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Fabular é preciso
Por isso mesmo a fabulação humaniza, não só por estar sempre voltada para a
condição humana, mas também, e talvez sobretudo, por atender à carência de
fantasia como contraponto da inteligência lógica, que faz da realidade um
território árido e carente de imaginação. Para viver e sobreviver, é preciso
sonhar, e sonhar com palavras é um modo de reinventar a vida e fazer da
existência um lugar de descobertas e de revelações.
Existe uma historieta, “A fábula do oleiro”, que identifica o traço lúdico de quem
fabula como aquele que brinca, que se diverte, que subverte as normas, que
reinventa a vida e sonha nas palavras o sonho de todos. Sugerindo mais do que
afirmando, o fabulador diz:
“Uma criança se aproxima de um oleiro que molda bonecos no barro e pendura
as estatuetas num varal para secar. Chega perto, admira os seres enfileirados,
fica fascinada com a perfeição daquelas pequenas criaturas que se multiplicam
nos movimentos exatos das mãos do escultor. Mesmo assim, pergunta:
– Por que você está fazendo tantos bonecos, se o mundo já está cheio de
gente?
E o oleiro, sem tirar os olhos e as mãos do trabalho, responde:
– É para preencher os vazios da vida, e não faz mal nenhum equilibrar as
criaturas de barro com os homens reais.”1
Apenas uma palavra final: a fabulação sempre se anuncia como uma voz
coletiva que oferece palavras e cores acolhedoras e revela “um mundo onde
todos sonham”.
1
Fábula popular recriada por mim em A maldição do olhar. São Paulo: Biruta,
2008, p. 112.
2
CANDIDO, Antonio. “O direito à literatura”. In: Vários escritos. São Paulo/Rio
de Janeiro: Duas Cidades, 2004, p. 174-5.
http://www.plataformadoletramento.org.br/em-revista/384/fabular-e-preciso.html
04/03/2020