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DIFICULDADES DE APRENDIZAGENS

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 3

1 PROCESSOS DE APRENDIZAGEM HUMANA..................................................... 4

1.1 As dificuldades de aprendizagem ..................................................................... 6

2 APRENDIZAGEM SOCIAL NA PERSPECTIVA DA TEORIA COGNITIVA SOCIAL


E EMOCIONAL ......................................................................................................... 13

2.1 Dificuldades de aprendizagem e os encadeamentos psicossociais ............... 15

3 TRANSTORNO DO NEURODESENVOLVIMENTO ............................................. 19

4 O DIAGNÓSTICO E AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM ........................ 25

4.1 Estilos cognitivos de aprendizagem ................................................................ 28

4.2 Temperamento infantil e as estratégias de ensino ......................................... 31

5 FRACASSO E SUCESSO ESCOLAR .................................................................. 33

5.1 O fracasso escolar no Brasil: Perspectiva contextual ..................................... 34

6 METODOLOGIAS PAUTADAS EM RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS ................ 42

6.1 Estratégias para o desenvolvimento e para a avaliação das atividades ......... 46

6.2 Como elaborar questões norteadoras ............................................................ 47

6.3 A aprendizagem baseada em projetos e em problemas na prática ................ 48

7 PRÁTICAS ESCOLARES E SEUS DESAFIOS ................................................... 51

7.1 Projetos envolvendo a diversidade cultural..................................................... 52

7.2 Como lidar com a diversidade cultural no “chão” da escola?.......................... 55

8 O PROCESSO DE EXCLUSÃO E A NECESSIDADE DA INCLUSÃO ................ 56

8.1 Política de educação inclusiva ........................................................................ 59

8.2 Inclusão social da pessoa com deficiência no universo escolar ..................... 61

9 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................... 63

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INTRODUÇÃO

Prezado aluno!

O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante


ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um
aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma
pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é
que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a
resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas
poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em
tempo hábil.
Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da
nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à
execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da
semana e a hora que lhe convier para isso.
A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser
seguida e prazos definidos para as atividades.

Bons estudos!

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1 PROCESSOS DE APRENDIZAGEM HUMANA

O conceito de aprendizagem é discutido por diversas perspectivas teóricas.


Desde o século XIX muitas teorias foram propostas para explicar esse
fenômeno. Algumas foram superadas, atualizadas e transformadas em novas
perspectivas, entretanto, observa-se que atualmente muitas coexistem, dando uma
característica multiparadigmática ao conceito. Ou seja, há diferentes abordagens para
tratar desse mesmo fenômeno, sob diferentes aspectos (ILLERIS, 2013).
Rotta, Bridi Filho e Bridi (2016) destacam que a aprendizagem é objeto de
estudo de diferentes ciências, tais como a psicologia, a pedagogia e a neurologia. Isso
ocorre devido à sua importância para a cultura, visto que todos os seres humanos
precisam aprender formal ou informalmente. Na atualidade, a escolarização e a
apropriação do conhecimento sistematizado é uma obrigatoriedade na nossa
sociedade e essa característica tem trazido um olhar mais atento a esses processos.
De acordo com Feldman (2015), Gazzaniga, Heatherton e Halpern (2018), a
aprendizagem pode ser entendida, de uma maneira ampliada, como uma mudança
relativamente permanente no comportamento humano em decorrência de uma
experiência. Na mesma linha de compreensão, Illeris (2007) define aprendizagem
como um processo que leva a uma mudança permanente na capacidade de um
organismo vivo qualquer, que não seja decorrente unicamente do amadurecimento
biológico ou do envelhecimento.
Vale destacar ainda, de acordo com Gazzaniga, Heatherton e Halpern (2018),
que a aprendizagem ocorre quando a experiência torna o sujeito mais bem preparado
ou adaptado para lidar com o meio em situações futuras. Ou seja, nem toda a
mudança pode ser considerada aprendizagem, ela precisa resultar em uma melhor
adaptação ou preparação para lidar com algo ou com alguma situação, isto é, a
aprendizagem requer uma melhoria.
Nesse sentido, a capacidade de aprender é essencial para o ser humano,
determinando desde o desenvolvimento de habilidades básicas, como andar e falar,
até habilidades complexas, como se relacionar com outras pessoas ou realizar
cirurgias cardíacas.

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Desde o nascimento o ser humano já está preparado para aprender.
Entretanto, os bebês apresentam um processo de aprendizagem mais simples
chamado de habituação. Consiste na adaptação a um estímulo, como o que ocorre
quando um bebê vê um brinquedo colorido pela primeira vez. Naquele momento o
estímulo (brinquedo) chama muito a sua atenção, porém, com o passar do tempo,
aquele estímulo já não surte o mesmo efeito, ou seja, o bebê se adapta ou se habitua
àquela informação. Os adultos continuam apresentando o processo de habituação,
contudo, a aprendizagem também passa a ocorrer de maneiras mais complexas
(FELDMAN, 2015).

Complementando esse raciocínio, Illeris (2013), na obra Teorias


contemporâneas da aprendizagem, destaca três dimensões ou esferas da
aprendizagem:

1. Conteúdo: diz respeito ao que é aprendido, engloba conhecimentos,


habilidades, insigths, significados, valores, postura, modo de agir, entre outras coisas
que contribuem para a compreensão e para a capacidade de quem aprende.

2. Incentivo: esfera relacionada à energia necessária para promover a


aprendizagem. Engloba sentimentos, motivação, emoções. Sua função é garantir o
equilíbrio mental.

3. Interação: diz respeito aos impulsos que dão início ao processo de


aprendizagem, tais como: percepção, ação, experiência, imitação, participação, entre
outros.
Dando continuidade a essa compreensão, Illeris (2013) ainda destaca dois
processos essenciais na aprendizagem:

• Processo externo: remete à interação do indivíduo com o meio no qual


está inserido.
• Processo psicológico/interno: remete à aquisição e à elaboração das
informações disponíveis no meio.
Para Illeris (2013), esses processos ocorrem em toda forma de aprendizagem,
contudo, algumas teorias se dedicam mais à compreensão e explicação de um ou de
outro processo. Por exemplo, teorias cognitivistas costumam se dedicar mais aos
processos internos, enfatizando os aspectos mentais. Já as teorias de aprendizagem
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social tendem a destacar mais os processos externos, de interação do indivíduo com
o meio. Destaca-se, nesse sentido, que ambas as teorias contribuem para o
desenvolvimento da compreensão do conceito através de uma abordagem
diversificada, demonstrando a característica multiparadigmática da aprendizagem.

1.1 As dificuldades de aprendizagem


Antigamente a instrução dos filhos era dever exclusivamente da família.
Contudo, a sociedade, a vida e o conjunto de conhecimentos foram mudando, e as
necessidades de cada pessoa se estenderam, tendo como resultado disso o fato de
a escola tomar o encargo de instruir e socializar as crianças e os adolescentes.
Assim, o professor, como educador, forma o aluno não apenas em
conhecimento, mas também em relação à sua inserção social e aos valores morais e
éticos (BOCK, 1996; WEIL, 1960). Em uma visão sociointeracionista, a chave de todo
ensino é as relações que se estabelecem entre os professores, os alunos e os
conteúdos de aprendizagem, e as atividades mobilizam as comunicações que podem
ser estabelecidas em classe.
Nesse contexto, os professores utilizam uma diversidade de estratégias em
suas ações educacionais. Sua interação com os alunos é direta, acompanhando os
processos que eles vão realizando em aula, intervindo e interagindo em diferentes
níveis: com a classe, com um grupo de alunos ou individualmente, de acordo com a
necessidade de cada aluno (ZABALA, 2014).
Assim, nas relações entre os sujeitos, vai se formando a aprendizagem, que
é o processo pelo qual o ser humano se apropria do conhecimento produzido pela
sociedade. Em qualquer ambiente, a aprendizagem é um processo ativo que conduz
a transformações no homem. Na opinião de Alarcão (2003, p. 27), “a aprendizagem é
um modo de gradualmente ir se compreendendo melhor o mundo em que vivemos e
de melhor utilizar os nossos recursos para nele agirmos”. Bossa (2007) coloca que a
complexidade do fenômeno da aprendizagem humana tem a dimensão da própria
vida.
Embora o conceito de aprendizagem tenha sobre si o peso da tradição
intelectualista, ele abarca muito mais do que isso. Por isso, a despeito da importância
que o aspecto intelectual possa ter, ele é só uma parte da aprendizagem total que o
ser humano desenvolve.

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Essa definição de aprendizagem, por si só, justifica seu caráter multidisciplinar
(BOSSA, 2007). Historicamente, não se tinha uma visão multidisciplinar acerca da
aprendizagem. Pelo contrário, a ciência buscava comprovar que as dificuldades de
aprendizagem tinham uma origem biológica e uma herança genética, que formavam
uma classe humana inferior. Isso ocultava a natureza predatória do sistema social e
responsabilizava o próprio indivíduo pelo seu fracasso ou sucesso (PATTO, 1999).
Segundo Bossa (2000), no século XIX, pela preocupação com os problemas
de aprendizagem na área médica, acreditava-se que os comprometimentos na área
escolar eram provenientes somente de causas orgânicas, pois se procurava identificar
no físico as determinantes das dificuldades do estudante.
A crença de que os problemas de aprendizagem eram causados por fatores
orgânicos perdurou por muitos anos e determinou a forma do tratamento dada à
questão do fracasso escolar até poucos anos atrás (BOSSA, 2000). Atualmente,
novas abordagens teóricas sobre o desenvolvimento e a aprendizagem, bem como
inúmeras pesquisas sobre os fatores intra e extraescolares na determinação do
fracasso escolar, contribuíram para uma nova visão mais crítica e abrangente
(BOSSA, 2000).
Dessa forma, diferenciaram-se os termos “dificuldades de aprendizagem” de
“distúrbios (transtornos) de aprendizagem”, ou seja, diferenciou-se quando os
dificultadores têm uma causa psicossocial de quando têm uma causa biológica da
criança. A quinta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais
(DSM-5) reconhece o erro da ciência em generalizar a origem dos problemas
escolares aos fatores biológicos (APA, 2015, documento on-line):

[...] a vasta comunidade científica que trabalha com transtornos mentais


reconhece que, anteriormente, a ciência não estava madura o suficiente para
produzir diagnósticos plenamente válidos — ou seja, proporcionar
validadores científicos consistentes, sólidos e objetivos para cada transtorno
do DSM. A ciência dos transtornos mentais continua a evoluir. Contudo, as
duas últimas décadas desde o lançamento do DSM-IV testemunharam um
progresso real e duradouro em áreas como neurociência cognitiva,
neuroimagem, epidemiologia e genética. Em suma, reconhecemos que os
limites entre transtornos são mais permeáveis do que se percebia
anteriormente.

Assim, percebeu-se que, muito mais do que determinantes genéticos, o


processo de aprendizagem requer uma troca de sensações, percepções, estímulos e
mudança de padrão do comportamento e respostas do sujeito. Essa aquisição de

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mudança implica em um comportamento diferenciado do anterior, constituindo uma
evolução da aprendizagem.
Existem, entretanto, fatores que poderão ocasionar falha no processo de
aprendizagem, ficando subdivididos em deficiências, dificuldades e distúrbios de
aprendizagem (ROMANELLI, 2003). As deficiências de aprendizagem, ou deficiências
intelectuais, são classificadas em quatro níveis (leve, moderada, grave ou profunda),
mensurados pelo quociente de inteligência (QI). Essas medidas de QI indicam maior
ou menor capacidade de aprendizagem (ROMANELLI, 2003). As características
essenciais da deficiência intelectual (ou transtorno do desenvolvimento intelectual)
incluem déficits em capacidades mentais genéricas, ou seja, que não se limitam às
aprendizagens escolares, incluindo prejuízo na função adaptativa diária. Há
deficiência nas funções intelectuais que envolvem raciocínio, solução de problemas,
planejamento, pensamento abstrato, etc.
O início ocorre durante o período do desenvolvimento infantil, e o diagnóstico
baseia-se tanto em avaliação clínica quanto em testes padronizados das funções
adaptativa e intelectual. O funcionamento adaptativo envolve raciocínio em três
domínios: conceitual, social e prático (APA, 2015). Outro fator são as dificuldades de
aprendizagem. De aspecto muito sutil, a condição de dificuldade de aprendizagem
está relacionada a bloqueios causados por percepções subjetivas (emoção) que, para
serem amenizadas, dependem de um ambiente harmonicamente adequado à
sensibilidade do aprendiz (ROMANELLI, 2003).
Nesse ambiente, cabe observar todos os contextos socioemocionais da
criança, principalmente a família, pois muitos dos que apresentam dificuldades de
aprendizagem têm como uma das causas os problemas ou conflitos familiares, como
separação dos pais, perda de um familiar próximo, nascimento de um irmão, etc.
(MACHADO, 2000). O termo genérico “dificuldade de aprendizagem” se refere a um
grupo heterogêneo de desordens, manifestadas por dificuldade na aquisição e no uso
da leitura, da escrita, do raciocínio ou de habilidades matemáticas.
Essa dificuldade pode ocorrer apenas por um período na vida. As dificuldades
de aprendizagem não podem ser explicadas por deficiências intelectuais ou outros
transtornos mentais ou neurológicos, mas sim por questões como adversidade
psicossocial, acuidade visual ou auditiva não corrigida ou falta de proficiência na
língua de instrução acadêmica.

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Ainda, as dificuldades de aprendizagem podem ser explicadas simplesmente
por uma consequência de falta de oportunidade de aprendizagem ou educação
escolar inadequada (APA, 2015). A criança com dificuldade de aprendizagem é uma
criança que apresenta um rendimento lento aquém da faixa etária das crianças ditas
como “normais”. Contudo, a criança com dificuldade de aprendizagem não
necessariamente é uma criança com deficiência ou distúrbio.
Ela apenas tem, no plano educacional, um conjunto de condutas
significativamente desviantes em relação à população escolar em geral (FONSECA,
2016). Para Stevanato et al. (2003), as dificuldades de aprendizagem quase sempre
se apresentam associadas a problemas de outra natureza, principalmente
comportamentais e emocionais. A concomitância dessas dificuldades é considerada
muito frequente. De modo geral, as crianças com dificuldades de aprendizagem e de
comportamento são descritas como menos envolvidas com as tarefas escolares do
que os seus colegas sem dificuldades.
Outro fator são os distúrbios de aprendizagem. O transtorno específico da
aprendizagem refere-se às aprendizagens escolares. É um transtorno do
neurodesenvolvimento com uma origem biológica que se torna base das
anormalidades no nível cognitivo, que são associadas às manifestações
comportamentais.
A origem biológica inclui uma interação de fatores genéticos, epigenéticos e
ambientais que influenciam a capacidade do cérebro de perceber ou processar
informações verbais ou não verbais com eficiência e exatidão (APA, 2015). O caminho
a ser seguido é descobrir em qual área ocorre tal distúrbio a partir de testes
específicos (ROMANELLI, 2003).
O distúrbio de aprendizagem é uma desordem no desenvolvimento normal
característico por algum déficit psicomotor que, consequentemente, afeta os
processos receptivos, integrativos e expressivos na realização simbólica do cérebro
(FONSECA, 2016). “É uma desarmonia do desenvolvimento normalmente
caracterizada por uma imaturidade psicomotora que inclui perturbações nos
processos receptivos, integrativos e expressivos da atividade simbólica” (FONSECA,
2016, p. 246).
O distúrbio de aprendizagem específica significa uma perturbação em um ou
mais processos psicológicos básicos envolvidos na compreensão ou utilização da

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linguagem falada ou escrita. Isso pode ser manifestado por uma aptidão imperfeita de
escutar, pensar, ler, escrever, soletrar ou fazer cálculos matemáticos (APA, 2015).
De acordo com o DSM-5, os transtornos da aprendizagem são diagnosticados
quando os resultados do indivíduo em testes padronizados e individualmente
administrados de leitura, matemática ou expressão escrita estão substancialmente
abaixo do esperado para sua idade, escolarização e nível de inteligência (APA, 2015).
A Classificação Internacional de Doenças, Transtornos Mentais e de
Comportamento (CID-10) denomina esses distúrbios como transtornos do
desenvolvimento das habilidades escolares, descrevendo-os como transtornos em
que as modalidades habituais de aprendizado estão alteradas desde as primeiras
etapas do desenvolvimento (OMS, 2007). O comprometimento não é somente a
consequência da falta de oportunidade de aprendizagem ou de um retardo mental.
Além disso, não é devido a um traumatismo ou a doenças cerebrais (OMS, 2007).

Um transtorno (distúrbio) é uma síndrome caracterizada por perturbação


clinicamente significativa na cognição, na regulação emocional ou no
comportamento de um indivíduo que reflete uma disfunção nos processos
psicológicos, biológicos ou de desenvolvimento subjacentes ao
funcionamento mental. Transtornos estão frequentemente associados a
sofrimento ou incapacidade significativos que afetam atividades sociais,
profissionais ou outras atividades importantes. Uma resposta esperada ou
aprovada culturalmente a um estressor ou perda comum, como a morte de
um ente querido, não constitui transtorno. Desvios sociais de comportamento
(p. ex., de natureza política, religiosa ou sexual) e conflitos que são
basicamente referentes ao indivíduo e à sociedade não são transtornos (APA,
2015, documento on-line).

Para diferenciar dificuldade e distúrbio de aprendizagem, a formulação de


caso para qualquer estudante deve incluir a história clínica criteriosa e um resumo
conciso dos fatores sociais, psicológicos e biológicos que podem ter contribuído para
o prejuízo no desenvolvimento escolar.
É preciso conhecer o desenvolvimento infantil (maturação, crescimento e
evolução). Ainda assim, encontrados prejuízos no seu histórico de neuro
desenvolvimento, é preciso tentar utilizar com o aluno metodologias educacionais
baseadas em evidências antes de submetê-lo a um diagnóstico, a fim de verificar se
as dificuldades escolares podem ser corrigidas pedagogicamente (APA, 2015).
1. TEORIAS COGNITIVAS DE APRENDIZAGEM

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Há diversas abordagens ou formas de se estudar a aprendizagem, o que
evidencia a característica multiparadigmática desse conceito. Entre as diversas
possibilidades, destacam-se neste capítulo as teorias ou abordagens cognitivas de
aprendizagem. Essas teorias partem do entendimento de que o ato de aprender está
relacionado aos processos de pensamento ou cognição, ou seja, essas teorias
enfatizam os processos mentais (invisíveis) que ocorrem quando alguém aprende
(FELDMAN, 2015).
De acordo com os estudiosos dessa abordagem, um exemplo desse tipo de
aprendizagem, que enfatiza os processos mentais não visíveis, é a chamada
aprendizagem latente (ou encoberta). Entende-se que um novo comportamento pode
ser aprendido, mas não demonstrado, até que haja uma oportunidade ou incentivo
para que ele seja expresso.
Ou seja, a aprendizagem pode ocorrer de uma forma não visível, sem que
haja a relação estímulo-resposta-consequência, como descreviam os behavioristas.
Sendo assim, entende-se que é possível aprender um conteúdo novo, mas não emitir
uma resposta expressa, isto é, é possível que haja aprendizado sem que novos
comportamentos sejam exibidos, apenas a partir da mudança mental. Assim, existe
diferença entre a aquisição de um comportamento — o saber fazer — e o desempenho
de tal comportamento — a ação em si (FELDMAN, 2015; GAZZANIGA;
HEATHERTON; HALPERN, 2018).
A aprendizagem latente pressupõe a existência de conteúdos latentes ou não
aparentes, que foram chamados de mapas cognitivos. Esses mapas são
representações mentais ou abstratas da realidade que permitem a obtenção, o
armazenamento e o processamento de informações do ambiente em nível neural ou
mental.
Assim, a compreensão de mapas mentais permite pressupor que há uma
elaboração interna anterior à emissão de um comportamento. Isto é, de acordo com a
compreensão de mapas cognitivos, entende-se que a aprendizagem pode ocorrer
através dos fenômenos mentais, a partir do armazenamento de informações do
ambiente (mapa cognitivo), que abarca até mesmo informações que não foram
utilizadas pelo sujeito até aquele momento (FURTADO, 2018; TOLMAN; HONZIK,
1930).

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Complementando essa compreensão, Gazzaniga, Heatherton e Halpern
(2018) destacam um outro tipo de aprendizagem que funciona de maneira semelhante
à aprendizagem latente, a aprendizagem por insight. Na aprendizagem por insight o
processo também ocorre de maneira encoberta, sem necessidade de expressão de
um comportamento, e é identificado quando alguém está refletindo sobre um
problema, fica um tempo indeterminado debruçado na questão e, de repente, chega
à resposta (ou tem um insight).
Note que, da mesma forma como ocorre na aprendizagem latente, na
aprendizagem por insight não é possível que outra pessoa visualize o processo de
aprendizagem, ele ocorre de maneira interna. Com essa compreensão, retoma-se o
conceito ampliado de aprendizagem, entendida como uma mudança, derivada da
experiência, relativamente permanente no comportamento ou nas capacidades de um
indivíduo, resultando em uma melhor adaptação ou preparação, por parte desse
indivíduo, para lidar com algo ou alguma situação.
A partir desse entendimento, destaca-se que a aprendizagem, de acordo com
o que propõem as abordagens cognitivas, pode ocorrer internamente, em nível neural
ou mental, não necessariamente podendo ser observada por outras pessoas
(GAZZANIGA; HEATHERTON; HALPERN, 2018; ILLERIS, 2007).
Nessa perspectiva, enfatizou-se a concepção de aprendizagem latente e de
aprendizagem por insight e, seguindo a mesma linha de raciocínio, destaca-se a
aprendizagem observacional.
A aprendizagem observacional pode ser entendida como um aspecto ou uma
forma de desenvolvimento da aprendizagem em uma abordagem cognitiva, como fica
claro no exemplo anterior (quando o adolescente pega o volante para dirigir pela
primeira vez e sabe alguns movimentos que precisam ser feitos devido à observação
que fez anteriormente). Assim, destaca-se que a aprendizagem latente, comumente
tem como estratégia a observação (GAZZANIGA; HEATHERTON; HALPERN, 2018).
A aprendizagem observacional foi foco de estudos do psicólogo Albert
Bandura, que afirmou que uma grande parcela da aprendizagem humana se dá
através da observação de outras pessoas se comportando, ou seja, a partir da relação
de quem aprende com outra pessoa (um modelo).
Desse modo, a aprendizagem ganha uma conotação social, sendo vista como
um fenômeno social e a perspectiva de aprendizagem observacional ganha uma

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conotação sociocognitiva. Devido à sua importância, na sequência você estudará
sobre a aprendizagem com essa conotação social, sob a ótica da teoria conhecida
como teoria cognitiva social de Bandura (GAZZANIGA; HEATHERTON; HALPERN,
2018).
2 APRENDIZAGEM SOCIAL NA PERSPECTIVA DA TEORIA COGNITIVA
SOCIAL E EMOCIONAL

Como visto até aqui, de maneira ampliada, pode-se entender que a


aprendizagem é um processo de mudança no comportamento ou na capacidade de
um sujeito, resultante da experiência, e tem como produto uma melhoria na sua
adaptação ou na sua capacidade para lidar com uma situação ou com algo no futuro
(GAZZANIGA; HEATHERTON; HALPERN, 2018; ILLERIS, 2007).
Tendo esse entendimento como pano de fundo, nesse trecho do capítulo você
estudará a forma ou estratégia de aprendizagem descrita por Albert Bandura,
conhecida como aprendizagem social, baseada na teoria cognitiva social, também
chamada de teoria sociocognitiva (GAZZANIGA; HEATHERTON; HALPERN, 2018).
Albert Bandura, nascido em 1925, é um importante psicólogo canadense que
desenvolveu sua carreira na Califórnia (Estados Unidos), como professor e diretor do
departamento de psicologia da universidade de Stanford e presidente da APA
(American Psychological Association — Associação Americana de Psicologia).
Bandura foi autor de diversas obras, tendo como um de seus principais legados o
desenvolvimento da teoria da aprendizagem social (GHEDIN, 2012).
Na teoria da aprendizagem social, Bandura (1977) também enfoca os
aspectos mentais envolvidos na aprendizagem, assim como ocorre nas abordagens
cognitivas.Entretanto, o autor enfatiza também os aspectos sociais envolvidos no
processo, descrevendo o desenvolvimento da aprendizagem a partir da observação
de outras pessoas (que servem como modelos), por isso sua teoria também ficou
conhecida como teoria da aprendizagem observacional (FURTADO, 2018; GHEDIN,
2012).
Nesse sentido, destaca-se que a aprendizagem observacional é
especialmente importante para casos em que não é possível aprender por tentativa e
erro, ou seja, quando é necessária uma compreensão prévia, em nível mental, de um
comportamento a ser emitido. Nesse sentido, para a teoria sociognitiva, assim como

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para a teoria cognitiva, a aprendizagem de um comportamento é diferente de emissão
desse comportamento.
Uma pessoa pode saber fazer algo sem nunca, de fato, ter feito aquilo, apenas
armazenando aquela informação em nível mental e, quando houver a oportunidade
ou o desejo, ela poderá emitir aquele novo comportamento (FURTADO, 2018;
GAZZANIGA; HEATHERTON; HALPERN, 2018; GHEDIN, 2012).
Para Bandura (1977), a aprendizagem observacional é regida por quatro
fatores principais:

• Não associativa: é necessário que a pessoa foque sua atenção a


determinada ação, isto é, perceba o que está ao seu redor. A atenção é
influenciada tanto pelas características da ação observada, quanto pelo
próprio observador (suas tendências cognitivas, como suas preferências
e afinidades).
• Retenção: é necessário que as informações captadas sejam
armazenadas em nível mental. Para que a retenção das informações
ocorra, é preciso o desenvolvimento de imagens mentais ou
representações verbais relacionadas àquela informação
(armazenamento cognitivo).
• Produção: uma etapa importante do processo de aprendizagem é a
ação propriamente dita do aprendiz, decorrente da atenção e da
retenção de determinada informação. Esse fator diz respeito à produção
propriamente dita do comportamento, ou seja, a passagem da esfera
cognitiva para a ação em si.
• Motivação: para que uma pessoa reproduza um comportamento
observado, é necessário que ela acredite que aquela ação trará
resultados positivos para ela (será recompensada). Sendo assim,
entende-se que o fator motivação está relacionado à expectativa do
aprendiz em relação à prática daquele conteúdo.

Um dos principais experimentos de Bandura acerca da aprendizagem social


ou observacional foi o experimento realizado na década de 1960 com um boneco
inflável chamado Bobo. Nesse experimento, Bandura dividiu crianças em idade pré-

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escolar em dois grupos. Para um dos grupos, Bandura apresentou um vídeo em que
um adulto interagia com o Bobo de maneira bem tranquila, brincando com ele. Já no
segundo grupo, Bandura apresentou um vídeo em que o adulto interagia com o Bobo
de uma maneira bastante agressiva, batendo no boneco com um martelo, chutando-
o, etc.
Depois de assistirem ao vídeo, as crianças dos dois grupos foram colocadas
em uma sala para brincar com diversos brinquedos, incluindo o boneco Bobo. O
resultado do experimento mostrou que as crianças que assistiram o adulto agindo de
maneira agressiva com o Bobo tinham duas vezes mais chances de agir de forma
semelhante (também agressiva) quando interagiram com o boneco.
Ou seja, os resultados desse experimento sugerem que a exposição de
crianças à violência pode gerar comportamentos agressivos e, além disso, que a
observação do comportamento de outras pessoas impacta no comportamento futuro
de quem está observando (GAZZANIGA; HEATHERTON; HALPERN, 2018).
Como você pôde observar ao longo do capítulo, pode-se definir aprendizagem
como uma mudança relativamente permanente nas capacidades de um organismo
vivo, decorrente da experiência. Aprendizagem é um tema estudado a partir de
diversos enfoques, o que caracteriza sua natureza multiparadigmática.
Entre esses enfoques, destacam-se as abordagens cognitivas, que enfatizam
os aspectos mentais envolvidos no processo de aprendizagem, tendo como exemplo
a aprendizagem latente (ou encoberta), em que se entende que, para que ocorra
aprendizagem não necessariamente precisa ocorrer um novo comportamento.
Ou seja, de acordo com essas abordagens, é possível que a aprendizagem
ocorra em nível mental, através da construção de mapas cognitivos, e seja
apresentada como uma ação apenas posteriormente, quando houver oportunidade ou
desejo. No mesmo sentido, destaca-se a abordagem sociocognitiva da aprendizagem,
que tem como seu principal autor Albert Bandura.
A teoria de Bandura se assemelha às teorias cognitivas, enfocando, em
específico, a aprendizagem a partir da observação do comportamento de outras
pessoas, ou seja, a aprendizagem a partir da interação social (FURTADO, 2018;
GAZZANIGA; HEATHERTON; HALPERN, 2018; GHEDIN, 2012; ILLERIS, 2013).
2.1 Dificuldades de aprendizagem e os encadeamentos psicossociais

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Para poder compreender e intervir nas causas que acarretam dificuldades de
aprendizagem, o objeto de trabalho vai necessitar das relações em que a criança
circula, visto que as dificuldades de aprendizagem têm causas e desenvolvimentos
múltiplos, em uma conjunção de fatores que, em um determinado momento, interagem
e imobilizam o desenvolvimento do sujeito.
Referente a isso, Bossa (2007) aponta que, entre essas causas, é possível
encontrar como promotor dos problemas de aprendizagem o método de ensino, ou
seja, a “ensinagem”. O professor pode ter dificuldades quanto à instituição de ensino
e/ou às relações que nela se estabelecem (o seu grupo/equipe de trabalho). Carita
(1999) complementa a ideia dizendo que a relação pedagógica é um campo social em
que emergem conflitos, cujas representações advêm da instituição, do professor e do
aluno.
Isso porque, conforme Lapassade (1977), as instituições são um conjunto de
atos ou ideias dos indivíduos que as compõem, e nesses atos e ideias se encontram
os costumes, os modos, os preconceitos e as superstições. Quanto ao estudante,
Ribeiro (1995) aponta que o ser humano só pode ser compreendido em uma relação
de grupo, em que tudo influencia tudo, pois o sujeito é um ser holístico que se
relaciona em comunidade. Machado (2000) acrescenta que para os fenômenos da
vida não existem causas individuais, pois esses fenômenos não são individuais, mas
sim efeitos que se produzem em uma rede de relações.
Quanto aos alunos com dificuldades escolares, Machado (2000) diz que muitos
deles têm problemas familiares, emocionais, pais alcoólatras, pobreza, etc.Entretanto,
o autor aponta que não é possível estabelecer uma relação direta de causa e efeito
entre essas questões emocionais e a capacidade de aprender, pois os fenômenos são
viabilizados nas relações, ou seja, agimos diferentemente conforme as relações.
Muitas vezes, espera-se que algum trabalho seja realizado apenas com as
crianças com dificuldades escolares, mas o objeto de trabalho vai necessitar das
relações em que essa criança circula. Com isso, Machado (2000) ressalta que os
trabalhos diagnósticos precisam dar importância para as relações e práticas
cotidianas como produtoras dos fenômenos que se analisa, e não apenas ter um olhar
diagnosticador que produz graus de deficiência e definições individualistas atribuídas
à criança encaminhada.

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Assim, deve-se considerar a forma como a aula é dada, a relação professor-
professor e professor-aluno, a história escolar da criança, entre outras questões,
buscando processos que potencializem as crianças.
Como afirma García Sánchez (1998), mesmo as teorias mais organicistas e
baseadas na neuropsicologia admitem que os distúrbios mentais podem se tornar
muito piores em resposta a um ambiente desestruturado e a uma família
desestruturada emocionalmente. Quando a família funciona assim, a criança
hiperativa vai se tornar mais hiperativa, a deprimida, mais deprimida, e a autista, mais
autista. Também é preciso considerar os efeitos emocionais que essas dificuldades
acarretam, agravando o problema.
Se o rendimento escolar da criança for sofrível, talvez ela seja vista como um
fracasso pelos professores e colegas ou até pela própria família. Infelizmente, muitas
dessas crianças desenvolvem uma autoestima negativa. Isso agrava muito a situação
e poderia ser evitado com o auxílio da família e com uma intervenção adequada.
Fernández (1991) afirma que existe uma articulação entre inteligência e desejo, entre
família e sintoma.
De acordo com a autora, se pensarmos no problema de aprendizagem como
derivado apenas do organismo ou da inteligência, para sua cura não haveria
necessidade de recorrer à família. Se, pelo contrário, as patologias no aprender
surgissem na criança ou no adolescente somente a partir de sua função equilibradora
do sistema familiar, não precisaríamos, para seu diagnóstico e cura, recorrer ao sujeito
separadamente de sua família.
Só podemos observar a possível construção da inteligência ao considerarmos
o sintoma como resultante da articulação construtiva do organismo, do corpo, da
inteligência e da estrutura do desejo, incluído no meio familiar, onde seu sintoma tem
sentido e funcionalidade.
Fonseca (2016) também se refere à dificuldade de aprendizagem como um
impedimento de um bom desempenho intelectual, vinculado a problemáticas
emocionais associadas a conflitos familiares não explicitados. Além dos problemas de
relacionamento, existem os problemas relacionados a abuso e negligência, problemas
com a adesão a regimes terapêuticos, obesidade, comportamento antissocial e
simulação.

17
Em resumo, é possível definir a dificuldade de aprendizagem como um
conjunto de sinais, de origem biopsicossocial, calcados em algumas constituintes
básicas: a criança, a família, a escola e o meio social (GARCÍA SÁNCHEZ, 1998).
Bossa (2007) aponta que há ainda muitas outras coisas que podem atrapalhar uma
criança na escola. Veja a seguir alguns exemplos (BOSSA, 2007, p. 56-59):

• Uma criança pode achar que ir para a escola não é importante, pois seus
pais não conseguem mostrar essa importância.
• Uma criança pode pensar que assim como seus pais não precisaram
estudar, ela também não vai precisar.
• Uma criança pode não aprender porque não sabe lidar com as leis e as
regras da vida.
• Uma criança pode não aprender porque seus pais, na tentativa de
acertar, erraram ao não estabelecer regras e limites. Assim, não
possibilitaram que a criança aprendesse a ser disciplinada.
• Uma criança pode ter raiva da escola por acreditar que ela só vai para
lá para deixar sua mãe sozinha com seu irmãozinho.
• Uma criança pode ter um problema de saúde que atrapalha sua
aprendizagem escolar.
• Uma criança pode ir mal na escola por ser muito desorganizada. Ela
esquece de fazer as tarefas, perde o material escolar, se atrasa na hora
de ir para a escola e sua vida vira uma bagunça.
• Uma criança pode ser muito inteligente e aprender muitas coisas, mas
seu cérebro falha na hora de realizar aprendizagens específicas, como
leitura e escrita.
• Uma criança pode não aprender porque está em uma escola onde a
forma de ensinar não está de acordo com sua forma de aprender.
• Uma criança pode não compreender a importância do que está sendo
ensinado na escola porque o professor não lhe mostra como utilizar
aquele conhecimento na vida.
• Uma criança pode não aprender porque o seu professor não sabe
ensinar.

18
• Uma criança pode não aprender porque o seu professor não gosta da
sua profissão, e por isso pode não ser um bom profissional.
Bossa (2007, p. 60) ainda enfatiza:

Só para você ter uma ideia, eu poderia ficar o dia inteiro escrevendo sobre as
coisas que podem atrapalhar uma criança na escola. Mesmo assim não
terminaria. Por isso, pode ser que o que atrapalha a criança na escola nem
esteja escrito aqui. Mas se ela está com dificuldades para aprender,
certamente tem um bom motivo para isso. O que o psicopedagogo pode fazer
é descobrir esse motivo e ajudar você e a escola a encontrarem formas de
solucionar esse problema. Pode, ainda, evitar que essas coisas cheguem a
atrapalhar a aprendizagem escolar.

Essas situações são apenas alguns exemplos que podem surgir no contexto
avaliativo da dificuldade de aprender.

3 TRANSTORNO DO NEURODESENVOLVIMENTO

A partir da publicação do DSM-5 pela Associação de Psiquiatria Americana


(APA), os distúrbios de aprendizagem, ou seja, a falta ou o prejuízo no rendimento
escolar que tem uma causa biológica, é persistente e não transitório, passaram a
integrar o grupo dos transtornos do neurodesenvolvimento.
Os transtornos do neurodesenvolvimento são um grupo de condições que já
podem ser percebidas no início do período do desenvolvimento infantil. Os transtornos
tipicamente se manifestam cedo no desenvolvimento, em geral antes de a criança
ingressar na escola, sendo caracterizados por déficits que acarretam prejuízos no
funcionamento pessoal, social, acadêmico ou profissional.
Os déficits de desenvolvimento variam desde limitações muito específicas na
aprendizagem ou no controle de funções executivas até prejuízos globais em
habilidades sociais ou inteligência (APA, 2015). Nesse grupo dos transtornos do
neurodesenvolvimento, estão incluídos os seguintes quadros (APA, 2015):

• deficiência intelectual (transtorno do desenvolvimento intelectual);


• atraso global do desenvolvimento;
• transtorno da comunicação;
• transtorno do espectro autista;
• transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH);
• transtornos motores do neurodesenvolvimento;

19
Transtorno específico da aprendizagem:
com prejuízo na leitura (dislexia);
com prejuízo na expressão escrita (disgrafia);
com prejuízo na matemática (discalculia).

Os critérios diagnósticos identificam sintomas, comportamentos, funções


cognitivas, traços de personalidade, sinais físicos, combinações de síndromes e o
período de tempo que o problema persiste, exigindo perícia clínica para diferenciá-los
das variações normais da vida e de respostas transitórias ao estresse, que não seriam
caracterizados como transtornos (ou distúrbios) (APA, 2015).
Os transtornos do neurodesenvolvimento, conforme o DMS-5 (APA, 2015)
podem ser por deficiência intelectual.
Transtorno do desenvolvimento intelectual: é um transtorno com início no
período do desenvolvimento que inclui déficits funcionais, tanto intelectuais quanto
adaptativos, nos domínios conceitual, social e prático. O nível de gravidade pode ser
leve, moderada, grave ou profunda.
Os vários níveis de gravidade são definidos com base no funcionamento
adaptativo, e não em escores de QI, uma vez que é o funcionamento adaptativo que
determina o nível de apoio necessário.
Atraso global do desenvolvimento: essa nomenclatura de diagnóstico é
utilizada de forma provisória, quando a criança não está atingindo os marcos do
desenvolvimento esperados em várias áreas do funcionamento, mas ainda é jovem
demais para participar de testes padronizados para um diagnóstico mais preciso.
Transtorno da comunicação: os transtornos da comunicação incluem o
transtorno da linguagem, o transtorno da fala, o transtorno da comunicação social
(pragmática) e o transtorno da fluência com início na infância (gagueira). Os três
primeiros são déficits no desenvolvimento e no uso da linguagem, da fala e da
comunicação social, respectivamente.
O transtorno da fluência: com início na infância é caracterizado por
perturbações da fluência normal e da produção motora da fala, incluindo sons ou
sílabas repetidas, prolongamento de sons de consoantes ou vogais, interrupção de
palavras, bloqueio ou palavras pronunciadas com tensão física excessiva.

20
Assim como outros transtornos do neurodesenvolvimento, os transtornos da
comunicação iniciam-se precocemente e podem acarretar prejuízos funcionais
durante toda a vida.
Transtorno do espectro autista: o transtorno do espectro autista
caracteriza- -se por déficits persistentes na comunicação e na interação social em
múltiplos contextos, incluindo déficits na reciprocidade social, em comportamentos
não verbais de comunicação usados para interação social e em habilidades para
desenvolver, manter e compreender relacionamentos. Além desses déficits, esse
transtorno requer a presença de padrões restritos e repetitivos de comportamento,
interesses ou atividades. No diagnóstico do transtorno do espectro autista, as
características clínicas individuais são registradas por meio do uso de especificadores
(com ou sem comprometimento intelectual concomitante; com ou sem
comprometimento da linguagem concomitante; associação a alguma condição médica
ou genética conhecida ou a um fator ambiental). Tais especificadores oportunizam aos
clínicos a individualização do diagnóstico e a comunicação de uma descrição clínica
mais rica dos indivíduos afetados.
Por exemplo, muitos indivíduos anteriormente diagnosticados com transtorno
de Asperger atualmente receberiam um diagnóstico de transtorno do espectro autista
sem comprometimento linguístico ou intelectual.
TDAH: é um transtorno do neurodesenvolvimento definido por níveis
prejudiciais de desatenção, desorganização e/ou hiperatividade-impulsividade.
Desatenção e desorganização envolvem incapacidade de permanecer em
uma tarefa, aparência de não ouvir e perda de materiais em níveis inconsistentes com
a idade ou o nível de desenvolvimento.
Hiperatividade-impulsividade: implica atividade excessiva, inquietação,
incapacidade de permanecer sentado, intromissão em atividades de outros e
incapacidade de aguardar. Na infância, o TDAH frequentemente se sobrepõe a
transtornos em geral considerados “de externalização”, como o transtorno de oposição
desafiante e o transtorno da conduta.
O TDAH costuma persistir na vida adulta, resultando em prejuízos no
funcionamento social, acadêmico e profissional.
Transtornos motores do neurodesenvolvimento: incluem o transtorno do
desenvolvimento da coordenação, o transtorno do movimento estereotipado e os

21
transtornos de tique. O transtorno do desenvolvimento da coordenação caracteriza-se
por déficits na aquisição e na execução de habilidades motoras coordenadas,
manifestando-se por falta de destreza e lentidão ou imprecisão no desempenho de
habilidades motoras, o que causa interferência nas atividades da vida diária.
O transtorno do movimento estereotipado é diagnosticado quando um
indivíduo apresenta comportamentos motores repetitivos e sem propósito, como agitar
as mãos, balançar o corpo, bater a cabeça, morder-se ou machucar-se. Os
movimentos interferem em atividades sociais, acadêmicas, entre outras. Os
transtornos de tique caracterizam-se pela presença de tiques motores ou vocais, ou
seja, movimentos ou vocalizações repentinas, rápidos, recorrentes, não ritmados e
estereotipados.
Transtorno específico da aprendizagem: uma característica essencial do
transtorno específico da aprendizagem são dificuldades persistentes para aprender
habilidades acadêmicas fundamentais, com início durante os anos de escolarização
formal. Habilidades acadêmicas básicas incluem a leitura exata e fluente de palavras
isoladas, a compreensão da leitura, a expressão escrita e ortográfica, cálculos
aritméticos e raciocínio matemático. Diferentemente de andar ou falar, que são
marcos adquiridos do desenvolvimento que emergem com a maturação cerebral, as
habilidades acadêmicas (leitura, ortografia, escrita, matemática) precisam ser
ensinadas e aprendidas de forma explícita.
Os critérios para que se possa atribuir o diagnóstico de transtorno específico
da aprendizagem são quatro: A, B, C e D. Os quatro critérios diagnósticos devem ser
preenchidos com base em uma síntese clínica da história do indivíduo (do
desenvolvimento, médica, familiar, educacional), em relatórios escolares e em
avaliação psicoeducacional. Se um desses quatro critérios não for identificado no
sujeito, então não se pode aferir o diagnóstico (APA, 2015). Veja a seguir quais são
os critérios (APA, 2015).

Critério A: é necessária a presença de ao menos um dos sintomas a seguir


que tenha persistido por pelo menos seis meses, apesar da provisão de intervenções
dirigidas a essas dificuldades:

• leitura de palavras de forma imprecisa ou lenta e com esforço;


• dificuldade para compreender o sentido do que é lido;
22
• dificuldades para escrever ortograficamente correto;
• dificuldades com expressão escrita, erros de gramática ou pontuação,
ou expressão escrita das ideias sem clareza;
• dificuldades para dominar senso numérico, fatos numéricos ou cálculo;
• dificuldades no raciocínio para solucionar problemas quantitativos.

Critério B: as habilidades acadêmicas afetadas estão muito abaixo do


esperado para a idade cronológica do indivíduo, causando interferência significativa
nas atividades cotidianas. Essa interferência é confirmada por meio de medidas de
desempenho padronizadas administradas individualmente e por avaliação clínica
abrangente.
Critério C: as habilidades acadêmicas afetadas iniciaram-se durante os anos
escolares ou posteriormente, quando as exigências excederam as capacidades
limitadas do indivíduo.
Critério D: as habilidades acadêmicas afetadas não podem ser explicadas
por deficiências intelectuais, acuidade visual ou auditiva não corrigida, outros
transtornos mentais ou neurológicos, adversidade psicossocial, falta de proficiência
na língua de instrução acadêmica ou instrução educacional inadequada.
Se forem satisfeitos os quatro critérios, no diagnóstico será preciso especificar
todos os domínios acadêmicos prejudicados. Quando mais de um domínio estiver
prejudicado, cada um deve ser identificado individualmente, conforme os
especificadores a seguir (APA, 2015, documento on-line).

• Com prejuízo na leitura (dislexia): falta de precisão na leitura de


palavras, na velocidade ou na fluência da leitura e na compreensão da
leitura.
• Com prejuízo na expressão escrita (disgrafia): falta de precisão na
ortografia, na gramática, na pontuação e na clareza ou na organização
da expressão escrita.
• Com prejuízo na matemática (discalculia): falta de precisão de senso
numérico, de memorização de fatos aritméticos, de precisão ou de
fluência de cálculo e de raciocínio matemático.

23
Ainda, será preciso especificar a gravidade atual, se é leve, moderada ou
grave, conforme a capacidade de compensar ou funcionar bem quando lhe são
propiciados adaptações ou serviços de apoio adequados, especialmente durante os
anos escolares (APA, 2015). As dificuldades para dominar essas habilidades
acadêmicas básicas podem também ser impedimentos para a aprendizagem de
outras matérias acadêmicas (história, ciências, estudos sociais), mas esses
problemas são atribuíveis a dificuldades de aprendizagem indiretamente. As
habilidades acadêmicas distribuem-se ao longo de um contínuo.
Assim, não há ponto de corte natural que possa ser usado para diferenciar
indivíduos com ou sem transtorno específico da aprendizagem. Portanto, qualquer
limiar usado para especificar o que constitui o desempenho acadêmico
significativamente abaixo do esperado para a idade é, em grande parte, arbitrário.

Uma avaliação abrangente é necessária. Um transtorno específico da


aprendizagem só pode ser diagnosticado após o início da educação formal,
mas, a partir daí, pode ser diagnosticado em qualquer momento em crianças,
adolescentes e adultos, desde que haja evidência de início durante os anos
de escolarização formal (i.e., o período do desenvolvimento). Nenhuma fonte
única de dados é suficiente para o diagnóstico de transtorno específico da
aprendizagem. Ao contrário, o diagnóstico é clínico e baseia-se na síntese da
história médica, de desenvolvimento, educacional e familiar do indivíduo; na
história da dificuldade de aprendizagem, incluindo sua manifestação atual e
prévia; no impacto da dificuldade no funcionamento acadêmico, profissional
ou social; em relatórios escolares prévios ou atuais; em portfólios de trabalhos
que demandem habilidades acadêmicas; em avaliações de base curricular; e
em escores prévios e atuais resultantes de testes individuais padronizados
de desempenho acadêmico (APA, 2015, documento on-line).

É necessária uma visão multidisciplinar. A dificuldade de aprendizagem tem


causas e desenvolvimentos múltiplos, exigindo pesquisas em diversos campos do
conhecimento, para que se tenha uma visão mais ampla sobre esse tema. Portanto,
não basta simplesmente listar os sintomas nos critérios diagnósticos para se aferir um
transtorno de aprendizagem.
Embora a conferência sistemática da presença desses critérios e de como
eles se aplicam a cada paciente assegure uma avaliação mais confiável, a gravidade
e o peso relativos a critérios individuais e sua contribuição para um diagnóstico exigem
discernimento clínico. O objetivo final de uma formulação clínica de caso é usar as
informações contextuais e diagnósticas disponíveis para desenvolver um plano

24
terapêutico abrangente, que esteja em consonância com o contexto cultural e social
do indivíduo (BOSSA, 2000).
Significados, costumes e tradições culturais podem contribuir tanto para o
estigma quanto para o apoio na reação social e familiar. O ambiente que o sujeito se
insere pode fornecer estratégias de enfrentamento que aumentam a resiliência em
resposta ao transtorno ou sugerir a busca de auxílio e opções de acesso à assistência
à saúde de diversos tipos.
O ambiente pode influenciar a aceitação ou a rejeição de um diagnóstico e a
adesão ao tratamento, afetando o curso da doença e sua recuperação, bem como as
decisões terapêuticas, as considerações sobre o prognóstico e a evolução clínica
(APA, 2015).
Por isso, tanto nas considerações caso a caso quanto em uma casuística mais
ampla, encontrar um fio condutor para explicar a multiplicidade de sintomas é, às
vezes, impossível, mesmo para os especialistas. Isso porque essa complexa e ampla
sintomatologia corre paralela à igualmente complexa rede de possibilidades que a
origina (BOSSA, 2000).
Nesse sentido, Masini (1981) aponta que a intervenção psicopedagógica deve
atuar junto com os professores, procurando estabelecer condições facilitadoras para
o desenvolvimento escolar, pois um profissional da instituição escolar é “o que tem
conhecimentos sobre os processos cognoscitivos e deverá dispor de recursos para
lidar com as pessoas e grupos, neutralizando situações de tensão emocional e
facilitando relacionamentos” (MASINI, 1981 p. 163).

4 O DIAGNÓSTICO E AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM

As dificuldades de aprendizagem no contexto da sala de aula envolvem muito


mais do que as situações adversas ao aprendizado, como o déficit sensorial,
abandono escolar, baixa condição socioeconómica, problemas cognitivos e
neurológicos entre outros.
Ciasca (2008), afirma que vale ressaltar que o professor não é o profissional
apto a diagnosticar as dificuldades de aprendizagem específica, pois o diagnóstico
implica no conhecimento ampliado sobre a origem de determinada doença ou
manifestação de seu sintoma.

25
Trentin (2019), ao citar Coelho (2014), afirma que ao professor cabe, estar
preparado para detectar as dificuldades de seus alunos e encaminhá-los junto à
família para profissionais especializados e responsáveis pelo diagnóstico.
É no contexto que envolve o eixo diagnóstico das dificuldades de
aprendizagem que emerge o psicopedagogo, o qual segundo Ciasca (2008) pode
desenvolver seu trabalho com base na prevenção e intervenção. Buscando
informações sobre o contexto que envolve a psicopedagogia, Ciasca (2008) destaca
que o diagnóstico psicopedagógico antigamente era direcionado somente ao indivíduo
e a origem de suas dificuldades de aprendizagem. No entanto com o passar do tempo
e ampliação de estudos na área, passou-se a considerar no diagnóstico
psicopedagógico além do indivíduo, o ambiente e o processo de ensino.
Assim, podemos inferir que a compreensão das dificuldades de aprendizagem
envolve a análise de uma amplitude de fatores que influenciam direta ou indiretamente
o indivíduo, possibilitando ao psicopedagogo o desenvolvimento do trabalho com base
na prevenção ou intervenção (CIASCA, 2008).
No entanto, quando há a presença de dificuldades de aprendizagem, o
processo de diagnóstico pode compreender os seguintes procedimentos:

[...] anamnese, análise do material escolar, relacionamento com a escola,


observação do desempenho em situação de aprendizagem, aplicações de
testes psicopedagógicos específicos e solicitação de exames
complementares (psicológico, neurológico, oftalmológico, audiométrico,
fonológico e outros). Diante disso, observa-se que a intervenção
psicopedagógica, quando necessária, é desenvolvida de formas variadas,
ficando os procedimentos a serem executados a critérios do profissional que
está atuando, geralmente influenciado pela sua formação. (CIASCA, 2008, p.
166-167).

A partir dos procedimentos apontados por Ciasca (2008) vale destacarmos


que o diagnóstico psicopedagógico busca por fatores que possam estar influenciando
a dificuldade de aprendizagem na criança. No entanto antes de tudo, o profissional
necessita averiguar como a criança aprende envolvendo as particularidades e as
singularidades no desenvolvimento. A compreensão do processo de aprendizagem e
das dificuldades que as crianças enfrentam ao aprender é o objetivo da
psicopedagogia, que busca integrar conhecimentos de diversas áreas.
Assim, em um contexto multidisciplinar, o psicopedagogo procura esclarecer
e desmistificar os termos correlacionados às dificuldades de aprendizagem. Essa
desmistificação torna-se necessária devido ao fato de que crianças são encaminhadas
26
para avaliações com profissionais de diferentes áreas em consequência da ausência
de conhecimentos dos professores e familiares sobre a causa das dificuldades de
aprendizagem.
No entanto, Ciasca (2008) aponta que a maioria das causas de dificuldades
de aprendizagem se encontram relacionadas à “problemas de ensino”, cujo contexto
é o escolar, ou aquelas de ordem afetivo-emocional proveniente do ambiente familiar.

O profissional que realiza o diagnóstico necessita ampliar sua visão para além
do momento em que se encontra, o que requer esmero e conscientização
quanto à responsabilidade de sua atuação na Psicopedagogia, pois o
diagnóstico psicopedagógico por ele realizado das dificuldades do aprendiz
sempre se encontra vinculado ao âmbito clínico, institucional e familiar. Essa
vinculação refere-se a uma necessidade de mudança e transformação das
metodologias pedagógicas institucionais e familiares (CHAMAT, 2004, p. 26).

Nesta perspectiva, podemos compreender que o diagnóstico precisa


possibilitar ao profissional direção para uma intervenção que envolva a criança, a
família e a escola, promovendo a autonomia e a motivação para a aprendizagem.
O diagnóstico também necessita desvelar os tipos de dificuldades e transtor-
nos de aprendizagem, possibilitando uma visão ampla da criança e encaminhamentos
quando necessário. A visão ampla, segundo Chamat (2004) envolve uma leitura de
como se dá o processo de aprendizagem; a procedência das dificuldades ou
incoerências no sistema de ensino, considerando a visão que a criança tem do real
voltado para suas relações e aquisição de novos conhecimentos (CHAMAT, 2004).
Assim, consideramos o diagnóstico fundamental para a identificação das cau-
sas das dificuldades de aprendizagem, possibilitando uma possível intervenção, pois
ele avalia a situação do aluno no contexto escolar, considerando a influência de
fatores internos e externos sobre a aprendizagem, permitindo assim que a dificuldade
seja identificada. Vale destacarmos neste contexto que envolve o diagnóstico a
importância da participação do professor, escola e a família (CIASCA, 2008).
Mediante o que vimos até o momento sobre a importância do diagnóstico,
podemos destacar que este, apresenta como objetivo principal identificar as difi-
culdades de aprendizagem da criança e os processos psicológicos que envolvem a
compreensão da língua falada e escrita. Diagnóstico este, que deve ocorrer em
conjunto com outros especialistas (psicólogo, fonoaudiólogo, pedagogo etc.).

27
O processo que abarca o diagnóstico necessita subsidiar qualquer tipo de
julgamento que se faça necessário para uma futura intervenção, a qual necessita estar
vinculada à construção da aprendizagem na criança (CIASCA, 2008).
Neste contexto, Ciasca (2008) ainda aponta que o sucesso do diagnóstico não
depende do cumprimento de uma bateria de testes ou técnicas de avaliação, mas sim
de um processo guiado pelo perfil da criança avaliada, onde haja flexibilidade para
com a seleção e aplicação do material. Assim, podemos compreender que a
psicopedagogia apresenta como objetivo principal a integração da criança no contexto
escolar, oferecendo-lhes novas opções de interação com este meio, tendo em vista
seu desenvolvimento.
Torna-se válido ressaltar o ponto de vista de Ciasca (2008) quando esta se
refere às bases pioneiras da Psicopedagogia, as quais envolvem a atuação da
Medicina e Pedagogia enquanto o princípio de evolução de estudos no campo das
dificuldades de aprendizagem. Neste contexto, discute-se o papel do psicopedagogo
enquanto aquele que deve desenvolver atividade investigativa quanto à origem de tais
dificuldades buscando alternativas para que as mesmas sejam superadas a fim de
outras possíveis serem evitadas.
Para tanto, torna-se imprescindível o conhecimento da criança e os recursos
dos quais o mesmo se dispõe para a produção de conhecimento e aprendizagem.
Assim sendo, torna-se fundamental que os profissionais especializados
responsáveis pelo diagnóstico tenham conhecimento do que é ensinar e o que é
aprender considerando a maneira com a qual sistemas e metodologias de ensino
podem interferir positivamente ou negativamente neste processo.

4.1 Estilos cognitivos de aprendizagem


Estilos cognitivos de aprendizagem não são capacidades, mas, sim, maneiras
preferidas de utilização das capacidades (STERNBERG, 1997). Dessa forma,
podemos aprender e pensar por meio de diversas maneiras.
Aprender é construir “[...] seus conhecimentos e sua afetividade na interação
[...]” com outros sujeitos e “[...] por meio de influências recíprocas que vão
estabelecendo cada sujeito constrói o seu conhecimento de mundo e o conhecimento
de si mesmo como sujeito histórico [...]” (LOPES, 1996, p. 111).

28
Cada pessoa apresenta diferenças individuais, sendo assim, a sua história de
vida irá influenciará no modo pelo qual ela organizará e processará as informações
recebidas pelo meio.
É inegável que cada pessoa apresente interesses, valores, motivações,
cultura, aspirações diferentes umas das outras, pois a forma como assimila os dados
recebidos do meio onde está inserida é percebida de maneira diferente, ou seja,
individual.
Os estudos sobre os estilos cognitivos foram desenvolvidos com base em
interesses nas diferenças individuais da capacidade de pensar, perceber, lembrar de
fatos e situações e resolver problemas. Santos, Bariani e Cerqueira (2000) afirmam
que, desde o século IX, estudiosos já tinham interesse pelas variações individuais nos
modos de pensamento, porém a expressão “estilo cognitivo” foi usada pela primeira
vez por Allport, em 1937.
Esse autor considerava que todas as pessoas tinham tendências ou
predisposições cognitivas e afetivas, que seriam os modos básicos para atuar e
pensar e determinariam as percepções e os julgamentos, sendo denominados de
estilos cognitivos (ALLPORT, 1973).
Bariani (1998) destaca que os estilos cognitivos, além de serem
características da estrutura cognitiva do indivíduo, também são modificados direta ou
indiretamente pela influência de novos eventos, como os fatores biológicos, a própria
cultura e as experiências de vida. Para o autor, os estilos são estruturas relativamente
estáveis e podem sofrer impacto de experiências vividas durante os anos de
escolaridade, inclusive na etapa do ensino superior.
Santos, Bariani e Cerqueira (2000) estudaram os estilos cognitivos por meio
de seus fatores psicológicos, adotando quatro dimensões.
Campo dependente: este estilo cognitivo caracteriza indivíduos que
requerem reforçamento extrínseco em suas atividades e têm como base uma
estrutura externa de referência; assim, optam por conteúdos e sequências
preestabelecidos. Preferem trabalhar em grupo e atribuem importância a uma
interação informal no ambiente escolar (relação professor-aluno); no entanto,
apresentam dificuldades em fazer avaliações críticas. Quando nos referimos que o
indivíduo requer um reforço extrínseco, estamos dizendo que ele precisa de um apoio
externo.

29
Campo independente: característica própria de indivíduos que tomam como
base estruturas internas de referência e, por isso, optam por participar da organização
de conteúdos e sequências. Preferem trabalhar individualmente e importam-se mais
com o conteúdo do que com a interação professor-aluno. Não apresentam
dificuldades em fazer análises críticas referentes às outras pessoas.
Impulsividade de resposta: característica comum às pessoas que
costumam responder sem uma prévia reflexão. Não dão importância à ponderação e
à organização que precede a ação.
Reflexividade de resposta: diz respeito às pessoas que se atêm mais às
ponderações e organizações que antecedem uma resposta. Seus pensamentos são
mais ordenados e contínuos. A dimensão impulsividade/reflexividade de resposta está
ligada à organização da atenção. A impulsividade tende a dar respostas imediatas e,
consequentemente, muitas vezes, imprecisas, com pouca ponderação e organização
prévia. Já a reflexividade se refere a uma tendência para analisar e diferenciar
estímulos complexos.
Convergência de pensamento: constitui um aspecto que identifica
indivíduos, cujo pensamento obedece ao raciocínio lógico, que têm habilidades para
lidar com questões que exigem uma solução determinada a partir das informações
fornecidas. Têm mais facilidade em trabalhar com tarefas mais convencionais e
estruturadas, que requerem lógica. São pessoas disciplinadas, acomodadas e
conservadoras. Há uma identificação do pensamento convergente com o pensamento
lógico e o raciocínio. Indivíduos com essa dimensão acentuada são hábeis em lidar
com problemas que requerem uma clara resposta convencional (uma solução
correta), com base nas informações fornecidas. São inibidos emocionalmente e
identificados como mais conformistas, disciplinados e conservadores (BARIANI, 1998;
BARIANI; SISTO; SANTOS, 2000).
Divergência de pensamento: é relativo à imaginação, criatividade,
originalidade e fluência. São indivíduos que apresentam pouca sociabilidade e
trabalham melhor com problemas menos estruturados, que requerem quantidade,
variedade, originalidade e generalidade das respostas. O pensamento divergente é
associado à criatividade, a respostas imaginativas, originais e fluentes. Os indivíduos
com essa predominância preferem problemas informais, sendo hábeis em tratar de
problemas que demandam a generalização de várias respostas igualmente aceitáveis.

30
Socialmente, são considerados irritadiços, disruptivos e até ameaçadores (BARIANI,
1998; BARIANI; SISTO; SANTOS, 2000).
Holista: caracteriza aqueles que analisam uma tarefa sob o ponto de vista
global, tentando estabelecer relações entre suas partes com a elaboração de
hipóteses complexas. Indivíduos com pensamento holista dão maior ênfase ao
contexto global desde o início de uma tarefa, preferem examinar uma grande
quantidade de dados, buscando padrões e relações entre eles. Usam hipóteses mais
complexas, às quais combinam diversos dados (RIDING; WHEELER, 1995; SANTOS;
BARIANI; CERQUEIRA, 2000; BARIANI; SISTO; SANTOS, 2000; ZHANG, 2002).
Serialista: são os indivíduos que trabalham com um problema, partindo de
aspectos específicos e separados, que posteriormente serão integrados para a
confirmação ou refutação de hipóteses simples, as quais, “passo a passo”,
possibilitarão a resolução de um problema. Os serialistas dão maior ênfase a tópicos
separados e em sequências lógicas, buscando padrões e relações somente mais
tarde no processo, para confirmar ou não suas hipóteses, as quais são mais simples,
além de uma abordagem lógico- -linear (RIDING; WHEELER, 1995; SANTOS;
BARIANI; CERQUEIRA, 2000; BARIANI; SISTO; SANTOS, 2000; ZHANG, 2002).
Salienta-se que o estilo cognitivo indica a tendência da pessoa a se comportar
de determinada maneira, o que, por exemplo, influencia nas suas atitudes. Sendo
assim, eles representam o modo preferido da pessoa processar a informação e
descrevem o modo de ela pensar, relembrar ou resolver problemas.
Percebe-se a importância dos estilos cognitivos para o desenvolvimento da
aprendizagem, pois eles possibilitam a valorização das características de cada
indivíduo, oferecendo a oportunidade de se adaptarem as diversas exigências do
mundo contemporâneo.

4.2 Temperamento infantil e as estratégias de ensino


Segundo LaHaye (1997), não existe outra coisa, que possa influenciar tanto a
nossa vida quanto o temperamento ou a combinação deles. “O temperamento
influencia tudo o que você faz – desde os hábitos de sono e de estudo, o estilo de
alimentação, até a maneira que você se relaciona com outras pessoas [...]” (LAHAYE,
1997, p. 9).

31
No campo de estudo do temperamento, uma primeira abordagem adveio de
um trabalho pioneiro realizado por Thomas e Chess, denominado Estudo Longitudinal
de Nova Iorque (THOMAS et al., 1963 apud MURIS; OLLENDICK, 2005).
Nela, o temperamento é entendido como uma categoria derivada de
comportamentos exibidos em um determinado momento de vida, resultantes de todas
as influências passadas e presentes, as quais os modelam e modificam em um
processo constante e interativo.
Segundo Muris e Ollendick (2005) as categorias de temperamento são: nível
de atividade, ritmo, aproximação ou retraimento, adaptabilidade, limiar de
responsividade, intensidade de reação, qualidade de humor, distraibilidade e período
de atenção e persistência.

• Nível de atividade é referente ao componente motor presente no


funcionamento de uma criança e na proporção diurna de períodos de
ativação e passividade.
• Ritmo é direcionado à previsibilidade e/ou imprevisibilidade no tempo de
qualquer função.
• Aproximação ou retraimento estão ligados à resposta inicial a um
estímulo novo, por exemplo, uma nova comida ou um novo brinquedo.
• Adaptabilidade se refere à facilidade com que a criança modifica uma
situação nova ou alterada na direção desejada.
• Limiar de responsividade está voltada à intensidade do nível de
estimulação necessária para evocar uma resposta deliberada,
independentemente da forma específica que esta pode assumir ou da
modalidade sensorial afetada.
• Intensidade de reação diz respeito ao nível de energia da resposta,
independentemente da sua qualidade ou direção.
• Qualidade de humor fala da quantidade de prazer, divertimento ou
comportamento amistoso em comparação ao desprazer, choro e
comportamento não amistoso.
• Distraibilidade está direcionada à efetividade de um estímulo ambiental
externo em interferir no comportamento vigente e alterar sua direção.
• Período de atenção e persistência é referente, respectivamente, ao
período de tempo que uma atividade particular é realizada pela criança
32
e à continuação de uma na presença de obstáculos para a manutenção
da direção da atividade.
Segundo Rothbart et al. (2003), essas categorias deram origem às seguintes
classificações de tipos de temperamento:

• Temperamento fácil, que é caracterizado por regularidade nas funções


biológicas, respostas de aproximação positiva a estímulos novos, alta
adaptabilidade à mudança, assim como intensidade de humor de leve à
moderada e preponderantemente positiva.
• Temperamento difícil, e se caracteriza por sinais de irregularidade nas
funções biológicas, respostas de retraimento negativo a novos
estímulos, não adaptação ou adaptação lenta a mudanças e expressões
de humor intensas, frequentemente negativas.
• Temperamento lento para reagir, que é caracterizado pela
combinação de respostas negativas a estímulos novos com
adaptabilidade lenta após contatos repetidos.

Segundo as ideias de Rothbart et al. (2003), as crianças de temperamento


fácil têm a tendência de se adaptarem rapidamente a novas demandas do ambiente,
enquanto as de temperamento difícil apresentam dificuldades de adaptação a novas
situações e humor negativo. Já as crianças de temperamento lento apresentavam
dificuldades moderadas de adaptação frente a novas demandas.

5 FRACASSO E SUCESSO ESCOLAR

Apesar de a escola ser um espaço de aprendizagem e formação, percebe-se a


existência de uma cultura educacional na qual o aluno deve possuir habilidades e
competências já estabelecidas para ser inserido na escola e, se não as tiver, é
encaminhado para os serviços de saúde.
Assim, a escola nem sempre procura refletir seu fazer e pensar em soluções
para o fracasso em seu interior, como, por exemplo, rever metodologias de ensino e
processos de avaliação. Essas práticas demonstram um processo de ruptura vigente
das próprias teorias pedagógicas, na medida em que alguns pesquisadores e
profissionais desconsideram os múltiplos fatores que determinam os fracassos

33
escolares, fazendo com que o foco esteja somente no âmbito do individual e do
orgânico da criança e do aluno e não nas questões sociais, econômicas, educacionais
e de concepção histórica da escola.

5.1 O fracasso escolar no Brasil: Perspectiva contextual

Com frequência, a qualidade educacional é pauta nos contextos acadêmicos e


políticos, nos quais se evidencia que, no Brasil, essa qualidade está muito longe do
esperado e que os objetivos escolares não alcançam cerca de metade dos alunos.
No âmbito da Política Nacional de Avaliação da Educação Básica, resultados
coletados em diferentes anos demonstraram que o fracasso escolar se encontra
presente na realidade brasileira de maneira preocupante. Com altos índices de
fracasso escolar, não se pode falar em oportunidades iguais, tampouco em escola
democrática (PINHEIRO et al., 2020).
Conforme levantamentos realizados nos estudos de Pinheiro et al. (2020), o
motivo mais apontado pelos educadores é o "aluno problema", que é apresentado
como portador dos fatores que resultam em seu próprio fracasso, retirando do
profissional da educação a responsabilidade de uma reflexão constante sobre a sua
prática. Entretanto, existem autores, como Patto (1999), que causaram impactos
nessa visão e entendem que este é um fenômeno multideterminado, que deve ser
analisado por diversos ângulos, não somente a partir do sujeito e da família, mas a
partir das relações e do contexto social.
Dessa forma, o fracasso escolar não deve ser naturalizado, mas analisado
dentro de um contexto social, político e econômico. Patto (1999), em sua obra “A
produção do fracasso escolar: histórias de submissão e rebeldia”, inicia um de seus
capítulos com uma frase de Berthold Brech, que já desacomoda aqueles que
condenam o aluno por suas dificuldades escolares: "A árvore que não dá frutos é
xingada de estéril. Quem examina o solo?" (PATTO, 1999, p. 26).
Nessa metáfora, se reconstitui o modo dominante de pensar as coisas
referentes à escolaridade, em que comumente se busca avaliar e diagnosticar o aluno
que não rende, mas esquece-se de avaliar e diagnosticar a escola e seus métodos,
sem qualquer laço de dependência com as condições sociais e históricas.

34
Patto (1999), então, utiliza-se do modo materialista histórico de pensar essa
relação para reforçar a necessidade de conhecer a realidade social, na qual se
construíram ideologias sobre as diferenças de rendimento escolar entre crianças de
diferentes origens sociais.
Para isso, torna-se necessário reunir informações que permitam conhecer
como surgiram as ideias sobre a dificuldade de escolarizar-se, seja na forma de
crenças ou das certezas cientificamente fundadas.
É inevitável, então, relembrar o surgimento das sociedades industriais
capitalistas, para captar a essência da natureza das concepções dominantes sobre o
fracasso escolar em uma sociedade de classes (PATTO, 1999).
Para Euzébios Filho e Guzzo (2009), o mecanismo ideológico do capitalismo é
utilizado para ocultar a natureza predatória desse sistema social e responsabilizar o
próprio indivíduo pelo seu “fracasso” ou “sucesso”. A ideologia propagada pelo
capitalismo é a de que o sucesso social de cada indivíduo só pode ser conquistado a
partir do esforço individual, tentando justificar as desigualdades sociais e ocultar a
lógica predatória do próprio capitalismo, que sobrevive a partir dessas desigualdades
e da acumulação de riquezas por uma minoria dominante.
Patto (1999) destaca a crítica de que a grande revolução industrial foi o triunfo
não da indústria como tal, mas de uma indústria capitalista e exploradora.
A passagem do modo de produção feudal para o modo de produção capitalista
causou grandes convulsões sociais: a relação de produção dominante empurrou
grandes contingentes das populações rurais para os centros industriais, gerou os
grandes centros urbanos com seus contrastes, veio coroar uma nova classe
dominante — a burguesia — e uma nova classe dominada — o proletariado —, que é
explorada economicamente seguindo as regras do jogo capitalista.
As comunidades que antes se constituíam de artesãos e camponeses
perderam suas condições anteriores de produtores independentes e de agricultores,
tornando-se uma massa popular faminta e militante que se acumulava nas cidades.
De vida produtiva e criativa, o trabalho reduziu-se a meio para satisfação da
necessidade de manter a existência (PATTO, 1999). A cidade industrial típica, nesse
período, era uma cidade superpovoada, carente de infraestrutura, que aglomerava os
trabalhadores na periferia e em vilas operárias, que contrastavam com os bairros da
vida burguesa. A nova burguesia deixa de ser apenas formada pelos que herdam tais

35
títulos e forma- -se por aqueles que foram crescendo às custas da exploração do
trabalhador assalariado. Assim, o mundo atingido direta ou indiretamente pela
economia capitalista estava basicamente dividido em perdedores e vencedores. Os
perdedores eram os grandes contingentes de trabalhadores assalariados, de serviços
braçais subalternos e mal-remunerados.
Os vencedores eram os novos homens bem-sucedidos (PATTO, 1999). Essa
crença liberalista de que a divisão social em classes superiores e inferiores teria como
critério o talento individual ajuda a compreender os caminhos trilhados do fracasso
escolar no advento dos sistemas nacionais de ensino, com a produção de uma
escolarização para os mais pobres, dando-lhes uma formação mais precária e com
falta de investimentos, o que mantinha os interesses do capitalismo.
Com essa desigualdade educacional, se fortalece a ideologia de que o sucesso
ou fracasso, em termos de progresso científico, técnico e econômico, depende
exclusivamente dos esforços e méritos próprios. O contexto contribuía para que os
vitoriosos na nova ordem social acreditassem nisso, pois é compreensível que essa
ideologia/crença encontrasse maior receptividade e entusiasmo entre aqueles mais
diretamente beneficiados pela nova ordem econômica e em ascensão: os círculos
mercantis e os financistas; os proprietários; os administradores sociais e econômicos;
os de espírito científico; a classe média instruída; os fabricantes e os empresários
(HOBSBAWM, 1982).
A escola universal, obrigatória, comum e gratuita seria também o meio de obter
a grande unidade nacional, onde se fundiriam as diferenças de credo e de raça, de
classes e de origem, com mecanismos sociais que garantissem a transformação dos
súditos em cidadãos e, ainda, a serviço da nação capitalista. Daí a concepção da
escola como instituição “redentora da humanidade" (ZANOTTI, 1972).
A escola não teria sido inicialmente uma instituição necessária à qualificação
das classes populares para o trabalho. Mesmo quando a especialização técnica do
operário passou a ser uma necessidade, seu treinamento era feito na própria fábrica.
A missão da escola para a classe trabalhadora não era a aquisição de
habilidades cognitivas específicas, era de ajustes comportais para atender às medidas
mais imediatas para essa classe: ensinar uma disciplina rígida para forçá-lo a
aprender a trabalhar sem descanso; ensinar a submissão na relação entre alunos e

36
professores para garantir a disciplina e a obediência do trabalhador na relação entre
patrões e empregados.
Nesse momento não havia consciência crítica do explorado, nem oposição a
esse modelo educacional, pois acreditavam nos discursos de méritos justificadores
das desigualdades existentes. Assim, a universalidade de ideias era real e, à medida
que a classe ascendente se transformava em classe dominante, criavam-se as
condições para que seus interesses particulares aparecessem mais ainda como
universais e se tornassem senso comum (CHAUÍ, 1981; PATTO, 1999).
A escola adquiriu funções diferentes para diferentes grupos e segmentos de
classes: para as classes médias, a escola era o instrumento real de ascensão e de
prestígio social; para as elites emergentes e para os empresários, era a instituição a
serviço do desenvolvimento tecnológico necessário para racionalizar, aumentar e
acelerar a produção; para a grande massa de trabalhadores miseráveis, a escola era
apenas a manutenção do sonho de deixar a condição de trabalhador braçal
desvalorizado e de vencer na vida.
Para estes, no sistema público de ensino, a educação primária já era
negligenciada, e onde existia limitava-se a ensinar rudimentos de leitura, de aritmética
e obediência moral (HOBSBAWM, 1982; PATTO, 1999).
Conforme Patto (1999), Galton foi um desses cientistas que teve como objetivo
principal o de medir a capacidade intelectual e comprovar a sua determinação
hereditária, concluindo que brancos e nobres são geneticamente de intelectualidade
superior.
Para ele, as aptidões naturais humanas são herdadas exatamente da mesma
forma como os aspectos constitucionais e físicos de todo o mundo orgânico. As ideias
de Galton a respeito de que a inteligência é herdada para uns e não para outros
marcaram época na psicologia, e sua influência sobre o movimento dos testes mentais
que davam escores mais altos para a classe dominante foi marcante.
Ao focar a distribuição desigual dos dons e dos talentos de acordo com genética
das famílias e das linhagens, em uma ordem social em que o acesso aos bens
materiais e culturais não é o mesmo para todos — mais do que isso, em uma
sociedade em que a discriminação e a exploração incidem mais sobre determinados
grupos étnicos —, a definição da superioridade só pode resultar em um grande erro:

37
acreditar que é natural o que, na verdade, é socialmente determinado — o fracasso
escolar (HOBSBAWM, 1982; PATTO, 1999).
Torna-se possível entender que a história, que deveria ser passado, ainda se
faz presente nas representações de mundo de hoje e no modo como os homens se
relacionam para produzir e reproduzir a vida.

5.2 Fatores que constituem o fracasso escolar


O aumento da demanda social por escola nos países industriais capitalistas
trouxe consigo dois problemas para os educadores: de um lado, a necessidade de
explicar as diferenças de rendimento da clientela escolar; do outro, a de justificar o
acesso desigual dessa clientela aos graus escolares mais avançados. Tudo isso sem
ferir o princípio essencial da ideologia liberal, segundo o qual o mérito pessoal é o
único critério legítimo de seleção educacional e social (PATTO, 1999).
A ambiguidade imposta por esse duplo problema trouxe argumentos de
diferentes naturezas sobre os fatores que constituem o fracasso escolar; argumenta-
se que a culpa é dos estudantes e de suas famílias: desinteresse, pouco repertório,
pobreza, carência afetiva, indisciplina e desestruturação familiar, entre outros.
Argumenta-se que a culpa é dos docentes: pressupõe-se que os docentes são
desinteressados, principalmente em razão dos baixos salários ou da falta de vocação;
diz-se que têm formação precária, desconhecem metodologias ativas e reproduzem
planos de aula sem qualquer crítica ou conexão com as questões sociais.
Pressupõe-se que a culpa é da gestão educacional: falta de compromisso dos
gestores, ou de nenhum investimento em infraestrutura (falta de bibliotecas,
laboratórios de informática, quadras de esportes, salas de leitura e dependências
acessíveis).
Dizem que a culpa é da organização seriada do ensino: a teoria é que a
organização seriada favorece as reprovações, mas experiências que utilizam outros
modelos revelam que os docentes encontram mecanismos para continuar retendo os
alunos.
Justificam que a culpa é das concepções de currículo: o argumento é de um
currículo por competências, em que alunos expostos aos conhecimentos
desenvolverão atributos e méritos pessoais, ignorando que a educação é um processo
coletivo

38
Argumenta-se que a culpa é da avaliação: a centralidade nos resultados das
avaliações também isenta a responsabilidade aos que ensinam, fazendo com que a
avaliação quantitativa da aprendizagem tenha o objetivo de identificar se os
estudantes conseguem reproduzir os conteúdos ensinados, garantindo a neutralidade
do processo de julgamento avaliativo e que também a culpa é da política de inclusão
escolar: estudiosos referem que a abertura da escola para todos diminuiu a qualidade
da educação. Chamando de escola de massas, o professor tem que ensinar a todos,
no mesmo tempo e no mesmo espaço, retirando do docente a possibilidade de atender
com qualidade ao aluno normal e merecedor de estar na escola, para dedicar atenção
especial aos diferentes, atrasados, pobres e desobedientes, que deveriam estar com
especialistas de apoio ou em uma escola ou classes próprias para eles.
As discriminações são reforçadas e sistematizadas na escola, contribuindo
para a perda de vínculos, para perseguições e para o desinteresse dos estudantes,
acarretando possíveis reprovações e abandono escolares.

5.3 A relação entre fracasso escolar e desigualdade social


Desde o início século XX, pesquisas e informações têm desmentido a ideia de
que a escola obrigatória e gratuita viera para transformar a humanidade, para redimi-
la da ignorância e da opressão.
O que se mostra é que a escola não cumpriu seu papel, e que a posse do
alfabeto, da constituição e da imprensa, da ciência e da moralidade não havia livrado
os homens da tirania, da desigualdade social e da exploração (PATTO, 1999).
Não é possível falar que todos têm igualdade de oportunidades e que o sucesso
depende do esforço pessoal enquanto a relação entre fracasso escolar e
desigualdade social tem reflexo dessa desigualdade já ao entrar no portão da escola,
já que apenas 0,6% delas possuem infraestrutura próxima ao padrão mínimo para
escolarização, ou seja, biblioteca, laboratório de informática, quadra esportiva,
laboratório de ciências, além de dependências adequadas para atender a estudantes
com necessidades especiais e básicas.
Destaca-se também que somente 44% das instituições de educação básica
possuem água encanada, sanitário, energia elétrica, esgoto e cozinha em sua
infraestrutura (MOTTA et al., 2015).

39
A definição da educação como promotora do “pleno desenvolvimento da
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”
(BRASIL, 1988, art. 205) intensifica a dimensão do quanto as perdas nas
aprendizagens e na qualidade do ensino podem representar para o desenvolvimento
econômico, social e cultural das pessoas e das localidades.
Isso acontece na medida em que determinados estudantes, que não se moldam
ao tipo de estrutura escolar capitalista vigente, são excluídos dos processos de
aprendizagem, reforçando que a escola se constituiu como mais uma forma de divisão
social, gerando em diversos alunos com baixo rendimento escolar a noção de que o
espaço educacional no qual estão inseridos não lhes pertence, ocasionando o que se
observa como fenômeno imediato: o fracasso e a evasão escolar (KUENZER, 2005).
A relação entre fracasso escolar e desigualdade social se evidencia, então,
nesses alunos, que, excluídos do fluxo escolar, serão excluídos dos mercados de
trabalho formais e, consequentemente, incluídos em trabalhos informais, nos quais o
nível de exploração será muito maior e a precarização mais intensa, internalizando a
responsabilização individual pela sua condição, que passa a constituir sua forma de
ser (KUENZER, 2005).
O aumento dos anos de estudos facilita o acesso a melhores oportunidades de
trabalho e possibilita maiores rendimentos. A Unicef (2021) descreve a contribuição
da escolarização para a melhoria das possibilidades de: a) trabalho e renda
(correlação entre anos de estudo e rendimentos); b) prevenção de enfermidades
(correlação entre anos de estudo e expectativa de vida); c) superação de
desigualdades sociais e econômicas (correlação entre anos de estudo e justiça
social).
A compreensão histórica do fracasso escolar brasileiro tantos, a reforçar o
caráter fundamental da educação para o desenvolvimento econômico e social do país
e a diminuição das desigualdades.
Ao logo deste capítulo, você viu o contexto histórico do fracasso escolar
brasileiro. Descreveu-se que a escola não teria sido inicialmente uma instituição
necessária à qualificação das classes populares e que coube responsabilizar o próprio
indivíduo pelo seu “fracasso” ou “sucesso”, mesmo diante da produção de uma
escolarização para os mais pobres que lhes dava uma formação mais precária e com
falta de investimentos.

40
A história da educação, que deveria ser passado, ainda se faz presente nas
representações ideológicas. Você pode perceber que dentre os fatores que
constituem o fracasso escolar, ou seja, a reprovação, a evasão e a distorção idade-
série, surgem argumentos de diferentes naturezas, de que a culpa é dos estudantes
e de suas famílias, dos docentes, de gestão educacional, da organização seriada, das
concepções de currículo, da avaliação e até da escola de massas.
É necessário e urgente superar as alegações de culpas, pois em alguma
medida elas encontrarão mérito em algum segmento social e continuarão com a
cultura do fracasso educacional, continuarão combinando aspectos e discursos que
se implantam como verdades nas memórias e práticas de educadores e da
comunidade escolar.
De acordo com a Unicef (2021), ao conhecer essas alegações, pode-se
confrontá-las com o direito à educação, que se objetiva no direito a conhecer e a
aprender e começar a construir uma cultura de trajetórias escolares bem-sucedidas,
que construam e devolvam os desejos e aspirações para meninas e meninos.
O direito à educação deve se desdobrar na conquista de outros direitos e,
também, nas oportunidades de vivenciar a cultura democrática e de ações contra
todas as discriminações. Finalmente, neste capítulo, você pôde relacionar o fracasso
escolar com a desigualdade social, em que os excluídos do fluxo escolar são excluídos
do trabalho.
O enfrentamento da cultura do fracasso nas escolas de todo o país e, em
especial, das escolas que atendem às populações mais vulneráveis, é
responsabilidade de cada docente e de cada gestor em todas as instâncias dos
sistemas educacionais (PATTO, 1999; UNICEF, 2021).
Reverter essa cultura não é fácil, pois não se destrói em pouco tempo uma
ideologia que por séculos foi construída e faz parte até hoje do pensamento social,
segundo o qual o mérito pessoal é o único critério legítimo de sucesso educacional
(PATTO, 1999).
É fundamental um esforço conjunto do governo, da sociedade e da comunidade
escolar para conhecer a fundo o problema, debater as diversas visões e enfrentar a
cultura do fracasso escolar.
A compreensão histórica do fracasso escolar brasileiro 15 No entanto,
combater o fracasso escolar não pode ser um ato burocrático, mas de compreensão

41
de que o fracasso escolar é um mecanismo contra a educação, contra o sistema
educacional, contra os profissionais da educação, contra os estudantes e, por fim,
contra a sociedade (UNICEF, 2021).
A escola precisa ser um lugar seguro, onde se conhece, se debate, se
constroem e se reconstroem conhecimentos sem ameaças. É preciso rever os
currículos, a avaliação das aprendizagens e os cotidianos escolares, criando espaços
inclusivos, em que todos tenham direito a trajetórias de sucesso escolar.
As escolas são instituições importantes para a ampliação do acesso aos bens
culturais, materiais e imateriais e para romper com o isolamento cultural a que estão
submetidos diversos segmentos sociais.
No entanto, a cultura da reprovação incide fortemente sobre as trajetórias
escolares de crianças e adolescentes e, combinada com características pessoais e
limitações de acesso decorrentes das desigualdades sociais, aumenta a incidência de
abandono e perpetua os ciclos de exclusão.
A elaboração e a execução de ações voltadas para o enfrentamento do
fracasso escolar dependem do quanto se pode conhecer sobre as características
desse fenômeno, sua incidência sobre determinados territórios e, neles, sobre
determinados grupos, mas levando em conta eventuais dificuldades relacionadas às
suas características e condições de vida como dados da realidade, e não como
obstáculos ao trabalho educacional (UNICEF, 2021).
Sem o reconhecimento de que a melhoria dos resultados escolares passa pela
transformação das relações, pela inclusão, pelo combate ao racismo e aos descasos
com determinados grupos, não haverá mudança nos patamares atuais.

6 METODOLOGIAS PAUTADAS EM RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS

No final da década de 1960, professores da faculdade de Medicina da


Universidade MacMaster, no Canadá, introduziram uma abordagem específica
educacional, com o objetivo de mudar a forma de ensino da medicina, denominada
aprendizagem baseada em problemas (ABP).
O intuito da equipe de professores era formar médicos que soubessem
aplicar, na prática, todo o conhecimento obtido de forma teórica. Para tanto, essa

42
proposta era introduzida nos últimos anos do curso, em que os alunos já possuíam
conhecimento teórico suficiente para resolver determinados problemas.
Conhecida como aprendizagem baseada em projetos, aprendizagem
baseada em problemas ou aprendizagem por descoberta, a abordagem é sempre a
mesma: colocar o aluno em contato com problemas ou situações que se aproximem
de sua realidade, para que possa resolvê-los utilizando seus conhecimentos.
A maior diferença entre a aprendizagem baseada em projetos e a
aprendizagem baseada em problemas está na necessidade de integração das
diferentes áreas do conhecimento, na capacidade de solução da questão em forma
de um produto e na cooperação para resolução da proposta de trabalho.
A ABP, originalmente denominada project based learning (PBL), representa
uma estratégia de ensino ativa e inovadora, em que o aluno irá construir o
conhecimento de forma coletiva e interdisciplinar, por meio de atividades de projeto.
Em linhas gerais, a ABP é a solução de um ou mais problemas que podem se
desenvolver durante o ensino de projeto. Trata-se de uma abordagem pedagógica na
qual os estudantes iniciam sua atividade partindo de um problema que pode ser real
ou uma situação simulada de qualquer área do conhecimento, desde que atenda aos
objetivos de aprendizagem de um curso ou disciplina.
É importante considerar que os problemas são situações contextualizadas e
apresentadas pelo professor em forma de questões, casos e cenários que necessitam
de uma solução/resposta por meio de um processo investigativo realizado pelos
discentes.
Apesar de ter sua origem na década de 1960, foi a partir de 1990 que a ABP
passou a ser aplicada nos Estados Unidos. É uma metodologia que tem ganhado cada
vez mais espaço, por ser “[…] um formato de ensino empolgante e inovador, no qual
os alunos selecionam muitos aspectos de sua tarefa e são motivados por problemas
do mundo real que podem, e em muitos casos, irão contribuir para a sua comunidade”
(BENDER, 2014, p. 15).
Diferentes universidades passaram a introduzir a metodologia em seus cursos
de Medicina, inclusive o Brasil, que em 1993, implantou a ABP pela primeira vez na
Escola de Saúde Pública do Ceará. Em seguida, a prática começou a ser empregada
em diferentes universidades e áreas que não fossem somente da saúde, como
administração, pedagogia, engenharias, entre outras.

43
Analisando o modelo educacional tradicional, baseado demasiadamente em
aulas expositivas e na memorização de conteúdos, entendemos a importância de
repensarmos sobre metodologias inovadoras, que possibilitem maior participação do
aluno em seu processo de aprendizagem.
A ABP entende que o problema é apresentado para ajudar os alunos a
identificarem suas próprias necessidades de aprendizagem, à medida que tentam
entendê-lo, reunir, sintetizar e aplicar informações sobre o problema e começar a
trabalhar efetivamente para aprender com os membros do grupo e com o tutor
(professor). Os fundamentos da aprendizagem baseada em problemas estão
descritos a seguir.

• Aprendizagem em grupos pequenos: a aprendizagem baseada em


projetos e em problemas ocorre em uma configuração de tutoria, em
grupos de sete a oito alunos. Um aluno é designado para um grupo
tutorial e há um facilitador diferente em cada uma das cinco áreas de
fundamentação. Os tutoriais ocorrem duas vezes por semana.
• Facilitação por parte dos professores: o tutor procura estabelecer um
equilíbrio entre guiar a conversa do tutorial e solicitar ativamente o
feedback dos alunos, para garantir que suas lacunas de conhecimento
sejam abordadas e resolvidas.
• Uso de casos reais: os alunos são apresentados a casos reais durante
o primeiro tutorial da semana. Espera-se que os alunos estudem,
investiguem o caso e apresentem seus resultados durante o segundo
tutorial dessa semana.
• Objetivos de aprendizagem: simplesmente propor aos alunos um caso
não garante que eles entenderão os conceitos apropriados. Cada caso/
tutorial é fundamentado em um conjunto de objetivos de aprendizagem
definidos, essenciais para garantir que os alunos abordem o conteúdo
correto e identifiquem seus pontos fortes e fracos naquela área em
particular.

Para Bruner (1976), o processo de aprendizagem ocorre a partir da aquisição


e da transformação de uma nova informação, adaptando novas ideias e avaliando a
aquisição dessa informação.

44
Entendendo o processo de aprendizagem e considerando os fundamentos da
ABP, é importante destacar que, para o sucesso desse processo e para que o
aprendizado realmente aconteça, é necessário o envolvimento do aluno, seu interesse
e sua curiosidade em aprender. Para que esse interesse desperte no aluno, os
problemas trazidos para sala de aula não podem ser rotineiros: devem ser
construídos, privilegiando problemas reais, que desenvolvam as habilidades dos
alunos, instiguem a busca criativa de soluções e o pensamento crítico.
O papel do professor é fundamental, uma vez que ele é o mediador entre o
aluno e o conteúdo a ser estudado, estimulando-o em suas descobertas.
É ele quem cria as situações de aprendizagem e seu papel na construção dos
problemas é fundamental, uma vez que ao formulá-los, ele precisa fazer conexões
entre a teoria e a prática, buscando as relações entre o que ensina e as habilidades
necessárias aos futuros profissionais, de forma que estimule os alunos a tomarem
suas próprias decisões.
Quando bem aplicada, a ABP pode produzir efeitos positivos na prática
educativa, levando os alunos a interagir com a realidade e a desenvolverem o senso
crítico. Ao analisar as constantes mudanças sociais, é de suma importância repensar
os métodos adotados pelo professor em sala de aula, para que estes também
atendam às necessidades da sociedade. Entendendo que a aprendizagem não é um
processo passivo, em que um obrigatoriamente ensina e outro aprende, a ABP coloca
professor e aluno como parceiros na construção do conhecimento.
Para Mamede e Penaforte (2001), a ABP possibilita que o aluno, autodirigindo
sua aprendizagem, construa o conhecimento de forma ativa e colaborativa,
aprendendo de forma contextualizada e dando um significado pessoal ao saber.
Nesse sentido, para construir um bom problema, o professor deve pensar em atrair a
atenção e o interesse de seus alunos, a fim de motivá-los a buscarem respostas para
a questão, não esquecendo que este (o problema) venha ao encontro dos objetivos
da disciplina para que os educandos percebam a correspondência entre o conteúdo e
a proposta apresentada. Outro aspecto importante é propor um problema desafiante,
porém não muito extenso, que contenha informações claras e contemple os
conhecimentos prévios dos alunos para que tenham interesse em pesquisar e
descobrir mais.

45
6.1 Estratégias para o desenvolvimento e para a avaliação das atividades
A aplicação da ABP em sala de aula requer profunda reflexão sobre o(s)
objetivo(s) que se pretende atingir, para que a partir disso seja elaborada a questão
que norteará a aprendizagem. No desenvolvimento da atividade, o professor deve
estar ciente de que não se trata de mera obtenção de conceitos por parte dos alunos,
mas do desenvolvimento de habilidades cognitivas como compreensão, raciocínio e
estratégia. Para a aplicação da ABP, Souza e Dourado (2015) apresentam uma
estrutura básica de passos que podem ser adaptados e aplicados em diferentes níveis
de ensino.

• Elaboração do cenário ou contexto problemático: deve ser de acordo


com o objetivo que se pretende atingir e chamar a atenção do aluno para
que este identifique o tema do objeto de estudo. Além disso, deve haver
relação com o conteúdo, ser funcional e de um tamanho ideal.
• Questões-problema: ao receber as questões-problema, os grupos
devem organizar as informações, dividir as tarefas, esclarecer as
dúvidas com o professor/tutor para então decidirem como vão
aprofundá-las.
• Resolução dos problemas: é a fase em que os alunos colocam em
prática todas as ações planejadas anteriormente.
• Apresentação do resultado e autoavaliação: o grupo deve elaborar
uma síntese com as reflexões e os debates realizados. Todos deverão
apresentar a solução encontrada para o grupo. No final, é importante
que o grupo e que cada aluno realize uma autoavaliação junto ao
professor, que irá verificar se o objetivo foi ou não atingido, realizando,
assim, a avaliação da aprendizagem.
A construção de conhecimentos por meio da ABP se caracteriza não só por
ser uma oportunidade rica e significativa para que o aluno confronte suas ideias com
as de outros colegas, mas também propicia uma visão concreta e prática do
aprendizado.
Ao trabalhar em grupo, os alunos percebem a importância da troca de saberes
e da colaboração, apoiam-se mutuamente, significando a importância de atingirem os
objetivos que lhes são comuns, acordados pelo coletivo, o que, por sua vez, exige o

46
estabelecimento de relações que prezem pela liderança compartilhada, pela confiança
mútua e a corresponsabilidade para a condução das tarefas.
A aprendizagem em grupo na ABP se configura como uma estratégia de
ensino na qual os sujeitos, de diferentes níveis de desempenho, trabalham juntos e
em pequenos grupos a fim de atingir uma meta — a partir da qual entram em
expressiva e significativa interatividade.
Uma das mais importantes mudanças que acontecem na prática docente da
ABP começa pela concepção que se tem de avaliação, uma vez que esta deve vir
carregada de significados e não ser apenas uma forma de mensurar quantitativamente
o quanto o aluno sabe ou não. A ABP permite o feedback imediato para que o
professor avalie o progresso da aprendizagem dos alunos, obtendo pistas da
assimilação do conteúdo e das possíveis dificuldades encontradas.
Já para o aluno, é a oportunidade de refletir, em tempo real, sobre as
estratégias utilizadas e avaliar o caminho que percorreu. Ao receber o feedback
imediato, o aluno desmistifica a ideia negativa que se tem do erro na aprendizagem,
uma vez que o percebe como parte natural do processo e isso o leva a experimentar
diferentes formas de pensar.

6.2 Como elaborar questões norteadoras


Ao planejar a questão norteadora, o professor deve privilegiar para que a
avaliação ocorra durante todo o processo e na sua aplicação, estando atento às
impressões dos alunos.
Na elaboração de uma questão norteadora, deve-se considerar que:

• as questões devem ser provocativas, ir além de superficialidades,


instigando e despertando o interesse dos alunos;
• devem ir além da obtenção por respostas fáceis, levando os alunos a um
pensamento superior, exigindo que eles integrem, sintetizem e avaliem
criticamente as informações;
• não podem privilegiar apenas uma disciplina ou tópico; é importante que
promovam conexões e quando possível, a interdisciplinaridade;
• podem surgir a partir de dilemas da vida real dos alunos e responder às
suas dúvidas ou curiosidades;

47
• não se detenham a responder “o que é isso?” ou “quais são?”, mas sim,
“por que isso acontece?” ou “como isso acontece?”.
Além dessas dicas, é importante que o professor tenha claro seu objetivo e
evite “armadilhas”, pois a questão norteadora deve promover a reflexão por parte dos
alunos. Isso o possibilitará a melhora de possíveis futuros aspectos que acabaram
não funcionando em determinada atividade. A avaliação contínua permite uma melhor
reflexão sobre as relações entre professor e aluno, professor e conhecimento,
estudante e estudante, estudante e conhecimento (SOUZA; DOURADO, 2015).
A avaliação se caracteriza como um dos maiores desafios da ABP, uma vez
que as instituições escolares ainda privilegiam avaliações formais. Nesta metodologia,
a avaliação acontece de forma contínua e exige cuidados por parte do professor, uma
vez que é baseada na observação direta, nos argumentos e nos registros realizados
pelos alunos. O professor deve pensar em uma forma de avaliar por meio da APB,
solicitando um produto final da solução encontrada pelo grupo, podendo ser:

• uma apresentação de slides;


• a produção de um artigo científico;
• um relatório escrito;
• qualquer outra produção que evidencie a construção significativa do
conhecimento.

É preciso ter em mente que a ABP possibilita a integração de conhecimentos,


uma vez que considera o conhecimento prévio do aluno para a construção de novos
conhecimentos. Nesse sentido, é importante valorizar aquilo que o aluno já sabe,
planejando questões que instiguem sua curiosidade e seu pensamento crítico.

6.3 A aprendizagem baseada em projetos e em problemas na prática


A aprendizagem baseada em projetos e em problemas não tem como objetivo
a mera transmissão e a aquisição de conteúdos, mas é caracterizada pela articulação
entre teoria e prática, com a intenção de apresentar ao aluno um problema ou uma
situação próxima da realidade, que resulte em uma solução e leve o aprendiz a tomar
consciência da sua participação efetiva nesse processo.
A aprendizagem baseada em projetos desenvolve nos educandos o senso de
responsabilidade, amplia seus conhecimentos e desperta a atenção às diferenças
48
individuais. Os resultados obtidos refletem a coletividade, favorecendo futuras
discussões e o intercâmbio de ideias, permitindo uma comunicação direta em que
todos percebam os problemas e as dificuldades durante a atividade. Esta interação
possibilita o desenvolvimento de lideranças, o compartilhamento de expectativas,
dificuldades e metas, promovendo o sentimento de coleguismo e, principalmente, de
aprendizagem colaborativa. Segundo Bender (2014), para se conceber o
planejamento dos projetos de ABP são necessários alguns componentes essenciais
retratados a seguir.

Âncora do projeto: Simples narrativas que descrevam o problema, podendo ser algo
mais envolvente e que desperte o interesse dos alunos. É imprescindível que ela
descreva um projeto real para os alunos.
Questão motriz: Em conjunto com a âncora, a questão motriz deve tanto motivar os
alunos quanto ajudá-los a delinear parâmetros que orientem seu trabalho.
Voz e escolha dos alunos: O professor deve envolver os alunos na escolha do
projeto, considerando não apenas os tipos de escolhas de ABP significativas para
eles, mas principalmente qual delas tem maior possibilidade de funcionar para eles.
Processos específicos para investigação e pesquisa: Apenas algumas atividades
e alguns processos de aprendizagem devem ser estipulados pela tarefa inicial,
proporcionando experiências autênticas para que os grupos possam resolver o
problema.
Investigação e inovação dos alunos: O professor deve usar meios que estimulem
a investigação e o pensamento inovador dos alunos durante o processo de
planejamento, pesquisa e desenvolvimento das atividades, por exercer o papel de
facilitador.
Cooperação e trabalho em equipe: Ajudar os alunos a trabalharem juntos na
resolução de um problema, desempenhando diferentes papéis e se ajudando
mutuamente. É uma das principais contribuições da ABP.
Oportunidades para a reflexão: Estimulando e levando o aluno a usar o pensamento
reflexivo, ele é capaz de encontrar soluções para o problema de forma criativa e
inovadora.

49
Feedback e revisão: Quando o aluno recebe o feedback constante dos caminhos
percorridos em cada etapa e tem a oportunidade de revisar seu trabalho, ele se sente
mais motivado durante o processo.
Apresentações públicas dos resultados dos projetos: O professor pode dar como
alternativa para os alunos publicarem os resultados do projeto em formato de vídeos,
relatórios, websites, apresentação de slides, entre outros, a fim de divulgar para outras
pessoas as soluções encontradas.
A seguir, podemos analisar uma sequência didática de aplicação da
metodologia da ABP.
Primeiro: O professor seleciona um problema, caso, cenário ou uma situação a partir
das necessidades do conteúdo trabalhado.
Segundo: Os estudantes realizam pesquisas ou a coleta de informações,
individualmente ou em grupo, ou seja, passam a investigar o assunto/ solução
conforme as especificidades de cada situação, com o intuito de desvendar ou resolver
o problema que receberam.
Terceiro: Para que os estudantes consigam solucionar o problema elencado, o
professor pode indicar as fontes ou autores de base para a investigação, mas nesta
forma de trabalho também é possível utilizar outras referências como parte do
processo de busca e de qualificação da resposta/solução.
Quarto: O professor deve indicar a forma de apresentação da resolução do problema,
bem como critérios para sua solução, como a capacidade de execução, a viabilidade,
entre outros.
Moura (1993) apresenta também três categorias de projetos que podem ser
adotadas no planejamento da ABP.

• Projeto construtivo: tem o objetivo de construir algo novo, inovador ou


uma nova solução para um problema.
• Projeto investigativo: adotando o método científico, o aluno utiliza da
pesquisa em diversas fontes para encontrar a solução do problema.
• Projeto didático ou explicativo: com base nas questões: “Como?” e “Para
quê?”, explica a funcionalidade do objeto de estudo.

Para enriquecer sua proposta, o professor pode organizar o projeto fazendo


uso das tecnologias disponíveis para o ensino. Quando bem utilizadas, estas
50
aumentam a eficácia da aprendizagem e o envolvimento dos alunos na atividade,
abrindo oportunidade para integrar, enriquecer e expandir os materiais educacionais,
apresentando novas maneiras de interação. É importante utilizar tecnologias nas
metodologias adotadas pelo professor, pois ao mesmo tempo em que inovam a prática
docente, elas também vão ao encontro da realidade dos alunos.
Quando aplicadas à ABP, as tecnologias se tornam ferramentas que
proporcionam possibilidades de aprendizagem que colaboram para o professor
estreitar laços de fala e interação com os educandos. É possível planejar atividades
que utilizem a internet, softwares, celulares, câmeras fotográficas e de vídeo, quadros
interativos, aplicativos, jogos digitais, entre outros.

7 PRÁTICAS ESCOLARES E SEUS DESAFIOS

A escola hoje apresenta inúmeros desafios. Um deles é contribuir para a


formação de educandos e cidadãos, pessoas críticas, conscientes e atuantes na
sociedade. É uma tarefa bastante complexa que exige do espaço escolar um
movimento que vá além de temas, conteúdos e programas. Soares (2003) destaca a
importância de compreender a relação entre cultura e educação. De um lado, temos
a educação e, de outro, a cultura como um espaço que influencia o processo
educacional. Sob essa perspectiva, a abordagem da temática da diversidade cultural
é fundamental no momento em que a escola desenvolve um ensino que procura
atender à comunidade em que está localizada.
Conforme Soares (2003), a escola precisa fomentar as diferenças e dar
significados para oportunizar e produzir saberes em diferentes níveis de
aprendizagem, porque as diferenças fazem parte do processo social e cultural de cada
educando e não servem para explicar que homens e mulheres, negros e brancos,
distinguem-se entre si. Antes de tudo, é preciso compreender que, ao longo do
processo histórico, as diferenças culturais foram produzidas e usadas socialmente
como critérios de classificação, seleção, inclusão e exclusão.
Sendo assim, a escola deve oportunizar a apropriação do conhecimento
científico e da cultura em geral, não perdendo de vista o aspecto fundamental, que é
a noção de que o conhecimento não se constrói com uma série de informações, mas

51
sim por meio de saberes. Nessa perspectiva, se abre um vasto campo de
possibilidades, pois “o saber do povo” designa muitas formas de conhecimentos.
Segundo Freire e Guimarães (1982), o processo educativo é organizado na
relação entre currículo, conhecimento e cultura.
Segundo Lerner (2007, p. 9-10):

É indispensável instrumentalizar didaticamente a escola para trabalhar com


a diversidade. Nem a diversidade negada, nem a diversidade isolada, nem a
diversidade simplesmente tolerada. Também não se trata da diversidade
assumida como um mal necessário ou celebrada como um bem em si mesmo,
sem assumir seu próprio dramatismo. Transformar a diversidade conhecida
e reconhecida em uma vantagem pedagógica: este me parece ser o grande
desafio do futuro.

O currículo deve-se voltar para a formação de cidadãos críticos


comprometidos com a valorização da diversidade cultural, da cidadania e aptos a se
inserirem em um mundo global e plural. Segundo Lopes (1987), é possível trabalhar
o currículo na visão multicultural, formando identidades abertas à pluralidade cultural,
sem preconceitos, com foco em uma educação para a cidadania, para a paz e para a
crítica as desigualdades sociais e culturais.

7.1 Projetos envolvendo a diversidade cultural


Segundo Vygotsky, todo o conhecimento é construído através das relações
sociais, no âmbito das relações humanas (OLIVEIRA, 2002). A sua teoria tem por
base o desenvolvimento do indivíduo como resultado de um processo sócio-histórico,
enfatizando o papel da linguagem e da aprendizagem nesse desenvolvimento, sendo
essa teoria considerada histórico-social. Este processo realiza-se na relação com
outro, nas trocas em que o professor aperfeiçoa sua prática e, ao mesmo tempo,
constrói, consolida, fortalece e enriquece seu aprendizado.
Neste sentido, Nóvoa (1997) afirma que a troca de experiências, no momento
da partilha de saberes, consolida espaços de formação, onde professor é chamado a
desempenhar, simultaneamente, o papel de formador e de formando.
Assim, o papel do professor é de fundamental importância. Atualmente,
muitas transformações vêm ocorrendo na sociedade. A concepção de escola e sua
função social precisam ser revistas e repensadas, uma vez que a educação autoritária,
compartimentada, com currículo fragmentado e distante das transformações sociais e
das vidas dos educandos está perdendo seu significado. Não há mais espaço para

52
essa escola em que o sujeito não tem autonomia e participação na construção de seus
saberes. Conforme Dewey (1897), a educação é um processo de vida e não uma mera
preparação para a vida que está por vir, e a escola deve representar a vida presente
- tão real e vital para o aluno como o que ele vive em casa.
Ou seja, além das preocupações em formar o aluno para ser capaz de ler,
escrever, interpretar, realizar operações matemáticas, ter conhecimentos sobre as
várias áreas do saber e preparando-o para se inserir na vida profissional, a escola
deve também se ocupar da formação de valores morais e éticos que são inerentes
aos humanos, como a autonomia, a solidariedade, a coletividade, o respeito ao
próximo, a autoestima positiva, para assim se tornarem indivíduos completos.
Nesse sentido, o trabalho por projetos contribui de forma significativa para a
educação e vai ao encontro com as exigências da sociedade moderna, pois o trabalho
por projetos envolve um processo de construção, participação, cooperação, noções
de valor humano, solidariedade, respeito mútuo, tolerância e formação da cidadania
tão necessária à sociedade emergente (LUCK, 2003).
Um bom exemplo de como os projetos podem ser úteis para repensar o
currículo e a cultura é o caso de uma escola pública de periferia que realizou o projeto
que chamaremos aqui de “Projeto Viva a Diversidade”, que se dedicou a trabalhar
com a cultura afrodescendente.
Durante o desenvolvimento do trabalho, houve uma análise de diversos
autores que escrevem sobre a dança e a cultura afro-brasileira.
Desse modo, foi possível realizar, por meio de aula expositiva e dialogada,
um encaminhamento de pesquisas, além de um levantamento das informações
encontradas, produções de texto, entrevistas com funcionários da escola e da
comunidade sobre o tema em questão.
Também foram desenvolvidas outras atividades: exposição de trabalhos para
os demais alunos e professores da escola e da comunidade, apresentação de
comidas típicas, confecção de livro ilustrando a história do Zumbi dos Palmares e
confecção de máscaras e esculturas de diversas tribos africanas (de acordo com os
significados que lhes são atribuídos). Com esse projeto, foi possível observar as obras
de artistas que foram influenciados pela cultura africana, como Pablo Picasso.
Discutiram-se estilos de dança outras manifestações culturais, como o filme
“Kiriku e a feiticeira”. Outro projeto sobre diversidade cultural para educação infantil

53
foi desenvolvido de uma forma um pouco diferente. Na escola infantil, o projeto foi
construído a fim de explorar a diversidade cultural existente no Brasil, proporcionando
às crianças o contato com outras culturas e, consequentemente, com o novo,
fomentando o desenvolvimento do respeito ao diferente e reforçando a autoestima e
identidade de cada um.
A educadora estruturou objetivos, de acordo com o foco do projeto:
• Pesquisar diferentes culturas da comunidade em que a escola está
inserida.
• Trabalhar a relação entre família e escola;
• Trabalhar a autoestima nos alunos para que estes possam relacionar-se
com o outro;
• Desenvolver uma imagem de si, atuando de forma mais independente,
com mais confiança em suas capacidades e percepção de seus limites;
• Estabelecer vínculos afetivos e de troca com adultos e seus pares, a fim
de fortalecer sua autoestima;
• Desenvolver o hábito de ouvir;
• Trabalhar a oralidade.
Assim, é na escola que as crianças se tornam conscientes das diferenças
religiosas, raciais e de classes sociais.
Nenhuma criança herda os preconceitos dos pais por intermédio da genética:
na verdade, eles são aprendidos. As atitudes (conscientes ou inconscientes) dos pais
são, no mínimo, um começo no desenvolvimento dos preconceitos das crianças. Os
pais manifestam suas próprias atitudes para com os grupos, controlando as relações
sociais dos filhos por meio de restrições ou encorajamento dados à formação de
amizades. O preconceito sujeita a criança a certas barreiras contra a sua aceitação
social. Isso se reflete no conceito que a criança vai criando sobre si, tornando-a um
sujeito com baixa autoestima.
O preconceito penetra na percepção e na vida das crianças afetando seu
desenvolvimento, podendo ter impacto nas relações sociais. A tarefa da escola, no
combate aos preconceitos, não é fácil. Muitas vezes no ambiente escolar, as atitudes
de professores e administradores reforçam os preconceitos que as crianças aprendem
em casa e na comunidade. O convívio com o racismo, o preconceito e a discriminação

54
racial no cotidiano escolar consolida danos, muitas vezes irreparáveis, para todas as
crianças, sejam elas negras ou brancas, enfim, para toda a sociedade.

7.2 Como lidar com a diversidade cultural no “chão” da escola?


Para além das dúvidas e dos anseios que rodeiam o imaginário escolar em
torno dos entraves e desafios culturais enfrentados atualmente, são os professores e
professoras que têm, fazendo jus às suas atividades-fim, melhor ensinado como fazer.
A partir de algumas conclusões de Moreira e Candau (2003), em cima de
diálogos com professores de escola, apresentam-se aqui algumas possibilidades mais
procedimentais para se reinventar, ainda que de maneira gradual, a escola.
Uma primeira lição de Moreira e Candau (2003) seria a importância de se
estabelecer um marco contextual. Neste sentido, seria importante que a escola (ou
mesmo um grupo de professores ou o professor em particular) se organizasse para
compreender o cenário atual de globalização e de influência neoliberal em que se
encontra a escola, por exemplo, e que também pudesse estabelecer aonde quer
chegar.
Outra questão importante é, nas palavras de Moreira e Candau (2003, p. 166):

Favorecer uma reflexão de cada educador(a) sobre a sua própria identidade


cultural: como é capaz de descrevê-la, como tem sido construída, que
referentes têm sido privilegiados e por meio de que caminhos. Temos
desenvolvido várias vezes este exercício com os(as) educadores(as) e, em
geral, o processo tem-se revelado muito provocador e instigante. Os níveis
de autoconsciência da própria identidade cultural encontram-se, na maior
parte das vezes, pouco presentes e não costumam constituir objeto de
reflexão pessoal. Muitos(as) profissionais da educação nos têm afirmado, em
diversos momentos, que a primeira vez em que haviam parado para pensar
sobre essa temática tinha sido por ocasião dos exercícios propostos, que
certamente mobilizaram memórias, emoções e experiências. Em muitos
casos, os exercícios fizeram aflorar histórias de vida, fortemente dramáticas,
em que as questões culturais geraram muito sofri- mento. Os relatos de
discriminação e preconceito, reprimidos e silenciados por longo tempo,
mostraram-se, então, particularmente fortes. Expressar-se, dizer sua palavra,
tem um efeito profundamente libertador, permitindo que a experiência do
“outro” se aproxime da nossa.

Moreira e Candau (2003) também apontam para outra necessidade imediata,


que impacta mais indiretamente a escola, porém também com grande força: a
necessidade de formação universitária e continuada sobre a formação cultural
brasileira.

55
Especificamente no tema de raça, ainda é comum a narrativa da “democracia
racial” no Brasil, que supõe que o racismo não existe no país, sendo urgente
problematizar certos lugares comuns que ainda não foram superados. Outra indicação
interessante que surge dos dois autores a partir de seu contato com professores e
professoras é a possibilidade de solidariedade para com grupos culturais e étnicos. A
ideia seria uma interação mais concreta e reflexiva, estimulando a entrada das
pessoas na escola que, afinal, a ela pertence.

8 O PROCESSO DE EXCLUSÃO E A NECESSIDADE DA INCLUSÃO

Podemos pensar no currículo escolar como um mapa que orienta a escola e


conduz seus estudantes pelo caminho de sua inclusão na vida social. Nesse sentido,
o professor seria o norteador que mostra a direção necessária pela trilha da formação
humana integral e para a construção de uma sociedade mais justa, democrática e
inclusiva.
Entretanto, o que se evidencia de forma geral são mapas que guiam muitos
deles para o caminho oposto. Desde o início do século XX, pesquisas como as de
Maria Helena Souza Patto, na obra A produção do fracasso escolar, vem desmentindo
a ideia de que a escola obrigatória e gratuita viera para transformar a humanidade e
para redimi-la da ignorância e da opressão. O que se mostra é que a escola não
cumpriu seu papel e não livrou os seres humanos da exclusão e da desigualdade
social.
A definição da educação como promotora do “pleno desenvolvimento da
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”
(BRASIL, 1988, documento on-line) intensifica a dimensão do quanto as perdas nas
aprendizagens e na qualidade do ensino podem atravancar o desenvolvimento
econômico, social e cultural das pessoas e das localidades.
Assim, a compreensão das políticas de inclusão social surge em oposição ao
conceito de exclusão. Dessa forma, cabe uma breve exposição que faça essa relação
entre exclusão e inclusão. Por isso, inicialmente, para nos aprofundarmos nas
questões de desigualdades, diversidade humana e paradigma da inclusão,
precisamos fazer uma retrospectiva histórica de como se constituiu o pensamento da
posição sociocultural de algumas características humanas, para então ter a dimensão
56
do entendimento e da representação que a sociedade nutre sobre determinados
grupos.
Se a inclusão, para alguns, implica um processo longo e dispendioso, esses
mesmos deveriam fazer contas ao preço da trajetória histórica da exclusão
(RODRIGUES, 2003). Precisa-se, então, reportar ao passado e localizar nas
diferentes épocas o retrato que se fixou culturalmente sobre a ideia das diferenças
individuais. Nesse sentido, por estarmos todos imersos em processos históricos
complexos, somos inescapavelmente produtores e produzidos por tais processos
(BAPTISTA, 2006).
Os processos de exclusão criaram diversos grupos sociais que não têm
reconhecidos seus direitos básicos, que não são visíveis enquanto sujeitos, que não
possuem garantias de políticas sociais, culturais e econômicas, e que não têm força
para falar e fazer-se ouvir, como, por exemplo, pobres, negros, índios, pessoas com
deficiência (PCDs), mulheres, homossexuais, idosos e crianças.
Podemos citar ainda três situações diferentes:
1. Pessoas com deficiência que são "cuidadas" exclusivamente em casa ou
em instituições permanentes;
2. outras que recebem apoio socioeducacional em instituições especializadas,
mas separadas das demais pessoas sem deficiência;
3. outras que estão na escola comum, em convívio social com todos.

A situação 1 pode equivaler à atividade dos povos primitivos, com as PCDs


sendo "asfixiadas" na superproteção ou representando empecilho à sobrevivência do
grupo (família).
A situação 2, de colocar PCDs em instituições que segregam, pode equivaler
à postura dos astecas, pois em algumas instituições não há uma proposta inclusiva.
Campanhas publicitárias que geram sentimento de pena podem equivaler à
postura da tribo Xaga, pois se deliciam com suas generosidades, sentindo-se bem por
não terem o mesmo "problema", avivando sua "normalidade".
Na situação 3, ainda há muito que se caminhar da integração à inclusão
verdadeira, pois "aceitam" alunos com deficiência nos contextos sociais, mas os veem
como os egípcios, ou seja, apenas estão pertos, mas não estão próximos. Nesta
realidade, por exemplo, deixar de conduzir um aluno com deficiência às atividades

57
escolares comuns, como ao ato de escrever e de se apropriar de sua autonomia na
construção da escrita e do conhecimento, seria como deixá-lo no meio do caminho,
como faziam os nômades sirionos, para não terem trabalho.
Obviamente, existe uma infinidade de diferentes casos, situações, instituições
e famílias diferentes; por isso, esse comparativo não pode ser visto com
generalização, nem como afronta aos que resistem à inclusão total, e sim como
metáforas dos resquícios históricos de postura frente ao outro.
Mas foi com o Renascimento que os fundamentos humanísticos exigiram que
a postura diante da pesquisa naturalista sobre os males físicos de certa forma
avançasse. A visão assistencialista cedeu lugar definitivamente à postura
profissionalizante e integrativa das PCDs. A maneira científica de perceber a realidade
daquela época começou a derrubar o estigma social que influenciava o tratamento
das pessoas com deficiência, e a busca racional da integração se fez por várias leis
que passaram a ser promulgadas (FONSECA, 2001).
Essas leis foram surgindo pari passu a novas formas de pensar e agir sobre
a deficiência, a partir de diversos movimentos em defesa dos direitos da dignidade
humana, constituindo-se como marcos legais de inclusão em combate à exclusão.
Tais marcos, por sua vez, são devolvidos à sociedade como um conjunto de
normas da vida que busca expressar e também alcançar um ideal de justiça, traçando
as fronteiras do ilegal e do obrigatório. A partir dessa visão histórica, a dignidade
humana da PCD passou a ser pauta de discussões internacionais, cujas publicações
mais tarde afetariam as políticas públicas brasileiras.
Desde a maturação do capitalismo, o mundo direta ou indiretamente passou
a estar basicamente dividido em perdedores e vencedores. Os perdedores eram os
grandes contingentes de trabalhadores assalariados, de serviços braçais subalternos
e mal remunerados, enquanto os vencedores eram os novos homens bem-sucedidos.
Esse mecanismo ideológico do capitalismo surge para ocultar a natureza
predatória desse sistema social e responsabilizar o próprio indivíduo pelo seu
“fracasso” ou “sucesso”. A ideologia propagada, então, é de que o sucesso social
de cada indivíduo só pode ser conquistado a partir do esforço individual, tentando
justificar as desigualdades sociais e ocultar a lógica predatória do próprio capitalismo,
que sobrevive a partir dessas desigualdades e da acumulação de riquezas por uma
minoria dominante (PATTO, 1999; EUZÉBIOS FILHO; GUZZO, 2009).

58
Foi nesse contexto histórico que surgiu a escola tradicional. A partir da crença
de que a divisão social em classes superiores e inferiores teria como critério o talento
individual, é possível compreender os caminhos trilhados do fracasso escolar
(reprovação e evasão) e de currículos escolares que dividem perdedores e
vencedores, que perduram até a atualidade nos sistemas de ensino.
Com a produção de uma escolarização para os mais pobres de forma mais
precária e sem investimentos não é possível então falar que todos têm igualdade de
oportunidades. Além disso, a escola não teria sido inicialmente uma instituição
necessária à qualificação intelectual das classes populares para o trabalho, nem
mesmo quando a especialização técnica do operário passou a ser uma necessidade,
pois seu treinamento era feito na própria fábrica.
A missão da escola para a classe trabalhadora, em seu currículo, não era a
aquisição de habilidades cognitivas específicas, mas era de ajustes comportamentais
para atender as medidas mais imediatas para essa classe: ensinar uma disciplina
rígida para forçá-los a aprender a trabalhar sem descanso; ensinar a submissão na
relação entre alunos e professores para garantir a disciplina e obediência do
trabalhador na relação entre patrões e empregados; e ensinar habilidades domésticas
para as meninas se tornarem boas donas de casa (CHAUÍ, 1981; PATTO, 1999).

8.1 Política de educação inclusiva


Diante das formulações de direitos humanos e fomentos de políticas
inclusivas, sociais e educacionais, a DUDH da ONU, em 1948, foi um marco histórico
mundial.
Além dessa declaração, diferentes localidades do planeta têm buscado definir,
implementar e aprimorar esses direitos. Assim, as sociedades locais e globais se
veem cada vez mais como uma só, aceitando cada vez menos a negligência de seus
direitos, inclusive para gerações futuras.
É bem verdade que milhões de pessoas ainda estão sujeitas a escravidão,
abuso sexual, exclusão em função de deficiência e perseguições por sua opção
sexual, religião, etnia, etc. Entretanto, o coletivo humano encontra um escudo: o
primeiro artigo da DUDH, que afirma que “Todos os seres humanos nascem livres e
iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em
relação uns aos outros com espírito de fraternidade” (UNICEF, [2022], documento on-

59
line). Não se pode negar que a DUDH foi um avanço para a humanidade (UNICEF,
2022), mas também é inegável que a humanidade ainda tem um longo caminho a
percorrer quando o assunto é a construção de uma sociedade humanitária, inclusiva
e justa. A sociedade se define pelo seu fim, mas a pessoa humana deve ser princípio,
sujeita e fim de todas as instituições sociais, principalmente as educacionais.
Dessa forma, com políticas inclusivas a sociedade como um todo dá
possibilidades para que cada pessoa, na sua individualidade, possa se desenvolver e
se tornar parte integrante do meio social, pela sua inserção e participação no que diz
respeito aos seus interesses pessoais e ao bem comum. Essa participação é chamada
de socialização e cidadania, e exprime a tendência natural dos seres humanos de se
associarem para atingir objetivos que ultrapassam as capacidades individuais (SILVA;
JUNIOR, 2010).
O currículo escolar torna-se, então, um instrumento que emerge para
promover a socialização, que é ação ou efeito de desenvolver nos indivíduos de uma
comunidade o sentimento coletivo, o espírito de solidariedade social e de cooperação.
É viver numa sociedade aberta e acessível a todos os grupos, mas que
também estimula a participação e oferece oportunidades iguais para todos realizarem
seu potencial humano. O termo sociedade inclusiva coloca a sociedade como aquela
que deve mudar para lidar com a diversidade humana (SOCIEDADE INCLUSIVA,
2001; RATSKA, 1999).
Todos esses esclarecimentos mostram que a inclusão escolar é muito
necessária para garantir uma educação mais democrática a todos os que dela
participam.
Porém, esse processo educacional só se tornará realidade se todos os
agentes envolvidos no processo conseguirem transpor a legislação para a prática
cotidiana. Para tanto, a formação de professores é fundamental para romper com
abordagens pedagógicas excludentes e para capacitá-los a construir planejamentos
pedagógicos voltados a uma transposição didática do currículo para um ensino
significativo, conectado com a realidade e a transformação social.
Para isso, é preciso considerar as individualidades e necessidades de cada
educando, suas aptidões e os diferentes tipos de inteligências, promovendo
adequação de espaços e materiais de acordo com as singularidades de cada aluno.
Ensinar é marcar um encontro com o outro, e a inclusão escolar provoca basicamente

60
uma mudança de atitude. É reconhecer que o outro é implacavelmente diferente, pois
a diferença é o que existe, a igualdade é inventada e a valorização das diferenças
impulsiona o progresso humano.
Quando se fala em educação inclusiva, fala-se de colaboração, cooperação,
solidariedade, mas é preciso vivenciar esses valores para que não fiquem apenas num
discurso vazio. Conforme o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
(PNUD) ([2022]), o conceito de desenvolvimento humano nasceu definido como um
processo de ampliação das escolhas das pessoas para que elas tenham capacidades
e oportunidades para ser aquilo que desejam.
Diferentemente da perspectiva do crescimento econômico, que vê o bem-
estar de uma sociedade apenas pelos recursos ou pela renda que ela pode gerar, a
abordagem de desenvolvimento humano procura olhar diretamente para as pessoas,
suas oportunidades e capacidades (PNUD, 2022).

8.2 Inclusão social da pessoa com deficiência no universo escolar

Historicamente a pessoa com deficiência frequentava uma instituição


específica, onde todos os estudantes possuíam algum tipo de deficiência,
ocasionando uma segregação e separação da sociedade.
Ainda hoje existem há escolas de educação especial, porém há uma tentativa
de que cada vez mais esse público possa ser inserido nas instituições de ensino
regular. No entanto, para que aconteça de fato a inclusão social na escola regular,
não basta somente matricular os alunos com deficiência nas escolas, é necessária
uma série de adaptações para que o ambiente receba o aluno.
Para identificar quais são as dificuldades e necessidades da pessoa com
deficiência, o modelo social, que se instaurou com o avanço das legislações em torno
do tema, trouxe uma nova forma de compreender a deficiência. Esse modelo passou
a influenciar as várias políticas sociais, dentre elas a política de educação, assim como
a Lei nº 13.146 (BRASIL, 2015, documento on-line) que assegura à pessoa com
deficiência o direito a uma educação de qualidade:

Art. 27. A educação constitui direito da pessoa com deficiência, assegurados


sistema educacional inclusivo em todos os níveis e aprendizado ao longo de
toda a vida, de forma a alcançar o máximo desenvolvimento possível de seus
talentos e habilidades físicas, sensoriais, intelectuais e sociais, segundo suas
características, interesses e necessidades de aprendizagem.
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Além de garantir o direito à educação, essa lei também prevê, em seu artigo
28, inciso II (BRASIL, 2015, documento on-line), o:

[...] aprimoramento dos sistemas educacionais, visando a garantir condições


de acesso, permanência, participação e aprendizagem, por meio da oferta de
serviços e de recursos de acessibilidade que eliminem as barreiras e
promovam a inclusão plena.

Ou seja, os sistemas educacionais precisam adaptar-se à realidade desse


público, atuando para eliminar as barreiras e impedimentos para o desenvolvimento
pedagógico pleno. Estar incluído na sociedade e no âmbito escolar não significa
apenas estar no mesmo ambiente daqueles considerados sem deficiência, mas estar
no meio de todos e ter condições de estar ali, diferente da integração, que apesar de
estar em um mesmo ambiente encontra-se distante dos demais.
Isso envolve também, a interação com os demais alunos, professores e toda
a comunidade escolar, brincar no pátio da escola, participar de excursões
organizadas, ou seja, tudo o que é comum para estudantes que não são considerados
deficientes. Nesse sentido:

[...] para entender totalmente a participação na educação, deve-se atentar


para como as tarefas ou rotinas podem ser modificadas para assegurar a
participação geral em um dado ambiente. Não basta simplesmente medir o
desempenho do aluno na execução de tarefas pré-definidas em um ambiente
pré-definido (OMS, 2013, documento on-line).

Além disso, o ambiente educacional também deve ser avaliado com relação
à sua adaptação às necessidades de todos os alunos, em especial daqueles com
deficiência, como a capacidade de oferecer acessibilidade física, como rampas de
acesso, elevadores, e de comunicação, como intérprete de linguagem de sinais, entre
tantas outras possibilidades, conforme prevê NBR 9050 (ABNT, 2020).
De modo geral, para a educação numa sociedade global e no contexto social
humano, o professor e a escola são de grande relevância na mediação das práticas
educativas inclusivas, que promovem a consciência crítica dos sujeitos e a
consciência de transformação social, requisitos básicos para o desenvolvimento
humano.

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