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Mãe, não vai embora tá?!

” – A
Ansiedade de Separação na
Infância
Escrito por: Vanessa Yara Campos Cezar, Fernanda Pasquoto Souza, Elizabete R.
Coelho
Março/2016

1. Introdução
A ansiedade de separação pode ser vista como um medo intenso da
separação de uma figura vinculadora (normalmente, a mãe), que causa
prejuízos sociais e escolares visíveis. Conforme Silveira e outros
(2007), diferente das outras ansiedades, no TAS encontramos apenas a
preocupação excessiva da separação da figura de referência afetiva da
criança, com prejuízos no desenvolvimento infantil, no desempenho
escolar e nas relações sociais.
É comumente associada a um efeito negativo ocorrente com alguém
próximo, podendo ser desde uma viagem longa, doença ou até mesmo
a morte de um ente querido. Causa sinais sintomáticos, tais como: dor
de cabeça, dor de barriga, tonturas, náuseas e até vômitos. A Terapia
Cognitivo Comportamental pode auxiliar no tratamento com crianças,
adolescentes e adultos na recuperação emocional, na identificação dos
pensamentos disfuncionais e com técnicas aplicadas para a redução do
medo apresentado.

2. O Medo e a Ansiedade
Conforme Oguma (2010), o medo é uma emoção humana universal e,
tanto as crianças e adolescentes, quanto os adultos podem e devem
experimentá-lo fisiologicamente. O medo é benéfico na conservação da
espécie, na medida em que serve de resposta adaptativa em muitas
situações adversas.

Silveira e outros (2007) explica que o medo é considerado uma emoção


humana universal em todas as faixas etárias e é um traço adaptativo
fundamental para a conservação de todas as espécies, entretanto,
quando em excesso ou ativado no contexto errado pode estar
relacionado a patologias de ansiedade.
De acordo com Ribeiro (1989) o medo e ansiedade são sentimentos
comuns, normais, que servem para nos proteger. O medo geralmente
se refere a um objeto ou a uma situação muito definida. Temos medo do
perigo imediato. Já a ansiedade se caracteriza por uma sensação
desagradável de tensão e apreensão. Fazendo antecipar um perigo
futuro, que pode ou não acontecer. No entanto, ambos são sentimentos
úteis. O medo protege do perigo e salvaguarda nossa integridade física.
Já a ansiedade, enquanto resposta emocional a uma situação, também
pode nos estimular na realização de uma tarefa, tornando-nos atentos.

3. Ansiedade de Separação
Para Echeverria (2003), é característica inata do ser humano ser
apegado aos pais. Segundo a teoria da evolução do naturalista inglês
Charles Darwin (1809-1882), o bebê já nasce com uma série de
comportamentos que conquistam os adultos, como o riso, o olhar e até
o choro. O problema pode surgir quando os pais confundem apego
natural com dependência e esquecem que tão importante quanto
apegar-se aos pais é aprender a se separar deles.

Quando a criança está por volta dos 2 anos de idade, já é capaz de


compreender que o fato de os pais estarem longe não significa ter sido
abandonada, mas essa confiança, entretanto, vai depender de como
esses vínculos foram criados na família.
Segundo Suveg e cols. (2005), citado por Vianna e outro (2009), o
transtorno de ansiedade de separação caracteriza-se pela ansiedade
excessiva em função do afastamento de casa ou de figuras de
vinculação. A reação emocional exagerada diante do afastamento dos
pais também pode fazer parte do funcionamento normal de crianças
muito pequenas.
Este comportamento pode ser frequentemente observado em crianças
até a idade pré-escolar, devido à insegurança gerada pela ausência dos
cuidadores. A ansiedade de separação se configura como um
transtorno quando se torna inadequada para o grau de desenvolvimento
ou quando interfere no funcionamento da vida diária do indivíduo.
Conforme o DSM-IV-TR (APA, 2000), para que a criança seja
diagnosticada com Transtorno de Ansiedade de Separação, deve
preencher cinco critérios. Sendo que para o Critério A, deve apresentar
pelo menos 3 dos sintomas, sendo esses: (1) sofrimento excessivo ou
recorrente frente à ocorrência ou previsão de afastamento de casa ou
de figuras importantes de vinculação; (2) preocupação persistente ou
excessiva acerca da possível perda ou perigos envolvendo figuras
importantes da vinculação; (3) preocupação persistente e excessiva de
que um evento indesejado leve à separação de uma figura importante
de vinculação; (4) relutância persistente ou recusa a ir para a escola ou
qualquer outro lugar, em virtude do meda da separação; (5) temor
excessivo e persistente ou relutância de ficar sozinho ou sem as figuras
importantes da vinculação em casa ou sem adultos significativos em
outros contextos; (6) relutância ou recusa persistente a se recolher sem
estar próximo a uma figura importante de vinculação ou a pernoitar
longe de casa; (7) pesadelos repetidos envolvendo o tema de
separação; (8) repetidas queixas de sintomas somáticos quando a
separação de figuras importantes de vinculação ocorre ou é prevista.
Assim, nos demais critérios, temos: A perturbação deve ter duração
mínima de 4 semanas, iniciar antes dos 18 anos, causar sofrimento
clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social e não
ocorrer exclusivamente durante outro transtorno.
Podem ser muitos os motivos e/ou causas a desencadear o Transtorno
de Ansiedade de Separação, devendo haver uma busca dedicada do
terapeuta a fim de localizar o real motivo, assim melhorando o foco das
técnicas e tratamento a serem aplicados.

De acordo com Lima (2012), cabe destacar que várias situações podem
influenciar o surgimento de sintomas de ansiedade. Cada caso deve ser
avaliado individualmente, mas alguns fatores são relatados na literatura,
como mudanças de escola ou domicílio, doença de algum membro
familiar ou separação conjugal. Não raro, com acesso a reportagens
que destacam a vulnerabilidade humana a eventos sociais aversivos,
como sequestros relâmpagos, assassinatos e assaltos a mão armada,
eles sentem o perigo mais próximo e, assim, temem que algo ruim
aconteça a si mesmo ou com seus familiares.

Conforme Silveira e outros (2007), o diagnóstico precoce é fundamental


para um tratamento adequado e respectiva remissão dos sintomas,
evitando-se, assim, um prejuízo maior decorrente da especificidade
sintomatológica.

4. Tratamento e Técnicas Utilizando a Teoria Cognitivo


Comportamental
Lima (2012) explica que a terapia cognitivo-comportamental utilizada
com crianças que possuem ansiedade de separação e se recusam a ir
ou permanecer na escola por medo de separar-se de seus pais ou
figura de vínculo preconiza o retorno à escola (exposição-alvo). No
entanto, essa exposição deve ser gradual para permitir que ocorra a
habituação à ansiedade, respeitando as limitações da criança e seu
grau de sofrimento e comprometimento. Deve haver, também, sintonia
entre a escola, os pais e o terapeuta quanto aos objetivos, conduta e
manejo. As intervenções familiares objetivam psicoeducar a família
sobre o transtorno, auxiliá-la no manejo para aumentar a autonomia e
competência da criança e reforçar positivamente suas conquistas.
A psicodeducação é uma técnica e estratégia educativa para promover
a compreensão do problema. Utiliza-se, para isso, recursos
audiovisuais e materiais gráfico/instrucional (manuais). Aborda-se a
etiologia da doença, a epidemiologia, o prognóstico e os diferentes
tratamentos existentes (KNAPP, 2008). De acordo com Lima (2012),
algumas recomendações são válidas para prevenir este transtorno:

• Desde cedo, diante dos afastamentos dos pais, estes devem


sinalizar para onde irão e quando devem retornar, porém, com
certa “margem de erro”. Por exemplo, “volto quando o sol se pôr”,
“venho para te colocar para dormir”. Se for dar uma saída e for
demorar, não adianta dizer que volta logo, ou estipular os minutos
(“volto em dez minutos”). Recomenda-se estabelecer as horas
para mais, para evitar os atrasos em virtude dos imprevistos. Não
é recomendada a “saída à francesa”.
• Recomenda-se que a despedida seja algo natural. Coloca-se em
evidência as questões satisfatórias que os filhos terão contato na
escola (o melhor amigo, a aula da disciplina que tem afinidade, os
paqueras) e não o afastamento ou as exigências (por exemplo,
“não me ligue!”).
• Alguns pais, em momentos de irritação, podem ameaçar o
abandono do lar diante do comportamento inadequado da criança
visando a diminuição da frequência deste. Por exemplo, “se você
fizer isso de novo, eu vou embora e não volto mais!”. Em brigas
conjugais, esta fala também é comum. Diante de crianças
ansiosas, então, não se recomenda este tipo de verbalização, pois
ela provoca ansiedade e deixa a criança alerta quanto à
possibilidade deste perigo.
• Incentive-o a brincar, o contato com os colegas e o lazer. Quando
estão em um contexto com estímulos satisfatórios, estas situações
concorrem com as preocupações, fazendo com que o medo fique
em segundo plano.
• Diante do medo da criança, jamais afirme a sua invulnerabilidade
a eventos como doença, morte ou mazelas sociais, apenas mude
o foco, apontando as evidências que não favorecem o perigo. Por
exemplo, se o adolescente revelar o medo de ficar sozinho em
casa, lembre-o da segurança que possui no momento, que reduz
a probabilidade de que algo ruim aconteça, como o porteiro, a
trava da porta ou a cerca elétrica.
Na abordagem cognitivo-comportamental são utilizadas outras técnicas
para auxiliar na recuperação das atividades sociais e escolares normais
e a diminuição gradativa do medo, sendo estas:

Economia de Fichas - É uma estratégia de intervenção da


Análise Aplicada do Comportamento que introduz contingências de
reforçamento para resposta(s) considerada(s) adequada(s) pelo
terapeuta. Estas contingências de reforçamento geralmente são
apresentadas em forma de fi chas, pontos ou qualquer outro tipo de
estímulo reforçador condicionado que possa sinalizar reforçamento em
momento posterior. Assim, estas fi chas podem ser trocadas por
atividades, alimentos, objetos ou outro tipo de estímulo reforçador
previamente defi nido, podendo, também, de acordo com Zambom
(2006) serem retiradas quando acusado comportamento inadequado.
Cartões-Lembretes – Sugere-se que a criança escreva ou
desenhe a ideia principal que possibilitará o enfrentamento das
situações temidas em um cartão, o qual permanecerá consigo e será
utilizado sempre que necessário. É importante que o cartão esteja com
a criança sempre que estiver enfrentando uma situação ansiogênica, a
fi m de que ela possa consultá-lo com facilidade (SILVEIRA et al, 2007).
Baralho da emoções - O Baralho das Emoções é um
“instrumento facilitador do acesso às emoções infantis na clínica
cognitiva”, capaz de promover “mudanças clínicas signifi cativas
conforme as especifi cidades de sua aplicabilidade”. Trata-se de um
instrumento muito útil para trabalhar-se com crianças, área onde a
criatividade do terapeuta joga com um papel decisivo para o sucesso da
abordagem das situações clínicas (CAMINHA, 2010).

Flexa Descendente – Essa técnica tem como objetivo


identifi car as principais situações que a criança descreve como
ansiogênicas e as respectivas emoções. O terapeuta utiliza perguntas,
tais como:”Se for assim o que pior poderá acontecer? E o que
aconteceria depois? O que há de tão ruim nisso?” Esses
questionamentos possibilitarão identifi car as crenças da criança em
relação às situações temidas, assim como auxiliará na compreensão da
lógica de seu raciocínio (SILVEIRA et al, 2007).

Questionamento socrático - O processo socrático fornece a


estrutura pela qual a criança identifi ca, testa e reavalia as importantes
generalizações cognitivas que utiliza para interpretar e compreender
seu mundo. O processo é estruturado e envolve algumas etapas
distintas, cada uma com um propósito específi co. Além de basear-se no
uso cuidadoso do questionamento sistemático para guiar a criança por
um processo em que suas defi nições universais serão identifi cadas e
avaliadas criticamente (KNAPP, 2008).

Treinamento em Relaxamento – Respiração Diafragmática -


Visa estimular o sistema nervoso autônomo parassimpático para
propiciar uma sensação de relaxamento. Deve explicar ao cliente como
proceder à respiração (KNAPP, 2008). Com a criança, pode-se utilizar
situações lúdicas como “cheirar a fl or e assoprar a vela”, para melhor
interação.

RPD - O objetivo do registro de pensamentos disfuncionais é de


facilitar que a criança lembre-se de eventos, pensamentos e
sentimentos. Serve para registrar cognições e reações, bem como
examinar, avaliar e/ou modifi car tais cognições. O RPD é um
procedimento utilizado por diversos transtornos mentais no tratamento
cognitivo comportamental. Ele visa proporcionar ao paciente reconhecer
a relação entre as situações ambientais ativadoras, pensamentos
automáticos, sentimento e comportamento, bem como para que o
paciente entenda melhor seu humor, criar mudanças de comportamento
desejadas e a mudar os pensamentos que interferem em seus
relacionamentos (BECK, 1997).
5. Considerações Finais
Todos nós somos formados pelo bio-psico-social, sendo assim, a
criança é e traduz muito do meio onde está inserida. Situações vividas,
momentos traumáticos, manejo dos pais e emoções sentidas
influenciam no comportamento e pensamento dessas crianças.

A ansiedade de separação é um transtorno comum na infância e na


adolescência. A criança sente medo intenso e transforma-o em
sintomas físicos que prejudicam sua vida social, assim como seu
rendimento escolar. Esses prejuízos acarretam angustia tanto para os
pais, quanto para as próprias crianças, que reconhecem o seu
comportamento disfuncional, a fim de sanar as queixas de muitos pais e
crianças, a escolha pela psicoterapia é imprescindível. Sendo
necessário o envolvimento, além da criança e do terapeuta, dos pais e
da escola.

A TCC – Terapia Cognitivo Comportamental – utiliza-se de muitas


técnicas e associações dos pais e das crianças, com o intuito de
gradativamente excluir os comportamentos inadequados do medo,
assim, consequentemente os sintomas físicos apresentados.
Enfim, conforme Lima (2012) o risco é inerente à vida. O ser humano é
vulnerável e a vida é finita. Mas tais preocupações na infância acabam
reduzindo o brilho da vida que se vê com mais clareza apenas nesta
fase da vida. Assim, a utilização da terapia focada na abordagem
cognitivo comportamental, com a utilização de diversas técnicas, é
necessária para a exclusão gradativa dos sintomas e reestruturação da
vida social.

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