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Kwasi Wiredu
O problema
Outro efeito pernicioso, como acréscimo ao erro antropológico, é que a própria elite
africana não realizou uma reflexão crítica “sobre a situação africana contemporânea”
(p.2), que, para Wiredu, concerne ao problema de sua não-modernização. Essa elite
mostra uma posição ambivalente: por um lado quer “preservar as culturas
indígenas[locais]” e, por outro, quer a modernização. Essa ambivalência, (ou seria
contradição, para Wiredu?), é que o caráter tradicional da cultura africana foi o
mesmo que “habilitava esparsos grupos europeus a subjugar largas massas da
população africana e coloca-la sob o jugo colonial (p.3). Aquela modernização a que
nos referimos acima, se revela aqui, tendo em vista a “situação africana
contemporânea”, como esforço de racionalização para um desenvolvimento
econômico e social: uma cultura na qual absorva os elementos da racionalidade
científica e do letramento4, além de ter critérios que orientem sobre o que deve ou
não ser evitado na cultura tradicional (oral e pré-científica/espiritualista). Sob este
último aspecto, Wiredu critica as superstições como manifestações irracionais das
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“Lamentavelmente, ao invés de observar as características não-científicas básicas do pensamento tradicional
africano como um tipo de pensamento tradicional em geral, antropólogos ocidentais e outros junto deles,
tendem a toma-las como definindo uma forma peculiar de pensamento africano. Os efeitos perniciosos deste
erro não são poucos”.
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Para Wiredu, esse erro “não implica em que isto [a indiferenciação] tenha acontecido por racismo anti-
africano” (p.2). Podemos, entretanto, desconfiar, dessa afirmação. O exótico (ou o “menos exótico”), pode ser,
uma forma de compreensão (antropológica, neste caso) racializada de um africano, conforme nos indica
Mbembe (Crítica da Razão Negra, p. 120-125).
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“Se uma cultura é tanto não-científica, quanto não letrada, em alguns importantes aspectos se pode dizer
que está atrasada em sentido bastante profundo” (p.3)
crenças5 (a bem da verdade, ele afirma, não só nas crenças africanas mais igualmente
as crenças em geral).
O que ele “exige” é que o pensamento se afirme por uma argumentação racional, que
deveria acontecer na análise da realidade (e em certos casos acontece tanto em África
quanto no mundo ocidental). O ocidente, contudo, realiza esta racionalidade com
mais desenvoltura do que a África
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Este aspecto simbólico impediria a aceitação de alguma ação irracional decorrente de uma crença quando,
segundo Wiredu, tal crença se efetiva, se “realiza” concretamente nas ações humanas. Tais ações não se
justificariam através de uma argumentação consistente, uma vez que preconceito e superstição manifestam a
irracionalidade: “(...) para se desenvolver em qualquer sentido sério, nós na África devemos romper com
nossos velhos hábitos acríticos de pensamento; isso significa que devemos deixar no passado o estágio do
pensamento tradicional.”
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Confira nota 5.