Você está na página 1de 6

Cálculo Avançado - Programa de Verão 2021

Programa de Pós-Graduação em Matemática (PPGM)


Universidade Federal de São Carlos (UFSCar)
Prof. Dr. José Ruidival dos Santos Filho

Lista 1
Amanda Santos Araújo

1. Defina a função módulo | | : R → [0, ∞) e considere d1 (x, y) = |x − y|. Mostre que


d1 é uma métrica e que (R, d) é um espaço métrico completo..
Resposta: Consideremos a função módulo | | : R → [0, ∞) definida por |x| = x,
se x ≥ 0 e |x| = −x, se x < 0. Para mostrar que d1 (x, y) = |x − y| é uma métrica
em R, devemos verificar as seguintes condições:
(a) d1 (x, y) ≥ 0
Temos que d1 (x, y) = 0 ⇔ |x − y| = 0 ⇔ x − y = 0 ⇔ x = y Se x 6= y engtão
d1 (x, y) = |x − y| > 0
(b) d1 (x, y) = d1 (y, x)

d1 (x, y) = |x − y| = |(−1)(y − x)| = | − 1||y − x| = |y − x| = d1 (y, x)

(c) d1 (x, z) ≤ d1 (x, y) + d1 (y, z)


~
d1 (x, z) = |x − z| = |x − y + y − z| ≤ |x − y| + |y − z| = d1 (x, y) + d1 (y, z)

~ Desigualdade triangular do módulo.


Portanto, d1 é uma métrica em R.
Agora, provaremos que (R, d1 ) é um espaço métrico completo. Para isso, mostraremos
que toda sequência de Cauchy em R é convergente.
Seja (xn ) uma sequência de Cauchy em R. Então, para todo  > 0, existe n0 ∈
N tal que m, n > n0 implica que d(xm , xn ) < . Tomando  = 1, temos que o
conjunto {xn0 +1 , xn0 +2 , ...} é limitado e, além disso, tem diâmetro menor ou igual a 1.
Observe que {x1 , x2 , ..., xn , ...} = {x1 , ..., xn0 }∪{xn0 +1 , xn0 +2 , ...}. Como {x1 , ..., xn0 }
é limitado, segue que {x1 , x2 , ..., xn , ...} é limitado. Logo, a sequência (xn ) é limitada.
Pelo Teorema de Bolzano–Weierstrass, temos que (xn ) tem uma subsequência (xnk )
que converge para a ∈ R.

Então, para todo  > 0, existe n1 ∈ N tal que m, n > n1 implica que d1 (xm , xn ) < 2
e existe k1 ∈ N tal que nk > k1 implica que d1 (xnk , a) < 2 .
Assim, considerando k > k1 tal que nk > n1 , temos que
 
d1 (xn , a) ≤ d1 (xn , xnk ) + d1 (xnk , a) < + =
2 2
para todo n > n1 . Portanto, (xn ) converge para a. Concluímos que (R, d1 ) é um
espaço métrico completo.
Lista 1 Amanda Santos Araújo

2. Em R2 , n ≥ 2, considere

n
! 21
X
dn (x, y) = |xi − yi |2
i=1

Mostre que dn é uma métrica em Rn , e que é advinda de um produto interno.


Olhando Rn = R × · · · × R observa-se que (Rn , dn ) é um espaço métrico completo.
Resposta: Para mostrar que dn é uma métrica, verificaremos as seguintes condições:
Para todo x, y e z ∈ Rn
1
(a) dn (x, y) = ( ni=1 |xi − yi |2 ) 2 ≥ 0, pois |xi − yi | ≥ 0.
P

n
! 21
X
dn (x, y) = 0 ⇔ |xi − yi |2 = 0 ⇔ |xi −yi | = 0, ∀i ⇔ xi = yi , ∀i ⇔ x = y
i=1

(b) dn (x, y) = dn (y, x)

n
! 21 n
! 12
X X
dn (x, y) = |xi − yi |2 = |yi − xi |2 = dn (x, y)
i=1 i=1

(c) dn (x, z) ≤ dn (x, y) + dn (y, z)


Para mostrarmos que vale a desigualdade triangular, faremos o uso da De-
sigualdade de Cauchy-Schwarz no Rn .

Desigualdade de Cauchy-Schwarz: Se x1 , ..., xn e y1 , ..., yn são números


reais arbitrários, então

n n
!1/2 n
!1/2
X X X
|xi yi | ≤ x2i · yi2 (1)
i=1 i=1 i=1

Demonstração: Considere a desigualdade

(r − s)2 = r2 − 2rs + s2 ≥ 0 ⇔ 2rs ≤ r2 + s2

para todo r, s ∈ R.
1/2 1/2
Tomando a = ( ni=1 x2i ) e b = ( ni=1 yi2 ) , temos que
P P

|xi | |yi | x2 y 2
2· · ≤ 2i + 2i
a b a b
para todo 1 ≤ i ≤ n.
Somando em relação ao índice i temos
n
2 X
|xi yi | ≤ 1 + 1
a · b i=1

2
Lista 1 Amanda Santos Araújo

Assim,
n n
!1/2 n
!1/2
X X X
|xi yi | ≤ a · b = x2i · yi2
i=1 i=1 i=1


Agora, mostraremos a desigualdade triangular.
n
X n
X
2 2
(dn (x, z)) = |xi − zi | = (xi − yi + yi − zi )2
i=1 i=1
n
X n
X n
X
2 2
= (xi − yi ) + 2 (xi − yi )(yi − zi ) + (yi − zi )2
i=1 i=1 i=1
n n
!1/2 n
!1/2
X X X
≤ (xi − yi )2 + 2 (xi − yi )2 (yi − zi )2
i=1 i=1 i=1
n
X
+ (yi − zi )2
i=1
v v 2
u n u n
uX uX
= t (xi − yi )2 + t (yi − zi )2 
i=1 i=1

= (dn (x, y) + dn (y, z))2

Logo, dn (x, z) ≤ dn (x, y) + dn (y, z) e, portanto, dn é uma métrica em Rn .

Sejam x = (x1 , ..., xn ), y = (y1 , ..., yn ) ∈ Rn . Definimos


n
X
hx, yi = xi y i
i=1

. Observe que hx, yi satisfaz as seguintes propriedades:

(a) hx, xi ≥ 0
Temos que hx, xi = ni=1 x2i ≥ 0
P

(b) hx, xi = 0 ⇔ x = 0
Note que hx, xi = ni=1 x2i = 0 ≥ 0 ⇔ x1 = · · · = xn = 0 ⇔ x = 0
P

(c) hx, yi = hy, xi


n
X n
X
hx, yi = xi yi = yi xi = hx, yi
i=1 i=1

(d) hx + y, zi = hx, zi + hy, zi


n
X n
X
hx + y, zi = (xi + yi )zi = xi zi + yi zi
i=1 i=1
n
X n
X
= xi zi + yi zi = hx, zi + hy, zi
i=1 i=1

3
Lista 1 Amanda Santos Araújo

(e) hkx, yi = khx, yi, k ∈ R


n
X n
X
hkx, yi = kxi yi = k xi yi = khx, yi
i=1 i=1
Pn
Portanto, temos que hx, yi = i=1 xi yi é um produto interno de Rn .
Com isso, podemos dizer que a métrica dn vem do produto interno, pois
v
u n
uX p
dn (x, y) = t |xi − yi |2 = hx − y, x − yi
i=1

Mostraremos que (Rn , dn ) é completo. Seja (xm )m∈N uma sequência de Cauchy em
Rn , onde xm = (xm m
1 , ..., xn ). Dado  > 0, como R é completo, temos que existem
y1 , ..., yn ∈ R, N1 , ..., Nn ∈ N tais que

∀k ∈ N, 1 ≤ k ≤ n, ∀nk > Nk : d1 (xmk , yk ) < √
n
2
Assim, segue |xm 2
k − yk | < n
. Logo,
n n
!1/2
X X
|xm 2 2
k − yk | <  ⇒ |xm
k − yk |
2
<
k=1 k=1

Portanto, dn (xm , y) < , onde y = (y1 , ..., yn ). Concluímos que Rn é completo.


3. Mostre que dn satisfaz a lei do paralelogramo. Se d é uma métrica num espaço
métrico M satisfazendo a lei do paralelogramo, é advinda de um produto interno ?
Resposta: Mostraremos que dn satisfaz a lei do paralelogramo, ou seja, que vale a
seguinte igualdade
dn (x + y, 0)2 + dn (0, x − y)2 = 2dn (x, 0)2 + 2dn (0, y)2
De fato,
n
X n
X
2 2 2
dn (x + y, 0) + dn (0, x − y) = |xi + yi | + |xi − yi |2
i=1 i=1
n
X n
X
= (|xi |2 + 2|xi ||yi | + |yi |2 ) + (|xi |2 − 2|xi ||yi | + |yi |2 )
i=1 i=1
X n n
X
= 2 |xi |2 + 2 |yi |2
i=1 i=1
= dn (x, 0) + dn (0, y)2
2

Portanto, dn satisfaz a lei do paralelogramo.

Sabemos que nem toda métrica é definida por uma norma. Dado uma métrica
d, kxk = d(x, 0) define uma norma se, e somente se, d(x, y) = d(x + z, y + z) e
d(λx, λy) = |λ|d(x, y).

4
Lista 1 Amanda Santos Araújo

Suponhamos que d é advinda de uma norma que satisfaz a lei do paralelogramo.

2kxk2 + 2kyk2 = kx + yk2 + kx − yk2

para todo x, y ∈ M .
Mostraremos que essa norma k · k é induzida por um produto interno.
Pela Lei da polarização, temos que
1
kx + yk2 − kx − yk2 .

hx, yi =
4
p
Note que hx, xi = 14 (k2xk2 ) = kxk.
Verificaremos as condições para mostrar que hx, yi é um produto interno,

(a) hx, xi = 41 (k2xk2 ) = kxk2 ≥ 0


(b) hx, xi = 0 ⇔ kxk2 = 0 ⇔ x = 0
(c) hx, yi = 14 (kx + yk2 − kx − yk2 ) = 41 (ky + xk2 − ky − xk2 ) = hy, xi
(d) hx + y, zi = hx, zi + hy, zi.
Pela Lei do paralelogramo, temos

2kx + zk2 + 2kyk2 = kx + y + zk2 + kx − y + zk2 .


Daí,

kx + y + zk2 = 2kx + zk2 + 2kyk2 − kx − y + zk2


= 2ky + zk2 + 2kxk2 − ky − x + zk2

Dessa forma, temos que


1
kx + y + zk2 = (2kx + zk2 + 2kyk2 − kx − y + zk2
2
+ 2ky + zk2 + 2kxk2 − ky − x + zk2 )
1 1
= kxk2 + kyk2 + kx + zk2 + ky + zk2 − kx − y + zk2 − ky − x + zk2
2 2
Fazendo a substituição de z por −z, obtemos
1 1
kx + y − zk2 = kxk2 + kyk2 + kx − zk2 + ky − zk2 − kx − y − zk2 − ky − x − zk2 .
2 2
Assim,
1
kx + y + zk2 − kx + y − zk2

hx + y, zi =
4
1  1
kx + zk2 − kx − zk2 + ky + zk2 − ky − zk2

=
4 4
= hx, zi + hy, zi

5
Lista 1 Amanda Santos Araújo

(e) hλx, yi = λhx, yi para todo λ ∈ R


Começaremos provar para λ ∈ N. Para λ = 1 é obviamente verdade. Supon-
hamos que hλx, yi = λhx, yi é verdadeira para algum k ∈ N. Temos que

h(k + 1)x, yi = hkx + x, yi = hkx, yi + hx, yi = khx, yi + hx, yi = (k + 1)hx, yi

portanto, por indução, hλx, yi = λhx, yi para qualquer λ inteiro positivo.


Note que também vale para λ = −1. De fato,
1 1
h−x, yi = (k − x + yk2 − k − x − yk2 ) = (kx − yk2 − kx + yk2 ) = −hx, yi
2 2
Observe que se vale para k1 , k2 ∈ R,então vale para k1 · k2 .

h(k1 · k2 )x, yi = hk1 · (k2 x), yi = k1 hk2 x, yi = k1 k2 hx, yi (2)

Dessa forma, a propriedade é valida para k1 = k ∈ N e k2 = −1. Assim,


hλx, yi = λhx, yi é verdadeira para λ ∈ Z.
Seja n ∈ Z − {0}. Temos que hx, yi = h nn x, yi = nh n1 x, yi, então h n1 x, yi =
1
n
hx, yi. Utilizando a equação 2 para k1 = n1 , n ∈ Z, e k2 = m ∈ Z, temos que
hλx, yi = λhx, yi é verdadeira para λ ∈ Q.
Utilizando a densidade de Q in R. Observe que h·, ·i é contínua, pois é como
uma combinação linear de normas, que são contínuas. Dessa forma, se xn → x,
então para y ∈ M temos que hxn , yi → hx, yi.
Seja x, y ∈ M . Para algum k ∈ R, escolha a sequência (qn ) ⊂ Q tal que qn → r.
Assim, qn x → rx em M , então hqn x, yi → hrx, yi. Mas hqn x, yi = qn hx, yi →
rhx, yi. Portanto, pela unicidade do limite, concluímos que hrx, yi = rhx, yi.
Portanto, d é advinda de um produto interno.

4. Contrastando com 2), justifique que (Rn , dn ) pode ser construído como o completa-
mento de (Qn , dn ).
Resposta: Pelo exercício 24, do Rudin, temos que (Qn )∗ é o completamento de Qn .
Assim, podemos identificar o conjunto (Qn )∗ de classes de sequências de Cauchy de
Qn com o Rn : para uma classe [(xn )] de sequências de Cauchy de Qn , associamos
a x ∈ Rn que é o limite comum das sequências de Cauchy em [(xn )] quando visto
como sequências em Rn e dado x ∈ Rn associamos a classe de todas as sequências
de Cauchy que convergem para x ∈ Rn .

5. Sabemos que qualquer aberto (R, d1 ) é a união de no máximo enumerável de bolas


abertas disjuntas duas a duas. Mostre que o mesmo não vale em Rn , se n ≥ 2.

Você também pode gostar