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CURSO DO PROF. DAMÁSIO A DISTÂNCIA

MÓDULO COMPLEMENTAR

APONTAMENTOS SOBRE
O NOVO CÓDIGO CIVIL
Lei n. 10.406/02

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DIREITO CIVIL
Apontamentos sobre o novo Código Civil
Lei n. 10.406/02

Prof. Vitor Frederico Kümpel

1. ESCLARECIMENTOS PRELIMINARES

O novo Código Civil, após longos anos de trâmite pelas casas do Congresso
Nacional, vem suprir antigas exigências de reformulação de nossa legislação civil, há
muito dissonante, inclusive das regras constitucionais a respeito das relações de cunho
privado, e apresenta não só mudanças de fundo em relação aos temas que dispõe, mas
também mudanças tópicas na disposição dos assuntos de sua competência, em seu texto
tratados.

Promove a unificação parcial do Direito Privado, uma vez que agrega a seu texto
todas as disposições acerca da constituição e extinção de sociedades, no capítulo
denominado “Direito Empresarial”, trazendo ao sistema jurídico pátrio a positivação da
teoria da empresa, e de todos os seus consectários, todavia, auxiliado pela Lei n. 6.404/76 e
suas recentes alterações, que trata das Sociedades por Ações, e permanece válida. Ressalta-
se que a unificação não se deu de modo total, pois a matéria Comércio Marítimo, tratada
em livro específico do Código Comercial, permanece vigente.

1.1. A Lei de Introdução e o Novo Código Civil


O Decreto-Lei n. 4.657/42 não sofre nenhuma alteração ou revogação em qualquer
de seus dispositivos com a entrada em vigor do novo Código Civil (Lei n. 10.406/01). Isto
porque o objeto tratado pela Lei de Introdução é distinto do objeto do Direito Civil. Aliás,
a Lei de Introdução não informa somente o Direito Civil, inserindo princípios e regras de
todo o ordenamento jurídico, o que na doutrina denominam-se normas de sobredireito, ou
sobrenormas. Aqui, cabe destacar que a Lei de Introdução é posterior ao Código Civil de
1916 (Lei n. 3.071/16). Dessa forma, verificamos que já não introduzia o Código Civil de
1916 e, portanto, não introduz também o novo código.

2. COMENTÁRIOS À LEI N. 10.406, DE 10.1.2002

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Cumpre observar que os comentários ao texto do novo código serão realizados,


tanto quanto possível, de forma tópica e breve, em razão de serem as modificações, em sua
maioria, a respeito de institutos existentes, adaptados à irrefutável evolução das relações
em sociedade. Em razão do exposto, faz-se necessário o conhecimento prévio dos temas a
seguir tratados, com a devida profundidade, nos termos do ordenamento vigente, para fins
de confronto e entendimento.

3. DISPOSIÇÕES SOBRE A PARTE GERAL

• O novo Código Civil não contém mais disposição preliminar, por não
considerar mais importante a divisão do direito em Direito Público e Direito
Privado.

• A expressão “todo homem” do atual artigo 2.º é substituída pela expressão “toda
pessoa”, que é mais abrangente e mais próxima da nomenclatura utilizada pela
lei.

• Não se utiliza mais a expressão “obrigações”, referente aos direitos e obrigações


na ordem civil, comum a todas as pessoas; tal expressão é substituída pela
palavra “deveres”, no texto do artigo 1.º.

• Mantém-se a divisão das pessoas em pessoa natural e pessoa jurídica, em que


pese à tentativa de substituição do termo “pessoa natural” por pessoa física,
pessoa humana.

3.1. Capacidade e Maioridade Civil


• O novo código não diferencia em seu texto a capacidade de aquisição de
direitos (de direito, ou de gozo) da capacidade de exercício (de fato, ou
processual). Assim, mantém-se a dificuldade de o intérprete diferenciá-las,
notadamente no que tange à necessidade de assistência e representação para a
proteção dos direitos conferidos.

• Nota-se no novo diploma civil, nos artigos 3.º e 4.º, o tratamento dos incapazes
de forma evolutiva, partindo da incapacidade absoluta, que passa a ter somente
três classes, à incapacidade relativa. Segundo o artigo 2.º do novo código, o
nascituro permanece titular de direitos eventuais, subordinados à condição
suspensiva traduzida no seu “nascimento com vida”, determinada no artigo
como o momento de início da personalidade. Os representantes continuam
capacitados a tomar as medidas necessárias à proteção dos direitos eventuais do
nascituro (artigo 130). Registra-se que, em relação às emendas à nova parte
geral, em trâmite no Congresso, de autoria da doutrinadora Maria Helena Diniz,
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uma delas propõe o afastamento da expressão “concepção” para colocação de


proteção aos direitos eventuais não só do nascituro, mas também aos embriões,
em razão da expressa previsão de estabelecimento de parentesco e proteção
sucessória a estes últimos, mesmo oriundos de inseminação artificial homóloga,
a exemplo do artigo 1.597, incisos III e IV, do novo diploma.

3.1.1. Absoluta e relativamente incapazes


• Entre os absolutamente incapazes não constam mais “os loucos de todo gênero”,
expressão pejorativa que foi substituída por "enfermidade ou deficiência
mental". Os menores de 16 anos permanecem no rol.

• Atualmente, o louco é civilmente irresponsável. Quem responde é o curador e, se


este não possui bens, a vítima permanecerá irressarcida. Pelo novo Código
Civil, de acordo com o artigo 928, o curador responde pelos atos de seu
curatelado. Todavia, há a possibilidade de responsabilização subsidiária do
deficiente mental, caso este possua bens e fique demonstrada a ausência de
culpa de seu curador, atendendo ao princípio da vedação do enriquecimento sem
causa. Por este artigo, a vítima foi beneficiada.

• A expressão “surdos-mudos”, com o novo texto, fica absorvida como


modalidade de deficiência capaz de tornar a pessoa “excepcional”. Assim, os
excepcionais, sem desenvolvimento mental completo, qualquer que seja a sua
causa, são considerados relativamente incapazes. Note-se que se a deficiência
for tal, que venha a suprimir toda a capacidade de discernimento do indivíduo,
será considerado absolutamente incapaz.

• “Aqueles que transitoriamente não conseguem exprimir sua vontade”, passam a


ser considerados, por via de regra, absolutamente incapazes. Podem, todavia,
mediante perícia, ser considerados relativamente incapazes, a depender do grau
de deficiência.

• Os ébrios habituais, toxicômanos, demais assemelhados, e todos os que tenham,


por doença mental, o discernimento reduzido, passam da lei especial (Decreto
de assistência aos psicopatas) para o novo Código Civil, para serem tratados
como relativamente incapazes. Aqui se incluem aqueles que, mesmo por causas
transitórias, não consigam exprimir sua vontade, desde que haja comprovação
pericial.

• Os pródigos permanecem no rol dos relativamente incapazes, e os índios são


remetidos à legislação especial, ressaltando-se que já existe regulação pelo
Estatuto do Índio (Lei n. 6.001/73).

• A morte presumida pode ser declarada sem prévia declaração de ausência


quando for extremamente provável a morte daquele que estava em perigo de
vida ou daquele que desapareceu por dois anos após o término de guerra. Desta
forma, transporta-se para o texto do novo código (artigo 7.º), regra
anteriormente prevista na Lei dos Registros Públicos. É de ressaltar que o
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procedimento de ausência permanece previsto no diploma civil, todavia, para


fins sucessórios, não se considerando mais como causa de absoluta
incapacidade. Por fim, nos casos do artigo 7.º, o cônjuge da pessoa
presumivelmente morta poderá se casar novamente e, caso o morto presumido
reapareça, deverá ser declarada a nulidade do segundo matrimônio contraído por
seu cônjuge; todavia, será considerado putativo em relação a este, surtindo
todos os efeitos, notadamente os de cunho patrimonial.

3.1.2. Maioridade civil


• O maior de 18 anos passa a gozar de capacidade plena, substituindo a antiga
regra que previa a capacidade plena somente aos 21 anos.

• A maioridade se inicia aos 18 anos (artigo 5.º, “caput”). Desta feita, os pais só
responderão pelos atos ilícitos dos filhos menores; por sua vez, as vítimas
poderão acionar somente os autores do ilícito quando estes forem maiores de 18
anos.

• Antes, quando o agente de um ilícito tinha até 21 anos, a vítima poderia acioná-
lo, bem como aos seus pais. Era melhor para a vítima (artigo156 do Código
Civil).

• Com o novo Código Civil, só os pais podem ser acionados quando menores de
18 anos cometerem atos ilícitos, mas se os responsáveis não têm bens, ou não
têm a obrigação de fazê-lo, pode-se voltar contra o incapaz (artigo 928). Assim,
a responsabilidade dos menores do novo Código Civil é subsidiária e mitigada.

• A emancipação pode ocorrer a partir dos 16 anos e não mais a partir dos 18
anos, porém, só pode ocorrer por escritura pública, diferente do sistema
anterior.

• O maior de 16 anos, que se estabeleça civil ou comercialmente, ou assuma


relação empregatícia, desde que, em função do estabelecimento ou emprego,
venha possuir economia própria, também passa a gozar de maioridade.

• O novo Código Civil não contempla mais, de forma expressa, o dispositivo que
vedava a “restitutio in integrum”, que é previsto pelo artigo 8.º do atual Código
Civil. O texto do Código Civil de 1916 não confere proteção integral ao
incapaz, impossibilitando o desfazimento de qualquer negócio jurídico válido e
regular que o envolva, simplesmente pelo fato de envolvê-lo. O novo sistema
presume a impossibilidade de proteção integral, todavia não traz a vedação
expressa em seu texto.

3.1.3. Personalidade

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• Os direitos da personalidade encontram proteção expressa no texto do novo


Código, permanecendo em regra intransmissíveis e irrenunciáveis, além de, por
óbvio, imprescritíveis. A lei pode, excepcionalmente, permitir a disposição de
tais direitos, a exemplo da doação de órgãos, em vida, para fins de transplante a
terceiros, conforme a Lei n. 9434/97 dispõe. Em regra, a cirurgia ablativa
(mudança de sexo), realizada pelos transexuais, permanece vedada.

• A nova lei, em seu artigo 16, contempla o direito a todo ser humano de ter nome
e sobrenome, consagrando assim a expressão coloquial “sobrenome”, e
preterindo, por conseqüência, a expressão técnica “patronímico”, ou apelido de
família, há muito utilizada pela legislação civil, notadamente na Lei de
Registros Públicos.

• O artigo 19 possibilita também ampla proteção, agora pela lei geral, do


pseudônimo consagrado, desde que utilizado para fins lícitos, mesmo sem
necessidade de registro, ao menos a priori.

• A vida privada das pessoas alcança proteção judicial preventiva e repressiva, não
só com o direito a reparação, mas também com direito a medidas judiciais que
venham a tolher lesões iminentes, conforme reza o artigo 21 do novo Código
Civil.

3.2. Pessoas Jurídicas


• A tradicional divisão das pessoas jurídicas em Corporações e Fundações, as
primeiras se subdividindo em sociedades e associações, é mantida. Todavia, em
relação às sociedades, uma vez trazidas para o novo código, qualquer que seja o
seu objeto, e ante a adoção, pelo mesmo, da teoria da empresa, desaparece a
subdivisão de sociedades civis e comerciais, que passam a se chamar
empresariais, quando regidas pelo regime jurídico comercial, e simples, quando
suas obrigações forem regidas pelo sistema civil.

• Ponto polêmico é a restrição imposta pelo texto do artigo 62, parágrafo único, do
novo código, às finalidades para as quais as fundações podem ser criadas
(assistenciais, culturais, morais e religiosas somente). Ficará a cargo da doutrina
a interpretação deste dispositivo, em razão de suas amplas possibilidades de
entendimento.

• A nova lei, apesar de não reproduzir em seu texto a regra que dispõe ter a pessoa
jurídica personalidade distinta dos seus membros, adota tal princípio de forma
integral, notadamente em razão da instituição da “desconsideração da
personalidade jurídica” (artigo 50, interpretado a contrariu sensu), adotando,
inclusive, critério subjetivista em relação aos atos que possibilitam sua
aplicação, conforme o texto do dispositivo, atribuído ao jurista Fábio Konder
Compartatto.

• De acordo com o artigo 63 do novo Código Civil, em relação à criação de


fundações, se o patrimônio destinado à sua instituição não for suficiente, deve-
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se perquirir a finalidade objetivada pelo instituidor e transferir o patrimônio em


questão para fundações de finalidade igual ou semelhante, afastando a regra do
código de 1916, que determina a transformação de tal valor em títulos do
Governo Federal.

• Em relação ao domicílio, a mudança importante que se registra é a criação do


domicílio profissional, que pode ser interpretado como nova nomenclatura do
“centro de ocupações habituais”.

3.3. Dos Bens


Em relação aos bens, são apresentadas as seguintes mudanças de vulto, conforme
abaixo se expõe.

• O instituto do “Bem de Família” é deslocado para o capítulo referente ao


Direito de Família, todavia, suas disposições, previstas no Decreto n. 3.200/41 e
na Lei n. 8.009/90, foram mantidas (será estudado junto às modificações
atinentes à família).

• Por considerar o legislador desnecessárias as disposições a respeito das coisas


fora do comércio, este capítulo foi suprimido do texto do novo Código Civil.

• Atendendo à necessidade de circulação de riquezas, ligada à natureza da maioria


dos bens corpóreos, o legislador passa a considerar como fator de
indivisibilidade de bens a excessiva diminuição ou perda do valor econômico
dos mesmos, quando possível sua ocorrência em razão da divisão. Logo, nestes
casos, fica vedada a divisão de um bem, quando acarretar perda de seu valor
econômico, a exemplo de um “raro diamante”, de acordo com as lições de
Carlos Roberto Gonçalves.

• O artigo 93 do novo texto civil cria o instituto das “pertenças”, consideradas


bens móveis principais que, sem pertencerem a determinado imóvel, o
guarnecem, ampliando sua utilidade ou aformoseando-o. Desta feita, acaba a
classificação consagrada dos “bens imóveis por acessão intelectual”, como eram
consideradas as pertenças até a instituição do novo Código Civil.

• Em relação à impossibilidade de usucapião de bens públicos, já expressa no


enunciado n. 340 do Supremo Tribunal Federal, cumpre observar que esta regra
passa da seara jurisprudencial para a seara legal, de acordo com o texto do
artigo 102 da lei.

• A inalienabilidade dos bens públicos permanece relativa, podendo ser destituída,


em relação aos bens de uso especial, observadas as regras legais, a exemplo da
desafetação (consistente em retirar a inalienabilidade e a função para qual o bem
era destinado, por meio de lei específica). Os bens dominicais, de domínio

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privado do Estado, continuam alienáveis, observadas as regras legais, a exemplo


da licitação (aplicável a todos os casos, salvo as exceções da Lei n. 8.666/93).

3.4. Dos Fatos Jurídicos


• A expressão negócio jurídico, consagrada na doutrina, passa a ser utilizada
como principal fato jurídico, atendendo à importância deste (amplitude de
efeitos, exigência de intenção e capacidade); todavia, permanecem as
subdivisões dos fatos jurídicos, apontando como principais o negócio jurídico, o
ato jurídico em sentido estrito e o ato-fato jurídico, este último considerado
como aquele que não exige nem mesmo intenção para que possa gerar efeitos, a
exemplo do incapaz que acidentalmente encontra, em terreno alheio, tesouro, o
qual seu proprietário não se lembrava.

• Em relação aos atos jurídicos lícitos, que não sejam negócios jurídicos, dispõe o
artigo 185 do novo diploma que aplicar-se-ão, no que couberem, as disposições
referentes aos negócios jurídicos, por haver necessidade de respeito à natureza
jurídica daqueles.

• A lei não rechaça o negócio jurídico unilateral, mas, ao contrário, de forma


implícita, o aceita, definindo exemplos deste como a instituição de fundação por
escritura pública e o consagrado “testamento”, possuidor de múltiplos efeitos.
Define-se negócio jurídico unilateral como aquele que se aperfeiçoa com uma
única declaração de vontade e permite a obtenção de inúmeros efeitos.

3.4.1. Dos vícios do negócio jurídico


• O novo código, artigo 110, trata da reserva mental, definindo-a como a
verdadeira vontade que o contratante possui ao efetuar um negócio jurídico,
diversa da vontade que ele externa ao pactuar. Considera válido o negócio
jurídico operado com reserva mental, desde que o outro contratante não saiba o
verdadeiro motivo pelo qual a outra parte com ele pactua, pois, com efeito, tal
contrato estaria eivado do vício da simulação bilateral, erigida pelo novo texto
como causa não de anulação, mas de nulidade do negócio jurídico, conforme
será visto.

• O silêncio continua interpretado como consentimento para a prática de negócios


jurídicos somente quando determinado por lei ou pela praxe, notadamente a
comercial. Como exemplos, podemos citar a aceitação de doação pura (lei) ou a
aceitação reiterada de remessas de produtos para experimentação, postos à
venda no estabelecimento destinatário, sem a formalização de pedidos (praxes
comerciais).
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• O autocontrato, instituto histórico, assim considerado em razão de sua larga


utilização, em sua modalidade “procuração em causa própria”, para imprimir
irretratabilidade a promessas de venda de imóveis (pactos de contrahendo),
anteriores à edição do Decreto n. 58/39, permanece como autocontrato apenas
em sua aparência, em razão da necessidade de estar o autocontratante, quando
da realização do contrato, investido como mandatário em relação a uma das
manifestações de vontade que faz.

• De acordo com o artigo 117, via de regra, o negócio celebrado pelo


representante consigo mesmo, no seu interesse ou de outrem, é anulável. Será
válido somente se o permitir a lei ou o representado, e desde que não se trate de
vedações expressas em normas cogentes.

• Os encargos ilícitos ou absolutamente impossíveis de serem cumpridos são


considerados pelo texto do artigo 137 como não escritos, portanto,
desconsiderados, gerando o negócio efeitos máximos desde a sua formação.

• Em relação aos defeitos dos negócios jurídicos, eles passam de cinco para seis
vícios, pois houve a exclusão da simulação das causas de anulabilidade (elevada
à causa de nulidade), e a previsão dos defeitos denominados “lesão” e “estado
de perigo”.

a) A simulação

• Prevista no artigo 167 do novo diploma, a simulação passa a ser considerada


causa de invalidade, ab initio, do negócio jurídico. Como conseqüência, o juiz
pode reconhecê-la de ofício, porque nulidade é matéria de ordem pública.
Regida pelo princípio da causalidade, não gera a invalidade do negócio
verdadeiro, desde que formal e materialmente válido, encoberto por uma de
suas modalidades, a saber, a dissimulação. Como exemplo de dissimulação que
permite a validade do negócio encoberto, pode ser citada a escritura pública e a
transferência de propriedade de imóvel com valor declarado menor que o valor
real, para fins de evasão fiscal, uma vez que a alienação permanece válida e
eficaz.

b) A lesão

• Embora já aplicada no sistema jurídico pátrio, em razão de criação doutrinária, a


lesão passa a ser prevista no artigo 157 da lei. É definida como a realização de
um negócio jurídico em que uma das partes, por inexperiência ou necessidade,
se obriga à prestação manifestamente desproporcional à prestação oposta.
Diferente da lesão preconizada pela doutrina, a lei não exige que um dos
contratantes se aproveite da inexperiência ou necessidade do outro, ou seja, em
regra, não é exigível o dito elemento subjetivo ao qual a doutrina dava o nome
de dolo de aproveitamento. Na lesão do novo diploma, basta que a parte
prejudicada pelo instituto assuma prestação manifestamente desproporcional,
por falta de experiência, ou em virtude de necessidade, ainda que sem dolo do
outro contratante, sendo essa prestação considerada o elemento subjetivo da
lesão prevista pela Lei n. 10.406/02. A convalidação do negócio realizado
mediante lesão é possível; a uma, em razão de sua anulabilidade, e não
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nulidade; a duas, desde que seja oferecido suplemento suficiente do valor, ou o


consentimento da redução do proveito, pela parte favorecida.

c) O estado de perigo

• Incluído no novo diploma civil, e muito assemelhado, para alguns


doutrinadores, ao estado de necessidade, o estado de perigo tem como
requisitos, para que torne possível a anulação do negócio realizado sob sua
égide: a situação de perigo que torne necessário que um dos contratantes salve a
si próprio, ou alguém de sua família; a solicitação de auxílio à outra parte,
conhecedora do perigo; e a assunção de obrigação excessivamente onerosa em
razão do auxílio.

Quanto à sua validade, três teorias se opõem: uma delas exige a efetividade do
negócio, em razão do brocardo “pacta sunt servanda”; outra, pugna pela
anulabilidade do negócio, se requerida; terceira e intermediária, oriunda da
doutrina italiana, prevê a anulação somente se a obrigação for excessivamente
onerosa, pois, se não houver excesso patente, o negócio se cumpre, e a decisão
sobre ser excessiva ou não a obrigação é do juiz, notadamente quando a
solicitação for realizada com o fim de salvar terceiro que não da família do
contratante (parece ser a teoria adotada pelo texto legal).

d) As modificações relativas ao instituto do erro

• Quanto ao erro de fato, o sistema anterior já admitia que o negócio jurídico


praticado com tal vício fosse anulado.

• O novo código amplia o instituto do erro (artigo 139, inciso III) ao permitir
expressamente que também o erro de direito leve à anulação de determinado
negócio jurídico, desde que, com a anulação, não haja a intenção de descumprir
a lei, uma vez que, com esse fim, a lei não pode ser afastada (ignorantia legis
neminem escusat).

3.5. Prescrição
• Atendendo ao consagrado entendimento doutrinário, o novo diploma, no artigo
189, determina que prescrição não é a perda do direito de ação, mas a perda da
pretensão atribuída ao autor de direito violado, de vê-lo reparado ou protegido.

• Os prazos, instituídos em regras de ordem pública, são inegociáveis, vale dizer,


inalteráveis por vontade das partes (artigo 192).

• O juiz passa a poder suprir a inércia da parte, declarando de ofício a prescrição,


mesmo em se tratando de direitos patrimoniais, se o objetivo for o de favorecer
pessoa absolutamente incapaz (artigo 194). Em relação à prescrição de direitos
não-patrimoniais,verdadeiras causas legais de decadência no ordenamento
pátrio, se e quando previstas, poderá o juiz usar do permissivo legal constante
do diploma processual civil, e declará-la de ofício.
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• Agora com o novo Código Civil, a prescrição é geral, é de 10 anos, não


importando ser a ação real ou pessoal, desde que a lei não estabeleça prazo
menor (artigo 205). Logo, a maior inovação é que não se faz mais a clássica
diferenciação para fins de prescrição de ações reais ou pessoais.

• Também não existe mais dúvida quanto à prescrição e decadência. Todos os


prazos que não estiverem previstos nos artigos 205 e 206 do novo Código Civil
serão considerados prazos decadenciais.

• O artigo 206, § 3.o, inciso V, do novo Código Civil dispõe que prescreve em 3
anos a pretensão da reparação civil de danos, sejam eles materiais e/ou morais.

• O artigo 200 do novo Código Civil traz o que a jurisprudência já entendia acerca
da não-incidência da prescrição, relativa a ato originado em processo penal, até
o trânsito em julgado da respectiva sentença.

• Não esquecer de observar o artigo 2.028 do novo Código Civil que, ao tratar das
disposições finais transitórias, determina a utilização dos prazos do Código
Civil de 1916 aos atos praticados sob sua égide, quando o novo diploma traz
prazo reduzido, ou já correu mais da metade do prazo previsto na lei revogada.

4. DOS COMENTÁRIOS À PARTE ESPECIAL

Um dos maiores problemas a ser enfrentado pelo intérprete, quando do estudo do


texto da Lei n. 10.406/02, será a denominada “antinomia de segundo grau”, assim definida
como o confronto de leis especiais anteriores à nova lei geral, esta última posterior. Assim,
fica a cargo do estudioso a escolha de qual dos critérios para resolução do conflito de
normas deve prevalecer: o critério cronológico ou o critério da especialidade.

A título de orientação, informamos que doutrinadores do jaez de Rosa Nery


determinam que, em regra, as disposições textuais do novo Código Civil devem prevalecer,
e em caso de existência de lacunas, ou quando houver previsão expressa, pelo mesmo, de
manutenção das leis especiais, aí sim estas permanecerão em aplicação.

5. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES

• Houve uma alteração topográfica, isto é, contextual, iniciando a parte especial


do novo Código Civil pela abordagem do Direito das Obrigações (Livro I),
tendo em vista a simetria que guarda com a Parte Geral do Código, sendo
pressuposto para análise dos livros subseqüentes. Por conseguinte, o antigo
Livro I da família foi para o final do código, ao lado do livro das sucessões,

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tendo sido melhor sistematizada a apresentação seqüencial dos livros no novo


Código Civil.

• O Livro I, das obrigações, teve seu texto elaborado pelo eminente jurista
Agostinho de Arruda Alvim, que integrou a comissão revisora e elaboradora do
projeto de 1972.

• A estrutura básica do livro das obrigações foi mantida, de forma que não trouxe
o novo Código Civil modificações profundas a ponto de assustar o exegeta do
direito; sendo assim, vejamos: nenhuma alteração trouxe o Código Civil com
relação às obrigações de dar. Quer nas coisas certas, quer nas incertas.

• Nas obrigações de fazer, em caso de inadimplemento ou mora do devedor, pode


o credor determinar a execução por terceiros às custas do devedor. Acresceu o
legislador a hipótese de poder o credor, em caso de urgência e
independentemente de autorização judicial, executar o fato para depois ser
ressarcido (artigo 249, parágrafo único).

• Nessa mesma linha de raciocínio, no que tange às obrigações de não fazer,


também pode o credor, em caso de urgência, mandar desfazer a prestação do
devedor, independentemente de autorização judicial, para depois ser ressarcido
(artigo 251, parágrafo único).

• Repare que o legislador se preocupou em acrescer as obrigações urgentes,


modernizando os institutos e os adaptando às situações práticas da vida.

• No que tange às obrigações alternativas, no silêncio, a escolha compete ao


devedor e, em havendo pluralidade de optantes, no caso de dissenso entre eles,
compete ao juiz decidir a obrigação de cada um. Também compete ao juiz a
decisão sobre a opção de cada obrigação alternativa na hipótese da opção recair
sobre terceiro que não puder ou não quiser exercê-la (artigo 252, §§ 3.º e 4.º).

• O novo Código Civil apenas acresceu, nas obrigações divisíveis e indivisíveis, o


conceito de obrigação indivisível, que é aquela que tem por objeto um bem não
fracionável, quer por natureza ou por questão de ordem econômica ou pelo
fundamento do negócio jurídico (artigo 258 do Código Civil).

• Houve uma pequena inserção no instituto da solidariedade ativa, determinando,


o legislador do novo Código Civil, que o devedor não pode opor exceções
pessoais a um dos credores solidários (artigo 273), acrescendo, ainda, que
qualquer julgamento contrário ao devedor não atinge aos demais, porém, o
julgamento favorável lhes aproveita.

• No Título II, que trata da transmissão das obrigações, o novo sistema apresentou
um único efeito, estabelecendo que o cessionário pode exercer os atos próprios
de conservação do direito cedido, independentemente do conhecimento da
cessão do devedor (artigo 293).

• Criou, o novo Código Civil, o instituto da assunção de dívida (artigos 299 a


303). O instituto faculta ao terceiro o poder de assumir obrigação do devedor
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com o consentimento expresso do credor, exonerando o devedor primitivo.


Ressalva apenas a hipótese do terceiro estar insolvente e o fato ser desconhecido
do credor. Obviamente, o credor é sempre ouvido para consentir.

• Tratando do objeto do pagamento, estabeleceu o novo Código Civil que as


partes podem convencionar o aumento progressivo das prestações sucessivas.
Porém, em qualquer caso em que houver manifesta desproporção entre o valor
da prestação devida e o do momento de sua execução, pode o juiz proceder
alteração, de modo a evitar prejuízo econômico. Tal instituto está em
consonância com a resolução por onerosidade excessiva (artigos 478 a 480) e o
instituto da lesão (artigo 157, § 2.º).

• Estabelece o novo código a nulidade das convenções que fixem pagamento em


ouro ou em moeda estrangeira, bem como qualquer transação envolvendo a
moeda estrangeira como moeda nacional, salvo expressa previsão em lei
especial.

• Ao tratar do lugar do pagamento, inovou o instituto autorizando que o motivo


grave pode justificar o pagamento em outro lugar não fixado pelas partes, desde
que não acarrete prejuízo para o credor. Caso ocorra o reiterado pagamento em
outro local, presume-se a renúncia do credor ao pagamento no local devido
(artigos 329 e 330).

• Já o artigo 389 do novo Código Civil trouxe grande inovação ao fixar a


responsabilidade civil contratual, determinando que o devedor não só responde
por perdas e danos, caso esteja inadimplente ou em mora, como ainda por juros,
correção monetária e honorários de advogado. A mesma regra parece
especificamente nos prejuízos da mora, no artigo 395 do mesmo códex.

• Ao tratar das perdas e danos, modernizou o novo Código Civil a antiga


nomenclatura do artigo 1.061, que só incluía juros de mora e custas, mais a pena
convencional, e passou a incluir, nas obrigações de pagamento em dinheiro,
correção monetária, os juros e custas já tratados e os honorários de advogado,
além da pena convencional. Ademais, caso os juros de mora não cubram o
prejuízo, poderá o juiz conceder ao credor indenização suplementar (artigo 404
e parágrafo único).

• O novo Código Civil, ao tratar dos juros legais, deixou de falar em 6 % ao ano
(artigo 1.062) passando a falar nos juros fixados por lei, ou fixados segundo a
taxa que estiver em vigor para mora do pagamento de impostos devidos à
Fazenda Nacional (artigo 406).

• No que diz respeito às arras, apresentou a redação do artigo 419 uma novidade
quando determinou que a parte inocente pode pedir indenização suplementar, se
provar maior prejuízo, valendo as arras como taxa mínima. A parte inocente
pode exigir, ainda, a execução do contrato com as perdas e danos, valendo as
arras como o mínimo da indenização.

12
__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

5.1. Contratos
• A teoria geral dos contratos passa a ser disciplinada de outra forma pelo novo
Código Civil, estando os princípios, antes apenas implícitos, agora explícitos no
novo diploma.

• O princípio da autonomia da vontade veio apresentado na primeira parte do


artigo 421, fixando uma liberdade de contratar da parte, porém, com dirigismo
próprio de uma sociedade neoliberal. Esse dirigismo se traduz pelo princípio da
função social do contrato que tem por escopo a função social da propriedade
(artigo 421, última parte).

• O legislador se preocupou com o princípio da boa-fé objetiva, determinando que


as partes, tanto na conclusão como na execução do contrato, ajam com lisura e
total integridade, não como se fossem contendores, mas como se fossem
parceiros. Sob esta ótica, o juiz passa a ter poder de modificar e cancelar
cláusulas que impliquem em devido prejuízo (artigo 422).

• A hermenêutica dos contratos de adesão determina que a interpretação de


cláusulas, pelo menos ambíguas e contraditórias, além das abusivas, deve ser
pro aderente. Ademais, as cláusulas que impliquem renúncia antecipada do
aderente são nulas (artigos 423 e 424).

• A enumeração contratual é aberta, o que garante às partes absoluta liberdade de


criarem contratos atípicos ou inominados, tendo por limite as restrições do
código e, obviamente, de outras normas de ordem pública (artigo 425).

• Ao tratar da proposta, a única inovação do sistema ocorreu por força do artigo


429 do novo Código Civil, que estabeleceu que a oferta ao público equivale à
proposta, vinculando o proponente, desde que preenchidos todos os requisitos
do contrato, porém, podendo ser revogada pela mesma via de sua divulgação.
Obviamente, não altera nada do Código de Defesa do Consumidor, que é mais
benéfico, pois considera bem mais vulnerável.

• O instituto da promessa de fato de terceiro, que só era tratado pelo artigo 929 do
Código Civil, determinando apenas a responsabilidade do promitente quando o
terceiro não executa o prometido, tem agora sua disposição modernizada pelos
artigos 439, parágrafo único, e 440, ao determinar que o promitente não tem
responsabilidade se o terceiro for o cônjuge, que não anuiu no ato cujos efeitos
venham a recair sobre os bens do casal em razão do regime adotado. Também
não há obrigação para aquele que se compromete por outrem, se o
comprometido, depois de dar sua palavra, faltar à prestação. É o caso da pessoa
se responsabilizar pela prestação de serviço de um determinado cantor,
afiançando que este comparecerá no ato. Caso o próprio cantor expressamente
se comprometa, libera o promitente e se responsabiliza pessoalmente pela
obrigação.

• No que diz respeito aos vícios redibitórios, o novo Código Civil apenas
modernizou o instituto no que diz respeito aos prazos. O antigo prazo de 15
dias, contados da tradição, para bens móveis, passou agora para 30 dias, e já não
13
__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

é contado apenas da tradição, sendo contado, ainda, para vícios de difícil


constatação, da ciência do vício. Nesta última hipótese, o prazo é de 180 dias.
Nos bens imóveis, o antigo prazo de 6 meses passou para um ano, contado ou
da tradição, para vícios de fácil constatação, ou do aparecimento do vício, para
os de difícil constatação. Os prazos não correm durante a vigência da cláusula
de garantia, devendo ser denunciados no prazo de 30 dias do seu descobrimento,
sob pena de decadência (artigo 446).

• O novo Código Civil previu a resilição unilateral como forma de extinção do


contrato, exatamente como hoje prescreve a doutrina, podendo uma das partes
desfazer o vínculo contratual sem culpa, independentemente da vontade da outra
parte, desde que a lei não expressamente proíba. Caso tenham ocorrido gastos,
os efeitos correspondentes devem ser produzidos (artigo 473 e parágrafo único).

• A resolução por onerosidade excessiva, que até então só era prevista no Código
de Defesa do Consumidor, vem expressamente tratada no artigo 478 do novo
Código Civil, retroagindo os efeitos até a data da citação.

5.2. Contratos em Espécie


• Não houve qualquer alteração no contrato de compra e venda. Apenas no que
tange às cláusulas especiais, tivemos algumas modificações pontuais. O novo
Código Civil não trata do pacto comissório e nem do pacto de melhor
comprador. No que diz respeito ao Direito de Preferência, estabelece novo
prazo decadencial, não mais de 30 dias, mas de 60 dias, conforme artigo 516.

• Estabelece o novo Código Civil, nos artigos 521 a 528, a venda com reserva de
domínio já nos moldes do sistema atual.

• Os artigos 529 a 532 estabelecem a venda sobre documentos. Aqui, o vendedor


transfere ao comprador o título representativo com a mesma força da
transferência do objeto. Salvo disposição contrária, o pagamento ocorre na
mesma oportunidade.

• O novo Código Civil cria a figura do contrato estimatório. Nessa relação jurídica
o consignatário recebe do consignante bens móveis, ficando autorizado a vendê-
los, obrigando-se a pagar um preço estimado previamente se não restituir as
coisas consignadas dentro do prazo ajustado. É modalidade de contrato real,
pois só se ultima com a entrega da coisa ao consignatário, conservando, o
consignante, a propriedade, até que seja vendida a terceiro pelo consignatário. A
diferença do contrato consignatório para a compra e venda está no fato de que a
tradição do bem móvel consignado não transfere a propriedade.

• No contrato de prestação de serviços, dispõe o artigo 593 do novo Código Civil


que, somente incide as disposições codificadas que não estiverem sujeitas a leis
trabalhistas ou a quaisquer leis especiais.

14
__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

• No que diz respeito ao contrato de mandato, apresentou o novo Código Civil, na


sessão “da extinção do mandato”, uma disposição sobre o mandato com
cláusula em causa própria, dispondo que sua revogação não terá eficácia, bem
como não se extinguirá pela morte de alguma das partes, ficando o mandatário
dispensado de prestar contas e podendo transferir para si os bens móveis ou
imóveis objeto do mandato, obedecidas as formalidades legais.

• Sobre o mandato judicial, estabelece o novo Código Civil que o mesmo fica
subordinado às normas processuais, e só supletivamente ao Código Civil (artigo
692).

• A partir do capítulo IX, o novo Código Civil passa a incorporar alguns contratos
mercantis. O primeiro contrato incorporado é o contrato de comissão, previsto
pelo Código Comercial, nos artigos 165 a 190. O contrato é tratado,
basicamente, como na legislação mercantil. Os artigos 710 a 721 tratam do
contrato de agência e distribuição, em que uma das partes assume a obrigação,
sem caráter eventual e empregatício, por conta da outra parte, e mediante
remuneração, da realização de certos negócios, tratando-se expressamente de
distribuição quando a parte tiver à sua disposição a coisa a ser negociada.

• Os artigos 722 a 729 tratam do contrato de corretagem. O vínculo jurídico da


corretagem obriga uma pessoa, independentemente de mandato, prestação de
serviço ou qualquer subordinação, a cumprir instruções e executar o negócio
estabelecido entre as partes com extrema diligência. Quanto à remuneração, esta
só é devida uma vez atingido o resultado ajustado. Os corretores de imóveis têm
sua disciplina jurídica fixada pela Lei n. 6.530/78.

• O contrato de transporte, já disciplinado pelas Leis n. 7.742/49, 8.632/90,


10.206/01 e 10.233/01, agora também vem com tratamento específico nos
artigos 730 a 756 do novo Código Civil, sendo que as normas do Código Civil
prevalecem sobre as leis especiais (artigo 732 do novo Código Civil).

• A última disposição contratual do novo Código Civil diz respeito ao


Compromisso, porém, o artigo 853 já dispõe que o juízo arbitral deve ser
tratado sob a ótica da Lei n. 9.307/96.

5.3. Dos Títulos de Crédito


• O artigo 887 do novo Código Civil, de maneira acadêmica, apresenta o conceito
de Vivante ao salientar que o título de crédito é todo documento necessário ao
exercício do direito literal e autônomo nele contido, somente produzindo efeitos
quando preenche os requisitos legais. Aqui estão os princípios da cartularidade,
da literalidade e da autonomia.

• De acordo com o artigo 888, caso o título de crédito não contenha algum dos
requisitos mínimos necessários, exigidos pelo artigo 889 do Código Civil, que
poderiam torná-lo nulo, de forma alguma ataca esta nulidade o negócio
ensejador do título.
15
__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

• O novo código salienta que o título de crédito não comportará a inclusão de


cláusula de estipulação de juros, proibindo o endosso, cláusulas que excluam a
responsabilidade pelo pagamento ou despesas e mesmo cláusulas que dispensem
formalidade legal. Tais cláusulas são nulificadas e consideradas não escritas.

• Conforme artigo 892, caso o representante ou mandatário de alguém vier a


assinar título de crédito sem ter poderes para tal, ou excedendo os que tiver,
passará a estar pessoalmente obrigado e a ter os direitos que seriam do suposto
mandante ou representado.

• O artigo 893 prestigia a circularidade do crédito e sua importância para o


desenvolvimento da atividade econômica. A transferência do título garante
todos os efeitos que lhe são inerentes ao transferido.

• Importante a disposição do artigo 895 que, ao prestigiar o princípio da


autonomia, determina que estando o título em circulação, somente ele servirá de
garantia para pagamento da obrigação.

• O artigo 897 trata do instituto do aval, que é garantia cambiária que visa
assegurar pagamento de letra de câmbio ou nota promissória. Uma declaração
cambial escrita na própria cártula, assumindo o subscritor uma obrigação
solidária, garante o pagamento de uma dívida pecuniária. Por óbvio, o aval só
pode se referir ao valor total do débito consignado. O aval deve ser dado de
maneira expressa no verso ou anverso do título. O avalista se equipara ao
emitente ou devedor final.

• Conforme o artigo 902, o credor não tem obrigação de receber pagamento antes
do vencimento do título de crédito. Apenas quando o título vence é que o credor
não pode se recusar a receber, sob pena de incidir em mora. Caso o título sofra
pagamento parcial, muito embora o devedor não tenha direito à entrega da
cambial, terá direito a uma quitação separada e a uma outra firmada no próprio
título, consignando o quantum pago.

• O objeto do novo Código Civil abarca os títulos nominativos, à ordem e ao


portador, disciplina a letra de câmbio, notas promissórias, duplicatas, cheques,
debêntures, conhecimentos de depósitos, conhecimentos de transportes e
warrants; não abarca letras hipotecárias, letras imobiliárias, notas de crédito
rural entre outras.

5.4. Responsabilidade Civil e Dano Moral


Em sede de responsabilidade civil, informamos que, de plano, foi regulada de forma
diversa, em espaço com título próprio (artigo 927 e seguintes do Código de Processo
Civil).

• No que se refere ao dano moral, o artigo 186 do novo Código Civil o menciona,
agora expressamente, tornando-se condizente com as disposições
constitucionais; todavia, tal previsão ainda é insuficiente, ficando a cargo da
16
__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

doutrina o grande trabalho de regular-lhe a aplicação. O novo Código Civil


continua sem citar parâmetros.

• A obrigação de indenizar por ato ilícito vem prevista no artigo 927 do novo
Código Civil.

• A regra continua sendo a responsabilidade subjetiva (artigo 186 do novo Código


Civil). Diz ainda o artigo que como pressuposto da responsabilização está o ato
de “violar direitos e causar dano”. Antes a conjunção era ou (artigo 159 do
Código Civil/1916).

• Determina o artigo 187 do novo Código Civil: “É obrigado a indenizar também


o que abusa de seu direito”. Essa interpretação já era acolhida pela
jurisprudência a contrario sensu dos artigos 160, inciso I, do Código Civil de
1916 e 5.º da Lei de Introdução ao Código Civil.

• O artigo 188, inciso II, do novo Código Civil, acrescenta como hipótese de
exclusão de responsabilidade, em razão de configurar estado de necessidade, a
“lesão a pessoa”. De acordo com o sistema anterior, a previsão legal era restrita
a lesões a coisas, devendo a lesão às pessoas ser acolhida em razão de decisões
jurisprudenciais.

• O Código de Defesa do Consumidor continua em vigor, regendo a


responsabilidade decorrente das relações de consumo, isto porque o novo
Código Civil fez a ressalva em seu artigo 593, permitindo a regulação de tais
relações por meio de lei especial.

• Quanto aos transportes, também continuam sendo aplicáveis as disposições não


só do Código de Defesa do Consumidor, mas também do Decreto n. 2.681/12,
que trata do transporte de passageiros em vias férreas, aplicável analogicamente
a todas as modalidades de transporte. Neste último caso, desde que haja lacunas
nas disposições sobre transporte de pessoas, previstas no novo código. Isto se dá
em razão de expressa ressalva no texto do artigo 732, prevendo a aplicação de
leis especiais.

• O Código de Defesa do Consumidor consagra a responsabilidade objetiva;


todavia, caso haja divergência sobre ser ou não relação de consumo a relação
jurídica causadora da responsabilidade contratual, devem prevalecer as
disposições do novo Código Civil, de acordo com parte da doutrina.

• No caso dos “pingentes” (indivíduos que viajam equilibrando-se no lado externo


dos meios de transporte, a exemplo dos jovens que viajam pendurados nos trens
de subúrbio, muito comum no Rio de Janeiro), a culpa da empresa de
transportes é considerada concorrente, e a indenização poderá ser reduzida à
metade, de acordo com o novo Código Civil, em seu artigo 738, parágrafo
único. É o que deverá prevalecer.

• A regra, conforme dito, continua sendo a responsabilidade subjetiva pelos danos


causados, ou seja, desde que provada a culpa aquiliana. Todavia, o novo Código
Civil traz uma ressalva no artigo 927, parágrafo único, última parte, ao prever a
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__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

hipótese de responsabilização objetiva, além das hipóteses legais, diante de


atividades de risco. Ocasião em que a decisão, ab initio, sobre aplicar as regras
da responsabilidade objetiva ou subjetiva, será do juiz. Assim, de acordo com a
doutrina, o juiz é quem analisa qual a atividade de risco; não havendo
necessidade de previsão inexorável em lei especial.

• No caso de pai, tutor, curador, de acordo com o código atual, a culpa é


presumida (todavia, iuris tantum) em relação aos atos causados por seus filhos,
pupilos e curatelados. Com o novo diploma (artigo 933), responderão
independentemente de culpa (agora a responsabilidade é objetiva).

• O pai não tem ação regressiva contra o filho se este for absoluta ou
relativamente incapaz (artigo 934). Se o filho for capaz, poderá o ascendente
mover a referida ação fundada no direito de regresso.

6. DO DIREITO DE EMPRESA

De acordo com a doutrina, ainda incipiente, em que pese haver grande parcela de
juristas pugnando pela não-entrada em vigor do novo Código Civil, que unifica os sistemas
Civil e Comercial, mesmo com a patente diversidade de objetivos (apoiando-se na
confissão de Vivante, a respeito do erro por ele cometido na Itália, ao unificar os sistemas
Civil e Comercial, trinta anos depois da unificação), outra parte admite a sua futura
vigência, deixando claro que há necessidade de correções. Nesse passo, nota-se a
existência de coerência entre alguns princípios de nosso desenvolvimento econômico e os
princípios adotados pela comissão do Dr. Miguel Reale, quando da redação do projeto do
novo código, em sua parte comercial, a saber:

• Princípio da Efetividade: a norma jurídica, traduzida no direito positivo, só é


efetivamente norma, assumindo seus modais deônticos de permitir, vedar e
determinar, se colocada em prática, como instrumento da sociedade.

• Princípio da Socialidade: o direito, como ciência humana e social, serve para


regular as relações em sociedade e, portanto, na aplicação da lei, devem todos
os operadores, e não só os magistrados, observar o artigo 5.º da Lei de
Introdução ao Código Civil, que determina a observância dos fins sociais a que
a lei se dirige, e as exigências do bem comum.

• Princípio da Eticidade: princípio que embasa a aplicação da ética às relações


humanas; embasador também do princípio da boa-fé, que se expande por toda a
seara jurídica nacional.

• Princípio da Operalidade: princípio que deve traduzir a necessidade de criação


de normas possíveis de serem aplicadas, reais, e não surreais, de forma a
possibilitar a efetividade.

18
__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

Passamos à análise das mudanças em sede de Direito Comercial, de forma tópica:

• A maior alteração trazida pelo novo Código Civil foi a introdução da teoria da
empresa. O Código Comercial, nesta parte derrogado pela nova lei, adota a
teoria dos atos do comércio, ou seja, o comerciante é identificado de acordo
com o ato que pratica; dessa forma, o prestador de serviços não é considerado
comerciante.

• Surge o conceito de empresário, definido como todo aquele que exerce


profissionalmente uma atividade econômica organizada para a produção ou
circulação de bens ou serviços.

• O sistema agora é aplicado ao prestador de serviços, não mais se distinguindo o


comerciante pelos seus atos; utiliza-se o termo genérico empresário.

• Com o novo Código Civil as pessoas jurídicas constituídas com o escopo de


desenvolver atividade econômica serão sociedades empresárias, não
importando o objeto; todavia, se a sociedade não desenvolver atividade
econômica será sociedade simples (exemplo: pessoa jurídica composta por
médico, advogado); em contrapartida, se organizar força de trabalho alheio
constituindo elemento da empresa, será sociedade empresária (exemplo:
Hospitais, Auditorias e Consultorias Legais).

Podemos citar, como exemplo, o médico que contrata enfermeira, telefonista e


motorista. Estes não constituem elementos da empresa, portanto, não formam
uma sociedade empresária, sendo necessário para tanto a organização da
atividade, com a devida contratação de outros médicos. Outro exemplo é
organizar sociedade para administração dos próprios bens, ocasião em que se
configura verdadeira sociedade simples.

6.1. Tipos Societários no Novo Código Civil


• Serão considerados tipos societários pelo novo diploma civil, as Sociedades em
Comandita Simples; em Nome Coletivo; as Sociedades por Quotas de
Responsabilidade Limitada (LTDA); as Sociedades Anônimas (S/A); as
Sociedades em Comandita por Ações; e por fim, as sociedades em Conta de
Participação.

• O novo Código Civil elimina a sociedade de capital e indústria. Em relação às


sociedades subsistentes, as únicas sociedades modificadas pelo novo código
foram as Sociedades em Comandita por Ações, as Sociedades por Quotas de
Responsabilidade Limitada e as Sociedades Anônimas.

6.1.1.Sociedades por quotas de responsabilidade limitada

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__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

• O Decreto n. 3.708/19 será revogado pelo novo código que,por meio dos artigos
1.052 a 1.087, passa a regular este tipo societário.

• Permanece como sociedade contratual, nascendo com o registro de seu contrato


social.

• São fontes de normas da sociedade por quotas o novo Código Civil e o contrato
social. É permitido ao contrato social indicar uma terceira forma normativa
subsidiária, a saber, as regras que regem as sociedades simples. Atualmente, o
artigo 18 do Decreto n. 3.708/19 diz que a Lei das Sociedades por Ações é
aplicada subsidiariamente; sendo revogado, haverá aplicação subsidiária da Lei
das Sociedades Anônimas somente por expressa disposição das partes no
contrato social.

• Continuam a ser pressupostos de existência que justificam as sociedades


limitadas.:

− “affectio societatis”: intenção dos sócios de constituir e manter a sociedade.

− pluralidade de sócios: registra-se ser inadmissível a constituição de uma


sociedade limitada unipessoal.

• O contrato que constitui uma sociedade é plurilateral.

• As sociedades contratuais, são em regra, essencialmente, sociedades de pessoas.


Todavia, no caso das sociedades por quotas de responsabilidade limitada, que a
doutrina define como mistas, estas devem ser definidas como de pessoas ou de
capital após observação de suas cláusulas chaves.

• Quanto à unipessoalidade, cumpre observar que nas sociedades anônimas


admite-se a constituição de uma sociedade unipessoal, a subsidiária integral
(uma sociedade proprietária de todas as ações de uma S/A, sendo sua
controladora).

A Sociedade Anônima é estatutária, constituindo-se por estatuto e regida por lei


especial; a relação jurídica não se dá entre os acionistas, mas entre eles e a
sociedade, pois são sociedades de capital.

• De forma incidental as sociedades limitadas podem se tornar unipessoais, desde


que por prazo determinado. Atualmente, a jurisprudência admite a
unipessoalidade temporária por até 1 ano. Com o novo Código Civil (artigo
1033), o prazo máximo passa a ser de 180 dias da exclusão do segundo sócio,
permanecendo apenas um (exemplo: sócio que falece ou que exerce o direito de
retirada). Se a sociedade remanescer unipessoal, decorridos os 180 dias, deve
ser extinta, dissolvida, todavia, sem a necessária extinção da empresa (assim
considerada em seu aspecto funcional, atividade organizada para o
oferecimento de produtos e serviços), que poderá ser desenvolvida pelo único
sócio como firma, comerciante individual.

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__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

• A adoção da teoria da empresa traz como seu corolário o entendimento de seu


conceito e, nesse passo, cumpre observar a existência de um critério multi-
facetário, criado pelo jurista italiano Asquini, vejamos:

Acepção multi-facetária proposta por Asquini:

Estabelecimento, local físico, patrimônio destinado:

Perfil Objetivo

Empresário, sujeito de direitos que realiza as atividades:

- Perfil Subjetivo

A união de trabalhadores, fundo e empresário:

- Perfil Corporativo

Atividade econômica organizada (adotado pelo novo Código Civil):

- Perfil Funcional

Os direitos inerentes aos sócios das limitadas ficam regulados no texto do novo
código da seguinte forma:

• Em relação à participação nos resultados sociais, nos lucros, se o contrato social


previr a aplicação subsidiária da Lei n. 6.404/76, no mínimo metade dos lucros
da sociedade deverão ser distribuídos entre os sócios (artigo 202 da Lei de das
Sociedades por Ações, com as alterações da Lei n. 10.303/01). Se o contrato
social nada dispuser, a maioria societária é quem decide, ficando a minoria
desprotegida, tal como ocorre nas sociedades simples.

• Sobre a participação nas deliberações sociais, atualmente o sócio minoritário


somente tem direito de deliberar se houver previsão contratual; o novo Código
Civil cria um sistema complexo de deliberações de certos assuntos (não todos),
que devem ser realizados mediante dois instrumentos, a assembléia de sócios ou
a reunião de sócios. Exige ainda a realização inexorável de assembléia de sócios
para determinados assuntos legalmente previstos.

• O rol de assuntos que exigem deliberação por assembléia de sócios não é


taxativo, pois o contrato social pode prever mais hipóteses além das legalmente
explicitadas. Neste rol, figuram hipóteses tais como: aprovação das contas da
administração; designação de administradores, bem como seu modo de
remuneração, quando estipulado em documento diverso do contrato social, em
separado; destituição de administradores; alteração do contrato social; pedido de
concordata, e mesmo de auto-falência, por analogia; fusão, incorporação ou
dissolução da sociedade.

• A deliberação por reunião de sócios é possível mediante expressa disposição


contratual. Se a sociedade contar com mais de 10 sócios, e quando, mesmo com
menos de 10, o contrato social se omitir a respeito, as deliberações
21
__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

necessariamente serão tomadas em assembléia de sócios. Registra-se que as


deliberações tomadas sem tais formalidades não geram efeitos. Em síntese,
para parte da doutrina, com acerto, as novas disposições do sistema civil
revelam um aumento gritante da burocracia atribuída às Sociedades por Quotas
de Responsabilidade Limitada.

• A junta comercial é a responsável pelo controle de utilização das assembléias e


reuniões, pois, é responsável pelo arquivamento das alterações contratuais.

• A reunião ou assembléia é dispensável quando todos os sócios decidirem por


escrito sobre a matéria que nela será deliberada. Assim, evita-se que pequenas
sociedades precisem reunir todos os seus sócios, ou fazer assembléia.

• As assembléias ou reuniões devem realizar-se no mínimo uma vez ao ano, nos 4


meses seguintes ao término de cada exercício social. Há um assunto que deve
ser periodicamente deliberado: a prestação de contas. Exercício social é o
período de apuração dos resultados da sociedade, demonstrações financeiras;
ativo menos o passivo (patrimônio líquido). No Brasil, como regra, o exercício
social corresponde ao ano civil.

Em relação às regras utilizadas para a convocação de assembléias, cumpre destacar,


preliminarmente, que as normas de convocação das assembléias foram acertadamente
instituídas com o acentuado cunho protecionista aos sócios minoritários.

• A convocação deve ser realizada por meio de anúncio a ser publicado no Diário
Oficial do Estado e jornal de grande circulação por no mínimo 3 vezes. Entre a
data do 1º anúncio e a da realização da assembléia, em 1ª convocação, devem
decorrer no mínimo 8 dias. Caso não haja quórum (de ¾) para instalação, a
segunda convocação deve ter 5 dias de antecedência, senão, tudo o que se
deliberar será nulo de pleno direito (qualquer que seja a sociedade, não é
possível a convocação de segunda assembléia para o mesmo dia). Salienta-se
que esta formalidade pode não valer para a reunião de sócios; serão aplicadas
caso o contrato social seja omisso a respeito.

• O contrato social poderá prever a reunião de sócios e trazer suas regras


específicas. Se o contrato for omisso, deverá haver assembléia, se for omisso
quanto a reunião de sócios, não pode haver a disposição sobre suas regras
específicas.

• Uma vez comparecendo todos os sócios fica suprida qualquer nulidade na


convocação, bem como quando se declararem cientes, por escrito, a respeito da
realização da assembléia, em ata ou previamente (regra semelhante à prevista na
Lei das Sociedades Anônimas).

• Em se tratando do quórum para deliberação dos assuntos em assembléia,


cumpre observar que são diversos do quórum de instalação; vejamos:

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__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

- 3/4 do capital social: alteração do contrato social; fusão, incorporação


ou dissolução da sociedade (não impede que o contrato social exija quórum
maior).

- mais de metade do capital social: designação de administradores


quando feita em ato separado (e não no contrato social), bem como a fixação
de sua remuneração, nessas condições; destituição dos administradores;
pedido de concordata.

• Assim, observa-se que o administrador pode ser eleito no contrato social,


ocasião em que será observado o quórum de ¾; ou em documento apartado, em
que o quórum deverá ser de mais de metade.

• Os demais assuntos serão aprovados por maioria simples dos presentes.

• A fiscalização e administração da sociedade são realizadas fundamentalmente


por dois mecanismos: a prestação de contas (artigo 1.020 do Código Civil), e o
exame de livros da sociedade (artigo 1.021 do Código Civil).

• Pelo Decreto n. 3.708/19, o gerente presta contas quando deixa o cargo, salvo se
o contrato social estipular periodicidade; fora desse período, as contas somente
podem ser prestadas judicialmente; o novo Código Civil altera tais disposições,
trazendo a periodicidade.

• Outra modificação trazida pelo novo Código Civil é a instituição do Conselho


Fiscal aplicável às sociedades por quotas de responsabilidade limitada, que deve
ser composto por no mínimo 3 membros eleitos pela assembléia ou reunião de
sócios.

• O Conselho Fiscal é órgão facultativo e não obrigatório, é considerado


verdadeiro órgão de assessoria das sociedades, e tem por funções fiscalizar a
gerência da sociedade, pedir informações aos administradores, examinar os
livros sociais, dar parecer sobre as contas dos administradores, indicando fraude
ou erro se houver.

• Não podem participar do Conselho Fiscal o impedido de exercer atividade


comercial e os administradores. A lei admite terceiro não sócio como membro
do conselho, a exemplo da empresa de auditores.

• Os sócios minoritários que representem no mínimo 20% do capital social, terão


direito de eleger um membro do Conselho Fiscal em separado (política de
proteção ao minoritário).

• É instituído o direito de preferência na subscrição de capital social, e seu


objetivo é a manutenção da participação societária. Tal prerrogativa deve ser
exercida nos 30 dias seguintes à deliberação sobre o aumento do capital. O
Decreto n. 1.800/96 estabelece que uma das cláusulas essenciais do contrato
social é a que estipula o capital social; se o direito de preferência não for
exercido por algum sócio, será transferido aos demais que poderão exercê-lo
nos 30 dias subseqüentes; se nenhum dos sócios exercer o direito de preferência
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__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

nesse prazo (60 dias), o capital social poderá ser subscrito por terceiros, se o
contrato permitir ou os sócios remanescentes autorizarem, caso contrário não se
aumenta o capital social.

• É regulamentado também o direito de retirada: na Sociedade Limitada os


dissidentes se retiram, nas Sociedades Anônimas vendem suas ações. Na lei
antiga a cisão não gerava direito de retirada, o que parece ter se tornado
admissível com a nova lei.

• A gerência das limitadas é o órgão de manifestação da vontade da sociedade.


Pelo Decreto n. 3.708/19, somente o sócio pode ser gerente, daí a expressão
“sócio-gerente”; a gerência por terceiros pode ser exercida somente por
delegação de poderes do sócio gerente, sendo denominado “gerente-delegado”
(além do sócio-gerente delegante). A existência de gerente-delegado é
obrigatória na hipótese de sócios estrangeiros; se o contrato não indicar, gerente
são todos os sócios.

• Em síntese: com o novo Código Civil, as modificações em sede de gerência são


modificações de vulto, inclusive podendo o gerente ser sócio ou não-sócio.

• Aponta o texto legal formalidades para nomeação do gerente: para a nomeação


por alteração do contrato social é necessária a anuência de no mínimo ¾ do
capital social; se em documento separado, mais da metade do capital social.
Para a nomeação de não-sócio como gerente, exige-se unanimidade do capital
social, se este capital não estiver integralizado em sua totalidade, ou aprovação
de 2/3 se estiver integralizado.

• Outra inovação do Código Civil é a adoção da teoria ultra vires: uma sociedade
não se responsabiliza pelos atos praticados pelo administrador, em nome da
empresa, em desacordo com seu objeto social. Até então não era aplicada; o
terceiro prejudicado deveria requerer perdas e danos perante a sociedade e esta
se ressarcia em regresso do sócio.

• Dispõe o artigo 1.015 do novo Código Civil que, se a sociedade limitada estiver
sujeita ao regime suplementar aplicável às sociedades simples, ela não
responderá pelos atos praticados em seu nome e que forem evidentemente
estranhos ao seu objeto social (definição legal da teoria acima referida).

• Por outro lado, caso seja aplicável em caráter suplementar a Lei n. 6.404/76, a
sociedade sempre responderá perante terceiros, com possibilidade de
ressarcimento. Em síntese: há a opção de adotar as regras subsidiárias da Lei
das Sociedades Anônimas, afastando a aplicação desta teoria. Desta feita,
confrontam-se dois princípios, a saber, o da adstrição ao objeto social, e a
teoria “ultra vires”. No Brasil, há clara aceitação da adstrição ao objeto inicial
que, por conseguinte, deve ser determinado. Todavia, com a adoção da teoria
“ultra vires”, o objeto tem sido ampliado, nos países que a adotam, uma vez que
o mercado faz exigências de garantia àqueles que contratam com as empresas
para que não haja, nem mesmo hipoteticamente, a preterição do terceiro de boa-
fé, o que acaba por desnaturar o instituto.

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__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

7. DO DIREITO DAS COISAS

7.1. Posse e Propriedade


Quanto à posse, pode-se dizer que as modificações foram absolutamente tópicas,
sem modificações de fundo. As mudanças significativas vieram quanto à propriedade.

7.1.1. Usucapião
• O novo Código Civil traz a figura da Usucapião e a figura da “desapropriação
privada”. O novo Código Civil fala em ‘a’ usucapião, como palavra feminina,
devendo esta ser a acepção utilizada.

• Existe hoje a figura da usucapião extraordinária de imóvel, prevista no artigo


550 do Código Civil de 1916, exigindo o prazo de prazo de 20 anos para sua
declaração.

• Existe também a usucapião ordinária, cujos requisitos não presumidos de


demonstração necessária são a posse, justo título e boa-fé. O prazo de posse é
de 15 anos entre ausentes e 10 anos entre presentes, conforme previsão do artigo
551 do código de 1916.

• Também existe a previsão de usucapião especial no texto da Constituição


Federal: a usucapião especial urbana (pro misero), prevista no artigo 183 da
Constituição, e a usucapião especial rural (pro labore), de acordo com o texto
do artigo 191, que aponta como requisitos: imóvel rural, área de até 50 hectares,
5 anos de posse e utilização como sua moradia, impossibilidade de o adquirente
possuir outro imóvel e necessidade da a pessoa tornar a área produtiva (por isso
denominado “pro labore”).

7.2. A Usucapião no Novo Código Civil

7.2.1. Extraordinária comum (artigo 1.238)


• Para fins de usucapião extraordinária comum, exige-se posse pacífica por 15
anos (antes eram 20 anos. Artigo 550 do Código Civil), havendo presunção dos
demais requisitos, a exemplo do justo título e da boa-fé. Assim, o prazo máximo
de usucapião no Brasil passa a ser de 15 anos.

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__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

7.2.2. Extraordinária especial (artigo 1.238, parágrafo único)


• Para a usucapião extraordinária especial, exige-se posse por 10 anos, além de
dever ser o imóvel utilizado como moradia ou que o adquirente tenha lhe dado
destinação produtiva, mediante obras ou serviços.

7.2.3. Ordinária comum (artigo 1.242)


• Exige-se para fins de usucapião ordinária comum a posse por 10 anos, justo
título e boa-fé.

7.2.4. Ordinária especial (artigo 1.242, parágrafo único)


• A usucapião ordinária especial exige posse por 5 anos; todavia, o possuidor,
além de boa-fé deve ter o imóvel registrado em seu nome, com posterior
cancelamento do registro; o imóvel deve ser utilizado como moradia e devem
ter sido realizadas obras e serviços de interesse social e econômico.

7.2.5. Especial urbana (artigo 1.240)


Anteriormente prevista no artigo 183 da Constituição Federal.

7.2.6. Especial rural (artigo 1.239)


Anteriormente prevista no artigo 191 da Constituição Federal.

Com a entrada em vigor do novo Código Civil, prevista para o dia 11.01.2003,
surgem dúvidas sobre qual lei deve ser aplicada, para que se estabeleça o prazo da
prescrição aquisitiva (usucapião). Para a dúvida, aponta-se a seguinte solução: se na data
da entrada em vigor da nova lei já correu mais da metade do prazo, aplica-se a lei velha. Se
tiver corrido menos da metade do prazo, aplica-se a lei nova.

• Assim, quem estiver há 9 anos na posse , vai faltar-lhe-ão 6 anos para usucapir
(para completar 15 anos, de acordo com a lei nova), e a pessoa que estiver há 11
anos na posse levará 9 anos para usucapir (para completar 20 anos, de acordo
com o código antigo). A doutrina considera, com razão, uma verdadeira
injustiça tal previsão, e neste ponto critica o novo Código Civil (artigo 2.028).

• Para a usucapião extraordinária especial e ordinário especial, que são hipóteses


novas trazidas pelo novo Código Civil, o prazo anterior à entrada em vigor do
novo Código Civil será contado e, seja qual for o prazo corrido, será
acrescentado de 2 anos (artigo 2.029). Assim, o proprietário, nesses 2 anos, tem
de tomar providências para que seu imóvel não seja usucapido.
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__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

7.2.7. Usucapião especial urbana coletiva


• Não encontra previsão no novo Código Civil. Está no Estatuto da Cidade,
instituído pela Lei n. 10.257/01. Para a sua ocorrência, exige-se a posse coletiva
de área de mais de 250 m², pelo prazo de 5 anos, ocupada por população de
baixa renda para sua moradia, desde que seus integrantes não possuam outro
imóvel.

À primeira vista, parece algo tétrico, ao menos do ponto de vista fático, de


circulação de riquezas. Todas as pessoas irão usucapir e cada um irá receber
uma fração ideal do imóvel (artigo 10, § 3.º). Todavia, a diferença de perímetro
das unidades, em termos fáticos, não corresponderá à posse, a exemplo de dois
indivíduos que, em uma favela, possuam barracos de metragem diferente. Será
formado um condomínio de coisa indivisível, que só poderá ser extinto por 2/3
dos condôminos (artigo 10, § 4.º).

• É prevista a figura da desapropriação privada. Na usucapião, o possuidor se


torna proprietário sem pagar. Na desapropriação privada, o possuidor torna-se
proprietário depois de justa indenização.

• A desapropriação privada exige extensa área (expressão vaga); ocupada por


número considerável de pessoas (expressão vaga); boa-fé; prazo de 5 anos; que
os possuidores tenham realizado obras e serviços considerados pelo juiz de
interesse social e econômico relevante. Além de bastante criticado, o instituto
ficou esvaziado pela criação da usucapião especial coletiva, porque nesta o
proprietário não paga um centavo.

• Outra mudança considerável é do artigo 1.255, parágrafo único. Antes, o solo


era considerado a coisa principal. Agora, se a construção ou plantação exceder
consideravelmente o valor do terreno, aquele que, de boa-fé, plantou ou
edificou, adquirirá a propriedade do solo, mediante pagamento de indenização
fixada judicialmente, se não houver acordo.

• Novidade também traz o artigo 1.258. Se a construção feita parcialmente em


solo alheio invade proporção que não exceda 1/20, adquire o construtor de boa-
fé a propriedade da parte do solo invadido. Receberá o proprietário do imóvel
invadido, neste caso, a indenização e o valor da desvalorização da área
remanescente. Se o construtor invadir a área de má-fé, adquire a propriedade,
mas pagará 10 vezes o valor da área invadida (artigo 1.258, parágrafo único, do
novo Código Civil). Ressalta-se o caráter punitivo.

7.3. Direito de Superfície


• O direito de superfície é modalidade de direito real sobre coisa alheia de fruição,
instituído pelo novo diploma civil e por leis especiais, com a finalidade de
agilizar a circulação de riquezas e substituir o instituto da enfiteuse.

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__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

• O Estatuto da Cidade, Lei n. 10.257/01, prevê o direito de superfície. No


diploma civil, é tratado pelo artigo 1.369 e seguintes do novo Código Civil.

• Uma grande diferença com a enfiteuse é que no direito de superfície não poderá
ser estipulado pelo concedente, a nenhum título, qualquer pagamento pela
transferência deste a terceiros, a exemplo do laudêmio exigível na enfiteuse.

• Pelo direito de superfície, o proprietário transfere ao superficiário o direito de


plantar e construir em seu terreno, temporária ou permanentemente, de forma
onerosa ou gratuita.

7.3.1. Características
• É um direito real: deve haver registro no Cartório de Registro de Imóveis (artigo
1.369). Mais uma vez, o novo Código Civil prestigia a escritura pública, como
forma de prestigiar a publicidade dos direitos reais e torná-lo oponível erga
omnes.

• É temporário: o Estatuto da Cidade dispõe que pode ser por tempo


indeterminado. O artigo 1.377 dispõe que prevalece a lei especial. Portanto,
pode ser permanente para o imóvel urbano. Desse modo, conclui-se que, para
instituição sobre imóvel rural, deve ser por tempo determinado (temporário).

• Oneroso ou gratuito (artigo 1.370): se nada for estipulado, presume-se gratuito.

• Transferibilidade: o superficiário pode alienar a terceiros (artigo 1.372).

• Perempção: direito de preferência (artigo 1.373). Caso haja venda sem a devida
preferência, caberá ação anulatória, no prazo de 6 meses a partir do registro da
transferência. O direito de preferência é conferido tanto ao proprietário como ao
superficiário.

• Transmissão causa mortis: tanto aos herdeiros do proprietário quanto do


superficiário, é transmitido o direito de superfície (artigo 1.372, parte final).

Mesmo que o contrato não possua a previsão de indenização, esta deve ocorrer em
rescisões antes do prazo, porque não pode haver enriquecimento ilícito, sem causa, de
acordo com a principiologia do sistema civil (artigo 1.375).

8. DIREITO DE FAMÍLIA

As disposições acerca do Direito de Família, no novo Código Civil, apresentam


excelente divisão sistêmica, pois o código trata, em primeiro lugar, das disposições gerais;
a seguir, as disposições referentes às pessoas; e por fim, trata das disposições patrimoniais.

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Antes, esse ramo era tratado no Livro I da Parte Especial. No novo Código Civil será
disciplinado no Livro IV da nova parte especial.

8.1. Disposições Gerais (Artigos 1.511 a 1.516)


• As disposições gerais trazem princípios relativos ao casamento, considerado
principal forma de constituição de família, chamado pelo código de “comunhão
plena de vida”. Podemos verificar, nas disposições da nova lei, verdadeiro
fomento ao instituto do casamento, notadamente nas restrições impostas à união
estável, como forma de facilitar sua conversão em casamento.

• O artigo 1.511 traz o princípio da igualdade dos cônjuges, baseado na igualdade


de direitos e deveres. Isto servirá de base para todos os demais artigos. Regula
na esfera civil as disposições do artigo 226, parágrafo 5.º, da Constituição
Federal. Havendo dúvidas nas decisões dos cônjuges, o juiz é chamado a
decidir, não havendo mais a primazia do sexo masculino.

• O princípio da acessibilidade vem expresso no artigo 1.512, e prevê a gratuidade


de habilitação e celebração, já vigentes no atual sistema, trazendo como
novidade, a partir da vigência da Lei n. 10.406/02, a gratuidade do registro.

• A inviolabilidade das relações matrimoniais é erigida à categoria de princípio


atinente à família (artigo 1.513), sem a possibilidade de intervenção de qualquer
pessoa de direito público ou privado. Excepcionalmente, nas hipóteses legais,
submeter-se-ão ao Judiciário.

• O artigo 1.514 resolve um grande problema que a doutrina sempre levantou


sobre ser a declaração do celebrante apenas uma formalidade, ou efetivamente
constitutiva do matrimônio. De acordo com o texto legal, o casamento é
considerado pronto e acabado somente após a declaração dos nubentes e a
manifestação do celebrante (acabou a polêmica).

• Artigos 1.515 e 1.516 – no casamento religioso com efeitos civis é necessário


registro e deve haver habilitação prévia ou posterior. Antes a Lei de Registros
Públicos tratava o assunto, e o prazo era de 30 dias. Hoje, o prazo é de 90 dias.
Se perder o prazo, deve haver nova habilitação. Sem habilitação prévia, o
registro é feito a qualquer tempo. Portanto, esses 90 dias são contados da
celebração do casamento em que houver habilitação prévia.

• Artigo 1.517 – Por meio das disposições deste artigo, iguala-se a idade núbil,
que agora é de 16 anos, tanto para mulher quanto para o homem. Assim, tal
dispositivo tem o fim de proteger a maturidade sexual dos nubentes. Entre 16 e
18 anos, é necessário autorização para o casamento, a ser fornecida pelos pais,
ou mesmo pelos guardiões dos menores, e em caso de recusa injustificada,
pode-se pedir ao juiz que supra a autorização. Entende-se tal autorização como
revogável até a celebração do casamento. Por fim, observa-se que a autorização
para o casamento é diversa da autorização para a celebração do pacto
antenupcial, prevista no artigo 1.654 do novo diploma.
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__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

• De acordo com as previsões do artigo 1.520, a respeito das exceções à


observação da idade núbil, podem os nubentes se casarem abaixo da idade
núbil, desde que haja suplementação de idade pelo juiz, em dois casos:

− evitar imposição de pena criminal, assim entendida em sentido amplo (já


existente);

− em caso de gravidez (novidade operada pelo sistema).

Ressalta-se que esse rol é taxativo, não admitindo, em regra, ampliações.

8.2. Impedimentos Matrimoniais


• Houve grandes alterações no que se refere aos impedimentos matrimoniais,
notadamente nos que se referem a causas impeditivas do casamento, tornando-o
anulável ou apenas sancionado.

• O artigo 1.521 do novo diploma só trata de impedimentos que, na legislação de


1916 são chamados de absolutamente dirimentes (artigo 183, incisos I a VIII, do
Código Civil de 1916).

• Os impedimentos relativamente dirimentes (antigos incisos IX a XII do artigo


183) não impedem mais a realização do casamento, todavia, tornam o instituto
passível de anulação.

• Não existe mais a hipótese do artigo 183, inciso VII, que previa a
impossibilidade de casamento entre o cônjuge adúltero com o seu co-réu, por tal
condenado; assim, as sanções decorrentes do instituto do adultério, na seara
civil, restringem-se a efeitos internos, ocorrentes na separação.

• As demais hipóteses são tratadas como causas suspensivas. Os antigos


impedientes ou proibitivos 183, incisos XIII a XVI, são tratados agora no artigo
1.523 do novo código. O inciso XVI , que impossibilitava o casamento de
juízes, escrivães e seus familiares com órfãos ou viúvas, sem autorização da
autoridade judiciária superior, deixa de existir.

• No artigo 1.523, inciso III, há a previsão de não poder casar o divorciado


enquanto não houver partilha dos bens do casal. Essa é a novidade. Todavia, é
perfeitamente possível ocorrer o divórcio sem prévia partilha dos bens, de
acordo com a Súmula 197 do Superior Tribunal de Justiça, ratificada pelo texto
do artigo 1581 do novo código. Os antigos impedimentos “impedientes ou
proibitivos”, que previam sanções como a perda do usufruto em caso de não
haver prévia partilha, a aplicação de multa etc, deixam de existir como sanções
próprias em capítulos; a única sanção prevista nas disposições patrimoniais
acerca do direito de família que prevalece é a adoção da separação legal
obrigatória de bens, em tais casos.

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__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

• Abre-se aos nubentes, sobre os quais pairam os antigos impedimentos


meramente impedientes ou proibitivos, de acordo com o parágrafo único do
1.523, a possibilidade de solicitar que não lhes seja aplicada a sanção referente
ao regime de bens, caso não haja prejuízo a terceiros, ocasião em que não se
aplicam as novas regras que dizem que os nubentes, naquelas hipóteses, não
devem casar, nem as sanções.

8.3. Quanto à Habilitação do Casamento


• Com certeza, a maior novidade a respeito da habilitação para o casamento está
prevista no artigo 1.526, qual seja: haverá necessidade de homologação judicial.

• Os documentos a serem apresentados e o procedimento permanecem iguais.

• Nos termos do artigo 1.528, é aplicada a responsabilidade civil ao oficial de


registros em caso de descumprimento de suas funções. Assim, o oficial deve
cumprir a função de esclarecer todas as causas absolutamente impedientes, de
anulação e suspensivas do casamento aos nubentes, além de exaurir as
informações a respeito da multiplicidade de regimes e livre estipulação deste.

8.4. Da celebração do Casamento


• Em relação às testemunhas, prevê o artigo 1.534, § 2.º, que, se o casamento for
em edifício particular, ou se um ou ambos os cônjuges forem analfabetos, o
número de testemunhas necessárias para a ratificação do ato passa a ser 4
pessoas (antes era 2).

• Nos termos do artigo 1.539, nos casamentos realizados com a presença do oficial
em casos de urgência, em razão de moléstia grave de um dos nubentes, o
número de testemunhas necessário é de 2 pessoas, que saibam ler e escrever
(antes era 4).

• O artigo 1.540 prevê que o casamento nuncupativo (in extremis) se realiza na


presença de 6 testemunhas (número igual). O que mudou é que essas
testemunhas não podem ser parentes em linha reta ou na linha colateral até 2.º
grau de qualquer dos nubentes. Com isso, derroga-se a Lei de Registros
Públicos no tocante a essa matéria. Ressalte-se que só neste caso é que existe
restrição a testemunhas familiares.

• As testemunhas do casamento nuncupativo têm de comparecer na presença do


juiz, para ratificar o ato que presenciaram, no prazo de 10 dias, nos termos do
artigo 1.541 (antes era de 5 dias o prazo de ratificação).

• Em relação ao artigo 1.542, que prevê a possibilidade do casamento por


procuração, as modificações são as seguintes: A lei exige agora instrumento
público, com poderes especiais (antes podia ser instrumento particular); também
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__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

só será revogada a procuração por instrumento público (parágrafo 4.º); e, se


houver revogação, e mesmo assim ocorrer o casamento, o outorgante arcará com
perdas e danos (parágrafo 1.o), além deste ato ser anulável (artigo 1.550 do novo
Código Civil). Registre-se que antes era considerado ato inexistente, por falta de
consentimento.

• O prazo do mandato outorgado ao mandatário para o casamento é de 90 dias, de


acordo com salutar disposição da lei.

• Prevê o artigo 1.543 que a prova do casamento se dá pela certidão de registro,


em regra. Foi retirada do texto a expressão “feito ao tempo de sua celebração”
(artigo 202 do Código Civil), valendo, assim, os registros posteriores, a exemplo
do casamento religioso feito sem habilitação prévia.

• O casamento de brasileiros nos consulados devem ser registrados no país em 180


dias, a contar da volta de um ou ambos ao Brasil, no cartório do respectivo
domicílio ou, em sua falta, no 1.º Ofício da Capital do Estado em que passarem a
residir (novidade operada pelo texto do artigo 1.544). Neste caso, a celebração
de casamentos de brasileiros no exterior é obrigatoriamente realizada pelos
cônsules brasileiros.

8.5. Sobre a Invalidade do Casamento


O artigo 1.548 do novo Código Civil considera nulo o casamento:

I – quando um dos cônjuges sofrer de enfermidade mental que o prive de


discernimento para a prática dos atos da vida civil.

* Entende-se como enfermidade mental, para os fins deste artigo, a deficiência


mental completa, causa de incapacidade absoluta. Nesse passo, importante observar que,
em caso de casamento com enfermo já interditado, o casamento será nulo, e na hipótese de
matrimônio contraído com enfermo ainda não interditado será, a depender da hipótese,
nulo ou anulável.

II – Com infringência de impedimentos, previstos no artigo 1.521, I a VII.

A incompetência ratione loci do celebrante deixa de ser causa de nulidade do


casamento, passando a ser considerada causa de anulabilidade.

A respeito da possibilidade de reconhecimento pelo juiz, de ofício, da nulidade do


casamento, antes impossível, por não haver o Código disposto a respeito, pode haver quem
pense ser possível a partir da vigência da nova lei o.

O artigo 1.550 considera o casamento anulável:

I – Quando não possuem os nubentes a idade núbil (16 para homem e mulher). O
Código prevê o prazo de 180 dias para anular o ato. Contados para o menor, a partir dos
16 anos e para o representante, a partir da celebração.
32
__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

II – Quando houver casamento sem autorização do representante. Com efeito,


entre 16 e 18 anos de idade será preciso autorização. Se os nubentes se casarem sem esta,
o casamento é anulável no prazo de 180 dias.

III – Havendo vício da vontade. Só é anulável o casamento por erro essencial ou


coação. Os erros essenciais são os mesmos que já existem, com exceção do defloramento
da mulher, tardiamente afastado do texto formal (artigos 1.556 e 1.557 do novo Código
Civil). O prazo de anulação em relação ao erro essencial é de 3 anos (antes eram 2 anos).
Quanto à coação, o prazo é de 4 anos.

* Houve pelo novo texto legal a previsão de outro erro essencial à pessoa do outro
cônjuge, no artigo 1557, inciso IV, qual seja, a ignorância pelo outro cônjuge, de doença
mental grave que torne insuportável a vida em comum, assim entendida como psicopatia,
depressão, neurose, psicose maníaco-depressiva, todavia, fora da questão volitiva, do
discernimento, uma vez que esta é denominada enfermidade mental, e é causa de nulidade
do ato, nos termos do artigo 1.548, inciso I.

IV – do incapaz de consentir. Assim, anula-se o matrimônio realizado com a pessoa


embriagada, hipnotizada, sob efeito de entorpecentes, etc.

V – casamento por procuração quando esta já foi revogada, salvo se houver


coabitação entre os cônjuges. Assim, é previsto no texto legal uma hipótese
arrependimento fático da revogação do mandato outorgado para fins de casamento. O
prazo de anulação é de 180 dias a contar da ciência da celebração.

VI – por incompetência do celebrante. Antes era hipótese de nulidade, agora é


prevista como causa de anulação. A incompetência deve ser territorial e não funcional. O
prazo é de 2 anos a contar da celebração. Há no texto exceção à anulabilidade de
casamento do casamento celebrado por autoridade incompetente, prevista no artigo
1.554, a saber: quando, mesmo incompetente, tiver realizado o casamento e efetuado o
registro deste ato, como forma de proteção ao consagrado princípio da aparência.

8.6. Eficácia do Casamento


Dentre os inúmeros efeitos que o casamento possui, cabe ressaltar aqueles que
foram trazidos ao texto legal em virtude de modificações anteriores por meio de leis
esparsas e pela própria Constituição Federal, pautados em princípios como a igualdade de
direitos e deveres dos cônjuges, a possibilidade de outras formas legais de constituição de
família, a extinção dos bens reservados, a não-representação e a não-decisão de
determinadas opções da sociedade conjugal pelo homem (a exemplo do domicílio), isso a
título de exemplo.

• O artigo 1.565, § 1.º, determina que qualquer dos nubentes pode acrescer ao seu,
o sobrenome do outro. Assim, a regra tradicional de a mulher acrescer somente
os apelidos de família do marido resta revogada, em razão da modificação dos
costumes.

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__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

• O § 2.º do artigo acima descrito, por sua vez, determina, em consonância com as
disposições do artigo 227, § 7.º, da Constituição, ser o planejamento familiar
uma livre decisão do casal, todavia, deve a doutrina e o aplicador da lei orientar
que se atenda, sempre que possível, aos princípios do texto constitucional a
respeito da família e da criança.

• O artigo 1.566 trata dos deveres recíprocos a serem observados pelos cônjuges.
Além da manutenção dos deveres já existentes no texto legal de 1916, exige,
agora de modo expresso no inciso V, o respeito e consideração mútuos.

• O casamento putativo, tratado no artigo 1.561, tem por base o princípio da boa-
fé. Assim, o casamento nulo ou anulável produz efeitos relativos ao cônjuge que
o contraiu de boa-fé, e mesmo que ambos estivessem de má-fé, no caso de
haver filhos desse casamento, em relação a estes, surte todos os seus efeitos.
Ressalte-se que o cônjuge de má-fé não herda dos descendentes e não adquire
pátrio poder, que no novo código é denominado poder familiar, conforme
oportunamente se verá.

• O artigo 1.568 determina que os cônjuges são obrigados a concorrer, na


proporção dos seus bens e rendimentos, para o sustento e manutenção da família
e dos filhos. Assim, busca-se não só a proporcionalidade, mas a verdadeira
isonomia substancial entre os deveres dos cônjuges.

• O dever de coabitação permanece como um dos deveres básicos do instituto do


casamento, todavia, o artigo 1.569 determina hipóteses em que há possibilidade
de ausência do domicílio conjugal por um dos cônjuges sem quebra deste dever,
a exemplo dos encargos públicos, do exercício de profissão em local diverso e
os interesses particulares relevantes.

8.7. Dissolução do Casamento


Antes do estudo dos tópicos a seguir, vale dizer que a Lei n. 6.515/77, denominada
Lei do Divórcio, fica apenas derrogada pelo novo Código Civil, pois há a possibilidade de
aplicação de seus dispositivos em todos os casos omissos, ou seja, nas lacunas existentes
na nova legislação civil.

• Registra-se uma mudança de concepção em relação à manutenção do nome em


caso de divórcio, pois, com a nova lei, a regra passa a ser a manutenção do
nome em caso de divórcio, devendo haver requerimento do interessado para que
o juiz determine a retirada do nome do outro cônjuge, conforme previsão do
artigo 1.571, § 2.º, do novo diploma.

• De acordo com o texto do artigo 1.572, não existe mais a expressão “conduta
desonrosa” como causa de anulação de casamento. Todavia, esta permanece no
texto do artigo 1.573 como fato gerador da impossibilidade da vida em comum.

• O § 2.º do artigo 1.572, determina mudanças nas regras da separação judicial


remédio (divortium bona gratia): o prazo cai de 5 para 2 anos nos casos de
34
__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

grave enfermidade de cura improvável. Restringe-se a impossibilidade de


meação ao cônjuge que requer a separação, no caso de comunhão universal,
apenas à separação remédio, permitindo o novo texto a meação nos casos de
separação falência.

• O artigo 1.574 reduz o prazo de casamento exigido para que seja possível a
separação consensual: agora se exige apenas um ano de casados (antes eram 2
anos).

• Em relação à perda do direito ao uso do nome pelo cônjuge culpado, houve


grande modificação, pois o texto do artigo 1.578 prevê que o culpado pela
separação pode manter o nome do outro cônjuge, só perdendo o direito ao uso
do nome do outro se houver pedido deste, e desde que não haja prejuízo,
devidamente tipificado nas hipóteses descritas em seus incisos I, II e III, do
artigo 1.578.

• O dispositivo constante no texto do artigo 1.580 determina que o divórcio por


conversão de separação pode ser requerido após um ano, contados da separação
judicial ou da medida cautelar que determina a separação de corpos. Desta feita,
registra-se um pequeno retrocesso da lei em estudo, uma vez que não mais
permite a contagem do prazo de qualquer medida cautelar solicitada em relação
a atos dos cônjuges, mas somente da cautelar de separação de corpos.

• O artigo 1.581 determina que o divórcio pode ser concedido sem que haja
partilha dos bens, trazendo para o texto legal o entendimento que já havia sido
sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça, no enunciado de número 197.

• Em relação à proteção aos filhos, determinada nos artigos 1.583 a 1.590, a nova
regra geral confere amplo poder de decisão ao juiz, para que possa determinar a
melhor medida a bem dos filhos (artigo1.586). Afasta-se, como regra, o critério
materno para conferir guarda de crianças, bem como ficam afastadas, a priori,
as regras sobre culpa, preexistência de guarda de fato, entre outras. Não
podendo o menor ficar com os pais, o juiz deve se utilizar dos critérios do
parentesco, da afinidade e da afetividade, para determinar a quem será conferida
a guarda do menor, conforme determina o parágrafo único do artigo 1.584.

• A diferenciação clássica dos alimentos entre naturais (indispensáveis a


sobrevivência) e civis ou “côngruos” (em sentido amplo) prevalece, conforme
se verá. Nesse passo, inova o artigo 1.704, ao determinar que o cônjuge culpado
pela separação pode requerer do cônjuge inocente alimentos; todavia, somente
os alimentos considerados naturais, ou seja, somente os que forem
indispensáveis para sua sobrevivência.

8.8. Relações de Parentesco


Em sede de parentesco não houve grandes modificações, exceto no que tange aos
graus e relativas a questões matrimoniais. Vejamos:

35
__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

• O artigo 1.592 reduz o número de graus de parentesco da linha colateral, ao


determinar serem parentes somente os colaterais até 4.º grau (antes eram
parentes até 6.º grau). Na linha reta, o parentesco se estabelece ad infinitum.

• Tios e sobrinhos ficam impedidos de casarem entre si, afastando o Código a


regra presente no Decreto n. 3.200/41, que possibilitava o exame de
compatibilidade sangüínea a ser realizado por dois médicos, para fins de
liberação do matrimônio nesta situação.

• Determina o artigo 1.595 que a união estável gera vínculo de parentesco por
afinidade. Apesar de tal inovação, tal previsão, apesar de não ser inócua, possui
efeitos diminutos, uma vez que o parentesco por afinidade continua a não gerar
a obrigação alimentar.

8.9. Filiação
As principais modificações se deram com o fito de adaptar o novo código às regras
anteriormente previstas na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente.
Fica em destaque a não-distinção entre filhos.

• Os procedimentos e regras da adoção passam a ser uniformizados, tanto no


Estatuto da Criança e do Adolescente como no novo Código Civil, tanto para
menores quanto para maiores. A diferença está no ordenamento a ser seguido, e
suas conseqüentes regras de competência. Agora só se confere a adoção por
procedimento judicial.

• A presunção pater is est quem nuptian demonstrant, relativa aos filhos nascidos
na constância do casamento, resta reforçada no texto do novo diploma (artigo
1.597), de acordo com os critérios de coabitação, tempo de nascimento e
possibilidades técnicas.

• A partir da vigência do novo texto, o pátrio poder passa a ser designado “poder
familiar”. O conteúdo do poder familiar, bem como seus deveres, em regra são
os mesmos que já vinham sendo observados. Notam-se modificações em sede
da data na qual estará extinto o poder familiar pela maioridade (18 anos), em
relação às regras relativas ao prazo de suspensão do poder familiar, que poderá
durar indefinidamente, à possibilidade de levantamento da perda do poder
familiar a bem do menor, e à falta de técnica que permanece na redação do
artigo 1.637, parágrafo único, que não especifica as hipóteses de prisão em que
tal poder pode ser suspenso, o juiz competente para a aplicação, a natureza de
tal efeito, se civil ou secundário da sentença penal, etc.

• Em relação aos meios de reconhecimento de filhos, em regra, prevalecem as


disposições dos artigos 1.596 a 1.606, quando realizado na constância da
sociedade conjugal. Fora do casamento, os meios previstos na Lei n. 8.560/92,
bem como seu texto, consideram-se derrogados, pois contam com aplicação nos
casos de lacuna do novo texto civil, a exemplo do procedimento administrativo

36
__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

de reconhecimento de filhos por pais “indigitados”, indicados pelas mães,


quando do registro de nascimento.

• A ação negatória de paternidade, prevista no artigo 1.600 e seguintes, passa a ser


agora, pelo texto legal, imprescritível, com livres fundamentos a serem
indicados pelo pai que pretende o reconhecimento judicial de sua não-
paternidade. A legitimidade é exclusiva deste, todavia, os herdeiros podem
prosseguir na ação em sobrevindo a morte do pai, após a propositura.

• O reconhecimento de filhos é irrevogável, nos termos do artigo 1.610.

• Com o fito de preservar a harmonia do lar conjugal, prevê o artigo 1.611 que o
filho havido fora do casamento e reconhecido por um dos cônjuges só poderá
morar na mesma residência do casal com autorização do outro.

8.10. Relações Patrimoniais


Em relação às regras patrimoniais relativas ao direito de família, divididas de forma
bastante didática no novo diploma civil, as modificações merecedoras de comentários são
as seguintes:

• O artigo 1.639, em seu § 2.º, passa a permitir a mutabilidade do regime de bens


entre cônjuges, desde que haja pedido motivado feito por ambos e mediante
autorização judicial. Ficam sem efeito as duas exceções apontadas pela lei de
introdução, doutrina e jurisprudência, quais sejam, a adoção do regime legal
pelos cônjuges estrangeiros casados no exterior que obtenham a naturalização
brasileira e a possibilidade de previsão de modificação de regime, no pacto
antenupcial, de forma a beneficiar filhos posteriormente concebidos.

• Nos termos do artigo 1.640, parágrafo único, o princípio da livre estipulação


permite, em tese, a fixação de regimes diversos, mediante a fusão das regras dos
regimes existentes, desde que por meio de pacto antenupcial, com escritura
pública.

• O texto do artigo 1.641 traz a regra da separação legal obrigatória para todos os
cônjuges que tenham 60 anos ou mais, independentemente do sexo, como forma
de garantir o princípio da isonomia.

• O cônjuge separado de fato há mais de 5 anos, pode desfazer doações inoficiosas


do outro cônjuge ao seu concubino, desde que prove que o bem em questão não
foi adquirido pelo esforço comum de seu ex-cônjuge e respectivo concubino,
nos termos do artigo 1.642, inciso V.

• Determina o artigo 1.644 que os cônjuges são solidária e proporcionalmente


responsáveis pelas dívidas adquiridas em proveito da sociedade conjugal, em
razão do princípio da proporcionalidade, que passa a reger tais relações de
cunho econômico.

37
__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

• O artigo 1.647 trata dos atos que, para validade, exigem a anuência do outro
cônjuge. Esses atos de disposição patrimonial passam a ter sua prática permitida
sem a anuência do outro cônjuge quando entre eles vigorar o regime da
separação absoluta dos bens. Esta é a novidade (o artigo 235 do Código Civil de
1916 exige a anuência, qualquer que seja o regime de bens). Em relação ao aval,
resta prejudicada a discussão a respeito da exclusão ou não da meação do
cônjuge que não o prestou, em caso de execução, uma vez que, mesmo sendo
instituto do direito cambiário, regido pelo princípio da autonomia, para prestar
aval agora é necessária a anuência do outro cônjuge.

• A anulação dos atos praticados sem a anuência do outro cônjuge, quando esta for
devida, tem prazo de 2 anos, conforme determina o artigo 1.649. Antes, o prazo
era de 4 anos (artigo 178, § 9.º, do Código Civil de 1916)

• Quanto ao regime de bens, sai do novo texto a previsão expressa do regime


dotal, e inclui-se o regime de participação final dos aqüestos (artigos 1.672 a
1.686 do novo Código Civil). Trata-se de um regime misto. Durante o
casamento vale a separação de bens. A administração dos bens anteriores ao
casamento, previstos no pacto, bem como dos bens adquiridos a título gratuito
na constância da sociedade conjugal, é livre, sem necessidade de outorga para
alienação inclusive. No final do casamento, aplicam-se quanto aos aqüestos, a
regra da comunhão parcial. Assim, estabelece-se um condomínio apenas no
momento da extinção da sociedade, para fins de divisão. É formalizado
exclusivamente mediante pacto antenupcial.

• Em relação ao regime da comunhão parcial de bens, que determina a repartição


dos bens adquiridos na constância do casamento, por presunção de aquisição em
decorrência do esforço comum, duas questões de relevância foram modificadas:

- o artigo 1.659 determina que o direito à percepção e a efetiva


percepção dos frutos civis do trabalho dos cônjuges são incomunicáveis
tanto na comunhão universal quanto na comunhão parcial de bens;

- fica expressamente prevista, no capítulo referente ao direito de


família, a exclusão da responsabilidade de um dos cônjuges por atos ilícitos
praticados pelo outro.

• Conforme o texto do artigo 1.663, a administração comum do patrimônio dos


cônjuges exige a anuência de ambos na cessão de administração ou uso de bens.

• O juiz pode determinar, de acordo com o § 3.º, que somente um dos cônjuges
permaneça na administração dos bens.

• Prevê o artigo 1.665 que os bens particulares do cônjuge são de administração


exclusiva deste, salvo convenção diversa em pacto antenupcial.

8.11. Alimentos

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__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

• Em sede de alimentos, preliminarmente cumpre informar que as disposições do


artigo 1.º da Lei n. 8.971/94, do “caput” do artigo 7.º da Lei n. 9.278/96, da Lei
n. 6.515/77 e do Código Civil de 1916 encontram-se revogadas, havendo no
novo texto civil uma reunião considerada pela doutrina, atécnica, de tais
institutos.

• Mantém-se a classificação dos alimentos em naturais, assim definidos aqueles


estritamente necessários à sobrevivência do alimentando, considerados pelo
novo código como devidos mesmo se resultantes de culpa deste (artigo 1.694, §.
2.º); e alimentos civis (côngruos), que, para sua fixação, deve-se levar em conta
o clássico critério binominal “necessidade versus possibilidade” (1.694, §. 1.º).

• Consideram-se alimentos legais os alimentos naturais ou civis devidos em razão


de: casamento; união estável; parentesco. No que tange ao parentesco, é
acrescido o vínculo da solidariedade imprópria na outorga dos alimentos, em
relação ao devedor, uma vez que a cada devedor é incumbido o ônus de oferecer
alimentos na proporção de suas possibilidades (artigo 1.698 do novo Código
Civil).

• Os alimentos são considerados amplos, ou seja, em sua acepção civil, quando


não há culpa do alimentando para a sua solicitação, ou quando o inocente pede
ao culpado, em casos se dissolução da sociedade conjugal.

• O artigo 1.700 resolve antiga questão doutrinária e jurisprudencial ao definir que


a obrigação alimentar transmite-se aos herdeiros do devedor, nos limites das
forças da herança recebida, atendendo, deste modo, o princípio da vedação do
enriquecimento sem causa.

• Em relação aos alimentos devidos aos filhos havidos fora do casamento, a lei
confere a possibilidade de o filho, já na ação de investigação de paternidade,
requerer alimentos provisionais. Na verdade, estes alimentos possuem
verdadeiro caráter provisório, e são denominados provisionais simplesmente
para que o juiz possa concedê-los de forma mais ampla, inclusive para o custeio
do trâmite da ação de investigação em que são solicitados o reconhecimento da
paternidade e os referidos alimentos. Com efeito, o juiz, mesmo de ofício, pode
conceder os alimentos provisórios na sentença.

• Dispõe o artigo 1.704 serem irrenunciáveis pelos cônjuges os alimentos na


separação. Esse tema é considerado atualmente polêmico na doutrina e
jurisprudência, pois alguns entendem renunciáveis tais alimentos. Como
complicador desta questão, todavia, corroborando o texto do artigo 1.704 do
novo código, aponta-se a Súmula n. 379 do Supremo Tribunal Federal, que
determina serem irrenunciáveis, no “acordo de desquite”, os alimentos, com
possibilidade de pleito ulterior, se verificados os pressupostos legais.

• Ao cônjuge culpado pela separação e sem aptidão para o trabalho, se não tiver
parentes, é possível a concessão, pelo juiz, de alimentos naturais, que deverão
ser pagos pelo ex-cônjuge não culpado, nos termos do artigo 1.704, parágrafo
único. Há na doutrina, com acerto, quem vislumbre flagrante injustiça nesta
previsão.
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__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

• Corroborando as idéias constantes das regras da Súmula 379 do Supremo


Tribunal Federal e do artigo 1.704 do novo diploma, o artigo 1.707 adota, em
relação a qualquer credor, de modo irrestrito, a impossibilidade de renúncia ao
direito de percepção de alimentos legais. Tal regra, salvo melhor juízo, não se
aplica aos alimentos voluntários (decorrentes de liberalidade) e judiciais
(decorrentes de indenização).

• São previstas ainda, no novo texto legal, as hipóteses de extinção do dever de


pagamento de alimentos legais, a exemplo de:

- o fato de o credor contrair novo matrimônio, união estável ou mesmo


concubinato (novidade), é previsto de modo a evitar relações familiares
instituídas à margem da lei, com subsistência de obrigações indevidas;

- morte do credor (mors omnia solvit);

- procedimento indigno do credor de alimentos para com seu devedor.

8.12. Bem de Família

8.12.1. Introdução
O bem de família passa a ser tratado no direito de família, Livro IV, artigo 1.711 do
novo Código Civil. Antes era tratado no artigo 70 do Código Civil de 1916, constante,
portanto, da parte geral.

O bem de família é o bem imóvel objeto de resguardo para que sirva de moradia à
família, portanto, não responde em face de dívidas existentes, mesmo em caso de
insolvência.

O bem de família é um bem afetado, goza de impenhorabilidade e inalienabilidade.

Temos o bem de família voluntário e compulsório, este último é o bem de família


previsto da Lei n. 8.009/90, cuja referência encontra-se na parte final do texto do artigo
1.711 do novo código.

Com efeito, o bem de família voluntário é aquele instituído por vontade do


proprietário, é previsto no novo Código Civil e no Decreto-Lei n. 3.200/41, artigos 19 a 23.
Este direito previsto no referido decreto também continua em vigor. O mesmo decreto é
conhecido como lei de proteção à família.

Há também previsões a respeito do registro do bem de família na Lei n. 6.015/73,


denominada Lei dos Registros Públicos.

8.12.2. Requisitos
São requisitos para a instituição do bem de família:
40
__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

• Ser instituído por ato de vontade, mediante escritura pública (contrato) ou


testamento. No novo Código Civil são mantidas estas disposições.

• A legitimidade é atribuída aos cônjuges, entidade familiar (artigo 226, §§ 3.º


e 4.º, da Constituição Federal) ou terceiro (doador ou testador – artigo 1.711,
parágrafo único, do novo Código Civil). No sistema do Código Civil de 1916,
quem institui é o chefe da família.

• É cabível a instituição sobre bens móveis, incluídos os valores mobiliários


e as pertenças, além de imóveis, na proporção de, no máximo, 1/3 do patrimônio
líquido da família, ao tempo da instituição (artigo 1.711 do novo Código Civil).

O Decreto-Lei n. 3.200/41 dispõe que não há limite patrimonial (artigo 19). Em


razão de tal distinção, é de se perguntar: Qual das disposições deve prevalecer? Por ser
posterior e tratar do tema de forma expressa, instituindo restrições ao referido instituto,
deve prevalecer o texto do novo Código Civil, ao menos a priori.

O artigo 1.712 do novo Código Civil fala em pertença. Denomina-se pertença uma
espécie de bem móvel inexistente no regime do Código de 1916. São bens que, não
constituindo partes integrantes de imóveis, se destinam, de modo duradouro, ao uso, ao
serviço ou ao aformoseamento de outro. É prevista em substituição aos extintos bens
imóveis por acessão intelectual (artigo 93 do novo Código Civil).

Os valores dos bens móveis não poderão exceder o valor do prédio instituído como
bem de família, conforme dispõe o artigo 1.713 do novo diploma.

A Lei n. 8.009/90 disciplina que a impenhorabilidade recai sobre o bem imóvel de


menor valor, caso haja mais de um bem de propriedade do (s) instituidor (es), bem como
sobre os móveis que guarneçam a residência, excluídos os adornos suntuosos (artigo 2.º),
obras de arte, automóveis. Nos termos do novo código, a impenhorabilidade quanto ao
imóvel permanece (bem de família compulsório), em razão da previsão do artigo 1.711.

• Inexistência de dívidas anteriores.

O Decreto-Lei n. 3.200/41 dispõe que para instituir o bem de família de modo


voluntário, a família deve usar a residência como sua moradia pelo prazo de 2 anos (artigo
19), todavia, o novo Código Civil não fala em prazo. Se não determina prazo como
requisito, duas soluções podem ser apontadas: exige-se o prazo de dois anos como
requisito para instituição do bem de família voluntário; não é exigível prazo, pois a Lei n.
8.009/90 não o faz em relação bem de família compulsório, e o novo código trata de forma
exauriente o tema, relativamente ao bem de família voluntário. Parece que a segunda
solução é a mais correta.

41
__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

8.12.3. Efeitos
• Determina o artigo 1.715 que o bem de família é isento de execução por dívidas
posteriores à sua instituição, salvo as que provierem de tributos relativos ao
prédio ou de despesas de condomínio, o que já era admitido como exceção pelo
Superior Tribunal de Justiça e, em relação ao bem de família compulsório, pela
Lei n. 8.009/90. Portanto, o primeiro efeito é a impenhorabilidade. O artigo fala
em tributo, e a referida expressão deve ser interpretada restritivamente. Assim,
se a pretensa penhora for proveniente da inadimplência relativa a taxas de
limpeza de logradouros, por exemplo, não será admitida, em razão de ser, de
acordo com a maioria doutrinária, verdadeira tarifa, preço público.

• O artigo 1.720 traz a previsão de administração conjunta do bem de família,


pelos cônjuges, caso não seja hipótese de instituição de bem de família pela
denominada “família monoparental”.

• Dispõe o artigo 20 do Decreto-Lei n. 3.200/41 que o bem de família subsiste,


mesmo havendo morte de um dos cônjuges, enquanto subsistir a família. Assim,
não entrará no inventário nem será partilhado. Essa determinação deve
prevalecer e, se falecerem ambos os cônjuges, a administração passará ao filho
mais velho, se for maior e, do contrário, a seu tutor. (artigo 1.720, parágrafo
único, do novo Código Civil). Também está recepcionado o artigo 21, § 2.º, do
decreto supra citado.

• O imóvel passa a ser considerado inalienável. Todavia, com a conjugação das


novas disposições da Lei n. 10.406/02 (artigo 1.719), o juiz poderá afastar essa
inalienabilidade. O juiz competente é o da vara de família, e deve haver oitiva
obrigatória do Ministério Público.

• O imóvel sob o qual se institui o bem de família não poderá ter destinação
diversa de moradia,como por exemplo, não poderá ser locado (artigo 1.717).

8.12.4. Hipóteses de extinção do bem de família (artigo 1.715)


• Em havendo dívidas anteriores à instituição voluntária do bem;

• Sobrevindo dívidas tributárias ou condominiais. Hipótese em que o bem é levado


à hasta pública, o valor arrecadado sub-roga-se ao credor e, caso haja saldo,
deverá haver devolução do excedente ao proprietário (artigo 1.715, parágrafo
único).

• Com o fim da família, assim entendidas as hipóteses de morte de ambos os


cônjuges e a de maioridade dos filhos, se não estiverem sujeitos à curatela
(1.722); e, também,com a morte de um dos cônjuges, desde que seja requerida
a extinção pelo sobrevivente (1.721, parágrafo único). Ressalte-se que a simples
dissolução da sociedade conjugal não extingue o bem de família, de acordo com
expressa disposição do caput do artigo 1.721.

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__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

9. DO DIREITO DAS SUCESSÕES

9.1. Modificações da Parte Geral


No direito sucessório, em primeiro lugar cumpre observar as modificações trazidas
em sua parte geral, e posteriormente as modificações afetas à ordem de vocação hereditária
etc, conforme as disposições tópicas abaixo:

• O princípio da “saisine”, norteador de todo o direito sucessório, determina que a


herança se transmite desde logo aos herdeiros legítimos e testamentários,
corroborando o já arraigado entendimento de que a partilha se faz para fins de
atender ao princípio da continuidade registral e possibilitar o recolhimento de
impostos relativos aos bens objeto de herança (artigo 1.784 do novo Código
Civil).

• Aos companheiros, diferente do que ocorre com as leis que regulam o instituto
da união estável, não é concedida a qualidade de herdeiro, mas somente lhes são
concedidos benefícios sucessórios. Assim, tem-se verdadeiro fomento ao
instituto do casamento, uma vez que tais disposições têm o fim primordial de
estimular a conversão das uniões estáveis em matrimônio. Em síntese: os
companheiros passam a ter a natureza jurídica de beneficiários da herança.

• O companheiro nunca dividirá patrimônio sucessível com o cônjuge do de cujus,


pois o código traz a previsão expressa de serem herdeiros, um ou outro.

Em relação à participação sucessória do companheiro, tem-se o seguinte:

• participará na sucessão dos bens adquiridos a título oneroso, na vigência da


união estável somente, recebendo os por inteiro caso não haja nenhum parente
sucessível do autor da herança (artigo 1.790, inciso IV);

• nesta participação, receberá quota equivalente a que for atribuída a aos seus
filhos, se concorrer com filhos comuns (inciso I).;

• se concorrer com descendentes exclusivos do autor da herança, o companheiro


receberá metade do que couber a cada um deles (inciso II);

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__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

• se concorrer, nesta participação, com outros parentes suscessíveis do de cujus,


terá direito ao recebimento de um terço da herança (inciso III).

Questão interessante levanta-se na hipótese de o companheiro, a que se atribui


benefícios sucessórios, suceder o de cujus em relação aos bens adquiridos por este antes da
constância da união estável. Nesta hipótese, os bens anteriores devem ser atribuídos ao
Município, ou entregues ao companheiro junto aos bens a que este tem direito? De acordo
com a doutrina, ainda incipiente, deve-se interpretar o artigo 1.844 do novo código de
forma a garantir ao companheiro a totalidade dos bens objeto da sucessão, uma vez que o
texto do referido artigo determina a transmissão dos bens ao Município somente em não
sobrevindo cônjuge, companheiro, ou algum parente sucessível.

9.2. Herança e Administração


• Dispõe o artigo 1.791 e seu parágrafo único, do novo código que, do início da
sucessão à partilha, os herdeiros são tratados como condôminos dos bens
integrantes da herança, estabelecendo-se, assim, um condomínio legal e
indivisível.

• Os artigos 1.793 a 1.795 estabelecem o direito de cessão das quotas


condominiais relativas à herança. Estas podem ser cedidas aos demais herdeiros,
a quem são conferidos o direito de preempção, ou a terceiros, de modo oneroso
ou gratuito. Cumpre registrar que, apesar de ser possível a cessão de quotas, não
é possível a cessão relativa a bens certos, individualizados, mas somente de
quotas-partes, em razão da inexistência de partilha.

• O artigo 1.797 determina que não há mais prazo para o término do inventário.
Com efeito, a regra do Código Civil de 1.916, que previa o prazo de 3 meses
para o término do inventário, era há muito desrespeitada, sendo considerada
inócua.

• O inciso IV do artigo acima confere a possibilidade expressa de o juiz instituir


um administrador provisório de sua confiança, até o compromisso do
inventariante, mesmo que o administrador seja terceiro.

9.3. Disposições Sobre os Herdeiros


• O artigo 1.798 dispõe que são capazes de herdar os nascidos e concebidos ao
tempo da abertura da sucessão. Como exceções, são apontadas nos artigos
seguintes, como capazes de herdar, as pessoas jurídicas e a prole eventual,
assim denominada a prole ainda não concebida a quem o autor da herança,
exclusivamente por testamento, confere direitos sucessórios.

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__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

• Em relação à prole eventual, o artigo 1.800, § 4.º, determina prazo para que seja
concebido o herdeiro eventual do testador, prazo este de 2 anos. Não concebido
neste prazo, os bens reservados à prole eventual passam aos herdeiros legítimos.

• A substituição testamentária por meio do fideicomisso perde previsão pelo novo


código. Assim, a única hipótese em que se vislumbra o fideicomisso,
estabelecido pela lei inclusive, é a situação em que o ascendente do herdeiro
eventual do testador fica com a disposição e guarda dos bens ao herdeiro
reservados, até que este seja concebido (prazo de 2 anos) e nasça com vida.

• Com efeito, o artigo 1.800 também determina que deverá ser dado curador à
prole eventual, assim como se dá curador ao nascituro.

• A incapacidade de herdar vem retratada nos artigos 1.801 a 1.803 da lei, e se


estende: ao testamenteiro; seus parentes em linha reta e linha colateral até o
segundo grau, mesmo por afinidade; às testemunhas do testamento; ao
concubino do testador casado, exceto quando o testador estava separado de fato
há mais de 05 anos sem culpa sua. Neste caso, o concubino receberá, no
máximo, o que o companheiro poderia receber.

9.4. Aceitação e Renúncia da Herança


• A maior modificação nesta seara é operada pelo artigo 1.809, parágrafo único,
ao determinar que, morto o herdeiro antes de haver tempo para dizer se aceitava
ou não a herança que lhe cabia, e deixando descendentes, estes representantes
devem se manifestar primeiro sobre a aceitação de suas heranças e,
posteriormente, dizer se aceitam, no lugar de seu ascendente morto, a herança a
este conferida. Tal regra mostra-se salutar em razão de ser possível sua
ocorrência, notadamente, em casos de acidente envolvendo familiares, e que não
haja comoriência.

• O artigo 1.812 determina, na vigência da nova lei, serem a aceitação e a renúncia


à herança irretratáveis.

• Ao credor permanece vigente a possibilidade de habilitar-se na herança do


devedor renunciante, em até 30 dias do conhecimento da renúncia, desde que
prove a insolvência do seu devedor. Ressalte-se que a renúncia permanece válida
após a quitação do valor devido ao credor, ou seja, caso haja excedente, este
deve ser dividido entre os demais herdeiros (artigo 1.813).

• Verifica-se no artigo 1.818 verdadeira limitação às possibilidades de perdão


tácito pelo ofendido ao seu indigno. Desta feita, o perdão expresso se dá
posteriormente ao ato, em escrito autêntico ou no testamento; já o perdão tácito,
operado pela conferência de bens ao indigno, em testamento posterior ao ato de
indignidade devidamente conhecido pelo testador, autoriza o herdeiro indigno a
receber a herança apenas nos limites da disposição testamentária, ainda que seja
herdeiro necessário.

45
__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

9.5. Petição de Herança


Define-se petição de herança como o direito do herdeiro de ser reconhecido como
tal e ser investido na posse e propriedade dos seus bens objeto da herança.

A ação de petição de herança vem prevista nos artigos 1.824 a 1.828, tem natureza
de verdadeira ação real, de cunho petitório, e em seu pólo passivo figuram os herdeiros
aparentes. Herdeiros aparentes, aqui, podem ser os herdeiros reais, legítimos, pois, apesar
de possuírem direito à herança do de cujus, em relação à parte do requerente não possuíam
direitos, razão pela qual devem restituir o que indevidamente receberam, ainda que se trate
apenas de parcela da herança. O prazo prescricional da petição de herança é de 10 anos,
nos termos da nova lei.

9.6. A Ordem de Vocação Hereditária


• Determina o artigo 1.829 que a ordem de vocação hereditária tem em primeiro
lugar, os descendentes em concorrência com o cônjuge; em segundo lugar, os
ascendentes também em concorrência com o cônjuge; em terceiro lugar, o
cônjuge sobrevivente; e finalmente, em quarto lugar, os colaterais até o quarto
grau.

• Desta feita, cumpre, de plano, observar que o cônjuge é erigido à categoria de


herdeiro necessário, sempre concorrendo, ainda que haja ascendentes e
descendentes, desde que não esteja separado de fato há mais de dois anos, ou
judicialmente, do cônjuge falecido. No caso da separação de fato há mais de
dois anos, é possível que o cônjuge ainda venha a ser considerado herdeiro, caso
prove que a separação não se deu por sua culpa.

• Havendo descendentes, determina o inciso I do artigo referido que o cônjuge


concorre com aqueles por cabeça, recebendo um quinhão igual ao que couber
aos descendentes, exceto:

- se o cônjuge era casado com o falecido em comunhão universal, em


razão de já ser considerado meeiro de tudo o que for apurado no inventário;

- se o cônjuge era casado com o de cujus no regime da separação legal


obrigatória de bens, pois, neste caso, não poderá haver burla à determinação
legal de não participação e patrimônio;

- se o cônjuge era casado com o autor da herança no regime da


comunhão parcial de bens, e o autor não deixou bens particulares, ocasião em
que, relativos aos seus efeitos, a comunhão parcial se equipara à comunhão
universal.

• Observa-se que o artigo 1.832 determina a quota mínima de 25% (vinte e cinco
por cento) ao cônjuge herdeiro que concorrer com descendentes do de cujus,
caso este cônjuge seja ascendente daqueles com que concorrer.

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__________________________________________________________________MÓDULO COMPLEMENTAR

• Ao cônjuge sobrevivente é conferido o direito real de habitação do imóvel


destinado à moradia do casal, desde que este seja o único bem imóvel a
inventariar, sem prejuízo da parte que lhe caiba na herança. Tal direito é
considerado pela doutrina como vitalício e incondicionado.

• Quando o cônjuge herdeiro concorrer com ascendentes do falecido, se estes


forem ascendentes em primeiro grau, ao cônjuge tocará um terço da herança.
Todavia, sendo os ascendentes em grau maior que o primeiro, ou havendo um
único ascendente, ao cônjuge caberá o recebimento de metade da herança.

• O Município, nos termos do artigo 1.844, é retirado da ordem de vocação


hereditária, sendo previsto como beneficiário somente em não havendo nenhum
herdeiro constante do artigo 1.829. A bem da verdade, a doutrina não considera
o Município propriamente como herdeiro, mas beneficiário, desde a vigência do
Código de 1916.

9.7. Disposições Testamentárias


• Na proteção aos bens, objeto da herança, existem cláusulas restritivas à
alienação dos bens. Todavia, o artigo 1.848 do novo Código Civil determina em
seu § 2.º que se houver justa causa, mediante autorização judicial, podem ser
praticados atos de alienação ou gravame, todavia, sempre obrigando à sub-
rogação real do objeto da arrecadação.

• Determina o novo texto legal que o prazo para a impugnação dos testamentos é
de cinco anos, contados da data do efetivo registro do testamento, de acordo
com o artigo 1.859.

• Em relação ao testamento público, a única modificação de vulto é a redução do


número de testemunhas, que passa a ser de duas apenas (artigo 1.864, inciso II,
do novo Código Civil).

• No tocante ao testamento cerrado, as modificações importantes são a previsão de


redação por qualquer meio mecânico, a exemplo do microcomputador ou
máquina de escrever, e a redução para duas pessoas, no número de testemunhas.

• O testamento particular exige a presença de três testemunhas na lavratura deste,


que o subscreverão após a leitura. O artigo 1.878, em seu parágrafo único,
possibilita ao juiz o reconhecimento da validade do testamento particular, se ao
menos uma testemunha o confirmar, na falta das demais, e as circunstâncias se
presumirem como tal.

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