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Livro 1 - Aprendizagem

Site: Ambiente Virtual de Aprendizagem do Ifes


Curso: Educação de Jovens e Adultos e Teorias de Aprendizagem para a Educação Profissional e Tecnológica
Livro: Livro 1 - Aprendizagem
Impresso por: Wander Pinto Ribeiro
Data: terça, 9 Mar 2021, 07:49
Sumário
1 Introdução

2 Iniciando a conversa: aprendizagem, desenvolvimento, formação

3 Memorização, automatização e incorporação

4 Teorias de aprendizagens clássicas

5 Correntes contemporâneas voltadas à EP

6 Referências
1 Introdução
"Somos quase tão inconscientes do modo que temos de aprender, quanto do fato de respirarmos."
(Peter Alheit; Bettina Dausien)

Fonte: Equipe de produção do curso

- O que é aprendizagem para você? (enquete? Só questionamento?)

- Pense em tudo o que você já aprendeu ao longo de sua vida: como aprendeu?

- E como você se tornou o/a profissional que é hoje? (tanto na sua educação formal, como ao longo de sua vida profissional.)

O papel do/a professor/a é, antes de mais nada, promover a aprendizagem por parte dos estudantes, não é mesmo? Entender
a aprendizagem é, portanto, algo essencial para este profissional chamado professor.
Mas o que é aprender? Como aprendemos? O que motiva a aprendizagem?

Perguntas distintas que, como você pode imaginar, abrem caminhos para um campo de estudos vastíssimo. Estudos das
neurociências vêm desvendando mecanismos de aprendizagem desde a infância com a ajuda de imagens cerebrais e outras
técnicas. A Psicologia já estuda o comportamento humano na aprendizagem há muitas e muitas décadas. Educadores
experimentam também formas de aprender e ensinar há séculos… Diante disso, ao longo das próximas semanas, vamos ter
como foco a introdução a algumas abordagens que consideramos importantes para a aprendizagem no contexto da Educação
Profissional (EP). Sem esquecer bases e princípios comuns a outras modalidades educacionais, procuramos trazer a reflexão
para o contexto da formação de trabalhadores e suas especificidades pedagógicas.

Dialogaremos com as discussões sobre a natureza dos saberes técnico-profissionais (tudo que está implicado neles e como
se constituem) que você estudará na Unidade Curricular de Epistemologia da Educação Profissional. Nesta, serão
apresentadas algumas respostas à questão “o que aprender em Educação Profissional?”, quando os saberes ganham sentido
mais amplo, estendido aos fazeres, ou “fazeres-saberes”, como diz Jarbas Novelino Barato, indicando que os fazeres não só
mobilizam saberes, mas são saberes em si. Então, eis que surge uma nova pergunta relevante para nós: será que se aprende
fazeres-saberes da mesma forma que saberes declarativos ou verbais?

O tema da aprendizagem também será retomado ao longo do curso em diversas Unidades Curriculares, como a de Didática,
em que serão apresentadas funções, métodos, instrumentos e critérios de avaliação da aprendizagem.

Para iniciar nossa caminhada em um mundo que, esperamos, você explorará muito mais ao longo de sua vida docente, vamos
indicar aqui em linhas gerais algumas das correntes e princípios de pensamento acerca da aprendizagem na EP capazes de
nos ajudar. Nas próximas semanas, aprofundaremos o estudo de algumas delas. Afinal, há muitas teorias da aprendizagem e
sobre este tema estamos sempre aprendendo!
Fonte: Equipe de produção do curso
2 Iniciando a conversa: aprendizagem, desenvolvimento, formação
Na Pedagogia, isto é, o estudo da educação (em especial, das crianças), costuma-se falar em desenvolvimento e
aprendizagem com sentidos distintos, ainda que complementares. O desenvolvimento está associado a processos de
aprendizagem de longo prazo, a fases (ou “estágios” em algumas teorias) de desenvolvimento, enquanto a aprendizagem
ocorreria em mais curto prazo, em atividades e funções específicas. Isso diz respeito tanto a faculdades/processos mentais
(pensamento lógico ou linguagem, por exemplo), como motores ou afetivos (aspectos inter-relacionados, vale dizer).
Aparecem, então, divergências na compreensão da relação desenvolvimento-aprendizagem, tais como: será preciso que a
criança alcance um determinado estágio de desenvolvimento para poder aprender tal função matemática, por exemplo (como
indicarão trabalhos de Jean Piaget). Ou a aprendizagem deverá estar “à frente do desenvolvimento”, ou seja, deve-se
aprender o que não se sabe para poder se desenvolver (como apontará o trabalho de Lev Vigotski)?
Ei, professor(a)!!!! O foco destes debates é o desenvolvimento da criança. Então, por que trazer isso se vamos tratar de
adultos ou jovens que já se encontram em situação de aprendizagem profissional?
Em primeiro lugar, podemos lembrar algo que pode parecer evidente: estamos sempre aprendendo. Mas talvez possamos ir
mais longe: mesmo para os adultos, pode haver desenvolvimento. É o que defende Pastré, um importante pensador da
formação profissional. Para ele, o desenvolvimento não acaba para o ser humano chegados os seus 15 anos de idade
(PASTRÉ, 2014, p. 60). Capacidades de análise e de síntese, por exemplo, podem se desenvolver bem mais tarde, a partir de
um novo conjunto de experiências vividas pelo adulto. Isso ocorre em grande parte, conforme comentaremos adiante, porque
somos colocados em situações-problema que nos desafiam, nos mobilizam, nos obrigam a buscar novos saberes, atitudes etc.

Fonte: (Macrovector/Freepik) e editada pela produção do curso

Pode-se falar mais amplamente, inclusive, de desenvolvimento profissional. Mesmo ao completar um curso de formação
profissional (qualquer que seja!), por exemplo, os saberes ou as competências visadas são em geral competências “de
entrada” na profissão, de modo que elas se desenvolvam efetivamente somente após uma mais longa ou mais intensa
incursão na profissão. É bom lembrar que as profissões ou áreas profissionais são muitas vezes extremamente diversificadas
em suas atividades, nas capacidades que estas atividades mobilizam. Além disso, as técnicas se transformam, assim como as
relações sociais, as formas de acesso a saberes… e nós mesmos mudamos, em função de circunstâncias, desejos,
identificações.
Por isso, fala-se há algum tempo em “aprendizagem ao longo da vida” (ALHEIT; DAUSIEN, 2006; DELORS, 1998; CLAXTON,
2006, entre outros) e na necessidade de pensar a formação como um processo não acabado, aberto para novas experiências.
Assim, tanto para jovens em situação de aprendizagem profissional como para adultos, aprender uma profissão pode
representar uma forma de “desenvolvimento”: pessoal, identitário, uma tomada de consciência de suas capacidades, de sua
capacidade de assumir um papel na sociedade, de empoderamento. Assim, a entrada do jovem na formação profissional pode
representar uma sequência de aprendizagens novas, bem como, ao longo destas, o desenvolvimento de diversas funções,
assumindo um papel de adulto, de profissional, deparando-se com questões éticas, estéticas, econômicas, ambientais, entre
outras.Muitos jovens, que não encontram sentido na escola, encontram novos sentidos na formação profissional. “Encontram-
se”. Isso envolve mudanças nas formas de pensar, de agir e perceber a si mesmo que poderiam ser equiparadas a “estágios”
de desenvolvimento para aquele sujeito.
Por outro lado, como veremos, adultos que voltam à escola também já aprenderam muitas coisas ao longo da vida e já
desenvolveram várias capacidades. Por isso, surgiram nas últimas décadas movimentos como o da Andragogia, que busca
estabelecer princípios de aprendizagem para aqueles que possuem um rico percurso biográfico e outras disposições de
aprendizagens, porém muitas vezes são tratados - e ensinados - como crianças… É importante ressaltar, contudo, que, em
alguns casos, nossas aprendizagens anteriores podem funcionar como obstáculos ao nosso desenvolvimento, como
“obstáculos epistemológicos” (Bachelard, ref.) e será preciso “desaprendê-las” para que novas formas de saber, novas
técnicas, novos olhares sobre o mundo se constituam, novas capacidades se formem.
Por fim, nesta introdução, vale lembrar que, desde “sempre” e independentemente das instituições formais de ensino, há
aprendizagem: o Homo faber (que continuamos sendo mais do que nunca (SIGAUT, 2012) não esperou o advento da moderna
didática para aprender a talhar o sílex, nem o agricultor romano, egípcio, inca, ou de qualquer outra civilização, esperou criar-
se uma disciplina acadêmica para aprender a arte do cultivo, da irrigação, da criação de animais… É no trabalho e pelo
trabalho que grande parte dos humanos aprende (BILLETT, 2013). É no trabalho também que cientistas descobrem, que
técnicos inventam. É muito comum que processos de aprendizagem autodirigida ocorram aí ou que currículos ocultos
permeiem as atividades laborais. Pensando nisso, uma corrente derivada da Andragogia considera também processos de
autodirecionamento da aprendizagem: a Heutagogia. Portanto, é fundamental olhar também para estes contextos de
aprendizagem, como se estruturam, como neles se aprende, como se transformam, para poder desenvolver aprendizagens
(as quais são voltadas a objetos de saber/fazer) e favorecer o aprimoramento dos aprendizes (suas capacidades) (PASTRÉ,
2014). Podemos aí aprender muito e (re)pensar nosso trabalho na formação de trabalhadores, inclusive para melhorar suas
condições de trabalho.

Fonte: (Macrovector/Freepik) e editada pela produção do curso


3 Memorização, automatização e incorporação
Para introduzir este tema, vale lembrar como costumamos conceber, consciente ou inconscientemente, a aprendizagem no
ambiente escolar; ainda formas de aprendizagem fora dele, das práticas sociais e culturais, e, enfim, no contexto (um
entrelugar?) da formação profissional.

Uma das primeiras concepções correntes, nem sempre consciente, é de que aprender é saber algo, memorizando-o. Há muito
tempo se critica uma ideia de aprendizagem como um “decorar”, como memorização de informações. Como veremos (e
talvez você já deve ter pensado nisso mais de uma vez), aprender é mais do que memorizar. A memorização é um tipo de
aprendizagem, ou uma parte da aprendizagem - uma parte apenas. Não se deve menosprezar a sua importância, é claro. É
difícil pensar na possibilidade de aprender algo (um “conteúdo”, uma atividade...) sem o reconhecimento dos elementos que
compõem aquilo que se aprende e, portanto, sem sua memorização.

Alguns autores como David Ausubel chamam esta etapa inicial (quando é a primeira vez que nos deparamos com um
conceito, assunto, atividade) da aprendizagem de “aprendizagem mecânica”, a partir da qual é possível pensar uma
aprendizagem “significativa”. Sem descartar a aprendizagem mecânica, inevitável diante de qualquer conhecimento ou
situação nova, ela, no entanto, deve estar a serviço de uma aprendizagem significativa, isto é, quando um saber novo interage
com saberes prévios do aprendiz e passa por processos de integração na sua mente - neste momento, podemos dizer que a
informação se torna conhecimento. Em abordagens humanistas como a de Carl Rogers, a ampliação do conhecimento
(aprendizagem significativa) precisa ainda ser “significante”, ou seja, “percebida pelo aluno como relevante para seus próprios
objetivos” pessoais (MOREIRA, 2016, p. 55). Assim, além de lembrar, ampliar e desenvolver faculdades mentais, capacidades
críticas (Paulo Freire), as diversas formas de inteligência (Howard Gardner) são também significados daquilo que constitui a
aprendizagem. À longa lista destes sentidos, podemos acrescentar, pensando na formação de trabalhadores e na
Epistemologia da EP: desenvolver capacidades qualificadas, significativas, críticas, pertinentes, inventivas, de intervir no
mundo para produzir a existência individual e social!

Aprender pode também levar à automatização dos saberes, das operações mentais, das ações, dos fazeres-saberes. Isso é
ruim? Não. Em muitos casos é até extremamente desejável. Assim, como quando dirigimos, quanto mais tivermos
automatizado operações como a troca de marchas, o acionamento dos freios, entre outros, mais liberamos nossa atenção
(neurologistas diriam: o córtex frontal) para o que está ocorrendo no trânsito, o que é fundamental para nossa segurança.

Fonte: (Macrovector/Freepik) e editada pela produção do curso

Ora, a ideia de automatização costuma ser vista com maus olhos em educação, porém é preciso salientar a importância vital
desta virtude de liberação de atenção do profissional, “pois permite que o sujeito desloque sua vigilância para níveis superiores
da atividade” (PASTRÉ; WEILL-FASSINA, 2007, p. 181). Isso vale para inúmeras atividades profissionais, inclusive as que
chamamos de mais “intelectuais” (embora toda atividade humana tenha intelectualidade): para o cirurgião, durante uma
operação (pensem como é importante!); para o técnico, em instrumentação cirúrgica que trabalha com o cirurgião; para o
técnico em eletrotécnica, que realizou a manutenção do aparelho para a realização da operação, e por aí vai.
Ao mesmo tempo, a automatização de saberes, operações mentais ou ações também pode representar (conforme evocado
acima) um obstáculo para outros saberes, operações mentais ou ações. Alguns pesquisadores chamam isso de necessidade
de proceder a uma “inibição” destes automatismos (HOUDÉ, 2014; 2018) para avançar na aprendizagem.
Um exemplo clássico está nas crianças que escrevem de forma espelhada, trocando d por b, por exemplo. Esse fenômeno
não se deve a uma “incapacidade” do criança, mas sim ao fato de que o cérebro tem uma função de reconhecimento das
formas em diversas posições ou orientações (assim reconhecemos o rosto de uma pessoa, quer a olhemos pela esquerda ou
pela direita).

Fonte: (Macrovector/Freepik) e editada pela produção do curso

Ora, se esta função é muito importante e não deve ser descartada de modo algum, ela precisa, no caso da aprendizagem da
escrita, ser inibida para possibilitar a distinção entre as letras. O mesmo pode ser transferido para outras situações. Há,
portanto, um jogo, uma dialética, quando se trata de aprendizagem enquanto automatização, e é preciso buscar distinguir as
situações em que será importante promovê-la ou inibi-la. O primeiro passo é reconhecê-la.

Sem olhar exclusivamente do ponto de vista da memorização e da automatização, há mais uma concepção de aprendizagem
importante em Educação Profissional: a de incorporação. Este tema será melhor desenvolvido na disciplina de Epistemologia
da Educação Profissional, porém vamos salientar aqui que, além do modelo mais puramente cerebral de apreensão das
formas faladas, escritas, verbais ou discursivas do conhecimento associados ao ensino escolar/acadêmico, os saberes se
expressam e são aprendidos - mais especialmente ainda em Educação Profissional - pelo corpo todo.

Fonte: (Macrovector/Freepik) e editada pela produção do curso


Isso porque, no mundo, as formas materiais e conceituais da realidade não se desligam, porque nossos sentidos e membros
operam juntamente com nossas sinapses, porque ações e reflexões são constituídos também por gestos, cheiros, visões,
ruídos, sensações, emoções, mas também porque as aprendizagens visadas na formação para o trabalho possuem todas
estas dimensões.

Assim, tais aprendizagens não necessariamente se expressam em palavras, nem são aprendidas por meio de palavras. Isso
não só não diminui sua importância, como constitui muitas vezes sua necessidade e beleza. Em todo caso, as implicações
pedagógicas são muitas.
4 Teorias de aprendizagens clássicas
Além das três concepções gerais apresentadas nas seções anteriores, vamos conhecer outras relacionadas às teorias
atualmente mais aceitas para a formação profissional. Contudo, se você tiver interesse em conhecer teorias mais comuns
utilizadas na educação básica ou outras modalidades educacionais, alguns autores elaboraram um panorama com o resumo de
várias das mais expressivas.

Texto: Comportamentalismo, Construtivismo e Humanismo

Link: http://moreira.if.ufrgs.br/Subsidios5.pdf

Resumo: Nesta obra, Moreira apresenta as teorias, a partir de sua ênfase: as teorias comportamentalistas (mais
preocupadas em modelar e controlar comportamentos), cognitivistas (mais voltadas para a compreensão dos mecanismos
de assimilação dos saberes e de interação sujeito/objeto ou sujeito/meio ambiente) ou humanistas (que buscam reflexões
sobre aspectos mais afetivos e do desenvolvimento da personalidade e identidade). É sempre bom frisar que, quanto mais
delas conhecemos melhor, e que é importante buscar complementariedade entre elas, mais do que descartar uma ou
outra em virtude de uma classificação. O mesmo vale para as correntes voltadas para a EP.

Canal do Youtube: Teorias Clássicas de Aprendizagem

Link: https://www.youtube.com/playlist?list=PLYb8MujOHWhChrjbNyTqPcYeMWQG21iXD

Resumo: traz pequenos vídeos relacionados às teorias de aprendizagem e faze referências a autores como Piaget, Vigotski
e Watson.

Livro: Teorias de Aprendizagem

Link: http://www.ufrgs.br/sead/servicos-ead/publicacoes-1/pdf/Teorias_de_Aprendizagem.pdf

Resumo: neste trabalho, os autores da obra, Fernanda Ostermann e Cláudio José de Holanda Cavalcanti, fazem um
apanhado das teorias de aprendizagem mais clássicas, subdivididas em: behavioristas, cognitivismo, humanismo e
socioculturais

Infográfico: A evolução do pensamento pedagógico

Link: https://novaescola.org.br/conteudo/1823/pensar-a-escola-uma-aventura-de-2500-anos

Resumo: Traz os pensadores mais influentes no campo educativo, demonstrando suas linhas teóricas.
5 Correntes contemporâneas voltadas à EP
Existem também diversas teorias que tentam explicar e explorar a aprendizagem no contexto da formação profissional. Em
muitos casos, elas podem ser extrapoladas para a educação básica ou superior. Elas se baseiam ou se nutrem muitas vezes
de princípios descritos por autores clássicos, como Piaget e Vigotski, mas incorporam novos elementos e contextos
relacionados ao mundo do trabalho e às práticas sociais de produção e aprendizagem dos saberes, do desenvolvimento das
pessoas.
No quadro abaixo, apresentamos rapidamente as cinco correntes contemporâneas que vamos aprofundar nas semanas
seguintes. Indicaremos também algumas outras teorias que não será possível abordar no curso, mas que podem trazer
contribuições.

Fonte: Equipe de produção do curso

A abordagem sociointeracionista da aprendizagem, desenvolvida por autores como Vigotski, se materializa na Educação
Profissional por meio da “pedagogia das obras” do trabalho, de Jarbas Novelino Barato, ou de uma “pedagogia da oficina”, de
Liv Mjelde. A ideia de que a participação na obra do trabalho constitui uma poderosa forma de interação e de mediação da
aprendizagem, e a ideia de que a oficina possui “propriedades mágicas” para aprender um ofício (mas também valores,
identidades, etc.) são formas lindas, atuais (e também muito antigas) de interpretar e nomear a formação de trabalhadores.
Princípios sociointeracionistas permeiam outras teorias, como você verá.

Como um trabalhador consegue realizar suas tarefas, resolver problemas, inventar soluções? Como pessoas aprendem
uma profissão ou inventam novas técnicas? A teoria da “Conceituação na ação”, de Gérard Vergnaud, oferece respostas
a estas perguntas, com base em elementos da teoria de Piaget, que foi revisitada para além da ideia de uma “maturação”
entre os estágios de aprendizagem e para compreender a aprendizagem dos adultos no mundo do trabalho e nas práticas
sociais. A ideia de que a gente precisa “conceituar” para poder agir permite pensar fora do velho modelo educacional
baseado no par “teoria e prática”, insuficiente para explicar a “inteligência” dos trabalhadores (Wisner, ref.) e o “rico
conteúdo intelectual do trabalho” (Rose, ref.). Esta teoria ganhou corpo na Didática Profissional, desenvolvida por
pesquisadores como Pierre Pastré ou Patrick Mayen.

Com ênfase um pouco menos cognitiva e mais nos fatores sociais da aprendizagem, a Teoria da Aprendizagem Social
(ou Situada), de Etienne Wenger e Jean Lave (entre outros autores), propõe que, antes de sermos sujeitos isolados no
aprender, pertencemos antes a “comunidades de prática”, que sempre aprendemos “em situação” e “com os outros”. Esta
abordagem permite repensar o papel da escola e do docente para além da transmissão de conteúdos, ampliar as
possibilidades da aprendizagem on-line, além de oferecer belas definições do que é aprender, do que é a comunidade e o
que são as “práticas” sociais.
A Teoria do Workplace Learning, ou seja, da aprendizagem no ambiente de trabalho, de Stephen Billett (refs), se vale de
estudos sobre como as pessoas aprendem em situação laboral e como lá se forma o que autor chama de uma
“Epistemologia da Prática” ou "Epistemologias pessoais”. Novos olhares sobre a aprendizagem e a formação profissional
são possíveis a partir desta abordagem, como em relação à importância do aprendiz estar engajado em tarefas, ao papel
da orientação fornecida ao aprendiz pelo ambiente e pelos companheiros, entre outros. Também discutem-se os
obstáculos e as dificuldades que se podem encontrar para aprender no trabalho, o que é rico em implicações para o
contexto da formação.

Fonte: (Macrovector/Freepik) e editada pela produção do curso

Adultos aprendem ou se comportam como crianças? Com base neste questionamento, a Andragogia e a Heutagogia,
conforme comentado anteriormente, colocam alguns princípios para a aprendizagem dos adultos tanto no contexto do ensino
presencial, como no do ensino a distância e híbrido. A reflexão sobre as particularidades e necessidades dos sujeitos adultos
que estão em situação de aprendizagem é muito importante, ainda mais no contexto da Educação Profissional, para a qual
muitos adultos se voltam para se desenvolver ou mudar de vida [dados INEP - education at a glance].

Várias outras teorias são interessantes e podem trazer contribuições para nossa compreensão da aprendizagem, como a
abordagem do “Profissional Reflexivo”, de Schön; das Inteligências múltiplas, de Gardner; ou a teoria Ator-Rede (Latour,
Callon…), mas não é possível aprender tudo sobre tudo de uma só vez, não é mesmo?
6 Referências
ALHEIT, P.; DAUSIEN, B. Processo de formação e aprendizagens ao longo da vida. Educação e Pesquisa, São Paulo, v.32,
n.1, p. 177-197, jan./abr. 2006.
BILLETT, S. (2013). Learning through practice: beyond informal and towards a framework for learning through practice. In:
Revisiting global trends in TVET: Reflections on theory and practice (pp. 123–163). Germany: UNESCO.
CLAXTON, Guy. O Desafio de Aprender ao Longo da Vida. Porto Alegre: Artmed, 2000.

DELORS, Jaques et al. Educação: um tesouro a descobrir. Trad. José Carlos Eufrázio. UNESCO. São Paulo: Cortez Editora,
1998. Disponível em: <http://dhnet.org.br/dados/relatorios/a_pdf/r_unesco_educ_tesouro_descobrir.pdf>
HOUDÉ, Olivier. Apprendre à résister. Paris: Le Pommier, 2014.

HOUDÉ, Olivier. L’école du cerveau. De Montessori, Freinet et Piaget aux sciences cognitives. Wavre (Bélgica): Mardaga,
2018.
MOREIRA, Marco Antônio. Comportamentalismo, construtivismo e humanismo. Subsídios teóricos para o Professor
Pesquisador em Ensino de Ciências. 2. ed. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2016. Disponível em:
<http://moreira.if.ufrgs.br/Subsidios5.pdf>

PASTRÉ, Pierre. La Didactique Professionnelle. Approche anthropologique du développement chez les adultes. 4. ed. Paris:
Presses Universitaires de France, 2014.
SIGAUT, François. Comment homo devint faber. Paris: CNRS Éditions, 2012.

VERGNAUD, Gérard. “A quoi sert la didactique?”. Revue Sciences Humaines. Hors-série (ancienne formule) N° 24 -
Mars/Avril 1999.
WEILL-FASSINA, A.; PASTRÉ, P. As competências profissionais e seu desenvolvimento. In: FALZON, P. Ergonomia. São
Paulo: Blucher, 2007. Cap. 13.

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