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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO PARÁ

CENTRO DE CIÊNCIAS NATURAIS E TECNOLOGIAS


CURSO DE BACHARELADO EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS

JEOVANA DOS REIS CORRÊA

ATIVIDADE DA DISCIPLINA DIREITO INTERNACIONAL : RESENHA


CRÍTICA

PROFESSOR: HUMBERTO ALMEIDA

BÉLEM-PA

2021
ELIAS, Fernando Lopes Ferraz. ​AS RELAÇÕES INTERNACIONAIS E O DIREITO
DIANTE DE UMA DISCIPLINA CONJUNTA, A PARTIR DOS MECANISMOS DE
INDUÇÃO AO CUMPRIMENTO DAS NORMAS INTERNACIONAIS. Revista da
Faculdade de Direito UFPR, v. 60, n. 3, p. 311-338, 2015​.

Fernando Lopez Ferras Elias é graduado em Direito e em Relações Internacionais pela


Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, tendo se formado em 1998. Além disso, possui
mestrado em Relações Internacionais pela Universidade do Sul de Santa Catarina (2002) e é
Doutor em Direito pelo Centro Universitário de Brasília (2017). Com experiência docente e
de gestão acadêmica desde 1999, a produção científica de Fernando Elias é voltada para as
áreas de Direito e Relações Internacionais, com ênfase em Direito Internacional.
O autor possui diversas produções bibliográficas e, entre estas, está o artigo “As
Relações Internacionais e o Direito diante de uma disciplina conjunta a partir dos mecanismos
de indução ao cumprimento das normas internacionais”. O artigo foi publicado em 2015 pela
Revista da Faculdade de Direito da UFPR, cuja linha editorial possui o intuito de aprofundar a
cultura jurídica brasileira, prestigiando a aproximação do direito com outras áreas do
conhecimento. Possivelmente, este pode ter sido um dos fatores para o artigo de Fernando ser
publicado na revista, visto que aproxima Direito e Relações Internacionais.
Podendo ser encontrado facilmente e de forma gratuita na Revista de Direito que está
na Biblioteca Digital da UFPR, o artigo, em suas 29 páginas, tem por finalidade fazer uma
avaliação sobre a possibilidade de construir uma disciplina conjunta entre o Direito e as
Relações Internacionais. Para trazer essa abordagem, o autor divide o artigo apresentando, a
princípio, os dilemas e os desafios de uma possível união interdisciplinar. Após isso, busca
considerar as possibilidades e perspectivas do diálogo entre as áreas e, por fim, investiga o
método aplicado ao estudo do Direito e das Relações Internacionais.
Ao iniciar o artigo, o autor apresenta a conexão entre direito e Relações Internacionais,
apontando que são disciplinas separadas pelos mesmos assuntos. Ao evidenciar os pontos de
divergência que distinguem as disciplinas, ele afirma que pensar ambas as áreas
conjuntamente é uma tarefa difícil. Assim, o autor afirma que considera um caminho
interessante pensar a teoria do direito que combina trabalhos práticos atrelada à revisão da
teoria das relações internacionais.
Posteriormente, ao discorrer sobre os dilemas e desafios para a construção de uma
disciplina conjunta, é exposto que há muitas lacunas entre o direito e relações internacionais,
e que apesar das várias reivindicações feitas, poucas evidências sistêmicas foram obtidas
(IRISH; KU; DIEHL, 2013, p. 359-360). O maior obstáculo seria, então, o fato de que a
tentativa de mapear um campo pode ser tanto excludente quanto objetiva. (SLAUGHTER;
TULUMELLO; WOOD, 1998, p. 369).
Acadêmicos de Relações Internacionais e Direito Internacional, apesar de terem
interesses paralelos, são separados nas pesquisas. Isso é explicado na nota de rodapé em que o
autor esclarece que, enquanto os cientistas políticos nas Relações Internacionais estão focados
em questões envolvendo o poder no mundo e como os Estados cooperam sobre os problemas
coletivos, o direito internacional se insere apenas como uma das muitas forças atuantes.
Embora o estudo dos fenômenos sejam semelhantes, os problemas de pesquisa, métodos e
resultados são distintos. Isso se torna um empecilho, visto que os campos percorrem objetivos
diferentes e falam para públicos distintos (HAFNER-BURTON; VICTOR; LUPU, 2012, p.
48).
Em seguida, o autor declara que um ponto negativo da busca por conhecimentos
interdisciplinares em grande parte da academia, é a questão de frequentemente serem adotadas
definições reducionistas da outra disciplina, já que o acadêmico não está inserido e não
participa ativamente dos debates.
Assim, é salientado que geralmente o conhecimento de um estudioso de disciplina
diferente sobre uma outra área costuma ser raso e unidimensional. Posto isso, os apelos para o
esforço interdisciplinar entre o direito internacional e as Relações Internacionais, pode se
configurar como um risco para reproduzir ou fortalecer configurações de poder das relações
internacionais. (KLABBERS, 2005, p. 35-38).
Por outro lado, o autor ressalta que muitos acadêmicos de direito internacional não só
reconhecem as determinantes sociais na conduta do Estado, como enfatizam o papel da lei de
cumprir os ideais normativos da “ordem mundial”, Entretanto, estes têm dificuldade de
integrar abordagens descritivas e normativas. Dessa maneira, a crítica recai sobre a questão de
os juristas possuírem como dever uma melhor compreensão da teoria social e dos princípios
políticos para que não fiquem presos na irrelevância, na indefinição teórica, entre outros.
(KOSKENNIEMI, 2005, p. 1, 4).
É aludido ainda, que o problema está em saber se a doutrina do direito internacional
está preparada para transformar-se e se tornar mais relevante para as relações internacionais.
Outro aspecto também exposto no artigo, diz que os advogados são convidados a analisarem
as relações internacionais, enquanto os acadêmicos das relações internacionais se recusam,
muitas vezes, a investigarem profundamente o pensamento jurídico internacional
(KLABBERS, 2005, p. 44). Portanto, não há parceria e sim a hegemonia por parte dos
acadêmicos de relações internacionais; os termos de troca da relação não são simétricos.
Nessa perspectiva, o autor aponta que um eficaz diálogo entre direito internacional e
as relações internacionais só ocorrerá se os acadêmicos de direito internacional continuarem a
apresentar argumentos convincentes sobre o poder do direito internacional na formação da
conduta dos Estados. Logo, há uma necessidade de mostrar que existe uma classe de normas
chamada direito internacional e que, por razões particulares, ela possui a capacidade de
influenciar o comportamento dos atores internacionais (BRUNNÉE; TOOPE, 2000, p. 24).
Portanto, os acadêmicos do direito internacional carecem de uma teoria satisfatória sobre por
que e quando os Estados respeitam o direito internacional.
Em seguida, é indicado no artigo que embora as principais teorias das relações
internacionais expliquem sobre o comportamento do Estado em um momento e regime
jurídico internacional específicos, nenhuma delas é capaz de fornecer um quadro global para o
entendimento do Estado em relação aos regimes jurídicos internacionais. O fato do grande
debate sobre o direito internacional ser polarizado e improdutivo pode se dar ao fato de as
preocupações sobre a validade do campo de pesquisa de RI ainda não terem sido respondidas
(HATHAWAY, 2005, p. 471).
O autor declara que é uma questão atormentadora o desafio de demonstrar que as
instituições internacionais afetam diretamente o comportamento do Estado. Porém, afirma que
ainda é pequeno o número dos estudos para sistematização da questão. Além disso, os
aspectos conceituais, metodológicos e teóricos continuam marcando o tema e dificultam
conclusões consistentes.
Na segunda parte do capítulo, o autor busca apresentar as possibilidades e perspectivas
na busca de um diálogo interdisciplinar. Assim, é revelado o interesse dos acadêmicos de
direito internacional na construção de uma teoria unificada, sob influência dos acadêmicos de
relações internacionais. Enquanto os de direito estão voltados para a teorias das relações
internacionais melhor explicarem modelos de evolução das normas e seu cumprimento, os
acadêmicos de Relações Internacionais voltam-se para os modelos normativos, objetivando
compreender os comportamentos observados (ALKOBY, 2008, p. 154).
Apesar de dizer que uma disciplina comum ainda não existe e pode nunca existir, o
autor indica que há notáveis progressos interdisciplinares. Isso ocorre a partir da combinação
de metodologias para lidar com questões consideradas complexas e com diversos estudiosos
que são treinados em ambas as disciplinas (ABBOTT, 2005, p. 9-10). Dessa maneira, os
acadêmicos de ambas as disciplinas têm muito a ganhar com o desenvolvimento de uma
agenda de pesquisa colaborativa para gerar novas ideias teóricas e práticas.
Ao apontar as motivações, o artigo destaca que há a necessidade de criar um exame
crítico da influência de uma disciplina sobre a outra e também que o estudo interdisciplinar do
direito internacional e das relações internacionais serve para revisar a historiografia e criticar
a dicotomia entre ambas as disciplinas.
Ademais, é sinalizado que a disciplina de ciência política desenvolveu um proativo
programa de pesquisa sobre o desenvolvimento, funcionamento, disseminação e impacto das
normas jurídicas, dos acordos e das instituições no plano internacional. Enquanto isso, um
número crescente de acadêmicos do direito internacional desenvolveu um interesse pela
pesquisa e pelos métodos da ciência política. Por mais de duas décadas, ambos vêm
colaborando e compartilhando ideias (HAFNER-BURTON; VICTOR; LUPU, 2012, p.
47-48).
Ao abordar as semelhanças entre o direito internacional e as Relações Internacionais, o
artigo evidencia que ambas descrevem os mesmos fenômenos: práticas estatais e estruturas
formais de instituições e regras internacionais, mesmo que isso não seja um fim em si mesmo
(ABBOTT, 1992, p. 168). Além disso, ambas dividem os mesmos interesses centrais: a paz e
a cooperação internacionais.
Devido ao que foi exposto, o autor argumenta que as relações internacionais não
podem mais se limitar aos estudos racionalistas dos regimes, e tampouco o direito
internacional às análises jurídicas positivistas da doutrina e da prática estatal (BECK, 1995, p.
120-122). Com isso, as disciplinas têm muito a contribuir com a outra já que, por um lado, o
direito internacional oferece grande quantidade de informações sobre as regras e as
instituições jurídicas, matéria-prima para o desenvolvimento e aplicação da teoria. Por outro,
as relações internacionais possibilitam uma fuga do estreito positivismo (ABBOTT, 1989, p.
340).
Dentro desse contexto, afirma-se que a fusão interdisciplinar das relações
internacionais com o direito internacional fornece a base para o desenvolvimento mais forte e
eficaz das instituições internacionais. Isso porque, com os cientistas políticos mais dedicados
aos assuntos internacionais, estes podem contribuir para o estudo da lei internacional e, por
sua vez, o conteúdo e o processo do direito internacional podem melhorar as ambições de
pesquisa dos especialistas em relações internacionais (JOYNER, 1987, p. 386). Logo, o artigo
salienta que os benefícios da pesquisa interdisciplinar podem ser, simultaneamente, teóricos e
práticos (ACEVES, 1997, p. 266).
Seguindo para a terceira parte do artigo, o autor procura discorrer sobre o método
aplicado ao estudo do direito e das relações internacionais. Nesse sentido, é indicado que há
uma divisão metodológica separando direito e política. O objetivo dos acadêmicos de direito
internacional não é explicar o comportamento dos Estados, mas sim de determinar quais
regras possuem o status de direito.
Assim, os estudiosos dos dois campos são separados por suas metodologias. Enquanto
os cientistas políticos estão comprometidos com um programa de pesquisa empírico sobre o
comportamento real dos Estados, os acadêmicos do direito internacional estão envolvidos em
um projeto normativo para demonstrar a existência de regras no plano internacional. Portanto,
ambos podem ser enriquecidos para identificar as regras que facilitem e incentivem
comportamentos estatais na seara global (KRASNER, 2000, p. 98-99).
Como uma grande parte das discussões teóricas do direito internacional reflete a
assimetria do sistema jurídico internacional, a tendência mais idealista do sistema
internacional é voltada a esclarecer e explicar o papel e o comportamento dos Estados na
esfera internacional. Logo, a crítica está na questão de que é necessário que as teorias do
direito internacional sejam submetidas à análise empírica por meio de ferramentas
metodológicas das ciências sociais, para que haja compreensão do relacionamento entre as
regras internacionais e os comportamentos estatais.
Inserido nessa discussão, o autor conclui que uma barreira que muitas vezes impede
novas abordagens para o estudo do problema do cumprimento das normas internacionais é de
ordem metodológica: juristas internacionalistas e teóricos das relações internacionais
frequentemente lidam com o mesmo assunto, mas raramente se esforçam para usar as teorias e
metodologias do outro (TAUBMAN, 2004, p. 222).
Ao relacionar direito e política mais adiante, o autor aponta no artigo que há uma
falácia em opor direito e política. Isso porque a política está presente tanto no processo de
criação do direito, quanto na sua utilização; a referência à lei é um dos elementos da política.
Assim, o relacionamento entre o direito, a economia e a política é notoriamente complexo.
Não deve-se sugerir a existência de uma relação causal entre os três, pois isto significa
rebaixar o direito a um mero produto das forças econômicas e políticas ou criar expectativas
exageradas sobre o direito como instrumento de mudança econômica e política.
Logo após expor alguns dilemas entre o direito e o Estado posto por outros autores, o
artigo declara que não há e nunca haverá uma teoria do direito e das relações internacionais
que consiga explicar completamente a conduta dos Estados, prevendo ações estatais
específicas em circunstâncias concretas em circunstâncias concretas.
houve poucos esforços para utilizar métodos experimentais no estudo do direito
internacional). Atualmente, as mais relevantes teorias sobre o comprometimento no direito
internacional não vêm do conhecimento jurídico, mas da academia das relações internacionais
Desse modo, o autor afirma que a essência do trabalho interdisciplinar é entender o
outro a partir do interior da sua disciplina. Assim, o direito e a política estão interligados no
mundo, e este mundo precisa ser imaginado antes de construído. Isso porque os acadêmicos
do direito internacional devem trabalhar, em conjunto com os cientistas políticos, problemas
de interesse comum, utilizando diferentes concepções de como o sistema internacional opera,
para gerar ideias e argumentos sobre questões substantivas específicas, projetando melhores
instituições e questionando seus próprios pressupostos sobre o que o direito internacional na
verdade é e como ele funciona. (SLAUGHTER, 2000, p. 233, 235)
Pode-se afirmar que, nessa perspectiva, as relações internacionais são de grande valor
para o amplo papel social dos acadêmicos do direito internacional como construtores de
políticas, ou ainda, como arquitetos da governança global.
O estudo do artigo conclui, portanto, que busca-se uma agenda de pesquisa
colaborativa entre Relações Internacionais e Direito. Logo, não se propõe a criação de uma
disciplina comum entre ambas, e também não há a ilusão de que um dia haverá uma teoria
geral do direito internacional e das Relações Internacionais. Ressalta-se, ainda, a necessidade
de elaborar um vocabulário único para facilitar o compartilhamento de ideias e informações.
Todos esses apontamentos são importantes, segundo o autor, para reforçar a qualidade
do papel social dos estudiosos do direito e das relações internacionais como construtores de
políticas públicas. Isso só será alcançado, como sinaliza o autor, se os acadêmicos estiverem
despidos de uma clara compreensão do fenômeno jurídico do cumprimento do direito
internacional.
Portanto, constata-se que os obstáculos epistemológicos e metodológicos impedem
uma integração completa entre o Direito e as Relações Internacionais.
O artigo “​As Relações Internacionais e o direito diante de uma disciplina conjunta, a
partir dos mecanismos de indução ao cumprimento das normas internacionais” discute a
questão da interdisciplinaridade entre as disciplinas de forma não tão objetiva. Utilizando o
método de análise bibliográfica de pesquisa, o autor é bem embasado ao fazer diversas
referências ao longo do artigo.
Embora a leitura do artigo não seja muito fluida, já que o autor não se mostra objetivo,
é possível obter diversos apontamentos interessantes expostos por ele, principalmente no que
diz respeito à dificuldade em integrar as duas disciplinas. Isso fica bem claro durante a leitura,
pois o autor se torna repetitivo ao retomar essa questão ao longo de sua escrita.
Desse modo, o autor cumpre com seu propósito de apresentar seus conhecimentos a
respeito da conexão entre direito internacional e Relações Internacionais. Ao longo do artigo,
as três divisões feitas, sendo estas: os dilemas e desafios para a construção de uma disciplina
conjunta, as possibilidades e perspectivas na busca de um diálogo interdisciplinar e o método
aplicado ao estudo do direito e das relações internacionais, contribuem para a boa organização
e apresentação das ideias do autor.
Por fim, o artigo, por ser tratar de um assunto específico, pode ser indicado para
acadêmicos de Relações Internacionais e de Direito.

Jeovana dos Reis Corrêa​, acadêmica da Disciplina Direito Internacional do Curso de


Bacharelado em Relações Internacionais da Universidade do Estado do Pará (UEPA)

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