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As Eruditas (Molière)- adaptação Rosana de Paulo

Personagens:
Crisaldo- o bom burguês
Filomena- mulher do Crisaldo
Armanda- filha do casal
Henriqueta- filha do casal
Aristides- irmão de Crisaldo
Belisa- irmã de Crisaldo
Cristóvão- pretendente de Henriqueta
Tremembó- pretendente de Henriqueta
Vadio- velho sábio
Martina- cozinheira
Coelho- criado
Juliano- criado de Vadio
Escrivão

Tudo acontece em Paris, na casa de Crisaldo. Entram Armanda e


Henriqueta.

Amanda: Como, minha irmã? Mas que besteira! Você pretende abrir mão
do nome de solteira? Para se casar? Que coisa mais vulgar!

Henriqueta: É.

Armanda: É? Só esse “É” chega? Basta só esse “É”?

Henriqueta: Por que esse ódio ao casamento?

Armanda: Um horror!

Henriqueta: Como?

Armanda: Eu disse horror! Você não sente um arrepio de horror ao


pronunciar essa palavra repugnante?

Henriqueta: Arrepio sim, mas não de horror!

Armanda: A mim, a palavra casamento só me traz visões imundas.

Henriqueta: Para mim, a palavra lembra apenas marido, casa, filhos:


existe nisso algo de assustar?

Armanda: Mas uma mulher precisa se realizar.

Henriqueta: E tem realização maior, pra alguém de minha idade do que


amar e ser amada?

Armanda: Teu sonho é mudar fraldas, idolatrar um macho e lhe servir de


capacho? A filosofia nos eleva a alma. Deveria se casar com a filosofia.

Henriqueta: Você, a luz cultural. Eu, a simples matéria.


Armanda:É o lado melhor que a gente deve imitar numa pessoa, nunca a
maneira como ela cospe, tosse ou assua.

Henriqueta: Ninguém vem à luz do dia por conceitos de filosofia.

Armanda: Discutir com você é tempo perdido. Mas pelo menos me diz
quem você está cercando? Não me diga que é Cristóvão?

Henriqueta: E por que não? Por acaso, ele é aleijado? Tem cabeça grande,
pé chato?

Armanda: Não! É bonito, elegante, muito bem educado. Mas Cristóvão


suspira por mim.

Henriqueta: Bem, Cristóvão não te interessa, que te interessa então que


eu me interesse?

Armanda: Não quero pra marido o teu belo senhor. Mas acho-o
indispensável como meu seguidor.

Henriqueta: Só consegui Cristóvão porque você não o quis. É por mim que
ele delira.

Entra Cristóvão (por uma porta).

Henriqueta: Cristóvão vem aí. Vou perguntar a ele o que é que ele pensa.

Aproximam-se de Cristóvão.

Henriqueta: Por favor, Cristóvão, esclarece esta dúvida. Qual de nós duas
tem direito a pretender tua estima?

Armanda: O que é isso? Não é bom forçar nada.

Cristóvão: Eu não tenho o menor constrangimento em confessar. O laço de


amor que me tem amarrado está deste lado. (apontando Henriqueta)

Armanda: Não entendo.

Cristóvão: Quem foi ao vento, perdeu o assento.

Armanda: E quem lhe disse que estou interessada no ar ou no lugar?

Henriqueta: Calma, minha irmã. Onde está a moral que domina tão bem
nossa parte animal?

Armanda: Melhor seria escutar o conselho dos que te deram a vida.

Henriqueta: Vou seguir o seu conselho. Cristóvão, vá imediatamente pedir


o consentimento de quem me pôs no mundo.

Cristóvão: Vou procurar teu pai imediatamente.


Henriqueta: Penso que é mais seguro ir procurar minha mãe.

Cristóvão: Sua mãe? Francamente, as mulheres eruditas não me agradam.


A maneira como ela segue esse tal Tremembó, um homem tão vulgar.

Henriqueta: Seus versos... Ele todo me parece coerente, concordo


totalmente. (sai por uma porta)

Cristóvão: Vem aí tua tia.

Entra Belisa. (entra por uma porta)

Cristóvão:Permita, dona Belisa. Posso abrir meu coração em chamas?

Belisa: Calma. Quem lhe deu permissão de me abrir, assim, seu coração?
Que é isso? Está apaixonado por mim?

Cristóvão: Por favor, há um engano aqui, não se alarme. Henriqueta,


senhora, é a mulher que me apaixona.

Belisa: Essa sua falsa retirada é espantosa. Como é habilidoso!

Cristóvão: Senhora, os céus ligaram meu coração ao de Henriqueta. Casar-


me com ela é tudo que desejo.

Belisa: Falarei a minha irmã sobre isso, esclarecendo que Henriqueta é


contrária ao casamento.

Cristóvão: Mas, senhora, não sei para que serve tal complicação, porque
insiste em entender o que não digo?

Belisa (insinuante): Por favor, para que esse fingimento? Por que tentar
esconder isso que os seus olhares já revelaram tanto?

Cristóvão: Porém...

Belisa: Adeus! No momento terá que se contentar com isso. E já lhe disse
mais do que deveria.

Cristóvão: Porém, seu engano, senhora, é que...

Belisa: Chega!

Cristóvão: Se eu a amo, senhora, peço-lhe que me enforque.

Belisa: Não. Não, por favor, não quero ouvir mais nada. (sai)

Cristóvão: Que o diabo enterre essa maluca e suas visões loucas.

Entra Aristides pela outra porta.


Aristides (entra falando): Está bem, está bem, eu te darei a resposta o
mais breve possível. Tudo fogo de palha.

Olhando Grisaldo.

Aristides: Ah, Deus te proteja, meu irmão.

Crisaldo: E a ti também, Aristides.

Aristides: Você sabe o porquê de eu estar aqui?

Crisaldo: Não.

Belisa aparece e fica escutando.

Aristides: Você conhece Cristóvão há muito tempo?

Crisaldo: Acho que sim, ou seja, há muito tempo!

Aristides: E qual tua opinião sobre ele?

Crisaldo: Parece-me um homem honesto.

Aristides: Pois bem, ele me encarregou de falar contigo: está interessado


em Henriqueta.

Crisaldo: A minha filhinha?

Aristides: Sim, por que não?

Belisa: Desculpe interromper, mas há outra história.

Aristides: O que há, minha irmã?

Belisa: O coração dele pertence a outra pessoa.

Aristides: Você está brincando... Não há condição. Se ele não ama


Henriqueta, ele é um monstro de simulação.

Belisa: Estou lhe afirmando.

Aristides: mas ele próprio me disse.

Belisa: Pois sim!

Aristides: Sou eu um imbecil?

Belisa: O que digo é um fato, a conclusão é tua. Ele sabe enganar.

Aristides: Já que você sabe tudo, Belisa, diga-me quem ele ama?

Belisa: Vocês querem saber?


Aristides: Claro, diga quem é?

Belisa: Eu.

Aristides: Você?

Belisa: Eu mesma.

Aristides: O que é isso, Belisa?

Belisa: Que significa essa expressão de surpresa? (sai furiosa)

Crisaldo: A nossa irmã está completamente, é! (gesto de loucura)

Aristides: Piora dia a dia. E em relação a Cristóvão?

Crisaldo: Precisa perguntar? Consinto de bom grado.

Aristides: Você sabe que ele não tem bens e que...

Crisaldo: Cristóvão é rico de virtudes e não há tesouro igual.

Aristides: Então é só falar com Filomena.

Crisaldo: Para que? Por quê? Já decidi e basta. Ele vai ser meu genro.

Aristides: Está bem, Crisaldo, mas nada demais pedir também o


consentimento dela. Vamos a...

Crisaldo: Você está brincando? Já disse, não é preciso. Decidindo por mim,
eu decido por ela.

Aristides: Mas é que... se, por acaso...

Crisaldo:Esquece, irmão, e fique descansado. Deixe comigo as coisas desse


lado.

Aristides: Está bem.

Crisaldo: É assunto resolvido, vou imediatamente falar com Filomena.

Entra Martina.

Martina: Que azar o meu!

Crisaldo: Por quê?

Martina: Por ter nascido.

Crisaldo: Mas o que é que você tem? Que bicho te mordeu?

Martina: Antes fosse um bicho, patrão... Foi a patroa.


Crisaldo: Quê! Ele te mordeu?

Martina: Antes mordesse, patrão. Despediu-me.

Crisaldo: Alguma coisa você fez, Martina.

Martina: Se fiz, não sei o que foi.

Crisaldo: Não tenha medo, você fica. Estou satisfeito com seu serviço.

Entram Filomena e Belisa.

Filomena (vendo Martina): Mas, como, você ainda está aqui, sua
patife!?! Depressa, dê o fora, sua estúpida!

Crisaldo: Devagar, que é isso?

Filomena: Eu já disse, está demitida.

Crisaldo: Espere.

Filomena: Ela já vai embora.

Crisaldo: Está bem, está bem. Já não está aqui quem falou.

Martina: Mas o que foi que eu fiz? Que foi que eu fiz?

Crisaldo: Você a pegou roubando?

Filomena: Pior que isso!

Crisaldo: Pior?

Filomena: Depois de mais de trinta lições de gramática, ela colocou um


substantivo no lugar do adjetivo.

Crisaldo: Só isso?

Filomena: Só isso? Você acha pouco?

Crisaldo: Eu pensei que ela tivesse cometido um crime muito maior.

Filomena: O que ela fez não é insignificante.

Crisaldo: De modo algum!

Filomena: Gostaria de ouvir sua defesa.

Belisa: Dá pena. Damos-lhe uma frase e ela a destrói completamente.

Martina: Se a gente se explica, então não está errada. Isso tudo que me
ensinam não serve para nada.
Belisa: Ô miolo mole! Depois desse esforço mortal da gente, você não vai
falar nem uma frase limpamente?

Martina: Mas a minha falação é como fala o pessoal de onde eu vim.

Filomena: É. O mal é incurável. Não tem jeito.

Belisa: Você não vê que fere a língua?

Martina: Não vejo não, senhora. Se eu ferisse, é natural, sangrava.

Belisa: Eu desisto de explicar: é uma porta.

Filomena: Viu por que eu a mandei embora?

Crisaldo (pisca para Martina): Fora daqui, Martina! Pronto, ela foi
despedida.

Filomena: Tem alguma coisa a declarar?

Crisaldo: A Henriqueta! Acho que é hora de dar-lhe um dote e escolher-lhe


um marido...

Filomena: Eu também pensei nisso, já resolvi o caso dela. O senhor


Tremembó é o homem escolhido. E não quero discussão! (sai)

Entra Aristides.

Aristides: E como é, cara? Tua mulher acaba de sair e eu não quero perder
tempo: como é que foi a conversa?

Crisaldo: É. Foi.

Aristides: Cristóvão foi aceito?

Crisaldo: Faltam alguns detalhes.

Aristides: Que detalhes? Diga logo, recusou?

Crisaldo: Não.

Aristides: Hesita então?

Crisaldo: Não, não, está decidida!

Aristides: Ah, está decidido!

Crisaldo: Eu disse decidida. Já tem outro para genro.

Aristides: Quem?

Crisaldo:Tremembó!
Aristides:Tremembó?

Crisaldo: Esse mesmo que nos enche com versos e latim.

Aristides: E você aceitou?

Crisaldo: Deus me livre! Longe de mim!

Aristides: Pelo menos você propôs Cristóvão?

Crisaldo: Achei melhor guardar o meu para outra ocasião.

Aristides: Nunca vi em minha vida tal fraqueza.

Crisaldo: É, meu irmão, é muito fácil falar! Mas eu queria ver você
enfrentando esse elefante.

Aristides: O culpado é você. Por tua covardia, ela hoje te domina.

Crisaldo: Você tem toda razão. É hora mesmo de uma decisão.

Aristides: Muito bem. Viva!

Crisaldo: É hoje que enfrento Filomena. Quem manda aqui sou eu.

Aristides: É isso que eu quero ver.

Crisaldo: Vá até Cristóvão e diga a ele para vir aqui agora.

Aristides: Eu vou correndo. (saem)

Entram Filomena, Armanda, Belisa, Tremembó e Coelho.

Filomena: Vamos sentar aqui para ouvir devagar o senhor Tremembó e


seus versos sem par.

Armanda: Estou morta de ansiedade.

Belisa: Não aguento esperar.

Henriqueta entra e vai saindo quando vê Tremembó.

Filomena: Olá Henriqueta, está fugindo?

Henriqueta: Não quero atrapalhar reunião tão culta!

Filomena: Fique conosco.

Henriqueta: Mas eu não entendo nada de literatura.

Tremembó: A senhora foi feita para encantar.


Henriqueta: Não tenho o menor interesse em...

Filomena (a Coelho):Depressa, menino! Sente-se em qualquer lugar.

Coelho tropeça e cai no chão.

Filomena: Mas que menino desastrado!

Belisa: A tua querida é ignorante, que coisa!

Coelho (levantando-se): Não foi nada grave!

Filomena: Brutamontes!

Tremembó: É preciso agir com o cuidado de vidro!

Armanda: Ah! Ah! Que espírito! Cuidado de vidro!

Belisa: Encantador! Cuidado de vidro!

Sentam-se.

Filomena: Estamos prontas para o nosso alimento espiritual.

Tremembó:So...

Belisa (a Henriqueta): Silêncio!

Tremembó: Soneto à bela princesa Urânia.


Vossa prudência cochila,
Abrigando na barriga
E tratando como pupila
Vossa cruel inimiga.

Belisa: Que incrível!

Armanda: Que palavras!

Filomena: Vamos ouvir o resto.

Batem à porta e Coelho vai atender.

Filomena: Quem será?

Coelho (a Tremembó): Senhor, tem um Calheiro aí que quer falar com


você.

Tremembó: É meu amigo sábio que quer conhecê-la.

Filomena:Mande-o entrar.

Entra Vadio.
Tremembó: Aqui está o homem que morria de vontade de conhecer a
senhora.

Filomena: Seja bem vindo!

Tremembó: Conhece os clássicos como ninguém e fala grego também!

Filomena (à Belisa): Ele sabe o grego? Ó Deus do céu! O grego? Ele sabe
o grego!

Belisa (à Armanda): O grego, minha sobrinha!

Armanda: O grego! Que espantoso!

Tremembó: Mas ele é admirável em prosa também.

Vadio: Ah, mas as graças inspiram os seus versos também.

Tremembó: Porém, o senhor tem os ritmos certos.

Vadio: Mas os seus são melhores.

Tremembó: Quem nunca ouviu uma balada sua não viveu.

Vadio: Não, suas rimas são ricas.

Tremembó: Você é o verdadeiro Sol!

Vadio: O senhor deveria ter uma estátua!

Tremembó: O senhor já ouviu o soneto sobre a febre da princesa?

Vadio: Sim, leram-me ontem numa reunião.

Tremembó: Sabe quem foi que fez?

Vadio: Olhe, eu nem quis saber. O tal soneto é duro de roer.

Tremembó: Essa não é a opinião geral.

Vadio: Mas é uma porcaria.

Tremembó: Eu sou o autor.

Vadio: O senhor?

Tremembó: Eu mesmo.

Vadio: Perdão, começo a duvidar da minha opinião.

Tremembó: Ora, desculpe se não lhe agradei.


Vadio: Vai ver que estava distraído ao escutar. Bem, vou recitar minha
balada.

Tremembó: Ninguém se interessa! Está fora de moda!

Vadio: Realmente, Balada só agrada a pessoa culta e inteligente.

Tremembó: Essa balada não é nada.

Vadio: eu disse claramente, a gente culta e inteligente.

Tremembó: Confundiu inteligente com pedante.

Vadio: Como pedante?

Tremembó: Olhe-se no espelho!

Vadio: O senhor já se olhou?

Tremembó: Escritorzinho de alcova, borrador de papel.

Vadio: Escritor que ninguém lê.

Tremembó: Ladrão de ideias.

Vadio: Pernóstico!

Filomena: Senhores. Aonde pretendem chegar?

Vadio: Eu te desafio. Isso não fica assim.

Tremembó: Vai se arrepender de ter nascido um dia.

Vadio sai.

Tremembó: Quero que me desculpem, senhoras!

Filomena: Prometo fazer tudo por uma reconciliação. Bem, mas mudando
de assunto... Gostaria de fazer tua ligação com Henriqueta.

Henriqueta:Eu, mamãe?

Filomena: Você, sim... Não se faça de bola.

Tremembó: Nem sei como me exprimir a essa alma pura. (beija a mão de
Henriqueta)

Henriqueta: Tenha calma, senhor. Não está nada definido.

Filomena: Você sabe muito bem que se eu quiser... Venha, senhor, vamos
conversar no jardim.
Fica Henriqueta e Armanda.

Armanda: Mamãe deseja o melhor para você.

Henriqueta: Fique com ele, então!

Armanda: Mas você é a preferida.

Entra Crisaldo e Cristóvão.

Crisaldo (à Henriqueta): Vem cá, minha filha, dê sua mão a esse


cavalheiro, que veio solicitar que você seja sua esposa.

Armanda: Você não é obrigada, irmã!

Henriqueta: Seu pai decidiu, está decidido. (dá a mão a Cristóvão)

Cristóvão: Ah! Que alegria! Não sei como exprimir minha felicidade.

Saem todos, menos Armanda.


Entra Filomena.

Armanda: Mãe, Henriqueta nem tomou conhecimento de tua decisão!

Filomena: Eu lhe mostrarei a quem tem de obedecer.

Cristóvão entra e escuta.

Armanda: Se eu fosse a senhora, não deixava Henriqueta se casar co


Cristóvão.

Filomena: É um jovem idiota.

Armanda: Nem gosta de ler.

Filomena: Ignorância.

Cristóvão (à Armanda): Que mal lhe fiz? De onde partiu esse ódio
mortal?

Armanda: O senhor é um leviano.

Cristóvão: Olhe para você. Ninguém nem te nota.

Armanda: Grosseiro.

Cristóvão: Outra já tomou seu lugar!

Filomena: E eu? Já escolhi outro para Henriqueta.

Cristóvão: Por favor, senhora, reveja pelo menos sua escolha. Tenho dó.
Filomena: Eu vejo Tremembó comomelhor ponto de vista.

Entra Juliano.

Juliano: Senhora, o sábio que a visitou, de quem eu sou criado, mandou-


lhe esse bilhete urgente.

Filomena: Bilhete?
(lê): “ Minha senhora, Tremembó está espalhando que vai se casar com sua
filha. Devo dizer-lhe que o que ele realmente adora é o dinheiro.”
Que insolência! Corra a seu patrão e diga que hoje mesmo casarei minha
Henriqueta com o senhor Tremembó.

Sai Juliano.

Filomena (a Cristóvão): O senhor pode assistir à cerimônia


(a Armanda): Mande o criado chamar o escrivão e avise tua irmã de minha
decisão.

Armanda: Mas ele não vai querer.

Filomena: Eu sei como obrigá-la a cumprir seu dever.

Saem as duas.

Entram pela outra porta Crisaldo, Aristides e Henriqueta.

Cristóvão: Senhor Crisaldo, ajude-me. A cerimônia será hoje.

Crisaldo: Com Tremembó?

Cristóvão:Tremembó.

Crisaldo: Mas o que viu nele? É um idiota.


(Pensa) Pois vamos realizar o casamento na hora em que ela quer.

Cristóvão: Como?

Crisaldo: Deixe comigo. Eu digo que ela vai casar com o senhor.

Henriqueta: Que Deus te ouça, meu pai.

Aristides: Farei tudo que puder para ajudar.

Cristóvão (à Henriqueta): Confie nos meus sentimentos.

Henriqueta: Confio. Prometo ser sua mulher e não vou ceder aos luxos de
minha mãe.

Cristóvão sai por uma porta e Tremembó entra por outra.

Henriqueta: Senhor Tremembó, gostaria de conversar com o senhor.


Tremembó (aproxima-se dela): Que olhos!

Henriqueta: Perdoe-me, senhor, mas não posso corresponder ao seu


amor, Cristóvão já mereceu todos os meus favores.

Tremembó: Todos?

Henriqueta: Sim, todos.

Tremembó: Aceito sua mão. Arrisco-me!

Henriqueta: Não! Estou muito comprometida...

Tremembó: Meu mundo é você!

Henriqueta: Piedade, senhor.

Tremembó: Quero que seja minha, pouco me importa o meio. (sai)

Entram o escrivão, Crisaldo e Martina.

Henriqueta: Papai, diga que está tudo certo!

Crisaldo: Acha que faço tudo o que sua mãe manda?

Henriqueta: Bem, o senhor é quem diz.

Crisaldo: Eu sou o único chefe dessa família.

Martina: Isso! Tenha coragem, senhor.

Entram todos.

Filomena (ao escrivão): Credo, que mal vestido!

Escrivão: Quê?

Filomena: É inútil convencer a ignorância. Vamos senhor, depressa. (vê


Martina) Mas o que essa indecente faz aqui?

Crisaldo: Depois discutiremos isso!

Escrivão: Onde está o noivo?

Filomena: É esse ali, todo duro. (mostra Tremembó)

Crisaldo: Não! Não! É esse jovem que vai casar. (aponta Cristóvão)

Escrivão: Muito bem. Dois maridos. Bem, se pudessem escolher um dos


dois, ser-me-ia mais fácil.

Martina: Deixem a menina decidir!


Filomena: Cale a boca!

Martina: Não calo não! Pode despedir-me cem vezes, mas não me calo!

Filomena: Louca.

Martina: O que a gente precisa num marido é muito amor. Na cama, todo
mundo é professor.

Filomena: Mas ela não se cala?

Martina: A vida é outra coisa.

Entra Aristides.

Aristides: Lamento interromper, mas precisam ler isso.

Filomena: O que é isso? (pega o papel e lê)


O que? Perdemos toda a fortuna? Crisaldo, veja isso.

Crisaldo: Meu Deus, e agora?

Filomena: Que vexame!

Tremembó:Olhe, senhora, pensei melhor e devolvo sua aliança.

Filomena: O que? Saia daqui! Fora!

Tremembó foge.

Cristóvão: Bem, acho que vão precisar de minha ajuda agora!

Henriqueta: Meu amor! Dinheiro não é importante.

Crisaldo: Foi tudo uma farsa. Não perdemos fortuna nenhuma.

Filomena: Como assim?

Aristides: Foi o único jeito de impedir o casamento.

Belisa: Bandidaço!

Martina: Agora é calar-me para sempre. Fingir de boa.

Crisaldo: Vamos, escrivão, sente aí e escreva o contrato exatamente como


eu exigi.

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