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Puberdade Precoce

PUBERDADE FISIOLÓGICA

 A puberdade compreende o período entre a infância e a vida adulta,


consistindo em uma fase de crescimento e desenvolvimento na qual há
modificações físicas e psicológicas que levam à maturidade sexual e
capacidade reprodutiva.
 É resultado da associação de fatores genéticos e ambientais, porém os
fatores que determinam seu início ainda não são totalmente conhecidos.
 A puberdade está intimamente relacionada com o eixo hipotálamo-
hipófise-gônada (HHG). O núcleo arqueado do hipotálamo e seus neurônios
liberam o GnRH, que é transportado para a hipófise anterior e estimula a
liberação do hormônio luteinizante (LH) e do folículo-estimulante (FSH).
 Estes últimos influenciam as gônadas para a produção dos hormônios
sexuais: nos meninos, o LH estimula a síntese de testosterona, enquanto o
FSH, a espermatogênese; já nas meninas, o LH e o FSH estimulam a
síntese de esteroides e a ovulação, respectivamente.
 As mudanças hormonais da puberdade têm início na vida fetal, quando a
hipófise fetal secreta LH e FSH (com predomínio deste último). Durante os
6 primeiros meses de vida, a secreção de testosterona pelos testículos e de
estradiol pelos ovários se torna importante.
 Após esse período, no entanto, a secreção hormonal diminui, permanecendo
baixa durante toda a infância, até que retorne na puberdade.
 Existem dois eventos principais na puberdade: a adrenarca e a gonadarca.
 A adrenarca ocorre pela estimulação do eixo hipotálamo-hipófise-
suprarrenal, com crescimento da camada reticular da suprarrenal e
aumento na produção de androgênios.
 Este evento é responsável pelo aparecimento dos pelos púbicos e
axilares, caracterizado pelo aumento da dosagem de de-
hidroepiandrosterona (DHEA) ou sua forma sulfatada (S-DHEA).
 A gonadarca, por sua vez, leva à ativação do eixo HHG, com o
desenvolvimento das mamas nas meninas e dos testículos nos meninos.
Caracteriza-se pelo aumento dos níveis de LH e FSH, além da
testosterona e estrogênio.
 Como avaliar a normalidade do desenvolvimento? Isso é feito de forma
objetiva pela observação das mudanças físicas, com seu início e o ritmo de
evolução, através da classificação de Tanner.
 Essa classificação se refere ao desenvolvimento de mamas (M) e pelos (P)
nas meninas e genitália (G) e pelos (P) nos meninos.
 Nas meninas, a menarca geralmente está relacionada com o T4 no
desenvolvimento das mamas, no qual há crescimento das aréolas.
 Nas meninas, os estrogênios levam ao desenvolvimento das mamas,
aumento dos grandes e pequenos lábios, aumento e redistribuição da
gordura corporal (predomínio no quadril), crescimento do útero,
estrogenização do epitélio vaginal (acidificação do pH e aparecimento de
leucorreia).
 O aparecimento de pelos púbicos, como dito anteriormente, têm sua origem
na produção de hormônio suprarrenal.
 O estirão puberal é consequência da ação conjunta dos esteroides
sexuais, hormônio de crescimento e fatores de crescimento (como o
IGF-1).
 Os hormônios sexuais influenciam de forma importante a maturação
óssea e o fechamento das epífises de crescimento, assim como a
aquisição de massa óssea.
 Para identificar e analisar os distúrbios puerperais, é importante conhecer
a cronologia normal dos eventos puberais.
 Nas meninas, o primeiro sinal é a aceleração do crescimento, porém o
aspecto mais marcante é a telarca (desenvolvimento das mamas); alguns
meses depois, os pelos púbicos começam a aparecer.
 A menarca ocorre geralmente após 2 anos do início do desenvolvimento
das mamas e, após esse momento, se inicia a desaceleração do
crescimento.
 A puberdade nas meninas ocorre entre 8 e 13 anos de idade, porém
existem variabilidades étnicas e regionais da época de início e ritmo de
evolução.
PUBERDADE PRECOCE

 A puberdade precoce (PP) é definida como o aparecimento de


caracteres sexuais secundários antes dos 8 anos nas meninas e antes
dos 9 anos nos meninos.
 No entanto, a idade não deve ser utilizada como critério isolado: deve-
se analisar a progressão dos caracteres sexuais, a velocidade de
crescimento e ritmo de maturação óssea.
 O desenvolvimento precoce da puberdade causa problemas como
estatura final inferior ao esperado (para o padrão genético familiar), além
de inadequação psicossocial.
 Os caracteres sexuais secundários podem ser classificados em dois
tipos: os heterossexuais e os isossexuais.
 Os heterossexuais são discordantes com o sexo genético da criança,
como é o caso da feminilização nos meninos e virilização nas meninas.
 Os isossexuais, por sua vez, são concordantes com o sexo genético.
 Quanto à etiologia, a puberdade precoce pode ser classificada de
acordo com a atividade do eixo HHG em:
1. Central (GnRH-dependente) – secundária à ativação do eixo HHG,
também chamada de PP verdadeira.
2. Periférica (GnRH-independente) – secundária à produção
autônoma de esteroides sexuais pelas suprarrenais ou gônadas,
independente do controle ou ativação do eixo HHG; chamada de
pseudo-puberdade precoce.
3. Combinada ou mista – compreende doenças com produção exacerbada
de esteroides sexuais, que induz ao amadurecimento precoce do eixo
HHG.
 Algumas condições levam a manifestações puberais isoladas, como o
desenvolvimento isolado das mamas, dos pelos púbicos ou da menarca,
chamadas respectivamente de telarca, adrenarca e menarca isoladas. Essas
condições são chamadas de desenvolvimento prematuro benigno.
 Como é a fisiopatologia da puberdade precoce? O aumento dos esteroides
sexuais (seja por produção autônoma ou ativação do eixo HHG) leva a uma
aceleração na velocidade de crescimento do paciente, associado ao
avanço da idade óssea (IO).
 Com isso, há o fechamento precoce das epífises ósseas e,
consequentemente, o comprometimento da estatura final da criança,
geralmente resultando em baixa estatura.
 O hipotireoidismo é uma causa de puberdade precoce que cursa também
com baixa estatura, porém apresenta atraso na idade óssea.
PUBERDADE PRECOCE CENTRAL

 Nesse tipo de PP, que depende da ativação do eixo HHG (dependente de


gonadotrofinas), o desenvolvimento sexual ocorre na sequência da
puberdade fisiológica, com a maturação sexual completa, porém com início
precoce.
 Devido à produção normal dos esteroides sexuais, os caracteres sexuais
são sempre isossexuais, ou seja, concordantes com o sexo genético da
criança.
 Tem incidência de 1 caso a cada 5.000-10.000 crianças, é mais comum no
sexo feminino (3:1) e tem três principais causas: idiopática, genética e
neurogênica.
 A causa idiopática é a mais comum nas meninas, estando presente em
mais de 80% dos casos e é caracterizada por ser uma PP sem causa
orgânica definida.
 A causa genética inclui mutações em genes específicos, como nos KISS-1 e
KISS-1R e na proteína GPR54.
 Já a etiologia neurogênica é a mais frequente em meninos e é consequência
de doenças que acometem o Sistema Nervoso Central (SNC). Os tumores do
SNC correspondem a 50% dos casos de PP central com etiologia
neurogênica.
 Outras causas de acometimento do SNC incluem hamartoma hipotalâmico,
anomalias congênitas, cistos, lesões vasculares, infecções, entre outros.

PUBERDADE PRECOCE PERIFÉRICA

 Nesse grupo de condições, o desenvolvimento puberal ocorre de forma


independente do controle do eixo HHG, ou seja, há uma produção
autônoma de esteroides sexuais. Dessa forma, estes casos não obedecem
à cronologia dos eventos puberais normais e a maturação sexual é
incompleta.
 Outro aspecto importante é que os caracteres sexuais podem ser iso ou
heterossexuais. Ou seja, meninas podem apresentar caracteres sexuais
secundários masculinos, diante de um tumor da suprarrenal, por exemplo.

 Para identificar a causa da PP periférica, deve-se avaliar inicialmente


os caracteres sexuais (se são iso ou heterossexuais), para então direcionar
a procura por alguma etiologia possível.
 Para as meninas, são possíveis causas de PP periférica isossexual:
hipotireoidismo primário não-tratado; cistos ovarianos foliculares
(produtores de estrógenos); tumor de células granulosas; síndrome de
McCune-Albright; exposição a esteroides sexuais ou interferentes
endócrinos (substâncias que atuam como se fossem hormônios).
 Já as causas heterossexuais, ou seja, que levam à virilização das meninas,
são: resistência periférica a glicocorticoides (como a Síndrome dos
Ovários Policísticos); tumor ovariano ou adrenal virilizante; exposição a
andrógenos.

PUBERDADE PRECOCE MISTA

 Esse tipo de distúrbio se inicia como uma PP periférica, com a produção


autônoma de esteroides sexuais, porém, com o passar do tempo essa
produção acaba ativando o eixo HHG.
 Dessa forma, manifesta-se inicialmente com uma maturação sexual
incompleta, tornando-se posteriormente completa e com a sequência
cronológica normal, após a ativação do eixo HHG.
 As causas são as mesmas causas da PP periférica, que não tenham sido
tratadas ou que o tratamento tenha sido inadequado.
DIAGNÓSTICO

Avaliação clínica

 Na avaliação dos pacientes com distúrbios puberais deve-se atentar para


diferenciar as condições benignas daquelas causadas por doenças, como os
tumores.
 Pacientes com as características a seguir devem ser avaliados para afastar
um possível distúrbio puberal:
1. Aparecimento precoce e/ou evolução acelerada dos caracteres
sexuais secundários;
2. Sinais clínicos de virilização;
3. Estatura acima do padrão genético familiar;
4. Velocidade de crescimento acima do esperado para o sexo e
idade.
 Deve-se investigar a história clínica, como as condições de nascimento,
antecedentes perinatais de infecções, uso de medicamentos e uso prévio
de hormônios, antecedentes de doença neurológica, ritmo de evolução e
idade do aparecimento dos caracteres sexuais, dados anteriores de
crescimento, além da história familiar puberal, como a menarca
materna e o período da mudança de voz paterna.
 O exame físico deve incluir os dados de estatura e peso, o estadiamento
puberal, de acordo com a classificação de Tanner, verificando se há
caracteres heterossexuais associados, além do exame neurológico.
 No momento do exame físico das meninas, é importante investigar possíveis
alterações decorrentes do estrogênio e dos androgênios.

 A presença de manifestações androgênicas deve orientar o profissional a


excluir a presença de alteração suprarrenal, sendo os diagnósticos
diferenciais a adrenarca precoce, o tumor de suprarrenal e a hiperplasia
congênita da suprarrenal (forma tardia).
Avaliação laboratorial

 O diagnóstico é basicamente clínico, no entanto, a dosagem das


gonadotrofinas é importante para classificar a puberdade precoce, uma
vez que o tratamento varia entre a PP central e periférica.
 Deve-se realizar a dosagem de FSH e LH (para avaliar ativação do eixo),
além dos esteroides sexuais (estradiol e testosterona) e adrenais (DHEA e
SDHEA).
 Se houver dúvida se há ou não participação do eixo, deve-se realizar o teste
de estímulo com GnRH ou um análogo do GnRH para posterior dosagem das
gonadotrofinas.
 Se a dosagem de LH basal for > 0,6 U/L, há ativação comprovada do
eixo HHG.
 Se o LH for normal, deve-se realizar um teste de estímulo com GnRH
(administrar 100mcg, EV), com nova dosagem do LH em 15, 30, 45 e 60
minutos após a administração.
 Se o pico de LH for > 9,6 U/L em meninos ou > 6,9 U/L em meninas, há
evidência de ativação do eixo.
 Caso o estímulo seja feito com um análogo do GnRH, a dosagem posterior de
LH deve ser feita em 30 e 120 minutos: se LH > 10 U/L, há ativação do eixo.

Avaliação por imagem

 Todas as crianças em avaliação dos distúrbios puberais devem realizar


uma radiografia de mão e punho para determinar a idade óssea (IO).
 Este é um índice útil na avaliação da progressão dos efeitos hormonais, já
que os esteroides aceleram a maturação óssea.
 Considera-se uma idade óssea normal 2 anos acima ou abaixo da idade
cronológica do paciente.
 A determinação da idade óssea pode ser feita através de alguns métodos. O
mais conhecido e difundido é o método de Greulich-Pyle, que consiste em um
Atlas com fotos de radiografias da mão e punho, com o qual o médico
compara a radiografia do paciente em questão, considerando a imagem que
mais se aproxima com a investigada.
 A ultrassonografia pélvica/abdominal permite avaliar as gônadas e
suprarrenais, descartando a presença de tumores.
 Além disso, permite avaliar sinais da ação estrogênica, como aumento
do volume uterino e ovariano para a idade, presença de cistos
foliculares (secundário à ativação do eixo HHG) e presença de endométrio.
 A RM de crânio e hipófise avalia anormalidades hipotalâmicas-
hipofisárias e deve ser sempre considerada nos casos de meninos com
suspeita de puberdade precoce central.
 O hamartoma hipotalâmico, por exemplo, consiste em uma imagem iso a
hipointensa em T1 e iso a hiperintensa em T2; não apresenta calcificações
dentro da lesão e não evidencia aumento do sinal após uso do contraste.

TRATAMENTO

 O tratamento da puberdade precoce possui alguns objetivos principais, que


são: suprimir o eixo HHG, a secreção de gonadotrofinas e de esteroides
gonadais; regredir os caracteres sexuais secundários até a idade
cronológica vigente, inclusive menstruações; desacelerar o ritmo de
avanço da maturação óssea; recuperar a velocidade de crescimento
normal; e normalizar os problemas psicossociais advindos desta
condição.
 Apesar disso, o sucesso terapêutico depende da idade do diagnóstico e do
início do tratamento: nos meninos, os melhores prognósticos consistem em
tratamentos em menores de 6 anos de idade.
 Quando houver causa anatômica identificada (exemplo: tumores do
SNC), independente da classificação da PP (central, periférica ou
mista), o caso deve ser manejado por especialista da área. Nesses
casos, o tratamento pode consistir em remoção cirúrgica do tumor.
 O tratamento clínico da PP central, na qual há ativação das
gonadotrofinas, baseia-se no uso de análogos do GnRH de ação
prolongada, como o acetato de leuprolide (3,75mg a cada 28 a 28 dias, via
IM ou SC).
 Esses medicamentos competem com os receptores de GnRH na hipófise,
realizando um feedback negativo para a secreção das gonadotrofinas (LH
e FSH), bloqueando o eixo.
 No geral são usados até alcançar uma idade óssea de 12 a 13 anos. Em alguns
casos, pode ser necessária a associação com o GH, quando a criança tem
baixa estatura devido à aceleração do crescimento precoce.
 Algumas reações adversas dos análogos de GnRH devem ser conhecidas e
orientadas à família e ao paciente, como: cefaleia, vômitos, sangramento
vaginal, sintomas vasomotores e abscesso no local de aplicação da
medicação. Existe, ainda, uma fraca associação de análogos de GnRH com
obesidade e redução mineral óssea.
 Já o tratamento da PP periférica consiste basicamente no manejo da
doença de base. Pode ser feito um tratamento clínico com o bloqueio da
síntese ou da ação dos esteroides sexuais, através de agentes
progestágenos, moduladores dos receptores de estrógenos (como o
tamoxifeno), espironolactona (antiandrogênico) ou inibidores da aromatase.

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