Você está na página 1de 52

Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

Lições de Finanças Públicas e Direito Financeiro- Maria d’Oliveira Martins

Noção de Finanças Públicas: atividade económica de um ente público tendente a afetar bens à
satisfação de necessidades que lhe estão confiadas. A expressão poderá ser utilizada num
sentido orgânico- simbolizando o conjunto de órgãos do Estado ou outro ente público a quem
compete dirigir recursos para a satisfação de certas necessidades-, sentido objetivo- atividade
através da qual o Estado afeta bens económicos à satisfação de certas necessidades sociais-, e
sentido subjetivo- disciplina cientifica que estuda os princípios e regras que regem a atividade
do Estado com o fim de satisfazer as necessidades que lhe estão confiadas.

Atividade financeira do Estado: constrói-se em função da satisfação das necessidades em


concreto sentidas por uma comunidade que são assumidas pelo poder político.

 Baseada em decisões políticas: como apresenta Michael Walzer as opções acerca das
necessidades que devem ser satisfeitas pela comunidade assumem uma natureza
política, visto que será a decisão política, que decidirá quais as maneiras para gastar os
dinheiros públicos. A atividade financeira do Estado e, em concreto a despesa pública,
é ditada pela decisão política. Os regimes mais intervencionistas (finanças
intervencionais, chamadas funcionais/ativas) levam a que o princípio do mínimo
(característico dos regimes liberais) seja substituído pela regra do ótimo, aumentando a
despesa pública, o que acarreta uma diversificação das receitas do Estado (exploração
do património público e recurso ao crédito).
 Baseada numa racionalidade económica, tendo em vista a prossecução da eficiência
no mercado e da justiça na distribuição de bens: A existência de um Estado do bem-
estar exige que o Estado afete receitas na prossecução do ótimo social e procure
soluções para a manutenção de um mercado eficiente e justo. Deverá existir um
mercado de base individualista em que as empresas, em princípio, se encontram em
concorrência perfeita. A busca de eficiência é o que leva o Estado a atuar no mercado
colmatando as falhas que este possa colmatas. Procurando a justiça, o Estado não se
conforma com as distribuições feitas pelo mercado, procedendo à correção das mesmas
de forma a promover uma afetação de recursos socialmente mais justa. A atividade
financeira do Estado tem como função também a estabilização económica (para além
da eficiência e justiça- ainda que a estabilização se reconduz à procura da eficiência e
justiça), que se concretiza, por exemplo, em manter o emprego elevado, um razoável
grau de estabilidade do nível de preços e uma apropriada taxa de crescimento
económico.
 Provocada por falhas de intervenção do Estado: a despesa pública acaba por ser
também determinada por falhas na intervenção do Estado ou falhas do Governo, como
por exemplo: falhas de informação (Estado desperdiça recursos por não conseguir uma
informação cabal acerca do beneficiários de certos problemas); deficiências no
planeamento e execução das suas tarefas; excesso de burocracia; captura das decisões
por parte dos lobbies, que defendem interesses privados; oscilação de ciclos eleitorais
(“medidas financeiras simpáticas com proximidade dos atos eleitorais”); despesas
indevidamente realizadas que não são fiscalizadas ou das quais não resulta a
responsabilização financeira; corrupção.

Incapacidades/falhas de mercado: consiste na existência de um bem, que corresponde a uma


necessidade dos membros da comunidade, que não é produzido pelo mercado de forma
eficiente. Quais as razões da existência das falhas de mercado? Ou porque se verifica a existência
de um desequilíbrio entre a utilidade individual e a utilidade social na produção e utilização de

1
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

um bem, que faz com que este não se produz ou se produza insuficientemente; ou porque se
geram custos/benefícios para a comunidade sem que esta possa imputá-los a quem os provoca;
ou porque a produção de certos bens conduz à destruição da concorrência nesse mercado. Esta
realidade exige que se arranjem outras formas de produzir os bens em causa.

Podemos apresentar como exemplos de falhas de mercado:

➢ Existência de necessidades coletivas que exijam a produção de bens coletivos/ bens


públicos puros para a sua satisfação. Há bens que não são produzidos no mercado, ou
que quando o são demonstram que são insuficientes em relação às necessidades. Assim,
se o bem for essencial não podem deixar de ser produzidos pelo Estado, sendo esses
bens chamados de bens coletivos ou bens públicos puros. Estes bens têm como
características: satisfação passiva, isto é, a sua apropriação não depende de nenhum
esforço por parte do consumidor, sendo difícil que se possa cobrar um preço por estes;
não são exclusivos, visto que não se pode privar ninguém da sua utilização, sendo que
aquilo que é fornecido o é imediatamente disponibilizado para todos os indivíduos em
igual quantidade; são não emulativos, isto é, os utilizadores não entram em
concorrência para conseguir a sua utilização, não sendo possível excluir ninguém da sua
utilização nem acarretando custo adicional o consumo por parte de mais um individuo.
Exemplos de bens públicos puros: farol, defesa nacional e justiça. Se estes bens fossem
produzidos no âmbito da economia privada haveria um desequilíbrio entre a utilidade
daquele que suporta os custos e a utilidade daqueles que beneficiam do bem e, por isso,
o Estado para acabar com esse desequilíbrio, intervém, chamando a si a produção
desses bens ou subsidiando-a. A produção será financiada por todos os membros da
comunidade através dos impostos. Existem também bens públicos impuros que apesar
de também terem um custo marginal 0 por cada utilização a mais, são suscetíveis de
ficar congestionados, visto que à medida que mais pessoas utilizam o bem, menos
utilidade retiram dele os seus utilizadores (ex. estrada, ponte, jardim público, piscina,
praias, bibliotecas, museus). Se o bem for facilmente congestionável, faz sentido que se
promova a exclusão de alguns utilizadores, e estaremos presentes um bem de clube.
Estes bens só apresentaram uma falha de mercado a que o Estado tem de acorrer se a
exclusão não for possível (por terem capacidade para mais utilizadores que o número
de população que servem ou por serem produzidos a custos decrescentes, podendo
gerar em último caso uma situação de monopólio).
➢ Existência de falhas na concorrência: poderá existir um monopólio natural (forma-se
pela existência de custo decrescentes que permitem fornecer bens a um custo inferior
das restantes) ou um monopólio artificial (criado pela determinação do Governo). A
existência de monopólios gera a renda do monopolista, isto é, um sobre lucro da
empresa, visto que os preços tendem a situar-se acima do nível normal do preço em
concorrência. O mercado deixa por isso de funcionar de forma eficiente, visto que os
consumidores consomem menos por o preço estar acima do custo médio. O Estado
poderá intervir com o chamamento a si da atividade ou reduzir a renda monopolista
através de um abaixamento administrativo dos preços. A Autoridade para a
Concorrência tem como objetivo suprir esta falha de mercado.
➢ Verificação de exterioridades/externalidades positivas e negativas, que correspondem
aos efeitos externos dos comportamentos económicos, consistindo as primeiras na
existência de um comportamento económico que provoca benefícios a terceiros e as
segundas na existência de um comportamento que implica a imposição de custos. A não
resolução das externalidades positiva levam a que haja um défice no fornecimento dos

2
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

bens (pois a utilidade social desses bens não foi paga ao fornecedor) e das
externalidades negativas levam a que se gere uma proliferação das atividades que a
causaram (pois não é imposta uma compensação). O Estado intervém socializando a
externalidade, permitindo o acesso à justiça e impondo tributação,
➢ Assimetria de informação, que gera distorções nos preços ou nas condições dos
produtos, visto que o mercado para funcionar de forma eficiente necessita de uma não
desigual informação na oferta e procura. O Estado supre esta incapacidade com o
fornecimento de mais informação, criando serviços de certificação de qualidade ou
mesmo assumindo alguns serviços de informação).
➢ Existência de bens que não são produzidos pelo mercado- mercados incompletos- mas
que são bens que satisfazem necessidades sentidas pela comunidade. Está associada a
esta incompletude a incerteza e risco na atividade económica, visto que há situações de
risco tão elevado que o mercado só pode cobri-los com custos muito elevados e
desproporcionados em relação ao risco. Assim, há falha de mercado quando os riscos
que deveriam ser protegidos só o são a preços muito elevados ou simplesmente não são
de todo. Assim, o Estado assegura a função de segurador, por exemplo através da
segurança social ou então legisla no sentido de promoção destes seguros (Sistema de
Indemnização dos Investidores).Por outro lado, temos o caso dos mercados
complementares, isto é, existem bens que a sua produção não é rentável sem a
produção de outros bens. Nestes casos, ou existe interesse em produzir os dois bens em
simultâneo ou existe o perigo de o seu produtor correr o risco de o seu bem ser um
fracasso face à ausência do produto complementar, sendo assim o Estado chamado a
promover a cooperação entre produtores de bens complementares.
➢ Verificação de desemprego, inflação e desequilíbrio.

É o Estado que providencia estes bens na medida em que só ele tem uma perspetiva de interesse
geral e temporalmente ilimitada, assim como detém poderes de autoridade para impor reras de
utilização de bens e seu financiamento. Por outro lado, só o Estado tem uma dimensão que lhe
permita empreender esforços que não estão ao alcance dos privados, sendo apenas possível ao
Estado realizar o bem-estar desejável.

Dois Braços do Direito Financeiro

Receita Pública: qualquer recurso obtido durante um determinado período, mediante o qual o
sujeito público pode satisfazer as despesas públicas que estão a seu cargo. Distingue-se em
receitas patrimoniais, receitas creditícias e receitas tributárias.

➢ Receitas Patrimoniais: são aquelas que provém da gestão dos bens de que o Estado é
titular ou que tem à sua disposição para a satisfação das suas necessidades. O
património bruto do Estado é constituído por ativos e passivos, sendo os primeiros uma
valorização económica do conjunto de bens e direitos e os segundos a oneração de bens
e direitos. O património líquido corresponde ao passivo descontado do ativo. No âmbito
do ativo podemos distinguir entre património real (coisas de que o estado dispõe e
direitos sobre elas) e financial (dinheiro, ativos monetário-financeiros, créditos e débitos
do Estado), por um lado, e património mobiliário (direitos sobre bens móveis e direitos
de objeto imaterial) e imobiliário (património dominial de objeto imóvel e património
creditício de objeto imaterial) por outro. No âmbito do património do Estado podemos
distinguir entre património duradouro (permanece na esfera jurídica do Estado para
além do período orçamental) e património não duradouro (permanência na esfera
jurídica do Estado fica aquém do período orçamental). Esta última diferenciação serve

3
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

de base para a distinção entre receitas correntes (não alteram a situação passiva ou
ativa do património duradouro do Estado) e receitas de capital (alteram a situação
passiva ou ativa do património duradouro do Estado); distinção entre divida flutuante e
fundada (consoante os ativos ou passivos vão ou não para além do período orçamental);
e ainda para autonomizar (em relação ao património do estado e à disciplina
orçamental) o património da Tesouraria do património do Estado, sendo o primeiro os
meios monetários do Estado e os meios de liquidez a curto prazo (património não
duradouro). As receitas patrimoniais, em geral, podem provir da gestão normal do
património ou da disposição de elementos do seu ativo (alienações ou onerações)-
sendo estes últimos não presentes na Lei de Orçamento de Estado, visto que esta não
reflete a permanência ou não na esfera jurídica do Estado dos bens de que é titular.
➢ Receitas Creditícias: resultam de uma atuação de dilatação temporal entre duas
prestações, sendo que desse dilatação resulta benefício para um ou ambos os sujeitos
da operação.
 Dívida Pública (Lei Quadro da Dívida Pública): conjunto de todas as situações
passivas de que o Estado é titular. A dívida pública serve para financiar o défice
global do Orçamento de Estado (dívida fundada) ou pode configurar opções de
boa gestão financeira ou económica. A dívida pública em sentido amplo engloba
a dívida administrativa (Estado é devedor por força de uma espera forçada ou
voluntária de alguns dos seus credores), dívida vitalícia (Estado se coloca numa
posição devedora em virtude da prática de serviços considerados excecionais,
relevantes ou distintos), divida empresarial (resulta da participação social que o
Estado tem em empresas) e dívida aquisitiva (resulta da aquisição de bens
recorrendo aos meios de financiamento privado). A dívida pública em sentido
estrito corresponde à situação na qual o Estado é devedor em virtude de uma
operação financeira, pela qual lhe foram prestados ativos financeiros, devendo
reembolsá-los e/ou pagar juros ou rendas- estamos perante o crédito e dívida
pública financeira. A dívida pública financeira engloba as seguintes distinções:
dívida principal (Estado é devedor de uma determinada quantia) e acessória
(Estado responde subsidiariamente em caso de incumprimento do devedor
principal, sendo o garante de uma situação de dívida); flutuante (vencimento
verifica-se no período orçamental em que foi gerada, sendo paga no total no
período de 1 ano- crédito de curto prazo) e fundada (prazo de vencimento é
superior a um ano, isto é, a dívida vence fora do período orçamental em que foi
originária- crédito de longo prazo. Dentro desta podemos distinguir entre a
dívida perpetua ou consolidada- o Estado não é obrigado a reembolso, mas
apenas ao pagamento de um certo juro anual, podendo ser remíveis (o Estado
pode pagar quando quiser) ou irremíveis (o Estado não tem de reembolsar, só
tem de pagar juros)- e dívida temporária- dívida com prazo de reembolso, como
empréstimos reembolsáveis à vista, vencimento em omento incerto,
vencimento por morte do devedor e vencimento em momento certo (tipo mais
comum)); interna (contraída dentro do próprio país) e externa (contraída no
estrangeiro); em moeda nacional e em moeda estrangeira- tem relevância para
efeitos de limitação do endividamento das Regiões Autónomas; efetiva (Estado
é devedor de uma entidade estranha ao setor público) e fictícia (Estado é
devedor do próprio Estado ou de uma entidade do setor público).
 O artigo 10º/1 da Lei-Quadro da dívida pública apresenta-nos os instrumentos
a que o Estado pode recorrer para aumentar a sua dívida pública. Segundo o

4
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

número 4 desse artigo também são incluídas na dívida direta do Estado os


certificados de rendas perpetuas e vitalícias. Os Bilhetes de Tesouro (são valores
mobiliários de curto prazo podendo ser emitidos com prazos até um ano-dívida
flutuante) e as Obrigações do Tesouro (são o principal instrumento de dívida,
financiando cerca de 70% da totalidade do financiamento de que o Estado
necessita. São valores mobiliários de médio e longo prazo- dívida fundada)
assumem uma maior importância enquanto instrumentos de dívida pública, na
medida em que é nestes que se concentra basicamente a emissão de títulos de
dívida. É importante também referir os produtos de aforro (só podem ser
emitidos a favor de particulares e não são transmissíveis exceto em caso de
falecimento do titular), dentro dos quais se destacam: os certificados de aforro
e os certificados do tesouro, sendo ambos instrumentos de dívida que visam a
captação da poupança das famílias, exigindo montantes mínimos de subscrição
reduzidos, os primeiros exigindo 100 euros e os segundos 1000 euros. Outros
instrumentos de dívida: Acordos de Reporte (consistem na venda a Operadores
Especializados em Valores do Tesouro e Especialistas do Tesouro de títulos de
dívida emitidos para o efeito, com a acordo simultâneo de recompra dos
mesmos, num prazo pré-acordado); Recurso à linha de Euro-Comercial Paper
(com montante máximo de 4 mil milhões de euros ou valor correspondente); e
Emissão de dívida em moedas não-euro (como solução excecional e de último
recurso, a possibilidade de emissão de instrumentos de médio e longo prazo em
moedas não-euro, com o objetivo de colmatar necessidades adicionais,
marginais e pontuais de financiamento). O risco associado na compra de
instrumentos de dívida pública é avaliado por agências internacionais de
notação financeira. (páginas 48-53 muito pouco bem percebido).
 Regime jurídico da dívida pública: o artigo 161º alínea h) da CRP apresenta que
a contração e concessão de dívida fundada e a realização de outras operações
de crédito que não sejam dívida flutuante depende da autorização da
Assembleia da República, sob pena de nulidade da emissão da dívida
correspondente. Exclui-se, portanto, desta exigência a dívida flutuante e as
rendas vitalícias e perpétuas. Assim, a autorização da AR é necessária apenas
para a contração e concessão de dívida pública fundada. A contração e
concessão de dívida regional ou municipal está sujeita a autorização das
Assembleias das Regiões Autónomas ou as Assembleias Municipal. Contudo, é
necessária a autorização prévia da Assembleia da República para a contração de
empréstimos em moeda sem curso legal em Portugal- acautelar distorções na
dívida pública externa nacional e não provocar reflexos negativos na avaliação
da dívida da República. A autorização de contração de dívida fundada implica a
definição do acréscimo do endividamento e do seu prazo máximo, assim como
o montante máximo da dívida em moeda estrangeira, a dívida a taxa fixa e a
dívida a taxa variável. A habilitação (se for nova à atribuída na Lei de Orçamento
de Estado) poderá ser concedida na alteração à lei do Orçamento de Estado ou
numa lei avulsa, estando ambas sujeitas ao regime da lei orçamental, visto que,
a redefinição de condições de contração de dívida pública não pode deixar de
se reportar ao Orçamento e, portanto, deve ser sujeita ao seu regime, até
porque é uma derrogação à Lei de Orçamento. Não será necessária uma
autorização legislativa para essa redefinição visto que, mesmo no caso de não
existir ainda aprovação parlamentar da Lei do orçamento, o Governo pode

5
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

emitir e contrair dívida (embora com limites). Assim, se se autoriza, mesmo sem
autorização e definição das condições, não faria sentido que sendo autorizada,
tivesse de seguir o regime das autorizações parlamentares para serem alteradas
as condições. Segundo o artigo 5º da Lei-Quadro da Dívida Pública, após
concedida a autorização parlamentar, o Conselho de Ministros define, por meio
de resolução, as condições complementares a que obedecerão a negociação,
contratação e emissão de empréstimos. A gestão da dívida pública é feita pela
Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública (IGCP, EPE). Esta entidade
deve também prestar apoio às Regiões Autónomas no que toca à organização
de dívida pública regional e no acompanhamento da respetiva gestão. O artigo
13º da Lei-Quadro da Dívida Pública descreve um conjunto de operações que
cabem à Assembleia da República, mas que esta pode autorizar o Governo,
através do Ministro das Finanças a realizá-las.
 A dúvida pública pode extinguir-se através da amortização, o que significa “o
pagamento das prestações de capital”. O IGCP deve evitar uma excessiva
concentração temporal de amortizações e a amortização de empréstimos
deverá ser coberta por receitas não consignadas do Orçamento de Estado (12º
LQDP). A dívida pode também extinguir-se através da prescrição da dívida: os
créditos correspondentes a juros e rendas perpétuas prescrevem em 5 anos a
contar do seu vencimento; os créditos correspondentes ao capital mutuado e a
rendas vitalícias prescrevem em 10 anos a contar do vencimento ou do primeiro
vencimento de juros ou rendas posterior ao dos últimos cobrados.
 Regime da dívida acessória do Estado (Lei 112/97): o Estado pode conceder
garantias pessoais sob forma de fiança ou aval. Essas garantias são concedidas
a título excecional e o fundamento para a sua atribuição deve ser o manifesto
interesse para a economia nacional, devendo essa concessão seguir o princípio
da igualdade e respeitar as regras de concorrência. A concessão de garantias
exige 3 requisitos de verificação comutativa: o Estado ter participação na
empresa ou interesse no empreendimento, projeto ou operação financeira
(com características especificas- 9º/2 DL) que justifique a concessão; tem de
existir um projeto concreto de investimento ou um estudo especificado de
operação a garantir e uma programação financeira rigorosa; o beneficiário tem
de apresentar características económicas, financeiras e organizacionais que
ofereçam segurança suficiente para fazer face às responsabilidades que
pretende assumir. O Estado nunca pode assumir uma garantia em que haja uma
forte possibilidade de ser chamado a pagar a dívida assumida. A concessão de
garantias depende da prova de imprescindibilidade dessa garantia para a
realização da operação de crédito ou financeira, o que significa que nunca
poderá conceder garantias com o fundamento de que a entidade concedente é
incapaz de assumir compromissos de pagamento de dívidas. O créditos de
utilização terão prazos de utilização não superiores a 5 anos, devendo ser
totalmente reembolsados no prazo máximo de 30 a 50 anos a contar das datas
dos respetivos contratos. O Estado aplica, nalguns casos, regimes especiais de
concessão de garantias. O limite máximo de garantias pessoas a conceder pelo
Estado é fixado pela AR (161º h) CRP e 5º DL)
➢ Receitas Tributárias: aquelas que o Estado obtém no exercício do seu poder de
autoridade, impondo aos particulares um sacrifício patrimonial que não tem por
finalidade puni-los nem resulta de qualquer contrato com eles estabelecido.

6
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

 Impostos: prestações pecuniárias de natureza corrente devidas ao


cumprimento de uma obrigação legal, unilaterais, exigidas coercitivamente pelo
Estado sem contrapartida imediata e direta para quem o paga. A ideia é a de
que como todos beneficiam da atividade financeira do Estado, todo devem
contribuir para a cobertura das despesas originadas com essa atividade. Os
impostos podem ser pessoais (têm em conta a condição social do contribuinte)
ou reais (refletem o elemento objetivo da sua incidência); diretos ou indiretos,
incidindo os primeiros sobre o rendimento e património e os segundos sobre o
consumo); progressivos, regressivos ou proporcionais; específicos (incidindo
sobre grandezas físicas) ou ad valorem (incidindo sobre valores); periódicos ou
de obrigação única.
 Taxas: constitui uma obrigação pecuniária e coativa, exigida por uma entidade
pública, em contrapartida de prestação administrativa efetivamente provocada
ou aproveitada pelo sujeito passivo. Tem uma natureza bilateral, visto que
pressupõe uma contraprestação especifica por parte do serviço público que a
cobra, devendo essa taxa e a contraprestação ter uma relação de
proporcionalidade. As taxas baseiam-se no princípio do benefício.
 Contribuições financeiras a favor de entidades públicas: encargos tributários
que de forma mais ou menos completa recorrem ao princípio do benefício como
forma de legitimação e parâmetro da distribuição dos encargos tributários. São
de natureza obrigatória e de caráter corrente, tendo como contrapartida uma
prestação social futura em favor do respetivo contribuinte. As prestações não
têm correspondência com o curso do bem em causa, tendo uma componente
coletiva mais acentuada (ex. contribuições para a Segurança Social).
➢ Outras receitas: multas, penalidades e coimas, os pagamentos efetuados por
particulares ao Estado e a outros entes públicos que que visam a compensação por
infração a um regulamento ou disposição legal.

Receitas das Autarquias Locais

 Notas: as freguesias têm muito poucas receitas, sendo essa escassez acompanhada do
número diminuto de tarefas que lhe incumbem. A descentralização administrativa,
operada com a repartição de competências entre Estado e AL, será tanto mais efetiva,
quanto mais capacidade de financiamento se conceder a estas últimas.
1. Transferências Orçamentais: a principal receita resulta das transferências que o Estado
faz para estas, tendo estas como objetivo a dotação das autarquias das condições
financeiras adequadas à prossecução das suas atribuições, promovendo também a
correção das desigualdades, como forma de garantir um desenvolvimento harmonioso
de todo o território nacional. O orçamento de Estado determina o que cabe em concreto
a cada autarquia. Anualmente, transfere-se para o Fundo de Equilíbrio Financeiro 19,5%
da média aritmética simples da receita líquida de IRS, IRC e IVA, sendo que esse depois
vai atribuir uma subvenção a cada um dos Municípios, através do Fundo Geral Municipal
e do Fundo de Coesão Municipal. Este Fundo Geral Municipal, que visa dotar os
municípios de condições financeiras adequadas ao exercício das suas atribuições,
distribui 50% da verba atribuída ao FEF às Autarquias, de acordo com os critérios fixados
no artigo 32º do Regime Financeiro das Autarquias Locais e entidades intermunicipais.
O Fundo de Coesão Municipal visa reforçar a coesão municipal e fomentar a correção
de desigualdades entre municípios, e atribui os restantes 50%. É também transferida
uma quantia para o Fundo Social Municipal e pode também operar uma transferência

7
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

correspondente a uma participação variável até 5% no IRS, dependendo essa receita de


uma prévia decisão dos municípios. Para o Fundo de Financiamento das Freguesias de
2% da média aritmética da receita líquida de IRS, IRC e IVA. Note-se ainda que é vedada
a possibilidade de transferências extraordinárias de verbas para os municípios e
freguesias, exceto em caso de financiamento de projetos de interesse nacional ou nas
situações previstas, como situações de calamidade pública, afetação negativa por
investimentos da responsabilidade da administração central, afetação drástica da
operacionalidade das infraestruturas e dos serviços municipais de proteção civil, e em
casos de reconversão urbana de génese ilegal ou programas de reabilitação urbana
quando o seu penso relativo transcenda a capacidade e a responsabilidade autárquica
nos termos da lei- Cooperação técnica e financeira.
2. Receitas Tributárias: estas receitas não cobrem a maior parte das despesas das
autarquias e, portanto, existe um federalismo financeiro imperfeito. O artigo 288º/4 da
CRP refere a existência de poderes tributários autárquicos. As autarquias têm poderes
de fixação da taxa de IMI relativos a prédios urbanos e por outro lado, têm o poder de
lançamento da derrama, até ao limite máximo de 1.5% do IRC. Os municípios podem
ainda, conceder isenções totais ou parciais em relação aos impostos ou tributos
próprios. As deliberações que envolvam o exercício de poderes tributários ou
determinem o lançamento de taxas não previstas na lei são nulas, não existido o poder
de criar impostos próprios nem o poder de proceder a adaptações do sistema fiscal
nacional. O poder tributário dos municípios traduz-se na titularidade do imposto
municipal sobre imóveis e de uma parcela do imposto único de circulação e no produto
da cobrança de derramas. São também receitas tributárias aquelas que correspondem
ao produto da cobrança de mais valias. As receitas das freguesias: titularidade da
totalidade do produto do imposto municipal sobre imóveis dos prédios rústicos e uma
participação de 1% na receita do IMI sobre prédios urbanos.
3. Receitas Patrimoniais: rendimento de bens próprios, móveis ou imóveis, por eles
administrados, dados em concessão ou cedidos para exploração, e receitas
provenientes da participação nos lucros das sociedades em que tomem parte (quanto
aos municípios). As freguesias têm como receitas patrimoniais os rendimentos próprios
de bens móveis ou imóveis por eles administrados, os rendimentos de mercados e
cemitérios das freguesias e o produto da alineação de bens próprios móveis ou imóveis.
4. Receitas Creditícias: a capacidade de endividamento das freguesias é menor que a dos
municípios, visto que só podem recorrer aos empréstimos de curto prazo. A Lei do
Orçamento de Estado pode estabelecer limites específicos ao endividamento anual das
autarquias locais, podendo estes ser inferiores aos que resultariam do Regime
Financeiro das AL e entidades intermunicipais, e prevalecendo (29º LEO). O
incumprimento dos limites dará lugar à redução do montante das transferências
orçamentais no ano subsequente. Existem, nos termos dos artigos 56º e seguintes do
Regime Financeiro das AL mecanismos de alerta precoce de desvios no que toca à
previsão orçamental da dívida. Os artigos 49º e seguintes do Regime apresentam o
regime de crédito dos municípios e das freguesias.
5. Outras Receitas: produto das taxas que os municípios podem criar; produto das multas
e coimas que caibam aos municípios; e o produto de heranças, legados, doações e
outras liberalidades. As freguesias têm como outras receitas: o produto da cobrança de
taxas; rendimento de mercados e cemitérios das freguesias; produto das multas e
coimas; e o produto de heranças, legados, doações e outras liberalidades. Estas

8
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

recebem ainda receitas dos municípios destinadas a cobrir encargos com a delegação
de competências.

Receitas das Regiões Autónomas

1. Receitas Tributárias: IRS devido ou retido por pessoas singulares residentes nas RA; IRC
devido por pessoas coletivas residentes das RA; IVA cobrado pelas operações realizadas
nas RA; impostos especiais de consumo cobrados sobre os produtos tributáveis que
sejam introduzidos no consumo das RA; imposto de selo devido por sujeitos passivos
com sede ou direção efetiva nas RA ou com sede ou direção efetiva em território
nacional, mas com sucursais, delegações ou quaisquer formas de representação
permanente nas RA; impostos extraordinários liquidados como adicionais ou sobre a
matéria coletável ou a coleta de outros impostos que já constituem receita das RA;
impostos extraordinários autónomos respeitantes a bens localizados nas Regiões, a
contatos aí celebrados ou a bens que garantam obrigações que se situem nessas
mesmas Regiões; importo especial pelo exercício da atividade do jogo devido pelas
empresas concessionárias nas respetivas circunscrições territoriais; IRS e IRC de pessoas
singulares ou coletivas sem sede no território português. Note-se que as receitas
tributárias compreendem ainda as próprias das RA, resultantes do exercício de poder
tributário próprio: adaptação do sistema fiscal às especificidades regionais (277 alínea
i)), devendo esta ser feita pelas AL Regionais; criação de impostos pelas AL Regionais.
Pode haver impostos apenas vigentes nas RA desde que não incidam sobre matéria
objeto da incidência prevista para qualquer dos impostos nacionais, caducando os
impostos regionais se forem criados outros semelhantes a nível nacional. As RA podem
proceder à cobrança destes impostos, criando para o efeito serviços ficais competentes
ou utilizar os serviços regionais do Estado, mediante o pagamento de uma
compensação; adicionais a impostos, criados pelas AL Regionais, sendo lançados
adicionais até 10% sobre a coleta dos impostos em vigor nas RA. Podem ainda fixar
taxas, fixando o quantitativo de taxas, tarifas e preços devidos pela prestação de
serviços regionais, pela outorga de licenças, alvarás e outras remoções de limites
jurídicos às atividades regionais dos particulares e pela utilização dos bens de domínio
público regional.
2. Receitas Creditícias: o recurso ao crédito é retirado na combinação do 227º/1 alínea h)
e p) CRP, retirando-se também a necessidade de este ser limitado pelo caráter unitário
do Estado. Assim, as RA podem contrair empréstimos de longo e curto prazo, limitados
nos termos definidos pela Lei de Finanças das RA. A autorização para contrair dívida
regional compete à AL Regional, exceto se for a contração de empréstimos em moeda
sem curso legal em Portugal, de forma a não provocar efeitos negativos quanto ao rating
de dívida da República. A dívida contraída a longo prazo destina-se apenas a financiar
investimentos ou a subsistir e amortizar empréstimos anteriormente contraídos. A
dívida a curto prazo deve ser contraída para fazer face a necessidades de tesouraria e,
portanto, ser paga até ao último dia do ano em que for contraída, não podendo
ultrapassar 35% das receitas correntes líquidas cobrados no 3 anos anteriores. A Lei de
Finanças das RA fixam os limites máximos de endividamento, mas a Lei de Orçamento
de Estado pode estabelecer limites específicos de endividamento anual para as RA, com
a particularidade de prevalecer. O incumprimento destes limites leva a que haja uma
redução do montante de transferências orçamentais do ano subsequente. Admite-se
que o Estado assuma uma posição devedora no que toca às dívidas das RA, se prestação
garantia pessoal ou se isso resultar de lei expressa.

9
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

3. Receitas Provenientes do Orçamento do Estado: justifica-se ela tendencial assunção da


generalidade das funções do Estado e pelos problemas especiais de desenvolvimento
que se fazem sentir e que decorrem de ultraperificidade destas regiões. A concessão de
transferências não resulta de negociação prévia com as RA, mas apenas na aplicação de
fórmulas matemáticas. Uma parte das transferências reverte para o Fundo de Coesão
das Regiões ultraperiféricas, com vista a assegurar a convergência económica de todo o
território nacional. As transferências podem ser reduzidas, pela violação dos limites ao
endividamento imposto pela Lei de Orçamento de Estado ou por necessidade de
assegurar o estrito cumprimento dos princípios da estabilidade orçamental e da
solidariedade recíproca, para cumprir o 126º TFUE e o PEC.
4. Receitas Patrimoniais
5. Outras Receitas: juros sobre impostos que constituem receita próprias, multas e coimas
se a ação ou omissão que consubstancia a infração se tiver verificado nas RA, preços
públicos devidos pelas prestações de serviços regionais, participação sobre os
resultados líquidos da exploração dos jogos sociais explorados pela Santa Casa da
Misericórdia de Lisboa.

Despesa Pública: é um dos elementos fundamentais da atividade financeira do Estado, ao lado


das receitas públicas, sendo um instrumento pública de redistribuição da riqueza. Despesa
pública não é um sinónimo de perda, sendo atualmente esta que permite uma certa
solidariedade social e que desempenha um papel estabilizador económico. Existem, no entanto,
problemas: importantes e constantes défices orçamentais (diferença entre a despesa excessiva
de um determinado ano económico em relação às receitas existentes) que levam ao recurso ao
crédito público/endividamento; e a tendência imparável do aumento da quantia global das
receitas dos entes públicos, que se traduz num aumento da dívida pública, privatizações e
pressão fiscal. A despesa pública poderá definir-se como a aplicação, mediante os mecanismos
juridicamente estabelecidos, dos créditos previamente aprovados no orçamento
correspondente para assim fazer frente às obrigações de conteúdo económico do ente público
de que se trate. A despesa pública corresponde ao conjunto de consumos, transferências e
investimentos, promovidos com a utilização de meios económicos monetários por parte do
Estado.

Consumos do Estado: consistem nas despesas correntes do designado consumo público


(despesas de pessoal mais despesas de aquisição de bens e serviços correntes), juntando a este
agregado os encargos correntes da dívida pública, que são normalmente objeto de tratamento
separado pela sua variabilidade e para permitirem uma mais fácil contabilização dos saldos
primários (consumos= despesas correntes – transferências correntes). Os consumos diminuem
o ativo líquido do Estado, sem terem a capacidade para gerar nova riqueza, por via de
redistribuição ou do investimento. O consumo alimenta o Estado, suportando a sua existência,
apensar de não corresponder a despesa reprodutiva.

Transferências: são uma componente da despesa pública, correspondente a prestações


unilaterais do Estado dirigidas a outro ente económico, público ou privado, sem que se verifique
qualquer contraprestação por parte deste último. As transferências poderão ocorrer para o
setor público (administrações públicas), setor privado (administrações privadas e feitas às
famílias) ou ainda para o exterior (correspondem a contribuições para a União Europeia ou
transferências para países terceiros ou organizações internacionais). As transferências
abrangem ainda os subsídios para o Setor Empresarial de Capital Público para compensar défices
de exploração. O âmbito das transferências engloba tanto as transferências correntes (visam

10
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

financiamento das despesas de consumo da entidade recebedora) como as transferências de


capital (visam financiamento de despesas de capital da entidade- estas também poderão ser
despesas de investimento).

Investimentos: englobam, enquanto componente de despesa pública, todas as despesas de


capital, isto é, todo o conjunto de despesas com efeitos na formação de capital fixo, que
perduram no tempo, estendendo os seus efeitos para além do período orçamental a que dizem
respeito. Os investimentos diminuem o ativo líquido do Estado, mas geram contrapartidas em
termos de acréscimo de bens duradouros. O Estado pode fazer mais e melhor com a despesa
pública em matéria de investimentos que com a despesa privada, contudo, a ação do Estado
deve ser limitada para que não derrube a ação dos privados.

A despesa pública restringe-se ao universo de gastos contabilizáveis, isto é, a soma de meios


económicos monetários empregue por entes públicos, tendo em conta a satisfação de
necessidades públicas, ficando, portanto de fora do controlo orçamental todos os gastos não
contabilizáveis- gastos ocultos- que escapam à aplicação do principio de plenitude orçamental
(assim como as operações de tesouraria, festão patrimonial do Estado e fenómenos de plenitude
orçamental, só que nestes casos à possibilidade de escrutínio por parte da AR, por constarem
obrigatoriamente dos elementos informativos que o Governo deve apresentar juntamento com
a proposta do Orçamento) e ao controlo da AR e do Tribunal de Contas. Apesar desses gastos
ocultos não se traduzirem um dispêndio de massas patrimoniais, inquinam a transparência e
não permitem o controlo de possíveis abusos.

O artigo 2º da Lei de Enquadramento Orçamental apresenta-nos que no conceito de despesa


pública deve ser incluído apenas o gasto operado por todos os organismos da Administração
Pública que estejam sujeitos ao regime de autonomia administrativa e ao regime de autonomia
financeira e administrativa, e os gastos operados pela Segurança Social, seja o gasto feito no
exercício dos poderes de autoridade ou não. Para além da despesa pública previamente
aprovada no Orçamento de Estado (serviços integrados, fundos e serviços autónomos e
Segurança Social), temos ainda a despesa pública dos orçamentos regionais (despesa das RA e
dos seus serviços e fundos autónomos) e nos orçamentos locais (despesa AL, suas associações
ou federações e seus serviços, bem como das áreas metropolitanas).

Estrutura e Dimensão do Setor Público Português

Setor Público: conjunto de entidades que exercem atividade financeira. Este subdivide-se em
Setor Público Administrativo (atuação financeira do Estado, através de órgãos da administração
pública, sem fins lucrativos) e Setor Empresarial do Estado (atuação do Estado por entidades
com a forma jurídica de empresas, cuja ação é motivada por critérios económicos). Só o primeiro
nível do Setor Administrativo é que é regulado pelo Orçamento de Estado (Estado e outras
entidades públicas dependentes do Estado), beneficiando o 2º nível e o Setor Empresarial do
Estado de independência orçamental, o que significa uma separação jurídica do orçamento
dessas entidades do Orçamento de Estado; existência de processos próprios de elaboração e
aprovação do Orçamento; administração financeira próprias e formas próprias de execução e
controlo, perceção de receitas e realização de despesas; existência de formas de
responsabilidade próprias.

Distinção entre o Setor Público Administrativo e o Setor Empresarial do Estado:

 A nível interno, até à revisão da LEO em 2011, o perímetro orçamental era definido
unicamente do ponto de vista jurídico-institucional, e, portanto, partia-se do

11
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

pressuposto de que a qualificação jurídica empresarial correspondia sempre ao


exercício da atividade económica mercantil/empresarial. Em 2011, a LEO consagrou no
artigo 2º/5 (em 2015 2º/4) que o Orçamento passava a integrar as entidades que
tenham sido incluídas em cada subsetor no âmbito do SEC, o que minimiza a disparidade
entre as regras de contabilidade pública e contabilidade nacional. Hoje, a distinção entre
SPA e SEE depende da qualificação jurídico-institucional, mas está sempre sujeita a
correção de acordo com a verificação do duplo critério económico da SEC 95, mantendo-
se o primeiro critério (jurídico-institucional) apenas até quando o segundo não o
contradizer (SEC 95).
 Para efeitos de reporte do défice à União Europeia: o recorte do setor administrativo é
conseguido através de 3 níveis: (1) apurar se a entidade é uma unidade institucional; (2)
averiguar se a entidade é uma unidade institucional pública; (3) determinar se é uma
unidade pública não mercantil. No caso se os níveis se verificarem estaremos presentes
do setor administrativo público. O caráter mercantil ou não mercantil advém da
aplicação do critério do preço economicamente vantajoso e o critério dos 50%. →
Qualificação jurídica de empresa não se fazia por vezes acompanhar de
empresarialidade, sendo de facto uma atividade administrativa do Estado.

Setor Público Administrativo

a. Serviços Integrados: são aqueles serviços do Estado que não disponham de autonomia
administrativa e financeira, tendo autonomia administrativa. Estes poderão ter ou não
ter personalidade jurídica. Os serviços integrados deverão sem identificados pela
ausência de uma lei ou decreto-lei que expressamente diga que estão sujeitos a um
regime diverso do regime regra (autonomia administrativa- atribuição de competência
aos dirigentes dos serviços e organismos da Administração para a prática de atos
administrativos definitivos e executórios apenas para a gestão corrente e para a
realização das respetivas despesas e ordenação do seu pagamento): autonomia
administrativa e financeira. Estão sujeitos aos poderes de direção, supervisão e inspeção
dos membros de Governo, como forma de garantir que a competência dos dirigentes
destes serviços se restringe aos atos de gestão corrente e para garantir a tomada de
decisões respeitantes a atos que não são gestão corrente fica para órgãos superiores.
Não dispõem de orçamento próprio, sendo o seu orçamento integrado no Orçamento
de Estado. Para efetuar as suas despesas, efetuam levantamentos mensais junto da
Direção-Geral do Tesouro. Não podem contrair empréstimos.
b. Serviços e Fundos Autónomos: não são serviços e fundos autónomos os serviços e
organismos da Administração que tenham natureza e forma de empresa (quer afastar-
se a atividade mercantil da atividade administrativa, sendo só esta última que integra o
OE), fundação ou associação pública, apenas podendo ser aqueles organismos que
tenham autonomia administrativa e financeira. Existem 3 formas de obtenção do regime
de autonomia administrativa e financeira: (1) nos termos da Lei de Bases da
Contabilidade Pública, expressando esta os seguintes pressupostos: os serviços e
organismos carecem deste regime para adequada gestão, têm receitas próprias que
cobrem pelo menos 2/3 das despesas, e cumprindo os anteriores requisitos têm uma lei
ou decreto-lei que reconhece autonomia financeira e administrativa; (2) por imperativo
constitucional- Universidades; (3) por imperativo legal excecional- possibilidade de
atribuição de autonomia financeira e administrativa em função de ponderosas razões
expressamente reconhecidas por lei ou decreto-lei e a Lei Quadro dos Institutos
Públicos, em que se reconhece a possibilidade de mais organismos beneficiarem de

12
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

autonomia administrativa e financeira independentemente de cumpridos os requisitos


da Lei de Bases da Contabilidade Pública. A autonomia administrativa e financeira
consubstancia-se na competência dos seus dirigentes realizarem despesas e ordenaram
o seu pagamento mesmo que fora dos atos de gestão corrente, estando sujeitos ainda
ao controlo das entidades que supervisionam a sua atividade. Esta autonomia traduz-se
na existência de orçamento privativo (por disporem de receitas próprias e de
administração e contabilidade privativas) que integra o orçamento de Estado. A
existência de orçamentos privativos não permitem que os organismos os executem
como quiserem, estando essa execução submetida a regras (Ex. primeiro utilizam as
receitas próprias e só depois as transferências do OE) e estando controlada pelo
Ministério das Finanças e, em última instância, pelo Tribunal de Contas. Podem recorrer
ao crédito com autorização do Ministro das Finanças e dispõem de património próprio.
Apesar da imposição do artigo 9º LBCP, existem organismos que gozam deste regime e
não têm personalidade jurídica. Quando cessa o regime de autonomia financeira e
administrativa? Quando ocorre a não verificação dos requisitos do 6º/1 LBCP durante
dois anos consecutivos, sendo essa cessação do regime constatada por meio de portaria.
c. Segurança Social: o artigo 105º CRP apresenta a necessidade se sujeição das suas
receitas e despesas ao princípio de autorização parlamentar, embora, note-se essa
sujeição não seja plena, visto que o orçamento da segurança social conserva autonomia
face ao OE e os decretos-leis que que procedem aos desenvolvimentos orçamentais são
distintos do OE. A Segurança Social pode ter de suportar cortes nos montantes a
transferir para si, visto que está obrigada a contribuir para o cumprimento do princípio
da estabilidade orçamental e, estando vinculada ao dever de solidariedade recíproca,
deve contribuir para uma situação em que o saldo global de todo o SPA seja nulo ou
excedentário. A gestão do Orçamento da Segurança Social obriga a uma projeção a
longo prazo da situação orçamental de que dispõe. O artigo 63º CRP reconhece o direito
à segurança social, apesenta as funções do Estado neste domínio e apresenta os
princípios fundamentais nesta matéria.
I. Princípios fundamentais sobre a Segurança Social: (1) Principio da
universalidade, isto é, todas as pessoas podem aceder à Segurança Social; (2)
Primado do setor público na gestão financeira: o Estado é o destinatário da
norma consagradora de um direito à segurança social, uma vez que é a ele que
compete organizar, coordenar e subsidiar um sistema que sirva esses fins; (3)
Principio da unidade (63º/2): a segurança social deve atuar de forma articulada
com o objetivo de o seu funcionamento ser harmonizado e os seus sistemas,
subsistemas e regime se complementem, sobrepondo-se apenas no mínimo; (4)
Principio da descentralização (63º/2): segurança social deve dispor de
autonomia em relação à administração centrar; (5) Principio da participação
(63º/2): nas suas tarefas relativas à SS o Estado deve fazer intervir associações
sindicais, organizações representativas dos trabalhadores e associações
representativas dos demais beneficiários; (6) Principio da acessibilidade
económica da Segurança Social: é uma derivação do principio da universalidade,
sendo só o Estado, com o seu património, que é capaz de suportar os custos de
um tal sistema e de o oferecer a todos de forma suportável; (7) Principio da
generalidade da cobertura de riscos (63º/3): a Segurança Social cobre os riscos
da doença, velhice, invalidez, viuvez, orfandade, desemprego e outras situações
de falta ou diminuição de meios de subsistência ou de capacidade para o
trabalho, independentemente de se ser trabalhador ou não. A enumeração

13
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

constitucional é meramente exemplificativa; (8) Pluralidade institucional


(63º/5): o Estado é coadjuvado, nas suas funções de SS, devendo promover a
existência de instituições particulares de solidariedade social. Como o Estado
não tem capacidade financeira para prover todas as necessidades, necessita da
colaboração com outras entidades privadas; (9) Equidade inter-geracional: as
decisões da SS dificilmente se compaginam com uma ótica anual, uma vez que
têm um horizonte temporal alargado, plurianual e necessariamente inter-
geracional. Deve, portanto, evitar-se uma oneração excessiva de uma geração
em favor de outra, de forma a que os recursos não sejam gastos de uma vez
pela geração presente, ficando a futura sem acesso ou com acesso reduzido à
SS. Deverá então repartir-se equitativamente os encargos e ganhos com a SS
pelas diferentes gerações.
II. Atividade financeira da SS: o Estado, no âmbito da SS, vai desenvolver uma
atividade financeira que se carateriza pela obtenção de receitas, gestão de
recursos e realização de despesas, tendo em vista a cobertura obrigatória e
universal das carências sociais por prestações compensatórias. A Lei de Bases
da Segurança Social (LBSS) apresenta 3 sistemas de proteção, aos quais
corresponde certa fonte de financiamento: a) sistema de proteção social de
cidadania, financiado por receitas gerais da SS; b) sistema previdencial,
financiado pelas receitas das contribuições das entidades patronais e
trabalhadores; c) sistema complementar, financiado pelas receitas obtidas por
via do pagamento de quotizações, apostando num sistema de capitalização
dessa receita, de adesão facultativa.
i. Sistema de Proteção Social de Cidadania: tem por objetivos a garantia
dos direitos básicos dos cidadãos e a igualdade de oportunidades,
promoção do bem estar e coesão social. O artigo 26º/2 LBSS apresenta
a competência desse sistema para efetivar esses objetivos. Engloba 3
subsetores: a) de ação social: abrange as pessoas mais vulneráveis, sem
ser necessária a prévia contribuição (29º/2 LBSS), cabendo ao Estado,
sobretudo, prestações em espécie, acesso à rede nacional de serviços e
equipamentos sociais e programas de combate à pobreza. Vale aqui o
princípio da subsidiariedade, dando-se preferência a instituições
privadas, famílias e comunidades na atuação. Este subsistema é
financiado por transferências do OE e por consignação de receitas ficais
e por verbas consignadas por lei para tal efeito, visto que esse não se
autofinancia; b) de solidariedade: abrange todos os cidadãos, podendo
por lei ser estendido a não nacionais, cabendo ao Estado prover em caso
de falta ou insuficiência de recursos económicos dos indivíduos, para a
satisfação das suas necessidades essenciais. As prestações deste
subsistema não são em princípio cumuláveis com as prestações a
auferir no âmbito do sistema previdencial. Este não se autofinancia,
pois, o direito às prestações não tem como pressuposto a obrigação
legal de contribuir, sendo financiada por transferências do OE e por
receitas fiscais consignadas; c) de proteção familiar: abrange todas as
pessoas com residência em Portugal, tendo em vista a compensação de
encargos familiares acrescidos, quando ocorram as eventualidades
legalmente previstas. Não se autofinancia, sendo financiado pelas
transferências do OE e receitas fiscais consignadas.

14
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

ii. Sistema Previdencial: abrange todos os trabalhadores por conta de


outrem ou legalmente equiparados e trabalhadores independentes e
tem em vista a garantia de prestações substitutivas de rendimento de
trabalho, perdido em consequência da verificação das circunstâncias
legalmente previstas. O direito à prestação tem como pressuposto a
inscrição dos trabalhadores na SS e o cumprimento das obrigações
contributivas. Este sistema é financiado por quotizações dos
trabalhadores e por contribuições das entidades empregadoras.
iii. Sistema Complementar: visa complementar o subsistema previdencial,
nas partes do rendimento que este não cobre ou nos casos que este não
prevê. O referido complemento tem de ser oferecido pelo Estado,
tendo em vista o reforço da proteção social dos beneficiários. Este
benefício pode ainda ser fruto da iniciativa coletiva ou de iniciativa
individual. Este sistema é garantido pela capitalização dos montantes
nele investidos.
d. Autarquias Locais: o artigo 238º CRP apresenta um imperativo constitucional de
independência financeira, isto é, a possibilidade de aprovar e elaborar o seu orçamento,
plano e outros documentos previsionais e de prestação de contas, arrecadam e dispõem
de receitas atribuídas por lei e geram o seu próprio património. Gozam de
independência orçamental, isto é, têm o seu próprio regime de enquadramento
orçamental, mas estão sujeitas a uma tutela inspetiva de legalidade, estão vinculadas
aos mesmos princípios orçamentais aplicáveis ao Orçamento de Estado e também
contribuem para os objetivos e metas orçamentais traçadas no âmbito das políticas de
convergência a que Portugal está obrigado perante a União Europeia (ex. podem ver
fixados na Lei OE limites máximos de endividamento e em caso de violação desses verem
reduzidas as transferências devidas em anos subsequentes). Na sua atividade de
previsão e gestão de receitas e despesas, regem-se pelo Regime Financeiro das
Autarquias Locais e das entidades intermunicipais e pelo Plano Oficial de Contabilidade
das Autarquias Locais. As suas receitas próprias, não cobrem, no entanto, a totalidade
das suas receitas- federalismo financeiro imperfeito. A autonomia financeira impõe:
direito a recursos próprios adequados para prosseguir as suas atribuições, devendo o
Estado dotá-las de recursos suficientes para a prossecução das atribuições que lhes
remete e para a manutenção do estatuto de autonomia, reconhecido
constitucionalmente; relações financeiras entre o Estado e AL obedecem aos princípios
da solidariedade e igualdade ativa (238º/2 CRP); AL devem ter recursos financeiros
provenientes de rendimentos e impostos locais; gozam de receitas próprias que incluem
obrigatoriamente receitas provenientes da gestão do seu património e receitas
provenientes da utilização dos seus serviços (238º/3); podem dispor de poderes
tributários, nos termos da lei (238º/4); municípios participam em receitas provenientes
de impostos diretos (254º/1 CRP) e de receitas tributárias nos termos da lei (254º/2
CRP). A definição da autonomia financeira é reserva relativa da AR (165º alínea q) CRP)-
RFAL.
e. Regiões Autónomas: gozam, por imperativo constitucional, de autonomia financeira,
consubstanciando-se em autonomia patrimonial, independência orçamental e
autonomia de tesouraria.
I. Autonomia Patrimonial: corresponde à possibilidade de disposição de bens
próprios e à disposição dos bens que o integram, sem sujeição a qualquer poder
de superintendência ou de tutela do Estado (227º/1 alínea h) CRP).

15
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

II. Independência Orçamental: inclui o poder de aprovar um plano de


desenvolvimento económico e social próprio, o seu orçamento e a sua conta
regional (227º/1 alínea p) CRP). É a associação de ideias de independência
orçamental e de autonomia político-legislativa que conduzirá ao
reconhecimento às RA de um volume maior de receitas comparativamente com
as AL e uma maior participação quanto às receitas que auferem. É reconhecido
às RA um verdadeiro poder tributário. Têm o seu próprio regime de
enquadramento orçamental, devido à sua independência orçamental. Note-se
que estão na mesma sujeitas aos mesmos princípios orçamentais aplicáveis ao
Orçamento de Estado e ao dever de assegurar, em conjunto com o Estado, AL e
todas as instituições dentro do perímetro das administrações públicas, a
estabilidade orçamental.
III. Autonomia de Tesouraria: é com base nestas que as RA arrecadam e dispõem
de receitas atribuídas por lei (227º/1 alíneas i), j) e r) CRP). Têm poder tributário
próprio e podem adaptar o sistema fiscal nacional às especificidades regionais.
Dispõem de receitas fiscais nelas cobradas ou geradas e dispõem de uma
participação das receitas tributárias do Estado.
IV. Concretização da autonomia financeira e definição dos seus termos: a
definição das relações financeiras entre o Estado e RA é reserva absoluta da
competência da AR (164º alínea t) CRP), incluindo a definição da solidariedade
nacional, daquilo que caberá às RA no que toca a participação nas receitas do
Estado, forma concreta do exercício do poder tributário próprio e do poder de
adaptação do sistema fiscal nacional às especificidades regionais, forma de
calculo das transferências orçamentais, definição da possibilidade de prestação
de garantias pessoais aos empréstimos contraídos pelas RA e os limites
máximos aos empréstimos e as sanções a cumprir no seu incumprimento. É Lei
de Finanças de RA e a LEO que regulam estas relações financeiras, sendo
necessárias leis orgânicas para alterar estas leis (166º/2, aplicável à alínea t) do
164º CRP).
V. Solidariedade Nacional (225º/2 e 229º CRP): este principio obriga o Estado a
assegurar um nível adequado de serviços públicos e atividades privadas, fazer
transferências para as RA dotando-as de meios necessários para a prossecução
dos seus fins, promover a eliminação de desigualdades, resultantes da sua
situação de insularidade ou ultraperiférica em relação ao restante território,
conceder apoios extraordinários em situações imprevistas, repor a situação
anterior à prática de danos ambientais por ele causados nas RA, comparticipar
em incentivos ao setor produtivo das regiões e financiar projetos de interesse
comum. Por outro lado, o princípio obriga as RA a contribuírem para o
equilibrado desenvolvimento do país, para o cumprimento dos objetivos
orçamentais, promoverem uma situação de estabilidade orçamental e
contribuírem para o cumprimento de objetivos de política económica a que o
Estado esteja vinculado por força de tratados ou acordos internacionais. Assim,
a autonomia financeira não é ilimitada, pois as RA estão obrigadas a coordenar
as suas finanças com as do Estado, estando sujeitas a controlos administrativo,
político e jurisdicional. A situação orçamental das RA é seguida de perto pelo
Conselho de Acompanhamento das Políticas Financeiras que funciona junto do
Ministério das Finanças, vigiando as políticas orçamentais regionais, suas
necessidades de financiamento e seu nível de endividamento. Se detetar

16
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

alguma irregularidade financeira e orçamental, deve informar a AR ou AL


Regional.

Setor Empresarial do Estado

O seu regime é definido no decreto-lei nº 133/2013 e é composto pelo conjunto das empresas
públicas e empresas participadas. Nas empresas públicas, o Estado ou outra entidade pública
estadual ou detém maioria do seu capital social ou dos direitos de voto ou tem o direito de
designar ou de destituir a maioria dos membros dos seus órgãos de administração ou de
fiscalização ou dispõem de participações qualificadas ou direitos especiais que lhe permitam
influenciar de forma determinante os processos decisórios ou opção estratégicas da empresa.
As empresas participadas são aquelas que têm uma participação permanente do Estado ou de
quaisquer entidades públicas estaduais, desde que nessas o Estado não exerça influencia
dominante. Entre as empresas públicas distinguem-se as sociedades constituídas nos termos da
lei comercial e as entidades públicas empresariais (não revestem a forma de sociedade, sendo
produto de criação governamental e estão sujeitas a tutela económica e financeira do Ministro
das Finanças).

➢ Independência Orçamental: justifica-se para apartar a contabilidade complexa das


mesmas do processo orçamental e por outro para permitir que a atividade empresarial
se possa reger pelas regras privadas do mercado. Isto não significa que haja total
indiferença perante a situação orçamental nacional, visto que as empresas carecem de
autorização para a sua constituição e estão sujeitas a um controlo permanente do
Governo (controlo direito do Ministro das Finanças). Como o critério relevante para a
integração no setor administrações públicas é económico, a situação económica de
algumas empresas públicas tenha reflexo no apuramento de défice excessivos.
Portanto, aplicando-se os critérios da SEC 95, certas empresas independentemente da
sua forma jurídica, integram o setor administrações públicas. Ora, em relação a essas há
o dever de respeitar o princípio da estabilidade orçamental. Como as empresas que
integram o SEP têm capacidade para contrair dívidas, o legislador teve de tomar
medidas e especiais cuidados no que toma à autorização de dívida, pois não esquecer
que certas empresas vão contabilizar para apuramento de défice excessivo (29º do
Regime Jurídico do Setor Público Empresarial- extensão das regras limite ao
endividamento das demais entidades que gozam de independência orçamental).
➢ Setor Empresarial Local: está definido nas Leis nº 50/2012 e 133/2013, sendo composto
pelo conjunto das sociedades comerciais participadas pelos municípios, pelas
associações de municípios e pelas áreas metropolitanas- serviços municipalizados,
empresas locais e participadas. As empresas locais têm por objeto exclusivo a
exploração de atividades de interesse geral ou a promoção de desenvolvimento local e
regional, não podendo ser constituídas empresas para a prossecução de atividades de
natureza exclusivamente administrativa ou intuito exclusivamente mercantil, tendo
ainda de prosseguir atividades que se encontram nas atribuições as entidades locais.
Certos serviços podem ser empresariados, tendo orçamento próprio, mas os totais das
suas receitas e despesas são inscritos nos orçamentos municipais correspondentes. As
suas perdas e ganhos são imputados aos orçamentos municipais. As empresas locais
podem contrair dívida, assim como os serviços municipalizados, mas estes obedecem às
regras legais aplicáveis aos municípios. O endividamento deve estar previsto no
orçamento da respetiva empresa, sendo aprovado anualmente esse orçamento pela
Assembleia geral ou pelas Câmaras Municipais, Conselhos diretivos das associações de

17
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

municípios ou juntas metropolitanas. É bastante limitado e controlado o endividamento


do setor empresarial local, podendo o endividamento excessivo levar a que seja limitada
a capacidade de endividamento e a que seja imposta a suportação dos prejuízos do
mesmo, na proporção da participação do seu capital social. Poderá mesmo ocorrer uma
suspensão das transferências a efetuar por parte do Orçamento do Estado. A limitação
ao endividamento está também associada à necessidade de cumprir os critérios
relativos ao défice e endividamento públicos.
➢ Setores Empresariais das RA: compostos pelo conjunto das empresas públicas e as
empresas participadas regionais, distinguindo-se estas pelo critério da influência
dominante. Podemos distinguir entre as empresas públicas regionais as sociedades
constituídas nos termos da lei comercial e as entidades públicas empresariais regionais
(não revestem a forma de sociedade e são produto de criação da RA, pelas AL Regionais,
estando sujeitas a tutela económica e financeira (abrange o poder de aprovar os
orçamentos respetivos) do Ministro das Finanças e do setor de atividade da empresa
(Açores) e dos membros do governo regional responsáveis pelas finanças e pelo setor
de atividade de cada empresa (Madeira). A possibilidade de endividamento das
empresas deve estar previsto no orçamento da respetiva empresa, sendo este aprovado
pela Assembleia Geral (sociedades) ou pelos órgãos de tutela (EPER). Excecionalmente
a assunção de dívidas por parte das RA deverá ser submetida a uma autorização prévia,
antes se orçamentada: quando o endividamento ou assunção de responsabilidades de
natureza similar não estão previstos nem no orçamento nem no plano de investimentos
da empresa a que se refere.
➢ Reflexos orçamentais da relação do Estado com o setor empresarial do Estado: a íntima
relação que se estabelece entre estas e o Estado, pela participação no seu capital, faz
com que, tanto do ponto de vista das receitas como das despesas orçamentais,
encontremos sinais da atuação empresarial estadual. Existem despesas que se refletem
no OE no domínio das relações deste com o SEE: dotações de capital, tendo em vista a
cobertura de realizações do capital estatutário da empresa; subvenções do Estado às
empresas públicas; concessão de empréstimos; e assunção de passivos que corresponde
À tomada de dívidas de empresas do Estado. A assunção de passivos e responsabilidades
está em princípio excluída, mas tem vindo a ser admitida no contexto de planos
estratégicos de reestruturação e de saneamento financeiro ou no âmbito de processos
de liquidação. O Estado, para além disto, pode assumir ainda compromissos de
despesas, concedendo garantias a operações financeiras de empresas públicas,
passando o Estado a ser devedor subsidiário, isto é, apenas intervém no caso de a
empresa a quem concedeu a garantia entrar em incumprimento. As receitas geradas
pelo SEE com reflexos orçamentais são: dividendos pagos ao Estado; remuneração de
capital estatutário; recuperação de créditos; receitas resultantes as privatizações e
reprivatizações, devendo as receitas desta última ser exclusivamente utilizadas para
amortização da dívida pública, amortização da dívida do SEE, serviço da dívida resultante
de nacionalizações e novas aplicações de capital no setor produtivo ( 293º/1 alínea b)
CRP). Se forem reprivatizações dos setores empresariais das RA, as suas receitas vão ser
aplicadas exclusivamente na amortização da dívida pública regional e em novas
aplicações de capital no setor produtivo regional.

Política Orçamental e a União Europeia

A partir de 1999, com o início da terceira fase da União Económica Monetária, os países regem-
se por uma política monetária única, assente na existência de uma moeda única e na existência

18
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

de uma só taxa de câmbio. A estratégia europeia assenta numa “policy mix”, isto é, a articulação
entre a centralização da política monetária e a descentralização das políticas orçamentais de
cada um dos Estados-Membros. Assim, o sucesso da política monetária dependeria do rigor com
que os orçamentos dos Estados fossem elaborados e executados. As regras orçamentais existem
como forma de impedir que a inexistência de disciplina orçamental leve à pressão sobre os
preços o que implicaria um aumento da taxa de juro do BCE e consequentemente os países com
défice mais baixo enfrentariam um custo resultante do comportamento dos países com défice
mais elevados. Segundo o artigo 126º TFUE e o Protocolo 20 sobre o procedimento relativo aos
défices excessivos, deverá ser cumprida uma disciplina orçamental assente na não
ultrapassagem de um valor de referência no que toca à relação entre o défice orçamental e o
PIB (3%) e no que toca à relação entre a dívida pública e o PIB (60%).

Foi realizado em 1997 um Pacto de Estabilidade e Crescimento entre os Estados-Membros, a


Comissão e o Conselho em que: os Estados-Membros se comprometem a apresentar situações
próximas do equilíbrio ou excedentárias e em caso de défice excessivo a aplicar as medidas de
correção orçamental para resolver o problema no prazo máximo de 1 ano; a Comissão
comprometeu-se a apresentar ao Conselho relatórios, pareceres ou recomendações que
permitam a este tomar de imediato medidas, sempre que seja detetado um défice excessivo; e
o Conselho comprometeu-se a tomar decisões rápidas, promovendo que os Estados com défices
excessivos corrijam a sua situação orçamental rapidamente.

Entre 2008 e 2009 houve o agravamento da disparidade de défices orçamentais apresentados


pelos países da zona euro e o lançamento de programas nacionais de salvação à banca com vista
à estabilização do sistema financeiro, por determinação do Eurogrupo, levou a uma degradação
da situação de países que já se encontravam fragilizados (Irlanda, Grécia e Portugal): aumento
do défice orçamental > aumento taxas de juros > degradação da notação financeira.

Em 2010, com o que se passou na Grécia aprofundou-se a política de solidariedade, prestando-


se auxilio aos países mais endividados da zona euro por parte daqueles que estão em melhores
condições, sendo isto feito através do Fundo Europeu de Estabilização Financeira (FEEF),
constituído pela Alemanha, Áustria, Bélgica, Chipre, Malta, Portugal, Eslováquia, Eslovénia,
Espanha, Finlândia, França, Grécia, Holanda, Irlanda, Itália e Luxemburgo. Este mecanismo
complementa a supervisão que as instâncias comunitárias fazem sobre a situação orçamental
dos seus Estados-Membros. Desde 2011, que o Pacto foi desenvolvido.

Em 2012, houve um aprofundamento da coordenação orçamental que culmina na assinatura


em março do Pacto Orçamental, que vinculará os países da zona euro e todos os outros Estados-
Membros que o quiserem assinar. Neste vai acrescer ao limite máximo de défice orçamental, a
existência de um limite relativo ao défice estrutural: para os países com a dívida acima dos 60%,
para que o Orçamento esteja equilibrado, o saldo da despesa da dívida pública não pode
apresentar desvios de mais de 0,5% do PIB em relação ao objetivo orçamental de médio prazo;
para casos abaixo dos 60%, o limite pode ascender a 1% do PIB a preços de mercado, em relação
ao objetivo orçamental de médico prazo. Estes limites consubstanciam a regra de ouro
orçamental: conter o endividamento, evitando um endividamento estrutural que ponha em
causa a sustentabilidade orçamental. A violação dos limites passam a acionar um mecanismo de
correção automático e para afastar esse mecanismo ou a aplicação de sanções será necessário
uma maioria qualificada de Estados da zona euro.

A adoção de Programas de Estabilidade é um dos instrumentos de controlo da disciplina


orçamental, estabelecendo-se nestes um objetivo de médio prazo que proporcione uma base

19
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

para a sustentabilidade das finanças públicas que conduza à estabilidade dos preços,
crescimento sustentável forte e à criação de emprego. Estes programas estão sujeitos a
autorização prévia por parte do Conselho Europeu e da Comissão, no âmbito do semestre
europeu, criado para permitir uma coordenação mais estreita das políticas económicas e uma
convergência sustentada dos comportamentos das economias dos Estados Membros. Estes
programas apresentados pelos Estados-Membros servem para a monitorização por parte dos
órgãos comunitários, do cumprimento dos limites de défice e dívida previstos e para adotar
medidas. O acompanhamento da Comissão e do Conselho seve para identificar qualquer desvio
da situação orçamental em relação ao objetivo previsto. Caso seja detetado algum desvio
significativo, o Conselho deve dirigir uma advertência ao Estado e passado um mês o Conselho
analisa de novo a situação e se o desvio persistir ou se agravar, fará uma recomendação com
um prazo máximo de 3 ou 5 meses para a adoção de medidas corretivas. Se não forem tomadas
tais medidas, a Comissão pode recomendar ao Conselho que adote, por maioria qualificada,
uma decisão constatando que não foram tomadas medidas necessárias e ainda recomendar que
o Conselho recomende medidas a tomar. Se o Estado não tomar medida nenhuma poderá
sujeitar-se à constituição em depósito remunerado junto da Comissão de montante equivalente
a 0,2% do PIB do ano anterior.

Se um Estado-Membro ultrapassa os valores de referência de défice e de divida, o Conselho


poderá declarar a existência de um défice excessivo (acabando com o processo que envolve a
Comissão que averigua se o défice é excessivo, o Comité Económico e Financeiro, que dá o que
parecer, e o Estado que será informado pela Comissão do seu parecer de défice excessivo para
apresentar a sua defesa). O Estado sujeito a procedimento de dívida excessiva deverá promover
uma redução numa médica de 20% por ano. O Estado sujeito a procedimento de défice excessivo
deve estabelecer um programa orçamental económico, com descrição detalhada das reformas
estruturais a implementar para assegurar a correção efetiva e durável do seu défice, sendo esse
programa sujeito a aprovação do Conselho e Comissão. Na implementação de um processo por
declaração de défice excessivo, inicia-se uma primeira fase não publica, em que é transmitido
ao Estado um conjunto de recomendações para tomar medidas eficazes no prazo de 3 ou 6
meses para que no ano seguinte esteja o problema resolvido. O incumprimento desta primeira
fase, leva ao início da segunda que torna pública as recomendações do Conselho. A terceira fase
consiste na inercia do Estado após a 2º fase, podendo o Conselho notificar o Estado para tomar
medidas destinadas a reduzir o défice para um nível que considere adequado num prazo de 2
meses. A 4º fase pressupõe o incumprimento da 3º pelo Estado, podendo o Conselho no prazo
máximo de 4 meses a contar da notificação, tomar uma série de medidas quando ao
incumprimento (202). Em qualquer fase do processo, sempre que se entenda estar corrigido o
erro, o Conselho revogará as medias aplicadas, no prazo de 2 meses a contar da última
notificação ao Estado, tendo de fazê-lo publicamente quando a situação se tiver tornado pública
(2º fase). A existência de défice excessivo implica a distribuição de fundos, visto que ao Estado
que o apresentar o fundo de coesão não financia novos projetos nem novas fases de projetos
importantes.

Supervisão orçamental: o Regulamento da UE nº1176/2011 prevê um mecanismo de alerta de


deteção precoce de desequilíbrios, seja internos, seja externos, que permitem ao Conselho
dirigir ao Estado afetado recomendações ou então declarar a existência de desequilíbrio
excessivos, recomendando-lhe que tome medidas corretivas. O incumprimento dessas medidas
pode levar à constituição de um depósito não remunerado, e no caso de insuficiência das
medidas, quando já tinham sido adotadas duas recomendações nesse sentido pelo Conselho, a
sanção a aplicar pode mesmo ser o pagamento de uma multa.

20
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

SEC 95: para efeitos de controlo da situação orçamental, os Estados devem reportar de acordo
com o Sistema de Contas Nacionais e Regionais. Este instrumento é considerado fundamental
para efeitos da aplicação do Pacto de Estabilidade e Crescimento, visto que promove a
harmonização de conceitos e estatística para que todos possam fazer uso das suas informações;
fornece uma visão sobre os ativos e passivos de cada país e do respetivo valor patrimonial; revela
stocks de ativos e passivos e o seu património líquido. É com base na informação que ele
apresenta que as instituições comunitárias avaliam a execução orçamental dos Estados e
detetam os desvios significativos que possam vir a constituir violações às suas obrigações. O SEC
95 integra as receitas e as despesas em setores institucionais: Sociedades não financeiras;
Sociedades financeiras; Administração Públicas: famílias; Instituições sem fins lucrativos ao
serviço das familiar: resto do mundo que inclui as unidades institucionais não residentes que
efetuem transações com unidades institucionais. Quanto à distinção entre o setor público
administrativo e o setor empresarial, a distribuição das receitas e despesas segue um duplo
critério económico: critério dos preços economicamente vantajosos, que faz depender a
distinção dos preços serem ou não economicamente relevantes, e o critério dos 50%, que atenta
à cobertura dos custos de produção. Para efeitos do perímetro do setor administrações públicas,
serão consideradas todas as entidades não mercantis por meio das quais o Estado atue,
independentemente do Estatuto de independência orçamental reconhecido internamente a
certas delas, consistindo na Administração Central, Administração Estadual, Administração Local
e Segurança Social.

O Orçamento do Estado

O Orçamento é um instrumento financeiro, no qual se faz uma previsão de receitas e despesas,


podendo ser o Orçamento de Estado, Orçamentos Locais (238º/1 CRP- integra a atividade
financeira dos organismos centrais municipais e das freguesias e dos serviços autónomos da
administração local) e Orçamentos Regionais (227º/1 alínea p) CRP- integram a atividade
financeira dos departamentos regionais e dos serviços e fundos autónomos da Administração
Regional). Os orçamentos traduzem uma autorização política (AR, Assembleias Locais e
Regionais) para a efetivação de um determinado plano aprovado, encontrando-se neles uma
limitação aos poderes da Administração no que toca à cobrança de receita e realização de
despesa. Aos 3 significados do Orçamento- previsão, autorização e limitação- correspondem os
3 elementos orçamentais- económico, político e jurídico.

Princípios Orçamentais1:

 Anualidade (14º LEO): são votados anualmente e executados também no período de


um ano (ano civil). Este princípio impõe um registo de todas as receitas e despesas a
realizar efetivamente durante o ano em causa, independentemente do momento
juridicamente relevante em termos de origem (orçamento de gerência). É necessário
ter também em conta o horizonte plurianual, sendo necessário uma programação
orçamental plurianual.
 Plenitude Orçamental (9º LEO)
o Unidade: imposição de elaboração, execução e controlo de um único
instrumento previsional de receitas e despesas, de forma a evitar a existência
de receitas e despesas que escapem à autorização parlamentar, ao
conhecimento por parte da Administração para executar e ao controlo
orçamental.

1
Aplicam-se a todos os Orçamentos do setor público administrativo.

21
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

o Universalidade: obriga a que nenhuma receita ou despesa escape à disciplina


orçamental, nem mesmo aquelas que à partida não são contabilizáveis, mas em
que há compromissos assumidos ou bens colocados à disposição do Estado. Esta
regra não abrange nem operações de tesouraria nem as operações de gestão
patrimonial do Estado. A realidade orçamental apenas se refere a meios
monetários gastos pelo Estado.
 Discriminação Orçamental
o Não Compensação (15º LEO): obriga a que as receitas e despesas sejam inscritas
nos orçamentos de forma bruta, e não líquida, excluindo a dedução dos custos
e perdas nas receitas e os ganhos ou perdas que as despesas possam gerar. As
exceções a esta regra estão no artigo 15º/3 LEO.
o Não Consignação (16º LEO): obrigam a que os orçamentos promovam uma
gestão financeira em conjunto, ou seja, em princípio, todas as receitas devem
servir para cobrir todas as despesas previstas. Impede-se assim uma
administração fragmentada. Existem exceções previstas no artigo 16º/2 LEO).
o Especificação (17º LEO): os orçamentos devem individualizar as receitas e
despesas, existindo 3 classificações orçamentais: económica2- distingue as
despesas e receitas de capital ou correntes, consoante alterem ou não a
situação ativa ou passiva do património duradouro do Estado; orgânica3, isto é,
as despesas devem corresponder à unidade orgânica que as realiza de acordo
com a sua lei orgânica, o que permite avaliar o peso de cada unidade orgânica
na prossecução de políticas orçamentadas; e funcional4, ou seja, as despesas
devem ser agrupadas em torno das principais funções do Estado. Veja-se que o
orçamento das RA segue também este critério, mas não o das AL. Pode ainda
ocorrer a inscrição de despesas em programas orçamentais, isto é, as despesas
no OE são estruturadas por programas.
 Equidade Inter-geracional (13º LEO): obriga à ponderação de receitas e despesas tendo
em vita o encontro de equilíbrio entre o que se gasta no presente e os gastos que se
assumem para o futuro, de forma a que proveitos e custos tenham uma distribuição
equitativa. Não se pode, portanto, onerar excessivamente a geração presente nem a
geração futura, devendo existir uma cooperação entre as várias gerações.
 Equilíbrio Orçamental: o critério do ativo de tesouraria é feito no âmbito do OE e dos
Orçamentos Regionais. Nos Orçamentos Locais aplica-se o critério do ativo patrimonial
do Estado.
o Orçamento dos serviços integrados no OE: critério ativo de tesouraria, na
vertente de saldo primário, ou seja, receitas efetivas devem cobrir despesas
efetivas, com exclusão dos juros que podem ser pagos por receita não efetiva.
o Orçamento dos serviços e fundos autónomos no OE: critério do ativo de
tesouraria, na vertente de saldo global.
o Orçamento da Segurança Social no OE: critério do ativo da tesouraria, na
vertente saldo global.
o Orçamento RA: critério ativo de tesouraria, na vertente saldo global.

2 Para as receitas e despesas. Violação do critério económico consubstancia uma ilegalidade.


3 Só para as despesas. Violação do critério orgânico consubstancia uma inconstitucionalidade, por violação do artigo
105º/3 CRP.
4 Só para as despesas. Violação do critério funcional consubstancia uma inconstitucionalidade, por violação do artigo

105º/3 CRP.

22
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

o Orçamento AL: critério ativo patrimonial.


 Estabilidade Orçamental (10º LEO): impõe-se ao conjunto das entidades do setor
público administrativo, devendo estas apresentar uma situação de equilíbrio ou
excedente orçamental. Este princípio é inserido para cumprimento dos critérios de
convergência de forma a que o Conselho não declare uma situação de défice excessivo.
Associados a este princípio surgem os princípios da solidariedade recíproca (12º LEO) e
o princípio da transparência (19º LEO).
 Princípio da Sustentabilidade (11º LEO): o Estado obriga-se a assumir compromissos
com respeito pela regra do saldo orçamental estrutural (transposição das novas regras
do Pacto de Estabilidade- sempre que a dívida estiver a cima dos 60%, o saldo estrutural
da despesa das administrações públicas não pode apresentar desvios de mais de 0.5%
em relação ao objetivo orçamental de médio prazo fixado) e dos limites de dívida (limite
de 60% em relação ao PIB) impostos pela União (20º e 25º LEO).
 Princípio da economia, eficiência e eficácia (18º LEO)
 Publicidade: todos os orçamentos devem ser publicados como condição de eficácia da
autorização e do consentimento para a cobrança de receitas e realização de despesas.
Mais, é necessário a publicidade para a Administração conhecer o conteúdo dos
orçamentos. Os orçamentos do Estado e das RA são publicados no Diário da República,
devendo as AL garantir a publicidade também.

O Orçamento do Estado é uma referência para os demais orçamentos, até porque é nele que se
pretende coordenar as receitas e despesas do universo das entidades púbicas que, nos termos
da SEC 95, pertencem ao setor administrações públicas, independentemente da sua forma e
natureza (2º/4 LEO). Por outro lado, é através deste que se promove a coordenação da atividade
financeira do Estado e dos subsetores com independência orçamental.

Regime Comum Orçamental: a proposta de lei OE é apresentada pelo Governo até 15 de


outubro de cada ano, sendo exclusiva a iniciativa do Governo. O projeto é discutido na AR
durante 45 dias após a apresentação da proposta, podendo a AR aprová-lo, aprová-lo com
alterações (emenda parlamentar- o OE é fruto da colaboração dos dois órgãos- podendo a AR
alterar a proposta do Governo5) ou rejeitá-lo. Estas características aplicam-se também aos
orçamentos das RA e orçamentos das AL. A Lei de OE é composta por duas partes: articulado e
mapas orçamentais- são a expressão do imperativo de especificação orçamental (40º LEO).

Prorrogação do Orçamento: no artigo 58º LEO prevê-se que o OE mantém-se em vigor para
além do ano económico, prolongando-se para o ano posterior, pretendendo-se evitar
perturbações no normal funcionamento do Estado que ficaria imobilizado à espera de novo
orçamento.

Execução Orçamental: o poder de execução orçamental compete ao órgão executivo (Governo,


Governo Regional, Junta de Freguesia e Câmara Municipal). Quanto ao OE é aprovado
anualmente um decreto-lei de execução orçamental (53º LEO). O Governo Regional deve
aprovar decretos regulamentares contendo disposições necessárias à execução do respetivo
instrumento previsional. Veja-se que os órgão deliberativos devem aprovar os orçamentos em
termos suficientemente discriminados, para que não se gere confusão entre os poderes de

5 Com limites: devem ser respeitados os vínculos a que a lei OE está sujeita, como a LEO, Lei das Grandes Opções e as
leis e contratos que impõem obrigações ao Estado, e os princípios constitucionalmente impostos e os instrumentos
plurianuais a que está subordinada (ex. programa de estabilidade e crescimento); a AR não pode proceder a
alterações que não se inscrevam no âmbito da proposta do Governo.

23
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

aprovação e de execução. Por outro lado, receitas e despesas aprovadas, apenas pelo executivo
são inválidas, podendo gerar responsabilidade civil, disciplinar, criminal e financeira.

Princípios comuns de execução orçamental: a) tipicidade qualitativa das receitas (o Orçamento


só condiciona as receitas quanto à espécie e não quanto ao montante); b) tipicidade quantitativa
das despesas (Orçamento condiciona as receitas quanto à espécie e ao montante- cabimento
orçamental- é fixado um teto); c) execução por duodécimos- imperativo da boa gestão e da
necessidade de dosear os recursos de forma a que não sejam gastos na totalidade antes do fim
do ano; d) gestão flexível (alterações orçamentais e consagração da possibilidade de existência
de um período orçamental complementar); e) segregação das funções (obriga a que quem
ordena a liquidação das receitas não faça a sua cobrança e quem ordena as despesas não seja o
pagador- 52º/6 LEO); f) boa execução financeira (respeito pelos princípios da economia,
eficiência e eficácia das despesas e o dever de inexistência de mora nos pagamentos do Estado).

Princípio da legalidade da despesa pública: traduz-se na exigência de que todo o facto gerador
de despesa deve respeitar as normas legais aplicáveis. Inicialmente este princípio estava
associado à verificação do cumprimento da tipicidade qualitativa e quantitativa a que as
despesas estão sujeitas, mas hoje este princípio estende-se determinando que a Administração
pode realizar as despesas previstas na lei OE e ainda a despesa que derivar dos contratos
públicos, desde que celebrados nos termos da lei (sustentado no Acórdão Tribunal de Contas
nº142/94). Em suma, o respeito do princípio da legalidade verifica-se se ocorrer um
cumprimento da legalidade genérica, das normas legais aplicáveis ao caso (legalidade
financeira), do cabimento orçamental (legalidade orçamental), do respeito das regras de
contabilidade e da verificação da economia, eficiência e eficácia.

Dispositivo Travão (167º/2 CRP): a restrição à iniciativa sobre propostas de alteração ao


orçamento justifica-se por o Governo ter iniciativa exclusiva em matéria orçamental, tanto no
momento da sua elaboração quanto no momento da sua alteração, e por o Parlamento não
dever intervir na execução que é levada a cabo pelo Governo, na medida em que a alteração das
receitas e despesas colocaria em causa o trabalho de execução deste. O TC tem considerado que
o aumento da despesa ou redução da receita operada pela AR é parcialmente inconstitucional,
na medida em que as medidas são inconstitucionais apenas durante o ano económico em curso.
Este dispositivo é comum aos orçamentos das RA e das AL.

Controlo Orçamental

 Apresentação de Contas
o Contas provisórias publicadas 45 dias após o final de cada trimestre decorrido
de execução orçamental.
o Conta Geral do Estado: é um registo sintético da execução orçamental,
indicando as receitas e despesas efetivamente efetuadas; da situação de
tesouraria, apresentando as cobranças e pagamentos orçamentais, as
reposições abatidas nos pagamentos e os movimentos e saldos das contas e nas
caixas de Tesouraria do Estado; situação patrimonial, dando a conhecer a
aplicação do produto de empréstimos e o movimento da dívida pública; e dos
fluxos financeiros dos serviços integrados do Estado de um dado ano
económico. Este registo é elaborado pelo Governo (Direção de Serviços da
Conta), no fina do ano económico e posteriormente enviado à Assembleia para
posterior emissão de resolução de aprovação ou rejeição (166º/5 CRP). O
âmbito subjetivo da Conta é mais amplo que o do Orçamento de Estado,

24
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

apresentando também situações de tesouraria, situação patrimonial e fluxos


financeiros do Estado. Veja-se o processo da aprovação da Conta Geral do
Estado: (I) prestação de contas; (II) elaboração da conta pelo Governo e sua
apresentação à AR; (III) remissão da conta para o tribunal de contas para que
esse proceda à elaboração de parecer; (IV) AR elabora e aprova a resolução de
aprovação ou rejeição da conta; (V) Governo publica a Conta Geral do Estado.
o Contas Regionais e Locais: a conta regional é apresentada à Assembleia
Legislativa Regional respetiva e em relação a esta o Tribunal de Contas deverá
emitir um parecer. As contas locais (anuais e trimestrais) devem ser remetidas
à Direção Geral do Orçamento. A conta anual deve ser apreciada pelo órgão
deliberativo e pelo Tribunal de Contas.
 Controlo Orçamental: todos os orçamentos do setor público administrativo encontram-
se sujeitos a uma tripla fiscalização: administrativa, política e jurisdicional. O controlo
poderá ser interno ou externo, sendo o primeiro feito pelo serviços administrativos
(Sistema de Controlo Interno6, composto por 3 níveis de controlo: operacional, setorial
e estratégico- DL nº166/98- controlo este exercido pelo método de auditoria, avaliando
a legalidade e o mérito) e pelo Conselho das Finanças Públicas (entidade administrativa
independente, podendo ir para além de execução do OE, podendo ter uma visão critica
de conjunto do fenómeno financeiro público. Acompanha a execução do OE, OR, OL e
OEE, permitindo perceber o esforço de coordenação entre estes subsetores operado
pelo Governo e qual a dinâmica da dívida pública como ela se vai ajustado com a
evolução dos compromissos assumidos pelo Estado e pelos subsetores), e o segundo
feito pela AR (Assembleias Legislativas das RA e as Assembleias Municipais ou de
Freguesia), Tribunal de Contas e pelo Tribunal e Contas Europeu. O controlo externo, ao
contrário do interno, é público e sujeito a publicidade por servir os interesses dos
cidadãos contribuintes.
o A AR exerce um controlo tríplice no que toca ao OE: a) controlo prévio, visto que
vota o OE (podendo alterar a proposta ou recusá-la), sendo que quanto mais
efetivo for o direito de emenda, mais terá efeito o controlo político prévio; b)
controlo durante a execução orçamental, apreciando as contas provisórias; c)
controlo posterior através da apreciação anual da Conta Geral do Estado. Neste
último controlo, a AR é assistida tecnicamente pelo TC, dendo este que dar um
parecer sobre a Conta Geral do Estado para esta poder apreciá-la de forma
esclarecida. No exercício do controlo concomitante e posterior a AR pode
acionar mecanismos de responsabilização política, como a realização de
inquéritos parlamentares e a demissão do Governo, através de uma moção de
censura. A AR pode sempre remeter o parecer do TC ou quaisquer outros
documentos de que disponha para as entidades competentes no sentido de se
efetivarem eventuais responsabilidades criminal, disciplinar, civil e financeira.
o O controlo jurisdicional é realizado pelo Tribunal de Contas, sendo este órgão
que audita e fiscaliza a legalidade e regularidade de receitas e despesas
públicas. O Tribunal tem competências para exercer um controlo prévio,

6 O Conselho Coordenador do Sistema de Controlo Interno garante o funcionamento do sistema de forma coerente e
racional, funcionando junto do Ministro das Finanças e presidido pelo Inspetor-Geral de Finanças. A partir de 2006 o
TC tem um papel de colaboração com este Conselho, podendo os relatórios referências às ações do Conselho servir
de base para processos de responsabilidade financeira que venham a correr no TC. Os órgãos de controlo interno têm
legitimidade processual subsidiária, isto é, podem requerer o julgamento de responsabilidade financeira no TC, no
caso de o MP não pretender requerer esse processo.

25
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

concomitante e sucessivo sobre a atuação financeira do Estado e também para


efetivar a responsabilidade financeira. O Tribunal funciona também como um
consultor qualificado da mesma, visto que quando envia parecer sobre a conta
geral do Estado permite que a AR faça o seu juízo político fundadamente.
Competências do Tribunal de Contas: dar parecer sobre a conta geral do Estado
e parecer sobre a conta das RA; dar parecer sobre projetos legislativos em
matéria financeira mediante solicitação da AR; fiscalizar previamente (1º
secção- fiscalização essencialmente de legalidade, da qual resulta a concessão
ou recusa do visto, sendo que esta última resulta de casos de nulidade, falta de
cabimento orçamental e ilegalidade que altere ou possa alterar o resultado
financeiro, determinando a recusa a ineficácia do ato ou contrato) a legalidade
e cabimento orçamental dos atos e contratos de qualquer natureza que sejam
geradores de despesa ou representativos de quaisquer encargos e
responsabilidades, quer para as entidades sujeitas aos seus poderes de controlo
ou jurisdição, quer para as entidades de qualquer natureza criadas pelo Estado
ou por quaisquer entidades públicas para desempenhar funções administrativas
originariamente a cargo da Administração Pública; verificar as contas das
entidades que as devem submeter ao Tribunal; julgar a efetivação das
responsabilidades financeiras (3º secção); realizar auditorias; apreciar a
legalidade, bem como a economia, eficiência das entidades sujeitas aos seus
poderes de controlo e a fiabilidade dos sistemas de controlo interno; fiscalizar
a cobrança de recursos próprios; e fiscalizar a aplicação de recursos financeiros
oriundos da UE. A fiscalização concomitante, tendo por objeto a atividade
financeira enquanto está a ser exercida consiste na verificação das entidades
sujeitas à jurisdição do TC, na avaliação dos sistemas de controlo interno, na
apreciação da legalidade, economia, eficiência e eficácia da gestão financeira,
na fiscalização da aplicação dos recursos provenientes da União e no controlo
da dívida pública direta para aferir em especial o cumprimento dos limites de
endividamento fixados no OE. O TC controla a despesa pública, sendo esta
considerada num âmbito bastante amplo, abrangendo todo o dinheiro público
gasto mesmo que seja feito fora do Estado, isto é, por entidades de qualquer
natureza que tenham participação de capitais públicos ou sejam beneficiárias,
a qualquer título de dinheiros ou outros valores públicos (2º/3 LOPTC). O
controlo da despesas é feito não só no âmbito da verificação da legalidade, mas
também toma em consideração os princípios da economia (boa gestão- evitar
desperdícios), eficiência (maximização de resultados em relação a um
determinado nível de recursos ou a maximização dos meios para determinada
quantidade e qualidade de resultados) e eficácia (avalia o grau de realização dos
objetivos e a relação entre os objetivos fixados e os resultados obtidos).

Traços Específicos do regime do Orçamento do Estado

 Mecanismos de Coordenação de Subsetores: surge da necessidade de cumprimento


dos critérios de convergência, visto que o défice é apurado em relação a todo o setor
administrações públicas, sendo o instrumento dessa coordenação o OE por permitir
uma perspetiva mais geral e por ser através deste que são autorizadas as transferências
para os demais subsetores do setor público administrativo. Veja-se que quem executa
o OE passa a ser responsável, em última análise, pela falta de coordenação do setor

26
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

público administrativo e o controlo orçamental estende-se ao cumprimento das


exigências de estabilidade orçamental (que inclui o setor administrações públicas).
 Apresentação de uma estimativa de orçamento consolidado como anexo
informativo à proposta de lei do OE.
 Estabelecimento de uma regra de equilíbrio orçamental global do setor público
administrativo a que todos estão sujeitos, por meio de vinculação aos princípios
da solidariedade recíproca e transparência orçamental.
 Autorização para o OE estabelecer limites ao endividamento das RA e AL, de
acordo com o saldo orçamental calculado para o setor público administrativo.
 Permissão para no OE se reduzirem em caso de necessidade as transferências
orçamentais previstas nas leis financeiras das AL e RA.
 Acompanhamento por parte do Ministério das Finanças em relação à execução
orçamental feita pelas AL e RA.
 Consagração de dissuasores de comportamentos contrários à estabilidade,
como a previsão de uma circunstância agravante no processo de
responsabilidade financeira, para quem incumpra as regras e procedimentos,
previstos para efeitos de assegurar a estabilidade orçamental.
 Previsão de clausulas de salvaguarda que permitam a rápida reposição do
respeito pelos critérios de convergência: redução das transferências em anos
subsequentes para RA e AL no caso de endividamento para além dos limites
inscritos no OE e suspensão das transferências previstas no OE para qualquer
dos organismos do setor público em caso de incumprimento do dever de
obrigação a que estão obrigados para verificação do cumprimento das medidas
de estabilidade orçamental.
 Mecanismos de Sustentabilidade Orçamental:
 Sujeição do OE ao Programa de Estabilidade e Crescimento e a uma regra de
saldo: o programa (apresentado até ao final de abrir ao CE e Comissão, sendo
antes sujeito a apreciação da AR) vincula o OE na medida em que estabelece um
objetivo de médio prazo e uma trajetória de ajustamento, sendo com base
nesse programa que os órgãos comunitários avaliam o OE a aprovar para o ano
seguinte e a sua execução, aferindo o cumprimento dos limites de défice e
endividamento previstos pelo direito comunitário. A regra de saldo diz respeito
ao objetivo de médio prazo fixado no programa ser definido em termos de saldo
ajustado do ciclo e de medidas temporárias, ou seja, pretende-se não aplicar o
programa com indiferença em relação aos fatores macroeconómicos que
sempre terão o seu reflexo sobre os níveis de défice e endividamento. O
programa e regra do saldo são mecanismos de contenção de despesa e,
portanto, são meios de estabilidade orçamental. Veja-se que é da estimativa do
orçamento consolidado e com os objetivos fixados pelos órgãos comunitários
que se define toda a política orçamental, que tem influência obviamente
também nas previsões orçamentais locais e regionais.
 Sujeição do OE à programação orçamental, associada a uma regra de despesa:
a programação é obrigatória para todas as despesas e está associada a uma
regra de despesa, que visa a limitação quantitativa da despesa pública num
determinado espaço de tempo, assentando na fixação de objetivos plurianuais
e na fixação de tetos quantitativos para o gasto público.
 Vinculações Constitucionais do Orçamento (105º2 CRP):

27
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

▪ Lei das Grandes Opções: há um dever de subordinação do OE às


orientações políticas e às grandes linhas definidas nesta mesma lei e,
portanto, a lei que aprova o OE não poderá contradizer essa Lei das
Grandes Opções sob pena de ser ilegal ou mesmo inconstitucional
indiretamente por violação do imperativo de “harmonia” previsto no
105º/2.
▪ Obrigações decorrentes de lei ou contrato: veja-se que as despesas
decorrentes de lei só serão obrigatoriamente previstas no OE se não
forem expressamente revogadas ou alteradas, entretanto ou mesmo na
própria Lei OE (veja-se acórdãos TC nº 303/90 e 358/92 que defendem
a possibilidade da lei OE revogar ou alterar leis materiais preexistentes
das quais decorram despesa). As obrigações contratuais do Governo
devem ter em conta a lei OE e não o inverso, pelo que essas obrigações
ou são assumidas de modo condicional ou sujeitas à livre inscrição
orçamental por parte da AR ou então a sua vinculatividade e
exigibilidade só pode ocorrer depois de o Governo ter conseguido ver
aprovadas as verbas necessárias para fazer face ao cumprimento
pontual dos acordos a que decidiu comprometer-se (TC vai nesse
sentido, permitindo que a AR altere por via legislativa alguns contratos
celebrados pelo Governo- acórdão nº 24/98).
 Contenção no que toca à assunção de dívida pública (16ºA e 25º LEO’s).

Responsabilidade Financeira: é através da responsabilidade financeira que o Tribunal de Contas


retira consequências dos juízos que profere no exercício dos seus poderes de fiscalização. A
responsabilidade financeira pode ser de dois tipos: reintegratória e sancionatória. A efetivação
da responsabilidade financeira faz-se mediante processo de julgamento de contas e processos
de responsabilidade financeira, emergindo a primeira de evidencias em relatórios de verificação
externa de contas e a segunda de factos evidenciados em relatório relativos a ações do Tribunal
de Contas (fora do processo de verificação externa de contas) ou em relatórios de controlo
interno. A responsabilidade reintegratória está associada a uma condenação de reposição de
verbas (59º a 64º LOPTC), que pode emergir tanto por casos de despesa pública injustificada
como por casos de não cobrança dolosa de receitas públicas. A sanção corresponde à reposição
das quantias correspondentes e ao pagamento de juros de mora. Esta responsabilidade tem um
prazo de prescrição de 10 anos. A responsabilidade sancionatória consiste na aplicação de
multas, ocorrendo nos casos previstos nos artigos 65º e 66º LOPTC. As multas têm um limite
máximo e são graduadas de acordo com as características apresentadas no artigo 67º/2 COPTC.
A aplicação de multas decorrente desta responsabilidade é compatível e cumulável com as
condenações em sede de responsabilidade reintegratória. A responsabilidade sancionatória tem
um prazo de prescrição de 5 anos. A responsabilidade financeira em geral é pessoal e depende
de um ato ilícito e culposo. O tribunal pode revelar ou reduzir a responsabilidade financeira
quando se verifique negligência (64º/2 LOPTC). Por outro lado, é possível relevar a
responsabilidade por infração financeira (apenas passível de multa) quando não tiver havido
antes recomendação do TC ou de qualquer órgão de controlo interno ao serviço auditado para
a correção da irregularidade do procedimento adotado ou quando é a primeira vez que o
tribunal de contas ou um órgão de controlo interno tenham censurado o seu autor pela sua
prática. Veja-se os artigos 89º a 93º LOPTC quanto ao processo de responsabilidade financeira.

Finanças Públicas e Direito Financeiro- Nazaré Cabral e Guilherme Martins

28
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

Instrumentos das Finanças Públicas

Receitas Públicas

Regem-se pelo principio da legalidade, visto que só podem ser regidas e criadas por lei ou no
seu respeito; pelo principio da renovação anual, não podendo ser cobradas sem autorização
orçamental atual; pelo principio de que as receitas devem encontrar-se integralmente previstas
no Orçamento de Estado; pelo princípio da não dedução das despesas de cobrança; pelo
principio da não consignação a despesas especificas, salvo em casos especiais ou excecionais
previstos na lei; e pelo principio, tendo exceções, da cobrança através do processo de execuções
fiscais.

Aa receitas públicas distinguem-se em 3 modalidades:

➢ Receitas Patrimoniais: resultam da administração do património do Estado ou da


disposição de elementos do seu ativo, sendo, respetivamente receitas do património e
receitas de disposição patrimonial, pois as primeiras resultam da normal administração
do património e as segundas da oneração ou alienação desse mesmo património.
➢ Receitas Tributárias: são provenientes da cobrança de tributos, isto é, de prestações
pecuniárias em favor do Estado ou de outras entidades públicas, de natureza obrigatória
e sem caráter sancionatório.
• Impostos: tributos unilaterais, visto que o pagamento do imposto não envolve
qualquer contraprestação, pelo menos como tal percecionada. O pressuposto
destes situa-se em factos reveladores de riqueza (consumo, por exemplo) e não
na prestação administrativa, tendo como finalidade o financiamento geral das
despesas públicas. Baseia-se em regra no princípio da capacidade contributiva.
• Taxas: tributos bilaterais, na medida em que o seu pagamento pressupõe uma
determinada contrapartida especifica, tendencialmente direta e imediata. Estas
são cobradas fundamentalmente: pela utilização de bens de domínio público;
pela obtenção de um serviço público; ou pela remoção de um obstáculo jurídico
ao exercício da atividade privada. O pressuposto destas é a prestação
administrativa de que o sujeito passivo seja causador ou beneficiário, sendo a
sua finalidade a compensação dessa prestação. Baseia-se no princípio da
equivalência.
• Contribuições Especiais (de melhoria ou especial desgaste): tipo particular de
impostos que são cobradas em virtude da ocorrência de externalidades
positivas ou negativas, visando internalizá-las e traduzem uma aplicação híbrida
dos princípios da capacidade contributiva e da equivalência.
• Contribuições Financeiras: não são contribuições especiais, sendo uma
categoria autónoma de tributo, ainda que fiquem no meio dos impostos e taxas,
visto que há uma contraprestação e esta pode ou não verificar-se no tempo
(natureza difusa). Um exemplo estas são as contribuições para a Segurança
Social. Têm como pressuposto a prestação administrativa presumivelmente
provocada ou aproveitada pelo sujeito passivo e têm uma finalidade
compensatória dessa prestação. Baseia-se no princípio da equivalência.

O artigo 165º alínea i) da CRP reserva à AR a competência legislativa de criar impostos e seu
sistema fiscal e o regime geral das taxas e demais contribuições financeiras feitas às entidades
públicas. Assim, a respeito dos impostos a AR tem a reserva relativa da criação do tipo fiscal e
respetivos elementos essenciais, como incidência, taxas, benefícios fiscais e garantias dos

29
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

contribuintes. Por outro lado, quando às taxas e contribuições financeiras apenas regula o
regime geral7.

Igualdade Tributária: consiste no direito fundamental a contribuir de acordo com a capacidade


económica de cada um, estando, portanto, o legislador vinculado a fazer concorrer os sujeitos
passivos para o financiamento das despesas públicas de acordo com o seu grau de existência
económica. Nos impostos diretos a capacidade contributiva é pressuposto direto da tributação,
sendo nos impostos indiretos apenas pressuposto indireto, visto que o consumo é uma
manifestação da capacidade contributiva. Nos impostos de consumo especiais, assim como no
caso das contribuições especiais a sua base é o princípio da equivalência.

Sistema Fiscal Português:

a) Impostos sobre o rendimento: IRS e IRS. Em 1989, os impostos sobre o rendimento


assumiram uma fórmula de tributação unitária, atingindo globalmente os rendimentos.
Em sede de IRS, existem desagravamentos decorrentes do princípio da capacidade
contributiva, sendo os mais importantes as deduções à coleta constantes do CIRS. A
configuração do IRS, de acordo com a capacidade subjetiva, deve ter em conta o
enquadramento familiar e pessoal do sujeito passivo. Contudo, só a partir de
determinado nível de rendimento é que o sujeito passivo de IRS consegue absorver
todas as deduções à coleta estruturantes identificadas. Em certas circunstâncias, quanto
maior for o rendimento bruto auferido pelo sujeito passivo, menor será o pagamento
do imposto, em virtude da capacidade de o sujeito passivo absorver todos os benefícios
disponíveis- natureza regressiva (quem recebe mais paga uma fração menor do que
quem recebe menos) dos desagravamentos estruturais. O IRC tem desagravamentos,
na sua maioria de natureza subjetiva, porque existem atividades que exercem atividades
de natureza não comercial, que por sua faz devem ser excluídas regra geral de
tributação do lucro. São muitas as situações no código do IRC que traduzem a aplicação
do justo valor quanto à tributação do lucro, isto é, a ideia de que não é preciso esperar
pela realização de valores históricos, mas antecipar/adiar tributação tendo em conta o
preço de uma venda de um ativo ou de uma transferência de responsabilidade que terá
lugar entre os participantes do mercado e nas condições atuais do mercado- avaliação
baseada no mercado e não em critérios definidos pela entidade. Esta surge como uma
alternativa ao custo histórico, isto é, a ideia de que só se tributam os ganhos que tenham
sido realizados, pagos ou colocados à disposição em datas definitas pelos
intervenientes.
b) Impostos sobre o património:
a. IMT: em 2013 procede-se a uma reforma na tributação do património, pela
instauração de um sistema efetivo de avaliação de prédios urbanos e rústicos,
permitindo o estabelecimento do valor patrimonial próximo do valor de
mercado, sendo possível a criação de um verdadeiro imposto sobre o
património. O IMT encontra fundamento na arrecadação de receita, mas
também na criação de custos de transação necessários ao cumprimento do
contrato de aquisição de bens imóveis.

7 Que engloba segundo Costa: noção de taxa e sua caracterização, possíveis modalidades e indicação típicas dos
domínios da sua incidência, princípios e regras gerais relativos à competência para o seu estabelecimento e à forma
ou procedimento que neste deve ser observado, critérios a que deve obedecer a fixação do respetivo montante e
elementos ou circunstâncias para tanto atendíveis e alguns aspetos relevantes do regime da relação jurídica e da
obrigação tributárias.

30
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

b. Imposto do selo: incide sobre todos os atos, contratos, documentos, títulos,


papéis e outros factos ou situações jurídicas previstos na Tabela Geral, incluindo
as transmissões gratuitas de bens. Não depende de uma norma de incidência
geral e deixou progressivamente de estar associado à ideia de monopólio fiscal
dos valores selados. Hoje, os momentos de pagamento deste imposto e de
cobrança coincidem, mas normalmente não coincidem o sujeito passivo e
aquele que suporta o imposto (ex. seguradoras). O Estado utiliza este imposto
para estabelecer barreiras a potenciais concorrentes no mercado, favorecendo
determinados agentes a esquivarem-se aos efeitos da concorrência própria do
mercado.
c. IUC: a reforma da tributação automóvel veio substituir os 3 impostos que
existiam sobre a circulação de veículos em Portugal- imposto municipal sobre
veículos, imposto de circulação e imposto de camionagem- por um único-
Imposto Único de Circulação (IUC). Neste imposto, mantém-se uma disciplina
diferenciada dos diferentes tipos de veículos, fixando-se categorias com base
no princípio da equivalência, isto é, a ideia de que os contribuintes devem ser
onerados na medida do custo que provocam ao ambiente e à rede viária. Este
princípio é a justificação dos seguintes traços do regime: oneração dos veículos
em função da respetiva propriedade e até ao momento do abate; o emprego
comum de uma base tributável especifica; a revisão do quadro de benefícios
fiscais vigente e a afetação de uma parcela da receita aos municípios da
respetiva utilização. O IUC é de periodicidade anual e o imposto incidente sobre
veículos da categoria A, B, C, D e E é devido até ao cancelamento da matrícula e
só em virtude de abate efetuado nos termos da lei. Este imposto apresenta bem
a lógica ambiental, por deter como variáveis para determinar a base tributável,
não só a cilindrada, mas também a voltagem, antiguidade da matrícula, emissão
de dióxido de carbono e combustível utilizados. Esta base tributável de natureza
mista é ainda relevante para repartir a receita deste imposto entre a
Administração central e os municípios: a receita gerada pelo IUC sobre os
veículos da categoria A, E, F e G bem como 70% da componente relativa à
cilindrada incidente sobre os veículos da categoria B pertence aos municípios
de residência dos sujeitos passivos; é da administração central, a receita gerada
pela componente do IUC relativa ao nível de emissão de CO2 incidente sobre os
veículos da categoria B, bem como os 30% da componente relativa à cilindrada
dos veículos da categoria B e a receita gerada pelo IUC incidente sobre os
veículos das categorias C e D, com exceção dos veículos dessas categorias que
circulem nas RA, sendo a titularidade dessa receita dessas RA.
c) Impostos sobre o consumo
a. IVA (Imposto sobre o valor acrescentado): este imposto é assente no sistema
de pagamentos fracionados destinados a tributar o consumo final. IVA dedutível
das empresas tem por fim evitar que os vários agentes económicos e o
consumidor final paguem todos o mesmo imposto sobre o mesmo produto.
Enquanto que o IVA dedutível dos contribuintes está relacionado com as
deduções específicas à coleta do IRS e funciona como uma motivação para os
contribuintes pedirem faturas com o Número de Identificação Fiscal associado.
Em sede de IVA, existe uma relação entre o Estado e os Contribuintes com uma
dupla vertente: (1) vertente passiva, abrangendo todas as operações efetuadas
pelo contribuinte, consistindo estas no fornecimento de bens e prestação de

31
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

serviços próprios da atividade empresarial; (2) vertente ativa, abrangendo os


impostos devidos ou pagos relativamente aos bens fornecidos e serviços
prestados e aos bens importados. É a diferença entre estas vertentes que
resulta o montante do imposto devido ao erário, caso a vertente passiva seja
superior à vertente ativa, ou o montante de imposto a ser restituído, no caso
inverso. O direito à dedução do IVA tem na base a correlação entre a aquisição
dos bens e dos serviços e o seu emprego, da qual resultam dois limites: (A) limite
quantitativo, isto é, a dedução só pode ser exercida na medida do imposto
suportado a montante; (B) limite qualitativo, pela verificação de dois requisitos:
inerência entre os bens e serviços adquiridos e a atividade empresarial
prosseguida; e a exclusão dos bens e serviços adquiridos utilizados para fins
diversos aos visados pela atividade empresarial. O IVA repercutido corresponde
à aquisição de um bem ou serviços que se pretende utilizar para necessidades
da empresa, ficando afeto aos bens da empresa. A dedução limita-se ao imposto
devido e devidamente documentado por meio de fatura. Os benefícios fiscais
em sede de IVA podem ser isenções completas ou incompletas, consoante
viabilizem ou não o direito à dedução ou reembolso do IVA, sendo que só as
isenções externas (aplicáveis a operações internacionais) conferem direito à
dedução, ao contrário das deduções internas. Além das isenções previstas na
Sexta Diretiva, poderão os estados membros manter as isenções que tenham
sido aplicáveis anteriormente a 1 de Janeiro de 1991. As isenções apresentadas
durante um período transitório podem continuar a ser tributadas. Note-se que
em qualquer caso, o TJUE tem-se pronunciado pela ideia de que os sujeitos
passivos podem invocar o efeito direito da norma comunitária nos casos em que
o Estado não tenha transporto o regime da Sexta Diretiva.
b. Impostos Especiais sobre o Consumo: a existência de um custo social associado
ao consumo de determinados bens, tendo em vista a internalização de
externalidades negativas geradas, fundamenta também a arrecadação de
receita do Estado. Como alternativa à proibição, os IEC pretendem punir o
consumo de determinados bens. No caso dos tabacos e bebidas alcoólicas, a
tributação é de caráter repressivo. No caso de produtos petrolíferos e
energéticos a tributação visa a proteção do ambiente. Estes impostos têm
natureza extra fiscal, sendo o imposto um instrumento de correção das
externalidades. Estes tipos de impostos só podem ser exigidos no momento da
introdução dos bens no consumo- regime de suspensão do imposto.
c. Imposto sobre os Veículos (ISV): aplica-se aos automóveis ligeiros, mistos e de
mercadorias com peso bruto até 3500 kg, e ainda a motociclos e autocaravanas,
ainda que lhe sejam aplicadas taxas menos elevadas pelo menor custo
ambiental e viário que produzem. A base tributária do imposto automóvel é
constituída pelos níveis de emissão de CO2 dos veículos tributáveis. Prevê-se a
concessão de uma redução fiscal aos veículos que comprovadamente
apresentem níveis de emissão reduzidos, em consonância com as
recomendações da Comissão Europeia.
➢ Receitas creditícias: são resultantes do crédito público e têm a particularidade de serem
receitas não efetivas (como as anteriores), visto que implicam o registo no passivo
financeiro de uma valor exatamente igual ao da receita, embora traduzam uma entrada
de ativos monetários no património. Divida Pública é a dívida do Estado (incluindo
também a dívida das administrações infra estaduais- regionais e locais- e a dívida do

32
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

setor empresarial), traduzindo um compromisso financeiro vencível num determinado


prazo. A dívida pública traduz o conjunto de situações passivas de que o Estado, num
conceito lato, seja titular, determinada, em primeira linha, pelo recurso ao crédito. O
recurso ao crédito é explicado pela existência de défice orçamental, isto é, as receitas
efetivas não são suficientes para cobrir as despesas efetivas, ou pela existência de um
stock prévio de dívida acumulado. Modalidades da Dívida Públicas: (1) quanto à fonte:
dívida financeira (contração de empréstimos ou à emissão de dívida pública) e dívida
não financeira (ex. dívidas a fornecedores ou àqueles a quem o Estado adquire bens e
serviços. Apesar de ser registada nas demonstrações financeiras do estado, não conta,
ao contrário da dívida financeira, para avaliação do peso da dívida pública na sua relação
com o PIB); quanto à moeda: dívida interna (quando é denominado em moeda com
curso legal em Portugal) e dívida externa (quando é denominada em moeda que não
tenha curso legal em Portugal); quanto à evidência: dívida expressa (quando a dívida
resulta da contração de empréstimos ou da emissão de dívida a sua evidência é
imediata), dívida implícita (quando a dívida resulta da assunção de compromissos que,
no imediato podem até trazer receitas, mas que redundarão em despesa, sendo a sua
evidência diferida no tempo) e dívida condicional (a dívida tem uma evidência
meramente difusa. Ex. concessão de garantias pessoas por parte do Estado, visto que a
dívida só se tornará efetiva para o Estado, no caso de incumprimento por parte do
devedor principal); quanto ao tipo de débito: dívida direta (Estado é devedor principal)
e dívida acessória (Estado é devedor subsidiário); quanto à maturidade: dívida de curto
prazo (inferior a 1 ano) e dívida de longo prazo (superior a um ano); quanto ao exercício
orçamental: dívida flutuante (amortização ocorre no mesmo exercício orçamental em
que a dívida foi contraída- é sempre de curto prazo) e dívida fundada (amortização
ocorre em exercício diferente daquele em que haja sido contraída- não é
necessariamente de longo prazo).
Emissão e gestão da dívida pública direta (CRP, LEO e Lei nº 7/98): a emissão de divida
pública direta necessita de autorização parlamentar, quando esteja em causa a emissão
de dívida fundada (161º alínea h)), o que resulta do princípio da democracia financeira
e da necessidade de assegurar que os representantes do povo exerçam um controlo
efetivo sobre a geração de encargos futuros. Compete ainda à AR definir as condições
gerais dos empréstimos a emitir (montante e os prazos de vencimento). O LEO
apresenta que é a lei de Orçamento de Estado que apresenta a autorização e define as
condições gerais. O Conselho de Ministros definirá condições complementares a que
devem obedecer a emissão, negociação e contratação da dívida, a que se segue a
definição de condições especificas dos empréstimos a contrair, por parte do IGCP, E.P.E
(entidade responsável principal de gestão normal da dívida). O Ministro das Finanças
tem o poder de definir linhas de orientação especificas a serem seguidas pelo IGCP.
Podemos contrapor a gestão normal da dívida à gestão anormal, sendo a primeira
aquela que corresponde ao conjunto de operações que se estabelecem entre o Estado
e os credores, em virtude da contração da dívida, e a segunda aquela que corresponde
ao conjunto de operações através das quais o Estado pretende modificar a situação e
composição da dívida pública- é aqui que surge a renegociação da dívida pública/
conversão, isto é, a alteração por acordo ou unilateralmente pelo devedor das
condições contratuais em que foi celebrado o empréstimo público, no decurso da
vigência deste.
Instrumentos da Dívida Pública Direta (Lei nº 7/98 artigo 10º): A forma mais
convencional de contração de empréstimos é a celebração de contratos por parte do

33
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

Estado. No entanto, a prática é, não tanto contratualizar empréstimos individuais com


cada credor, mas sim em colocar no mercado títulos de dívida, que se destinam a ser
subscritos pelo público em geral. Obrigações do Tesouro constituem o principal
instrumento utilizado pelo Estado para satisfazer as suas necessidades de
financiamento, sendo valores mobiliários de médio e longo prazo, cuja emissão se
efetua através de operações sindicadas, leilões ou por operações de subscrição limitada.
Bilhetes de Tesouro são valores imobiliários com um valor unitário de um euro, podendo
ser emitidos com prazo até um ano, colocados a desconto através de leilão ou
subscrição limitada e reembolsáveis no vencimento pelo seu valor nominal. Os
certificados de aforro são instrumentos de dívida com o objetivo de captar a poupança
das famílias, sendo colocados diretamente juntos dos aforradores e tendo montantes
mínimos de subscrição reduzidos. Estes só podem ser emitidos a favor de particulares e
não são transmissíveis exceto no caso de falecimento do titular.
Dívida Publica Condicional e Acessória: é uma dívida condicional e subsidiária, visto que
o Estado só a assume verdadeiramente como sua se e quando esta não for paga pelo
devedor principal. Esta dívida é regulada pela CRP (161º alínea h)) e pela Lei nº 112/97
que aprova o regime das garantias pessoais do Estado que podem ser tanto avales como
fianças (atualizando-se o preceito constitucional). A AR deve fixar por lei o limite máximo
de garantias a conceder pelo Governo, sendo essa lei a Lei de Orçamento de Estado e
apenas essa. O pedido é dirigido ao Ministro das Finanças que decidirá através de
despacho, tendo o projeto que reunir manifesto interesse para a economia nacional e
cumprir os requisitos legais.

Despesas Públicas: é o conjunto de dispêndios realizados pelos entes públicos para custear os
serviços públicos (despesas correntes) prestados à sociedade ou para a realização de
investimentos (despesas de capital). A despesa abrange assim o consumo, investimento e
transferências. O consumo é a aquisição presente de bens , tendo em vista a satisfação das
necessidades a que um sujeito se propõe. O investimento representa todo o capital adicional
adquirido pelo setor público e privado ao fim de um determinado período. Este poderá ser real
se se reportar aos bens de capital empregues no processo produtivo ou pode ser financeiro se
tiver como referência o mútuo ou depósito de fundos juntos de mercados ou instituições
especializadas. Valerá investir se o retorno do investimento adicional for superior à taxa de juro.
As transferências poderão ser de capital ou correntes, consoante afetem ou não o património
duradouro do Estado; diretas ou indiretas, consoante visem aumentar diretamente os
rendimentos disponíveis ou traduzam um benefício meramente indireto pelo aumento das
possibilidades de consumo; para entidades do setor público ou do setor privado. A despesa
Pública tem diversas modalidades: despesas de investimento (concorrem para a formação de
capital fixo do Estado) e despesas de funcionamento (gastos necessários para assegurar o
normal funcionamento da máquina administrativa); despesas em bens e serviços (asseguram a
criação de utilidades por meio da compra de bens ou serviços do Estado) e despesas de
transferência (limitam-se a proceder a uma redistribuição de recursos atribuindo-os a entidades
que se situam no setor público ou no setor privado); despesas produtivas (limitem a gerar
utilidades no presente) e despesas reprodutivas (impliquem o aumento da capacidade produtiva
no futuro); despesas civis (dentro das quais podemos destacar as despesas económicas, sociais,
com funções gerais de soberania) e despesas militares (destinam-se a manter a Defesa Nacional)

PIB = Consumo Privado + Investimento + Despesa Pública + Diferença entre as Exportações e


Importações.

34
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

Sistema Fiscal Português:

• Impostos sobre o rendimento: imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS)
e o imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC).
• Impostos sobre o património: imposto municipal sobre as transmissões onerosas de
imóveis (IMT) e imposto único de circulação (IUC)
• Impostos sobre o consumo: imposto sobre o valor acrescentado (IVA), impostos
especiais de consumo e Imposto sobre os veículos (ISV)

Setor Público: abrange todas as entidades controladas pelo poder político, sendo essas a
totalidade de administrações públicas (central, regional, local e segurança social) e ainda o setor
público empresarial (empresas públicas, empresas municipais e sociedades anónimas de
capitais exclusiva ou maioritariamente públicos).

Contabilidade Pública: baseia-se em critérios de natureza jurídico-constitucional e encontra-se


regulada pela Lei nº 8/90 e pelo DL nº 155/92. O registo dessa contabilidade faz-se com o Plano
Oficial de Contabilidade Pública (POCP). Tem um interesse sobretudo interno, visto que orienta
os serviços competentes da Administração Pública na elaboração das respetivas contas ou
demonstrações financeiras.

Contabilidade Nacional: baseia-se em critérios de natureza económica, sendo o seu regime


fundamental de natureza comunitária (SEC 95- Sistema Europeu de Conta). Tem um interesse
sobretudo externo, visto que os seus destinatários são as instituições comunitárias competentes
(Comissão e Eurostat) pela monitorização e avaliação das finanças públicas dos Estados
Membros. A contabilidade nacional é um instrumento de uniformização da informação
contabilística.

Unidades Institucionais: são entidades económicas com capacidade de possuir bens e ativos, de
contrair passivos e de realizar atividades e operações económicas com outras unidades em seu
próprio nome. Estas têm autonomia de decisão no exercício da sua função principal (tem direito
a ser proprietária de bens ou ativos e poderá transacionar a propriedade dos bens ou ativos;
capacidade para tomar decisões económicas e realizar atividades económicas pelas quais é
diretamente responsável; capacidade para contrair passivos em seu nome, aceitar obrigações
ou compromissos futuros e celebrar contratos), dispõem de uma contabilidade completa
(circunstância de a mesma dispor de documentos contabilísticos que reflitam a totalidade das
suas operações económicas e financeiras efetuadas no decurso do tempo de referência das
contas e de um balanço dos seus ativos e passivos) ou podem elaborá-la.

Integração das Unidades Institucionais em Setores Institucionais: são agrupadas em função da


análise da sua atividade principal e da função da unidade institucional em causa, as quais são
consideradas indicadores do seu comportamento económico. Cada unidade pertence a um
único setor ou subsetor. Setores Institucionais: (1) Sociedades Não Financeiras; (2) Sociedades
Financeiras; (3) Administrações Públicas; (4) Famílias; (5) Instituições sem fins lucrativos ao
serviço das famílias. A soma de todos os setores é = à economia total.

Função = produção de bens > distinção entre tipo de produtor: a) produtores mercantis privados
e públicos →Sociedades Financeiras, Sociedades não Financeiras ou Familias; b) produtores
privados para a utilização final própria →Familias; c) outros produtores não mercantis privados
e públicos →Administrações Públicas ou Instituições sem fim lucrativo ao serviço das famílias.

35
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

Produção Mercantil: é aquela que é vendida no mercado, compreendendo: produtos vendidos


a preços economicamente significativo; produtos que são objeto de troca direta; produtos
utilizados para pagamento em espécie; produtos fornecidos por uma unidade de atividade
económica local a outra, dentro da mesma unidade institucional para serem utilizados como
consumo intermédio ou final; produtos acrescentados às existências de produtos acabados e de
trabalhos em curso destinados a um ou outros dos empregos acima referidos.

Produção destinada a utilização final própria: bens ou serviços que são retidos para consumo
final pela mesma unidade institucional ou para formação bruta de capital fixo pela mesma
unidade institucional.

Produção Não Mercantil: abrange a produção que é fornecida gratuitamente ou a preços que
não são economicamente significativos.

Preço economicamente significativo: ocorre quando mais de 50% dos custos da produção são
cobertos pelas vendas. Flutuações de menor importância de vendas de um ano para o outro não
devem implicar uma reclassificação de unidades institucionais.

Produtor Público: é controlado pelas administrações públicas, isto é, determinam a política ou


programa geral da unidade.

Produtor Público ou Fins Lucrativos ou


Critério dos 50%
Privado não

Setor Público e Perímetro Orçamental

Desorçamentação: traduzem-se numa manipulação da lei ou das regras contabilísticas tendo


em vista apenas a obtenção de certos efeitos orçamentais ou contabilísticos (ex. retirada
artificial de uma entidade do setor público qualificando-o como entidade privada).

Os orçamentos das empresas públicas não figuram no Orçamento de Estado, tal como não
figuram nos orçamentos das RA e AL. No entanto, as regras do SEC 95 pretendeu capturar os
encargos financeiros associados a transferências financeiras entre as administrações públicas e
setor empresarial local, através da consolidação das contas. Isto é, a contabilização de receitas
e despesas deverá fazer-se, não apenas através de valores brutos de transferência, mas também
através de valores líquidos dessas transferências- valores consolidados. Este meio é uma forma
também de uma progressiva inclusão dos orçamentos das Administrações Públicas Regional e
Local e do Setor Público Empresarial no perímetro orçamental, visto que permite perceber a
dimensão dos fluxos financeiros entre todos eles. Por outro lado, esse objetivo poderá ser
alcançado através da reclassificação de entidades empresariais: são entidades reclassificadas
aquelas que independentemente da sua forma e natureza se incluam no setor público
administrativo no âmbito do SEC 95.

Descentralização Financeira: O Setor Público engloba 3 subsetores: Estado Central, Regiões


Autónomas e Autarquias Locais. Estes 3 níveis relacionam-se entre si: o Estado central realiza
transferências para as RA e para as AL, e, por sua vez, as RA podem financiar diretamente as
suas AL. A ideia geral é a de que o financiamento segue a função, devendo primeiramente
averiguar qual a despesa (expenditure assignement) e depois qual é a receita (tax assignement).
Contudo, em Portugal há uma desconexão destes dois conceitos, visto que a legislação que
determinam a afetação ou transferência de atribuições do Estado para os níveis mais baixos são
desligadas e diferentes das legislações financeiras. Assim, o processo de transferência de função

36
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

não tem sido devidamente articulado com o processo de atribuição de meios de financiamento.
O federalismo financeiro manifesta-se independentemente da natureza do Estado e da sua
organização político-administrativa. Este acontece sempre que existem níveis inferiores de
decisão e desde que essa existência se traduza num acervo de funções e/ou recursos financeiros.

Descentralização político-administrativa: o Estado Português é um estado unitário


parcialmente regional, sendo as RA e AL a expressão máxima da descentralização.

Descentralização fiscal: as RA e AL têm autonomia no que diz respeito à determinação da


receita, principalmente da receita fiscal própria. Portanto, esta descentralização fiscal traduz-se
na possibilidade de as entidades poderem ser titulares de receita tributária, referente a tributos
cobrados nessas circunscrições e na existência de autonomia fiscal, isto têm possibilidade de as
entidades exercerem poderes tributários em relação a esses tributos/impostos,
designadamente podendo criar impostos e definir os seus elementos essenciais.

Independência Orçamental: os orçamentos anuais de cada uma das RA e AL não constam no


Orçamento de Estado. Importa referir que os orçamentos das empresas públicas encontram-se
também fora do Orçamento de Estado, tendo estas orçamentos próprios, sendo também
independentes do ponto de vista orçamental. Existem 2 graus de independência orçamental: o
primeiro relaciona o Orçamento de Estado com o Setor Público Empresarial Nacional e com as
Administrações Regionais e Locais; o segundo relaciona as RA e AL com os respetivos setores
empresariais, o que indiretamente relaciona os setores empresariais locais e regionais com o
Estado Central. Tem-se vindo a assistir a um alargamento do perímetro orçamental para que
este passe também a inclui o setor empresarial do Estado (incluindo o regional e o local).

Autonomia Financeira: existem 2 tipos de serviços, uns dotados de autonomia meramente


administrativa (serviços integrados- direções gerais, secretarias gerais, inspeções gerais,
direções gerais, departamentos municipais) e outros dotados de autonomia administrativa e
financeira (fundos e serviços autónomos- institutos públicos e serviços municipalizados que
agora se denominam empresas públicas municipais de natureza estatuária), que significa que
pelo menos 2/3 das respeitas respetivas sejam receitas próprias e em principio significa a
atribuição de personalidade jurídica. A autonomia financeira hoje reconduz-se à autonomia
orçamental e patrimonial, isto é, na possibilidade de estes serviços elaborarem e executarem os
respetivos orçamentos, com grande margem de liberdade, não deixando, contudo, de integrar
o OE, e na possibilidade e capacidade de detenção e gestão de património próprio. No entanto,
estas duas autonomias estão restritas, por exemplo pela necessidade de autorização do Ministro
das Finanças para a prática de inúmeros atos de gestão e execução orçamental e ainda a
restrição em termos quantitativos e dependência de autorização por parte do Ministro para
certos atos de gestão.

O Estado financia outros setores: Regiões Autónomas através da subvenção geral e subvenção
especifica (Fundo de Coesão para as Regiões Ultraperiféricas); Municípios através de subvenção
geral (Fundo de Equilíbrio Financeiro) e subvenção especifica (Fundo Social Municipal);
Freguesias através de subvenção geral (Fundo de Financiamento das Freguesias); empresas
públicas nacionais por via de financiamentos e indemnizações compensatórias.

Orçamento da Segurança Social: integra o Orçamento de Estado, mas mantém uma


considerável autonomia relativamente à gestão orçamental do Estado Central. O sistema da
Segurança Social desdobra-se em sistema de proteção social de cidadania (com subsistemas de
ação social, solidariedade e proteção familiar- sendo este sistema financiado por transferências
do OE, que são transferidas em bloco e distribuídas pelos vários subsistemas, e através da

37
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

consignação de receitas fiscais enviadas diretamente para o subsistema de proteção familiar),


sistema previdencial (financiado por quotizações dos trabalhadores e contribuições das
entidades empregadoras. A gestão deste segue um sistema de repartição, visto que os
trabalhadores no ativo vão financiando as pensões dos trabalhadores que se reformam,
apresentando também num entanto um sistema em que os trabalhadores acumulam reservas
financeiras próprias destinadas ao pagamento da sua própria pensão- concessões à
capitalização. Quanto a este sistema pode ainda existir transferências do orçamento de Estado
e transferências do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, quando isso se
justifique) e sistema complementar que integra um regime público de capitalização, para além
de regimes complementares de iniciativa coletiva e individual. O sistema previdencial-repartição
funciona o epicentro financeiro de todo o sistema de segurança social, fazendo a ligação entre
o sistema de proteção social de cidadania e o sistema previdencial-capitalização: os excedentes
do sistema de proteção social de cidadania são canalizados para a capitalização através do
sistema previdencial- repartição. Princípio da adequação seletiva: manda adequar as fontes de
financiamento às modalidades de proteção social).Este visa essencialmente proibir a utilização
das contribuições sociais para financiar despesas de caráter não contributivo, mas já não veda,
pelo menos em determinadas circunstâncias, que as transferências do OE possam ser utilizadas
para colmatar a situação deficitária do previdencial.

Morfologia e Vicissitudes do Orçamento do Estado

O Orçamento de Estado (OE) pode ser definido como o documento onde são previstas e
computadas as receitas e despesas anuais, competentemente autorizadas. Assim, o OE é tanto
uma previsão (associa-se às funções económicas do OE, que serão a racionalidade económica e
a eficácia como quadro de elaboração das políticas financeiras, ou seja, o OE permite uma gestão
mais eficiente e racional dos dinheiros públicos e através deste é possível conhecer os aspetos
fundamentais da política económica do Estado) como uma autorização (associa-se às funções
jurídicas e políticas do OE, sendo que este se assume como uma autorização política, pois esta
está a cargo do Parlamento, sendo este que autoriza as despesas e receitas, que serão
executadas pelo Governo- existe uma limitação jurídica da Administração, visto que os
respetivos poderes financeiros carecem de ser autorizados). O OE é uma lei em sentido formal
e material. Desde a revisão de 1982 da CRP que vigora um sistema monista no que toca ao OE,
na medida em que a lei do OE é apenas um documento que contém tanto a vertente normativa
(autorização jurídico-política de realização de receita e cobrança de despesa) como a vertente
contabilística (conjunto de mapas, agregadores e desagregadores de receita e despesa- suporte
contabilístico de previsões de receita e dotações de despesa). Assim, o OE pode ser visto num
dimensão económico-financeira sendo efetivamente um orçamento do Estado, ou seja, um
plano de condução das finanças públicas do país e instrumento principal da ação
macroeconómica do Estado, ou então pode ser visto na sua dimensão jurídica, isto é, enquanto
expressão do princípio da democracia financeira. A Lei de OE tem sido considerada como uma
lei de valor reforçado devido ao seu procedimento especial de aprovação (iniciativa exclusiva do
Governo- 161º alínea g) CRP- tempos de aprovação, entrada em vigor e vigência que visam
garantir a sua duração anual) e ao facto de ser uma lei irrevogável.

Enquadramento Legal do OE

As relações entre a Lei de Enquadramento Orçamental (LEO) e o OE: a LEO é o quadro


fundamental do OE, ou seja, a lei do Orçamento é elaborada, organizada, votada e executada,
anualmente de acordo com a respetiva LEO (106º CRP). Há uma ideia de dependência da Lei de
OE face à LEO, mas existem alguns obstáculos a esta visão: ambas as leis são leis de valor

38
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

reforçado (uma reconhecida pela CRP- LEO- e outra defendida pela doutrina- OE) e a CRP não
prevê qualquer dependência entre leis de valor reforçado, tendo, portanto que seguir as regras
de direito que se aplicam às leis de igual valor; por outro lado, a LEO não exige nenhuma
exigência especifica no plano da aprovação ou alteração, podendo acontecer no limite que a
LEO fosse alterada pela própria lei enquadrada- lei OE.

Planos de incidência da LEO: esta é uma lei multifacetada, encontrando nela níveis de incidência
muito diversos dos quais podemos destacar os planos de incidência sobre vertente contabilística
do OE, sobre a vertente normativa do OE e planos de incidência formal e planos de incidência
substancial. Verifica-se que a LEO é cada vez menos uma lei de incidência formal, reguladora de
procedimentos e estruturas orçamentais, para ser cada vez mais uma lei de incidência
substancial, ou seja, preocupada com os resultados orçamentais, sendo hoje exigido, para além
do respeito pelo processo devido, o resultado orçamental concordante com as exigências de
disciplina orçamental. Assim, a LEO tem três eixos de matérias: (1) estrutura, conteúdo e
resultados orçamentais; (2) processo orçamental; (3) controlo orçamental e responsabilidade
financeira.

Vicissitudes Histórias da LEO: ver figura da página 272.

A crise de 2008 veio aprofundar um conjunto de tendências relativas ao desenho dos sistemas
orçamentais, sendo possível observar nas reformas um conjunto de boas práticas internacionais:

 Sistemas Orçamentais estão menos concentrados com os procedimentos e formatos


orçamentais e mais nos resultados orçamentais e, portanto, a micro orçamentação está
subordinada aos objetivos da macro orçamentação: disciplina orçamental e
sustentabilidade a longo prazo das finanças públicas. Destaca-se a necessidade de os
países promoverem planos credíveis de redução do défice público, que envolvem
ajustamentos de longo prazo; a consolidação orçamental deve dar preferência às
restrições pelo lado da despesa, visto que garantem melhores resultados que o aumento
dos impostos; a orçamentação deve basear-se em previsões económicas prudentes e
realistas.
 A micro orçamentação exibe agora várias novas características: (i) instrumentos de
programação plurianual da despesa, visto que traça os objetivos de médio prazo; (ii)
desenvolvimento de técnicas orçamentais “top-down”, ou seja, definição prévia de
tetos máximos de despesa para cada ministério setorial e só depois a concretização de
dotações para cada rubrica orçamental; (iii) novas regras ou princípios orçamentais, que
procuram condicionar os resultados orçamentais (consolidação orçamental, disciplina
financeira, sustentabilidade financeira de longo prazo, eficiência agregada e eficiência
alocativa) e abrangem a integralidade das Administrações Públicas. Estas regras
poderão ser de natureza procedimental ou de natureza quantitativa. São exemplos de
novos princípios orçamentais a estabilidade e transferência orçamental; (iv)
relaxamento, na gestão orçamental, dos controles sobre os inputs e focalização nos
resultados (outputs), isto é, na orçamentação interessam não as dotações orçamentais
(meios) mas o desempenho do serviço numa determinada área (fins).

Vinculações Internas do OE

Regras Orçamentais Clássicas:

 Anualidade: esta regra envolve a exigência de votação anual do Orçamento pelo


Parlamento e a execução anual do Orçamento pelo Governo e Administração Pública. O

39
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

princípio da anualidade no direito português inclui o orçamento de gerência, ou seja,


inclui-se no Orçamento todas as receitas a cobrar efetivamente durante o ano e as
despesas a realizar efetivamente independentemente do ano em que tenham nascido.
Ora, o orçamento de gerência tem como desvantagem a dificuldade de responsabilizar
o Governo, pela elaboração e execução de orçamentos que lhe são imputáveis, o que
levou a que o legislador previsse a necessidade de a elaboração do orçamento fazer um
enquadramento da perspetiva plurianual e previsse que os orçamentos dos organismos
do setor público administrativo integrem programas, medidas, projetos ou ações que
impliquem encargos plurianuais, prevendo a despesa total de cada programa, as
parcelas desses encargos relativos ao ano em causa e as despesas de cada 1 ou 2 anos
seguintes com caráter indicativo. Mesmo nos casos em que a lei prevê a existência de
mapas plurianuais, as verbas neles introduzidas devem ser inscritas no OE de cada ano,
sob pena de não poderem ser realizadas por falta de cabimento orçamental. O artigo
22º do DL nº 197/99 apresenta que o cabimento de despesas em orçamentos futuros
deve ser assegurado por um compromisso de inscrição assumido pelo Ministro
responsável pela despesa e o Ministro que faz o Orçamento. A lei admite um período
complementar (ainda que o ano económico coincida com o ano civil), ou seja, admite-
se o fecho da execução orçamental das despesas num período (complementar) que é
fixado anualmente pelo decreto de execução orçamental, de duração variável. Este
período complementar permite sustentar que o período orçamental vai para além do
ano civil. Veja-se que o período anual é o período mínimo de vigência orçamental, sendo
o período máximo definido pelo poder executivo através da existência ou não de
período complementar. É atribuído um mandato (mandatário é o Governo e mandante
o Parlamento) parlamentar periódico para cobrança de receitas tributárias, que se
baseia no princípio do autocontentamento ou da autotributação. O conteúdo deste
mandato segue as regras da legalidade financeira: (i) legalidade orçamentária, isto é, é
necessário uma periodicidade da votação parlamentar e da execução do orçamento; (ii)
legalidade fiscal, ou seja, há uma reserva absoluta de lei quanto à matéria de criação,
alienação e supressão dos impostos. Veja-se que o poder orçamental é repartido pelo
Parlamento e pelo Governo, mas o poder tributário é exercido primordialmente pelo
Parlamento, salvo autorização parlamentar expressa, nos limites e condicionalismos
impostos. O mandato tributário, apesar de estar incluído no poder orçamental, depende
de definição prévia das condições estabelecidas em lei parlamentar em sede legislativa.
 Plenitude: a plenitude orçamental do OE só se aplica às receitas e despesas dos serviços
integrados, serviços e fundos autónomos e segurança social, só tendo estes que constar
de um único orçamento e de estar todas nesse orçamento. Excluem-se deste princípio
de plenitude orçamental as operações de tesouraria, gestão patrimonial do Estado e
fenómenos de independência orçamental (RA, AL, SPE, Associações Públicas, Fundações
Públicas). Quanto às RA e AL as receitas e despesas destas não têm de integrar o OE,
mas exige-se que estas integrem um só orçamento. Contudo, o Governo é obrigado a
fazer acompanhar a proposta orçamental de elementos informativos relativos à
estimativa do orçamento consolidado do SPA, na ótica da contabilidade pública e
contabilidade nacional. Por outro lado, exige-se que o Governo elabore contas
consolidadas, a integrar a conta do Estado.
 Discriminação: as subregras desta regra principal têm em comum o objetivo de
assegurar uma maior racionalidade financeira e um efetivo controlo orçamental. Estas
subregras são: (i) regra da não compensação/do orçamento bruto: as receitas e as
despesas devem ser inscritas no orçamento de forma bruta e não líquida, não devendo

40
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

ser deduzidas às receitas as importâncias gastas com a sua cobrança nem às despesas
as receitas originadas pela sua realização. Pretende-se possibilitar um controlo efetivo,
político e administrativo, da execução fiscal; (ii) regra da não consignação: num
Orçamento não pode afetar-se qualquer receita à cobertura de determinada despesa,
como forma de evitar a existência de uma Administração Pública fragmentária
desprovida de uma gestão financeira de conjunto. Contudo, excetuam-se desta regra as
receitas apresentadas no artigo 16º/2 LEO. Para ocorrer consignação de receita é
preciso que se verifique: a) receitas deverão ter lugar no mesmo património
administrativo: b) e deverão cobrir uma despesa ou um grupo de despesas; (iii) regra da
especificação: o orçamento deve individualizar suficientemente cada receita e cada
despesa. Assim, a cada espécie de despesas públicas deve ser concedido um crédito que
deve ser exclusivamente afeto ao serviço ou função prescrita. Existem despesas que por
serem imprevisíveis (e inadiáveis) não podem ser suficientemente individualizadas e,
portanto, devem ser inscrita a dotação provisional destas no Orçamento do Ministério
das Finanças. O cumprimento desta subregra exige a classificação das receitas e
despesas segundo o critério económico (sob pena de ilegalidade) e classificação das
despesas segundo os critérios orgânico (assenta na distribuição das despesas pelos
departamentos do Estado e pela rubrica dos Encargos Gerais da Nação-serviços
integrados- e na distribuição das receitas e despesas por cada um dos fundos e serviços
integrados) e funcional (sob pena de inconstitucionalidade material, por violação do
105º/3 CRP).
 Publicidade: condição de eficácia da autorização e do consentimento parlamentares
para a cobrança de receitas e a realização de despesas e, ao mesmo tempo, tanto os
decisores e executores financeiros como os cidadãos têm de conhecer os termos
concretos da autorização para que essa possa ser aplicada, controlada e fiscalizada. A
necessidade de publicação decorre do facto de se exigir a forma de lei para a aprovação
do OE, sendo que às leis se aplica o regime geral de publicação dos atos(119º CRP). Por
outro lado, o legislador prevê que sejam tornados públicos todos os documentos que se
revelem necessários para assegurar a adequada divulgação e transparência do OR e da
sua execução (ex. Publicidade do Diário da AR que publica o relato das reuniões de
Comissão do Orçamento e Finanças). O regime de publicação deve ser garantido e
assegurado também pelas RA e pelas AL.
 Equilíbrio: (i) Equilíbrio Formal (105º/4 CRP): igualdade entre as receitas e as despesas,
traduzindo a interdição dos défices (nunca a totalidade de despesas exceda a totalidade
das receitas, sob pena de se ter de financiar os défices com empréstimos, pela criação
de um imposto suplementar ou pelas manipulações monetárias) e excedentes de receita
(relacionado com a ideia de Estado Liberal). O conceito de equilíbrio formal foi sendo
abandonado; (ii) Equilíbrio Substantivo: baseia-se na teoria do défice sistemático e na
teoria dos orçamentos cíclicos (receitas aumentam em períodos expansionistas e as
receitas diminuem em períodos de recessão). Podemos ter 4 critérios de equilíbrio
substancial: (A) Critério Clássico: só há equilíbrio orçamental quando as receitas
normais (patrimoniais e tributárias) cobrissem todas as despesas. O défice orçamental
só é admissível no caso de sobrevivência nacional (guerra ou calamidade pública), o que
significa que nas restantes situações é preferível o aumento dos impostos que o
agravamento dos impostos; (B) Critério do Orçamento Ordinário: há equilíbrio quando
as despesas ordinárias foram cobertas pelas receitas ordinárias e as despesas
extraordinárias sobertas pelo excedente das receitas ordinárias e as receitas
extraordinárias. O problema deste critério está nas variadas definições de verbas

41
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

ordinárias e extraordinárias; (C) Critério do Ativo Patrimonial do Estado: as


receitas/despesas de capital alteram a situação passiva ou ativa do património do
Estado, ao contrário das Receitas/Despesas correntes que não onerem nem aumentam
o valor do património duradouro do Estado. Assim, para existir equilíbrio aas despesas
correntes têm de ser cobertas pelas receitas correntes e as despesas de capital cobertas
pelas receitas de capital ou pelo excedente das correntes. O desequilíbrio ocorre
quando a cobertura das despesas correntes é feita pelas receitas de capital; (D) Critério
do Ativo da Tesouraria: as verbas efetivas representam uma efetiva diminuição do
património monetário do Estado, enquanto que as verbas não efetivas, embora
traduzam uma alteração do património de tesouraria, mas provocam no mesmo um
acréscimo/diminuição idêntica. Existe equilíbrio quando as despesas efetivas só podem
ser financiadas por receitas efetivas e as despesas não efetivas são financiadas por
receitas efetivas e receitas não efetivas. O recurso a um empréstimo só serve, portanto,
para amortizar outro empréstimo (défices dos anos anteriores), visto que se for utilizado
para outros fins vem reduzir o património monetário do Estado.
É exigido um equilíbrio substancial que se traduz no respeito pelos critérios de
convergência relativos ao défice e ao endividamento público, por forma a dar
cumprimento à proibição de défices excessivos, ou seja, para que os orçamentos do
setor público administrativo se encontrem equilibrados têm de respeitar os critérios de
convergência (10º/2 e 3 LEO).

Regras Orçamentais Novas

Modalidades: (1) Regras de Natureza Procedimental, que pretendem assegurar a transparência


e boa gestão financeira, consistindo na exigência que o Governo se comprometa relativamente
a uma determinada estratégia de política financeira que seja suscetível de monitorização; (2)
Regras de Natureza Numérica, que se referem a alvos específicos quantitativos, procurando
impor certos limites à política orçamental. Podem traduzir-se em exigência em matéria de
equilíbrio orçamental, tanto na sua globalidade como nas situações de equilíbrio do orçamento
corrente, permitindo recorrer ao crédito para financiar investimento público, pela aplicação da
regra de ouro. Estas regras permitem a transparência e imparcialidade, assim como evitam as
delongas associadas a processos de negociação entre o centro e os níveis inferiores de decisão,
mas apresentam falta de flexibilidade podendo encorajar comportamentos que visem contornar
a aplicação das regras (contabilidade criativa).

Uma regra financeira de base deve comportar oito elementos: a) clareza, que impõe a necessária
cobertura institucional e a existência de clausulas de salvaguarda, de forma a evitar
ambiguidades na sua execução; b) transparência e c) simplicidade garantindo estas a
proximidade das decisões tomadas pelo Executivo; d) flexibilidade, representado a necessidade
de adaptação aos choques exógenos que escapam ao controlo politico; e) adequação, ou seja,
necessária conexão entre os meios e os fins; f) coercibilidade, isto é, existência de uma norma
constitucional ou legal, possivelmente acompanhada de sanções pelo não cumprimento e tutela
efetiva, de natureza administrativa ou jurisdicional; g) consistência, que exige adaptabilidade às
medidas de política macroeconómica a tomar; h) eficiência, que prevê que uma regra deve servir
de catalisador para eventuais reformas, assegurando a sustentabilidade das políticas públicas.

Perímetro Objetivo da Regra Financeira de Base: conceito de equilíbrio substancial (corrente-


excluindo as despesas de capital), que se traduz na exigência que o Estado tenha receitas
necessárias para cobrir as despesas sem necessidade de recurso ao Estado; na proibição do
financiamento dos défices como prática reiterada; na manutenção da dívida a níveis constantes,

42
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

de forma a manter as taxas de juro contraentes e criar espaço de manobra para preparação de
uma resposta para outra crise/recessão eventual; na determinação eventual de limites
numéricos aos défices ou a superávides, de forma a evitar desequilíbrios graves.

Perímetro Subjetivo da Regra Financeira de Base: a definição dos sujeitos abrangidos pelas
regras financeiras dependente da delimitação do perímetro de consolidação (pressupõe a
apresentação de um quadro exato- que determinamos através de critérios qualitativos, mais
precisamente de cinco formas de dependência- e fiel à realidade financeira e a determinação do
método de consolidação formal mais adequado- podemos falar de integração global (há
controlo exclusivo de uma entidade por parte de uma entidade pública mãe e, portanto as suas
finanças são agregadas após a eliminação de operações recíprocas), integração proporcional
(contabiliza os contributos financeiros de uma entidade consolidado em função do seu peso no
sistema financeiro público, usado nas entidades sujeitas a um controlo conjunto e não exclusivo
por entidades públicas e/ou provadas) e integração por equivalência (determina-se o montante
equivalente nos títulos e participações no resultado da entidade consolidada, sendo esse
montante integrado por equivalência no estado consolidado da entidade-mãe) e da
consequente homogeneização e eliminação das operações recíprocas.

A regra de base é acompanhada de regras adicionais e ainda de medidas excecionais,


introduzidas com o objetivo de acomodar os choques ou as flutuações cíclicas na economia, que
gozam de autonomia. Podem ainda ser criadas operações com base em fundos de contingência,
isto é, uma autorização contida na despesa agregada principalmente destinada a cobrir e a
antecipar eventos não constantes das previsões orçamentais. É na mesma necessário a
autorização prévia parlamentar para a libertação das verbas em causa.

Novos Princípios Orçamentais:

 Princípio da Estabilidade Orçamental: consiste no equilíbrio das Administrações


Públicas, calculado nos termos da SEC 95, sendo evidentemente uma expressão da
aprovação do PEC. Este princípio é reforçado pelos princípios da solidariedade recíproca
e da transparência orçamental (12º e 19º LEO). A estabilidade implica uma visão de
conjunto, integral, de todo o setor público e é reduto da contabilidade nacional. Este
princípio respeita à fase da execução orçamental (ao contrário do equilíbrio).
 Princípio da Transparência Orçamental: traduz a ideia de informação exata e objetiva
sobre o modo como o Estado utiliza os dinheiros públicos, sobre o curso dos programas
orçamentais e, se possível, sobre os seus benefícios. Este princípio facilita os
mecanismos de controlo orçamental, nos planos político, administrativo e jurisdicional,
de prestação de contras e de responsabilização financeira. Pressupõe ainda a abertura
interinstitucional (governo, parlamento, setores e subsetores do Estado, instâncias
comunitárias). Reforça o papel do Ministro das Finanças, colocado no centro do sistema
de informações do Estado em matéria orçamental.
 Princípio da Solidariedade Recíproca: comprometimento de todos os níveis de decisão
no esforço de estabilidade. É este princípio que justifica que o valor das transferências
do Estado para tais entidades possa ser inferior se as exigências de disciplina orçamental
a isso o obrigarem, assim como a previsão de cortes se os limites de endividamento não
forem cumpridos por essas- a autonomia financeira das entidades fica limitada, perante
as exigências de solidariedade recíproca. Note-se que a contribuição para o esforço de
estabilidade orçamental deve ser feito proporcionalmente pelas entidades das
Administrações Públicas.

43
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

 Princípio da Equidade Geracional: surge da necessidade de avaliação da


sustentabilidade de longo prazo da dívida pública.

Acolhimento das novas regras numéricas na legislação portuguesa: este acolhimento surge das
imposições da legislação comunitária, designadamente PEC, e da necessidade de concretização
dos princípios apresentados anteriormente.

 Regras Procedimentais: aprovação do orçamento de Estado faz-se em articulação com


a aprovação de outros documentos com relevância orçamental que o vinculam ou
condicional (Ex. elaboração e apreciação no Parlamento dos programas de crescimento
e estabilidade e aprovação parlamentar de programação orçamental). Por outro lado, o
processo orçamental reclama a intervenção de diversas entidades, algumas
constitucionalmente previstas e outras sem previsão constitucional, assim como ocorre
uma maior europeização do processo orçamental, intervindo neste as instâncias
comunitárias (relevo para a Comissão).
 Regras Numéricas
o Regras de Saldo ou Equilíbrio: o artigo 20º LEO concretiza a regra do saldo
estrutural ajustado do ciclo e das medidas temporárias, em conformidade com
o objetivo orçamental de médio prazo resultante do PEC. O artigo 22º LEO
concretiza o princípio do desvio significativo, definindo quando existe tal desvio
e as circunstâncias em que o mesmo se justifica.
o Regras de Dívida: prevê-se limites de endividamento na Lei OE para os
subsetores do Estado, podendo estes ser inferiores aos determinados nas leis
de financiamento respetivas, quando tal resulte da necessidade de cumprir o
PEC. O artigo 25º LEO fixa os limites para a dívida pública do Estado.
o Regras de Despesa: o OE está subordinado aos limites máximos de despesa
fixados pela lei de programação orçamental plurianual. Por outro lado, o artigo
20º/6 LEO apresenta outro limite à despesa pública.

Vinculações Externas do OE: estão presentes no artigo 44º LEO. A vinculação dominante é a que
resulta das exigências de disciplina orçamental e de sustentabilidade das finanças públicas
resultante da legislação comunitária aplicável (PEC). Veja-se que o artigo 8º/4 CRP apresenta
uma aplicabilidade direta destas normas, transformando-as em fonte de direito, sendo,
portanto, obvio a necessidade do OE se conformar com estas. O OE está ainda vinculado aos
limites de despesa consagrados nos instrumentos de programação orçamental: quadros
plurianuais (artigo 35º LEO apresenta o Quadro Plurianual das despesas públicas) que fixam,
para o período de programação em causa, limites máximos para a despesa agregada e para a
despesa em cada setor ou área funcional. Existem ainda despesas obrigatórias, isto é, obrigações
decorrentes de lei, contrato ou associadas ao cumprimento de sentenças judiciais. Veja-se que
para que uma despesa possa ser realizada o facto gerador da obrigação da despesa deve
respeitar as normas legais aplicáveis (legalidade genérica) e deve encontrar-se prevista/inscrita
e cabimentada no orçamento(legalidade especifica). O OE acolhe tanto a legalidade genérica
como especifica, visto que pode criar despesa pública, mas por vezes acolhe passivamente a
despesa pública já criada. Não há violação do artigo 105º/2 CRP e 42º LEO quando o OE deixa
de ter dotações suficientes para respeitar obrigações decorrentes de lei ou de contrato, desde
que essas alterações na atribuição dos direitos sejam definidas por lei, sendo as obrigações
decorrentes de lei e de contrato tidas em conta, mas nesses novos termos. O OE é o instrumento
legal por excelência de criação/conformação de obrigações para o Estado. As vinculações
externas mais relevantes são as obrigações decorrentes do cumprimento das regras do PEC (ex.

44
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

Programas de Estabilidade e Crescimento) e os limites de despesa definidos pelo quadro


plurianual da despesa pública.

Podemos falar de “boleias” ou “cavaleiros” orçamentais, ou seja, matérias que não têm um
conteúdo orçamental, mas que por vezes são inseridas no OE. Existem duas teses quanto a este
problema: inconstitucionalidade e irrelevância jurídica. A última apresenta que os cavaleiros
orçamentais não são inconstitucionais, por não beneficiarem do regime jurídico orçamental e,
portanto, não interferindo na repartição de competências definida pela CRP, não beneficiando
das regras especiais de aprovação e caducidade previstas pela CRP para a lei OE. Apesar da LEO
ter integrado algumas matérias como orçamentais, legalizando a prática orçamental, outras
matérias não foram integradas no conjunto apresentado no artigo 41º LEO. Veja-se o caso
relevante do universo fiscal que, permitindo-se que a matéria seja reguada pela lei do OE, evita-
se o exclusivismo orçamental, possibilitando que as alterações ou inovações na área fiscal
possam ser feitas fora do OE. Com esta não integração nas matérias do artigo 41º LEO permite-
se que os deputados e/ou grupos parlamentares tenham capacidade de iniciativa originária (o
que advém também do principio da democracia fiscal que exige que os representantes do povo
aprovem a lei fiscal e tenham também iniciativa desta), visto que as matérias lá apresentadas
estão sujeitas a exigências procedimentais associadas à aprovação do OE, nomeadamente à
iniciativa originária exclusiva do governo. Contudo, o legislador, noutras disposições, afirma a
ideia de que a matéria fiscal é matéria de conteúdo especificamente orçamental e prevê que,
mesmo que a vigência do orçamento seja prorrogada, não são prorrogadas as autorizações
legislativas em matéria fiscal, devendo caducar sempre no final do ano.

Direito de Emenda Parlamentar no domínio orçamental e a sua relação com a “lei-travão”

 O artigo 161º g) CRP apresenta a iniciativa exclusiva do Governo de apresentar a


proposta de Lei de Orçamento de Estado. Veja-se que a exclusividade de alteração
orçamental pode advir do artigo 199º alínea b), por ter a competência de execução
orçamental.
 O Parlamento, no contexto de uma alteração orçamental, não pode proceder a
modificações orçamentais que não se inscrevam na proposta do Governo, isto é, alargar
essas modificações a áreas não pretendidas pelo Governo- não pode proceder a
alterações que extravasem o âmbito da proposta (mas podem aumentar as receitas
numa percentagem diversa da pretendida ou diminuir menos as despesas do que foi
proposto), apenas podendo aceitar ou rejeitar a proposta.
 A lei travão (167º/2 CRP) impede que os deputados, grupos parlamentares e cidadãos
apresentem projetos de lei de alteração, que envolvam o aumento da despesa ou
diminuição da receita, no ano económico em curso. A lei travão tem uma finalidade
ampla, visto que impede tanto leis avulsas do Parlamento que produzam tais efeitos
como emendas feitas pelo Parlamento às propostas de alteração orçamental que
produzam tal efeito. Ora, assim percebe-se que o Parlamento não tenha iniciativa de
alteração orçamental, pois isso iria permitir que se produzissem os efeitos proibidos
pela lei travão.
 Quanto às iniciativas originárias ou supervenientes relativas a legislação avulsa, estas
sofrem de inconstitucionalidade parcial por apenas serem inconstitucionais na medida
em que se apliquem ao ano económico em curso, podendo apresentar projetos de lei
que acarretem esses efeitos para os anos seguintes.

Previsão de receitas a despesas: no que toca às receitas, intervém fundamentalmente o


Ministério das Finanças e quanto às despesas, a sua previsão exige a prévia negociação entre os

45
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

diversos Ministérios. Existem 3 métodos de previsão da receita: (i) tradicional ou empírico:


baseia-se em abordagens de negociação; (ii) método de avaliação direta: adotado
especialmente para receitas novas ou de maior volatilidade, sendo a previsão feita tendo por
base o juízo humano tendo também em atenção elementos técnicos; (iii) método dos modelos:
supõe a previsão ecométrica (técnica de investigação económica que recorre à análise
matemática e à estatística) pelo recurso a equações de regressão. A previsão das despesas é
diferente consoante se trate de despesas já existentes em anteriores orçamentos (faz-se de
forma praticamente automática) ou de despesas novas (faz-se de forma aproximativa). Contudo,
todos os anos, na generalidade dos países, surgem orçamentos suplementares e retificativos
para repor a verdade orçamental permitindo apurar o grau de fiabilidade das avaliações
efetuadas. As causas de imprecisão podem ser factos involuntários (erros técnicos resultantes
de instabilidade da conjuntura económica, dos limites dor modelos econométricos e
mecanismos jurídicos de gestão orçamental) ou factos voluntários (desinformação ou mentira
orçamental- manipulação desleal de valores orçamentais ou inscrição inexata de verbas).

Processo de Aprovação do Orçamento de Estado

A proposta de Lei OE para o ano económico seguinte é apresentada pelo Governo à AR até 15
de outubro de cada ano (exceções artigo 39º LEO). A iniciativa é exclusiva do Governo (161º g)
CRP), na medida em que o OE é o principal instrumento da execução do programa político do
Governo, sendo o Governo que presta contas no final do seu mandato pela execução desse
programa. É o Parlamento que tem a reserva absoluta da votação e aprovação do OE (161º g)
CRP)- decorre do princípio da democracia financeira, cabendo aos representantes dos cidadãos
autorizar politicamente o Governo a conduzir a gestão financeira do país, gerir recursos
financeiros, cobrando receita e realizado despesa pública. A votação da proposta realiza-se 45
dias após a apresentação da proposta. As matérias são discutidas e votadas tanto na
generalidade (a maioria das coisas- articulado e mapas orçamentais) como na especialidade
(criação de impostos ou alterações e extinção aos vigentes, no tocante à incidência, taxas,
isenções e garantias dos contribuintes e as matérias relativas a empréstimos e outros meios de
financiamento; e tudo o que a AR entenda submeter a apreciação na especialidade).

Prorrogação de vigência do OE: em princípio um governo de gestão não pode apresentar uma
proposta de lei OE (186º/5 CRP), mas, excecionalmente, verificando-se manifesta insuficiência
dos meios financeiros previstos no OE anteriores para a prossecução do funcionamento normal
do Estado e da Administração, será possível ao Governo utilizar o seu direito de iniciativa em
matéria orçamental junto da AR apresentando uma proposta de alteração da lei OE. Contudo, é
obvio que esta alteração não pode envolver autorização de despesas para projetos novos ou
decorrentes de alterações de fundo da política económica nem para a cobrança de receitas que
visem financiá-las. A LEO consagra uma prorrogação automática da autorização parlamentar
extensiva para além do final do ano, altura em que caducaria, evitando uma perturbação no
normal funcionamento do Estado em virtude de inexistência do OE (58º LEO). Contudo, exige-
se que para que ocorra prorrogação, o Governo determine por DL o regime orçamental
transitório para o ano em causa. O artigo 58º/1 apresenta as causas que levam a prorrogação
do OE: a) rejeição da proposta de lei OE; b) tomada de posse do novo governo, se essa tiver
ocorrido entre 1 de julho e 30 de setembro; c) caducidade da proposta de lei OE em virtude da
demissão do Governo proponente; d) não votação parlamentar da lei OE. O nº 2 apresenta que
a prorrogação abrange o articulado e mapas orçamentais, assim como os decretos-lei de
execução orçamental, sendo que o nº3 apresente aquilo que a prorrogação não abrange. Por
fim o nº 4 apresenta aquilo que o Governo durante este período pode fazer: emitir dívida

46
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

fundada, conceder empréstimos e realizar outras operações ativas de crédito (com limites) e
conceder garantias pessoais.

Regime da Execução Orçamental: a execução orçamental é da competência do Governo


exclusivamente (199º b) CRP), visto que esta se situa no quadro da competência administrativa
que é do Governo e, porque é no Governo que estão os serviços tecnicamente habilitados a
produzir o OE. Contudo, veja-se que a execução também é assegurada pela função legislativa,
através do decreto-lei de execução orçamental, sendo esta competência de legislar também
exclusiva do Governo. A execução orçamentar é feita, quotidianamente, a todo o momento,
pelos serviços do Estado a que respeita o orçamento. Esta execução obedece a diferentes regras
consoante se trate da execução da receita ou da execução da despesa. O artigo 52º LEO expressa
os princípios de execução orçamental:

a) Orçamento da despesa:
a. Princípio da segregação de funções entre autorização da despesa e autorização
de pagamento;
b. Princípio da legalidade, genérica e especifica;
c. Princípio da tipicidade qualitativa;
d. Princípio da tipicidade quantitativa: exigência do cabimento simples;
e. Despesas com receitas consignadas: exigência do duplo cabimento orçamental;
f. Princípio da utilização por duodécimos;
g. Regras de Economia, Eficiência e Eficácia.
b) Orçamento da Receita:
a. Princípio da segregação de funções entre liquidação e cobrança;
b. Princípio da legalidade genérica e específica;
c. Princípio da tipicidade qualitativa.

Processo Orçamental Subsequente:

 Alterações da competência da AR (59º LEO): a proposta de alteração cabe em exclusivo


ao Governo e a aprovação compete à AR, sendo que a emenda parlamentar na fase
subsequente conhece limites. A AR apenas tem competência tipificada para alterar
alguns mapas de base.
 Alterações da competência do Governo (60º LEO): Governo tem competência residual,
sendo que pode alterar todos os mapas, por exclusão de partes. O 167º/2 (dispositivo
travão) impede de se apresentem propostas de criação que ponham em causa a
configuração do consentimento orçamental na vigência anual do plano financeiro.
 Alterações da competência dos serviços: alterações de pequeno significado.

Orçamentos suplementares: alteração profunda ao programa de dotações inicialmente previsto


e aprovado no Orçamento, tendo por efeito aumentar o montante global das dotações para
autorização e/ou pagamentos quer para financiar uma ou várias ações novas sem que haja
aumento global das dotações.

Orçamentos retificativos: alterações de natureza financeira ou técnica no orçamento sem


provocar um aumento do montante global das dotações e sem prever novas ações.

Fiscalização Orçamental e Responsabilidade Financeira

Princípio da responsabilidade financeira e “accoutability”: o princípio da responsabilidade


financeira está intimamente relacionado com a ideia de accoutability, isto é, a ideia de prestar

47
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

contas. A necessidade de prestar contas envolve tanto os gestores públicos como os


responsáveis políticos principais (membros do Governo). Hoje, é exigido ao gestor orçamental
que cumpra os objetivos traçados para a despesa, estando a prestação de contas relacionada
com a verificação de que em que medida os objetivos traçados foram concretizados, sendo por
isso que o gestor orçamental deverá ser responsabilizado. Por outro lado, os atores políticos
principais podem ser responsáveis pelo incumprimento de regras políticas relacionadas com a
condução da política orçamental e pelo desrespeito das exigências em matéria de disciplina
orçamental.

Modalidades de controlo ou fiscalização orçamental:

 Fiscalização Política (107º CRP): cabe à AR e traduz-se na apreciação anual da Conta


Geral do Estado (controlo à posteriori) e na apreciação ao longo do ano do modo como
o Governo executa o Orçamento e pondo em prática as suas políticas económico-
financeiras (controlo concomitante). Por outro lado, a AR exerce uma fiscalização
política também quando aprova o orçamento de Estado. Na função de fiscalização a
posteriori e concomitante a AR é assistida pelo TC através da emissão de um parecer
sobre a Conta Geral do Estado obrigatório por parte deste, que não é vinculativo, e
através da assistência durante a execução orçamental. A AR pode recusar a aprovação
da Conta Geral do Estado e responsabilizar politicamente o Governo que executou o
orçamento, desde que em funções ainda. Por outro lado, poderá sempre solicitar
informações sobre o modo como se processa a execução orçamental ou votar moções
de censura, que sendo aprovadas, implicam a demissão do governo.
 Fiscalização Administrativa : compete à entidade responsável pela realização da
despesa ou liquidação da receita (autocontrolo), assim como às entidades que lhe sejam
hierarquicamente superiores e de tutela, aos órgãos de inspeção e controlo
administrativo e à Direção Geral do Orçamento. Esta fiscalização está centrada em
aspetos de legalidade e cabimento orçamental sobretudo e é realizada à priori.
 Fiscalização Jurisdicional (107º CRP): está a cargo do Tribunal de Contas que é o órgão
supremo de auditoria integrado no poder judicial. Este dá parecer sobre a Conta Geral
do Estado, fiscaliza a legalidade das despesas públicas e julga as contas que a lei mandar
submeter-lhe.
 Fiscalização e Responsabilidade Financeira: a responsabilização financeira é o resultado
da conjugação do controlo administrativo, político e jurisdicional. Note-se que não é
certo apresentar que o Tribunal de Contas tem o monopólio no apuramento e
julgamento das responsabilidades financeira, na medida em que a sua jurisdição não
abarca a opção política que se relaciona também com a questão da responsabilidade
(ex- consequências de endividamento excessivo por parte das RA são decretas pelo
Ministro das Finanças sem pronuncia do TC e o empréstimo negociado com a Troika não
foi submetido ao TC). .

Tribunal de Contas

O Tribunal de Contas é um autêntico tribunal integrado no poder judicial (209º/1 c) CRP), tendo
uma integração especial, na medida em que não está na dependência do Conselho Superior de
Magistratura. Integra um Presidente (nomeado pelo PR- 133º m) CRP) e 16 juízes. Faz parte,
com o Tribunal de Contas Europeu, da rede europeia de instituições superiores de auditoria. O
Tribunal é organizado e regulado no essencial pela lei nº 98/97- Lei de Organização e Processo
do Tribunal de Contas (LOPTC). O tribunal é o órgão de controlo, de fiscalização e auditoria das
contas públicas, o que se traduz na competência de : a) dar parecer sobre a Conta Geral do

48
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

Estado, incluído a da Segurança Social e sobre as contas das RA; b) fiscalizar previamente a
legalidade e cabimento orçamental dos atos e contratos de qualquer natureza que sejam
geradores de despesa ou representativos de quaisquer encargos e responsabilidades para as
entidades sujeitas ao seu controlo e jurisdição; c) julgar a efetivação de responsabilidades
financeiras; d) realizar auditorias; e) apreciar a legalidade, bem como a economia, eficiência e
eficácia das entidades sujeitas ao seu poder de controlo- não se trata de fazer apreciações de
índole política, mas sim de proceder à avaliação técnica e económica sobre o modo como o
dinheiro público é utilizado e aplicado. Note-se que o TC procede à fiscalização, tanto prévia,
concomitante como sucessiva e pode proceder à aplicação de sanções que a lei manda aplicar
em resultado do apuramento de responsabilidades. Pode ainda formular recomendações. Cabe
a este tribunal a tarefa essencial de credibilização das finanças públicas tendentes à boa e
correta utilização dos dinheiros públicos. São indispensáveis coordenações efetivas entre os
diferentes tipos de fiscalização confiados ao TC e uma colaboração estreita entre os sistemas de
controlo interno da Administração financeira do Estado e a atividade do tribunal, sem esquecer
a fiscalização política da AR.

Competências do Tribunal de Contas:

a) Consultiva
b) Jurisdicional: julga e efetiva responsabilidades financeiras.
c) Fiscalização a priori das despesas públicas: examina e concede o visto ou emite
declaração de conformidade relativamente a diversos atos gerados de despesa.
d) Fiscalização concomitante e sucessiva: recorre à auditoria, avaliando procedimentos
administrativos relativos a atos que impliquem despesa de pessoa e contrato que não
estejam submetidos a visto prévio , verificando as contas das entidades sujeitas à sua
prestação e o seus respetivos sistemas de controlo interno (…).
e) Administrativa (6º lei nº 7/98).

Fundamento do papel do Tribunal de Contas: o controlo orçamental tem como fundamentos


assegurar que o Executivo se mantém dentro dos limites da lei e dos assinalados pelo
Parlamento, através da lei OE, e ainda evitar desperdícios e a má utilização dos recursos
públicos. A responsabilidade constitui um dever e uma sujeição daqueles a quem foram
confiados dinheiros públicos, quer liquidem e cobrem receitas, quer autorizem, confiram ou
paguem despesas- existe uma responsabilidade para com o Estado. Ora, o controlo externo que
o TC exerce sobre essas entidades tem como fundamento informar os cidadãos e os seus
representantes de como são geridos, em vários planos, os recursos financeiros e patrimoniais
que lhes pertencem. É o facto de determinada entidade beneficiar ou de alguma forma se servir
de recursos que pertencem à generalidade dos cidadãos que dá fundamento à existência do TC,
condicionando ainda os limites da jurisdição.

Através dos artigos 214º CRP e 1º (define ao nível legal, as atribuições do Tribunal, a sua missão
e o interesse público que o Tribunal visa realizar, que será o interesse no controlo da legalidade,
de regularidade e da boa gestão dos dinheiros públicos), 5º e 6º LOPTC é possível definir que a
jurisdição do Tribunal incide sobre a generalidade das receitas e das despesas públicas e da
correspondente atividade de gestão, sem que seja possível desassociar da sua competência a
utilização de dinheiros públicos por parte das entidades sujeitas ao seu controlo e jurisdição (a
sua jurisdição baseia-se num critério objetivo- princípio da perseguição do dinheiro e valores
públicos, independentemente da natureza das entidades que os tem à guarda). É, então muito
vasto, o número de entidades sujeito à atuação do TC: toda as entidades que tenham a seu cargo
a gestão de dinheiros ou valores públicos independentemente da natureza jurídica de tais

49
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

entidades. O âmbito da sua jurisdição é ainda condicionado pelo fim de controlo financeiro
desses dinheiros públicos. Portanto, onde inexistam dinheiros públicos, o exercício de funções
de controlo não tem razão de ser. O artigo 2º da Lei nº 98/97 determina que o TC exerce a função
de controlo financeiro e a função e controlo jurisdicional em relação às entidades que fazem
parte do SPA, SPE e também em relação às entidades que gerem ou utilizam dinheiros públicos.
O artigo 2º/1 da LOPTC apresenta as entidades sujeitas à jurisdição e poderes de controlo do TC,
acrescentando o artigo 2º/2 outras entidades também sujeitas essa jurisdição e controlo, entre
as quais se incluem as associações públicas (de entidades públicas, de entidades privadas e de
caráter misto), desde que sejam financiadas maioritariamente por entidades públicas ou
estejam sujeitas ao controlo de gestão de entidades públicas. Há que atender-se à diversidade
de natureza que os vários tipos de associações públicas apresentam, nomeadamente quanto ao
regime financeiro e das suas relações com as finanças do Estado, podendo ter diversos níveis de
sujeição ao TC (ex. academias estão sujeitas a prestação de contas porque são financiadas
diretamente por verbas orçamentais do Estado, mas as ordens profissionais e a Casa do Doutro
já não estão). O artigo 2º/3 LOPTC pretende criar uma cláusula de salvaguarda que permita
sujeitar à jurisdição do TC entidades não abrangidas pelos números 1 e 2 desse artigo, mas
enuncia claramente os princípios que devem guiar a interpretação do âmbito dessa mesma
jurisdição: (i) definição da jurisdição do TC reside na garantia da boa gestão dos dinheiros e
valores públicos; (ii) a sua atuação, enquanto forma de controlo externo sobre a gestão de
outras entidades, deve cingir-se ao necessário para assegurar a fiscalização da legalidade,
regularidade e correção económica e financeira dos dinheiros e valores públicos.

Competências das Secções do Tribunal de Contas

 1º Secção (visto):exerce as competências de fiscalização prévia e concomitante de atos


e contratos, podendo, em certos casos, aplicar multas e relevar responsabilidade
financeira. Realiza o acompanhamento próprio do ato ou contrato que está submetido
a visto. O visto ou declaração de conformidade é o ato do tribunal através do qual se faz
a apreciação da generalidade dos factos ou atos de despesa que devem ser validade
realizados, desde que obedeçam à legalidade e ao cabimento orçamental. O visto é
condição para a produção de efeitos do ato. O visto trata-se de um ato através do qual
se assegura um controlo de legalidade de decisões com implicações financeiras. As
decisões sobre o visto constituem caso julgado material, ou seja, são insuscetíveis de
ser reapreciados, depois de esgotados os mecanismos de recurso. Os vistos são de
legalidade. Existem atos sujeitos a visto que podem produzir todos os seus efeitos antes
da respetiva emissão, exceto no que respeita aos pagamentos (45º/1). A recusa desse
visto implica a ineficácia desses atos após a notificação aos interessados, mas nessa
situação, o visto não é considerado uma condição de eficácia, sendo que o contrato ou
ato produzem efeitos até à recusa do ato, pois essa implica a anulação do ato
(normalmente retroativa). Quais são as principiais causas de recusa do visto? Contratos
qualificados como trabalhos a mais, contratos celebrados na sequência de ajustes
diretos, em que são verificadas as condições legalmente impostas para este tipo de
contratação, contratos celebrados após o concurso, sendo verificada a existência de
cobertura orçamental para a despesa e ou falta de inscrição no plano plurianual de
investimento. O visto poderá ser emitido com recomendações, ou seja, é atribuído o
visto, mas devem ser tido em conta um determinado conjunto de situações,
nomeadamente a utilização adequada do conceito legal de trabalho a mais, a abertura
de concursos na legalidade, a consulta do número de entidades legalmente exigível,
necessidade de indicação do preço, entre outras.

50
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

 2º Secção (auditoria): exerce a fiscalização concomitante e sucessiva da atividade


financeira, podendo ainda, nos casos previstos na lei, aplicar multas e relevar a
responsabilidade financeira. Composta por juízes e economistas, englobando uma
componente de apreciação da economia, eficiência e eficácia dos atos. Formula
recomendações, podendo algumas destas ser encaminhadas para o MP para um
eventual apuramento de responsabilidades financeiras. A fiscalização concomitante
tem uma componente preventiva e pedagógica e de acompanhamento de ação e é
corporizada no relatório de auditoria. A não submissão do contrato implica a
responsabilidade sancionatória, isto é, será aplicada uma multa. Em sede de auditoria,
o TC tem identificado certos problemas que levam a recomendações e reservas, tais
como: no âmbito de contratos de pessoal: violação das regras aplicadas ao
recrutamento e seleção de pessoal; não identificação atempada dos critérios de
apreciação curricular; manutenção da nomeação em regime precário para além do
prazo; informação de cabimento de verbas incorretamente prestada; no âmbito do
contrato de prestação de serviços, a utilização deste tipo de contratação para titular de
relações de trabalho subordinado e recurso ao ajustamento direto sem fundamento
legal.
 3º Secção (julgamento): exerce a função jurisdicional, procedendo ao julgado dos
processos de efetivação de responsabilidades financeiras e de multa, a requerimento
das entidades competentes. Tem bastante relevância a responsabilidade financeira
reintegratória, ou seja, a responsabilidade que obriga os responsáveis de repor os
montantes determinados na lei, apurados objetivamente em função dos factos que
constituem os pressupostos da responsabilidade. É o Tribunal de Contas que tem
competência para efetivar a responsabilidade financeira, devendo esta ser requerida
pelo MP, independentemente de outras responsabilidades que possam emergir dos
mesmos factos (civil, penal e disciplinar). O artigo 59º da LOPTC determina que o
Tribunal pode condenar o responsável dos casos de alcance (independentemente da
ação do agente nesse sentido, desaparecimento de dinheiros ou valores do Estado ou
outras entidades públicas), desvio de dinheiros e valores públicos (desaparecimento por
ação voluntária de qualquer agente público que a eles tenha acesso por causa do
exercício de funções públicas que lhe estão cometidas) e de pagamentos indevidos
(pagamentos ilegais que causarem dano para o erário público, incluindo aqueles a que
corresponde contraprestação efetiva que não seja adequada ou proporcional à
prossecução das atribuições da entidade em causa ou aos usos normais de determinada
atividade), a repor as importâncias abrangidas pela infração, sem prejuízo de qualquer
outro tipo de responsabilidade em que o mesmo possa incorrer. Pode existir reposição
ainda por não arrecadação de receitas, isto é, quando ocorra autorização ou
sancionamento, com dolo ou culpa grave, que impliquem a não liquidação, cobrança ou
entrega de receitas com violação das normas legais aplicáveis (ex. funcionário deixa
passar prazos de caducidade (4 anos) e prescrição (8 anos)). No entanto, a punição que
existe nestes casos passa mais pelo procedimento disciplinar do que pela via da
responsabilidade financeira. Os destinatários da reposição serão, segundo o artigo 61º
LOPTC, o agente ou agentes da ação ou ainda os funcionários ou agentes, que nas suas
informações para os gerentes, dirigentes ou outros administradores não esclareçam os
assuntos da sua competência de harmonia com a lei, desde que essa ação seja praticada
com culpa. A responsabilidade financeira sancionatória consiste na aplicação de uma
multa ao responsável. Esta não é uma alternativa à responsabilidade financeira
reintegratória, podendo ambas ser aplicadas no mesmo caso. O TC avalia a culpa e o seu

51
Inês Godinho 2019/2020 2º Semestre

grau de acordo com as circunstâncias do caso. Em caso de negligência, o Tribunal pode


reduzir ou relevar a responsabilidade em que houver incorrido o infrator, devendo fazer
constar da decisão as razões justificativas a redução ou da revelação.

Conselho das Finanças Públicas

Nas alterações recentes da LEO, observamos a criação de uma entidade administrativa


independente que tem como missão pronunciar-se sobre os objetivos propostos relativamente
aos cenários macroeconómico e orçamental, À sustentabilidade de longo prazo das finanças
públicas e ao cumprimento da regra sobre o saldo orçamental, da regra da despesa da
Administração Central e das regras de endividamento das RA e das AL. Veja-se a dificuldade de
compatibilizar as competências atribuídas à AR e ao TC com esta entidade.

52

Você também pode gostar