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EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA COMARCA DE BELA VISTA

DE GOIÁS-GO

PROCESSO°: 505734-12.2011.809.0017

RÉU: Adriano Meireles Caixeta

NATUREZA: Alegações Finais

ADRIANO MEIRELES CAIXETA, já qualificado nos


autos, através de sua defensora nomeada que a esta subscreve, vem,
respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, nos autos da Ação Penal em
epígrafe, que lhe move o Ministério Público do Estado de Goiás, com fulcro no art.
403, parágrafo 30, do Código de Processo Penal, para apresentar seus
MEMORIAIS, pelos motivos de fato e de direito a seguir expostos:

DOS FATOS

O Ministério Público do Estado de Goiás denunciou


Adriano Meireles Caixeta, com fulcro no art. 121, parágrafo 2°, inc. II c/c art. 14, inc.
II, ambos do Código Penal. A denúncia foi recebida em 29 de janeiro de 2013 (folha
57 dos autos físicos), por este Juízo foi recebida. Consta que no dia 02 de setembro
de 2011, Adriano Meireles Caixeta e Joad silva de Souza estavam no bar Toca da
Pelota. Em certo momento, teriam se desentendido com Ueuber Bastos Soares,
sendo que este pegou um pedaço de madeira para atacar Adriano e Joad, estes,
para se defenderem, armaram-se com uma faca e teriam desferido golpes de faca
na região do abdômen de Ueuber. Após a confusão, os envolvidos não foram
encontrados no local.

No próprio despacho de recebimento da denúncia,


determinou-se a citação de Adriano, a qual foi cumprida em 19 de fevereiro de 2013
(folha 79 dos autos físicos), onde, neste ato, Adriano solicitou que lhe fosse
nomeado um Defensor Público, no qual foi nomeado em 13 de julho de 2013. Ato
contínuo, Adriano, representado por seu defensor, apresentou defesa preliminar. Em
02 de junho de 2014, a juíza, em sua decisão, apontou que na defesa nenhuma
prova havia capaz de justificar a absolvição sumária e foi designada, neste mesmo
ato, a audiência de instrução e julgamento (folha 93). Na audiência, Adriano foi
considerado revel e sua prisão preventiva foi decretada. O mandado de prisão foi
cumprido, porém fora revogado em 06 de abril de 2015, pelo fato de que mãe de
Adriano informou o endereço residencial do filho, ou seja, a alegação de que se
encontrava em local incerto e não sabido já não poderia prevalecer.

Já na segunda audiência, a suposta vítima não


compareceu (folha 238). Posteriormente, dona Alzenia, compareceu novamente em
Juízo para informar o novo endereço do acusado Adriano, seu filho. Em 2020 houve
nova audiência, onde a vítima foi ouvida como informante, tendo o depoimento
gravado e juntado como mídia aos autos eletrônicos. Em 15 de abril de 2020, o
Parquet apresentou Alegações Finais. Agora, devidamente intimada, a defesa vem,
por intermédio de sua advogada, apresentar Memoriais.

DO DIREITO

OS DEPOIMENTOS

A versão da testemunha Cleiber Dias Araújo, que


presenciou os fatos, a qual não foi ouvida em audiência porque o Ministério Público
dispensou a oitiva (fls. 406, 416 e 417), mesmo a tendo arrolado na Denúncia, é
totalmente diversa da versão contada por Ueuber e por Melck Damasceno Silva, que
não presenciou o início da briga. Segue o depoimento de Cleiber:
Na manhã do dia 02-09-11, por volta das 07:00 horas da
manhã o depoente estava fritando salgados e percebeu
em que em uma das meses do estabelecimento estavam
três rapazes, sendo eles, um apelidado de "Fiuca", mas o
depoente não sabe informar o nome do mesmo, outro
apelidado de "Pit-Bul", mas também tem o apelido de
"Biba" e o terceiro o depoente não conhecia e nem era
freguês do bar; que, em dado momento, os três iniciaram
uma pequena discussão entre eles, percebido que "Biba"
pegou um pedaço de pau e começou a agredir os dois
rapazes que estavam com ele na mesa; que o depoente
percebeu que um dos rapazes que estava na mesa e
brigando com o “Biba” foi até a uma moto que estava
estacionado do lado de fora do bar, retornando com um
faca não e foi logo esfaqueando "Biba", que saiu correndo
para o lado de onde estava o depoente e naquele
momento o depoente percebeu que ele estava todo sujo
de sangue; que imediatamente o depoente ao perceber
que "Biba" estava ferido ajudou o mesmo a entrar no
carro de Melke e este o conduziu para o hospital; que
após agredir "Bida", os dois rapazes que estavam
brigando com ele, pegaram a moto e fugiram do local; que
o depoente informa que "Biba" e seus dois companheiros,
estiveram no estabelecimento durante toda a noite, mas
não gastaram nada, somente ficaram procurando briga
com os outros fregueses.

Os depoimentos dos réus coincidem no sentido de


esclarecimentos dos fatos. O acusado não foi ao carro pegar a faca. O acusado
usou uma faca que estava no balcão.

Já o depoimento da testemunha Melck em audiência não


coincide com seu depoimento na Delegacia. Além de que, a própria vítima o acusa
de ser mandante do ocorrido, o que traz o descrédito da testemunha ou a não
confiabilidade da própria vítima em toda a sua declaração. Inclusive, diz que
conhecia Joad e Ueuber, o que, automaticamente, faz com que este fique favorável
à eles e desfavorável à Adriano, pois não iria incriminar os seus amigos.

As declarações da suposta vítima em audiência não


coincidem com as declarações prestadas na Delegacia. Na audiência ele afirma ser
amigo de Joad, logo a única pessoa que resta como alvo para que ele acusa é o
Adriano. Cleiber alegou que Adriano pediu desculpas por estar sendo envolvido na
confusão e disse que ele é seu primo, ou seja, eles possuem um alto vínculo afetivo.

Ueuber disse que Joad, antes do momento das facadas,


falou a seguinte frase: “eu falei pra você, eu falei pra você”, soando como uma
ameaça, o que aponta este como, também, o autor do crime. Também alegou que
tem muitas dúvidas referente ao fato, pois desconfia que foi Melck é o mandante
para que ele fosse esfaqueado, o que corrobora com seus depoimentos divergentes
em Juízo e na delegacia. Inclusive, ajudando Ueuber no seu socorro, possivelmente,
a fim de camuflar sua culpa no crime.

Melck, em momento algum, em Juízo, afirmou ter


tentando separar a briga, muito pelo contrário, disse que chegou depois que a briga
já estava quase terminando. Na delegacia Melck disse que a facada foi desferida por
Joad, já em Juízo, disse que o responsável pelos golpes é Adriano, o que parece
que este está, todo o tempo, tentando colocar a culpa em alguém e se esquivando
de uma eventual responsabilidade.

DA LESÃO NA SUPOSTA VÍTIMA

A vítima deu entrada no Hospital de Urgência de Goiânia,


na data de 02.09.2011 e teve alta em 04.09.2011, conforme demonstra o atestado
médico (fls. 31 e 32 dos autos), o que o desmente no seu depoimento na Delegacia ,
onde o mesmo afirma ter ficado internado durante quatro meses, mas o médico, em
seu laudo, afirmou ter sido apenas dois dias. O laudo demonstra que a lesão não
teve maior gravidade e indica a ausência do dolo, do animus necandi, ou seja, o
acusado não teve intenção de matar.
DA LEGÍTIMA DEFESA

No depoimento do acusado na Delegacia, depoimento


confirmado por Joad Silva de Souza e, também, pela testemunha Cleiber Dias
Araújo, o réu agiu em legítima defesa, pois a suposta vítima estava atacando com
um pedaço de pau a ele e Joab. Que o acusado pegou a faca no balcão e desferiu a
facada. Se quisesse matar a vítima o teria feito, mas seu único intuito era se
defender. No Manual de Direito Penal – Parte Geral, de Pacelli e Callegari, os
autores apontam que ela está necessariamente vinculada a situações em que
há agressão praticada por uma pessoa. Ou seja, uma pessoa é o agressor e outra é
a agredida, que vai se defender por meio da legitima defesa, o que se encontra
previsto no Código Penal brasileiro, em seu art. 25, caput, e o que se amolda
perfeitamente ao caso concreto, pois, o uso do meio que Adriano usou para se
defender fora moderado, já que Ueuber ficou apenas algumas horas no hospital,
sem correr nenhum risco de morte.

DA QUALIFICADORA DO INCISO II, PARÁGRAFO SEGUNDO DO ARTIGO 121

O motivo fútil é uma circunstância agravante que


determinam maior gravidade da culpabilidade. Figuram, também, como
circunstâncias qualificadoras do delito de homicídio (art. 121, § 2.º, I e II, CP). Motivo
fútil é aquele insignificante, flagrantemente desproporcional ou inadequado se
cotejado com a ação ou a omissão do agente. (PRADO, Luiz Regis. Curso de
Direito Penal Brasileiro. 13. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. p. 430).
Motivo fútil é o motivo de mínima importância, manifestamente desproporcional à
gravidade do fato e à intensidade do motivo.

Porém, não se trata de motivo fútil, pois Adriano apenas


reagiu diante de uma provocação que lhe era feita, conforme o depoimento de
Cleiber, que foi a única testemunha que presenciou integralmente o fato, apesar de
ter resistido por um momento, o grau de provocação foi aumentando, sendo que
Adriano não conseguiu se conter e começou a responder às provocações de
Ueuber.
DA POSSIBILIDADE DE DESCLASSIFICAÇÃO

Não há provas suficientes que demonstram a presença do


animus necandi na conduta do agente. O Ministério Público não conseguiu provar a
intenção de matar por parte do acusado. Conceito e exemplo prático de
desclassificação de que se trata o Código de Processo Penal Brasileiro, tem o
sentido de mudar a classificação jurídica do crime, mudar a imputação inicial,
operar uma mutatio ou emendatio libelli, que se opera e verifica por vários modos,
quer por errônea classificação jurídica do Ministério Público na denúncia, quer por
errônea avaliação dos fatos, quer por mudança dos fatos durante a instrução
criminal. O que se amolda perfeitamente no caso em comento.

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – CRIME DE TENTATIVA DE


HOMICÍDIO QUALIFICADO (ART. 121 , § 2º , INCISOS I , III e IV , C/C
ART. 14 , INCISO II , DO CP ) EM CONEXÃO COM OS DELITOS DE
AMEAÇA (ART. 147 DO CP ) E DESOBEDIÊNCIA (ART. 330 DO CP )–
SENTENÇA DE PRONÚNCIA – PRETENDIDA A DESCLASSIFICAÇÃO DO
CRIME DE TENTATIVA DE HOMICÍDIO QUALIFICADO PARA O DELITO
DE LESÃO CORPORAL – POSSIBILIDADE – AUSÊNCIA DE ANIMUS
NECANDI CONFIGURADA DE PLANO – ELEMENTOS PROBANTES QUE
EVIDENCIAM, INDENE DE DÚVIDA, QUE A INTENÇÃO DO RÉU NÃO
ERA MATAR A VÍTIMA – SENTENÇA DE PRONÚNCIA REFORMADA –
PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO ACOLHIDO – DESCLASSIFICAÇÃO
PARA O DELITO DE LESÕES CORPORAIS (ART. 129 , § 9º , DO CP )– DE
OFÍCIO CONCEDIDO HABEAS CORPUS PARA DETERMINAR O
TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL QUANTO AO CRIME DE
DESOBEDIÊNCIA – A ausência de animus necandi do acusado, capaz
de conduzir à desclassificação, deve ser demonstrada de forma
incontroversa, caso contrário, a submissão do acusado ao julgamento
perante o Tribunal do Júri é medida impositiva. Se constatada de
plano a inexistência da intenção de matar a vítima, poderá o acusado
obter a desclassificação da conduta que lhe foi atribuída na denúncia
(tentativa de homicídio qualificado) para o delito de lesões corporais.
Na hipótese dos autos, malgrado o órgão acusador tenha imputado
ao recorrente a prática do crime de tentativa de homicídio
qualificado, as provas jungidas neste processado indicam, indene de
dúvida, que a sua conduta mais se amolda àquela prevista no art.
129, § 9º , do Código Penal . (RSE 135289/2013, DES. PAULO DA
CUNHA, PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL, Julgado em 27/05/2014,
Publicado no DJE 30/05/2014).

Como comentado no tópico anterior, Adriano não possui a


vontade de matar a vítima, a não ser de apenas contê-la. O julgado acima defende
que deve haver a desclassificação da conduta que fora atribuída ao acusado na
denúncia, simplesmente pela ausência de vontade e intenção de matar.

DOS PEDIDOS

Considerando o acima exposto, o acusado requer:

a) A absolvição sumária do acusado, com base no artigo 415, inc. IV, do Código
de Processo Penal, tendo em vista a legítima defesa;
b) Caso o não acolhimento da legítima defesa por Vossa Excelência, e
considerando a não comprovação de forma segura do animus necandi por parte do
acusado, que se dê por IMPROCEDENTE os termos narrados na Denúncia, em
razão da inexistência de suporte probatório mínimo a indicar a autoria do crime e
seja o réu impronunciado nos termos do artigo 414, do Código de Processo Penal;
c) Caso entendimento diverso dos requerimentos acima, que seja
desclassificado o crime do artigo 121, parágrafo segundo, inc. II, c/c artigo 14 para o
artigo 129, ambos do Código Penal ou seja desconsiderada a qualificadora prevista.

Termos em que, pede deferimento.

Bela Vista de Goiás, 22 de abril de 2021.

MYLLENA RIBEIRO DE SOUZA


OAB XXXXX

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