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RELAÇÃO DE ASPECTOS

SÓCIO-ECONÔMICOS E AMBIENTAIS
COM PARASITOSES INTESTINAIS
E EOSINOFILIA EM CRIANÇAS
DA ENCA, CAXIAS DO SUL-RS

NATÁLIA CRISTINA PEZZI, REJANE GIACOMELLI TAVARES

Resumo: as infecções parasitárias se constituem em um


dos principais problemas de saúde pública, apresentando-se de
forma endêmica em diversas áreas do Brasil. Podem apresen-
tar estreita relação com fatores sócio-demográficos e
ambientais, tais como: precárias condições sócio-econômicas,
consumo de água contaminada, estado nutricional dos indiví-
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duos e outros, sendo freqüentemente a população infantil a mais


atingida. Com o objetivo de investigar a prevalência de para-
sitas intestinais em crianças de idade escolar e os fatores cha-
ves envolvidos na epidemiologia de enteroparasitoses, foi
realizado levantamento enteroparasitológico em 92 crianças
freqüentadoras da ENCA, Caxias do Sul, Rio Grande do Sul.
Foram analisadas 276 amostras de fezes pelos métodos de HPJ
e Faust. Foram obtidos dados referentes a hábitos de higiene,
dados pessoais e parâmetros sócio-econômicos. Observou-se
a presença de pelo menos uma espécie de parasita em 55,44 %
das amostras das crianças. As espécies de maior prevalência
foram Endolimax nana (37,36%), Entamoeba coli (29,67%),
Giardia lamblia (13,19%) e Ascaris lumbricoides (13,19%). O
poliparasitismo foi detectado em 32,61% das amostras. A pre-
sença de parasitoses não apresentou correlação com as taxas
de eosinofilia observadas.

Palavras-chave: prevalência, medidas sanitárias,


parasitoses intestinais, eosinofilia, método analítico 1041
A
s parasitoses intestinais são doenças cujos agentes
etiológicos (helmintos ou protozoários), pelo menos em
certas fases do seu ciclo evolutivo, localizam-se no apare-
lho digestivo do homem podendo provocar diversas patologias
(FERREIRA et al., 2004). Segundo Patz et al. (2000), as doenças
parasitárias são conseqüências das várias mudanças ambientais, mas
possuem associação íntima com o comportamento humano, poden-
do este atuar como preventivo ou transmissor (PATZ et al., 2000).
Essas infecções continuam sendo uma significante causa de
morbidade e mortalidade no mundo, particularmente nos países
subdesenvolvidos (CARVALHO et al., 2002; SANTOS et al.,
2004), sofrendo variações conforme a região de cada país, as con-
dições de saneamento básico, o nível sócio-econômico, o grau de
escolaridade, a idade e os hábitos de higiene de cada indivíduo,
representando assim, um importante problema de saúde pública
(CASTRO et al., 2004; GURGEL et al., 2005; LIMA & COTRIN,
2004; MELO et al., 2004; QUADROS et al., 2004; TASHIMA &
SIMÕES, 2005).
Associado aos fatos acima citados, o rápido e contínuo desen-
volvimento das cidades desencadeou uma série de problemas refe-

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rentes à questão ambiental, principalmente em relação à qualidade,
quantidade e destino do lixo produzido. Comumente o lixo é desti-
nado a ser desprezado, pois sua permanência no ambiente humano
pode redundar em efeitos indesejáveis, com repercussão na saúde
e bem-estar do homem. Mesmo que este não se constitua em fonte
primária de contaminação, pode propiciar o desenvolvimento de
fatores ecológicos que passam a constituir parte integrante da estru-
tura epidemiológica de algumas doenças (PRADINI, 1995). Dados
do PNDA (Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio) mostram
que 63,6% dos resíduos das grandes cidades são destinados aos lixões
e alagados, agravando consideravelmente os problemas de saúde
da população (IBGE, PNAD, 2000). De forma semelhante, os re-
sultados do PNSB (Pesquisa Nacional de Saneamento Básico), re-
alizada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística),
revelam que o esgotamento sanitário é o serviço de saneamento
básico de menor cobertura nos municípios brasileiros, alcançando
apenas 52,2% das sedes municipais (IBGE, PNSB, 2000).
As infecções parasitárias acometem principalmente as crian-
1042 ças e os adultos jovens, exercendo importante influência sobre o
estado nutricional e crescimento dos mesmos, sendo que o grande
prejuízo se traduz no baixo índice de aproveitamento escolar
(ASSIS et al., 2003; BECKER et al., 2002; BRESSAN et al., 2004;
COSTA-MACEDO & REY, 2000; FERREIRA et al., 2004;
MARQUEZ et al., 2002; SATURNINO et al., 2003).
Apesar de isoladamente não apresentarem alta letalidade, as
enteroparasitoses podem ser analisadas como co-fatores da mor-
talidade infantil, considerando que infecções por parasitos intes-
tinais podem afetar o equilíbrio nutricional, induzir sangramento
intestinal e má absorção de nutrientes, além de competir pela
absorção de micronutrientes, reduzir a ingesta alimentar, causar
complicações cirúrgicas como prolapso retal, obstrução e absces-
so intestinal e afetar o desenvolvimento cognitivo da criança
(MARQUEZ et al., 2002).
Os parasitas podem atingir o homem agindo por vários meca-
nismos, entre eles ação alergizante e ação espoliadora. Conside-
rando que nem todos parasitas possuem esta última ação, alterações
nos índices hematimétricos (hematócrito e hemoglobina) podem
ser resultados de outras patologias como, por exemplo, a anemia
resultante da má nutrição. Por sua vez, a ação alergizante apresen-
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ta a eosinofilia como um achado característico em indivíduos


parasitados (CIMERMAN & CIMERMAN, 2001; NEVES, 2000).
As causas mais comuns de eosinofilia são as doenças alérgi-
cas e as parasitoses. As condições alérgicas que causam eosinofilia
costumam ser identificadas na anamnese, mas no caso das
parasitoses, a detecção laboratorial da eosinofilia, associada ao
exame parasitológico de fezes (EPF) pode ser uma ocorrência que
leva ao diagnóstico correto (BAIN, 2004).
Os parasitas do trato gastrointestinal parecem exercer um
importante papel nos casos de reações alérgicas e de
hipersensibilidade. Vários estudos corroboram esta hipótese,
mostrando existir uma grande correlação entre a presença de pa-
rasitas nas fezes e os sintomas alérgicos observados nos indivídu-
os parasitados (HEUKELBACK et al., 2005; KAMINSKYL et al.,
2004; USTUN et al., 2004). As reações de hipersensibilidade
parecem ser desencadeadas por substâncias químicas produzidas
pelos parasitas. Como uma reação do organismo a estas reações
alérgicas e/ou de hipersensibilidade, ocorre um aumento na circu-
lação sanguínea dos eosinófilos, que são constituintes das células 1043
brancas do sangue. Esta eosinofilia, no entanto, parece não ser
limitada somente a infecções por helmintos, mas também por
protozoários. Acredita-se que a função primária dos eosinófilos é
ser mediador do efeito citotóxico contra o parasita, participando
também de processos inflamatórios que possam acompanhar es-
tas infecções parasitárias (USTUN et al., 2004).
Devido a isso, o presente estudo teve como objetivo determi-
nar a prevalência de parasitoses em crianças entre 4 e 14 anos
assistidas pela ENCA (Entidade de Assistência à Criança e Ado-
lescente), sua correlação com a contagem de eosinófilos e altera-
ções nos índices hematimétricos (hematócrito e hemoglobina), bem
como estabelecer uma relação entre os resultados obtidos e as
condições sócio-econômicas e ambientais da comunidade.

MATERIAL E MÉTODOS

Este estudo foi realizado em amostras de fezes e sangue


coletadas de 92 crianças assistidas pela ENCA em Caxias do Sul,
Rio Grande do Sul. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética
em Pesquisa do Centro Universitário Feevale. Após assinatura do

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consentimento informado, os responsáveis pelos participantes
responderam a um questionário de anamnese, para verificação de
processos alérgicos, asma, entre outros, já que estes fatores pode-
riam fornecer resultados falsos positivos para eosinofilia. Tam-
bém foi avaliada a condição sócio-econômica e de hábitos de
higiene dos participantes.
Foram coletadas três amostras de fezes espontaneamente
emitidas de cada um dos participantes, em dias alternados, em
frascos contendo solução de formol a 10% para conservação das
mesmas. As amostras foram identificadas conforme a ordem de
obtenção das mesmas. Essas amostras foram avaliadas utilizando
o método de sedimentação espontânea (Hoffman, Pons e Janer –
HPJ) (HOFFMANN et al., 1934), para pesquisa de ovos e larvas,
e o método de Faust (FAUST, 1939), para pesquisa de cistos. Foram
confeccionadas 3 lâminas de cada uma das amostras, bem como
de cada um dos métodos, perfazendo um total de 18 lâminas exa-
minadas para cada um dos participantes da pesquisa. As mesmas
foram analisadas microscopicamente, coradas por lugol. As amos-
1044 tras de sangue foram analisadas em contador hematológico
automatizado (XT 1800i, SysmexÒ), seguido de observação mi-
croscópica para confirmação do resultado diferencial de leucócitos
e avaliação dos parâmetros relacionados à série vermelha
(hematócrito e hemoglobina). As amostras foram processadas e
analisadas no Laboratório de Biomedicina do Centro Universitá-
rio Feevale.
Ao término das análises, foram emitidos os laudos com os
respectivos resultados, e os participantes que apresentaram
parasitoses foram encaminhados para serviço médico adequado
na Unidade Básica de Saúde do bairro Belo Horizonte em Caxias
do Sul, Rio Grande do Sul.
Para análise estatística foi usado um teste não paramétrico, o
teste qui-quadrado para tendências, adotando p<0,05 como nível
de significância.

RESULTADOS

No levantamento coproparasitológico, nossos dados de-


monstram que das 92 amostras analisadas, o maior índice de
ocorrência foi de Ascaris lumbricoides (13,19%). Quando ava-
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liada a prevalência dos protozoários, estes aparecem em 80,21%


das amostras, sendo que a Endolimax nana foi observada em
37,36% (Tabela 1).

Tabela 1. Freqüência de diferentes parasitos identificados nas


92 amostras analisadas

Os resultados negativos para enteroparasitoses representaram


44,56% e os positivos, 55,44%, dos quais 22,83% estavam
infectados por um único parasita e 32,61% por mais de um orga-
nismo (Tabela 2).
As associações mais ocorrentes nos casos de poliparasitismo
estão demonstradas na Tabela 3. 1045
Tabela 2. Prevalência das parasitoses.

Tabela 3. Associações de parasitos em infecções por helmintos


e protozoários.

Podemos verificar que a associação mais comum foi


Endolimax nana + Entamoeba coli, representando 11,96% do total
de associações.

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Quanto aos métodos utilizados para análise das amostras, os
resultados indicam uma maior sensibilidade do método de Faust para
identificação de protozoários, muito embora não se tenha obtido
diferença estatisticamente significativa (p>0.05). Para a identifica-
ção dos helmintos parece não haver diferença de especificidade e
sensibilidade entre os métodos utilizados (Tabela 4).

Tabela 4. Comparativo de métodos utilizados para identificação


dos parasitas.

Ao avaliarmos a relação entre ocorrência de parasitoses e


1046 eosinofilia, não se obteve diferença estatisticamente significativa
(p>0,05), muito embora se tenha observado uma maior ocorrência
de eosinofilia nos casos de infecções por Ascaris lumbricoides. Dos
12 casos positivos este helminto, 7 deles apresentaram eosinofilia
superior a 8% na contagem diferencial (58,33%) (Tabela 5).
Tabela 5. Avaliação da relação entre eosinofilia e parasitoses.

* Eosinófilos superior a 8%.

Quanto aos índices hematimétricos (hematócrito e


hemoglobina), não foi observada nenhuma variação relevante,
sendo que em nenhuma das amostras avaliadas foi detectada a
presença de anemia.
Na avaliação sócio-econômica, nossos dados demonstraram
que 20% dos participantes estão incluídos na classe C e 80% na
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classe D, conforme critérios de classificação definidos pela ANEP


(2000). Em relação aos hábitos de higiene, observou-se que as
crianças que freqüentam creches ou escolas públicas têm maior
conhecimento acerca de procedimentos simples, como por exem-
plo a necessidade da lavagem adequada das mãos, refletindo a
necessidade de educação sanitária para pais e responsáveis.

DISCUSSÃO

O estudo epidemiológico das infecções parasitárias fornece


dados como o grau de insalubridade do meio, nível e extensão do
saneamento básico de uma região, bem como os hábitos de higi-
ene da população em estudo (SANTOS et al., 2003). Essas infec-
ções são observadas com maior freqüência nas classes salariais
mais baixas e com menor grau de escolaridade (MACEDO et al.,
2005), sendo que a falta de higiene associada a precárias condi-
ções de moradia favorecem sua disseminação, podendo levar a uma
maior incidência de enteroparasitoses em uma determinada região,
comprometendo assim a situação socioeconômica da mesma 1047
(CHAVES et al., 2006; PRADO et al., 2001). Concordando com
outros estudos prévios, que justificam a elevada prevalência de
parasitoses pelas precárias condições socioeconômicas e culturais
da população analisada, em nosso estudo encontramos 55,44% das
crianças parasitadas, fato este que corrobora a observação acima
relatada (CARRILLO et al., 2005; FERREIRA E ANDRADE,
2005; PEREIRA E SANTOS, 2005; SATURNINO et al., 2005).
Infecções causadas por associações entre duas ou mais espé-
cies de parasitas apresentaram maior freqüência quando compa-
radas a infecções causadas por um único organismo, representando
32,61% e 22,83% respectivamente. A associação mais comum foi
entre Endolimax nana e Entamoeba coli (11,96%) seguida de
Giardia lamblia e Endolimax nana (4,35%). O que agrava este
quadro é que estas formas parasitárias desenvolvem patogenias
que são quase sempre negligenciadas e esquecidas, uma vez que
os sintomas clínicos são inespecíficos ou confundidos com os de
outras doenças, ficando os indivíduos parasitados por longos anos
de forma silenciosa e inaparente, causando danos principalmente
em crianças (SATURNINO et al., 2005).
No que se refere às helmintíases, vale salientar que não foi

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utilizado um método específico (swab-anal) para a pesquisa de ovos
de Enterobius vermiculares, o que provavelmente explica a não
ocorrência de casos positivos para esse parasita. Quando o méto-
do sensível é utilizado para a detecção destes ovos, a enterobiose
se torna uma parasitose consideravelmente freqüente, especialmen-
te em crianças (MACEDO, 2005). Neste estudo, esse método não
foi utilizado por se tratar de um método invasivo, o que poderia
causar constrangimento das crianças fazendo com que as mesmas
não participassem do estudo.
A taxa de prevalência de helmintos foi menor do que a de
protozoários, sendo que o helminto que apresentou maior fre-
qüência foi o Ascaris lumbricoides, um parasita intestinal cos-
mopolita. Este helminto é a espécie mais prevalente de todos
os enteroparasitas que acometem o homem em países com bai-
xas condições socioeconômicas (CARRILLO et al., 2005). No
Brasil, levantamentos coproparasitológicos têm demonstrado
que o Ascaris lumbricoides é o helminto que ocorre com maior
freqüência entre as diferentes comunidades estudadas
1048 (MACEDO, 2005).
Nas amostras analisadas, observou-se maior freqüência do
protozoário Endolimax nana, seguido da ameba Entamoeba coli.
Ambas as espécies são comensais não patogênicas, porém com
importante implicação na epidemiologia das doenças parasitári-
as. Estes enterocomensais apresentam o mesmo mecanismo de
transmissão de outros protozoários patogênicos como a Giardia
lamblia, podendo servir como bons indicadores das condições
sócio-sanitárias e da contaminação fecal a que os indivíduos estão
expostos (MACEDO, 2005; ROCHA et al., 2000; SATURNINO
et al., 2003; SATURNINO et al., 2005; TASHIMA et al., 2005).
Além disso, podem sugerir a presença de comportamentos relaci-
onados à falta de higiene como lavagem inadequada das mãos, água
e ocorrência de alimentos contaminados (MACEDO, 2005).
Em relação ao protozoário Giardia lamblia, cabe salientar a
importância da análise das 3 amostras de fezes para o diagnóstico
correto (PUPULIN et al., 2004; TASHIMA et al., 2005), conside-
rando-se que os cistos deste parasita são eliminados pelo hospe-
deiro de forma intermitente. A análise de uma única amostra fecal
para detecção destes cistos reduziria de 30% a 50 % a sensibilida-
de do resultado (TASHIMA et al., 2005). No presente estudo fo-
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ram analisadas 3 amostras de fezes de cada participante, não


ocorrendo assim distorção dos resultados decorrente das análises.
Em um estudo feio em Belo Horizonte foi verificado que
crianças menores de 12 anos, atendidas pela rede pública de saú-
de, apresentaram os maiores índices de prevalência de parasitoses
intestinais (SILVA & SANTOS, 2001). Da mesma forma, em nosso
estudo crianças menores de 12 anos apresentaram um maior nú-
mero de infecções quando comparadas com crianças com idade
superior a 12 anos. Isso demonstra que ocorre um decréscimo na
freqüência de enteroparasitoses com o aumento da idade devido a
uma proteção auto-imune adquirida após sucessivos contatos com
o parasita, e também com a higiene mais efetiva à medida que a
criança cresce (PUPULIN et al., 2004; SATURNINO et al., 2005).
A aplicação de diferentes métodos para a realização do exa-
me parasitológico de fezes torna-se necessário, tendo em vista a
variabilidade morfológica e biológica apresentada pelos parasitas
(MENDES et al., 2005). Ao compararmos os métodos HPJ e Faust,
constatamos que ambos os testes possuem boa especificidade para
detecção de helmintos. Já para pesquisa de protozoários, o méto- 1049
do de Faust parece ter uma maior sensibilidade quando compara-
do ao HPJ, concordando assim com autores que afirmam que
embora a eficácia seja semelhante para os dois métodos, ocorre
uma maior sensibilidade para detecção de cistos e ovos leves por
Faust e melhor desempenho da técnica HPJ na detecção de ovos
pesados de helmintos (CARVALHO et al., 2002). Outros autores
também afirmam que o método de Faust, na forma tradicional,
ainda continua sendo uma boa escolha para o diagnóstico das
protozooses intestinais (NOLLA et al., 2005).
Quanto à relação de infecções parasitárias e eosinofilia, au-
tores afirmam que ocorre um aumento de eosinófilos circulantes
decorrentes dessas infecções, e que a eosinofilia resultante seria
causada por parasitas que realizam algum tipo de invasão tecidual
durante seu ciclo evolutivo, o que não ocorre regularmente em
infecções por protozoários (BAIN, 2004; REY, 2002). No caso
específico de ocorrência de Ascaris lumbricoides, a eosinofilia se
justifica com base no seu ciclo vital onde, durante a fase inicial da
infestação, este parasito necessita de uma passagem pulmonar,
conhecida como “Ciclo de Loss” (NEVES, 2000; REY, 2002). Os
resultados obtidos em nosso estudo demonstraram não haver cor-

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relação entre a presença de parasitoses e eosinofilia, muito embo-
ra se tenha observado uma maior ocorrência de eosinofilia nas
crianças parasitadas por As caris lumbricoides. Também em ou-
tros estudos não se observou correlação entre contagem de
eosinófilos no sangue, níveis séricos de IgE total e intensidade das
infecções por Ascaris lumbricoidess, Trichiuris trichiura e
ancilostomídeos (MEDEIROS et al., 2006; ROSARIO-FILHO et
al., 1982. ROSÁRIO-FILHO, 1982).
Frente aos resultados observados, medidas de prevenção
devem ser implementadas na região estudada, como o saneamen-
to básico e educação sanitária, considerando que o exame
parasitológico de fezes pode ser realizado rotineiramente para
controle dessas infecções. Também é necessário o acompanhamen-
to das condições de saúde da comunidade local, além da implan-
tação de medidas que visem conscientizar e orientar a população
sobre a transmissão das enteroparasitoses, já que um dos pontos
chave para combater as doenças infecto-contagiosas é a Educa-
ção, pois pessoas melhores informadas sobre higiene correm menos
1050 riscos de contraí-las. A educação para a saúde é, sem dúvida, o
processo mais eficiente das ações profiláticas. Segundo Dias
(1998), um programa de Educação Ambiental deve promover
conhecimentos necessários à compreensão do ambiente, de modo
a suscitar uma consciência social que gere atitudes capazes de afetar
comportamentos.

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Abstract: parasitic infections are the most common Public Health


problems in most of Brazilian territory. The occurrence of parasitic
infection is closely related with social and demographic factors and
environmental aspects such as: precarious social-economical
conditions, use of contaminated water, nutritional state, etc, usually
the childish population the most affected. The aim of this work is to
investigate the prevalence of intestinal parasites among children and
1054 to evaluate key factors involved in epidemiology of enteric parasites.
The study was conducted with 92 childrens from ENCA, Caxias do
Sul, Rio Grande do Sul State. It was analyzed 276 feces samples of
children. The samples were analyzed the HPJ and Faust methods.
Data concerning to hygiene, personal aspects and social-economical
parameters were acquired. Intestinal parasites were detected in 55,44
% of sampled children. Endolimax nana (37,36%), Entamoeba coli
(29,67%), Giardia lamblia (13,19%) e Ascaris lumbricoides (13,19%)
were the most common parasites detected. A 32,61% rate of
polyparasitism was detected. The growth of circulating eosinophilos
was not related to the prevalence of intestinal parasites.

Key words: prevalence, sanitary measures, intestinal parasites,


eosinophilia, analytical method.

Agradecimentos
Ao Técnico de Enfermagem e estudante de Biomedicina Jackson
Housein, pelo apoio dado no desenvolvimento do trabalho.
estudos, Goiânia, v. 34, n.11/12, p. 1041-1055, nov./dez. 2007.

NATÁLIA CRISTINA PEZZI


Instituto de Ciências da Saúde e Laboratório de Biomedicina - Centro Universi-
tário Feevale.

REJANE GIACOMELLI TAVARES


Instituto de Ciências da Saúde e Laboratório de Biomedicina - Centro Universi-
tário Feevale. E-mail: rejanetavares@feevale.br 1055

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