Você está na página 1de 263

UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO

FACULDADE DE HUMANIDADES E DIREITO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO

RESPONSABILIDADE SOCIAL, PREGAÇÃO E EDUCAÇÃO:

TENSÕES MISSIOLÓGICAS NO PROJETO MISSIONÁRIO DA

IGREJA METODISTA EM TERRAS BRASILEIRAS

NICANOR LOPES

São Bernardo do Campo — março de 2012


NICANOR LOPES

RESPONSABILIDADE SOCIAL, PREGAÇÃO E


EDUCAÇÃO: TENSÕES MISSIOLÓGICAS NO
PROJETO MISSIONÁRIO DA IGREJA METODISTA EM
TERRAS BRASILEIRAS

Tese apresentada em cumprimento parcial das


exigências para obtenção de grau de doutor em
Ciências da Religião, sob a orientação do
Prof. Dr. Geoval Jacinto da Silva. Programa de
Pós-Graduação em Ciências da Religião –
Área: Práxis Religiosa e Sociedade. Faculdade
de Humanidades e Direito, Universidade
Metodista de São Paulo.

São Bernardo do Campo — março de 2012


BANCA EXAMINADORA

Prof. Dr. Geoval Jacinto da Silva (Orientador)


Universidade Metodista de São Paulo – UMESP

Prof. Dr. Dario Paulo Barrera Rivera


Universidade Metodista de São Paulo – UMESP

Prof. Dr. Rui de Souza Josgrilberg


Universidade Metodista de São Paulo – UMESP

Prof. Dr. Benedito Ferraro


Pontifícia Universidade Católica de Campinas – PUC/CAMPINAS

Prof. Dr. Ely Eser Barreto César


Universidade Metodista de Piracicaba - UNIMEP
Para Lúcia Helena, Nica Jr. e Lucas,
porque vocês sempre foram companheiros em missão!

In Memoriam:
Idalina Soares Lopes,
mãe, discipuladora e motivadora ministerial.

Elias Boaventura,
ícone da resistência no sistema educacional do metodismo e motivador junto aos
movimentos populares.
Nós cremos na Igreja Universal porque ela é um sinal do Reino de Deus, cuja
fidelidade é revelada de muitas maneiras, onde as várias cores pintam uma só
paisagem, onde as várias línguas entoam um só louvor.

(9ª ASSEMBLÉIA DO CONSELHO MUNDIAL DE IGREJAS. Livro de culto e orações: em tua graça. Porto Alegre: [s.n.], 2006, p.60)
AGRADECIMENTOS

Glória ao Pai,
ao Filho
e ao Espirito Santo,
assim como era no principio, agora e sempre.
Amen.

Esta pesquisa foi possível somente pela generosidade da Igreja Metodista


por meio da Faculdade de Teologia. Sou grato aos meus amigos de missão, que
não somente me incentivaram, mas também caminharam comigo.

Prof. Dr. Geoval Jacinto da Silva: que desde os meus primeiros passos no
Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião da Universidade Metodista
de São Paulo foi um orientador firme e compassivo;

Prof. Clovis Pinto de Castro, Prof. Dr. Rui de Souza Josgrilberg e Prof. Paulo
Roberto Garcia: diretores da FATEO, pelo crédito e parceria nas ações
acadêmicas;

A toda “gente boa” da FATEO: pela amizade, companheirismo e apoio;

Elizangela A. Soares e Luciano José de Lima: pela dedicação e sugestões criativas


na revisão final do texto;

Lúcia, Nica Jr. e Suellen, Lucas e Elissa: pelo carinho e respeito.


LOPES, Nicanor. Responsabilidade Social, Pregação e Educação:
Tensões Missiológicas no Projeto Missionário da Igreja Metodista em
Terras Brasileiras. São Bernardo do Campo: Tese de Doutorado
(Faculdade de Humanidades e Direito, Programa de Pós-Graduação em
Ciências da Religião) — Universidade Metodista de São Paulo, São
Bernardo do Campo, 2012.

RESUMO

Esta pesquisa, Responsabilidade Social, Pregação e Educação: tensões


missiológicas no projeto missionário da Igreja Metodista em terras brasileiras, tem
como objetivo analisar as ações missionárias da Igreja Metodista do período de
sua implantação até o final do período referente ao 18° Concílio Geral (2006-2011).
A análise resgatou a tríade Responsabilidade Social, Pregação e Educação como
uma marca identitária do movimento wesleyano e que esse princípio missionário
nem sempre foi seguido pelo metodismo brasileiro. Notou-se também que a tríade
serviu, em momentos decisivos, como elemento norteador do projeto missionário.
Isso é percebido no período da implantação, bem como na constituição do Plano
para Vida e Missão (PVM). Em que pese que as ações missionárias no metodismo
brasileiro nem sempre foram providas de uma reflexão teológica sistemática, a
tríade Responsabilidade Social, Pregação e Educação sempre funcionou como
eixos essenciais da missão e de forma indissociável. Não foram poucos os
momentos em que o projeto missionário metodista enfrentou tensões na sua
execução. O ímpeto pelo crescimento numérico e expansão geográfica, muitas
vezes, ofuscou a fidelidade à tríade. Nessa trajetória de pesquisa está construída
em quatro capítulos, nos quais se busca a superação de uma compreensão
histórica equivocada e faz-se necessário que o projeto missionário assuma os
elementos essenciais da tríade como marco regulatório da missão metodista. As
repetitivas opções equivocadas não colaboram com a nova compreensão de
missão. O resultado da pesquisa encoraja futuras análises para que o metodismo
assuma o papel de agente de Deus na missio Dei e para que o seu envolvimento
missionário mantenha fidelidade à tríade Responsabilidade Social, Pregação e
Educação.

Palavras-chave: Missão — Metodismo — Missiologia — Responsabilidade Social —


Pregação — Educação.
LOPES, Nicanor. Social Responsibility, Preaching and Education:
missiological tensions in the Missionary Project of the Methodist Church
on Brazilian soil. São Bernardo do Campo: Thesis (Doctor’s Degree in
Sciences of Religion – Praxis and Society) — Methodist University of São
Paulo, São Bernardo do Campo, 2012.

ABSTRACT

The aim of the present research, Social Responsibility, Preaching and Education:
missiological tensions in the Missionary Project of the Methodist Church on Brazilian
soil, is to examine the missionary action of the Methodist Church, since its
implementation up to the period referring to the 18th General Conference (2006 –
2011). The study rescued that the triad of Social Responsibility, Preaching and
Education represents a distinct identity of the Wesleyan Movement, and that such a
missionary principle has not been closely followed by the Brazilian Methodism. It is
noteworthy that the triad was especially significant in the missionary project, which is
particularly noticeable during its implementation, as well as in the constitution of the
so-called Plano para Vida e Missão (PVM). Once assumed that the missionary action
in the Brazilian Methodism has not fully been characterized by systematic theological
reflections, the triad of Social Responsibility, Preaching and Education has always
played a prominent role in the mission. In many instances, a considerable strain was
put on the Methodist missionary project. The intense focus on the number of
followers and geographic expansion did not contribute to maintain great fidelity to the
triad and its ideals. Along the way research is built in four chapters, in which one
seeks refine a historical understanding of the process unfolded in this study, it is
crucial that the essential regulatory framework of the triad as the Methodist mission.
The research highlights the importance of further studies so that Methodism can take
on a fundamental role in the Missio Dei, enlightened by the triad of Social
Responsibility, Preaching and Education.

Key words: Mission – Methodism – Missiology – Social Responsibility – Preaching –


Education
SUMÁRIO

RESUMO ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 7
ABSTRACT -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 8
INTRODUÇÃO -------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 13
CAPÍTULO 1: O CONTEXTO SÓCIO-POLÍTICO-CULTURAL E ECONÔMICO QUE DÁ ORIGEM À
IGREJA METODISTA NO TERRITÓRIO BRASILEIRO --------------------------------------------------------- 23
1 Introdução do capítulo: a tríade missionária metodista — Responsabilidade Social, Pregação e
Educação -------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 23
1.1 O processo de implantação do metodismo brasileiro e a tríade missionária --------------------------25
2 A tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação — na formação do metodismo -- 34
2.1 A Responsabilidade Social como fruto do amor na formação do metodismo -------------------------------38
2.2 A pregação como elemento constitutivo da identidade na formação do metodismo -----------------------42
2.2.1 As mulheres pregadoras na formação do metodismo — uma inovação marcante ------------------44
2.3 A educação como elemento de inclusão social e crescimento espiritual na formação do metodismo 46
3 A tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação — como paradigma missionário na
formação do metodismo brasileiro ------------------------------------------------------------------------------- 49
3.1 Paradigmas missionários do protestantismo de missão na implantação do metodismo brasileiro e
suas mutações --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------52
3.2 A Responsabilidade Social como elemento de inclusão social na implantação do metodismo
brasileiro ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------57
3.3 A pregação como elemento de construção de uma identidade religiosa na implantação do metodismo
brasileiro ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------61
3.4 A educação como elemento de transformação social na implantação do metodismo brasileiro -------64

CAPÍTULO 2: AS INFLUÊNCIAS DA TRÍADE — RESPONSABILIADE SOCIAL, PREGAÇÃO E


EDUCAÇÃO — NO PROJETO MISSIONÁRIO METODISTA BRASILEIRO ------------------------------ 70
1 Introdução do capítulo: as influências da tríade missionária metodista — Responsabilidade
Social, Pregação e Educação ------------------------------------------------------------------------------------- 70
1.1 A influência do pietismo na tríade missionária metodista ---------------------------------------------------------71
1.2 A influência da presença leiga no debate missionário -------------------------------------------------------------73
10

2 A tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação — no primeiro momento


missionário do metodismo no Brasil (1835-1841) ------------------------------------------------------------ 75
3 A tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação — no segundo momento
missionário do metodismo no Brasil (1867-1930) ------------------------------------------------------------ 84
4 A tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação — no terceiro momento
missionário do metodismo no Brasil (1930-1982) ----------------------------------------------------------- 100
5 A tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação — a partir do “Vida e Missão”: o
quarto momento missionário do metodismo no Brasil (1982-2010) ------------------------------------ 122
CAPÍTULO 3: MAPEAMENTO DAS AÇÕES MISSIONÁRIAS DA IGREJA METODISTA------------ 136
1 Introdução do capítulo: mapeamento das ações missionárias no campo da tríade —
Responsabilidade Social, Pregação e Educação — no metodismo brasileiro ----------------------- 136
2 Mapeamento das ações missionárias da Igreja Metodista: da implantação à autonomia ------ 138
3 Mapeamento das ações missionárias da Igreja Metodista: da autonomia ao Plano para a Vida
e Missão (1930-1982) ---------------------------------------------------------------------------------------------- 156
4 Do Plano para a Vida e Missão aos dias atuais (2010) ------------------------------------------------- 164
CAPÍTULO 4: RESPONSABILIDADE SOCIAL, PREGAÇÃO E EDUCAÇÃO COMO PARADIGMA
MISSIONÁRIO DO METODISMO BRASILEIRO------------------------------------------------------------------ 188
1 Introdução do capítulo: a tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação — como
paradigma missionário do metodismo brasileiro ------------------------------------------------------------ 187
2 As mudanças de paradigmas na teologia de missão ---------------------------------------------------- 191
2.1 A missio Dei no Antigo Testamento ---------------------------------------------------------------------------------- 192
2.2 A missio Dei no Novo Testamento ------------------------------------------------------------------------------------ 193
2.3 A missio Dei em Paulo --------------------------------------------------------------------------------------------------- 195
2.4 A missio Dei como teologia de missão no contexto metodista brasileiro ----------------------------------- 196
3 O paradigma missionário na teologia de missão do metodismo latino-americano --------------- 199
3.1 Contribuições de José Míguez Bonino ------------------------------------------------------------------------------- 200
3.2 Contribuições de Mortimer Arias -------------------------------------------------------------------------------------- 204
4. O paradigma missionário presente no Plano para Vida e Missão e no Programa Dons e
Ministérios do metodismo brasileiro: o Rito de Passagem da Igreja transplantada para Igreja
encarnada ------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 208
4.1 Contribuição à luz da Responsabilidade Social ------------------------------------------------------------------- 218
4.2 Contribuição à luz da Pregação (produção literária) ------------------------------------------------------------- 221
4.3 Contribuição à luz da Educação (historiografia das IMES) ----------------------------------------------------- 223
5 Da compreensão da missão como empreendimento meramente expansionista e articulação
eclesiástica autoritária à tríade missionária — Responsabilidade Social, Pregação e Educação:
um convite à superação ------------------------------------------------------------------------------------------- 227
5.1 Inculturação como espaço vivencial da missão: um convite ao respeito e à convivência -------------- 229
5.2 Inculturação: um convite à ecumenicidade ------------------------------------------------------------------------- 231

CONSIDERAÇÕES FINAIS -------------------------------------------------------------------------------------------- 235


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS --------------------------------------------------------------------------------- 241
ANEXOS -------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 263
ÍNDICE DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 — Primeira página do livro de matriculas aberto por Martha Hite Watts, em 1881. _______ 67
Figura 2 — Quadro comparativo da década de 1930 ____________________________________ 112
Figura 3 — Quadro comparativo da década de 1950 ____________________________________ 113
Figura 4 — Capa do PVM _________________________________________________________ 215
Figura 5 — A missão é dialogada do lado de fora do templo ______________________________ 216
Figura 6 — A fé conjugada com a discussão política ____________________________________ 217

Mapa 1 — As três primeiras missões metodistas no Brasil ________________________________ 147


Mapa 2 — O metodismo no Brasil após fusão das conferências ___________________________ 151
Mapa 3 — Presença metodista no Brasil em 2010 ______________________________________ 184

Tabela 1 — O Brasil e a Igreja no início da década de 1980 ______________________________ 126


Tabela 2 — Aspectos socioculturais e eclesiais das décadas de 1980 e 1990 ________________ 131
Tabela 3 — Igrejas Evangélicas de Missão no Brasil em 2002 _____________________________ 137
Tabela 4 — Mapeamento da primeira missão metodista no Brasil (1835-1841) ________________ 140
Tabela 5 — Mapeamento da missão metodista no “Circuito Santa Bárbara” (1867-1876) ________ 141
Tabela 6 — Mapeamento da missão metodista “Ransom” no Brasil (1876-1881) ______________ 142
Tabela 7 — Mapeamento da missão metodista “Ransom” no Brasil (1876-1883) ______________ 142
Tabela 8 — Mapeamento da missão metodista no Brasil: Primeira Conferência Anual Brasileira (1886)
______________________________________________________________________________ 143
Tabela 9 — Mapeamento da missão metodista no Brasil (1886- 1900) ______________________ 147
Tabela 10 — Mapeamento da missão metodista no Brasil (1900- 1910) _____________________ 152
Tabela 11 — Mapeamento da missão metodista no Brasil (1918) __________________________ 153
Tabela 12 — Mapeamento da missão metodista no Brasil (1910-1920) ______________________ 153
Tabela 13 — Mapeamento da missão metodista no Brasil (1930) __________________________ 154
Tabela 14 – Mapeamento das ações missionárias do Projeto Uma Semana pra Jesus (1996-2011)175
Tabela 15 — Mapeamento das concepções sobre o discipulado ___________________________ 179
Tabela 16 — Mapeamento do desenvolvimento do metodismo brasileiro entre 1900-2000 ______ 185
ABREVIATURAS

CEB Confederação Evangélica do Brasil


CESE Coordenadoria de Estudos e Serviços Ecumênicos
CG Concílio Geral
CIEMAL Conselho de Igrejas Evangélicas Metodista da
América Latina
CLADE Congresso Latino Americano de Evangelização
CLAI Conselho Latino Americano de Igrejas
COGEIME Conselho Geral das Instituições Metodistas de
Ensino
EC Expositor Cristão
ENAVI Encontro Nacional de Avivamento e Santificação
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatítica
ICP Instituto Central do Povo
IM Igreja Metodista
IMES Instituições Metodistas de Educação Superior
MINAS Ministério Nacional de Avivamento e Santificação
PVM Plano para Vida e Missão
ULAJE União Latino-Americana da Juventude Ecumênica
UMESP Universidade Metodista de São Paulo
UNIMEP Universidade Metodista de Piracicaba
INTRODUÇÃO

A discussão sobre o tema da missão sempre esteve presente na pauta da


Igreja Cristã. Trata-se de uma questão vital no espaço religioso. A investigação
temática desperta diversos enfoques, pois se, por um lado, a discussão missionária
possui um enfoque predominantemente apologético em defesa de uma
determinada denominação, por outro, o enfoque mais abrangente da missão, como
a missio Dei, nem sempre é investigado como sentido maior da missão.

As leituras históricas da missão, na maioria das vezes feitas por historiadores


da Igreja, por exemplo, Justo L. González e Carlos Cardoza Orlandi, descrevem a
história do movimento missionário como se este acontecesse de forma linear e,
com esse pensamento, induzem a uma missiologia que reforça a ideia de missão
como mero expansionismo. Essa falsa compreensão desenvolve a ideia de uma
espécie de evolução missionária que equivocadamente reforça o conceito de
conquista e progresso da fé. Tal análise missiológica também se organiza com
processos de sequência numa perspectiva analítica, indo do simples ao complexo,
e a forma de aferir os resultados da missão tem como base o expansionismo
geográfico.

Essas compreensões ficam claras quando se pesquisa a missão da Igreja


Cristã desde o fim do período neotestamentário, denominado como período da
14

Idade Antiga, seguido da Idade Média, Idade Moderna e no mundo


contemporâneo. Superar este conceito missiológico linear não é uma tarefa fácil.
Trata-se de uma ideia muito mais complexa do que se pode imaginar. A discussão
missiológica na qual as questões do poder procuram homogeneizar conceitos
provoca os descaminhos da missão. Michel Foucault contribui para elucidação de
leituras históricas, Michel Said ao analisar Foucault e a imaginação do poder
afirma:

O ponto de partida de uma busca histórica para compreender como


os discursos adquirem não somente seu status social e
epistemológico, mas também sua densidade específica como obra
terminada, como convenção da disciplina, como ortodoxia datada.1

Assim, essa pesquisa aborda o tema da tensão missiológica no projeto


missionário da Igreja Metodista em terras brasileiras, especialmente nos elementos
essenciais da concepção wesleyana, a saber: Responsabilidade Social, Pregação
e Educação.

A motivação para esta pesquisa surgiu da necessidade de se investigar o


quanto é importante o tema da missão, em especial, em tempos de profundas
mudanças no campo religioso. O desenvolvimento de uma tese se dá pela vivência
acadêmica e também no cotidiano do labor ministerial.

Da perspectiva ministerial, o autor vivenciou situações diversas no campo da


missão. Em 1982, foi nomeado pela Igreja Metodista para o Campo Missionário de
Rondonópolis/MT. A vivência de 1982 a 1990 permitiu não somente a observação,
mas também a intervenção em vários aspectos da fronteira missionária. É
importante destacar que a expressão fronteira missionária não é aqui utilizada
como sinônimo de fronteira geográfica; também o é, mas não exclusivamente. Por
exemplo, a tensão na fronteira missionária quanto aos aspectos culturais no estado
do Mato Grosso na década de 1980 era muito maior que a fronteira geográfica. Em
outras palavras, viajar para o estado do Mato Grosso era muito mais fácil do que
enfrentar as tensões entre os imigrantes do sul do país na conquista de novas
fronteiras agrícolas em confronto com os povos indígenas da região

1
SAID, Edward W. Reflexões sobre o exílio e outros ensaios. São Paulo: Companhia das Letras, 2003, p. 93.
15

matrogrossense e os pequenos agricultores que viviam como posseiros de terras


públicas.

E isso não foi diferente quando o pesquisador, também por nomeação da


Igreja Metodista, participou de um intercâmbio missionário na Alemanha. Durante
cinco anos (1993-1998) o autor vivenciou a dimensão ministerial na cidade de
Nürnberg. Em que se pesem as devidas proporções das dificuldades nesta
fronteira cultural, as experiências foram múltiplas e enriquecedoras.

A dimensão da vida acadêmica se deu ao longo do tempo, tendo o seu início


em Rondonópolis, na rede pública, em especial na formação de educadores para o
ensino religioso, seguido de um curto período em Ribeirão Preto, no Seminário
Batista do Nordeste Paulista. Finalmente, desde 2001 este pesquisador integra o
corpo docente da Faculdade de Teologia da Igreja Metodista.

A motivação maior para esta pesquisa se encontra na necessidade de


oferecer uma reflexão missiológica que dê conta das tensões próprias desse
campo e, ao mesmo tempo, aponte caminhos que colaborem com a fidelidade ao
conceito da missio Dei (missão de Deus). Conjugando vida acadêmica e vida
ministerial, em 2003 o autor apresentou dissertação de mestrado com o título
“Responsabilidade social e terceiro setor: uma análise crítica da Associação
Beneficente Campineira da Igreja Metodista à luz da Teologia Prática”.

A primeira razão para a eleição do tema “Responsabilidade Social, Pregação


e Educação: tensões missiológicas no projeto missionário da Igreja Metodista em
terras brasileiras” centra-se no fato de que, muitas vezes, por falta de
fundamentação teórica e histórica consistentes, produz-se ações missionárias
geradoras de equívocos na caminhada da Igreja.

Não menos importantes, outras razões também foram motivadoras para a


escolha do tema. Uma delas é a necessidade de um referencial missionário que
seja coerente com o documento maior metodista sobre a missão, o Plano para
Vida e Missão da Igreja (PVM). Esse documento, aprovado pelo Concílio Geral da
Igreja Metodista em 1982 e referendado nos Concílios posteriores (1987, 1991,
16

1997, 2001, 2006 e 2011), é norteador das reflexões contemporâneas sobre o


tema da missão no metodismo brasileiro. Como se pode notar, é importante
destacar a relevância e novidade da perspectiva aqui denominada tríade
missionária, que contempla as dimensões da Responsabilidade Social, Pregação e
Educação como eixos indissociáveis para o cumprimento da missão.

Na revisão bibliográfica apresenta-se um conjunto de obras relacionadas à


missão e evangelização e ao metodismo na área da eclesiologia. Os temas
centrais do estudo — Responsabilidade Social, Pregação e Educação — foram
exaustivamente pesquisados. Portanto, a revisão bibliográfica procura atender os
seus referenciais teóricos e metodológicos.

Esta pesquisa tem por referencial teórico a trajetória das reflexões teológicas
a partir do conceito da missio Dei. De acordo com David Bosch:

Durante o último meio século, aproximadamente, houve uma sutil,


porém decisiva mudança no sentido de se entender a missão como
missão de Deus. Nos séculos precedentes, a missão foi
compreendida de várias maneiras. Às vezes, ela foi interpretada
primordialmente em termos soteriológicos: como salvar indivíduos da
condenação eterna. Ora foi entendida em termos culturais: como
apresentar pessoas do Oriente e do Sul às bênçãos e privilégios do
Ocidente cristão. Frequentemente, ela foi vista em categorias
eclesiásticas: como expansão da igreja (ou de uma denominação
específica). De quando em quando, foi definida em termos de história
da salvação: como um processo através da qual o mundo – pela
evolução ou por um evento cataclísmico – seria transformado no
reino de Deus. Em todos esses casos e de maneiras diversas, muitas
vezes conflitantes, a interrelação intrínseca entre cristologia e
doutrina da Trindade, tão importante para a igreja primitiva, foi
gradualmente substituída por uma das diferentes versões da doutrina
da graça.2

Como referencial teórico, a pesquisa partiu de estudos realizados no âmbito


da Teologia da Missão por autores como David Bosch, Paulo Suess, José Comblin
e Wesley Ariarajah. Esses estudiosos aprofundaram a teoria da missio Dei. Seus
textos retratam a necessidade de uma nova leitura sobre o tema da missão e
apontam que o caminho da mesma, a partir de Karl Barth, é uma reflexão que tem

2
BOSCH, David. Missão transformadora: mudança de paradigma na teologia da missão. São Leopoldo: Sinodal,
2002, p. 466.
17

por premissa a teologia trinitária e de conteúdo de envio. Como afirmam Patricia


Lloyd-Sidle e Bonnie Sue Lewis:

O conceito de missio Dei foi expresso pela primeira vez por Karl
Barth na Conferência do Conselho Missionário Internacional em
Willingen, em 1952. Fundamentado na teologia trinitária e na
natureza de Deus, apontou para uma compreensão de "Deus, o Pai
que envia o Filho, e Deus o Pai e o Filho que enviam o Espírito [e]
que foi expandida para incluir ainda outro movimento: Pai, Filho e
Espírito Santo que enviam a igreja para o mundo"3 (tradução nossa).

No caso da leitura histórica do protestantismo latino-americano autores como


Arturo Piedra, Hans-Jürgen Prien e Julio de Sant’Ana foram indispensáveis. Na
especificidade do metodismo, os principais estudiosos consultados foram José
Gonçalves Salvador, James L. Kennedy, Antonio Gouvêa Mendonça, Duncan
Alexander Reily, Prócoro Velasques Filho, Richard Heitzenrater, Theodore Runyon,
Rui de Souza Josgrilberg, Claudio de Oliveira Ribeiro, José Carlos de Souza e
Helmut Renders.

Portanto, o método aplicado a este trabalho é “o estudo comparativo das


semelhanças e diferenças entre diversos tipos de grupos, sociedades ou povos”.4
A investigação pretende verificar semelhanças e explicar as divergências no
movimento missionário metodista. Este método é utilizado tanto para comparações
de grupos do passado como entre os existentes e os do passado. Segundo Eva
Maria Lakatos e Marina Andrade Marconi, o método comparativo se assemelha ao
método tipológico de Weber: ao comparar fenômenos sociais complexos, o
pesquisador cria tipos e/ou modelos ideais, construídos a partir da análise de
aspectos essenciais do fenômeno.5

3
LLOYD-SIDLE, Patricia; LEWIS, Bonnie Sue. Teaching Mission in a Global Context. Louisville: Geneva Press,
2001, p. 125. Texto original: “The concept of the missio Dei was first expressed by Karl Barth at the Willingen
Conference of the International Missionary Council in 1952. Grounded in Trinitarian theology and God's very
nature, it pointed to an understanding of “God the Father sending the Son, and God The Father and the Son
sending the Spirit [and] was expanded to include yet another movement: Father, Son and Holy Spirit sending
the church into the world”.
4
LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina Andrade. Fundamentos de metodologia científica. 6. ed. São Paulo:
Atlas, 2009, p. 107.
5
LAKATOS; MARCONI apud OLIVEIRA, Silvio Luiz. Metodologia científica aplicada ao Direito. São Paulo:
Cengage Learning, 2002, p. 45.
18

Esse método tem sua aplicabilidade principalmente nas ciências sociais. A


utilização se deve à possibilidade que o estudo oferece de trabalhar com
grupamentos humanos em universos populacionais diferentes e até distanciados
pelo espaço geográfico.6 Segundo Rovigati Danilo Alyrio, o método comparativo se
realiza pela análise de sujeitos, fenômenos ou fatos, com o propósito de destacar
as diferenças e semelhanças entre eles.7

Ainda quanto ao método, é imprescindível destacar o pensamento de Franz


Rosenzweig. Segundo Klaus Berg, a filosofia de Franz Rosenzweig é uma crítica à
totalidade: “o ser humano não pode ser diluído em nenhum sistema pelo fato de
ser sujeito”.8 Isso significa que o novo pensamento9 pretende focar a experiência
do tempo como dimensão constitutiva do existir. O tempo e a experiência da
temporalidade são elementos inseparáveis da vida humana, pois pertencem ao
núcleo de nossa experiência vital.

A temática em questão faz parte da caminhada acadêmica do autor, que


busca nesta pesquisa dar a ela um enfoque bíblico-teológico-histórico-pastoral e
procura contribuir na reflexão missiológica metodista, em especial, na cadeira de
missão e evangelização que o autor ocupa na Faculdade de Teologia da
Universidade Metodista de São Paulo.

Nesse caso, o que se pode afirmar como inédito na pesquisa é a dimensão da


tríade missionária. Essa tríade contempla o núcleo gerador de ações missionárias
e, por isso, a partir dela se construiu a seguinte hipótese: a ausência e/ou a
dissociabilidade da tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação —
foram fatores predominantes nas tensões do projeto missionário do metodismo
brasileiro e na configuração identitária do mesmo.

Assim sendo, a pesquisa suscitou alguns questionamentos para reflexão:


quais os elementos missionários que o metodismo brasileiro ainda conserva de sua

6
FACHIN, Odília. Fundamentos de metodologia. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 37.
7
ALYRIO, Rovigati Danilo. Metodologia científica. Programa de Pós-Graduação em Gestão e Estratégia em
Negócios [PPGEN]. Rio de Janeiro: UFRRJ, 2008, p. 4.
8
BERG, Klaus. Hermenêutica do Novo Testamento. São Leopoldo: Sinodal, 1999, p. 232.
9
ROSENZWEIG, Franz. El nuevo pensamiento. Madrid: Visor, 1989.
19

origem wesleyana? Mantém o metodismo brasileiro o paradigma do mundo como


paróquia missionária? O ambiente religioso plural, como no movimento de
avivamento inglês do século XVIII, foi decisivo na tríade — Responsabilidade
Social, Pregação e Educação? E uma organização eclesiástica fruto de um projeto
missionário carregado de outras ideologias e interesses tem condições de garantir
a tríade em questão? Como os movimentos missionários, enquanto projetos
minoritários de contracultura (por exemplo, o metodismo inglês nascente), e os
projetos majoritários com caráter civilizatório (por exemplo, o norte-americano) se
comportaram quanto à fidelidade bíblico-teológico-histórico-pastoral?

Para responder às questões evidenciadas, a pesquisa procura elucidar os


eixos norteadores desenvolvendo a tese em quatro capítulos. No primeiro capítulo
analisamos o contexto sócio-politico-cultural e econômico que dá origem à Igreja
Metodista no território brasileiro. Trata-se de uma análise histórica, porém não
meramente descritiva. O que se procurou contemplar foi um exame que garantisse
a interpretação da relação da tríade missionária proposta. Tal análise permitiu a
compreensão da Responsabilidade Social como elemento de inclusão social,
conjugando a Pregação como elemento formador da identidade religiosa de cunho
protestante que, por sua vez, tem na Educação a condição de transformação social
na implantação do metodismo brasileiro.

O segundo capítulo se trata de uma abordagem das influências da tríade em


momentos considerados decisivos para o metodismo brasileiro, bem como as
consequências quando da ausência da tríade como, por exemplo, no primeiro
período missionário (1835-1841). Esse primeiro momento foi considerado um
movimento espontâneo e evidencia uma ação missionária com pouca conexão da
tríade, pois as ações missionárias se concentraram de forma preferencial na
pregação. Não se pode negar uma pequena presença de Responsabilidade Social
junto aos marinheiros com o atendimento da capelania portuária e quanto à
educação na abertura de Escolas Dominicais sem o oferecimento da educação
secular.

Passados vinte e seis anos de interrompimento da missão surge um novo


momento (1867-1930). Nesse período fica evidente a tríade nas ações
20

missionárias do metodismo brasileiro. A síntese do período pode ser observada


nas ações que constituem da abertura de pontos de pregação, capelas e
construção de templos que obedeciam ao seguinte formato: Responsabilidade
Social com ações concretas em favor especialmente de crianças empobrecidas
que eram atendidas nas Escolas Paroquiais. Não de menor valor fica evidente o
comprometimento com a transformação da sociedade monárquica para uma
sociedade republicana por meio da educação secular. Eis aí uma das fortes razões
do compromisso com a Educação.

As parcerias do projeto missionário metodista com os republicanos na busca


de novas mentalidades e organização da sociedade brasileira são analisadas a
partir do projeto educacional que tem sua gênese no Brasil na cidade de
Piracicaba/SP, com a chegada da missionária leiga Martha Watts. Esse projeto
contou com o apoio da família de Prudente de Moraes, que representava um
seguimento de articulação do movimento republicano no Brasil.

Com efeito, a Pregação com caráter conversionista ganha sentido e dá


sustentação ao projeto missionário metodista, a ponto de culminar com a
autonomia da Igreja.

O período de 1930-1982 foi marcado por profundas tensões, não somente no


ambiente interno da Igreja, como também com fatores externos do país. As
motivações que levaram à autonomia, em especial as questões nacionalistas e o
desejo de autogoverno, não foram suficientes para garantir a identidade na
perspectiva da tríade. As tensões no campo educacional não serão mais
relevantes para as ações missionárias, isto é, as escolas não representam mais
uma agência formadora de opinião para a compreensão da pregação e muito
menos para a responsabilidade social. As escolas paroquiais são fechadas nesse
tempo, gerando um distanciamento em termos de educação popular. Todavia,
como fruto das tensões surge, em 1982, sob influência de uma teologia missionária
de perspectiva latino-americana, o primeiro documento missiológico considerado
autóctone, o Plano para Vida e Missão (PVM). Pela primeira vez a Igreja Metodista
aprova uma carta missionária com conceitos de uma missão inculturada. O PVM
representa um documento missionário a partir da realidade brasileira, com reflexão
21

teológica de contexto latino-americano e retoma a dimensão da tríade. O PVM


focará a missão como missio Dei e reafirmará a responsabilidade social da Igreja
enquanto agência missionária. Esse documento também estabelecerá novas
Diretrizes para a Educação Metodista.

No terceiro capítulo procura-se construir o mapeamento das ações


missionárias da Igreja Metodista. A partir da premissa do método aplicado a este
trabalho, a pesquisa analisou o metodismo brasileiro em três momentos, a saber:
mapeamento da implantação até a autonomia, da autonomia ao PVM e do PVM
aos dias atuais. À vista desses momentos, a pesquisa procurou comparar a
fidelidade da tríade tanto no período de implantação como no desenvolvimento da
missão. É importante destacar que as fontes originárias do metodismo brasileiro
são distintas, a saber, o projeto oficial se dá no sudeste (Rio de Janeiro, São Paulo
e Minas Gerais), por meio do metodismo estadunidense do sul. Outro projeto,
desenvolvido de forma autônoma, de origem no metodismo estadunidense do norte
e conhecido como missão de autossustento, dá-se no norte e nordeste brasileiro.
Esse projeto não teve continuidade. Um dos indicativos para o fechamento dessa
missão pode ser a fragilidade da tríade. A implantação da missão no norte e
nordeste brasileiro não tinha como premissa as dimensões da Responsabilidade
Social, Pregação e Educação; o trabalho nesta região ficou centrado na pregação.

Outra inserção do metodismo se dá no sul do país, como fruto do trabalho


missionário da Igreja Metodista Episcopal do Uruguai. A consolidação do trabalho
no sul também pode ser atribuída à forte evidência ao compromisso com a tríade
— Responsabilidade Social, Pregação e Educação — e essa aproximação
referente aos elementos essenciais da missão permite uma fusão do trabalho
metodista do sudeste e sul como trabalho único.

Como cumprir a missão no contexto metodista brasileiro em face aos eixos


norteadores da tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação? Convém
sublinhar que o quarto capítulo procura apresentar paradigmas para uma
missiologia metodista brasileira a partir da tríade — Responsabilidade Social,
Pregação e Educação.
22

Contudo, a teologia da missão metodista brasileira fundamenta-se em


análises das mutações que os paradigmas na teologia de missão enfrentaram ao
longo da história dos movimentos missionários. As leituras contemplaram
perspectivas bíblico-teológico-históricas e pastoral. As contribuições de metodistas
latinos que discutiram com intensidade o tema da missão, tais como José Míguez
Bonino e Mortimer Árias, foram essenciais na elucidação e fundamentação da tese.
Para o exercício de contextualização da realidade brasileira uma releitura do PVM
foi indispensável.

À vista disso, constata-se que o PVM não somente resgata os valores da


tríade missionária do metodismo— Responsabilidade Social, Pregação e Educação
— mas também funciona como um rito de passagem de uma igreja transplantada
para uma igreja encarnada na realidade brasileira.

Enfim, procura-se com esta tese validar os elementos essenciais para a


missão metodista no Brasil com a esperança de que a teologia de missão
metodista no século XXI seja fiel a identidade wesleyana. Para tanto, é necessário
que a teologia de missão metodista tenha compromissos com os paradigmas
missiológicos a partir da tríade no contexto latino americano, do PVM e supere a
compreensão da missão como projeto meramente expansionista para uma
dimensão inculturada. E, que as tensões próprias do momento missionário
marcadas pelos valores de mercado e disputa denominacional não seduza a
teologia de missão metodista. Pelo contrário, que ela seja uma teologia fiel aos
princípios da tríade. Por conseguinte da missio Dei.
CAPÍTULO 1
O CONTEXTO SÓCIO-POLÍTICO-CULTURAL E
ECONÔMICO QUE DÁ ORIGEM À IGREJA
METODISTA NO TERRITÓRIO BRASILEIRO

1 Introdução do capítulo: a tríade missionária metodista —


Responsabilidade Social, Pregação e Educação
As possibilidades de leituras sobre os movimentos missionários no espaço
latino-americano, a partir dos meados do século XIX, não são poucas e a inserção
do metodismo brasileiro não difere de outros projetos. Neste contexto, algumas
leituras podem ser consideradas como: projeto civilizatório1; dominação do espaço
territorial2; exploração econômica3 e até missionária.

1
Cf. RIBEIRO, Darcy. O processo civilizatório: etapas da evolução sociocultural. 2. ed. São Paulo: Companhia
das Letras, 1998. Neste livro o autor desenvolve a teoria global sobre as etapas da evolução do processo
civilizatório. Ainda, do mesmo autor, veja América Latina, a pátria grande. Rio de Janeiro: Guanabara, 1986.
Darcy Ribeiro desenvolve neste livro a reflexão sobre a identidade latino-americana sob os aspectos histórico-
culturais, políticos e sociais.
2
Cf. BETHELL, Leslie (Org.). América Latina Colonial. Vol. 2. São Paulo: Editora Fundação Universidade de São
Paulo; Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 2004. O texto investiga as relações de dominação na
América Latina, entre outros fatores, a questão da dominação geográfica. Com a independência dos países de
dominação espanhola, em especial no século XIX, as contribuições culturais diferentes foram fundidas, muitas
vezes, por missionários religiosos.
3
Ibidem, vol. 6. Neste volume o autor desenvolve os fundamentos da exploração econômica latino-americana,
em especial na segunda metade do século XIX, denominada de “Idade de Ouro”.
24

Na América Latina também já foram exploradas, pelo viés do processo


colonizador, as tendências teológicas de cunho fundamentalista e liberal 4. Essas
tendências (ecumênica e evangelical) estiveram evidentes no período da guerra
fria, no desenvolvimento do denominacionalismo, etc. Entre outras questões, todas
essas leituras buscaram nas pesquisas “razões que justificaram e promoveram a
expansão protestante”.5

Como construir conhecimentos que possam superar as generalizações do


senso comum e das descontinuidades históricas? Esta pergunta oferece
possibilidades de investigação para apresentar os caminhos e descaminhos da
missiologia metodista brasileira. A motivação para esta pesquisa se dá em torno do
debate das ações de expansão missionária no metodismo brasileiro, cujos
resultados foram traduzidos como eixo norteador, a saber, a tríade
Responsabilidade Social, Pregação e Educação: tensões missiológicas no projeto
missionário da Igreja Metodista em terras brasileiras.

A pesquisa procura definir como tríade os conceitos essenciais da herança


wesleyana na unidade dinâmica da responsabilidade social, pregação e educação,
como elementos genuínos e fundamentais da teologia de missão metodista.
Tríade, neste caso, não significa apenas “conjunto de três coisas ou trilogia”.6 Seu
significado na pesquisa teológica é mais abrangente, pois não se trata,
simplesmente, da composição de três elementos. São partes essenciais que
formam uma unidade, como é o caso da doutrina da trindade.

A importância do tema se dá exatamente pela contínua discussão a respeito


da expansão missionária da Igreja, a saber, a tríade proposta sempre
desempenhou um papel considerável na identidade do metodismo mundial e

4
Para aprofundar esses conceitos (fundamentalismo e liberal) ver DREHER, Martin. Fundamentalismo. São
Leopoldo: Sinodal, 2006. Este livro trata do fundamentalismo religioso. O autor julga importante aprofundar por
todo o desenvolvimento do cristianismo desde o século XVII para esclarecer o que, mais recentemente, se
começou a chamar de fundamentalismo.
5
Cf. PIEDRA, Arturo. Evangelização protestante na América Latina. São Leopoldo: Sinodal, 2008. O livro de
Piedra discute o enfrentamento ocorrido no mundo político, econômico e religioso no continente americano. As
tensões entre o norte e o sul, pelas questões religiosas. O norte representado pelos EUA de religião
protestante e América Latina católica são analisados no texto numa abordagem da obra missionária promovida
pelos EUA na América Latina.
6
HOUAISS, Antonio. Dicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
25

constitui um foco nos debates teológicos contemporâneos sobre o crescimento da


Igreja.

Para a tradição wesleyana, responsabilidade social, pregação e educação são


ações essenciais no desenvolvimento do projeto missionário e elementos
indissociáveis. Entende-se, portanto, que missiologia é toda a complexidade de
relações na tarefa missionária. Como afirma João Panazollo:

A missiologia é a ciência teológica que estuda a realidade


missionária no seu conjunto e nos seus diversos elementos. Em
outras palavras, é a disciplina teológica que se ocupa das missões
sob a luz dos princípios da revelação divina, da doutrina teológica,
conjugando-se com os tratados mais importantes: a Trindade, a
Cristologia, a Eclesiologia... Conta com conhecimentos humanos e
antropológicos e de outros aspectos relacionados, pesquisados,
cientificamente elaborados, sistematizados e, metodologicamente,
apresentados. É decisivo para a missiologia manter a parceria com
outras disciplinas.7

Afirmar que há conflitos na missiologia metodista não significa desqualificá-la


no seu projeto missionário. Pelo contrário, “deveria tornar-se logo claro que em
nenhuma época dos dois últimos milênios houve uma única teologia de missão”.8
Portanto, as leituras missiológicas da América Latina são resultantes de um
processo de miscigenação étnico-cultural e se caracterizam pela diversidade e
pluralidade. Nessa diversidade, as relações e as construções que se
desencadearam na história do metodismo em terras brasileiras, no campo da
expansão missionária, apresentam-se como objeto próprio de investigação. Assim,
a tríade Responsabilidade Social, Pregação e Educação não necessariamente será
apresentada nesta ordem. Como se tratam de elementos indissociáveis, a ordem
não possui valor determinante na pesquisa.

1.1 O processo de implantação do metodismo brasileiro e a tríade


missionária

7
PANAZZOLO, João. Missão para todos: introdução à missiologia. São Paulo: Paulus, 2006, p. 17-18.
8
BOSCH, David. Missão transformadora: mudanças de paradigma na teologia da missão. São Leopoldo:
Sinodal, 2002, p. 25.
26

A gênese histórica do metodismo brasileiro, nesta pesquisa, contemplará não


somente o ímpeto missionário do metodismo estadunidense no final do século XIX,
ou mesmo a ideologia norte americana do Destino Manifesto9, Doutrina Monroe10 e
Pan-americanismo11. Buscar-se-á analisar as questões que envolveram a
contextualização desse projeto missionário e seus desdobramentos, com especial
atenção às influências missiológicas que caracterizaram a expansão missionária
estadunidense em direção ao continente latino-americano, em específico o
movimento de expansão metodista no Brasil. Não menosprezando essas leituras
históricas, porém na busca de novos elementos interpretativos, buscar-se-á
investigar o que será denominado, a partir de agora, de tríade metodista:
Responsabilidade Social, Pregação e Educação. “O movimento metodista, ao
longo dos anos, teve como expressões de fé e serviço três ações: Evangelização
(anúncio e material impresso), Ação Social e Educação (cristã e secular)”.12

Outras chaves de compreensão missiológica acompanharam o movimento


missionário metodista no período do reavivamento e expansionismo norte-
americanos no século XIX, na chamada “era metodista” 13, mas que não serão
analisadas neste trabalho. O movimento missionário metodista pelo continente
norte-americano retomou a tríade wesleyana do metodismo: o Arminianismo14, tese
contrária ao calvinismo; o Puritanismo15, movimento de reação à Reforma

9
“Destino Manifesto” era a ideologia que entendia que os protestantes norte-americanos se sentiam
comissionados a levar a todo o mundo a religião e a cultura protestantes, isto é, anglo-saxãs – ou a doutrina da
“Igreja Espiritual”, que advogava completa separação entre Igreja e cultura. Cf. MENDONÇA, Antonio Gouvêa;
VELASQUES FILHO, Prócoro. Introdução ao protestantismo no Brasil. São Paulo: Loyola, 1990, p. 163.
10
A “Doutrina Monroe” foi formulada em 1823 pelo presidente norte-americano James Monroe. Sua tese principal
é “América para os americanos”. Essa doutrina foi assumida completamente no final do século XIX. Cf.
SANTOS, Marcelo. O poder norte americano e a América Latina no pós-guerra fria. São Paulo: Annablume;
Fapesp, 2007, p. 22.
11
PIEDRA, Evangelização protestante na América Latina.
12
SILVA, Geoval Jacinto da. A relevância do pensamento de John Wesley para a Teologia Pastoral. Revista
Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 9, n. 18, p. 121-136, jan./jun. 2005.
13
REILY, Duncan A. História documental do protestantismo no Brasil. São Paulo: ASTE, 1984, p. 7.
14
SCHÜLER, Arnaldo. Dicionário enciclopédico de teologia. Canoas: ULBRA, 2002, p. 64: “Arminianismo. As
doutrinas de Armínio. Divergiu da doutrina da predestinação absoluta. Segundo ele, desde toda a eternidade
Deus predestinou à vida eterna aqueles que, de acordo com a presciência divina, haveriam de permanecer
firmes na fé até o fim; Cristo morreu por todos, não só pelos predestinados à vida; o livre-arbítrio humano
coopera na conversão; o homem pode resistir à graça e dela pode cair. Essas doutrinas foram condenadas
pelo Sínodo de Dort (1518-19)”.
15
Ibidem, p. 387: “Puritanismo. Principiou como movimento de protestantes ingleses que julgavam a Igreja da
Inglaterra da era de Elisabete I necessitava de reformas que eliminassem corrupções remanescentes,
tornando-a mais calvinista. Na luta em torno da ordem eclesiástica, surgiram várias correntes (presbiterianos,
congregacionalistas, etc). Como modo de vida, o puritanismo põe ênfase na santidade de todos os grupos do
27

Anglicana no período da Rainha Elisabeth I; e o Pietismo16, que, por sua


complexidade, não é possível sintetizar numa frase. Porém, a seu respeito se
destaca, nesta pesquisa, a afirmação de Antonio Gouvêa Mendonça:

Discuti como o pietismo moraviano inseriu-se no protestantismo


missionário e lhe deu um colorido especial. Pretendo mostrar agora
que esse mesmo pietismo chegou ao Brasil como ponta de linha da
ebulição religiosa dos avivamentos dos séculos XVIII e,
principalmente, XIX.17

É importante observar que a tríade da gênese do metodismo inglês não será


muito diferente da tríade metodista estadunidense. E a gênese do metodismo
brasileiro será alimentada, agora, por uma tríade norte-americana que, segundo
Hans-Jürgen Prien, representa outra chave interpretativa da missiologia metodista
no período de sua implantação: protestantismo, liberalismo e maçonaria
articulavam o mesmo projeto na América Latina. Em pesquisa sobre o tema,
Dussel afirma: “ser protestante, liberal e maçom eram aspectos de um mesmo
fenômeno, ao qual se agregava o racionalismo e naturalismo”.18 A partir desta
leitura não se poderá negar os conflitos e as tensões no campo religioso entre
protestantismo de missão e catolicismo romano.

Para melhor compreender essa tríade metodista na área da educação, nossa


investigação baseou-se, não exclusivamente, nos estudos de Peri Mesquida,19
pesquisador no campo da educação protestante no Brasil. É interessante notar que
Mesquida analisa a formação do espaço urbano do sudeste brasileiro não somente

movimento. O termo puritanismo passou a significar também moralismo, extrema severidade de costumes,
excessivo rigor na aplicação de princípios. ‘É difícil definir o puritanismo, já que foi ao mesmo tempo um estado
de espírito, um programa e um movimento dentro da Igreja da Inglaterra com raízes no período inicial da
Reforma’ (51: vol.II, p. 141)”.
16
LOMBARDI, José Claudinei et. al. (Org.) Navegando pela história da educação brasileira. Campinas: Graf. FE:
HISTEDBR; Unicamp, 2006. CD-ROM. “Movimento religioso nascido na Alemanha em fins do século XVII,
como reação ao dogmatismo da igreja oficial luterana. Seu principal representante foi o pastor luterano Phillipp
Jakob Spener (1635-1705). O Pietismo defendia a renovação da piedade com base em um retorno subjetivo e
individual ao estudo da Bíblia e à oração. Em termos educacionais, destacou-se neste movimento a figura de
August Francke (1663-1727) que, a partir da Universidade de Halle, difundiu seu sistema pedagógico. A
influência do pietismo atingiu o seu maior alcance através de John Wesley (1703-1791), fundador do
Metodismo. O pietismo inspirou as medidas educacionais adotadas pelos movimentos evangélicos
conservadores, nos Estados Unidos, no início do século XIX”.
17
MENDONÇA, Antonio Gouvêa. O celeste porvir: a inserção do protestantismo no Brasil. 3. ed. São Paulo:
USP, 2008, p. 337.
18
DUSSEL, Enrique. Tensiones en el espacio religioso: masones, liberales y protestantes em la obra de Mariano
Soler. In: BASTIAN, Jean-Pierre (Org). Protestantes, liberales y francmasones. México: Cehila, 1990, p. 35.
19
MESQUIDA, Peri. Hegemonia norte-americana e educação protestante no Brasil. Juiz de Fora: EDUJF; São
Bernardo do Campo: Editeo, 1994.
28

como uma marcha para o “progresso”, mas também como um movimento


geopolítico similar às marchas norte-americanas na sua expansão de fronteiras —
o que justifica a forte tendência ideológica do chamado liberalismo norte-
americano, ideologia que está muito presente na pregação protestante e no projeto
educacional das igrejas de missão, como o metodismo 20.

O tema da pregação é analisado a partir de Francis Gerald Ensley,21 que em


seu texto enfoca a pregação em John Wesley como meio de cumprimento da
missão, em especial na época em que ele descobre a pregação ao ar livre. Prócoro
Velasques Filho e Antonio Gouvêa Mendonça serviram como referencial teórico,
principalmente na análise do culto protestante brasileiro. Eles afirmam que:

Se no catolicismo a centralidade do culto repousa no mistério da


missa, particularmente na transubstanciação, o culto protestante
tem seu centro na pregação. Em presença da pregação, hinos,
orações, testemunhos e leituras bíblicas tornam-se elementos
secundários e ornamentais.22

As igrejas de missão ou históricas, a saber: batista, congregacional, metodista


e presbiteriana, no desenvolvimento de sua obra missionária no século XIX,
valorizaram a pregação não somente como estratégia de implantação, mas
também como forma apologética na evangelização. As influências do racionalismo
levaram a teologia fundamental a se ocupar de formas apologéticas para justificar
a fé através da razão. Nesse período os “teólogos ortodoxos, tanto protestantes,
como católicos, usaram a razão para garantir a autoridade divina de Cristo e da
Igreja”.23 Assim sendo, o protestantismo de missão, ao se implantar no Brasil,
utiliza-se da pregação apologética para questionar o cristianismo estabelecido
pelos católicos ao longo de mais de quatrocentos anos. Magali do Nascimento
Cunha afirma:

A primeira função dos missionários passou a ser o convencimento


dos ouvintes que a religião e a cultura deles eram pagãs e os

20
MESQUIDA, Hegemonia norte-americana e educação protestante no Brasil, p.133.
21
ENSLEY, Francis Gerald. John Wesley, o evangelista. São Paulo: Imprensa Metodista, 1960.
22
MENDONÇA; VELASQUES FILHO, Introdução ao protestantismo no Brasil, p. 159.
23
O’COLLINS, Gerald; LATOURELLE, René (Org). Problemas e perspectivas de teologia fundamental. São
Paulo: Loyola, 1993, p. 267.
29

levariam ao inferno. O anticatolicismo passa a ser uma das grandes


características da pregação missionária.24

Tal como Mendonça, Cunha entende que o pregador protestante mediava a


compreensão das teses religiosas para os ouvintes. No caso específico dos
metodistas, a “pregação avivalista arminiana-metodista viabilizava-se pelas
condições sociais locais, embora se distanciasse da teologia oficial”.25 Esta
compreensão protestante em valorizar a pregação a ponto de a mesma ocupar um
lugar central nas atividades religiosas é fruto do puritanismo inglês. Segundo Max
Weber, a pregação de cunho puritano tinha por objetivo central “tornar o
cristianismo na Inglaterra o mais ‘puro’ possível, praticado por uma Igreja
‘purificadora’ de todo resíduo papista e de todo oficialismo estatal, uma igreja de
doutrina absolutamente ‘pura’ conforme a Sagrada Escritura”.26 A repercussão
deste conceito na pregação é perceptível, uma vez que a pregação protestante
dedicará especial atenção neste campo, elevando no mesmo a sua exigência. No
metodismo nascente não será diferente. Luiz Carlos Ramos, ao analisar a prática
homilética de John Wesley, afirma:

Segundo consta, Charles Wesley era muito mais exigente e severo


na seleção de pregadores do que o irmão John. Consta-se que
certa vez, aborrecido com o fato de alguém, ‘sem o auxílio de
Deus’, ter feito de um alfaiate pregador, ele teria dito que estava
pronto, ‘com o auxilio de Deus’, a tornar o pregador novamente
alfaiate.27

O movimento metodista estadunidense garantiu a continuidade com a


preocupação e cuidado para com os pregadores, assim como o movimento
wesleyano do século XVIII. Essa ênfase na pregação fortalecerá a dimensão
apologética através da pregação de uma “fé viva” e “obras de justiça” que, segundo
Mendonça, “era exatamente a tendência da pregação metodista”.28 Essa

24
CUNHA, Magali do Nascimento. A explosão gospel: um olhar das ciências humanas sobre o cenário
evangélico no Brasil. Rio de Janeiro: Mauad; Instituto Mysterium, 2007, p. 37.
25
MENDONÇA, O celeste porvir, p. 327.
26
WEBER, Max. A ética protestante e o “espírito” do capitalismo. Edição de Antonio Flávio Pierucci. São Paulo:
Companhia da Letras, 2007, p. 288.
27
RAMOS, Luiz Carlos. Prática homilética de John Wesley. Revista Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 9,
n. 13, p. 134-153, jan./jun. 2004.
28
MENDONÇA, op. cit., p. 86.
30

preocupação com a pregação também estará presente no movimento missionário


metodista em terras brasileiras.

Pode-se afirmar que a tríade missionária esteve presente no processo de


criação e implantação do metodismo inglês, estadunidense e brasileiro. Neste
processo o foco na dimensão da Responsabilidade Social fica evidenciado,
conforme será discutido posteriormente. A Inglaterra do século XVIII com suas
crises sociais será impactada pelas práticas solidárias do movimento metodista;
“historiadores dizem que o reavivamento metodista evitou uma revolução
sangrenta na Grã-Bretanha, inaugurando uma dinâmica reformista na destinação
social da democracia”.29

Responsabilidade Social nesta pesquisa será estudada como uma estratégia


missionária e como gênese da missiologia metodista. Helmut Renders compreende
que a festa do amor ou ágape representa uma estrutura estética litúrgica de
solidariedade e por isso essas celebrações valorizavam a partilha do pão e do
cálice onde

Wesley posicionava a coleta a favor dos pobres no centro desta


celebração, entre a distribuição do pão e do ‘cálice de amor’ (love
cup). Assim, ele relaciona a ética (doação para os pobres) com a
estética (forma do culto). O acento místico recebe em seguida um
espaço nas sessões das testemunhas e das orações espontâneas
que se seguiam imediatamente.30

Assim, é possível identificar o conceito de Responsabilidade Social na gênese


do metodismo nascente. Os desdobramentos deste conceito continuam numa
dinâmica intensa na vida em sociedade. O metodismo estadunidense, no período
de sua implantação no Brasil, impulsionado pelos ideais do liberalismo, assume
parcerias com a maçonaria por entender que esta instituição pode colaborar nos
projetos de solidariedade e desenvolvimento filantrópico.31

29
CAVALCANTI, Robinson. Cristianismo e política: teoria bíblica e prática histórica. Viçosa/MG: Ultimato, 2002,
p. 154.
30
RENDERS, Helmut. O Plano para a Vida e a Missão e sua espiritualidade correspondente. Revista
Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 12, n. 20, p. 85-104, jul./dez. 2007.
31
Cf. VIEIRA, David Gueiros. O protestantismo, a maçonaria e a questão religiosa no Brasil. Brasília: Editora
Universidade de Brasília, 1980.
31

As ambiguidades nesse contexto não podem ser analisadas como exclusivas,


pois, na avaliação de Paul Tillich, “a relação da Presença Espiritual com a religião
apresenta dois aspectos, porque tanto a ambigüidade mais profunda da vida
quanto o poder de superar as ambiguidades da vida se manifestam na religião”.32
Em estudos realizados pelo ISER, Catolicismo: modernidade e tradição33,
encontra-se a afirmação de que a Diocese de Campos se divide em duas
tendências. Uma, tradicionalista, liderada por Dom Antonio de Castro Mayer; e
outra, institucional, liderada por Dom Carlos Alberto Etchandy. No estudo, Zelia
Seiblitz afirma que:

na primeira fase, os cuidados com o apostolado moderno se


omplementam com a perseguição às seitas, elas mesmas vistas
como resultado do liberalismo. É época dos ataques ao
protestantismo, ao espiritismo, à maçonaria. 34

O que confirma David Gueiros Vieira na sua pesquisa sobre “Protestantismo,


a maçonaria e a questão Religiosa no Brasil” 35, ao investigar a possível coligação
entre grupos maçônicos e protestantismo de missão, no final do século XIX. O
autor verifica que a questão religiosa brasileira, nessa época, é marcada pela
disputa ideológica do espaço político, por um lado do liberalismo, apregoado pelos
missionários protestantes estadunidenses e, por outro, pelo movimento
conservador ultramontano do catolicismo romano.

Nesta mesma direção, o historiador Hugo Fragoso corroborará acerca da


existência de tensões na questão religiosa no final do período do Império e já na
República. Sobre as discussões entre os padres católicos e o Estado no tema da
maçonaria ele afirma:

Se colocarmos a Questão Religiosa dentro de um contexto Igreja-


Povo, é duro ouvir a acusação que fazia Joaquim Nabuco.
Ironicamente lembrava ele que dois bispos foram presos e
encarcerados porque tiveram coragem de “atacar a maçonaria”,

32
TILLICH, Paul. Teologia Sistemática. Três volumes em um. 5. ed. São Leopoldo: Sinodal, 2005, p. 668.
33
SANCHIS, Pierre (Org.). Catolicismo: modernidade e tradição. São Paulo: Loyola, 1992.
34
SANCHIS, Catolicismo, p. 270.
35
Cf. VIEIRA, David Gueiros. O Protestantismo, a maçonaria e a questão Religiosa no Brasil. Brasília: UNB,
1980.
32

mas nenhum bispo pregava do alto do púlpito contra a escravidão


negra.36

Por conseguinte, sob influência do pensamento liberal, somado às práticas


filantrópicas da maçonaria, o movimento missionário se aproxima da organização
do Brasil Império para fortalecer os traços do liberalismo e apresentar a
benemerência como um componente da religiosidade protestante.

Assim, o pensamento filantrópico, como missiologia metodista, compõe o


modo de fazer missão protestante, o que pode ser aferido a partir da instalação da
primeira instituição de ação social no Brasil, fundada em 1906 pelo missionário
Hugh Clarence Tucker. O Instituto Central do Povo (ICP), mesmo fundado com
objetivos educacionais no início do século XX, bem como outras instituições do
sistema metodista de educação se diferenciará por desenvolver uma vocação
própria de benemerência, pois sua escola diurna atenderá às crianças da
população empobrecida.

Tucker, que chegara ao Brasil em 1886 para pastorear a comunidade norte-


americana residente no Rio de Janeiro, dará início, em 13 de maio de 1906, às
obras do ICP. Destaca-se que, nesse dia, a Lei Áurea37 adquire sua maioridade (18
anos) — talvez um fato não proposital, porém um dado historiográfico interessante.
Tucker afirma:

Há tempos um pequeno grupo de crentes, desejosos de fazerem


alguma coisa em benefício das almas dessa numerosa multidão de
trabalhadores que tem vindo de diversos pontos do país, para esta
Capital, tem reunido, de semana em semana, em oração, rogando a
Deus para lhes deparar os meios necessários e um lugar
apropriado, para onde pudessem convidar o povo, especialmente a
multidão dos operários para lhes anunciar o Evangelho de nosso
Senhor Jesus Cristo.38

36
FRAGOSO, Hugo. História da Igreja no Brasil: ensaio de interpretação a partir do povo, segunda época – a
igreja no Brasil no século XIX. Tomo II/1: História geral da Igreja na América Latina. 3. ed. Petrópolis: Vozes;
São Paulo: Paulinas, 1992, p. 188.
37
MOURA, Clóvis. Dicionário da escravidão negra no Brasil. São Paulo: USP, 2004, p. 15: “Abolição. Ato de
abolir. No caso da escravidão, o ato de extinguir esse sistema de trabalho. Ele podia acontecer ou por meio de
um movimento revolucionário, como no Haiti, ou por meio de uma norma jurídica, como no Brasil. A Abolição
no Brasil efetivou-se em 13 de maio de 1888, por ato da princesa Isabel, que exercia no momento as funções
de Regente do Império. O Brasil foi a última nação cristã do mundo a abolir o sistema escravo de trabalho pela
chamada Lei Áurea, assinada pela princesa Isabel”.
38
IGREJA METODISTA. Expositor Cristão, Rio de Janeiro, v. XXII, n. 20, p. 2, 16 mai. 1907, p. 8.
33

Tucker, que trabalhara como missionário durante dez anos no Rio de Janeiro,
revela, nesta fala, o espírito de Responsabilidade Social presente na comunidade
metodista como projeto missionário. Fazer o bem aos trabalhadores na capital do
país era fazer alguma coisa em benefício das almas dessa numerosa multidão de
trabalhadores.

José Carlos de Souza e Helmut Renders39 associam Tucker ao Evangelho


Social e afirmam que a identidade social da história da Igreja Metodista está ligada
a este missionário. Eles justificam esta categoria com o ministério de Tucker; e não
sem razão. Importante de se ressaltar na perspectiva historiográfica é que Tucker,
na sua autobiografia, destaca o seguinte:

Eu vim ao Brasil acreditando ardentemente na Liberdade Religiosa,


na Bíblia aberta, ao direito de todo homem interpretá-la. Eu sou o
único sobrevivente da Igreja Metodista no Brasil (1886). Eu
participei da tradução da Bíblia e um grande acervo de Literatura
Cristã. Fundei o Instituto Central do Povo, cooperei na fundação do
Colégio Granbery e ajudei no estabelecimento de várias outras
instituições educacionais. Participei da organização e construção do
Hospital dos Estrangeiros, Hospital Evangélico, Casa Bíblica
(Sociedade Bíblica), Igreja Union e ACM. Cooperei na erradicação
da Febre Amarela, e na organização do primeiro Playground,
Jardim da Infância, Clínica Médica e Dental e Classes em
enfermagem, economia doméstica e campanhas contra a
tuberculose, doenças venéreas e lepra. Em cada movimento para
melhora moral e espiritual do povo do Brasil, eu tenho procurado
fazer o papel de um cristão valioso.40

Portanto, para melhor compreender esta dimensão da Responsabilidade


Social, benemerência ou ação social, o próprio Tucker, ao escrever a sua
autobiografia, enfatiza suas ações missionárias nesse campo. Curioso observar
que a fundação do ICP se dá concomitante com a organização da Igreja Metodista
em São João, mas o nome desta igreja não aparece na sua autobiografia.

39
RENDERS, Helmut; SOUZA, José Carlos de. História da Igreja Metodista no Brasil: dos inícios até 2009. São
Bernardo do Campo, 2009. Disponível em:
<https://arkheia.metodista.br/jspui/bitstream/123456789/129/1/Historia%20da%20Igreja%20Metodista%20no%
20Brasil.pdf>. Acesso em: 12 fev. 2010.
40
Cf. Autobiografia. In: WAY, Anita Betts. Instituto Central do Povo: 100 anos em missão. São Bernardo do
Campo: Umesp, [s.d.], p. 20-21.
34

No mesmo campo da missão, Eliane Moura Silva41, ao analisar o trabalho


missionário educacional de Martha Watts em Piracicaba, também identificará o
conceito de Responsabilidade Social:

A religião seria, então, a inspiração para o trabalho dessas


missionárias; a crença religiosa mantinha o forte idealismo da
caridade, santificando tanto quem ajudava a causa por meio das
doações como aquelas que recebiam esses fundos para realizar
suas missões, no caso de Martha Watts, entre outras, como
missionárias e educadoras cristãs.42

Logo, a questão central da presente pesquisa é que esta tríade —


Responsabilidade Social, Pregação e Educação — é formada por elementos
indissociáveis no projeto missionário dos metodistas desde a sua gênese e as
expressões contemporâneas de missão ameaçam este tripé. A relevância desta
pesquisa é a análise da dimensão da tríade como chave de leitura da missiologia
metodista brasileira. Isso não significa que outras leituras que privilegiaram outras
formas, tais como: a dimensão do expansionismo ou mesmo avivamento não são
representativas ou que sejam de menor valor.

2 A tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação


— na formação do metodismo
Antes de levantar qualquer discussão ou relato sobre o metodismo inglês
como gênese do metodismo mundial, faz-se necessário discutir sobre a
historiografia do metodismo. Estamos partindo do pressuposto de que historiografia
é entendida como um discurso sobre o passado, estruturado sob a forma de texto,
que constitui o seu objeto de estudo. Portanto, historiografia é “nada mais que a
história do discurso – um discurso escrito e que se afirma verdadeiro – que os
homens têm sustentado sobre seu passado ”43. Assim, um pesquisador “nativo”

41
Este artigo trata a ação missionária com a expressão “missionarismo”, termo que não utilizaremos por não ser
comum nas reflexões teológicas. Segundo o Dicionário de Língua Portuguesa Houaiss (Rio de Janeiro:
Objetiva, 2001), “o uso do sufixo ismo se disseminou para designar movimentos sociais, ideológicos, políticos,
opinativos, religiosos e personativos, através dos nomes próprios representativos, ou de nomes locativos de
origem, e se chegou ao fato concreto de que potencialmente há para cada nome próprio um derivado”.
42
SILVA, Eliane Moura. Gênero, religião, missionarismo e identidade protestante norte-americana no Brasil ao
final do século XIX e inícios do XX. Mandrágora, São Bernardo do Campo, ano XIV, n. 14, p. 31-32, 2008.
43
CARBONELL, Charles-Olivier. Historiografia. Lisboa: Teorema, 1992, p. 6.
35

necessita de cuidados redobrados para não fazer apologias numa pesquisa


acadêmica. Otávio Velho faz a seguinte recomendação:

Se precisa manter uma tensão com os discursos “nativos”, deve


também manter a sensibilidade e mesmo uma vulnerabilidade em
relação a eles. É justamente o que torna essa tensão duplamente
complexa, dinâmica, instigante e, talvez, exemplar para o próprio
modo de tratamento da questão dos dualismos.44

Ampliando a discussão em torno da historiografia se encontra a


afirmação que lhe cabe como uma especificidade da história:

Não uma reflexão sobre a história, enquanto conjunto da produção


humana, mas fundamentalmente, sobre o conhecimento histórico, ou
seja, a reflexão sobre a produção dos historiadores ou (...) sobre as
obras históricas (...). Vale dizer, o debruçar-se sobre a história-
conhecimento.45

No caso da historiografia wesleyana, no texto “Repensar a teologia de Wesley


para o metodismo contemporâneo”, Randy L. Maddox afirma que as leituras que se
fazem de John Wesley são geralmente apologéticas:

A partir da morte de Wesley, ao longo do século XIX, a maioria das


publicações que tratam de Wesley cabe na categoria de biografia.
Independentemente de serem acadêmicas, essas biografias eram
geralmente elogios triunfalistas e ou defesa de Wesley46 (tradução
nossa).

Portando, analisar as questões que envolviam a Inglaterra no século XVIII,


tempo de John Wesley, não é tarefa simples. Entre as mutações, típicas de uma
sociedade em transformação, no campo da organização social e econômica,
destacam-se as transições de um sistema feudal para uma forma de capitalismo,
da economia rural para a economia industrial e a mudança no conceito de modos
de produção, que passa de doméstica para industrial de grande escala. Essas
mudanças são motivadas pela crise geral da economia européia. Theo Santiago,
ao fazer uma leitura histórica desse período, afirma:

44
VELHO, Otávio. Globalização: antropologia e religião. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/mana/v3n1/2458.pdf>.
Acesso em: 01 mar. 2010.
45
ARRUDA, J. J.; TENGARRINHA, J. M. Historiografia luso-brasileira contemporânea. Bauru: EDUSC, 1999, p.
11.
46
MADDOX, Randy L.; RUNYON, Theodore. Rethinking Wesley's Theology for Contemporary Methodism.
Michigan: Kingswood Books, 1998, p. 213. Texto original: “From the time of his death through the nineteenth
century the vast majority of publications dealing with Wesley fit in the category of biography. Far from being
detached scholarly accounts, these biographies were typically triumphalist panegyrics and/or defenses of
Wesley”.
36

Por uma parte, o século XVIII é um século de alta geral dos preços
[...], é ainda o século das grandes fortunas edificadas sobre o ouro
do Brasil, a prata mexicana, do açúcar e do rum das ilhas, do
algodão da América e da Índia, tudo isso extraído do trabalho dos
povos colonizados. [...] Constata-se, contudo, que o século XVIII,
especialmente nos países mais avançados como a Inglaterra, vê
desaparecer senão a carestia e a falta de pão, pelo menos as
fomes mortais.47

Tudo isso acabou modelando uma nova sociedade, com tensões próprias, e
certamente esses períodos proporcionam ambiguidades sociais. Assim como o
século XVIII promove fome e crise social, ele também proporciona acúmulo de
riquezas, como analisado por Santiago.

No campo religioso, Renders afirma que a gênese do metodismo inglês


origina dois movimentos, a saber, “um movimento de reforma intra-eclesiástica e
um movimento de reforma da nação”.48 Esses movimentos funcionam como chaves
hermenêuticas para a compreensão do desenvolvimento do pensamento de John
Wesley sobre a missão. A organização de uma liderança militante se dará pela
disciplina estabelecida nas Regras Gerais, que redundará não somente numa
militância cristã sem violência, mas forjará a maturidade cristã wesleyana e do
metodismo, como discorre Renders:

O vínculo dos dois, e a sua expressão máxima, podem ser


sintetizados, segundo Wesley, num único mandamento de Jesus, o
mandamento de amar os inimigos. Para isso a maturidade cristã
tinha que assumir o caráter radical da militância cristã e a militância
cristã precisava desenvolver características de maturidade cristã.49

Assim, para compreender o contexto sócio-político-econômico da Inglaterra


no século XVIII e utilizar a chave de leitura proposta por Renders é necessário
levantar a seguinte questão: quais as implicações que esse ambiente social
proporciona para o tempo de John Wesley e o movimento metodista? Para Souza,

A Inglaterra é o primeiro país a enfrentar um processo que implica na


transformação de todas as regras anteriores do jogo social, da inter-
relação. É o primeiro país que passa por transformações radicais das

47
SANTIAGO, Theo. Do feudalismo ao capitalismo: uma discussão histórica. 10. ed. São Paulo: Contexto, 2006,
p. 48.
48
RENDERS, Helmut. O metodismo nascente como Movimento. Revista Caminhando, São Bernardo do Campo,
v. 9, n. 1, p. 121-136, jan./jun. 2005.
49
RENDERS, O metodismo nascente como Movimento, p. 134.
37

estruturas econômicas, sociais e políticas. Comparando as


exigências da indústria com o trabalho agrário, são sumamente
desiguais. Por exemplo, o operário tem que se submeter ao ritmo da
máquina; existe sempre uma produção independente das condições
subjetivas, o que não acontece no trabalho agrário (...). Isso talvez
provocasse uma revolta, uma rebelião muito grande da parte do
povo, mas o poder do Estado nesse momento é amplo e inibe essa
revolta. Na Idade Média, as primeiras máquinas que surgiram foram
destruídas. Mas aqui, em virtude do poder do Estado, todos sabem
que o advento dessa nova sociedade é inevitável e o indivíduo tem
que se submeter se integrar.50

A partir da leitura de Renders e de outros pesquisadores, não somente o


Estado tem o poder de inibir um ambiente de rebelião e desordem social. Luiz
Carlos Soares desenvolve uma pesquisa intitulada “A Albion revisitada: ciência,
religião, ilustração e comercialização do lazer na Inglaterra do século XVIII” e, ao
analisar os dissidentes, afirma:

Diante da reação conservadora, fortalecida mais ainda pela


declaração de guerra à França revolucionária (1792), do governo
liberal pragmático do Primeiro Ministro Pitt, o Moço, o Racionalismo
inglês e o movimento Unitário sofreram um terrível golpe, com a
desmobilização de suas bases em virtude da existência de um clima
político de perseguição. No mesmo momento, as bandeiras de
reformas, ‘dentro da lei e da ordem’, passaram às mãos das
correntes Evangélicas, revigoradas com a expansão do Metodismo
de John Wesley51 (negrito nosso).

Assim, a leitura social, política e religiosa de Soares confirma a interpretação


de Renders, que afirma que a militância cristã sem violência leva o movimento
metodista à maturidade cristã e, naturalmente, esse estado maduro proporcionava
respeito e tolerância como sinônimos de amor ao próximo. Duncan A. Reily declara
ser um dos versículos favoritos de John Wesley: “fé que atua pelo amor (Gl 5.6),
que Wesley citava vez sem conta como a própria definição do cristianismo
autêntico”.52

50
SOUZA, José Carlos de. Introdução a Wesley. In: ______ (Org.) Wesley. São Paulo: Editeo; CEDI, 1991 (Série
Leituras da Bíblia: Wesley), p. 12-13.
51
SOARES, Luiz Carlos. A Albion revisitada: ciência, religião, ilustração e comercialização do lazer na Inglaterra
do século XVIII. Rio de Janeiro: 7Letras; FAPERJ, 2007, p. 80.
52
REILY, Duncan A. Wesley e sua Bíblia. São Bernardo do Campo: Editeo, 1997, p. 25.
38

2.1 A Responsabilidade Social como fruto do amor na formação do


metodismo

O movimento metodista do século XVIII nasce com uma base sólida no que
diz respeito à Responsabilidade Social como fruto do amor e da nova vida. Essa
atitude tinha no seu núcleo uma resposta da fé às crises sociais que o povo inglês
já enfrentava há muito tempo. A Inglaterra, desde o século XIV, tinha cunhado o
conceito de Welfare State (Estado de Bem-Estar) e por “perceberem que a
caridade cristã não daria conta de controlar a miséria generalizada”,53 com base
neste conceito aprovam leis de proteção aos pobres (Poor Laws).

Para Potyara A. P. Pereira, a evolução das preocupações sociais inglesas


avança na criação de “leis que regulamentam a perambulação de pessoas em
busca de melhores ocupações (Poor Law Acts), as Workshouses destinadas aos
pobres capazes de trabalhar”.54

Portanto, para o tempo de John Wesley e o contexto inglês, é discutível a


idéia de caridade que compreende “o auxílio ao próximo como imaginário cristão
do fim da Idade Média, projetando-se desde então o ideal de virtude de ajuda ao
pobre, equiparado à figura de Cristo”.55 Esse imaginário no contexto inglês já está
sendo discutido como política pública e, no movimento metodista, ocupa um
espaço de responsabilidade social como fruto do amor.

É certo que “Weber dificilmente interpretaria a caridade cristã como altruísmo


da submissão, nem tampouco rejeitaria os ideais cristãos de justiça social por
refletirem o “ressentimento” das classes inferiores”.56

O movimento metodista, dentro do movimento de reavivamento do século


XVIII, destaca-se por sua visão social e ganha muita força na sociedade inglesa. A
Responsabilidade Social afetou profundamente a sociedade daquela época. John
Wesley é reconhecido como o exemplo mais marcante desse período, pois elevou

53
PEREIRA, Potyara A. P. Política social: temas e questões. São Paulo: Cortez, 2008, p. 65.
54
Ibidem, p. 68.
55
BORGES, Célia Maia. Escravos e libertos nas irmandades do Rosário: devoção e solidariedade em Minas
Gerais – séculos XVIII e XIX. Juiz de Fora: UFJF, 2005, p. 102.
56
DIGGINS, John Patrick. Max Weber: a política e o espírito da tragédia. São Paulo: Record, 1999, p. 163.
39

a consciência social no seu tempo, tendo sido também um profeta da retidão


social, que lutou contra várias injustiças sociais e defendeu causas tais como:
abolição dos escravos e do seu tráfico; a humanização do sistema penitenciário; a
melhoria das condições nas fábricas e nas minas de carvão; a educação acessível
ao público e muitos outros avanços para a sociedade.

O compromisso com a Responsabilidade Social e a paixão por justiça social


marcaram o movimento metodista inglês e servem de inspiração no cuidado e
preocupação com a educação da população.

Entrementes, alguns filantropos intervinham procurando melhorar a


situação das classes inferiores. Já em 1780, o reverendo Robert
Raikes (1735-1811) abriu em Gloucester uma “escola dominical”
para os pobres, ensinando a ler e escrever utilizando a Bíblia.57

A Responsabilidade Social no movimento metodista inglês pode também ser


compreendida a partir da concepção da doutrina puritana que enfatiza a disciplina
e a rejeição dos valores transitórios do mundo, fazendo do engajamento social
parte integrante da espiritualidade do movimento e seu compromisso com as
questões bíblicas do Novo Testamento sobre as obras. Segundo Reily, “baseando-
se nestes princípios cristalinos do Novo Testamento e na própria experiência cristã, João
Wesley teve convicção de que a verdadeira fé em Cristo resulta inevitavelmente em boas
obras”.58

Portanto, a Responsabilidade Social não será um anexo ou acessório do


movimento metodista inglês do século XVIII. Essa expressão de Evangelho
Social59, com sua ênfase na realidade existencial dos cristãos, debate temas não
somente da Igreja, mas se compromete com ações de políticas públicas, economia
e organização social.

57
CAMBI, Franco. História da pedagogia. São Paulo: Unesp, 1999, p. 440-441.
58
REILY, Duncan Alexander. A influência do metodismo na reforma social na Inglaterra no século XVIII. São
Paulo: Junta Geral de Ação Social, 1953, p. 3.
59
Cf. RAUSCHENBUSCH, Walter. A Theology for the Social Gospel. New York: Macmillian, 1917 [New York:
Westminster John Knox Press, 1997]. O termo Evangelho Social (Social Gospel) foi cunhado por teólogos
protestantes no final do século XIX como oposição às práticas capitalistas da época. A tese central deste
movimento é o ser humano como guardião do próximo. Os principais articuladores desse movimento foram
Washington Lis (1836-1918) e Walter Rauschenbusch (1861-1918).
40

John Wesley levantou como um exemplo de ministério filantrópico a ação


conjugada da fé comprometida com a integralidade do ser humano e, por isso,
envolveu-se em projetos sociais de relevância. Em 1774, John Wesley escreve
“Reflexões sobre a Escravidão” — Thoughts upon Slavery60. Esse texto trata com
propriedade sobre uma denúncia social na qual John Wesley refuta pontualmente
todos os argumentos utilizados até então pelos defensores do escravagismo. A
reflexão contempla também a linha histórica da ação dos traficantes europeus de
escravos nas suas intenções colonizadoras no continente africano. Wesley
categoriza como imoral esse tipo de negócio e o qualifica como uma ação
incompatível com a conduta cristã. Élie Halévy afirma que John Wesley é um dos
colaboradores da Sociedade Abolicionista61, sociedade filantrópica fundada em
1787 por Granville Sharp e Thomas Clarkson, ambos anglicanos ligados aos
Quakers, que tinham no pregador Wesley a difusão dos ideais dessa sociedade.

Inconformado com a resolução do Parlamento Inglês, que rejeitou a proposta


da Lei de Abolição do Tráfico de Escravos, em 24 de fevereiro de 1791, John
Wesley, em sua última carta, recomenda pastoralmente ao parlamentar William
Wilberforce62 que continuasse nos seus esforços para fazer o Parlamento britânico
aprovar a Lei. Renders afirma que na militância de John Wesley “o engajamento
pessoal e pastoral é acompanhado por uma iniciativa editorial e pública”.63

O reconhecimento pelo engajamento dos protestantes ingleses é detectado


na pesquisa de Angela Alonso, que afirma:

Nabuco ficou contaminado. Vidrou em Gladstone. Conheceu um de


seus filhos por meio da Anti-Slavery Society. Ali cavou relações
estreitas. Era uma associação de raiz protestante. Os quacers
Tomas Clarkson e Granville Sharp foram pioneiros, combatendo o
tráfico negreiro. O evangélico William Wilberforce propôs

60
WESLEY, John. Obras de Wesley. Tomo VII. Editor General: Justo González. Franklin: Providence House
Publishers, 1996-1998 (Edición auspiciada por Wesleyan Heritage Foundation), p. 99-128.
61
HALÉVY, Élie. A History of the English People in the Nineteenth Century. Vol. 4. California: California
University Press, 1951.
62
BARBOSA, José Carlos. Negro não entra na igreja: espia da banda de fora. Protestantismo e escravidão no
Brasil Império. Piracicaba: Unimep, 2002, p. 221.
63
RENDERS, O metodismo nascente como Movimento, p. 133.
41

regularmente legislação abolicionista no Parlamento e fez meetings


pelo país até o fim da escravidão, em 1833. 64

O espírito filantrópico, atualmente compreendido como responsabilidade


social, será um eixo transversal da missão metodista desde sua gênese inglesa até
os projetos missionários além-mar, como por exemplo, nos EUA, América Latina e
outros continentes. No metodismo norte-americano, o movimento de santidade
(The Way of Holiness) liderado por Phoebe Palmer desenvolverá ações de
solidariedade e ela será considerada a pioneira na Obra Filantrópica Urbana.

Acima de tudo, as mulheres eram especialmente engajadas em


atos de benevolência, que demonstravam a sua obediência a Lei de
Deus. A própria Phoebe Palmer foi uma pioneira na filantropia
urbana, estabelecendo uma missão em Cinco Pontos, mais
precisamente na favela mais notória de Nova York, com assistência
humana aos presos65 (tradução nossa).

Tem-se na obra teológica do metodista Sante Uberto Barbieri o


estabelecimento de valores essenciais para a motivação missionária da Igreja
Cristã e, em especial, do metodismo latino-americano e brasileiro. A vida e a
missão da Igreja, segundo Barbieri, fundamentam-se “basicamente na vida e na
missão de Jesus”.66 O mesmo afirma:

Somente em íntima associação com aquele que veio para que


tivéssemos vida plena poderemos realmente contribuir para que
este nosso mundo se pareça, ainda que em tom menor, ao Reino
de amor e justiça que Ele proclamou e encarnou.67

Fica evidente a contribuição de Barbieri para a compreensão da dimensão da


responsabilidade social no metodismo como essencial.

64
ALONSO, Angela. Joaquim Nabuco: os salões e as ruas. São Paulo: Companhia das Letras, 2007, p. 153.
65
MATHISEN, Robert R. Critical Issues in American Religious History. Waco: Baylor University Press, 2001, p.
206. Texto original: “Above all, women were especially likely to engage in acts of practical benevolence, which
demonstrated their obedience to God´s law. Phoebe Palmer herself was a pioneer in urban philanthropy,
establishing a mission in Five Points, New York City´s most notorious slum, and dispensing assistance to
inmates in New York´s Tombs prison”.
66
BARBIERI, Sante Uberto. Aspectos da pobreza humana. São Bernardo do Campo: Imprensa Metodista, 1980,
p. 9.
67
Ibidem, p. 24.
42

2.2 A pregação como elemento constitutivo da identidade na formação


do metodismo

A pregação ou o púlpito nos estudos de missiologia representa um núcleo


gerador de ação missionária. No metodismo inglês não foi diferente. Em primeiro
lugar, pretende-se destacar a dimensão da pregação/púlpito ou anúncio. John
Wesley era um pregador exigente, tanto para si próprio como para os pregadores
do movimento metodista de sua época.

Richard P. Heitzenrater oferece uma pista interessante na questão valorativa


da pregação no movimento metodista inglês ao afirmar que, “em março de 1751,
Wesley convocou a primeira importante Conferência desde a implementação do
plano para examinar pregadores dezoito meses antes”.68 Essa preocupação com
os pregadores será uma constante no movimento metodista inglês, uma vez que os
Wesley sempre perceberão as tensões com a doutrina, haja vista que a mesma
está em processo de se firmar como doutrina autônoma. Os problemas doutrinários
essenciais assinalados por Heitzenrater são: “corrupção dos alemães (isto é, os
morávios) e a ’mancha’ da predestinação e do antinomianismo (isto é, Whitefield).69
É importante destacar que essas tensões representam movimentos próximos das
relações dos irmãos Wesley e, por isso mesmo, complicam o processo de
organização identitária do movimento metodista.

Essa análise do metodismo inglês na busca de firmar sua identidade religiosa


não pode ser feita somente da perspectiva do século XVIII, tempo dos Wesley.
Para a apreciação de Richard H. Niebuhr sobre as origens sociais do
denominacionalismo, o nacionalismo e as igrejas70 representam uma herança
européia dos países anglo-saxões, onde o protestantismo se estabelece com força,
diferente da religião católica dos países mediterrâneos 71. Assim, é relevante
destacar o caráter da pregação como elemento fundamental na construção da
identidade religiosa.
68
HEITZENRATER, Richard P. Wesley e o povo chamado metodista. São Bernardo do Campo: Editeo; Rio de
Janeiro: Pastoral Bennett, 1996, p. 182.
69
Ibidem, p. 186.
70
Cf. NIEBUHR, Richard H. As origens sociais das denominações cristãs. São Paulo: ASTE; Ciências da
Religião, 1992, p. 71-86.
71
Ibidem, p. 73.
43

Portanto, vale apontar que a Inglaterra, desde o século XVI, enfrenta tensões
religiosas e, já em 1535, na reforma do Parlamento, “estabeleceu uma forma
Erastina de governo, isto é, proclamaram Henrique VIII como cabeça tanto da
Igreja como do Estado”.72 Logo a seguir, surge o Movimento Puritano73; depois, o
Movimento dos Quakers74. Estes e outros movimentos articularam o campo
religioso inglês. Isso proporcionou um ambiente de tensões definido como “um
período de liberdade religiosa, de acordo com a opinião de um número cada vez
maior de pessoas, havia resultado no surgimento de um fanatismo religioso”.75
Certamente tal cenário exerce influência sobre os Wesley e sobre as suas relações
com os seus pregadores e movimento.

Outra descoberta importante no movimento metodista inglês, no campo da


pregação, foi o pregador local, uma pessoa leiga que tenha sido credenciada pelo
movimento metodista para liderar um grupo local.

Devido ao limitado número de ministros ordenados, o pregador local


desenvolveu um papel muito importante no movimento metodista. Não se tratava
de uma categoria eclesiástica, isto é, de um ministério ordenado, mas John Wesley
examinava com rigor todos aqueles em que sentia poder confiar para conduzir o
culto e pregar. Pregador local é um verbete assim definido:

O pregador local é um leigo que tenha sido credenciado por uma


Igreja Metodista para conduzir o culto em uma base regular.
Pregadores locais desempenham um papel importante na Igreja
Metodista da Grã-Bretanha e nas outras igrejas historicamente
ligados a ela, e também foram importantes na história social da
Inglaterra.76

72
HEITZENRATER, Wesley e o povo chamado metodista, p. 5.
73
Cf. BREMER, Francis J. The Puritan Experiment: New England Society from Bradford to Edwards. New
England: University Press of New England, 1976, p. 1: “Em 06 de fevereiro de 1556 no reinado de Queen Mary,
o bispo John Hooper foi trazido para Glouchester, a sede da sua diocese, onde foi queimado na fogueira”. Esse
movimento valorizava a pregação bíblica como a verdadeira lei de Deus e por isso propunha reformas na Igreja
e no Estado inglês. A partir de 1600, os puritanos ganharam força no Parlamento e os conflitos com a Igreja da
coroa se aprofundaram.
74
Cf. MORA, José Ferrater. Dicionário de filosofia. Tomo IV (Q-Z). São Paulo: Loyola, 2004, p. 2422: “A principal
doutrina é a da ‘luz interior’. Outras doutrinas são: oposição à predestinação, a idéia de que o homem pode
vencer o pecado se segue por si mesmo a revelação cristã, a idéia de que a crença religiosa quaker é assunto
de responsabilidade exclusivamente pessoal. Além disso, os quakers defenderam o valor da palavra
empenhada e a completa sinceridade”.
75
HEITZENRATER, Wesley e o povo chamado metodista, p. 13.
76
METHODISTS. Webster´s Quotations, Facts and Phrases. New York: ICON Group International, 2008, p. 128.
44

Heitzenrater valoriza também este vocábulo e esclarece que o Pregador local,


no tempo de John Wesley, “não era itinerante. Nos EUA, o pregador local era, em
geral, itinerante que, por circunstâncias particulares (...), não mais reunia as
condições de viajar pelo circuito.77

2.2.1 As mulheres pregadoras na formação do metodismo — uma inovação


marcante

A historiografia do movimento de avivamento tem como personagens


principais os homens, o que não é diferente no metodismo inglês. Contudo, o
contexto Inglês do século XVIII, com suas ambiguidades e transformações,
vivenciará, no movimento metodista, a pregação feminina.

Assim como nos primeiros séculos, mulheres ajudaram no testemunho da fé


cristã, não somente com obras de caridade ou como profetizas, mas também como
pregadoras. De igual forma, no movimento de avivamento do século XVIII muitas
mulheres, tais como a Condessa de Zinzendorf, Suzana Wesley e outras,
influenciaram de várias maneiras.

Na análise de Paul Chilcote, “Santa Hilda, conhecida carinhosamente por


“Madre”, fundou em 659 uma comunidade monástica para homens e mulheres que
exerceu uma importante liderança num período crítico da vida inglesa”,78 o que não
torna menos tenso para a vida religiosa dos ingleses a aceitação de mulheres
pregadoras. Como o mesmo Chilcote relata,

Quando Arturo Lake, bispo de Bath e Wells, descobriu que uma das
pregadoras era de sua própria diocese, desencadeou uma fúria e
uma venenosa ira sobre seu rebanho errante. Certamente vocês se
têm mostrado indignos de ser homens e tão débeis a ponto de ser
estudantes de uma mulher.79

77
HEITZENRATER, op. cit., p. 329.
78
CHILCOTE, Paul Wesley. Ella ofreció a Cristo: el legado de las mujeres predicadoras en el metodismo
primitivo. Nashville: Abingdon Press, [s.d.], p. 9.
79
Ibidem, p. 11.
45

Susanna Wesley (1669-1742), embora não tenha publicado um livro contendo


orientações para o movimento ou mesmo pregações, é reconhecida como a mãe
do metodismo80, reconhecimento histórico atribuído graças aos estudos
historiográficos dos textos dos filhos Charles e John Wesley. Tal influência é
destacada por Heitzenrater quando afirma:

Susanna estava encarregada da educação inicial dos filhos, e


instituiu uma hora por semana à noite para cada um de seus cinco
ou seis filhos que estivessem em casa a qualquer tempo. Mas a
influência do sermão semanal, que se esperava, sem dúvida, que
as crianças ouvissem fielmente, com certeza deixou sua marca no
desenvolvimento teológico dos filhos. As cartas de Susanna,
enviada a seus filhos, que foram preservadas, têm uma
preponderância de assuntos teológicos, talvez surpreendentes de
se ver em uma época na qual não se esperava que as mulheres
fossem instruídas.81

Porém, foi na Conferência de maio de 1755 que John Wesley surpreendeu os


participantes com uma nova visão a respeito das mulheres como pregadoras. “Esta
posição tradicional de Wesley representa uma pequena diferença em relação a
sete anos atrás, quando argumentava contra os costume dos quakers que
permitiam que as mulheres pregassem”.82 Essa nova postura de John causa
preocupação em seu irmão Charles.

Diante dos desafios dos Wesley para com o movimento, isso significava um
compromisso de submissão a Cristo. E na organização das sociedades, classes e
bands, Graciela Murray se destaca como uma líder modelo83 do movimento. Sobre
Graciela Murray, Chilcote afirma:

Vigilante em suas obras itinerantes, freqüentemente viajou grande


distancias sem nenhuma companhia e gozava de grande reputação,
não somente por suas habilidades pastorais e sim por seu
extraordinário valor. [...] Wesley costumava referir-se a ela como
sua “mão direita”.84

80
REILY, Duncan Alexander. Suzana Wesley: a mãe do metodismo. Revista Voz Missionária, São Paulo: II
Trimestre 1999.
81
HEITZENRATER, Wesley e o povo chamado metodista, p. 25-26.
82
Ibidem, p. 193.
83
CHILCOTE, Ella ofreció a Cristo, p. 34.
84
Ibidem, p. 35.
46

Essa presença de mulheres pregadoras não será uma inovação exclusiva do


contexto inglês. Ela se dará em outros momentos do metodismo, por exemplo, no
caso norte-americano, que terá Bárbara Ruckle Heck como ícone da mãe do
metodismo na América.85

2.3 A educação como elemento de inclusão social e crescimento


espiritual na formação do metodismo

A formação do metodismo não poderia deixar de ter a educação como um


dos eixos articuladores, afinal o movimento se deu quando um grupo de
estudantes da Universidade de Oxford, sob a liderança dos irmãos e professores
John e Charles Wesley, passou a se reunir para o cultivo da piedade cristã, através
da leitura da Bíblia, da prática da oração, do jejum, da visita aos presos e aos
enfermos. Para Amós Nascimento,

O metodismo surgiu dentro do contexto universitário e foi


influenciado pelo Iluminismo, com sua grande ênfase na
universalidade da educação, na racionalidade, no desenvolvimento
científico, nas revoluções políticas e econômicas, bem como nas
discussões antropológicas motivadas pelo impacto do
86
colonialismo.

O compromisso com a educação no movimento metodista, pelo fato de ter


surgido num ambiente universitário, não ficou apenas nas reflexões acadêmicas,
pois “com relação à perspectiva social e educacional, Wesley observou com
interesse a educação nas comunidades moravianas, especialmente em Herrnhut, e
a tradição pietista na Universidade de Halle”.87 Assim, o metodismo compreendeu
cedo a importância de promover a educação como instrumento para a melhoria da
qualidade de vida, tanto do indivíduo quanto da sociedade. Destaca-se que o
pietismo, em especial pela obra de Augusto Hermann Francke, valorizou a

85
KIENZLE, Beverly Mayne; WALKER, Pámela J. (Ed.). Women Preachers and Prophets: through Two Millennia
of Christianity. Los Angeles: University of California Press, 1998. Este livro trata da discriminação das mulheres
como pregadoras. A texto analisa as pregadoras “oficiais” e “oficiosas” no mundo cristão. A relevância do
estudo está na compreensão de vocação “chamada divina” para pregar ou no “chamado institucional” na
organização eclesiástica nos processos de ordenação. O livro analisa o papel de várias mulheres no século
XX, dentre elas Bárbara Ruckle Heck.
86
NASCIMENTO, Amós. John Wesley, o Iluminismo e a educação metodista na Inglaterra. Revista de Educação
do COGEIME, Piracicaba, ano 12, n. 22, p. 89, jun. 2003.
87
Ibidem, p. 95.
47

educação e as obras sociais. Francke foi considerado o “pai” da virtude social. Ele
“fundou famoso orfanato, o qual, ao tempo de sua morte, abrigava cento e trinta e
quatro crianças”.88

Neste contexto, John Wesley, em 24 de junho de 1748, fundou a Kingswood


School, uma escola de ensino básico para crianças. Em seus primórdios, a
Kingswood tinha sessenta alunos, na sua maioria, pobres. O colégio “recebia
crianças a partir dos seis anos de idade, mas nenhuma era aceita após o décimo-
segundo ano de vida”.89 Esse formato de escola para crianças empobrecidas
representa a primeira expressão formal metodista na dimensão da
Responsabilidade Social para atender às necessidades educacionais.

A obra educacional é uma ênfase e ocupa lugar privilegiado nas reflexões


teológicas de John Wesley. Sua preocupação reside na necessidade da formação
das crianças empobrecidas e dos seguidores do movimento metodista. Para atingir
esses objetivos,

Wesley publicou muitas outras obras que se relacionam de um


modo ou de outro com o seu programa de educação. Em parte, sua
monumental obra em publicações era parte de sua missão
educacional90 (tradução nossa).

Compreender a dimensão da educação como parte integrante do projeto


missionário do metodismo Inglês é perceber que, para John Wesley, a missão se
articulava com a educação para o desenvolvimento da fé. A educação será pauta
importante para o movimento metodista. Em “A Serious Call to a Devout and Holy
Life” (Um chamado sério para uma vida de santidade), destaca-se a ênfase do
autor, Willian Law, sobre a educação como elemento restaurador da nova vida.

E como a única finalidade de um médico é restaurar a natureza ao


seu estado próprio, então a única finalidade da educação é restaurar
nossa natureza racional ao seu estado apropriado. [...] E como a
medicina pode justamente ser chamada a arte de restaurar a saúde,
então a educação pode ser considerada, sob outro aspecto, como a
88
WALKER, Williston. História da Igreja Cristã. São Paulo: ASTE, 1967, p. 195.
89
NASCIMENTO, John Wesley, o Iluminismo e a educação metodista na Inglaterra, p. 97.
90
BUNGE, Marcia J. The Child in Christian Thought. Cambridge: William B. Eerdmans Publishing, 2001. Texto
original: “Wesley published many other works that relate in one way or another to his education program. In
part, his monumental publishing enterprise itself was part of his education mission”.
48

arte de recuperar o homem, a sua perfeição original91 (tradução


nossa).

A ênfase na educação como dimensão essencial da missão também está


muito presente na organização eclesial do movimento metodista. As sociedades92,
que funcionavam como congregações locais, em 1742 foram divididas em
classes93, que se reuniam em grupos de aproximadamente 12 pessoas, as quais
residiam nas proximidades. A criação das classes foi pedagogicamente utilizada
para solucionar as dificuldades que os mais pobres tinham para contribuir com
pagamento das dívidas com a aquisição do Salão Novo94. Antes mesmo da criação
das classes, John Wesley, desde 21 de maio de 1741, trabalhava com um grupo
de líderes denominado bands95, grupo de seis a sete pessoas.

Portanto, para o movimento metodista inglês a responsabilidade para com a


educação não é algo secundário. Este compromisso a compreende como parte
integrante da missão. As complexidades enfrentadas no inicio do metodismo inglês
provavelmente foram superadas graças à ênfase na educação que, por sua vez,
criou espaços de cidadania capazes de interpretar a sociedade inglesa do século
XVIII e de propor transformações sociais nos seus múltiplos escritos, “que chegam
a mais de duzentos volumes”.96 Assim, a educação não terá apenas um significado
pedagógico no movimento wesleyano; ela será parte integrante do movimento

91
LAW, William. A Serious Call to a Devout and Holy Life. Newcastle: J. Backer Printer, 1845. Texto original:
“And as the only end of the physician is to restore nature to its own state, so the only end of education is to
restore our rational nature to its proper state. Education, therefore, is to be considered as a reason borrowed at
second-hand, which is, as far as it can, to supply the loss of original perfection. And as physic may justly be
called the art of restoring health, so education should be considered in no other light, than as the art of
recovering to man the use of his reason”.
92
Expressão para designar, de modo geral, a todos os metodistas de um determinado local, os quais, quando se
reuniam, evitavam utilizar o termo ”igreja”, a fim de não darem a impressão de que estavam competindo com a
Igreja paroquial da localidade (Cf. Heitzenrater).
93
Cada metodista era membro de uma classe, um grupo com mais ou menos doze membros, e tendo um líder
(guia). Reuniam-se semanalmente para oração, estudo bíblico e companheirismo, exame de consciência. Era
um grupo de apoio a pessoas arrependidas e que buscavam a fé pessoal (Cf. Heitzenrater).
94
HEITZENRATER, Wesley e o povo chamado metodista, p. 118.
95
Literalmente significa “banda”, no sentido de pequeno grupo. Tem uma semelhança com as classes menores
(além do líder, mais ou menos seis pessoas do mesmo sexo). Para ser membro era preciso ter experiência
pessoal de fé, solicitar admissão, concordar com uma total franqueza, para ouvir e falar, nas conversações
grupais (Cf. Heitzenrater).
96
McDONALD, W. El Wesley del Pueblo. México: Casa Unida de Publicaciones, 1985.
49

missionário. Renders afirma que, “sem ela, como sua parte integrante, a
soteriologia será incompleta”.97

3 A tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação


— como paradigma missionário na formação do metodismo
brasileiro
Somente quando se observa a missão da Igreja situada dentro da missão de
Deus é que podemos afirmar que compreendemos a missio Dei. A ênfase principal
que se pretende dar sobre a responsabilidade missionária no contexto da
implantação do metodismo brasileiro, no final do século XIX, é repleta de tensões e
ambiguidades. Os grupos protestantes, sejam da Europa ou dos Estados Unidos,
não davam conta das dimensões políticas, sociais e econômicas para a implantação
dos projetos missionários na América Latina. E, como consequência dessas
ambiguidades e percepção, “esses líderes resistiram em investir importantes
recursos financeiros e humanos para a evangelização protestante desse
continente”.98

É no contexto da primeira conferência missionária ecumênica de Edimburgo,


em 1910, que haverá uma reação dos missionários, em especial os norte-
americanos, que atuam na América Latina. “A conferência de Edimburgo chocou-se
com a mentalidade missionária desenvolvida durante o século XIX, que incluía os
povos católicos entre os pagãos”.99 Para dirimir esse conflito, as decisões de
Edimburgo serão discutidas em congresso próprio para os missionários que atuam
na América Latina, no Panamá, em 1916. E as missões norte-americanas que
tinham seus missionários na América Latina ratificarão o projeto norte-americano em
confronto com Edimburgo. Robert Speer fará a defesa da presença protestante na
América Latina com o seguinte argumento:

97
RENDERS, Helmut. Andar como Cristo andou: a salvação social em John Wesley. São Bernardo do Campo:
Editeo, 2010, p. 303.
98
PIEDRA, Evangelização protestante na América Latina.
99
MENDONÇA; VELASQUES FILHO, Introdução ao protestantismo no Brasil, p. 31.
50

A Igreja Católica não fora capaz de garantir a educação e a


moralidade do subcontinente; não dera a Bíblia ao povo na sua
própria língua; não formara um clero idôneo, intelectual ou
eticamente; pregara um evangelho deformado e não tinha recursos
para evangelizar toda a América Latina.100

Essa atitude, entre outras, sinalizará um projeto missionário com fortes


resistências ecumênicas. O protestantismo brasileiro será herdeiro deste ranço
anticatólico e, mesmo após um século de Edimburgo, com todas as análises e
contribuições de pesquisadores, a dimensão da ecumenicidade da Igreja ainda
representa um espaço de tensão.

José Míguez Bonino discute algumas limitações historiográficas do Congresso


Evangélico do Panamá. Primeiramente, “trata-se preponderantemente de um
congresso ‘missionário’: neste sentido, serve para delinear a concepção e estratégia
da empresa missionária”101; em segundo lugar, tem a ver com a limitação que
acompanha a nossa tese do compromisso com a responsabilidade social dentro do
pensamento liberal, pois, segundo Míguez Bonino,

Trata-se de um congresso realizado sob a hegemonia das


denominações históricas ‘liberais’ (utilizo este termo aqui em sua
acepção norte-americana de ‘progressista’ ou ‘avançado’),
influenciadas em diversos graus pela teologia liberal e do evangelho
social dos Estados Unidos: metodistas, presbiterianos, discípulos de
Cristo, Convenção Batista Americana (do norte dos Estados Unidos)
e, mais ainda, pelos setores missionários ‘liberais’ dessas
denominações.102

Esta tensão revela que, na realidade, não foi diferente no movimento


missionário metodista, desde a sua gênese inglesa e sua movimentação para outros
continentes, em especial, para a América do Norte. Pois a visão de mundo de John
Wesley, segundo Theodore W. Jennings Jr., é “uma cosmovisão profética”103, o que
significa entender o mundo como espaço de missão de Deus, valorizar a dimensão
comunitária da salvação e considerar a experiência pessoal como parte de um todo
e não experiência isolada.
100
Ibidem, p. 31-32.
101
MÍGUEZ BONINO, José. Rostos do protestantismo latino-americano. São Leopoldo: Sinodal, 2003, p. 13.
102
MÍGUEZ BONINO, Rostos do protestantismo latino-americano.
103
JENNINGS JR., Theodore W. Wesley e o mundo atual. São Bernardo do Campo: Editeo, 2007, p. 62.
51

O objetivo central desta pesquisa é analisar as razões da tríade —


Responsabilidade Social, Pregação e Educação — no desenvolvimento missionário
no metodismo brasileiro. A não ecumenicidade nas igrejas de missão face às
dificuldades de relacionamentos com o catolicismo romano no período de
implantação não se justifica para o metodismo. Segundo Souza,

No caso particular dos metodistas e demais herdeiros do legado


wesleyano, negar a ecumenicidade da Igreja não é apenas rejeitar
um traço de sua identidade confessional, mas é renunciar ao seu
propósito histórico, a sua razão de ser.104

Diante do desafio para compreender as motivações missionárias que


estabeleceram o metodismo brasileiro se encontra a análise de Arturo Piedra sobre
o início da evangelização na América Latina. Em sua pesquisa, Piedra identifica que
“a história das relações entre católicos e protestantes caracterizou-se pela
confrontação”.105 Essa constatação no mundo latino-americano não é diferente no
Brasil, uma vez que no metodismo nascente a conversão do ex-padre Antonio
Teixeira Albuquerque foi utilizada como estratégia evangelizadora. Segundo José
Carlos Barbosa, o ex-padre, poucos dias após sua recepção na Igreja Metodista do
Catete, já fazia suas pregações. Que segundo Barbosa,

Contribuiu decisivamente para dar mais visibilidade ao movimento


metodista, foi a palestra pública que passou a dirigir nas noites de
quarta-feira, abordando temas polêmicos e ‘perigosamente
inflamáveis’, tais como purgatório, adoração de imagens, autoridade
da Bíblia, etc106.

Tendo a dimensão da tríade — Responsabilidade Social, Pregação e


Educação — é importante assinalar, no contexto da ecumenicidade, no projeto
missionário metodista, que se, por um lado, um ex-padre ao ser recebido na Igreja
Metodista já recebe as credencias para ensinar e pregar, por outro, o seu
conhecimento sobre o maior “concorrente” religioso, a saber, a Igreja Católica, será
atacado por um ex-militante. Portanto, está na gênese metodista brasileira, assim
como em toda a América Latina, uma disputa pelo campo religioso. Desta forma, a

104
SOUZA, José Carlos de. Leiga, ministerial e ecumênica: a Igreja no pensamento de John Wesley. São
Bernardo do Campo: Editeo, 2009, p. 222.
105
PIEDRA, Evangelização protestante na América Latina, p. 20.
106
BARBOSA, José Carlos. Salvar & educar. Piracicaba: CEPEME, 2005, p. 45.
52

presente investigação se torna necessária para compreender como o metodismo


brasileiro se portará em relação à tríade — Responsabilidade Social, Pregação e
Educação.

3.1 Paradigmas missionários do protestantismo de missão na


implantação do metodismo brasileiro e suas mutações

O movimento missionário no século XIX deixou um legado significativo na


reflexão teológica sobre o tema da missão. Como primeiro momento, destaca-se a
articulação, em especial leiga, para a formatação de um projeto de cooperação
missionária que se concretiza na primeira Conferência Mundial Missionária,
realizada em Edimburgo (1910), que pode ser considerada “o ponto de partida do
movimento ecumênico em todas as suas formas”.107 O elemento motivador, ou a
ênfase no movimento ecumênico, articulado por leigos, em especial no movimento
estudantil, está ligado às preocupações sociais. Conforme discorre Mendonça:

É possível que as raízes mais robustas do movimento ecumênico


tenham sido as associações leigas mundiais de jovens, que
começaram a surgir a partir da segunda metade do século XIX.
Talvez os leigos e jovens não estivessem tão picados pelas
animosidades teológicas e pelo orgulho denominacional e, assim,
suas organizações puderam ter vida longa e prestar grande serviço
ao ecumenismo, principalmente no preparo dos seus futuros
líderes108.

A observação de Mendonça corrobora a tese das discussões sociais da


época e do compromisso com a solidariedade e Responsabilidade Social, pois na
linha do tempo do movimento ecumênico se encontra o objetivo principal do
“Conselho Internacional Missionário ‘para promover a solidariedade dos cristãos em
escala mundial e a unidade de intenções e de ação na obra de evangelização’”. 109

107
NEILL, Stephen. História das missões. 2. ed. São Paulo: Vida Nova, 1989, p. 566.
108
MENDONÇA, Antonio Gouvêa. O movimento ecumênico no século XX - algumas observações sobre suas
origens e contradições. Tempo e Presença Digital, ano 3, n. 12. Disponível em:
<http://www.koinonia.org.br/tpdigital/detalhes.asp?cod_artigo=236&cod_boletim=13&tipo=Artigo>. Acesso em:
02 mar. 2010.
109
Extratos da Constituição do CMI. In: BOYER, C.; BELLUCCI, D. (Org.). Unità cristiana e movimento
ecumenico, p. 86-89, doc. 18 apud VERCRUYSSE, Jos. Introdução à teologia ecumênica. São Paulo: Loyola,
1998, p. 50.
53

No segundo momento se destaca o Congresso Evangélico do Panamá


(1916), que delineou a proposta missionária para a América Latina. Em outras
palavras, “o congresso significou o começo de um esforço consciente para estender
seu trabalho ao longo do continente latino-americano, como nunca antes tinha sido
feito”.110

A reflexão historiográfica desse evento, já analisada por Míguez Bonino, será


ampliada nas pesquisas de Lauri Emilio Wirth, quando este discute os processos
evangelizadores na perspectiva do imaginário eurocêntrico e as culturas locais. Wirth
entende que as ações missionárias desenvolvidas pelo protestantismo de missão
nos séculos XIX e XX não se diferem daquelas utilizadas pelo catolicismo romano
nos séculos XVI e XVII, pois ambas “trazem no seu bojo a idéia de uma hierarquia
interna”111 — o que configurará um processo colonizador e civilizatório hegemônico.
Por isso, Wirth entende que:

O Congresso Evangélico do Panamá foi uma espécie de saída


pragmática para solucionar os impasses criados nos bastidores da
Conferência Missionária de Edimburgo a respeito do continente
latino-americano, enquanto campo de missão protestante.112

O terceiro momento desta jornada ecumênica que se pretende destacar nesta


pesquisa trata dos desdobramentos da Conferência Missionária Mundial de
Edimburgo (1910) que, em 1925, desemboca, em Estocolmo, no movimento Vida e
Obra. Este tinha por objetivo a unidade dos cristãos por meio da ação social. As
influências do movimento Vida e Obra podem ser interpretadas à luz das expressões
teológicas, “como a do Evangelho Social nos Estados Unidos na passagem do
século XIX para o século XX”.113 Outro movimento a ser considerado nesse período
é denominado Fé e Constituição (Lausanne 1927), o qual enfatizava a doutrina
comum e a ordem eclesial como pressupostos da unidade cristã:

110
PIEDRA, Evangelização protestante na América Latina, p. 159.
111
WIRTH, Lauri Emilio. Protestantismos latino-americanos: entre o imaginário eurocêntrico e as culturas locais.
Revista Estudos de Religião, ano XXII, n. 34, p. 105, jan./jun. 2008.
112
PIEDRA, Evangelização protestante na América Latina, p. 122.
113
CUNHA, Magali do Nascimento. Quando a vida supera as fronteiras. Revista Caminhando, São Bernardo do
Campo, v. 12, n. 19, p. 121, jan./jun. 2007.
54

O reconhecimento de que Vida e Obra não podem existir sem Fé e


Constituição e que, em conjunto devem se dedicar ao reino de Deus
levou à decisão de se conjugar as duas organizações numa só: o
Conselho Mundial de Igrejas teria sua primeira assembléia em 1941.
A Segunda Guerra Mundial, porém, impediu a concretização desse
plano. [...] Em 1948, sob o tema As desordens do ser humano e o
desígnio de Deus, o Conselho Mundial de Igrejas (CMI) esteve
convicto de que os desastres da Segunda Guerra Mundial se deviam,
em boa medida, ao silêncio das igrejas em relação aos
acontecimentos mundiais.114

Depois desses eventos de nível mundial, em setembro de 1978 as igrejas e


os movimentos evangélicos da América Latina lançaram os princípios fundantes
para a organização do Conselho Latino-Americano de Igrejas e, em novembro de
1982, na cidade de Huampani (Peru), o CLAI foi constituído oficialmente. Esse
movimento ecumênico latino-americano influência a Igreja Metodista no território
brasileiro e, em 1982, o XIIº Concílio Geral da Igreja Metodista, realizado na cidade
de Belo Horizonte, no Estado de Minas Gerais, aprova o documento norteador para
o seu projeto missionário. Tal documento se torna conhecido como “Vida e
Missão”115 Este, em primeira instância, sinalizará uma nova esperança para a Igreja
e será um documento normatizador ao ser incorporado aos Cânones da Igreja
Metodista. Servirá para dirimir a vida ministerial dos metodistas e,
concomitantemente, inserirá oficialmente a Igreja Metodista nas relações
ecumênicas. É nesse mesmo concílio que se aprova, dentro do espírito do “Vida e
Missão”, a participação oficial da Igreja no Conselho Nacional de Igrejas Cristãs
(CONIC). No campo missionário, a tese fundante das igrejas membros do CONIC se
resume nas afirmações:

Cristo é o libertador do homem do pecado e de todas as suas


conseqüências. A Igreja, serva do mundo, continua no tempo a
missão de Cristo. Sua ação no campo social consiste na
evangelização libertadora, esperança para os homens no desespero,
que caracteriza o tempo presente. Procura, com sua pobreza, a
promoção do próprio homem na transformação do mundo e de si

114
DREHER, Martin Norberto. A igreja latino-americana no contexto mundial. São Leopoldo: Sinodal, 1999, p.
195.
115
Cf. CÉSAR, Ely Eser Barreto. Por que o Plano para a Vida e Missão falou? Revista Caminhando, São
Bernardo do Campo, v. 12, n. 20, p. 58, jul./dez. 2007. O Plano Vida e Missão foi acolhido, em seu tempo,
pelas lideranças de um corpo eclesial em profunda crise como uma resposta promissora.
55

mesmo, em benefício do homem todo e de todos os homens, numa


dimensão comunitária.116

Não se podem ocultar, nesta pesquisa, as tensões que o “Vida e Missão”


gerou em alguns setores da Igreja Metodista. Diante das reações dos referidos
setores, por questões políticas a publicação do texto para a Igreja ficou parada por
um tempo. Sua primeira publicação se dará por iniciativa de uma instituição de
ensino, o Instituto Educacional Piracicabano / Universidade Metodista de Piracicaba
(IEP/UNIMEP), que obviamente tinha interesse em que o documento fosse
conhecido e fortalecido na Igreja Metodista. O livro celebrativo dos vinte anos de
implantação do “Vida e Missão”117 denuncia alguns equívocos da trajetória do plano,
tais como:

A prática da Igreja Metodista vinte anos depois parece estar negando


o que ela mesma assumiu no “Vida e Missão”: contraditoriamente
hoje fala-se de e promovem-se “missões”. Por que missões? Diz o
“Vida e Missão” que a missão é de Deus e é uma só: estabelecer o
Reino de Deus. O termo plural –“missões”- reforça um sentido
negativo de que a missão é da Igreja e por isso pode ser realizada de
diferentes formas e lugares longínquos. Trata-se de uma outra
teologia e uma outra pastoral.118

Portanto, a pesquisa deseja focar a Responsabilidade Social como parte


integrante da missão e percebe-se que uma das falhas do plano está na retomada
do “caminho que separa a evangelização da ação social; ou seja, a ação social fica
praticada como estratégia para atrair pessoas a Cristo”.119 A crítica de Ely Eser
Barreto César revela bem as tensões que a igreja enfrentou ao assumir uma nova
dimensão da missão, em especial na sua tarefa solidária para com os pobres e na
transformação da realidade social.

Essa resistência na mudança paradigmática por parte de boa parte do corpo


clérigo e de alguns segmentos leigos também se dá por causa da proposta

116
Do relatório do encontro apud HORTAL, Jesus. “CESE”. In: Guia ecumênico: informações, normas e diretrizes
sobre ecumenismo. 3. ed. São Paulo: Paulus, 2003 (Estudos da CNBB, 21), p. 82s.
117
RIBEIRO, Claudio de Oliveira; LOPES, Nicanor. 20 anos depois: a vida e a missão da Igreja em foco. São
Bernardo do Campo: Editeo, 2002.
118
CUNHA, Magali do Nascimento. Tempo de nostalgia ou de recriar utopias? Um olhar sobre os anos de 1980
vinte anos depois. In: Ibidem, p. 43.
119
CÉSAR, Por que o Plano para a Vida e a Missão falhou?, p. 59.
56

ecumênica do “Vida e Missão” e da participação da Igreja Metodista nos organismos


ecumênicos. Sustenta-se aqui que isso ocorre em meio às igrejas de missão, em
especial aquelas que iniciaram seus projetos missionários no Brasil no final do
século XIX e sofreram perseguição católica romana. O contexto histórico religioso
desse período se dá pela influência dos resultados do Concílio Ecumênico de
dezembro de 1869, convocado por Pio IX. Esse Concílio, em que se pese a
denominação ecumênica, é exclusivo para a Igreja Romana; seu caráter
“ecumênico” objetivava a unidade e catolicidade do romanismo no mundo, uma vez
que, por traz dos conflitos entre os latinos e os anglo-saxônicos, estava em disputa a
hegemonia da Igreja Romana. Segundo Mendonça:

De modo geral, o Concílio preocupou os governos liberais por causa


de questões como pretensões medievais da Igreja quanto ao
governo civil, casamento civil, ensino leigo, liberdades constitucionais
e o impacto antiprogressista do Silabo. O principio da autoridade
papal também não deixou de preocupar os bispos liberais quanto às
suas prerrogativas.120

O movimento missionário protestante na América Latina, e por isso, no Brasil,


não seria diferente. É carregado de ambiguidades. Se, por um lado, a expansão
religiosa se dá pela motivação da experiência da fé, por outro, não é possível negar
os interesses de Estado, com o desejo de expansão de domínio político e
econômico dos Estados Unidos. E, com isso pode-se aferir que a implantação das
igrejas denominadas de missão no Brasil é beneficiada por um governo liberal que,
segundo Maria Lúcia Spedo Hilsdorf, justifica-se com um formato de governo
republicano.

O novo governo que se organiza tem, então, traços do liberalismo


moderado. De outro lado, o quadro mental da geração que fez a
Independência, de matriz ilustrada e regalista, tem também traços
liberais e filantrópicos devidos à predominância britânica sobre toda a
região dos “libertadores” americanos.121

Portanto, a mentalidade republicana que se inicia no campo político brasileiro


é composta de um forte acento nas ações filantrópicas e facilitar “a abertura para o

120
MENDONÇA; VELASQUES FILHO, Introdução ao protestantismo no Brasil, p. 69.
121
Cf. HILSDORF, Maria Lúcia Spedo. História da educação brasileira: histórias. São Paulo: Thompson, 2003, p.
43.
57

mundo anglo-saxão significou a abertura para o universo protestante”.122 Tal


comportamento afetará as relações com o mundo católico romano, que até então
era a religião da Coroa. Daí a suspeita de que igrejas com esta herança histórica
têm suas dificuldades para compreender projetos missionários.

3.2 A Responsabilidade Social como elemento de inclusão social na


implantação do metodismo brasileiro

A primeira expedição missionária metodista com destino ao continente sul-


americano foi a de Fountain E. Pitts, pastor metodista norte-americano, que no dia
“28 de junho de 1835 embarca em Baltimore nos Estados Unidos rumo ao Brasil.
Pitts desembarcou no porto do Rio de Janeiro em 19 de agosto de 1835”.123 É
possível verificar na missão de Pitts o interesse norte-americano da Doutrina
Monroe, pois ao desembarcar no Rio de Janeiro o mesmo era portador de cartas
de recomendação de pessoas influentes dos Estados Unidos como, por exemplo,
“Andrew Jackson, Presidente da República, e de Henry Clay, presidente do
Senado Norte Americano.124

O trabalho metodista iniciado por Pitts terá sequência com a chegada de


Justin Spaulding. Seu envio ao Brasil acontece graças ao apelo de Pitts, que
escreve para a Sociedade Missionária da Igreja Metodista Episcopal:

Estou nesta cidade (Rio de Janeiro) há duas semanas, e lamento


que minha permanência seja necessariamente breve. Creio que uma
porta oportuna para a pregação do Evangelho está aberta neste
vasto império. Os privilégios religiosos permitidos pelo governo do
Brasil são muito mais tolerantes do que eu esperava achar em um
país católico (...). Já realizei diversas reuniões e preguei oito vezes
em diferentes residências onde fui respeitosamente convidado e
bondosamente recebido pelo bom povo.125

122
MENDONÇA, O movimento ecumênico no século XX, p. 73.
123
KENNEDY, L. James. Cincoenta annos de methodismo no Brasil. São Paulo: Imprensa Metodista, 1928, p.
13.
124
BARBOSA, Salvar & educar, p. 12.
125
REILY, Duncan A. História documental do protestantismo no Brasil, p. 81-82.
58

Apesar da permanência de Pitts no Brasil ter sido breve, suas ações foram
eficazes. Com a chegada de Spaulding, em 29 de abril de 1836 126, a tríade
missiológica — Responsabilidade Social, Pregação e Educação — fica evidente. Já
em maio ele organiza a primeira Escola Dominical Metodista no Brasil, bem como o
projeto da abertura de uma escola que, segundo Barbosa, não era sua iniciativa,
mas “alguns amigos recomendaram e até pediram que abrisse uma escola,
alegando que faltava na cidade uma escola de qualidade”.127 — certamente
envolvidos pelo espírito metodista norte-americano nas questões da
Responsabilidade Social:

Animados pelas idéias filantrópicas nascidas no movimento


metodista, da revolução norte americana e da revolução francesa.
No decorrer da primeira metade do século XIX, assistimos à
abertura de bibliotecas públicas nas principais cidades da Europa e
Estados Unidos.128

A dimensão da Responsabilidade Social, neste primeiro período missionário


metodista, será verificada no trabalho que Spaulding desenvolve com os
marinheiros. Ele será “o primeiro a assumir o trabalho de capelão dos
marinheiros”129, conforme comentário de Kennedy:

Houve, também, reuniões de oração regularmente; e todos os


domingos, com seus ajudantes, ele pregava em algum navio aos
milhares de marinheiros que constantemente entravam na baía do
Rio de Janeiro.130

Entretanto, a primeira missão metodista brasileira teve vida curta. Em 1841,


por motivos diversos, ela se encerra no Brasil. Reily estabelece as seguintes
razões para o fechamento:

1) falta de pessoal missionário; 2) dificuldades de acesso direto ao


povo brasileiro devido a superstições e limitação da liberdade
religiosa; e 3) arrocho financeiro provocado pela depressão
econômica dos Estados Unidos, o chamado “Pânico de 37”.131

126
BARBOSA, op.cit., p. 13.
127
Ibidem, p. 14.
128
PERROTTI, Edmir. Confinamento cultural, infância e leitura. São Paulo: Summus, 1990, p. 48.
129
BARBOSA, Salvar & educar, p. 19.
130
LONG, Eula Lee Kennedy. Do meu velho baú metodista. São Paulo: Junta Geral de Educação Cristã; Igreja
Metodista, 1968, p. 16.
131
REILY, História documental do protestantismo no Brasil, p. 84.
59

O reinício definitivo da missão metodista se dará em 1867, com a chegada de


Junius Eastham Newman no Rio de Janeiro. Newman chega vinte e seis anos após
o encerramento da primeira iniciativa missionária metodista no Brasil. Uma das
razões para fechamento da missão foi a limitação da liberdade religiosa. Porém, na
chegada de Newman, o ambiente já tem outra conotação. Ele escreve:

A liberdade religiosa aqui, na prática, é quase tão completa como


nos Estados Unidos e, legalmente, mais ou menos como na
Inglaterra. A imprensa é tão livre como nos Estados Unidos, ou
mais ainda, não há aqui o perigo da “lei da turba” (mob-law) como
nos Estados Unidos e as provisões constitucionais são tão boas
como em qualquer parte do mundo.132

O período de Newman é diferente do período de Spaulding, pois

os protestantes aproveitavam as oportunidades que o clima de


tolerância oferecia e, no final do século XIX, já estavam
praticamente implantadas no Brasil todas as denominações
clássicas do protestantismo.133

Newman se mudou para o interior de São Paulo, em Saltinho 134, trabalhando


entre os colonos americanos e, em 20 de agosto de 1871, com os imigrantes de
Santa Bárbara, organizou, com cultos em inglês, a Primeira Igreja Metodista do
Brasil.

Posteriormente, fixaram-se na cidade de Piracicaba e, na dimensão da


Responsabilidade Social, as irmãs Newman abriram um Internato e Externato, que
não se solidificou, pois “no domingo, dia 18 de julho de 1880”,135 Annie, vítima de
febre amarela, veio a falecer.

Em Piracicaba, a tradicional família Moraes Barros, mesmo com o fechamento


da escola metodista, não desistiria da ideia de apoiar os metodistas no campo da
educação e Responsabilidade Social. Com o apoio de metodistas americanos,
intercederam junto à Methodist Episcopal Church para que enviasse uma
professora para reabrir o colégio em Piracicaba.

132
Ibidem, p. 88.
133
MENDONÇA, O movimento ecumênico no século XX, p. 44.
134
Cf. BARBOSA, Salvar & educar, p. 25.
135
Ibidem, p. 31.
60

Em 1881, chegaram a Piracicaba James W. Kogger e Miss Martha Hite Watts.


Ele “pregou seu primeiro sermão em 29 de maio, em inglês, para um público
formado inteiramente por imigrantes norte americanos”136 e ela inaugurou, em 13
de setembro, o Colégio Piracicabano, até hoje em funcionamento e que deu origem
à Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP).

Outras iniciativas filantrópicas são realizadas, tais como em Juiz de Fora/MG,


como afirma Siqueira:

Mais tarde, registram-se também iniciativas de outros grupos


religiosos tais como os protestantes e espíritas. Em 1884 foi
instalada na Igreja Metodista Central uma Comissão de Ação Social
que oferecia assistência alimentar, material (distribuição de roupas,
calçados, cobertores, material escolar e medicamentos), e serviço
médico sem restrição de idade para o atendimento. Em 1890,
destaca-se a criação do Instituto Granbery também da Igreja
Metodista.137

Assim, o pensamento filantrópico, para o qual se utiliza nesta tese o termo


Responsabilidade Social, compõe o modo de fazer missão metodista. Isso pode ser
aferido a partir da instalação da primeira instituição de ação social no Brasil, fundada
em 1906 por Tucker como parte do seu trabalho missionário.

O ICP, como esse braço da concepção filantrópica do movimento missionário


norte-americano, firmar-se-á em várias frentes sociais no Rio de Janeiro. As ações
educativas formais não serão os únicos alvos desta instituição, que tem sua data
de inauguração no marco histórico da maioridade da Lei Áurea. Livingstone dos
Santos Silva, em resenha sobre o trabalho do ICP, afirma: “A história do Instituto
se confunde com a história do Rio republicano”138 e destaca as relações do
Instituto e de seu fundador, Tucker, com as questões sociais do seu tempo:

1912 – Campanha contra tuberculose.

136
Ibidem, p. 33.
137
SIQUEIRA, Mirella Loterio. Entidades religiosas e política de atendimento a Infância e adolescia: reflexões
sobre os desafios de efetivação do Estatuto da Criança e Adolescente. In: Libertas: Revista Eletrônica do
Programa de Pós Graduação em Serviço Social, Juiz de Fora, v. 2, n. 2, p. 79, jul. 2008.
138
SILVA, Livingstone dos Santos. Instituto Central do Povo – 100 anos em Missão [WAY, Anita Betts. Instituto
Central do Povo – 100 anos em Missão. São Paulo: Umesp, 2006]. In: Revista de Educação do COGEIME,
Piracicaba, ano 15, n. 29, p. 100, dez. 2006.
61

1913 – Primeiro Jardim da Infância no Rio de Janeiro – primeiro


curso de datilografia para trabalhadores.

1917 – Um dos fundadores da Sociedade Americana – unindo a


Colônia Americana e trabalhando para a amizade entre os EUA e o
Brasil.

1920 – 1935 – Trabalhou com Rodolfo Anders na Confederação


Evangélica na produção de material para a Escola Dominical;
trabalhou também na tradução da Bíblia; durante toda a sua vida
participou do movimento ecumênico; trabalhou com D. Eunice
Weaver, reconhecida pelo governo brasileiro como o “Anjo dos
Lázaros”, ajudando no estabelecimento de educandários para filhos
sadios de pais leprosos (hansenianos).

1925 – Dando continuidade ao trabalho de saúde já existente no ICP


ajudou a fundar junto com o Departamento Nacional de Saúde
Pública, a clínica infantil e pré-natal.

1944 – Foi condecorado pelo Governo Brasileiro com a “Ordem do


Cruzeiro do Sul” a mais alta honra oferecida a uma pessoa
estrangeira.139

Existem outros envolvimentos na dimensão da Responsabilidade Social no


metodismo brasileiro, por ocasião de sua implantação, que serão analisados no
decorrer desta pesquisa.

3.3 A pregação como elemento de construção de uma identidade


religiosa na implantação do metodismo brasileiro

Assim como no movimento metodista inglês e norte-americano, a pregação foi


decisiva na construção identitária do metodista brasileiro. O fundamento da
evangelização missionária no século XIX, sem sombra de dúvida, foi a pregação
bíblica. Tal ênfase se deu porque essa tinha sido a experiência dos missionários
estadunidenses.140

A família de igrejas reformadas, geralmente, enumera três marcas para a


Igreja em seus documentos confessionais. Uma delas é a pura pregação da
Palavra de Deus, como afirma Dreher:

139
SILVA, L. S., Instituto Central do Povo, p. 101.
140
CUNHA, A explosão gospel, p. 37.
62

Somente através da publicação da Institutas, em 1536, na cidade de


Basiléia, Calvino se tornou conhecido como teólogo. [...] Ela não tem
o brilho exterior da igreja romana; não apresenta a mesma
visibilidade. Seus sinais visíveis são a pura pregação do evangelho e
a reta administração dos sacramentos.141

A pregação missionária não se limitou à apresentação direta do evangelho


aos indivíduos para que se convertessem. Porém, despendeu grandes recursos
materiais e humanos na educação por intermédio dos seus colégios. Aqui estavam
as contradições, pois a educação nas escolas protestantes era condutora dos
valores da ideologia liberal do progresso, como já analisado por Hilsdorf 142, e se
encaminhava na sociedade brasileira à elite entusiasmada com o modelo liberal
norte-americano, com seus valores centrados no preparo de indivíduos
independentes.

O cristianismo, diferente de outros estilos religiosos, é uma religião de


pregadores, em especial o protestantismo. A Reforma Protestante foi, em grande
parte, um movimento de retomada da pregação, principalmente a pregação
expositiva. Da mesma forma, todos os movimentos de avivamento, como é caso no
contexto do movimento wesleyano, constituíram-se a partir de uma forte ênfase
dada à pregação.

Como afirma Gonzalo Baez Camargo:

O metodismo foi um movimento e não uma instituição. Um


movimento que se iniciou no redescobrimento da experiência viva da
graça de Deus e do “testemunho do Espírito ao nosso espírito”, feito
por João Wesley, e que debaixo da influência de sua poderosa
pregação se propagou como um incêndio em bosque seco.143

Portanto, seguindo a tradição das igrejas reformadas, o metodismo também


se utiliza da pregação como ferramenta essencial para a propagação de seus
ideais e segue a mesma lógica de pregação do mundo evangélico. Segundo Jerry
Stanley Key:

141
DREHER, Martin N. A crise e a renovação da igreja no período da Reforma. São Leopoldo: Sinodal, 1996,
p.98.
142
Cf. HILSDORF, História da educação brasileira, p. 43.
143
BAÉZ CAMARGO, Gonzalo. Gênio e espírito do metodismo wesleyano. São Bernardo do Campo: Imprensa
Metodista, 1986, p. 6.
63

A pregação é a fiel exposição do sentido correto de um ou mais


textos da Bíblia, ilustrando a exposição e aplicando-a a vida dos
ouvintes, envolvendo-os de tal maneira que são satisfeitas suas
necessidades, sendo que esta comunicação é feita por uma pessoa
com uma experiência real com Cristo e guiada pelo Espírito Santo.144

A pregação apologética dos missionários é relatada por Barbosa quando da


investigação, como acima mencionada, sobre a adesão do ex-padre Albuquerque
ao metodismo, e que logo se torna pregador metodista: “já no segundo domingo
subseqüente à sua recepção, dia 16 de março de 1879, Teixeira de Albuquerque
pregou seu primeiro sermão na Igreja Metodista”.145 Curiosamente, Teixeira de
Albuquerque inaugurará o trânsito religioso146 tão presente no Brasil. O ex-padre
iniciará a sua vida protestante no presbiterianismo, passará pelo metodismo e
terminará sua carreira como batista. Em todas as situações, utilizará a apologia
das razões do porquê deixara a Igreja Romana. Portanto, é considerável que “um
possível lugar vivencial da revitalização da verdade é a pregação expositiva, e esta
possivelmente representa em vários sentidos o fim da pregação apologética.147

Como já afirmado, as ambiguidades são próprias neste período e no campo


missionário em formação. Para Mendonça, estas ambiguidades e aparentes
contradições contribuem para a crise de identidade do movimento missionário dos
protestantes de missão. Ele analisa:

Quais os resultados dessa dupla e conflitiva ação missionária? A


pregação conversionista direta não atingiu as elites liberais
emergentes e muito menos a burguesia da qual brotava a nobreza
do Império, assim como mais tarde, as lideranças republicanas,
mas arrebanhou seus adeptos nas camadas pobres de pequenos
proprietários de terra e funcionários subalternos nas cidades; a
ação educativa, que pretendia influir na construção de uma
sociedade progressista segundo o modelo liberal, embora tenha
exercido grande influência na remodelação da educação brasileira,
sob o ponto de vista religioso foi praticamente nula. A elite
emergente brasileira, liberal e iluminista, nunca esteve interessada
na religião em geral e muito menos na protestante. Como a
144
KEY, Jerry Stanley. O preparo e a pregação do sermão. Rio de Janeiro: Juerp, 2001, p. 36.
145
BARBOSA, Salvar & educar, p. 45.
146
Cf. SOUZA, Sandra Duarte de. Trânsito religioso e construções simbólicas temporárias: uma bricolagem
contínua. Revista Estudos de Religião, São Bernardo do Campo, n. 20, p. 165, 2001: “A idéia de “trânsito
religioso” admite o “passeio” por diversas religiões (mesmo, em alguns casos, havendo predileção por uma ou
outra) não demanda mudanças intestinais na forma de vida dos transeuntes e dispensa ou atenua o
compromisso com uma instituição específica”.
147
BERGER, Klaus. Hermenêutica do Novo Testamento. São Leopoldo: Sinodal, 1999.
64

aceitação de uma mensagem religiosa por parte de indivíduos ou


grupos depende da resposta que ela dá as suas necessidades e
desejos, a pregação missionária recebeu guarida por parte das
camadas pobres na medida em que ela apontava para uma bem-
aventurança futura compensadora de suas perspectivas presentes.
Formavam, assim, de maneira seletiva, congregações de
características messiânicas. Isto explica porque o protestantismo no
Brasil não formou sociedades de idéias como em outras partes da
América Latina.148

O culto e a pregação metodista foram elementos importantes do movimento


missionário, lembrados na literatura de Guimarães Rosa: “Mas, quando posso, vou
no Mindubim, onde um Matias é crente, metodista: a gente se acusa de pecador, lê
alto a Bíblia, e ora, cantando hinos belos deles”.149

3.4 A educação como elemento de transformação social na


implantação do metodismo brasileiro

A educação como parte da tríade desta pesquisa é um enfoque a partir da


“’doutrina social’” de Wesley – seu conceito da sociedade, do trabalho, da
propriedade, do Estado”.150 Assim, a educação formal e religiosa é parte integrante
do projeto missionário metodista. Na implantação do metodismo no Brasil, a
fundação de escolas seculares e a ênfase na educação cristã, como a valorização
da Escola Dominical, eram elementos essenciais da expansão missionária.

Martha Watts será um ícone no cumprimento missionário por meio da


educação. Ela foi pioneira como missionária solteira designada pela Woman’s
Foreign Missionary Society151 para iniciar um trabalho educacional na cidade de
Piracicaba, no interior de São Paulo, em 1881. Ao marcar esse movimento de
missão, ela trouxe em seus ideais, como mulher e educadora, o propósito de

148
MENDONÇA, Antonio Gouvêa. Gênese dos protestantismos brasileiros. Lusotopie, p. 299-306, 1998.
Disponível em: <http://www.lusotopie.sciencespobordeaux.fr/somma98.html>. Acesso em: 05 abr.2010.
149
ROSA, João Guimarães. Grande sertão: veredas. 19 ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001, p. 8.
150
MÍGUEZ BONINO, José. Metodismo: releitura latino-americana. São Bernardo do Campo: Editeo; Piracicaba:
Unimep, 1983, p. 4.
151
METHODIST EPISCOPAL CHURCH. Minutes. Boston: New England Conference, 1868, p. 29: “That we
believe the Woman's Foreign Missionary Society of the Methodist Episcopal Church to be an agency well
calculated to increase the interest of the Church in the Missionary enterprise and to render important assistance
in the work of the church”.
65

educar as mulheres brasileiras e, como mulher e missionária, o de transformar todo


aquele que cruzasse o seu caminho em cristãos protestantes.

Mesquida, ao discutir a hegemonia norte-americana e a educação protestante


no Brasil, evidencia que:

As mulheres metodistas, pertencendo à denominação mais


poderosa dos Estados Unidos e “con-formadas” pela ideologia
religiosa hegemônica na América, persuadidas de que elas se
achavam no “centro mundial da civilização”, estavam convictas de
que sua vocação consistia em “transformar suas irmãs pagãs ou
instruídas numa falsa religião” em mulheres “civilizadas e cristãs”.152

Essa visão missionária, atrelada à Woman’s Foreign Missionary Society, que


passou a enviar suas missionárias para ministrarem a educação às pessoas do
mesmo sexo — o que, segundo Mesquida, era o lema da Woman’s Foreign
Missionary Society: “uma obra da mulher para a mulher” — foi o início de um
movimento significativo das missionárias metodistas em conjunto com os
missionários para o transplante cultural dos norte-americanos metodistas em solo
brasileiro. Para o autor, após a Guerra Civil Americana, os metodistas norte-
americanos tinham em seu ideário que:

[...] as nações mais evoluídas tinham o dever de “civilizar” os povos


atrasados do mundo, seja pela conversão dos pagãos, seja pela
“recuperação” dos católicos ao “verdadeiro cristianismo”, isto é, ao
cristianismo protestante. Cristianizar as nações queria dizer “civilizá-
las” de acordo com o modelo ideal: os Estados Unidos da
América.153

Essa visão de missão está incutida em Watts a ponto de ela afirmar: “O


Senhor introduziu no coração de alguns dos seus servos a compaixão por estas
vidas, bem como o desejo de achar uma forma de resgatá-las”.154

Quanto ao desejo de transformar mulheres católicas romanas em mulheres


protestantes instruídas e civilizadas, o relato de Watts corobora o pensamento da
educação como projeto de expansão missionária:

152
MESQUIDA, Hegemonia norte-americana e educação protestante no Brasil, p. 147.
153
MESQUIDA, Hegemonia norte-americana e educação protestante no Brasil, p. 105.
154
MESQUITA, Zuleica. Evangelizar e civilizar: cartas de Martha Watts (1881-1908). Piracicaba: Editora Unimep,
2001, p. 17.
66

Suas cerimônias são repletas de idolatria e sua quase total


indiferença à observância do domingo são os grandes males
evidentes a todos. [...], não acho que todas as pessoas más do
mundo estejam no Brasil, e à medida que for me inteirando poderei
contar sobre suas virtudes. Eles são infelizes, de qualquer forma,
por terem um Estado que tornou-se extremamente corrupto nas
mãos de seus líderes. [...] Deus garantirá que vivamos na plenitude
de sua luz, que eles também receberão de nós!155

Vale ressaltar, segundo os relatos de Watts, que ela era muito observadora e
sempre procurava estar presente em todos os acontecimentos e festejos religiosos
da cidade para se contextualizar e se sentir segura de cada passo que deveria dar.

Ao presenciar uma das manifestações do catolicismo em Piracicaba, ela deixa


transparecer seus ideais e convicções de missão para a civilização cristã da mulher
brasileira:

Esperamos com crescente interesse e com os corações tristes;


entendemos que aquilo tudo havia sido planejado para deleitar os
ignorantes e preencher suas mentes com a excitação que eles
interpretam erroneamente como fervor religioso. Então, comentei
que não era de se admirar que se deixassem levar por essas coisas;
como não lhes é oferecido nada melhor, eles aceitam alegremente
essas novidades que os padres sabem tão bem como manejar. [...].
Podem vocês imaginar a escuridão moral deste império em que o
grande “Iluminador” não é melhor conhecido? Não há necessidade
de um trabalho de evangelização aqui, minhas irmãs? E vocês não
orarão por nós para que sejamos dotados do poder superior, tão
necessário para o trabalho que temos a fazer?156

As evidências de que o trabalho educacional significava uma ação


evangelizadora se podem observar no livro de matrícula, no qual as alunas são
denominadas discípulas e não alunas, conforme se pode observar:

155
Ibidem, p. 22.
156
MESQUITA, Evangelizar e civilizar, p. 26.
67

Figura 1 — Primeira página do livro de matriculas aberto por Martha Hite Watts, em 1881.

157
Fonte: ELIAS, Vieram e ensinaram, p. 58.

Neste contexto educacional de missão protestante norte-americana, segundo


Almeida, é possível afirmar que:

[...] a educação era a forma divina de servir, o que não retirava de


sua prática a conotação política e ideológica de levar aos recantos
mais longínquos a cultura e a ideologia que professavam, em busca
da hegemonia daquilo que consideravam o verdadeiro modo de ser
e proceder.158

Há, portanto, que se considerar que a missão educacional está intimamente


ligada ao projeto de uma civilização cristã protestante. Com base em tais aspectos, a
missão se firmará no seu empenho de fazer o melhor para a educação do futuro das
crianças brasileiras.

Na ênfase em ensinar e introduzir uma nova civilização cristã, para os alunos


em particular, o projeto educacional metodista demonstra sua convicção na
superioridade dos ideais da cultura evangélica norte-americana, e isso só seria

157
ELIAS, Beatriz Vicentini. Vieram e ensinaram (Colégio Piracicabano, 120 anos). Piracicaba: Editora Unimep,
2001.
158
ALMEIDA, Jane Soares de. Ler as letras: por que educar meninas e mulheres? São Bernardo do Campo:
Universidade Metodista de São Paulo; Campinas: Autores Associados, 2007, p. 154.
68

possível por meio do desenvolvimento de um projeto educacional inovador que


fizesse frente àquele existente e liderado pela Igreja Católica.

De acordo com Almeida:

O ideário de uma educação que atingisse toda a população e que o


ensino de crianças estivesse sob a responsabilidade feminina fez
com que as missionárias protestantes fossem as pincipais
incumbidas do trabalho nas escolas.159

Porém, o ideal da educação como elemento de transformação social na


missão metodista em terras brasileiras, por ocasião do Primeiro Encontro de
Teologia Protestante, realizado em São José, Costa Rica, de 06 a 11 de fevereiro de
1983, será questionado por Elias Boaventura com a seguinte afirmação: “Nosso
sistema educacional é dicriminatorio até elitista, procura manter as especificações
sociais existentes e até aprofunda e em nada têm contribuído para a transformação
social que se deseja”.160

Com o desenvolver desta pesquisa se observará que a crítica de Boaventura


será confirmada com as consecutivas dificuldades que o metodismo brasileiro
enfrentará com os seus projetos educacionais. Essas dificuldades não serão apenas
no que se refere a garantir a eficácia missionária, onde a educação funcionasse
como um agente de transformação social, mas será mais complexa quando as
regras do mercado educacional particular no Brasil colocarem em risco a qualidade
do ensino e a sustentabilidade financeira das instituições que o oferecem. As
dificuldades com a educação não serão apenas institucionais; serão também de
cunho político social. Como afirma Roberto Nardi:

É evidente que esse estado de crise na educação é reflexo da


própria crise que permeia a sociedade, pois, como já foi visto, as
gestões mercadológicas que carcaterizam as administrações

159
Ibidem, p. 154.
160
BOAVENTURA, Elias. El papel del metodismo em la educación brasileña – contexto actual. In: DUQUE, Jose
(Org.). La tradición protestante em la teologia latinoamericana. Primer intento: lectura de la tradición metodista.
San Jose: DEI, 1983. Texto original: “Nuestro sistema educacional es dicriminatorio, elitista, pretende mantener
las especificaciones sociales existentes y hasta profundizarias y em nada han contribuido para la
transformación social que se desea”.
69

governamentais tendem a desfavorecer as políticas sociais, entre as


quais está a educação.161

Essa crise também será notada no espaço das comunidades de fé,


particularmente na Escola Dominical. Essa agência de educação cristã, que ao
longo dos tempos funcionou como uma grande estratégia evangelizadora, perderá
sua influência nas igrejas locais com o processo de urbanização da sociedade
brasileira. Como afirma Cunha:

No contexto rural era possível estabelecer dois horários de


programação aos domingos: o primeiro bem cedo, de manhã, com
culto e Escola Dominical (catequese), e o segundo no final do dia
para o culto principal. [...] Após investirem presença na cidade, as
igrejas mantiveram as mesmas práticas e até hoje vivem a crise do
esvaziamento das programações em dias úteis e nas manhãs de
domingo.162

Portanto, a educação como elemento de transformação social precisa ser


repensada no projeto missionário metodista e as razões para se constituir novos
paradigmas para uma educação que contemple este projeto missionário serão
analisados nos próximos capítulos.

Resumindo: não se pretende normatizar, como regra única de compreensão,


mas argumentar a associação da tríade — Responsabilidade Social, Pregação e
Educação — como elementos essenciais que adquirem uma vinculação estreita;
que não somente significam conjunto de elementos, mas que formam uma
verdadeira unidade na teologia de missão do metodismo. Assim, o desafio do
próximo capítulo é analisar as influências desta tríade.

161
NARDI, Roberto (Org.). Educação em ciências: da pesquisa à pratica docente. São Paulo: Escrituras Editoras,
2003, p. 37.
162
CUNHA, A explosão gospel, p. 65.
CAPÍTULO 2
AS INFLUÊNCIAS DA TRÍADE —
RESPONSABILIADE SOCIAL, PREGAÇÃO E
EDUCAÇÃO — NO PROJETO MISSIONÁRIO
METODISTA BRASILEIRO

1 Introdução do capítulo: as influências da tríade missionária


metodista — Responsabilidade Social, Pregação e Educação
O movimento missionário no século XIX deixou um legado significativo na
reflexão teológica sobre o tema da missão, em especial, para o movimento
metodista e para a Igreja Metodista dos EUA. Pois, no período da Reforma
Protestante, século XVI, não se evidenciou um projeto missionário expansionista
que fosse além da própria Europa. Segundo os historiadores, os reformadores
“pretendiam libertar a Igreja das tradições e leis humanas que ofuscaram a luz da
Palavra de Deus. Desejavam que toda a Igreja voltasse às suas origens, ao
cristianismo dos tempos dos apóstolos”.1 Stephen Neill afirma que, “para Lutero, a

1
FISCHER, Joachim H. Reforma: renovação da Igreja pelo evangelho. São Leopoldo: Sinodal, 2006, p. 16.
71

missão é sempre de forma preeminente obra do Deus Triúno — missio Dei — e


seu alvo e resultado são a vinda do Reino de Deus”.2

Portanto, neste capítulo serão analisadas as influências consideradas


fundantes do projeto missionário metodista, que tem suas raízes no
protestantismo. A primeira observação será sobre o movimento pietista. E, como
conseqüência, a valorização dos leigos nas reflexões e articulações para um
projeto missionário de cooperação, que culminou com a Conferência de
Edimburgo e seus desdobramentos no continente latino-americano como, por
exemplo, o Congresso do Panamá, em 1916, que dará um caráter de cooperação
à obra missionária na América Latina.3

Na continuidade do capítulo, a partir dos desdobramentos dos movimentos


missionários, sejam eles de caráter ecumênico ou evangelical, como analisa Luiz
Longuini Neto4, procura-se abordar as três dimensões da missão metodista
brasileira objeto desta pesquisa (Responsabilidade Social, Pregação e Educação),
desde a sua implantação até a elaboração do Plano para Vida e Missão.

1.1 A influência do pietismo na tríade missionária metodista

A missão "protestante", na perspectiva expansionista, passa a ganhar vulto


somente no século XVIII com o surgimento dos movimentos de avivamento
pietista alemão. A comunidade moraviana em Hernhut, sob a liderança do conde
2
NEILL, Stephen. História das missões. São Paulo: Vida Nova, 1989, p. 55.
3
Cf. Darli Alves Souza, que pesquisou o envolvimento das comunidades protestantes brasileiras no
movimento ecumênico nas primeiras décadas do século 20, trabalho este que, em 2002, resultou na
dissertação de mestrado As comunidades protestantes e o Congresso do Panamá: um estudo do
envolvimento das comunidades locais no movimento ecumênico nas primeiras décadas do século XX.
4
Cf. Luiz Longuini Neto, que desenvolveu o trabalho que resultou, em 1997, na sua tese de doutorado
Pastoral como o novo rosto da missão: um estudo comparativo dos conceitos de Pastoral e Missão nos
movimentos Ecumênico e Evangelical no Protestantismo Latino-Americano (1960-1992). Longuini Neto
compara os termos “pastoral” e “missão” forjados, respectivamente, no interior dos movimentos ecumênico e
evangelical. Em sua tese, o autor conclui que o movimento evangelical influencia, com maior ou menor
intensidade, todas as denominações do protestantismo instalado no país. Para melhor compreensão da
evolução histórica do protestantismo em sua busca de unidade e as propostas missiológico-pastorais, ele
fez uma abordagem, como pano de fundo, do Congresso do Panamá.
72

Nicolaus Zinzendorf, representa a primeira agência missionária com um


expressivo envio de obreiros para a missão. Esse movimento exerce influência no
pensamento de Wesley, como afirma Antonio Gouvêa Mendonça: “A presença do
pietismo no pensamento de Wesley surgiu após sua experiência de conversão numa
reunião religiosa em certa casa da Rua Aldersgate, em Londres, em 24 de maio de
1738”5. Porém, numa releitura sobre o tema o metodismo brasileiro, segundo
Claudio Oliveira Ribeiro, “os estudos indicam que o metodismo implantado no
Brasil é pouco wesleyano e reduziu-se a uma forma especial de pietismo: o
implantado pelos missionários norte-americanos no século XIX”. 6

Ao contrário do modelo missionário católico romano e dos primeiros


empreendimentos dos pietistas, a característica típica e inovadora dos
missionários moravianos é que eram, em sua grande maioria, leigos. O corpo
missionário leigo era composto por pessoas simples e dos mais distintos ramos
profissionais. Os mesmos se submetiam a um treinamento missionário para, em
seguida partirem, ao campo. Como afirma Mac Lienhard:

Esse movimento haveria de amplificar-se ainda no que designou


como pietismo alemão, um movimento de reavivamento
representado em particular por Spener, Francke e Zinzendorf, e
que iria dar seu cunho característico ao luteranismo alemão. Mais
que a ortodoxia luterana, esse movimento se interessou pelo
humano Lutero, sua piedade, pelas passagens em que
contrapunha uma fé viva, rica em obras, a uma fé morta.7

Outra característica era a opção pelo autossustento como forma de


manutenção do projeto missionário. Pode-se considerar que a partir do movimento
pietista se inaugura o grande impulso para as missões e seus desdobramentos do
movimento missionário do século XIX.

5
MENDONÇA, Antonio Gouvêa. O celeste porvir: a inserção do protestantismo no Brasil. 3 ed. São Paulo:
Edusp, 2008, p. 72.
6
RIBEIRO, Claudio de Oliveira. Por uma eclesiologia metodista brasileira. Revista Caminhando, São
Bernardo do Campo, v. 9, n. 1, p. 44, 2004.
7
LIENHARD, Mac. Martim Lutero: tempo, vida, mensagem. São Leopoldo: Sinodal, 2003, p. 309.
73

1.2 A influência da presença leiga no debate missionário


Como primeiro momento destaca-se a articulação, em especial leiga, na
formatação de um projeto missionário de cooperação que se concretiza na
primeira Conferência Mundial Missionária, realizada em Edimburgo (1910), e que
pode ser considerado “o ponto de partida do movimento ecumênico em todas as
suas formas”.8 O elemento motivador ou a ênfase no movimento ecumênico está
ligada às preocupações sociais, sendo articulada por leigos envolvidos no
movimento estudantil. Segundo Mendonça:

É possível que as raízes mais robustas do movimento ecumênico


tenham sido as associações leigas mundiais de jovens, que
começaram a surgir a partir da segunda metade do século XIX.
Talvez os leigos e jovens não estivessem tão picados pelas
animosidades teológicas e pelo orgulho denominacional e, assim,
suas organizações puderam ter vida longa e prestar grande
serviço ao ecumenismo, principalmente no preparo dos seus
futuros líderes.9

A observação de Mendonça corrobora a tese das discussões sociais da


época e do compromisso com a solidariedade e responsabilidade social, pois na
linha do tempo do movimento ecumênico encontramos o objetivo principal do
“Conselho Internacional Missionário para promover a solidariedade dos cristãos
em escala mundial e a unidade de intenções e de ação na obra de
evangelização”.10

Os desdobramentos missionários na América Latina e Brasil serão


acompanhados pelo Congresso Evangélico do Panamá (1916), que delineou a
proposta missionária para a América Latina. Em outras palavras, “o congresso
significou o começo de um esforço consciente para estender seu trabalho ao longo

8
NEILL, História das missões, p. 566.
9
MENDONÇA, Antonio Gouvêa. O movimento ecumênico no século XX - algumas observações sobre suas
origens e contradições. In: Revista Tempo e Presença Digital, ano 3, n. 12. Disponível em:
<http://www.koinonia.org.br/tpdigital/detalhes.asp?cod_artigo=236&cod_boletim=13&tipo=Artigo>. Acesso
em: 02 mar. 2010.
10
Extratos da Constituição do CMI. In: BOYER, C.; BELLUCCI, D. (Org.). Unità cristiana e movimento
ecumenico, p. 86-89, doc. 18 apud VERCRUYSSE, Jos. Introdução à teologia ecumênica. São Paulo:
Loyola, 1998, p. 50.
74

do continente latino-americano, como nunca antes tinha sido feito”.11 Conforme


comenta Arturo Piedra:

Trata-se de um congresso realizado sob a hegemonia das


denominações históricas ‘liberais’ (utilizo este termo aqui em sua
acepção norte-americana de ‘progressista’ ou ‘avançado’),
influenciadas em diversos graus pela teologia liberal e do
evangelho social dos Estados Unidos: metodistas, presbiterianos,
discípulos de Cristo, Convenção Batista Americana (do norte dos
Estados Unidos) e, mais ainda, pelos setores missionários ‘liberais’
dessas denominações.12

O primeiro capítulo desta pesquisa contemplou na reflexão de José Míguez


Bonino sobre a configuração dos Rostos do Protestantismo Latino-Americano.
Pretende-se neste capítulo destacar a perspectiva da Responsabilidade Social
como parte integrante da missão. Tal pressuposto missiológico da virada do
século XIX representa uma tensão missionária para os metodistas brasileiros,
desde sua origem até o mais significativo plano missionário, o “Vida e Missão”.

É importante destacar que para esta pesquisa a divisão dos períodos


históricos procura atender a uma cronologia de senso comum na história do
metodismo brasileiro. A chegada do Rev. Fountain Elliot Pitts, em 1835, tem como
objetivo observar as possibilidades de missão no Brasil e pode ser entendida
como marco referencial do planejamento da primeira missão. Já em 1836, o Rev.
Justin R. Sapulding instala a missão no Brasil, que será interrompida em 1841.

Uma das obras que desenvolve o estudo deste período é de autoria de


José Gonçalves Salvador e contempla os seguintes temas:

DOS PRIMÓRDIOS À PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA (1835 A


1890)

Capítulo I – O Precursor do Metodismo no Brasil;

Capítulo II – Primórdios do Metodismo no Brasil e

11
PIEDRA, Arturo. Evangelização protestante na América Latina. São Leopoldo: Sinodal; CLAI, 2006, p. 159.
12
Ibidem, p. 13.
75

Capítulo III – O Pequeno Começo de uma Grande Obra.13

Mesmo considerando a interrupção da missão em 1841, pode-se considerar


que, em 1867, com a chegada do Rev. Junius Eastham Newman, que acompanha
voluntariamente um grupo de imigrantes, deu-se a continuidade do trabalho que
trouxe novas motivações para a sua implantação definitiva, consolidação e
autonomia até a elaboração do Plano para Vida e Missão.

2 A tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação


— no primeiro momento missionário do metodismo no Brasil
(1835-1841)
O metodismo dos EUA experimentou um movimento missionário
espontâneo. Segundo Duncan A. Reily, “apesar das dificuldades causadas pela
Revolução (1775-83) houve expansão metodista nesses anos”.14 Porém, de
acordo com José Carlos Barbosa, essa espontaneidade passará a ser planejada e

a sistematização de uma política de expansão missionária para


outros países foi discutida mais tarde, quando o movimento já
experimentava grande crescimento e importante sedimentação na
sociedade norte-americana.15

Esta ação do metodismo dos EUA permitiu que, em 1835, fosse enviado
para o Brasil o primeiro missionário, Fountain Elliot Pitts, com objetivo de
observação do campo.

Pitts foi comissionado pelo bispo James Osgood Andrew para uma viagem de
reconhecimento da América do Sul. As cidades escolhidas foram: Rio de Janeiro
(Brasil); Montevidéu (Uruguai) e Buenos Aires (Argentina).16 Pitts atuou como um

13
Cf. SALVADOR, José Gonçalves. História do metodismo no Brasil. São Bernardo do Campo: Imprensa
Metodista, 1982.
14
REILY, Duncan Alexander. História documental do protestantismo brasileiro. São Paulo: ASTE, 1984, p. 80.
15
BARBOSA, Jose Carlos. Salvar & educar. Piracicaba: CEPEME, 2005, p. 10.
16
REILY, op. cit., p. 81.
76

“espia”, conforme o conceito de Números 13, 17-18: “Enviou-os, pois, Moisés a espiar a
terra de Canaã; e disse-lhes: Subi por aqui para o lado do sul, e subi à montanha. E
vede que terra é, e o povo que nela habita; se é forte ou fraco; se pouco ou muito”.
Assim foi também o papel de Pitts, que verificou as condições das cidades visitadas
e, com empolgação, em especial por sua estada no Rio de Janeiro, relatou: “já
realizei diversas reuniões e preguei 8 vezes em diferentes residências onde fui
respeitosamente convidado e bondosamente recebido pelo bom povo”. 17

Esse movimento de reconhecimento das possibilidades missionárias na


América Latina fazia parte de uma ideologia norte-americana conhecida como
Destino Manifesto.18 Essa ideologia tem suas bases numa proposta burguesa que
fundia os interesses mercantilistas e missionários dos EUA.19

Tendo como pano de fundo o Congresso do Panamá (1916), na análise da


inserção metodista no Brasil paira a dúvida sobre a sua ecumenicidade, em
especial quando se trata da sua ação missionária na dimensão da
responsabilidade social. Se por um lado os missionários norte-americanos
dialogavam com autoridades políticas brasileiras e outras organizações da
sociedade civil da época, procurando legitimidade para o projeto protestante, por
outro as críticas à Igreja Católica Romana eram ácidas e acusatórias, como
revelam os relatórios para as juntas missionárias.

Pitts está neste contexto e, em 1857, no concílio distrital do Tennessee do


meio, apresentou a conhecida teoria do Armagedom.20 No prefácio do livro há uma
declaração intitulada “Para o público americano”, onde encontramos a seguinte
afirmação:

17
SALVADOR, História do metodismo no Brasil, p. 16.
18
Cf. PIEDRA, Arturo. Evangelização Protestante na América Latina: Análise das razões que justificaram e
promoveram a expansão do protestante. São Leopoldo: Sinodal; Equador: CLAI, 2006, pp. 30-57.
19
MÍGUEZ BONINO, José. Rostos do protestantismo latino-americano. São Leopoldo: Sinodal, 2003, p. 119.
20
PITTS, Fountain E. A Defense of Armageddon: or Our Great Country Foretold in the Holy Scriptures.
Baltimore: J. W. Bull, 1859, p. iii.
77

A teoria do Armagedom, de acordo com Rev. F. E. Pitts, foi


preparada durante anos. Sua origem veio através de muita
pesquisa e trabalho mental. Por cerca de dois anos o trabalho foi a
público e obteve um grande destaque das mais hábeis revistas e
periódicos da América. Teólogos eruditos, civis e estadistas têm
acreditado livremente sua veracidade, e matemáticos pronunciam
sua demonstração quanto ao argumento cronológico. Na verdade,
quase todos os que a examinam acreditam nela. As exceções a
essa regra são geralmente encontradas entre os sujeitos da coroa
britânica, ou daqueles que imaginam que a Inglaterra, por
excelência, é o modelo das nações21 (Tradução nossa).

Outro episódio que corrobora a linha pietista e adesão à ideologia do


Destino Manifesto de Pitts, enquanto missionário norte-americano, é o relato de
Robert Anderson Young em seu livro “Reminiscences”, de 1900, quando afirma:

Na sessão de abertura da conferência, Rev. Fountain E. Pitts


fechou o grande avivamento na Igreja McKendree. A reunião tinha
ocupado as três fases do encerramento do seu pastorado. Mais de
quinhentos membros foram inseridos à Igreja, entre os quais
estava Willian R. Elliston, depois de tanto tempo tesoureiro da
nossa sociedade missionária. Como eu era seu convidado durante
a Conferência, é claro que eu ouvi muito sobre o maravilhoso
avivamento. O pastor que conduziu, o pastor fez toda a pregação,
o pastor levou o canto congregacional. Fountain E. Pitts foi o
homem22 (tradução nossa).

É importante ressaltar que, na observação de Young, a centralização dos


atos litúrgicos do culto realizado por Pitts na conferência o qualificou como o
homem. As características acima revelam o estilo missionário implantado no Brasil

21
PITTS, A Defense of Armageddon, p. iii. Texto original: “The theory of Armageddon, by the Rev. F. E. Pitts,
has been in course of preparation for years. Immense research and mental labor have brought it into being.
Por nearly two years it has been before the public and met the favorable notice of many of the ablest journals
and reviews in America. Learned theologians, civilians and statesmen have freely accredited its truthfulness,
and mathematicians pronounce its chronological argument demonstration. Indeed, almost all who examine it
believe it. The exceptions to this rule are generally found amongst the subjects of the British Crown, or those
who imagine that England, par excellence, is the model of the nations”.
22
YOUNG, Robert Anderson. Reminiscences. Nashville: Publishing House Methodist Episcopal Church,
South, Barbee & Smith, agents, 1900, p. 43. Texto original: “At the opening of the conference session Rev.
Fountain E. Pitts closed the great revival in McKendree Church. The meeting had occupied the three closing
mouths of his pastorate. Over five hundred members had been added to the Church, among whom was
Willian R. Elliston, afterwards so long treasurer of our missionary society. As I was his guest during the
Conference, of course I heard much of the wonderful revival. The pastor conducted it, the pastor did all the
preaching, the pastor led the congregational singing, etc. Fountain E. Pitts was the man”.
78

em sua primeira experiência, a saber, centrado no clero e com pouca participação


leiga.

Com o entusiasmo relatado por Pitts, a Conferência envia para o Brasil o


primeiro missionário residente, Justin R. Spaulding. Ele efetivamente trabalhará no
Brasil a partir de 1836.23 No relatório “History of American Missions to the
Heathen: from Their Commencement to the Present Time” encontramos o seguinte
relato:

Sr. Spaulding, ao chegar, encontrou estímulo suficiente para entrar


de imediato em seu trabalho missionário. Ele formou uma pequena
sociedade, e começou a pregar regularmente. Ele escreveu, em 04
de julho de 1836, que suas perspectivas são extremamente
encorajadoras – o aumento da congregação – que Escola
Dominical foi estabelecida, e aparentemente boas impressões
feitas em muitas mentes. Ele consentiu em abrir uma escola diária,
e começou a pregar a bordo de navios Ingleses e americanos,
distribuindo Bíblias e folhetos. Relatou que um caminho foi aberto
para a difusão de Bíblias Portuguesas, e eles foram introduzidos
nas escolas - escreveu para o Conselho para enviar uma
professora qualificada para dar educação. À medida que mais
ajuda era necessária para uma missão eficiente, o Sr. Daniel P.
Kidder foi designado para auxiliar o Sr. Spaulding em seu trabalho
árduo. Sr. Kidder, e sua esposa, juntamente com um professor e
uma professora navegaram de Boston no dia 12 de novembro de
1837, e chegaram e entraram em seus trabalhos com alegria e
empenho24 (tradução nossa).

Além da família Spaulding, em janeiro de 1838 a família de Daniel Parrish


Kidder chega para fortalecer o trabalho missionário no Brasil. Atendendo a um
pedido de Spaulding, a família Kidder vem colaborar com a abertura de uma

23
BARBOSA, Salvar & educar, p. 13.
24
TRACY, Joseph at al. History of American Missions to the Heathen: from Their Commencement to the
Present Time. Worcester: Sponner & Howland, 1840, p. 559. Texto original: “Mr. Spaulding, on arriving,
found sufficient encouragement to enter immediately on his missionary labors. He formed a small society,
and commenced regular preaching. He wrote, July 4th, 1836, that his prospects were exceedingly
encouraging—the congregation increasing— Sabbath School established, and good impressions apparently
made on many minds. He consented to open a day school, and commenced preaching on board English and
American ships, distributing Bibles and tracts. Reports that a way was opened for spreading Portuguese
Bibles, and they were introduced into schools—Wrote for the Board to send a female teacher qualified to give
a finished education. As more help was needed for an efficient mission, Mr. Daniel P. Kidder was appointed
to assist Mr. Spaulding in his arduous labors. Mr. Kidder, his wife, together with a male and female teacher
sailed from Boston on the 12th of November 1837, and arrived and entered on their work with cheerfulness
and diligence”.
79

escola, que teve seu início no bairro da Glória e depois se mudou para o Engenho
Velho. Essa mudança se dá por ocasião da transferência da família Kidder para o
Engenho Velho, local este de concentração dos imigrantes norte-americanos.25 Tal
fato indica que a pregação e a educação representam ações inseparáveis neste
primeiro momento missionário do metodismo brasileiro.

Porém, a escola terá uma vida muito curta. Em menos de seis meses
Spaulding anuncia que McMurdy havia renunciado ao papel de professor na
escola metodista e estava se preparando para retornar aos EUA.

Em primeira instância Kidder trabalha com Spaulding. Ambos enfrentam


dificuldades no aprendizado da língua portuguesa e, por essa razão, desenvolvem
ações entre os imigrantes protestantes de língua inglesa, tais como os norte-
americanos e ingleses. Isso possibilitará uma inserção missionária junto aos
marinheiros, quando Spaulding e Kidder atuarão como capelães. Como descreve
Kidder:

Anualmente, mais de doze mil marinheiros, viajando sob os


pavilhões da Inglaterra, e dos Estados Unidos, se encontram no
Rio de Janeiro. Essa classe de homens exige a melhor atenção
dos cristãos filantrópicos. Quando a peste vista o Rio de Janeiro,
estão certos de ser atacados, antes de quaisquer outros. A
imprevidência dos marinheiros é proverbial, e a sua dissipação e
negligencia são bem conhecidas. Uma maior proporção de
marinheiros morre anualmente em comparação com qualquer
outra classe, e por isso realmente requerem os mais vivos
esforços em seu beneficio, quer moral quer fisicamente falando.
Os esforços que tenho feito em relação aos marinheiros do Rio, de
quando em vez, não foram inteiramente perdidos. A American
Seamen’s Friend Society, nobre instituição que levou a Igreja a
todos os pontos do mundo para os norte-americanos e ingleses,
estabeleceu uma capelania nesse porto.26

25
Cf. KIDDER, Daniel P.; FLETCHER, J. C. O Brasil e os brasileiros: esboço histórico e descritivo. Rio de
Janeiro: Companhia Editora Nacional, 1941, p. 127-128: “Nossa mudança para o Engenho Velho foi
motivada pelo fato de quási tôdas as famílias norte-americanas residentes no Rio de Janeiro estarem lá
instaladas, e, por isso, bastante distantes de qualquer culto Protestante”.
26
Ibidem, p. 227-228.
80

Barbosa afirma que, “embora o atendimento religioso aos marinheiros não


tenha produzido frutos permanentes para a implantação do metodismo no Brasil,
J. Sapulding e D. P. Kidder dedicaram a esta atividade com bastante afinco”.27
Porém, este ministério de capelania junto aos marinheiros pode ser entendido
como a expressão da solidariedade e/ ou Responsabilidade Social da época.

O trabalho de Kidder que obteve uma desenvoltura mais expressiva foram


suas viagens pelo Brasil como representante da Sociedade Bíblica Americana.
Suas ações, por exemplo, a distribuição de Bíblias, bem como suas observações
das instituições religiosas da época permitem que ele tenha um panorama da vida
brasileira nos idos de 1830. Kidder, nessas viagens, conheceu pessoalmente
muitos vultos da política brasileira da época. Ele construiu inúmeros contatos e
coletou informações valiosas que muito o ajudaram a compreender o país.

Nesse contexto, a obra de Émile G. Léonard, “O protestantismo brasileiro”,


numa leitura da perspectiva das territorialidades religiosas evangélicas no Brasil,
afirma que:

Kidder, que percorreu o Brasil durante a minoridade de D. Pedro II,


distribuindo Bíblias e reunindo documentário para seus Sketches
of residence and travel in Brazil. Outras descrições de viagens
poderão interessar mais do ponto de vista da descrição geográfica,
econômica e social do país. Esta, entretanto, sobreleva todas no
que diz respeito à situação espiritual e eclesiástica, quer pelo fato
de ser esse assunto afim com sua atividade e as preocupações de
seu autor, quer devido à sua inteligência e liberalismo, que nem
sempre encontramos em propagandistas que seguiram seus
passos.28

Essa habilidade de Kidder pode ser relacionada à ideologia norte-


americana do Destino Manifesto, em que os missionários pioneiros imbuídos
desse pensamento justificam a ocupação do Oeste dos EUA. O grande
crescimento metodista estadunidense, bem como a anexação de territórios
mexicanos, se dão em razão dessa ideologia. É também verdadeira essa mesma

27
BARBOSA, Salvar & educar, p. 20.
28
LÉONARD, Émile G. O protestantismo brasileiro. 3. ed. São Paulo: ASTE, 2002, p. 33.
81

hipótese para ação missionária protestante fora dos EUA, que nesta pesquisa se
aplica ao Brasil.

A missão Spaulding foi impactada negativamente por algumas situações.


Uma delas foi o fechamento da escola. Outra, em contexto familiar, foi a morte de
Cynthia Harriet Kidder, esposa de Daniel Kidder, seu fiel companheiro de missão.
Conforme Halford E. Luccok relata:

Em 1841, terminou esta primeira etapa da obra metodista no


Brasil. A cidade do Rio de Janeiro, apesar de capital, era uma das
cidades mais doentias do Brasil. Febre e epidemias de toda a
espécie tinham ali campo propício para a sua procriação, devido
ao clima e às precárias noções de higiene de então. Cynthia
Harriet Kidder, estremada esposa do Rev. Daniel P. Kidder, foi a
primeira vítima da trágica capital. Faleceu em 1840 de febre
amarela, forçando o seu esposo a voltar aos Estados Unidos com
o seu filhinho nos braços.29

E, não menos importante, a tensão interna dos EUA e da Igreja Metodista


norte-americana. Portanto, em maio de 1841 se dá o encerramento da primeira
missão metodista em terras brasileiras. Segundo Reily, além da situação pessoal
das famílias envolvidas,

as principais causas reais foram: 1) falta de pessoal missionário; 2)


dificuldade de acesso direto ao povo brasileiro devido as
superstições e limitação da liberdade religiosa; e 3) arrocho
financeiro provocado pela depressão econômica nos Estados
Unidos, o chamado “Pânico de 37”.30

As razões enumeradas por Reily devem ser analisadas a partir da


conclusão de Mendonça, que afirma sobre o encerramento do trabalho metodista
no Brasil: “O mais provável é que a crise das igrejas protestantes americanas por
causa da escravidão, que atingiu a Igreja Metodista em 1844, tenha cortado os
recursos missionários”.31

29
LUCCOK, Halford E. Linha do esplendor sem fim. São Paulo: Junta Geral de Educação Crista Igreja
Metodista do Brasil, [s.d.], p. 88.
30
REILY, História documental do protestantismo brasileiro, p. 84.
31
MENDONÇA, O celeste porvir, p. 45-46.
82

Mesmo considerando que cinco anos (abril de 1836 a maio de 1841)32 seja
um curto período da presença metodista no final do século XIX, pode-se
evidenciar, a partir desta análise, que a tríade Responsabilidade Social, Pregação
e Educação está presente no primeiro momento missionário metodista. Se, por um
lado, a motivação missionária tinha como pano de fundo o Destino Manifesto e a
Doutrina Monroe33, por outro, observa-se que os missionários trabalhavam esta
tríade como meta missionária. O envolvimento com a capelania dos marinheiros
revela que, no primeiro momento, essa foi a atividade mais intensa dos
missionários e representa a dimensão da responsabilidade social do movimento
missionário. Não de menor valor é o comprometimento de Spaulding e Kidder com
a abertura da primeira Escola Dominical e a primeira escola secular para crianças,
inicialmente instalada na Rua do Catete34, na Glória e depois no Engenho Velho.
Tais ações educativas comprovam a ênfase na educação religiosa e secular. Não
será diferente quanto ao tema da pregação. O engajamento nesse campo é, sem
dúvida, a ação principal do projeto missionário, em especial no metodismo, que
tem raízes profundas com o tema. Pitts, o espia do metodismo norte-americano,
afirma que em apenas duas semanas pregou oito vezes. 35 Os relatórios da missão
Spaulding revelam: “Imediatamente após a minha chegada, iniciei cultos públicos
na minha residência. A assistência logo aumentou de trinta para quarenta, e assim
fomos obrigados a procurar um lugar maior e mais conveniente”.36

Portanto, a missão metodista, no período da sua primeira implantação no


Brasil, procurou seguir, mesmo com as dificuldades do contexto missionário já
analisado o método missiológico estabelecido ao longo da história do cristianismo.

32
BARBOSA, Salvar & educar, p. 22.
33
Cf. PIEDRA, Evangelização protestante na América Latina, p. 27: “Os autores que abordavam esse tema
consideravam que na América Latina eram lembrados os efeitos negativos da Doutrina Monroe e se
rejeitava a leitura oculta da geopolítica norte-americana, que subentendia a frase ‘América para os
americanos’ como ‘América Latina para os Estados Unidos’”.
34
KIDDER, Daniel P. Reminiscências de viagens e permanência no Brasil. Rio de Janeiro; Província de São
Paulo: Senado Federal, 2001, p. 121.
35
REILY, História documental do protestantismo brasileiro, p. 81.
36
Ibidem, p. 83.
83

Pode-se perceber que a tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação


— esteve presente no ministério de Jesus. Alguns exegetas, como Craig S.
Keener37, defendem a tese de que a base da missiologia de Jesus no texto da
“Grande Comissão” (Mateus 28, 19-20) deve ser interpretada à luz de Mateus 4,
23: “Jesus percorria toda a Galiléia, ensinando [Educação] em suas sinagogas,
pregando [Pregação] o Evangelho do Reino e curando [Responsabilidade Social]
toda e qualquer doença ou enfermidade do povo”.

Essa tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação — está


presente no movimento metodista do século XVIII, e assim foi interpretada por
Francis Gerald Ensley que, ao analisar a Responsabilidade Social na dimensão da
educação e da filantropia em Wesley, afirma:

O mais nobre resultado, que jamais cessou, desde aquele dia até
os dias de hoje, de remediar a culpa, a ignorância, o sofrimento
físico, a degradação social dos perdidos e dos pobres... Produziu
uma nova filantropia que reformou nossas prisões, infundiu
demência e sabedoria às nossas leis penais, aboliu o tráfico de
escravos e deu o primeiro impulso à educação popular.38

Ainda no mesmo livro, Ensley se referirá à pregação, pois, para Wesley, “a


forma mais característica (e mais sensacional) de levar o evangelho ao povo de
seus dias era o que chamava de pregação no campo, isto é, pregação ao ar livre”39
que sem dúvida foi a grande inovação do movimento wesleyano do século XVIII.
Assim, observa-se que Wesley, após as resistências próprias de sua época e
aderindo à prática iniciada por Whitefield, a pregação ao ar livre, descobrirá o
povo: “antes invisível, a necessidade do mesmo, de ouvir a boa nova do amor de
Deus, tornava-se óbvia”.40

37
KEENER, Craig S. Matthew. Downers: InterVarsity Press, 1997 (New Testament Commentary Series), p.
718.
38
ENSLEY, Francis Gerald. John Wesley, o evangelista. São Paulo: Imprensa Metodista, 1960, p. 12.
39
Ibidem, p. 46.
40
REILY, Duncan A. Situações missionárias na história do metodismo. São Bernardo do Campo: Editeo,
1991, p. 9.
84

Na chegada dos missionários metodistas ao Brasil a evangelização terá


como método a “divulgação das Escrituras e folhetos religiosos, nisso aderindo
aos conselhos de João Wesley”41, pois, para ele, a divulgação escrita da literatura
bíblica seguia “em importância a pregação do Evangelho”.42

É certo que a missão Spaulding não desenvolveu a tríade conforme o


movimento metodista já experimentara nos seus primórdios. A Responsabilidade
Social não está tão evidente neste período, pois não se tem registro da instalação
de projetos sociais ou ações correlatas. A pregação ao ar livre entre o povo
brasileiro também não será estabelecida, até mesmo pelos limites que os
missionários tinham com a língua portuguesa. A educação ficará no âmbito da
educação religiosa, sem envolvimento com a educação secular. Tudo isso, como
já relatado, o primeiro momento da missão enfrentou opositores radicais.43

3 A tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação


— no segundo momento missionário do metodismo no Brasil
(1867-1930)
A ausência missionária metodista por 26 anos — do encerramento da
missão Spaulding (1841) até a chegada Junius Eastham Newman, em agosto
186744 — não significou o fim do Projeto Missionário Metodista Estadunidense.
Essa ausência de um quarto de século tem suas razões nas dificuldades internas
do metodismo norte-americano. As tensões entre o metodismo do norte e do sul

41
LONG, Eula Lee Kennedy. Do meu velho baú metodista. São Paulo: Junta Geral de Educação Crista; Igreja
Metodista, 1968, p.18.
42
Ibidem, p. 18
43
Cf. BARBOSA, Salvar & educar, p. 17-18: “O Padre Perereca foi o opositor mais radical do metodismo, ele
chegou a escrever três livros recheados de denúncias e acusações, conforme se pode perceber a partir dos
próprios títulos, que são os seguintes: 1) Desagravos do Clero e do Povo Católico Fluminense; ou Refutação
das Mentiras e Calúnias do Impostor que se Intitula Missionário do Rio de Janeiro, e Enviado pela
Sociedade Metodista Episcopal de New York para Civilizar e Converter ao Cristianismo os Fluminenses; 2)
O Católico e o Metodista; ou Refutação das Doutrinas Heréticas que os Intitulados Missionários do Rio de
Janeiro, Missionários de New York tem vulgarizado nessa Corte; 3) Antídoto Católico contra o Veneno
Metodista, ou Refutação do Segundo Relatório do Intitulado Missionário do Rio de Janeiro”.
44
REILY, Situações missionárias na história do metodismo, p. 86.
85

dos EUA, em especial com relação ao tema da escravidão, desencadeará uma


cisão interna do movimento. “Na Conferência Geral de 1844, por se recusar
aceitar James Osgood Andrew como bispo, por ter o mesmo se tornado dono de
escravos por herança, iniciou o processo de cisão formal da igreja”.45 O período de
1861-1865, nos EUA, é repleto de tensões: trata-se da guerra civil.

Karen Armstrong, ao analisar as guerras históricas, fruto do


fundamentalismo no judaísmo, no cristianismo e no islamismo, sintetiza esse
período da seguinte forma:

Os americanos também haviam passado por um conflito terrível e


por seu decorrente anticlímax. Veio a Guerra Civil (1861-65) entre
os estados do Norte e do Sul em termos apocalípticos. Os
nortistas acreditavam que a luta purificava a nação; os soldados
cantavam a “glória da vinda do Senhor”. Os pregadores falavam de
um Armagedon iminente, de uma batalha entre a luz e as trevas, a
liberdade e a escravidão. Aguardavam ansiosamente o Novo
Homem e a Nova Época que emergiriam, como a fênix, dessa
provação. Mas tampouco na América surgiu um admirável mundo
novo. A guerra deixou cidades inteiras em ruínas, famílias
despedaçadas e brancos do Sul revoltados.46

Esse período de tensões na sociedade civil norte-americana também


proporcionará prejuízos significativos ao metodismo estadunidense, como relata
Paul E. Buyers:

Durante o período da Guerra Civil o Metodismo sofreu revezes,


tanto no norte como no sul. Entre os anos de 1860 e 1864 a Igreja
do Norte perdeu mais de sessenta e oito mil membros e a do Sul,
mais de cem mil membros. Além disso, a Igreja do Sul perdeu das
suas propriedades, igrejas, colégios, escolas e outros
estabelecimentos. O trabalho missionário estrangeiro ficou
paralisado.47

O tema da escravidão, como analisado no primeiro capítulo, é um dos


temas missiológicos no campo da responsabilidade social do movimento
metodista inglês. Robin Blackburn afirma que Wesley é um dos colaboradores da
45
REILY, Situações missionárias na história do metodismo, p. 86.
46
ARMSTRONG, Karen. Em nome de Deus. São Paulo: Companhia das Letras, 2001, p. 163.
47
BUYERS, Paul E. História do metodismo. São Paulo: Imprensa Metodista, 1945, p. 266.
86

Sociedade Abolicionista. E, que “Wesley não foi um pioneiro do pensamento


antiescravista, mas sua adesão refletiu e trouxe à luz uma forma de abolicionismo
popular”.48

A retomada missionária se dará em 1867, com a chegada de Junius E.


Newman, não por iniciativa da junta missionária, porém por iniciativa do próprio
pregador metodista, que “resolveu acompanhar seus compatriotas sulistas que
emigraram o Brasil após a guerra civil”.49

Tal decisão situa-se no contexto das tensões que a sociedade civil e a


igreja norte-americana vivem. Os conflitos levam Newman a refletir sobre sua
permanência ou não nos EUA, como relata Eugene C. Harter:

O Reverendo Junius C. Newman, pastor da Igreja Metodista, havia


tentado, em vão, consolar a viúva. Nesse momento ele levou os
meninos para casa, partilhando com eles o pouco alimento de que
sua família dispunha. Os mendigos de Sherman tinham roubado
quase tudo o que possuíam, deixando-lhes pouco mais que alguns
itens de mobília e as roupas do corpo. As tropas da União haviam
arrebentado as cercas de Newman, levando embora o seu gado, e
roubado a comida que estava armazenada em sua outrora
próspera fazenda. Abalado por estes eventos e pela desolação
que tomou conta de Meridian, Newman iniciou seus planos de
mudar sua recém-ampliada família para uma área mais segura. A
população civil estava quase perdida. Sem lugar para viver e
pouca comida para comer, muitos buscavam refúgio na sombra
das árvores ou em tendas emprestadas até reconstruírem ou
migravam para outras partes. Newman se perguntava se a vida no
Brasil, sobre o qual ele tinha lido, não poderia ser preferível a este
inferno que o General Sherman tinha criado50.

48
BLACKBURN, Robin. A queda do escravismo colonial: 1776-1848. Rio de Janeiro: Record, 2002, p. 117.
49
REILY, Situações missionárias na história do metodismo, p. 87.
50
HARTER, Eugene C. The Lost Colony of the Confederacy. Jackson: University Press of Mississippi, 1985, p.
7. Texto original: “The Reverend Junius C. Newman, pastor of the Methodist church, had tried in vain to
console the window. Now, he took the boys in, sharing with them the little food available to his family.
Sherman's bummers had stolen almost everything they owned, leaving them little more than a few items of
furniture and the clothes on their backs. The union troops had torn up Newman's fences, driven away his
cattle, and stolen the food that was stored on his once thriving plantation. Stunned by these events and the
desolation that overwhelmed Meridian, Newman began his plans for moving his newly enlarged family to a
safer area. The civilian population was almost beyond help. With no place to live and little food to eat, many
sought refuge in the shade of trees or in borrowed tents until they rebuilt or migrated to other parts. Newman
wondered whether life in Brazil, about which he had read, might not be preferable to this living hell that
General Sherman had created”.
87

O metodismo do sul dos EUA vivia um momento difícil, conforme acima


citado, com a perda de propriedade e de grande parte de sua membresia. A
conferência estava endividada e não podia assumir as despesas da vinda de
Newman para o Brasil. No entanto, Newman e sua família decididamente
assumem as despesas de viagem e embarcam para o Brasil. J. L. Kennedy, ao
relatar sobre seu compatriota, deixa transparecer que a busca original dos
Newman era a recuperação econômica e, conjugado a isso, podia desenvolver a
obra missionária:

O Rev. Junius E. Newman, que antes era homem de certa fortuna,


tendo perdido tudo que possuía, durante essa guerra, precisava de
alguma forma estabelecer os seus haveres. Vendo muitos dos
seus amigos e patrícios partirem para uma terra longínqua e
estrangeira, resolveu acompanhá-los, especialmente animado pela
esperança de poder auxiliar na propaganda do Evangelho.51

Ao desembarcar no Brasil, em 05 de agosto de 1867, com os outros norte-


americanos que procuravam novos horizontes de vida no pós-guerra, Newman
escreve para seu país relatando as suas expectativas com o Brasil:

Agradecerão a Deus por esta linda e favorecida terra de refúgio...


Pois aqui acharão “liberdade para adorar a Deus”... Aqui também
erguerão firmemente a bandeira do nosso cristianismo protestante
e cantarão os doces cânticos de Sião, como antes, na sua terra
natal. E ainda que a linda mangueira, com seus largos e agradável
sombra seja, temporariamente, sua única casa de oração, mesmo
assim se reunirão para adorar a Deus, e os hinos de Watts e
Wesley serão cantados no Brasil como em outras terras.52

Após toda a tensão e perdas nos EUA, novas possibilidades de vida


surgem e, parodiando o salmista, Newman relata de forma entusiasta a sua
estada no Brasil: “Como cantaremos a canção do Senhor em terra estranha?”
(Salmo 137, 4). Ele afirma: “mesmo assim se reunirão para adorar a Deus, e os
hinos de Watts e Wesley serão cantados no Brasil”.53

51
KENNEDY, J. L. Cinqüenta anos de metodismo no Brasil. São Paulo: Imprensa Metodista, 1928, p. 16.
52
BARBOSA, Salvar & educar, p. 24.
53
Ibidem, p. 26.
88

Ainda sobre o tema da escravidão, “os sulistas norte-americanos ficaram


animados com o regime de grandes propriedades escravocratas vigentes no
Brasil”.54 Tal atitude revela, dentro desta pesquisa, a tensão missiológica
metodista brasileira. Mesmo diante da tragédia norte-americana, os metodistas
que aqui chegam para esse segundo momento missionário revelam suas
intenções contrárias ao pensamento wesleyano e razão do conflito estadunidense.
Essas tensões e contradições são espelhadas em seu companheiro do movimento
metodista na Inglaterra, George Whitefield, considerado um dos mais notáveis
pregadores de seu tempo e um abolicionista juntamente com Wesley. Em sua
ação missionária na Geórgia, utilizou-se de escravos para o serviço do Orfanato
Bethesda, como relata Julia Floyd Smith:

Não há dúvida sobre as intenções benevolentes e zelo reformador


de Oglethorpe, pensou ele próprio, dono de escravos e plantação
em South Carolina. Ele também foi vice-governador para a Royal
African Company (Companhia da Realeza Africana) que o rei do
parlamento, e os comerciantes patrocinavam; o comércio de
escravos Africano foi considerado "o grande pilar e apoio do
comércio de plantação britânica na América”. George Whitefield, o
evangelista de renome que fundou o orfanato Bethesda perto de
Savannah, e James Habersham, um funcionário colonial dentro do
corpo diretivo do presidente William Stephenes, ambos apoiando
fortemente o movimento para tornar a escravidão legal na Geórgia.
Withefield comprou o Bethesda com o dinheiro recebido de seus
investimentos em terras e escravos na Carolina do Sul.55

Allan Gallay analisa profundamente esta tensão entre a postura de um


abolicionista inglês e suas dificuldades na implantação missionária do metodismo

54
BARBOSA, José Carlos. Negro não entra na Igreja: espia da banda de fora. Protestantismo e escravidão no
Brasil. Piracicaba: Unimep, 2002, p. 96.
55
SMITH, Julia Floyd. Slavery and Rice Culture in Low Country Georgia, 1750-1860. Knoxville: University of
Tennessee Press, 1991, p. 19. Texto original: “There is no doubt about the benevolent intentions and
reforming zeal of Oglethorpe, thought he himself owned slaves and a plantation in South Carolina. He also
was deputy governor for the Royal African Company that king, parliament, and merchants supported; the
African slave trade was considered "the great pillar and support of the British plantation trade in America".
George Whitefield, the distinguished evangelist who founded Bethesda Orphanage near Savannah, and
James Habersham, a colonial official within the governing body of President William Stephenes, both
strongly supported the movement to make slavery legal in Georgia. Withefield launched Bethesda with
monies received from his investments in land and slaves in South Carolina”.
89

na Georgia. No artigo The Origins of Slaveholders Paternalism: George Whitefield,


the Bryan Family, and the Great Awakening in the South ele escreve:

Whitefield adquiriu uma plantação e escravos, em meados da


década de 1740, "através da generosidade de meus bons
amigos... na Carolina do Sul". Suas "oito mãos de trabalho...
levantaram [mais] em um ano, e com um quarto do gasto, que foi
produzido no Orfanato Bethesda por vários anos após a última."
Whitefield deduziu "que a Geórgia nunca pode ou vai ser uma
província próspera sem os negros." O mesmo homem que havia
discutido tão convincente contra o desumano tratamento dos
negros, em 1740, mudou seu argumento cinco anos mais tarde.
Admitindo que os negros "são trazidos de uma maneira errada de
seu próprio país" e afirmando que o comércio de escravos "não
era para ser aprovado", Whitefield acreditava que o comércio de
escravos "continuará a ser realizadas querendo ou não; Eu deveria
pensar que sou muito favorecido se eu pudesse comprar um bom
número deles.... ". Ele racionalizou a escravidão, dizendo que era
dever cristão "tornar as suas vidas confortáveis e estabelecer uma
base para a reprodução de sua posteridade." Whitefield pode ter
acreditado que o transporte de africanos a milhares de quilômetros
de sua casa e sua escravidão foi justificada pela possibilidade de
"tornar a vida deles confortável" e converter seus filhos para o
cristianismo, mas ele ainda sentia a necessidade de negar a sua
responsabilidade para a legalização da escravidão na Geórgia: "Eu
não tinha responsabilidade em trazê-los para Geórgia, embora a
meu julgamento consentisse isso." Mas, uma vez que o ato foi
feito, ele escreveu o Bryans, "não vamos pensar mais nisso, mas
diligentemente melhorar a presente oportunidade para a instrução
deles”.56

56
GALLAY, Allan. The Origins of Slaveholders Paternalism: George Whitefield, the Bryan Family, and the
Great Awakening in the South. The Journal of Southern History, Athens, GA, v. 53, n. 3, p. 391-392, Aug.
1987: “Whitefield acquired a slave plantation in the mid-1740s, ‘through the bounty of my good friends… in
South-Carolina.’ His ‘eight working hands . . . raised [more] in one year, and with a quarter the expense, than
has been produced at [the] Bethesda [orphan house] for several years last past.’ Whitefield deduced from
this ‘that Georgia never can or will be a flourishing province without negroes.’ The same man who had
argued so cogently against the inhumane treatment of blacks in 1740 had five years later changed his
argument. Admitting that blacks ‘are brought in a wrong way from their own country’ and asserting that the
slave trade was ‘not to be approved of,’ Whitefield believed that the slave trade ‘will be carried on whether we
will [it] or not; I should think myself highly favored if I could purchase a good number of them…’ He
rationalized enslavement by saying it was Christian duty ‘to make their lives comfortable and lay a foundation
for breeding up their posterity.’ Whitefield may have believed that transporting Africans thousands of miles
from their home and enslaving them was justified by the chance to "make their lives comfortable’ and to
convert their children to Christianity, but he still felt the need to deny his responsibility for the legalization of
slavery in Georgia: ‘I had no hand in bringing them into Georgia; though my judgment was for it.’ But once
the act was done, he wrote the Bryans, ‘let us reason no more about it, but diligently improve the present
opportunity for their instruction”.
90

Whitefield justifica sua atitude afirmando que a Georgia não terá como se
desenvolver sem a força dos negros africanos. Como diz Adam Hochschild:

George Whitefield, o pastor evangélico mais influente de sua


época – tanto Newton como Equiano ouviram-no pregar -, tinha
mais de cinqüenta escravos na Geórgia e acreditava firmemente
que “os países quentes não podiam cultivar sem negros”.57

Isso não significa que Whitefield estava abdicando das teses iniciais do
metodismo inglês, que assumiu um formato distinto no processo de inclusão de
todas as classes e raças. Robinson Cavalcanti afirma que certo político trabalhista
inglês certa vez afirmou: “o meu socialismo não procede de Marx, mas do
metodismo”.58 Segundo o pensamento de Cavalcanti, em sua análise sobre o
movimento missionário metodista de caráter estrangeiro, este nunca dissociou o
anúncio das Boas Novas dos cuidados filantrópicos. Porém, é importante destacar
as tensões que o campo religioso enfrenta na fronteira missionária. Assim, vale
ressaltar que Newman, ao chegar à cidade do Rio de Janeiro, em 1867, não
estabelece nenhum trabalho missionário. Conforme relata José Gonçalves
Salvador:

Conta que ao desembarcar no Rio trazia consigo $ 100 dólares em


ouro, que era tudo quanto lhe restava, além de um pouco que
deixara com a família. Ao fim de um mês comprou uma pequena
fazenda num subúrbio de Niterói, a qual, na ocasião da carta, já
lhe estava dando lucro. A Capital, tão próxima, oferecia excelente
mercado para os produtos, bem como para suprimento do
necessário. Na propriedade existia uma casa mais cômoda do que
a dos EUA. Só faltava igreja e, pelo que sabemos, Newman não
organizou nenhum trabalho religioso enquanto residiu em Niterói,
embora a Sra. Judith M. K. Jones diga que morou no Rio e que
sua casa era um dos pontos de reunião dos imigrantes, mas não
especifica a natureza destas. Além disto, na Capital havia cultos
de diversas denominações.59

Newman retorna aos EUA para buscar sua família e se estabelece como
proprietário de terras em Saltinho. Esse período sem a organização de uma
57
HOCHSCHILD, Adam. Enterrem as correntes. Rio de Janeiro: Record, 2007, p. 116.
58
CAVALCANTI, Robinson. Cristianismo e política: teoria bíblica e prática. Viçosa/MG: Ultimato, 2002, p. 154.
59
SALVADOR, História do metodismo no Brasil, p. 32.
91

efetiva comunidade de fé também gerou tensões entre Newman e sua


Conferência nos EUA:

Há um fato expresso na carta revelada quão magoado Newman se


sentia com respeito à Conferência de Alabama: tinham-lhe
excluído o nome do rol. Por quê? Falta de correspondência com as
autoridades? Não parece! Mas, talvez, porque o trabalho dele no
Brasil fosse coisa particular, sem caráter oficial e já se ausentara
há três anos. Contudo, manifesta a esperança de ver o nome
restaurado e ele próprio reconhecido como missionário aqui. À
igreja nada pesará, pois sustenta-se a si mesmo e à família.60

Certamente este conflito é solucionado, pois um ano depois desta


correspondência, em 1871, em Saltinho, próximo a Santa Bárbara do Oeste (SP),
Newman organizará a primeira Igreja Metodista no território Brasileiro. Esse feito
será reconhecido por ocasião dos 25 anos de presença metodista no Brasil, após
a chegada de Newman. O Expositor Cristão, em julho de 1901, dedicará uma
edição especial e ali encontramos a seguinte afirmação sobre o missionário:

Soube granjear as simpatias dos irmãos, Drs. Prudente e Manoel


de Moraes Barros, nomes estes imortais nos anais da história
brasileira. Pelas relações que teve com estes dois eminentes
cavalheiros, pode melhor planejar a missão brasileira, e pelas
representações feitas pelo Sr. Newman e outros membros da
nossa igreja, a Conferência Geral de 1874 foi induzida a
determinar o estabelecimento de uma Missão no Brasil.61

Newman, porém, não aprendeu a língua portuguesa, o que permitia que


suas pregações fossem apenas para os imigrantes norte-americanos. Essa
situação também pode ser considerada outro campo de tensão na dinâmica
missionária do metodismo nascente no Brasil. E, por essa razão, ele escreve:

Enquanto prego Cristo a estes americanos – que estão espalhados


pelo país – em inglês, há um enorme campo missionário à minha
volta pronto para os trabalhadores; mas ai! Eles não estão aqui.
Oh, como meu coração é tocado pelas cenas à minha volta!

60
SALVADOR, História do metodismo no Brasil, p. 34.
61
EC, 11 de julho de 1901, p. 2.
92

Pudesse eu pregar Cristo a esse povo gentil, em sua própria


língua, faria disso o trabalho da minha vida.62

Através das suas cartas, Newman insistiu para que os metodistas norte-
americanos abrissem uma missão em nosso país. Em fevereiro de 1876, cinco
anos após a organização da primeira Igreja Metodista no Brasil, chega John
James Ransom, agora como missionário oficial da Junta de Missões da Igreja
Metodista Episcopal do Sul, despertada através da publicação das cartas nos
jornais metodistas nos EUA. Newman, nomeado Superintendente em 1879,
juntamente com a família, mudou-se para Piracicaba (SP). Após,
aproximadamente, um ano, entre 1879-1880, suas filhas Annie e Mary
organizaram um internato e externato para meninas. O "Colégio Newman" é
considerado a gênese do Colégio Piracicabano, uma das instituições mais
significativas na história da educação metodista em terras brasileiras — o que nos
leva a reafirmar que a segunda missão metodista em terras brasileiras será a
precursora de um sistema educacional inequívoco, reforçando o conceito da tríade
pesquisada neste estudo.

Ransom dedicou-se ao aprendizado do português para proclamar a boa-


nova aos brasileiros. Ao contrário de Newman, sua filha Annie dominava a língua
portuguesa com proficiência. “Annie Ayres Newman possuía boa instrução e sabia
o português tanto quanto o inglês”63 e, no natal de 1879, ela se casa com o
missionário Ransom. Em 18 de julho de 1880, vítima de febre amarela, Annie veio
a falecer.

Pelo que a pesquisa indica, Ransom, mesmo com a perda da esposa,


dedica-se ao trabalho e revela uma performance no aprendizado da língua
portuguesa:

O Rev. Ransom, por sua vez, reiniciou os cultos em português e


deu rápido andamento à construção da capela, no terreno

62
BARBOSA, Salvar & educar, p. 28.
63
SALVADOR, História do metodismo no Brasil, p. 38.
93

adquirido junto ao largo do Catete, a qual seria a primeira na


história do Metodismo brasileiro. (...) Além das reuniões em uma
residência, conforme dissemos, Ransom inaugurou novo ponto de
culto em português, à Rua de São Clemente, 39, no bairro de
Botafogo, onde não existia ainda nenhum crente metodista.64

Em agosto de 1886, Ransom volta ao EUA. Historiadores discutem sobre


as verdadeiras razões de seu retorno e suspeita-se que o mesmo ficou
desapontado com algum tratamento que lhe foi dispensado nas suas atribuições
eclesiásticas. Porém, sua relação com a língua portuguesa continuará. Na
bibliografia de seu terceiro filho com Sarah Crowe, sua segunda esposa, o
historiador Louis Decimus Rubin Jr. afirma:

Se observarmos o início da carreira de John Crowe Ransom,


podemos ver este processo quase perfeitamente exemplificado.
Ransom nasceu em Pulaski, Tennessee, em 1888. Seu pai, John
James Ransom, era um pastor metodista, assim como o seu pai
antes dele. O Dr. Ransom serviu como missionário na América
Latina. Ele era conhecido como um estudioso e lingüista, e
traduziu a Bíblia para o português.65

O período de 1876 a 1886 é geralmente denominado de "Missão


Ransom"66. Sua efetiva contribuição para o metodismo nascente foi a organização
de uma estrutura mínima para o funcionamento da Igreja Metodista em terras
brasileiras, mesmo ainda sem condições jurídicas de registro da Igreja. Ransom
foi um estrategista na ação missionária brasileira. Ele não teve pressa para
estabelecer o local definitivo para inicio da Igreja. Mesmo estando a família de
Newman em Piracicaba e desejosa por fundar uma escola na cidade, por
influência dos políticos locais, tais como a família de Prudente de Moraes, Ransom

64
SALVADOR, História do metodismo no Brasil, p. 72 e 78.
65
RUBIN Jr., Louis Decimus. The Wary Fugitives: Four Poets and the South. Baton Rouge: Louisiana State
University Press, 1923, p. 10. Texto original: “If we look at the early career of John Crowe Ransom, we can
see this process almost perfectly exemplified. Ransom was born in Pulaski, Tennessee, in 1888. His father,
John James Ransom, was a Methodist minister, as had been his father before him. Dr. Ransom had served
as a missionary in Latin America. He was known as a scholar and linguist, and he had translated the Bible
into Portuguese”.
66
Cf. SALVADOR, op. cit., p. 43.
94

não optou de imediato por Piracicaba. Antes fez um reconhecimento da região sul
do Brasil, em especial o Rio Grande do Sul, como relata Salvador:

O Rev. Ransom, embora recém-chegado, encarregou-se de


examinar “in loco” a viabilidade do plano. A quantia de 1.000
dólares destinada pela Junta de Missões à obra no Brasil, bem
poderia ser usada na instalação da escola. Para iniciar era mais do
que suficiente. Os presbiterianos, todavia, já tinham gasto em
Campinas, com o terreno e construção do belo edifício de tijolos
onde funcionava o Colégio Internacional, cerca de 30.000 dólares,
mas iriam dispender o triplo, provavelmente. Até que esse
problema e o dos professores encontrassem solução, Ransom
dedicou-se a nova tarefa de verificar onde melhor convinha
inaugurar outro ponto da Missão: Porto Alegre ou Rio de Janeiro.67

Após suas análises, optou pelo Rio de Janeiro como centro estratégico
para propagar o metodismo, obviamente por ser, na época, o centro político e
econômico do país. Em janeiro de 1878, Ramsom iniciou sua pregação em inglês
e português. O recebimento dos primeiros brasileiros à comunhão da Igreja
Metodista se deu, como afirma Salvador:

A 9 de março de 1879, a igreja do Catete recebeu por profissão de


fé os primeiros brasileiros: o ex-padre Antônio Teixeira de
Albuquerque e sua esposa D. Senhorita Francisco de
Albuquerque. Ele tinha renunciado ao Catolicismo em Pernambuco
a 7 de abril de 1879, já possuindo filhos. No mês de julho, mais
quatro brasileiros foram recebidos, todos da família Pacheco.68

Em se tratando de tensões na dinâmica missionária, os primeiros


metodistas recebidos por Ransom enfrentaram, cinco anos depois, conflitos no
ministério de Kennedy, o que culmina no desligamento de alguns deles, conforme
relato:

Quando os membros de uma igreja dão bom testemunho e são


consagrados, há alegria, o pastor trabalha animado e os frutos
aparecem. Quando sucede o contrário, os cultos diminuem de
assistência, os interessados fogem e o pastor se esforça em vão.
É o que se deduz lendo o relatório desanimador do Rev. Kennedy
em maio de 1884, referindo-se às duas congregações do Catete,

67
SALVADOR, História do metodismo no Brasil, p. 37.
68
Ibidem, p. 49.
95

inglesa e nacional. A situação chegara a tal ponto que a Junta de


Ecônomos se viu constrangida a designar uma comissão para
investigar o procedimento dos irmãos Robert Bratt e James
Whitter, devendo o relatório ser entregue ao pastor. Entrementes
surgiram graves denúncias contra as senhoras D. Maria Tereza
Landim e D. Isabel Tereza Landim, pelo que o zeloso Kennedy as
visitou por diversas vezes, aconselhando-as a viver cristãmente,
mas elas não quiseram, preferindo demitir-se da igreja no começo
de 1885. Outro caso, igualmente contristador, foi o do Sr. Alfredo
Pacheco e sua esposa, D. Eliza Pacheco, família pioneira e de
projeção, a qual também se retirou em princípios de 1885. Que
lástima e que responsabilidade para que, um dia, conheceu o
Evangelho redentor de Jesus Cristo.69

Após o episódio do falecimento da Annie, esposa de Ransom, ele viaja para


os Estados Unidos em busca de refrigério pessoal e de mais pessoas dispostas a
contribuir na tarefa missionária no Brasil. Certamente por suas qualidades
estratégicas, ele convence pessoas e a direção da Junta Missionária Norte-
Americana e retorna ao Brasil, dois anos depois, com James L. Kennedy, Marta
Watts e o casal Koger. Assim relata Salvador:

Entre os que ouviram o Rev. Ransom falar a respeito do Brasil e


narrar a história de miss A. A. Bewman, moça talentosa e serviçal,
mas ceifada tão cedo pela morte, encontravam-se os dois jovens
pastores James L. Kennedy e James W. Koger, e a senhorita
Marta Hile Watts, esta de Louisville, Kentucky, e aqueles,
respectivamente, das Conferências de Holston e Carolina do Sul.
Os moços são idealistas, capazes de sacrifícios e de grandes
realizações, conforme a história tem mostrado, e os três aceitaram
o desafio, vindo a esculpir seus nomes indelevelmente nas
páginas do metodismo brasileiro.70

Kennedy e Koger implementarão os circuitos de pregação do metodismo:


Kennedy no Rio de Janeiro e Koger em Piracicaba. Salvador declara que:

Assim, o ano de 1881 definiu rumos ao Metodismo, mostrando-lhe


as linhas a seguir, quer na escolha de locais para o
estabelecimento da obra, quer na adoção de métodos: a visitação

69
SALVADOR, História do metodismo no Brasil, p. 102.
70
Ibidem, p. 67.
96

doméstica, o uso de boa literatura, o ensino e a pregação do


Evangelho a viva voz.71

Na dimensão da educação, a educadora Marta Watts assumirá a tarefa de


educar crianças e moças brasileiras, dando sequência ao trabalho das filhas de
Newman. Surgirá o Colégio Piracicabano, primeira escola metodista no Brasil,
fundada em 13 de setembro de 1881, com a matrícula de apenas uma aluna,
Maria Escobar. Como descreve Jacques Marcovitch:

Martha Watts era muito apreciada por líderes republicanos de


Piracicaba, da estatura de Prudente de Moraes, que se tornaria
Presidente da República de 1894 a 1898, e de seu irmão Manuel
de Moraes. Ambos não apenas admiravam a escola de Martha
Watts, que encorajavam com donativos, como viam nela a ocasião
ideal para aborrecer a Igreja Católica, com que os republicanos
andavam em constante guerrilha em torno da questão da
separação entre a Igreja e o Estado.72

Com a presença, competência e habilidades de Martha Watts, o projeto


missionário metodista brasileiro vai ganhando seus contornos na área da
educação. É importante destacar que a educação, como proposta missionária,
viverá a tensão da fronteira política do Brasil Império e do Brasil republicano.
Como relata Marcovitch, republicanos apoiaram o sistema educacional norte-
americano. Em “O metodismo e a ordem social republicana”, Vasny de Almeida
afirma:

As intenções dos metodistas e suas propostas de ordem social


são, dessa forma, analisadas aqui como integrantes de um
encadeamento social mais amplo, que perpassava por diversas
instituições e grupos comprometidos com a ordem política
instaurada em 1889. Os discursos de clérigos e lideranças leigas
sobre regras de condutas e comportamento social, exaustivamente
publicados em seus meios de comunicação, destinados tanto para
os membros da Igreja Metodista quanto aos demais leitores,
revelam um compromisso com a ideologia da "ordem e progresso"
instilada pelos setores dominantes da sociedade. Nossa
pretensão, nesse sentido, é propiciar uma abordagem que, ao não
se restringir à idéia de que todo conteúdo moralizador é parceiro
71
SALVADOR, História do metodismo no Brasil, p. 72.
72
MARCOVITCH, Jacques. Pioneiros e empreendedores: a saga do desenvolvimento no Brasil. Vol. 2. São
Paulo: Edusp, 2005, p. 308.
97

do autoritarismo paternalista, possibilite visualizar, na visão de


mundo dos protestantes sobre a moralidade e conduta, sinais de
um comprometimento com a modernidade nas relações sociais.73

Enquanto que a primeira missão metodista valorizou contatos com o


Império Português no Brasil, esse segundo momento é marcado na aproximação
dos missionários metodistas pelas iniciativas dos irmãos Manoel e Prudente de
Moraes Barros que, na cidade de Piracicaba, participam da criação do Gabinete
de Leitura, da Loja Maçônica, do jornal O Piracicaba e até da construção do
Colégio Piracicabano. Eliana Tadeu Terci, em sua pesquisa de doutorado, destaca
que “a aliança entre os republicanos e metodistas se fundamentava na oposição à
Monarquia”.74 Não somente em Piracicaba essa aproximação missionária com o
movimento republicano é percebida. Como afirma Lyndon Santos:

Os protestantes estavam convictos de que sua religião era a que


melhor se adequava aos tempos republicanos e ao processo de
modernização da sociedade. Este discurso foi captado por João do
Rio, um jornalista na virada dos séculos XIX/XX no Rio de Janeiro,
chamado por Nicolau Sevcenko de “repórter dos novos tempos”.75

Porém, é importante realçar que a educação no movimento missionário


metodista iniciante em Piracicaba não é tão somente uma aliança entre
republicanos e metodistas. Um fato que não é tão conhecido é a ação de Frances
S. Koger, esposa do missionário James W. Koger, que fundou uma escola para
crianças pobres em Piracicaba, como descreve Salvador:

De fato, os metodistas queriam colaborar na obra educativa local,


como bem se verifica em uma nova escola aberta pela senhora
Koger em determinado ponto da cidade. Tendo a família se
mudado para esse bairro, ela encontrou ali diversas crianças
vivendo ociosamente, e as convocou para lhes ministrar o ensino,

73
ALMEIDA, Vasny. O metodismo e a ordem social republicana. Revista de Estudos da Religião, São
Bernardo do Campo, ano 3, n. 1, p. 41, 2003.
74
TERCI, Eliana Tadeu. A cidade na primeira república: imprensa, política e poder em Piracicaba. Tese
(Doutorado em História) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo,
São Paulo, 1997, p. 290.
75
SANTOS, Lyndon. O protestantismo no advento da República no Brasil: discursos, estratégias e conflitos.
Revista Brasileira de História das Religiões- ANPUH, São Paulo, ano III, n. 8, p. 112, set. 2010.
98

meninos e meninas, pudessem pagar ou não. Somavam


dezesseis. Quando Miss Koger precisou deixar a escola, por
enfermidade, outros lhe retomaram o posto.76

O interesse pela educação de crianças pobres revela as intenções


missionárias do metodismo enquanto Responsabilidade Social, elemento
essencial da herança cristã e wesleyana. Esse elemento é também avaliado por
Elias Boaventura e Silvana Malusá, quando pesquisaram sobre as Escolas
Paroquiais77 no metodismo. Boaventura e Malusá afirmam que “o fenômeno das
Escolas Paroquiais Metodistas confirma o empenho da Junta Norte-Americana e
das mulheres metodistas na obra educacional.78

Mesmo de forma não muito vigorosa as ações missionárias afirmativas na


dinâmica da Responsabilidade Social permeiam o projeto missionário metodista, o
que vem reafirmar a tese principal desta pesquisa.

É importante salientar que a Responsabilidade Social representa uma


evolução das discussões em torno do termo filantropia:

Filantropia é composta de duas palavras gregas que significam:


amor a humanidade. Por conseguinte, é próxima de benevolência,
e difere de amizade, como este último afeto subsiste apenas entre
alguns indivíduos, enquanto filantropia compreende toda a
espécie.79

Para responder às questões evidenciadas, a pesquisa fará, num momento,


a discussão em torno da Responsabilidade Social como um elemento essencial da
dimensão missionária e como se deu a evolução desse conceito tão presente não

76
SALVADOR, História do metodismo no Brasil, p. 82.
77
Para aprofundamento do tema Escolas Paroquiais recomenda-se a leitura do texto de BOAVENTURA,
Elias; MALUSÁ, Silvana. Escolas paroquiais metodistas. Revista de Educação do COGEIME, São Paulo,
ano V, p. 83-98, dez. 1996.
78
Ibidem, p. 89.
79
ENCYCLOPAEDIA BRITANICA. Or A Dictionary of Arts, Sciences, and Miscellaneous Literature. London:
Archibald Constable and Company, 1823, p. 262. Texto original: “Philanthropy is compounded of two Greek
words which signify the love of mankind. It is therefore of nearly same import with benevolence; and differs
from friendship, as this latter affection subsists only between a few individuals, whilst philanthropy
comprehends the whole species”.
99

somente na religião, mas também de forma intensa nos últimos anos nas
empresas.

Em 22 de dezembro de 1883, se realizou a Conferência


Trimestral, em Piracicaba, ao se tratar da questão de 25, sobre
Negócios Miscelâneos, o Rev. Koger apresentou um documento
em inglês, que dizia: "The Brazil Mission is divided into two
Districts, the Rio de Janeiro and São Paulo, J. J. Ranson and J.
W. Koger, superintendente. Noutras palavras, a Missão Brasileira
ficava dividida daí em diante em dois distritos: o do Rio de Janeiro
e o de São Paulo, cada qual sob a direção de um presbítero-
presidente e todos sob a superintendência do Rev. Koger.
Embora constituíssem, ainda, duas áreas enormes, era a melhor
maneira para conduzi-las.80

Os líderes do movimento missionário metodista brasileiro apontam, por


meio do chamado "Trio de Ouro", o indicativo das três dimensões da missão:
Kennedy (evangelista, construtor de igrejas e o historiador do metodismo
brasileiro); Tarboux (pregador e pastor das principais igrejas metodistas e primeiro
bispo residente no Brasil, eleito em 1930) e Tucker (agente da Sociedade Bíblica
Americana e fundador do Instituto Central do Povo). Somente estes três, de forma
única na história do metodismo, instalam a primeira Conferência Anual, como
relata Long:

Até o dia de hoje tem essa Conferência a distinção de ser única


em todo o metodismo mundial organizada com três membros tão
somente: o Rev. James L. Kennedy, o Rev. John W. Tarboux e o
Rev. Hugh C. Tucker, designados depois como "TRIO DE OURO"
- líderes metodistas nos campos de evangelização (Kennedy
organizou mais igrejas e recebeu mais membros do que qualquer
outro pregador); Tarboux, no campo da educação (especialmente
em conexão com Granbery); e Tucker, como pioneiro dinâmico no
campo da ação social, tendo ao seu crédito uma longa lista de
"Primeiros".81

Frente ao que foi apresentado, a pesquisa indica que a tríade missionária


— Responsabilidade Social, Pregação e Educação — funciona como eixo
norteador das ações missionárias do metodismo no início do século XX.

80
SALVADOR, História do metodismo no Brasil, p. 79.
81
LONG, Do meu velho baú metodista, p. 62.
100

4 A tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação


— no terceiro momento missionário do metodismo no Brasil
(1930-1982)
O final do segundo e início do terceiro momento missionário do metodismo
no Brasil é marcado pela tensão que traz o tema da autonomia junto à Igreja-mãe
(Igreja Metodista Episcopal do Sul [EUA]).

O autogoverno e a ideologia nacionalista representam as motivações que


levam o metodismo brasileiro buscar autonomia. Conforme analisa Rui de Souza
Josgrilberg:

A idéia da autonomia nasceu com o desejo dos (as) metodistas


brasileiros (as) de se constituírem em Igreja autônoma. Esse
desejo trazia no centro o princípio do autogoverno. Para a sua
concretização, era necessário alcançar o auto-sustento. Todas as
iniciativas, decisões, responsabilidades, estavam nas mãos dos
missionários. (...). A motivação da autonomia encontrou uma mola
propulsora na forte ideologia nacionalista, muito viva no início do
século passado (uma espécie de patriotismo reivindicatório de
direitos inerentes à nacionalidade).82

As tensões internas da Igreja representam os conflitos que a sociedade


brasileira vivenciava na época. Em “A Questão Nacional na Primeira República”, a
historiadora Lúcia Lippi Oliveira analisa “o nacionalismo, enquanto bandeira a
guiar os intelectuais preocupados em construir um projeto de salvação nacional”. 83
Nesse cenário, no contexto metodista brasileiro é importante destacar a figura de
Guaracy Silveira, pastor que, segundo pesquisa de Cilas Ferraz de Oliveira, é
qualificado como um político e um religioso liberal:

Guaracy Silveira, de família rica que empobreceu, estudou para


padre, tornou-se pastor protestante e foi o primeiro deputado
protestante eleito no Brasil nas Constituintes de 1934 e 1946. Ele é
um típico intelectual desse período. Atuou como jornalista e

82
JOSGRILBERG, Rui de Souza. O movimento da autonomia – nasce a “Igreja Metodista do Brasil”, 2 de
setembro de 1930. In: SOUZA, José Carlos de (Org.). Caminhos do metodismo no Brasil: 75 anos de
autonomia. São Bernardo do Campo, Editeo, 2005, p. 12.
83
OLIVEIRA, Lúcia Lippi. A questão nacional na Primeira República. São Paulo: Brasiliense, 1990, p.147.
101

escreveu diversas obras e poesias. Ele se identificava como um


político e um religioso liberal.84

Os movimentos históricos que acompanham o metodismo brasileiro são


permeados pela tensão existente no campo político brasileiro. Se considerarmos a
organização oficial da Igreja com a chegada de John James Ransom, em fevereiro
de 1867, como missionário oficial da Junta de Missões da Igreja Metodista
Episcopal do Sul, o período entre a chegada do metodismo oficial e a mudança do
regime monárquico para a república é de apenas treze anos. Esse paralelo
também pode ser percebido no desenrolar da história. O fim da Primeira República
ou República Velha se dá em 1930, com a chegada de Getúlio Vargas ao poder
com a seguinte proposta política:

A Plataforma da Aliança Liberal, lida por Getúlio num comício


realizado na capital da República, na Esplanada do Castelo, em
janeiro de 1930, tinha por objetivo sensibilizar as elites regionais
dissidentes, a crescente classe média urbana e mesmo a massa
trabalhadora. Defendia a reforma do sistema político, com a
adoção, entre outros pontos, do voto secreto e da justiça eleitoral;
defendia também as liberdades individuais clássicas e a anistia,
com o que acenava para a reconciliação com os tenentes.85

Segundo Reily, a autonomia do metodismo não “se desenvolveu, é claro,


em um vácuo; pelo contrário, desenvolveu-se no Brasil da década dos vinte, um
Brasil de crescente auto-afirmação e nacionalismo”.86 A tese de Reily corrobora
esta investigação, que observa que as tensões da sociedade brasileira
representam as tensões da Igreja. O caminho para a autonomia, ainda segundo
Reily, é composto por três fatores: “1) A Eclesiologia e a Filosofia Missionária do
Protestantismo; 2) A Crescente Maturidade da Missão Brasileira e 3) Os Passos
Específicos que conduziram à Autonomia”.87

84
OLIVEIRA, Cilas Ferraz. Protestante na política: O caso Guaracy Silveira. X Simpósio Internacional –
Processo Civilizador, 1, 2, 3 e 4 de abril, Campinas: Unicamp, 2007. Não paginado.
85
FAUSTO, Boris. Getulio Vargas: o poder e o sorriso. São Paulo: Companhia das Letras, 2006, p. 36.
86
REILY, Duncan Alexander. Metodismo brasileiro e wesleyano. São Bernardo do Campo: Imprensa
Metodista, 1981, p. 23.
87
REILY, Metodismo brasileiro e wesleyano, p. 23.
102

Destaca-se na tese de Reily que o movimento protestante na América


Latina buscava novas formas de ser organizar e expressar. O Congresso de
Montevidéu, em 1925, “no qual participaram 11 metodistas representando o
Brasil”88, aprovou a reivindicação de se eleger bispos nativos. Reily ainda aponta
que no mesmo período que a Igreja Metodista Episcopal do Sul aprovou a
autonomia do metodismo brasileiro, o mesmo se deu com as Igrejas Metodistas da
Coréia e México.

Outras análises sobre o processo de autonomia da Igreja Metodista e o


movimento nacionalista são cabíveis nesta pesquisa como, por exemplo, é
analisado por Josgrilberg:

O “nacionalismo religioso” é definido por S. G. Inman em 1929, no


relatório do Congresso de Havana (1929), como sendo “o
propósito e ações para assegurar completo auto-sustento, auto-
governo auto-crescimento à obra, sem se separar do
companheirismo da Igreja Universal”. Essa caracterização se
completa, mais adiante, com uma nota que aponta para a
aculturação do Evangelho.89

Portanto, a autonomia da Igreja Metodista em terras brasileiras não pode


ser analisada numa única perspectiva ou como se fosse uma “via de mão única”, a
saber, um desejo exclusivo e único dos metodistas brasileiros da época. É
essencial que a discussão contemple outros fatores, tais como políticos, sociais,
culturais, educacionais, entre outros. O movimento de autonomia do metodismo
brasileiro é resultante dos fatores anteriormente indicados e, na intenção
missionária, representa a busca por uma eclesiologia inculturada para o
cumprimento da missão. Em pesquisa sobre o movimento de autonomia da Igreja
Metodista, C. F. de Oliveira conclui:

O movimento pela autonomia foi uma luta pelo poder, frustrada


pela incapacidade de superação da dependência econômica e

88
Ibidem, p. 35.
89
JOSGRILBERG, Rui de Souza. A autonomia e a cultura brasileira: Revista Caminhando, São Bernardo do
Campo, v. 10, n.2, p. 47, jul./dez. 2005.
103

ideológica frente aos missionários e à Junta de Missões da Igreja


Metodista Episcopal do Sul.90

Tendo como pano de fundo essa análise do movimento de autonomia da


Igreja Metodista, a tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação — é
percebida nos movimentos das lideranças que procuravam ocupar os espaços
desta Igreja recém-emancipada, porém com tensões internas e externas das mais
variadas ordens.

Se, por um lado, Huch H. Tucker, Guaracy Silveira e outros representam o


pensamento de que ação missionária significa o comprometimento com as
transformações sociais, por outro, encontraremos Augusto Schwab, Epaminondas
Moura e outros que representam o pensamento de que ação missionária é ver a
Igreja como agência de conversão pessoal, avivamento e santidade.

Em face de críticas da sua compreensão sobre o socialismo, uma vez que o


mesmo foi eleito pelo Partido Socialista Brasileiro, Guaracy Silveira defenderá sua
identidade de pastor metodista e deputado constituinte. C. F. de Oliveira afirma
que:

Guaracy defendeu a tese de que “socialismo” e “marxismo” não


eram sinônimos, havia um socialismo cristão e divulgou o Credo
Social da Igreja Metodista fundamentando a defesa da sua
orientação socialista. (...) Em segundo lugar, ele sustentou a tese
de que os candidatos do PSB fizeram campanha, com um
programa socialista, na sua visão, genuinamente cristão.91

A Responsabilidade Social terá um acento significativo nesse início do


terceiro momento missionário do metodismo brasileiro. O periódico oficial da Igreja
Metodista – Expositor Cristão (EC) – dará muita ênfase a essa dimensão da Igreja.

90
OLIVEIRA, Cilas Ferraz de. O movimento de autonomia da Igreja Metodista do Brasil. Dissertação
(Mestrado em Ciências da Religião) – Faculdade de Filosofia e Ciências da Religião, Universidade Metodista
de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2001, p. 106.
91
OLIVEIRA, Cilas Ferraz de. Nunca, na história deste país... a contribuição de Guaracy Silveira ao
Metodismo do Brasil. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Ciências Humanas, Universidade
Metodista de Piracicaba, Piracicaba, 2008, p. 100-101.
104

Dentre esses relatos destacamos o relatório da Comissão de Temperança e


Serviço Social no Concílio Geral da Autonomia:

O bispo James Cannon Junior fez um discurso sobre este tema: ‘A


Igreja e o Evangelho Social’, explicando os princípios
fundamentais das atividades da Igreja, expôs cuidadosamente a
diferença entre o apelo direto do Evangelho a cada alma
individualmente e a relação necessária de cada indivíduo para com
a sociedade. O bispo declarou que o fato muito importante e
significativo que na primeira reunião pública sob a direção do seu
Concílio Geral para ouvir um relatório, a Igreja Metodista
mostrasse enfaticamente sua atitude para com o Evangelho Social
de Jesus, colocando-se assim na linha de frente com o metodismo
desde os dias de Wesley.92

Inspirados e influenciados pela linha do Evangelho Social, o metodismo


brasileiro pós-autonomia valorizará as reflexões de Walter Rauschenbusch,
considerado um dos precursores do Social Gospel. Nas pesquisas de Helmut
Renders, “na tradição metodista, o conceito ‘social’ aparece com frequência e com
significados variados”.93 Portanto, vale destacar que, para o metodismo brasileiro
pós-autonomia, a interpretação de Guaracy Silveira, como citada acima, de que
responsabilidade social da Igreja tem vínculos com um socialismo cristão, pode
também ser percebida nas seguintes atitudes oficiais da Igreja, tais como o
documento aprovado no segundo Concílio Geral em 1934, a saber:

O evangelho que nós pregamos é uma força social


transformadora. Combatemos o materialismo, o amor ao lucro, a
avareza, o nepotismo, o egoísmo. Urge que os raios x dos ensinos
de Jesus penetrem o íntimo de nossa civilização. A visão do Reino
de Deus deve elevar-nos acima das correntes da história das
mudanças complexas do mundo de modo que, com vistas
elevadas, possamos observar os interesses humanos antagônicos
e voltar novamente ao seio da vida humana para fazer parte pela
cristianização da ordem social com nova coragem e fé renovada.94

92
TUCKER, Huch C.; CERILLANES, J. I. Relatório da Comissão de Temperança e Serviço Social. In: Atas do
1° Concílio Geral da Igreja Metodista do Brasil. São Paulo: Imprensa Metodista, 1930, p. 40.
93
RENDERS, Helmut. Andar como Cristo andou: a salvação social em John Wesley. São Bernardo do
Campo: Editeo, 2010, p. 24.
94
CONCILIO GERAL DA IGREJA METODISTA. A atitude da Igreja Metodista do Brasil perante o mundo e a
nação. In: Atas do 2° Concílio Geral da Igreja Metodista do Brasil, Porto Alegre, 4 a 19 de janeiro de 1934.
São Paulo: Imprensa Metodista, 1934, p. 96.
105

Não involuntariamente, mas configurando o marco referencial da identidade


metodista pós-autonomia, os Cânones da Igreja, que até então eram uma
tradução da versão norte-americana, fortalecerão a Responsabilidade Social da
Igreja com destaque para Credo Social95. Esse destaque perderá sua importância
na década de 1960, ocasião de muitos conflitos na política brasileira e também na
vida interna da Igreja. Ele voltará a ocupar espaço como marco referencial na
legislação de 1982, ocasião da aprovação do Plano para Vida e Missão. Ainda, na
linha do pensamento não involuntário e sim como marco referencial, em 03 de
setembro de 1930, no denominado Concílio da Autonomia, Tucker foi chamado
para presidir os trabalhos conciliares desse novo momento. Sublinha-se que
Tucker foi o missionário norte-americano profundamente identificado com a
Responsabilidade Social. Sua biografia contempla a fundação da primeira
instituição de Serviço Social do Brasil, o Instituto Central do Povo, como
mencionamos anteriormente.

A eleição do primeiro bispo nativo, César Dacorso Filho, dar-se-á no 2°


Concílio Geral, em 1934. Guaracy Silveira, o metodista deputado constituinte pelo
Partido Socialista Brasileiro, revela sua empolgação com a eleição do primeiro
bispo metodista brasileiro:

a eleição do novo bispo veio encher de alegria a todos que o


conhecem. Moço humilde, de grande cultura, enérgico e capaz de
resolver com prudência todas as dificuldades que surjam nos
concílios e nos pastorados, sempre fiel e todas as obrigações dos
cargos que tem ocupado, ele será nestes seis anos um fator de
paz e desenvolvimento da Igreja.96

Porém, esse marco referencial de comprometimento social da Igreja sofrerá


mudanças, frutos das tensões internas e das pressões políticas da época, em
especial a inserção do país na segunda guerra Mundial, pois Vargas com a

95
A Doutrina social da Igreja Metodista se expressa no Credo Social. Para aprofundar no tema a 57ª. Semana
Wesleyana promovida pela FaTeo, por ocasião do centenário do Credo Social, debateu o tema e os
registros estão no livro. RENDERS, Helmut (org). Sal da Terra e Luz do Mundo. São Bernardo do Campo:
EDITEO, 2009.
96
SILVEIRA, Guaracy. EC, v. 49, n. 3, p. 12, 24 jan. 1934.
106

implantação do Estado Novo, indicava uma aproximação do Brasil com países do


Pacto de Aço (Alemanha e Itália). Em 1937, com a aprovação de uma Constituição
centralizadora e autoritária, Vargas implantará uma ditadura no país e uma forte
aproximação com a Igreja Católica, como analisa Kenneth P. Serbin:

As tendências políticas dos anos 30 reforçaram a relação entre a


Igreja e o Exército. A fracassada revolta comunista de 1935
causou profunda cisão nas Forças Armadas e acentuou o medo do
comunismo na direita e na Igreja. (...). Durante a Segunda Guerra
Mundial, a Igreja enviou capelães militares para acompanhar a
Força Expedicionária Brasileira (FEB), que lutou ao lado das forças
dos Estados Unidos na Itália.97

Embalados pelas comemorações do bicentenário da experiência pessoal de


John Wesley, os metodistas brasileiros enfrentarão as tensões missionárias no
interior da Igreja. Se, por um lado, um grupo defendia o compromisso social da
Igreja como forma de ação missionária, por outro, um grupo assumia claramente
que a ação missionária metodista brasileira necessitava de novos rumos e
indicava a evangelização pessoal, o avivamento e a santidade como indicativos
desses novos rumos. Como afirma Eduardo Mena Barreto Jaime, no EC de
outubro de 1938:

Antes de evangelizar os de fora, avivemos os de dentro, mudemos


nós mesmos de rumos e de orientação, de métodos e de práxis de
idéias e de opiniões, de propósitos de atitudes que não estiverem
em harmonia com as finalidades espirituais do metodismo
verdadeiro e da Igreja Cristã.98

A postura de Jaime será corroborada com a chegada de Schwab na


Secretaria da Junta Geral de Missões, numa preocupação frenética com os
números de membros da Igreja, fruto da compreensão do conceito da Escola
missiológica denominada de missiologia gerencial, que é assim entendida por
Escobar:

97
SERBIN, Kenneth P. Diálogos na sombra: bispos e militares, tortura e justiça social na ditadura. São Paulo:
Companhia das Letras, 2001, p. 84.
98
JAIME, Eduardo Mena Barreto. O evangelismo wesleyano. Expositor Cristão, São Paulo, v. 52, n. 37, p. 2, 4
out. 1938.
107

Missiologia Gerencial é uma escola típica do pensamento moderno


vindo dos Estados Unidos, a abordagem quantitativa é
predominante e a orientação pragmática bem definida.99

As influências desse pensamento pragmático na ação missionária tomam


conta do ambiente metodista, uma vez que seu secretário geral de missões é
adepto do mesmo. Schwab declarará que a evangelização pessoal e vida de
santidade deverão nortear os rumos missionários da Igreja. Assim afirma o
secretário geral de missões:

A nossa Igreja nasceu com este profundo desejo na vida dos seus
fundadores: evangelizar o indivíduo para que o mesmo aceite a
Jesus como seu salvador pessoal, e cresça em santidade,
tornando-se digno e útil da sociedade e do meio em que vive,
como filho de Deus.100

Analisando ainda as tensões no interior do metodismo brasileiro, vale


destacar que, no final da década de 1930, o 3° Concílio Geral, realizado em 1938
em Juiz de Fora, no Instituto Granbery, decide pelo fechamento da Escola Bíblica
de Porto Alegre e a Faculdade de Teologia do Granbery. Tal decisão originará a
constituição de uma única Faculdade de Teologia em São Paulo. Segundo o bispo
César Dacorso Filho, a decisão é bem avaliada com ênfase nas seguintes
questões: “preparação ministerial mais variada, mais profunda, enquanto mais
econômica, mais fortalecedora da coesão da igreja (...), mais uniformizadora de
nossas atividades”.101

Ainda nesse terceiro momento missionário do metodismo no Brasil (1930 -


1982), pretende-se destacar que a tensão missionária levou a um equívoco
comum dos protestantes na América Latina, a saber: reduzir a missão como
somente ação evangelizadora. Para David Bosch, a “missão inclui a

99
ESCOBAR, Samuel. Missiologia evangélica: olhando para o futuro na virada do século. In: TAYLOR, Willian
(Org). Missiologia global para o século XXI. Londrina: Descoberta, 2001, p. 40.
100
SCHWAB, Augusto. Evangelismo. Expositor Cristão, São Paulo, v. 54, n. 42, p. 4, 21 nov. 1939.
101
SOUZA, José Carlos de. Faculdade de Teologia: um passo consistente da Igreja a caminho da autonomia.
In: ______ (Org.). Caminhos do metodismo no Brasil: 75 anos de autonomia. São Bernardo do Campo,
Editeo, 2005, p. 29.
108

evangelização como uma de suas dimensões essenciais”.102 Considerar a


evangelização como essencial na obra missionária não significa considerar a
evangelização como sinônimo da missão. Míguez Bonino afirma que:

Simplificando, poderíamos, talvez, dizer que o protestantismo


latino-americano teve a tendência de confundir evangelização e
missão; ou seja, de reduzir a totalidade da missão de Deus à
“tarefa evangelizadora” concebida de modo estreito como o
anúncio do chamado “plano de salvação” e o convite à
conversão.103

Como se observa na análise de Míguez Bonino, o equívoco sobre a


compreensão da missão não é um fenômeno religioso metodista brasileiro. Na
verdade, estende-se como realidade no contexto protestante latino-americano.
Portanto, é compreensiva a ênfase na conversão pessoal, na santidade e no
avivamento. As divergências na compreensão de missão da Igreja se
aprofundarão ao longo desse terceiro momento metodista. Renders avalia que tal
atitude conduz a igreja a uma polarização:

Este dissenso impossibilita abraçar uma missão como Igreja, ou,


pelo menos, como maioria dela. Onde não há esperança de
consenso, cresce a tentativa de dominação de um grupo sobre o
todo.104

Outras análises no campo social, do qual o religioso não está dissociado,


indicam que as polarizações transformam espaços democráticos em espaços
autoritários. José Luiz Beired, ao analisar a situação da Nova República com
Vargas, escreve sobre os intelectuais autoritários. Em seu livro, “Sob o signo da
nova ordem: intelectuais autoritários no Brasil”105, ele dedicou um item com um
título, no mínimo curioso, quando se fala de fenômenos da religião, a saber: “O
culto ao golpe de Estado e ao líder carismático”. Em sua análise sobre esse tema
na América Latina, o autor compara esse fenômeno no Brasil e na Argentina,

102
BOSCH, Missão transformadora, p. 28.
103
MÍGUEZ BONINO, Rostos do protestantismo latino-americano, p. 126.
104
Ibidem, p. 21.
105
BEIRED, José Luiz. Sob o signo da nova ordem: intelectuais autoritários no Brasil e na Argentina. São
Paulo: Loyola, 1999.
109

afirmando que a “união dos nacionalistas só seria factível em torno de um


‘caudilho’”106. E fica evidente o imaginário religioso nessa figura, que é descrito da
seguinte forma:

[...] impor uma concepção total de weltanschauung do movimento


que ele encabeça com messianismo providencial. Por isso, o
caudilho manifesta-se perante sua hoste com um salvador
excepcional: é, por definição, o homem forte e desinteressado
capaz de matar e morrer pelos ideais que predica [...] os chefes
das grandes revoluções sempre foram, ao mesmo tempo que
condutores civis, egrégio guerreiros por educação e
temperamento. Isto é: militares no sentido duro e heróico do
termo.107

Logo, o projeto missionário metodista herdará também em sua organização


eclesiástica os ranços do autoritarismo eclesiástico como resultado das disputas
pelo poder, espaço e dominação numa Igreja com uma autonomia frágil.

A questão do autoritarismo no campo religioso já foi analisada por diversas


matrizes religiosas, em especial quando o mesmo se dá nas disputas pelo poder e
vem carregado do elemento emblemático do carisma. João Batista Libânio, ao
considerar esta situação no catolicismo romano, assevera:

Adotam, por vezes, posições antiéticas. Eles mantêm valor e


significação se conseguem flexibilizar, injetar espírito, mover da
estagnação as estruturas da Igreja, sobretudo o centralismo do
poder, o personalismo decisório, a rigidez canônica, o clericalismo
masculino, o autoritarismo enfatuado. Perdem, porém a força
carismática se se deixam absorver totalmente pela instituição.
Então cessam de ter um novo movimento para se tornar mais uma
instituição envelhecida.108

Tal fenômeno é comum ao metodismo desde a sua origem. Segundo


Mendonça & Velasques Filho, Peter Fry denunciou que o movimento metodista

106
Ibidem, p. 159.
107
Ibidem, p. 160.
108
LIBANIO, João Batista. Os carismas na Igreja do terceiro milênio: discernimento, desafios e práxis. São
Paulo: Loyola, 2007, p. 213.
110

Inglês, nos tempos de Wesley, foi dirigido com “’mão de ferro’ [...] até sua morte
em 1791”.109 Odilon M. Chaves certifica que:

Na verdade, o metodismo brasileiro caminhou muito à sombra da


ênfase política e social brasileira. Getúlio Vargas dirigiu o país da
década de trinta à década de cinqüenta com uma ditadura. O
primeiro bispo brasileiro dirigiu o metodismo com mão de ferro
também de 1934 a 1955.110

Ainda nesse período denominado de terceiro momento missionário do


metodismo no Brasil, sublinha-se que a pregação ficou centrada, não de forma
exclusiva, mas de forma mais acentuada, no conceito da evangelização. Como
dito, a missão nesse tempo sofrerá um reducionismo e será considerada apenas
como evangelização. Como assevera Martin Norberto Dreher:

A pregação protestante vai ser do tipo evangelístico,


correspondendo às Santas Missões da Igreja Católica Apostólica
Romana: transforma o convertido em tipo ideal para a nova
sociedade que se quer criar – individualista. Ele é sujeito de sua
própria existência. A religião é dele e não mais da familia. Básica é
a relação: Eu e Deus.111

Não serão diferentes as conclusões a que Magali do Nascimento Cunha


chegará em sua pesquisa sobre o movimento gospel no mundo evangélico
brasileiro, a ponto de afirmar que “o conteúdo da pregação não diferencia muito
daquele trazido ao Brasil pelos missionários no século XIX: apelo à conversão, à
salvação individual”.112

A dimensão conversionista, fortemente assinalada nesse período, indicará a


expansão geográfica do metodismo brasileiro. Após sucessivas tentativas
fracassadas da Igreja Metodista Episcopal do Sul para a implantação do
109
MENDONÇA, Antonio Gouvêa; VELASQUES FILHO, Prócoro. Introdução ao protestantismo no Brasil. São
Paulo: Loyola, 1999, p. 211.
110
CHAVES, Odilon Massolar. Avivamento e o compromisso social metodista, na Inglaterra, no século XVIII:
uma busca de subsídios para a identidade do metodismo brasileiro no 3° milênio. Tese (Doutorado em
Ciências da Religião) – Faculdade de Filosofia e Ciências da Religião, Universidade Metodista de São
Paulo, São Bernardo do Campo, 2002, p. xvi
111
DREHER, A Igreja latino-americana no contexto mundial, p. 232.
112
CUNHA, Magali do Nascimento. A explosão gospel: um olhar das ciências humanas sobre o cenário
evangélico no Brasil. Rio de Janeiro: Mauad; Instituto Mysterium, 2007, p. 70.
111

metodismo no nordeste brasileiro, dentre outras decisões, nesse período de


motivação evangelizante, o 5° Concílio Geral, realizado em Piracicaba, SP, de 14
a 26 de fevereiro de 1946, decide enviar “Benedito Natal Quintanilha para
Salvador, BA, marcando a expansão do metodismo no Nordeste”.113 Dando
seqüência à expansão missionária no nordeste, em 1959 “Dorival R. Beulke dá
início à obra metodista em Recife”.114

A combinação da pregação conversionista com a assimilação da


Missiologia Gerencial levou o metodismo brasileiro, em seu 6º Concílio Geral, em
1950, a preocupar-se com ênfases no crescimento numérico da Igreja, o que
resultou no Programa “Avante por Cristo” como plano missionário da Igreja.
Novamente o reducionismo da missão como sinônimo de evangelização levou ao
estabelecimento de alvos numéricos com o supracitado programa como estratégia
missionária para a Igreja, a saber:

1. Que se adote para o programa o nome de ‘Avante por Cristo’ e,


como subtítulo a expressão ‘O desafio de Jesus e a nossa
resposta’; 2. Que se organize o programa sob quatro aspectos: 1°
‘Nossa Fé’; 2° ‘Nossa Igreja’; 3° ‘Nosso Ministério’; 4° ‘Nossa
Missão’ [...] Que, sob o aspecto ‘Nossa Missão’, se tome estudo e
discernimento claro da situação geral do Brasil e da Missão que
nele tem a realizar a Igreja Cristã. [...] Em todos os aspectos do
programa se deve dar ênfase à evangelização, não só por meio de
séries de pregação, mas também pelo trabalho individual,
sugerindo-se o método de dois a dois. A evangelização inclui a
visitação repetida e continuada.115

Os resultados da decisão são analisados com ambigüidades. Schwab


(Secretário Geral de Missões), que está deixando o cargo, avalia o engajamento
da Igreja como positivo, e Duncan A. Reily (Secretário Geral de Missões), que está
assumindo o cargo, é menos otimista e relata “o fato que o metodismo ficou

113
SOUZA, José Carlos de. Linha do Tempo: Cronologia abreviada do metodismo brasileiro (1835-2001). In:
RAMOS, Luiz Carlos; SANTOS, Suely Xavier dos; LIMA, Luciano José (Ed.). Anuário Litúrgico 2004. São
Bernardo do Campo: Editeo, 2004, p. 16.
114
Ibidem, p. 16.
115
CONCILIO GERAL DA IGREJA METODISTA. A atitude da Igreja Metodista do Brasil perante o mundo e a
nação. Atas do 6° Concílio Geral da Igreja Metodista do Brasil, Porto Alegre, 12 a 16 de fevereiro de 1950.
São Paulo: Imprensa Metodista, 1950, p. 138-140.
112

muito aquém do seu alvo de matrícula nas EE. DD e no número de


membros”.116

No que diz respeito à educação as ambiguidades são relevantes. Se, por


um lado, há um crescimento no número de alunos nos Colégios Metodistas, por
outro, as Escolas Paroquiais, que significavam a versão educacional para
atender os empobrecidos, diminuem de forma significativa. Segundo
Boaventura e Malusá,

O fim da guerra (1939 – 1945) e a articulação liberal exigem a


redemocratização do País. O Brasil é simpático aos ideais
americanos; e os analfabetos (sendo maioria) continuam sem
direito ao voto. Dessa forma fica claro que a classe econômica
com direito a usufruir essa nova democratização acaba sendo
principalmente a burguesa. 117

Abaixo, a pesquisa de Boaventura e Malusá indica o desempenho


comparativo entre Escolas Paroquiais, Colégios e Membresia da Igreja
Metodista no início da década de 1930 e final da década de 1960. É
significativo o esvaziamento das Escolas Paroquiais: no início da década de
1930 elas têm 1.373 alunos e mantêm uma estabilidade no decorrer da década,
tendo, em 1939, o seu maior número de alunos/as (1.854). O período da
década de 1940 e 1950 foi marcado pelo declínio no número de alunos/as que,
em 1956, reduziu-se de forma drástica (430). Em contrapartida, o desempenho
dos Colégios é o inverso das Escolas Paroquiais, pois no inicio da década de
1930 tinham 2.887 alunos/as e fecham a década de 1950 com 13.425.

Figura 2 — Quadro comparativo da década de 1930

116
REILY, Duncan A. Cruzada metodista de evangelização. Expositor Cristão, São Paulo, ano 70, n. 41, p. 1,
13 out. 1955. Os alvos para o período eram: para a EE.DD, 58.200 matriculados (foram alcançados 48.800)
e para novos membros, 45.000 (foram alcançado 40.500).
117
BOAVENTURA; MALUSÁ, Escolas paroquiais metodistas, p. 94.
113

Fonte: BOAVENTURA; MELUSA, Escolas paroquiais metodistas, p. 92.

Figura 3 — Quadro comparativo da década de 1950

Fonte: BOAVENTURA; MELUSA, Escolas paroquiais metodistas, p. 92.

As décadas de 1960 a 1980 são marcadas por profundas tensões no que


diz respeito aos paradigmas missionários do metodismo brasileiro, não obstante
tensões também observadas na história do povo brasileiro. A primeira grande
questão a se destacar é a mudança sociocultural, que até então era
essencialmente rural e passa a ser urbana. A população brasileira, nesse período,
segundo os dados do IBGE, transfere-se do espaço rural para o espaço urbano.
Tal movimentação desencadeia uma mudança radical nos diversos segmentos da
sociedade. Quanto à dimensão vocacional, José Lisboa Moreira de Oliveira
observa: “parece-me que ainda não se compreende suficientemente que há uma
diferença astronômica entre o mundo rural, onde tudo era sacralizado, e a cultura
114

urbana, marcada pela dessacralização”.118 A análise de Oliveira indica que essa


movimentação populacional exige novos paradigmas de missão, porém, os
desafios de mudança nas culturas institucionais nem sempre são assimilados com
tranquilidade, pois “o mundo urbano assiste à passagem da bucólica cidade
tricêntrica – igreja, praça e moradia – para a atemorizante ‘selva de pedra’ das
megalópoles”.119 Essas mudanças, não raro por falta de uma análise de
conjuntura mais apropriada, levaram o censo comum afirmar que “o homem da
roça é naturalmente religioso, ao passo que o homem da cidade seria fatalmente
ateu”.120

O período final (1960 – 1980), denominado, nesta pesquisa, de terceiro


momento missionário do metodismo brasileiro, também será marcado por
transformações significativas na caminhada missionária. Destacam-se os reflexos
da Comissão da Igreja e Sociedade da Confederação Evangélica do Brasil.
Movimento este não exclusivo no Brasil, mas verificado em toda a América Latina.
Como afirma Míguez Bonino:

No ambiente religioso, a consciência dessa crise repercute


profundamente na América Latina. A renovação teológica e
eclesial do Vaticano II é relida na ótica da “transformação da
sociedade” na Assembléia Episcopal de Medellín em 1968 e a
preocupação do Conselho Mundial de Igrejas (CMI) com “os
países em vias de desenvolvimento” converte-se em
“transformação estrutural” na Conferência de Genebra em 1966,
onde a delegação latino-americana desempenhou um papel
importante, e na América Latina no movimento “Igreja e Sociedade
na América Latina (ISAL) de 1960. A nova liderança que surge
assume essa perspectiva, apoiada numa visão barthiana, que
procura combinar uma teologia bíblica de redenção numa ótica
histórica com um chamado à militância ativa nos movimentos
sociais e políticos de libertação.121

118
OLIVEIRA, José Lisboa Moreira de. Pastoral vocacional e cultura urbana: desafios e perspectivas de
interação. São Paulo: Loyola, 2002, p. 20.
119
LIBÂNIO, João Batista. A vida religiosa na crise da modernidade brasileira. São Paulo: Loyola, 1996, p. 14.
120
GRINGS, Dadeus. A evangelização da cidade: o apostolado urbano. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004, p.
90.
121
MÍGUEZ BONINO, Rostos do protestantismo latino-americano, p. 25-26.
115

Essas transformações representam “um momento de construção de


grandes esperanças, crises e contradições”.122 Os sinais de transformações são
perceptíveis já no 8° Concílio Geral realizado em Juiz de Fora/MG, de 10 a 20 de
julho de 1960, quando o Credo Social da Igreja é totalmente reformulado. Tal
reformulação é um indicativo da conjuntura metodista, como avaliou Míguez
Bonino, acima. Porém, isso não significou um maior comprometimento do
metodismo brasileiro com a Responsabilidade Social. Pelo contrário, as tensões
tenderam a se aprofundar ainda mais. Na construção de grandes esperanças se
pode observar, no 9° Concílio Geral, de 10 a 20 de julho de 1965, no Rio de
Janeiro, a criação da Sexta Região Eclesiástica (Paraná e Santa Catarina).

Em 1964, com o contexto político no Brasil e América Latina em


efervescência, crises e contradições, como afirma Jorge Hamilton Sampaio123,
solaparão as expectativas de construção de um novo conceito missionário
comprometido com a realidade brasileira. Paulo Fernando C. Andrade observa:

Por outro lado, para que pudesse frear a onda de reivindicações


populares que se fazia forte, instauraram-se através de golpe
militar regimes de força em vários países da América Latina
(Brasil, 1964; Argentina, 1966; Peru, 1968). Se no caso brasileiro
tal regime foi inicialmente saudado com entusiasmo por grande do
episcopado e do clero brasileiro, logo, pelos rumos que toma,
transforma-se em motivo de preocupação e tensão.124

A Junta Geral de Ação Social da Igreja Metodista publica, em 1968, o livro


“Igreja: onde estás? Formas dinâmicas do testemunho da Igreja”, de Colin W.
Williams. A apresentação do livro revela bem os conflitos entre a opção de
engajamento social e a opção de cunho mais evangelístico que a Igreja no Brasil

122
SAMPAIO, Jorge Hamilton. Os difíceis anos 60 In: SOUZA, José Carlos de (Org.). Caminhos do
metodismo no Brasil: 75 anos de autonomia. São Bernardo do Campo: Editeo, 2005, p. 22.
123
Cf. SAMPAIO, Jorge Hamilton. Sobre sonhos e pesadelos da juventude metodista brasileira nos anos
sessenta. Tese (Doutorado em Ciências da Religião) – Faculdade de Filosofia e Ciências da Religião,
Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 1998.
124
ANDRADE, Paulo Fernando Carneiro. Fé e eficácia: o uso da sociologia na Teologia da Libertação. São
Paulo: Loyola, 1991, p. 52.
116

vive quanto à sua missão. São essas as palavras do Secretário de Ação Social da
Igreja Metodista:

Nesta obra revolucionária do pensamento teológico o autor


focaliza o tema mais importante sobre a Igreja nos tempos atuais.
Ele examina com extrema seriedade bíblica as relações entre as
formas do testemunho cristão relevantes na situação
contemporânea e as estruturas tradicionais de nossas igrejas.
Essa relação entre missão e estruturas é fundamental em toda a
discussão da obra.125

Porém, o relacionamento do protestantismo histórico de missão no Brasil


com o protestantismo mundial, e em específico o relacionamento do metodismo
brasileiro com o metodismo mundial, não dará conta das dificuldades locais. As
influências pentecostais e a herança de governos autoritários tanto na esfera
pública como na esfera eclesiástica, gerarão rupturas no seio da Igreja, por
exemplo, o fechamento da Faculdade de Teologia, em 1968. Esse episódio foi
analisado por Zuleica de Castro Mesquita126, bem como por Jorge Hamilton
Sampaio em sua tese de doutorado, “Sobre sonhos e pesadelos da juventude
metodista brasileira nos anos sessenta”. Ambos oferecem contribuições para a
análise histórica da juventude do período.

O testemunho de João Parahyba Daronch da Silva afirma:

A reunião do gabinete geral da Igreja Metodista, ocorrida em


novembro de 1968, teve um fato marcante para o Rev. Parahyba.
Nela estavam presentes os seis bispos da Igreja no Brasil (...).
Segundo o seu relato, após a decisão de fechamento da
Faculdade de Teologia, eles receberam a visita do casal Otília e
Derly de Oliveira Chaves. Eles traziam uma carta para os bispos
solicitando que “antes de qualquer providência no exame do
assunto importante da Faculdade de Teologia, sugerimos uma
visita pastoral ao reitor, Rev. Otto Gustavo Otto, aos professores
da faculdade em suas casas, a cada um em família e depois a
todos os alunos, para conhecê-los e para ouvi-los pastoralmente”.
Houve, na sequência, grande silêncio na sala. Após o silêncio, um

125
WILLIAMS, Colin W. Igreja, onde estás? Formas dinâmicas do testemunho da Igreja. São Paulo: Imprensa
Metodista, 1968, p. 3.
126
MESQUITA, Zuleica de Castro. Crise da Faculdade de Teologia em 1968 à luz do pensamento de Edgar
Morin. Piracicaba: Atlas, 1997.
117

dos secretários sugeriu a leitura bíblica de Efésios 4.16. Antes da


leitura, porém um dos bispos declarou: “A esta altura dos fatos não
caberia descermos até a faculdade em São Bernardo do Campo”.
Voltou a reinar o silêncio, e a leitura foi feita.127

Reafirma-se a constatação de que esse é um período carregado de


contradições, ambiguidades e tensões. Ao mesmo tempo em que se buscam
caminhos de libertação, na dimensão eclesiológica se observa ações autoritárias,
opressoras e retrocessos. Mas é também nesse período que a tríade —
Responsabilidade Social, Pregação e Educação — voltará ao centro das
discussões do metodismo brasileiro como modo de fazer missão. Esta pesquisa
observa que é nesse período que o conflito conceitual de missão e evangelização
será levantado. Paulo Ayres Mattos publicará o artigo “Evangelização para a
realidade brasileira”128, trazendo uma compreensão contextualizada do desafio da
evangelização como uma das ações da missão da Igreja. Isac Aço acompanha
esse pensamento e localizará a evangelização como ação libertadora, trazendo
como referencial o comissionamento de Jesus em Lucas 4, 16-19: “evangelizar os
pobres”. Isso significa que as reflexões do Conselho Mundial de Igreja (CMI), que
está ressignificando o conceito de “missão e evangelização” para o mundo cristão,
com certo atraso começam a fazer parte da reflexão teológica do metodismo
brasileiro. Esses reflexos representam o envolvimento de metodistas brasileiros
com o CMI e também daqueles que abraçam os encaminhamentos de uma
jornada ecumênica da Igreja na busca pela Unidade dos Cristãos e pela Paz
Mundial.

Não sem as já mencionadas ambiguidades e contradições, esse significará


o período mais crítico no que diz respeito à ação missionária metodista. A
ressignificação dos conceitos de “missão e evangelização” enfrentará fortes
resistências, em especial nos meios conservadores da Igreja, por exemplo, dos

127
SILVA, Elena Alves. João Parahyba Daronch da Silva. In: SINNER, Rudolf; WOLF, Elias; BOCK, Carlos
Gilberto (Org.). Vidas ecumênicas: testemunhas do ecumenismo no Brasil. São Leopoldo: Sinodal; Porto
Alegre: Padre Réus, 2006, p. 124.
128
MATTOS, Paulo Ayres. Evangelização para a realidade brasileira. Expositor Cristão, São Paulo, ano 80, n.
24, p. 5, 15 dez. 1965.
118

grupos que ainda defendiam o crescimento numérico a despeito de qualquer


compromisso teológico. Como já observado, o fechamento da Faculdade de
Teologia que, de acordo com a leitura de Sampaio, não se trata de um fato
isolado, provocará uma ruptura na Igreja e as possibilidades de negociações para
uma reconciliação não obterão sucessos.

A Assembléia Geral do CMI de 1961, realizada em Nova Delhi, fará a


“integração do Conselho Internacional de Missões do CMI, que passou a contar
com uma comissão de “Missão e Evangelização”. E as Igrejas do Terceiro Mundo
começaram a mostrar uma presença forte e atuante”.129 Isac Aço, dentre outros,
que também teve sua biografia contemplada no livro “Vidas ecumênicas”, será um
dos precursores das novas concepções teológicas sobre “Missão e
Evangelização”. Em artigo publicado no EC de outubro de 1970 ele declara:

Na década de 70 não é importante apenas que se proclame a


salvação aos desprotegidos e explorados, mas que se descubra o
que significa pregar a salvação dos explorados, mesmo que isto
signifique pregar-lhes a perdição.130

Portanto, não é muito difícil associar o pensamento de Aço com as decisões


do CMI, a busca pela unidade e o comprometimento com a transformação social,
uma vez que as igrejas de países empobrecidos ganhavam relevância no cenário
cristão mundial. Ainda, é possível observar que o pensamento de Aço está
alinhado com o tema da Conferência de Nova Délhi, a saber:

“Jesus Cristo, Luz do mundo”, desenvolvido em três seções, onde


foi explanado que o testemunho comum (martyria), a ser dado
pelos cristãos, chama-os ao serviço mútuo (diakonia) para com o
mundo, mas que ambas as coisas só têm autoridade e crédito
quando são realizadas na unidade (koinonia).131

129
HORTAL, Jesús. E haverá um só rebanho: história, doutrina e prática católica do ecumenismo. São Paulo:
Loyola, 1996, p. 194.
130
AÇO, Isac. A evangelização na década de 70. Expositor Cristão, São Paulo, ano 85, n. 19, p. 4, 15 out.
1970.
131
HORTAL, E haverá um só rebanho, p. 194.
119

Esse período significará o mais crítico no que diz respeito à ação


missionária metodista. A nova significação dos conceitos de “missão e
evangelização” continuará ganhando fortes resistências além do apoio ao regime
militar como princípio de “obediência às autoridades”. Por isso, “utilizando–se de
linguagem militar, o editor do Expositor Cristão exaltava a obediência e a
submissão como valores imprescindíveis da vida cristã”.132

Anivaldo Padilha tece críticas severas à participação da juventude


evangélica nos anos de 1950 e também narra o momento que podemos chamar
de conversão dessa juventude. Ao fazer um depoimento na Coordenadoria de
Estudos e Serviços Ecumênicos (CESE), em julho de 2001, afirma:

Nós éramos totalmente cerrados na busca de uma santidade que


nos separava do mundo e de seus problemas. Nosso conceito de
santidade era o de separação do mundo e não o conceito bíblico
de que ser santo é ser separado para o trabalho de Deus. Nossa
vida era inteiramente voltada para o interior da igreja. Nossa
espiritualidade significava uma fuga do mundo e não uma busca
da verdade evangélica. Nós tínhamos um comportamento bastante
- ou totalmente – moralista: ser jovem evangélico era não fumar,
não beber, não dançar, não “colar” na escola, enfim, a gente
acreditava que era, realmente, totalmente diferente dos outros, que
a gente estava fugindo do mundo. Isso significava também não se
misturar com os jovens do mundo. Isso era uma característica
nossa. Na escola, no trabalho, a tendência era a gente se separar,
mostrar que éramos diferentes. Nós tínhamos que dar o
testemunho de que nós éramos diferentes e melhores. Isso nos
levava, por exemplo, a não participar de nada.133

Prosseguindo seu depoimento, Padilha afirma que a mudança de postura


da juventude evangélica inicia-se nos idos dos anos de 1960. Sob a influência de
alguns organismos — como a União Latino-Americana da Juventude Ecumênica
(ULAJE), União Cristã de Estudantes do Brasil (UCEB) e a Confederação
Evangélica do Brasil (CEB), a juventude evangélica passa por mudanças

132
SAMPAIO, Sobre sonhos e pesadelos da juventude metodista brasileira nos anos sessenta, p. 115.
133
PADILHA, Anivaldo. Depoimento de Anivaldo Padilha. In: LOPES, Nicanor. Responsabilidade social e
Terceiro Setor: uma análise crítica da Associação Beneficente Campineira à luz da teologia prática.
Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) – Faculdade de Filosofia e Ciências da Religião,
Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2003, p. 27.
120

profundas na sua atuação e comprometimento com a realidade em que vive o


povo brasileiro. Foi fundamental para a mudança da cultura evangélica no Brasil o
papel desenvolvido pelos organismos acima citados. Padilha diz:

Essas organizações tiveram um papel fundamental, porque


começaram a organizar encontros e seminários para a gente
discutir, refletir sobre a situação brasileira e desenvolver reflexão
teológica. Começamos a ler a Bíblia de outra maneira, não da
forma fundamentalista que a gente lia antes, e começamos a
organizar acampamentos de trabalho em várias regiões do Brasil.
Reuníamos os jovens, estudantes ou não, em épocas de férias, e
íamos para regiões carentes, para prestar serviço à comunidade.
Esse serviço ia desde a construção de casas até, por exemplo, a
elaboração de programas de alfabetização de adultos.134

Os desdobramentos desta complexa etapa do metodismo brasileiro serão


assim resumidos na compreensão de Sampaio:

Eram duas bases de fé diferenciadas. Quem perseguia, fazia-o em


nome da sua concepção teológica. Embora a influência do governo
militar tenha sido decisiva no conflito, a base para a truculência
contra a juventude estava nas divergências sobre a compreensão
da fé cristã, do lugar onde acreditavam que Deus estava. A
pregação do governo militar tinha pontos comuns com a pregação
da maioria dos líderes metodistas, especialmente no discurso
contra o comunismo. Para estes, apoiar o regime era um ato de fé
no Reino de Deus. A perseguição aos jovens tinha como objetivo
limpar a Igreja dos “falsos crentes”, ou seja, daqueles que não
professavam a mesma fé e acreditavam que Deus estava em
outros lugares.135

Com todas essas tensões o final desse período não poderia ser outro: frágil
desempenho missionário, desconfiança nos relacionamentos internos da Igreja,
disputas exacerbadas pelos espaços de poder para garantir opiniões antagônicas
e muita fragilidade na concepção teológica de missão. A tríade —
Responsabilidade Social, Pregação e Educação — viveu nessa ocasião uma
dicotomia jamais observada na história do metodismo brasileiro. No caso da
educação, Ely Eser Barreto César assegura:

134
LOPES, Responsabilidade social e Terceiro Setor, p. 28.
135
SAMPAIO, Sobre sonhos e pesadelos da juventude metodista brasileira nos anos sessenta, p. 244.
121

É nesse contexto que se colocam buscas em torno do conceito da


“educação confessional” e a retomada dos fundamentos
educacionais do movimento wesleyano. A transformação da
sociedade (“reforma da nação”) continua posta, sendo os
parâmetros para esse processo a noção do Reino de Deus, como
realidade que expressa a vontade de Deus para a Terra e a
sociedade humana.136

As mudanças conceituais de “missão e evangelização” viriam somente em


1982, com a aprovação do Plano para Vida e Missão. As influências, ou as fontes,
do novo conceito teológico para a ação missionária estão nos movimentos, em
especial de Igreja e Sociedade da América Latina e do Concílio Mundial de
Igrejas. O metodista Mortimer Árias escreve um dos textos mais significativos para
alimentar essa reflexão, “Salvação hoje”, no qual avalia:

A busca contemporânea, entretanto, está marcada por novas


perspectivas e preocupações. O homem tomou consciência de sua
dimensão histórica, saiu de sua província geográfica para o
universo espacial. Descobriu seus direitos de homem e reclama
sua plena vigência. Preocupa-se não somente com seu destino
individual, mas também com o destino da própria humanidade.
Descobriu suas potencialidades criadoras e inventou engenhosos
e complicados instrumentos para dominar o mundo e colocá-lo a
seu serviço. Por outro lado, começa também a tomar consciência
de suas limitações, de seus imponderáveis, dos riscos da História.
Deve fazer frente a sistemas brutalmente repressivos ou a
preconceitos profundamente arraigados, que regem seu lugar a
emergentes minorias e postergadas maiorias. Precisa adaptar-se a
normas e valores da “grande sociedade” que escapam ao controle
do indivíduo e permeiam toda sua existência, ameaçando a própria
privaticidade do pensamento. A busca de salvação assume, então,
novos e desorientadores acentos e reveste-se de cores novas de
esperança.137

Ainda, em 1980, outro metodista, Júlio de Sant’Ana, autor do livro “A Igreja


e o desafio dos pobres”, enfatiza que a radicalidade na obra missionária passa
pelo compromisso com os pobres:

136
CÉSAR, Ely Eser Barreto. O projeto de escola metodista confessional sob a luz da espiritualidade
wesleyana. Revista de Educação do COGEIME, São Paulo, ano 12, n. 22, p. 66, jun. 2003.
137
ARIAS, Mortimer. Salvação hoje. Petrópolis: Vozes, 1974, p. 12.
122

Portanto, dentro de nossa condição atual, a Igreja não se identifica


com os pobres. A Igreja reconhece os pobres como uma parte
muito importante do mundo, mas não reconhece a si mesma entre
os pobres, da mesma forma que os pobres não reconhecem a
presença de Cristo na Igreja. E a Igreja que não é Igreja dos
pobres coloca sérias dúvidas sobre seu caráter eclesiástico. Isto
constitui um critério de interpretação eclesiástica.138

Essas literaturas, os encontros teológicos e as consultas sobre Vida e


Missão da Igreja darão novos rumos à tríade — Responsabilidade Social,
Pregação e Educação — no projeto missionário metodista brasileiro.

5 A tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação


— a partir do “Vida e Missão”: o quarto momento missionário
do metodismo no Brasil (1982-2010)
“O final dos anos de 1970 e o início dos anos 80 representaram
oportunidades singulares para a renovação teológica e pastoral no Brasil”. 139 Essa
constatação foi reconhecida vinte anos após a aprovação do maior documento
missionário metodista de toda a sua história em terras brasileiras.

Posteriormente, Geoval Jacinto da Silva em sua pesquisa sobre Educação


Teológica e Pietismo140 mostra como o movimento pietista influenciou o processo
da educação teológica oferecida pelas Faculdades de Teologia na formação
pastoral e no modelo de Igreja que foi implantada no Brasil pelas igrejas de
missão. “Nunca antes na história deste país”141 o metodismo tinha estabelecido

138
SANT’ANA, Júlio de. A Igreja e o desafio dos pobres: tempo e presença. Petrópolis: Vozes, 1980, p. 30.
139
RIBEIRO, Claudio de Oliveira; LOPES, Nicanor (Org.). Vinte anos depois: a vida e a missão da Igreja em
foco. São Bernardo do Campo: Editeo, 2003, p. 12.
140
Cf. SILVA, Geoval Jacinto da. Educação Teológica e Pietismo: a influência na formação pastoral no Brasil,
1930-1980. São Bernardo do Campo: Universidade Metodista de São Paulo, 2010.
141
Essa frase tornou-se popular no Brasil no período da presidência de Luiz Inácio Lula da Silva. O escritor
Marcelo Tas publicou livro com este título em 2009, pela editora Panda Books.
123

bases teóricas com tanta clareza de seu projeto missionário. Stanley da Silva
Moraes declara que:

O grande esforço de evangelização não conseguiu levar a Igreja a


crescer. A unidade alcançada nos documentos e colegiados
maiores não conseguiu mover a base da Igreja. Tornou-se
evidente a existência de problemas ainda não superados. Isto
levou o Colégio Episcopal e o Conselho Geral a chamarem uma
grande consulta nacional sobre Vida e Missão da Igreja. É essa
consulta que gerará o documento “Plano para a Vida e Missão da
Igreja”.142

Destaca-se que essa consulta está no contexto das celebrações dos 50


anos de autonomia da Igreja Metodista e, externamente, o cristianismo latino-
americano começa a sentir os primeiros impactos do novo paradigma de missão e
evangelização estabelecido pelo Conselho Mundial de Igrejas. Deve-se ressaltar a
criação do Conselho Latino Americano de Igrejas (CLAI), em 1982, como um
importante evento do movimento ecumênico na América Latina. E, na perspectiva
da Igreja Católica Romana, as decisões de Puebla143 fermentam os vários
segmentos da Igreja, reafirmando os passos da Teologia da Libertação. O alvo
missionário para os cristãos latino-americanos, nessa época, tem um endereço
preferencial definido não só em documentos ecumênicos, mas também em
documentos católico-romanos e evangélicos. O público alvo da missão,
preferencialmente, é o pobre. Como afirma Almeida:

Pregar o evangelho não é pregar uma evasão deste mundo. Pelo


contrário, a palavra do Senhor leva a mais, leva a radicalizar nosso
compromisso na história. E isso, concretamente, significa
solidarizar-se com os oprimidos do continente, participar dos seus
esforços de emancipação; conscientes de que a história da
salvação é uma libertação em processo. É no encontro com os
homens, com os mais pobres e explorados dentre eles, que
encontraremos o Senhor144.

142
MORAES, Stanley da Silva. Uma Igreja que tem coragem de definir sua identidade. Revista de Educação
do COGEIME, São Paulo, ano 12, n. 23, p. 48, dez. 2003.
143
A Terceira Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano foi realizada em Puebla de Los Angeles
(México) no período de 27 de janeiro a 13 de fevereiro de 1979.
144
ALMEIDA, João Carlos. Teologia da solidariedade: uma abordagem da obra de Gustavo Gutiérrez. São
Paulo: Loyola, 2005, p. 168
124

Até o movimento denominado por Longuini Neto de evangelical145, em 31


de outubro de 1979, na abertura do Segundo Congresso Latino-Americano de
Evangelização (CLADE II), assume posturas mais contextualizadas com a
realidade da América Latina:

O Clade II assumiu como ponto de partida, um período


preparatório de leituras e uma análise detalhada da realidade
latino-americana de cada região, realidade esta que foi analisada
basicamente nos aspectos político, socioeconômico, cultural,
religioso, moral e espiritual. Cada região teve liberdade de
apresentar e organizar seu relatório conforme a necessidade,
assim os enfoques foram multidisciplinares.146

Todos esses movimentos influenciarão a tríade — Responsabilidade Social,


Pregação e Educação — nesse quarto momento missionário do metodismo
brasileiro. Com o Plano Vida e Missão (PVM) “nasce uma Igreja que faz uma
autocrítica de sua vida e missão”147 que será de extrema relevância na busca pela
unidade e identidade confessional. Luiz Carlos Ramos denomina esse tempo de “a
pregação no tempo das revoluções: uma homilética das libertações, dos carismas
e das mídias”.148

O Plano para Vida e Missão foi, pedagogicamente, uma construção


histórica e consciente de sua importância e, por isso, o PVM reafirmará as
demandas da tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação — objeto
desta pesquisa. Tal observação pode ser aferida no formato do documento: a)
como documento orientador (uma constituição missionária), tem o “Plano para
Vida e Missão da Igreja”; b) como documento sistematizador, tem o “Plano para as
Áreas de Vida e Trabalho”; c) como documento norteador da missão educativa,

145
Cf. LONGUINI NETO, Luiz. O novo rosto da missão. Viçosa/MG: Ultimato, 2002, p.11: “O movimento
evangelical é uma iniciativa de cristãos e não de igrejas; portanto, trata-se de um movimento de pessoas
[...], tendo como paradigmas: evangelização, fundamentalismo e conscientização”.
146
LONGUINI NETO, O novo rosto da missão, p.185.
147
MORAES, Uma Igreja que tem coragem de definir sua identidade, p. 51.
148
RAMOS, Luiz Carlos. A pregação na idade mídia: os desafios da sociedade do espetáculo para a prática
homilética contemporânea. Tese (Doutorado em Ciências da Religião) – Faculdade de Filosofia e Ciências
da Religião, Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2005, p. 70.
125

tem as “Diretrizes para a Educação na Igreja Metodista”; d) na orientação para a


expansão missionária, tem o “Plano Diretor Missionário da Igreja Metodista”.

Portanto, o PVM não é um documento sem uma profunda reflexão teológica


e análise conjuntural do metodismo brasileiro. Pelo contrário, sua concepção
teológica é resultado de um retorno às origens do metodismo, na busca da
identidade confessional da Igreja. Em sua parte introdutória, o documento
reconhece as dificuldades dos últimos anos: “não será dentro do curto espaço de
um quadriênio, que corrigiremos os antigos vícios que nos impedem caminhar”. 149
Procurando não significar que o PVM era uma “invenção da roda”, mas
procurando dar conexão com as mudanças que o período anterior já
experimentara, os bispos afirmarão que o PVM permitirá que tudo na Igreja se
oriente para a Missão, assim como decidido no Plano Quadrienal de 1964. Neste
se estabeleceu a ênfase no Plano “Ministério e Missão”: Que tudo na Igreja passe
a existir em função da Missão. Oliveira na sua análise diz:

No Plano Para a Vida e a Missão da Igreja encontram-se, em


síntese, os principais aspectos da herança wesleyana. Embora
redigidas de forma sintética e conciliar, as orientações desse
documento, integradas como artigo dos Cânones da Igreja,
reforçam os conteúdos e a metodologia teológica latino-americana,
com as exigências das mediações socioanalíticas, hermenêutica e
prática para a ação teológica e pastoral.150

Vários textos foram produzidos para identificar este momento do metodismo


brasileiro e há um consenso em afirmar que o PVM representa “um documento
desafiador e revolucionário”.151 A abrangência do PVM permite que o
realinhamento da Igreja a respeito de seu agir missionário seja um “permanente
compromisso com o bem estar da pessoa total, não só espiritual, mas também em

149
COLÉGIO EPISCOPAL DA IGREJA METODISTA. Vida e missão: decisões do XIII Concílio Geral da Igreja
Metodista. Piracicaba: Unimep, 1982, p. 7.
150
OLIVEIRA, Claudio de Oliveira. Por uma eclesiologia metodista brasileira. Revista Caminhando, São
Bernardo do Campo, v. 10, n. 2, p. 141, jul./dez. 2005.
151
OLIVEIRA, Clory Trindade de. A trajetória da educação metodista PVM e DEIM: 20 anos de história.
Revista de Educação do COGEIME, São Paulo, ano 12, n. 23, p. 117, dez. 2003.
126

seus aspectos sociais”.152 É imprescindível pontuar que o PVM compreenderá a


missão no conceito da missio Dei153, isto é, a missão é de Deus. O item do PVM
intitulado “Entendendo a vontade de Deus” trabalha este tema com toda
propriedade e se destaca com as expressões “A missão de Deus; o propósito de
Deus; A missão é de Deus”.154

Cunha, ao analisar os 20 anos do PVM, afirma que é preciso começar com


uma visão macro do contexto no qual nasce o documento e apresenta o quadro a
seguir:

Tabela 1—O Brasil e a Igreja no início da década de 1980

Aspectos da realidade sociopolítica brasileira Aspectos da realidade eclesial metodista (início da


(início da década de 1980) década de 1980)
O Brasil experimenta um processo de A Igreja busca reerguer-se da frustração da
redemocratização com a fase final do divisão de 1967 e da crise ideológica de 1968
governo militar ditatorial
Busca de revitalização do metodismo e de
Lideranças políticas exiladas retornam ao uma proposta metodista de ação no Brasil, no
país espírito dos Planos Quadrienais de 1974 e
1978, com propostas de crescimento numérico
Os movimentos sociais — sindicatos, e qualitativo
associações de bairro, conselhos
municipais — retomam espaços Preocupação forte com a identidade metodista

Retomam-se projetos de educação A Igreja quer superar a acomodação na


popular perspectiva evangelizante da parte dos
segmentos leigo e clérigo
Há movimentos de valorização das
expressões de cultura popular Identificação da necessidade de salto de
qualidade no ministério pastoral:
Eleições gerais em 1982: parlamento e desburocratização do seu papel, promoção de
governo estaduais participação leiga, maior preparo bíblico-
teológico
No campo das idéias, há formulação de
propostas de transformação social e Busca de criatividade nas formas de atuação
questionamento de formas de dominação pastoral
social, com destaque para a participação
popular Envolvimento de lideranças com movimentos
de educação popular, com os movimentos de
No campo político, reforça-se o debate novas formas de leitura da Bíblia e de reflexão
entre grupos usualmente considerados de teológica com base na Teologia da Libertação
“direita” (PDS, PTB e outros) e os de e com o movimento ecumênico internacional e
“esquerda” (PT, PDT e outros) nacional

Cresce a presença e a participação metodista

152
COLÉGIO EPISCOPAL DA IGREJA METODISTA, Vida e missão, p. 9.
153
Cf. BOSCH, Missão transformadora, p. 468: “Desde Willingen, a compreensão da missão como missio Dei
foi adotada praticamente por todas as ramificações cristãs – primeiro pelo protestantismo ligado ao CMI,
mas subseqüentemente, também por outros agrupamentos eclesiásticos, como os ortodoxos orientais”.
154
COLÉGIO EPISCOPAL DA IGREJA METODISTA, op.cit., p. 14.
127

em movimentos sociais e o interesse por


projetos com grupos empobrecidos

Fonte: RIBEIRO; LOPES, 20 anos depois, p. 23

O quadro acima revela o dinamismo no campo das mudanças, tanto na


sociedade brasileira como na vida eclesiástica. E, nos aspectos da realidade
eclesial metodista, fica claro que o tema da Responsabilidade Social é o que
alimenta a dinâmica missionária da Igreja. Muitas avaliações sobre esse período
foram publicadas e serão apresentadas no decorrer desta pesquisa.

No campo da Educação a avaliação do PVM também é positiva. César


compreende que, nas Diretrizes para a Educação na Igreja Metodista (DEIM), “se
conclui, na mesma direção, que ’o Espírito nos revela que o Reino de Deus é
maior que qualquer instituição ou projeto humano’, o que inclui a Igreja, enquanto
organização social”.155 Tal compreensão reafirma a dimensão da educação como
parte integrante da missão.

O PVM será fonte geradora de muitas novidades na vida ministerial do


metodismo, dentre as quais destacamos o Programa Agentes da Missão, na
Quinta Região Eclesiástica. Os editores do Manual de Estudos para o Plano para
a Vida e Missão (14 estudos)156 afirmam:

Por isso o “Plano para Vida e Missão da Igreja” é fundamental para


cada metodista, pois ele é o texto conciliar que tem autoridade
para “fundamentar a ação missionária numa igreja de Dons e
Ministérios”. [...] Na 5ª. RE, nos últimos 4 anos (1987-1991)
tivemos o acréscimo de mais um novo membro por dia durante
estes últimos 1.460 dias. Se comparamos este dado com o que
ocorreu nos 15 anos anteriores, quando tivemos apenas o
acréscimo de um novo membro a cada 28 dias, então é hora de
começar a avaliar nossa prática missionária para aprofundá-la.157

155
CÉSAR, Ely Eser Barreto. A visão educacional originada do PVM e das DEIM. Revista de Educação do
COGEIME, São Paulo, ano 12, n. 23, p. 11, dez. 2003.
156
CÉSAR, Ely Eser Barreto; LOPES, Nicanor. Manual de estudos para o Plano para a Vida e Missão (14
estudos). Piracicaba: Agentes da Missão, 1992, p. 6
157
Ibidem, p. 6
128

Esse relato avaliativo expõe o nível da mudança que está ocorrendo no


interior da Igreja, impulsionada pelo PVM. O indicativo relevante é a mudança de
mentalidade missionária: a Igreja está deixando de realizar ações consideradas de
manutenção para, missionariamente, agir fora do templo. Nesse período a
expressão “fora das quatro paredes” será retomada com muita frequência. No
próximo capítulo analisaremos com mais profundidade essa expressão. Fora das
quatro paredes será regularmente utilizada nos documentos oficiais da Igreja, com
tom imperativo para a ação missionária, como se observa no manual de estudos
da pastoral “Servos e servas, sábios e sábias, santos e santas, solidários e
solidárias”:158

Necessidade de visão missionária completa. Não possuímos, de


forma clara e definida, um compromisso missionário, um projeto
missionário. Nos últimos anos, enfatizamos a importância do
projeto missionário da Igreja Metodista em terras brasileiras.
Felizmente temos ampliado nossas preocupações. No entanto,
ainda não temos uma estratégia que viabilize um projeto corajoso,
abrangente, que envolva todas as igrejas locais e instituições. A
Carta nos adverte: “nos falta uma mística que infunda na vida de
todos os metodistas brasileiros uma autêntica e concreta paixão
missionária que, sob o poder do Espírito Santo, nos leve a viver de
maneira prática e poderosa o lema: “o mundo é a minha paróquia”.
A crise no mundo de nossos dias requer uma Igreja com
autoridade para testemunhar poderosamente fora das quatro
paredes do templo (...). Recuperar o compromisso missionário é
o imperativo maior do povo metodista no Brasil159 (grifo nosso).

A dimensão da ação fora dos limites do templo ou fora das quatro paredes
do templo dá origem ao Programa Agentes da Missão que, assim como na
construção do PVM, criou um Plano Diretor Missionário e, inspirado neste

158
Cf. COLÉGIO EPISCOPAL DA IGREJA METODISTA. Carta pastoral: servos/as, sábios/as, santos/as,
solidários/as. São Paulo: Imprensa Metodista, 1989. A publicação desta Carta Pastoral se deu em 1989,
porém o Colégio Episcopal se reuniu nos dias 20 e 21 de dezembro de 2005, com o propósito de dar
continuidade ao preparo do 18º Concílio Geral. Na reunião, recebeu o resultado da Avaliação Nacional e
aprofundou sua reflexão sobre o eixo definido para o Concílio, que é “eclesiologia cristã e metodista”. E o
bispo Adriel de Souza Maia produziu um Manual de Estudos com o título “Pistas para aprofundamento da
compreensão da Carta Pastoral do Colégio Episcopal: Servos/ Servas/ Santos/ Santas/ Sábios/ Sábias/
Solidários/ Solidárias”. Assim a Igreja pôde ampliar sua compreensão sobre o tema.
159
MAIA, Adriel de Souza. Pistas para aprofundamento da compreensão da Carta Pastoral do Colégio
Episcopal: Servos/ Servas/ Santos/ Santas/ Sábios/ Sábias/ Solidários/ Solidárias. São Paulo: Imprensa
Metodista, 2006, p. 5
129

documento, criou o Manual Missionário do Povo Metodista, que traz o seguinte


desafio para a Igreja:

O programa AGENTES DA MISSÃO acontece, sobretudo, quando


se organiza uma ação de amor fora do templo. E fora do templo,
quer dizer fora dos limites dos crentes... Os AGENTES DA
MISSÃO aprendem fazendo a MISSÃO fora do templo e
descobrindo o caminho enquanto se está a caminhar160 (grifo
nosso).

É importante salientar que Dons e Ministérios não é um novo programa da


Igreja, ele surge como movimento motivador para práticas do PVM. Para garantir o
aprofundamento da experiência de Dons e Ministérios e o comprometimento do
corpo pastoral, o Colégio Episcopal, em 1988, convocou um Encontro Nacional de
Pastores e Pastoras na cidade de Belo Horizonte/MG. A repercussão do encontro
está publicada. O Colégio Episcopal se expressa nas seguintes palavras:

É de uma clareza diamantina que uma Igreja Ministerial abre


novos espaços ministeriais que até então encontravam-se
emperrados para a missão. Ela dinamiza a ação interna e externa
do povo de Deus, evitando que sua missão seja sombreada pela
ociosidade e pelo quietismo. O ócio na congregação suscita rixas,
desavenças, discórdias e incrementa a desunidade, o
enfraquecimento na fé e compromete o sentido da salvação.
Tropas aquareladas na trincheira degeneram-se. Crentes apáticos
indiferentes na fronteira cristã tornam-se pessimistas. Nossas
igrejas e seus diversos seguimentos necessitam de um projeto
mais arrojado objetivando a missão.161

É certo que o objetivo de refletir, debater e avançar com o Programa Dons e


Ministérios foi alcançado, até mesmo porque o Encontro Ministerial contou com a
presença de aproximadamente 300 pastores e pastoras.

No decurso dessa caminhada missionária destaca-se o “Relatório do


Colégio Episcopal para o Concílio Geral de 2006”. A bispa e os bispos fazem a
seguinte avaliação sobre o PVM no período de 2002-2006:

160
MANUAL MISSIONÁRIO DO POVO METODISTA. Piracicaba: Editora Agentes da Missão, 1988 (Coleção
Dons e Ministérios), p. 7-23.
161
COLÉGIO EPISCOPAL. Mensagem do Colégio Episcopal da Igreja Metodista ao Encontro Nacional de
Pastores e Pastoras. EC, São Paulo, p. 6, out. 1998.
130

Plano Para a Vida e Missão da Igreja: não há dúvida que na


história do Metodismo Brasileiro o 13º Concílio Geral da Igreja
Metodista, realizado em julho de 1982, constituiu um marco
eclesiológico para a vida do povo metodista, especialmente,
construindo eixos balizadores da missão. Nesse sentido, tendo
como elementos referenciais os Planos Quadrienais, o Plano de
Vida e Missão da Igreja, abre os horizontes da Igreja,
especialmente, após uma profunda crise de identidade e
autoridade experimentada pela Igreja a partir da segunda metade
da década de 60. Esses horizontes podem ser verificados a partir
das seguintes afirmações: “devemos continuar o processo que
permitirá que tudo na Igreja Metodista se oriente para a Missão. A
Igreja deverá experimentar, de modo cada vez mais claro, que sua
principal tarefa é repartir, fora dos limites do templo, o que ela, de
graça, recebe do seu Senhor. Por isso, somos convidados ao
desafio tipicamente wesleyano da santificação. Certamente aqui
estamos diante da necessidade de revisar profundamente nossa
prática de piedade pessoal e a necessidade de rever nossos atos
de misericórdia, entendidos como ação concreta de amor a favor
dos outros. Esses são dois caminhos que traduzem a visão de
Wesley a santificação na Bíblia.” Isto posto, há grandes
implicações para a vida e totalidade dos membros da Igreja
(clérigos e leigos) na busca da revitalização do ministério
comprometido com os ditames do Evangelho do Reino de Deus.162

Essa leitura positiva da Vida e Missão da Igreja também é reafirmada


quanto ao Programa Dons e Ministérios, que surgiu em 1987, para alimentar as
práticas estabelecidas no PVM.

Dons e Ministérios: nessa linha eclesiológica o Concílio Geral da


Igreja Metodista, reunido na cidade de São Bernardo do Campo,
nas dependências do Instituto Metodista de Ensino Superior (IMS),
com a aprovação da dinâmica da Igreja em Dons e Ministérios,
sem dúvida é fruto da ação do Espírito Santo, tendo como pano de
fundo os Planos Quadrienais e a aprovação do Plano de Vida e
Missão da Igreja. É interessante destacar que o Plano Nacional:
Ênfases e Diretrizes, aprovado pelo 16º Concílio Geral, dá um tom
unificador ao projeto de Dons e Ministérios na Vida da Igreja
Metodista. O presente Plano sublinha a importância de melhor
configurar o modo de planejar em Dons e Ministérios,
considerando-se que, em 1987, o referido Concílio aprovou uma
Igreja configurada em Dons e Ministérios. Nessa perspectiva
ressaltou:

162
COLÉGIO EPISCOPAL, Atas e Documentos do 18° Concílio Geral. São Paulo: IM, 2006, p. 22.
131

“a) reafirmou o principio conciliar para todos os níveis, inclusive a


igreja local e a descentralização do poder; b) a igreja local deixou
de ser vista como uma unidade institucional e, sim, ‘Comunidade
Fé’; c) enfatizou o Sacerdócio Universal de todos os Crentes, a
necessidade de todos se envolverem na missão; d) reafirmou o
conceito de Igreja e Missão percebida nos últimos anos e presente
no Plano para a Vida e Missão da Igreja; e) reafirmou a unidade da
Igreja, o princípio metodista da conexidade.163

Esse período, dos anos de 1980 até a virada do século (2000), foi marcado
por reações positivas na nova dinâmica missionária da Igreja. A tríade —
Responsabilidade Social, Pregação e Educação — estava em perfeita sintonia. Os
relatórios oficiais revelavam esse ufanismo. Os testemunhos nos periódicos da
Igreja também reafirmam a dinâmica do PVM e Dons e Ministérios. Porém, assim
como as influências externas que motivaram as mudanças internas na Igreja nos
anos 1980, como visto no quadro elaborado por Cunha, as influências do final do
século XX não pouparão a Igreja, como demonstra o novo quadro:

Tabela 2 — Aspectos socioculturais e eclesiais das décadas de 1980 e 1990

Aspectos socioculturais Aspectos eclesiásticos

O Brasil experimenta o ajuste às políticas A Igreja Metodista recebe forte influência dos
neoliberais e a crise das esquerdas e dos movimentos pentecostais e de avivamento
movimentos sociais religioso e do movimento gospel em
ascensão
Visibilidade da globalização econômica e no O avanço da implantação de Dons e
campo das comunicações Ministérios
Maior crescimento numérico em relação às
A prática e a lógica da exclusão social décadas anteriores
Maior clericalização e menor participação
Reforço do individualismo e da competição leiga nos níveis decisórios da Igreja, em
como valores sociais especial no plano local
Desenvolvimento da Teologia da
Crise no “socialismo real” e nos movimentos Prosperidade e da Guerra Espiritual
sociais Busca de maior presença da Igreja na mídia
Crise no ministério pastoral com os diversos
Despolitização dos setores populares e da modelos de ingresso no pastorado e
juventude banalização da ordem presbiteral
Crise de liderança em todos os níveis da
Reforço da cultura de violência Igreja; maior politização do encargo
episcopal — bispos que representam
Desarticulação dos movimentos populares e tendências
fortalecimento das propostas neoliberais Fortalecimento da “política de ascensão” e
da competição entre os pastores
Desinteresse do povo pelos processos Ausência de um projeto missionário
políticos e eleitorais coerente com os documentos da Igreja e
fechamento para os temas sociais

163
COLÉGIO EPISCOPAL, Atas e Documentos do 18° Concílio Geral, p. 22.
132

Surgimento do Terceiro Setor — programas Busca de recriação da Escola Dominical por


sociais apoiados pela iniciativa privada para parte das lideranças nacionais e regionais,
amenizar os efeitos da exclusão social além de maior atenção ao trabalho com
crianças
Fortalecimento da cultura de consumo Decadência do trabalho com a juventude
O mercado e o movimento gospel criam novo
jeito de ser evangélico, com espaços de
lazer e shows. Os momentos de culto são
transformados em espetáculos, com
centralização ma música
Fechamento para o movimento ecumênico

Fonte: RIBEIRO; LOPES, 20 anos depois, p. 41.

Observa-se que o cenário sociocultural brasileiro apresenta os reflexos do


mundo globalizado e suas implicações serão inevitáveis na vida eclesiástica.
Cunha, em outra pesquisa, falará da “sacralização de gêneros musicais populares
brasileiros”164 como resultado da globalização da cultura gospel. Praticamente
todos os valores culturais que os missionários, no período de implantação do
metodismo, negaram com o argumento de que era cultura pagã, passam, neste
tempo de globalização, a ser sacralizados. Portanto, estilos musicais populares,
bem como instrumentos que até então não podiam fazer parte dos espaços
litúrgicos protestantes passam também pela sacralização e ocuparão espaços
estéticos de destaque nos púlpitos evangélicos.

Na avaliação de César, “retomar o PVM após vinte e cinco anos, requer


menos retomar sua lógica própria quanto tentar enxergar os destaques deixados
ao longo do tempo”.165 Em outras palavras, isso significa que o PVM necessita de
uma releitura a partir da realidade social que a Igreja vive no início do terceiro
milênio. O grande problema está no que foi detectado ao longo desta pesquisa, a
saber, o rompimento da unidade da tríade. O princípio wesleyano de equilíbrio
entre atos de piedade e obras de misericórdia é o que se pode considerar como
elemento catalisador da unidade missionária da Igreja.

164
CUNHA, A explosão gospel, p. 176.
165
CÉSAR, Ely Eser Barreto. Por que o Plano para a Vida e Missão falhou? Revista Caminhando, São
Bernardo do Campo, v. 12, n. 20, p. 59, jul./dez. 2007.
133

A cultura da globalização que seduziu os fiéis com “uma nova ‘ambiência’


Midiática, instaurada pelas novas tecnologias eletrônicas, tem modificado o campo
religioso e o levado a organizar novas estratégias e táticas”.166 Essas estratégias
são observadas desde os tempos em que os EUA desejavam combater os
caminhos que a Igreja latino-americana estava tomando. Como afirma David Stoll:

Sob o impacto de Jimmy Swaggart a consciência popular não era


clara. Mas ele atacou a Igreja Católica mais abertamente do que
os outros grandes evangelistas fizeram, e seu ponto de vista da
política das regiões era simplesmente, derivada essencialmente da
retórica sobre o império do mal. Como resultado, a direita religiosa
considerou Swaggart como o mais forte baluarte contra o
comunismo na América Latina. Em 1987, ele foi recebido pelo
presidente José Napoleón Duarte, em El Salvador e Augusto
Pinochet no Chile167 (tradução do autor).

Os pregadores eletrônicos que combatiam as experiências religiosas na


América Latina, que tinham um caráter mais popular e crítico da realidade, não
foram poucos168. Portanto, analisar o período de globalização com suas
dimensões tão complexas não é uma tarefa fácil. Por exemplo, o líder da Igreja
Universal do Reino de Deus, proprietário de um grande conglomerado de
comunicação, tais como a Rede Record de Televisão, Rede Nacional de rádios
FM, a Rede Aleluia e o Jornal a Folha Universal, dentre outras empresas do ramo
comunicacional, critica a ação dos seus concorrentes no Brasil. Como afirma
Ricardo Mariano:

Edir Macedo condena os ministérios eletrônicos norte-americanos


por deixarem os fiéis acomodados em casa, prática que contraria
frontalmente sua estratégia de inserção social lastreada no
crescimento denominacional. Considera execrável os “devotos do

166
BORELLI, Viviane (Org.) Mídia e religião: entre o mundo da fé e o do fiel. Rio de Janeiro: E-papers, 2010,
p. 112.
167
STOLL, David. Is Latin America Turning Protestant? The Politics of Evangelical Growth. Los Angeles:
University of California Press, 1990, p. 153. Texto original: “Jimmy Swaggart's impact on popular
consciousness was unclear. But he attacked the Catholic Church more openly than other major evangelists
did, and his view of the politics of the regions was simple one, derived mainly from rhetoric about the evil
empire. As result, the religious right regarded Swaggart as its strongest bulwark against communism in Latin
America. In 1987, he was received by President José Napoleon Duarte in El Salvador and General Augusto
Pinochet in Chile”.
168
Sobre esse assunto, veja RAMOS, A pregação na idade mídia, p. 80-92.
134

sofá”, indispostos de ir à igreja e sustentá-la. [...]. Eis as críticas de


Macedo ao televangelismo norte-americano: “Sou radicalmente
contra a igreja eletrônica. O que se faz nos Estados Unidos é um
erro muito grave, até contra o próprio Deus, contra a própria fé.
Eles fazem um show da fé em cima de seus próprios nomes – é o
programa Jimmy Bakker, Jimmy Swaggart, programa Hex
Humbard, não anunciam o programa de uma igreja. Eles controlam
as pessoas, levam as pessoas a ficar acomodadas dentro de suas
próprias casas.169

Mas o que sobressalta nesse período é que a “sociedade espetacular


dissemina seus produtos manufaturados principalmente através de mecanismos
culturais de lazer e consumo”170 e esta realidade também é constatada na ação
missionária da Igreja. Pois, “a homilética espetacular seria, então, aquela que a
aliena o fiel do produto da sua piedade, de sua vida de fé, tornando-o espectador
da experiência religiosa”.171 Portanto, a experiência religiosa que no PVM é
encarnada e comprometida com a realidade brasileira, e que tem como base o
comprometimento social para a transformação da realidade, como ação
missionária, passa a ser mediada por influência dessa cultura do espectador que
troca o engajamento social por uma “espiritualidade do louvor”.172 Essa
espiritualidade compromete a unidade missionária e, assim, desloca os princípios
da tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação — a ponto de seduzir
o metodismo brasileiro a promover ações missionárias que contrapõem o seu
modo de ser em Dons e Ministérios e contrariar as orientações do PVM. Como
avalia C. O. Ribeiro:

Como se sabe, a conjuntura da Igreja Metodista no Brasil, assim


como a das demais igrejas, sofreu e reforçou, no final da década
de 1980 e início dos anos de 90, os efeitos da mentalidade
individualista e consumista própria da sociedade em geral. Foram
anos difíceis para uma vivência autêntica do Evangelho e
desenvolvimento da missão, que se prolongam até o momento
atual. Neles são visíveis os mecanismos de privatização e de

169
MARIANO, Ricardo. Neopentecostais: sociologia do novo pentecostalismo no Brasil. 2. ed. São Paulo:
Loyola, 2005, p. 47.
170
Ibidem, p. 52.
171
Ibidem, p. 170.
172
Ibidem, p. 61.
135

comercialização da fé, a desvalorização da solidariedade cristã e


dos projetos de cunho social críticos, e por outro lado, uma ênfase
excessiva no intimismo devocional, na demasiada identificação da
bênção de Deus com bens materiais e no avivamento
individualista. Tais ênfases ‘têm matado’ o Vida e Missão.173

Individualismo, consumismo, espiritualismo, evangelismo e outros “ismos”


solaparão o projeto missionário construído pelo PVM. A alienação da realidade ou
o abandono da prática fora das quatro paredes deslocará, novamente, o projeto
missionário que procurou, com o PVM, retomar a sua concepção wesleyana nas
dimensões da Responsabilidade Social, Pregação e Educação.

A guisa de considerações finais deste capítulo sobre as influências da


tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação — no projeto missionário
metodista brasileiro, constata-se que certamente muitas práticas da Igreja não
correspondem ao proposto na sua trajetória histórica e muito menos ao
documento norteador, o PVM. O desuso das linhas essenciais, ou mesmo o
desvio das ênfases norteadoras do projeto missionário metodista, não significa o
sepultamento de seu compromisso com a tríade. Pelo contrário, o valor profético e
teológico do PVM, enquanto marco regulatório da missão, ainda está vivo e mais
uma vez reafirmado na Assembléia Geral da Igreja Metodista, em julho de 2011,
na cidade de Brasília/DF.

No próximo capítulo se tratará mais especificamente da análise dos dados


do metodismo brasileiro. Será uma tentativa de mapeamento a partir de
informações coletadas nos relatórios avaliativos dos Concílios Gerais, em especial
após 1982, e das informações oferecidas pelas instituições de Ensino e Ação
Social da Igreja Metodista.

173
RIBEIRO, Claudio de Oliveira. O Plano para a Vida e a Missão Morreu? Reflexões sobre a ação
evangelizadora e os desafios missionários da Igreja Metodista em terras brasileiras. Revista Caminhando,
São Bernardo do Campo, v. 12, n. 20, p. 81-82, 2007.
CAPÍTULO 3
MAPEAMENTO DAS AÇÕES MISSIONÁRIAS DA
IGREJA METODISTA

1 Introdução do capítulo: mapeamento das ações missionárias


no campo da tríade — Responsabilidade Social, Pregação e
Educação — no metodismo brasileiro
Mapear as ações missionárias da Igreja Metodista não é uma tarefa fácil. Os
dados estatísticos não são divulgados conforme se atualizam, bem como as
reportagens publicadas nos periódicos eclesiásticos são, geralmente, de caráter
apologético. Portanto, as fontes para subsidiar este capítulo serão os relatórios do
Colégio Episcopal e Conselho Geral (posteriormente Coordenação) aos Concílios
Gerais. E as outras fontes, que devem ser observadas no contexto da narrativa
apologética, permitirão um olhar mais sistematizado dos dados estatísticos e das
narrativas publicadas nos periódicos oficiais da Igreja.

Da implantação até aproximadamente 1970, a Igreja Metodista tinha somente


um informativo em nível nacional, o Expositor Cristão. Tem-se conhecimento de
que, em maio de 1973, a Primeira Região Eclesiástica (Rio de Janeiro) passou a
publicar um periódico regional e, daí para frente, outras regiões passaram a
praticar o mesmo. Isso posto, o mapeamento a partir das narrativas publicadas nos
137

periódicos regionais não alimentarão a pesquisa, como já dito, elas devem ser
analisados dentro da dimensão própria da apologia metodista regionalizada.

É importante destacar que uma organização religiosa precisa conhecer o


perfil dos seus membros para melhor cumprir sua tarefa missionária. A Igreja
Metodista é parte do protestantismo histórico, denominado na missiologia de
protestantismo de missão. O sociólogo Antonio Flávio Pierucci fala em
denominações clássicas do protestantismo,1 e afirma:

Pioneiras mesmo no trabalho de propaganda evangélica no


Brasil foram as sociedades bíblicas de origem inglesa e norte-
americana. E as missões metodistas. Os metodistas norte-
americanos foram praticamente os primeiros a vir para o Brasil
em missão evangelizadora.2

O metodismo, como pertencente ao núcleo do protestantismo de missão e


sendo um dos primeiros a se estabelecer no Brasil, não obteve resultados
quantitativos significativos. Segundo os dados do IBGE de 2000, as igrejas
evangélicas de missão no Brasil representam apenas 5% da população.

Tabela 3 — Igrejas Evangélicas de Missão no Brasil em 2002

Fonte: Censo Demográfico de 2000, IBGE.

1
GAARDER, Jostein. O Livro das religiões. São Paulo: Cia. Das Letras, 2000, p. 306.
2
Ibidem, p. 306.
138

É importante destacar que esta pesquisa tem o seu recorte no metodismo de


missão. Os dados do IBGE, acima, contemplam também as cisões que o
metodismo sofreu ao longo de sua história no Brasil e até mesmo outras cisões
que chegaram posteriormente, tais como Igreja Metodista Livre, Nazarenos e
outras. Preliminarmente é identificável que a maior concentração metodista no
Brasil está localizada no Estado do Rio de Janeiro e seu melhor desempenho se
deu nas últimas duas décadas, não diferente de outros grupos religiosos na região,
tais como os batistas, pentecostais e neopentecostais. Destaca-se que o grupo do
metodismo, com 341.000 fiéis, representa apenas 4% dos protestantes de missão.

Diante da impossibilidade de um diagnóstico abrangente e mais preciso, o


esforço desta pesquisa se deteve nas linhas transversais da tríade missionária
Responsabilidade Social, Pregação e Educação.

Portanto, o contexto brasileiro para a implantação do protestantismo de


missão, e do metodismo em particular, deve ser analisado dentro das pistas que
Martin Dreher oferece. Este afirma que o povo evangélico foi usado pelo projeto
liberal para alcançar seus objetivos, que foram o branqueamento da raça, a
eliminação das nações indígenas, a segurança nacional, a valorização fundiária, a
mão-de-obra barata, a construção e conservação de estradas e a criação de uma
classe média brasileira.3

2 Mapeamento das ações missionárias da Igreja Metodista: da


implantação à autonomia (1867 – 1930)
O primeiro mapeamento das ações missionárias metodistas de que se tem
registro está no livro “Cincoenta annos de methodismo no Brasil”. James L.
Kennedy, escolhido pelas Comissões do Jubileu das três Conferências Anuais,
escreveu a obra4. Na primeira parte do livro é apresentada uma análise de
conjuntura da inserção protestante no Brasil no século XVI. Kennedy destaca os

3
Cf. DREHER, Martin Norberto. Imigrações e história da Igreja no Brasil. Aparecida: Santuário, 1993.
4
Cf. KENNEDY, James L. Cincoenta annos de methodismo no Brasil. São Paulo: Imprensa Metodista, 1928.
139

equívocos dos primeiros imigrantes protestantes, por exemplo, sua crítica


concentra-se nos excessos praticados no âmbito da intolerância religiosa. Ele
afirma que os huguenotes franceses foram exterminados pela traição do Almirante
Villegaignon. Os dados históricos dessa chacina podem ser observados na
narrativa de Franco Cenni:

Em meados de 1555, o conde de Coligny, chefe dos huguenotes,


organizava uma expedição comandada pelo almirante Villegaignon a
fim de ocupar a baía de Guanabara e ali fundar uma colônia que se
tornasse abrigo dos hereges expulsos da França. O almirante, em
pouco tempo, estendeu sua influência sobre as tribos tamoios e
tupinambás, tornando-se senhor de vasto território, onde iniciou a
obra de catequização dos índios a fim de convertê-los à religião
calvinista.5

Portanto, nesse primeiro momento, o almirante Villegaignon é um parceiro


quanto à presença protestante no território brasileiro e o mesmo será interrogado
na França tanto por católicos como por protestantes, uma vez que o conflito
religioso entre católicos e protestantes estava estabelecido no Brasil. Villegaignon
“em fins de 1558, teve que retornar a França para defender-se das acusações
tanto da parte dos católicos como dos protestantes”. 6

Para entender a análise de Kennedy que denuncia Villegaignon como traidor


voltamos a Cenni, que afirma:

Foi a essa altura que o armistício de Iperoígue, obtido com o


precioso concurso de Giuseppe Adorno, tornou possível a realização
de uma ação definitiva, destinada a expulsar para sempre aqueles
que ameaçavam não apenas a colônia portuguesa, mas a própria
religião católica. [...]. De sua parte, Giuseppe Adorno reuniu um
exército de santistas e vicentinos, armados praticamente a sua custa,
que colocou sob o comando do alemão Eliodoro Hessus, guarda
livros do engenho de São João, seguindo com eles em numerosos
lenhos de guerra para a Guanabara, colaborando decisivamente para
o triunfo definitivo de Estácio de Sá. Os huguenotes e seus aliados
foram dizimados e dispersos sem apelação.7

5
CENNI, Franco. Italianos no Brasil. 3. ed. São Paulo: EDUSP, 2003, p. 49.
6
BARBOSA, Maria de Fátima Medeiros. As letras e a cruz: pedagogia da fé e estética religiosa na experiência
missionária de José de Anchieta. Roma: Edrice Pontificia Università Gregoriana, 2006, p. 157.
7
CENNI, op. cit., p. 50-51.
140

Kennedy, em seu mapeamento do protestantismo de missão, também relata


sobre a presença dos protestantes holandeses na região nordeste do Brasil. Em
sua análise de conjuntura afirma que estes foram “muito tolerantes no principio,
tornaram-se por fim muito desumanos e intolerantes para com os judeus e
católicos romanos”.8 Certamente, com essa leitura Kennedy procura balisar as
tensões no campo missionário brasileiro.

Na segunda parte do livro, Kennedy mapeia as ações missionárias próprias


do metodismo norte-americano no território brasileiro. Em seu relato, a primeira
missão metodista no Brasil (1835 – 1841) é resultante da carta de Fountain E.
Pitts, que “recomenda o estabelecimento de uma missão metodista no Brasil”. 9 A
correspondência sensibiliza R. Justin Spaulding, da Conferência Anual de Nova
Inglaterra (EUA), que recebe nomeação para o trabalho missionário no Brasil.

Spaulding chega ao Brasil em agosto de 1867, no mesmo ano, envia uma


carta-relatório com dados do trabalho no país. As informações da missão
Spaulding são animadoras, revelando o aumento da frequência de pessoas no
culto. Assim, o missionário logo tratou de alugar um salão com capacidade para
acomodar aproximadamente 200 pessoas. Todo esse entusiasmo pode ser assim
descrito:

Tabela 4 — Mapeamento da primeira missão metodista no Brasil (1835-1841)

Atividade: Frequência:

Culto Público 40 pessoas

Reunião de oração semanal A família + 2 jovens

Escola Dominical 40 crianças e adolescentes

Classes de Escola Dominical 8 classes

Escola diária Nenhuma

Fonte: REILY, História documental do protestantismo brasileiro, p. 83.

8
KENNEDY, Cincoenta annos de methodismo no Brasil, p. 7.
9
REILY, Duncan A. História documental do protestantismo no Brasil. São Paulo: ASTE, 1984, p. 81.
141

Mesmo diante da empolgação constante no primeiro relatório de Spaulding,


as dificuldades internas do metodismo estadunidense silenciaram a missão
brasileira por 25 anos.

Em 1867, Junius Eastham Newman reinicia o trabalho metodista em terras


brasileiras. Porém, o envolvimento missionário deste foi restrito entre “sulistas que
emigraram para o Brasil”.10 Newman fixou residência na colônia dos imigrantes
estadunidenses e inaugurou o denominado “Circuito de Santa Bárbara”, na região
de Piracicaba/SP. Kennedy traz o seguinte relato sobre o trabalho de Newman:

Tabela 5 — Mapeamento da missão metodista no “Circuito Santa Bárbara” (1867-1876)

Atividade: Frequência:

Culto Público 50 pessoas

Reunião de oração semanal Sem informação

Escola Dominical Sem informação

Classes de Escola Dominical Sem informação

Escola diária Nenhuma

Fonte: KENNEDY, Cincoenta annos de methodismo no Brasil, p. 13.

No tempo de Newman, insistentes cartas foram enviadas à Junta de Missões


da Igreja Metodista solicitando apoio para a missão brasileira. Finalmente, a
Conferência Geral de 1874 decidiu pelo estabelecimento definitivo da missão
metodista no Brasil, como relata Eula Kennedy Long:

O bispo americano, Holland Mc Tyeire, em seu histórico do


metodismo declara: “A investigação feita no Brasil em 1835 pelo Rev.
Pitts, foi sucedida pela ocupação permanente em 1876, com a
chegada do Rev. Ransom”. Muitas mudanças haviam ocorrido
durante os 40 anos, desde 1835.11

Ransom tem consciência de que o limite do idioma impõe barreiras para o


projeto missionário. Por isso dedica, em Campinas/SP, o primeiro ano de sua

10
REILY, História documental do protestantismo no Brasil, p. 88.
11
LONG, Eula Kennedy. Do meu velho baú metodista. São Paulo: Junta Geral de Educação Cristã; Igreja
Metodista, 1968, p. 36.
142

presença no Brasil para o aprendizado da língua portuguesa. 12 Antes de fixar


residência no Rio de Janeiro, Ransom percorreu várias partes do Brasil para
planejar a ação missionária da Igreja Metodista. Kennedy afirma que, em 1881, a
missão Ransom demonstrava forte vigor. Em seu relato, a tríade missionária —
Responsabilidade Social, Pregação e Educação — fica evidente: “assim termina o
primeiro ano, 1881, do segundo lustro da missão Ransom, sendo o nosso trabalho
firmemente estabelecido ao longo de três linhas de ação, a saber: a) Pregação a
viva voz; b) Obra Educativa e c) Literatura boa”.13

Tabela 6 — Mapeamento da missão metodista “Ransom” no Brasil (1876-1881)

Atividade: Frequência:
Membros 66 (60 membros estrangeiros e 6
brasileiros)
Escola Dominical 4 (2 no Rio de Janeiro; 1 em Santa
Barbara e 1 em Piracicaba)
Igrejas organizadas 3
Escola diária Colégio Piracicabano
Fonte: KENNEDY, Cincoenta annos de methodismo no Brasil, p. 23.

O desempenho da missão metodista no Brasil começa a dar sinais de


vitalidade não somente na capital do Império (Rio de Janeiro) e em Santa Barbara
do Oeste, locais estes de forte presença de imigrantes estadunidense, mas
também começa a conquistar novos espaços, tais como a cidade de São Paulo. Os
relatórios do final de 1883 dão o seguinte quadro:

Tabela 7 — Mapeamento da missão metodista “Ransom” no Brasil (1876-1883)

Atividade: Frequência:

Membros 130 (sem a qualificação da


nacionalidade)
Escola Dominical 5 (2 no Rio de Janeiro; 1 em Santa
Barbara; 1 em Piracicaba e 1 em SP)
Igrejas organizadas 3

Escola diária Colégio Piracicabano

Fonte: KENNEDY, Cincoenta annos de methodismo no Brasil, p. 23.

12
Cf. KENNEDY, Cincoenta annos de methodismo no Brasil, p. 16.
13
Ibidem, p. 22.
143

Nesse período é importante destacar a chegada do metodismo em Juiz de


Fora/MG, pois essa inserção se dá não somente pela dimensão do
expansionismo da Igreja Metodista Episcopal do Sul dos Estados Unidos, mas
também por possuir uma quantidade considerável de imigrantes que certamente
pelas questões culturais optariam pelo metodismo por afinidade natural. Segundo
Domingos Giroletti, “a cidade experimentava um processo de urbanização
crescente desencadeado especialmente nas três últimas décadas do século XIX,
sendo considerada a principal cidade de Minas Gerais, daquele período”. 14

Com o efetivo estabelecimento da missão no Brasil, em 01 de janeiro de 1886


surge o periódico “O Methodista Cathólico” que, em 20 de julho de 1887, terá como
sucessor o “Expositor Cristão”. Nesse mesmo ano se constitui a Conferência
Anual15 Brasileira na cidade do Rio de Janeiro. No ano anterior, em 16 de setembro
de 1886, o bispo Granbery foi autorizado pela Conferência Geral (EUA) a organizá-
la. Segundo Kennedy, a Conferência foi estabelecida com dois distritos (Rio de
Janeiro e São Paulo) e cada distrito tinha seus circuitos missionários. Assim foi
mapeada a Igreja Metodista na sua Primeira Conferência Anual:

Tabela 8 — Mapeamento da missão metodista no Brasil: Primeira Conferência Anual Brasileira (1886)

Distrito Rio de Janeiro Distrito São Paulo

Igrejas 2 2

Circuitos 3 (Juiz de Fora/MG; Rio Novo 1


e Mar de Hespanha)
Membros 97 (+ 16 candidatos no Circuito 107
de Rio Novo)
Fonte: KENNEDY, Cincoenta annos de methodismo no Brasil, p. 53.

Eula K. Long testemunha que a Primeira Conferência Anual Brasileira tem


uma particularidade no metodismo mundial. Ela foi “a única em todo o metodismo
mundial organizada com três membros tão somente: o Rev. James L. Kennedy, o

14
GIROLETTI, Domingos. Industrialização de Juiz de Fora: 1850-1930. Juiz de Fora: EDUFJF, 1988, p. 24.
15
O termo Conferência Anual é uma herança do movimento metodista inglês. Wesley, em sua eclesiologia,
organizou a Igreja de tal forma que anualmente os líderes constituíam um fórum de debate e avaliação das
ações missionárias. No Brasil o termo foi utilizado do início até a autonomia (1930) e, daí para frente, uma
tradução mais livre denominou esta reunião de concílio.
144

Rev. John W. Tarboux e o Rev. Hugh C. Tucker”. 16 E, na análise de Long, a tríade


missionária — Responsabilidade Social, Pregação e Educação — fica evidente. Ela
afirma:

“TRIO DE OURO” – líderes metodistas nos campos de


evangelização (Kennedy organizou mais igrejas e recebeu mais
membros do que qualquer outro pregador); Tarboux, no campo da
educação (especialmente em conexão com Granbery); e Tucker,
como pioneiro dinâmico no campo da ação social, tendo ao seu
crédito uma longa lista de “Primeiros”.17

É importante destacar que os relatos acima são referentes ao trabalho


missionário da Igreja Metodista Episcopal do Sul (sul dos EUA) e, por
consequência, desenvolvido no sudeste brasileiro.

Há relatos de que a Igreja Metodista Episcopal (norte dos EUA), por meio de
um programa denominado missão de autossustento, estabeleceu um projeto
missionário no norte do Brasil. Esse formato de missão foi liderado por William
Taylor18 que, em 1879, publicou o livro “Pauline Methods of Missionary Work”. Sua
tese principal é a designação missionária para obreiros metodistas para outros
continentes, porém sem a responsabilidade do sustento. Os obreiros designados
deveriam prover a sua subsistência. Esse conceito gerou um conflito na Junta
Missionária da Igreja Metodista Episcopal19. Porém, em 1874, a Conferência Anual

16
LONG, Do meu velho baú metodista, p. 62.
17
Ibidem, p. 62.
18
William Taylor (1821-1902) nasceu no condado de Rockbridge, na Virgínia, Estados Unidos. Filho de Stuart e
Martha (Hickman) Taylor, converteu-se ao evangelho num acampamento Episcopal Metodista, em 1849. É
apontado como missionário metodista para a Califórnia em 1849. Em outubro desse mesmo ano, William se
casa com (Isabel) Anne Kimberlin of Fincastle, na Virgínia. Juntamente com ela, tem cinco filhos e uma filha,
dos quais apenas quatro sobrevivem à infância. Em 1856, escreveu o primeiro de dezessete livros chamado
“Seven Years: Street Preaching in San Francisco” (Sete anos de pregação de rua em São Francisco), editado
por W. P. Strickland. De 1863 a 1866, Taylor faz várias viagens missionárias de forma a levantar fundos na
Austrália, Nova Zelândia e, por fim, em 1866, na África do Sul, onde realiza várias campanhas evangelísticas
revolucionárias. De 1870 a 1875, viaja para o sul da Índia onde estabelece várias Igrejas Episcopais Metodistas
autônomas. Em 1874 entra em ruptura com a missão Metodista de Nova York devido às missões na Índia,
assim como o recrutamento de missionários autossuficientes descritos e apontados no seu livro “Pauline
Methods of Missionary Work” (Métodos paulinos de trabalho missionário), em 1879. Em 1884, Taylor é eleito
como Bispo Missionário da Igreja Episcopal Metodista para a África, estabelecendo igrejas no sul da Libéria,
Serra Leoa, Angola, Moçambique e no Zaire. As suas experiências na África são narradas no seu livro “Story of
My Life” (A história da minha vida), em 1897, ou na versão de 1897, como “William Taylor of Califórnia”. Após a
publicação deste livro, William retira-se para a Califórnia, onde vem a falecer em 18 de Maio de 1902, na
cidade de Palo Alto. Cf. <http://digilib.bu.edu/mission/missionary-biographies/taylor-william-1821-1902>. Acesso
em: 27 jun. 2011.
19
ANDERSON, Justice C. An Evangelical Saga. Longwood: Xulonpress, 2005.
145

nomeou o Rev. Justus H. Nelson que, com o auxilio de Taylor, em 19 de junho de


1880, desembarcou em Belém do Pará. 20

Portanto, logo após a organização da Conferência Anual Brasileira e


publicação mensal do periódico metodista, em 15 de agosto de 1887 a primeira
edição do Expositor Cristão informa:

O estimado irmão e Reverendo JUSTUS H. NELSON, Pastor


Metodista no Pará, nos escreve a seguinte notícia animadora: Temos
19 membros em plena comunhão e 16 à prova. Destes, dois são
americanos, um alemão e os restantes são brasileiros e portugueses.
Temos uma Escola Dominical com 50 alunos e uma assistência
média de 20. Desde agosto do ano passado tenho celebrado culto
em inglês nos domingos de manhã, com uma assistência de 15 a 20
pessoas. A nossa Congregação brasileira é de 40 a 60 pessoas.21

A missão inaugurada por Justus H. Nelson no norte do país, dando


continuidade ao método de Taylor — sustento próprio — terá o aporte de dois
novos missionários: Albert G. Smith e Marcus E. Carver, conforme relato no
mesmo Expositor Cristão (EC).

Duncan A. Reily, diante de perguntas não respondidas sobre o fim da missão


no Norte do País, buscou respostas nos arquivos da Board of Global Ministries da
Igreja Metodista Unida e descobriu que:

Nelson diz que, apesar da decisão da Conferência Geral da IME, em


1900, de transferir toda a sua atividade missionária no Brasil à IMES,
ele resolveu manter seu trabalho em Belém, porque a IMES "não
cogitava em estabelecer missões no Amazonas, havendo falta de
pastores no sul do Brasil. Eu não quis abandonar os meus amigos e
meu predileto serviço no Pará". Portanto, contrariando as ordens da
sua Igreja, ele ficou!22

O mapeamento do metodismo brasileiro no final do século XIX possuía duas


fontes missionárias. Uma era a missão no sudeste do país, coordenada pela Igreja
Metodista Episcopal do Sul; a outra, com trabalhos no sul e na região amazônica,

20
BARDAY, Wade Crawford. History of Methodist Missions: The Methodist Episcopal Church 1845-1939. New
York: The Board of Missions of the Methodist Church, 1957.
21
EC, 1887, p.5.
22
REILY, Duncan Alexander. O metodismo na Amazônia: a obra pioneira de Justus Nelson (1880 – 1925). São
Bernardo do Campo: IMS; Faculdade de Teologia, 1982, p. 4.
146

era coordenada pela Igreja Metodista Episcopal. Os dados do trabalho no sudeste


foram mais bem organizados e a configuração na região era:

a) Presença em quatro cidades importantes do país (Rio de Janeiro, Juiz de


Fora, Piracicaba e São Paulo);

b) As cidades escolhidas eram referências comerciais e apontavam para uma


característica urbana;

c) 219 membros.

No sul e região amazônica o mapeamento tinha a seguinte configuração:

a) Na região amazônica duas igrejas (Pará e Manaus) e uma escola que não
subsistiu. O trabalho em Manaus, no ano de 1889, sofreu uma cisão e
deixou de fazer parte da missão;

No dia 19 de agosto, ele (Willian Taylor) embarcou no Rio de Janeiro


com destino a New York, de onde ele pouco depois enviou o pessoal
prometido para iniciar os três colégios. O pessoal destinado a
Maranhão e à Bahia em pouco tempo se desanimou e voltou à
América do Norte. Em Pernambuco, chegaram a abrir um colégio;
mais tarde, fechou-se.23

b) No sul a missão estava mais articulada. Havia quatro igrejas (Porto Alegre,
Forqueta, Bento Gonçalves e Alfredo Chaves) com um total de 151
membros.

No quadro abaixo se procura sintetizar, de forma gráfica, a geografia dessas


três fontes missionárias. Como se observa somente o centro oeste não tinha uma
missão estabelecida. As outras regiões, Norte, Sul, Sudeste e Nordeste, já
contavam com a presença missionária metodista.

23
REILY, O metodismo na Amazônia, p. 10.
147

Mapa 1 — As três primeiras missões metodistas no Brasil

Juiz de Fora/MG
Rio de Janeiro/RJ
São Paulo e Piracicaba/SP

Belém/PA
Manaus/AM
Rio Grande do Sul/RS

Fonte: KENNEDY, Cincoenta annos de methodismo no Brasil, pp 20 -220.

A primeira década das Conferências Anuais Brasileiras (1886-1895) revela


que o desempenho do metodismo no Brasil caminha para uma consolidação
definitiva. O que garante essa afirmação é a metodologia utilizada pelas
conferências, a saber: as sessões plenárias tinham uma pauta com perguntas
objetivas a respeito do trabalho desenvolvido pelos distritos eclesiásticos. A
organização das perguntas objetivava dar resposta ao estado geral da Igreja, tais
como Ação Missionária, Educação, Ação Social, Patrimônio, etc. — o que permitia
que os dados estatísticos fizessem parte essencial dos relatórios. Seguem, então,
os dados do desempenho da missão metodista no século XIX:

Tabela 9 — Mapeamento da missão metodista no Brasil (1886- 1900)

Local: Quando: Igrejas: Membros: Esc. Dom.: Colégios e Escolas


Paroquiais:

1ª. Juiz de Fora Set/1886 7 219 6 3

11ª. Juiz de Fora Jul/1896 26 1571 26 34


148

15ª. São Paulo Ago/1900 34 2774 49 9

Fonte: KENNEDY, Cincoenta annos de methodismo no Brasil, p. 50-102.

O trabalho metodista no Rio Grande do Sul teve seu início em 1875 com a
chegada de João C. Correa, que veio da Igreja Metodista Episcopal do Uruguai. É
importante destacar que essa atividade missionária do metodismo no Rio Grande
do Sul teve origem não pela Igreja Metodista Episcopal do Sul dos EUA, mas sim
pelo metodismo do norte dos EUA, como afirma Eduardo M. Barreto Jaime:

O Rio Grande do Sul, em 1875, pela primeira vez, recebeu a visita de


um evangelista e ministro da Igreja Metodista Episcopal do Norte.
Veio ao nosso Estado o dr. João da Costa Corrêa, o qual residia na
República Oriental do Uruguai.24

Outro destaque é que a missão metodista do norte dos EUA na América do


Sul fez um caminho diferente, seu contato se deu pela costa do Pacífico, como
afirma Kirby e Abraham do Instituto Oxford de estudos metodistas:

A costa do Pacífico na América do Sul recebeu o seu primeiro


missionário em 1859 quando o primeiro Metodista, James
Swaney, chegou. Ele pregou primeiro em Inglês para os
residentes estrangeiros que viviam em Lima e na cidade
portuária de El Callao. No ano seguinte, ele organizou uma
congregação e assim começou a missão metodista no Peru25
(tradução nossa).

João C. Correa, que de médico homeopata assumiu a missão de colportor da


Sociedade Bíblica Americana, foi quem organizou o trabalho metodista em Porto
Alegre em 1887. Contou com o apoio de outro colportor, Samuel Elliot, que já era
conhecido pelos metodistas em outras localidades, pois “o primeiro trabalho efetivo

24
JAIME, Eduardo Mena Barreto. História do metodismo no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Gráfica Moderna,
1963, p. 39.
25
ABRAHAM, William James; KIRBY, James E. The Oxford Handbook of Methodist Studies. Oxford Handbooks Online,
2009, p. 144. Disponível em
<http://www.oxfordhandbooks.com/oso/public/content/oho_religion/9780199212996/toc.html>. Acesso em: 17 jan. 2012.
Texto original: “The Pacific coast of South America received its first missionary in 1859 when the first Methodist,
James Swaney, arrived. He preached first in English to the foreign residents living in Lima and the port city of El
Callao. The following year he organized a congregation and thus began the Methodist mission in Peru”.
149

como obreiro metodista foi desenvolvido por Samuel Elliot em Capivari durante um
curto período, entre 1883 e início de 1884”. 26

Reafirmando o conceito das tensões existentes no campo missiológico do


metodismo, pois as fontes que organizam missionariamente o metodismo na
América Latina são oriundas das tensões vividas pela denominação nos EUA, em
especial, na Guerra de Secessão, onde a Igreja se dividiu em duas conferências, a
saber, a do norte e da sul, e na procura de caminhos para superar essa tensão, o
metodismo brasileiro caminhará na busca de uma homogeneização. Na
apresentação do texto de José Machado Pais, Lopes afirma que o debate sobre o
tema das tensões no campo religioso pode ser assim compreendido:

As implicações do tema no conjunto vasto de tensões: entre o local e


o global; o público e privado; a homogeneização e a hegemonização;
as reproduções massificadas da cultura e as inovações de “margem”;
os impulsos da homogeneização do lado da oferta cultural e os da
heterogeneização do lado da procura; as lógicas e os processos de
criação erudita e a chamada culturas de massas; enfim, tensões
entre o próprio e o alheio; o endógeno e o exógeno; o tradicional e o
moderno; a norma e a dissidência.27

Na busca pela homogeneização do metodismo, em 1899, A. W. Greeman, da


Conferência de La Plata (Uruguai), e H. C. Tucker, da Conferência Anual Brasileira,
iniciaram as negociações para a fusão dessas conferências. “A missão desses dois
ministros era de ultimar as negociações da transferência da obra deste Estado
(RS) para a Igreja Metodista do Sul”. 28 Portanto, na Conferência Anual Brasileira,
realizada em julho de 1900, em São Paulo, o Dr. H. C. Tucker informa que, por
autorização do Dr. Lambuth, secretário da Junta de Missões, o trabalho no Rio
Grande do Sul passa a pertencer à Conferência Anual Brasileira.

No mapeamento da presença metodista no Brasil, observa-se que essa fusão


proporcionará um novo desempenho missionário para o Rio Grande do Sul. Na
continuidade dessa atividade de superar as tensões, em julho de 1901, no Catete,

26
BARBOSA, José Carlos. Salvar & educar: o metodismo no Brasil do século XIX. Piracicaba: CEPEME, 2005,
p. 55.
27
CASTRO, Clovis Pinto de; CUNHA, Magali do Nascimento; LOPES, Nicanor (Org.). Pastoral urbana: presença
pública da Igreja em áreas urbanas. São Bernardo do Campo: Editeo/Umesp, 2006, p. 8.
28
JAIME, História do metodismo no Rio Grande do Sul, p. 54.
150

Rio de Janeiro, a informação prestada à Conferência Anual sobre o tema é o que


se relata a seguir:

É com prazer que recebemos a notícia que no sul do Brasil não


temos mais senão um metodismo episcopal. Que a apresentação do
trabalho do Rio Grande do Sul juntamente com toda a propriedade,
membros e trabalhadores, pela Junta de Missões da Igreja Metodista
Episcopal, tem sido aceita pela Igreja Metodista Episcopal do Sul e
d´ora em diante fica formado o distrito do Rio Grande do Sul, da
Conferência Anual da Missão Brasileira da Igreja Metodista Episcopal
do Sul.29

Nessa homogeneização em busca da superação das tensões missiológicas


do metodismo brasileiro, destaca-se, na dimensão da tríade missionária metodista,
o talento especial de Thomas Wood no que se refere à educação. Ele desenvolveu
um importante sistema educacional em Montevidéu, no Uruguai, e quando
transferido para o Peru, em 1891, criou um sistema educacional igualmente
importante naquele país. 30

A partir da superação de duas fontes missionárias para a mesma Igreja, um


novo mapa do metodismo brasileiro pode ser visualizado. É importante enfatizar
que, no caso norte e nordeste, apesar da presença missionária de Justus Nelson, a
Igreja Metodista no Brasil assume historicamente que, “apenas em 1946, a missão
metodista se iniciou em Salvador, Bahia, liderada por Benedito Natal
Quintanilha”.31

José Pontes Sobrinho em dissertação de mestrado analisou o Metodismo no


Nordeste do Brasil, sua análise que contempla o período de 1946 a 2003, conclui:
“a organização do Nordeste como Região Missionária, enfocando os movimentos
que buscaram tal estruturação, como as conferências missionárias e o Encontro de

29
KENNEDY, Cincoenta annos de methodismo no Brasil, p. 187.
30
ABRAHAM; KIRBY, The Oxford Handbook of Methodist Studies, p. 144. Texto original: “In 1891, Thomas Wood
arrived from Montevideo as a missionary. As he done there, he began an important educational enterprise”.
31
REILY, O metodismo na Amazônia, p. 5.
151

Obreiros Metodista do Nordeste (ENCOMENE)” confirmam que “A Igreja Metodista


nunca teve um projeto missionário para o Nordeste” 32.

Mapa 2 — O metodismo no Brasil após fusão das conferências

Juiz de Fora/MG
Rio de Janeiro/RJ
São Paulo e Piracicaba/SP
Rio Grande do Sul/RS

Fonte: KENNEDY, Cincoenta annos de methodismo no Brasil, pp 20 -220.

O metodismo no Rio Grande do Sul acompanha a dimensão da tríade


missionária e logo inicia um trabalho educacional. Carmen Chacon, “que era
professora formada no Uruguai”33 e fora designada por Thomas Wood para cuidar
da questão da educação, organizou a Escola Mista Evangélica em Porto Alegre e,
com pouco tempo, reuniu um número significativo de alunos, a saber, 187
matrículas. Em 1906, esse sistema educacional passou a se chamar Colégio
Americano. Outras instituições educacionais foram criadas no Rio Grande do Sul,
bem como instituições de serviço social, como segue quadro abaixo:

32
PONTES SOBRINHO, José. Metodismo no Nordeste do Brasil: Análise Crítica da Implantação e Configuração
do Metodismo na Perspectiva da Práxis Religiosa. Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) – Faculdade
de Filosofia e Ciências da Religião, Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2004, p.
223.
33
LONG, Do meu velho baú metodista, p. 66.
152

Tabela 9 — Mapeamento da missão metodista no Rio Grande do Sul

Instituições de Ensino Instituições de Serviço Social

Colégio Americano de Porto Alegre Lar Metodista para Crianças – Porto


Alegre

Colégio União de Uruguaiana Lar Ottilia Chaves – Lar das meninas –


Porto Alegre

Instituto Educacional de Passo Fundo Centro de Assistência Vila Noal em


Santa Maria

Instituto Porto Alegre Instituto Rural Metodista em Alegrete

Colégio Centenário em Santa Maria

Fonte: LONG, Do meu velho baú metodista, p. 82-86.

Em 07 de julho de 1906, por decisão da 16ª Conferência da Igreja Metodista


Episcopal do Sul, realizada em Asheville, Carolina do Norte, constitui-se a
emancipação do Distrito Rio Grande do Sul à categoria de Missão Sul Brasileira,
que passa a ter status de Conferência Anual. Segundo Eduardo Jaime, nasce com
paralelos interessantes.

A primeira reunião da Missão Sul - Brasileira era composta de 10


membros, exatamente o mesmo número da Primeira Conferência
Metodista realizada na cidade de Londres em 1744, e da primeira
realizada na América do Norte, na cidade de Filadélfia, em 1773.34

A experiência expansionista da Missão Sul Brasileira, com status de


Conferência Anual, motivou a criação da Conferência Anual Central Brasileira, em
1918. No período de 1900 a 1910, o metodismo pode assim ser mapeado:

Tabela 10 — Mapeamento da missão metodista no Brasil (1900- 1910)

Pregadores Membros: Esc. Dom.: Alunos da Esc. Alunos das Escolas Alunos dos Colégios:
locais: Dom. Paroquiais:

1900 6 2774 49 1694

1910 28 6190 97 4190 575 1637

Fontes: KENNEDY, Cincoenta annos de methodismo no Brasil, p. 101-142; BOAVENTURA; MALUSÁ,


Escolas paroquiais metodistas, p. 83-98.

A Conferência Geral de Igreja Metodista Episcopal do Sul, realizada em maio


de 1918 na cidade de Atlanta, Geórgia, aprovou a organização da Conferência
34
JAIME, História do metodismo no Rio Grande do Sul, p. 51.
153

Central Brasileira. Em agosto de 1918, Conferência Anual Brasileira, de posse


dessa resolução, declarou, na cidade de Juiz de Fora/MG, a organização da
Conferência Central Brasileira, sendo esta a terceira Conferência Anual organizada
no Brasil.

Os distritos que comporiam esta nova Conferência são: “São Paulo,


Piracicaba e Ribeirão Preto, incluindo alguns campos mais antigos do trabalho
metodista brasileiro”.35 E seus dados representam, aproximadamente, 1/3 dos
metodistas brasileiros:

Tabela 11 — Mapeamento da missão metodista no Brasil (1918)

Igrejas: Membros: Esc. Dom.: Alunos da


Esc. Dom.

1918 38 3504 50 2366

Fonte: KENNEDY, Cincoenta annos de methodismo no Brasil, p. 265.

Mesmo diante das dificuldades externas existentes, a saber, o período da


Primeira Grande Guerra, os dados dessa nova realidade eclesiástica até os
momentos que antecedem a autonomia (1930) representam um bom desempenho
do metodismo brasileiro, como se observa a seguir:

Tabela 12 — Mapeamento da missão metodista no Brasil (1910-1920)

Pregadores Membros: Esc. Dom.: Alunos da Esc. Alunos das Escolas Alunos dos Colégios:
locais: Dom. Paroquiais:

1910 28 6190 97 4190 575 1637

1920 33 9982 177 8176 1147 1078

Fontes: KENNEDY, Cincoenta annos de methodismo no Brasil, p. 140-160; BOAVENTURA; MALUSÁ,


Escolas paroquiais metodistas, p. 83-98.

Tal expressão expansionista se dá face aos alicerces essenciais da missão


na dinâmica da pregação, certamente com o discurso conversionista e baseada na
salvação da alma e no comprometimento com a educação, o que fica evidente no
35
KENNEDY, Cincoenta annos de methodismo no Brasil, p. 265.
154

investimento nas Escolas Paroquiais e Colégios, bem como na responsabilidade


social com a criação e manutenção de obras sociais. A manutenção dessa tríade
missionária é também alimentada, segundo Clory Trindade, pelo ideal norte-
americano de dominação do continente, que em sua opinião se dá na seguinte
forma:

As ideologias da preservação nacional na expansão transnacional e


dos “benefícios culturais aos menos afortunados” se unem na obra
missionária do metodismo norte americano, a fim de implantar, no
Brasil e em outras partes do mundo um metodismo comprometido
com a cultura norte americana.36

Do início da sua implantação até 1930 (ano da autonomia), o metodismo


brasileiro se fortalece e apresenta uma expansão reconhecida pela Igreja-mãe. Os
dados do mapeamento da situação da Igreja nos momentos da pré-autonomia são
os seguintes:

Tabela 13 — Mapeamento da missão metodista no Brasil (1930)

Igrejas: Membros: Esc. Dom.: Alunos da Esc. Alunos das Escolas Alunos dos Colégios:
Dom. Paroquiais:

1930 157 15.560 323 16.601 1373 2887

Fontes: KENNEDY, Cincoenta annos de methodismo no Brasil, p. 320; BOAVENTURA; MALUSÁ, Escolas
paroquiais metodistas, p. 83-98.

Mais importante do que analisar os números é a análise da forma como a


missão se desenvolveu, sempre procurando dar conta da tríade que sustenta o
projeto missionário na perspectiva wesleyana. É certo que as tensões próprias do
movimento missionário estão presentes nesse período, em especial, no contexto
da inculturação do metodismo na realidade brasileira. Segundo Trindade:

Até 1930, particularmente, a obra missionária é desenvolvida sob o


domínio quase absoluto da presença e ação dos missionários nos
postos chave e de poder da Igreja. Até a autonomia, há muito pouco
no metodismo do Brasil de qualquer participação mais atuante, mais
crítica e consciente, mais responsável, na vida política da nação.

36
OLIVEIRA, Clory Trindade de. Situações missionárias na história do metodismo. São Bernardo do Campo:
Editeo, 1991, p. 22.
155

Durante este longo período de sessenta e três anos (1867-1930), o


metodismo no Brasil permaneceu, basicamente, um movimento
alienado da realidade e da cultura brasileiras.37

Porém, destaca-se que o testemunho cristão dos metodistas para a


sociedade brasileira foi realizado dentro dos pilares da tríade — Responsabilidade
Social, Pregação e Educação.

Em relação à educação, sublinha-se que, após um momento que representou


uma alternativa de vanguarda na aliança com os setores mais dinâmicos da
sociedade, o metodismo vive, nessa área, uma frequente repetição de ações. Não
é mais perceptível o entusiasmo, como ocorreu no caso dos missionários Koger e
Martha Watts, em Piracicaba, para os trabalhos educacionais que “estavam sendo
esperados, principalmente pela liderança política da cidade representada pelos
irmãos Moraes Barros”. 38

Considera-se que nas primeiras décadas do século XX a área educacional


metodista vive uma rotina e mantém o objetivo de formar as lideranças do país e
de informá-las com as ideias pedagógicas importadas dos Estados Unidos. A
questão principal é que, após o primeiro momento de implantação de instituições
metodistas de educação, ocorrido entre 1881 e 1920, cessou-se essa ação
missionária da Igreja.

Por sua vez, no período de 1910 a 1940, o desempenho das Escolas


Paroquiais, que tinham caráter mais social na sua ação educativa, foi formidável e
com alguns picos, como os 1.854 alunos em 1939. No entanto, esta ação educativa
passa, a partir de 1950, a desaparecer como expressão missionária metodista.
Segundo Boaventura e Malusá:

A existência do projeto de Escolas Paroquiais encontrava-se


estreitamente ligada às igrejas locais, dependente delas, mas

37
OLIVEIRA, C. T., Situações missionárias na história do metodismo, p. 22.
38
LOPES, Lucia Helena Coelho de Oliveira. Educação, missão e gênero: as cartas de Martha Hite Watts (1881-
1895). Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Humanidades e Direito, Universidade Metodista
de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2010, p. 53.
156

recebendo grande apoio da Federação das Mulheres, do Movimento


Leigo e do Ministério Pastoral.39

Com o objetivo de manter o projeto missionário, sempre oxigenado pela


dimensão da educação, em 11 de fevereiro de 1928 surge, na sala da própria
residência40 do Rev. Clement Evans Hubbard, o Instituto Americano de Lins, última
escola criada antes da autonomia da Igreja Metodista.

3 Mapeamento das ações missionárias da Igreja Metodista: da


autonomia ao Plano para a Vida e Missão (1930-1982)
A autonomia da Igreja Metodista, em 1930, já foi analisada por diferentes
aspectos. Se, por um lado, Josgrilberg afirma:

A motivação da autonomia encontrou uma mola propulsora na forte


ideologia nacionalista, muito viva no início do século passado (uma
espécie de patriotismo reivindicatório de direitos inerentes à
nacionalidade.41

Por outro, Silva argumenta que:

Devido à projeção do Estado de São Paulo, que já se destacava


através da economia e da cultura, a cidade de São Paulo, que
crescia com ares de uma grande metrópole, recebe os primeiros
metodistas, em outubro de 1883, e atrai não só os metodistas como
também diversos segmentos da sociedade e investimentos
estrangeiros; nesse contexto, os metodistas, percebendo o potencial
da cidade, passam a fazer dela um centro promotor de seus ideais.42

Uma pesquisa realizada pelo instituto de estudos do metodismo, Oxford


Institute, destacará no livro “The Oxford Handbook of Methodist Studies” a análise
de José Míguez Bonino com a seguinte afirmação:

39
BOAVENTURA, Elias; MALUSÁ, Silvana. Escolas paroquiais metodistas. Revista do COGEIME, Piracicaba, v.
5, n. 9, p. 83-98, 1996.
40
BITENCOURT, B. P. Frutos da visão de um bravo. Lins: Instituto Americano de Lins da Igreja Metodista, 1997.
41
JOSGRILBERG, Rui de Souza. O movimento da autonomia – nasce a “Igreja Metodista do Brasil”, 2 de
setembro de 1930. In: SOUZA, José Carlos de (Org.). Caminhos do Metodismo no Brasil: 75 anos de
autonomia. São Bernardo do Campo, Editeo, 2005, p. 12.
42
SILVA, Geoval Jacinto da. O fim do período missionário! Surge a nova Igreja! Reflexão pastoral sobre a
autonomia da Igreja Metodista e seus reflexos na Terceira Região Eclesiástica, berço da autonomia. Revista
Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 10, n. 2 [16], p. 150-161, jul./dez. 2005.
157

Uma chave na história do metodismo latino-americano foi o ano de


1969. Neste e no ano seguinte, dois importantes eventos
relacionados ocorreram. O primeiro foi o reconhecimento da
autonomia das Igrejas Metodistas na América Latina em relação à
UMC, a segunda foi a criação de CIEMAL. Estes dois eventos
caminharam de mãos dadas e devem ser entendidos com o culminar
de um longo processo, a convergência de diferentes linhas de ação
em que as questões teológicas, políticas e missionárias foram
interligados43 (tradução nossa).

Portanto, em 03 de setembro de 1930, na segunda sessão do 1° Concílio


Geral da Igreja Metodista, por proposta de Derly A. Chaves, várias comissões são
criadas para o funcionamento da Igreja, dentre elas, a COMISSÃO DE MISSÃO44,
incluindo Extensão da Igreja, Evangelismo e Publicações. Essa comissão se reuniu
e se organizou, elegendo como presidente Eduardo Mena Barreto Jaime e, como
secretária, Otília Chaves.

O primeiro relatório da comissão, cujo Secretário Executivo era o Rev.


Guaracy Silveira, discorre sobre quatro itens, a saber: 1) Ilha da Madeira. Com
vistas à expansão missionária em terras de língua portuguesa, acolhe-se as
informações do Bispo James Cannon Junior, que descrevem o trabalho do Rev.
Antonio P. Rolim e sua família; 2) Índios. O Secretário Geral de Missões foi
autorizado a levantar recursos financeiros para a manutenção dos trabalhos da
“Associação Evangélica de Catequese aos Índios” em Dourados/MT, onde atua um
médico metodista, Dr. Nelson de Araújo; 3) Evangelismo. Aprova-se a realização
de uma Campanha Nacional de Evangelização, com ênfase no evangelismo
pessoal. Recomenda-se, ainda, a tradução do livro “Methodist Evangel”, do Dr.
Godard; 4) Publicações. Acentua-se a importância do Expositor Cristão como
literatura capaz de concretizar a conexidade metodista e se estabelece um alvo de
3.000 assinaturas pagas por ano.

43
ABRAHAM, William James; KIRBY, James E. The Oxford Handbook of Methodist Studies. Great Britain: SPI
Publisher Services, 2009, p. 150. Texto original: “A key in the history of Latin American Methodism was the year
1969. In this and the following year two important, related events took place, with a third following in 1971. The
first was the recognition of the autonomy of the Methodist churches in Latin America in relation to the UMC; the
second was the creation of CIEMAL. These two events went hand in hand and should be understood as the
culmination of a long process, the convergence of different lines of action in which theological, political, and
missionary issues were intertwined”.
44
IGREJA METODISTA. Atas do 1° Concílio Geral da Igreja Methodista do Brasil. São Paulo: Imprensa
Metodista, 1930, p. 34.
158

Na compreensão de que a missão acontece em contínua tensão, no 2°


Concílio Geral (1934) surge um impasse no que diz respeito à Expansão
Missionária. No documento denominado “Memorial sobre delimitação de campos
de evangelização nos Estados do Paraná e Santa Catarina” 45, Filipe Landes e L. E.
Wright encaminham preocupações relativas ao acordo, firmado em 1895, entre
metodistas, anglicanos e presbiterianos sobre a expansão missionária no sul do
país. O documento afirma que a nova geração de metodistas, por
desconhecimento do acordo, iniciou visitas missionárias em Santa Catarina e
Paraná, área de ação dos presbiterianos. Porém, somente em 1932 dois obreiros
metodistas abriram trabalhos nestes estados. O documento citado recomenda que
se busque um novo consenso sobre os limites geográficos da expansão
missionária com a Igreja Presbiteriana.

As tensões no campo missionário não foram superadas com o movimento de


autonomia. Pelo contrário, entre 1934 e 1935, surge a primeira cisão no metodismo
brasileiro, por decisão da Comissão de Disciplina, que na época era chamada de
Conselho de Sentença. Por quatro votos contra um, José Henriques da Matta foi
excluído da Igreja Metodista e organiza a Irmandade Metodista Ortodoxa. 46 As
cisões não param por aí. Muitas outras surgirão e, geralmente, resultantes da
tensão na compreensão missionária da Igreja. Se, por um lado, um grupo buscava
um projeto denominado de santidade, identificado no contexto brasileiro do
movimento de renovação carismática, por outro, um grupo buscava
comprometimento social mais relevante. Em sua tese de doutorado, “Avivamento e
o compromisso social metodista na Inglaterra, no século XVIII: uma busca de
subsídios para a identidade do metodismo brasileiro no 3° milênio”, Odilon
Massolar Chaves afirma:

Nosso pressuposto básico é de que é possível caminhar para a


unidade no metodismo, especialmente, levando os grupos a
compreenderem que as Obras de Piedade e os Atos de Misericórdia
fazem parte das raízes wesleyanas. São dois aspectos constitutivos

45
IGREJA METODISTA. Atas do 2º Concílio Geral da Igreja Metodista do Brasil. São Paulo: Imprensa Metodista,
1934, p. 81-83.
46
IGREJA METODISTA. Anuário do Concílio Regional do Norte. Belo Horizonte, 29 de janeiro a 4 de fevereiro
de 1935.
159

da identidade metodista. É possível e necessária uma Ação


Missionária comum entre os chamados carismáticos e a ala
progressista da Igreja. Esta Ação Missionária é fator de unidade da
Igreja.47

Assim, a primeira expressão na expansão missionária pós-autonomia é


somente observada nos relatórios do 4° Concílio Geral (1942). Existe uma
contradição nos dados estatísticos. No relatório episcopal, o Revmo. Bispo César
Dacorso Filho afirma que o crescimento do período foi de 4.212 novos membros48.
Entretanto, o Secretário Geral de Missões, Rev. Augusto Schwab, relata que, no
quadriênio, houve um acréscimo de 9.042 novos membros. Independente dos
números, convém destacar que a Igreja teve, nesse período, uma expansão
missionária relevante. A campanha de evangelização foi orientada pela obra
“Avivamento e Evangelismo”, de autoria do Rev. Eduardo M. B. Jaime e, com fins
evangelísticos, foi confeccionado um hinário intitulado “Cantai a Jeová”.49

No 5° Concílio Geral aparece pela primeira vez o tema da expansão para o


norte do Brasil. Com ofertas oriundas de Escolas Dominicais e cultos dos quartos
domingos, principia-se essa nova expressão missionária. A soma dos recursos
levantados para início do trabalho é de Cr$ 50 mil. No quadriênio são publicados
mais de 500 mil folhetos com 20 tipos de mensagens evangelísticas diferenciadas.

A autonomia é fortalecida com a expansão missionária rumo ao centro-oeste


e nordeste. Nesse período, a Igreja desenvolveu a campanha “Avante por Cristo”.
A missão entre os índios ganha destaque, sendo estabelecida em Laranjeiras do
Sul/PR (Missão no Rio das Cobras), no sul do Mato Grosso e em Ponte Nova/MG.
Projeta-se também o avanço da Igreja na nova capital federal, no centro-oeste e
em Recife/PE. O Secretário Geral de Missão menciona uma reunião com o
Presidente da República:

47
CHAVES, Odilon Massolar. Avivamento e o compromisso social metodista na Inglaterra, no século XVIII: uma
busca de subsídios para a identidade do metodismo brasileiro no 3° milênio. Tese (Doutorado em Ciências da
Religião) – Faculdade de Filosofia e Ciências da Religião, Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo
do Campo, 2002, p. LXXXI.
48
IGREJA METODISTA. Atas do 4° Concílio Geral da Igreja Metodista do Brasil. Piracicaba: Editora IEP, 1942,
p. 21.
49
Ibidem, p. 23.
160

Fomos felizes em conseguir uma entrevista com o Presidente


Juscelino Kubitschek de Oliveira para tratar dos nossos planos para
Brasília. (...) O presidente da República se mostrou entusiasmado
com os nossos planos para Brasília, e assinou documentos
facilitando a aquisição de terrenos (...). 50

No mesmo relatório menciona-se que o casal Dorival e Myrian Beulke, em 29


de fevereiro de 1960, chegam no Recife com objetivo de iniciar o trabalho
metodista.

Com a crise política que se alastra por toda América Latina e com os regimes
militares assumindo os governos, a interferência na expansão missionária do
metodismo brasileiro é percebida. Jesus Hortal faz a seguinte análise:

O texto atual do Credo Social foi aprovado pelo X Concílio Geral,


celebrado no Rio de Janeiro, em 1971. Contudo, dada a proveniência
prevalentemente burguesa, de classe média, dos fiéis, nem sempre
as bases acompanham a direção da Igreja Metodista nessa
preocupação social, tendo-se chegado, às vezes, a tensões muito
fortes, sobretudo durante os anos do regime militar.51

Em 1964, iniciam-se os estudos para um novo campo missionário em


Aracaju/SE e, no quinquênio, o Campo Missionário de Brasília é transferido para a
Quinta Região Eclesiástica. Porém, a difícil situação política no país interfere
diretamente na vida da Igreja. Em junho de 1968, a Faculdade de Teologia é
fechada pelo Gabinete Geral da IM e a Igreja perde não só a liderança da
juventude, mas toda uma geração. Um balanço feito no Expositor Cristão revela,
nesse período, um elevado número de pessoas que deixaram a Igreja, a saber,
10.417 membros.52 Em 1969 a Igreja, por decisão do Concílio Geral Extraordinário,
em Piracicaba, que confirmou a decisão do Gabinete Geral e anunciou a
reabertura da Faculdade de Teologia para 196953.

Por outro lado, realiza-se em Recife a Primeira Consulta Missionária no


Nordeste, nos dias 18 a 21 de setembro de 1969. Mas a grande novidade quanto à

50
IGREJA METODISTA. Atas do 4° Concílio Geral da Igreja Metodista do Brasil, p. 217.
51
HORTAL, Jesus. E haverá um só rebanho: história, doutrina e prática católica do ecumenismo. São Paulo:
Loyola, 1996, p. 113.
52
EC, n. 17, p.14, set. 1970.
53
SALVADOR, José Gonçalves. História do Metodismo no Brasil. São Paulo: Imprensa Metodista, 1982, p.10.
161

expansão missionária nos anos de 1970 é o lançamento da campanha


“Transamazônica: integrar para não entregar”, inclusive, com a divulgação, em
1972, de um selo comemorativo que vinculava o sesquicentenário da
Independência com Missão Metodista na Transamazônica. Vale assinalar que o
selo estilizado por Derly Barroso traz a indicação da bandeira brasileira simulando
o movimento da Igreja Metodista para o nordeste e para a Transamazônica.54 Com
a aprovação do projeto de implantação do trabalho em Altamira/PA (escola e
ambulatório médico), o Rev. Antonio Francisco Correa é nomeado missionário. Em
11 de maio de 1974, às 14h, é inaugurado o trabalho missionário no KM 143,
Gleba 54, Lote 05 TAI (trecho Altamira-Itaituba). No mesmo ano, o engenheiro
agrônomo Francisco Antonio de Oliveira Pita parte para Angola, com um contrato
inicial de três anos, na qualidade de missionário leigo.

O momento pós-autonomia é sempre pautado pela busca de uma


contextualização missionária que não se afaste das dimensões da tríade —
Responsabilidade Social, Pregação e Educação. Não sem tensões, a Igreja busca,
em dois Planos Quadrienais (1975-1978 / 1979-1982), a sua expressão missionária
de forma comprometida com sua identidade, persistindo o compromisso em
transmitir o melhor conceito de missão, visando ações missionárias dentro da
dimensão da tríade.

Em 1974, no Concílio Geral realizado na cidade do Rio de Janeiro, foi


aprovado o primeiro Plano Quadrienal para o período de 1975-1978. Em si, ele
orienta as ações e diretrizes para a caminhada missionária da Igreja no período
proposto. Clóvis Pinto de Castro observa que a construção desse documento foi
bastante participativa, haja vista que ele foi aprovado após vários dias de reunião
no Concilio Geral de 1974 e com diversos estudos de grupo que proporcionaram
uma longa e ampla reflexão sobre esse esforço por parte da igreja.55

Sob o lema “Vamos aos 100 mil”, procura-se motivar toda a Igreja para
atividades intensivas de evangelização. A advertência do Rev. William Richard
54
EC, n. 15, p. 9, 15 ago. 1972.
55
Cf. CASTRO, Clóvis Pinto de; CUNHA, Magali do Nascimento. Forjando uma nova Igreja: dons e ministérios
em debate. São Bernardo do Campo: Editeo, 2001.
162

Schisler Filho teve efeitos: “os dados comprovam: a igreja parou. (...) Não há
dúvidas estamos desorientados. Estamos parados. E os números aí estão
gritantes, para quem tem olhos para ver e ouvidos para ouvir”.56 O paradigma de
crescimento a partir da análise da adesão de novos membros será objeto de
estudos de Marcos Antonio Garcia com a tese “A Igreja em busca do crescimento.
Uma análise pastoral do não crescimento da Igreja Metodista na Região
Metropolitana de São Paulo”.57 Isso posto, a discussão sobre as dificuldades da
expansão missionária impulsionará um novo momento na Igreja.

A ênfase nesse plano foi formulada com o titulo “Missão e Ministério”. Pode-
se encontrar nesse documento as raízes do Programa Dons e Ministérios, pois
suas ênfases e orientações para as ações missionárias revelam a busca por uma
presença da Igreja para diversos ministérios, a saber: Ministério Cristão, Missão e
Evangelização, Ação Social, Educação, Unidade da Igreja, Patrimônio e Finanças
e Comunicação.

Na continuidade e aprimoramento da experiência, o segundo Plano


Quadrienal, aprovado em 1978, estabelece o tema: “Unidos pelo Espírito,
Metodistas Evangelizam”. Por iniciativa do Conselho Geral, um anteprojeto foi
elaborado por meio de um grupo de trabalho que formulou as linhas de
planejamento missionário da Igreja para o período 1978-1982. Esse grupo
desenvolveu uma pesquisa em todo o país para verificar o uso do Plano
Quadrienal anterior e colher sugestões para a elaboração de um novo.

A partir dos resultados da pesquisa, o novo Plano Quadrienal estabeleceu os


seguintes objetivos:

Orientar o povo metodista na sua vivencia cristã sob a dinâmica do


Espírito Santo que, em unidade, crescimento e serviço promove
evangelização, em meio à realidade concreta do mundo.58

56
EC, n. 14, p.12, 1978.
57
GARCIA, Marcos Antonio. A Igreja em busca do crescimento: Uma análise pastoral do não crescimento da
Igreja Metodista na Região Metropolitana de São Paulo. (Doutorado em Ciências da Religião) – Faculdade de
Filosofia e Ciências da Religião, Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2000.
58
COLÉGIO EPISCOPAL DA IGREJA METODISTA. Plano Quadrienal 1979-1982. In: Atas e Documentos do XI
Concílio Geral, 1979. São Paulo: Imprensa Metodista, 1978, p. 223.
163

Portanto, a proposta missionária será caracterizada com a seguinte definição:

Tudo na Igreja Metodista: ministérios, instituições educacionais e de


serviço, igrejas locais; congregações, sociedades e grupos e o
próprio patrimônio, existe em função da Missão, isto é, do
testemunho, serviço e evangelização.59

A experiência de construção coletiva dos planos e a aderência da Igreja


Metodista no Brasil aos dois Planos Quadrienais funcionaram como instrumento de
motivação para a busca de identidade no projeto missionário e clareza na
fundamentação do Plano Para a Vida e a Missão da Igreja.

Nesse período, destaca-se na questão educacional a decisão do 4° Concílio


Geral com a criação da Ordem dos Educadores da Igreja Metodista, que na
descrição dos seus fins afirma:

A Ordem dos Educadores tem por fim congregar em seu seio os


professores os professores e outros trabalhadores cristãos da Igreja
Metodista do Brasil, que queiram consagrar-se ao magistério ou
outro serviço cristão, mediante voto.60

E observa-se o envolvimento da área educacional na “Campanha Avante por


Cristo”, como relata o secretário da Junta de Educação Cristã no 7° Concílio Geral:

Felizmente nossos educandários identificaram-se com o glorioso


movimento do Avante por Cristo – intensificaram o trabalho de
educação religiosa, realizaram animadas séries de evangelização, o
ambiente interno foi agradável e de excelente ordem, frutos
preciosos foram colhidos com regozijo e louvores a Deus.61

É importante frisar que a “Campanha Avante por Cristo” era um programa de


evangelização da Igreja e que, de acordo com a declaração dos bispos da época,
“visa a evangelização do povo brasileiro”. 62

59
Ibidem, p. 225.
60
IGREJA METODISTA. Anais do 4° Concílio Geral da Igreja Metodista, Piracicaba: 8 a 19 de fevereiro de 1942,
p. 67.
61
IGREJA METODISTA. Atas e Documentos do 7° Concílio Geral da Igreja Metodista do Brasil, Rio de Janeiro:
10 a 21 de julho de 1955, p. 86.
62
COSTA, Nelson de Godoy. César Dacorso Filho, príncipe da Igreja Metodista do Brasil. São Paulo: Imprensa
Metodista, 1967, p. 335.
164

Também, nesse período, para enfrentar os desafios da educação metodista,


em 22 de abril de 1967 surgiu o Conselho Geral das Instituições Metodistas de
Ensino (COGEIME). Nesse tempo de existência, o COGEIME se desenvolveu e
ajudou a consolidar a educação metodista no Brasil.

Superando o longo período sem a criação de uma nova instituição


educacional e procurando resolver as dificuldades financeiras para a sustentação
da Faculdade de Teologia em São Bernardo do Campo, de acordo com B. P.
Bittencourt:

O IMS foi criado, oficialmente, em 1970. Antes, porém, houve


um período – dir-se-ia de gestação -, de mais ou menos uns
cinco anos, durante o qual prosperou a idéia de que os
problemas de manutenção da Faculdade de Teologia poderiam
ser resolvidos mediante o estabelecimento de cursos
superiores no seu campus, em Rudge Ramos.63

Portanto, o 10º Concílio Geral da Igreja Metodista, reunido na cidade de Belo


Horizonte/MG, de 15 a 22 de julho de 1970, na sessão do dia 20 de julho, cria o
Instituto Metodista de Ensino Superior (IMS). Em 1997, o IMS emancipou-se com o
status de Universidade e passou a se chamar Universidade Metodista de São
Paulo (UMESP).

4 Do Plano para a Vida e Missão aos dias atuais (2010)


A Igreja Metodista, no período do 13º Concílio Geral, realizado em julho de
1982 na cidade de Belo Horizonte, está envolvida num ambiente de tensões, em
especial a disputa entre os movimentos denominados “carismáticos” e
“progressistas”. Esse conflito é também observado por Jean Vernette quando
afirma:

Na Igreja, nem sempre é fácil haver entendimento para um trabalho


conjunto entre movimentos de sensibilidades bem distintas, entre
militantes sociais e fiéis carismáticos, entre tradicionais e

63
BITTENCOURT, B. P. As origens da UMESP – Universidade Metodista de São Paulo. São Bernardo do
Campo: Umesp, 1999, p. 22.
165

progressistas. E se cada um fosse necessário à harmonia do todo,


notadamente quando a tormenta ameaça engolir o mundo?64

A tensão maior se concentra na integração da Igreja Metodista ao Conselho


Nacional de Igrejas Cristãs (CONIC). A participação metodista nesse órgão foi
aprovada com uma pequena diferença, 5 votos favoráveis a mais. O pano de fundo
do conflito eram as linhas ideológicas presentes na Igreja da época.

Para dar sustentação ao Plano para Vida e Missão, em 1981 foi realizada a
“Consulta Nacional Sobre a Vida e a Missão da Igreja” em suas diversas áreas. Na
tese de Castro e Cunha65 o resultado dessa consulta agradou aos setores mais
progressistas da Igreja, enquanto despertou o desprezo dos carismáticos. Mesmo
assim, o acento ou ênfase na dimensão da Responsabilidade Social foi acolhido
com um consenso nas divergências, procurando corresponder às expectativas dos
dois grupos, progressistas e carismáticos. Sobre a mesma consulta, Ribeiro,
analisando os documentos daquele período, expõe que:

Ela indicou a necessidade de um plano que pudesse nortear a ação


missionária da igreja a partir de uma perspectiva integral,
participativa e que reafirmasse a responsabilidade social cristã, já
anteriormente indicada no Credo Social.66

Outro documento motivador e que esboça as tendências na elaboração do


PVM foi “Problemas Para Um Metodista Pensar”.67 Ele se constitui numa série de
expressões formuladas em reuniões de teólogos metodistas, membros das igrejas
e a liderança entre os anos de 1980 e 1982.

Novos tempos para a expansão missionária no metodismo brasileiro são


inaugurados a partir de 1982. Em que se pesem as dificuldades de assimilação do
PVM e as novas aspirações missionárias da Igreja, a mesma vivencia novas
experiências. Assim, no 14º Concílio Geral (1987) a Igreja reformula seu modo de
agir e de ser. Deixa a estrutura de cargos e funções para ser uma Igreja de Dons e

64
VERNETTE, Jean. Parábolas para os nossos dias. São Paulo: Loyola, 1993, p. 102.
65
CASTRO; CUNHA, Forjando uma nova Igreja, p. 44.
66
RIBEIRO, Claudio de Oliveira. Trindade: a vida e a missão da Igreja nos documentos da década de 60. Revista
Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 10, n. 2, p. 139, jul./dez. 2005.
67
PROBLEMAS para um metodista pensar. [s.l.]: [s.n.], 1982.
166

Ministérios. Nesse mesmo Concílio, visando à expansão missionária, elege, pela


primeira vez, um bispo para a Região Missionária do Nordeste.

O 15º Concílio Geral (1991) estabelece um novo “slogan” para a Igreja —


“Comunidade Missionária a Serviço do Povo” — e concentra as suas ações em
quatro áreas: Missionária, Administrativa, Social e Docente. Novamente, visando à
expansão missionária, elege-se um bispo para o Campo Missionário do Norte
(Amazônia).

De modo análogo, as motivações na área nacional da Igreja influenciam as


ações regionais. Em 1995 duas ações ligadas à expansão missionária merecem
destaque. Surge o Programa “Uma Semana pra Jesus”, que tem por objetivo
motivar os leigos para uma ação evangelizadora e de ação social na fronteira
missionária da Igreja. Esse projeto desloca das igrejas locais uma média de 500
pessoas que, além do serviço de evangelização e atendimento social, também
constroem templos, clubes de mães, etc. Esse programa começa na Quinta Região
Eclesiástica e depois é seguido por outras regiões.

A outra iniciativa, a ”Campanha Nacional pela Oferta Missionária”, tem por


objetivo levantar recursos para financiar a obra missionária no norte e nordeste do
país. A primeira campanha não estabeleceu um alvo, mas as posteriores o fizeram
de modo crescente. Em 2004, o alvo de 270 mil reais foi alcançado sem
dificuldades.

Matéria publicada no Expositor Cristão, em agosto de 1997, ressalta que a


Igreja havia retomado o ardor missionário apresentando dados como comprovação
do seu crescimento. Em 1990 a Igreja tinha 83.652 membros e, em 1996, 112.641
— um crescimento de quase 35%.

Em 1999, quando o Colégio Episcopal aprova o tema “Crescendo na Fé e no


Conhecimento de Deus”, a Igreja vivencia um boom no envio de missionários, não
apenas para as regiões norte e nordeste, mas também para países como
Alemanha, Espanha, EUA e Uruguai.
167

Se, logo após a autonomia, a Igreja experimentou crescimento constante, ora


modesto, ora mais intenso, e no período da ditadura militar enfrentou a crise e a
estagnação, nos últimos anos as estatísticas indicam que a presença do
metodismo no Brasil tem percorrido uma linha crescente.

Portanto, é necessário destacar que o PVM contempla um conjunto de


documentos essenciais para a missão metodista no Brasil. Por isso, na mesma
época, no conjunto de documentos que envolvem o PVM encontram-se o Plano
Diretor Missionário e as Diretrizes para a Educação. Esses documentos, em que se
pese pouco conhecidos, representam o eixo norteador essencial das novas ações
missionárias da Igreja. Observa-se sua intencionalidade em tratar aspectos da
expansão missionária, haja vista que seu conteúdo se volta exclusivamente a esse
tema. Isso fica claro na declaração de seu objetivo:

O objetivo geral do Plano Diretor Missionário da Igreja Metodista é o


de estabelecer medidas e diretrizes que visem a ordenar a ação
missionária da Igreja, nas áreas onde ainda não há trabalho
metodista regular, desde uma perspectiva da Missão, tal como
conceituada pelo Plano Para a Vida e a Missão da Igreja.68

Se, por um lado, Plano Diretor Missionário foi motivador para a abertura de
novos trabalhos missionários dos metodistas, dentro os quais muitos se
desenvolveram e permitiram que a expansão missionária da Igreja revelasse um
novo momento por outro, a ênfase nas periferias ao invés de centros e na
população pobre e não nas classes média e alta gerou dificuldades no sustento
econômico-financeiro desses novos campos missionários. Estes, por sua vez, por
longo tempo, não conseguiram gerar recursos próprios para manutenção e assim
possibilitar que novos campos fossem abertos.

A ênfase missionária comprometida com as classes populares e ou


empobrecidas não representa uma opção inovadora ou mesmo exclusiva na nova
proposta missionária. Pelo contrário, trata-se de uma herança wesleyana na
dimensão da tríade que esta pesquisa analisa.

68
COLÉGIO EPISCOPAL DA IGREJA METODISTA. Plano para Vida e a Missão. 3. ed. São Paulo: Cedro, 2001,
p. 69.
168

Desde os primórdios do metodismo, a pregação metodista configura-se com


elementos baseados na convergência da relação fé e razão, isto é, da Igreja com a
sociedade e suas demandas. Como assinala Roger E. Olson:

Para Wesley, a razão é na melhor das hipóteses uma ferramenta a


ser usada a serviço da fé. Para Toland, a razão é um cânone para
decidir o que a fé pode acreditar. Wesley não se deleita em mistérios
ou milagres, mas ele não aceita descartá-los. Toland era
extremamente cético em relação a milagres e rejeita os mistérios.69

Fé e razão são temas ainda amplamente discutidos nas reflexões teológicas,


como escreve Paul Helm:

Parece haver duas maneiras pelas quais se têm discutido e


enfatizado a certeza da fé, como Wesley fez, e como o Concílio de
Trento e da Confissão de Fé de Westminster fez, têm que tomar, e
pode ser útil para destacar estes para clarificação. Uma distinção que
ocorre profundamente por meio da epistemologia é aquela entre
conhecimento por aquisição e estudo e conhecimento por
descrição.70

Essa reflexão também é desenvolvida por teólogos brasileiros, tais como Rui
de Souza Josgrilberg, que afirma: “A teologia é um discurso possível que
pressupõe a fé e a revelação”71. Portanto, é necessário que a teologia wesleyana
entenda a expressão de fé também como exercício da razão. Por ser o metodismo
uma religião que reconhece os elementos da história do pensamento cristão e se
alimenta do diálogo constante com as manifestações da fé, ele, o metodismo, é
considerado uma religião do equilíbrio, como afirma José Carlos Barbosa:

Aspiramos pelo equilíbrio, pela conciliação entre razão e coração,


ciência e piedade, animus e anima. Não serve um equilíbrio com
feição do mesotes aristotélico, movido pela apatia. Estamos
saturados desta “triste religião” que não nos faz cantar no dia-a-dia
69
OLSON, Roger E. God in Dispute: Conversations among Great Christian Thinkers. From the Early Church into
the 21st Century. Grand Rapids: Baker Academic, 2009, p. 174. Texto original: “For Wesley, reason is at best a
tool to be used in the service of faith. For Toland, reason is a canon for deciding what faith can believe. Wesley
did not revel in mysteries or miracles, but neither did he discard them. Toland was extremely skeptical of
miracles and rejected mysteries”.
70
HELM, Paul. Faith with Reason. London: Oxford University Press, 2000, p. 164. Texto original: “There seem to
be two ways in which those who have discussed and emphasized the assurance of faith, as Wesley did, and as
the Council of Trent and the Westminster Confession of Faith did, have taken it, and it may he helpful to
highlight these for clarification. A distinction which runs fairly deeply through epistemology is that between
knowledge by acquaintance and knowledge by description”.
71
JOSGRILBERG, Rui de Souza. A fé em busca da teologia. In: MARASCHIN, J. C. (Org.) Teologia sob limite.
São Paulo, ASTE, 1992, p. 78.
169

da vida. Queremos muito mais. Precisamos de muito mais. Nós, povo


chamado metodista, queremos resgatar de J.W. a originalidade que
nos falta (...).72

Essa herança possibilitou que o metodismo brasileiro assumisse


compromissos com o “Credo Social elaborado em 1908 pela Igreja Metodista
Episcopal do Sul (EUA) como parte dos Cânones editados em 1934
(posteriormente revisado e adaptado à realidade nacional)”. 73

Renders analisa o compromisso do metodismo brasileiro para com o Credo


Social em dois momentos importantes: o 1° CG (1934) após a autonomia e o 13°
CG (1982) na formulação do PVM, conforme certifica:

Ele foi apresentado no Concílio Geral seguinte, em 1934, pelo


presbítero Hugh Clarence Tucker. Tucker era conhecido como
organizador do Instituto Central do Povo em Rio de Janeiro,
fundando em 1906 — ou seja, dois anos antes da criação do Credo
Social — e como colportor de Bíblias. Aprovado no dia 16 de janeiro
de 1934, no primeiro Concílio sob plena liderança brasileira, a
autônoma Igreja Metodista do Brasil afirmou um compromisso com o
mundo ao seu redor numa abrangência e clareza que somente o
PVM retomaria quase um meio século depois.74

Portanto, o PVM contempla em seu conteúdo, como parte importante, o


Credo Social da Igreja Metodista enquanto expressão do metodismo brasileiro
perante a sociedade na qual está inserida. Seus temas centrais são: herança
wesleyana; bases bíblicas; ordem político-social e econômica; responsabilidade
civil; problemas sociais. De forma sintetizada o documento assegura:

Em cada época e lugar surgem problemas, crises e desafios através


dos quais Deus chama a Igreja a servir. A Igreja, guiada pelo Espírito
Santo, consciente de sua própria culpabilidade e instruída por todo

72
BARBOSA, José Carlos. O caminho para a cabeça precisa ser aberto pelo coração. In: RIBEIRO, Claudio de
Oliveira et al. (Org.). Prática e teologia na tradição wesleyana: John Wesley, 300 anos. São Bernardo do
Campo: Editeo, 2008, p. 91.
73
CUNHA, Magali do Nascimento. A Igreja Metodista e a cultura brasileira. In: SOUZA, José Carlos de (Org.).
Caminhos do metodismo no Brasil: 75 anos de autonomia. São Bernardo do Campo: Editeo, 2005, p. 36.
74
RENDERS, Helmut. Um precursor do PVM na época da autonomia: a declaração A Atitude da Igreja Metodista
do Brasil perante o Mundo e a Nação, de 1934. Revista Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 12, n. 20, p.
167-176, jul./dez. 2007.
170

conhecimento competente, busca discernir e obedecer à vontade de


Deus nessas situações especifica.75

Nas igrejas locais, busca-se superar as dificuldades quanto ao equilíbrio das


ações que compõem a tríade missionária metodista. E procura-se reafirmar a
dimensão da fé encarnada na realidade brasileira, pois “o mundo crerá numa fé
encarnada no hoje. Não numa fé que se refugia num espiritualismo abstrato e
inoperante”.76

Em 1985, líderes metodistas da Quinta Região Eclesiástica articulam o


“Programa Agentes da Missão”. Essa liderança representada pelo Bispo Messias
Andrino e pelos pastores e professores de teologia Clory Trindade e Ely Eser
Barreto Cesar preparam uma estratégia de reflexão, treinamento por meio da
mobilização nos distritos eclesiásticos. Essa atitude se dá em vista da resistência
ao PVM, em especial, do grupo denominado carismático na região.

O primeiro documento ou texto norteador do Programa Agentes da Missão


reflete os desejos dessa missão encarnada:

Por isso, os AGENTES DA MISSÃO não são constituídos apenas de


pregadores que evangelizam, no sentido tradicional de trazer almas
para Cristo. Os AGENTES DA MISSÃO são agentes da MISSÃO. A
MISSÃO que inclui a saúde, a libertação de tudo aquilo que
escraviza a pessoa humana, desde a libertação da idolatria do
dinheiro e da vida materialista até a libertação da falta de comida, de
moradia, passando pela libertação dos vícios. Os AGENTES DA
MISSÃO são aqueles que aprendem a crer forte. Se Deus é o Deus
da vida, se Deus é o Deus que venceu a morte na cruz de Jesus, a
MISSÃO do Deus da vida está relacionada a tudo o que promove a
vida.77

Esse movimento, que em tese pretende enfrentar as tensões no campo


missionário da Igreja, tensões existentes entre a compreensão da fé encarnada e

75
COLÉGIO EPISCOPAL DA IGREJA METODISTA. Vida e missão: decisões do XIII Concílio Geral da Igreja
Metodista. Piracicaba: Unimep, 1982, p. 57 (o texto do Credo Social colocado no Plano Para a Vida e a Missão
da Igreja foi aprovado pelo X Concilio Geral da Igreja Metodista no dia 5 de fevereiro de 1971, na cidade do Rio
de Janeiro).
76
MURAD, Afonso. Este cristianismo inquieto: a fé cristã encarnada em J. L. Segundo. São Paulo: Loyola, 1994,
p. 84.
77
IGREJA METODISTA. Manual missionário do povo metodista. Piracicaba: Editora Agentes da Missão, 1988
(Coleção Dons e Ministérios), p. 12.
171

da espiritualidade de consumo 78, ganhará novas proporções. Assim, em 1987, o


Colégio Episcopal assume o novo jeito de ser da Igreja e a tensão fica evidente por
conta da destituição do Conselho Geral e de todas as Secretarias em nível
nacional. Castro, ao analisar este período, afirma que:

O Colégio Episcopal recebeu do Concilio Geral, além de grande


responsabilidade de governar a Igreja, a incumbência de implantar
um novo modelo de Igreja organizada em Dons e Ministérios, isto é,
uma Igreja Ministerial. Desafiar a conscientizar a Igreja Metodista a
viver e agir missionariamente, na perspectiva do movimento Dons e
Ministérios, não seria uma tarefa fácil, principalmente pelo fato de
estarem sozinhos na liderança da Igreja, pois junto com o Conselho
Geral, também haviam sido extintas todas as secretarias da Igreja.79

Dons e Ministérios será acolhido pela Igreja em nível nacional como um


movimento que, na análise de Castro, “criou na vida da IM uma nova esperança,
um novo ânimo”.80 Como a experiência na Quinta Região Eclesiástica demonstrava
um bom desempenho, o Concilio Geral de 1987, incluirá este novo modo de ser da
Igreja em especial no Planejamento Nacional, como segue:

IV – BASE: Redescoberta dos Dons e Ministérios como instrumentos


dinamizadores da proposta missionária da Igreja (Espírito Santo);
caráter ministerial de toda a Igreja (Sacerdócio Universal de todos os
Crentes); relevância do ministério pastoral para equipar e aperfeiçoar
os demais ministérios para o desempenho da missão.81

No ano seguinte (1988), o 16° Concílio Geral realiza, de forma pedagógica e


estratégica, o Encontro Nacional de Pastores e Pastoras, em Belo Horizonte. Este
tem como objetivo principal instruir, capacitar e mobilizar o ministério pastoral na
dinâmica de Dons e Ministérios.

78
SUNG, Jung Mo. Sementes de esperança: a fé em um mundo em crise. Petrópolis: Vozes, 2005. No quinto
capítulo o autor reflete que a “espiritualidade do consumo” mostra o aspecto da vida cotidiana dessa
“religião econômica”, enquanto que a fé idolátrica no mercado é o fundamento da dinâmica estrutural da
economia e de sua legitimação. A “espiritualidade do consumo” é a espiritualidade onde o ser humano, com
o mito de progresso, busca satisfazer sua sede de ser mais humano através do consumo sem fim para dar
satisfação ao desejo de poder e de reconhecimento.
79
CASTRO, Clóvis Pinto de. Igreja Metodista: ação pedagógica do Colégio Episcopal na implantação de um
novo modelo de Igreja organizada em Dons e Ministérios (1987-1991). Dissertação (Mestrado em Educação) –
Faculdade de Educação e Letras, Universidade Metodista de Piracicaba, Piracicaba, 1992, p. 33.
80
Ibidem, p. 41.
81
IGREJA METODISTA. Registros, atas e documentos do 16º Concílio Geral da Igreja Metodista. São Bernardo
do Campo: IMS, 1988, p. 102.
172

É relevante destacar na expansão missionária desse período a decisão de


oportunizar um dinamismo nas regiões do nordeste (1988) e norte (1991), onde a
presença metodista era e continua sendo muito pequena. A criação da Região
Missionária do Nordeste (REMNE) e Campo Missionário do Norte e Noroeste
(CMNN) — posteriormente categorizado Região Missionária Amazônia (REMA) —
deu um novo impulso ao metodismo nessas regiões do Brasil.

O 14° Concílio Geral, realizado em 1987 na cidade de São Bernardo do


Campo/SP, elegeu e designou para o nordeste brasileiro o Bispo Paulo Ayres
Mattos. Depois de verificado nos relatórios o desempenho favorável da missão na
Região Missionária do Nordeste, no 15° Concílio Geral (1991) decide-se eleger um
bispo para a Região da Amazônia. O Rev. Lino Estevão Magalhães foi eleito e
posteriormente designado, porém não assumiu como bispo para o Campo
Missionário do Norte e Noroeste (CMNN). Em Concílio Geral Extraordinário, a
Igreja elegeu para atender esta vacância o Bispo Rosalino Domingos. Observa-se,
assim, a intenção de valorizar a missão. Paulo Ayres Mattos, logo após sua eleição
e designação, faz as seguintes declarações sobre sua nova missão:

I. Revisão dos critérios adotados para a implantação da Igreja


Metodista no Nordeste;
II. Prioridade no envio de obreiros e recursos materiais para a
Região e Campos Missionários;
III. Aprovação de um programa de dez anos para estrutura de auto-
sustento;
IV. Processo de emancipação a partir de uma filosofia não
paternalista;
V. Envio das outras regiões de, pelo menos, um clérigo, e seu total
sustento durante o período de implantação.82

Se, por um lado, existe toda essa empolgação para o novo modo de ser
Igreja, por outro, não se pode minimizar uma nova tensão em seu meio. Trata-se
do papel dos Grupos Societários nessa nova organização. Geoval Jacinto da Silva
e o autor desta pesquisa afirmam que:

Os dez primeiros anos de prática do sistema de Dons e Ministérios,


por falta de um programa de implantação que contemplasse os
diversos níveis da Igreja e os grupos societários estiveram bem

82
EC, p. 17, ago. 1987.
173

desarticulados em suas ações no sentido do envolvimento e


participação da liderança leiga.83

A alternativa para superar essa tensão ficou a cargo da liderança leiga na


direção das federações de homens e mulheres da Quinta Região Eclesiástica que,
em 1996, articulam-se e criam o Projeto Missionário “Uma Semana pra Jesus”.
Destaca-se nesse projeto a ênfase missionária na dimensão da tríade —
Responsabilidade Social, Pregação e Educação, uma vez que sua estrutura de
ação está centrada na mobilização do laicato para agir fora das quatro paredes do
templo. A expressão fora da das quatro paredes, como já discorrido, é conhecida
no contexto metodista desde os seus primórdios.

Os irmãos Wesley foram motivados por George Whitefield na pregação ao ar livre.


Segundo Reily, John Wesley “recebeu o apelo com uma reação mista – ele se
encontrou ao mesmo tempo fascinado com as possibilidades dessa nova modalidade
de evangelização, como repelido pela novidade que se lhe apresentava quase
indecente”.84

Uma das inspirações para a temática de transpor as paredes do templo


encontra-se na pesquisa de Kenneth Newport sobre Charles Wesley. Esta foi
dividida em quatro capítulos introdutórios para depois analisar as pregações de
Charles no contexto do metodismo e do século XVIII. A obra inclui o uso de fontes
utilizadas Charles Wesley, especialmente a Bíblia, as Homilias e o Livro de Oração
Comum. Portanto, Newport assinala:

Um dos aspectos mais famosos da pregação avivalista Metodista,


principalmente pelo engajamento do próprio John Wesley, era a
prática de pregação ao ar livre. Esta prática foi no início praticada por
George Whitefield e foi retomada por ambos os irmãos Wesley. John
iniciou a pregação ao ar livre, o mais tardar em abril de 1739 e
Charles não estava muito atrás.85

83
SILVA, Geoval Jacinto da; LOPES, Nicanor. Igreja de dons e ministérios e os grupos societários: reflexão
histórica da evolução e não evolução dos grupos societários na perspectiva da Igreja de Dons e Ministérios.
Revista Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 12, n. 20, p. 135-148, jul./dez. 2007.
84
REILY, Duncan Alexander. Situações missionárias na história do metodismo. São Bernardo do Campo: Editeo,
1991, p. 9.
85
NEWPORT, Kenneth G. C. The Sermons of Charles Wesley: A Critical Edition with Introduction and Notes.
New York: Oxford University Press, 2001, p. 39.
174

Entende-se que a pregação ao ar livre no metodismo nascente é uma forma


de interpretar a ação missionária para fora das quatro paredes e também um
método missionário que foi vivenciado no século XIX por Willian Booth, fundador
do Exercito de Salvação que, segundo Maruilson Menezes de Souza,

Sua conversão aconteceu aos 15 anos na Capela Wesleyana de


Nottingham e logo começou a liderar o grupo de jovens da igreja,
levando-os para as ruas, para fora das quatro paredes e tudo
fazendo para que as pessoas do seu bairro pobre viessem a ser um
ganho para a Igreja Metodista.86

Assim, o projeto missionário Uma Semana pra Jesus nasceu no ano de 1996
com o objetivo de cumprir a missão precípua da Igreja, como afirma o PVM: “a
missão acontece quando a Igreja sai de si mesma, envolve-se com a comunidade
e se torna instrumento da novidade do Reino de Deus”.87

Esse mover para fora do templo é também uma experiência metodista em


outros países, tal como relata Jerry Ruth Williams no livro “Suspirando diante da
minha alma”, sobre o trabalho metodista nos EUA. O capítulo quatro traz o tema “a
porta aberta para a verdadeira hospitalidade” e nesse contexto a autora afirma:

Nós também somos uma igreja 24-7 [24h por dia e 7 dias por
semana], mas as nossas ênfases são diferentes, mais inclusiva e
mais espiritual. Não é preciso uma estrutura desbloqueada 24 horas
por dia, sete dias de semana, para realizar o ministério. O ministério
é feito em qualquer lugar, fora das quatro paredes de uma estrutura.
Vamos à estrutura chamada igreja para celebrar e ser reabastecido,
re energizados, e para dedicar-se a obra do ministério e missão88
(tradução nossa).

Utilizando-se do método segundo o qual a Igreja deve sair de dentro das


quatro paredes do templo, o projeto missionário Uma Semana pra Jesus procura
realizar a missão a partir do referencial do PVM. Busca também atender o ser

86
SOUZA, Maruilson Menezes de. Teologia salvacionista em ação: análise do Caso Torre. São Paulo: Arte &
Ciência, 1999, p. 17.
87
COLÉGIO EPISCOPAL DA IGREJA METODISTA, Plano para Vida e a Missão, p.14.
88
WILLIAMS, Jerry Ruth. Sighing Forth My Soul. Bloomington: Xlibris Corp., 2007, p. 52. Texto original: “We, too,
are a 24-7 church, but our emphases are different, more inclusive, and more spiritual. One does not need an
unlocked structure twenty-four hours a day, seven days week, to do ministry. Ministry is done elsewhere,
outside the four walls of a structure. We come to the structure called church to celebrate and to be refueled,
reenergized, and rededicated for the work of ministry and mission”.
175

humano na sua integralidade. As ações desenvolvidas pelos voluntários fortalecem


as dimensões da tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação.

As atividades intensas da semana missionária se dão da seguinte forma: no


primeiro período do dia os voluntários participam de momentos de oração, leitura
bíblica e, logo depois, saem para as suas tarefas específicas, de acordo com o
dom. Um grupo significativo vai para as ruas na tarefa de evangelizar de porta em
porta e, nesta experiência, envolvem-se com a realidade das pessoas e podem se
solidarizar com elas. Outros vão para trabalhos sociais, por exemplo, serviços de
saúde (medicina e odontologia). Há também uma farmácia que entrega os
remédios a partir do receituário. Ainda outro grupo participa de ações educativas.
Cursos são oferecidos como forma de capacitação para melhoria de renda de
pessoas empobrecidas, tais como cabeleireiro, manicure, pintura, biscuit, entre
outros.

Destaca-se que nessa semana os voluntários constroem um templo para a


comunidade que recebe o projeto.

No quadro abaixo se pode ter idéia da expressão do Projeto, sua evolução no


que tange aos participantes e o mapeamento das novas igrejas implantadas com
essa ação:

Tabela 14 – Mapeamento das ações missionárias do Projeto Uma Semana pra Jesus (1996-2011)
Ano da realização Local: cidade / UF Quantidade de voluntários
do Projeto

1º. 1996 Vila Rica / MT 234


2º. 1997 Peixoto de Azevedo / MT 593
3º. 1998 Guarantã do Norte / MT 435
4º. 1999 Palmas / TO 650
5º. 2000 Bela Vista / MS 600
6º. 2001 Tangará da Serra / MT 450
7º. 2002 Bataguassu / MS 657
8º. 2003 Barra do Garça / MT 550
9º. 2004 Sinop / MT 698
10º. 2005 Primavera do Leste / MT 745
11º. 2006 São Gabriel do Oeste / MS 739
12º. 2007 Coxim / MS 792
176

13º. 2008 Jardim / MS 846


14º. 2009 Lucas do Rio Verde / MT 531
15º. 2010 Três Lagoas / MS 435
16º. 2011 Eldorado / MS 443

Fonte: http://www.reunionlive.org/web/umasemanaprajesus/inicio.

Esse projeto, que por iniciativa dos leigos e leigas foi


incorporado ao planejamento missionário da Quinta Região
Eclesiástica, serviu de modelo para projetos semelhantes
nas demais regiões eclesiásticas do metodismo brasileiro.

Nem sempre, porém, a dimensão da tríade é


alimentadora das ações missionárias do metodismo brasileiro. Pois, paralelamente
ao projeto missionário Uma Semana pra Jesus existia uma mobilização nacional
denominada Encontro Nacional de Avivamento e Santificação (ENAVI) que, por
sua vez, representa a tensão, sempre existente, no projeto missionário metodista.
A estratégia do ENAVI era promover o avivamento espiritual no metodismo
brasileiro ou, como comumente denominado no ambiente wesleyano, resgatar o
projeto de santidade e avivamento. O primeiro deles foi realizado entre os dias 21 e
23 de abril de 1989 no Acampamento Betel, na Terceira Região Eclesiástica, São
Paulo. Esse movimento foi legitimado em 1991 pelo 15° Concílio Geral, em Juiz de
Fora, e foi incorporado, em 1998, não mais como movimento, mas como parte
programática da Coordenação Nacional de Expansão Missionária. Seus objetivos
se traduzem na ideia: “na dependência de Deus, se reúnem para orar por um
avivamento na Igreja e no Brasil”.89

Em 2006, no 18° Concílio Geral, o relato sobre as ações do ENAVI, o qual já


se identifica com novo nome — Ministério Nacional de Avivamento e Santificação
(MINAS) — é mais sóbrio, como afirma o secretário:

O Encontro Nacional de Avivamento e Santificação tem como


objetivos o estudo, oração e reflexão da espiritualidade na tradição
wesleyana. Ocorre bienalmente envolvendo toda a igreja. O MINAS
estimula a vivência da piedade, da misericórdia e do serviço. Neste

89
COLÉGIO EPISCOPAL DA IGREJA METODISTA. Livro de Atas e Documentos do 17° Concílio Geral da Igreja
Metodista, realizado em Maringá/PR. São Paulo: Editora Cedro, 2003, p. 96.
177

período eclesiástico foram realizados dois encontros de avivamento:


Porto Alegre/RS (2002) e Sumaré/SP (2004).90

O MINAS que depois da decisão do 15° CG foi incorporado às ações da Área


Nacional da Igreja e com a reconfiguração da estrutura da Sede Nacional, que
passou a ser gestada por “apenas um/a executivo/a, assessorado/a de
funcionários/as”,91 desaparece do cenário metodista.

O movimento de santidade não representa uma Igreja voltada para si ou


isolada dentro das quatro paredes. Porém, a aderência do movimento tende a
excluir a dimensão da santidade social. Míguez Bonino afirma que essa tendência
faz parte da identidade protestante latino americana:

De fato, a tradição evangélica latino-americana é fortemente


pneumatológica. Tanto em sua expressão nos “avivamentos” quanto
no “movimento de santidade” do século 19 e no pentecostalismo do
século 20, a adscrição à “obra do Espírito” tem sido a dinâmica
fundante e fundamental.92

Todavia, é importante notar a tensão existente nos projetos missionário


presentes no metodismo no final do século XX, seja pela encarnação dos
voluntários em projetos missionários como, por exemplo, Uma Semana pra Jesus,
ou pelos encontros de avivamento e santificação, como os promovidos pelo
ENAVI/MINAS.

As dificuldades em alinhar as ações missionárias da Igreja com a proposta do


PVM são notadas nas avaliações nacionais. Já no primeiro ano do novo milênio
(2001), a Igreja Metodista realiza, em Maringá/PR, o 17° Concílio Geral. Em seu
relatório, o Colégio Episcopal descreve as expectativas para o terceiro milênio:

Reconhecemos que a Igreja Evangélica no Brasil caminha para uma


homogeneização, neste contexto, é urgente sublinhar para a
sociedade brasileira, quem são os metodistas e para que existimos.
Dar a Igreja Metodista uma visibilidade que demonstre com clareza
quem somos nós.

90
COLÉGIO EPISCOPAL DA IGREJA METODISTA. Atas e Documentos do 18° Concílio Geral da Igreja
Metodista, realizado em Aracruz/ES e São Bernardo do Campo/SP. Edição eletrônica. Disponível em
<www.metodista.org.br/conteudo.xhtml?c=9904>. Acesso em: 12 mai. 2011.
91
Ibidem (Relatório da COGEAM).
92
MÍGUEZ BONINO, José. Rostos do protestantismo latino-americano. São Leopoldo: Sinodal, 2002, p. 112.
178

Para isso precisamos resistir à tentação da uniformidade de ritos e


práticas missionárias, presente na Igreja Evangélica Brasileira, quase
sempre individualista, baseada na satisfação pessoal, na negação do
sofrimento, e centrada na prosperidade a qualquer custo.93

O novo milênio, conforme relatório do Colégio Episcopal, realmente chega


com o objetivo de homogeneizar o mundo cristão. O desaparecimento do
movimento de avivamento e santificação promovido inicialmente pelo ENAVI e
depois pelo MINAS não significou uma adequação a um modelo missionário com
bases no PVM. Pelo contrário, um novo movimento dentro do segmento religioso
denominado carismático, conhecido como G-12, alterará de forma significativa as
relações missionárias dos metodistas.

A força do movimento é notável e começa a ameaçar o modelo eclesiológico


da Igreja Metodista, o que gera reação do Colégio Episcopal em 2004. Assim
afirmam os bispos e bispa:

O Colégio Episcopal frente a um dos últimos movimentos doutrinários


no meio Evangélico, chamado G-12, vem junto ao povo Metodista
colocar, de modo breve, nossa visão doutrinária acerca deste
movimento, e reafirmar nossa herança bíblica e Wesleyana.
Sabemos que nem sempre podemos dar resposta a todos os
movimentos que surgem no meio evangélico brasileiro, mas este
movimento afetou algumas de nossas igrejas e pastores/as, por isso
sentimo-nos no dever de compartilhar esta carta pastoral.94

E a carta pastoral conclui:

Assim sendo, o Colégio Episcopal, ao analisar as propostas do G-12


declara que elas são incompatíveis com os documentos, doutrinas e
caminhada da Igreja em dons e ministérios; e que pastores e
pastoras não têm o direito de envolver a comunidade local em
propostas que não foram avaliadas pelos respectivos Concílios, ou
seja, Regional, Distrital e Local. O/a pastor/a que assim proceder,
estará contrariando a orientação a orientação doutrinal da Igreja, e
atraindo para si toda responsabilidade. Desta forma, estará sujeito ao
que prescreve os Cânones da Igreja Metodista.95

93
COLÉGIO EPISCOPAL DA IGREJA METODISTA. Livro de Atas e Documentos do 17° Concílio Geral da Igreja
Metodista, p. 79.
94
COLÉGIO EPISCOPAL DA IGREJA METODISTA. Carta pastoral do Colégio Episcopal sobre o G-12.
Disponível em: <http://www.metodista.org.br/arquivo/documentos/download/carta_G12.pdf>. Acesso: em 20
mar. 2011.
95
Ibidem.
179

Procurando minimizar a tensão, no período eclesiástico de 2001-2006 a Igreja


estabeleceu um programa de discipulado. Com isso visava atender às demandas
do movimento evangélico na área de grupos pequenos. As propostas do G-12
eram mais atrativas face ao modelo do discipulado, no entanto, colocavam em
risco o modo eclesiológico metodista. Diante disso, em 2008, o Coordenador
Nacional do Programa de Discipulado da Igreja Metodista, Bispo Nelson Luiz de
Campos Leite, reage em artigo publicado na “Revista Mosaico: Apoio Pastoral”,
reafirmando a compreensão metodista de discipulado, e não recomendando o
envolvimento com o G-12. De forma esquemática ele afirma:

Tabela 15 — Mapeamento das concepções sobre o discipulado


O Discipulado para a Igreja O Discipulado é:
Metodista não é:

Um método Um estilo de vida e uma forma de ser da


Pessoa e do Ministério de Jesus;

Um programa Um “estilo de vida” relacional, fraternal,


comunal, onde a convivência, a comunhão,
o auxílio mútuo, o amor, o perdão. Levar os
“fardos uns dos outros, conforme toda uma
orientação bíblica, uma tipologia de vida
expressa por Cristo e pela Igreja Primitiva;

Uma disciplina Uma dinâmica piedosa onde a adoração, o


louvor, a oração, o estudo da Palavra, o
compartilhar, interceder uns pelos outros. A
vigília e o jejum tornam-se não uma forma
de conquista perante Deus, mas uma
expressão grata, amorosa e servil da
pessoa e da Igreja à Maravilhosa Graça
Divina;

Um modelo de crescimento Um estilo de vida onde se busca “seguir a


verdade, a honestidade, a transparência, a
nossa realidade e necessidades; crescer,
em todas as coisas e dimensões, em Cristo.
Uma busca de maturidade cristã que flui da
graça e da presença viva do Espírito Santo.

Uma forma de ser Igreja Finalmente, cremos que o Discipulado,


como fruto da graça, torna-se “uma nova
estratégia”: humana, sensível, amorosa,
engajada, realista, holística... de
cumprimento da Missão de Cristo através
da Sua Igreja. É claro que haverá
crescimento em qualidade e em quantidade,
mas um crescimento orgânico, vital,
maduro, integrado viabilizado pela Graça
que possibilita a cada um vivenciar os seus
Dons e Ministérios e a testemunhar em
plenitude a ação do Espírito em nossas
vidas, entre nossas vidas e através de
nossas vidas. Isso significa: vivenciar já, no
presente tempo, a presença do Reino de
180

Deus, seus signos e frutos junto das


pessoas, das famílias, dos grupos sociais,
da Igreja, da natureza e da História.

Mais um modismo

Um movimento centrado e
sob a dominação de um
líder

96
Fonte: LEITE, Discipulado e graça, p. 15.

As dificuldades com o modelo eclesiológico de Dons e Ministérios e as


dimensões de uma Igreja Episcopal, Conciliar e Conexional são notáveis na Igreja
Metodista. Mesmo diante da recomendação episcopal de que “nossa vocação inclui
construir pontes, superar limites, alargar e clarear a visão quanto ao
relacionamento ecumênico”97, uma forte tendência antiecumênica está presente na
Igreja, fruto de uma resistência à proposta missionária do PVM. Um grupo de
delegados (clérigos e leigos) se articulou antes da realização do 18° Concílio
Geral, por meio de redes sociais na Internet, com o objetivo de retirar a Igreja
Metodista de organismos ecumênicos. Curiosamente, essa proposta é
encaminhada pela delegação da Quarta Região Eclesiástica, cujo Coordenador
Nacional da Expansão Missionária participava como delegado e, como
mencionado, era o responsável pelo MINAS. Segue o teor da proposta aprovada:

A delegação da 4ª RE, por voto de sua maioria, propõe: 1. que a


Igreja Metodista se retire do CONIC e demais órgãos ecumênicos
com a presença da Igreja Católica Apostólica Romana e grupos não-
cristãos; 2. Que seja revista a Pastoral do Ecumenismo; 3. Que o
processo de entrada da Igreja Metodista em órgãos representativos
de cunho religioso seja feito da seguinte forma: consulta com ampla
divulgação das informações aos Concílios Locais e posterior
homologação do Concílio Geral.98

Após uma significativa trajetória em busca de unidade entre os cristãos, o


metodismo brasileiro contrariará a sua caminhada histórica. Destaca-se que o

96
LEITE, Nelson Luiz Campos. Discipulado e graça: o “estilo” ministerial de Jesus. Mosaico Apoio Pastoral, São
Bernardo do Campo, ano 16, n. 42, p. 12-17, jun./set. 2008.
97
COLÉGIO EPISCOPAL DA IGREJA METODISTA. Atas e Documentos do 18° Concílio Geral da Igreja
Metodista (Relatório do Colégio Episcopal).
98
COLÉGIO EPISCOPAL DA IGREJA METODISTA. Atas e Documentos do 18° Concílio Geral da Igreja
Metodista.
181

Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (CONIC) teve a Igreja Metodista na sua


organização e que dois bispos metodistas ocuparam a presidência desse órgão.
Talvez a explicação para esse conflito esteja na reflexão de Rubem Alves ao
afirmar:

O protestantismo brasileiro, assim, parece ser menos marcado pela


tradição do protestantismo histórico que pelo conflito com a Igreja
Católica. É isso a nosso ver, o que explica o elemento radicalmente
antiecumênico que o caracteriza.99

A análise dessa tensão com uma aderência metodista vem de um dos


organizadores dos documentos missionários essenciais da Igreja — o PVM e Dons
e Ministérios. Ely Eser Barreto César pondera o seguinte:

A prática missionária se confunde com o processo de santificação,


requer vida de disciplina pessoal e comunitária, compromisso
contínuo e paciente com o próprio crescimento em santidade. Ela se
expressa em atos de piedade e atos de misericórdia. Atos de
misericórdia consistem em “solidariedade ativa junto aos pobres,
necessitados, marginalizados sociais”. Se, ao crente, cabe o
compromisso com essa prática, ela não será solitária, pois “se não
há religião solitária, não deve haver missão solitária”. O poder do
Espírito Santo é fundamental para o testemunho social da
comunidade de fé. É sob a orientação do Espírito que a Igreja
responde aos imperativos do evangelho, transformando-se em meio
da graça significativo e relevante às necessidades do mundo.100

A práxis missionária na perspectiva wesleyana deve ser o referencial


missiológico para os metodistas. Isso não exime a tensão frente às outras
perspectivas, até mesmo porque “a explosão do pluralismo religioso na ’aldeia
global’ desafia as religiões e lhes pede demonstração de sua força pacificadora”. 101

É compreensiva a tensão na dimensão missionária e historicamente os


conflitos nesse campo sempre estiveram presentes, em especial, quando se trata
de um projeto que procura a inculturação da mensagem, como se propõe com o

99
ALVES, Rubem. Dogmatismo & tolerância. São Paulo: Loyola, 2004, p. 67.
100
CÉSAR, Ely Eser Barreto. Projeto Missionário presente no Plano para a Vida e Missão confrontado com a
tradição wesleyana e a programação missionária da IM de 2003. In: RIBEIRO, Claudio de Oliveira et al. (Org.).
Teologia e prática na tradição wesleyana: uma leitura a partir da América Latina e Caribe. São Bernardo do
Campo: Editeo, 2005, p. 248.
101
BRAKEMEIER, Gottfried. A autoridade da Bíblia: controvérsias – significado – fundamento. São Leopoldo:
Sinodal, 2003, p. 84.
182

PVM. Uma leitura cuidadosa da Bíblia permite que essa problemática se revele,
como ocorre no exemplo de Paulo, que “viveu na constante tensão de fazer
compreender, de forma adequada, o anúncio da salvação aos povos que
evangelizou”.102

Nesse sentido, as avaliações históricas do projeto missionário metodista são


ambíguas. Se, por um lado, o contexto histórico brasileiro foi inspiração para forjar
um projeto missionário encarnado como o PVM, pois “via de regra, foram bastante
mais visíveis os movimentos religiosos populares situados entre meados dos anos
1960 e a década de 1970, para o caso brasileiro” 103, por outro, a implementação do
PVM por meio de Dons e Ministérios representa um caminho menos burocrático e
mais participativo. Isso facilitou a influência por parte das correntes do
pentecostalismo, como analisam Castro e Cunha:

Como a doutrina pentecostal é justamente centrada na busca


literalista dos dons espirituais a partir de textos do Novo Testamento,
alguns desvios da proposta metodista puderam ser notados na vida
das igrejas, com ênfase na criação de ministérios de reforço às
práticas avivalistas de tendência carismática.104

Em 2002, por ocasião das celebrações dos 20 anos de aprovação dos


documentos constantes no PVM, a Faculdade de Teologia ofereceu algumas
reflexões sobre o tema. Em síntese, os editores do livro “20 anos depois: a vida e a
missão da Igreja em foco”, afirmam:

No contexto metodista, esse período corresponde justamente ao da


elaboração e aplicação do Programa “Dons e Ministérios” – proposta
pensada para viabilizar as ênfases teológicas e pastorais do Vida e
Missão. Como olhar para o futuro que se avizinha? Como servir
melhor à missão do Reino? Como estimular ainda mais os esforços
de reflexão teológico-doutrinária a partir da teologia wesleyana tendo
como referência a realidade brasileira?105

102
CASALEGNO, Alberto. Ler os Atos dos Apóstolos: estudo da teologia lucana da missão. São Paulo: Loyola,
2005, p. 429.
103
BRANDÃO, Carlos Rodrigues; PESSOA, Jadir de Morais. Os rostos do Deus do outro: mapas, fronteiras,
identidades e olhares sobre a religião no Brasil. São Paulo: Loyola, 2005, p. 72.
104
CASTRO; CUNHA, Forjando uma nova Igreja, p. 69.
105
RIBEIRO, Claudio de Oliveira; LOPES, Nicanor (Org.). 20 anos depois: a vida e a missão da Igreja em foco.
São Bernardo do Campo: Editeo, 2002, p. 20.
183

Portanto, diante da complexidade, a avaliação do metodismo antes e depois


do PVM necessita de olhares além da Igreja, e não somente um olhar dela em
território brasileiro. É importante que se observe o continente latino-americano em
geral. E pesquisas recentes por membros do Centro de Estudos Wesleyanos
(CEW), que trabalham a especificidade da Teologia Wesleyana Brasileira, indicam
pistas relevantes para melhor compreensão da Igreja Metodista. Destaca-se a
pesquisa de Helmut Renders, que discute o conceito soteriológico em Wesley. Em
resumo sua pesquisa contribui como o próprio autor afirma:

A novidade desta tese ou a sua contribuição especial está então, na


múltipla e paralela exploração do conceito social, partindo do sentido
múltiplo no próprio Wesley, mostrando como sua soteriologia envolve
toda a vida, todo o ser humano, no processo da salvação, da sua
manutenção, do seu aprofundamento e da ampliação.106

Na ênfase sobre a soteriologia social como teologia wesleyana, Renders


afirma que “Wesley não colocou o drama eclesiástico da sua época em primeiro
lugar, mas o drama do seu mundo”. 107 Também se pode concluir que a missiologia
wesleyana era uma missão inculturada. E, neste sentido, também é correto afirmar
que Wesley “tornaria soteriológica a sua eclesiologia”. 108

Nessa mesma direção, outro pesquisador do CEW, José Carlos de Souza,


afirma que a eclesiologia para Wesley era leiga, ministerial e ecumênica. Ele
pondera:

Quando igrejas perdem esse foco missionário e soteriológico, não


lhes resta outra saída senão demarcarem os seus territórios,
delimitarem a sua identidade institucional e construírem muros de
separação para se distinguirem de ‘organismos congêneres’.109

E não é diferente a contribuição de Rui de Souza Josgrilberg que, na reflexão


sobre o caminho da salvação se propõe “argumentar em favor de uma teologia que

106
RENDERS, Helmut. Andar como Cristo andou: a salvação social em John Wesley. São Bernardo do Campo:
Editeo, 2010, p. 22.
107
RENDERS, Andar como Cristo andou, p. 95.
108
Ibidem, p. 84.
109
SOUZA, José Carlos de. Leiga, ministerial e ecumênica: a Igreja no pensamento de John Wesley. São
Bernardo do Campo: Editeo, 2009, p. 226.
184

começa com a situação humana, nossas práticas e nossas necessidades pessoais


e sociais que acabam envolvidas pela graça divina”. 110

Essas novas reflexões, somadas a muitas outras contribuições, representam


a nova fase missionária da Igreja Metodista, e isso implica reflexões teológicas no
campo da missão que alimentem a prática missionária da Igreja.

O problema é quando a prática não se transforma em práxis, isto é, quando a


ação não caminha junto com a reflexão. Entende-se que esses dois momentos
(Ação e Reflexão) são inseparáveis, pois “supõe visão dinâmica e histórica do
homem, em que a ação e reflexão vão inseparavelmente unidas”. 111

Enfim, o mapeamento do metodismo no século XXI apresenta dados de


crescimento numérico (veja gráfico abaixo), porém, precisa ser traduzido em
maturidade, tanto no cultivo de nossa herança teológica dentro da diversidade
cultural brasileira, quanto no testemunho solidário entre os mais pobres. Destaca-
se também que neste novo milênio o metodismo não criou novas instituições de
ensino, exceto a implementação da modalidade de Educação a Distância (EAD)
pela Universidade Metodista de São Paulo (UMESP). 112 O mesmo se dá com as
instituições de serviço social.

Mapa 3 — Presença metodista no Brasil em 2010

21.463 (10%) 105.632 (49,2%)


22.850 (10,6%)
4.963 (2,3%) 11.922 (5,6%)
3.086 (1,4%)
18.278 (8,5%)
Total em 2010
214.715 26.521 (12,4)

110
RIBEIRO, C. O. et al., Prática e teologia na tradição wesleyana, p. 96.
111
LIBÂNIO, João Batista. Teologia da Libertação: roteiro didático para um estudo. São Paulo: Loyola, 1987, p.
99.
112
Sobre esse tema, veja LOPES, Nicanor. Formação teológica na modalidade da Educação a Distância. Revista
Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 14, n. 2, p. 67-79, jul./dez. 2009.
185

Fonte: Dados Estatísticos Oficiais para o 19° Concílio Geral (2011)

Procurou-se, com a pesquisa do mapeamento do metodismo brasileiro,


desvelar as contradições, tensões e ambiguidades existentes entre um modelo
missionário e outro. Percebe-se pelo gráfico abaixo que apesar de todas essas
questões, a presença metodista, da perspectiva da membresia, cresceu na
proporção da população brasileira. Isto posto, resta afirmar que o objetivo
desejado, o mapeamento do metodismo brasileiro, foi alcançado.

Tabela 16 — Mapeamento do desenvolvimento do metodismo brasileiro entre 1900-2000

Proporção Percentual da Membresia Metodista


do Brasil em relação a População Brasileira

0,016% 0,034% 0,085% 0,11%


0,041% 0,049%

Fonte: Dados Estatísticos da Igreja Metodista e do IBGE (obs.: em 1930 não houve
censo oficial; a proporção foi feita por projeção).

O fenômeno do crescimento evangélico no Brasil e a mobilização religiosa


têm sido estudados por vários pesquisadores e institutos. João Batista Libânio
afirma que “só nos últimos 10 anos, os protestantes passaram, em números
absolutos de 13 milhões para 26 milhões”. 113 O crescimento apontado por Libânio
indica que o desempenho dos metodistas esteve abaixo do percentual do país,
pois se em 2000 o metodismo representava 0,085% da população, em 2010 o
percentual deveria ser de 0,17% e não 0,11%, como detectado. Isso, em números
absolutos, representa 109.530 membros a menos. Também não se pode deixar de
registrar que o crescimento evangélico no Brasil nos últimos anos foi do grupo
pentecostal, como enfatizam Cesar Romero Jacob e outros:

O crescimento dos evangélicos pentecostais e, mesmo o de algumas


igrejas protestantes tradicionais, é visto com frequencia como um
processo espontâneo, em função do vácuo espiritual deixado pela
Igreja Católica. No entanto, a comparação dos mapas de 1991 com

113
LIBÂNIO, João Batista. A religião no início do milênio. São Paulo: Loyola, 2002, p. 209.
186

os de 2000 nos leva a crer que esse aumento não se realize de


modo natural, mas, ao contrário, seja fruto de um projeto mais amplo
de expansão dos evangélicos no Brasil.114

A presença dos metodistas no Brasil tem um foco muito localizado, a saber,


no Estado do Rio de Janeiro, com 105.632 membros (49,2% do total da membresia
brasileira). Essa proporção está muito acima dos outros segmentos evangélicos
brasileiros. Nas estatísticas do IBGE, o contingente de adeptos evangélicos estava
crescendo, até então, a uma taxa de 7,9% ao ano. Mas o Estado do Rio de Janeiro
tem um percentual maior, de 21%.115

Resta afirmar que o mapeamento do metodismo brasileiro não pode ser visto
somente da perspectiva numerológica, até mesmo porque a Igreja vive uma
constante tensão nesse campo. Pois, por um lado, temos uma NUMEROFOBIA
(medo de números), que é compreensível no meio metodista brasileiro pelo
insucesso de meta numérica proposta ao longo de nossa história, quando os
resultados nem sempre corresponderem ao proposto. Em contraparte, nossa fobia
em alguns casos é convertida em NUMEROLATRIA (obsessão ou idolatria por
números), na qual é comum nos esquecermos do princípio bíblico “Eu plantei;
Apolo regou; mas Deus deu o crescimento (1 Co. 3,6)”.

Finalizando este capítulo, destaca-se que fatores importantes na


consolidação do metodismo brasileiro dentro da perspectiva missionária e na
dimensão da tríade em análise — Responsabilidade Social, Pregação, e Educação
— não podem deixar de ser consideradas. Como já discorrido, nas tensões e
ambiguidades nas práticas missionárias, observa-se que nem sempre a tríade é
evidenciada. Talvez seja esta a razão do não desempenho missionário favorável
da Igreja Metodista, como deniuncia Paulo Ayres Mattos na sua comunicação aos
delegados/as ao seu 19° Concílio Geral, realizado em julho de 2011.

Portanto, repito, a história contemporânea das igrejas evangélicas no


Brasil demonstra que há movimentos de avivamento que não
produzem grande crescimento e há grande crescimento sem a

114
JACOB, Cesar Romero et al. Atlas da filiação religiosa e indicadores sociais no Brasil. Rio de Janeiro: Editora
PUC-Rio, 2003, p. 8.
115
Cf. IBGE, Censo Demográfico 2000.
187

adoção de doutrinas e práticas pentecostais. E digo isto sem


qualquer preconceito contra o pentecostalismo e contra crescimento
numérico. Digo isto mais para desconstruir o uso político-ideológico
da propaganda pentecostal entre nós metodistas que é difundida sob
diferentes aparências de santidade.116

E na área da educação, em que se pese uma profunda crise financeira no


sistema educacional brasileiro, metodistas do Brasil se destacam em nível mundial,
por exemplo, a pesquisa desenvolvida por uma equipe de brasileiros: Almir de
Souza Maia (coordenador), Beatriz Vicentini Elias, Irene C. Macêdo Jardim e
Sérgio Marcos Pinto Lopes. Para se ter uma idéia da complexidade da pesquisa,
encontra-se anexo um mapa mundí com a identificação dos países onde está
presente a educação metodista (ANEXO 1). Em 2011, por ocasião das celebrações
dos 20 anos da International Association of Methodist Schools, Colleges and
Universities (IAMSCU), isso pode ser observado pela palavra do presidente:

Somos gratos ao Dr. Almir de Souza Maia pelo seu tratamento


atencioso e comovente desta saga de uma incomum associação
internacional. Dr. Maia esteve desde o início, como um dos
fundadores IAMSCU, e coletou um maravilhoso acervo de
documentos e fotografias ao longo dos anos. Ninguém está mais
preparado para oferecer uma visão privilegiada da criação e
evolução da IAMSCU. Dr. Maia está atento à teologia que sustenta a
IAMSCU e esta história é clara acerca de nossas raízes wesleyanas
e do papel que elas desempenham no seu desenvolvimento. Talvez
o mais importante seja que este trabalho constantemente aponta e
identifica a grande expectativa que temos para o futuro da
IAMSCU.117

Isso posto, conclui-se que não é o modelo pentecostal que mobiliza o


crescimento ou mesmo a presença de uma comunidade metodista. O que se
percebe é que a manutenção da tríade — Responsabilidade Social, Pregação e
Educação — ainda é indispensável para o projeto missionário metodista. No
próximo capítulo a pesquisa procura apresentar a tríade como paradigma
missionário para a ação metodista.

116
MATTOS, Paulo Ayres. INGRATA SURPRESA? Kyrie eleison! Mensagem recebida por e-mail em 05 de julho
de 2011.
117
MAIA, Almir (Org.). “A educação é nosso mundo”. Visão retrospectiva da IAMSCU e suas perspectivas,
Piracicaba, 2011, CD-ROM.
CAPÍTULO 4
RESPONSABILIDADE SOCIAL, PREGAÇÃO E
EDUCAÇÃO COMO PARADIGMA MISSIONÁRIO DO
METODISMO BRASILEIRO

1 Introdução do capítulo: a tríade — Responsabilidade Social,


Pregação e Educação — como paradigma missionário do
metodismo brasileiro
As reflexões desenvolvidas neste capítulo têm por objetivo compreender as
profundas mudanças no cenário missionário, em especial, do metodismo brasileiro.
Consequentemente, a primeira tarefa é conceituar a teoria de paradigmas de
Thomas Kuhn. Paradigma é um conjunto de conceitos, valores, percepções que
uma comunidade científica compartilha. Segundo Maria Cecília Maringoni de
Carvalho:

A partir do momento em que um paradigma se impõe frente a uma


comunidade de pesquisadores, verificam-se as seguintes
consequências:

a) no plano cognitivo: surge consenso no que diz respeito à natureza


dos fenômenos (por exemplo, quanto à natureza da luz, será ela
composta de partículas de matéria, ou será um movimento
ondulatório, ou ainda composta de fótons, ou seja, de entidades
quântico-mecânicas que exibem características de ondas e outras
188

partículas etc.) Desaparecem, portanto, as escolas e teorias


rivalizantes acerca da constituição dos fenômenos.

b) no plano social: surge uma comunidade de cientistas que


possuem as mesmas convicções, que partilham o mesmo
paradigma. Constitui-se, assim, um grupo homogêneo, que transmite
a seus discípulos uma mesma doutrina.1

Deste modo, teoria de paradigmas significa que o conhecimento não


representa formas cumulativas do saber, mas se dá por rupturas, mudanças de
estrutura teórica e “nenhum indivíduo ou grupo consegue, de fato, criar, um novo
paradigma2. O que possibilita a troca de paradigmas é uma crescente consciência
de que vivemos em uma era de mudança na maneira de compreender a
realidade”.3

As mudanças de paradigmas na missiologia, na perspectiva histórica, foram


observadas por Hans Küng4 em seis diferentes momentos. Assim, David Bosch se
apropria dessa classificação para basear sua compreensão sobre os paradigmas
históricos da missão5. Compreender esses momentos, que especificamente, no
caso desta pesquisa, o segundo capítulo procurou atender, é de relevância de
última instância. A compreensão dos momentos históricos do movimento
missionário possibilita o entendimento das práticas desenvolvias no cristianismo,
bem como, permite que o processo hermenêutico dê conta das demandas da
missão nos diferentes contextos sociais, políticos e eclesiológicos.

Aos seis momentos esboçados por Küng e adaptados por Bosch denomina-
se paradigmas históricos da missão, quais sejam:

1. O Paradigma missionário da igreja oriental;

2. O paradigma missionário patrístico e ortodoxo;

3. O paradigma missionário católico romano medieval;

1
CARVALHO, Maria Cecília Maringoni de. Construindo o saber: metodologia científica. Fundamentos e técnica.
Campinas: Papirus, 1989, p. 76-77.
2
BOSCH, Missão transformadora, p. 230.
3
Ibidem, p. 232.
4
Ibidem, p. 229.
5
Cf. ibidem. Este é o título da segunda parte do seu livro (p. 227-415).
189

4. O paradigma missionário da Reforma Protestante;

5. O paradigma missionário moderno do iluminismo;

6. O paradigma missionário ecumênico emergente.6

Observa-se que os paradigmas missionários tiveram um período de validade


significativo no decurso da história. Segundo a classificação de Bosch, o período
foi entre 300 e 500 anos, todavia as mudanças nos conceitos missionários se
deram de formas abruptas.

Nesta pesquisa investigam-se as mudanças ocorridas na compreensão de


missão no metodismo brasileiro. Contudo, consideram-se as mesmas em um curto
período, nesse caso, de uma maneira distinta da temporalidade de maior escala
proposta por Bosch.

7
Justo L. González e Carlos Cardoza Orlandi avaliam que o movimento
missionário no Brasil por parte do catolicismo foi débil em comparação ao alcance
que os missionários espanhóis tiveram na América Latina. No campo do
protestantismo, os autores afirmam que “a proliferação de igrejas protestantes e
pentecostais no Brasil deveu-se às muitas divisões que elas experimentaram”. 8

As mudanças ocorridas no pensamento missionário do cristianismo são


observadas nos documentos da várias conferências missionárias mundiais 9. No
que diz respeito à América Latina, Luiz Longuini Neto debate o tema no livro “O
novo rosto da missão”10. E para compreender as mudanças de paradigmas no
movimento missionário metodista, esta investigação se fundamenta na pesquisa de

6
BOSCH, Missão transformadora, pp. 227-228.
7
Para compreender melhor este tema, veja GONZÁLEZ, Justo L.; CARDOZA ORLANDI, Carlos. História do
movimento missionário. São Paulo: Hagnos, 2008, p. 440-454.
8
Ibidem, p. 453.
9
Sobre os resultados e influências das Conferências Missionárias Mundiais, veja BOSCH, Missão
transformadora, p. 443-446.
10
O termo “o novo rosto da missão” é utilizado com objetivo de apresentar um panorama do protestantismo da
América Latina. As noções de “movimento evangelical” e “movimento ecumênico” são fundamentais para a
compreensão das mudanças ocorridas no movimento missionário protestante no continente latino-americano.
Cf. LONGUINI NETO, Luiz. O novo rosto da missão: os movimentos ecumênico e evangelical no
protestantismo latino-americano. Viçosa/MG: Ultimato, 2002.
190

Longuini Neto e na leitura historiográfica dos documentos metodistas, tanto no


campo da missão e evangelização, quanto na área da educação.

A missio Dei representa o paradigma missionário que possui maior aderência


à soteriologia de John Wesley. A salvação é entendida, conforme assevera Helmut
Renders, como “soteriologia wesleyana sob o aspecto do múltiplo sentido da
palavra social”.11 No que diz respeito ao conceito de missio Dei, foi em Willingem,
Alemanha (1952) que “começou a engendrar-se um novo modelo. [...] A obra
salvífica de Deus precede tanto a igreja quanto a missão”. 12 Theo Sundermeier
afirma:

O conceito de missio Dei foi usado somente “em passant” na


conferência, e só mais tarde, através da publicação de G. Vicedom,
foi que ele veio para culminar a nova abordagem e a mensagem da
conferência mais precisamente. Willingen 1952 foi a primeira vez que
a missão foi tão abrangentemente ancorada na doutrina de Deus.
Para começar, tal fato abriu novas perspectivas, haja vista que a
missão tornou a cair em crise após a segunda guerra mundial,
embora proclamado como o grande acontecimento do século 20 na
primeira conferência mundial de missão em Edimburgo13 (tradução
nossa).

Tendo a concepção de missio Dei como núcleo estruturante da Teologia


Pastoral e do referencial missionário, e não mais por iniciativa ou mesmo estratégia
da Igreja, é possível compreender a mudança paradigmática na teologia de
missão, o que provoca uma mudança quanto ao lugar da Igreja nesse projeto. Esta
“passa de remetente a remetida”.14 Pois, como afirma Jacques Matthey: “Ainda que não
se trate de uma expressão indiscutível em nossos tempos, missio Dei no momento é a

11
RENDERS, Helmut. Andar como Cristo andou: a salvação social em John Wesley. São Bernardo do Campo:
Editeo, 2010, p. 24.
12
BOSCH, Missão transformadora, p. 444.
13
SUNDERMEIER, Theo, Missio Dei Today: On the Identity of Christian Mission. In: International Review of
Mission, Genève, vol. 92, ed. 367, p. 560, Oct. 2003. Texto original: “The concept of missio Dei was only used
in passing at the conference, and it was only later, through the publication of G. Vicedom, that it came to sum up
the new approach and message of the conference so precisely. Willingen 1952 was the first time that mission
was so comprehensively anchored in the doctrine of God. That was a source of relief, to start with, since
mission had again fallen into crisis after the second world war, albeit proclaimed the great event of the 20th
century at the first world mission conference in Edinburgh”.
14
BOSCH, op. cit., p. 444.
191

formulação mais precisa para sinalizar o marco que a identidade e obra de Deus
oferecem à existência humana”.15

Portanto, esta pesquisa tem por objetivo, na linha da tríade —


Responsabilidade Social, Pregação e Educação — colaborar na construção de
paradigmas missionários no contexto do metodismo brasileiro, tendo como núcleo
estruturante o conceito de missio Dei numa perspectiva teológica da soteriologia
wesleyana.

2 As mudanças de paradigmas na teologia de missão


O primeiro desafio que encontramos foi literatura em português para
conceituar a missão como teologia. O referencial teórico para essa compreensão
está no trabalho de Bosch16. Somente no século XIX teremos uma teologia de
missão sistematizada, com Gustav Warneck (1834-1910) e Josef Schmidlin (1876-
1944), respectivamente fundadores da missiologia protestante e católica. Para
Bosch, a missão como teologia acabou sendo estabelecida como disciplina
independente, “não só como hóspede, mas com direito a domicilio na teologia”. 17
Isso graças ao esforço de Gustav Warneck como professor da Universidade de
Halle (1896-1910). Não fora diferente no mundo católico. Em 1911, Josef Schmidlin
recebeu a tarefa de dirigir o periódico “Ciências da Missão” (Zeitschrift für
Missionswissenschaft) e, em 1910, ao receber a cadeira de missão na
Universidade de Münster, reconheceu sua dívida para com Warneck,

Joseph Schmidlin apoiou-se continuamente em Warneck. Ele


também reconhece que o termo missão é usado em diversos
sentidos. Admite basicamente compreender o conceito em sentido
amplo e estendê-lo a todos os homens; 'a uns, que já lhe (= à Igreja)
pertencem e possuem a fé eclesiástica, para que conservem e vivam

15
MATTHEY, Jacques. Reconciliação como missão de Deus – Igreja como comunhão reconciliante. Revista de
Estudos Teológicos, São Leopoldo, v. 45, n. 2, p. 32, 2005.
16
Para compreender esse debate, cf. BOSCH, Missão transformadora, p. 584-608.
17
Ibidem, p. 586.
192

segundo ela, e outros, que ainda se encontram nos termos do erro e


fora da Igreja, para que se decidam por ela e se convertam.18

Desse modo, o tempo que missão tem o reconhecimento como teologia é


relativamente novo. Essa pesquisa ao analisar as mutações da ação missionária
no metodismo observa que a missão ainda é, não somente no contexto metodista,
mas no contexto cristão brasileiro, apenas uma disciplina ou uma estratégia de
gestão eclesiástica. O destaque a ser dado, a esta altura da pesquisa, é que o
núcleo central da missão cristã é o envio. Envio da mensagem salvífica de Deus ao
mundo, que no primeiro momento da história encontramos com o povo de Israel,
seus enviados. No cumprimento das profecias do Antigo Testamento Deus envia
Jesus que, após o cumprimento de sua missão, envia todos para o mesmo
ministério de anúncio da graça salvadora, justiça, bondade e misericórdia de Deus.

2.1 A missio Dei no Antigo Testamento

O universalismo do Antigo Testamento não explicita um conceito claro de


missão, uma vez que sua compreensão é centrípeta (de fora para dentro) — o que
faz compreender que a missão é dos povos que vieram para Israel. A leitura das
profecias de Isaías indica o caminho e o papel de Israel no projeto missionário de
Deus em salvar o mundo: “E acontecerá nos últimos dias que se firmará o monte
da casa do SENHOR no cume dos montes, e se elevará por cima dos outeiros; e
concorrerão a ele todas as nações” (Isaías 2, 2). Esse é um conceito centrípeto de
missão estruturado na dimensão universalista narrada nas profecias de Isaias, do
capítulo 40 ao 55. Que segundo Blaw “O Novo Testamento nos traz algo
totalmente novo que está faltando, por completo, no Antigo: a comissão de
proclamação às nações, para a missão no sentido centrífugo”. 19 Porém, é
importante observar as profecias com um caráter mais missionário e um indicativo
para o Messias.

18
MÜLLER, Karl. Teologia da Missão. Petrópolis: Vozes, 1995, p. 40.
19
BLAW, Johannes. A Natureza missionária da Igreja. São Paulo: ASTE, 1966, p.66.
193

“O Servo Sofredor” de Isaias 42 e 49 é uma ideia estranha às lógicas


messiânicas tradicionais do antigo Israel, pois o messias é geralmente forte,
poderoso e vencedor. A ideia de humilhação, sofrimento e assassinato seguido de
morte não condiz com as tradições judaicas. A imagem de um sofredor enviado por
Deus para salvação não é entendida dessa forma nem mesmo nos evangelhos,
com exceção da literatura lucana 20 (Lucas 22, 37 e Atos 8, 32-33). Os demais
evangelhos não revelam a compreensão profética do Antigo Testamento. Portanto,
o conceito de salvação no cânon veterotestamentário tem como núcleo a
compreensão de que as nações virão à salvação e a de não um envio, como
analisa Carriker:

Nesses primeiros onze capítulos de Gênesis, as promessas


(inclusive de julgamento!) de Deus se destinam à humanidade toda.
Aqui, Deus se relaciona com o mundo todo. O próprio nome “Adão”,
que significa “humanidade”, demonstra tal preocupação universal.
Contudo, esse enfoque “universal” não se esgota nos primeiros onze
capítulos de Gênesis. Ele continua ao longo de toda a Bíblia, já que
todos os povos da terra, e a terra toda, constituem a preocupação
benemerente de Deus.21

Sem reducionismos, é necessário compreender que o conceito de missão no


Antigo Testamento não exclui a dimensão do envio. O problema está na
configuração política entre Israel e as nações, pois o período de exílio não é
compreendido como um envio, mas sim como uma eleição. Daí por diante a
missão no Antigo Testamento passa a ser desenvolvida como um projeto
privatizado do povo de Israel.

2.2 A missio Dei no Novo Testamento

Como ponto de partida é importante deixar claro que a literatura do Novo


Testamento possui uma variedade maior de fontes no que tange à temática da

20
Para aprofundar o tema, veja LOCKMANN, Paulo. Jesus, o messias profeta. São Bernardo do Campo: Editeo,
2011.
21
CARRIKER, Timóteo C. A visão missionária na Bíblia: uma história de amor. Viçosa/MG: Ultimato, 2005, p. 24-
25, p. 24.
194

missão. É preciso compreender os enfoques dos evangelhos sinóticos, a literatura


joanina e as cartas de Paulo.

Nota-se que o evangelho de Mateus finaliza sua narrativa com uma


pretensão exclusivista do mundo cristão: “E, chegando-se Jesus, falou-lhes,
dizendo: É-me dado todo o poder no céu e na terra. Portanto ide, fazei discípulos
de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo”
(Mateus 28,18-19). Segundo Johannes Blaw, a partir desta autoridade “surgiu uma
atitude positiva para com todas as nações, (...). Esta relação positiva recebeu
caráter e significado pela ordem: ‘fazei discípulos’”. 22 O detalhe é que esse
conceito não pode ser entendido isoladamente de todo o testemunho bíblico sobre
Jesus. Uma hermenêutica unilateral deste texto contradiz a mensagem de Jesus
em Marcos 9, 38-41, onde o mesmo ensina a tolerância e o exercício do ministério
por pessoas que falavam e agiam em seu nome, mas que não faziam parte do
grupo de discípulos. A Grande Comissão precisa ser vista como mudança de
paradigma missionário, a saber, sair da condição de uma força centrípeta (de fora
para dentro), e organizar-se missionariamente numa força centrífuga (de dentro
para fora).

Martin Hengel23 oferece uma importante fundamentação da concepção


missionária a partir do Novo Testamento. Esta concepção é assim compreendida
por Michael F. Bird:

Isto leva Hengel procurar a origem das primeiras missões cristãs na


atividade pré-pascal de Jesus. Hengel efetivamente classifica Jesus
como o "missionário primordial". A proclamação feita por Jesus do
reino de Deus, sua oferta de vida nova para os excluídos da
sociedade judaica e o seu anúncio do juízo vindouro possuem uma
"natureza missionária”24 (tradução nossa).

22
BLAW, A Natureza missionária da Igreja, p. 86.
23
Cf. HENGEL, Martin. The Son of God: The Origin of Christology and the History of Jewish-Hellenistic
Religion.Nwe York: Wipf & Stock Publishers, 2007. A pesquisa de Hengel avança significativamente a
discussão crítica da cristologia do Novo Testamento. O sugestivo título: o Filho de Deus aponta para uma
coerência interna e dinâmica do desenvolvimento da cristologia no cristianism o primitivo. A natureza da
cristologia do Novo Testamento é consistente enquanto uma abordagem dogmática. Portanto é de vital
importância unir pesquisa histórica e teológica a busca da verdade cristológica e missionária.
24
BIRD, Michael F. Jesus and the Origins of the Gentile Mission. New York: T&T Clark International, 1988, p. 19.
Texto original: “This leads Hengel to look for the origin of the early Christian missions in Jesus pre-Easter
195

Bosch, também fundamenta na sua tese “Missão transformadora”, a partir do


pensamento de Hengel. Ele define sua reflexão sobre o Novo Testamento como
documentário missionário.

O princípio de que “em ti serão abençoadas todas as famílias” [em Abraão]25 é


agora sinalizado com o envio a todas as nações, e a mensagem dos atos apostólicos
narrados por Lucas afirmará o que o envio compreende: “Mas recebereis a virtude do
Espírito Santo, que há de vir sobre vós; e ser-me-eis testemunhas, tanto em
Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria, e até aos confins da terra” (Atos 1, 8).

2.3 A missio Dei em Paulo

Ainda no Novo Testamento temos a realização prática dessa mensagem. O


apostolado de Paulo conceitua a missão numa dimensão pública, a ponto de
enfrentar uma discussão interna entre os apóstolos sobre a pregação aos gentios.

Muitas foram as controvérsias a respeito do ministério apostólico de Paulo,


como analisa Fabris:

Uma prova do fenômeno da rejeição pode ser encontrada nas


polêmicas presentes em algumas cartas paulinas, como Gálatas, 2
Coríntios e Filipenses; de forma mais velada, também em Romanos,
1 Tessalonicense e 1 Coríntios. Ainda que não se possa pensar
numa frente antipaulina homogênea, é certo que nas tensões ou
confusões nas jovens comunidades fundadas por Paulo fora da
Palestina, junto às colônias judaicas da diáspora, refletem a reação
dos grupos cristãos ligados ao judaísmo palestinense ou, de
qualquer forma, à tradição legal judaica.26

Essa controvérsia não esvazia o ministério missionário de Paulo. Bosch


afirma:

activity. Hengel colourfully labels Jesus the ’primal missionary’. Jesus proclamation of the kingdom of God, his
offer new life to the outcasts of Jewish society, and his announcement of the coming judgment all possess a
’missionary character’”.
25
Para aprofundar o tema, veja GARCIA, Paulo Roberto. Bases bíblicas para a missão. In: CONSELHO
LATINO-AMERICANO DE IGREJAS (Org.). Missão, unidade e identidade da Igreja. Quito: Departamento de
Comunicações do CLAI, 2000, p. 1-18.
26
FABRIS, Rinaldo. As cartas de Paulo. Vol III: Tradução e comentários. São Paulo: Loyola, 1992, p. 11.
196

Foi só na década de 1960, entretanto, que toda a significação


dessa nova percepção de Paulo foi reconhecida e apropriadamente
avaliada. Hoje em dia se reconhece amplamente que Paulo foi o
primeiro teólogo cristão justamente porque foi ele o primeiro
missionário cristão.27

Para Paulo, o compromisso missionário impulsiona um alcance universal


movido pelo amor de Cristo: “Porque o amor de Cristo nos constrange, julgando
nós assim: que, se um morreu por todos, logo todos morreram” (2 Coríntios 5, 14).
Por isso, sua missão vai além do compromisso com os judeus e atenta para os
gentios. Seu ministério missionário contempla viagens para o território da Galácia,
regiões como da Síria, Cilícia, Frígia, entra na Europa, em direção de cidades
importantes como Macedônia, Ática e Acaia, instalando novas comunidades
cristãs. Ao analisar esses textos, Paulo Roberto Garcia assume a “hipótese de que
as cartas paulinas na forma em que as temos hoje em nossa Bíblia eram,
originalmente, pequenos bilhetes pastorais”.28 Essas comunicações fortaleciam o
ímpeto missionário dos primeiros cristãos e orientavam pastoral e doutrinariamente
as comunidades nascentes dentro perspectiva da reconciliação.

Portanto, pode-se compreender que o fundamento ou núcleo central da obra


missionária de Paulo é a reconciliação, como ele mesmo escreve: “E tudo isto
provém de Deus, que nos reconciliou consigo mesmo por Jesus Cristo, e nos deu o
ministério da reconciliação” (2 Coríntios 5, 18). Ainda neste capítulo analisaremos o
tema da reconciliação como um paradigma missionário.

2.4 A missio Dei como teologia missão no contexto metodista brasileiro

A missão como teologia, em última instância, fundamenta-se na conhecida


teologia dialética de Karl Barth e, em especial, na sua tese sobre cristologia. Como
afirma Bürkle:

27
BOSCH, Missão transformadora, p. 160.
28
GARCIA, Paulo Roberto. O sofrimento e a missão: reflexões a partir de 2 Coríntios 10-13. Revista
Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 15, n. 1, p. 30, jan./jun. 2010.
197

O mais óbvio é reconhecer, em especial, pelo impacto da assim


chamada teologia dialética de Karl Barth. Aqui cristologia é tema
central do desenvolvimento da dogmática da Igreja e sua expressão
direta foi encontrada na teologia da missão. A tese é o próprio Cristo,
o missionário e a idéia de que a missio Dei se distingue de missões
humanas, mas em última análise, independentemente, se esta
atividade correspondeu à relativização de todas as ações provisórias,
à luz da finalidade da ação divina29 (tradução nossa).

Portanto, entende-se que é de fundamental importância localizar a missão


como teologia, pois a apresentação dos fundamentos ou das bases essenciais do
cristianismo representa uma tarefa missionária. A teologia da missão é que
desenvolve, ou deveria desenvolver a reflexão dos temas centrais da fé cristã, por
exemplo, a revelação, a esperança, a fé, a conversão, a comunhão, a vocação, o
amor, dentre muitos outros considerados importantes para a compreensão das
dimensões do Reino de Deus. Moltmann, na construção da Teologia da Esperança,
concluiu:

A missão hoje só presta serviço quando contagia os seres humanos


com a esperança. A missão está a serviço do despertar de uma
esperança viva, ativa e apaixonada pelo reino de Deus, o qual vem
ao mundo para transformá-lo. Essa é uma tarefa de toda a
cristandade e não só de alguns encarregados especiais. Toda a
cristandade é chamada ao apostolado da esperança em favor do
mundo e nele encontra sua essência, isto é, aquilo que a torna
comunidade de Deus.30

Partindo do pressuposto do Reino de Deus como espaço de concretização da


ação missionária, o metodismo brasileiro no PVM situa a missão como teologia
central da Igreja, pois a “missão de Deus no mundo é estabelecer o seu Reino.
Participar da construção do Reino de Deus em nosso mundo, pelo Espírito Santo,
constitui-se na tarefa evangelizante da Igreja”. 31 O termo construção do Reino de
Deus não representa uma unanimidade no pensamento teológico cristão. Essa

29
BÜRKLE, Horst. Missionstheologie. Stuttgart: Kohlhammer, 1979, p. 19. Texto original: “Am deutlichsten ist das
bei den Auswirkungen der durch Karl Barth bestimmten sog. dialektischen Theologie zu erkennen. Hier hat die
cristozentrische Entfaltung der Kirchlichen Dogmatik ihren unmittelbaren Niederschlag in der Theologie der
Mission gefunden. Die These Christus selbst ist der Missionar und die Vorstellung, dass die missio Dei vom
menschliche Mis-sionswerk nicht zur zu unterscheiden, sondern letztlich unabhängig sei, entsprach dabei der
Relativierung alles vorläufigen Tuns im Lichte der Endgültigkeit göttlichen Han-delns”.
30
MOLTMANN, Jürgen. Teologia da Esperança: estudos sobre os fundamentos e as conseqüências de uma
escatologia cristã. 3. ed. São Paulo: Teológica; Loyola, 2005, p. 408.
31
IGREJA METODISTA. Vida e missão: decisões do XIII Concílio Geral da Igreja Metodista. Piracicaba: Editora
Unimep, 1982, p. 11.
198

questão foi analisada por Antonio Gouvêa Mendonça e Prócoro Velásquez Filho,
que alegam:

O escolasticismo e o pietismo tendem a reduzir as tensões


teológicas; a doutrina da Igreja espiritual procura afastar a Igreja das
questões sociais perturbadoras como a escravidão; o apocalipsismo
remete o Reino de Deus para além da história. Desconfia-se da
capacidade humana para participar significativamente da construção
do Reino; recusa-se este mundo em favor de um outro que será
produto da irrupção do sobrenatural na história.32

Porém, na análise da Teologia Latino Americana feita por Gustavo Gutiérrez


essa tensão é superada a partir da seguinte compreensão:

O crescimento do Reino de Deus é um processo que se dá


historicamente na libertação – enquanto esta significa maior
realização da pessoa, condição de uma sociedade nova -, porém não
se esgota nela; realizando-se em feitos históricos libertadores,
denuncia seus limites e ambigüidades, anuncia-lhe a plena
realização e impele-o efetivamente à comunhão total. [...] Pode-se
dizer que o fato histórico, político, libertador é crescimento do Reino,
é acontecer salvífico, mas não é a chegada do Reino, nem toda a
salvação.33

Assim, a compreensão do PVM como teologia de missão do metodismo


brasileiro entende que a aplicação do termo construção do Reino de Deus não é
equivocada. Ademais, o desejo missionário a partir do PVM é compreender que “o
fazer a missão é participar desta ação em favor da expansão e crescimento do
Reino”.34

A missio Dei, portanto, pode ser incluída como teologia fundante do


metodismo. Pois, no que diz respeito ao relacionamento de Deus com a
humanidade, a graça divina antecede tudo e todos, e este relacionamento está
marcado pela misericórdia e amor divinos, que Wesley, ancorado na teologia
paulina, traduz como Graça. Textos tais como a carta pessoal ao companheiro
Timóteo (“Deus nos salvou e chamou para a santidade, não em atenção às nossas

32
MENDONÇA, Antonio Gouvêa; VELASQUES FILHO, Prócoro. Introdução ao protestantismo no Brasil. São
Paulo: Loyola; São Bernardo do Campo: IEPG, 1990, p. 137.
33
GUTIÉRREZ, Gustavo. Teologia da libertação: perspectivas. 3. ed. São Paulo: Loyola, 1979, p. 238.
34
LOCKMANN, Paulo Tarso de Oliveira. O Reino de Deus – seu lugar bíblico-teológico no Plano para a Vida e a
Missão da Igreja. Revista Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 12, n. 20, p. 49, jul./dez. 2007.
199

obras, mas em virtude do seu desígnio, da graça que desde a eternidade nos
destinou em Cristo Jesus”, 2 Timóteo 1, 9) e a carta comunitária aos Efésios
(“Porque é gratuitamente que fostes salvos mediante a fé. Isto não provém de
vossos méritos, mas é puro dom de Deus”, Efésios 2, 8) permitem observar o
delineamento de uma soteriologia no pensamento paulino.

Nesta mesma direção pode-se observar Wesley, quando em seus escritos


trata do mesmo tema. No sermão 85, cujo título é “Desenvolvendo nossa própria
salvação”, Wesley afirma:

Nenhum homem vivo está inteiramente destituído do que é


comumente chamado de consciência natural. Mas isso não é natural.
É mais corretamente designada de graça preveniente. Todos os
homens têm de certo modo, em maior ou menor grau, esta graça,
que não depende da iniciativa humana. Toda pessoa, tem, cedo ou
tarde, bons desejos, embora em geral os reprimam, antes que
possam extirpar a raiz profunda do pecado, ou produzir algum fruto
bom. Todos têm em alguma medida aquela luz, alguns somente
fracos raios, e que, cedo ou tarde, mais ou menos, ilumina a todo o
homem que vem ao mundo. E cada um, a menos que ele pertença
ao menor número daqueles cuja consciência está cauterizada, sente-
se mais ou menos desconfortável, quando age contrário à luz de sua
própria consciência. De modo que o homem peca não porque não
tenha a graça de Deus, mas porque não faz uso da graça que tem.35

Para ele, assim como para os arminianos, a graça preveniente na soteriologia


pode ser compreendida dentro do conceito da missio Dei, uma vez que “ela
prepara para a aceitação da graça salvífica através dos processos da natureza e
da história”.36

3 O paradigma missionário na teologia de missão do


metodismo latino-americano
Não foram poucas as contribuições teológicas para a construção de novos
modelos missionários para a Igreja na América Latina. Dentre os muitos teólogos

35
WESLEY, John. Obras de Wesley. Tomo VII. Editor General: Justo González. Franklin: Providence House
Publishers, 1996-1998 (Edición auspiciada por Wesleyan Heritage Foundation), p. 124.
36
TILLICH, Paul. Teologia sistemática. São Leopoldo: Sinodal, 2005, p. 289.
200

protestantes e católicos podem ser citados Leonardo Boff, Clodovis Boff, Gustavo
Gutiérrez, José Comblin, João Batista Libânio, Antônio Moser, Benedito Ferraro,
Hugo Assmann, Marcelo Barros, Alberto Antoniazzi, Faustino Teixeira, José
Duque, Julio de Sant’Ana, Sante Uberto Barbieri, José Miguez Bonino, Mortimer
Arias. Não pelo valor da respectiva contribuição, mas sim pela proximidade com o
metodismo brasileiro, destaca-se o pensamento dos dois últimos da lista acima.

3.1 Contribuições de José Míguez Bonino

José Míguez Bonino, teólogo metodista argentino, oferece uma significativa


contribuição na discussão para a teologia de missão. Sua obra “Rostos do
protestantismo latino-americano”37 inovou o pensamento missionário da América
Latina ao utilizar-se hermeneuticamente da Trindade como princípio missionário
(missio Dei) e de matizes que compõem a gênese do protestantismo latino-
americano com as suas faces “liberal, evangelical e pentecostal”. Segundo Míguez
Bonino, cada qual se manifesta com rosto próprio e possui sua afinidade com uma
das pessoas da Trindade.

Míguez Bonino, ao debater sobre a face liberal, considera como muito frágil e
reducionista a “análise do que Jean-Pierre Bastian qualifica – e descarta – como a
‘hipótese conspirativa’”.38 Sua opção é pela análise que o próprio Bastian chama
de “hipótese associativa”.

O valor desta hipótese reside no fato de reconhecer que a entrada do


protestantismo se explica fundamentalmente por uma situação
endógena à América Latina (a luta por uma modernização liberal) e
que aí o protestantismo se alia com setores latino-americanos que
impulsionaram tal projeto, principalmente (na tese de Bastian) com
as “associações libertárias” de distintos tipos (lojas maçônicas,
associações operárias, grupos de intelectuais, sociedades
parapolíticas).39

37
MÍGUEZ BONINO, José. Rostos do protestantismo latino-americano. São Leopoldo: Sinodal, 2002.
38
Ibidem, p. 10.
39
Ibidem, p. 11.
201

A análise de Míguez Bonino, na perspectiva do rosto liberal, contempla ainda


os desdobramentos da missão na América Latina a partir das iniciativas do
Congresso Evangélico do Panamá (1916), que reverte a situação do projeto
missionário latino-americano, uma vez que a Conferência de Edimburgo (1910) o
tinha colocado como um projeto marginal da discussão missionária mundial.
Míguez Bonino entende que o projeto liberal fracassou pela sua ambiguidade
teológica e a maior razão para o fracasso pode ser considerada a não inculturação,
isto é, não se popularizou. A adesão ao projeto foi de uma elite econômica e
cultural da América Latina. Porém, é importante ressaltar que esse rosto foi
fundamental na construção de uma religião com fortes traços de solidariedade e
benemerência.

O rosto evangélico tem o perfil da teologia pietista e representa a dimensão


onde as tensões missionárias são mais latentes. Os conflitos teológicos entre os
pensamentos arminiano e calvinista impulsionaram o protestantismo latino-
americano a repensar a sua inserção no espaço social, e a preocupação com a
liberdade religiosa passa a ser um tema missionário e político ao mesmo tempo. É
certo que o rosto evangélico alimenta posturas fundamentalistas. Míguez Bonino
avalia que:

No mundo de tradição wesleyana, a insistência na experiência da


“segunda bênção” – a plenitude da santificação – originou divisões
frente ao que alguns consideram um abandono da busca de
santidade por parte de igrejas metodistas: nascem assim, além do
Exército da Salvação (Inglaterra, 1880), a Igreja de Deus, a Aliança
Cristã e Missionária (1887), a Igreja do Nazareno (1908) e a Igreja
dos Peregrinos (Pilgrim Holiness Church, 1897). A importância desse
desenvolvimento para o nosso tema pode ser percebido na data de
entrada (de 1897 a 1914) de todas essas igrejas na América Latina.40

Esse rosto evangélico, na análise de Míguez Bonino, além de


denominacionalista é também individualista. Seu compromisso social fica na
superficialidade da caridade, sem compromisso com a transformação social.

O rosto pentecostal foge das dimensões do protestantismo histórico, pois sua


estrutura teológica composta pelos elementos maniqueísta, determinismo e

40
MÍGUEZ BONINO, Rostos do protestantismo latino-americano, p. 35.
202

pessimismo antropológico41 difere da organização teológica dos protestantes de


missão da América Latina. Míguez Bonino ainda analisa que o pentecostalismo
latino-americano não pode ser considerado de fonte única, a saber:

Douglas Petersen, missionário das Assembléias de Deus da Costa


Rica, sustenta em sua tese de doutorado que se deve falar de duas
correntes que convergem no movimento: a tradição wesleyana de
santidade e a linha pré-milenarista e dispensacionalista das
Conferências de Keswick e das “Prophecy Conferences” em sua
inserção dentro do movimento de Moody, Torrey e outros
evangelistas.42

Na dinâmica da análise dos rostos do protestantismo latino-americano,


Míguez Bonino destaca ainda a dimensão do rosto étnico. As tensões que
envolvem a dimensão étnica da missão são vistas pelo viés das igrejas
transplantadas, que mantém suas práticas litúrgicas, organizacional e missionária,
porém procuram conquistar os nativos do espaço onde está inserida. Há também
uma constante tensão e conflito com as chamadas igrejas étnicas que, por sua
vez, centralizam suas atividades com exclusividade para seus fiéis de origem
migratória. Por isso mantém não somente a estrutura litúrgica e organizacional,
mas inclusive o idioma de origem criando, assim, uma forma impermeável para a
recepção e convivência com os nativos.

A contribuição relevante de Míguez Bonino na construção de um paradigma


missionário, que parte de sua leitura teológica latino-americana, evidencia a sua
chave hermenêutica, que tem a Trindade como referencial teológico para o
protestantismo latino-americano. Portanto, ele estabelece a missão como princípio
material de uma teologia protestante latino-americana. Esse princípio tem por
objetivo a unidade da Igreja. No livro “A fé em busca de eficácia”, Míguez Bonino
expressa a preocupação da Teologia da Libertação com as transformações
sociopolíticas no interior do regime de cristandade na América Latina. A eficácia da
teologia deve ter seus reflexos na prática concreta do amor empenhada pela

41
MÍGUEZ BONINO, Rostos do protestantismo latino-americano, p. 62.
42
Ibidem, p. 61.
203

libertação, pressupondo que a leitura da realidade proporcione os recursos para


uma teologia politicamente eficaz43.

Por isso, se tenta descobrir um “princípio material”, ou seja, aquela


orientação teológica que, por expressar melhor a vivência e a
dinâmica da comunidade religiosa, dê consistência e coerência à
compreensão do evangelho e se constitua em ponto de referência
para a construção teológica dessa comunidade, temos de falar da
“missão como ‘princípio material’ de uma teologia protestante latino-
americana”.44

Míguez Bonino propõe “repensar” o conceito de missão na dimensão da


conversão para o metodismo latino-americano. Sua metodologia pressupõe três
conjuntos de fatores (teológico; filosófico, psicológico e sociológico; interioridade e
subjetividade). Para esta reflexão, destaca-se o nível teológico. Para ele, a
cristologia deve ser tomada como tema central e compreendida a partir do amor de
Deus pela humanidade. Isso “introduz uma mudança decisiva na concepção de
conversão”.45

Portanto, as contribuições de Míguez Bonino para a teologia de missão


metodista podem ser consideradas relevantes. David Ford, ao analisar as
tendências teológicas do século XX e na síntese da obra e pensamento de Míguez
Bonino, afirma:

O trabalho de Míguez Bonino demonstra a centralidade da história na


teologia da libertação latino-americana e a compreensão
sociopolítica da história. É importante ressaltar que a história
sociopolítica é fundamental para compreender não só por causa dos
argumentos sociológicos, isto é, que todo conhecimento é
historicamente condicionado, mas também por causa de argumentos
bíblicos: a História é o campo da ação de Deus, ação que é a
transformação da história através do amor46 (tradução nossa).

43
MÍGUEZ BONINO, José. A fé em busca de eficácia: uma interpretação teológica latino-americana sobre
libertação. São Leopoldo: Sinodal, 1987.
44
Ibidem, p. 107.
45
MÍGUEZ BONINO, José et al. Luta pela vida e evangelização: a tradição metodista na teologia latino-
americana. São Paulo: Paulinas, 1985, p. 137.
46
FORD, David. The Modern Theologians: An Introduction to Christian Theology in the Twentieth Century.
Malden: Blackwell Publishing, 1997, p. 419. Texto original: “Miguez Bonino's work demonstrates the
centrality of history in Latin American liberation theology, and the sociopolitical understanding of history. It is
important to underscore that socialpolitical history is central to understanding not only because of sociological
arguments, that is, that all knowledge is historically conditioned, but also because of scriptural arguments:
History is the arena of God's action, action which is the transformation of history love”.
204

Assim, a significativa contribuição de Míguez Bonino para a teologia de


missão corrobora a dimensão da missio Dei e reafirma o paradigma do
envolvimento missionário com atitudes na dimensão do amor que exerce força
transformadora na sociedade por meio da Responsabilidade Social, Pregação e
Educação.

3.2 Contribuições de Mortimer Arias

Mortimer Arias é bispo emérito da Igreja Metodista da Bolívia e atualmente é


professor de Evangelismo na Iliff School of Theology. Arias lecionou na Claremont
School of Theology e foi presidente do Seminário Bíblico Latino-Americano na
Costa Rica. É autor de muitos livros e artigos sobre teologia latino-americana,
dentre os quais destacamos o título “Salvação hoje”.

A reunião do Conselho Mundial de Igrejas (CMI) em Bangkok, Tailândia


(dezembro de 1972 e janeiro de 1973), discutiu o tema da salvação hoje, que nas
reflexões foi dividido em subtemas: Cultura e identidade; Salvação e justiça social
e Igrejas renovadas em missão. Como fruto das discussões desta assembléia,
Mortimer Arias escreveu e/ou traduziu os debates para a América Latina,
utilizando, inclusive, o tema da conferência para título do livro.

Arias, na discussão sobre a salvação, afirma:

A busca contemporânea, entretanto, está marcada por novas


perspectivas e preocupações. O homem tomou consciência de sua
dimensão histórica, saiu de sua província geográfica para o universo
espacial. Descobriu seus direitos de homem e reclama sua plena
vigência. Preocupa-se não somente com seu destino individual, mas
também com o destino da própria humanidade. Descobriu suas
potencialidades criadoras e inventou engenhosos e complicados
instrumentos para dominar o mundo e colocá-lo a seu serviço. Por
outro lado, começa também a tomar consciência de suas limitações,
de seus impoderáveis, dos riscos da História. Deve fazer frente a
sistemas brutalmente repressivos ou a preconceitos profundamente
arraigados, que regem seu lugar a emergentes minorias e
postergadas maiorias. Precisa adaptar-se a normas e valores da
“grande sociedade” que escapam ao controle do indivíduo e
permeiam toda sua existência, ameaçando a própria privaticidade do
205

pensamento. A busca de salvação assume, então, novos e


desorientadores acentos e reveste-se de cores novas de
esperança.47

Pode-se considerar que a conclusão de Arias sobre a questão da salvação é


colocada para a Igreja como prática testemunhal, isto é, a Igreja enfrenta o desafio
de comunicar a salvação por meio de sua prática solidária a serviço da
humanidade. A Igreja deve assumir o papel de agente de Deus na missio Dei, e o
seu envolvimento missionário em perspectiva histórica oferece uma identidade com
os propósitos salvíficos e a torna agente de Deus na história.

Quando a Igreja se distancia da mensagem bíblica da salvação ela não


assume o papel de agente de Deus no processo histórico da mesma, enquanto a
Igreja comprometida com tal mensagem percebe que as lutas humanas pela
dignidade e cidadania representam desafios no contexto da salvação hoje.

Para Arias, a salvação contempla a dimensão integral do ser humano, em


seu conceito a salvação é total. Não existe dicotomia entre salvação pessoal e
social e/ou salvação espiritual e material. Seu conceito de salvação é assim
resumido:

Não há salvação material sem salvação espiritual, nem salvação


cristã que ignore a realidade social e material. Assim o testemunhar a
Bíblia e nossa experiência contemporânea o exigem.48

Diante disso, o pensamento de Arias sobre salvação é compreendido na


complexidade histórica da humanidade e as dimensões de compreensão do termo
ultrapassam os limites da religião, englobando situações tais como: luta pela justiça
econômica contra a exploração do homem pelo homem; luta pela dignidade
humana contra a opressão política dos povos; luta pela solidariedade contra a
alienação de algumas pessoas de outras e luta pela esperança contra o desespero
na vida pessoal.

Na sua reflexão sobre a situação latino-americana, Arias se utiliza do binômio


cativeiro-libertação. Para ele, o cativeiro da igreja evangélica na América Latina é o
47
ARIAS, Mortimer. Salvação hoje. Petrópolis: Vozes, 1973, p. 12.
48
Ibidem, p. 29.
206

cativeiro missionário que a impede de se dirigir a seu próprio povo em suas


próprias palavras desde suas próprias necessidades.

Na discussão sobre a teologia de missão no contexto latino-americano, Arias


contribui com a sua reflexão, em especial, advertindo sobre as mudanças ocorridas
no pensamento wesleyano por ocasião da “implantação do metodismo na América
do Norte até o final do século XIX” 49. Esse pensamento é corroborado com a tese
de Darrel L. Guder no livro “Missional Church: A Vision for the Sending of the
Church in North America”, que analisa a crítica de Arias:

Duas tendências na longa história da cristandade ajudam a explicar


esse padrão perturbador. Em primeiro lugar, a Igreja tem tendência
para separar a notícia do Reino de Deus da provisão de Deus para a
salvação da humanidade. Esta separação tornou a salvação um
evento privado, dividindo "a minha salvação pessoal" do advento do
Reino de Deus, a cura sobre todo o mundo. Em segundo lugar, a
Igreja tem também uma tendência a imaginar-se em uma variedade
de maneiras estranhas ao que deve ser fundamental para ela - sua
relação com o reino de Deus. Se foi o anuncio de Jesus do reino de
Deus que reuniu pela primeira vez a Igreja nascente em comunidade,
e se essa igreja cresceu e amadureceu em torno da maneira que o
reino encontrou significado e esperança em sua morte e
ressurreição, então a igreja deve sempre buscar sua definição com o
reino de Deus em Cristo como seu ponto de referência
fundamental.50

Arias, além de analisar criticamente essa dicotomia missionária, proporá para


a teologia de missão latino-americana um paradigma missionário que contemple
um discipulado derivado do ministério de Jesus. Não é permitido, da perspectiva
bíblica, um movimento missionário que seja de origem autônoma. Suas análises
sobre a teologia da missão conduzem a uma leitura bíblico-teológica na dimensão

49
MENDONÇA; VELASQUES FILHO, Introdução ao protestantismo no Brasil, p. 97.
50
GUDER, Darrel L. (Org.). Missional Church: A Vision for the Sending of the Church in North America. Grand
Rapids: B. Eerdmans Publishing, 1998, p. 92. Texto original: “Two tendencies in the long history of Christendom
help to explain this troublesome pattern. First, the Church has tended to separate the news of the reign of God
from God's provision for humanity's salvation. This separation has made salvation a private event by dividing
"my personal salvation" from the advent of God's healing reign over all the world. Second, the church has also
tended to envision itself in a variety of ways unconnected to what must be fundamental for it - its relation to the
reign of God. If it was Jesus announcement of the reign of God that first gathered the fledgling church into
community, and if that church grew and matured around the way that reign found meaning and hope in his
death and resurrection, then the church must always seek its definition with the reign of God in Christ as its
crucial reference point”.
207

da comunhão, a ponto de afirmar que “comunhão e comunidade são o propósito


último da missão”.51

Arias afirma que a “Memória subversiva de Jesus”52 está narrada nas


Escrituras e o Espírito Santo nos desafia a dar respostas criativas e fiel na
transformações social existentes em nosso mundo como gestos de missão em
nosso tempo e espaço.

A grande contribuição de Arias na discussão da teologia de missão para o


contexto latino-americano metodista pode ser percebida, também, no texto
“Hermenêutica da libertação: uma jornada pastoral”. A dimensão da libertação
como projeto missionário conduz a uma hermenêutica de um povo peregrino e um
livro de peregrinos, como diz Arias. A teologia de missão aqui está centrada no
amor libertador de Deus e o comprometimento com seu Reino. Conforme Arias:

O que a Bíblia tem a nos dizer enquanto a libertação não chega? É


um fato histórico que as comunidades fiéis, e aqueles que trabalham
para a libertação humana, têm de viver a maior parte de suas vidas e
por toda uma geração, sem a vinda do evento libertador. A Bíblia não
é um manual para a liberação. Pelo contrário, a Bíblia tem a palavra
de garantia sobre o amor de Deus, a presença de Deus em cada vida
humana, o perdão de Deus e consolo em tempos de derrota e perda,
e o plano de Deus para a humanidade e para o mundo - o reino de
Deus53 (tradução nossa).

Arias afirma que “a missão da Igreja é ser testemunha da graça libertadora do


amor de Deus em Cristo”.54 Portanto, para ele a teologia de missão, a partir de
uma hermenêutica libertadora, significa a missio Dei na perspectiva de meta
missionária. A graça libertadora de Deus é desenvolvida por meio da prática

51
GEORGE, Sherron Kay. Participantes da graça: parceria na missão de Deus. São Leopoldo: Sinodal, 2006, p.
24.
52
ARIAS, Mortimer. Anunciando el Reinado de Dios. Costa Rica: Varitec, 1998, p. 127.
53
BOTTA, Alejandro F.; ANDIÑACH, Pablo R. The Bible and the Hermeneutics of Liberation. Atlanta: Society of
Biblical Literature, 2009, p. 233. Texto original: “What has the Bible to say to us while liberation does not arrive?
It is a fact of history that the faithful communities, and those working for human liberation, have to live most of
their lives and for a whole generation without the coming of the liberative event. The Bible is not a handbook for
liberation. Rather, the Bible has the word of assurance about God's love, God's presence in every human life,
God's forgiveness and consolation in times of defeat and loss, and God's plan for humanity and for the world -
the reign of God”.
54
ARIAS, Mortimer. De Lutero a Wesley e de Wesley a nós. Revista Caminhando, São Bernardo do Campo, v.
8, n. 2, p. 34, 2003.
208

espiritual na dimensão da piedade e da misericórdia. Essa meta se conquista com


o exercício da fé nas atitudes da Responsabilidade Social, Pregação e Educação.

Destaca-se que esta pesquisa identifica como paradigmas da missão


metodista os seguintes elementos: a missio Dei; a soteriologia social de Wesley; a
história como campo da ação de Deus e espaço de transformação social,
desenvolvidos por Míguez Bonino; o testemunho como graça libertadora do amor
de Deus em Cristo no pensamento de Arias, e a tríade — Responsabilidade Social,
Pregação e Educação, entendida aqui como fundamental na constituição da
teologia de missão metodista brasileira.

4. O paradigma missionário presente no Plano para Vida e


Missão e no Programa Dons e Ministérios do metodismo
brasileiro: o Rito de Passagem da Igreja transplantada para
Igreja encarnada
O metodismo brasileiro possui um legado missionário, como exposto, de uma
teologia de missão conceitualmente aceita como missio Dei. Se, por um lado, este
legado realinha o metodismo brasileiro nessa direção, por outro, não há como
negar os desvios que ele enfrentou na sua trajetória, desde a sua implantação até
os dias atuais.

Após tentativas frustradas, como fruto da Consulta Nacional Missionária sobre


a Vida e a Missão da Igreja, de 1981, o metodismo brasileiro organiza e aprova no
Concílio Geral de 1982 o “Plano para a Vida e a Missão da Igreja”, que representa
a continuação dos Planos Quadrienais de 1974 e 1978. É importante destacar que
a consulta missionária foi o principal evento da celebração do 50º aniversário de
autonomia da Igreja Metodista em terras brasileiras (1930-1980). Esse documento
procura não somente construir uma teologia de missão para a realidade brasileira,
mas responsabiliza a ação da Igreja militante como transformadora e, por isso,
categoricamente afirmará que “o metodismo demonstra permanente compromisso
com o bem estar da pessoa total, não só espiritual, mas também em seus aspectos
209

sociais”.55 Esse conceito da teologia de Wesley e de teólogos metodistas latino-


americanos, já discutido dentro do paradigma da missio Dei, assemelha-se à
proposta de Orlando Costas quando afirma:

A missão da Igreja é profética, sacerdotal e real, constituída por um


povo escolhido, peregrino e apostólico que é o corpo de Cristo e
templo do Espírito Santo, mas que se manifesta em situações
concretas e, por tomar diversas formas temporais, tem de ser visto
como um organismo dinâmico que se estabelece no mundo para
cumprir sua tarefa de ser uma Instituição.56

O tema da Missão será abordado no PVM como responsabilidade da Igreja


para com o ser humano na sua integralidade. Portanto, a organização teológica do
PVM pode ser assim compreendida:

a) Bases históricas do metodismo – A herança wesleyana;

b) Bases bíblicas – Entendendo a vontade de Deus;

c) Análise de conjuntura – Necessidades e oportunidades;

d) Bases Estratégicas – O que é trabalhar na missão de Deus?; Como


participar da missão de Deus?; Situações nas quais acontece a missão;
Os frutos do trabalho na missão de Deus e Herança e vitória na missão de
Deus.

Como o PVM representava um forte momento de transição no metodismo


brasileiro, as ações desenvolvidas para sua implementação foram cobertas de
ambiguidades e podem ser classificadas como um Rito de Passagem.57 John
Milbank faz a seguinte análise:

Todas as culturas instituem estágios de vida, o que significa que


sempre haverá momentos e épocas de ambiguidades em que um
indivíduo abandonou um papel antigo, mas ainda não assumiu por

55
IGREJA METODISTA, Vida e missão, p.38.
56
COSTAS, Orlando. Hacia una teologia de la evangelizacion. Buenos Aires: Ed. La Aurora, 1973, p. 147.
57
Cf. GENNEP, Arnold van. The Rites of Passage. Chicago: Chicago University Press, 1960, p. 189-194: Ritos
de passagem são celebrações que marcam mudanças de status de uma pessoa no seio de sua comunidade.
Os ritos de passagem podem ter caráter religioso, por exemplo. Cada religião tem seus ritos de
passagem,sendo parecidos com de outras religiões, ou não. O termo foi popularizado pelo antropólogo alemão
Arnold van Gennep no início do século vinte.
210

inteiro um novo. De igual forma, todas as culturas tentam classificar


as coisas em tipos e, como nenhuma classificação dessa espécie
pode ser exaustiva, permanecem sempre certas coisas de status
ambíguo. Pode-se afirmar que, em ambos os casos, as ameaças à
identidade social são diluídas por meio da sacralização de épocas e
lugares incertos, da sua transformação em tabu e da limitação com
rituais e cerimônias.58

Até o Concílio Geral de 1982 o metodismo brasileiro reproduziu uma estrutura


organizacional do metodismo mundial e latino-americano. Sua estrutura funcional
se articulava com as representações leigas nas diversas comissões da Igreja.
Essas comissões tinham seu formato na igreja local e se reproduziam de formas
representativas em nível regional e geral. Tal estrutura necessariamente não
representava um projeto missionário inculturado, pois a autonomia de 1930 não
representou para o metodismo brasileiro uma nova estrutura organizacional nem
um novo modo de fazer missão.

Contudo, o contexto latino-americano, atolado num regime militar excludente,


suscita nas suas igrejas uma busca por novos horizontes na discussão do projeto
missionário. Como já argumentado no início deste capítulo, a partir da análise de
Longuini Neto duas correntes teológicas (evangelical e ecumênica) permeavam o
ambiente religioso brasileiro. E, no que diz respeito à leitura de conjuntura, uma
não difere da outra:

Quando da realização do CLADE II a América Latina já não era mais


a mesma e o protestantismo também já não era mais o mesmo. O
continente continuava em crise, contudo as ditaduras militares
haviam dominado o cenário político latino-americano, aprofundava-se
a crise econômica e com os países asfixiados pela dívida externa. A
Igreja Católica passava por momentos de renovação após as
conferências de Medellín e Puebla e as Comunidades Eclesiais de
Base representavam uma grande esperança no fermento religioso
latino-americano, também agitado pelo pentecostalismo.59

O CLADE II, evento este organizado pelo movimento evangelical, aconteceu


no período de 31 de outubro a 9 de novembro de 1979, em Lima (Peru), sob o
tema “Para que a América Latina ouça a voz de Deus”. Não só o CLADE II revela
preocupações com o ambiente sócio-político da América Latina. Em 1978, na

58
MILBANK, John. Teologia e teoria social: para além da razão secular. São Paulo: Loyola, 1995, p. 165.
59
LONGUINI NETO, O novo rosto da missão, p. 182.
211

cidade Oaxtepec (México) acontece a Assembléia de Igreja Cristãs, promovida


pelos protestantes latino-americanos. O tema da Assembléia é “Unidade e Missão
na América Latina” e a leitura de realidade por ela feita assinala:

[...] O capitalismo internacional subordina estes últimos a seus


interesses de lucro e acumulação, pelo que gera a debilitação das
condições de intercâmbio, a dependência tecnológica, o controle
político-militar, o fortalecimento das relações de domínio interno e o
aumento da dívida externa que alcança cifras astronômicas [...].60

É nesse contexto que se organiza o Conselho Latino Americano de Igrejas


(CLAI), órgão de caráter ecumênico ao qual a Igreja Metodista se filiará, bem como
ao seu segmento brasileiro, o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (CONIC),
conforme registra a Ata do 13º Concílio Geral da Igreja Metodista:

CONSELHO LATINO AMERICANO DE IGREJAS “CLAI” – Proposta:


Considerando que a Igreja Metodista vem participando da
organização do CLAI e que esse organismo se constituirá
brevemente; considerando parecer favorável do Colégio Episcopal;
resolve (o Conselho Geral) propor ao XIII Concílio Geral o ingresso
da Igreja Metodista no Conselho Latino Americano de Igrejas. Depois
que alguns pronunciamentos foram feitos, o assunto foi colocado a
voto e aprovado por 55 votos a favor e 5 contrários.61

O resultado do processo de ingresso da Igreja Metodista em órgãos


ecumênicos, como o CLAI E CONIC, não dá conta das tensões existentes. Uma
leitura das atas e documentos revela que o modelo de Igreja está em disputa. Se,
por um lado, um grupo deseja uma Igreja comprometida com as lutas políticas e
sociais da América Latina (antes da aprovação de entrada no CLAI foi aprovada
uma moção de apoio a El Salvador62), por outro, participantes do concílio
advertiam a Igreja com declarações de voto como: “O envolvimento político de
ministros de várias Igrejas, inclusive a nossa, metodista, no nosso entender, tem

60
CLAI. Oaxtepec 1978: unidad y misión en América Latina. Costa Rica: Comité Editorial del CLAI, Consejo
Latinoamericano de Iglesias, 1980, p. 206.
61
IGREJA METODISTA. Atas e Documentos do XIII Concílio Geral. Belo Horizonte: Igreja Metodista, 1982, p.
47.
62
Cf. AQUINO, Rubim Santos Leão de. Sociedade brasileira: uma história através dos movimentos sociais. Rio
de Janeiro: Record, 2007, p. 803: “A conjuntura internacional foi marcada pela acentuado contraste entre a
crescente agressividade dos governos norte-americanos de Ronald Reagan (1981-1988) e George Bush
(1989-1992) e a cada vez mais evidente crise da URSS. [...] Foram os casos das intervenções ocorridas em El
Salvador, Nicarágua, Guatemala, Jamaica, Suriname, Granada e Panamá”.
212

trazido sérios prejuízos à obra de Deus”. 63 Portanto, o PVM representa um rito de


passagem da Igreja Metodista que, após alguns ensaios com os Planos
Quadrienais de 1974 e 1978 os quais, na opinião de Clovis P. Castro “representou
um período de avanços e retrocessos” 64, assume em um espaço conciliar um novo
compromisso missionário.

A própria afirmação no conteúdo histórico do Plano garante um momento


novo da discussão missiológica da Igreja:

A experiência do Colégio Episcopal e de vários segmentos da Igreja


Metodista nesses últimos anos indica que o metodismo brasileiro
está saindo da profunda crise de identidade que abalou nossa Igreja
após a primeira metade da década de sessenta.65

Certamente a afirmação referente à crise de identidade dos anos de 1960


representa todo o processo político latino-americano declarado tanto na
conferência evangelical de CLADE II como na organização ecumênica do CLAI.

Apesar da tensão e a ambiguidade presentes no 13º Concílio Geral de 1982,


pois se este aprovou o PVM após um longo período de estudos e debate, obtendo
um resultado tranqüilo. Assim, também, como no ingresso no CLAI. O mesmo não
acontece com a proposta do Conselho Geral da Igreja para ingresso no organismo
ecumênico brasileiro — o CONIC. Pelo contrario, a votação para entrada no
CONIC é aprovada de forma apertada, por apenas cinco votos de diferença. Tal
postura certamente comprometerá a implementação do PVM, pois o mesmo possui
uma fundamentação pastoral-teológica e histórica na linha do ecumenismo e
propõe uma vivência prática dessas relações, e o que se percebe é que a Igreja
teme por seu envolvimento ecumênico e político social.

Se entendermos que o PVM é o resultado de ensaios dos Planos Quadrienais


de 1974 e 1978, pode-se então categorizar o surgimento desse plano como um
Rito de Passagem de uma Igreja de manutenção para uma Igreja missionária. Isto

63
IGREJA METODISTA, op. cit., p. 68.
64
CASTRO, Clovis Pinto de; CUNHA, Magali do Nascimento. Forjando uma nova Igreja: dons e ministérios em
debate. São Bernardo do Campo, Editeo, 2001, p. 15.
65
IGREJA METODISTA. Cânones 2007. São Paulo: Cedro, 2007, p. 36.
213

é, a passagem de uma Igreja que até o presente momento trabalhava de forma


exaustiva para descobrir sua vocação missionária, mas que, sempre influenciada
pelo modelo estrutural importado, não dava conta das demandas decorrentes de
um continente imerso numa profunda crise política, social e eclesiológica.

Importa observar que o PVM assume o conceito de missão estabelecido pelo


Congresso de Missão de Willingen (1952), a saber: a missio Dei. Tal compreensão se
dá na afirmação do plano no contexto do tema:

Compreendendo a vontade de Deus: a missão é de Deus — Pai, Filho


e Espírito Santo. O objetivo é construir o Reino de Deus. O seu amor é
a força motivadora de sua presença e ação. Ele trabalha até agora (Mt
28,19; Jo 3,16).66

Após o Concílio Geral de 1982, não obstante o grande avanço da proposta


missionária, a Igreja ainda vive velhas estruturas organizacionais, um formato
eclesiológico híbrido, o que faz com que o seu governo seja carregado de tensões
e ambiguidades. Se, por um lado, precisa garantir a presença leiga na estrutura
organizacional, por outro, os clérigos não poderiam ficar de fora. Assim, o
Conselho Geral da Igreja passou a ser presidido por um leigo e o Colégio
Episcopal pelo bispo presidente. Esse modelo se reproduziu na organização das
regiões eclesiásticas. Tal hibridez gerou profundos conflitos na administração
eclesiástica, o que resultou na busca de um novo modelo de organização para a
Igreja.

A mudança de uma Igreja de cargos para uma Igreja de Dons e Ministérios67


não acontece num clima ameno no mundo interno da Igreja Metodista brasileira. “O
PVMI de corte liberal-progressista, aprovado em 1982, havia incomodado a setores
da Igreja, principalmente aos conservadores e carismáticos”. 68 Aqui se pode focar
o termo Rito de Passagem, porque a decisão do Concilio Geral de 1987 procurou
enterrar o modelo híbrido da organização da Igreja. Porém, a proposta de Dons e
Ministérios não surge como proposta organizacional de gestão eclesiástica. Trata-

66
IGREJA METODISTA, Vida e missão, p. 12.
67
Para aprofundar este tema ver: CASTRO, Clovis Pinto de; CUNHA, Magali do Nascimento. Forjando uma nova
Igreja: dons e ministérios em debate. São Bernardo do Campo, Editeo, 2001.
68
CASTRO; CUNHA, Forjando uma nova Igreja, p. 25.
214

se de uma alternativa ou válvula de escape para a situação conflitante da Igreja.


Acreditava-se que o novo modelo traria uma organização mais simples para as
igrejas locais, regiões eclesiásticas e área geral da Igreja. Um ano após a
realização do Concílio Geral, entre os dias 16 e 21 de agosto de 1988, na cidade
de Venda Nova/MG, a Igreja Metodista realiza o Ministerial Nacional dos pastores
e pastoras, e tem como foco a discussão do novo modo de ser da Igreja. Dons e
Ministérios é o tema central das palestras, liturgias, debates e conversas de
corredores.

O Bispo Isac Aberto Rodrigues Aço detecta em sua fala que a decisão
precisa ser avaliada com cuidado. Ele categoriza que foi criada uma situação sui
generis:

A situação “sui generis”, peculiar, que vivenciamos teve início


quando quisemos ampliar a participação do povo através do
desafio ao descobrimento e desenvolvimento dos dons, para um
ministério ou ministérios mais eficazes. O Concílio Geral votou o
governo e administração episcopal, sem que abrisse os canais,
ao menos como estrutura prevista para o equilíbrio entre o
ministério episcopal, o ministério pastoral e o ministério de todos
os demais membros. Caminhávamos para uma igreja mais
participativa, porém, fomos colocados diante da possibilidade de
mais centralização, quer nos bispos, quer nos pastores. 69

Diante de tal afirmação, entende-se que o Rito de Passagem não estava


somente nas questões organizacionais. Tal postura representa uma nova
eclesiologia, onde o envolvimento dos fiéis com os problemas da sociedade
representa o espaço da missão. E isso pode ser notado até mesmo no estilo da
literatura produzida na época de implantação do PVM.

Como analisado no primeiro capítulo, as tensões que o PVM gerou em


alguns setores da Igreja Metodista fez com que a publicação do texto para as
comunidades locais ficasse parada por um tempo. Sua primeira publicação se
dará por iniciativa de uma instituição de ensino, o IEP/UNIMEP, que obviamente
tinha interesse que o documento fosse conhecido e fortalecido na Igreja. Sua

69
COLEGIO EPISCOPAL. A Igreja de Dons e Ministérios: a visão dos bispos. Piracicaba: Agentes da Missão,
1991, p. 25.
215

capa, como se pode observar abaixo, engloba o mapa da América Latina como
forma de fortalecer os movimentos sociais que emergiam no continente.

Figura 4 — Capa do PVM

Fonte: IGREJA METODISTA. Vida e Missão: decisões do XIII Concílio Geral da Igreja Metodista.
Piracicaba: Editora Unimep, 1982.

Isto também é percebido no livreto publicado pelo IEP/UNIMEP por ocasião


da celebração de um ano do PVM. O título “100 anos de busca... 1 ano de Vida e
Missão” é oferecido às igrejas locais com um formato editorial bem popular. Essa
publicação foi de responsabilidade do departamento de filosofia e teologia da
Universidade Metodista de Piracicaba, e tem por objetivo o debate do “‘Plano para
Vida e Missão’ buscando sempre que neste processo pedagógico seja compatível
com sua proposta pastoral”.70

70
GOULART, Acir; ROMERO, Francisco; ROMERO, Maria Rosa. A vontade de Deus. Piracicaba: Unimep, 1983
(Cadernos Vida e Missão), p. 3.
216

A figura 5 procura representar o ambiente eclesiástico popular do momento


final de um culto dominical. A dimensão da missão será enfatizada fora do espaço
privado do templo. Toda a reflexão será desenvolvida com o objetivo de fortalecer
uma pastoral popular, engajada com os movimentos sociais e crítica ao modelo
estabelecido de sociedade. A Bíblia será a ferramenta principal para toda a
inspiração na busca de mudanças sociais necessárias. A nova hermenêutica será
a força motriz para as transformações necessárias no contexto da missão.

Figura 5 — A missão é dialogada do lado de fora do templo


217

Fonte: GOULART; ROMERO; ROMERO, A vontade de Deus, p. 5.

O desenvolvimento do texto objetiva uma nova reflexão religiosa. Os


personagens da história em quadrinhos debaterão a validade ou não da nova
hermenêutica bíblica e a proposta do texto é o que se pode verificar na figura 6.

Figura 6 — A fé conjugada com a discussão política


218

Fonte: GOULART, ROMERO; ROMERO, A vontade de Deus, p. 10.

Assim, é possível afirmar que os novos paradigmas contidos no PVM e a


metodologia proposta nos Dons e Ministérios contribuem de forma decisiva na
reorganização da tríade missionária metodista — Responsabilidade Social,
Pregação e Educação. As contribuições podem ser notadas nos aspectos que se
seguem.

4.1 Contribuição à luz da Responsabilidade Social

A herança wesleyana quanto à Responsabilidade Social é incontestável no


campo religioso. A doutrina social da Igreja Metodista representa elemento
fundante do metodismo histórico. Esta, expressa no Credo Social, significa uma
singularidade no mundo religioso e, em especial, no mundo protestante. É
importante considerar que “o ‘social’ em Wesley é teológico — espelha uma
hermenêutica bíblica do indivíduo socializado e do povo que se consubstancia em
pessoas”.71

71
JOSGRILBERG, Rui de Souza. Qual o sentido de “Social” na “Religião Social” de John Wesley? In:
RENDERS, Helmut et al. Sal da terra e luz do mundo. São Bernardo do Campo: Editeo, 2009, p. 64.
219

A Ação Social dentro das ações eclesiais é conhecida como diaconia. É


necessário recorrermos ao processo de desenvolvimento histórico dessa atuação,
sua inserção nas práticas religiosas, sua dimensão pedagógica e até mesmo o seu
pioneirismo na atuação junto aos necessitados.

González e Cardosa Orlandi, ao descreverem a “História do movimento


missionário”, analisam o fenômeno pentecostal no Chile, inclusive dentro da Igreja
Metodista. Mas após os conflitos da ditadura militar e com a necessidade de
reconstruir o país, “um dos aspectos negativos sobre o avanço protestante no Chile
foi a carência de doutrina social”. 72 A única Igreja com declaração explícita sobre o
tema era a Metodista, mas que, por sua presença tímida no país, não exerceu
influência no processo.

As ações sociais que a Igreja desenvolve precisam ser de caráter


emancipatório e por isso não se divorciam da ação evangelizadora. A dificuldade
está centrada na dicotomia que se exerce nas ações ministeriais. A Igreja tem
dificuldades em estabelecer ações conjuntas, como afirma Emilio Castro:

A divisão programática do trabalho dentro da estrutura de nossas


Igrejas ilustra outra dimensão do problema. Temos, na maioria de
nossas Igrejas ocidentais, departamentos de ação social e
departamentos de evangelização, cada um tentando ser fiel ao seu
objetivo particular. Isso é útil até certo ponto, mas pode também levar
a uma abdicação de nossa responsabilidade cristã global. Há,
realmente, dons diferentes na vida da Igreja, que exigem uma divisão
lógica de vocações e tarefas. Mas se esses carismas - quer
considerados individualmente, quer organizados estruturalmente na
vida da Igreja — limitam ou distorcem o testemunho total do Reino,
então tornam-se um empecilho à missão da Igreja.73

As dificuldades que permeiam as ações ministeriais na ação social aos


poucos são superadas pelas políticas públicas estabelecidas ao longo da história
e, nos últimos anos, o tema da Responsabilidade Social ganha novo contorno com
a Lei do Terceiro Setor, em específico no contexto das instituições de ação social
das igrejas. A trajetória que possibilita ações mais integradas está intimamente
ligada às origens do metodismo e sua teologia missionária. Certamente o Credo

72
GONZÁLEZ; CARDOZA ORLANDI, História do Movimento Missionário, p. 418.
73
CASTRO, Emilio. Servos livres: missão e unidade na perspectiva do reino. Rio de Janeiro: CEDI, 1986, p. 27.
220

Social e o PVM possuem valores essenciais e podem ser considerados como as


razões ou os elementos que afirmam e reafirmam a tradição wesleyana na direção
da responsabilidade social.

Renders analisa o PVM como um documento correspondente à histórica


tradição do Credo Social Metodista quanto à sua Responsabilidade Social:

Um Credo Social, pelo caráter dinâmico de cada sociedade, será


sempre uma afirmação em construção, atualização e adaptação, ou
seja, um testemunho do seu tempo. Assim também o Credo Social
da Igreja Metodista no Brasil. Depois da sua primeira adaptação
nacional ou versão inicial de 1930/1934 ele foi atualizado em 1960 e
1968. O por enquanto último passo dessa releitura contínua
representa o Plano para a Vida e a Missão da Igreja Metodista de
1982 que, no mínimo em parte, respondia à herança do Credo Social
como complemento ou encaminhamento programático. Apesar dessa
sua concepção como documento complementar ele acabou, nos
anos seguidos, até certo grau substituir o próprio Credo Social.74

No desenvolvimento do seu argumento, como já dito, Renders defende a tese da


salvação social em Wesley. Em outras palavras, é a salvação que “defende a
corresponsabilidade da sociedade para o bem-estar dos necessitados, não cedendo à
leitura moderna que culpa o pobre por sua desgraça — leitura chamada por ele de
‘diabólica’”.75

A Igreja Metodista, de forma pedagógica, orienta o trabalho social. Como


afirmado no documento motivador para o trabalho social:

O ministério de Jesus, nosso modelo de evangelização, nos mostra o


que realmente significou levar "boas notícias" a todas as pessoas.
Jesus aprendeu sobre a vida do seu povo e se identificou com ele,
inserindo-se e participando do seu jeito de viver, pregou a Palavra da
Salvação e convidou para o arrependimento, ensinou sobre o Reino
de Deus, recuperou a saúde de pessoas doentes por meio da cura,
deu valor às pessoas discriminadas e ofereceu-lhes possibilidades
de mudança, denunciou injustiças e corrupções tanto do poder
político como do poder religioso, e desenvolveu muitas outras ações
que significavam boas notícias, em especial para as pessoas que
carregavam o peso do sofrimento naquela sociedade cheia de
divisões e contradições. A prática de Jesus é e tem que ser o nosso
74
RENDERS, Helmut. Um Credo Social para o século 21: a mais recente versão do Credo Social estadunidense
como inspiração para a atualização do Credo Social brasileiro. Revista Caminhando, São Bernardo do Campo,
v. 15, n. 1, p. 175-180, jan./jun. 2010.
75
RENDERS, Andar como Cristo andou, p. 176.
221

modelo de evangelização, que representa a Missão recebida pela


Igreja para continuar o ministério dEle.76

Tal documento reafirma a teologia de missão na perspectiva da tríade


missionária, que tem como eixos transversais os temas da Responsabilidade
Social, da Pregação e da Educação.

Em 2010, a Sede Nacional da Igreja Metodista publicou a revista Ação Social


Metodista. Seu conteúdo contempla um balanço da atual situação das ações
sociais que o metodismo realiza no Brasil (ver anexo 2). A motivação para a
publicação da revista foi um noticiário em nível nacional e em horário nobre da
televisão aberta de grande audiência. “O trabalho silencioso dos metodistas” foi o
título da notícia que mostrou para o país o trabalho realizado pelo Projeto
Metodista do Povo de Rua77 na cidade de São Paulo.

4.2 Contribuição à luz da Pregação (produção literária)

Objetivando a construção de um paradigma missionário a partir do PVM, a


Área Nacional da Igreja Metodista incrementou seu setor de publicações. Este
movimento não ficou somente neste âmbito, pois as regiões eclesiásticas também
se envolveram e criaram suas publicações.

A iniciativa de produção literária para subsidiar a ação pastoral face ao novo


paradigma missionário foi da Quinta Região Eclesiástica, berço do movimento
Agentes da Missão que deu origem ao Programa Dons e Ministérios. A liderança
do movimento criou, em 1987, uma editora popular, conhecida como Editora
Agentes da Missão, que desenvolveu na sua linha editorial quatro coleções: Dons
e Ministérios, Ministério Cristão Hoje, Estudos Comunitários e Escola Dominical.
No período de 17 anos de existência (1987-2004) foram publicados 20 títulos.

76
IGREJA METODISTA. Como criar e desenvolver o Ministério de Ação Social na Igreja local. São Paulo: Cedro;
Coordenação Nacional de Ação Social, 2000, p. 3.
77
Em 2010, Jorge Schütz Dias defendeu tese de doutorado com o título “Pastoral em situação de rua: análise
das ações pastorais da Comunidade Metodista do Povo de Rua na cidade de São Paulo – 1992-2009” pelo
Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da Faculdade de Humanidades e Direito da
Universidade Metodista de São Paulo.
222

Quanto à contribuição da Área Nacional, é importante mencionar a criação da


revista Caminhando, em 1982, cujo objetivo principal era suscitar a reflexão
teológica e a qualificação do corpo ministerial da Igreja. No caso de uma
publicação mais específica para o laicato, surge a Biblioteca Vida e Missão, que
organizou publicações nos temas: Bíblia, Celebrações, Documentos, Metodismo,
Ministérios, Pastorais e Discipulado.

As primeiras publicações da Biblioteca Vida e Missão procuraram dar conta


das demandas emergentes da nova missiologia. Na série “Documentos”, a primeira
publicação será o PVM. Como já descrito anteriormente, a Igreja no primeiro
momento não publicou o plano, ficando esta tarefa a cargo da Universidade
Metodista de Piracicaba. Após este período de resistência, o PVM será a primeira
publicação da referida biblioteca e sua aceitação no metodismo internacional é tão
significativa que será publicado em inglês – Plan for the Life and Mission of the
Church, em 1996.

A revista Caminhando, sob a responsabilidade da Área Nacional, contava


com a contribuição efetiva de docentes da Faculdade de Teologia da Igreja
Metodista. Em 2001, por ocasião do reconhecimento do curso de teologia pelo
Ministério da Educação e Cultura (MEC), a revista passou a ser editada sob a
responsabilidade da referida faculdade. A contribuição da revista é sem dúvida
uma das mais significativas na construção da nova missiologia metodista brasileira,
forjando assim uma nova pregação alinhada com as bases missionárias do
metodismo histórico. Luiz Carlos Ramos, em artigo afirma, na revista Caminhando:

Os pregadores, portanto, eram examinados criteriosamente antes de


serem admitidos como tais. Eles também deveriam permanecer
coerentes em seu comportamento e convicções teológicas, de
acordo com os princípios estabelecidos pelos irmãos Wesley.78

A Editora da Faculdade de Teologia (Editeo), com outras linhas de


publicação, também será o grande suporte pedagógico para a nova configuração

78
RAMOS, Luiz Carlos. A prática homilética de John Wesley. Revista Caminhando, São Bernardo do Campo,
ano IX, n. 13, p. 133-152, jan./jun. 2004.
223

do pensamento missiológico metodista brasileiro. Praticamente todas as


conferências das Semanas Wesleyanas 79 foram publicadas.

Como reflexo dessa nova postura na produção literária, Claudio de Oliveira


Ribeiro, pastor e teólogo metodista, publica em 2001 um livreto com o título
“Leituras de aquecer o coração”, onde analisa as principais obras publicadas em
português sobre o metodismo. Ribeiro organizou seus comentários por períodos:
Os anos de 1960 e de 1970; Os anos de 1980; Os anos de 1990 e Perspectivas.80
Em sua bibliografia foram listadas 117 obras das principais editoras metodistas, a
saber: Imprensa Metodista, Biblioteca Vida e Missão e Editeo, entre outras.

A pastoral publicada pelo Colégio Episcopal intitulada “O culto da Igreja em


missão” expressa o compromisso com a pregação no contexto da tríade
missionária do metodismo com a seguinte afirmação:

O culto é a fonte e o ápice da missão. Como Igreja, entramos no


culto para adorar e saímos para servir. Não há Igreja se não houver
adoração e serviço. A importância do culto na vida da Igreja é
inquestionável ao nos darmos conta de que passa por ele tudo de
importante que, de uma forma ou de outra, o povo de Deus faz.81

A valorização da dimensão da pregação na construção e/ou reconstrução da


missiologia metodista brasileira é explicitada na produção literária e assim
expressa pelo Colégio Episcopal: “Este não é o ponto de chegada, mas a abertura
de novos horizontes [...], para que possamos oferecer a Deus o nosso culto vivo,
santo e agradável”.82

4.3 Contribuição à luz da Educação (historiografia das IMES)

79
A Semana Wesleyana é um evento anual que acontece, geralmente, na terceira semana de maio e tem por
objetivo desenvolver reflexões teológicas em perspectiva wesleyana. Trata-se de uma semana acadêmica
promovida pela Faculdade de Teologia da Igreja Metodista que não somente oportuniza a participação dos
docentes e discentes da casa, mas é extensiva a comunidade externa. Em 2011 a Faculdade de Teologia
celebra a 60ª Semana Wesleyana. De 1982 em diante todas as apresentações deste evento foram publicados
pela Editeo.
80
RIBEIRO, Claudio de Oliveira. Leituras de aquecer o coração. São Paulo: Cedro, 2001.
81
IGREJA METODISTA. O culto da Igreja e missão. São Paulo: Cedro, 2006, p. 8.
82
Ibidem, p. 12.
224

Quando, em 1748, os irmãos Wesley adquiriram uma velha fundição de


canhões na periferia de Kingswood e a transformaram em salas de aulas para
atender as crianças filhas dos trabalhadores das minas de carvão, certamente não
imaginavam que estava se inaugurando um dos alicerces mais importantes da
missão metodista.

O metodismo brasileiro, por questões do projeto missionário estadunidense,


desenvolveu ações na área educacional dentro das ambiguidades próprias de um
projeto civilizatório. A educação secular, por exemplo, teve os seguintes contornos:
(1) A Educação Cristã desenvolveu-se, em especial, nos templos por meio da
Escola Dominical, cultos e círculos bíblicos, objetivando a formação da identidade
confessional metodista. Salienta-se que as Escolas Paroquiais83 desenvolviam um
papel mais público e representavam um espaço de articulação do professorado
brasileiro. (2) A educação secular desenvolveu-se a partir do ideal missionário
wesleyano e, segundo Paulo Ayres Mattos, pode assim ser compreendida:

Assim da articulação de uma proposta de Missão, em princípio


eclesiástica, com o oferecimento de ensino, em princípio secular,
floresce o ensino confessional. A Confessionalidade é a marca
distintiva das IME e tem dado sentido e valor à vida daqueles(as) que
nelas estudam, ensinam e trabalham.84

Quando das celebrações dos 300 anos do nascimento de John Wesley


(2003), o Conselho Geral das Instituições Metodistas de Ensino (COGEIME)
publicou em sua revista uma série de artigos referentes ao tema. O texto “O projeto
de escola metodista confessional sob a luz da espiritualidade wesleyana” de Ely
Eser Barreto Cesar, levanta a seguinte discussão: qual é a amplitude do projeto
educacional metodista? O autor discorre que este possui a dimensão da
construção do Reino de Deus, ou seja, é muito mais que simplesmente fundar
igrejas:

83
As Escolas Paroquiais foram analisadas no segundo capítulo desta tese. Boaventura e Malusá afirmam que
“as Escolas Paroquiais cumpriam uma função religiosa. Visavam representar um espaço na Educação para o
professorado brasileiro, visto que nos Colégios Confessionais, administradores e professores norte-americanos
não abriam mão de suas presenças”.
84
MATTOS, Paulo Ayres. Mais de um século de educação metodista. Piracicaba: COGEIME, 2000, p. 8.
225

Deve-se perguntar se esse fenômeno educacional, que se expressa


em projetos escolares em contextos distintos como Índia, Japão,
África (projeto que relaciona vários países com diferentes línguas)
Bolívia, Estados Unidos da América, não teria uma raiz comum nos
próprios fundamentos da eclesialidade wesleyana para além do
fenômeno missionário do Metodismo norte-americano,
inegavelmente o grande responsável pela emergência da maioria das
Igrejas Metodistas nacionais. A fundação de escolas seria
simplesmente parte de uma estratégia para a criação de Igreja?85

Portanto, o projeto educacional metodista abrange um caráter pedagógico


que tem por objetivos a ação transformadora do indivíduo e da sociedade. E, isso
faz com que o projeto educacional atenda a complexidade da missão. Tal atitude é
revelada quando se discute a dimensão da confessionalidade86. Essa análise inclui
a educação secular como parte integrante da missão e corrobora com a tríade
missionária do projeto metodista, sinalizando que não se faz dicotomia no projeto
missionário quanto à Responsabilidade Social, Pregação e Educação.

Para Mattos, na discussão sobre confessionalidade nas escolas metodistas, a


questão valorativa entre a pregação e a educação era igualitária, pois os
missionários entendiam que as escolas eram parte integrante da missão e
postulavam que podiam “através da educação modernizar a sociedade
87
brasileira”.

A dimensão mais relevante sobre a educação esteve a cargo das Diretrizes


para a Educação na Igreja Metodista.88 Suas propostas inovadoras são
incompreendidas e difíceis de serem colocadas em prática. Mattos, ao avaliar as
propostas, afirma:

85
CÉSAR, Ely Eser Barreto. O projeto de escola metodista confessional sob a luz da espiritualidade wesleyana.
Revista do COGEIME, São Paulo, ano 12, n. 22, p. 59-68, jun. 2003.
86
Sobre o tema da confessionalidade nas escolas metodistas recomenda-se a leitura do amplo debate registrado
na Revista do COGEIME de 1/1992. Julio de Sant’Ana escreveu sobre Confessionalidade e educação: uma
visão ecumênica; Elias Boaventura sobre Confessionalidade metodista; Paulo Ayres Mattos sobre
Confessionalidade, educação e escola: um enfoque histórico; Paulo Lockmann sobre Confessionalidade e
educação: uma abordagem pastoral missionária; e Rui de Souza Josgrilberg sobre O que é filosofia cristã e
confessionalidade no metodismo e Confessionalidade e educação: uma visão ecumênica.
87
MATTOS, Paulo Ayres. Confessionalidade, Educação e Escola: Um enfoque histórico. Revista do COGEIME,
São Paulo, ano 1, n. 1, p. 52, 1991.
88
Este documento faz parte da discussão do PVMI, também aprovado, não sem tensões, no XIII Concílio Geral
de 1982. Assim como o PVMI, o DEIM está carregado de ambigüidades e revela as mudanças de paradigmas
da missão quanto à educação que a Igreja Metodista assume a partir desse momento.
226

Os elementos centrais das Diretrizes pretendem ser resultante dessa


intenção missionária. O texto final aprovado pelo Concílio de 1982
(mesmo com contradições flagrantes decorrentes das tentativas de
sua descaracterização feitas pelos setores da Igreja que
discordavam da Teologia da Missão do Plano Quadrienal de 1974)
afirma claramente que o modelo educacional da Igreja Metodista
estava completamente em desacordo com as bases bíblico-
teológicas de uma prática educativa libertadora [...]89 (grifo nosso).

Na mesma linha de Mattos, Castro entende que a Igreja Metodista tem


dedicado pouco espaço para a reflexão sobre o tema da educação. Em sua
opinião, “é como se a educação não fosse importante para o projeto de missão
metodista no Brasil”.90 A crítica de Castro se torna relevante a partir da ênfase que
as Diretrizes têm quanto ao projeto educacional. Na análise da conjuntura
eclesiástica o documento pondera:

A ação educativa da Igreja acontece de diversas maneiras: através


da família, da igreja local em todas as suas agências (comissões,
escola dominical, o púlpito, os grupos societários etc.), através de
suas instituições de ensino secular, teológicos, de ação comunitária e
de comunicação.91

E na fundamentação bíblico-teológica o documento considera:

Sendo assim, a salvação é entendida como resultado da ação de


Deus na História e na vida das pessoas e dos povos. Biblicamente,
ela não se limita à idéia da salvação da alma, mas inclui a ação de
Deus na realidade de cada povo e de cada indivíduo. Isso atinge
todos os aspectos da vida: religião, trabalho, família, vizinhança,
meios de comunicação, escola, política, lazer, economia (inclusive
meios de produção), cultura, segurança e outros. A salvação é o
processo pelo qual somos libertados por Jesus Cristo para servir a
Deus e ao próximo e para participar da vida plena no Reino de
Deus.92

Portanto, a ressignificação do projeto educacional metodista como meta


missionária não é apenas uma discussão filosófica, pedagógica ou mesmo de
política educacional. Trata-se um elemento essencial no cumprimento da missão

89
MATTOS, Mais de um século de educação metodista, p. 88.
90
RIBEIRO, Claudio de Oliveira; LOPES, Nicanor (Org.). 20 anos depois: A vida e a missão da Igreja em foco.
São Bernardo do Campo: Editeo, 2003, p. 65.
91
IGREJA METODISTA, Cânones 2007, p. 60.
92
Ibidem, p. 60.
227

como paradigma na perspectiva da tríade — Responsabilidade Social, Pregação e


Educação.

A síntese da teologia de missão na herança metodista passa pela


indissociabilidade dos elementos essenciais da tríade missionária —
Responsabilidade Social, Pregação e Educação.

5 Da compreensão da missão como empreendimento


meramente expansionista e articulação eclesiástica autoritária
à tríade missionária — Responsabilidade Social, Pregação e
Educação: um convite à superação
Para superar a compreensão de missão como projeto expansionista, faz-se
necessário ressignificar o conceito missiológico na Igreja Metodista. Isso implica a
compreensão do campo religioso que não procura somente debater o crescimento
da Igreja como fenômeno isolado. Mas, pelo contrário, busca constante diálogo
com outros fenômenos sociais e tem como meta missionária o propósito de
habilitar a Igreja para entender o seu exercício missionário no mundo, que,
segundo Bosch é o de “servir, curar, e reconciliar uma humanidade dividida e
ferida”.93

A superação passa pela análise crítica da história, em especial, de


continentes colonizados, como é o caso do Brasil. Os modelos de inserção
missionária nos projetos católico e protestante não diferem nos métodos, em que
se pese que o projeto católico seja do século XVI e o protestante do século XIX.
Veiga afirma que:

Os jesuítas chegaram ao Brasil em 1549, trazidos pelo primeiro


governador geral, Tomé de Souza. Sob o comando de Manuel da
Nóbrega tinham a missão de converter em cristãos e em súditos do
governo português. Para tanto, criaram escolas e instituíram colégios

93
BOSCH, Missão transformadora, p. 492.
228

e seminários que foram se espalhando pelas diversas regiões do


território.94

Na política de implantação e consolidação da missão metodista entre o final


do século XIX e o início do XX, o projeto missionário do metodismo norte-
americano, na área educacional, estava impregnado dos valores da democracia
liberal norte-americana e entendia que a evangelização também passava pela
conversão a esses valores. Portanto, o que difere o projeto católico do protestante
é somente a época. Peri Mesquida explicita essa tese da seguinte forma:

Comunicar (...) a salvação pela experiência da conversão, assim


como os benefícios da democracia liberal, pois “o cristianismo e o
mundo político (na América) marcham juntos, um purificando e
aperfeiçoando o homem através da fé, e o outro, pela política.95

Zuleica Mesquita corrobora essa tese em sua pesquisa, na especificidade do


trabalho missionário de Marta Watts na missão metodista, ao afirmar:

Pensavam elas que, “civilizando” as mulheres nativas, ou seja,


educando-as nos padrões culturais do protestantismo essas
mulheres se libertariam da dominação masculina em que viviam,
tornando-se independentes e em condições de prover o próprio
sustento.96

Para a superação de uma compreensão histórica equivocada, faz-se


necessário que o projeto missionário assuma os elementos essenciais da missio
Dei. As repetitivas opções equivocadas não colaboram com a nova compreensão
de missão. Aplica-se nesse caso um reducionismo que tem na missão um
empreendimento meramente expansionista.

Mattos, na sua análise sobre o projeto educacional metodista no período da


ditadura militar, faz a seguinte crítica:

A Igreja, na melhor das hipóteses, contudo, pareceu não se


aperceber das implicações e das contradições missiológicas
provocadas por seu envolvimento com o governo militar em sua

94
VEIGA, Ilma Passos Alencastro. Aula: gênese, dimensões, princípios e práticas. Campinas: Papirus, 2008,
p.19.
95
MESQUIDA, Peri. Hegemonia norte-americana e educação protestante no Brasil: um estudo de caso. Juiz de
Fora: EDUFJF; São Bernardo do Campo: Editeo, 1994, p. 111.
96
MESQUITA, Zuleica de Castro Coimbra. Evangelizar e civilizar: cartas de Martha Watts, 1881-1908.
Piracicaba: Editora Unimep, 2001, p. 12.
229

política educacional privatizante, favorecida pela repressão política e


pela sistemática violação dos direitos humanos. Era uma contradição
flagrante nossa resposta à política educacional da ditadura diante
das posições afirmadas no Credo Social contra a violação dos
Direitos Humanos e em defesa da autonomia da Igreja e da
Universidade face às tentativas da ditadura pelo controle político e
ideológico do país.97

Tal postura revela que a Igreja necessita manter-se sempre alerta ao princípio
missionário, como já afirmado. O essencial da missão é de ser agente de serviço,
cura e reconciliação para a humanidade.

5.1 Inculturação como espaço vivencial da missão: um convite ao


respeito e à convivência

Outro passo essencial para a superação de conceitos equivocados da missão


é o tema da inculturação. De acordo com Josgrilberg:

O protestantismo e mesmo o metodismo depois da autonomia não


conseguiram desenvolver um projeto eclesial que tomasse a
inculturação como elemento importante de práticas ou de um projeto
de igreja.98

Pode-se afirmar que a inculturação é um tema recorrente ao longo da história


do cristianismo. As mudanças ocorridas nas práticas litúrgicas e nas expressões de
fé do povo de Deus no decorrer da história comprovam não só mudanças
históricas, do ponto de vista da linearidade. A “linearidade não representa uma
ruptura com o passado e o predomínio do futuro sobre o presente”.99 Pelo
contrário, ela oferece pistas contextuais, dá lugar às diferenças e convive com as
tensões próprias do tempo e do lugar.

Os desdobramentos de uma missão inculturada podem ser decisivos, em


especial na superação de conceitos missionários autoritários que, no contexto
globalizado, têm “o sincretismo sem qualquer atitude crítica, sem perguntar-se pela

97
MATTOS, Paulo Ayres. A obra educacional da Igreja Metodista no Brasil: um sumário histórico-teológico.
Revista de Educação do COGEIME, ano 9, n. 16, p. 69, jun. 2000.
98
JOSGRILBERG, Rui de Souza. A autonomia e a cultura brasileira. Revista Caminhando, São Bernardo do
Campo, v. 10, n. 2 [16], p. 43-56, jul./dez. 2005.
99
REIS, José Carlos. As identidades do Brasil: de Varnhagen a FHC. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2007, p. 48.
230

coerência interna do sistema religioso”. 100 Diante disso, líderes religiosos assumem
a postura de gestores da experiência religiosa alheia, com atitudes autoritárias e
dominadoras, utilizando-se da mesma lógica do capitalismo em causar
necessidades, em especial pelos meios midiáticos. Esse tipo de liderança religiosa
desperta desejos e interesses em pessoas com crise de sentido de vida. “Mais, o
indefinido do desejo coaptado ao infinito de Deus significaria a morte do desejo e,
de certa forma, a inaptidão de Deus a ser cada vez mais desejado”. 101 Essa pode
ser uma das explicações dadas pelos projetos missionários contemporâneos.

A tensão presente no tema da inculturação no contexto do mundo


globalizado também pode ser entendida como própria de “um período de transição,
na zona limítrofe entre um paradigma que não mais satisfaz e um outro que ainda
não é, em grande parte, amorfo e opaco”. 102 Portanto, os equívocos praticados no
passado, nos projetos missionários, não significam que conscientemente abriu-se
mão da proposta do Reino de Deus. Como afirma Melo:

Em sua atividade missionária o Povo de Deus, evitando erros e


equívocos do passado, precisa colocar-se em atitude de alteridade
fraterna ante pessoas, povos e culturas, prestar atenção às
preparações evangélicas e às sementes do Verbo germinando em
toda parte, sem, no entanto, atenuar a radical novidade de que é
portador.103

A isso se atribui o conceito de tensão criativa, espaço privilegiado para a


missão contemporânea, que no entendimento de Bosch significa:

Os melhores modelos de teologia contextual conseguem reunir, em


uma tensão criativa, theoria, práxis e poiésis – ou, se quisermos a fé,
a esperança e o amor. Isso constitui uma outra maneira e definir a
natureza missionária da fé cristã.104

Na prática, essa tensão criativa significa que se deve encontrar maneiras de


honrar o nosso compromisso missionário, de modo que a nossa visão ética não
100
LIBÂNIO, João Batista. A religião no início do milênio. São Paulo: Loyola, 2002, p. 160.
101
PAIVA, Geraldo José de. Entre a necessidade e o desejo: diálogos da psicologia e a religião. São Paulo:
Loyola, 2001, p. 75.
102
BOSCH, Missão transformadora, p. 439.
103
MELO, Antonio Alves. A evangelização no Brasil: dimensões teológicas e desafios pastorais. Roma: Editora
da Pontifícia Università Gregoriana, 1996, p. 139.
104
BOSCH, Missão transformadora, p. 516.
231

seja corrompida. No ambiente próprio do metodismo, as dinâmicas da


Responsabilidade Social, Pregação e Educação representam elementos essenciais
de um projeto missionário wesleyano autêntico.

Consequentemente, para tornar-se relevante para a sociedade brasileira o


projeto missionário metodista necessita de uma inculturação da fé que signifique
uma interpretação da missio Dei, que não somente seja uma tradução da
linguagem, como sentido de palavras, mas no sentido mais amplo. Assim como
traduzida por Wesley, como soteriologia social; por Míguez Bonino, que
compreende o movimento missionário com atitudes que exercem força
transformadora na sociedade; e por Arias, que compreende a missão da Igreja
como testemunha da graça libertadora.

É fundamental que o anúncio do Evangelho esteja comprometido com o


quadro cultural e seja entendido como fator de identidade. Do contrário, o projeto
missionário metodista corre o risco de se apropriar de valores no contexto
globalizado que não condizem com o seu modo de ser.

5.2 Inculturação: um convite à ecumenicidade

Na realidade multifacetada da cultura globalizada é fundamental que a fé


cristã, no contexto do metodismo, abra-se para uma realidade maior do que
apenas a própria cultura local, respeitando, inclusive, o valor dessas contribuições
locais. Isto significa que a convivência ecumênica representa um fator colaborativo
para compreensão da Igreja quanto ao processo cultural e desdobramentos da
missão. O fechamento para outras experiências religiosas e culturais pode
contribuir para tendências subjacentes do grupo, motivando rivalidades religiosas.
Como assevera Philip Jenkins:

As rivalidades religiosas também são problemáticas. Muitas vezes,


as relações entre denominações em expansão são cordiais, ou pelo
menos, não tem um caráter de confronto, em razão de que cada
232

Igreja tem bastante espaço para crescer em um vasto número de


prováveis convertidos.105

O metodismo brasileiro, contudo, reluta em assumir a dimensão de um projeto


missionário que signifique o anúncio do Reino de Deus em unidade. No entanto, é
caminho incontornável assumir o caráter leigo, ministerial e ecumênico da Igreja,
ideia que encontra ressonância na reflexão de Bosch:

O impulso para um testemunho comum, reivindica-se, não tem sua


origem em alguma estratégia; é a consciência da comunhão com
Cristo e de uns com os outros que gera o dinamismo que impele os
cristãos a dar um testemunho visível comum.106

Essa atitude envolve uma vontade de partilhar e ouvir, bem como uma abertura
para a possibilidade de mudanças em perspectiva de ambas as partes. Todas as
tradições religiosas têm algo a aprender com tais diálogos na medida em que elas são
capazes de aceitar a especificidade cultural do outro. As heranças religiosas podem
ser e são transformadas por tais encontros. “Sabe-se que na história do cristianismo
tem havido significativas mudanças culturais, talvez a mais importante seja o
movimento para além do judaísmo e sua aculturação no mundo greco-romano”.107

Essa mudança transformou radicalmente a forma de vida cristã em todas as


suas dimensões sociais e culturais. O cristianismo voltará a ser transformado pela
sua relação dialógica ao encontrar-se em unidade com outras religiões do mundo.
Temporariamente, a Igreja Metodista assume uma resistência ao tema. O que se
pode ver é que na própria experiência do movimento metodista tal resistência foi
superada com o tempo. O próprio “Wesley estava disposto a envidar todos os
esforços para manter a unidade, impedindo que a ruptura com a Igreja oficial
viesse à tona”.108

105
JENKINS, Philip. A próxima cristandade: a chegada do cristianismo global. Rio de Janeiro: Record, 2004, p.
210.
106
BOSCH, Missão transformadora, p. 553.
107
ORMEROD, Neil J.; CLIFON, Shane. Globalization and the Mission of the Church: Ecclesiological
Investigations. New York: T&T Clark, 2009, p. 173.
108
SOUZA, José Carlos de. Leiga, ministerial e ecumênica: a igreja no pensamento de John Wesley. São
Bernardo do Campo: Editeo, 2009, p. 223.
233

Neste sentido os temas da inculturação, diálogo religioso, testemunho


comum, entre outros, representam as dimensões culturais que a globalização
levanta como questões para a missão contemporânea da Igreja. A cultura em si
expressa não só uma infraestrutura social de uma comunidade, mas também de
unidade humana que conduz para a significação de valores como amor,
solidariedade, bondade, misericórdia, compaixão, etc. Os significados desses
valores que constituem a cultura são realizados nos corações e mentes dos
humanos, cuja busca pela autenticidade é sua missão. Portanto, “a vida no
Espírito, cristocêntrica se concretiza na solidariedade de compaixão, graça e amor
ao mundo afastado de Deus”.109

No caso específico do metodismo, o compromisso com a tríade —


Responsabilidade Social, Pregação e Educação — representa um desafio
constante. Tais dimensões, como elementos essenciais e inegociáveis na tarefa
missionária, garantem sua identidade. Theodore Runyon sintetizou no livro “A nova
criação”110 alguns elementos essenciais para o projeto missionário metodista no
mundo contemporâneo. No contexto metodista brasileiro, a reflexão da
inculturação como convite à ecumenicidade deve ser analisada à luz do mundo
urbano.

Runyon, ao refletir sobre a questão essencial dos relacionamentos em


Wesley, afirma:

Para Wesley é o relacionamento que conta. A realidade essencial é


esse relacionamento do qual o Espírito Santo é a fonte e o fiador, e
não a linguagem que busca, muitas vezes inadequadamente, dar-lhe
expressão.111

Na continuidade da reflexão sobre a relevância do projeto missionário na


perspectiva wesleyana, S. Wesley Ariarajah112 apresenta “quatro dimensões

109
ZABATIERO, Júlio. Fundamentos da teologia prática. São Paulo: Mundo Cristão, 2005, p. 127.
110
Cf. RUNYON, Theodore. A nova criação: a teologia de John Wesley hoje. São Bernardo do Campo: Editeo,
2002. No capítulo seis (p. 211-274) Runyon trata da dimensão “Wesley para os dias de hoje”. Para Runyon
elementos como os direitos humanos, direitos da mulher, cuidado com o meio ambiente, ecumenismo e
tolerância religiosa representam compromissos essências para uma teologia metodista contemporânea.
111
RUNYON, A nova criação, p. 270.
112
Cf. ARIARAJAH, S. Wesley. Repensando a Missão para os Nossos Dias. São Bernardo do Campo: EDITEO,
2011.
234

importantes do metodismo que poderão servir de inspiração para o repensar da


missão em nossos dias”.113 Ariarajah sugere as seguintes dimensões: 1) Missão
como proposta soteriológica pessoal e social; 2) Missão como criação de
comunidades fiéis; 3) Missão como resposta ao contexto social e 4) Missão para
pessoas de outra fé.

Portanto, a tríade metodista aponta para uma convergência na perspectiva da


Teologia Prática114 onde as ações pastorais se configuram em atitudes criativa,
reflexiva e libertadora. Para Casiano Floristan 115 a prática missionária da Igreja se
articula com os seguintes elementos essenciais: A missão (KERIGMA) como ação
profética acontece pela martyría que se dá pela proclamação da Palavra
(LEITOURGIA) conjugada com a expressão libertadora da pastoral social
(DIAKONIA) e pela fraternidade vivida na comunidade (KOINONIA).

Por conseguinte, a tríade — Responsabilidade Social, Pregação e Educação


— pode servir como um elemento catalisador para uma missão inculturada que
convide à superação dos velhos modelos missionários, ao respeito e à
ecumenicidade.

113
ARIARAJAH, Repensando a Missão para os Nossos Dias, p.41.
114
Cf. FLORISTAN, Casiano. Teologia Practica: Teoria y Praxis de La Accion Pastoral. Salamanca: Sigueme,
1993.
115
FLORISTAN, Teologia Practica, pp. 213-229.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

Amor sem limites,


Amor sem idade,
Amor por toda a humanidade.
Charles Wesley

O mundo é minha paróquia.


John Wesley

A jornada percorrida nesta pesquisa não foi curta. Muitas considerações à


guisa de resultados finais ficaram no trajeto. Mas, assim é a missão, nela não cabe
conclusão final, pois ela não termina nem com a aceitação da última “ovelha
perdida”. Ela é a permanente presença de Deus com a humanidade. Assim
reafirma-se aqui a permanente e indispensável necessidade de compreendê-la
como missio Dei.
É fato que os aspectos analisados não esgotam a reflexão teológica sobre a
missiologia no metodismo brasileiro, outras leituras já foram apresentadas e
certamente outras ainda virão. Todavia, procurou-se indicar as questões essenciais
da missão, na dimensão da tríade Responsabilidade Social, Pregação e Educação,
questões essas tidas por essenciais na herança wesleyana.
As questões missionárias no metodismo brasileiro nem sempre foram
estabelecidas a partir da tradição wesleyana ou mesmo do conceito teológico da
240

missio Dei. A transplantação cultural e inserção histórica geraram equívocos


missiológicos ao ponto de fragilizar a tríade missionária nesta pesquisa analisada.
Essa mutação foi, no metodismo brasileiro, corrigida por ocasião da organização
do Plano para Vida e Missão. O que também, não significa uma correção do
percurso missionário percorrido da elaboração do plano até os dias atuais. Na
verdade, o mesmo pode ser observado em outras igrejas de tradição wesleyana.
Nessa tarefa de apontar caminhos para a ação missionária da Igreja a
pesquisa indica os elementos essenciais da missão numa perspectiva wesleyana.
Responsabilidade Social, Pregação e Educação são elementos indissociáveis no
agir missionário da Igreja. Quando se afirma que o tema da missão sempre esteve
presente na pauta da Igreja Cristã, não se faz como questão retórica. Trata-se de
uma questão vital no espaço religioso.

Consequentemente, este trabalho ao pesquisar as ações missionárias no


projeto da Igreja Metodista percebeu-se que o tema tem na sua essência as
tensões próprias de um ambiente de mudança, não somente na concepção
pessoal, mas também comunitária. Wesley, no movimento metodista, convivia com
esta tensão. Sua convicção de que outra paróquia era possível e que fosse além
das fronteiras do modelo eclesiológico inglês de seu tempo, permitiu que sua
proposta missionária fosse para o mundo. O mundo é minha paróquia. Dentro
dessa perspectiva a análise das tensões relacionada à missão utilizando como
objeto de investigação os elementos essenciais da tradição wesleyana pode-se
constatar que as tensões foram de forma criativa portas para novas oportunidades
no campo da missão. Bosch afirma que “nossa vida cristã neste mundo implica, por
conseguinte, uma tensão inevitável, oscilando entre o júbilo e a agonia”. 1 Esta
pesquisa, também, não de forma conclusiva, procurou oferecer uma reflexão
missiológica que dê conta das tensões próprias desse campo e, ao mesmo tempo,
aponte caminhos que colaborem com a fidelidade ao conceito da missio Dei.
Se por falta de fundamentação teológica consistente produz-se ações
missionárias geradoras de equívocos na caminhada da Igreja. A pesquisa procurou
assinalar a necessidade de uma permanente atitude de vigilância quanto à
indissociabilidade da tríade.
1
BOSCH, David. Missão Transformadora, p. 184.
240

Um marco regulatório importante para os metodistas no que se refere a


prática missionária é o documento Plano para Vida e Missão da Igreja. A
legitimidade deste referencial teológico está na aprovação conciliar de 1982 e
consequentemente referendado nos Concílios Gerais dos últimos quase 30 anos.
Trata-se da base norteadora da vida e missão do metodismo brasileiro.
Considerando o universo de pontos envolvidos nesta pesquisa e seu grau de
exigência, é imperioso salientar que a análise do contexto que deu origem à Igreja
Metodista no território brasileiro se deu a partir da interpretação da relação da
tríade missionária proposta. Tal análise permitiu a compreensão da
Responsabilidade Social como elemento de inclusão social, conjugado a Pregação
como elemento formador da identidade religiosa de cunho protestante que, por sua
vez, tem na Educação a condição de transformação social. Se por um lado, essa
percepção ficou latente, a partir de 1867, período considerado segundo momento
missionário. Por outro, não foi tão evidente no primeiro período de (1835-1841) e
pode ser essa uma das razões da descontinuidade do projeto neste período.
O caminho da conversão, no denominado segundo momento missionário, da
IM foi a volta aos princípios da tríade, os missionários viram que a pregação como
ação evangelizadora necessitava de uma ação diaconal quanto a responsabilidade
social e fortalecida com um projeto educacional consistente. Portanto, essa foi a
expressão da Teologia Prática expressa na missão do período referido.
Quais as influências da tríade nos momentos considerados decisivos para o
metodismo brasileiro? No segundo momento missionário de implantação fica
evidente que a tríade funciona como agente catalisador nas ações missionárias.
Talvez a comprovação dessas evidências esteja firmada nas ações que constituem
desde a abertura de pontos de pregação, capelas e construção de templos. E,
concomitantemente percebe-se que a Responsabilidade Social é sinalizada com
ações concretas em favor, especialmente, de crianças empobrecidas e pessoas
adultas não alfabetizadas que eram atendidas nas Escolas Paroquiais.
Não de menor valor fica evidente o comprometimento com a Educação. A
abertura de novos pontos de pregação era acompanhada do projeto educacional.
Martha Hite Watts é um ícone da presença missionária leiga com objetivos claros
de fortalecer a missão da Igreja. Além disso, é a Educação que permite à igreja
240

nascente um diálogo com outras organizações da sociedade da época. O apoio da


família de Prudente de Moraes, na cidade de Piracicaba, comprova essa
articulação.
Certamente a Pregação, de caráter conversionista, é o elemento que dá
sustentabilidade ao projeto missionário metodista e estabelece a identidade
religiosa da Igreja. Isso ficou muito latente quando do mapeamento das ações
missionárias da Igreja Metodista. Porém, Josgrilberg no artigo “As pregações de
Wesley sobre o Sermão do Monte”2 colabora ao analisar o conteúdo da pregação
de Wesley, como certifica:
O tema do Reino percorre o SM. O Reino, segundo Wesley, é
interno, externo e eterno. A presença interna do Reino (inward
Kingdom) traz justiça, a paz, a alegria no Espírito; quem perseverar
até o fim participa do Reino eterno. O Reino de Deus interno é
fundamento e condição para um correto entrelaçamento com as
dimensões externas do Reino. Wesley não descuida de sua
dimensão social, o que é amplamente comprovado em sua prática do
evangelho3.

É possível notar na reflexão de Josgrilberg que a Pregação no momento


wesleyano revela a essência do cristianismo e formula uma teologia da missão
com os elementos da tríade pesquisada.
A pergunta central da pesquisa pode ser assim formulada: Está presente no
projeto missionário da IM em terras brasileiras essa marca da identidade
wesleyana? A pesquisa comprova que sim. Em que pese, que o desafio para os
tempos atuais são: cumprir a missão no contexto metodista brasileiro em face aos
eixos norteadores da tríade: Responsabilidade Social, Pregação e Educação;
assumir responsabilidade com ações missionárias de cunho cooperativo e não
somente isoladas; compreender que a missão é mais que empreendimento
meramente expansionista; ressignificar a articulação eclesiástica autoritária para
uma articulação participativa e comprometer-se com a inculturação como espaço
vivencial da missão. O marco referencial (PVM) da teologia da missão no contexto
metodista brasileiro é coerente e as aproximações da missio Dei, soteriologia

2
JOSGRILBERG, Rui de Souza. As pregações de Wesley sobre o Sermão do Monte: A visão wesleyana da vida
autêntica diante de Deus. Revista Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 9, n. 2, p. 44-55, ago./dez. 2004.
3
JOSGRILBERG, As pregações de Wesley sobre o sermão do Monte, p. 48.
240

social e teologia da graça se complementam nas perspectivas bíblico-teológico-


histórica-pastoral.
A pesquisa procurou evidenciar as ações missionárias da IM dentro da
formulação exata da Teologia Prática e da herança wesleyana e isto colaborou na
clarificação do conceito da igreja em missão. É fato, que na análise da tríade se
pode observar as fragilidades na missão metodista. Apesar de se ter trabalhado a
natureza da missão metodista na perspectiva da tradição wesleyana, mas nem
sempre os gestos missionários foram fiéis a esta herança. O desrespeito deste
ponto pode ser considerado como falta de uma ação eclesiástica comprometida
com a identidade metodista.
A questão metodológica no exercício da missão é essencial no que tange a
fidelidade da tríade. Quando a IM estabeleceu o Programa Dons e Ministérios
como instrumento metodológico de ação, a premissa principal foi o conceito de
servir ou diaconal. Comblin assegura que “os missionários de Jesus Cristo
obedecem a uma missão explícita, consciente e aceita de modo pleno (...). Servir é
transmitir, isto é, criar de novo”. 4 Para isso, pedagogicamente, foi-se trabalhado
nas ações de conscientização missionária uma releitura do texto de João 13, 1-17
(O Lava-pés). Assim assegura os coordenadores do programa:
Lavar o pé de alguém é colocar-se a serviço de alguém numa
posição de baixo para cima. O lava-pés no mundo judeu era uma
prática afetiva dentro da vida doméstica, mas sempre praticado por
aquele que tinha menos poder ou autoridade. A mulher lavava o pé
do marido. As crianças, os pés dos pais. Ao assumir esta posição na
última lição, planejada, antes da cruz, Jesus nos diz, claramente, que
o serviço uns aos outros não é igual ao serviço dos senhores,
daqueles que sabem tudo e têm a verdade para cada situação5.

Assim, pode-se destacar que os objetivos tanto do PVM e do Programa Dons


e Ministérios eram de reafirmar as dimensões da tríade no projeto missionário da
IM com as dimensões da inculturação e superação do autoritarismo como cultura
religiosa. Considera-se, finalmente, que esta tese enfatiza a tríade:
Responsabilidade Social, Pregação e Educação, como elementos essenciais para

4
COMBLIN, José. Teologia da Missão. Petrópolis: Vozes, 1980, p. 53.
5
CÉSAR, Ely Eser Barreto. et al. (Org.). Manual Missionário do Povo Metodista. Piracicaba: Agentes da Missão,
sd, p. 9.
240

a missão, com a esperança de que a teologia de missão metodista brasileira no


século XXI seja fiel à identidade wesleyana.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABRAHAM, William James; KIRBY, James E. The Oxford Handbook of


Methodist Studies. Oxford Handbooks Online, 2009. Disponível em
<http://www.oxfordhandbooks.com/oso/public/content/oho_religion/9780199212
996/toc.html>. Acesso em: 17 jan. 2012.

_____________________. The Oxford Handbook of Methodist Studies. Great


Britain: SPI Publisher Services, 2009.

AÇO, Isac. A evangelização na década de 70. Expositor Cristão, São Paulo,


ano 85, n. 19, 15 out. 1970.

ALMEIDA, Jane Soares de. Ler as letras: por que educar meninas e mulheres?
São Bernardo do Campo: Universidade Metodista de São Paulo; Campinas:
Autores Associados, 2007.

ALMEIDA, João Carlos. Teologia da solidariedade: uma abordagem da obra de


Gustavo Gutiérrez. São Paulo: Loyola, 2005.

ALMEIDA, Vasny. O metodismo e a ordem social republicana. Revista de


Estudos da Religião, São Bernardo do Campo, ano 3, n. 1, 2003.

ALONSO, Angela. Joaquim Nabuco: os salões e as ruas. São Paulo:


Companhia das Letras, 2007.

ALVES, Rubem. Dogmatismo & tolerância. São Paulo: Loyola, 2004.

ALYRIO, Rovigati Danilo. Metodologia científica. Programa de Pós-Graduação


em Gestão e Estratégia em Negócios [PPGEN]. Rio de Janeiro: UFRRJ, 2008.

ANDERSON, Justice C. An Evangelical Saga. Longwood: Xulonpress, 2005.


262

ANDRADE, Paulo Fernando Carneiro. Fé e eficácia: o uso da sociologia na


Teologia da Libertação. São Paulo: Loyola, 1991.

AQUINO, Rubim Santos Leão de. Sociedade brasileira: uma história através
dos movimentos sociais. Rio de Janeiro: Record, 2007.

ARIAARAJAH, S. Wesley. Repensando a Missão para os Nossos Dias. São


Bernardo do Campo: EDITEO, 2011.

ARIAS, Mortimer. De Lutero a Wesley e de Wesley a nós. Revista


Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 8, n. 2, 2003.

_____________________. Salvação hoje. Petrópolis: Vozes, 1974.

ARMSTRONG, Karen. Em nome de Deus. São Paulo: Companhia das Letras,


2001.

ARRUDA, J. J.; TENGARRINHA, J. M. Historiografia luso-brasileira


contemporânea. Bauru: EDUSC, 1999

BAÉZ CAMARGO, Gonzalo. Gênio e espírito do metodismo wesleyano. São


Bernardo do Campo: Imprensa Metodista, 1986.

BARBIERI, Sante Uberto. Aspectos da pobreza humana. São Bernardo do


Campo: Imprensa Metodista, 1980.

BARBOSA, José Carlos. Negro não entra na igreja: espia da banda de fora.
Protestantismo e escravidão no Brasil Império. Piracicaba: Unimep, 2002.

_____________________. O caminho para a cabeça precisa ser aberto pelo


coração. In: RIBEIRO, Claudio de Oliveira et al. (Org.). Prática e teologia na
tradição wesleyana: John Wesley, 300 anos. São Bernardo do Campo: Editeo,
2008.

_____________________. Salvar & educar. Piracicaba: CEPEME, 2005.

BARBOSA, Maria de Fátima Medeiros. As letras e a cruz: pedagogia da fé e


estética religiosa na experiência missionária de José de Anchieta. Roma:
Edrice Pontificia Università Gregoriana, 2006.

BARDAY, Wade Crawford. History of Methodist Missions: The Methodist


Episcopal Church 1845-1939. New York: The Board of Missions of the
Methodist Church, 1957.

BEIRED, José Luiz. Sob o signo da nova ordem: intelectuais autoritários no


Brasil e na Argentina. São Paulo: Loyola, 1999.
262

BERG, Klaus. Hermenêutica do Novo Testamento. São Leopoldo: Sinodal,


1999.

BETHELL, Leslie (Org.). América Latina Colonial. Vol. 2. São Paulo: Editora
Fundação Universidade de São Paulo; Brasília: Fundação Alexandre de
Gusmão, 2004.

_____________________ (Org.). América Latina Colonial. Vol. 6. São Paulo:


Editora Fundação Universidade de São Paulo; Brasília: Fundação Alexandre de
Gusmão, 2005.

BIRD, Michael F. Jesus and the Origins of the Gentile Mission. New York: T&T
Clark International, 1988.

BITENCOURT, B. P. Frutos da visão de um bravo. Lins: Instituto Americano de


Lins da Igreja Metodista, 1997.

_____________________. As origens da UMESP – Universidade Metodista de


São Paulo. São Bernardo do Campo: Umesp.

BLACKBURN, Robin. A queda do escravismo colonial: 1776-1848. Rio de


Janeiro: Record, 2002.

BLAW, Johannes. A Natureza missionária da Igreja. São Paulo: ASTE, 1966.

BOAVENTURA, Elias. El papel del metodismo em la educación brasileña –


contexto actual. In: DUQUE, Jose (Org.). La tradición protestante em la teologia
latinoamericana. Primer intento: lectura de la tradición metodista. San Jose:
DEI, 1983.

_____________________; MALUSÁ, Silvana. Escolas paroquiais metodistas.


Revista do COGEIME, Piracicaba, v. 5, n. 9, p. 83-98, 1996.

BORELLI, Viviane (Org.) Mídia e religião: entre o mundo da fé e o do fiel. Rio


de Janeiro: E-papers, 2010.

BORGES, Célia Maia. Escravos e libertos nas irmandades do Rosário: devoção


e solidariedade em Minas Gerais – séculos XVIII e XIX. Juiz de Fora: UFJF,
2005.

BOSCH, David. Missão transformadora: mudança de paradigma na teologia da


missão. São Leopoldo: Sinodal, 2002.

BOTTA, Alejandro F.; ANDIÑACH, Pablo R. The Bible and the Hermeneutics of
Liberation. Atlanta: Society of Biblical Literature, 2009.

BRAKEMEIER, Gottfried. A autoridade da Bíblia: controvérsias – significado –


fundamento. São Leopoldo: Sinodal, 2003.
262

BRANDÃO, Carlos Rodrigues; PESSOA, Jadir de Morais. Os rostos do Deus


do outro: mapas, fronteiras, identidades e olhares sobre a religião no Brasil.
São Paulo: Loyola, 2005.

BREMER, Francis J. The Puritan Experiment: New England Society from


Bradford to Edwards. New England: University Press of New England, 1976.

BUNGE, Márcia J. The Child in Christian Thought. Cambridge: William B.


Eerdmans Publishing, 2001.

BÜRKLE, Horst. Missionstheologie. Stuttgart: Kohlhammer, 1979.

BUYERS, Paul E. História do metodismo. São Paulo: Imprensa Metodista,


1945.

CAMBI, Franco. História da pedagogia. São Paulo: Unesp, 1999.

CARBONELL, Charles-Olivier. Historiografia. Lisboa: Teorema, 1992.

CARRIKER, Timóteo C. A visão missionária na Bíblia: uma história de amor.


Viçosa/MG: Ultimato, 2005.

CARVALHO, Maria Cecília Maringoni de. Construindo o saber: metodologia


científica. Fundamentos e técnica. Campinas: Papirus, 1989.

CASALEGNO, Alberto. Ler os Atos dos Apóstolos: estudo da teologia lucana


da missão. São Paulo: Loyola, 2005.

CASTRO, Clóvis Pinto de. Igreja Metodista: ação pedagógica do Colégio


Episcopal na implantação de um novo modelo de Igreja organizada em Dons e
Ministérios (1987-1991). Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de
Educação e Letras, Universidade Metodista de Piracicaba, Piracicaba, 1992.

_____________________; CUNHA, Magali do Nascimento. Forjando uma nova


Igreja: dons e ministérios em debate. São Bernardo do Campo, Editeo, 2001.

_____________________; CUNHA, Magali do Nascimento; LOPES, Nicanor


(Org.). Pastoral urbana: presença pública da Igreja em áreas urbanas. São
Bernardo do Campo: Editeo/Umesp, 2006.

CASTRO, Emilio. Servos livres: missão e unidade na perspectiva do reino. Rio


de Janeiro: CEDI, 1986.

CAVALCANTI, Robinson. Cristianismo e política: teoria bíblica e prática


histórica. Viçosa/MG: Ultimato, 2002

CENNI, Franco. Italianos no Brasil. 3. ed. São Paulo: EDUSP, 2003.

CÉSAR, Ely Eser Barreto. A visão educacional originada do PVM e das DEIM.
Revista de Educação do COGEIME, São Paulo, ano 12, n. 23, dez. 2003.
262

_____________________. O projeto de escola metodista confessional sob a


luz da espiritualidade wesleyana. Revista do COGEIME, São Paulo, ano 12, n.
22, p. 59-68, jun. 2003.

_____________________. Por que o Plano para a Vida e Missão falou?


Revista Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 12, n. 20, p. 59-68, jul./dez.
2007.

_____________________. Projeto Missionário presente no Plano para a Vida e


Missão confrontado com a tradição wesleyana e a programação missionária da
IM de 2003. In: RIBEIRO, Claudio de Oliveira et al. (Org.). Teologia e prática na
tradição wesleyana: uma leitura a partir da América Latina e Caribe. São
Bernardo do Campo: Editeo, 2005.

_____________________; LOPES, Nicanor. Manual de estudos para o Plano


para a Vida e Missão (14 estudos), Piracicaba: Agentes da Missão, 1992.

CHAVES, Odilon Massolar. Avivamento e o compromisso social metodista, na


Inglaterra, no século XVIII: uma busca de subsídios para a identidade do
metodismo brasileiro no 3° milênio. Tese (Doutorado em Ciências da Religião)
– Faculdade de Filosofia e Ciências da Religião, Universidade Metodista de
São Paulo, São Bernardo do Campo, 2002.

CHILCOTE, Paul Wesley. Ella ofreció a Cristo: el legado de las mujeres


predicadoras en el metodismo primitivo. Nashville: Abingdon Press, [s.d.].

CLAI. Oaxtepec 1978: unidad y misión en América Latina. Costa Rica: Comité
Editorial del CLAI, Consejo Latinoamericano de Iglesias, 1980.

COMBLIN, José. Teologia da Missão. Petrópolis: Vozes, 1980.

COSTA, Nelson de Godoy. César Dacorso Filho, príncipe da Igreja Metodista


do Brasil. São Paulo: Imprensa Metodista, 1967.

COSTAS, Orlando. Hacia una teologia de la evangelizacion. Buenos Aires: Ed.


La Aurora, 1973.

CUNHA, Magali do Nascimento. A explosão gospel: um olhar das ciências


humanas sobre o cenário evangélico no Brasil. Rio de Janeiro: Mauad; Instituto
Mysterium, 2007.

_____________________. A Igreja Metodista e a cultura brasileira. In: SOUZA,


José Carlos de (Org.). Caminhos do metodismo no Brasil: 75 anos de
autonomia. São Bernardo do Campo: Editeo, 2005.

_____________________. Quando a vida supera as fronteiras. Revista


Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 12, n. 19, p. 117-211, jan./jun. 2007.

_____________________. Tempo de nostalgia ou de recriar utopias? Um olhar


sobre os anos de 1980 vinte anos depois. In LOPES, Nicanor; RIBEIRO,
262

Claudio de Oliveira. 20 anos depois: a vida e a missão da Igreja em foco. São


Bernardo do Campo: Editeo, 2002.

DIGGINS, John Patrick. Max Weber: a política e o espírito da tragédia. São


Paulo: Record, 1999.

DREHER, Martin N. A crise e a renovação da igreja no período da Reforma.


São Leopoldo: Sinodal, 1996.

_____________________. A igreja latino-americana no contexto mundial. São


Leopoldo: Sinodal, 1999.

_____________________. Imigrações e história da Igreja no Brasil. Aparecida:


Santuário, 1993.

DUSSEL, Enrique. Tensiones en el espacio religioso: masones, liberales y


protestantes em la obra de Mariano Soler. In: BASTIAN, Jean-Pierre (Org).
Protestantes, liberales y francmasones. México: Cehila, 1990.

ELIAS, Beatriz Vicentini. Vieram e ensinaram (Colégio Piracicabano, 120 anos).


Piracicaba: Editora Unimep, 2001.

ENCYCLOPAEDIA BRITANICA. Or A Dictionary of Arts, Sciences, and


Miscellaneous Literature. London: Archibald Constable and Company, 1823.

ENSLEY, Francis Gerald. John Wesley, o evangelista. São Paulo: Imprensa


Metodista, 1960.

ESCOBAR, Samuel. Missiologia evangélica: olhando para o futuro na virada do


século. In: TAYLOR, Willian (Org). Missiologia global para o século XXI.
Londrina: Descoberta, 2001.

FABRIS, Rinaldo. As cartas de Paulo. Vol III: Tradução e comentários. São


Paulo: Loyola, 1992.

FACHIN, Odília. Fundamentos de metodologia. São Paulo: Saraiva, 2001.

FAUSTO, Boris. Getulio Vargas: o poder e o sorriso. São Paulo: Companhia


das Letras, 2006.

FISCHER, Joachim H. Reforma: renovação da Igreja pelo evangelho. São


Leopoldo: Sinodal, 2006.

FLORISTA, Casiano. Teologia Practica: Teoria y Praxis de la Accion Pastoral.


Salamanca: Sigueme, 1993.

FORD, David. The Modern Theologians: An Introduction to Christian Theology


in the Twentieth Century. Malden: Blackwell Publishing, 1997.
262

FRAGOSO, Hugo. História da Igreja no Brasil: ensaio de interpretação a partir


do povo, segunda época – a igreja no Brasil no século XIX. Tomo II/1: História
geral da Igreja na América Latina. 3. ed. Petrópolis: Vozes; São Paulo:
Paulinas, 1992.

GAARDER, Jostein. O Livro das religiões. São Paulo: Cia. Das Letras, 2000.

GALLAY, Allan. The Origins of Slaveholders Paternalism: George Whitefield,


the Bryan Family, and the Great Awakening in the South. The Journal of
Southern History, Athens, GA, v. 53, n. 3, p. 369-394, Aug. 1987.

GARCIA, Paulo Roberto. Bases bíblicas para a missão. In: CONSELHO


LATINO-AMERICANO DE IGREJAS (Org.). Missão, unidade e identidade da
Igreja. Quito: Departamento de Comunicações do CLAI, 2000, p. 1-18.

_____________________. O sofrimento e a missão: reflexões a partir de 2


Coríntios 10-13. Revista Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 15, n. 1, p.
29-37, jan./jun. 2010.

GENNEP, Arnold van. The Rites of Passage. Chicago: Chicago University


Press, 1960.

GEORGE, Sherron Kay. Participantes da graça: parceria na missão de Deus.


São Leopoldo: Sinodal, 2006.

GIROLETTI, Domingos. Industrialização de Juiz de Fora: 1850-1930. Juiz de


Fora: EDUFJF, 1988.

GONZÁLEZ, Justo L.; CARDOZA ORLANDI, Carlos. História do movimento


missionário. São Paulo: Hagnos, 2008.

GOULART, Acir; ROMERO, Francisco; ROMERO, Maria Rosa. A vontade de


Deus. Piracicaba: Unimep, 1983 (Cadernos Vida e Missão).

GRINGS, Dadeus. A evangelização da cidade: o apostolado urbano. Porto


Alegre: EDIPUCRS, 2004.

GUDER, Darrel L. (Org.). Missional Church: A Vision for the Sending of the
Church in North America. Grand Rapids: B. Eerdmans Publishing, 1998.

GUTIÉRREZ, Gustavo. Teologia da libertação: perspectivas. 3. ed. São Paulo:


Loyola, 1979.

HALÉVY, Élie. A History of the English People in the Nineteenth Century. Vol.
4. California: California University Press, 1951.

HARTER, Eugene C. The Lost Colony of the Confederacy. Jackson: University


Press of Mississippi, 1985.
262

HEITZENRATER, Richard P. Wesley e o povo chamado metodista. São


Bernardo do Campo: Editeo; Rio de Janeiro: Pastoral Bennett, 1996.

HELM, Paul. Faith with Reason. London: Oxford University Press, 2000.

HENGEL, Martin. The Son of God: The Origin of Christology and the History of
Jewish-Hellenistic Religion.Nwe York: Wipf & Stock Publishers, 2007.

HILSDORF, Maria Lúcia Spedo. História da educação brasileira: histórias. São


Paulo: Thompson, 2003.

HOCHSCHILD, Adam. Enterrem as correntes. Rio de Janeiro: Record, 2007.

HORTAL, Jesus. “CESE”. In: Guia ecumênico: informações, normas e diretrizes


sobre ecumenismo. 3. ed. São Paulo: Paulus, 2003 (Estudos da CNBB, 21).

_____________________. E haverá um só rebanho: história, doutrina e prática


católica do ecumenismo. São Paulo: Loyola, 1996.

HOUAISS, Antonio. Dicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva,


2001.

IBGE, Censo Demográfico 2000. <disponível na Internet:


http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/calendario.shtm>

IGREJA METODISTA, Colégio Episcopal. Atas e Documentos do 18° Concílio


Geral da Igreja Metodista, realizado em Aracruz/ES e São Bernardo do
Campo/SP. Edição eletrônica. Disponível em
<www.metodista.org.br/conteudo.xhtml?c=9904>. Acesso em: 12 mai. 2011.

_____________________. Carta pastoral do Colégio Episcopal sobre o G-12.


Disponível em:
<http://www.metodista.org.br/arquivo/documentos/download/carta_G12.pdf>.
Acesso: em 20 mar. 2011.

_____________________. Carta pastoral: servos/as, sábios/as, santos/as,


solidários/as. São Paulo: Imprensa Metodista, 1989.

_____________________. Livro de Atas e Documentos do 17° Concílio Geral


da Igreja Metodista, realizado em Maringá/PR. São Paulo: Editora Cedro, 2003.

_____________________. Plano para Vida e a Missão. 3. ed. São Paulo:


Cedro, 2001.

_____________________. Plano Quadrienal 1979-1982. In: Atas e


Documentos do XI Concílio Geral, 1979. São Paulo: Imprensa Metodista, 1978.

_____________________. Vida e missão: decisões do XIII Concílio Geral da


Igreja Metodista. Piracicaba: Unimep, 1982.
262

_____________________. Atas e Documentos do 18° Concílio Geral. São


Paulo: IM, 2006.

_____________________. A Igreja de Dons e Ministérios: a visão dos bispos.


Piracicaba: Agentes da Missão, 1991.

_____________________. Mensagem do Colégio Episcopal da Igreja


Metodista ao Encontro Nacional de Pastores e Pastoras. Expositor Cristão, São
Paulo, out. 1998.

_____________________. Atas do 2° Concílio Geral da Igreja Metodista do


Brasil, Porto Alegre, 4 a 19 de janeiro de 1934. São Paulo: Imprensa Metodista,
1934.

_____________________. Atas do 6° Concílio Geral da Igreja Metodista do


Brasil, Porto Alegre, 12 a 16 de fevereiro de 1950. São Paulo: Imprensa
Metodista, 1950.

_____________________.Anais do 4° Concílio Geral da Igreja Metodista,


Piracicaba: 8 a 19 de fevereiro de 1942

_____________________. Anuário do Concílio Regional do Norte. Belo


Horizonte, 29 de janeiro a 4 de fevereiro de 1935.

_____________________. Atas do 1° Concílio Geral da Igreja Methodista do


Brasil. São Paulo: Imprensa Metodista, 1930.

_____________________. Atas do 2º Concílio Geral da Igreja Metodista do


Brasil. São Paulo: Imprensa Metodista, 1934.

_____________________. Atas do 4° Concílio Geral da Igreja Metodista do


Brasil. Piracicaba: Editora IEP, 1942.

_____________________. Atas e Documentos do 7° Concílio Geral da Igreja


Metodista do Brasil, Rio de Janeiro: 10 a 21 de julho de 1955.

_____________________. Atas e Documentos do XIII Concílio Geral. Belo


Horizonte: Igreja Metodista, 1982.

_____________________. Como criar e desenvolver o Ministério de Ação


Social na Igreja local. São Paulo: Cedro; Coordenação Nacional de Ação
Social, 2000.

_____________________. Expositor Cristão, Rio de Janeiro, v. XXII, n. 20, 16


mai. 1907.

_____________________. Manual missionário do povo metodista. Piracicaba:


Editora Agentes da Missão, 1988 (Coleção Dons e Ministérios).

_____________________. O culto da Igreja e missão. São Paulo: Cedro, 2006.


262

_____________________. Registros, atas e documentos do 16º Concílio Geral


da Igreja Metodista. São Bernardo do Campo: IMS, 1988, p. 102.

_____________________. Vida e missão: decisões do XIII Concílio Geral da


Igreja Metodista. Piracicaba: Editora Unimep, 1982.

JACOB, Cesar Romero et al. Atlas da filiação religiosa e indicadores sociais no


Brasil. Rio de Janeiro: Editora PUC-Rio, 2003.

JAIME, Eduardo Mena Barreto. História do metodismo no Rio Grande do Sul.


Porto Alegre: Gráfica Moderna, 196.

_____________________. O evangelismo wesleyano. Expositor Cristão, São


Paulo, 4 out. 1938.

JENKINS, Philip. A próxima cristandade: a chegada do cristianismo global. Rio


de Janeiro: Record, 2004.

JENNINGS JR., Theodore W. Wesley e o mundo atual. São Bernardo do


Campo: Editeo, 2007.

JOSGRILBERG, Rui de Souza. A autonomia e a cultura brasileira. Revista


Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 10, n. 2 [16], p. 43-56, jul./dez. 2005.

_____________________. A fé em busca da teologia. In: MARASCHIN, J. C.


(Org.) Teologia sob limite. São Paulo, ASTE, 1992.

_____________________. O movimento da autonomia – nasce a “Igreja


Metodista do Brasil”, 2 de setembro de 1930. In: SOUZA, José Carlos de
(Org.). Caminhos do metodismo no Brasil: 75 anos de autonomia. São
Bernardo do Campo, Editeo, 2005.

_____________________. Qual o sentido de “Social” na “Religião Social” de


John Wesley? In: RENDERS, Helmut et al. Sal da terra e luz do mundo. São
Bernardo do Campo: Editeo, 2009.

KEENER, Craig S. Matthew. Downers: InterVarsity Press, 1997 (New


Testament Commentary Series).

KENNEDY, L. James. Cincoenta annos de methodismo no Brasil. São Paulo:


Imprensa Metodista, 1928.

KEY, Jerry Stanley. O preparo e a pregação do sermão. Rio de Janeiro: Juerp,


2001.

KIDDER, Daniel P. Reminiscências de viagens e permanência no Brasil. Rio de


Janeiro; Província de São Paulo: Senado Federal, 2001.

_____________________; FLETCHER, J. C. O Brasil e os brasileiros: esboço


histórico e descritivo. Rio de Janeiro: Companhia Editora Nacional, 1941.
262

KIENZLE, Beverly Mayne; WALKER, Pamela J. (Ed.). Women Preachers and


Prophets: through Two Millennia of Christianity. Los Angeles: University of
California Press, 1998.

LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Marina Andrade. Fundamentos de


metodologia científica. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2009.

LAW, William. A Serious Call to a Devout and Holy Life. Newcastle: J. Backer
Printer, 1845.

LEITE, Nelson Luiz Campos. Discipulado e graça: o “estilo” ministerial de


Jesus. Mosaico Apoio Pastoral, São Bernardo do Campo, ano 16, n. 42, p. 12-
17, jun./set. 2008.

LÉONARD, Émile G. O protestantismo brasileiro. 3. ed. São Paulo: ASTE,


2002.

LIBÂNIO, João Batista. A religião no início do milênio. São Paulo: Loyola, 2002.

_____________________. A vida religiosa na crise da modernidade brasileira.


São Paulo: Loyola, 1996.

_____________________. Os carismas na Igreja do terceiro milênio:


discernimento, desafios e práxis. São Paulo: Loyola, 2007.

_____________________. Teologia da Libertação: roteiro didático para um


estudo. São Paulo: Loyola, 1987.

LIENHARD, Mac. Martim Lutero: tempo, vida, mensagem. São Leopoldo:


Sinodal, 2003.

LLOYD-SIDLE, Patricia; LEWIS, Bonnie Sue. Teaching Mission in a Global


Context. Louisville: Geneva Press, 2001.

LOCKMANN, Paulo Tarso de Oliveira. O Reino de Deus – seu lugar bíblico-


teológico no Plano para a Vida e a Missão da Igreja. Revista Caminhando, São
Bernardo do Campo, v. 12, n. 20, p. 43-54, jul./dez. 2007.

_____________________. Jesus, o messias profeta. São Bernardo do Campo:


Editeo, 2011.

LOMBARDI, José Claudinei et. al. (Org.) Navegando pela história da educação
brasileira. Campinas: Graf. FE: HISTEDBR; Unicamp, 2006. CD-ROM.

LONG, Eula Lee Kennedy. Do meu velho baú metodista. São Paulo: Junta
Geral de Educação Cristã; Igreja Metodista, 1968.

LONGUINI NETO, Luiz. O novo rosto da missão. Viçosa/MG: Ultimato, 2002.


262

_____________________. Pastoral como o novo rosto da missão: um estudo


comparativo dos conceitos de Pastoral e Missão nos movimentos Ecumênico e
Evangelical no Protestantismo Latino-Americano (1960-1992). Tese (Doutorado
em Ciências da Religião) – Faculdade de Filosofia e Ciências da Religião,
Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 1997.

LOPES, Lucia Helena Coelho de Oliveira. Educação, missão e gênero: as


cartas de Martha Hite Watts (1881-1895). Dissertação (Mestrado em
Educação) – Faculdade de Humanidades e Direito, Universidade Metodista de
São Paulo, São Bernardo do Campo, 2010.

LOPES, Nicanor. Formação teológica na modalidade da Educação a Distância.


Revista Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 14, n. 2, p. 67-79, jul./dez.
2009.

_____________________. Responsabilidade social e Terceiro Setor: uma


análise crítica da Associação Beneficente Campineira à luz da teologia prática.
Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) – Faculdade de Filosofia e
Ciências da Religião, Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do
Campo, 2003.

LUCCOK, Halford E. Linha do esplendor sem fim. São Paulo: Junta Geral de
Educação Crista Igreja Metodista do Brasil, [s.d.].

MADDOX, Randy L.; RUNYON, Theodore. Rethinking Wesley's Theology for


Contemporary Methodism. Michigan: Kingswood Books, 1998.

MAIA, Adriel de Souza. Pistas para aprofundamento da compreensão da Carta


Pastoral do Colégio Episcopal: Servos/ Servas/ Santos/ Santas/ Sábios/
Sábias/ Solidários/ Solidárias. São Paulo: Imprensa Metodista, 2006.

MAIA, Almir (Org.). “A educação é nosso mundo”. Visão retrospectiva da


IAMSCU e suas perspectivas, Piracicaba, 2011, CD-ROM.

MANUAL MISSIONÁRIO DO POVO METODISTA. Piracicaba: Editora Agentes


da Missão, 1988 (Coleção Dons e Ministérios).

MARCOVITCH, Jacques. Pioneiros e empreendedores: a saga do


desenvolvimento no Brasil. Vol. 2. São Paulo: Edusp, 2005.

MARIANO, Ricardo. Neopentecostais: sociologia do novo pentecostalismo no


Brasil. 2. ed. São Paulo: Loyola, 2005.

MATHISEN, Robert R. Critical Issues in American Religious History. Waco:


Baylor University Press, 2001.

MATTHEY, Jacques. Reconciliação como missão de Deus – Igreja como


comunhão reconciliante. Revista de Estudos Teológicos, São Leopoldo, v. 45,
n. 2, p. 31-48, 2005.
262

MATTOS, Paulo Ayres. A obra educacional da Igreja Metodista no Brasil: um


sumário histórico-teológico. Revista de Educação do COGEIME, ano 9, n. 16,
p. 65-75, jun. 2000.

_____________________. Confessionalidade, educação e escola: um enfoque


histórico. Revista do COGEIME, São Paulo, ano 1, n. 1, p. 9-24 1991.

_____________________. Evangelização para a realidade brasileira. Expositor


Cristão, São Paulo, dez. 1965.

_____________________. Expansão do metodismo no nordeste. Expositor


Cristão, São Paulo, ago. 1987.

_____________________. Mais de um século de educação metodista.


Piracicaba: COGEIME, 2000.

McDONALD, W. El Wesley del Pueblo. México: Casa Unida de Publicaciones,


1985.

MELO, Antonio Alves. A evangelização no Brasil: dimensões teológicas e


desafios pastorais. Roma: Editora da Pontifícia Università Gregoriana, 1996.

MENDONÇA, Antonio Gouvêa. Gênese dos protestantismos brasileiros.


Lusotopie, p. 299-306, 1998. Disponível em:
<http://www.lusotopie.sciencespobordeaux.fr/somma98.html>. Acesso em: 05
abr.2010.

_____________________. O celeste porvir: a inserção do protestantismo no


Brasil. 3 ed. São Paulo: Edusp, 2008.

_____________________. O movimento ecumênico no século XX - algumas


observações sobre suas origens e contradições. Tempo e Presença Digital, ano 3,
n. 12. Disponível em:
<http://www.koinonia.org.br/tpdigital/detalhes.asp?cod_artigo=236&cod_boletim=13
&tipo=Artigo>. Acesso em: 02 mar. 2010.

_____________________. O movimento ecumênico no século XX - algumas


observações sobre suas origens e contradições. In: Revista Tempo e Presença
Digital, ano 3, n. 12. Disponível em:
<http://www.koinonia.org.br/tpdigital/detalhes.asp?cod_artigo=236&cod_boletim
=13&tipo=Artigo>. Acesso em: 02 mar. 2010.

_____________________; VELASQUES FILHO, Prócoro. Introdução ao


protestantismo no Brasil. São Paulo: Loyola, 1990.

MESQUIDA, Peri. Hegemonia norte-americana e educação protestante no


Brasil: um estudo de caso. Juiz de Fora: EDUFJF; São Bernardo do Campo:
Editeo, 1994.
262

MESQUITA, Zuleica de Castro. Crise da Faculdade de Teologia em 1968 à luz


do pensamento de Edgar Morin. Piracicaba: Atlas, 1997.

_____________________. Evangelizar e civilizar: cartas de Martha Watts


(1881-1908). Piracicaba: Editora Unimep, 2001.

METHODIST EPISCOPAL CHURCH. Minutes. Boston: New England


Conference, 1868.

METHODISTS. Webster´s Quotations, Facts and Phrases. New York: ICON


Group International, 2008.

MÍGUEZ BONINO, José et al. Luta pela vida e evangelização: a tradição


metodista na teologia latino-americana. São Paulo: Paulinas, 1985.

_____________________. A fé em busca de eficácia: uma interpretação


teológica latino-americana sobre libertação. São Leopoldo: Sinodal, 1987.

_____________________. Metodismo: releitura latino-americana. São


Bernardo do Campo: Editeo; Piracicaba: Unimep, 1983.

_____________________. Rostos do protestantismo latino-americano. São


Leopoldo: Sinodal, 2003.

MILBANK, John. Teologia e teoria social: para além da razão secular. São
Paulo: Loyola, 1995.

MOLTMANN, Jürgen. Teologia da Esperança: estudos sobre os fundamentos e


as conseqüências de uma escatologia cristã. 3. ed. São Paulo: Teológica;
Loyola, 2005.

MORA, José Ferrater. Dicionário de filosofia. Tomo IV (Q-Z). São Paulo:


Loyola, 2004.

MORAES, Stanley da Silva. Uma Igreja que tem coragem de definir sua
identidade. Revista de Educação do COGEIME, São Paulo, ano 12, n. 23, dez.
2003.

MOURA, Clóvis. Dicionário da escravidão negra no Brasil. São Paulo: USP,


2004.

MÜLLER, Karl. Teologia da Missão. Petrópolis: Vozes, 1995.

MURAD, Afonso. Este cristianismo inquieto: a fé cristã encarnada em J. L.


Segundo. São Paulo: Loyola, 1994.

NARDI, Roberto (Org.). Educação em ciências: da pesquisa à pratica docente.


São Paulo: Escrituras Editoras, 2003.
262

NASCIMENTO, Amós. John Wesley, o Iluminismo e a educação metodista na


Inglaterra. Revista de Educação do COGEIME, Piracicaba, ano 12, n. 22, p. 89-
104, jun. 2003.

NEILL, Stephen. História das missões. 2. ed. São Paulo: Vida Nova, 1989.

NEWPORT, Kenneth G. C. The Sermons of Charles Wesley: A Critical Edition


with Introduction and Notes. New York: Oxford University Press, 2001.

NIEBUHR, Richard H. As origens sociais das denominações cristãs. São Paulo:


ASTE; Ciências da Religião, 1992.

O’COLLINS, Gerald; LATOURELLE, René (Org). Problemas e perspectivas de


teologia fundamental. São Paulo: Loyola, 1993.

OLIVEIRA, Cilas Ferraz de. Nunca, na história deste país... a contribuição de


Guaracy Silveira ao Metodismo do Brasil. Tese (Doutorado em Educação) –
Faculdade de Ciências Humanas, Universidade Metodista de Piracicaba,
Piracicaba, 2008.

_____________________. O movimento de autonomia da Igreja Metodista do


Brasil. Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) – Faculdade de
Filosofia e Ciências da Religião, Universidade Metodista de São Paulo, São
Bernardo do Campo, 2001.

_____________________. Protestante na política: O caso Guaracy Silveira. X


Simpósio Internacional – Processo Civilizador, 1, 2, 3 e 4 de abril, Campinas:
Unicamp, 2007.

OLIVEIRA, Clory Trindade de. A trajetória da educação metodista PVM e


DEIM: 20 anos de história. Revista de Educação do COGEIME, São Paulo, ano
12, n. 23, dez. 2003.

_____________________. Situações missionárias na história do metodismo.


São Bernardo do Campo: Editeo, 1991.

OLIVEIRA, José Lisboa Moreira de. Pastoral vocacional e cultura urbana:


desafios e perspectivas de interação. São Paulo: Loyola, 2002.

OLIVEIRA, Lúcia Lippi. A questão nacional na Primeira República. São Paulo:


Brasiliense, 1990.

OLIVEIRA, Silvio Luiz. Metodologia científica aplicada ao Direito. São Paulo:


Cengage Learning, 2002.

OLSON, Roger E. God in Dispute: Conversations among Great Christian


Thinkers. From the Early Church into the 21st Century. Grand Rapids: Baker
Academic, 2009.
262

ORMEROD, Neil J.; CLIFON, Shane. Globalization and the Mission of the
Church: Ecclesiological Investigations. New York: T&T Clark, 2009.

PAIVA, Geraldo José de. Entre a necessidade e o desejo: diálogos da


psicologia e a religião. São Paulo: Loyola, 2001.

PANAZZOLO, João. Missão para todos: introdução à missiologia. São Paulo:


Paulus, 2006.

PEREIRA, Potyara A. P. Política social: temas e questões. São Paulo: Cortez,


2008.

PERROTTI, Edmir. Confinamento cultural, infância e leitura. São Paulo:


Summus, 1990.

PIEDRA, Arturo. Evangelização protestante na América Latina. São Leopoldo:


Sinodal, 2008.

PITTS, Fountain E. A Defense of Armageddon: or Our Great Country Foretold


in the Holy Scriptures. Baltimore: J. W. Bull, 1859

PROBLEMAS para um metodista pensar. [s.l.]: [s.n.], 1982.

RAMOS, Luiz Carlos. A prática homilética de John Wesley. Revista


Caminhando, São Bernardo do Campo, ano IX, n. 13, p. 133-152, jan./jun.
2004.

_____________________. A pregação na idade mídia: os desafios da


sociedade do espetáculo para a prática homilética contemporânea. Tese
(Doutorado em Ciências da Religião) – Faculdade de Filosofia e Ciências da
Religião, Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo,
2005.

_____________________. Prática homilética de John Wesley. Revista


Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 9, n. 13, p. 134-153, jan./jun. 2004.

RAUSCHENBUSCH, Walter. A Theology for the Social Gospel. New York:


Macmillian, 1917 [New York: Westminster John Knox Press, 1997].

REILY, Duncan A. Cruzada metodista de evangelização. Expositor Cristão, São


Paulo, ano 70, n. 4, 13 out. 1955. Os alvos para o período eram: para a EE.DD,
58.200 matriculados (foram alcançados 48.800) e para novos membros, 45.000
(foram alcançado 40.500).

_____________________. História documental do protestantismo no Brasil.


São Paulo: ASTE, 1984.

_____________________. Situações missionárias na história do metodismo.


São Bernardo do Campo: Editeo, 1991.
262

_____________________. Wesley e sua Bíblia. São Bernardo do Campo:


Editeo, 1997.

_____________________. A influência do metodismo na reforma social na


Inglaterra no século XVIII. São Paulo: Junta Geral de Ação Social, 1953.

_____________________. Metodismo brasileiro e wesleyano. São Bernardo do


Campo: Imprensa Metodista, 1981.

_____________________. O metodismo na Amazônia: a obra pioneira de


Justus Nelson (1880 – 1925). São Bernardo do Campo: IMS; Faculdade de
Teologia, 1982.

_____________________. Suzana Wesley: a mãe do metodismo. Revista Voz


Missionária, São Paulo: II Trimestre 1999.

REIS, José Carlos. As identidades do Brasil: de Varnhagen a FHC. Rio de


Janeiro: Editora FGV, 2007.

RENDERS, Helmut. Andar como Cristo andou: a salvação social em John


Wesley. São Bernardo do Campo: Editeo, 2010.

_____________________. O metodismo nascente como Movimento. Revista


Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 9, n. 1, p. 121-136, jan./jun. 2005.

_____________________. O Plano para a Vida e a Missão e sua


espiritualidade correspondente. Revista Caminhando, São Bernardo do Campo,
v. 12, n. 20, p. 85-104, jul./dez. 2007.

_____________________. Um Credo Social para o século 21: a mais recente


versão do Credo Social estadunidense como inspiração para a atualização do
Credo Social brasileiro. Revista Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 15,
n. 1, p. 175-180, jan./jun. 2010.

_____________________. Um precursor do PVM na época da autonomia: a


declaração A Atitude da Igreja Metodista do Brasil perante o Mundo e a Nação,
de 1934. Revista Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 12, n. 20, p. 167-
176, jul./dez. 2007.

_____________________; SOUZA, José Carlos de. História da Igreja


Metodista no Brasil: dos inícios até 2009. São Bernardo do Campo, 2009.
Disponível em:
<https://arkheia.metodista.br/jspui/bitstream/123456789/129/1/Historia%20da%
20Igreja%20Metodista%20no%20Brasil.pdf>. Acesso em: 12 fev. 2010.

RIBEIRO, Claudio de Oliveira. Leituras de aquecer o coração. São Paulo:


Cedro, 2001.

_____________________. O Plano para a Vida e a Missão Morreu? Reflexões


sobre a ação evangelizadora e os desafios missionários da Igreja Metodista em
262

terras brasileiras. Revista Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 12, n. 20,


p. 81-82, 2007.

_____________________. Por uma eclesiologia metodista brasileira. Revista


Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 9, n. 1, 2004.

_____________________. Trindade: a vida e a missão da Igreja nos


documentos da década de 60. Revista Caminhando, São Bernardo do Campo,
v. 10, n. 2, mês jul./dez. 2005.

_____________________. Por uma eclesiologia metodista brasileira. Revista


Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 10, n. 2, jul./dez. 2005.

_____________________; LOPES, Nicanor (Org.). 20 anos depois: a vida e a


missão da Igreja em foco. São Bernardo do Campo: Editeo, 2002.

RIBEIRO, Darcy. O processo civilizatório: etapas da evolução sociocultural. 2.


ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

ROSA, João Guimarães. Grande sertão: veredas. 19 ed. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 2001.

ROSENZWEIG, Franz. El nuevo pensamiento. Madrid: Visor, 1989.

RUBIN Jr., Louis Decimus. The Wary Fugitives: Four Poets and the South.
Baton Rouge: Louisiana State University Press, 1923.

RUNYON, Theodore. A nova criação: a teologia de John Wesley hoje. São


Bernardo do Campo: Editeo, 2002.

SAID, Edward W. Reflexões sobre o exílio e outros ensaios. São Paulo:


Companhia das Letras, 2003.

SALVADOR, José Gonçalves. História do metodismo no Brasil. São Bernardo


do Campo: Imprensa Metodista, 1982.

SAMPAIO, Jorge Hamilton. Os difíceis anos 60 In: SOUZA, José Carlos de


(Org.). Caminhos do metodismo no Brasil: 75 anos de autonomia. São
Bernardo do Campo: Editeo, 2005.

_____________________. Sobre sonhos e pesadelos da juventude metodista


brasileira nos anos sessenta. Tese (Doutorado em Ciências da Religião) –
Faculdade de Filosofia e Ciências da Religião, Universidade Metodista de São
Paulo, São Bernardo do Campo, 1998.

SANCHIS, Pierre (Org.). Catolicismo: modernidade e tradição. São Paulo:


Loyola, 1992.
262

SANT’ANA, Júlio de. A Igreja e o desafio dos pobres: tempo e presença.


Petrópolis: Vozes, 1980.

SANTIAGO, Theo. Do feudalismo ao capitalismo: uma discussão histórica. 10.


ed. São Paulo: Contexto, 2006.

SANTOS, Lyndon. O protestantismo no advento da República no Brasil:


discursos, estratégias e conflitos. Revista Brasileira de História das Religiões-
ANPUH, São Paulo, ano III, n. 8, set. 2010.

SANTOS, Marcelo. O poder norte americano e a América Latina no pós-guerra


fria. São Paulo: Annablume; Fapesp, 2007.

SCHÜLER, Arnaldo. Dicionário enciclopédico de teologia. Canoas: ULBRA,


2002.

SCHWAB, Augusto. Evangelismo. Expositor Cristão, São Paulo, v. 54, n. 42, 21


nov. 1939.

SERBIN, Kenneth P. Diálogos na sombra: bispos e militares, tortura e justiça


social na ditadura. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.

SILVA, Elena Alves. João Parahyba Daronch da Silva. In: SINNER, Rudolf;
WOLF, Elias; BOCK, Carlos Gilberto (Org.). Vidas ecumênicas: testemunhas
do ecumenismo no Brasil. São Leopoldo: Sinodal; Porto Alegre: Padre Réus,
2006.

SILVA, Eliane Moura. Gênero, religião, missionarismo e identidade protestante


norte-americana no Brasil ao final do século XIX e inícios do XX. Mandrágora,
São Bernardo do Campo, ano XIV, n. 14, 2008.

SILVA, Geoval Jacinto da. A relevância do pensamento de John Wesley para a


Teologia Pastoral. Revista Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 9, n. 18,
p. 121-136, jan./jun. 2005.

_____________________. O fim do período missionário! Surge a nova Igreja!


Reflexão pastoral sobre a autonomia da Igreja Metodista e seus reflexos na
Terceira Região Eclesiástica, berço da autonomia. Revista Caminhando, São
Bernardo do Campo, v. 10, n. 2 [16], p. 150-161, jul./dez. 2005.

_____________________; LOPES, Nicanor. Igreja de dons e ministérios e os


grupos societários: reflexão histórica da evolução e não evolução dos grupos
societários na perspectiva da Igreja de Dons e Ministérios. Revista
Caminhando, São Bernardo do Campo, v. 12, n. 20, p. 135-148, jul./dez. 2007.

SILVA, Livingstone dos Santos. Instituto Central do Povo – 100 anos em


Missão [WAY, Anita Betts. Instituto Central do Povo – 100 anos em Missão.
São Paulo: Umesp, 2006]. In: Revista de Educação do COGEIME, Piracicaba,
ano 15, n. 29, p. 99-101, dez. 2006.
262

SIQUEIRA, Mirella Loterio. Entidades religiosas e política de atendimento a


Infância e adolescia: reflexões sobre os desafios de efetivação do Estatuto da
Criança e Adolescente. In: Libertas: Revista Eletrônica do Programa de Pós
Graduação em Serviço Social, Juiz de Fora, v. 2, n. 2, p. 73-90, jul. 2008.

SMITH, Julia Floyd. Slavery and Rice Culture in Low Country Georgia, 1750-
1860. Knoxville: University of Tennessee Press, 1991.

SOARES, Luiz Carlos. A Albion revisitada: ciência, religião, ilustração e


comercialização do lazer na Inglaterra do século XVIII. Rio de Janeiro: 7Letras;
FAPERJ, 2007.

SOUZA, Darli Alves. As comunidades protestantes e o Congresso do Panamá:


um estudo do desenvolvimento das comunidades locais no movimento
ecumênico nas primeiras décadas do século XX. Dissertação (Mestrado em
Ciências da Religião) – Faculdade de Filosofia e Ciências da Religião,
Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2002.

SOUZA, José Carlos de (Org.). Caminhos do metodismo no Brasil: 75 anos de


autonomia. São Bernardo do Campo, Editeo, 2005.

_____________________. Introdução a Wesley. São Paulo: Editeo; CEDI,


1991 (Série Leituras da Bíblia: Wesley).

_____________________. Faculdade de Teologia: um passo consistente da


Igreja a caminho da autonomia. In: ______ (Org.). Caminhos do metodismo no
Brasil: 75 anos de autonomia. São Bernardo do Campo, Editeo, 2005.

_____________________. Leiga, ministerial e ecumênica: a Igreja no


pensamento de John Wesley. São Bernardo do Campo: Editeo, 2009.

_____________________.Linha do Tempo: Cronologia abreviada do


metodismo brasileiro (1835-2001). In: RAMOS, Luiz Carlos; SANTOS, Suely
Xavier dos; LIMA, Luciano José (Ed.). Anuário Litúrgico 2004. São Bernardo do
Campo: Editeo, 2004.

SOUZA, Maruilson Menezes de. Teologia salvacionista em ação: análise do


Caso Torre. São Paulo: Arte & Ciência, 1999.

SOUZA, Sandra Duarte de. Trânsito religioso e construções simbólicas


temporárias: uma bricolagem contínua. Revista Estudos de Religião, São
Bernardo do Campo, n. 20, p. 157-167, 2001.

STOLL, David. Is Latin America Turning Protestant? The Politics of Evangelical


Growth. Los Angeles: University of California Press, 1990.

SUNDERMEIER, Theo, Missio Dei Today: On the Identity of Christian Mission.


In: International Review of Mission, Genève, vol. 92, ed. 367, p. 560-578, Oct.
2003.
262

SUNG, Jung Mo. Sementes de esperança: a fé em um mundo em crise.


Petrópolis: Vozes, 2005.

TERCI, Eliana Tadeu. A cidade na primeira república: imprensa, política e


poder em Piracicaba. Tese (Doutorado em História) – Faculdade de Filosofia,
Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1997.

TILLICH, Paul. Teologia sistemática. Três volumes em um. 5. ed. São


Leopoldo: Sinodal, 2005.

TRACY, Joseph at al. History of American Missions to the Heathen: from Their
Commencement to the Present Time. Worcester: Sponner & Howland, 1840.

TUCKER, Huch C.; CERILLANES, J. I. Relatório da Comissão de Temperança


e Serviço Social. In: Atas do 1° Concílio Geral da Igreja Metodista do Brasil.
São Paulo: Imprensa Metodista, 1930.

VEIGA, Ilma Passos Alencastro. Aula: gênese, dimensões, princípios e


práticas. Campinas: Papirus, 2008.

VELHO, Otávio. Globalização: antropologia e religião. Disponível em:


<http://www.scielo.br/pdf/mana/v3n1/2458.pdf>. Acesso em: 01 mar. 2010.

VERCRUYSSE, Jos. Introdução à teologia ecumênica. São Paulo: Loyola,


1998.

VERNETTE, Jean. Parábolas para os nossos dias. São Paulo: Loyola, 1993.

VIEIRA, David Gueiros. O protestantismo, a maçonaria e a questão religiosa no


Brasil. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1980.

WAY, Anita Betts. Instituto Central do Povo: 100 anos em missão. São
Bernardo do Campo: Umesp, [s.d.].

WEBER, Max. A ética protestante e o “espírito” do capitalismo. Edição de


Antonio Flávio Pierucci. São Paulo: Companhia da Letras, 2007.

WESLEY, John. Obras de Wesley. Tomo VII. Editor General: Justo González.
Franklin: Providence House Publishers, 1996-1998 (Edición auspiciada por
Wesleyan Heritage Foundation).

WILLIAMS, Colin W. Igreja, onde estás? Formas dinâmicas do testemunho da


Igreja. São Paulo: Imprensa Metodista, 1968.

WILLIAMS, Jerry Ruth. Sighing Forth My Soul. Bloomington: Xlibris Corp.,


2007.

WIRTH, Lauri Emilio. Protestantismos latino-americanos: entre o imaginário


eurocêntrico e as culturas locais. Revista Estudos de Religião, ano XXII, n. 34,
p. 105-125, jan/jun. 2008.
262

YOUNG, Robert Anderson. Reminiscences. Nashville: Publishing House


Methodist Episcopal Church, South, Barbee & Smith, agents, 1900.

ZABATIERO, Júlio. Fundamentos da teologia prática. São Paulo: Mundo


Cristão, 2005.

Você também pode gostar