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EDUCAÇÃO E ANTROPOLOGIA
Resumo:
Este trabalho teve por objetivo perceber as possibilidades de aproximação entre Educação e
Antropologia, dadas a partir da abordagem de questões referentes às diversidades culturais em
cursos de formação acadêmica de professores. Para tanto, buscou-se perceber em que espaços
e momentos esta aproximação ocorre, tendo conhecimento de algumas das práticas
discursivas de professores que trabalham no campo da formação de professores, em cursos de
Pedagogia da cidade de Santa Maria, Rio Grande do Sul. As questões que circundam a
temática das diversidades culturais, percebidas através da utilização de termos como “respeito
e inclusão da diferença”, têm sido recorrentes no campo da educação, evidenciando cada vez
mais a “emergência do outro”, na tentativa de romper com o conceito homogeneizador de
cultura, do qual a Escola apropriou-se, assumindo a função de transmitir uma cultura
hegemônica e justificando a sua resistência em aceitar o “diferente”. Cultura e educação são
conceitos que se tornam inerentes, já que ambos deparam-se com diferentes lógicas e práticas
culturais, aproximando Educação e Antropologia, já que esta tem como próprio objeto de
estudo a busca do respeito e compreensão dessas diferentes dinâmicas culturais. Considerando
o espaço da formação de professores como um dos espaços onde se desenvolve um processo
de produção de subjetividades, torna-se importante que nele ocorra o exercício de um olhar
antropológico em torno dos diferentes sistemas culturais, a fim de que se procure evitar
práticas de violência simbólica legitimadas a partir das práticas discursivas de futuros
docentes.
Palavras-chave: Educação. Antropologia. Cultura. Diversidades culturais. Formação de
professores.
Cientista social e professora estadual.
2
Introdução
As diversidades culturais consistem no objeto de estudo da Antropologia e
conforme diz Fonseca (2000), a palavra “alteridade1”, descreve bem o objeto de estudo dessa
ciência, na medida em que envolve simultaneamente, “a mim” e “ao outro”.
Percebe-se no atual período sócio-histórico-político e econômico, inúmeras
transformações, as quais são definidas por muitos teóricos, como sendo características de uma
época intitulada de pós-modernidade2. As mudanças que transcorrem no campo tecnológico,
econômico, cultural e social, passam a reconfigurar a dinâmica das relações sociais, a relação
espaço-tempo, por vezes alterando, produzindo ou redefinindo sistemas culturais,
demonstrando segundo Boaventura Santos (1999), o fato de estarmos vivendo numa época de
crise paradigmática, a qual traz consigo a necessidade de apropriar-se de novos conceitos,
novas categorias, bem como redefinir as já existentes. Este autor considera ainda, que à
medida que avançamos na transição paradigmática, constata-se a insustentabilidade do
reducionismo econômico, percebendo-se ser cada vez mais difícil distinguir entre o
econômico, o político e o cultural.
O pluralismo e o direito de ser diferente passam a ser problematizados nessa
época de crise e transição paradigmática, onde se tornou menos difícil deparar-se com um
“outro”, que pode vir a ser bastante “diferente” de nós. Não é mais preciso ir para muito
longe buscar o “exótico” e as diferentes culturas, como o fizeram os primeiros antropólogos.
É notório haver um crescente interesse pelas questões culturais, seja nas esferas
acadêmicas, políticas, educacionais ou da vida cotidiana.
Veiga-Neto (2003) diz que, como em nenhum outro momento, parecem se tornar
cada vez mais visíveis as diferenças culturais, bem como os embates e debates sobre a
diferença e entre os diferentes, perpassando os diferentes campos do saber.
Considerações de ordem histórico-genealógica mostram o atrelamento da
pedagogia e da escola moderna à invenção do conceito de cultura como um conjunto de
significados únicos e universais e o quanto a educação foi concebida como sendo o caminho
para se atingir e transmitir as formas mais “elevadas de cultura”, tendo por modelo as
conquistas já realizadas pelos grupos sociais mais educados, considerados os mais “cultos”.
1
Da Matta (1997), recordando Malinowski diz que “a pesquisa antropológica era um caminho de duplo
movimento: uma viagem de ida, em direção ao “selvagem” desconhecido e confundido em meio a costumes
exóticos e irracionais e uma viagem de volta ,quando o etnólogo reexamina seus dados e os integra no plano
mais profundo das escolhas humanas. Descobre-se então que o que se chamou de exótico ou de irracional é
apenas a forma explícita de um traço conhecido em sua própria sociedade. Só que, entre nós, este traço está
implícito”. (Da Matta, 1997, p. 107.)
2
Há inúmeros debates e divergências quanto a utilização dos termos modernidade e pós-modernidade para
definir o atual contexto sócio-histórico, o que vem a demonstrar a abrangência e complexidade do tema.
3
Por muito tempo a cultura fora vista como única e universal, transformando-se num
conceito totalizante, referindo-se ao conjunto de tudo aquilo que de “melhor” havia sido
produzido em termos materiais, artísticos, filosóficos, científicos e literários, onde caberia à
escola transmiti-los. Essa incumbência dada à escola atribuiu-lhe um caráter homogeneizante
e normativo, onde a diversidade deveria ser padronizada, segundo os moldes da então cultura
hegemônica.
Por hora, a Escola passa a perceber a existência de diferentes culturas, onde, ao
deparar-se com elas no cotidiano escolar, passa a problematizá-las de tal forma que leva à
reflexão e constatação acerca da necessidade em romper com práticas educativas
padronizantes e homogeneizantes, visando seguir um caminho que considere cultura, culturas
e educação, muitas vezes precisando redefinir tais conceitos.
É um desafio que se lança falar das relações entre cultura, culturas e educação,
diante do qual torna-se válido e pertinente conhecer questões sobre a formação acadêmica de
professores, considerando os vínculos entre a produção de saberes e as relações de poder no
âmbito da universidade, percebendo este espaço de formação como um lócus de produção de
subjetividades de um “sujeito-professor”. Para tanto, faz-se importante investigar se as
questões das diferenças sociais e culturais estão incluídas nos cursos de formação acadêmica
de professores e conhecer em que espaços e de que forma são produzidas e construídas as
práticas discursivas acerca das diversidades culturais.
Os atuais debates acerca das relações entre diversidades e educação encontra-se cada
mais presente nos cotidianos escolares, suscitando debates em torno dos discursos e práticas
educativas, apontando para a importância em ocorrer uma formação acadêmica que considere
e problematize esta questão.
Para Foucault (1984), o poder não existe enquanto realidade material, o que existe são
relações de poder. Os discursos para este autor são ao mesmo tempo instrumento e efeito de
poder, sendo neles que se articulam saber e poder. Os conteúdos incorporados nas praticas
discursivas podem ser vistos como constituindo modos específicos de produção de
subjetividades.
A partir de tais considerações, surgiu o propósito de realizar um trabalho de pesquisa,
que buscasse perceber os momentos e os espaços de uma “aproximação” entre Educação e
Antropologia, as apropriações e conceituações realizadas em torno do conceito de cultura e
diversidade, tentando ainda analisar as práticas discursivas de professores universitários que
trabalham na formação de professores.
4
Antropólogos-educadores
2
Associação Nacional de pós-graduação em educação;
3
Reunião de Antropologia do Mercosul;
4
Associação Brasileira de Antropologia;
5
Associação Nacional de pós –graduação em ciências sociais;
6
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