se faz com pessoas,
competências e sensibilidades. A técnica e os recursos materiais são ferramentas essenciais,
mas devem vir para dar suporte à emoção e à criatividade.

Primeiro falaremos do humano, do indivíduo, das funções, de trabalho e ética, e das relações
profissionais em um projeto audiovisual. A abordagem inicial, portanto, será sobre quem faz
som direto.

Avançaremos, então, com as questões técnicas: as locações, os equipamentos e as estratégias


de captação. Esses tópicos equivalem a o quê, onde e como. Este guia não pretende analisar
aspectos do som como fenômeno físico nem descrever de forma exageradamente técnica os
equipamentos utilizados para captação. O intuito é apresentar ao leitor um guia com os proce-
dimentos elementares para a gravação de som em produtos audiovisuais. Os mais interessados
deverão buscar conhecimento específico nas áreas de acústica, áudio analógico e digital e som
para cinema.

Ao final, o guia tratará de aspectos práticos na captação de som direto para ficção e documen-
tário, acrescentando algumas dicas sobre as técnicas utilizadas pelos profissionais do som
direto.

Este trabalho deseja, acima de tudo, encorajar os estudantes e realizadores do audiovisual a


buscarem bons resultados na captação de som em suas ficções ou documentários. Em som
direto, uma preparação adequada é o caminho para o sucesso. Nenhum equipamento, por
mais caro ou moderno que seja, substituirá a competência de uma equipe comprometida em
realizar um bom produto.
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ANTES, UM PASSO ATRÁS

O cinema nasceu mudo? Nem tanto. O espetáculo de luz e imagens em movimento já trouxe o
som como o acompanhante natural e essencial à fruição dos filmes desde o chamado “primei-
ro cinema”. O silêncio nunca existiu realmente nas salas de cinema – ao contrário, o público
testemunhou invariavelmente um rico universo sonoro, com música, vozes, efeitos sonoros
recriados ao vivo, além dos ruídos das próprias reações aos filmes. Naturalmente, o acompa-
nhamento mais utilizado para as experiências pioneiras do cinema foi a música. Essa música,
tocada ao vivo, geralmente por um pianista ou uma pequena orquestra, embalava as exibições
recorrendo às partituras de temas eruditos ou populares mais conhecidos do público, um tru-
que que ajudava a conectar as pessoas ao espetáculo visual. Nessa época, havia também a
função dos “explicadores”, apresentadores que narravam as películas durante as sessões, cola-
borando com suas vozes para que público entendesse a nova linguagem e sua gramática. Lu-
tando contra as dificuldades técnicas, chegou-se ao ponto de preparar atores que, escondidos
atrás da tela, dublavam os diálogos e davam voz às imagens projetadas, tentando manter o
máximo de sincronismo possível, numa inequívoca busca pelo realismo. Apesar das discus-
sões estéticas sobre o real valor do som para o cinema, a indústria naturalmente buscou reali-
zar esse casamento e, pouco a pouco, as dificuldades técnicas foram ultrapassadas.

Após várias tentativas, em 1927, um filme chamado O Cantor de Jazz inaugura a possibili-
dade de realizar filmes de longa-metragem com som sincronizado. Obviamente, o cinema não
passou de “mudo” a “sonoro” do dia para a noite, mas até então só se conseguia sonorizar
com falas e diálogos, de forma eficiente, filmes com pequena duração. Esse marco, estabele-
cido com O Cantor de Jazz, nos serve como referência histórica pelo ineditismo do feito.
Percebe-se que, àquela altura, as tecnologias de registro de imagem e som desenvolviam-se
rapidamente, mas o casamento entre os dois mundos desafiava a indústria também no “modo
de fazer” cinema. O texto de Martin Barnier no livro En route vers le parlant. Historie d’une
évolution technologique, économique et esthétique du cinema fala sobre esse alvorecer do
cinema sonoro:

No início de 1929, utilizaram-se, pela primeira vez, grandes varas montadas


sobre tripés com rodas de cortiça para deslocar silenciosamente os microfo-
nes no set. Na França, batizaram esse equipamento como “girafa” e, nos
EUA denominaram-no de boom microphones. Já a partir de 1926, nos estú-
dios da Warner Bros., os microfones não estavam somente escondidos nos
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vasos de plantas, como descobrimos depois de Cantando na Chuva, mas


também pendurados no teto do estúdio. Um sistema de cordas permitia posi-
cionar os microfones acima dos atores. Rapidamente, sem dúvida até o final
de 1927, os microfones estavam pendurados em varas que permitiam seu
deslocamento. Antes disso, colocavam-se inúmeros microfones no teto do
cenário e o engenheiro de som mixava ao vivo, ligando e desligando micro-
fones sucessivamente (a partir do verão de 1926). Poucos técnicos (e durante
poucos meses) opuseram-se ao deslocamento dos microfones em varas.
(2002, p.78-79. Tradução minha).

Contudo, ouvem-se os testemunhos das equipes técnicas e só são lembradas as “auto-


biografias” dos cineastas que afirmam que tiveram a idéia de mover os microfones contra a
vontade dos engenheiros de som. É o que podemos ler em uma entrevista de William Well-
man concedida a Richard Schickel, citada no livro El sonido en el cine de Laurent Jullier:

Cheguei (ao set da Paramount) e disse: “Essa manhã tenho boas notícias para
os sound men. Vou mover o condenado do microfone”. Enchi-me de cora-
gem, arranjei uma escada, subi e soltei o microfone do teto. Coloquei-o na
ponta de uma vassoura. Movi-o e funcionou. (2007, p.74. Tradução minha).

Diferentes fontes oferecem nomes de diferentes pessoas responsáveis pelo “primeiro microfo-
ne móvel”, sem que tenhamos um dado exato. Douglas Shearer afirma que seria Eddie Man-
nix, do Departamento de Som da MGM. Por outro lado, temos Gordon Sawyer, técnico da
United Artists, ou Doroty Azner na Paramount. As girafas construídas pelos operários dos
estúdios serão utilizadas no final de 1928. Uma das primeiras, nos estúdios MGM, gira e des-
loca-se em todos os sentidos sobre um eixo. Em 1929, existem girafas com varas telescópi-
cas. Em 1930, o aperfeiçoamento permite movimentação total e contrapesos facilitam a ope-
ração.

A descrição acima nos mostra de forma breve como a indústria cinematográfica iniciou seu
desenvolvimento de estratégias para captação de som, vencendo os limites impostos pela tec-
nologia da época. Inúmeros problemas foram progressivamente solucionados, entre eles o
ruído gerado pela própria câmera, pelas luzes ou pela maquinaria. A próxima barreira a ser
vencida era sair do estúdio, filmar nas ruas, usar o som gravado nas locações como som final.
Isso só seria possível com um equipamento de gravação de som pequeno e leve, bem diferente
dos usados nos estúdios até aquele momento.

Nos primeiros anos da década de 1950, a empresa suíça Kudelski S.A. inicia a comercializa-
ção de um equipamento que viria a ser um símbolo de qualidade e confiabilidade na gravação
de áudio, utilizando a tecnologia do registro de som em fita magnética: os gravadores Nagra.
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Esses gravadores se tornaram o sistema padrão de gravação de som para cinema de 1960 até
os anos 1990, e, durante todos esses anos, ganharam a fama de trabalharem como “relógios
suíços”, por sua precisão e infalibilidade. Seu tamanho reduzido e construção robusta também
permitiam o uso adequado para as produções fora dos estúdios, em locações exteriores, nas
quais o equipamento deveria ser leve e resistente. Uma grande inovação dos gravadores Nagra
foi o Neo-Pilottone, um sinal de sincronismo, compartilhado entre o gravador e a câmera, que
garantia que a velocidade dos motores dos dois equipamentos estaria perfeitamente sincroni-
zada, tanto no momento da gravação quanto na pós-produção, durante a montagem e sonori-
zação dos filmes. Esse sistema, hoje obsoleto, foi gradativamente substituído pelo código de
tempo desenvolvido e compartilhado por duas organizações: a Society of Motion Picture And
Television Engineers (SMPTE), nos EUA, e a European Broadcast Union (EBU), na Europa.

Os anos 1990 marcam o início da revolução digital para a captação de som no cinema. A pri-
meira renovação de equipamentos ocorre com o uso dos gravadores DAT (Digital Audio Ta-
pe) para captação do áudio em lugar dos gravadores de fita magnética. O manuseio das fitas
DAT, que têm o tamanho aproximado de uma caixa de fósforos, era extremamente simples e
seu armazenamento requer menos espaço e cuidados do que os rolos de fita dos Nagra. Mas,
apesar de serem muito práticos e de terem uma qualidade de som muito boa, os gravadores
DAT apresentavam um problema para a produção: a fragilidade do equipamento, principal-
mente em comparação aos “tanques de guerra” suíços. Além disso, o áudio digital natural-
mente evoluiu para a gravação não-linear, que utiliza discos rígidos ou cartões de memória
para o armazenamento e a manipulação dos arquivos sonoros. Esse fato decreta o abandono
progressivo dos DAT e inicia a era dos gravadores multipistas digitais.

Com a possibilidade de gravar várias pistas com aparelhos portáteis, o SOM DIRETO pôde
expandir e aperfeiçoar as estratégias e técnicas de captação. Os arquivos sonoros digitais tam-
bém têm a característica de incluírem “metadados”, que são informações importantes anexa-
das, a exemplo do TIMECODE (ou código de tempo), que facilita muito a sincronização entre
som e imagem.

Atualmente, temos à nossa disposição gravadores digitais com duas, quatro, seis, oito ou mais
pistas, que gravam em disco rígidos ou cartões de memória, com uma qualidade de áudio im-
pressionante, timecode, portabilidade e resistência ao manuseio, por preços relativamente bai-
xos se comparados aos antigos gravadores analógicos.
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Por outro lado, o desenvolvimento da captação simultânea de som e imagem em vídeo e a


progressiva redução de preços desses equipamentos também ampliaram o modo de realizar
produtos audiovisuais. A indústria tem apresentado cada vez mais camcorders digitais, que
são capazes de gravar som com qualidade bastante para realizar produções de TV ou cinema.
No entanto, as orientações para se obter um bom SOM DIRETO não mudaram com o passar
dos anos nem com a chegada das novas tecnologias. A era digital não invalida nem substitui
os conhecimentos essenciais e os cuidados que um profissional de captação de som domina.
Então, finalmente, vamos ao tema: como fazer som direto?
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CAPÍTULO 1
O QUE É SOM DIRETO?

Som direto é toda e qualquer informação sonora gravada simultaneamente à captação das i-
magens de um produto audiovisual. As vozes dos atores, os ruídos das ações, a ambiência dos
espaços internos e a paisagem sonora dos exteriores fazem parte da construção do som direto,
que também deve registrar sons e ruídos adicionais, particulares à locação, captados no set,
para serem utilizados na montagem, enriquecendo a banda sonora.

Um bom som direto sempre priorizará a melhor captação possível dos diálogos ou depoimen-
tos. A inteligibilidade das vozes é o primeiro objetivo do técnico de som direto. Nada parece-
rá mais amador, em um produto audiovisual, do que vozes mal captadas e ininteligíveis. Os
efeitos imediatamente gerados por qualquer ficção ou documentário com um áudio ruim são o
desinteresse e a desconcentração do público.

Fazer um bom som direto é, antes de tudo, gravar boas vozes. Esse conceito de trabalho tem
um motivo claro: evitar a dublagem dos diálogos. Em geral, a melhor interpretação dos atores
é aquela que acontece no calor do set. Dificilmente conseguimos reproduzir, mais tarde, em
estúdio, a concentração do elenco e da equipe, assim como o ambiente e a atmosfera psicoló-
gica que compõem o momento da filmagem. Algumas vezes, por questões técnicas, não é
possível captar um bom som dos diálogos e, infelizmente, a dublagem será inevitável. Neste
caso, é preciso ter em conta as questões de cronograma e orçamento, que aumentarão conside-
ravelmente os custos da produção. É bom ressaltar que, diferentemente dos diálogos, os ou-
tros sons (ambiências, efeitos e ruídos) podem ser mais gravados separadamente no próprio
set ou produzidos, mais tarde, em estúdio. Contudo, além das vantagens econômicas, um bom
som direto apresenta vantagens estéticas do ponto de vista de uma abordagem naturalista.

Nos documentários, é essencial ressaltar a importância estética do som direto para o êxito da
obra. Foi a partir de 1950, com desenvolvimento dos gravadores portáteis e da captação de
som sincronizado com imagem que os sujeitos documentados ganham voz própria. Além do
registro das vozes, é essencial a captação da paisagem sonora das locações. A captação de
som contribui decisivamente para registrar o recorte desejado da realidade, pois não só infor-
ma o espectador sobre essa realidade, através do som dos depoimentos e das ações, como
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também evoca o lugar, a ambiência e o fora de quadro1, estimulando e ampliando a sensoria-


lidade e a subjetividade do público.

As obras documentais têm a inerente característica de buscar um momento único, o flagrante,


o registro do irrepetível, e é preciso atenção e habilidade para não perder ou registrar precari-
amente o som direto nos documentários.

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O enquadramento da imagem só define o que se vê, mas não elimina os sons que fazem parte do entorno, que
não é visto, mas sabemos que existe. A sonoridade do fora de quadro, especialmente nos documentários, é um
elemento construtivo essencial para a fruição do público.
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CAPÍTULO 2
A EQUIPE DE SOM DIRETO

A realização de um produto audiovisual exige, acima de tudo, trabalho em equipe. A sua rea-
lização demanda cooperação e coordenação, disciplina e hierarquia, dedicação e comprome-
timento. A equipe de som direto, além de empenhar-se em sua área de trabalho, deve ter uma
atitude colaborativa em relação às atividades dos outros departamentos, sempre cuidando para
não invadir o espaço de atuação dos demais profissionais envolvidos no projeto. Também é
indispensável a colaboração de todos os departamentos para que seja possível realizar as gra-
vações de áudio no set e registrar, com qualidade, o som durante as filmagens.

Considerando uma típica configuração de produção audiovisual, com sua complexidade e


variedade de atividades, vamos agora focalizar a equipe de som direto: descrevê-la, analisá-la
e relacioná-la com os outros departamentos.

Uma equipe de som direto se divide em três funções: o técnico de som, o microfonista e o
assistente de som. Obviamente, essa divisão de funções só é possível em produções que te-
nham recursos financeiros para investir nesse nível de especialização e dinâmica de trabalho.
É comum, em produções de maior orçamento, a equipe de som ter até mais de um microfonis-
ta ou dois assistentes de som dividindo as demandas durante as filmagens, mas não é o objeti-
vo deste guia descrever tais situações. Vamos nos concentrar nas pequenas realizações, com
equipes menores, e no aprendizado das abordagens e procedimentos básicos de uma equipe
padrão de som direto. De qualquer forma, por menor que seja a produção, as funções citadas
acima nunca serão eliminadas, mas redistribuídas dentro da própria equipe. Por exemplo, nas
equipes reduzidas de documentário e pequenas ficções, por questões de custo e logística, o
técnico de som também desempenha a função de microfonista. A análise da equipe de som
direto, seus profissionais e suas funções é essencial para estabelecer as competências e deve-
res exigidos em qualquer projeto audiovisual.

O TÉCNICO DE SOM DIRETO

É o profissional responsável pela gravação de som no set, que comanda a equipe de som dire-
to e assina a captação nos créditos. São atribuições da sua função: estudar o roteiro, visitar as
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locações, reunir-se e discutir com a direção e com os outros departamentos sobre as necessi-
dades técnicas e propostas estéticas para a realização do filme.

Em um produto audiovisual, o fluxo da atividade do técnico de som direto inicia-se logo após
o convite da produção para participar do projeto. Na primeira fase, chamada pré-produção da
equipe de som, é necessário obter as informações básicas sobre a realização. Ter acesso ao
projeto, roteiro, cronograma e plano de locações permitirá ao técnico participar das reuniões
com a direção e produção, já que a análise cuidadosa desse material é indispensável para a
realização de um bom registro do som direto.

O próximo passo é definir, junto à produção, as demandas técnicas, de pessoal e de equipa-


mento. Neste momento, definem-se também os valores dos cachês dos profissionais da equi-
pe.

As demandas técnicas serão solicitadas à produção do projeto e incluem: visitas prévias às


locações, preparação das locações visando a melhoria da acústica de interiores (colocação de
mantas, carpetes e espumas) e a minimização de ruídos no set e entorno (maquinaria, luzes,
ar-condicionado, tráfego e animais). O técnico também é responsável pela escolha do melhor
equipamento para a realização da captação de som, devendo disponibilizar, no set, o sinal do
som direto para monitoração pelo diretor, além de entregar um boletim de som para a produ-
ção, juntamente com as mídias utilizadas para o registro de som (fitas, CD, DVD, cartões de
memória ou HD).

Os conhecimentos necessários para a formação de um técnico de som direto são:

 O som como fenômeno físico e suas propriedades.


 Acústica: o comportamento do som em ambientes abertos ou fechados.
 Psicoacústica: a percepção subjetiva dos fenômenos sonoros pelo ser humano.
 Áudio: dominar profundamente a teoria e a operação dos equipamentos para grava-
ção do som.
 Fundamentos de eletricidade e eletrônica.
 Informática: atualização sobre as novas tecnologias digitais e seus processos.

Além desses tópicos, claramente técnicos, é essencial a construção de um background teórico


das linguagens e estéticas audiovisuais. É altamente desejável que o técnico de som direto
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tenha um amplo repertório audiovisual, conhecimento sobre a história do som no cinema, teo-
ria da comunicação e do cinema, movimentos e escolas cinematográficas, produção para TV,
música e estética. O técnico se relaciona diretamente com a direção dos projetos e quanto
mais souber sobre a linguagem de cinema e vídeo mais competência terá para seguir as ins-
truções e sugerir soluções para a realização. A função de técnico também exige conhecimento
sobre os outros processos ligados ao som de um filme, como edição de som, mixagem e fina-
lização. Quanto mais ele conhecer esses processos mais competência terá para exercer sua
atividade com segurança e criatividade.

O MICROFONISTA

Sua função principal é operar o boom (vara telescópica que sustenta um microfone próximo à
fonte sonora). O microfonista será responsável também pela colocação dos microfones de
lapela nos atores e outros plantados no set, sempre seguindo as orientações do técnico. A
guarda e manutenção dos equipamentos, na ausência de um assistente de som, também pas-
sam a ser funções do microfonista.

A princípio, pode parecer fácil operar um boom no set, mas é preciso muito treino e resistên-
cia física para se tornar um bom microfonista. É preciso colocar o microfone o mais próximo
possível dos atores, sem invadir o limite do quadro nem gerar sombras, e manter a consistên-
cia sonora da captação todo o tempo. Essas habilidades serão descritas mais tarde, no capítulo
sobre operação do boom.

Como assistente imediato do técnico de som, o microfonista deve ter conhecimento sobre o
funcionamento e manutenção dos equipamentos e dirigir-se somente ao técnico quando tiver
dúvidas ou perceber problemas no som. Aqui estão algumas das competências do microfonis-
ta experiente:

 Posicionar o microfone o mais próximo possível, sem entrar em quadro.


 Não perder o eixo de captação dos diálogos quando os atores se movimentam em
cena.
 Trabalhar de forma cuidadosa e silenciosa, principalmente no manuseio da vara de
boom, mesmo quando for necessário andar ou correr para seguir a ação.
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 Preocupar-se em eliminar as possíveis sombras geradas pelo boom sobre os atores


ou cenário.
 Apresentar-se gentilmente e explicar com clareza, para os atores, quando for neces-
sário colocar microfones de lapela na roupa ou no corpo destes.
 Não se dirigir ao diretor ou ao assistente de direção. Seu contato deve ser exclusi-
vamente com o técnico de som. Sugestões são sempre bem vindas, mas devem ser
discutidas anteriormente com seu superior.
 No ensaio “para o som”, perceber e memorizar a melhor forma de movimentar-se
durante a tomada, fazendo uma espécie de mapa mental da ação.

O ASSISTENTE

Tem a função de dar suporte ao técnico e ao microfonista, auxiliando na montagem e desmon-


tagem dos equipamentos de som, coordenando a guarda e transporte desses equipamentos,
preenchendo eventualmente o boletim de som, orientado pelo técnico, e atendendo às deman-
das imediatas da equipe (troca de pilhas e baterias, posicionamento de cabos, alimentação,
etc.). Também deve ter consigo um kit de ferramentas e conhecimento em eletrônica básica,
para eventuais manutenções no set. Em caso de dúvidas ou sugestões, o assistente deve diri-
gir-se somente ao microfonista e técnico de som.

A EQUIPE DE SOM E OUTROS DEPARTAMENTOS

Nos projetos audiovisuais, assim como em qualquer atividade coletiva, a qualidade das rela-
ções profissionais e o nível de colaboração entre os departamentos determinam decisivamente
o sucesso ou fracasso do trabalho. Vamos listar uma série de estratégias que o técnico de som
direto deve utilizar juntamente com a colaboração de toda a equipe do projeto. Quando todos
os departamentos são convidados para colaborarem com a captação do som direto, ganhamos
uma atitude mais positiva no set e o técnico deixa de ser o chato que reclama sempre de
quaisquer barulhinhos imperceptíveis. É necessário que todos entendam e se comprometam
com essa colaboração silenciosa para o som do filme. Abaixo, itens que ilustram como a e-
quipe de som direto pode obter a colaboração de cada departamento do projeto.
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Direção

 Reunir-se com o técnico de som para analisar e discutir o roteiro e as escolhas técni-
cas e estéticas.
 Disponibilizar-se para discutir problemas que possam ocorrer no set.
 Cuidar para não desautorizar ou desprezar a opinião do técnico frente à equipe de
filmagem. Conversar em particular em caso de divergência.

Produção

 Visitar as locações com o técnico de som.


 Isolar a área do tráfego de veículos, sempre que possível.
 Checar tráfego aéreo e atividades ruidosas próximas às locações.
 Não desprezar os pedidos do técnico em relação a material fonoabsorvente para me-
lhorar a acústica do set, como mantas e carpetes, nem a solicitação de aluguel de e-
quipamentos extras para captação de som.

Arte

 Evitar objetos e equipamentos ruidosos (ranger de móveis, ventiladores, computado-


res etc.).
 Evitar luminárias muito baixas no cenário (atrapalham a operação do boom).
 Utilizar cortinas e carpete ajuda a obter um som menos reverberante nos interiores,
além de atenuar ruídos de passos.
 Nos cenários, não construir tetos muito baixos e, se possível, evitar paredes parale-
las.

Figurino

 Evitar objetos que provocam muito ruído, como colares, brincos e outras jóias.
 Evitar tecidos sintéticos e priorizar roupas de algodão.
 Colaborar quando for preciso esconder um microfone na roupa dos atores.
 Não se impressionar com o relevo desses microfones embaixo da roupa, raramente
eles serão perceptíveis ao público.
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Alimentação

 Manter a área para refeições longe do set.


 Controlar os ruídos das máquinas de café, fornos microondas e refrigeradores.

Elétrica, maquinaria e transporte

 Manter geradores de energia o mais longe possível.


 Evitar abrir janelas e portas do set como passagem para cabos.
 Manter os equipamentos e “traquitanas” bem lubrificados.
 Garantir que caminhões e caminhonetes de transporte sejam estacionados a certa dis-
tância; carrinhos devem transportar os materiais até o set.
 Ter sempre mantas e cobertores para abafar ruídos de maquinário.
21

CAPÍTULO 3
AS LOCAÇÕES

Locação é qualquer lugar, fora de um estúdio, escolhido para realizar captação de imagem e
som, em ficções ou documentários. Conhecer previamente as locações onde vamos trabalhar
com som direto é a arma mais eficaz para evitar surpresas que impossibilitam uma boa capta-
ção do áudio. Após a definição das locações, é de extrema importância visitá-las, de preferên-
cia em horário próximo ao da filmagem, e definir uma estratégia para o controle dos ruídos ou
melhoria de uma acústica ruim. É bom frisar que, da mesma forma que a direção elimina ou
substitui locações por questões da fotografia, o técnico de som direto pode condenar um local
por entender que não será possível realizar uma boa captação do áudio. É responsabilidade do
técnico manter a direção e produção advertidas em relação às dificuldades técnicas para cum-
prir sua função.

As locações se dividem, basicamente, em interiores e exteriores. Vamos analisar as caracte-


rísticas desses dois tipos de locação e como usá-las para melhorar a captação de som.

INTERIORES

Chamamos de interiores os ambientes total ou parcialmente fechados, que possuem teto e


paredes, e que conseqüentemente geram mais reflexões no som produzido dentro deles. Esses
espaços isolam parcialmente os ruídos indesejáveis que vêm de fora do set e isso é uma gran-
de vantagem para o som direto. Porém, as locações em interiores têm um elemento que exige
muito cuidado na captação do som: a reverberação. A primeira característica negativa de um
ambiente demasiadamente reverberante é a perda da inteligibilidade da voz. O microfone, em
um ambiente exageradamente reverberante, vai captar, além das vozes, as reflexões sonoras
(que geram o fenômeno da reverberação) e o áudio ficará sem presença e sem definição. Um
bom exemplo disso é a sonoridade de espaços como igrejas, ginásios e até mesmo salas gran-
des ou banheiros. A quantidade de reverberação tem relação direta com o tamanho do espaço
e a densidade das superfícies.

 Grandes espaços internos tendem a ser mais reverberantes do que os pequenos.


 Superfícies mais rígidas geram mais reflexões do que as macias.
22

É fácil notar que uma sala grande é mais reverberante que um quarto pequeno. Mas, se a sala
estiver com móveis, tapetes, cortinas e quadros, pode ter menos reverberação do que um quar-
to que tem apenas uma cama. Isso ocorre por causa das superfícies dos objetos presentes em
um local. Em geral, tecido, fibras, espuma e madeira são materiais mais fonoabsorventes (me-
nos densos) do que os usados para as paredes, piso e teto. Isso ajuda na diminuição das refle-
xões e aumento da inteligibilidade do áudio gravado.

Um som captado com um pouco de reverberação natural soa mais real, cheio e rico. No entan-
to, em hipótese alguma as reflexões podem ter uma intensidade tal que prejudique o entendi-
mento dos diálogos. O melhor a fazer é tentar controlar as características da sala com materi-
ais fonoabsorventes como tapetes, carpetes, mantas e espumas acústicas. Esses materiais têm
a propriedade de diminuir a intensidade da reflexão do som, tornando o ambiente mais morto.
Manter o microfone o mais próximo possível e cuidar da acústica da locação irão garantir
uma boa relação entre o sinal direto (som originado na fonte sonora) e as reflexões (sons ori-
ginados após o som original rebater nas superfícies do ambiente), permitindo inteligibilidade
nas vozes e uma percepção dos planos sonoros muito mais precisa. Plano sonoro nada mais é
do que a sensação de proximidade ou distância em relação à fonte sonora. Quanto mais perto
da fonte menos percebemos as reflexões e vice-versa. Não custa lembrar que sempre é possí-
vel adicionar o efeito da reverberação na pós-produção, com softwares ou unidades externas
de reverb, e, na mixagem final do projeto, escolher a quantidade de efeito adequada.

Sempre que gravamos em interiores é necessário gravar o room tone do set. Room tone é o
som característico do silêncio específico de cada ambiente fechado – em português, chama-
mos de bafo da sala. Esse bafo deve ter pelo menos um minuto para ajudar, na montagem, a
suavizar cortes e corrigir ruídos entre as falas.

EXTERIORES

As locações chamadas de exteriores são os espaços abertos onde o som vai ter uma propaga-
ção sem reflexões perceptíveis, por exemplo: um jardim, praia, rua etc. Ao contrário dos es-
paços fechados, não encontraremos problemas com reverberação em exteriores, porém os
ruídos do entorno são o grande desafio a ser solucionado. Em um set ao ar livre, a quantidade
de fontes de ruídos possíveis é enorme. Em um entorno urbano, podemos ser surpreendidos
23

por aviões, tráfego, música, máquinas, motores, sirenes, vozes e inúmeros outros ruídos.
Quando nos afastamos para locações longe dos centros urbanos, os ruídos diminuem, mas
continuamos vítimas dos aviões, animais e sons naturais como vento, folhagem e quedas
d’água. Em qualquer dos casos, o objetivo é manter uma relação sinal-ruído bastante elevada,
ou seja, diálogos e outros sons relevantes com muito mais volume do que o som ambiente.
Sempre que estivermos em locações exteriores, é necessário gravar essa ambiência, registrar a
paisagem sonora separadamente, para enriquecer a banda sonora ou corrigir problemas na
captação. Seria o equivalente ao bafo dos interiores. Esse registro da ambiência deve ser feito
em estéreo, ou seja, utilizando dois canais (direito e esquerdo), para possibilitar a construção
de uma imagem sonora ampla, que simule a espacialidade real da locação.
24

CAPÍTULO 4
O SILÊNCIO NO SET

Por definição, o silêncio é a ausência de som. No entanto, essa definição não se aplica para
quem trabalha com som direto. Deve-se pensar o silêncio como uma sensação subjetiva muito
mais do que um fenômeno físico. Considerando que o som só não se propaga no completo
vácuo, temos a certeza que nunca “ouviremos” o tal silêncio. E mesmo se pudéssemos sobre-
viver no vácuo do espaço sideral, por alguns minutos, nossos sons internos nos encheriam de
sensações sonoras: o coração batendo, o sangue correndo, os olhos piscando e sabe-se lá quais
ruídos ouviríamos diretamente de nossas vísceras.

Então, quando pedimos silêncio para gravar som direto, num set de filmagem, estamos pedin-
do o impossível? Sim. E não.

Como foi dito antes, conhecemos o silêncio como uma sensação subjetiva e não como um
fenômeno físico. Já que ignoramos o tal silêncio absoluto (coisa que nunca vamos experimen-
tar), é preferível pensar nos vários “silêncios” que somos capazes de criar e perceber. O silên-
cio de um templo religioso não é igual ao silêncio da casa no campo. O minuto de silêncio em
um estádio de futebol em nada se parece com o silêncio de um hospital. Em todos os casos, o
silêncio tem vida própria, tem “consistência e densidade” particulares e, acima de tudo, tem
seus sons formadores que lhe dão caráter e identidade. Quando gravamos som direto, é essen-
cial termos sob nosso domínio o silêncio que desejamos.

Agora entraremos nas questões práticas. A primeira coisa que devemos saber é: para que ser-
ve o silêncio no set? Obviamente, o silêncio vai permitir a gravação de um bom som no set.
Teremos vozes claras, inteligíveis, sem ruídos que atrapalhem o entendimento ou desconcen-
trem o público. O silêncio também permitirá que, na montagem, sejam escolhidos os planos
que construirão as seqüências sem uma mudança perceptível na paisagem sonora, apesar de as
tomadas terem sido captadas em diferentes momentos. O silêncio constante permite suavizar a
montagem. A descontinuidade de um background sonoro barulhento, com ruídos diferentes a
cada mudança de plano denunciaria os cortes de maneira inaceitável. A essa continuidade
chamamos raccord de som.
25

É importantíssimo, no trabalho da equipe de som direto, gravar esse silêncio próprio de cada
set. O bafo da sala (o room tone) vai ajudar a suavizar os cortes, preencher vazios na pista de
som e substituir ruídos indesejados entre as falas na fase de montagem.

Sempre que acabarmos de gravar os diálogos em um set, devemos gravar, pelo menos um
minuto desse bafo, e para isso a equipe deve colaborar com paciência e sem fazer ruídos.

LEMBRETES IMPORTANTES

 Sempre que possível, escolher locações naturalmente silenciosas.


 Em locações ruidosas, tentar minimizar os ruídos isolando a área, desligando máqui-
nas e aparelhos, evitando rota de aviões, fechando portas e janelas, usando mantas e
mantendo a equipe silenciosa nos momentos de gravação.
 O silêncio absoluto não existe, nem soa natural! Precisamos do silêncio próprio de
cada locação. O segredo é manter as vozes altas e claras em relação ao bafo natural
de cada ambiente.
 Grave sempre o bafo dos interiores. Ele deve ser gravado sem vozes e com a equipe
silenciosa, por pelo menos um minuto.
 Se a locação for inevitavelmente ruidosa, proponha à direção a gravação de um pla-
no seqüência. Apesar do background ruidoso, o montador terá a continuidade sonora
garantida (raccord).
 Visitar e preparar as locações é sempre uma forma de evitar surpresas. Em som dire-
to, preparação é metade do trabalho.
 Um set silencioso, mesmo em momentos nos quais não haja gravação de som, pro-
porciona concentração e comunicação mais fácil.
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CAPÍTULO 5
O KIT BÁSICO DE CAPTURA DE SOM DIRETO

Quando a equipe de som direto sai para uma locação leva consigo um conjunto de equipa-
mentos que serão as ferramentas para realizar seu trabalho. A essa altura, o técnico de som
direto já deve ter visitado a locação previamente; preparado os interiores (melhorando sua
acústica); reduzido, com a ajuda da produção, os ruídos no set e no entorno; e se familiarizado
com a paisagem sonora do local. É chegada a hora de escolher e configurar os equipamentos
que serão utilizados para realizar a captação. Cada profissional desenvolve, com o tempo e a
experiência, um gosto pessoal e uma seleção própria dos seus equipamentos. Eles funcionam
de maneira diferente e, o mais importante, soam de maneira diferente. Assim, o técnico de
som direto irá construir suas preferências pessoais de acordo com o manuseio e sonoridade
desejada.

Neste guia, tomou-se a liberdade de configurar um kit básico de captação, com equipamentos
de qualidade profissional, tanto em sonoridade quanto em construção.

O kit proposto permite captar som direto tendo em vista as produções em vídeo e utilizando
como suporte de gravação de áudio a própria câmera.

Façamos agora a lista dos equipamentos para, adiante, explicarmos suas características, recur-
sos e aplicações.

 Microfone Dinâmico de Mão


 Microfone Shotgun Curto
 Microfone Lapela com Fio
 Microfone Lapela sem Fio
 Vara de Boom
 Sistema Blimp Completo (Pistola, Zepelin e Peludo)
 Mixer de Campo
 Fone de Ouvido (Circumaural)
 Cabos de Microfone
 Bolsa de Transporte
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Além desses equipamentos, é indispensável ter no set acessórios e ferramentas para eventuais
necessidades ou imprevistos. A lista abaixo contempla os itens mais comuns:

 Mantas de Som
 Espumas acústicas
 Carpete
 Fitas adesivas (Gaffer Tape, Esparadrapo e Silver Tape)
 Adaptadores e conectores de áudio
 Maleta de Ferramentas
 Baterias e pilhas

A seguir, vamos descrever brevemente cada equipamento e acessório, incluindo sugestões de


marcas e modelos. Nos capítulos posteriores, faremos uma análise mais detalhada de alguns
dos seus recursos e aplicações.

MICROFONE DINÂMICO DE MÃO

Esse tipo é o mais comum em depoimentos e entrevistas nos quais o próprio repórter ou en-
trevistado manuseia o microfone. Tem como características a boa qualidade de captação de
voz, robustez e baixo custo. Deve ser utilizado a uma pequena distância (20cm no máximo)
da boca. Para evitar os pops gerados pelas consoantes P e B, recomenda-se o uso de espuma
anti-pop.

 O modelo SM58 da marca Shure, o RE-50 da Electrovoice e o MD46 da Sennheiser


são os modelos clássicos. Existem ainda as opções de microfones dinâmicos sem fio
que permitem maior mobilidade.

MICROFONE SHOTGUN CURTO

Seguramente, o microfone mais versátil para produções audiovisuais. Sua direcionalidade


(rejeição aos sons fora-de-eixo) permite uma ótima captação a curta e média distância (entre
30cm e 3m), isolando bastante as vozes do ruído ambiente. Por ser um microfone condensa-
dor, precisa de alimentação phantom power ou pilhas para funcionar. Sua resposta de fre-
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qüências é extremamente plana e ampla, captando um som claro e cristalino. Utilizado em


ficções e documentários, sua operação é feita por um microfonista que manipula o boom.

 O MKH 416 e o MKH60, ambos da Sennheiser; o KMR 81 da Neumann; e o CMIT


5U da Schoeps são os modelos mais utilizados.

MICROFONE LAPELA COM FIO

Esses pequenos microfones, também conhecidos como lavalier, têm sua utilização mais co-
mum nos programas de TV. Seu tamanho reduzido, alta qualidade e possibilidade de fixação
na roupa (liberando os movimentos das mãos) transformaram-no na opção número um para
telejornais, debates e entrevistas. A pequena cápsula é presa à roupa com um clip (de prefe-
rência próximo à área da cavidade toráxica) e seu fio escondido sob a vestimenta. Um adapta-
dor XLR permitirá a conexão com um cabo comum de microfone. Por ser um microfone con-
densador, também precisa de phantom power para funcionar. É ideal para planos nos quais
quem está “clipado” ficará sentado ou parado, mesmo que de pé. Em exteriores, sempre será
necessário o uso da espuma anti-pop por causa da sua alta sensibilidade ao vento.

 TRAM 50; Sennheiser MKE 2; e Shure SM93 são exemplos de modelos usuais.

MICROFONE LAPELA SEM FIO

Na realidade, os microfones lapela sem fio são os mesmos lapela com fio, porém conectados
a sistemas de transmissão RF (rádio freqüência). A liberdade de movimentos que os sistemas
sem fio permitem ampliaram o uso dos lapela na TV e no cinema. O microfone lapela é co-
nectado a um transmissor (escondido sob a roupa) que envia o sinal de áudio, via RF, para um
receptor, evitando o uso de cabos que atrapalham ou limitam os movimentos. A desvantagem
desses sistemas está na possibilidade de aparecerem ruídos no áudio, gerados por interferên-
cias. Os sistemas sem fio dividem-se em VHF (Very High Frequency, entre 30MHz e
300MHz) e UHF (Ultra High Frequency, entre 300MHZ e 3GHz). Os sistemas UHF são me-
nos suscetíveis às interferências, contudo os VHF são mais baratos.

 Sugestões: Sistemas sem fio Evolution da Sennheiser, Lectrosonics e UWP da Sony.


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VARA DE BOOM

Esse acessório permite ao microfonista posicionar o shotgun o mais perto possível do som
desejado (em geral vozes) e permanecer fora de quadro. A vara consiste num corpo tubular
telescópico que pode ajustar-se a vários tamanhos e tem construção muito leve e resistente
(alumínio ou fibra de carbono). Os modelos mais sofisticados têm um cabo espiralado interno
para conectar o microfone.

 A única vara telescópica de boom nacional é da Mattedi e as importadas mais co-


nhecidas são da VDB, Ambient e K-Tek.

SISTEMA BLIMP

Um sistema blimp tem três elementos projetados para minimizar a captação de ruídos pelo
microfone: pistola, zepelim e peludo. O primeiro elemento, responsável pela redução de ruí-
dos provocados pela manipulação da vara de boom, é a pistola. Ela tem um conjunto de elásti-
cos ou borrachas que sustentam o microfone e diminuem a transmissão mecânica de movi-
mentos do microfonista operando o boom. Os outros dois elementos são eficientes na redução
do ruído provocado pelo vento. O zepelim, para ventos fracos e moderados, é um cilindro de
estrutura telada e revestido com tecido, que deve ser acoplado à pistola. Finalmente, o peludo,
no caso de ventos mais fortes, envolve o zepelim, diminuindo a velocidade de incidência do
vento com seus pêlos longos. Sem esse sistema, é impossível garantir uma boa gravação de
som ao ar livre.

 Os fabricantes mais conhecidos são Rycote e Sennheiser.

MIXER DE CAMPO

Normalmente, quer seja uma ficção ou um documentário, as pequenas produções usarão a


própria câmera para gravar o som direto nos dois canais de áudio disponíveis. Um mixer pos-
sibilita o uso de mais microfones e irá agregar recursos técnicos e maior qualidade à captação
de som. Uma boa relação custo-benefício é conseguida com um mixer portátil de três canais.
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Essa quantidade de canais é suficiente para atender as captações de diálogos na maioria das
situações. Adiante explicaremos detalhadamente os recursos e possibilidades quanto ao uso
do mixer.

 Entre os fabricantes deste tipo de modelo, destacamos o Shure FP-33, o Sound De-
vices 302 e o Wendt X3.

FONE DE OUVIDO (CIRCUMAURAL)

Esse equipamento é a única forma de monitorar com precisão o som direto durante a capta-
ção. É de extrema importância que o fone de ouvido seja: circumaural (cubra todo o ouvido
externo) para isolar os ruídos exteriores; confortável mesmo com uso prolongado; e tenha
ótima qualidade de reprodução de áudio. Não é má idéia ter dois fones para o caso de aciden-
tes com equipamento.

 Os modelos Sony MDR-7506 são os clássicos; há também alguns modelos Sennhei-


ser e AKG.

CABOS DE MICROFONE

São os cabos de microfone que transmitem o sinal de áudio até o mixer ou câmera. De nada
adianta ter um shotgun de qualidade superior se os cabos de microfone têm problemas nos
conectores, nas soldas, estão desencapados ou cortados. O cuidado e a manutenção dos cabos
irão garantir um sinal forte, claro e sem ruídos. Além disso, é necessário dispor de cabos de
tamanhos diferentes no set, pois cabos grandes ou curtos demais são inadequados para uma
boa captação. Cabos excessivamente longos podem captar interferência de RF (rádio freqüên-
cia) e cabos curtos demais atrapalham o manuseio da vara de boom. É indicado ter à mão,
pelo menos, um cabo curto (2m), um médio (5m) e um longo (10m) e, se possível, cabos de
reserva. Conectores XLR de qualidade proporcionam melhor passagem do sinal e encaixes
perfeitos. Devemos lembrar que “o elo mais fraco dita a resistência da corrente”, então, nada
de economia na compra dos cabos.
31

CAPÍTULO 6
OS MICROFONES

Neste capítulo, vamos analisar os microfones, o primeiro equipamento na cadeia de registro


de som. No processo de captação do som, os microfones serão os “ouvidos” do sistema de
gravação e grande parte da qualidade do áudio captado no set depende de uma boa escolha e
do uso adequado dos microfones.

Quando comparamos os microfones com o ouvido humano, é preciso ter muita precaução
para não pensarmos que ambos funcionam de forma igual. Obviamente, tanto um microfone
quanto o ouvido tem a capacidade de captar as perturbações em um meio físico (em nosso
caso, no ar) e transformar essas oscilações em uma informação análoga ao fenômeno que
chamamos de som. No entanto, por que em pleno século 21, com as tecnologias e materiais
mais avançados de que a ciência dispõe, não temos ainda o microfone “perfeito” que emule as
capacidades do ouvido humano com precisão e resolva definitivamente as demandas da cap-
tação do som em qualquer situação? Não seria coerente ter, ao invés de vários microfones
diferentes, um único microfone que atendesse a todas as necessidades de captação? Ninguém
troca de orelhas para ouvir um show de rock, depois troca novamente para manter uma con-
versa no elevador e troca mais uma vez para apreciar os sons de um piquenique no parque.
Por que a indústria fabrica centenas de tipos de microfones diferentes, se tudo que nós quere-
mos é, simplesmente, gravar um “bom” som? A resposta é simples: nenhum microfone con-
seguiria juntar sozinho todas as capacidades e qualidades do sistema auditivo humano. É por
isso que, ao longo dos anos, a indústria desenvolveu tantos tipos de microfones e através do
uso cuidadoso e permanente pelos profissionais, esses equipamentos foram aperfeiçoados e
continuam evoluindo para responder às mais diversas necessidades no campo do áudio profis-
sional.

Dito isto, vamos definir o que é e como funciona um microfone e analisar suas características
e aplicações. Por conceito, todo microfone é um “transdutor”, ou seja, é um equipamento ca-
paz de transformar um tipo de energia em outro. No caso específico dos microfones, a trans-
dução converte a energia acústica do som em energia elétrica. Assim, o fenômeno sonoro é
transformado em uma corrente elétrica análoga que tenta representar, da melhor maneira pos-
sível, o som captado pelo transdutor. Existem diversas formas de fazer essa transdução de
energia acústica em elétrica, mas, para os nossos interesses imediatos, vamos estudar somente
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dois tipos de microfones: dinâmicos e condensadores. Não vamos nos aprofundar muito na
teoria e eletrônica dos dois tipos, mas é útil saber, resumidamente, o modo como cada um
funciona.

MICROFONES DINÂMICOS

Quando vemos, na TV, um repórter segurando um microfone em uma reportagem de rua, nar-
rando um fato ou tomando um depoimento de um entrevistado, esse microfone certamente
será um transdutor do tipo dinâmico. O microfone estará bem próximo a boca ou da fonte
sonora desejada e, obviamente, será visto em quadro e por isso é normal usar uma canopla
(aquele cubinho onde se vê a logomarca da emissora ou programa) para melhorar a sua visua-
lidade. Por causa dessa posição próxima à boca e de seu formato, esse tipo de microfone é
carinhosamente apelidado de “sorvetão”.

Vamos ao modo de funcionamento dos microfones dinâmicos de bobina móvel. Na parte su-
perior desse tipo de microfone existe um componente que se chama “cápsula”. É nela que
estão as três partes principais do sistema de transdução: o diafragma, a bobina e o imã. O dia-
fragma é uma membrana muito fina que se move quando as ondas sonoras atingem o corpo da
cápsula. Esse movimento ondulatório faz o diafragma mover-se para frente e para trás, mo-
vendo também a bobina, um tipo de mola espiralada muito delicada e leve, que está conectada
à própria membrana. O corpo da bobina está envolto, em uma fenda, no imã permanente, e
seu curso de movimento dentro dessa fenda do imã é que vai gerar, por “indução” elétrica, um
sinal análogo ao som captado. É esse sinal elétrico que será transmitido como sinal de áudio
através do cabo até um mixer, câmera ou gravador.

Os microfones dinâmicos de bobina móvel são extremamente resistentes ao manuseio, que-


das, umidade e são relativamente baratos. São considerados microfones “duros” porque resis-
tem a altos níveis de pressão sonora sem distorção ou prejuízo aos componentes, mas só fun-
cionam bem quando estão muito próximos a fonte do som desejado. Eles não podem ter um
tamanho muito reduzido porque sua tecnologia de transdução não permite uma miniaturização
dos componentes que ainda mantenha a eficiência do sistema. Por causa da massa (peso dos
componentes) do conjunto diafragma/bobina, que é grande em comparação à energia de um
estímulo acústico, a resposta aos transientes (picos instantâneos de sinal) é relativamente len-
ta, assim perde-se um pouco de velocidade de resposta aos sons mais rápidos e também a fi-
33

delidade na captação das freqüências mais altas. Os microfones dinâmicos são indicados para
microfonação de voz a curta distância e captação de sons extremamente intensos como moto-
res, tambores ou explosões. Eles são a primeira escolha do vídeo-jornalismo quando a locação
é exterior, ruidosa e não há problema em ter um microfone em quadro. Os formatos buscam
um desenho mais confortável para manuseio e o uso de sistemas sem fio liberou bastante os
movimentos, assegurando para que não ocorram acidentes com cabos; mas é bom lembrar que
uma das mãos do repórter, apresentador ou entrevistado estará sempre ocupada com o micro-
fone, limitando assim suas ações.

MICROFONES CONDENSADORES OU Á CAPACITOR

Enquanto os dinâmicos de bobina móvel usam o princípio da indução, os microfones conden-


sadores usam a capacitância como forma de gerar sinais elétricos que representem o sinal
acústico. É por isso que também podemos chamá-los de microfones à capacitor, apesar de esta
ser uma nomenclatura menos utilizada. Vamos resumir o conceito de capacitância para avan-
çarmos na análise dos microfones condensadores. Um capacitor de placas paralelas é um
componente eletrônico que tem a propriedade de acumular uma carga de energia, em um
campo elétrico, quando essas duas placas estão carregadas eletricamente. A medida da carga
acumulada nessas placas chama-se capacitância. Agora vem a parte que nos interessa real-
mente. Quando essas duas placas se movem em relação a si mesmas a capacitância muda,
aumentando quando as placas se aproximam e diminuindo quando elas se afastam. Então, no
caso dos microfones condensadores, o capacitor é construído tendo como uma das placas o
próprio diafragma (uma membrana finíssima recoberta de ouro) que se moverá em relação à
outra placa (back-plate) gerando com esse deslocamento uma corrente análoga ao som que
atinge a cápsula. Como a membrana dos condensadores não está acoplada a nenhum compo-
nente pesado, como no caso dos dinâmicos de bobina móvel, sua leveza e capacidade de des-
locamento é muito maior, gerando uma resposta mais sensível e precisa ao som que chega à
cápsula. Os transientes (picos instantâneos de sinal) são fielmente captados e as freqüências
agudas são melhor representadas, tornando a transdução extremamente fiel. Os condensadores
podem ser microfones muito pequenos (como os “lapela”) e leves, mas também são muito
sensíveis a impactos e umidade. Precisam de Phantom Power ou baterias para funcionar.

MICROFONES NA PRÁTICA: SHOTGUNS


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O tipo de microfone mais usado nas produções audiovisuais é o shotgun. Utilizando uma tra-
dução literal do inglês, poderíamos chamá-lo de “espingarda”, e é bem claro que esse nome
vem da sua semelhança com o cano de uma arma. O formato alongado dos microfones shot-
gun deriva da técnica de cancelamento acústico de fase, que tem como objetivo a rejeição
parcial das ondas sonoras que vêm das laterais e da traseira do microfone; esse projeto baseia-
se em um componente chamado tubo de interferência. É esse tubo, acoplado à cápsula do
microfone e repleto de pequenas fendas, que permite uma maior direcionalidade na captação
do som, ou seja, selecionar o som que se deseja captar apenas apontando o microfone para a
fonte, filtrando todo o resto como conseqüência. As fendas no corpo do tubo, que jamais de-
vem ser obstruídas, geram um cancelamento das ondas sonoras que não são captadas no eixo
frontal do shotgun. É bom notar que o cancelamento não é total nem funciona igualmente para
todas as freqüências, gerando um efeito conhecido como “coloração” aos sons “fora de eixo”.
Quanto melhor a qualidade do shotgun, menos coloração ele imprimirá nos sons rejeitados,
pois o que se deseja é apenas atenuar em intensidade o ruído ambiente e não mudar suas ca-
racterísticas de timbre e freqüências. Um shotgun não fará desaparecer por completo os ruídos
do entorno, mas permitirá uma melhor inteligibilidade dos sons captados em sua “mira”. A
direcionalidade extrema tem outro preço: por melhor qualidade que tenha o shotgun, ambien-
tes reverberantes tendem a “colorir” o som captado fora de eixo, então, não se indica o uso
deles para locais com muita reverberação. Como resolver? Se possível, tratar o ambiente com
materiais fonoabsorventes ou utilizar microfones menos direcionais, sem tubo de interferên-
cia.

Existem dois tipos de microfones shotgun: curtos e longos. Escolher qual tipo utilizar vai de-
pender da distância da fonte sonora em relação ao microfone. Um microfone shotgun curto
não deve estar mais próximo do que trinta centímetros nem mais afastado do que três metros
dos atores. Se a produção é de baixo orçamento e não é possível ter microfones diferentes a
disposição, é recomendável ter sempre um shotgun curto no set porque a grande maioria das
tomadas vai exigir o uso dele. Um shotgun longo deverá ser usado quando a distância até os
atores superar três metros e é possível gravar bons diálogos com até cinco metros de afasta-
mento dos atores.

Como regra geral, quanto mais perto o microfone estiver da fonte, melhor a captação, levando
sempre em consideração o limite imposto pelo enquadramento, evitando a projeção de som-
35

bras nos atores ou cenário e buscando sempre a continuidade e consistência sonora de diálo-
gos e ruído ambiente entre os planos.

Os irmãos menores dos shotgun são os microfones de padrão polar “super-cardióide” e “hi-
per-cardióide”. Eles têm um ângulo de captação mais aberto, não são tão direcionais, não u-
sam tubo de interferência, e, como produzem menor coloração fora de eixo, soam mais natu-
rais. Seu uso é indicado em exteriores calmos, interiores reverberantes ou planos extremamen-
te fechados, nos quais se possa colocar o microfone mais perto do que trinta centímetros da
boca do ator. Por causa dessa proximidade é essencial o uso de uma espuma para evitar picos
de sinal por consoantes bilabiais (o famoso puf ou pop causado pelo B e pelo P).

MICROFONES DE LAPELA

A tecnologia dos microfones condensadores permitiu uma importante possibilidade para a


construção desses transdutores: a miniaturização dos componentes. Disso surge uma ferra-
menta essencial na captação do som para audiovisuais que é o microfone lapela. Os lapela
(ou também chamados “lavalier”) podem ter desde o tamanho de uma uva até dimensões infe-
riores às de uma cabeça de palito de fósforo. São microfones para uso muito próximo à boca,
tendo na cabeça e peito os melhores lugares para sua fixação. Em entrevistas, telejornalismo
ou documentários, os lapela são presos à roupa (gola, lapela, gravata etc) e ficam a mostra.
Eles têm acessórios específicos para sua fixação, como pinças ou prendedores, e em geral
funcionam melhor quando colocados próximo à cavidade toráxica – aquela concavidade fron-
tal, no meio do peito, onde está o osso esterno. Essa posição gera um timbre de voz natural,
evita pufs, mantém o microfone em uma posição estável sem limitar os movimentos do entre-
vistado e usa o próprio corpo como barreira para os ruídos indesejados que vêm detrás do
entrevistado.

Em produções de ficção, outra forma comum de usar os lapela é escondê-los sob a roupa ou
cabelo dos atores. Quando o plano é aberto demais para usar um shotgun, os pequenos lapela
são uma ótima opção para não precisar de dublagem na pós-produção. A desvantagem é a
perda dos planos sonoros, pois as vozes passarão a soar muito “perto”, independentemente da
distância em relação à câmera. Esse tipo de captação também deve estar cercado de cuidados
em relação a ruídos de cabos e roupas e problemas com impactos corporais ou suor dos ato-
res. Sem dúvida, o som captado com microfones de lapela não têm a mesma riqueza tonal e
36

“perspectiva” alcançada com os shotgun, mas podem ser a melhor ou única opção em alguns
casos, incluindo a colocação em pontos estratégicos da locação ou cenário. A isso chamamos
microfones “plantados” no set.

Esses pequenos microfones oferecem as opções de utilizá-los conectados a um cabo, que


transmite o sinal de áudio até a câmera, mixer ou gravador, ou conectados a um sistema sem
fio, que fará chegar o sinal aos mesmos equipamentos por rádio freqüência. O uso de um la-
pela com fio vai garantir um sinal sem interferência embora venha a restringir os movimentos
de quem está “lapelado”. Em entrevistas ou depoimentos nos quais as pessoas terão posições
fixas (sentadas, por exemplo) e o plano favorecer a não-visibilidade do cabo, recomenda-se o
uso dos microfones com fio; mas, se precisamos de mobilidade, é um incômodo e um risco
desnecessário manter um ator com um “cordão umbilical” que pode causar acidentes quando
pisado.

O grande parceiro dos lapela, em produções que exijam mobilidade dos atores, é o sistema de
transmissão sem fio. É preciso notar que os melhores lapela tanto podem ser usados com fio
como também em sistemas sem fio, trazendo a grande vantagem de combinar os componentes
de acordo com as preferências subjetivas, necessidades técnicas ou orçamento do usuário.
Com o avanço da tecnologia, esses sistemas estão cada vez mais confiáveis e acessíveis.
37

CAPÍTULO 7
OPERANDO O BOOM

Aprender como operar um boom é a habilidade mais importante para um microfonista. Se a


operação é feita de maneira correta, o áudio captado terá qualidade e consistência; do contrá-
rio, o som captado corre o risco de ser ruim ou até mesmo inutilizável para o produto final. A
familiarização com as técnicas de operação de boom demanda treino e dedicação e, apesar de
essas técnicas parecerem fáceis, seu domínio requer tempo.

Quando vemos um microfonista profissional operando um boom, de maneira relaxada e ágil,


notamos que o equipamento parece ser uma extensão de seu braço. Ele domina os movimen-
tos que mantêm o microfone apontando para o ator, move-se com destreza e silenciosamente
no set e evita fazer sombras ou entrar em quadro com o microfone.

A operação do boom é uma questão de técnica e equilíbrio muito mais do que força. Obvia-
mente, é necessário ter resistência física para suportar grandes períodos sustentando o peso do
equipamento, porém, com a prática, sua manipulação torna-se menos cansativa e mais relaxa-
da e intuitiva.

Quando o shotgun já está acoplado à vara de boom, é necessário ajustar sua extensão apropri-
adamente e conectar o cabo de microfone. Esse cabo deve ser levemente espiralado em torno
da vara, de modo que fique sem folgas. As folgas podem causas ruídos na manipulação que
serão transmitidos ao microfone. Três ou quatro voltas serão suficientes para manter o cabo
bem esticado. Não se recomenda prender o cabo com fitas adesivas, pois, se houver necessi-
dade de alterar a extensão da vara, será necessário descolar a fita, gerando perda de tempo

Para estender a vara de boom basta girar as travas de torção e, sempre a partir da menor seção,
ajustar a dimensão que seja apropriada para a manipulação. É recomendável não estender as
seções até seu limite para não forçar excessivamente as travas.

A posição clássica da vara de boom é acima da cabeça, sustentada pelas duas mãos. Na ex-
tremidade do fundo da vara deve haver cabo suficiente para permitir os movimentos sem atra-
palhar a manipulação.

Um bom microfonista deve ter ambidestria para operar o boom, ou seja, ter igual habilidade
com ambas as mãos. A mão que fica à frente deve ser a mão base; é ela que sustenta maior
38

parte do peso. Ela não deve se fechar ao redor da vara, apenas apoiar com firmeza enquanto a
mão detrás, segurando com o polegar embaixo e os outros dedos na parte superior, serve para
rotacionar a vara em seu próprio eixo. A vara deve passar acima da cabeça do microfonista
para melhorar o equilíbrio do corpo e minimizar a fadiga muscular dos braços. Respirar nor-
malmente e não travar o corpo em uma só posição é importante para manter os músculos rela-
xados.

Como já dito anteriormente, a posição clássica de operar e posicionar o boom é por cima dos
atores e os motivos são os seguintes:

 Quando o boom está por cima dos atores ou entrevistados, eles têm espaço para mo-
ver-se sem se chocar com o microfone.
 O microfone não tem fontes de ruído no eixo de captação, uma vez que está aponta-
do para baixo e, após os atores, só teremos o piso, que não é fonte de ruído.
 A qualidade do timbre das vozes é superior quando captados por cima da cabeça.

Depois de dominada a técnica de manipulação da vara de boom, o próximo passo é aprender a


manter o “eixo”. Mas o que é o eixo? Imaginemos uma linha que sai do microfone até a boca
ou peito do ator. Esse é o eixo imaginário que devemos manter sempre. E comum perder o
eixo quando o ator se move ou vira-se rápido, e para isso é recomendado ensaiar os movimen-
tos anteriormente. Manter o eixo é essencial para não comprometer o timbre e a presença das
vozes captadas. Uma dica para praticar os movimentos com a vara, sem perder o eixo, é pren-
der um apontador laser no boom e seguir os movimentos de algum voluntário.

Algumas vezes será necessário operar o boom por baixo, apontando o microfone para cima.
Em geral, usa-se essa técnica quando existem obstáculos acima da cabeça dos atores ou o piso
é muito ruidoso ao caminhar (cascalho, mato ou areia). Infelizmente, a tendência dessa posi-
ção é anasalar um pouco a voz.

O melhor “alvo” do microfone não é a boca e sim o centro do peito, o esterno. Manter o eixo
quando se aponta para o esterno é mais fácil, eficiente, e o timbre tem maior equilíbrio em
freqüências.

Observemos algumas dicas de como manipular o boom na posição mais comum, captando por
cima da cabeça:
39

!
Mão detrás: polegar por baixo permite rotacionar a vara usando o punho enquanto os outros
dedos prendem o cabo.

!
Mão da frente: a vara descansa sobre os dedos.

O cabo deve estar espiralado e sem folga para evitar ruídos no manuseio e movimentação.
Não se deve exagerar na quantidade de voltas em torno da vara.
40

O alvo do microfone deve ser o centro do peito do ator. Quando o boom estiver captando mais
de uma pessoa, é indicado posicioná-lo verticalmente, acima das cabeças.
!
!
!
!

!!!!!!!! !!!!!!! !
Três sugestões de posicionamento do boom, de acordo com a altura do ator ou enquadramento
da câmera.!
!
!
41

CAPÍTULO 8
GRAVANDO SOM DIRETO NA CÂMERA DE VÍDEO

A maneira mais simples de gravar som direto em um projeto audiovisual é utilizar as entradas
de áudio da própria câmera de vídeo. Os equipamentos necessários são: uma câmera com en-
tradas XLR (conector profissional de três pinos), microfones, cabos de microfone e um fone
de ouvido. Em geral, as câmeras semi-profissionais ou profissionais têm dois canais de áudio
com conectores XLR, fornecem alimentação phantom power para condensadores e possuem
ajustes independentes de ganho de entrada para cada canal. O par de canais de áudio permite a
gravação de dois canais mono ou um estéreo. O uso em mono é indicado para a captação de
vozes e o estéreo para ambientes. Uma vantagem em gravar áudio diretamente na câmera é
que se torna desnecessário sincronizar o som e imagem na montagem, uma vez que os dois já
serão registrados simultaneamente, no mesmo equipamento.

Apesar de não gerar os melhores resultados para o som, por não contar com pré-
amplificadores de extrema qualidade, nessa forma de captação de som podem-se conectar os
microfones diretamente na câmera para gravar o áudio, e obter qualidade aceitável. Escolhe-
se qual tipo de microfone utilizar, de acordo com as possibilidades técnicas e necessidades
estéticas, e simplesmente conecta-se ao canal de áudio da câmera. Após conectarmos cabos e
microfones, basta ajustar o ganho de entrada para ter a melhor relação de nível (volume) sem
distorção, ou seja, nem gravaremos com um nível de entrada muito baixo, nem permitiremos
um excesso de nível que estrague o áudio definitivamente. Para isso, pediremos que o repór-
ter, entrevistado ou ator fale com a intensidade de volume que fará durante a gravação – assim
poderemos ajustar previamente o ganho e teremos o melhor áudio sem distorção. É comum
ajustar os picos de voz entre -12dB e -6dB para termos uma margem de segurança até o 0dB e
não perdermos um bom áudio por excesso de sinal. Cada câmera tem seus recursos e caracte-
rísticas próprias e é necessário estudarmos cada modelo para sabermos utilizá-las com rapidez
e propriedade. Quando somos chamados para gravar som direto utilizando uma câmera, é in-
dispensável conhecermos fisicamente o equipamento (onde se localizam os conectores, botões
e comandos) e também dominarmos os ajustes de som internos, que em geral estão em um
menu dedicado ao áudio, nas configurações da câmera. Resumindo, é necessário conhecer
previamente a câmera, ou ao menos ter acesso ao manual do equipamento para não “desco-
brir” os recursos já na locação, pois isso é anti-profissional e atrasará o trabalho da equipe.
42

Lembre-se de que apesar de a operação câmera não ser responsabilidade sua, o áudio gravado
nela é!

GRAVANDO NA CÂMERA DE VÍDEO UTILIZANDO UM MIXER

A utilização de um mixer, ou misturador, que receba e reenvie os sinais de microfones é a


melhor opção para gravar som direto na câmera de vídeo. Quando utilizamos um mixer, ga-
nhamos qualidade sonora e mais controle sobre o áudio captado, além da possibilidade de uso
de mais microfones do que os dois canais da câmera permitem. A qualidade dos pré-
amplificadores de microfone dos mixers é melhor do que os utilizados nas câmeras. Além
disso, os recursos oferecidos nos permitem controle sobre nível, freqüência e dinâmica do
áudio; e os canais de entrada possibilitam o uso de mais microfones. O primeiro passo para
utilizar um mixer em conjunto com uma câmera é calibrar os níveis de saída e entrada dos
equipamentos. Para não corrermos o risco de gerar distorção no áudio gravado na câmera, é
preciso ajustar os níveis de saída do mixer com os de entrada na câmera. Assim saberemos,
sem precisar checar na câmera a todo momento, o nível do volume de gravação. Para fazer
isso, os mixers de som direto têm um recurso que se chama oscilador de tom. O oscilador gera
um tom de 1KHz a 0dB nas saídas do mixer e permite que esse sinal seja enviado para as en-
tradas XLR da câmera, para que o nível de volume seja calibrado. Após fazer essa calibra-
gem, o técnico de som terá controle sobre o áudio gravado na câmera simplesmente contro-
lando a saída do mixer.

O MIXER

O mixer é o “coração” do kit de equipamentos de qualquer técnico de som direto. Esse equi-
pamento é usado para receber, amplificar, controlar nível, rotear, misturar e dar saída nos si-
nais de áudio que vêm dos microfones, funcionando como um centro de controle da captação
de som. Os recursos e configurações dos mixers dependem do uso para o qual se destinam. Se
o projeto em vista é um documentário, com depoimentos nas ruas, ou será rodado em locais
de difícil acesso, a melhor escolha é um mixer leve, com poucos canais, e de construção resis-
tente. Se o projeto é uma ficção que será rodada em estúdio, num ambiente controlado, pode
ser utilizado um mixer maior, com muitos canais e com mais recursos. A depender do projeto,
o técnico deve avaliar as vantagens e desvantagens de cada modelo, sempre levando em conta
43

que a qualidade do áudio deve ser o primeiro ponto na escolha, seguido pela portabilidade,
pelos recursos e pela resistência do equipamento.

Quer o técnico de som esteja gravando o áudio diretamente na câmera de vídeo ou em um


gravador de áudio externo, é o mixer que, preferencialmente, deve receber o sinal dos micro-
fones. As produções em vídeo menos profissionais costumam utilizar somente as entradas de
microfones das câmeras para gravar som direto, mas essa prática apresenta duas grandes des-
vantagens:
!
 A qualidade do sinal de áudio gravado diretamente na câmera é muito inferior se
comparada ao sinal que passa antes por um mixer. A diferença está na qualidade de
construção dos pré-amplificadores e outros componentes eletrônicos do mixer.

 Ao contrário das câmeras, que obviamente priorizam a qualidade de captação de i-


magem, o mixer oferece recursos ao técnico de som para realizar uma gravação de
áudio com qualidade superior.
!
!
!
44

CAPÍTULO 9
CAPTANDO SOM COM UM GRAVADOR DE ÁUDIO

Gravar o som direto em um equipamento próprio para captação de áudio é uma opção que
aumenta a qualidade do registro sonoro e dá mais liberdade à equipe de som. Esse equipamen-
to chama-se gravador de áudio e funciona paralelamente à câmera, registrando separadamente
os diálogos e outros sons desejados. Ao contrário da gravação de áudio utilizando a câmera,
quando se usa um gravador é necessário sincronizar som e imagem posteriormente. O modo
mais fácil de fazer a sincronização é usando uma claquete no set.

Os atuais gravadores de áudio utilizam mídias digitais como suporte de registro, sendo os
mais comuns os cartões de memória e discos rígidos. Os arquivos de som são transferidos
para os computadores de edição via cabos digitais (USB ou FireWire) e não existe nenhuma
perda de qualidade. Tudo permanece no domínio digital do momento da gravação até a finali-
zação do audiovisual.

A operação e recursos desses gravadores varia de modelo para modelo, mas a estrutura básica
é sempre igual: canais de entrada, ajuste de nível, escolha da resolução de gravação (16 ou 24
Bits) e taxa de amostragem (44.1/ 48/ 96 KHz). As regras de controle de nível de sinal conti-
nuam valendo exatamente como quando se grava diretamente na câmera, ou seja, o maior
nível possível sem nunca atingir a distorção do sinal.

Uma vantagem dos gravadores é a possibilidade de ter vários canais independentes. Já exis-
tem equipamentos portáteis com até oito canais de gravação, o que dá uma enorme flexibili-
dade e segurança ao técnico, que pode gravar vozes separadamente, facilitando a edição e
mixagem na pós-produção. Um procedimento essencial quando utilizamos um gravador é
fazer backups diários. Após o final da jornada de filmagem, é necessário fazer uma cópia de
segurança do áudio captado. Alguns gravadores já têm drives de CD ou DVD para realizar
essa função; outros precisam ser conectados a um computador para transferir os arquivos de
som para uma mídia externa. É recomendável fazer o backup em duas mídias diferentes, por
exemplo: após transferir o áudio para um computador e gravar DVDs com os arquivos, man-
ter as duas cópias de segurança (no HD e nos DVDs) até a finalização do projeto.

A qualidade superior do áudio registrado em um gravador torna-o mais indicado nas produ-
ções que tenham mais recursos e disponibilidade de equipamentos. Cada modelo terá suas
45

características próprias de operação e é necessário estudá-lo com antecedência para entender


os recursos e dominar seu manuseio. O uso em conjunto com um mixer amplia as possibilida-
des de microfonação, tanto em quantidade de microfones quanto em controle dos sinais.

Um procedimento muito útil e que facilita a montagem do som é enviar uma cópia do sinal
registrado no gravador para um canal da câmera. Isso é feito conectando, por meio de um ca-
bo, a saída analógica de áudio do gravador à entrada XLR da câmera de vídeo. Algumas vezes
é necessário ter plugues adaptadores de áudio para realizar essa conexão entre os equipamen-
tos; então é preciso checar antes e estar preparado para interligar gravador e câmera no set.
Chamamos a esse procedimento de “gravar um mixdown guia” para referência. Assim, se o
diretor quiser revisar uma cena, terá um áudio na câmera igual ao captado pelo gravador. O
mixdown também permite, na ilha de montagem, que o montador tenha uma referência, além
da claquete inicial, para checar o sincronismo ao longo da cena.

Falando em sincronismo, vamos descrever o uso da claquete, indispensável quando se grava


som e imagem em equipamentos distintos. A claquete é a forma mais simples de garantir refe-
rência de sincronismo e deve ser batida em todas as tomadas com som direto registrado em
gravador externo, em vez da própria câmera.

CONVENÇÕES DO USO DA CLAQUETE CONVENCIONAL

O uso da claquete e suas convenções devem ser conhecidos e dominados pela equipe de som.
Mesmo quando não há som direto, a claquete facilitará a identificação das tomadas pelo mon-
tador, mas ela não deve ser batida.
46

A primeira convenção que iremos apontar é como identificar na claquete as tomadas sem som
direto. Quando fazemos planos detalhe, inserts, panorâmicos ou outras tomadas que, por indi-
cação da direção ou impossibilidade técnica, não precisarão de som direto, é necessário indi-
car na claquete que essas tomadas não terão sons associados. Nesses casos, devemos escrever
a palavra “MOS” na claquete. Ninguém sabe ao certo porque essa palavra é usada desde o
início do cinema sonoro; aqui estão algumas tentativas de solução para o acrônimo:

 Minus optical signal


 Minus optical sound
 Minus optical stripe
 Muted on screen
 Mute on sound
 Mic off stage
 Music on side
 Motor only shot
 Motor only sync

Segundo a lenda mais divertida para a origem de “MOS”, vários dos primeiros diretores de
Hollywood eram alemães e pronunciavam “Mit-Out Sound” em lugar de “Without sound” e a
corruptela se mantém até nossos dias.

O assistente nunca deve esquecer de escrever MOS na claquete das tomadas sem som para
que o montador não perca tempo, buscando um som inexistente.

Vamos agora apontar as diferentes convenções de uso da claquete:

COMO CANTAR UMA CLAQUETE

Cantar uma claquete nada mais é do que falar, em voz alta e clara, as informações sobre a
tomada a ser filmada. Essa voz, junto com a batida da tesoura, garante a identificação e sin-
cronização de som e imagem dos projetos em película ou em vídeo com sistema de gravação
de áudio separado da câmera.
47

Quando um assistente cantar a claquete, ele irá falar, em ordem, as seguintes informações:
Cena ou seqüência, plano e tomada. Por exemplo:

 “Cena quatro, plano B, tomada dois”; ou


 “Seqüência cinco, plano A, primeira”.

O importante é que o microfonista registre a voz e a batida perfeitamente, às vezes aproxi-


mando o microfone da claquete antes de reposicioná-lo para a realização da cena.

CLAQUETE INICIAL PARA TOMADA COM SOM DIRETO

Identifica a tomada no início e permite sincronizar o som na montagem.

 Claquete em frente à câmera, com foco e luz que permitam leitura e tesoura aberta.
 Diretor pede para rodar “som”, técnico confirma “som rodando”.
 Diretor pede para rodar “câmera”, fotógrafo confirma “câmera rodando”.
 Diretor pede “claquete”.
 Assistente “canta” a claquete (cena, plano e tomada), bate a tesoura e sai de quadro.
 Diretor pede “ação”.

CLAQUETE NO FINAL DE TOMADA COM SOM DIRETO

Quando não foi possível colocar a claquete no início por questões de foco e luz ou para não
desviar a atenção de pessoas ou assustar animais na cena.

 Após rodar a tomada e o diretor pedir “claquete”.


 Claquete de cabeça para baixo, em frente à câmera, com foco e luz que permitam
leitura e tesoura aberta.
 Assistente “canta” a claquete (cena, plano e tomada) e complementa “claquete de fi-
nal”, bate a tesoura e sai de quadro.
 Diretor pede “corta”.

CLAQUETE INICIAL PARA TOMADA SEM SOM DIRETO


48

Identifica a tomada no início e indica tomada sem som direto.

 A palavra MOS deve estar escrita na claquete.


 Claquete em frente à câmera, com foco e luz que permitam leitura e tesoura fechada.
 Diretor pede para rodar “câmera”, fotógrafo confirma “câmera rodando”.
 Diretor pede “claquete”.
 Assistente segura a claquete por alguns segundos e sai de quadro.
 Diretor pede “ação”

CLAQUETE NO FINAL DE TOMADA SEM SOM DIRETO

Quando não foi possível colocar a claquete no início por questões de foco e luz ou para não
tirar atenção de pessoas ou assustar animais na cena.

 Esperar rodar a tomada e o diretor pedir “claquete”.


 A palavra MOS deve estar escrita na claquete.
 Claquete de cabeça para baixo, em frente à câmera, com foco e luz que permitam
leitura e tesoura fechada.
 Diretor espera alguns segundos e pede “corta”.
49

CAPÍTULO 10
DICAS: GRAVANDO DOCUMENTÁRIOS E FICÇÕES

Veremos a seguir algumas dicas de configuração de equipamentos para gravar depoimentos


em documentário. Partiremos das configurações mais simples, usando somente a câmera de
vídeo para registrar imagem e som, até as mais complexas e que utilizam mais recursos.

GRAVANDO DEPOIMENTOS COM O MICROFONE DA CÂMERA

Quando é preciso gravar um depoimento em vídeo, e o único microfone disponível é o da


própria câmera, é preciso redobrar a atenção com o entorno. Exteriores muito barulhentos
sempre devem ser evitados. Se for possível, tentar posicionar o entrevistado de frente para as
fontes mais fortes de ruído, para que o microfone da câmera aponte para a “voz” e fique “de
costas” para o barulho indesejado, aproveitando melhor sua direcionalidade. Além disso, en-
quadramentos mais fechados, com a câmera mais próxima, ajudam a captar melhor a voz. Não
custa lembrar que a monitoração com fone de ouvido é indispensável. É esse monitoramento
cuidadoso que vai indicar se o som da voz está inteligível e em primeiro plano em relação aos
ruídos do ambiente.

No caso de interiores, uma acústica ruim (excessivamente reverberante) vai prejudicar o som
gravado de forma definitiva. É impossível tratar um áudio com muita reverberação, e isso
deve ser feito na hora da captação com mantas e carpetes. Outra dica: nunca posicionar um
entrevistado em cantos de um ambiente, pois o reforço de freqüências graves prejudicará mui-
to o som captado. Se não há material fonoabsorvente para tratar o ambiente excessivamente
“vivo”, proponha à direção mudar de local. Interiores com poucos móveis, com superfícies
que gerem muita reflexão (banheiros e cozinhas), eletrodomésticos, animais, janelas e portas
abertas e vizinhança ruidosa são inimigos que devem ser combatidos na locação.

Usar os dois canais de áudio da câmera, com ganhos diferentes também é útil nessas situa-
ções. O ideal é ajustar o ganho de um canal para ter um sinal “quente”, com picos o mais pró-
ximo possível de 0dB (lidos visualmente no display da câmera) e o outro canal, com aproxi-
madamente -6dB de ganho. Isso garantirá que, caso ocorra uma distorção por excesso de sinal
no primeiro canal, o áudio do segundo canal poderá ser utilizado para substituir o momento da
distorção.
50

Não sejamos tímidos em pedir silêncio no set. Faz parte do trabalho cuidar para que o entorno
seja amistoso à captação de som. Seriedade e simpatia, em geral, conseguem que vizinhos
desliguem o som, curiosos calem a boca, crianças e animais sejam afastados do set e o silên-
cio seja relativamente mantido. O importante é não esquecer de explicar para as pessoas, de
forma clara e rápida, como o barulho prejudica o trabalho.

GRAVANDO DEPOIMENTOS COM UM MICROFONE DE MÃO

Em alguns casos, principalmente em exteriores ruidosos, é necessário utilizar um microfone


dinâmico de mão. Entrevistas próximas ao tráfego, eventos com música ou multidão são pro-
pícias ao uso desse tipo de microfone. O posicionamento deve ser bem próximo à boca (entre
10 e 20cm) para isolar a voz do ambiente. É uma boa idéia gravar o outro canal de áudio com
o microfone da câmera – assim teremos a possibilidade de mixar apropriadamente, na ilha de
edição, os volumes de voz e som ambiente, enriquecendo a banda sonora. É aconselhável uti-
lizar uma espuma anti-pop para evitar ruído do vento e das sílabas com P e B (os famosos
pufs). O uso de um fone de ouvido e o correto ajuste dos ganhos garantirão a boa captação.
Não se assuste quando tiver que dar muito mais ganho ao microfone dinâmico – é uma carac-
terística própria desse tipo de transdutor. Outra lembrança: microfones dinâmicos não preci-
sam de phantom power; então, apesar de não prejudicar o equipamento, desligue a alimenta-
ção para economizar a bateria da câmera.

GRAVANDO DEPOIMENTOS COM O MICROFONE DE LAPELA COM FIO

A próxima situação é uma entrevista ou depoimento em que não teremos muita movimenta-
ção do entrevistado. Se tivermos em mãos um lapela com fio, essa é uma boa solução, princi-
palmente para depoimentos longos que cansariam muito o microfonista com um boom ou no
caso do próprio operador de câmera ser o responsável pelo som. Teríamos duas opções para
configurar a captação de som: utilizando somente o lapela ou também o microfone da própria
câmera. Se quisermos priorizar somente o som da voz, enviaremos o sinal do lapela para os
dois canais da câmera, com o “truque” já descrito de termos ganhos distintos em cada canal
como segurança, se ocorrer uma distorção por excesso de sinal. Uma sala ou um escritório
silenciosos seriam os ambientes indicados para esse tipo de configuração, já que a paisagem
sonora não seria enriquecida pelo sons da locação. A segunda forma de captar seria registran-
51

do também os sons ambientes com o microfone da câmera para mixar com o sinal do lapela
na edição. Se o ambiente tem informações sonoras importantes, esse registro é indispensável
para a construção da banda sonora. Por exemplo: um centro de compras, um aeroporto, um
sítio ou uma festa, todos esses lugares têm sons particulares que podem ser úteis na ambienta-
ção do depoimento e disfarçar a sonoridade “chapada” e sem perspectiva do microfone lapela.
Para finalizar, o uso do lapela com fio dará também a segurança de um sinal claro e sem in-
terferências de rádio freqüências.

GRAVANDO DEPOIMENTOS COM O MICROFONE DE LAPELA SEM FIO

As tomadas que exigem movimentação do entrevistado em locais pequenos, difíceis de operar


um boom, ou quando não temos um microfonista para fazer a captação, pedem o uso de mi-
crofones lapela sem fio. O lapela sem fio dará liberdade de movimentos ao entrevistado e ao
operador de câmera. Os ruídos gerados por rádio freqüência exigem atenção redobrada. Para
minimizar esses problemas é preciso não ultrapassar o limite máximo de distância entre
transmissor e receptor e evitar freqüências suscetíveis a interferências. O manual de cada mo-
delo explica bem como deslocar-se de uma freqüência de transmissão para outra mais “lim-
pa”. Sempre utilizar pilhas novas é outra condição que não se pode esquecer. Uma baixa vol-
tagem gera sinal fraco, ruidoso e com estalos. Mantenha as antenas em posição vertical e não
as deixe tocar o cabo do microfone. Monitore todo o tempo com fones de ouvido para perce-
ber falhas no sinal – não confie no display da câmera.

GRAVANDO DEPOIMENTOS COM UM MICROFONE SHOTGUN

Se a locação tem boa acústica e pouco ruído ambiente, pode-se optar pelo uso de um shotgun.
O resultado será um som mais natural e equilibrado, com uma percepção de profundidade e
riqueza de timbre bastante agradável. Posicionar o microfone o mais próximo possível é in-
dispensável. Perceba a necessidade de usar proteção contra o vento, mesmo que as rajadas
sejam somente ocasionais. Testar o melhor ângulo de captação durante um ensaio para o som
também vai contribuir para melhorar o registro da voz. Alguns técnicos gostam de captar com
o boom mesmo quando usam outros microfones para, caso se faça necessário, permitir a mi-
xagem dos sinais na ilha de montagem. Faça testes com as configurações acima, compare os
resultados e desenvolva suas próprias estratégias e modo de trabalho. As experiências do téc-
nico vão aperfeiçoando os métodos e dando segurança de realizar uma boa captação.
52

LEMBRETES

 Estar sempre atento aos menores ruídos que possam desconcentrar ou irritar o públi-
co. Uma cadeira que range sempre que o entrevistado se move, sapatos batendo ner-
vosamente no piso, roçar de mãos na roupa, brincos ou pulseiras, celulares e telefo-
nes fixos, eletrodomésticos e ar condicionado são as fontes de ruído mais prováveis.

 Quando for colocar um microfone de lapela, seja gentil e explique o que está fazen-
do. Sempre tenha cuidado para não invadir a privacidade e intimidade do entrevista-
do.

GRAVANDO FICÇÕES COM UM MICROFONE SHOTGUN

O melhor microfone para registrar diálogos é o shotgun. Quando temos um set silencioso, o
uso do boom vai facilitar o trabalho de captação e dar qualidade em timbre e perspectiva so-
nora às tomadas. Em geral, um único boom é capaz de cobrir a área de ação de um plano. Isso
é bom porque se temos necessidade de dois booms teremos, como conseqüência, o dobro de
ruído ambiente captado. Em locações interiores, sem vento, use apenas a espuma no microfo-
ne para evitar ruído do deslocamento do boom atritando com o ar. Se a ação for em exterior
sem muito vento, basta o zepelim para evitar as rajadas mais fracas. O uso do peludo é indis-
pensável em exteriores com muito vento. Sempre priorize as vozes, registre o som do que a
câmera “vê” e aproxime o boom o mais que puder da fonte sonora. Peça ensaios para o som
quando as tomadas forem complexas e exigirem movimentos do boom ou deslocamento do
microfonista. Lembre-se: o bom microfonista pisa leve e mantém-se respirando normalmente.

GRAVANDO FICÇÕES COM UM MICROFONE SHOTGUN E LAPELAS

Cada vez mais os técnicos estão utilizando microfones de lapela escondidos sob a roupa dos
atores. Ficou comum registrar, além do canal do boom, canais separados dos lapela para cada
ator. Isso funciona como segurança em caso de perda de eixo do shotgun, ruídos ocasionais
no set, e como solução para ambientes ruidosos ou muito reverberantes. Os cuidados básicos
são:
53

 Fixar e esconder o microfone lapela sob o figurino de modo que não haja ruído de
roupa, movimentos e respiração.
 Esconder bem o transmissor para não aparecer por acidente na tomada.
 Estar atento às interferências de RF (rádio freqüência).

Quando utilizamos microfones de lapela e boom em conjunto, precisamos de um mixer ou


gravador de vários canais para plugar separadamente cada microfone em um canal. Se o des-
tino final dos sinais de áudio é uma câmera ou gravador com apenas dois canais, devemos
separar o sinal do shotgun em um canal e o sinal dos lapela em outro. Caso o gravador de
áudio tenha mais canais, é recomendado ter cada microfone endereçado para o seu próprio
canal, permitindo uma mixagem posterior na edição de som e montagem.

GRAVANDO FICÇÕES COM SHOTGUN E MICROFONES PLANTADOS.

Em algumas situações, é necessário esconder microfones no cenário para realizar uma boa
captação. Isso ocorre quando o plano é muito aberto, impossibilitando a aproximação do bo-
om e os microfones de lapela estão fazendo ruídos (roupas inapropriadas, cenas sem roupa,
interferência de RF). A solução é distribuir estrategicamente microfones plantados no cenário,
nos pontos mais próximos onde os atores irão falar. Móveis, plantas, quadros, luminárias,
tudo serve para esconder os microfones sem fio e salvar o registro das vozes durante as filma-
gens. O mesmo cuidado na fixação de microfones no corpo dos atores vale para os plantados
no set. Devem-se evitar superfícies que vibrem ou que serão movimentadas ou tocadas duran-
te a ação. A última dica é: não esqueça de retirar o microfone após terminar a captação – isso
ocorre com freqüência!

LEMBRETES

 Peça para a direção para gravar os diálogos separadamente sempre que perceber que a
captação durante a tomada não foi satisfatória. Isso garantirá uma opção para o mon-
tador tentar sincronizar sem precisar dublar as vozes.
 Nunca esqueça de gravar pelos menos um minuto do bafo de sala de cada set.
 Grave sons adicionais importantes para a cena. Eles serão necessários para corrigir ou
enriquecer o trabalho de edição de som.
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CAPÍTULO 11
AGORA, UM PASSO ADIANTE

Após a conclusão da captação de som direto, qual o destino de toda essa informação sonora?
O que acontecerá com o áudio cuidadosamente registrado no set? Para responder a essas ques-
tões, vamos fazer um resumo dos processos básicos de edição e finalização da banda sonora,
compreendendo os caminhos que o som direto vai seguir.

Se o som direto foi captado na câmera de vídeo, e conseqüentemente já está sincronizado com
as imagens, a direção já terá os arquivos de imagem e som prontos para iniciar a decupagem e
escolha das tomadas desejadas. O montador carregará para a timeline do programa de edição
os clips para iniciar montagem do filme. A qualidade de captação e competência da equipe de
som direto aparecerá nesse momento. Os cuidados com o controle do ruído, a acústica dos
ambientes, posicionamento preciso do boom, manipulação silenciosa da vara, fixação perfeita
dos microfones de lapela e níveis adequados de sinal irão testemunhar a favor ou contra o
trabalho do técnico de som e microfonista. Se o som foi bem captado, isso permitirá ao mon-
tador fazer cortes e transições suaves, utilizar pouca ou nenhuma equalização de freqüências e
ajustar níveis de volume com facilidade.

Se o som direto foi captado em um gravador de áudio, o processo de sincronização entre ima-
gem e som torna-se necessário antes de qualquer outro procedimento. Utilizando os arquivos
de som captados no gravador, o montador irá usar o som da batida da claquete gravado no
início de cada tomada e para isso é preciso que esse som tenha sido captado adequadamente.
Por isso, é bom lembrar de aproximar o boom da claquete para gravar com clareza a “cantada”
e a batida. Após sincronizar as tomadas, inicia-se então o processo de montagem. É importan-
te que os arquivos de som estejam nomeados corretamente (cena, plano e tomada) para facili-
tar sua identificação. É importante também que um boletim de som direto, com informações
precisas sobre cada tomada, acompanhe o backup que será entregue para o montador. O bole-
tim de som direto é uma ferramenta indispensável para registrar quais tomadas foram boas
para o som e quais tiveram problemas, como perda de eixo de captação, ruídos, boom em
quadro etc. Um boletim bem detalhado permite um fluxo de trabalho mais rápido e eficiente.

A gravação de sons adicionais irá permitir que o montador enriqueça a banda sonora, por isso
o técnico deve gravar os ruídos e efeitos importantes para a possível utilização na montagem.
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Sons de ambientes, ações, passos, impactos e outros efeitos darão essencial contribuição para
a construção da paisagem sonora do filme. Existem bibliotecas de ruídos e efeitos sonoros
(em CD ou DVD) produzidas por companhias estrangeiras, porém os sons adicionais registra-
dos na locação certamente soarão mais coerentes e verdadeiros, evitando um estranhamento
na percepção do público. Ao final, a mixagem do som direto com música, efeitos sonoros ou
narração, quando for necessário, dará o polimento definitivo na banda sonora. A mixagem
deve ser realizada com um programa específico de produção de áudio, que conta com mais
recursos do que um software de edição de imagem. A pós-produção e mixagem de som são
processos extremamente importantes e dependentes do material sonoro captado no set. Se o
registro do som direto obtiver sucesso, conseqüentemente o trabalho de pós-produção será
mais fácil, menos corretivo e mais criativo.

Na atividade de captação de som direto, existem muitas evoluções tecnológicas que facilitam
enormemente o trabalho da equipe de som. Gravadores digitais com mais canais, sistemas de
monitoração em fio, sincronização de som e imagem com timecode, tudo isso vem facilitando
o processo de registro do som no set. Contudo, é bom frisar novamente, o que realmente faz a
diferença é o domínio técnico e o comprometimento com a realização de um bom trabalho.
Este guia, antes de tudo, pretende fazer “pensar” o som direto e a atividade dos envolvidos em
sua realização. A evolução não pode nem deve ser apenas tecnológica – é necessário tornar a
abordagem do som direto mais coerente e respeitada dentro da atividade audiovisual e, com
isso, certamente, alcançar a qualidade e expressividade que todos desejamos.
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REFERÊNCIAS

ALTMAN, Rick. Sound theory, sound practice. Nova York: Routledge, 1992.

BARNIER, Martin. En route vers le parlant: histoire d’une évolution technologique,


économique et esthétique du cinéma (1926-1934). Liège: Éd. Céfal, 2002.

HOLMAN, Tomlinson. Sound for film and television. Nova York: Focal Press, 2002

JULLIER, Laurent. El sonido en el cine. Barcelona: Paidós, 2007.

MERCIER, Denis. Le livre des techniques du son, tome 1: notions fondamentales.


Dunod, Paris, 2002.

_____. Le livre des techniques du son, tome 2: la technologie. Dunod, Paris, 2002.

_____. Le livre des techniques du son, tome 3: l’ exploitation. Dunod, Paris, 2002.

MILES, Dean. Location Audio Simplified. Toronto: David Stoddart, 2006.

YEWDALL, David Lewis. Practical art of motion Picture sound. Nova York: Focal
Press, 2007.
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GLOSSÁRIO

Áudio: Conjunto de técnicas para registro, reprodução e transmissão do som. O pró-


prio som registrado, reproduzido e transmitido utilizando-se métodos analógi-
cos ou digitais.
Backup: Cópia de segurança das informações registradas pelo som direto.
Bafo da sala: Som captado de cada ambiente interior em silêncio, sem ações ou
falas. O bafo de sala é indispensável para suavizar cortes na montagem.
Banda sonora: Toda a informação sonora presente num produto audiovisual, inclu-
indo vozes, locuções, música, ambiências, ruídos e efeitos sonoros.
Boletim de som: Planilha que organiza os dados que descrevem as tomadas de
som direto, registrando informações relevantes para a produção. Esses dados
incluem quantidade de canais, resolução dos arquivos digitais, detalhes técni-
cos para sincronização, etc.
Boom: Aparato que permite, com o uso de uma vara, posicionar um microfone o
mais próximo possível da fonte sonora, sem entrar em quadro.
Cachorrão: Ver “peludo”.
Claquete: Aparato utilizado para identificar visualmente as tomadas e sincronizar
imagem e som por meio da batida de uma haste móvel. Esse ruído permitirá
ao montador identificar um ponto de sincronismo facilmente, que é a própria
imagem da claquete fechada.
Coloração: Aumento ou redução na intensidade de freqüências específicas causan-
do uma alteração no timbre natural da fonte sonora.
dB: Ver “decibel”.
Decupagem: Análise de todas as tomadas realizadas na filmagem e organização do
material que será realmente utilizado para a montagem final.
Decibel: Unidade de medida utilizada para mensurar a intensidade de sinais de áu-
dio.
Dublagem: Gravação de vozes (em geral diálogos) para substituir o som direto ori-
ginal captado no momento da filmagem. A dublagem normalmente serve para
corrigir problemas no registro do som de diálogos ou para a tradução das fa-
las para outro idioma.
Eixo de captação: Linha de mira imaginária que produz os melhores resultados so-
noros quando apontamos um microfone direcional.
Fonoabsorvente: Materiais que tem a propriedade de absorver a energia acústica,
diminuindo a propagação do som.
Hertz: Unidade de medida de freqüência em ciclos por segundo.
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Metadados: Dados que são anexados aos arquivos de áudio.


Mixdown: Mistura dos canais de áudio registrados no gravador de som direto e utili-
zado como referência nas câmeras de vídeo. Esse sinal é enviado de uma sa-
ída do gravador para um canal de áudio da câmera.

Phantom Power: Alimentação de energia elétrica, para microfones condensadores,


que é conduzida através do próprio cabo de microfone.
Peludo: Aparato de pêlos longos que recobre o microfone para diminuir o ruído cau-
sado pelo vento forte.
Plano sonoro: Sensação de proximidade ou afastamento de uma fonte sonora a
partir da percepção da intensidade e das reflexões em relação ao sinal original.
Pré-amplificador: Primeira etapa de amplificação do sinal de um microfone.
Quadro: Área visível captada pela câmera.
Raccord: Termo francês que define a continuidade entre dois planos. Em som dire-
to, o raccord de som é conseguido evitando-se gravar ruídos que apareçam e
sumam em cada corte de uma cena.
Room tone: Ver “bafo de sala”.
Reflexão: Fenômeno físico do som quando as ondas sonoras rebotam sobre uma
superfície.
Set: Local onde é realizada a captação de imagem e som de um audiovisual.
Timecode: Código de tempo referencial nas produções audiovisuais. O formato utili-
zado é “Horas: Minutos: Segundos; Quadros”. No uso do timecode, existe uma vari-
edade de taxas de quadros por segundo que devem ser definidas de acordo com as
características de produção, local de produção, captação de som e imagem e finali-
zação do produto.
XLR: Tipo de conector profissional de microfone e cabos que utiliza três pinos.
Zepelim: Aparato em forma de cápsula que recobre o microfone diminuindo o ruído
causado pelo vento fraco.

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