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Acórdãos TCAS Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul

Processo: 229/10.3BECTB

Secção: CT

Data do Acordão: 05-03-2020

Relator: VITAL LOPES

Descritores: IMPUGNAÇÃO JUDICIAL;


IVA;
CORRECÇÃO À MATÉRIA COLECTÁVEL;
FACTURAÇÃO FICTÍCIA;
FRAUDE CARROSSEL.

Sumário: 1. O artigo 19º nº 3 do Código do Imposto sobre o Valor


Acrescentado só exclui o direito à dedução do imposto que resulte
de operação simulada.
2. Sobre a administração tributária recai o ónus de provar os
factos constitutivos do direito à liquidação adicional e sobre o
sujeito passivo recai o ónus de provar os factos constitutivos do
direito à anulação dessa liquidação - artigo 74.º, n.º 1 da Lei Geral
Tributária.
3. Em termos gerais, a “fraude carrossel” implica a existência de
várias empresas que, supostamente, realizam transacções entre si,
sendo que uma delas, por praticar transmissões intracomunitárias
de bens, não liquida I.V.A. nos termos do R.I.T.I. (Regime do I.V.A.
nas Transacções Intracomunitárias).
4. A substância económica da operação em causa deve ser
analisada à luz de critérios objectivos, mas a posição do sujeito
passivo na cadeia de transmissões deve ser subjectivamente
esmiuçada, procurando averiguar qual a sua real atitude perante a
fraude em curso, penalizando quer a intenção quer a negligência.
5. Não foram carreados para o RIT quaisquer elementos que
permitam concluir que houve um “esforço concertado” dos
diversos operadores envolvidos nas transacções, pois que não se
detecta qualquer elemento que estabeleça a necessária conexão
entre a cadeia mencionada e a ora Recorrida, o que significa que o
RIT não evidencia quais os elementos concretos que permitem
concluir pelo envolvimento da sociedade impugnante,
designadamente que elementos probatórios foram recolhidos no
âmbito da situação agora apontada, elementos esses que assim
seriam do conhecimento da ora Recorrida.

Votação: UNANIMIDADE

Aditamento:
1
Decisão Texto ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2.ª SUBSECÇÃO
Integral:
DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL
CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

1 – RELATÓRIO

I – A Exma. Representante da Fazenda


Pública inconformada com a sentença da Mmª. Juiz do
TAF de Castelo Branco que julgou procedente a
impugnação judicial que a sociedade S…………. Ldª,
deduziu contra o indeferimento expresso de reclamação
graciosa apresentada contra as liquidações adicionais de
IVA e juros compensatórios dos exercícios de 2005 e 2006,
dela recorre para este Tribunal, pretendendo a sua
revogação e substituição por outra decisão que mantenha os
actos de liquidação ora postos em crise.

Nas suas alegações de recurso formula as seguintes e doutas


conclusões:
“1.º
O presente recurso interposto da decisão constante de fls. 437 a
477, que decide conceder provimento ao pedido de anulação das
liquidações em IVA, violando assim várias disposições, art.º 75.º da
LGT, a alínea a) do n.º 1 e n.º 3 do art.º 19.º, conjugado com a
alínea a) do n.º 1 do art.º 20.º, 72.º-A do CIVA.
2.º
Com o devido e merecido respeito crê a Fazenda Pública, a ora
recorrente que, o tribunal “a quo” não tem razão como dicidiu, ao
ter julgado procedente a impugnação, aplicando erradamente o
direito aos factos dados como provados e ficou por conhecer de
outras questões relevantes para a decisão.
3.º
O Digno Magistrado do Ministério Público, pronunciou-se a fls.
434, no sentido de que a impugnação devia improceder, face aos
elementos do PA, da prova testemunhal e documentais, referindo-se
à sentença da impugnação judicial n.º 619/09.4BEVIS do TAF de
Aveiro, no qual é impugnante, a sociedade W…………...
4.º
Entende o MP que em termos idênticos, a impugnante não logrou
fazer prova dos factos alegados como era seu ónus.
5.º
O referido processo de impugnação judicial, foi deduzido pela
Sociedade W.........., S.A., relativo a liquidações do IVA do ano de
2006, tendo sido proferida sentença de indeferimento.
6.º
Resulta dos autos, nomeadamente da prova documental vertida no
relatório da IT a fls. 28 e sgs, e da prova testemunhal ficou provado,
que a Sociedade W.........., S.A., era fornecedor da L .........Lda.. e,
esta fornecedora da S.........Lda.., ou seja, a Sociedade W..........,
S.A., era fornecedora indirecta da S.........Lda..
7.º
As liquidações referidas no art.º 1.º supra, dizem respeito às
liquidações oficiosas de IVA e respectiovs juros compensatórios
realtivos aos anos de 2005 (Maio a Julho e Setembro a Dezembro) e
2006 (Janeiro a Maio e Setembro de 2006), cujas liquidações estão
discriminadas a fls. 2 a 4 do PA.
Ora,
8.º
Tais liquidações resultaram de uma acção de inspecção tributária à
S………… Lda., pela IT da Direcção de Aveiro, que ao tempo a
sociedade tinha a sua sede na Zona Industrial de ………, Freguesia
de Espargo, concelho de Santa Maria da Feira, e que,
9.º
Culminou com o relatório final, junto aos autos, que aqui
reproduzimos para os efeitos legais e, e consequentemente, foram
efectuadas correcções meramente aritméticas à matéria tributável
de IVA, referente aos períodos em causa, cfr. 61 e seguintes do PA.
10.º
A acção inspectiva externa, foi despoletada, a partir da análise
interna de pedidos de reembolso de IVA solicitados pela
impugnante relativos aos anos de 2005 e 2006, derivados do
comércio de “sucata”, realizado no mercado interno.
11.º
Através da acção de inspecção externa efectuada à impugnante e do
cruzamento de informação de dados contabilísticos e declarativos
dos sujeitos passivos com os quais, a impugnante, mantinha directa
ou indirectamente relações comerciais, principalmente com
aquisição no mercado interno de “sucata”. Conclui-se que,
12.º
O IVA foi deduzido indevidamente, com base em supostas
aquisições de bens na utilização de facturas fictícias/falsas,
originando assim, ilegitimamente, uma permanente situação de
crédito de imposto perante o Estado.
13.º
Colocou-se em causa, as aquisições (compras) no sector da
“sucata”, supostamente efectuadas pela impugnante no mercado
interno aos seus fornecedores directos e indirectos.
14.º
Concluindo-se que essas aquisições faziam parte de uma série de
operações com fins fraudulentos, como se demonstra no referido
relatório da IT.,
15.º
Que traduzem uma forte probabilidade das operações constantes
das facturas serem simuladas, colocando-se assim em crise a
presunção legal da veracidade dos elementos contabilísticos e
respectivas declarações, art.º 75.º da LGT.
16.º
A IT apenas se pronunciou e, colocou em causa, o IVA deduzido a
montante, relativamente às aquisições de sucata no mercado interno
relativamente aos fornecedores directos e indirectos da impugnante,
com quem mantinha relações comerciais, referenciados no
relatório.
17.º
Resulta que nunca foi posto em causa a liquidação do IVA a jusante
relativa às transmissões intracomunitárias (vendas) dos bens em
causa, nas relações comerciais entre a impugnante, e os seus
clientes intracomunitários, como a mesma quer fazer crer.
18.º
Resulta de fls. 66 e 67 do PA, que a Sociedade S.........Lda..,
aquando da acção inspectiva, tinha a sede e exercia a sua
actividade, na Zona Industrial ………., freguesia de Espargo,
Concelho de Santa Maria da Feira, cujo local, exerce a sua
actividade, área da do Serviço de Finanças de Feira 1.
19.º
Com base no relatório, o Serviço Finanças da Feira 1, da área da
sede da impugnante ao tempo, efectuaram as liquidações adicionais
de IVA, agora em litígio, com base legal na alínea a) do n.º 1 e n.º 3
do art.º 19.º, conjugado com a alínea a) do n.º 1 do art.º 20.º do
CIVA, como resulta de fls. 2 e sgs., do PA.
20.º
Estranhamente, a impugnante, a partir de 2007/08/16, conf. doc. 1 e
2 juntos à nossa contestação, passou a sua sede para a loja …. do
E……. Shopping Center, na Covilhã,
21.º
Continuando no entanto, a exercer a sua actividade nas suas
instalações próprias, na área do serviço de finanças da Feira1, como
provam os autos.
O que nos leva a crer,
22.º
Que a mudança de sede, teve em vista, uma manobra de “baralhar”
os serviços, procurando desviar o processo, da localização onde se
desenrolava a comercialização do negócio do sector da “sucata”,
com as empresas fornecedoras envolvidas, bem como
23.º
Da intervenção directa da IT da Direcção de Finanças de Aveiro e
do Serviço de Finanças da Feira 1, ou do TAF de Aveiro.
24.º
Para um Direcção ou Serviço de Finanças, ou um TAF, fora da área
dos serviços que que tinham procedido ao apuramento do IVA
25.º
Nos presentes autos discute-se a veracidade das facturas e, se elas
correspondem ou não a transacções reais, ou seja, se os emitentes
das facturas postas em causa fornecem à impugnante os serviços
que as mesmas se referem.
Ora,
26.º
A sentença julgou procedente a questão em análise, com base nos
fundamentos dos factos provados, constantes de fls. 441 a 456,
Vem o tribunal,
27.º
Em sede de motivação e apreciação, face aos factos decorrentes do
relatório dizer que, se afigura que a tese da AF sofre de várias
fragilidades, a saber:
1.A AF não demonstrou ter encontrado na contabilidade da
impugnante que permitissem aferir da existência de indícios
ponderosos de que a impugnante participava num esquema de
fraude carrossel;
2.A AF não demonstrou ter encontrado através de dados concretos
carreados das várias empresas “fornecedores”, nem ter encontrado
conexões que permitissem concluir haver indícios sérios de
simulação;
3. A AF não realizou reconciliações bancarias, nem colocou em
causa os fluxos financeiros da S……………, nem das empresas
suas fornecedoras de sucata;
4. A AF não realizou quaisquer averiguações quanto aos possíveis
armazéns do principal fornecedor a “A…………Unipessoal, Lda.”,
nem recolheu elementos que demonstrem que a sociedade
transmitente dos bens não dispunha de uma “adequada estrutura
empresarial susceptível de exercer a actividade declarada”;
5.Resultando do relatório da inspecção junto aos autos o contrário:
A Soc. “A……….., Lda.”, tem instalações, camiões de transporte,
armazéns e trabalhadores próprios (que são utilizados pela
impugnante) tem clientes (pelo menos a impugnante), labora e tem
receitas próprias;
6. Ficou demonstrado que a L……….., era mera intermediária e
não necessitava de instalações físicas para desempenhar o papel na
intermediação e colocação no mercado da sucata para outras
empresas.
7.Na fase inspectiva a actividade investigatória foi insuficiente,
nomeadamente quanto à evidenciação dos fluxos financeiros entre
as empresas; investigação adequada sobre transporte dos produtos
transaccionados e, todas as actividade conexas, relacionadas com a
compra e venda de sucata;
8. Ficou demonstrado por parte da inspecção tributária quanto à”
imaterialidade” das operações realizadas e, pelo contrário, a
impugnante rebateu as conclusões da AF, quanto à materialidade
das operações com prova testemunhal.
Assim
28.º
Entendeu o tribunal, que AF, não demonstrou fortes índices, a fim
de poder descredibilizar a presunção de verdade da contabilidade e
das facturas da impugnante.
29.º
Não o demonstrando, não caberia à impugnante o ónus da prova da
veracidade das operações comerciais. Tendo a impugnante rebatido
as conclusões da AF, quanto à materialidade das operações através
da prova testemunhal
30.º
Entendemos, que o tribunal ao decidir assim, não decidiu de acordo
com os factos como provados, como se vai demonstrar a seguir:
31.º
É certo que a AF, nunca pôs em causa, a contabilidade da
impugnante, a realização de reconciliações bancarias, nem colocou
em causa os fluxos financeiros da impugnante, nem das empresas
dos seus fornecedores directos de sucata a A………… e, a
L……….., dado que do ponto de vista formal, quer dos elementos
contabilísticos, quer dos fluxos financeiros, estes estavam correctos.
Por outro lado,
32.º
Como se no art.º 11.º supra, que através da acção inspectiva
externa, efectuada à S……….. Lda., e do cruzamento de
informação em termos contabilísticos e declarativos dos sujeitos
passivos com os quais, a impugnante mantinha directa ou
indirectamente relações comerciais, principalmente com aquisição
no mercado interno de “sucata”, foi colocado
33.º
Em causa, as aquisições (compras) no sector da “sucata”,
supostamente efectuadas pela S…………. Lda., no mercado interno
aos seus fornecedores directos e indirectos, concluindo-se que essas
aquisições faziam parte de uma série de operações com fins
fraudulentos, como se demonstra no referido relatório da IT., com
base na proveniência da “sucata”
34.º
Como se dá conta no art.º 12.º supra, por falta de pressupostos
legais, o IVA foi deduzido indevidamente, com base em supostas
aquisições de bens na utilização de facturas fictícias/falsas,
originando assim, ilegitimamente, uma permanente situação de
crédito de imposto perante o Estado.
Assim,
35.º
Entendemos que a AF, demonstrou ter encontrado através de dados
concretos carreados das várias empresas “fornecedores”, pelo
cruzamento de informação em termos contabilísticos e declarativos
dos sujeitos passivos com os quais, a S………… Lda., mantinha
directa ou indirectamente relações comerciais, e ter encontrado
conexões que permitem concluir haver indícios sérios de simulação.
Factos esses,
36.º
Traduzem uma forte probabilidade das operações constantes das
facturas serem simuladas, colocando em crise a presunção legal da
veracidade dos elementos contabilísticos e respectivas declarações,
art.º 75.º da LGT.
7.º
É certo que a AF ao tempo da acção inspectiva, não realizou
quaisquer averiguações quanto aos possíveis armazéns do principal
fornecedor a “A………………, Lda.”, nem recolheu elementos que
demonstrem que a sociedade transmitente dos bens não dispunha de
uma “adequada estrutura empresarial susceptível de exercer a
actividade declarada”;
Tendo no entanto,
38.º
Sido dito pela testemunha o mentor do relatório que não visitou as
instalações “A…………….., Lda.”, tendo vindo, a ter
conhecimento posteriormente através do relatório aquando da acção
inspecção efectuada à “A…………, Lda.” no qual é referido que
sociedade não tem adequada estrutura empresarial susceptível de
exercer a actividade declarada.
Contudo,
39.º
Não nos parece que resulte do relatório da inspecção junto aos
autos que nele esteja referido, como a sentença diz que, a Soc.
“A…………….., Lda.”, tem instalações, camiões de transporte,
armazéns e trabalhadores próprios (que são utilizados pela
impugnante) tem clientes (pelo menos a impugnante), labora e tem
receitas próprias;
Assim sendo,
40.º
Caberia à impugnante o ónus da prova da veracidade das operações
comerciais, não tendo assim a impugnante conseguido rebater as
conclusões da AF, quanto à materialidade das operações através da
prova testemunhal.

Atendendo ao teor dos autos de inquirição de testemunhas,


constantes dos autos, a Fazenda Pública considera que, não foi
provada a matéria factual invocada pela impugnante.
41.º
O interrogatório conduzido pela impugnante, quase se cingiram a
responder às questões sobre a matéria factual, relativamente às
transmissões intracomunitárias (vendas) dos bens em causa, nas
relações comerciais entre a S………… Lda., e os seus clientes
intracomunitários.
Ora,
42.º
Como já foi referido o que estava em questão eram apenas as
aquisições (compras) supostamente efectuadas no mercado interno
a fornecedores directos e indirectos, com os fundamentos
constantes do referido relatório.
43.º
Quando interrogadas as testemunhas por parte da Fazenda Pública,
estas desconheciam a proveniência da sucata. Também
desconheciam quem eram os fornecedores da impugnante, com
excepção das testemunhas L……………, F…………..,
R……………..
44.º
As testemunhas A……………….. e M…………………., ambos
funcionários do Banco .......... de Vila da Feira, conheciam os sócios
da impugnante como clientes do banco. Quando questionados pela
F.P, o 1.º disse ter conhecimento de ter havido transferências com a
L………… e, desconhecia a A…………... O 2.º disse que
desconhecia a existência de relações comerciais entre a, ora
impugnante a L…………., Lda. e, a A……………. Lda.
45.º
A testemunha L…………, apenas conhecia a empresa A…………..
Lda., como fornecedora de sucata à impugnante, não conhecendo a
origem do material.
46.º
A testemunha R……………, gerente da empresa de transportes
T……….., sendo esta empresa que fazia o transporte de toda a
sucata da impugnante para o estrangeiro, a partir da firma
A…………….., Lda. Desconhecia a origem da sucata. Desconhecia
os fornecedores da impugnante. Ainda disse que conhecia a firma
W.........., porque era cliente da T…………..
47.º
A testemunha F………………., disse que conhecia a firma
A…………….. como fornecedora da impugnante, tendo também
dito que a L………… não tinha espaço físico para armazenamento
de sucata e que também forneceu algum material à impugnante.
Desconhecendo também a origem da sucata.
48.º
A testemunha R……………., encarregado de armazém da
impugnante, disse que era ele que assistia a todos os carregamentos
da sucata efectuados pela impugnante e que toda a sucata era
transportada para o estrangeiro a partir dos armazéns da
A……………. e que o volume de negócios redundava os 10, 15
milhões de euros anos. A firma A……………, também fornecia
sucata a outros clientes, questionado quem eram esses clientes não
soube dizer. Desconhecia também a origem da sucata. Questionado
se conhecia a L………. e a W.........., depois de hesitar disse que
conhecia e, que a L…………… foi fornecedora de sucata à
impugnante, tendo o seu sócio negociado a transacção comercial e
o transporte a partir da empresa W.......... cerca de 200 Toneladas.
Donde resulta provado,
49.º
Que indirectamente a impugnante pelo menos, negociou a
transacção comercial e o transporte a partir da empresa W..........
cerca de 200 Toneladas. Empresa essa, fizemos referência nos art.ºs
3.º, 5.º e 6.º supra, para os quis se remete.
50.º
As testemunhas L…………… e F……………., funcionários da
AT, quando questionados vieram confirmar os seus depoimentos
com base nos documentos nos quais tiveram intervenção.
51.º
Tendo em consideração que os depoimentos prestados pelas
testemunhas arroladas pela impugnante não são suficientes
reveladores, de modo a provar os factos invocados pela impugnante
e, consequentemente deverão ser provados todos os factos
tributários que levaram à prática dos actos de liquidação de IVA em
causa.
Por outro lado,
52.º
O tribunal não se pronunciou e, em obediência ao princípio do
inquisitório ao qual o jugador fiscal está subordinado, na descoberta
da verdade material, violando assim o art.º 660.º do CPC que se
relaciona quanto à questão, da entrada em vigor das novas regras
fiscais “Reverse Charge” aplicadas ao sector da sucata, a partir de
1/10/2006, através da Lei n.º 33/2006 de 28 de Junho, não tendo a
impugnante a partir dessa data declarado mais compras de sucata,
voltando a sua actividade apenas à tradicional de comércio de
matéria-prima (metais não ferrosos) junto das industria nacionais de
ferragens e metalomecânica,
O que leva crer,
53.º
Por parte da AF que a mudança de comportamento da impugnante
se traduz numa forte probabilidade das operações constantes das
facturas serem simuladas, colocando em crise a presunção legal da
veracidade dos elementos contabilísticos e respectivas declarações,
art.º 75.º da LGT.
54.º
A impugnante, como resulta do relatório, foi alertada pela AF, de
um eventual envolvimento num esquema de fraude carrossel, dado
a empresa estar a comercializar no sector da sucata vulnerável à
prática de fraude,
Portanto,
55.º
Não venha a impugnante dizer em abono da sua tese que não sabia
nem tinha que conhecer se os fornecedores cumpriam com as suas
obrigações fiscais como é referido na sentença a fls. 471.
Pois,
56.º
Tal obrigação é lhe imposta pelo art.º 72-A do CIVA, sob pena de
ser também responsável solidário pelo pagamento do IVA, desde
que tenha intervindo ou venha a intervir, em qualquer fase do
circuito económico, em operações relacionadas, neste caso com
bens derivados da sucata
57.º
Assim face ao exposto, entendemos que não assiste razão à
impugnante, quanto aos vícios invocados para se proceder à
anulação das liquidações adicionais de IVA, devendo manter-se o
acto tributário impugnado na ordem jurídica.»

A recorrida apresentou contra-alegações, nas quais


apresenta as seguintes e doutas conclusões:

1. A Fazenda Pública invoca, em primeiro lugar, a sentença


proferida no âmbito do processo n.º 619/09.4BEVIS do TAF de
Aveiro porquanto considera que, em termos idênticos, a
impugnante não logrou fazer prova dos factos alegados como era
seu ónus.

2. Impõe-se, antes de mais, explicitar que


a Impugnante/Recorrida nunca interveio no processo
619/09.4BEVIS, nem sequer os seus sócios foram indicados
como testemunhas.

3. Pelo que, dúvidas não restam de que a Impugnante desconhecia


por completo a existência destes autos e, consequentemente, quais
as causas de pedir e pedidos aí formulados.

4. No entanto, caso exista tal sentença e a mesma tenha transitado


em julgado (pormenor que nem sequer é referido), não se vislumbra
qual a relevância da mesma para o caso concreto pois, reitera-se, a
Impugnante não teve qualquer intervenção no mesmo.

5. No entanto, cumpre referir que a sociedade W.......... nunca


forneceu directamente qualquer mercadoria à Impugnante.

6. A única transacção efectuada entre esta e a impugnante, ocorreu


com a intermediação da L…………., correspondendo à compra
pela Impugnante de 227.005 Kg, no ano de 2006, ponto 26 da
sentença.

7. Por outro lado, invoca a Recorrente que a 16/08/2007, a


Impugnante/Recorrida passou a sua sede para a Covilhã, apesar de
continuar a exercer a sua actividade nas suas instalações da Zona
Industrial de Roligo.

8. Acrescenta ainda que esta mudança teve o intuito de “baralhar”


os serviços, procurando desviar o processo da zona onde se
desenrolava a comercialização do negócio do sector da “sucata”,
com as empresas fornecedoras envolvidas.

9. Curiosamente a mudança da sede da Impugnante nem sequer está


incluída nos factos provados. Pelo que, a Recorrente para
fundamentar as suas alegações neste facto teria de peticionar uma
alteração da matéria de facto, nos termos previstos nos arts. 653.º,
n.º 2, 685.º-B e 712.º, n.º 1 do C.P.C., o que não se sucedeu.

10. Assim sendo, terão de ser liminarmente rejeitadas as conclusões


vertidas de 20.º a 24.º, conforme prescrito no art. 685.º-B, n.º 2 do
C.P.C.

Não obstante e sem prescindir,

11. Tal argumentação padece de duas contradições que a ferem de


morte.

12. A primeira prende-se com a circunstância de a Recorrente


alegar que a Impugnante comercializava “sucata” com as empresas
fornecedoras envolvidas, ou seja, afinal as transacções tituladas
pelas facturas em causa eram reais.

13. A segunda com o facto de a Impugnante não ter qualquer móbil


para “baralhar” ou “deslocalizar” o processo. É que as diligências
investigatórias empreendidas pela IT já haviam terminado há mais
de um ano, quando se verificou a alegada mudança de sede da
impugnante.

14. Para além disso, a Recorrente refere também que a inspecção se


baseou no cruzamento de informação de dados contabilísticos e
declarativos dos sujeitos passivos com os quais, a impugnante,
mantinha directa ou indirectamente relações comerciais,
principalmente com aquisição no mercado interno de “sucata”.

15. Estas informações permitiram concluir, na perspectiva da


Recorrente, que tais relações comerciais reflectiam supostas
aquisições de bens na utilização de facturas fictícias/falsas que
originavam uma permanente situação de crédito do IVA perante o
Estado, ou seja, as aquisições de sucata efectuadas pela Impugnante
eram falsas.

16. Com efeito, o que se discute nos autos é a veracidade das


facturas, se elas correspondem ou não as transacções reais.

17. Considera a AF que as facturas em que foi deduzido o IVA nas


operações internas, correspondiam a operações simuladas e por isso
não conferiam o direito à dedução de acordo com o disposto no art.
19.º, n.º 3 do CIVA.

18. Na tese da AF a impugnante encontrava-se inserida num


esquema de facturação fraudulenta, sem qualquer correspondência e
aderência a operações reais de transmissão de bens.

19. Contudo, a AF chega também a referir que a impugnante até


podia efectuar transacções reais, comercializar sucata no mercado
interno e vendê-la no mercado intracomunitário, no entanto, porque
os adquirentes e seus fornecedores pertenceriam a um esquema de
fraude carrossel o seu direito à dedução do imposto ficaria
irremediavelmente precludido, art. 19.º, n.º 3.

20. A sentença proferida considerou, porém, que a AF não logrou


provar nenhum facto concreto que permitisse concluir que a
impugnante estaria envolvida num esquema de fraude carrossel.

21. Constatou a douta decisão que a AF não encontrou na


contabilidade da impugnante quaisquer irregularidades que
permitissem suportar o envolvimento da mesma na fraude nem
sequer carreou dados concretos relativos às empresas fornecedoras
que permitissem concluir haver indícios sérios de fraude.

22. Pelo contrário, a AF louvou a correcta contabilização das


operações comerciais da impugnante, a boa ordem e organização
dos mesmos, não colocou em causa nem as operações bancárias
nem os fluxos financeiros da impugnante nem dos seus
fornecedores.

23. A AF apenas se limitou a concluir que a L………… não


possuía adequada estrutura empresarial para exercer a actividade
declarada e que as empresas fornecedoras que estão na base do
circuito onde nasce a suposta sucata comercializada pela
impugnante (alcoólicos, desconhecidos, siresucatas…) não
possuem contabilidade, não têm estrutura comercial e não
entregaram IVA ao Estado.

24. Na perspectiva da AF, tal como alegado nas conclusões 31.º a


36.º, do cruzamento de informação em termos contabilísticos e
declarativos dos sujeitos passivos com os quais, a impugnante
mantinha directa ou indirectamente relações comerciais,
principalmente com o mercado interno de “sucata” permitiu colocar
em causa as aquisições (compras) no sector da sucata, supostamente
efectuadas pela S………….. Lda., no mercado interno aos seus
fornecedores directos e indirectos, concluindo-se que essas
aquisições faziam parte de uma série de operações com fins
fraudulentos com base na proveniência da “sucata”.

25. Contudo, como foi expendido na sentença (fls. 34) se a


facturação da Impugnante não tem como suporte operações reais,
então deverão existir fragilidades nas contabilidades das empresas
envolvidas que devem ser devidamente evidenciadas, que têm de
ser apontadas para que se possa concluir que essas operações não
existiram.

26. Para se concluir tem de partir-se de factos que foram


constatados e esses factos não se encontram só a montante nos
fornecedores têm de encontrar-se no sujeito passivo que sofre as
correcções à dedução do IVA.

27. A AF considerou haver indícios sérios relativamente à


actividade desenvolvida pelos fornecedores de primeira linha e
pelos restantes fornecedores e por aqui se quedou, já que
do relatório nada consta quanto à repercussão daquelas
irregularidades na actividade da Impugnante, mormente que
esta soubesse ou devesse saber que os seus fornecedores não
dispunham de adequada estrutura empresarial para exercer a
actividade declarada (cfr. art. 19.º, n.º 4 do CIVA).

28. Não ficou provado, nem sequer através de indícios fortes, que
as sociedade fornecedores da impugnante, designadamente a
“A……………” não dispusessem de uma adequada estrutura
empresarial susceptível de exercer a actividade declarada”.

29. Aliás, resulta do relatório da AF (fls. 23 e 24) que se trata de um


contribuinte que cumpre com as suas obrigações fiscais a nível
declarativo, registando inclusivamente algumas entregas de IVA,
conforme constatámos através da base de dados da DGCI. Possui
contabilidade formalmente organizada nos termos da lei comercial
e fiscal. Este sujeito passivo declarou como venda os valores
enunciados no quadro supra, referido no ponto 12 deste
probatório, e a impugnante registou as mesmas na
contabilidade na rúbrica de compras (matéria provada em 13 da
sentença).

30. Ficou outrossim provado (ponto 23 da sentença) que eram os


fornecedores da impugnante, nomeadamente A…………….,
Unipessoal que a avisavam do local/armazém onde se encontrava o
material a carregar. Por sua vez, um empregado da empresa
transportadora (T……….) chegava ao local e carregava a sucata,
passava pelas instalações da impugnante, afim do funcionário da
mesma, normalmente, o R…………… (encarregado de armazém)
proceder à inspecção da sucata de forma a se certificar dos seus
patrões de qualidade, após o que o camião seguia ao destino dos
clientes da impugnante. A partir de 2005, os clientes da impugnante
situavam-se maioritariamente, no mercado intracomunitário.

31. Impõe-se, assim, concluir que a A……………. possuía


instalações onde se encontrava a laborar (local onde a empresa
transportadora se dirigia para carregar a sucata), funcionários (que
acondicionavam a carga nos camiões da T………..), clientes (pelo
menos a impugnante), receitas próprias, contabilidade organizada e
situação tributária regularizada.

32. Tanto mais que é a própria Recorrente quem reconhece não ter


realizado quaisquer averiguações quanto aos possíveis
armazéns do principal fornecedor a A……………Lda. nem
recolhido elementos que demonstrem que a sociedade
transmitente dos bens não dispunha de uma “adequada
estrutura empresarial susceptível de exercer a actividade
declarada”.

33. A alegação constante da conclusão 38.º é ilegal pois que a


Recorrente não cumpriu os requisitos legais previstos no art. 685.º-
B do C.P.C. para impugnar a matéria fáctica.

34. No entanto, caso o mentor do relatório ter proferido as


declarações referidas pela Recorrente (o que não sucedeu) apenas
significaria que os indícios fortes de que a principal fornecedora
da impugnante não detinha estrutura adequada apenas foram
apurados em data posterior à notificação do relatório final.
35. Tal equivale a reconhecer que, à data da redacção do
relatório e da notificação do mesmo á Impugnante inexistiam
indícios fortes de que a A………… não tivesse adequada
estrutura empresarial susceptível de exercer a actividade
declarada.

36. No que concerne à L……………, sendo a mesma uma mera


intermediária não necessitava de instalações físicas para
desempenhar esse papel, na intermediação e colocação no mercado
da sucata para outras empresas.

37. Pelo exposto, impõe-se concluir, na esteira da douta sentença, a


AF não recolheu quaisquer elementos no sentido de demonstrar
que as sociedades transmitentes dos bens não dispunham de
uma “adequada estrutura empresarial susceptível de exercer a
actividade declarada”.

38. Na verdade, a AT não invoca factos que traduzem uma


probabilidade elevada de as operações referidas nas facturas serem
simuladas, probabilidade elevada capaz de abalar a presunção legal
de veracidade das declarações da impugnante e dos dados
constantes da sua contabilidade.

39. A AT não logrou demonstrar como lhe competia, os


pressupostos da sua actuação, o que origina a anulação das
liquidações adicionais de IVA de 2005 e 2006.

40. A decisão recorrida não violou qualquer preceito legal,


aplicando e interpretando correctamente as normas prescritas no art.
75.º da LGT e nos arts. 19.º, 20.º e 72.º-A do CIVA.

41.Sem prescindir, importa ainda acrescentar que, na nossa humilde


opinião, os factos provados permitiam mesmo concluir que a
impugnante logrou provar a materialidade das operações comerciais
em causa através de documentos e testemunhas.

42. A Impugnante provou os seguintes factos:

· Todas as compras efectuadas aos seus fornecedores se


encontravam tituladas por facturas;
· Todos os pagamentos eram efectuados através de cheques,
juntando cópia dos mesmos, bem como extractos bancários;
· Todas as facturas relativas ao transporte das mercadorias
efectuadas pela T…………, notas de pagamento emitidas pela
impugnante a esta última e cópias dos cheques respeitantes a tais
pagamentos;
· Guias de remessa e mais que retratam as negociações entre a
impugnante e as empresas intracomunitárias a quem aquela
efectuava as vendas de sucata que adquiria no mercado nacional;
· Cópia dos seguros relativos à “sucata” transportada onde figurava
como segurado a impugnante.
· Extractos bancários que reflectem o pagamento das aquisições de
sucata efectuadas no mercado interno, das vendas para os clientes
intracomunitários, dos elevados valores que possuía nos bancos
para negociar as mercadorias (metais não ferrosos) cotadas na
bolsa.

43. Todos estes elementos documentais, associados aos


depoimentos prestados em audiência impunham a constatação de
que existem indícios sérios de que todas as operações tituladas
pelas facturas emitidas pela impugnante consubstanciam compras e
vendas reais, ou seja, permitiam concluir pela materialidade das
operações.

44. Analisemos agora a prova testemunhal produzida e impugnada


ilegalmente pela Recorrente que não se preocupou em cumprir os
requisitos legais previstos no art. 685.º-A CPC, mas não se coibiu
de tecer considerações incorrectas sobre os depoimento prestados
em audiência.

45. A testemunha A……… atestou a forte capacidade financeira da


impugnante e das operações efectuadas em bolsa, o que foi
confirmado por M………. que não se recordava do nome das
empresas nacionais e financeiras que eram parceiras comerciais da
impugnante dada a dilação temporal.

46. As testemunhas L……….., F………….. e R…………….


explicaram todo o circuito subjacente ao negócio da “sucata”,
confirmando que todas as operações comerciais passavam pelos
bancos, identificaram o principal fornecedor da impugnante, bem
como as elevadas quantidades de sucata comercializada.

47. O desconhecimento que estas demonstraram relativamente à


origem da sucata é perfeitamente justificável pois que a sua
proveniência constitui um dos “segredos” do negócio.

48. Como bem explicou a testemunha R…………, caso a


impugnante soubesse quem eram os fornecedores da A…………..
já não adquiriria a mercadoria à mesma, optando por comprar
directamente aos seus fornecedores, certamente por valores
inferiores.

49. Conjugando então todos os elementos probatórios aludidos,


mesmo não incumbindo o ónus da prova à impugnante, esta logrou
provar a materialidade das operações comerciais, o que também
implicaria a anulação das liquidações adicionais de IVA em causa e
a procedência da impugnação deduzida.

50. Por último, invoca a Recorrente que a sentença não se


pronunciou sobre a questão de a impugnante a partir de 1/10/2006,
data da entrada em vigor das novas regras fiscais de “Reverse
Charge”, não ter efectuado e/ou declarado mais compras de sucata.

51.O não conhecimento desta questão na sentença proferida não


viola o disposto no art. 660.º do C.P.C. que apenas “obriga” o
julgador a resolver todas as questões que se revelem essenciais à
boa decisão da causa, o que não sucede no caso concreto em que se
trata de uma questão completamente irrelevante para o litígio a
dirimir.

52.Não obstante, a conduta da impugnante é facilmente explicável


se atentarmos a que a mesma deixou de possuir meios financeiros
para transacionar “sucata”. Transacções que implicavam elevadas
quantias pecuniárias.

53.Tal aconteceu por duas razões: a primeira deve-se ao facto de a


AT lhe ter recusado o reembolso das avultadas quantias de IVA
relativas aos anos de 2005 e 2006 aqui em discussão, enquanto que
a segunda prende-se com a imposição da devolução dos reembolsos
de IVA anteriormente aprovados e efectuados pela AT.

A Digna Magistrada do Ministério Público, junto deste


Tribunal, emitiu mui douto parecer concluindo pela
procedência do recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

***

II - DO OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da


alegação da Recorrente (cf. artigos 634.º, n.º4 e 639.º, n.º1 do
CPC),a questão que importa resolver reconduz-se a saber se
a sentença incorreu em erro de julgamento ao concluir que a
AT não recolheu indicadores sérios e seguros de que as
facturas contabilizadas pela impugnante emitidas por dois
supostos fornecedores não correspondem a reais e efectivas
operações económicas.

III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

- A sentença recorrida deu como assentes os seguintes


factos:
«
1. A impugnante é uma sociedade comercial, familiar, cujos
sócios são marido e esposa, foi constituída em 27/01/1987 e,
tem como objeto social “a indústria de fabricação de tubos em
ferro e plástico e comércio por grosso e a retalho de ferros, aços e
outros metais em lingotes e outras formas básicas, incluindo folha-
de-flandres e sucatas (comércio por grosso e a retalho de metais
ferrosos e não ferrosos)  ” – cfr. fls. 59 a 169 do processo
administrativo em apenso aos autos;
2. De acordo com os registos contabilísticos da S.........Lda..,
ora impugnante, a sua atividade entre os exercícios de 2005
e 2006 caracteriza-se pela comercialização no mercado
interno de matéria-prima para a indústria de ferragens e
metalomecânica, designadamente, chapa, cavilha e tubo de
cobre e latão (metais não ferrosos), adquirida no mercado
intracomunitário e, em paralelo, pela introdução no mercado
intracomunitário de desperdícios e resíduos derivados de
metais não ferrosos, nomeadamente de sucata derivada de
cobre, na maior parte e, em menor dimensão de latão - cfr.
fls. 59 a 169 do processo administrativo em apenso aos
autos;
3. A impugnante foi sujeita a ação de inspeção tributária, a
qual se iniciou em 10/11/2006, a coberto da Ordem de
Serviço nº OI………. de 09/11/2006 e, foi dada por
concluída com a emissão da Nota de Diligência nº
NDO2007713442, em 25/06/2007 - cfr. fls. 59 a 169 do
processo administrativo em apenso aos autos;
4. Na origem da ação inspetiva, esteve uma análise interna
de pedidos de reembolso de IVA, em que a AF
detetou “ (…) fortes suspeitas do sujeito passivo estar envolvido
em esquemas de fraude fiscal relacionados com a obtenção de
reembolsos de IVA derivados de comércio de sucata. Na base dos
referidos reembolsos, estaria a utilização de facturas fictícias
emitidas por alguns supostos «fornecedores», as quais seriam
refinadas/branqueadas/filtradas á medida que se ia subindo de
patamar, de forma a credibilizar globalmente o negócio efetuado e,
deste modo, tornar aparentemente legítimos os reembolsos a
solicitar pelo último operador do cenário (neste caso o s.p. objeto
da presente ação inspetiva) antes do produto (sucata) sair do
mercado nacional (e entrar no mercado intracomunitário)” - cfr.
fls. 59 a 169 do processo administrativo
5. No relatório inspetivo, quanto à apreciação e
desenvolvimento da atividade da impugnante, é constatado
que “ (…) em termos de mercado, o interno absorveu a quase
totalidade das vendas do s.p. em 2002 e 2003, ou seja, 97,2% e
99,9%, respetivamente, situação que começou a inverter-se em
2004, ao representar apenas 64% das vendas. Em 2005, a posição
do mercado interno na estrutura do volume de negócios do s.p. foi
tomada pelo mercado externo (intracomunitário) que passou a
representar 71% das vendas em contraste com os 29% do mercado
interno. Assim, no exercício de 2005, as vendas da empresa
deixaram de ter como principal destino o mercado nacional para
passarem a ter o mercado intracomunitário. Este mercado que em
2002, representou apenas 2,8% das vendas, m 2003 0,1%, em 2004
e 2005 passou a representar 35,9% e 70,6%, respetivamente (…)
em 2006, o volume de negócios continuou a aumentar, atingindo o
montante de 9,75 milhões de euros, dos quais 2,92 milhões
respeitam ao mercado interno (destes 0,15 milhões são de sucata) e
6,83 milhões ao mercado intracomunitário (venda de sucata) ” -
cfr. fls. 59 a 169 do processo administrativo em apenso aos
autos;
6. A impugnante exercia a sua atividade em instalações de
pequena/média dimensão na zona industrial de Roligo,
composta de uma área administrativa e uma área de
armazenagem que não era utilizada para o depósito de
sucata - cfr. fls. 59 a 169 do processo administrativo em
apenso aos autos e depoimento das testemunhas;
7. Em 2005 e 2006, a impugnante dispunha de reduzidos
meios humanos, para além dos dois sócios-gerentes tinha
mais três funcionários: um motorista, um administrativo e
um fiel de armazém - cfr. fls. 59 a 169 do processo
administrativo em apenso aos autos;
8. Nos exercícios de 2005 e 2006, a impugnante deixou de
entregar imposto ao Estado, passando a encontrar-se numa
situação de crédito de imposto, tendo solicitado o primeiro
reembolso referente ao período de 05/04, no valor de €
111.770,63, o qual foi analisado e deferido em ação
inspetiva externa. Para além daquele, a impugnante solicitou
ainda os seguintes reembolsos:

Reembolsos solicitados em 2005


Declaração Reembolso de IVA Solicitado
Periódica
05/04 111.770,63
05/06 59.861,58
05/09 114.663,86
05/10 37.410,08
05/11 75.190,33
05/12 197.513,05
Total 2005 596.409,53

Reembolsos solicitados em 2006


Declaração Reembolso de IVA Solicitado
Periódica
06/02 51.359,29
06/03 101.503,10
06/04 97.135,18
06/05 15.137,11
06/06 90.463,74
06/07 131.761,16
Total 2006 487.359,58

- cfr. fls. 59 a 169 do processo administrativo em apenso aos


autos;

9. Quanto aos fornecedores da impugnante, a inspeção


tributária constatou ainda que “ (…) nos anos objeto da ação
inspetiva (2005 e 2006) as compras de sucata foram efetuadas aos
seguintes fornecedores nacionais: A…………. NIF ……… (2005);
V…………………… NIF ……………. (2005); A. ……….. e S……….,
Lda. NIF …………. (2005 e 2006) e L .........Lda.. NIF …….. Por
curiosidade todo o transporte da sucata, desde o fornecedor até ao
cliente final, esteve a cargo de uma só única empresa, a
denominada “T…………………….., Lda.”  NIF ………….. - cfr.
fls. 59 a 169 do processo administrativo em apenso aos
autos;
10. Quanto à organização contabilística da impugnante, a
AF considerou que “ (…) a sociedade dispõe de contabilidade
formalmente organizada segundo os preceitos da lei Comercial e
Fiscal (…) sendo as operações relevadas contabilisticamente de
harmonia com o Plano Oficial de Contabilidade. A contabilidade é
processada por um sistema informático, encontrando-se os
documentos contabilísticos que lhe servem de suporte, de modo
geral, bem arquivados e em bom estado de conservação (…) O
sistema contabilístico instituído, apoia-se em diversos diários,
consoante a natureza das operações a registar, tais como:
ü Caixa- Diário 1 (até Junho de 2005) ou 62 (de Julho de 2005 a
Fevereiro de 2006) – registo dos cheques emitidos e respetivos
recibos de fornecedores; registo dos recibos de clientes e
respetivos depósitos bancários; registo de pequenas
despesas/compras pagas a dinheiro; registo de vendas a dinheiro
(…);
ü Compras-Diário 2 – registo das compras de mercadoria e
sucata; registo das notas de crédito e de débito respeitantes a
compras;
ü Vendas-Diário 3- registo de facturação emitida e das notas de
crédito e de débito com ela relacionadas;
ü Letras- Diário 4- registo das letras a receber (4001); registo das
letras a pagar (4002);
ü Operações Diversas – Diário 5- registo dos fornecimentos e
serviços de terceiros; registo de transferências, financiamentos e
despesas bancárias; registo de custos diferidos e acréscimos de
custos; registo de processamento de salários;
ü Bancos- Diário 10- Existe a partir de 2006- registo de cheques
emitidos e respetivos documentos de quitação (…)” - cfr. fls. 59 a
169 do processo administrativo em apenso aos autos;

11. A AF conclui, sob o título “Descrição dos Factos e


Fundamentos das Correções Meramente Aritméticas à Matéria
Tributável: Dado que esta ação de inspeção resultou de proposta
efetuada pelos serviços internos aquando da análise de pedidos de
reembolsos de IVA, referentes a períodos do exercício de 2006, se
ter detetado fortes indícios do s.p. estar envolvido em esquemas de
fraude fiscal relacionados com a obtenção de reembolsos de IVA
derivados do comércio de sucata e que os mesmos estariam
supostamente influenciados pela utilização de facturas fictícias
emitidas por alguns pretensos “fornecedores” as quais seriam
refinadas/branqueadas/filtradas à medida que se ia subindo de
patamar, de forma a credibilizar o negócio efetuado e desse modo
tornar aparentemente legítimos os reembolsos (…) os pedidos de
reembolso de IVA (…) estão fortemente influenciados pela dedução
de imposto relativo à aquisição de sucata de metais não ferrosos,
na análise documental de IVA deduzido demos particular
importância aos documentos de aquisição de existências,
analisando todos os documentos de aquisição de sucata (…) tendo-
se verificado que os mesmos formalmente encontram-se
devidamente emitidos, satisfazendo os requisitos legais
estabelecidos para o efeito, contudo, através de uma análise mais
exaustiva, foram detetadas graves irregularidades que defraudam
os cofres do Estado (…)
III.1.3- Cruzamento através do Sistema Informático da DGCI a
Diversos Fornecedores/Prestadores de Serviços: Além disso,
efetuamos uma pesquiza através do sistema informático da DGCI a
diversos fornecedores e prestadores de serviços de forma a
verificar se as suas vendas e/ou prestações de serviços foram
declaradas (…) Da referida pesquisa, detectámos que apenas um
suposto prestador de serviços (comissionista) não havia declarado
o IVA declarado no recibo que tinha emitido à S.........Lda..,
(…)”- cfr. fls. 59 a 169 do processo administrativo em
apenso aos autos;
12. Face aos pressupostos acima descritos a A.F. chegou à
conclusão que a impugnante fazia parte de uma rede “
Fraude Carrossel”, em que os fornecedores diretos – 1ª
linha, foram em 2005, A………….., Unipessoal, Lda. e em
2006, de novo, A……………….., Unipessoal, Lda. e a
L…………..Unipessoal, Lda., sendo que os pedidos de
reembolso encontram-se assentes no IVA dedutível de
facturas respeitantes à “aquisição” de sucata de metais não
ferrosos (desperdícios e resíduos de cobre e latão) que o s.p.
declara como vendida para Espanha e Itália.
As compras evidenciam os seguintes valores por
fornecedores de 1ª linha:

Fornecedores de 1ª linha
Fornecedor Sucata/ Valor IVA Total
Exerc
Quantidade
A…., Lda. 1.262.765 Kg € € 721.813,33 €
2005
3.502.218,70 4.224.032,03
A……….., 1.205.600 Kg € € €
2006
Lda. 5.343.689,40 1.122.174,77 6.465.864,17
L…….., 227.005 Kg € € 239.708,18
2006 Lda. 1.141.467,50 €
1.381,176,00

- cfr. fls. 59 a 169 do processo administrativo em apenso aos


autos;

13. Da inspeção cruzada realizada ao fornecedor A.


……………., Unipessoal, Lda., constatou-se que o mesmo
cumpre com as suas obrigações fiscais a nível declarativo,
registando, inclusivamente, algumas entregas de IVA.
Possui contabilidade formalmente organizada nos termos da
lei comercial e fiscal. Este sujeito passivo declarou como
venda os valores enunciados no quadro supra, referido no
ponto 12 deste probatório, e a impugnante registou as
mesmas na contabilidade na rúbrica de compras - cfr. fls. 59
a 169 do processo administrativo em apenso aos autos;
14. Da inspeção cruzada realizada ao fornecedor,
L……….., Lda. constatou-se que o mesmo cumpre com as
suas obrigações fiscais a nível declarativo, registando,
inclusivamente, algumas entregas de IVA. Possui
contabilidade formalmente organizada nos termos da lei
comercial e fiscal. Este sujeito passivo declarou como venda
os valores enunciados no quadro enunciado no ponto 12 do
probatório, e a impugnante registou as mesmas na
contabilidade na rúbrica de compras - cfr. fls. 59 a 169 do
processo administrativo em apenso aos autos;
15. Quanto a este último fornecedor, a AF verificou ainda
que o mesmo não possuía estrutura física, pois a sua sede
social é a residência do seu sócio único, P…………………,
daí o relatório inspetivo enunciar que “ (…) é paradoxal que a
L………. tenha realizado aqueles negócios que envolvem grandes
quantidades de sucata de cobre e avultada movimentação de
dinheiro, sem que dispusesse de instalações adequadas à atividade-
note-se que a sua sede (domicilio fiscal)é um apartamento
localizado perto da praia de Esmoriz (…) tendo-lhe sido colocada
a questão do motivo da “W.........., SA.” lhe ter faturado aquela
sucata e depois, em nome da “L…….”, ter faturado a sucata a
“S………..”, quando estava em jogo apenas uma “comissão” pela
sua suposta angariação de sucata de cobre para “S.........”, o
mesmo referiu-nos que foi condição exigida pela D. M………… que
assim fosse efetuado o negócio, porque ela não queria que a
“S.........” estivesse diretamente envolvida na compra de sucata à
“W.........., SA.”. E sabe-se lá porquê? Por último, referiu que o
negócio da sucata em que a “L……..” se envolveu foi efémero
(apenas durou 15 dias) devido a desavenças familiares com a D.
M………………., mãe da sua companheira (…)”  - cfr. fls. 59 a
169 do processo administrativo em apenso aos autos;
16. A AF, no relatório inspetivo, apresenta um circuito
documental, ou seja, a forma como a facturação se apresenta
relativa aos “Fornecedores” “Diretos” e “Indiretos” da
impugnante, prefigurando o que entende ser um esquema de
“Fraude Carrossel”, conforme ponto III.1.4.4.3 do relatório
da inspeção tributária a fls. 59 a 169 do processo
administrativo em apenso aos autos, e que se apresenta no
quadro seguinte:
Circuito Documental - Movimento da facturação
União Europeia
S.........Lda..
A…………..,Lda L……….., Lda.
G……, Unip.,Lda. J……………. W.........., SA.
A…………. Desconhecidos,
Inexistentes
L…… S……….., Lda. S………., Lda.
Toxicodependentes, Desconhecidos
Inexistentes

17. O relatório Inspetivo apresenta a


seguinte fundamentação de facto: “ (…) conclui-se que a
sociedade S........., insere-se numa cadeia de operadores
organizada cuja articulação entre eles visa, em última análise o
reembolso de um imposto que não foi pago. Partindo dos
fornecedores que estão na base do circuito verifica-se, que é neles
que nasce a suposta sucata comercializada por S.........,
nomeadamente nos toxicodependentes, alcoólicos, inexistentes e
desconhecidos no L………., na S…………. e no J………………….. E
conforme se conclui das respetivas averiguações, os mesmos foram
utilizados com intuitos fraudulentos para conferir o direito à
dedução a jusante do IVA liquidado em documentos de vendas
falsas emitidos em seu nome e que não foi entregue nos cofres do
Estado. E é condição necessária para a utilização daqueles
documentos, visando o objetivo da fraude no IVA que, por outro
lado, o IVA não seja intencionalmente entregue nos cofres Estado,
porque só assim produz efeitos, e, por outro lado, que quem o
utiliza tenha perfeito conhecimento da utilidade que disso faz, pois
só assim tira benefício. Ora, esse benefício não se esgota nos que
utilizam diretamente, quem não entrega o imposto na 1ª fase (no
caso em concreto no “A…………..” ou na “S……..”), ele reparte-
se pelos posteriores utilizadores dos documentos. Ou seja, cada
fase, utiliza a fase imediatamente anterior, o que indica o
conhecimento do esquema sem que contudo, implique,
obrigatoriamente, que quem está na fase final, conheça quem foi
utilizado em primeiro (onde “nasceu” o documento), bastando-lhe
para tal conhecer o intermediário/emitente anterior. Todavia,
quem utiliza os documentos numa fase posterior, sabe
perfeitamente que o seu emitente anterior, ou o que lhe emitiu a
ele, não tem capacidade conforme ficou comprovado pelas
averiguações efetuadas, para realizar os negócios subjacentes às
faturas/vendas a dinheiro que recebe. Assim num dos extremos do
circuito temos entidades que simulando transmissões de bens,
emitem faturas/vendas a dinheiro e liquidam o respetivo IVA sem
que cumpram a obrigação de entregar este imposto. Da
intervenção destes simulados fornecedores resulta unicamente a
criação de um direito á dedução desse mesmo imposto por parte
daqueles que nas faturas/vendas a dinheiro são mencionados como
adquirentes. Este direito à dedução, porque é limitado pela lógica
do funcionamento do próprio imposto é transformado num direito
ao recebimento do imposto através da faturação de vendas a
empresas não racionais. Para que não se levantem dúvidas quanto
à aparente legitimidade dos pedidos de reembolso, estas vendas
não são feitas diretamente pelas empresas que se relacionam
diretamente com os simulados fornecedores, mas antes por
empresas instrumentais como neste caso da S.......... (…) Pelo que
foi exposto ao longo deste relatório acerca do rastreio do circuito e
origem da sucata declarada como adquirida e vendida por S.........,
chegamos á conclusão que a sua proveniência é um verdadeiro
mistério, uma vez que quando chegamos ao início do circuito da
transação “da sucata” acabamos por ter como fornecedores,
nomeadamente, toxicodependentes, alcoólicos, inexistentes e
desconhecidos. Quando interrogados os agentes do setor,
independentemente da fase do circuito comercial em que estão
colocados a resposta é idêntica – não sabem, não é da sua conta, é
um problema dos seus fornecedores (…)A mesma resposta deu a
sócia-gerente da S........., M…………….., ao referir que apenas
sabia a quem comprava a sucata, mas a sua origem só os seus
“fornecedores” é que podiam dizer dado que não era assunto em
que se preocupasse saber por razões de natureza comercial (…)
Tal situação deixa supor, pelo menos três possibilidades: que a sua
verdadeira origem está em empresas industriais, algumas de
considerável dimensão, o que se justifica pelas quantidades e
uniformidade do metal comercializado, cuja identidade, quer pela
sua manutenção, quer por tudo quanto envolve, convém manter no
anonimato (…) a acrescentar a estas três possibilidades e dada a
quantidade invulgar supostamente transacionada de sucata, que
pressupõe uma atividade industrial (…) de grandes dimensões (…)
subsiste também a hipótese deste negócio da sucata estar ligado à
industria espanhola, muitíssimo mais desenvolvida que a nossa
(…). A única realidade possível e admissível, na prática, é a
inexistência da generalidade das transações tal como se encontram
declaradas nas correspondentes faturas ou vendas a dinheiro
emitidas.” (…)” - cfr. fls. 59 a 169 do processo administrativo
em apenso aos autos;
18. As correções que estiveram na base das liquidações, ora
contestadas, de IVA referem-se aos períodos de imposto
05/05 a 05/07; 05/09 a 06/07 e 06/09, tendo a AF
apresentado como fundamentação de direito o
seguinte: “ (…) Pelo exposto nos pontos III.1.4., III.1.5 e III.1.6.
do presente relatório, conclui-se que o imposto deduzido pela
sociedade S........., com base nas faturas emitidas por, ou em nome,
das sociedades unipessoais “A………….” e “L……..”, não é
dedutível pelas duas seguintes razões; - Por um lado, porque se
considera que as compras escrituradas e declaradas pela
sociedade “S.........” com base nas facturas que lhe foram emitidas
por aquelas duas sociedades unipessoais, são operações
simuladas, pelo que de acordo com o disposto no nº 3 do art. 19º
do CIVA, não poderá deduzir-se o imposto que resulte de
operações simuladas (…) A sociedade S........., na pessoa dos seus
sócios, para além necessariamente conhecer, ou dever conhecer, as
simulações de transmissões que estiveram na génese do direito à
dedução, participou numa cadeia de fraude no IVA.
Assim, não poderá deduzir-se imposto que resulte de operação
simulada (nº 3 do art. 19º do CIVA) o IVA constante de faturas
emitidas por, ou em nome das sociedades unipessoais
“A………….” e “L………..”, foi indevidamente deduzido por
“S.........”, nos períodos e montante seguintes:

IVA Indevidamente deduzido


Exercício Mês Fornecedor IVA Período IVA
Deduzido DP indevidamente
(campo 22 deduzido
DP)
Maio A……. , Unip. 43.518,16 05/05 43.518,16
Junho A........., UNIP. 86.180,53 05/06 86.180,53
Julho A........., UNIP. 52.618,12 05/07 52.618,12
2005 Setembro A........., UNIP. 143.817,87 05/09 143.817,87
Outubro A........., UNIP. 69.911,10 05/10 69.911,10
Novembro A........., UNIP. 108.612,37 05/11 108.612,37
Dezembro A........., UNIP. 217.155,18 05/12 217.155,18
Total 721.813,33 721.813,33
Janeiro A........., UNIP. 71.464,68 06/01 71.464,68
Fevereiro A........., UNIP. 72.319,59 06/02 72.319,59
Março A........., UNIP. 162.517,53 09/03 162.517,53
2006 Abril A........., UNIP. 153.120,03 06/04 153.120,03
Maio A........., UNIP. 85.493,39 06/05 85.493,39
Junho L…… 108.255,00 06/06 128.369,64
A........., UNIP. 20.114,64
Julho L…….. 131.453,18 06/07 228.939,38
A........., UNIP. 97.486,20
Setembro A........., UNIP. 459.658,71 06/09 459.658,71
Total 1.361.882,95 1.361.882,95
Total 2.083.696,28
Global
- cfr. fls. 59 a 169 do processo administrativo em apenso aos autos;

19. Desde o início da sua atividade, a impugnante dedicou-


se ao comércio de metais ferrosos e não ferrosos, sendo que
com a crise das transações, começou a dedicar-se ao
negócio da sucata, através do qual faturava cerca de
trezentos mil euros por cada transação. O preço era
transacionado em Bolsa – cfr. depoimento da testemunha
F…………….. e de L……………………….;
20. De 2002 a 2005 a impugnante declarou ao Estado,
através das respetivas declarações periódicas Mod. 22 de
IRC os seguintes valores de vendas, que se apresentam no
seguinte quadro:

Comparação Vendas e Resultados

Exercício 2002 2003 2004 2005


Vendas 3.049.530,28 1.858.879,39 3.605.927,32 7.134.733,33
Resultado 15.294,15 42.229,14 86.183,55 215.000,56
Contabilístico
Resultado 27.023,28 59.205,37 115.165,68 286.812,66
Fiscal

21. Dados os valores transacionados pela empresa, a sócia


gerente da impugnante, D. F……………., é uma pessoa
conhecida e muito reputada junto do Banco …………. de
que é cliente. Junto desse Banco, a impugnante detinha
saldos médios muito “interessantes”, pois recebia
transferências de quantias bastante significativas, quer de
clientes nacionais, quer estrangeiros, nomeadamente,
oriundos de Espanha e Itália – cfr. depoimento da
testemunha A…………………. e de M………… e docs.
208 a 284 dos presentes autos;
22. Os seus clientes no mercado intracomunitário, são
nomeadamente, L……….., SA.( Espanha); E………….,
S.F.A, (Itália) – cfr. docs. de fls. 208 a 284 dos presentes
autos;
23. A impugnante não procedia ao armazenamento da
sucata no seu armazém, aliás, nem sequer tinha as
condições, em termos de dimensão, para poder fazê-lo.
Eram os seus fornecedores, nomeadamente, A………..
Unipessoal que avisavam a impugnante do local/armazém
onde se encontrava o material a carregar. Por sua vez, um
empregado da empresa transportadora (T…………….. -
empresa que fazia o transporte de toda a sucata comprada
pela impugnante) chegava ao local e carregava a sucata,
passava pelas instalações da impugnante, afim do
funcionário da mesma, normalmente, o R………….
(encarregado de armazém) proceder à inspeção da sucata de
forma a se certificar dos seus padrões de qualidade, após o
que o camião seguia ao destino dos clientes da impugnante.
A partir de 2005, os clientes da impugnante situavam-se,
maioritariamente, no mercado intracomunitário - cfr.
depoimento das testemunhas L…………….. e R………….
e R……………;
24. Face ao volume das cargas transportadas, que rondavam
os 10/15 milhões de euros por ano, a impugnante realizava
seguros (crédito/caução, de cerca de 500 mil euros) – cfr.
depoimento da testemunha R…………. e docs. de fls. 205 a
207 e 207 verso dos presentes autos;
25. A impugnante trabalhava apenas com a transportadora
T..............., pois não haviam muitas empresas de transporte
a trabalhar com este tipo de negócio – transporte de sucata
para o estrangeiro – cfr. depoimento da testemunha
R……………….. e docs. de fls. 136 a 223 dos presentes
autos;
26. Com a W.......... (empresa que era fornecedora da
L........), a impugnante celebrou apenas um único negócio de
compra de sucata (cerca de trezentas toneladas de sucata). O
negócio correu mal e a impugnante só não teve qualquer
prejuízo porque descontaram o (prejuízo) à empresa
A……………, Unipessoal - cfr. depoimento da testemunha
R……………….;
27. Os pagamentos a fornecedores eram, normalmente,
efetuados através de cheque e transferência bancária, sendo
que os pagamentos eram feitos a 30 dias - cfr. depoimento
da testemunha L…………….., e F………………. e docs.
de fls. 75 a 135 dos presentes autos;
28. Aquando da ação inspectiva à impugnante, não foram
analisados os fluxos financeiros, nem as contas bancárias
foram objeto de qualquer reconciliação (confronto dos
lançamentos contabilísticos com os extratos bancários) –
cfr. depoimento da testemunha F…………………….;
29. Em 23/01/2008, a impugnante deduziu reclamação
graciosa das liquidações de IVA de 2005 e 2006, a qual veio
a ser deferida parcialmente em 23/12/2008. Nesse âmbito,
das correções efetuadas pela Direção de Finanças de Aveiro,
considerou-se que deveria ser subtraída a importância de €
234.224,90, pelo que ficou a constar como total de
correções o valor de € 1.838.124,33, em substituição dos €
2.072.349,23 inicialmente apurados – cfr. fls. 266 do
processo de reclamação graciosa em apenso aos autos;
30. Em 27/01/2009, é deduzido recurso hierárquico o qual
foi considerado improcedente por despacho do Subdiretor-
geral de 27/11/2009, e que veio a ser notificado à
impugnante em 19/01/2010 – cfr. fls. 232 e segs. do
processo de recurso hierárquico em apenso aos autos;
31. Em 21/04/2010 é deduzida a presente impugnação
judicial – cfr. fls.2 e segs. dos presentes autos.

******

E mais se consignou na sentença que “... Não existem factos


relevantes para a decisão que importe destacar como não
provados...” e que a convicção do Tribunal assentou no “teor
dos documentos juntos aos autos e expressamente referidos no
probatório supra, nomeadamente:
Ø Cópias de facturas do fornecedor “ A…………………..
Unipessoal, Lda.;
Ø Listagem dos cheques emitidos a favor da referida empresa, pela
impugnante;
Ø Cópias de facturas da T............... à S.........,
Ø Guias de Remessa emitidas pela S........., às empresas
intracomunitárias;
Ø Notas de pagamento emitidas pela S......... à T............... e cópias
dos cheques respetivos;
Ø Cópia dos seguros (Crédito/Caução) figurando como segurado a
impugnante - S.........;
Ø Extratos de Conta da S......... dos bancos: M………………..;
B……………… e do B……………………….;
Ø Relatório da Ação Inspetiva.

e, no depoimento das seguintes testemunhas:

A………………… e M……………………, ambos funcionários do


B……………. Ambos reconheceram a gerente da impugnante,
M……………………….
A…………….. foi gerente de conta da impugnante. Conta bancária
que, era movimentada pela sócia-gerente, o que lhe permitiu
referir que a mesma tinha subjacente sempre avultadas quantias e
que muitas operações eram movimentadas em bolsa.
M………………., por sua vez lembra-se de Dª…………… possuir
conta no banco, receber transferências de empresa nacionais e
estrangeiras, sem se recordar contudo de nomes, dada a dilação de
tempo entretanto verificada. Refere ainda, que a mesma pessoa
fazia muitas transferências para o estrangeiro, nomeadamente,
para Espanha e Itália.
L………………, enquanto empresário estabeleceu relações
comerciais com a impugnante, comprava e vendia à mesma.
Referiu como se processavam os negócios da compra e venda de
sucata. Adiantou que todo o circuito financeiro subjacente ao
negócio da sucata passava pelos bancos. Que, ele não trabalhava
com qualquer empresa, pedindo sempre informações comerciais
sobre as mesmas, pelo que neste sentido atesta que a S......... era
uma empresa sólida, que cumpria com todas as obrigações
decorrentes dos negócios em que intervinha. Há cerca de 4 a 5
anos deixou de fazer negócios com a impugnante dado esta já não
apresentar garantias.
R………………, como empresário de transportes da empresa
“T...............”, prestava serviços à impugnante. A sua relação
advém do facto de assegurar os transportes de mercadorias da
S.......... Refere que também fazia transportes de mercadoria à
empresa W...........
F……………………, acompanhou, na qualidade de Técnico Oficial
de Contas, o processo contabilístico da impugnante. Revelou
conhecimento das transações comerciais efetuadas pela
impugnante para países comunitários, mencionando inclusive a
existência de seguros realizados pela impugnante dado o elevado
volume de sucata transportada.
R……………, fiel de armazém e também sobrinho da sócia-gerente
da impugnante, explicou o desenvolvimento da atividade da
impugnante.
Referiu que a mesma começou por operar apenas no mercado
interno, mas que face às dificuldades sentidas expandiu-se para o
mercado internacional, sendo que a partir de 2005 as vendas no
mercado intracomunitário acabaram por ser maioritárias, faturava
cerca de dez milhões entre importações e exportações.
L…………….,  inspetor tributário, teve apenas intervenção na
informação/relatório que serviu de base para instruir a
reclamação graciosa apresentada pela impugnante, referiu que
não inpeccionou a impugnante.
F………………….., inspetor tributário, foi o mentor do relatório
resultante da ação inspetiva realizada à impugnante. Relatou que
os reembolsos de IVA da impugnante foram deferidos até a AF ter
conhecimento da fraude do IVA no ramo das sucatas. Assim, após
Abril de 2005 (deferimento do 1º reembolso de IVA) a cadeia de
transmissões foi posta em causa pela AF. Disse que não conhece os
armazéns do principal fornecedor da impugnante (A……………..,
Lda.), apenas se deslocou à sede da empresa para verificar os
elementos contabilísticos. Relata a primeira reunião que teve com
os gerentes da S........., por ocasião do 1º reembolso de IVA,
alertando os mesmos para a existência de fraude no negócio das
sucatas.
Refere que as compras eram simuladas com aquelas empresas, mas
que como existiam vendas (que não foram postas em causa),
reconhece que até podem ter sido feitas compras no mercado
paralelo.
Acrescenta que, por ocasião da ação inspetiva não analisou os
fluxos financeiros da impugnante, nomeadamente as contas
bancárias.
Os depoimentos das testemunhas foram credíveis, não só pela
argumentação que se manifestou dentro de uma linha factual
homogénea traçada pelas mesmas, a qual é reforçada pela prova
documental existente nos autos.

******

IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da


alegação, o Recorrente não se conforma com o julgado na
medida em que, a seu ver, a Administração tributária
demonstrou ter encontrado através de dados concretos
carreados das várias empresas, supostas fornecedoras da
impugnante, mediante cruzamento de informação em termos
contabilísticos e declarativos dos sujeitos passivos com os
quais a Recorrida, “S.........Lda..” mantinha directa ou
indirectamente relações comerciais, conexões que permitem
concluir haver indícios sérios e seguros de operações
simuladas. Vejamos.

O que se discute nestes autos é a veracidade das facturas


encontradas na contabilidade da impugnante, se elas
correspondem ou não a transacções reais e efectivas, ou
seja, se os emitentes das facturas forneceram ou não à
impugnante os bens e/ ou serviços descritos nas facturas.

Consta do relatório que culminou a acção inspectiva, ter a


AT verificado que as facturas em que foi deduzido o IVA
nas operações internas correspondiam a operações
simuladas e, como tal, não conferiam o direito à dedução de
acordo com o disposto no art.º 19.º, n.º 3 do CIVA.
Tal é assim, na tese da AT porque a impugnante se
encontrava inserida num esquema de facturação fraudulenta,
sem qualquer correspondência a operações económicas de
transmissão de bens.

Salienta-se que a AT refere que a impugnante até podia


efectuar transacções reais, ou seja, comercializar sucata no
mercado interno e vendê-la no mercado intracomunitário,
no entanto, porque os adquirentes e seus fornecedores
pertenceriam a um esquema de fraude carrossel, o seu
direito à dedução do imposto ficaria irremediavelmente
comprometido, em consonância com o regime estabelecido
no art.º 19.º, n.º 3 do CIVA.

Ora, esta tese da AT, agora retomada pelo Recorrente nas


doutas alegações, padece de várias fragilidades, que
passamos a analisar.

Antes, porém, impõe-se fazer alguns considerandos de


ordem doutrinária.

Com interesse para o enquadramento desta questão, cabe ter


presente que o Imposto sobre o Valor Acrescentado
(I.V.A.), introduzido no sistema tributário português pelo
dec.lei 394-B/84, de 26/12, pode definir-se como um
imposto indirecto tanto de um ponto de vista jurídico (como
tal é classificado no Orçamento do Estado), como de um
ponto de vista económico, dado que recai sobre a despesa, é
repercutível (o encargo fiscal é transferível para o
consumidor final) e o respectivo facto tributário apresenta
um carácter transitório ou acidental. É um imposto geral
sobre o consumo, na medida em que incide, em princípio,
sobre todas as transmissões de bens e prestações de serviços
com características onerosas (cf. artº.1, do C.I.V.A.). O
I.V.A. caracteriza-se, igualmente, como um imposto
plurifásico porque incide sobre todas as fases do circuito
económico, desde a produção ao consumidor final, e não
cumulativo, na medida em que em cada fase do circuito
económico tributa apenas o valor acrescentado, isto é, o
acréscimo de valor que os bens ou serviços passam a ter na
fase em que se encontram, evitando, assim, o efeito
cumulativo de imposto sobre imposto. Além das
características apontadas, o I.V.A. apresenta ainda a da
neutralidade, dado que, mercê do mecanismo das deduções,
o imposto virá a ser suportado, na totalidade, pelo
consumidor final, tornando fiscalmente irrelevante o
número de fases que integrem o circuito económico. Por
último, refira-se que a liquidação do imposto é feita pelos
operadores económicos que procedem a autoliquidação e
repercutem para o cliente o imposto liquidado a montante,
devendo utilizar o método subtractivo indirecto na
determinação do valor acrescentado de acordo com o
disposto no artº.19, do C.I.V.A. (cfr. Nuno de Sá Gomes,
Manual de Direito Fiscal, I, Editora Rei dos Livros, 1996,
pág.240 e seg.; Soares Martinez, Direito Fiscal, 8ª.edição,
Livraria Almedina, 1996, pág.618 e seg.; J. L. Saldanha
Sanches, Manual de Direito Fiscal, 3ª.edição, Coimbra
Editora, 2007, pág.24 e seg. e 411 e seg.).

O acto tributário tem sempre na sua base uma situação de


facto concreta, a qual se encontra prevista abstracta e
tipicamente na lei fiscal como geradora do direito ao
imposto. Essa situação factual e concreta define-se como
facto tributário, o qual só existe desde que se verifiquem
todos os pressupostos legalmente previstos para tal. As
normas tributárias que contemplam o facto tributário são as
relativas a incidência real, as quais definem os seus
elementos objectivos (cf. Alberto Xavier, Conceito e
Natureza do Acto Tributário, pág.324; Nuno de Sá Gomes,
Manual de Direito Fiscal, II, Cadernos de Ciência e Técnica
Fiscal, 1996, pág.57; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão,
Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª.
edição, 1997, pág.269). Só com a prática do facto tributário
nasce a obrigação de imposto. A existência do facto
tributário constitui, pois, uma condição "sine qua non" da
fixação da matéria tributável e da liquidação efectuada. No
que diz respeito ao imposto sobre o valor acrescentado, o
facto tributário que lhe é fundamento consubstancia-se em
qualquer transmissão de bens ou prestação de serviços, a
título oneroso, que seja efectuada no território nacional (cf.
art.º1.º do C.I.V.A.).

Nos termos do C.I.V.A., a obrigação geral dos sujeitos


passivos disporem de contabilidade adequada ao
apuramento e fiscalização do imposto deriva do
estabelecido no artº.28, nº.1, al. g). Assim se explica que os
sujeitos que face a lei comercial e fiscal estão obrigados a
dispor de contabilidade organizada, devam observar,
igualmente, certas obrigações contabilísticas em ordem a
obter segurança e clareza no registo das operações
decorrentes da aplicação do Código do IVA e necessárias ao
cálculo do imposto, bem como para permitir o seu controlo
(cfr.artºs.44 a 52, do C.I.V.A.; António Borges e Martins
Ferrão, A Contabilidade e a Prestação de Contas, 8ª. Edição,
Editora Rei dos Livros, pág.114).

Ainda no que diz respeito ao específico regime do I.V.A.,


igualmente se dirá que o legislador se socorre de presunções
que estabelecem a prova legal para alguns factos
particulares, as quais implicam uma verdadeira inversão do
ónus da prova e se explicam pela natureza deste tributo (cf.
artº.80, do C.I.V.A.; J. L. Saldanha Sanches, A
Quantificação da Obrigação Tributária, 2ª.edição, Lex,
2000, pág.314 e seg.). Por último, atendendo mais uma vez
à especificidade do I.V.A., mais se refere que não pode a A.
Fiscal operar alterações à quantificação da base tributável
deste imposto, sem que fique demonstrado terem sido
praticadas omissões ou inexactidões no registo de compras
ou no registo de vendas do sujeito passivo em causa
(cfr.ac.S.T.A.-2ª. Secção, 26/11/97, rec.21676, Ap.Dr.,
30/3/2001, pág.3108 e seg.; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 28/10/98,
rec.20568, Ap. Dr., 21/1/2002, pág.2964 e seg.; ac.T.C.A.-
2ª.Secção, 16/3/1999, proc.280/97, Antologia de Acórdãos,
ano II, nº.2, pág.288 e seg.).

Neste particular, é sabido que, como tem sido jurisprudência


uniforme dos tribunais superiores, quando a administração
tributária desconsidera as facturas que reputa de falsas,
aplicam-se as regras do ónus da prova do artigo 74.º da Lei
Geral Tributária, competindo à administração tributária
fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais
que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem
indícios sérios de que a operação constante da factura não
corresponde à realidade.

Feita esta prova, passa a recair sobre o sujeito passivo o


ónus da prova da veracidade da transacção - cf., entre
muitos outros, os Acórdãos deste Tribunal Central
Administrativo Sul de 10/31/2019, tirado no proc.º
1729/14.1BELRA e de 07/11/2019 tirado no proc.º
1296/10.5BELRA e os Acórdãos do Tribunal Central
Administrativo Norte de 24-01-2008, processo n.º 01834/04
Viseu, de 24-01-2008, processo n.º 2887/04 Viseu, de 27-
01-2011, processo n.º 455/05.7BEPNF e de 18-03-2011,
processo n.º 456/05BEPNF.
Diga-se, ainda, que não é imperioso que a Administração
efectue uma prova directa da simulação, pois que, como em
muitos outros casos, haverá que recorrer à prova indirecta, a
“factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o
auxílio das regras de experiência comum, da ciência ou da
técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A
conclusão ou prova não se obtém directamente, mas
indirectamente, através de um juízo de relacionação normal
entre o indício e o tema de prova” ( Alberto Xavier,
Conceito e Natureza do Acto Tributário, pág. 154), o que
significa que a AT não tem que demonstrar a falsidade das
facturas, bastando-lhe evidenciar a consistência desse juízo,
invocando factos que traduzem uma probabilidade elevada
de as operações referidas nas facturas serem simuladas,
probabilidade elevada capaz de abalar a presunção legal de
veracidade das declarações dos contribuintes e dos dados
constantes da sua contabilidade - artigo 75º da LGT.

Ora, indícios são definidos por João de Castro Mendes


como aqueles factos que “permitem concluir pela
verificação ou não verificação de outros factos, em virtude
de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam
como máximas de experiência” - citado por José Luís
Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação
Tributária, 2ª edição, pág. 311, sendo que nesta tarefa,
poderá a Administração Tributária lançar mão de elementos
obtidos com recurso à fiscalização cruzada, junto de outros
contribuintes, para obter os referidos indícios, pelo que tais
indicadores de falsidade das facturas não têm
necessariamente que advir de elementos do próprio
contribuinte fiscalizado.

Nestas condições, é jurisprudência firme que quando a


Administração tributária desconsidera as facturas que reputa
de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do artigo
74.º da Lei Geral Tributária, competindo à administração
tributária fazer prova de que estão verificados os
pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja,
de que existem indícios sérios de que a operação constante
da factura não corresponde à realidade, sendo que, feita esta
prova, passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova
da veracidade da transacção.

Como se disse, a Administração Fiscal tem o ónus de


demonstrar a factualidade que a levou a desconsiderar as
facturas contabilizadas (in casu, que a levou a considerar
determinadas aquisições de sucata como simuladas),
factualidade essa que tem de ser susceptível de afastar a
presunção de veracidade das operações constantes da escrita
do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte
(atento o princípio da declaração e da veracidade da escrita
vigente em sede tributária), só, então, passando a competir
ao contribuinte o ónus de prova de que as operações se
realizaram.

Ora, tais indícios podem colher-se não só junto da escrita e


contabilidade de quem arquivou e relevou
contabilisticamente os documentos em causa, como colher-
se junto de elementos externos à mesma, sendo que, só
perante esses concretos indícios, essa elevada probabilidade,
cessa a presunção de veracidade daquela, passando a
competir ao contribuinte o ónus de provar que as operações
ali descritas efectivamente se realizaram.

Avançando para o caso concreto, e começando pela análise


da matéria relativa aos fornecedores da Recorrente não
podemos deixar de ter presente que a mesma contabilizou as
facturas emitidas pelos seus indicados fornecedores e emitiu
as respectivas declarações periódicas, o que terá feito nos
termos previstos na lei, visto que não foi apontada nenhuma
irregularidade nem a essas declarações nem a elementos
contabilísticos que as suportassem.

Nenhuma dúvida, por isso, de que a Recorrente beneficiava


da presunção da verdade a que alude o artigo 75.º, n.º 1, da
Lei Geral Tributária, quanto aos elementos inseridos nessas
declarações.

Daí que coubesse à administração tributária, no âmbito da


sua actividade fiscalizadora averiguar da sua conformidade
com a verdade fiscal do sujeito passivo e, sendo caso disso,
reunir os indicadores que, apesar do cumprimento formal
dos seus deveres declarativos e de escrituração, e da
aparência de colaboração com a administração fiscal que
dele decorre, não teria o direito à dedução arrogado nesses
documentos.

O que a administração tributária pretendeu fazer


precisamente através da acção inspectiva apontada nos
autos, mas sem sucesso no entendimento da sentença
recorrida.

Com referência à situação agora enunciada nos autos,


importa ter presente o exposto no Ac. deste TCA Sul de 24-
04-2012, Proc. nº 05523/12, www.dgsi.pt, onde se ponderou
que: “… A fuga e fraude fiscais são hoje um fenómeno de
contornos cada vez mais sofisticados, sendo comuns os
casos de facturas falsas, de não entrega dos montantes
liquidados a terceiros ou da “fraude carrossel” do I.V.A.
Para além do seu impacto orçamental, a fraude em matéria
de I.V.A. cria distorções da concorrência que favorecem os
operadores desonestos.
Como é sabido, de acordo com o sistema de I.V.A. nas
transacções intracomunitárias instituído em 1993, as
mercadorias circulam isentas de imposto, tendo o sujeito
passivo direito à dedução do imposto suportado a montante
(transmissões intracomunitárias de bens com isenção que
confere direito à dedução do imposto suportado), o que dá
azo à utilização abusiva deste regime.
Em termos gerais, a “fraude carrossel” implica a existência
de várias empresas que, supostamente, realizam transacções
entre si, sendo que uma delas, por praticar transmissões
intracomunitárias de bens, não liquida I.V.A. nos termos do
R.I.T.I. (Regime do I.V.A. nas Transacções
Intracomunitárias). No entanto, deduz o I.V.A. suportado
nas supostas aquisições de bens, o que origina assim,
ilegitimamente, uma permanente situação de crédito de
imposto perante o Estado. Temos assim que o elemento
fundamental da “fraude carrossel” consiste no
aproveitamento da associação de operações em que o I.V.A.
é cobrado pelo fornecedor ao seu cliente (geralmente no
âmbito de operações dentro de um Estado-Membro) e de
operações sem cobrança do I.V.A. entre os contratantes
(geralmente no âmbito de operações intracomunitárias).
Esta associação, que é inerente ao regime actual, permite a
um sujeito passivo a aquisição de bens sem pré-
financiamento do I.V.A. e a facturação, em seguida, do
I.V.A. ao abrigo de uma entrega interna destes bens. Sucede
que tal sujeito passivo desaparece (missing trader ou
operador desaparecido) e não paga esse I.V.A. à
administração fiscal, enquanto que o comprador dos bens
exerce o seu direito à dedução. Ou seja, não só não se paga
como se tenta recuperar impostos que nunca foram pagos,
através de reembolsos.
Concluindo, a denominada “fraude carrossel” tem como
consequência, para o Estado defraudado, uma dedução de
imposto que não é financeiramente suportada por uma
prévia entrega de imposto liquidado (cfr. Clotilde Celorico
Palma, IVA - A nova Directiva e o Regulamento para o
combate à fraude nas transacções intracomunitárias, Revista
TOC, nº.107, Fevereiro de 2009, pág.38 e seg.) …” (fim de
cit.).

Pois bem, neste domínio, e com referência à decisão de 12-


01-2006 do Tribunal de Justiça da União
Europeia (acórdão de 12-01-2006, nos processos apensos
C-354, C-355 e C-484/03, disponível in http:
//curia.europa.eu/), citado no Ac. do TCA Norte de
05/18/2017 tirado no proc.º 00377/04.9BEPRT, que o
relator deste subscreveu na qualidade de 1.º Adjunto e cuja
linha expositiva temos vindo a acompanhar, surpreende-se
no seu discurso a análise conjunta dos conceitos de sujeito
passivo e de actividades económicas, situação que permite
determinar “a extensão do âmbito de aplicação abrangido
pelo conceito de actividades económicas e o seu carácter
objectivo, no sentido de que a actividade é considerada em
si mesma, independentemente dos seus objectivos e dos
seus resultados”, o que significa que tais conceitos se
aplicam de forma autónoma em relação aos objectivos e
resultados visados pelas operações em causa.

Na sua linha de análise resulta ainda que não faria qualquer


sentido, muito menos no âmbito de um imposto como o
IVA, cuja pedra de toque é a neutralidade garantida pelo
direito à dedução, que a Administração Fiscal atendesse à
intenção de um sujeito, diferente do sujeito passivo que
intervenha na cadeia de transmissões com intuito
fraudulento, quando esse sujeito passivo não tinha nem
podia ter conhecimento do esquema fraudulento.

Assim sendo, aquilo que importa analisar é a operação em


que o sujeito passivo que procura exercer o direito à
dedução está envolvido, e não as operações feitas a jusante
ou a montante por outros sujeitos, ou seja, a análise de cada
uma das operações deve ser feita casuisticamente.

Nesta sequência, sem perder de vista que no esquema da


fraude carrossel há intervenientes que actuam com o único
propósito de lesar o Estado, deixando de entregar o IVA
liquidado, o Tribunal de Justiça aponta que as vicissitudes
de uma delas não afectam as outras a jusante ou a montante.

Em suma, de acordo com a leitura do Tribunal de Justiça, a


substância económica da operação em causa deve ser
analisada à luz de critérios objectivos, mas a posição do
sujeito passivo na cadeia de transmissões deve ser
subjectivamente esmiuçada, procurando averiguar qual a
sua real atitude perante a fraude em curso, penalizando quer
a intenção quer a negligência. Daí que a tese de análise da
cadeia de fraude em carrossel como um todo caia por terra,
porque se assim fosse nem era preciso saber qual a posição
do sujeito passivo em concreto; bastava que objectivamente
a fraude existisse para se negar o direito à dedução por parte
daquele sujeito, mesmo que subjectivamente nada tivesse a
ver com a fraude.

Descendo aos autos, vejamos o que a sentença ponderou


para concluir pela falta de indícios sérios e seguros de que
as facturas contabilizadas pela impugnante e relativamente
às quais ela exerceu o direito à dedução do IVA nelas
mencionado não correspondem a reais e efectivas operações
económicas, cumprindo salientar que o Recorrente não
impugnou a decisão de facto, ou pelo menos não o fez
eficazmente, com observância do ónus imposto no então n.º
1 do art.º 685.º-B, do CPC/61:

«No caso concreto, afigura-se-me que a AF não recolheu elementos


suficientemente fortes que demonstrem que as sociedades
transmitentes dos bens não dispunham de uma “adequada estrutura
empresarial susceptível de exercer a atividade declarada”, nos
moldes que vimos referindo.
É certo que é dado conta que, a L........ não dispunha de instalações
que permitissem o acondicionamento da quantidade de sucata que
era transacionada, mas a impugnante também não detinha armazéns
que permitissem guardar a sucata que era transacionada. Com isso
pode concluir-se que não dispunha de “adequada estrutura
comercial”?
Não curou a AF de perceber como funcionava na realidade no
negócio da sucata e como operavam as empresas entre si, no caso
concreto.
Impõe-se a questão, eram necessárias instalações para acondicionar
a sucata adquirida?
Havia uma ligação comercial entre a impugnante e as empresas
ditas de “fim de linha”?
O relatório inspectivo refere apenas que “, cada fase, utiliza a fase
imediatamente anterior, o que indica o conhecimento do esquema
sem que contudo, implique, obrigatoriamente, que quem está na
fase final, conheça quem foi utilizado em primeiro (onde “nasceu”
o documento), bastando-lhe para tal conhecer o
intermediário/emitente anterior. Todavia, quem utiliza os
documentos numa fase posterior, sabe perfeitamente que o seu
emitente anterior, ou o que lhe emitiu a ele, não tem capacidade
conforme ficou comprovado pelas averiguações efectuadas, para
realizar os negócios subjacentes às facturas/vendas a dinheiro que
recebe.”
Face a esta afirmação, ocorre-nos desde logo questionar, em que
factos a AF se funda para concluir que, “quem utiliza os
documentos numa fase posterior sabe perfeitamente que o seu
emitente anterior, ou o que lhe emitiu a ele, não tem capacidade”?
Note-se, a AF não procurou averiguar dos fluxos financeiros dessas
empresas bem como dos da impugnante.
Acresce que, nem sequer foram realizadas quaisquer averiguações
quanto aos possíveis armazéns do principal fornecedor da
impugnante a, “A………….. Unipessoal”.
A AF não recolheu quaisquer elementos no sentido de demonstrar
que a sociedade transmitente dos bens não dispunha de uma
“adequada estrutura empresarial susceptível de exercer a atividade
declarada”. Antes, do relatório de inspeção junto aos autos resulta
exatamente o contrário:
A sociedade, A………….Unipessoal, Lda., tem instalações,
camiões de transporte, armazéns e trabalhadores próprios [que são
utilizados pela impugnante], tem clientes (pelo menos a
impugnante), labora e tem receitas próprias.
Quanto à L........, ficou demonstrado nos autos, era mera
intermediária e não necessitava de instalações físicas para
desempenhar esse papel, na intermediação e colocação no mercado
da sucata para outras empresas.

Impõe-se assim, aferir se, por si só os indícios apontados pela AT


na atividade da fornecedora da Impugnante contêm força capaz de
suportar a sua atuação no sentido da desconsideração das operações
e consequentemente do IVA contido nas facturas de compra de
mercadoria pela S......... à L........ e à A…………, Unipessoal,
afastando a presunção de veracidade que lhe assistia quanto aos
elementos declarados13, pela Impugnante
A impugnante a este propósito, demonstra que:
 Que movimentava sucata dos seus fornecedores (principalmente
da A………. Unipessoal) para o mercado intracomunitário;
 Que tinha despesas de transporte desses bens;
 Que efetuava seguros com o transporte de bens;
 Que transacionava elevados valores na bolsa de valores (referente
aos produtos (metais não ferrosos) relacionados com a sucata).
Não fosse a insuficiente atividade investigatória na fase inspetiva,
nomeadamente quanto à evidenciação dos fluxos financeiros entre
as empresas; investigação adequada sobre o transporte dos produtos
transacionados; e todas as atividades conexas relacionadas com a
compra e venda de sucata, e a AF poderia estar na posse de indícios
sérios e seguros sobre a materialidade das operações da
impugnante.
Assim, a resposta só pode ser uma, nada ficou demonstrado por
parte da inspecção tributária quanto à “imaterialidade” das
operações realizadas e, pelo contrário, a Impugnante apresentou-se
a rebater as conclusões da AF quanto à materialidade das suas
operações com prova testemunhal, apresentando não só
funcionários da empresa (empregado de armazém) como o
motorista da T............... (empresa de transporte de sucata) entre
outras.
Por seu lado, da parte da Fazenda Pública, o próprio Inspector
Tributário responsável pela discutida ação inspectiva, veio a
assumir que a contabilidade da Impugnante se encontrava
regularmente organizada e que os pagamentos eram feitos por meio
de cheque, reconhecendo que não verificou, à data da inspeção, os
mesmos, nem fez qualquer reconciliação bancária.
Para além disso, admitiu ter realizado inspeção cruzada, sem ter
inspecionado os armazéns nem recolhido os elementos de
funcionamento real das empresas com quem a impugnante se
relacionava.
Do exposto, forçoso se torna concluir, que a AT não carreou para os
autos factos suficientes e ponderosos que indiciassem com elevado
grau de probabilidade que as compras efetuadas às empresas
A……………Unipessoal e L........, nos exercícios de 2005 e 2006
não titulassem efetivas operações.
Na verdade os indícios apontados às irregularidades da atividade
das sociedades fornecedoras da Impugnante não são
suficientemente indiciadores da falsidade das facturas aqui em
conflito e, consequentemente, não têm força para, só por si, abalar a
presunção da veracidade dos elementos da escrita da impugnante,
até porque desses indícios não resulta que toda a actividade das
empresas fornecedoras da impugnante, seja falsa, o que resulta é
que apenas a L........ não demonstrou deter, à data, estrutura
empresarial para suportar o volume de negócios e o tipo de sucata
que diz ter vendido, contudo tal como ficou demonstrando em
audiência, como intermediária não necessitava de possuir armazéns
para armazenar a sucata que diz ter vendido.
Afigura-se-me, pois que a AF não invoca factos que traduzem uma
probabilidade elevada de as operações referidas nas facturas serem
simuladas, probabilidade elevada capaz de abalar a presunção legal
de veracidade das declarações da impugnante e dos dados
constantes da sua contabilidade – artigo 75.º da LGT.
Entendemos, assim, a AT não logrou demonstrar, como lhe
competia, os pressupostos da sua atuação, havendo um manifesto
défice investigatório, o que acarreta a ilegalidade das liquidações
adicionais de IVA de 2005 e 2006, pelo que terão de ser anuladas.»

Na verdade, não se detecta qualquer elemento que


estabeleça a necessária conexão entre a cadeia de
fornecedores mencionada a montante e a impugnante ora
Recorrida, o que significa que o RIT não evidencia quais os
elementos concretos que permitem concluir pelo
envolvimento da impugnante no circuito da fraude,
designadamente que elementos probatórios foram
recolhidos no âmbito da acção inspectiva, elementos esses
que assim seriam do conhecimento da ora Recorrente, de
modo a poder ter-se por preenchida a condição de exclusão
do direito à dedução consagrada no n.º4 do art.º 19.º do
CIVA (na redacção introduzida pelo art.º 47/2 da Lei n.º 55-
B/2004, de 20 de Dezembro), segundo o qual, “os sujeitos
passivos não podem deduzir o IVA que resulte de operações
em que o transmitente dos bens ou prestador dos serviços
não entregar nos cofres do Estado o imposto liquidado
quando tenham ou devessem ter conhecimento de que o
transmitente dos bens ou prestador dos serviços não dispõe
de adequada estrutura empresarial susceptível de exercer a
actividade declarada”.

Isto permite evidenciar, como salientado na sentença


recorrida, que o RIT carecia de maior trabalho ao nível da
análise da relação estabelecida entre a ora Recorrida e as
empresas fornecedoras no sentido de se estabelecer de
forma clara os contornos da mesma no sentido de afirmar a
ideia de que a Recorrida tinha conhecimento do esquema
fraudulento, sendo que tais indícios não podem apreender-se
partindo unicamente da análise estabelecida a montante por
esses fornecedores com outros sujeitos.

Assim, não existindo matéria capaz de envolver a Recorrida


no descrito esquema, não existe matéria capaz de abalar a
presunção de veracidade que, como vimos, envolve as
operações descritas nos autos, atentos os reconhecidamente
imaculados documentos de suporte, pelo que inexistem
motivos capazes de suportar a posição da AT, aqui
laboriosamente sustentada pelo Recorrente, no sentido de
não aceitar a dedução do IVA mencionado nas facturas em
causa nos autos.

O mesmo é dizer que a AT não cumpriu o ónus que sobre si


impendia no sentido de fundamentar as correcções da
matéria tributável que originaram as liquidações
impugnadas, as quais estão, assim, feridas de ilegalidade,
como bem o entendeu a sentença recorrida, que é de manter
na ordem jurídica, negando-se provimento ao recurso.
Por último e como se sabe, nas causas de valor superior a €
275.000,00 a regra continua a ser o pagamento integral da
taxa de justiça resultante da aplicação dos critérios legais,
assumindo natureza excepcional a dispensa, pelo juiz, de
pagamento do remanescente da taxa de justiça ao abrigo do
disposto no artigo 6.º, n.º 7, do Regulamento das Custas
Processuais.

Tal dispensa só deverá ocorrer em situações de manifesto


desequilíbrio entre o montante a pagar e a actividade
desenvolvida pelo tribunal, o que se entende verificar.

Como tal, ponderando, por um lado, a complexidade da


matéria factual e jurídica e por outro, o elevado valor do
processo, que é de 1.717.700,72 Euros, justifica-se a
dispensa de pagamento de 75% do remanescente de taxa de
justiça.

V – DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da 2.


ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal
Central Administrativo Sul em negar provimento ao
recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas a cargo do Recorrente, com dispensa de pagamento


do remanescente da taxa de justiça em 75%.

Lisboa, 05 de Março de 2020

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Vital Lopes

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Luísa Soares

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Mário Rebelo

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