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Relações Internacionais, conforme se pode depreender do próprio termo, são as relações que
se desenvolvem entre as nações. Muito embora o significado de nação varie ao longo da história da
humanidade, com o advento da Idade Moderna e do Capitalismo, observa-se uma identificação entre
nação e Estado. Isso ocorre porque o Estado, preenchendo os requisitos necessários à circunscrição da
realidade nacional, entendida como o conjunto das aspirações e dos desejos compartilhados por um
grupo de mesma história e geografia e, acima de tudo, de uma identidade definida por uma série
variada de elementos, como idioma, etnia e cultura comuns, aparelha a nação na defesa de seus
interesses, que naturalmente se excluem dos interesses de outras nações.
É por essa razão que muitas vezes se confundem relações internacionais e política
internacional. Tal confusão não parece totalmente descabida, pois a política é o campo do
conhecimento que procura compreender o fenômeno do poder e as relações internacionais são a esfera
da realidade em que se manifestam relações de poder, basicamente entre Estados.
As relações internacionais, contudo, estão manifestas em diferentes campos da realidade,
podendo-se resumi-los para efeito de análise em: diplomático, militar, econômico, psicossocial e
político propriamente dito, e são desenvolvidas por autores que não exclusivamente o Estado.
Nesse sentido, a compreensão das relações internacionais passa necessariamente pelo estudo
das relações sociais em suas diferentes dimensões compreendidas por áreas especifica de
conhecimento, como Política, Sociologia, Economia, Direito, História, Geografia e Psicologia entre
outras, mas com um aporte interdisciplinar. Por esse motivo, as teorias sobre as relações internacionais
desenvolvem-se com o próprio desenrolar dessas relações, assumindo, por conseguinte, caráter
dinâmico e novas conformações, pois invariavelmente incorporam novos elementos de análise, de
acordo com o desenvolvimento histórico da sociedade humana.
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Com base no que se disse anteriormente, pode-se pensar que as teorias sobre as relações
internacionais se desenvolvem sem maior fundamentação e como resposta às ocorrências do sistema
de relações internacionais.
É, contudo, fundamental, salientar que o estudo das relações internacionais vem de longa data
e manifesta-se de forma clara no pensamento de Thomas Hobbes (1588-1679). No entanto, o estudo
das relações internacionais, como campo de conhecimento autônomo, só começou a atingir tal status a
partir da década de 1950 e, não por acaso, como resultado do maior conflito de toda a história da
humanidade que, dividindo o mundo em dois blocos, configuraria a era do terror nuclear, levando a
comunidade dos cientistas sociais a concentrar esforços na compreensão da realidade externa às
sociedades nacionais.
A partir daí vem se observando uma profusão de teorias, com características identificadas com
os diferentes quadros apresentados na realidade das relações internacionais, cuja compreensão é
dificultada para aqueles que pretendem iniciar-se nesse estudo.
Assim, adota-se para efeito didático deste livro o critério de Marcel Merle, autor de obra
consagrada sobre a Introdução ao estudo das relações internacionais, Sociologia das relações
internacionais, para definir o escopo do conhecimento nas relações internacionais segundo três
concepções dessas relações, amparadas fundamentalmente nas grandes correntes metodológicas
consagradas no campo das ciências sociais.
Thomas Hobbes é a principal referência dessa escola por ser o primeiro grande pensador de
uma teoria que encontra sustentação na realidade das relações internacionais. É considerada sua
grande obra o Leviatã (1651), produzida no auge das Revoluções Sociais e, portanto, em um momento
de afirmação do Estado moderno inglês.
Segundo Hobbes, o poder soberano é absoluto, isto é, não há bem nem mal no exercício do
poder, sendo este pura e simplesmente a manifestação das razões de Estado. Para esse pensador, o
homem vive em “estado de natureza”, ou seja, sua necessidade de possuir ou de defender sua
propriedade leva a um estado de permanente beligerância. O que o impede, no entanto, de permanecer
nesse estado de permanente conflito é a percepção de que isso implica riscos muitos sérios à sua
sobrevivência, o que o obriga, por força da razão ou pela imposição da vontade de um homem mais
forte – possibilidade mais forte para Hobbes -, a assumir um “contrato” que define seus direitos e
deveres. A prerrogativa desse “contrato” é a base do poder do “soberano” ou do “Estado”. A
superação do “estado de natureza” se faz pela instituição do “estado de sociedade”.
Ainda segundo o pensamento de Hobbes, tal situação pode ser estendida à esfera das relações
entre as nações, isto é, à esfera das relações internacionais. Contudo, neste caso, o “estado de
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sociedade” não pode ser estabelecido com clareza. O “estado de natureza” é uma característica do
sistema internacional.
O pensamento de Hobbes está vivo ainda nos dias de hoje e é responsável pelo
desenvolvimento de importantes escolas de pensamento sobre as relações internacionais, destacando-
se entre elas as de Clausewitz e Aron, que diferenciam de acordo com a perspectiva antagônica que
assumem diante das questões colocadas por Hobbes em relação ao sistema internacional. Essas podem
ser descritas como: idealistas – que crêem que o “estado de natureza” pode ser superado pelo
estabelecimento de um “pacto” – e realistas – que julgam que um equilíbrio e certa estabilidade no
sistema internacional só podem ser alcançados pelo equilíbrio de forças.
A concepção “clássica” é, em conclusão, uma teoria que destaca a guerra como um fenômeno
fundamental e característico das relações internacionais ou do sistema internacional.
A principal referencia das relações internacionais é Karl Marx. Seus trabalhos bastante
conhecidos, por si só, considerando a verdadeira revolução que suscitaram no campo do conhecimento
cientifico, justificam uma incursão relativa à questão das relações internacionais.
Marx não construiu uma teoria de relações internacionais, mas seu pensamento ensejou o
desenvolvimento de uma concepção dessas relações. Para Marx, a história das sociedades é
determinada pelas relações sociais de produção que nelas se estabeleçam e que, no caso do
capitalismo, caracterizam-se pelos antagonismos de classes (o controle da propriedade dos meios de
produção determina as classes capitalista e trabalhadora assalariada). Esse pensamento guarda uma
relação com o pensamento de Hobbes, mas, na medida em que estabelece um vínculo entre a
economia e a política, anuncia a natureza diversa dos conflitos que se podem estabelecer nas relações
entre os homens.
Como o Estado nacional, que interage com o sistema internacional, é para Marx o estado
burguês, isto é, o aparelho governamental que representa os interesses do grupo dominante das
sociedades capitalistas, as relações que se estabelecem no sistema internacional são relações que
tendem a se perpetuar. Os conflitos entre tais Estados são temporários. O verdadeiro conflito que pode
ser visualizado no sistema internacional diz respeito à própria essência do capitalismo que se refere à
luta entre classes.
Para Marx, enquanto houver capitalismo haverá Estados nacionais, mas tal sistema tende a se
extinguir, pois a história revela que todos os sistemas anteriores, ao atingirem o completo esgotamento
de suas relações sociais de produção, entraram em colapso e foram superados pela instituição de novos
sistemas.
A concepção marxista de relações internacionais revela, portanto, um aspecto interessante, que
diz respeito à manifestação das relações conflitivas do sistema internacional. Distinta da concepção
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clássica e marcada pela economia, essa concepção se preocupa com a possibilidade de extinção ou
modificação da figura do Estado nacional como ator privilegiado do sistema, antecipando algumas
situações vivenciadas nos dias atuais e conferindo maior flexibilidade à análise da realidade das
relações internacionais na medida em que concebe a guerra como uma questão não exclusiva do
Estado.
A concepção moderna das relações internacionais tem como principais referências Hans
Morgenthau, George Kennan, Henri Kissinger e Stanley Hoffmann. É uma concepção que se pretende
mais científica e, por isso, recusa o apriorismo da teoria clássica e o determinismo marxista. Por ser
herdeira do positivismo, é mais pragmática e pretende analisar a realidade de acordo com sua
configuração e necessidades. Coloca-se na perspectiva descritiva, e suas possibilidades em termos
perspectivos se realizam sobre uma metodologia estatística bastante refinada.
Pela herança positivista, a concepção “moderna” também carrega uma visão orgânica, ou
sistêmica, da realidade. Assim, essa escola imagina que todas as coisas, assim como as pessoas, têm
seu comportamento definido a partir de leis da natureza, constituindo organismos ou sistemas cujo
funcionamento deve ser observado pela ciência. É por isso que essa escola também é chamada de
“funcionalista” ou “behaviorista”. Dessa forma, o conhecimento do funcionamento das coisas deve
assegurar o conhecimento das leis que o regem e, por conseguinte, dos organismos ou sistemas que
constituem a realidade. A atividade fundamental do cientista é, portanto, a observação, pois, além de
ser uma atitude neutra, ela garante a existência real de um fenômeno.
Transplantando tal idéia para o campo das relações internacionais, tem-se que, como
organismo, esse sistema está sujeito a uma série de leis definidas por sua própria natureza, que podem
ser conhecidas pela observação incessante e aguda de seu funcionamento.
Começa-se, portanto, com uma observação dos atores que compõem esse sistema e dos fatores
que influenciam sua ação, para, a partir daí se construir um quadro de relações que caracterizam, ou
são, o próprio sistema. Lança-se mão, para tanto, dos recursos estatísticos de descrição da realidade
(por exemplo, na comparação entre o poder das nações, leva-se em consideração dados relativos a PIB
– Produto Interno Bruto – capacidade militar, território, população etc.).
Contudo, há aí uma dificuldade, que se refere à impossibilidade de se mensurar todos os tipos
de relações e interações que ocorrem na realidade e sua freqüência, o que obriga os adeptos dessa
concepção, ou escola, a um esforço de desenvolvimento de métodos estatísticos cada vez mais
sofisticados, mas que, no limitado, significam sempre uma redução dos problemas reais que implicam
as relações entre seres humanos.
A concepção “moderna”, a despeito de alguns problemas metodológicos (para alguns
ideológicos), significa um avanço para o conhecimento das relações internacionais e revela a
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necessidade de constante avaliação das perspectivas teóricas perante os movimentos reais que ocorrem
na esfera dessas relações. Essa concepção, portanto, leva ao extremo as características de mobilidade e
mutabilidade de sistema, já anunciadas na concepção marxista, assumindo ela mesma um caráter
plenamente dinâmico. Além disso, as técnicas descritivas da realidade desenvolvidas por essa escola
mostram-se perfeitamente adequadas às necessidades de desenho de um sistema a partir do qual se
possam programar interpretações e análises resultantes.
Para o mais fácil entendimento da realidade internacional é importante que se realize um recorte
histórico a partir do qual possa se aprender a lógica que tem caracterizado as relações internacionais.
Para tanto é destacado a seguir o desenvolvimento de dois aspectos inter-relacionados da realidade
internacional a partir do término da Segunda Guerra Mundial, de maneira a se reconstruir a dinâmica
que daria conformação ao sistema internacional e seus desdobramentos atuais. Esses aspectos referem-
se à economia e á política e estratégia mundiais.
Genericamente, pode-se afirmar que, com o término da Segunda Guerra Mundial, o mundo
dividiu-se em dois grandes blocos, Ocidental e Oriental, despontando como seus lideres os Estados
Unidos e a União Soviética, respectivamente.
As relações políticas e econômicas mundiais a partir de 1945 se encontrariam envoltas em
novo clima de guerra, e a justificativa para esse fato se basearia para os Estados Unidos na idéia de
que a riqueza gerada pelas Instituições livres ocidentais seria mais do que suficiente para enfraquecer
o crescente poder soviético ou oriental. Mas isso não descartava a necessidade de prontas respostas
militares às “agressões soviéticas”, consolidando a assim denominada Política de Contenção.
A recuperação européia e japonesa, além da ausência de desenvolvimento significativo das
regiões pobres, contudo, frustrou as perspectivas norte-americanas, instalando a possibilidade de um
jogo político “pendular” entre os países pertencentes ao sistema ocidental.
A resposta a essa situação, em um primeiro momento, adquiriu um caráter mais radical,
implicando um aprofundamento das tensões no campo militar e gerando o chamado “terror nuclear”.
A partir da década de 1970, contudo, seria desenvolvida a “consciência” da necessidade de redução de
tais tensões, começando-se a promover a noção de interdependência que viria a assentar o movimento
da globalização.
necessariamente à pobreza de outros. Essa situação pode ser descrita como jogo de soma
zero.
2. A segunda vertente refere-se à Teoria da Interdependência. Essa teoria, contudo, pode
ser resumidamente dividida, segundo duas diferentes perspectivas, em: Interdependência
Simétrica (ou pura) e Interdependência Assimétrica. No primeiro caso, a teoria baseia-se
nas idéias de David Ricardo e em sua Teoria das Vantagens Comparativas,
fundamentando-se na especialização econômica das nações e nas vantagens resultantes das
trocas obrigatórias entre os países, repartindo-se de forma igualitária os ganhos desse
processo. Já no segundo caso, Roberto Keohane observa que as trocas que ocorrem
obrigatoriamente entre as nações, como resultado do desenvolvimento histórico do sistema
internacional, apresentam ganhos, de fato, mas que repartem de forma diferente da
apresentada pela teoria clássica de Interdependência (Simétrica) e, portanto, não
igualitária, caracterizando uma situação para o sistema internacional que pode ser descrita
como jogo de forma variável.
Muitas vezes há uma confusão entre relações internacionais e política externa. A relação entre
as duas é necessária e natural, uma vez que as relações internacionais podem ser consideradas o
produto das ações externas dos Estados nacionais. Contudo, a diferenciação entre esses dois elementos
é fundamental para que se compreenda a natureza das situações e os constantes conflitos estabelecidos
no cenário internacional. Este item tem por objetivo explicar o significado de política externa e seu
desenvolvimento no caso brasileiro.
A elaboração de uma política externa pelos Estados deve considerar, portanto, duas condições
fundamentais: internas e externas. As motivações políticas internas de uma sociedade são
extremamente importantes para a condução dos negócios de Estado, de tal forma que as relações com
outros Estados com a concordância da sociedade nacional. Entretanto, por mais legitimadas
internamente que estejam ações de um Estado, elas somente encontram possibilidade de
implementação se as relações internacionais como um todo se apresentarem receptivas a elas.
Nesse sentido, o processo racional de implementação da política externa deve considerar os
seguintes passos:
- Diagnóstico. Análise dos ambientes políticos nacional e internacional, com todas as
variantes possíveis.
- Levantamento de alternativas. Elaboração de alternativas de curso de ação.
- Tomada de decisão. Escolha do melhor curso de ação e forma de implementação.
- Implementação. Disponibilização e acionamento dos meios para a implementação.
- Acompanhamento. Avaliação do curso de ação.
- Correção. Em caso de necessidade, aplicação dos recursos e adoção das medidas necessárias
à mudança de curso de ação.
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Entretanto, em muitos casos e por uma série de razões – entre as quais, o desenvolvimento de
métodos precisos para desenvolver ações semelhantes -, as organizações nem sempre conseguem
alcançar o sucesso desejado.
É por isso que a elaboração de projetos para o desenvolvimento de ações internacionais
assume fundamental importância, configurando-se como alternativa para o levantamento de recursos
necessários ao desenvolvimento de projetos de relevância para um país.
Até meados do século XX, ou mais exatamente até a Segunda Guerra Mundial, o sistema
internacional esteve marcado pelas relações interestatais e individuais (interempresariais). A partir daí,
as mudanças dos cenários político, econômico e social mundiais, imprimindo novo perfil a sociedade
internacional, muito influenciado por uma nova categoria de atores: as organizações supra, multi ou
transnacionais.
Mais do que por uma questão de fato, o direito internacional passou a ter novas atribuições,
ampliando sua esfera de atuação. Com isso, evidentemente, se quer dizer que, a partir da Segunda
Guerra mundial, passou a se desenvolver uma concepção ética das relações internacionais que, mesmo
que ainda não hegemônica, revela uma nítida consciência dos problemas relativos à assimetria que
preside os relacionamentos entre os países que compõem o sistema. Essa, inclusive, foi à tônica que
engendrou a figura da cooperação internacional na Carta das Nações unidas, em seu artigo 56.
Naquele momento, contudo, a cooperação internacional assumia um caráter assistencialista. As
atividades de cooperação recebiam mesmo a denominação de assistência técnica, prevendo-se sempre
situações em que um país seria exclusivamente recebedor de conhecimentos e outro exclusivamente
fornecedor deles. Ainda, é bom que se frise, os conhecimentos ministrados estavam restritos às
técnicas, nunca à ciência e à tecnologia.
É obvio que, em vez de ajudar a superar as condições de subdesenvolvimento de grande parte
dos países, muitas vezes as atividades de cooperação aprofundavam essas condições, pois reforçavam
laços de dependência. Todavia, com o prenúncio do colapso da ordem estabelecida no pós-guerra, o
conceito de cooperação passaria a ser objeto de reformulação, alcançando hoje o significado de
operação conjunta entre países ou entre os diversos sujeitos do direito internacional.
Dessa maneira, ainda que conservando a condição básica de uma relação de doação e recepção
de conhecimento, a cooperação internacional incorporaria a noção de reciprocidade. Da mesma forma,
a concepção de conhecimento passaria por um processo de ampliação no campo da cooperação
internacional, estendendo-se às áreas da ciência e da tecnologia.
Na realidade, partia-se da hipótese de que nenhuma atividade de cooperação pode ser situada
em um quadro no qual existam fornecedores ou recebedores exclusivos, pois o conhecimento devia ser
considerado o fruto de uma operação de construção em parceria. Promovida por organismos
internacionais de caráter oficial, a cooperação passou a ser, portanto, uma importante via para o
desenvolvimento de processos de internacionalização de um sem-número de organizações.
Consequentemente, esse processo hoje se estende por uma gama variada de organizações não-estatais.
Há, tradicionalmente, dois tipos de cooperação internacional definidos pelos agentes envolvidos:
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