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A ECONOMIA DA MISÉRIA

Fiquei refletindo esta semana sobre os últimos acontecimentos no cenário


político nacional, e de certo modo, internacional e o possível resultado das eleições do
próximo mês. Creio que este seja o papel dos analistas, professores, articulistas,
jornalistas, filósofos, sociólogos, cientistas políticos, dentre outras áreas do
conhecimento: pensar a realidade e suas implicações nas vidas humanas.
De minha parte, enquanto assistente social e pesquisador, preocupo-me com a
situação daqueles que estão à mercê das condições de miserabilidade,
vulnerabilidades ou em condições subumanas de sobrevivência. Esta população, ora é
alvo de políticas assistencialistas e eleitoreiras, ora é uma população em potencial para
eleger nossos governantes. Contudo, os interesses dos políticos e capitalistas são
sempre os mesmos: se manterem no poder e/ou ganhar “mais-dinheiro”.
Aristóteles já dizia na Antiguidade que somos “animais políticos” (zoon
politikon), ou seja, somos seres sociais que intervimos na vida social. A vida política,
para os gregos, era entendida enquanto espaço onde os “homens”- já que as mulheres
e os escravos não ascendiam a essa condição -, podiam agir politicamente com o
objetivo de se tornarem imortalizados perante a história. Onde os feitos perpetuassem
através dos tempos. Talvez um pouco da ideia da Academia Brasileira de Letras, local
onde vivem os imortais da literatura brasileira, se é que é possível fazer esta
comparação.
Os homens livres na Antiguidade eram aqueles que se libertavam das condições
econômicas, ou seja, do provento da casa, da família etc. O Império Romano rompeu
com esta relação ao separar a vida política da vida ética. E o as religiões judaico-cristãs
colocaram a imortalidade no mundo espiritual, ou seja, os grandes feitos, o
reconhecimento e a lembrança estavam naqueles que conseguiam ter uma vida santa
para se tornarem santos. A imortalidade estava na beatitude quase sempre comparada
com a pobreza, simplicidade, humildade etc., enquanto que o poder e as riquezas do
mundo estavam nas mãos dos “ricos mortais”.
Hoje as situações se inverteram. A imortalidade, o reconhecimento, as
lembranças e os grandes feitos estão naqueles que detém ou acumulam muito
dinheiro. Que controlam e alimentam os bancos e o mercado. Que visam o lucro. E a
vida política está relega a quem conquista espaço nesse ninho de víboras, onde as
relações nem sempre são licitas, mas são legalmente aceitas.
Hoje é natural um patrão explorar o seu empregado até em seus momentos de
lazer. É natural trabalharmos vinte e quatro horas sem parar. É natural tomarmos
vitaminas para nos manter “sempre alerta”. É natural demitir milhares de
trabalhadores das empresas automobilísticas quando estes já produziram um
excedente de veículos. É natural nos tornarmos mercadorias, para a produção de
mercadorias, em troca de uma mercadoria denominada salário, para comprarmos
outras mercadorias para sobrevivermos. Enfim, é natural vivermos assim. Será que há
outro jeito? Eu ainda acredito que sim. Afinal, a esperança é sempre a última que
morre...
Vladimir Safatle, num comentário da Revista Carta Capital, deste mês, aponta
que “quem paga a conta da política econômica do Estado brasileiro são os seus
cidadãos”. Logo, deveriam ser eles os comandantes da economia, mesmo que “a ideia
é deixar a política econômica à margem de qualquer possibilidade de interferência
popular”. Em minha opinião, as eleições deste ano já estão ganhas. É só ver quais as
empresas que tiveram o maior faturamento nos últimos anos, quais os acordos que
vão preservar estes faturamentos e quais destas estão apoiando o candidato “x”, “y”,
“z”. Os discursos vão nessa direção. Nada de novo.
As capas de algumas revistas desta semana e as manchetes apontam para a
força teocrática dos evangélicos. O despautério é tanto que fiquei indignado com uma
foto publicada na Revista Época onde a Presidenta Dilma, acena aos presentes na
inauguração do Templo de Salomão, da Igreja Universal em São Paulo, uma obra
faraônica, paga com o dinheiro dos “pobres fiéis”, para servir aos interesses
puramente humanos – pois Deus não precisa de nenhum dinheiro e muito menos local
para culto. Uma obra que é uma verdadeira afronta à miséria humana.
Bem, já dizia um grande pensador: “a história, muitas vezes, se repete
enquanto tragédia, outras vezes enquanto farsa”. O ser humano é carente de história.
As coisas caem rápido no esquecimento.
Enquanto isso, na vida real, nos últimos dez anos, pela primeira vez o número
de formandos do ensino superior diminui. O motivo principal: falta de dinheiro para
terminar os cursos. Mas não é um contrassenso num momento em que há várias
formas possíveis de financiamento estudantil? Em momento de PROUNE, Cotas, FIES,
bolsas, novas universidades, curso a distância etc.? Não deveria ser o contrário?
Pois é, creio que precisamos pensar e estudar mais, ou deixar que Deus
governe as vidas dos pobres e o dinheiro a vida dos ricos. Aos pobres, o céu os espera
e aos ricos a vida farta continua sendo o melhor destino. Pura paródia de uma triste
realidade.

Renato Tadeu Veroneze


Assistente Social
E-mail: rtveroneze@hotmail.com

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