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QUEM AMA CONSERTA

Este livro foi escrito por Luiz Gonzaga Pinheiro, que quer lançá-lo
apenas após estudá-lo detalhadamente com o grupo de aprofundamento
doutrinário Leon Denis, formado por uma equipe multidisciplinar com a
função de estudar “O Livro dos Espíritos”. Se você quer participar desse
estudo, tecendo críticas, comentários, adendos, correções, elogios... sinta-se
á vontade. Mas, por gentileza, o faça com base na ciência e não movido por
emoção ou paixão, pois neste caso não levaremos em consideração a sua
opinião.
O grupo Leon Denis procura estudar a obra de Kardec, situando-a no
contexto por ele vivido, e já chegou à conclusão lógica de que ele é muito
maior e mais genial do que todos supunham. Para nós, Kardec não está
superado, ultrapassado, não foi indigno da missão que desempenhou nem
poderia ter feito mais do que fez, pois sempre agiu no limite de suas forças.
Muito ao contrário daqueles que o julgam superado, o consideramos
um missionário honesto, sábio, humilde em seu saber e coerente em suas
posições; um homem de vanguarda com o pensamento muito a frente do
seu tempo.
Os que pensam que queremos fragilizá-lo, atacá-lo, ou agredi-lo de
maneira velada ou ostensiva, aquietem seus corações. A obra louva seu
bom senso e competência e procura fazer o que ele aconselhou aos
verdadeiros espíritas, deixar a obra compatível com o tempo.

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Apelos do tempo

Luiz Gonzaga Pinheiro


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APELOS DO TEMPO

Quem quer mesmo a verdade absoluta


Sem quedar-se aos séculos para vê-la pronta,
Muitos zeros receberá na conta
Que o tempo faz para cedê-la em luta.

Quem a verdade tem como impoluta


E a guarda em frases que a razão afronta,
Reconhecerá após a cova pronta
O quanto foi vã sua disputa

O imponderável, o absoluto, o definitivo,


O que de tão belo faz cativo
Só os milênios trarão um dia

Busca no hoje o que te faça altivo


Rega a suor teu grão de lenitivo
Pois a verdade agora te espedaçaria.

“Não se trata, portanto, de uma Doutrina estanque. O seu campo de


conhecimento é infinito como a própria Criação. Ampliando-lhe os conteúdos
apresentados em síntese, Espíritos dedicados daquela primeira hora volveram para dar
continuidade às investigações, ao desdobramento dos seus parâmetros, ao
desenvolvimento das suas teses, na condição de investigadores, de escritores, de
jornalistas, de oradores, mas também como médiuns eficientes e responsáveis, de forma
que permanecessem abertas as portas de acesso à imortalidade por intermédio das
comunicações espirituais, que constituem a documentação viva e imbatível do que se
encontra exarado nas obras básicas que lhe servem de alicerce.

Entre Dois Mundos - Manoel Philomeno de Miranda – Psicografia de Divaldo


Franco.
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Dedicatória

Este livro é dedicado àqueles que, pensando à frente


Do seu século, fazem suas casas no everest do tempo.
São justamente os que vivem sozinhos, mesmo em
Plena multidão. Que dormem nas estrelas e voltam a
Cada manhã para os pântanos. Que representam o
Silêncio na algazarra e o grito na demência. Que à
Semelhança da luz que a uns atrai e a outros ofusca,
São admirados e molestados. Que fazem florescer
Miosótis em pleno deserto, enquanto outros procuram
Nele apenas água, e que, por isso mesmo, jamais são
Profetas em sua própria terra.
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Índice

1. Introdução
2. A arte de burilar mensagens
3. Um olhar crítico sobre nossos valores
4. A credibilidade da ciência
5. Sobre a necessidade de aprofundamento de algumas respostas de O Livro dos
Espíritos
6. Reflexões positivas são sempre bem-vindas
7. Argumentos de Kardec a favor da adequação de sua obra ao tempo
8. Resultado prático da aplicação do pensamento progressista de Kardec
9. Kardec, o homem, o cientista
10. Introdução ao estudo da Doutrina Espírita (comentários e sugestões)
11. Prolegômenos
12. Análise de algumas perguntas, respostas e comentários de Kardec
13. Sem comentários
14. Comentários do autor
Kardec era adepto da abiogênese?
Sobre a polêmica da inteligência das plantas
A antropologia criminal
Sobre a formação de novos mundos pelos cometas
Sobre a superioridade de Marte e de outros planetas
Sobre o momento da união da alma ao corpo
Sobre a meditação e a contemplação
Sobre a elaboração em segredo do livro Imitação do Evangelho e outros temas
15. Conclusão
16. Bibliografia

“Foi assim, que mais de dez médiuns prestaram a sua assistência para esse trabalho.
Foi da comparação e da fusão de todas essas respostas coordenadas, classificadas, e
muitas vezes, refundidas no silêncio da meditação, que formei a primeira edição de O
Livro dos Espíritos, que apareceu a 18 de abril de 1857 (Allan Kardec – Obras
Póstumas)”.
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Introdução

Este livro é uma obra de ficção no qual o autor relata seu encontro com um
estranho que o busca para esclarecimentos sobre uma das obras básicas da Doutrina
Espírita, “O Livro dos Espíritos”. Tal encontro se dá durante o sono físico, estando seu
Espírito liberto e preocupado com o desenvolvimento de temas doutrinários.
O visitante, um franco atirador no campo do pensamento, pouco disse sobre ele,
mas através de agudos questionamentos devidamente elastecidos, forçou o dialogista a
reflexões que ele mesmo queria evitar.
O homem dizia chamar-se Rama Lunru ou tempo, como preferissem chamá-lo, e
ali estava para uma conversa de homem para homem ou de homem com o tempo, pois
gostava de buscar amadores, sendo ele mesmo um deles, para fazer apelos, e
experientes, o que viria a ser um dia, para conversas edificantes.
O estranho trazia o citado exemplar na mão e confessou estar sua vida mudada
em função dos ensinamentos ali contidos. Que gostaria de aprofundá-los, mas entre os
seus não despertara nenhum interesse. Foi então que ficou sabendo da existência de um
amador apaixonado, em terras brasileiras, e voou para cá. Ao identificar a quem buscava
pediu que o hospedasse por uma noite a fim de expor seus pensamentos sobre os temas
ali registrados, pois pretendia, com a ajuda dele, dissipar a nuvem que bloqueava seus
pensamentos, gerada pelos arraigados conceitos a ele passados por sua religião.
Aprendera com seus ancestrais que a alma do homem pode voltar a habitar o
corpo de um animal; que a condição de subalternidade imposta pela divisão da
sociedade em castas é justa; que os párias não devem se rebelar contra seus
dominadores nem praticar esforços para sair da situação em que se encontram, pois tudo
quanto merecem da justiça divina é o que ora têm em suas vidas. O livro que tinha em
mãos desautorizava tudo aquilo, daí o conflito gerado em sua mente.
Afirmou que sempre fora estudioso dos problemas da alma e que meditava
diariamente em questões relativas à imortalidade, reencarnação, justiça divina, dentre
outros temas ali escritos, mas nunca houvera encontrado um compêndio tão grandioso
quanto aquele, pois nele observara de maneira clara e elegante as mais significantes
questões da existência humana. O problema se resumia no desdobramento das questões,
já efetuado em outras obras, de difícil acesso para ele.
Convidado a sentar-se e a citar um ponto da obra que o intrigava disse que
jamais ingerira carne, que a vaca era um animal sagrado em seu país, todavia, o livro
admitia que os adeptos da religião iniciada a partir da sua publicação, o fizessem.
Apesar do esforço para enviá-lo a outras pessoas que pudessem explicar melhor
toda a problemática que o atormentava, do argumento forjado para descartar pessoas
insistentes e pegajosas, qual seja a falta de tempo e de competência, neste caso
verdadeiro, ele fez desabar a desculpa dizendo que já tinha feito algumas visitas e
que os visitados haviam simplesmente repetido o que o livro dizia, não admitindo
qualquer outra interpretação que não fosse a julgada correta por eles. A ele, alma impura
e carente de conhecimento, interessava minúcias e especificidades. Gostara da obra,
principalmente pela abertura que a mesma deixa aos seus adeptos para questioná-la e
aceitar apenas o que a consciência aprovava.
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Àquela altura, o desconhecido já promovido a hóspede, ainda argumentou: O


livro fala do Cristo, gostaria de conhecê-lo melhor. Mas sou igual aos meus amigos. Sei
apenas repetir o que está escrito no livro, respondeu um pouco envergonhado o
anfitrião. Contudo, o homem era insistente e voltou à carga: nada é igual na natureza. O
senhor escreve para convencer os homens da excelência deste livro e se recusa a estudá-
lo comigo para que possamos aprender com as nossas diferenças?
E foi assim que vencido em seus argumentos, ambos passaram toda a noite a
falar sobre o que se segue. O livro é um resumo da conversa que ambos teceram, sem
rastros da presença dos dois. Se alguém perguntar se não é muita conversa para uma só
noite terá como resposta que o tempo corre diferente em outros planos de existência.
Não esqueça o leitor de que está é uma obra de ficção e de que há verdade na
ficção e ficção na verdade. Cabe a cada um descobri-la.

A arte de burilar mensagens

O resultado final de uma mensagem espírita nem sempre se apresenta


exatamente como o comunicante o emitiu. É inquestionável que sua essência permaneça
inalterada para que a idéia exposta não sofra modificações. Todavia, a fim de bem
apresentá-la, principalmente se ela tem como destino ser uma obra literária, deve-se
proceder a um hábil burilamento em suas palavras com a finalidade de torná-las
didáticas, elegantes e, sobretudo, dotadas de simplicidade poética.
Que não se adiantem os mais apressados, diante desta opinião pessoal, em dizer
que sou a favor de alterações de mensagens mediúnicas ou de enxertos com a finalidade
de modificá-las. A Doutrina Espírita, a pretexto de se tornar popular, não deve ser
tratada como apenas um amontoado de argumentos ou de informações. Notemos que em
seu nascedouro ela já apresentava a dignidade cultural própria dos bons pedagogos, no
caso a elegante sobriedade do francês Hippolyte Léon Denizard Rival, que adotou o
codinome de Allan Kardec. Por que precisaríamos imprimir em livros, textos contendo
erros gramaticais, com argumentos ingênuos e vocabulário caseiro, se podemos
expressar a mensagem do comunicante em linguagem correta e acessível?
Não sou a favor do preciosismo literário nem de que se descaracterize uma
mensagem, quando necessitamos, através dela, comprovar a identificação ou o estilo do
personagem que a pronunciou. Sempre há casos que fogem à regra estabelecida, devido
às suas especificidades. Mas não concordo que, em nome da originalidade, passem para
o papel a prolixidade, as gírias, o laconismo que dificulta o entendimento, dentre outros
vícios de linguagem, sob o argumento de que o recado deve ser mantido como foi dito.
Não considero mistificação o fato de alguém, seja médium ou escritor, traduzir o
que o comunicante disse, utilizando-se para isso de um vocabulário mais apropriado e
mais adequado ao nível cultural de terceiros, no caso, leitores. Não se trata de
preconceito nem de desrespeito aos valores de determinado personagem, melhorar sua
linguagem com a intenção de transformar o texto resultante da sua comunicação em
uma página que traduza de maneira mais clara o teor enfocado.
Assim pensando, e admitindo que assim ocorra em inúmeras oportunidades,
trago à baila a figura do burilador de mensagens, aquele que tem a função de esculturar
frases, tornando-as jóias raras. Ao contrário do que possam imaginar, a mensagem
assim trabalhada ganha mais credibilidade, amplia seu espaço de divulgação, torna-se
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uma obra de arte nas livrarias, podendo ser utilizada como substrato e argumentação no
corpo doutrinário espírita.
A julgar pela afirmativa de Kardec exposta em destaque no início deste livro, ele
foi um excelente burilador de mensagens. Dotá-las de vigor argumentativo, imprimir-
lhes clareza estelar, favorecê-las com solidez literária e “lixar-lhes” as arestas,
desbastando o excesso sem, contudo, prejudicar o conjunto da obra ou alterar-lhe a
essência, foi, dentre outros, o trabalho mais precioso do codificador.
Mas isso não é uma afirmação leviana que pode, inclusive, comprometer o
mérito da codificação pela participação pessoal de Kardec em meio às mensagens dos
bons Espíritos? Diria que o raciocínio é justamente o oposto. Através da pesquisa e da
meditação no tema exposto, o codificador teve oportunidade de enriquecê-lo, desdobrá-
lo, aprofundá-lo, resumi-lo.
Não foi por acaso que ele foi escolhido e preparado para tão espinhosa missão,
qual seja, apresentar ao mundo a síntese literária do consolador prometido por Jesus.
Todavia, algumas frases ou mensagens de O Livro dos Espíritos, obra que
enfoco neste momento, necessitam na atualidade de um polimento, a fim de mostrar
todo o brilho que o tempo foi aos poucos retirando. No espaço de três anos, da primeira
edição para a segunda, Kardec fez esse trabalho. Mas, passados mais de 150 anos,
ninguém mais ousou auxiliar o grande codificador nessa tarefa de ajustamento da obra
ao tempo.
A proposta deste livro é tentar imprimir um polimento na escultura de algumas
respostas buriladas por Kardec, agindo tal qual o artesão quando se vê diante de uma
obra sacra cuja pintura foi danificada pelo tempo. No caso, ele procura manter a
originalidade o quanto pode, mas não se omite de lustrar a parte vencida pelo tempo, de
adicionar nova madeira às partes corroídas por agressões naturais, sem contudo, sentir-
se um violador de obras de arte nem um profanador de relíquias.
Jamais diria, pelo menos de forma consciente, que Kardec está errado ou
superado, e me esforçarei para não rotular de questões erradas, aquelas escolhidas para
comentar. Seria muita pretensão de minha parte, Espírito ainda ignorante em milhares
de temas que povoam este mundo, arvorar-me como dono da verdade, coisa que
combato sistematicamente naqueles que assim procedem. Tentarei fazer detalhamento,
aprofundamento, adequação, comentários que julgo pertinentes, principalmente para o
bom entendimento daqueles que têm a felicidade de agora adentrarem o estudo de tão
consoladora doutrina.
Que aquietem seus corações os defensores do zelo doutrinário. Meu
compromisso é com a perenidade e não com a precariedade, ou seja, preocupo-me com
a Doutrina atualizada, bem compreendida, aceita sem reservas, e não sob suspeita,
acossada pela ciência, agredida por qualquer um que venha a pinçar de suas obras,
informações ultrapassadas ou dúbias interpretações. As sugestões contidas neste livro
são frutos de reflexões do autor em diálogo com o tempo e, assim sendo, podem ou não
ser aceitas por outras pessoas. Não significam, como podem pensar alguns, sentenças
condenatórias ao trabalho de Kardec ou dos Espíritos que o assistiam. Portanto, se
algumas delas possam parecer inócuas sob o ponto de vista de um sábio, não o serão
para outros que necessitam de uma visão através de outro ângulo.
Enfatizo que os argumentos aqui utilizados são do próprio codificador sendo
bastante fácil encontrá-los em sua obra. Como podem dizer alguns, meu é o
atrevimento, e como declaram outros, a coerência. Antes de alguma crítica é
aconselhável respirar fundo e tentar compreender a obra deste grande homem chamado
Kardec.
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Neste livro eu e o tempo somos franco-atiradores com centenas de palavras


engatilhadas; utilizo um buril no lugar de um fuzil. Uma caneta é tudo quanto tenho
para iniciar uma revolução, a revolução que tenta resgatar a lembrança de que Kardec
deixou um roteiro a ser seguido, para que sua obra pudesse permanecer sobre os trilhos
da razão em qualquer época ou circunstância.

Um olhar crítico sobre nossos valores


Nós espíritas, não julgamos o Espiritismo um conjunto de dogmas pétreos ou um
sistema de pensamentos acabados do qual nada possa ser retirado ou adicionado. A
Doutrina Espírita deve acompanhar a cultura do seu tempo, adaptar-se à ciência naquilo
que não contradiz a verdade, enamorar-se da filosofia em assuntos pertinentes ao seu
corpo doutrinário, caminhar com a pesquisa, evitar críticas as outras religiões e deixar
as portas do diálogo sempre abertas para quem preferira outra filosofia de vida.
Constata-se no momento presente um grande fluxo de informações
universalizando o conhecimento e, ao mesmo tempo, expondo a fortaleza ou a
fragilidade de algumas hipóteses que ele veicula. O problema das fontes de consultas
não é mais, como outrora, a escassez, mas a seleção do que é valioso e honesto em meio
ao emaranhado de pensamentos a que se tem acesso, alguns sem substância ou crédito.
É extremamente necessário que o Espiritismo, no momento estonteante em que
vivemos, divulgue a sua mensagem o mais coerentemente possível, a fim de inspirar
confiança em meio a tantas mensagens que não a merecem.
Assim apresentada muitos verão sua excelência e a ela se entregarão, o que não
ocorrerá se, em tempo de resumos e consultas rápidas pelo qual passamos encontrarem
pensamentos contraditórios, incompletos ou superficiais.
Vale lembrar que era desejo de Kardec que a Doutrina Espírita fosse
continuamente atualizada através de congressos, pesquisas e seminários, tendo na
ciência um referencial norteador. Seu conselho em relação aos textos doutrinários é que
os passássemos pelo crivo da consciência, aceitando somente aquilo que fosse lógico,
racional, em concordância com a ciência e moralmente compatível com os
ensinamentos do Cristo.
Diante disso, ao interpretarmos sua obra à luz dos atuais ensinamentos,
julgamos agir em conformidade com seu pensamento e em harmonia com nossa
consciência, certos de que a busca da verdade deve ser uma obrigação perene e o
aprimoramento de nossas obras, tema do cotidiano.
Digno de nota, também, é que o codificador fez a melhor seleção de textos com
o que dispunha, pesquisou arduamente, complementou as lacunas com escritos de sua
própria lavra e armou a obra nascente com sólidos e coerentes argumentos. Na verdade,
Kardec estava convicto de que aquilo que fosse negado pela ciência teria pouca chance
de atravessar os séculos.
Homem de visão e de bom senso optou pela utilização de um método de
abordagem que lhe permitisse a observação científica e a especulação filosófica, sem
descartar, contudo, a revelação espiritual, razão pela qual seus detratores jamais
puderam se armar de argumentos verdadeiramente capazes de neutralizar suas
afirmações.
Em sintonia com o progresso, não pôs o selo terminativo em sua obra. E se
assim agiu, por que nós deveríamos contradizê-lo? Temos a liberdade, para comentar
com responsabilidade, questões da doutrina que abraçamos.
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O século atual, bem como o passado, trouxe novos questionamentos, novas


descobertas a exigirem complementações nos conteúdos doutrinários já expostos. Se o
progresso é praticamente infinito, deveríamos ficar plantados no século XIX?
Asseguro que este não é o pensamento nem o desejo de Kardec. Se o Evangelho
de Jesus está atualizado é porque seus ensinamentos, de cunho filosófico-moral, são
atemporais, ou seja, a verdade de suas leis é imutável. Amar a Deus e ao próximo é um
mandamento válido para todas as épocas e latitudes.
O mesmo não ocorre com os aspectos científicos e filosóficos terrenos, que
evoluem conforme o progresso efetuado pelo Espírito. E segundo se deduz dos escritos
de Kardec, o Espiritismo é também ciência e filosofia, sendo, portanto, tais aspectos
sujeitos ao estacionamento ou à aceleração conforme estejam atrelados ou não à roda do
tempo.
Adequar uma obra ao tempo não tira, em absoluto, o mérito de quem a escreveu
nem, neste caso, a sua inestimável contribuição para o progresso moral do planeta.
Acredito que seja o desejo de qualquer autor compatibilizar sua criação com o avanço
do progresso. Isso é uma maneira de preservá-la e de mantê-la acessível às novas
gerações. Jesus veio adequar ao seu tempo a obra de Moisés. O Espiritismo, consolador
prometido por Jesus, veio relembrar, aprofundar e revelar o que o Mestre não tinha dito
devido à falta de maturidade moral-intelectual da humanidade. Essa seqüência, essa
acomodação de ensinamentos aos novos tempos, é uma exigência das gerações, fato que
acontece hoje de forma muito mais rápida que séculos atrás.
Naturalmente, se Kardec desenvolveu seu trabalho segundo o avanço científico
do século XIX, as complementações deverão ter como base nosso atual estágio de
conhecimento, o que significa apenas uma tentativa de colocar no ponto, como bem
enfatizou o Congresso Espírita de 1890. Logicamente, as mudanças que se fazem
necessárias devem trazer em seu bojo as novas descobertas e as diferentes interpretações
científicas, o que não implica em uma modificação da obra.

A credibilidade da ciência

Primeiramente quero ressaltar que o Espiritismo é ciência, filosofia e religião.


As visões, filosófica e científica, do Espiritismo, possibilitam àqueles que as
consideram importantes, uma maior amplitude investigativa e uma observação mais
apurada de suas bases, o que forçosamente implica em mudanças comportamentais que
deságuam nas reformas ético-morais.
A aceitação desta base triangular, feita por convencimento e não por
ingenuidade ou fanatismo, é que mantém a pureza doutrinária, o espírito do Espiritismo
livre da ritualística dos que o divinizam e o interpretam como obra acabada, sem,
todavia, explicar ou confirmar os fenômenos comprovados por Kardec.
A ciência e a filosofia dão vigor à Doutrina e funcionam, neste caso, como
fiadores para a validação da excelência doutrinária, enquanto que somente o aspecto
religioso não propicia uma fé raciocinada, segundo Kardec, a única capaz de enfrentar a
razão face a face, em qualquer época. Apenas como religião, ou seja, enquadrando-se
nas velhas fórmulas de seitas já superadas, ela apenas fará apenas homens ingênuos e
não Espíritos viris, transformadores sociais como exige a atualidade.
Observa-se, na interpretação da realidade que nos cerca atualmente, uma
supremacia da visão científica em detrimento de outros pontos de vista, talvez porque a
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ela sejam atribuídos os melhores e mais palpáveis resultados oferecidos às nossas


inquietações e sede de conhecimento. Todavia, julgo um erro excluir do nosso
julgamento a parcela de contribuição que a visão da fé, da filosofia e da própria intuição
nos propicia.
Nem tudo é apenas científico, mas tudo precisa ter uma explicação científica e
nada é absolutamente anti-científico. Um sistema religioso não se sustenta somente em
cima do misticismo, de um corpo filosófico, de uma moral impecável, apresentando,
porém, atitudes contrárias à ciência. Deus criou a ciência como linguagem para a
interpretação de sua obra e essa linguagem precisa ser, obrigatoriamente, concorde com
outras maneiras de ver o mundo. A ciência não é a única visão de mundo que a
Humanidade dispõe, mas é, no momento, para a grande maioria dos pensadores
modernos, a mais importante.
É do apóstolo Paulo, lavrada na conclusão de O Livro dos Espíritos, a seguinte
afirmação: “Gravitar para a unidade divina, tal é o destino da Humanidade. Para
alcançá-lo três coisas são necessárias: a justiça, o amor e a ciência; três coisas lhe são
opostas e contrárias: a ignorância, o ódio e a injustiça”. Em resposta à questão 1010
da mesma obra, temos ainda: “... Mas, dai-lhes uma interpretação lógica, e aqueles que
vós chamais livres pensadores as admitirão sem dificuldade, precisamente porque eles
refletem. Porque não vos enganeis, esses livres pensadores não desejam mais do que
crer. Eles têm, mais que os outros, sede do futuro, mas não podem admitir o que é
contestado pela ciência”.
Como Allan Kardec considerou a concordância da Doutrina com o avanço
científico uma exigência natural, temos margem para comentar suas informações,
notadamente as transmitidas pelos Espíritos, em virtude de possíveis interferências
mediúnicas no momento da transmissão das mensagens. Diante dessa afirmativa,
alguém poderá dizer que Kardec era assistido constantemente por Espíritos superiores.
Não duvido deste argumento e vou ainda mais adiante. Acredito que, além da
honestidade de propósitos do codificador e da competência da equipe desencarnada que
o assistia, ele tenha redobrado os esforços para superar as dificuldades que enfrentou e
suprir a falta de informações reinante na época.
Contudo, a própria palavra superior necessita de um referencial. Espíritos
superiores a quem? A ele, Kardec? Quando nos reportamos a um critério de
superioridade devemos lembrar o quanto estamos distantes da perfeição. Por outro lado,
em se tratando de um fato mediúnico, cuja ocorrência envolve os dois planos, tudo fica
mais difícil devido a nossa dificuldade de aferição na parte do processo que se
desenvolve por um deles, o espiritual.
Vejamos alguns questionamentos quanto aos critérios de legitimidade para a
aceitação de uma comunicação espírita como sendo transmitida por um Espírito
superior.
“A distinção entre Espíritos bons e impuros é extremamente fácil (grifo meu):
A linguagem dos Espíritos Superiores é constantemente digna, nobre, impregnada da
mais alta moralidade, imune de qualquer paixão inferior; seus conselhos transpiram a
mais pura sabedoria e têm sempre por escopo nossa melhoria e o bem da Humanidade.
A linguagem dos Espíritos inferiores, ao contrário, é inconseqüente, quase sempre
trivial e até grosseira; se dizem por vezes coisas boas e verdadeiras, dizem-nas mais
freqüentemente falsas e absurdas por malícia ou por ignorância; tiram todo proveito da
credulidade e se divertem à custa dos que os interrogam, ora insuflando-lhes a vaidade,
ora embalando-lhes os desejos com falsas esperanças. Em suma, as comunicações
sérias, na verdadeira acepção da frase, só serão transmitidas nos centros sérios,
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naqueles em que os companheiros se acharem unidos por íntima comunhão de


pensamentos, visando ao Bem. ( O Livro dos Espíritos – primeira edição)”
Neste parágrafo Kardec se referiu apenas aos bons e impuros, ou seja, aos
Espíritos situados nos dois extremos da escala ou a todos? Aprofundando o raciocínio
imaginemos tal escala fictícia de 1 a 10 com os bons espíritos no último estágio (10) e
os impuros no início (1). Pelas características apresentadas por estes Espíritos seria fácil
reconhecer qual o superior e qual o inferior. Mas e os intermediários? Como diferenciar
e dar uma exata localização aos que se encontram nos estágios próximos através de uma
comunicação mediúnica, tais como 4,9 e 5,0? È evidente que Kardec se referiu à escala
como um todo, mesmo porque escrevia não para os extremos, mas para os
intermediários.
Na introdução da obra em análise (capítulo XII da introdução) Kardec referindo-
se a Espíritos inferiores que tomam emprestado o nome de outros conhecidos e
reverenciados faz a seguinte observação: Esse controle é, com efeito, bastante difícil de
estabelecer; se ele não o pode ser de maneira bastante autêntica, como por um ato de
estado civil, pode-o ao menos por presunção depois de certos indícios.
Tudo seria extremamente fácil se tivéssemos o bom e o impuro sob controle e
sujeito a análise de todos os nossos sentidos.
Na prática, a distinção entre bons e maus, mensagens autênticas e de caráter
duvidoso não é tão fácil de ser feita. O trabalho que desempenho no campo doutrinário
deu-me esta certeza. Vejamos algumas sutilezas no universo dessa questão: há entre os
maus e os levianos aqueles que são verdadeiros atores, que representam magistralmente
um papel sem que, para isso, sejam reveladas as suas intenções; que lêem textos adrede
preparados e enganam com maestria, pois para isso se especializaram. Concordo que o
roteiro elaborado por Kardec dificulta, mas não impede as mistificações. Uma prova do
que dizemos é a dificuldade que se tem ao tentar apontar um médium que não tenha sido
vítima de mistificação. Para evitá-las há de se levar em conta, dentre outras
providências, a assistência de uma equipe espiritual atenta e conhecedora dos propósitos
daqueles que querem burlar a boa-fé dos pesquisadores, cerceando-lhes as intenções. E
para merecer a assistência permanente de uma equipe com essas características, é
necessário que cada membro do grupo mediúnico ou de pesquisa no campo da
mediunidade esteja à altura dessa proteção. Se o grupo não estiver preparado em seus
aspectos morais, intelectuais e afetivos, tudo que dele surgir em uma reunião mediúnica
específica pode não ter origem em uma fonte confiável, mas a mensagem pode estar
absolutamente correta em seu conteúdo.
Alguém sem muita experiência na prática da mediunidade poderá indagar frente
a este argumento: mas que mágica é esta? Pode um grupo mediúnico sem preparo
produzir algo de bom? Pode, nem que seja uma isca que os mistificadores lancem, ao
ceder um pouco de verdade agora, para mais tarde saturá-lo de mentiras. Um bom
médium vidente ajudaria na identificação do mistificador? Nem sempre, pois o farsante
pode modificar seu perispírito, fazendo-se passar por quem não é.
Outro ponto a ser observado diz respeito às contradições existentes em
determinadas mensagens ditadas por desencarnados. Como seria interpretada por
Kardec a comunicação de um Espírito que afirmasse que um elétron pode estar em um
lugar e em outro ao mesmo tempo, ou seja, que ele é tão veloz que praticamente pode
estar em toda a órbita de um átomo, ao mesmo tempo? Ou que existe certo padrão de
organização no caos, já que para os Espíritos o caos não é nada e para a mecânica
quântica ele é quase tudo? Talvez tais mensagens fossem consideradas contraditórias e
afastadas do corpo doutrinário devido a sua origem suspeita, quando, na realidade, o
conhecimento da época é que estava encoberto, dificultando uma correta interpretação.
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Da mesma maneira, se hoje algum comunicante em uma reunião de estudos disser que
veio do futuro através de um buraco de minhoca (espécie de túnel que liga o passado
com o presente ou o presente com o futuro), nos tenderíamos a não aceitação da sua
mensagem, no mínimo desconfiando da sua natureza inusitada. Nos próximos séculos,
se tal teoria vier a se confirmar, como acreditam os cientistas, veríamos que o
comunicante poderia estar com a razão.
Povos diferentes possuem culturas diferentes e, logicamente, isso gera maneiras
diferentes de expressar verdades, sem, contudo, implicar em mistificações. Esse é outro
ponto a ser analisado antes de acusar uma mensagem de ser contrária ao consenso
universal. Na verdade, diante de uma página expressa em uma linguagem cultural
impregnada de nuanças fora do senso comum europeu - o chinês, por exemplo – algum
pesquisador espírita do século XIX talvez tendesse a julgar a informação sob a ótica
européia, considerada por ele a mais compatível com a verdade científica, esquecendo
ou desconhecendo que povos como o indiano, o japonês, o africano, dentre outros,
possuem maneiras diferentes de explicar o mundo.
Se observarmos a codificação, veremos que os textos são, em sua maioria,
europeus. Atentando para este detalhe - heranças culturais diferentes - podemos
observar a velha Índia, o Japão e a China que através de paradoxos e Koans* expressam
verdades milenares numa estranha e maravilhosa forma de integrar ciência, filosofia e
religião, revelando ensinamentos que mais se assemelham à poesia pura, cuja
profundidade e coerência são percebidas por poucos. Tais textos, ainda hoje têm grande
chance de serem excluídos, taxados de mentirosos ou inadequados por sua origem
suspeita, por parte daqueles que não levam em conta essa diversidade cultural.
Aprofundando mais um pouco o bisturi investigativo nos critérios de aceitação
de uma mensagem como proveniente de uma boa fonte, há de se notar que outro ponto
bastante polêmico, mas de suma importância, é o que se refere à maldade. Esta é
interpretada diferentemente conforme os tempos, as situações e as culturas. Considerar
que: “Todo Espírito que, em suas comunicações, revela um mau pensamento, pode ser
classificado na terceira ordem” (O Livro dos Espíritos – pergunta 101), ou seja, é um
Espírito imperfeito, é adotar um critério temerário, embora seja difícil encontrar um
melhor. Se Moisés, sem se identificar, houvesse dito em uma comunicação mediúnica
que fora um líder que mandara matar muitos dos seus liderados, sem se aprofundar no
contexto em que atuou, seria, de imediato, classificado como um Espírito de terceira
ordem.
Como meu principal objetivo nesta obra é analisar perguntas e respostas de O
Livro dos Espíritos, no que fui acossado pelo tempo, deixemos o atalho que tomamos
para outra ocasião e sigamos adiante.
O Espiritismo é uma fonte valiosa de conhecimentos, mas como esse
conhecimento precisa ter continuidade, necessita, sobretudo, de adequação ao momento
das novas gerações sob pena de, pelo menos, em suas afirmações científicas, ficar
defasado.

* Os místicos chineses e japoneses com a finalidade de expor as inconsistências oriundas da comunicação


verbal e de colocar em evidência os seus limites, fazem uso constante de koans, espécie de enigmas
utilizados na transmissão de ensinamentos, com os quais expõem a face paradoxal da natureza.
14

Para bem me fazer entender, mesmo correndo o risco de parecer repetitivo,


exemplifico com uma afirmação científica fornecida supostamente pelo Espírito
Galileu, psicografada por Flamarion: “As condições em que se efetuou a desagregação
da Lua pouco lhe permitiram afastar-se da Terra e a constrangeram a conservar-se
perpetuamente suspensa no firmamento, como uma figura ovóide cujas partes mais
pesadas, formaram a face inferior voltada para a Terra e cujas partes menos densas lhe
constituíram o vértice, se com essa palavra se designar a face que, do lado oposto a
Terra, se eleva para o céu. É o que faz que esse astro nos apresente sempre a mesma
face. Para melhor compreender-se o seu estado geológico, pode ele ser comparado a
um globo de cortiça, tendo formada de chumbo a face voltada para a Terra.
“Daí, duas naturezas essencialmente distintas na superfície do mundo lunar:
uma, sem qualquer analogia com o nosso, porquanto lhe são desconhecidos os corpos
fluidos e etéreos; a outra, leve, relativamente a Terra, pois que todas as substâncias
menos densas se encaminharam para esse hemisfério” (A Gênese, Cap. VI, item 25).
As viagens feitas à Lua comprovaram que não existem “duas naturezas
essencialmente distintas”, mas semelhantes. A face oculta da Lua não difere em
natureza da que nos é mostrada, ou seja, apresenta aspectos físicos semelhantes
conforme registros fornecidos pela selenografia efetuada em sua superfície. O fato de a
Lua apresentar sempre a mesma face voltada para a Terra, como um navio que circunda
uma ilha mostra sempre o mesmo lado do costado, deve-se aos dois movimentos
sincrônicos que ela possui, quais sejam: a rotação em torno do seu próprio eixo e
translação em volta da Terra. Minha hipótese sobre este fato é a de que a psicografia de
Flamarion é oriunda do seu próprio Espírito, fruto do animismo, mais precisamente o
reflexo do que ele pensava acerca do Cosmo à sua época.
Podemos em nome dessas pequenas falhas, aliás, previstas e mesmo esperadas
no exercício mediúnico, invalidar todo um trabalho honesto e profícuo elaborado por
tão meritória equipe? Evidente que não. Mas há de se convir que uma falha em um
edifício destinado à habitação afasta os moradores que querem segurança e certeza de
que se encontram em um “ninho” confiável. Se a mediunidade foi responsável pela
maioria das revelações do Espiritismo, deve-se proceder a uma rigorosa análise nos
pontos conflitantes com a ciência lá encravados, dele extraindo as partes em desacordo,
tornando-o atual e sem falhas. Assim já pensavam os componentes do Congresso
Internacional Espírita de 1890, deixar a Doutrina no ponto em que se situavam, com as
informações compatíveis com o avanço do pensamento mundial.
Para isso, que se arme a equipe responsável por tão grandiosa tarefa de bastante
cautela e rigoroso bom senso, a fim de não cometer o mais ridículo dos erros humanos,
o de tentar ser a dona da verdade. Acredito que nessa atualização, a visão da ciência
deva ser restaurada em sua inteireza, logicamente dentro dos limites que atingimos.
Um dos caminhos mais seguros que o homem trilha neste vasto mundo é o
científico. Foi a ciência que o arrancou das cavernas escuras da pré-história e o fez pisar
no solo lunar. É a ciência que o leva a entender o macro e o microcosmo, a imaginar
com certo grau de certeza a realidade de um mundo nunca visitado por ele, situado a
bilhões de quilômetros de distância. E será a ciência que o humanizará, quando o fizer
compreender e aceitar definitivamente que Deus é o maior de todos os cientistas.
Deus é o autor de toda ciência e o homem pouco a pouco vai descobrindo o
pensamento que O motivou a criá-la. Aliados à ciência deverão estar o amor e o cortejo
de virtudes que ele induz, fazendo descer, enfim, o reino do céu a Terra. “A ciência e a
religião são as duas alavancas da inteligência humana; uma revela as leis do mundo
15

material e a outra as leis do mundo moral. Mas uma e outra, tendo o mesmo princípio,
que é Deus, não podem contradizer-se” (O Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap. I,
Item 8).
O Espiritismo, ao conclamar a humanidade terrena à prática do amor e à
instrução, faz um convite para que todos se tornem cientistas, ou seja, amantes da
ciência, pois esta é a linguagem utilizada por Deus para mostrar sua magnífica obra.
Quem caminha, faz ciência, quem canta, escreve poesia, ora, rega, ampara ou qualquer
coisa faz, pratica ciência, mesmo sem o saber. É a ciência, portanto, o alfabeto de todas
as ações, o combustível da evolução material, que terminará por induzir às reformas
morais necessárias à aquisição da justiça e da paz.
O homem pode evoluir através da arte, da filosofia e da religião, mas estes
caminhos estão assentados na generosa estrada da ciência, e qualquer um deles que a
negue não sobreviverá. É destino do ser humano conviver intimamente com a ciência,
pois mesmo para entender a si próprio sempre precisará dela. Respiramos, nos
alimentamos, dormimos e sonhamos ciência.
O pensamento é que tornou o homem cientista. Desde que começou a pensar, ele
quis saber a resposta para as indagações que o cotidiano lhe trazia. Hipóteses, teorias,
leis, compêndios e enciclopédias avolumaram-se e continuam se avolumando na mente
humana, formando uma biblioteca que não tem fim.
Ninguém que não seja louco despreza a ciência. A própria palavra consciência,
lembra-nos que devemos encarar os fatos “com ciência”. Fora dela, o que resta para
esboçar uma explicação? A ciência, no presente momento, é o que existe de mais
palpável para a nossa necessidade de “ver para crer”, para a pacificação da nossa
certeza, para a sobrevivência da confiança ao tecermos nossos sonhos.
Alguém poderá dizer que coloco a ciência acima de Deus. Claro que isso não é
verdade. Exalto a linguagem divina através da ciência, pois é mais lógico admitir um
deus cientista do que um deus mágico. O primeiro inspira mais confiança pela
imparcialidade com que se manifesta, sempre através de leis. Muita ciência aproxima de
Deus, é o que dizem.
Portanto não tenhamos medo do saber científico, antes o abracemos, sabedores
de que, ao dominá-lo, estaremos dominando a nós mesmos.

Sobre a necessidade de aprofundamento em algumas respostas de O Livro


dos Espíritos

Sempre tive o máximo respeito por qualquer religião, e mesmo por quem não
tem religião alguma. Deus não se interessa por rótulos doutrinários, mas que seus filhos
cumpram o resumo da lei exposta de maneira magnífica por Jesus: amar a Deus sob
todas as coisas e ao próximo como a si mesmo. Tal resumo pertence a todas as religiões
e a nenhuma delas em particular. Kardec, por sua vez, traduzindo o pensamento dos
bons Espíritos, enfatiza: a melhor religião é aquela que mais homens de bem faz.
Mas então, por que você está nas hostes espíritas? Porque o Espiritismo é a
religião que melhor responde aos meus anseios de crescimento. A que atingiu, em
cheio, minhas dúvidas, amenizando-as, pois ainda convivo com muitas delas. A
proposta espírita, fundamentada na reforma moral e intelectual dos seus adeptos, me
fisgou em definitivo, principalmente pela ânsia de conhecimento que sinto e pela
necessidade de entender a minha origem e destinação.
Todavia, na tentativa de aprofundar alguns pontos dessa proposta, notadamente
o científico, tenho me deparado ao longo dos anos com a intransigência daqueles que
16

consideram Kardec um Espírito tão infinitamente superior que lhe seria impossível
registrar algo que pudesse ser complementado; alguém incapaz de cometer qualquer
falha durante seu trabalho na codificação; um homem de cuja obra literária não se pode
retirar ou adicionar uma vírgula sequer; um ser que produziu uma obra pronta e
acabada.
Essa divinização de Kardec sempre me pareceu estranha, porque ele jamais
demonstrou qualquer interesse nesse sentido. Agindo contrariamente à parcela que o
considera perfeito, sempre teve o cuidado e a hombridade de se dizer limitado,
admitindo que a ciência, e não ele pudesse estar com a verdade em alguns pontos da sua
obra e, nesse caso, os espíritas deveriam seguir com ela. Aconselhou a todos que
passassem pela peneira da razão tudo quanto lessem ou ouvissem, retendo somente o
aprovado pela consciência; incentivou a utilização do bom senso como mediador das
discussões e apontou a fé raciocinada como a única capaz de enfrentar a razão em
qualquer época ou circunstância.
Para quem considera o Espiritismo uma revelação exclusivamente divina, trazida
aos homens através de Espíritos superiores em 1857, nada mais lógico supor que a
Doutrina é um diamante já entregue lapidado, ou seja, jóia pronta e acabada. Se tudo
quanto foi dito saiu diretamente da boca de Deus, este não poderia ter se enganado em
nenhum aspecto. Mas para quem considera que Kardec foi co-autor, que uma boa
metade do que foi escrito é fruto de suas pesquisas, condensadas, remodeladas,
aprofundadas e aperfeiçoadas com seu próprio raciocínio, o enredo muda de cenário.
Para quem tem a lucidez de observar que as mensagens vieram de médiuns e
estes podem se enganar, introduzir idéias suas, a nível consciente ou inconsciente,
dando assim outra interpretação aos fatos, o panorama se altera.
Para quem recorda que àquela época não havia médiuns educados segundo as
regras espiritistas, uma vez que ainda seriam aglutinadas; que a cesta de bico, de escrita
lenta e mal elaborada, dava margem para interpretações equivocadas, a certeza de
transmissão mediúnica sem interferência anímica se esvai.
Para quem se lembra de que Kardec Iniciou seus estudos sobre as mesas girantes
em 1855, e em menos de dois anos já lançava a primeira edição de “O Livro dos
Espíritos”, ou seja, admitindo-se que neste período de tempo é impossível a qualquer ser
humano dominar completamente assunto tão complexo como o que ele pesquisava, há
uma a pedra no meio do caminho, ou um porém no meio do texto.
Para quem admite que a Doutrina foi coordenada sob a ordem de Espíritos
superiores, mas interpreta “superiores” com relação a nós, habitantes terrenos, e não
superiores em último grau, Espíritos puros, a necessidade de atualização parece óbvia.
Vou mais fundo neste tema. Contribuíram para elaboração da idéia espírita não
apenas Espíritos superiores, mas também inferiores, como consta em uma de suas
importantes obras, “O Céu e o Inferno”, pouco lida e pesquisada. Encravada em suas
páginas, como um rubi à cavidade de uma jóia, encontra-se contundente coletânea de
testemunhos de Espíritos em condições medianas, sofredores, suicidas, criminosos
arrependidos e Espíritos endurecidos, todos descrevendo suas condições espirituais,
utilizadas como ensinamentos e advertências para os aprendizes da Doutrina.
Quando notamos que o Espiritismo, Doutrina de excelência comprovada é mais
condensação, ordenação, seleção do que revelação, posto que tudo nele reunido, já
existia antes e tinha sido revelado em outras religiões e filosofias, inclusive entre os
iniciados pré-Jesus, somos tocados por certa dose de humildade.
A mesma humildade que Kardec aconselhava na interpretação e na atualização
das verdades, pois estas se modificam a cada esquina. Algumas pessoas podem
pensar que tenho a pretensão, mediante uma atitude de orgulho e prepotência, de alterar,
17

modificar, ou reescrever o “Livro dos Espíritos”. Só quem pode mudar a obra de um


autor é ele mesmo. O que quero é que a obra seja atualizada cientificamente através de
notas de rodapé, explicações em anexos no final da obra, ou como acharem mais
conveniente, conquanto que a atualizem.
A minha neurose, como chamam alguns, se deve a erros científicos apresentados
na codificação sem que ninguém diga: na época em que ela foi escrita pensava-se
assim. Hoje a ciência provou que é assado!
Diante de tanta franqueza da parte de Kardec, há de se perguntar por que
determinados espíritas têm tanto medo dos questionamentos que possam ser feitos sobre
as afirmações do codificador. Julgam que a codificação é obra pétrea? Que todos devem
ficar estáticos, fossilizados no século XIX, negando assim a lei do progresso? Que
aprofundar ou discutir pontos da obra é um insulto aos bons Espíritos ou a Jesus?
Positivamente, este não é o estilo espírita que Kardec se esforçou para deixar como
herança.
Para estes, transcrevo algumas palavras do grande mestre de Lion, anotadas na
conclusão do livro em que ora nos detemos: “Entre os adeptos do Espiritismo há os que
diferem de opinião sobre pontos da teoria, mas todos concordam sobre os pontos
fundamentais. Portanto, há unidade”. E mais adiante, no mesmo capítulo: “A razão
deve ser o supremo argumento e a moderação assegurará melhor o triunfo da verdade
do que a crítica envenenada pela inveja e pelo ciúme”.
Penso que aquele que age desta maneira tem medo de sua própria fragilidade; de
ser questionado e não encontrar argumentos convincentes para uma resposta. Isso me
lembra uma velha companheira que trabalhou comigo em uma escola pública, tida como
pessoa intragável. Quem a observasse bem, notaria o medo que ela demonstrava ao ser
questionada sobre algo que a ameaçava. Sem um bom nível cultural que lhe permitisse
responder às observações feitas ao seu trabalho, invariavelmente partia para a
intimidação, na tentativa de abafar o questionamento. Quando alguém lhe dizia: “Por
que você fez isso?”, ela respondia grosseiramente, agredia o interlocutor, para assim
encerrar o diálogo sem, contudo, tocar no assunto indagado. Tinha apenas medo de ser
superada em uma discussão; de ser apanhada em uma falta e não ter argumentos
defensivos; atacava para se ver livre de acusação, fingia-se de superior para não
demonstrar sua inferioridade. Utilizava a técnica dos inseguros, “o ataque é a melhor
defesa”, sem pensar que estava com isso perdendo amigos e se tornando antipática, ou
seja, cada vez mais sozinha com sua fragilidade. Não estão agindo assim aqueles que
temem aprofundamentos ou discussões sobre a obra em questão?
Quem está convencido acerca de uma verdade qualquer não teme indagações,
sejam elas exageradas em tamanho ou proporção. Lógico que cada pessoa, tendo
história de vida e estágio evolutivo diferentes está no seu direito natural de ter opiniões
divergentes de outras a ela apresentadas. Mas isso deveria ser um motivo a mais para
que todos mantivessem a mente aberta para novas revelações e contestações, evitando
que idéias já adquiridas se cristalizassem.
A famosa lei do progresso, tão apregoada pelos evolucionistas, parece não
funcionar para um seu subconjunto que insiste em se manter no passado. Discutir os
escritos de Kardec? Escrever outro livro apontando algum complemento? O que é isso?
Quem ele pensa que é?
O pior é que muitos querem fazer crer que aquele que deseja contribuir com a
Doutrina, desde que seja através de adequações nos pontos em que ela necessita de
algum reparo, é um perturbado; esperam mesmo que ele se subestime em inteligência e
admita ser um semi-analfabeto ou um analfabeto funcional; argumentam que todos
somos seres inferiores, presas fáceis de obsessores e de pseudo-sábios e lamentam,
18

enfim, que esforços sejam empregados em uma tarefa certamente, inspirada pelas
trevas.
Certa vez, visitando um Centro Espírita para proferir uma palestra sobre a lei do
progresso, passei em frente ao quadro onde avisos eram expostos e li no cartaz que fazia
o chamamento para o início de um curso sobre mediunidade: “Não é Doutrina Espírita
o que não tiver a chancela de Allan Kardec”. Alguém colocara acima desse cartaz,
outro com a belíssima frase: “Quando a gente pensa que sabe todas as respostas, vem a
vida e muda todas as perguntas”.
Fiquei alguns minutos admirando aquele paradoxo. Uma frase excludente
revelando o quanto estamos longe da união entre os espíritas, e muito mais do tão
sonhado ecumenismo, e outra progressista, indutora da busca do conhecimento. As
frases excludentes fazem mais mal do que bem aos profitentes de uma religião.
Separam, quando todos deveriam estar unidos em nome da fraternidade, respeitando-se
mutuamente. Toda a ciência pós-Kardec, os clones, as células-tronco, a inseminação
artificial, a mãe de aluguel, os transgênicos, o genoma, a mecânica quântica, a teoria da
relatividade e um sem-número de avanços científicos não possuem a chancela de
Kardec, de vez que ele desencarnou antes que tais eventos ocorressem. O autor da
melancólica frase não colocou chancela do Espiritismo, o que amenizaria a situação,
mas de Allan Kardec, deixando fora da Doutrina todo o conhecimento de um século e
meio. Isso demonstra o quanto o inconsciente revela nossa intransigência para com o
pensamento alheio quando este é diferente do nosso. Como ele trai nossa intenção de
camuflar sentimentos e desnuda o preconceito lá instalado, expondo a alma, em seu
verdadeiro estágio evolutivo.
“Fora da Igreja não há salvação” é uma frase excludente, pois deixa de fora
dessa salvação os budistas, os hinduístas, os espíritas, os evangélicos, dentre outros.
Não simpatizo nem mesmo com a mais lógica delas, “fora da caridade não há
salvação”, pois entendo que a não salvação é algo inviável e impossível segundo a lei
do progresso. Mesmo que alguém se negue a evoluir, ou seja, a ser salvo, um dia será
tomado pelo redemoinho do progresso e forçado por ele, terá que caminhar um ou mais
passos, situando-se adiante do degrau evolutivo em que se encontrava.
Aquele que exclui o faz por considerar-se superior a outros, dos quais tenta
apartar-se, mostrando claramente a falta de humildade ou, por outro lado, o complexo
de superioridade que o caracteriza. Explicitamente esse alguém expõe, mesmo sem ser
esta a sua intenção, o não cumprimento dos postulados que, em teoria, defende.
Sei que as pessoas não são obrigadas a aceitar meus pontos de vista pessoais. Por
outro lado, não podem impor suas convicções a seus irmãos. Aliás, para o filósofo
Nietzsche, o problema da verdade não é a mentira, mas as convicções. Aquele que está
convicto de que sua idéia é correta não desiste dela. Mas, se esta idéia não for
verdadeira, estiver incompleta, inadequada? É justamente em nome da liberdade de
pensamento tão enfatizada e cobrada por Kardec que as exponho. Ele próprio era um
homem de vanguarda, rejeitando boa parte do pensamento religioso do continente em
que vivia. Pensemos em conjunto, abstraindo qualquer preconceito ou antipatia à idéia
exposta, fazendo um esforço para aceitar a necessidade imposta pela evolução que o
tempo trouxe, navegando nas asas ligeiras que a lei do progresso fez crescer neste
tempo maravilhoso em que vivemos e vejamos se as questões abaixo não merecem
acolhimento.
19

Reflexões positivas são sempre bem-vindas

Sei que ninguém gosta de expor fragilidades nem de ser contestado em seus
valores. Mas é justamente para que esses valores sejam fortalecidos e admirados que
precisamos confrontá-los com outros já devidamente testados e reconhecidos como
verdadeiros. Determinados fatos são definitivos, outros necessitam de mais dados,
terceiros devem ser reavaliados. Não fazemos isto em nossa vida diária? É neste
sentido que lanço nesta página algumas informações para que sirva como objeto de
reflexão.

Durante a codificação da Doutrina ocorreram:

a) Erros científicos: ausência de luas em Marte, a solidez do anel de Saturno (não é


apenas um, mas muitos e constituídos de partículas em suspensão), a defesa da
abiogênese da qual Kardec era adepto, interpretações equivocadas sobre a inferioridade
das raças (só existe uma raça, a humana), bem como outros pontos nos quais a ciência já
se manifestara desfavoravelmente à interpretação do codificador. Quanto à inferioridade
das raças é inútil argumentar que naquela época existia a escravidão e que era senso
comum na Europa todos acreditarem na inferioridade, principalmente dos negros*.
Ocorre que os desencarnados que coordenavam a transmissão da mensagem espírita
estavam séculos à frente daquela geração e deveriam deixar uma mensagem de
vanguarda, impregnada de futuridade, para estabelecer os fundamentos de uma filosofia
racional, livre dos preconceitos do espírito do sistema, disseram eles. Nós nele pusemos
as bases do novo edifício que se eleva e deve um dia reunir todos os homens em um
mesmo sentimento de amor e de caridade (prolegômenos). Portanto, se a mensagem
deveria retratar a união futura dos homens sob a bandeira da caridade, jamais deveria
conter qualquer traço de discriminação. Esta era a intenção da equipe desencarnada que
auxiliava Kardec.

b) Erros grosseiros contidos na primeira edição de O Livro dos Espíritos, e corrigidos na


segunda edição, tais como a união da alma com o corpo acontecer apenas no momento
do nascimento; a negação de que o princípio inteligente passa por estágios nas espécies
mais primitivas até chegar à fase humana, ou seja, a evolução não se faz nos campos
anatômico e fisiológico, apenas no campo espiritual; a tendência ao crime embasada em
determinadas características físicas, algo semelhante ao que propusera César Lombroso.
Sei que tais correções foram feitas na segunda edição, mas o caráter importante aqui é
que se houve correção é porque houve equívocos, portanto, as correções deveriam ser
constantes a cada período de tempo, como queria o codificador.

* Recentemente, a revista “Reformador”, Nº 2150 de maio de 2008 publicou a seguinte nota: Do


encontro do Ministério Público Federal, no Estado da Bahia, e algumas editoras espíritas, em especial a
FEB, em virtude de representação dirigida a esse órgão, solicitando-lhe providências no sentido de proibir
a circulação das obras de Kardec que conteriam, na visão do requerente, textos discriminatórios ou
preconceituosos, resultou a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta. Neste as editoras se
comprometem a inserir notas explicativas nos livros em questionamento, evitando-se assim quaisquer
interpretações indevidas a respeito dos textos citados.
20

c) Ocorrências não explicadas como a ocorrida com a mensagem contida em O Livro


dos Médiuns, considerada apócrifa, assinada por Jesus de Nazaré, mas que surge
modificada em O Evangelho Segundo o Espiritismo como sendo de autoria de O
Espírito de Verdade.

d) Atitudes estranhas, tais como Kardec ter escrito O Evangelho Segundo o Espiritismo
sem o conhecimento de seus colaboradores, fazendo ele mesmo a seleção de textos, o
julgamento quanto à autenticidade dos mesmos e lá colocando um título imediatamente
censurado por alguém de raro bom senso. Sabemos que Kardec era auxiliado pelos bons
Espíritos. Mas por que nesse detalhe principal não foi feliz na escolha? O título
Imitação do Evangelho poderia, de imediato, ampliar a censura contra a doutrina
nascente cujos detratores não se esquivariam em dizer: nós temos o original! Não
precisamos de uma imitação!

e) A vontade de Kardec expressa em textos de sua lavra, afirmando seu pensamento


progressista, o desejo de que a obra fosse continuamente atualizada, sua decisão de
caminhar sempre ao lado da ciência.

Alguns desses temas serão aprofundados no final da obra em Comentários do


autor.

Podemos afirmar, e é verdade, que nós de evolução mediana para baixo, não
somos inspirados e assistidos durante as 24 horas do dia. Há sempre um momento em
que baixamos a guarda, motivados pelo cansaço, a tristeza, a ingratidão que sofremos,
as necessidades de toda ordem. Pode ser que em um desses raros momentos de
desatenção, Kardec tenha decidido por este título infeliz, sendo necessário que um
amigo encarnado o advertisse quanto à falha cometida. Mas, e aí vem a questão a que se
prendem os detratores da Doutrina: se isso aconteceu em um ponto, pode ter acontecido
em outros.
É do ganhador do prêmio Nobel de Física, pela descoberta dos quarks, Murray
Geel-Mann, o seguinte pensamento: “Quando me deparo com uma imprecisão escrita
em um livro, fico desencorajado e me pergunto se posso, realmente, aprender alguma
coisa de um autor que já provou estar errado em pelo menos um ponto”. Essa é a razão
da necessidade de adequação de determinados pontos da obra. Estamos em uma época
onde as fontes de informação são abundantes, propiciando comparações,
aprofundamentos e refutações, fato que tanto prende como afasta os adeptos de uma
idéia, a depender de como ela é exposta. Se não quisermos ver a Doutrina Espírita
vulnerável, sob fogo cerrado dos detratores que se apegam a interpretações equivocadas
e a aspectos vagos que exigem complemento, façamos nós mesmos os ajustes antes de
sermos forçados pela ciência, pelo progresso ou pela língua cortante, mas incentivadora
dos nossos oponentes.
Não adianta culpar àqueles que possuem idéias contrárias às nossas; muito
menos, agredi-los. O que supera uma idéia é outra mais robusta. Além do mais,
diversidade é uma coisa boa e necessária. Sabemos que com o amadurecimento do
senso moral e a socialização dos conhecimentos científicos, a Humanidade tenderá para
uma estabilidade e uma homogeneidade no seu modo de agir e pensar. No livro em
análise, O Livro dos Espíritos, Kardec indaga se o Espiritismo se tornará uma crença
21

comum, e não se os habitantes da Terra se tornarão espíritas. Podemos entender a


sutileza da indagação admitindo que todo espiritualista, independente da doutrina que
professe, manterá relações simpáticas com o Espiritismo. Admitindo sua formação
religiosa a sobrevivência do Espírito, a mediunidade lhe dará a prova. Se aceita a
supremacia de um Deus justo e bom, tomando conhecimento da reencarnação, do
referencial de vida que é Jesus, da pluralidade dos mundos habitados, sentir-se-á em
casa, hóspede do contexto espírita, embora adepto de outra religião.
O mundo, tal quanto os indivíduos, comporta diferentes filosofias, sobretudo
pela existência de culturas, climas e estágios evolutivos diferentes. Desde que a ética
comande as relações humanas, não deve haver temor da diversidade religiosa ou de
idéias.
Enquanto não atingirmos esse estágio de tolerância e entendimento, convém
pensar que há certa lógica em se valorizar as ações dos nossos oponentes, percebível,
apenas por aqueles que são agudos nas nuanças do “conhece-te a ti mesmo”. Nossos
amigos, geralmente, não nos acusam abertamente de erros nem nos policiam as atitudes.
Pelo contrário, nos elogiam dando-nos a impressão, não raro, de que somos evoluídos.
Nossos inimigos, no sentido oposto, nos arrancam a máscara, mostram em cada
pequeno deslize que cometemos, o quanto precisamos aprender. Costumo dizer que o
Centro Espírita deve muito aos obsessores, pois são eles que aumentam nossa clientela
através dos flagelos que impõem aos que perseguem. Não estou com essa afirmação
concordando com os métodos que eles utilizam. Estou chamando a atenção para um
detalhe óbvio: uma boa radiografia moral nossa, uma boa súmula sobre nosso estágio
evolutivo, pode ser mais sincera e digna de confiança quando emitida por um inimigo
nosso que por um amigo. Um inimigo não tem nada a esconder de nossas imperfeições.
Ele as escancara, vasculha nossa vida e nosso íntimo para nos mostrar tal qual somos,
enquanto um amigo, por vezes se apieda, e em nome dessa piedade, subestima nossa
mendicância espiritual.
Note o leitor que falo de diversidade e não de competições ridículas, de futricas
e melindres, do pseudo-sábio que se sente diminuído quando uma idéia nova o atinge,
exigindo estudo e esforço para acompanhar o progresso. Perceba o amigo que valorizo a
convivência harmônica entre os que pensam de maneira diferente, mas que não aprovo o
discordar sem base sólida, apenas porque o fanatismo ou acomodação falam mais alto.
Eis em síntese alguns motivos pelos quais inicio como franco-atirador e com a
ajuda do tempo a obra Apelos do Tempo.

Argumentos de Kardec a favor da adequação da sua obra ao tempo

Na última parte do livro Obras Póstumas, Constituição do Espiritismo –


Exposição de motivos, Kardec mostra as razões pelas quais a Doutrina Espírita deveria
ser continuamente atualizada. Eis, sinteticamente, alguns pontos do seu pensamento:
* Para se assegurar da unidade no futuro, uma condição é indispensável, é que
todas as partes do conjunto da Doutrina sejam determinadas com precisão e clareza,
sem nada deixar de vago; para isso fizemos de modo que os nossos escritos não possam
dar lugar a nenhuma interpretação contraditória, e trataremos que isso seja sempre
assim.
* O caráter da Doutrina deve ser essencialmente progressivo. Ela não deve
ficar imobilizada sob pena de suicidar-se. Se uma nova lei é descoberta, deve a ela
ligar-se; não deve fechar a porta a nenhum progresso, assimilando todas as idéias
justas, de qualquer ordem que sejam, físicas ou metafísicas, não será jamais
ultrapassada, e aí está uma das principais garantias de sua perpetuidade.
22

* O programa da Doutrina não será, pois, invariável senão sobre os princípios


passados ao estado de verdades constatadas; para os outros, não os admitirá, como
sempre fez, senão a título de hipóteses, até a sua confirmação. Se lhe for demonstrado
que está em erro sobre um ponto, modificar-se-á nesse ponto.
* A verdade absoluta é eterna, e por isso mesmo, invariável. No estado de
imperfeição de nossos conhecimentos, o que nos parece falso hoje, pode ser
reconhecido como verdadeiro amanhã, em conseqüência da descoberta de novas leis. É
contra essa eventualidade que a Doutrina não deve jamais se encontrar desguarnecida.
O princípio progressivo, que ela inscreveu em seu código, será a salvaguarda de sua
perpetuidade, e sua unidade será mantida precisamente porque ela não repousa sobre o
princípio da imobilidade. Esta, em lugar de ser uma força, se torna uma causa de
fraqueza e de ruína para quem não segue o movimento geral; rompe a unidade porque
aqueles que querem ir adiante se separam daqueles que se obstinam em permanecer
atrasados.
* Em lugar de um chefe único será criada uma comissão central composta por
doze membros, sendo dentre outras atribuições, o estudo dos princípios novos,
suscetíveis de entrar no corpo da Doutrina e a convocação dos congressos e das
assembléias gerais.
* O congresso procederá a cada 25 anos a uma revisão da constituição
orgânica do Espiritismo com a finalidade de apreciar as novas necessidades e não
levar perturbações com modificações muito freqüentes.

Resultado prático da aplicação do pensamento progressista de Kardec


“No Congresso espírita e espiritualista internacional de 1890, os delegados
declararam que, desde 1869, os estudos seguintes tinham revelado coisas novas, e que,
segundo o ensinamento preconizado por Allan Kardec, alguns dos princípios do
Espiritismo, sobre os quais o mestre baseara seu ensinamento, deveriam ser colocados
no ponto de acordo com os progressos da ciência há 20 anos”.
Essa corrente de idéias, comum aos delegados vindos de todas as partes da
Terra, provou que um volume novo deveria ser feito, para casar o ensinamento de Allan
Kardec com aquele que nos dá, constantemente, a procura da verdade.
Essa será a obra da Comissão de propaganda; (...) esse volume deverá, ele
mesmo, a seu turno, ser posto ao ponto, quando um novo Congresso lhe terá decidido.
A ciência, disse Allan Kardec, está chamada a construir a verdadeira gênese segundo
as leis da Natureza.
“As descobertas da ciência glorificam a Deus em lugar de rebaixá-lo; não
destroem senão o que os homens edificaram sobre as idéias falsas que se fizeram de
Deus”. (Obras Póstumas – Princípios Fundamentais da Doutrina Espírita reconhecidos
como verdades espíritas - final da obra).

Kardec, o homem, o cientista


Não pretendo neste artigo fazer um resumo biográfico de Kardec, assunto
bastante conhecido de grande parcela dos espíritas, mas enfatizar alguns pontos que
justifiquem meus comentários a respeito da necessidade de adequação de alguns dados
da sua obra. Registrarei, portanto, aspectos pontuais de sua vida e de sua personalidade,
retirados de livros que aprofundam o assunto, sem, todavia, entrar em comentários
alongados.
23

- Pelo que se conhece da vida e obra de Kardec, ele foi um homem pacífico e honesto,
não havendo registros em qualquer documento acerca de agressões por ele cometidas,
seja de forma explicita ou velada, física ou verbal, a quem quer que seja. Mesmo sendo
um homem lidando com um tema altamente “explosivo”, polêmico e antipático para boa
parcela da população francesa, manteve-se firme e digno durante a grande batalha
intelectual que levou a efeito.

- Kardec foi considerado homem de visão, cujas qualidades intelectuais e morais jamais
estiveram em dúvida, fruto de uma educação esmerada e de uma disciplina bem
direcionada.

- O codificador não costumava deixar sem resposta nenhuma agressão sofrida pela
Doutrina que ajudou a nascer, a tudo explicando com paciência, coerência e boa
vontade.

- Mesmo desconhecendo o inconsciente, mais tarde devassado por Freud, Kardec nele
aprofundou investigações, deixando valioso relato sobre a maneira como ele interfere na
personalidade atual. Ao estudar o animismo e a “herança” intelecto-moral que o
Espírito traz do passado, tornou-se um precursor dos estudos psicológicos modernos,
colocando-se à frente do seu tempo, sendo, por isso mesmo, considerado um dos
importantes homens de vanguarda da Europa.

- Foi um pesquisador incansável, escritor de linguagem fluente, clara e objetiva, hábil


em sínteses, profundo na argumentação e moderado nas críticas.

- Foi um homem aberto aos novos conhecimentos, sem idéias dogmáticas, consciente do
seu poder de liderança, precavido contra as fraudes e convicto da necessidade de
integração entre o conhecimento da Doutrina que codificava e o conhecimento já
conquistado pela Humanidade.

- Kardec utilizou como ferramenta de trabalho o método científico. Partia da


observação, procedia a uma investigação e dela extraia afirmações que, se repetidas em
outros experimentos, poderiam ser transformadas em teorias, ou seja, sofrer uma
generalização, tornando-se uma espécie de lei. Como em alguns casos a aplicação de tal
método é dificultosa, senão inviável, deu a seu trabalho uma abertura para o “novo”, a
chance de que outros pudessem provar seu acerto ou seu engano, imprimindo assim à
Doutrina nascente um caráter progressista que aceitava atualizações, desde que
comprovadamente compatíveis com o corpo doutrinário. Demonstrando excepcional
bom senso e admitindo a possibilidade de falhas em seu trabalho, municiou a Doutrina
nascente com um toque de humildade, permitindo-lhe a possibilidade de rever pontos de
vista equivocados.

- Foi também, em algumas ocasiões, centralizador, pois elaborou sozinho, sem opiniões
de terceiros e sem mesmo mostrar a seus amigos, O Evangelho Segundo o Espiritismo,
e apesar da opinião de seus auxiliares encarnados e desencarnados favorável a evolução
anatômica e fisiológica das espécies (biogênese) manteve fidelidade às suas convicções
(abiogênese). Tal fato demonstra que pelo menos nestes casos, seu procedimento foi
diferente do usual. No primeiro, preocupado com o volume do trabalho e o pouco tempo
24

disponível para desenvolvê-lo, não parou para ouvir seus auxiliares que, muito
provavelmente, retardariam o lançamento da obra, mas por outro lado, poderiam
enriquecê-la com justas argumentações. No segundo, talvez pelo mesmo motivo, falta
de tempo, não tenha priorizado o aprofundamento dos estudos científicos sobre a gênese
da vida.
- Em determinados momentos de sua caminhada, fato comum a qualquer humano,
Kardec admitia determinado raciocínio e “esquecia” de enquadrar o restante da obra à
nova maneira de pensar. Um ser humano comum pode mudar de opinião a qualquer
instante sem prejuízo no seu relacionamento com os amigos. Um escritor, ao admitir
uma nova interpretação para os fatos que narra, deve retornar às paginas já gravadas
cujas interpretações são, diante do novo momento, equivocadas, a fim de promover os
devidos reparos, sob pena de incorrer em contradições. Isso ocorreu com o texto contido
em O Livro dos Médiuns, cujo autor se identifica como Jesus de Nazaré, classificado de
apócrifo por Kardec, e que, por alguma razão não bem explicada, surge em O
Evangelho Segundo o Espiritismo com uma nova assinatura e com modificações em sua
estrutura. Esse texto revelou-se de grande importância para o movimento espírita por
indicar um belíssimo roteiro de elevação para todos: “Amai-vos e instrui-vos”. A
assinatura, no novo livro, foi modificada para Espírito de Verdade. Em outras ocasiões,
Kardec parecia ser confiante demais em sua intuição e eficiência, registrando fatos sem
o devido aprofundamento em suas conseqüências. Acredito que ao escutar dos Espíritos
que a união da alma com o corpo ocorre somente no instante do nascimento (primeira
edição de O Livro dos Espíritos) Kardec poderia ter indagado sobre a responsabilidade
de quem provoca um aborto, pois àquela altura todos já sabiam que a expulsão
proposital do útero materno, com a intenção de matar uma criança completamente
formada, que se movimenta e está pronta para nascer, estaria em desacordo com a ética,
a caridade e constituiria um crime. Por qual razão esse erro só foi corrigido na segunda
edição, após ser criticado pelos leitores mais atentos?
- Kardec recebeu críticas por endossar o pensamento comum na Europa de que nela
estava a parcela mais culta do planeta. Este fato não combatido e até defendido por ele,
no qual muitos europeus admitiam como inferiores, negros, índios e amarelos é causa
ainda hoje de errôneas interpretações das quais se servem seus detratores. Contra esta
atitude estão os próprios preceitos reencarnacionistas a ele passados pelos Espíritos: um
sábio cujo patrimônio intelectual seja mal-aplicado e que venha a causar prejuízos ao
meio em que vive, pode nascer junto a ignorantes, viver entre eles e, inclusive, ser um
deles, já que precede a reencarnação o esquecimento temporário de determinadas
conquistas anteriores. Sendo bem claro: um europeu culto, porém aético, poderia nascer
em uma tribo indígena, ser um hotentote, tribo a qual Kardec se refere como sendo uma
das mais atrasadas; um branco racista pode nascer entre negros; um mau patrão pode
nascer como empregado. Resumindo: tomando-se como base a cor da pele de um
homem, se compararmos um negro africano com um branco europeu, sendo ambos
desconhecidos para o observador, tudo quanto se pode dizer, com certeza, sobre o
negro, é que ele tem mais melanina do que o branco.
- Kardec também foi criticado por considerar o trabalho intelectual uma forma superior
de atividade, tanto entre encarnados quanto entre desencarnados (ver pergunta 538 de O
Livro dos Espíritos), o que, certamente, influenciou na elaboração da obra que
compunha, de vez que nela a abordagem dos fenômenos físicos e da experimentação
prática é diminuta. Tal pensamento elitista (Karl Marx o chamaria de burguês) pode
gerar em pessoas desinformadas, o seguinte raciocínio: se fulano é um trabalhador
artesanal, operador de máquinas, sapateiro, dentre outros, está ligado a um trabalho
25

inferior, é portanto um Espírito inferior. Jesus foi carpinteiro, Paulo de Tarso era
tecelão, Madre Teresa, Albert Schweitzer e Gandhi, foram faxineiros e escritores.
Todavia, todos eles se mostraram Espíritos iluminados. Acredito que este pensamento,
que perpassa toda a codificação, tenha desviado para outros pesquisadores
contemporâneos do mestre lionês, até mesmo como uma providência adotada pela
equipe espiritual responsável pela instalação do Espiritismo no planeta, a pesquisa e a
divulgação de toda a gama de fenômenos relacionados com os efeitos físicos. Tal foi o
trabalho efetuado por Madame D’Esperance, William Crookes, Daniel Dunglas Home,
Louis Alphonse Cahagnet, Alexandre Aksakof, Zöllner, Bozzano, Henry Slade, dentre
outros.
- Kardec é também criticado por ora utilizar, ora não utilizar e de outras vezes mal-
utilizar o método científico e a concordância universal para os ensinamentos espíritas.
Uma argumentação favorável a esse ponto de vista é a modificação que ocorreu na
segunda edição de O Livro dos Espíritos de três pontos altamente importantes para a
Doutrina e que todos desconhecem o critério utilizado na modificação. Essas
modificações já foram apresentadas acima.
Resta-nos reconhecer que Kardec viveu em um contexto e em um país que
realmente eram cultos, berço do iluminismo, sendo-lhe dificultoso escapar às
influências do meio, aos arroubos patrióticos de uma nação convicta da superioridade de
suas conquistas nos campos da ciência, da filosofia e das artes. Enquanto outros países
ainda escravizavam os negros e dizimavam os índios, a França, recanto mais luminoso
da Europa, preparava enciclopédias, aprofundava os direitos sociais, humanizava o
tratamento dos loucos, exaltava os valores filosóficos e artísticos, destacava a ciência
como linguagem representativa do progresso e burilava a religião procurando retirar
dela os pruridos humanos. Ao ler a obra de Kardec, deve o leitor situar-se em tal
contexto, pois dificilmente o homem passa incólume aos valores e tradições de sua
época.
Ao final do livro, em Comentários do Autor, aprofundaremos as questões aqui
abordadas.
Esses pontos sobre a vida e a obra de Kardec nos bastam para justificar a
necessidade das reflexões que passaremos a desenvolver em sua obra O Livro dos
Espíritos, sempre lembrando: Não tenho nenhuma intenção de modificar a citada
obra, retirando o que seu autor escreveu para colocar o que eu sugiro; apenas
proponho que o leitor coloque um livro ao lado do outro e, passo a passo, tire suas
próprias conclusões. Assim fizemos, eu e o tempo. As sugestões que constam na
obra têm a finalidade de oferecer ao leitor um referencial para que ele possa
avaliar o comentário feito, e não para que elas sejam introduzidas em meio aos
escritos de Kardec.

Introdução ao estudo da Doutrina Espírita (comentários e sugestões)

Lembramos ao leitor que estamos consultando quatro traduções


simultaneamente, quais sejam: Herculano Pires, Salvador Gentile, Torrieri Guimarães e
Guillon Ribeiro, e que só daremos sugestão quando considerarmos o texto inadequado,
ou contraditório com o corpo doutrinário espírita em todas elas, fato que reforça a idéia
de que todos os tradutores seguiram fielmente a idéia original, sendo a discordância
registrada imputada ao Espírito comunicante e/ou ao comentário que o endossa.
26

Admitiremos ser preferência do tradutor por tais ou tais palavras, estilo ou


adequação ao idioma português, casos em que algum deles tenha traduzido corretamente
a idéia e outro o tenha feito de maneira errônea, incompleta ou menos clara. Nesse caso,
faremos ou não um comentário ou uma adequação àquela considerada passível de
melhora, oferecendo-a como sugestão a fim de que o texto represente com mais justeza
a essência doutrinária espírita; se alguma mudança for necessária apenas na pergunta,
não colocaremos a resposta da questão em análise; em casos de textos longos, cuja
modificação a ser feita seja mínima, separaremos o trecho a ser analisado e o exporemos
em destaque com o devido reparo; se considerarmos que a resposta necessita de um
comentário a fim de esclarecê-la melhor, nós o faremos; comentários longos ficarão
para o final do livro.
Tais sugestões não se destinam a modificar a obra nem trazem em seu bojo
nenhuma crítica ao codificador. Muito menos têm o objetivo de promover ou destacar a
pessoa que as elaborou visto que, na realidade, ela fez o óbvio, conquanto necessário.
Diria mesmo que a grande maioria dos espíritas as admite e, às vezes, até as discute
sem, todavia, agrupá-las e incorporá-las ao conjunto da obra.
Feitas tais observações, passemos à introdução da obra, ressaltando sua síntese
bela e singela, motivo de encantamento e elevação a tantos que a apreendem.
Julgamos por bem numerar nossas interferências a fim de melhor nos situarmos
e nos entendermos, de vez que necessitamos de referenciais para agilizar nossa
pesquisa.

1. A morte é a destruição do envoltório mais grosseiro (cap. VI).

A ciência atual considera entre as propriedades gerais da matéria a


indestrutibilidade como uma das mais importantes. A matéria, portanto, não pode ser
destruída, e sim transformada. Essa lei (conservação da massa), descoberta pelo francês
Lavoisier, morto pela Revolução Francesa (1789), é anterior a Kardec, sendo, por
conseguinte, bastante divulgada entre os intelectuais da época, não havendo razões para
ser ignorada na primeira edição de O Livro dos Espíritos em 1857.

Sugestão: A morte é a transformação do envoltório mais grosseiro visando devolver a


terra os elementos que o constituem.

2. As diferentes existências corporais do Espírito são sempre progressivas e


jamais retrógradas; mas a rapidez do progresso depende dos esforços que nós fazemos
para atingir a perfeição (cap. VI).

As existências são sempre progressivas e o Espírito jamais retrograda quando


analisamos o problema sob o ponto de vista do conhecimento acumulado, ou seja, de
suas conquistas no campo científico, filosófico, moral, dentre outros. Estas jamais se
perdem, embora, na grande maioria das vezes, totalmente ou em parte, tal conhecimento
seja cerceado pelo esquecimento imposto pela encarnação. Todavia, se refletirmos no
tema sob a ótica do bem-estar físico, social e mental veremos que o Espírito pode
regredir por força de seus desvios para com a Lei. Ele pode, inclusive, habitando um
mundo de regeneração voltar a reencarnar em um mundo de provas e expiações, sendo
este inferior àquele, por não se encontrar preparado para responder adequadamente às
exigências evolutivas conquistadas pela sociedade que adentrou.
A obra Os Exilados de Capela ilustra com fidelidade este exemplo, bem como a
linguagem profética de Jesus sobre o final dos tempos, onde estão descritos os
27

diferentes caminhos que tomarão os bons e os maus em obediência à lei de causa e


efeito. Vejamos como Jesus se expressa quanto a este evento: “Ora, quando o filho do
homem vier em sua majestade, acompanhado de todos os anjos, ele se assentará sobre
o trono da sua glória. E estando todas as nações reunidas diante dele, irá separar os
homens uns dos outros, como um pastor separará as ovelhas dos cabritos, e colocará
as ovelhas à sua direita, e os cabritos a sua esquerda. Então o rei dirá àqueles que
estarão à sua direita: Vinde, vós que fostes abençoados por meu Pai, possuí o reino que
vos foi preparado desde a fundação do mundo. (...) Em seguida, dirá àqueles que
estarão à sua esquerda: Apartai-vos de mim, malditos; ide ao fogo eterno, que foi
preparado para o diabo e para seus anjos”. (O Evangelho Segundo o Espiritismo –
cap. XV – Fora da Caridade não há Salvação).
Podemos ler também, reforçando este exemplo, na excelente obra 50 Anos
Depois, de autoria do Espírito Emmanuel, psicografada por Chico Xavier, o drama de
Adriano, imperador romano, que dentre outras atrocidades permitiu o assassinato em
massa de cristãos e que, por seus crimes, reencarnou como filho de uma escrava, sendo
abandonado recém-nascido, pela própria mãe, que o deixou ao relento em meio a outros
rebentos enjeitados em local onde era comum tal procedimento.
Diante desses fatos tão contundentes, não restam dúvidas de que o Espírito não
retrograda em suas conquistas intelectuais e morais, mas em bem-estar físico, social e
mental as quedas podem ser homéricas.

Sugestão: O texto acima escrito seria utilizado como nota complementar.

3. Na sua reentrada no mundo dos Espíritos, a alma aí reencontra todos aqueles


que conheceu sobre a Terra, e todas as suas existências anteriores se retratam em sua
memória com a lembrança de todo o bem e de todo o mal que fez (cap. VI).

Na verdade, quando um Espírito qualquer, salvo os superiores, adentra o mundo


dos Espíritos após a desencarnação, passa por um período de perturbação que varia
conforme o seu estágio evolutivo. Passado este período, que pode ser de horas, meses
ou anos, ele nem sempre reencontra aqueles com os quais se relacionou. Todos que ele
conheceu sobre a Terra totalizaria milhares de Espíritos a ele vinculados por centenas de
encarnações, muitos dos quais já não lhe interessa rever ou lhe desagradaria reencontrar.
Mesmo entre seus entes queridos, alguns podem estar encarnados em regiões
desconhecidas, outros terem optado por mudança de rumo adentrando-se no Bem ou no
Mal, dele se afastando, e outros podem estar ao seu lado, mas invisíveis para ele. Pode
até mesmo ocorrer que algum Espírito que com ele tenha se relacionado no passado
possa estar em um mundo diferente, naquele instante, com acesso negado para os que, à
sua semelhança, ainda não tenham evoluído o bastante para visitá-lo. Outra realidade
que ele pode encontrar é a ausência de amigos, por não ter agido lealmente com eles, o
que lhe serviria como lição para que mais valor venha dar à amizade. Quanto à memória
de todas as existências, isso é ainda mais difícil, principalmente de suas primeiras
encarnações, cujas lembranças se perderam no tempo. Em alguns casos se fazem
necessárias regressões de memória para que venha à tona o conhecimento passado. De
outra feita, esse conhecimento pode ser ocultado a fim de preservar a lucidez e o bom
ânimo na luta. Posteriormente, na Revista Espírita de junho de 1866, Kardec responde a
uma indagação questionando esta afirmativa, feita através de carta. Eis parte de sua
resposta: O Livro dos Espíritos não é um tratado completo do Espiritismo; não faz
senão colocar-lhe as bases e os pontos fundamentais, que devem se desenvolver
sucessivamente pelo estudo e pela observação.
28

Como o codificador também disse que na Doutrina Espírita tudo deveria ter
precisão e clareza, sem nada deixar de vago, consideramos que a presente resposta
necessita de um complemento.
Sugestão: Na sua reentrada no mundo dos Espíritos, a alma aí reencontra alguns
daqueles que conheceu sobre a Terra e, à proporção que vai se readaptando a vida no
mundo espiritual, suas existências anteriores vão se retratando em sua memória com a
lembrança do bem e do mal que fez.

4. A ciência propriamente dita, como ciência, portanto, é incompetente para se


pronunciar na questão do Espiritismo: ela não tem que se ocupar com isso e seu
julgamento, qualquer que seja, favorável ou não, não poderia ter nenhuma
importância. (...) Vede, pois, que o Espiritismo não é da alçada da Ciência (cap. VII).

Aqui temos uma flagrante contradição com o que mais tarde, Kardec, mais
experiente e mais sábio, afirmaria: “Caminhando de par com o progresso, o Espiritismo
jamais será ultrapassado, porque, se novas descobertas lhe demonstrassem estar em
erro acerca de um ponto qualquer, ele se modificaria nesse ponto. Se uma verdade
nova se revelar, ele a aceitará”. (A Gênese, cap. I, Item. 55). Mas para que todos vejam
o apreço que Kardec tinha para com a ciência, vejamos algumas afirmativas suas
escritas no livro “A Gênese” lançado em 1868, já mais experiente neste assunto: Por
sua natureza, a revelação espírita tem duplo caráter: participa ao mesmo tempo da
revelação divina e da revelação científica. ... Participa da segunda, por não ser esse
ensino privilégio de indivíduo algum, mas ministrado a todos do mesmo modo; por não
serem os que o transmitem e os que o recebem seres passivos, dispensados do trabalho
da observação e da pesquisa, por não renunciarem ao raciocínio e ao livre-arbítrio;
porque não lhes é interdito o exame, mas, ao contrário, recomendado; enfim porque a
doutrina não foi ditada completa, nem imposta à crença cega; porque é deduzida, pelo
trabalho do homem, da observação dos fatos que os Espíritos lhe põem sob os olhos e
das instruções que lhe dão, instruções que ele estuda, comenta, compara, a fim de tirar
ele próprio as ilações e aplicações.
Um pouco adiante Kardec reforça este raciocínio: É, pois, rigorosamente exato
dizer-se que o Espiritismo é uma ciência de observação e não produto da imaginação.
As ciências só fizeram progressos importantes depois que seus estudos se basearam
sobre o método experimental; ate então, acreditou-se que esse método também só era
aplicável à matéria, ao passo que o é também às coisas metafísicas.
Para, finalmente, concluirmos que o Espiritismo não sobreviveria sem o auxilio
da ciência, vejamos como o codificador expõe de maneira clara sobre a necessidade de
união ente os aspectos religioso e científico: Assim como a ciência propriamente dita
tem por objeto o estudo das leis do princípio material, o objeto especial do Espiritismo
é o conhecimento das leis do principio espiritual. Ora, como este último princípio é
uma das forças da natureza, a reagir incessantemente sobre o princípio material e
reciprocamente, segue-se que o conhecimento de um não pode estar completo sem o
conhecimento do outro. O Espiritismo e a ciência se completam reciprocamente; a
ciência, sem o Espiritismo, se acha na impossibilidade de explicar certos fenômenos só
pelas leis da matéria; ao Espiritismo, sem a ciência, faltariam apoio e comprovação. O
estudo das leis da matéria tinha de preceder o da espiritualidade, porque a matéria é o
que primeiro fere os sentidos. Se o espiritismo tivesse vindo antes das descobertas
científicas, teria abortado, como tudo quanto surge antes do tempo.
29

Sugestão: A ciência propriamente dita, tem competência para se pronunciar


favoravelmente ou não, na questão do Espiritismo. Todavia, há de se verificar se o seu
discurso corresponde verdadeiramente à essência dos fatos aos quais a Doutrina
alude..

Prolegômenos

A palavra, prolegômenos, não é mais utilizada em obras literárias atuais. Em seu


lugar utiliza-se, introdução, prefácio ou outra com significado semelhante, mas que seja
rotineiramente empregada.

O Livro dos Espíritos, em alguns tópicos, traz fortes argumentos a favor de uma
adequação. Seus organizadores desencarnados, ou seja, a equipe chefiada pelo Espírito
de Verdade, enfatizou que fiscalizaria toda a obra a fim de que ela não viesse a conter
erros ou interpretações dúbias. São afirmações dessa equipe contidas no texto em
análise: “Esse livro foi escrito por ordem e sob o ditado dos Espíritos superiores para
estabelecer os fundamentos de uma filosofia racional, livre dos preconceitos do espírito
do sistema. (...) Ocupa-te com zelo e perseverança do trabalho que tu empreendeste
com nosso concurso, porque esse trabalho é o nosso. (...) antes de o propagar, nós o
reveremos em conjunto, a fim de controlar-lhe todos os detalhes”.
A julgar pelas palavras acima, a obra deveria aproximar-se o quanto possível da
perfeição, com o mínimo de arestas. E por que surgiram equívocos na primeira edição,
já superados, e permanecem os de natureza científica ainda hoje?
Primeiramente ressaltemos que ao dizer “esse trabalho é nosso”, os Espíritos
referiam-se a eles e a Kardec, fato que impõe mais responsabilidade sobre os ombros do
codificador. Se fosse apenas dos Espíritos, Kardec teria sido um ser passivo e qualquer
pessoa medianamente preparada poderia selecionar textos, proceder a uma pequena
crítica e editar seu conteúdo. Sabemos que ele analisava as mensagens, fundia umas
com outras, as aprofundava e completava com textos seus, acrescentava notas, enfim,
dava corpo definido ao que ouvia e anotava. Podemos afirmar que grande parte dos
textos da codificação devemos a ele, à sua inteligência e intuição, pois dos Espíritos era
a idéia, a essência, a inspiração que jamais lhe faltou.
É prudente também admitir que ainda somos falhos em alguns detalhes,
notadamente na educação da mediunidade. A obra foi repassada a Kardec por via
mediúnica. Isso significa que em algum ponto ela pode ter sido alvo de interferência,
sofrendo modificações no pensamento original do comunicante.
Devemos lembrar de que O Livro dos Espíritos teve suas respostas elaboradas,
inicialmente, através da psicografia por intermédio de uma cesta de bico e,
posteriormente, através da mão do médium. A fragilidade do primeiro método decorre
da imprecisão da caligrafia, pouco legível, às vezes, e com palavras que poderiam estar
emendadas umas às outras, sendo necessário recorrer à intuição do médium para que a
mensagem tivesse sentido. A deficiência da segunda tem base na interferência que o
médium ou o comunicante pode sofrer, resultando disso um real prejuízo para a
mensagem.
Ressalte-se ainda que a primeira edição da obra foi quase que totalmente escrita pela
jovem Caroline Baudin, de 16 anos de idade, como narra Kardec na Revista Espírita, de
janeiro de 1858: “Os primeiros médiuns que concorreram para o nosso trabalho foram
as senhoritas Julie e Caroline Baudin, cuja boa vontade jamais nos faltou. O livro foi
quase todo escrito por seu intermédio e em presença de numeroso público que assistia
às sessões, nas quais tinha o mais vivo interesse. Mais tarde os Espíritos
30

recomendaram uma revisão completa em sessões particulares, tendo-se feito, então,


todas as adições e correções julgadas necessárias. Essa parte essencial do trabalho foi
feita com o concurso da senhorita Japhet,a qual se prestou com a melhor boa vontade e
o mais completo desinteresse a todas as exigências dos Espíritos, porque eram eles que
marcavam dia e hora para suas lições”.
Como é forçoso acreditar, em uma assembléia variada onde os pensamentos são,
às vezes, antagônicos, não é muito fácil instalar um clima de harmonia e de excelência
para que se obtenha comunicações isentas de interferências.
Mas será que realmente podemos considerar como possibilidade, a interferência
do médium ou de terceiros nas mensagens ditadas visando à codificação da Doutrina?
Recorramos para isso à palavra dos imortais que auxiliaram Kardec na codificação,
contida em O Livro dos Médiuns: “Qual seria o médium que poderíamos considerar
perfeito? – Perfeito? É pena, mas bem sabes que não há perfeição sobre a Terra. Se
não fosse assim, não estarias nela. Digamos antes bom médium, e já é muito, pois são
raros. O médium perfeito seria aquele que os maus Espíritos jamais ousassem fazer
uma tentativa de enganar. O melhor é o que, simpatizando somente com os bons
Espíritos, tem sido enganado menos vezes”.
As interferências negativas em uma comunicação mediúnica podem surgir
através dos seguintes modos:
a) Interferência do médium na mensagem: neste caso, consciente ou
inconscientemente, o médium introduz pensamentos seus no corpo da mensagem
que recebe. Se essa adulteração for inconsciente podemos chamá-la de
comunicação anímica, se consciente, de fraude.
b) Interferência de uma mente estranha em sintonia com o médium: o “penetra”,
utilizando-se dessa sintonia, introduz pensamentos que são captados pelo
intermediário e adicionados à mensagem resultando na impressão de que esta é
exclusiva do comunicante.
c) Interferência de uma mente estranha em sintonia com o comunicante: aqui o
intruso introduz pensamentos que são captados pelo comunicante e repassados ao
médium, dando a impressão de que a mensagem é unicamente daquele que se
comunica. Esta hipótese é menos provável devido ao fato de o comunicante ter
sido, como se espera, um Espírito senão superior, pelo menos mais evoluído que a
média dos habitantes terrenos, exceto os Espíritos sofridos que deram testemunhos
de seus atos dolentes em obras como O Céu e o Inferno. Na comunicação de
Espíritos elevados, esse tipo de interferência com finalidade de adulterar e causar
prejuízos à mensagem é nula. Para melhorá-la, o caso torna-se comum.
d) Interferência de uma ou mais mentes estranhas em sintonia com o médium e com o
comunicante: neste caso existe a infiltração de pensamentos que são captados por
ambos, resultando em duplo prejuízo para a mensagem, deixando a impressão de
que esta é genuína e de autoria exclusiva do comunicante. Esta hipótese também
não nos parece viável pelos motivos já citados.
Pelo exposto vemos que uma obra mediúnica deve ser alvo de severa vigilância
e de apurada revisão a fim de que idéias estranhas não penetrem sutilmente,
subliminarmente através de infiltrações de pensamentos captados pelo médium e/ou
pelo comunicante.
Visto tais detalhes, passemos à observação da seguinte frase: “O homem
quintessencia o Espírito pelo trabalho e tu sabes que não é senão pelo trabalho do
corpo que o Espírito adquire conhecimento”.
Primeiramente, verificamos que a palavra corpo no contexto doutrinário espírita
pede um complemento. Corpo físico ou espiritual? O Espírito adquire conhecimento
31

tanto encarnado quanto na erraticidade, ou seja, com os dois corpos citados ou com
apenas um, o perispírito. A frase ficaria mais clara assim expressa: “... e tu sabes que é
apenas pelo trabalho que o Espírito adquire conhecimento”. Alguém poderá questionar
que o Espírito adquire conhecimento pelo estudo, pela prática das virtudes ou da
maldade, mas, em última instância, tudo é trabalho. Saiamos da introdução e
adentremos o cerne da obra.

Análise de algumas perguntas, respostas e comentários de Kardec

Pergunta 2

- O que se deve entender como infinito?

- O que não tem começo nem fim; o desconhecido: tudo que é desconhecido é infinito.

A palavra, infinito significa, não finito, ou seja, sem fim. Eterno é o que não tem
começo nem fim. Mesmo admitindo a palavra, infinito, como o que não tem começo
nem fim a resposta não está clara. Tudo que é desconhecido um dia virá à luz. E quando
isso ocorrer ainda será infinito? Admitindo este raciocínio, o desconhecido tornar-se
conhecido, ele já não se encaixa mais dentro do conceito defendido inicialmente, o de
não ter começo nem fim, pois com o conhecimento dominado, encerrado estará o
problema. Por tal razão, concordamos com a supressão de parte da resposta. Chamamos
a atenção do leitor para o conceito de infinito adotado pelos autores da obra, de vez que,
tomado como verdadeiro, deverá adequar-se coerentemente em todas as situações em
que for utilizado.

Sugestão: O que não tem fim.

Pergunta 11

- Um dia será dado ao homem conhecer o mistério da Divindade?

- Quando seu Espírito não estiver mais obscurecido pela matéria e, pela sua perfeição,
ele estiver próximo dele, então, ele o verá e o compreenderá.

Se Deus é onipresente sempre estamos próximos Dele não sendo preciso esperar
a evolução para então gozarmos dessa proximidade. Quanto a vê-lo, como quem diz:
estou vendo ali o meu pai, isso o limitaria por enquadrá-lo em um espaço finito e Deus é
infinito.

Sugestão: Quando seu Espírito não estiver mais obscurecido pela matéria ele se
identificará em definitivo com Ele.

Pergunta 14

- Deus é um ser distinto, ou seria, segundo a opinião de alguns, a resultante de todas as


forças e de todas as inteligências do Universo reunidas?
32

- Se o fora assim, Deus seria, o efeito e não a causa; ele não pode ser ao mesmo tempo
um e outra. Deus existe, vós não o podeis duvidar, é o essencial. Crede-me, não vades
além. Não vos percais num labirinto de onde não podereis sair. Isso não vos torna
melhores, mas talvez um pouco mais orgulhoso porque acreditaríeis o que na realidade
nada saberíeis. Deixai, pois, de lado todos esses sistemas; tendes muitas coisas que vos
tocam mais diretamente, a começar por vós mesmos. Estudai as vossas imperfeições, a
fim de vos desembaraçar delas, isso vos será mais útil do que querer penetrar o que é
impenetrável.

Apesar do bom conselho de conhecermos a nós mesmos primeiramente, a


resposta procura colocar um freio nas pesquisas científicas e filosóficas a respeito da
natureza divina. Ressaltamos que na época atual os recursos são bem maiores que os
anteriores e que a sede de saber é própria do Espírito, sendo esta atitude de indagação e
pesquisa, a responsável pelo grande desenvolvimento que o planeta atingiu atualmente.
Hoje admitimos que a construção do conhecimento se faz através de erros e acertos,
sendo o erro interpretado pedagogicamente como uma tentativa de acerto. Quem sabe se
um incentivo para o estudo e para a pesquisa, já que vivemos em um país onde muitos
são os acomodados que se comprazem com romances adocicados e mensagens
“curtinhas para não cansar a vista” não seria bem melhor? Além do mais, o
conhecimento a respeito de Deus não é impenetrável senão no estágio evolutivo em que
nos encontramos, segundo resposta anterior.

Sugestão: Se assim o fora, deus seria o efeito e não a causa. Deus existe, vós não podeis
duvidar, isso é essencial. Pesquisai, mas tende o cuidado para não vos tornardes
orgulhosos por um falso saber que julgais verdadeiro, tendo antes a preocupação de
apreender o conhecimento acerca de vós mesmos, a fim de vencer vossas imperfeições.

Pergunta 17

- É dado ao homem conhecer o princípio das coisas?

- Não, Deus não permite que tudo seja revelado ao homem nesse mundo.

Não é que Deus não permita ao homem apreender determinados conhecimentos.


É que ele ainda não evoluiu o bastante para o entendimento de determinadas questões.
Não devemos esquecer que existe uma lei de evolução presidindo todos os eventos do
planeta. Um dia a Terra (esse mundo) será um planeta de Espíritos evoluídos e, nesse
dia, teremos condições de saber o princípio das coisas.

Sugestão: Deus não permite, ainda, que tudo seja revelado ao homem nesse mundo
devido ao seu atraso intelectual e moral.

Pergunta 21

- A matéria existe desde o princípio, como Deus, ou foi criada por Ele em determinado
momento?
33

- Só Deus o sabe. Entretanto, há uma coisa que a vossa razão deve indicar: Deus,
modelo de amor e caridade, jamais esteve inativo. Por mais distante que se consiga
imaginar o início da sua ação, poder-se-á compreendê-lo um segundo sequer na
ociosidade?

A obra revela insistentemente que Deus, causa primeira de todas as coisas, é o


criador de tudo quanto existe. Portanto, dizer que “só Deus o sabe”, não condiz com a
linha de pensamento por ela escolhida quando coloca Deus como o criador incriado. Se
a matéria existisse desde o princípio, como Deus, Ele não seria a causa primeira, o
criador de todas as coisas, e quem a tivesse criado é que seria Deus. Além do mais, o
complemento da resposta é inócuo e sem relação direta com a pergunta.

Sugestão: Já vos dissemos que Deus é a causa primeira de todas as coisas.

Pergunta 25

- O Espírito é independente da matéria ou não é mais que uma propriedade desta, como
as cores são propriedades da luz e o som uma propriedade do ar?

- Ambos são distintos; mas é necessária a união do Espírito e da matéria para dar
inteligência à matéria.

O Espírito não dá inteligência à matéria porque aquela lhe é própria e


intransferível. A sua união com a matéria perispiritual possibilita que ele atue no mundo
espiritual e a sua união com a matéria orgânica o permite atuar no mundo material a fim
de construir, através da sua interação com esses corpos, o conhecimento de que
necessita para evoluir. Todavia, chegará o dia em que ele não mais precisará reencarnar.
Daí em diante estará ligado apenas à matéria perispiritual.

Sugestão: Ambos são distintos; mas é necessária a união do Espírito com a matéria a
fim de que ele possa atuar no mundo a que é chamado a se exercitar. De certa forma,
com o auxílio do fluido vital ele animaliza a matéria e dela se serve em suas atividades.

Pergunta 31

- De onde provêm as diferentes propriedades da matéria?

- São modificações que as moléculas elementares sofrem pela sua união, e em certas
circunstâncias.

Vejamos a definição de átomos adotada pela ciência atual: “sistema


energeticamente estável, formado por um núcleo positivo que contém prótons e
nêutrons, e cercado de elétrons” (Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa). Os
átomos são, portanto, elementos materiais, invariáveis, invisíveis em virtude da
pequenez e homogêneos entre si, distinguindo-se apenas pela forma, posição e
movimento. Já uma molécula é um grupamento estável de dois ou mais átomos, que
caracteriza quimicamente certa substância.
Ao utilizar os termos “moléculas elementares”, os Espíritos passam uma idéia de
que o fluido universal é constituído por moléculas, e não por partículas elementares. Em
busca dos componentes formadores da matéria, do “sêmen” fecundante do espaço, o
34

homem já vasculhou o átomo com o auxílio dos aceleradores de partículas, descobrindo


que ele é composto por mais de duzentas delas, sem chegar a uma conclusão definitiva.
Ao bombardear o átomo, este se desagrega em diferentes partes e essas partes se
desintegram em outras, até que as últimas, ao se desligarem, geram partes que não são
menores que aquelas de onde surgiram. O homem viu assim, aturdido, que as partículas
saem da energia pura onde são geradas em certas circunstâncias e a ela voltam num
bailado cósmico mais digno de uma sinfonia que de um teorema.
Essa última fronteira que o homem busca, o fluido universal, provavelmente a
energia pura que dá origem a essas partículas elementares, deve ser algo ainda mais
fantástico que o cenário já admirado pelo homem em sua saga para descobrir como
surge a matéria. Se penetramos no átomo, para nós uma partícula elementar, e
descobrimos outras ainda mais ínfimas, como admitir o fluido universal composto por
moléculas, sendo estas um grupamento de dois ou mais átomos?
Alguns podem argüir que falam os Espíritos de outra realidade a qual não
entendemos. Um bom professor precisa utilizar-se da linguagem usual do seu aluno para
explicar o que deseja. Exigir que o aluno “suba” até ele para entendê-lo em sua
explanação é totalmente antipedagógico. Por esta razão sugerimos que a palavra
molécula seja substituída.

Sugestão: São modificações que as partículas elementares sofrem pela sua união, e em
certas circunstâncias.

Pergunta 33

Comentário de Kardec: O oxigênio, o hidrogênio, o azoto, o carbono e todos os corpos


que catalogamos como simples...

Na tabela periódica onde constam todos os elementos químicos naturais e artificiais


existentes no planeta, fonte de pesquisa de químicos e de estudantes da Química, não
existe o azoto, mas o nitrogênio. Se fizermos uma pesquisa entre os estudantes do
ensino médio com o objetivo de que eles identifiquem as características de um gás
chamado azoto, dificilmente obteremos resposta.

Sugestão: O oxigênio, o hidrogênio, o nitrogênio, o carbono e todos os corpos que


catalogamos como simples...

Pergunta 34

- As moléculas têm uma forma determinada?

- Sem dúvida, as moléculas têm uma forma determinada, mas que não é para vós
apreciável.

Atualmente, a Química, através da geometria molecular, já consegue determinar


a forma das moléculas. Através de técnicas especiais poderosos microscópios já
fotografam várias moléculas, notadamente, de proteínas. As moléculas diatômicas, ou
seja, aquelas que possuem somente dois átomos são sempre lineares. Observando-se
uma molécula do dióxido de carbono (CO2), notamos que a distribuição espacial dos
seus pares eletrônicos é O = C = O, o que implica dizer que sua geometria molecular é
linear. Da mesma maneira, determinou-se a geometria molecular angular, com a
35

distribuição dos pares eletrônicos obedecendo aos limites de um triângulo equilátero,


em forma de tetraedro, dentre outras. Lembramos aqui o ocorrido com o cientista
Kalkulé, que exausto em sua luta para descobrir como os átomos de carbono e de
hidrogênio se arrumavam no espaço formando a molécula do benzeno, sonhou com
duas cobras, uma devorando a outra, formando uma espécie de balão fechado
(hexágono) e ao acordar notou que aquela forma se adaptava de maneira admirável à
estrutura que buscava. Teve em sonho a visão da forma geométrica que procurava,
antecipando-se aos certeiros estudos hoje possibilitados pela ação dos computadores.

Sugestão: Sem dúvida, as moléculas têm uma forma determinada, mas para vós ainda
não apreciável.

Pergunta 35

- O espaço universal é infinito ou limitado?

- Infinito. Supõe-no limitado; que haveria além? Isto te confunde a razão, eu sei bem, e,
todavia, tua razão diz que não pode ser de outro modo. Ele é como o infinito em todas
as coisas; não é na vossa pequenina esfera que podereis compreendê-lo.

Lembra-se o leitor de que cobraríamos a coerência nas respostas sempre que o


conceito de infinito (o que não tem começo nem fim, segundo definição inicial) fosse
utilizado? Certamente que o espaço teve um começo. A obra da criação descrita em A
Gênese, assim o confirma. Os Espíritos responsáveis pela obra O Livro dos Espíritos
dizem que o universo não pode ter sido criado por ele mesmo. Se ele foi criado, teve um
começo, não se enquadrando mais no conceito de infinito. Poder-se-ia dizer que ele é
ilimitado, ou seja, tão imenso que não nos é possível dimensioná-lo. Além do mais,
afirma a ciência que o universo está em expansão, com todas as suas galáxias se
afastando de um ponto central, sendo esta fuga o resultado de uma grande explosão
ocorrida entre dez a quinze bilhões de anos passados. A teoria do Big Bang é a mais
aceita no presente momento para explicar a origem do universo. Se todas as galáxias se
afastam hoje, houve um momento no passado em que toda a matéria estava concentrada
em um ponto. Este ponto, segundo a ciência, foi o início de tudo.

Sugestão: Ilimitado; Supõe-no limitado; o que haveria além? Isto te confunde a razão,
eu bem sei, e, todavia, tua razão diz que não pode ser de outro modo.

Pergunta 37

- O universo foi criado ou existe de toda a eternidade como Deus?

- Sem dúvida que ele não pôde fazer-se por si mesmo, e se fosse de toda a eternidade,
como Deus, não poderia ser obra de Deus.

Essa resposta torna sem efeito e, portanto, desnecessária, a pergunta de número


21, que, se retirada da obra, não afetaria o conjunto, visto que nada acrescenta, e até o
tornaria mais conciso e coerente.
36

Pergunta 40

- Os cometas seriam, como se pensa atualmente, um começo de condensação da matéria


e de mundos em via de formação?

- Isso é exato; mas o que é absurdo é crer-se em sua influência. Quero dizer, a
influência que vulgarmente se lhe atribui; porque todos os corpos celestes têm sua
parte de influência em certos fenômenos físicos.

A resposta a essa questão não nos parece clara, razão pela qual a dividiremos em
duas partes: se ela se referisse unicamente à condensação da matéria, permanecendo
como está nos pareceria lógica, apesar de não termos a certeza de que um corpo situado
a milhões de anos-luz da Terra, um asteróide, por exemplo, girando tranqüilamente em
órbita de algum planeta, possa ter influência em algum fenômeno físico na Terra. Se o
Espírito que a respondeu o fez incluindo os mundos a serem formados, ela se
modificaria.
Quanto aos cometas serem mundos em formação, nada há de provado neste
sentido, pelo contrário, a ciência afirma que o destino desses astros é a morte por
desgaste de matéria, que vai diminuindo a cada vez que passam próximo ao Sol.

Sugestão: Cometas são astros errantes que nos visitam periodicamente até que, por
decréscimo de matéria, o que ocorre a cada vez que se aproximam do Sol, desaparecem
do cenário celeste. Não devemos atribuir à sua aparição nenhum mau presságio, como
os antigos faziam, pois, trata-se de um fato normal dentro das leis que regem os
movimentos dos astros.

Pergunta 42

- Poderemos conhecer a duração da formação dos mundos: da Terra, por exemplo?

- Nada te posso dizer a respeito, porque só o Criador o sabe, e bem louco seria quem
pretendesse saber ou conhecer o número de séculos dessa formação.

Digno de nota é o tempo do verbo poder, no futuro, que assim empregado, nega
a lei de evolução. Consideramos que no momento em que a pergunta foi feita, muitos
Espíritos superiores, técnicos, engenheiros siderais, aos quais Deus confia a formação
de novos mundos, poderiam dar uma resposta exata à questão formulada.
A ciência atual já calcula a idade das mais antigas rochas com base na
radioatividade. Através de pesquisas feitas por Becquerel em 1895, constatou-se que
certos elementos químicos, os radioativos, vão se desintegrando espontaneamente a um
ritmo constante de emissão de partículas até estabilizarem-se sob a forma de um
elemento final. A velocidade e o modo de desintegração dos elementos radioativos são
próprios em cada um deles e podem ser determinados experimentalmente. Através da
aplicação dos métodos radioativos, a idade da Terra foi calculada em cerca de 4,6
bilhões de anos.
Indo mais longe, o homem descobriu através do estudo dos fósseis, que a origem
da vida teve seus ensaios iniciais em torno de quatro bilhões de anos passados, nos
lagos e oceanos. Há três bilhões de anos começaram a surgir os organismos
pluricelulares; há 2 bilhões de anos surgiu o sexo; há um bilhão de anos os vegetais
37

inundaram o espaço com oxigênio através da fotossíntese; há 600 milhões de anos


surgiu a explosão cambriana, quebrando a hegemonia das algas ao diversificar as
espécies; há cerca de 10 milhões de anos surgiram as primeiras criaturas parecidas com
seres humanos.
Pelo exposto concluímos que a resposta, além de desestimulante, ou seja, não
incentiva à pesquisa, não é exata em sua afirmativa, segundo a qual só o Criador detém
essa resposta. Julgamos que “só o Criador sabe, e bem louco seria quem pretendesse
saber”, não são argumentos dignos da linguagem dos bons Espíritos, pois estes primam
pelos conselhos perfeitamente racionais.

Sugestão: Nada te posso dizer a respeito, por enquanto. Os Espíritos encarregados da


formação e da evolução da Terra detém esses dados, mas cabe a vós a pesquisa e o
esforço na busca dessa verdade que, certamente, vos será apresentada à medida que
vossa ciência e vossa moral avancem o bastante para conquistá-la.

Pergunta 43

- Quando a Terra começou a ser povoada?

- No começo tudo era caos; os elementos estavam em confusão. Pouco a pouco cada
coisa tomou o seu lugar; então apareceram os seres vivos apropriados ao estado do
globo.

Sugestão: substituir a palavra quando que inicia a pergunta, por como.

Pergunta 46

- Existem, ainda, seres que nasçam espontaneamente?

- Sim, mas o germe primitivo existia em estado latente. Sois testemunhas todos os dias,
desse fenômeno. Os tecidos dos homens e dos animais não encerram os germes de uma
multidão de vermes que aguardam, para eclodirem, a fermentação pútrida necessária à
sua existência? É um pequeno mundo que dormita e que se cria.

A teoria da geração espontânea, ou abiogênese, que afirmava que os seres vivos


podiam surgir espontaneamente da matéria não-viva, teve crédito até meados do século
XIX, ocasião em que Redi, Spallanzani e Pasteur a soterraram. Hoje se sabe que um ser
vivo surge somente através da reprodução, seja ela assexuada ou sexuada. A
fermentação pútrida ocorre por atuação dos decompositores, fungos e bactérias,
responsáveis pela reciclagem da matéria orgânica do planeta.
Não é a fermentação pútrida que faz gerar os seres, pois estes já existem e
apenas convergem para o corpo inerte movidos por condições favoráveis. Bactérias
anaeróbicas e aeróbicas, fungos que se agregam ao cadáver, moscas que perfuram a
terra para pôr seus ovos no cadáver a fim de que eclodam gerando larvas e até besouros
que se sucedem em atividade junto ao cadáver, conforme o grau da decomposição, são
seres já existentes cuja função é possibilitar o reaproveitamento do material subtraído ao
planeta, devolvendo ao solo o que lhe pertence.

Sugestão: Não, pois um ser vivo surge através de outro que lhe dá origem. A
fermentação pútrida que ocorre por ocasião da morte dos seres vivos é necessária a fim
38

de que a matéria por eles utilizada seja restituída a terra para novamente ser
aproveitada.

Pergunta 49

- Se o germe da espécie humana se encontrava entre os elementos do globo, por que não
se formam mais, espontaneamente, os homens como na sua origem?

- O princípio das coisas está nos segredos de Deus; todavia, pode-se dizer que os
homens uma vez espalhados sobre a Terra, absorveram neles os elementos necessários
à sua formação para transmiti-los segundo as leis da reprodução. O mesmo se deu com
as diferentes espécies de seres vivos.

Constantemente venho chamando a atenção do leitor para respostas


desestimulantes com relação à pesquisa e ao desejo inato do ser humano de aprender.
Hoje tal resposta seria dada, principalmente, através da genética, enfatizando que, com o
surgimento do sexo, dois organismos tiveram a chance de trocar pedaços do seu código
genético, do seu DNA, produzindo novas variedades a serem selecionadas pela
evolução. Por outro lado, os seres vivos, mesmo antes do aparecimento do homem, já
haviam adquirido a capacidade de se multiplicar por via sexual, não sendo, portanto, os
homens que, uma vez espalhados sobre a Terra absorveram elementos, possibilitando-os
a formarem cópias suas.

Sugestão: Pode-se dizer que os homens adquiriram a capacidade de formar cópias suas
segundo a lei de reprodução, pois já havia neles os elementos necessários à
transmissão dos caracteres hereditários. O mesmo se deu com as diferentes espécies de
seres vivos surgidas deles.

Pergunta 52

- De onde vêm as diferenças físicas e morais que distinguem as variedades de raças


humanas sobre a Terra?

- Do clima, da vida e dos costumes. O mesmo ocorre com dois filhos da mesma mãe
que, educados um longe do outro e diferentemente, não se assemelham em nada quanto
à moral.

Primeiramente é preciso lembrar que a ciência já provou que existe apenas uma
raça humana. Quando se fala sobre moral, faz-se alusão a um conjunto de regras de
conduta consideradas como válidas, quer de modo absoluto para qualquer tempo ou
lugar, quer para grupo ou pessoa determinada. Dessa maneira nos referimos à moral do
Cristo e a consideramos válida para todos os cristãos. Ora, se esses dois filhos já
tiverem valores morais consolidados, mesmo longe e em culturas diferentes, mostrar-se-
ão semelhantes no modo de agir diante de fatos que exijam uma decisão, provando a
aquisição de um determinado valor ou conquista, tal como a paciência, a tolerância, a
justiça, a caridade, dentre outras. As diferenças culturais dos povos não retiram dos
Espíritos seus valores morais já conquistados, que de alguma maneira se expressam,
visto que eles não podem retrogradar. A resposta parece ignorar as afinidades, as
tendências e o estágio espiritual de cada um, generalizando aspectos que necessitam de
detalhes para um completo entendimento. Exemplificando: dois filhos de uma mesma
39

mãe, educados em culturas diferentes, uma francamente favorável a pena de morte e a


outra não, precisam tomar cada um deles a seguinte decisão: dar parecer em um
julgamento de um homem que matou outro para roubar. Se os dois forem Espíritos já
comprometidos com a moral do Cristo, embora educados em culturas opostas, tenderão
ao mesmo comportamento, ou seja, se assemelharão quanto à moral, pois esta quer a
educação do pecador e não sua morte.

Sugestão: As diferenças físicas, do clima e dos costumes. As diferenças morais, do


estágio evolutivo no qual cada indivíduo se encontra. Em se tratando do aspecto moral,
pode ocorrer que dois filhos da mesma mãe, quando educados um longe do outro e
diferentemente, apresentem soluções iguais para problemas semelhantes.

Pergunta 55

- Todos os globos que circulam no espaço são habitados?

- Sim, e o homem da Terra está longe de ser, como ele crê, o primeiro em inteligência,
em bondade e em perfeição. Todavia, há homens que se crêem muito fortes, que
imaginam que somente seu pequeno globo tem o privilégio de abrigar seres racionais.
Orgulho e vaidade! Julgam que Deus criou o Universo só para eles.

A pergunta, segundo o meu ponto de vista, foi feita com a intenção de saber da
existência de seres humanos em outros planetas e não de simples formas de vida, tais
como vírus e bactérias. Suponhamos que a Terra seja o universo que conhecemos. Nela
existe locais onde a vida é abundante, outros onde é escassa e terceiros onde ela não
floresce. As cidades, os desertos, o centro da Terra com seu núcleo de ferro e níquel
incandescente, podem nos dar uma idéia desse quadro. Não podemos imaginar o
universo com semelhantes características? Haverá vida em um buraco negro? Em uma
estrela que explode transformando-se em uma supernova? Em uma estrela qual o Sol,
onde as explosões são constantes devido aos átomos de hidrogênio se fundirem a uma
temperatura que oscila entre 15 a 20 milhões de graus para formar o hélio? Nas
explosões das estrelas, o que sucederia com a vida se ela lá estivesse? Seria
exterminada? A Lua não é habitada por encarnados. Deveríamos então fazer uma
divisão clara de mundos habitados por encarnados e outros por desencarnados, a fim de
que alguém não venha a dizer: “Não é habitado por encarnados, mas pode ser por
desencarnados”
A pergunta de número 43 indaga quando a Terra começou a ser povoada. Isso
não é um indicativo de que ela, no período de sua formação estava despovoada? Nesse
período correspondente a um bilhão ou mais de anos necessários a sua consolidação, era
ou não era um planeta? Quem respondeu à pergunta de número 55 teve condições de
averiguar ou saber de uma fonte segura que tivesse sondado os confins do universo a
fim de se certificar se todos os globos são habitados?
Já fomos à Lua e enviamos a Marte naves que fizeram um relato completo de
sua superfície. Somente a Mariner 9 orbitando este planeta durante 349 dias, enviou
para a Terra 7.329 fotografias. Temos um mapa da superfície marciana mostrando solo
avermelhado, pedras, montes e buracos. Ainda não foi encontrada nenhuma espécie de
vida entre esses escombros. Viveriam os marcianos no interior do planeta ou teriam eles
o poder de iludir nossos instrumentos?
Quando o Espiritismo faz uma citação, esta deve ter respaldo científico. Foi
assim que aconselhou o seu codificador. Afirmações espetaculares, mas sem a devida
40

aprovação da ciência, mais afastam adeptos que aproximam. Aliás, o Espiritismo


sempre estará melhor acompanhado e representado se pessoas lúcidas, amantes da
ciência e da razão o sustentarem. Aqui não vai embutida nenhuma acusação a quem
quer que seja, é apenas uma observação que deve ser levada em conta no
encaminhamento das questões doutrinárias.
A afirmação de que existe vida em todos os globos que circulam pelo espaço é
racional, lúcida e dá uma utilidade a todos eles. Mas astros como os cometas a teriam?
Não seria melhor esperar que a ciência avançasse um pouco mais, antes de emitir uma
resposta tão genérica?

Sugestão: Acreditamos que a grande maioria o seja, e o homem da Terra está longe de
ser, como ele crê o primeiro em inteligência, em bondade e em perfeição. Todavia, há
homens que se crêem muito fortes, que imaginam que somente seu pequeno globo tem o
privilégio de abrigar seres racionais. Orgulho e vaidade! Julgam que Deus criou o
Universo só para eles.

Pergunta 56

- A constituição física dos diferentes globos é a mesma?

- Não, eles não se assemelham de modo algum.

Chamamos a atenção para o comentário de Kardec feito à resposta da pergunta


55 onde ele finaliza da seguinte maneira: “... com exclusão de tantos milhares de
mundos semelhantes”. A palavra semelhante significa, parecido, ou seja, mundos que se
identificam em um ou múltiplos aspectos. Quanto a este tema, vejamos como se reporta
Joanna de Ângelis, com base em estudos do astrônomo Sir James Jeans, em seu livro No
Limiar do Infinito, psicografado por Divaldo Franco: “cálculos pessimistas, examinando
o Sol, estrela de quinta grandeza a sustentar 9 (Já não temos 9 planetas, pois Plutão é
hoje considerado um grande asteróide) planetas conhecidos por enquanto, e que os
mantêm com a sua energia, fazem crer que neste universo de sóis mais poderosos, se
lhes fossem dados 2 planetas apenas para cada um, teríamos 200 bilhões em
movimentação em nossa galáxia. Atribuindo-se por probabilidade a hipótese de
somente 1% deles ter as mesmas condições e idades correspondentes à Terra, teríamos
dois bilhões de planetas com as mesmas condições que caracterizam o nosso berço de
origem.
Dando-se a possibilidade remotíssima de que apenas 1% deles tivesse condições
de vida semelhante à nossa e defrontaríamos, aproximadamente, com cerca de 20
milhões de planetas iguais ao nosso com vida inteligente”.
Por que astrônomos da Terra têm tanto interesse em Marte? Porque ele é
semelhante a Terra em muitas características: há calotas de gelo polares, nuvens brancas
flutuando, tempestades de areia e até um dia de 24 horas.
Podemos ler em O Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap. III, Há Muitas
Moradas na Casa de Meu Pai: Nos mundos que chegaram a um grau superior, a forma
do corpo é, como em toda parte, a forma humana, mais embelezada, aperfeiçoada e,
sobretudo, purificada. Não bastaria esse importantíssimo detalhe, a forma humana ser
padrão em todos os mundos, para torná-los semelhantes em pelo menos um aspecto? Se
a destinação da humanidade é a beleza e a bondade podemos igualmente dizer que os
mundos se assemelham cada vez mais pelas virtudes, à proporção que se elevam na
41

hierarquia espiritual. Logo, há algo em comum entre os mundos, pelo menos alguns,
que os tornam semelhantes, fisicamente e espiritualmente, em um ou mais aspectos.

Sugestão: De alguma maneira, física ou espiritualmente, pode haver traços comuns na


maioria deles, pois as leis de Deus são as mesmas para todo o universo. Mas existem
aqueles que, fisicamente, em nada se assemelham.

Capítulo IV - Princípio vital – Seres orgânicos e inorgânicos (resumo que antecede a


pergunta de número 60)

Os seres orgânicos são aqueles que têm, em si mesmos, uma fonte de atividade
íntima que lhes dá a vida. Eles nascem, crescem, reproduzem-se por si mesmos e
morrem. São dotados de órgãos especiais para realizarem os diferentes atos da vida e
que são apropriados às suas necessidades de conservação. Nessa classe estão
compreendidos os homens, os animais e as planta. Os seres inorgânicos são todos
aqueles eu não têm vitalidade, nem movimento próprio e não se formam senão pela
agregação da matéria. Tais são os minerais, a água, o ar, etc.

No século XVII, tornou-se bastante difundida a idéia de que a produção de


substâncias orgânicas dependia da presença de uma essência imaterial chamada pelos
estudiosos de força vital. Essa crença de que somente os seres vivos poderiam dispor
dessa substância, teve o nome de vitalismo, sendo defendida por nomes importantes tais
como o do naturalista John Needhan e do químico Jakob Berzelius.
O vitalismo começou a perder força a partir de 1828 quando o químico alemão
Friedrich Wöhler conseguiu fabricar uréia, substância orgânica existente na urina de
muitos animais, a partir de substância inorgânica, no caso, cianato de amônia. Neste
ponto precisamos destacar que matéria orgânica é diferente de vida, a fim de bem
situarmos o leitor na definição de vitalismo que o Espiritismo deverá elaborar.

Ao afirmar que a animalização da matéria depende do princípio vital, Kardec se


inseriu no vitalismo, doutrina decadente em sua época. Os Espíritos responsáveis pela
codificação, embora tenham tentado descrever essa teoria respondendo perguntas
formuladas pelo codificador, não deixaram claro como o fluido vital interage com a
matéria, o que tem causado certa confusão em algumas situações geradas pelo progresso
da ciência. Diante do avanço da engenharia genética e da biologia molecular, sabe-se
que a medicina pode manter um corpo clinicamente morto através de aparelhos, durante
anos. Neste caso, o fluido vital está presente mantido pelo funcionamento dos órgãos?
Admitindo como verdadeira a teoria do fluido vital precisamos, nós espíritas, de uma
redefinição da mesma, tanto para diferenciá-la do vitalismo do qual os cientistas já não
falam, quanto para torná-la mais compreensível diante do avanço científico que
atravessamos. O processo de vitalização da matéria incluiu uma espécie de teia que
integra todos os órgãos como defendem os organicistas? Ou seria um campo
morfogenético o fator capaz de dar partida aos processos biológicos?
Outro ponto no qual a ciência avançou, aperfeiçoando suas teorias, foi na
conceituação dos seres orgânicos. Atualmente denominamos de seres orgânicos aqueles
que possuem moléculas orgânicas, ou seja, que apresentam átomos de carbono unidos
em seqüência, formando cadeias carbônicas, pois a vida na Terra baseia-se
essencialmente na presença desse elemento formador da estrutura básica de todas as
moléculas orgânicas.
42

Destaco ainda no texto que inicia este capítulo, que ele se baseia na classificação
ultrapassada que englobava todos os seres vivos em apenas animais e vegetais. Hoje
sabemos que a classificação se estende por cinco reinos e mais os vírus, que não
pertencem a nenhum deles, devido suas características específicas.

Sugestão: Os seres orgânicos são aqueles que apresentam em sua estrutura básica
moléculas orgânicas, ou seja, aquelas que contêm átomos de carbono formando
cadeias, as quais se ligam outros elementos, tais como o oxigênio, o hidrogênio e o
nitrogênio. Estes seres têm em si mesmos, uma fonte de atividade íntima que lhes dá a
vida. Eles nascem, crescem, reproduzem-se por si mesmos e morrem. São dotados de
órgãos especiais para realizarem os diferentes atos da vida, apropriados às suas
necessidades de conservação. Nessa classe estão compreendidos as bactérias, os
protozoários e as algas, os fungos, as plantas e os animais. Os seres inorgânicos são
todos aqueles eu não têm vitalidade, nem movimento próprio e não se formam senão
pela agregação da matéria. Tais são os minerais, a água, o ar, etc.

Pergunta 67

- A vitalidade é um atributo permanente do agente vital ou se desenvolve apenas em


razão do funcionamento dos órgãos?

- Ele não se desenvolve senão com o corpo. Não dissemos que esse agente sem a
matéria não é a vida? É necessária a união dessas duas coisas para produzir a vida.

Melhor seria trocar a palavra corpo por “matéria orgânica com certo nível de
organização”. O vírus é acelular, ou seja, não tem células, mas tem fluido vital, pois é
vivo. Seguindo este raciocínio podemos dizer que a vitalidade, ou princípio vital, latente
na matéria orgânica com ela se associa ou é acionada a partir de certo nível de
organização conquistada por ela. Seguem os vírus, as bactérias, os protozoários
culminando com os seres mais evoluídos como os humanos. Atualmente constatou-se
que uma proteína anormal ou príon pode reproduzir réplicas de si mesma e espalhar
doenças, tais como a da “vaca louca”. Estaria aí o limite além do qual o princípio vital
seria acionado?

Sugestão: - Ele não se desenvolve senão quando a matéria atinge certo nível de
organização. Não dissemos que esse agente sem a matéria não é a vida? É necessária a
união dessas duas coisas para produzir a vida.

Pergunta 68

- Qual a causa da morte entre os seres orgânicos?

- O esgotamento dos órgãos.

A morte dos seres vivos pode ocorrer por dezenas de motivos naturais ou induzidos.
Para que a pergunta fique mais clara seria aconselhável adicionar a ela a palavra
natural.

Sugestão: - Qual a causa da morte natural entre os seres orgânicos?


43

Pergunta 68-a

- Poder-se-ia comparar a morte à cessação do movimento de determinada máquina


desorganizada?

- Sim; se a máquina está mal montada, a atividade cessa; se o corpo adoece, a vida se
extingue.

Obrigatoriamente, a vida não se extingue com a doença, mas com a morte.

Sugestão: Sim; se a máquina está defeituosa, a atividade cessa; se o corpo adoece a tal
ponto de não mais desenvolver suas atividades vitais, a vida orgânica se extingue.

Pergunta 71

- A inteligência é um atributo do princípio vital?

- Não, pois as plantas vivem e não pensam; têm apenas vida orgânica. A inteligência e
a matéria são independentes, pois um corpo pode viver sem inteligência; mas a
inteligência não pode se manifestar senão por meio de órgãos materiais; é necessária a
união com o Espírito para intelectualizar a matéria animalizada.

Comentário de Kardec: Podem distinguir-se assim: os seres inanimados, constituídos de


matéria, sem vitalidade nem inteligência, que são os corpos brutos; os seres animados
não pensantes, formados de matéria e dotados de vitalidade, mas desprovidos de
inteligência; os seres animados pensantes, formados de matéria, dotados de vitalidade
e tendo a mais, um princípio inteligente que lhes dá a faculdade de pensar.

Nesse comentário Kardec afirma a existência de seres vivos que têm a mais que
outros um princípio inteligente, admitindo assim que alguns não o possuem. Léon
Denis, André Luiz, Gabriel Delanne e os próprios Espíritos que auxiliaram na
codificação, pensam de maneira diferente.
* “O homem é, pois, ao mesmo tempo, Espírito e matéria, alma e corpo; mas,
talvez que Espírito e matéria não sejam mais do que simples palavras, exprimindo de
maneira imperfeita as duas formas de vida eterna, a qual dormita na matéria bruta,
acorda na matéria orgânica, adquire vitalidade, se expande e se eleva no Espírito”
(Leon Denis – O Problema do Ser do Destino e da Dor). Poeticamente, esse raciocínio
foi absorvido pelos espíritas da seguinte maneira: A alma dorme nos minerais, sonha
nos vegetais, agita-se nos animais e acorda no homem.
* “Através de mil modelos inferiores, nos labirintos de uma escalada
ininterrupta; através das mais bizarras formas; sob a pressão dos instintos e da sevícia
de forças inverossímeis, a cega psique vai tendendo para a luz, para a consciência
esclarecida, para a liberdade” (Gabriel Delanne – A Evolução Anímica).
* “A imensa fornalha atômica estava habilitada a receber as sementes da vida
e, sob o impulso dos gênios construtores, que operavam no orbe nascituro, vemos o seio
da Terra recoberto de mares mornos, invadido por gigantesca massa viscosa a
espraiar-se no colo da paisagem primitiva. Dessa geleia cósmica, verte o princípio
inteligente, em suas primeiras manifestações” (André Luiz – Evolução em dois
Mundos).
44

* “A alma pareceria, assim, ter sido o princípio inteligente dos seres inferiores
da criação? – Não dissemos que tudo se encadeia na Natureza e tende à unidade? É
nesses seres, que estais longe de conhecer totalmente, que o princípio inteligente se
elabora, se individualiza pouco a pouco e ensaia para a vida” ( Allan Kardec - O Livro
dos Espíritos, pergunta 607).
* “O Espírito não chega a receber a iluminação divina, que lhe dá,
simultaneamente com o livre arbítrio e a consciência, a noção dos seus altos destinos,
sem haver passado pela série divinamente fatal dos seres inferiores, entre os quais se
elabora lentamente a obra da sua individualização” (Allan Kardec – A Gênese).
Acreditamos que o princípio inteligente contribui na modelação do seu
envoltório astral que dará origem ao futuro perispírito, e participa ativamente na
resolução dos problemas atinentes à sua sobrevivência e reprodução. A base para tal
afirmação é bem simples: efeitos inteligentes têm origem em causas inteligentes.
Observando-se a atividade de um simples vírus, como ele invade uma célula, toma seus
comandos e injeta seu material genético, passando a interferir no metabolismo da célula
invadida, percebemos que ele demonstra uma inteligência invulgar. Ele toma a
“fortaleza” (célula) de assalto, passa a comandar a síntese de novos ácidos nucléicos
virais à custa da energia e dos componentes químicos da célula hospedeira (aproveita a
fábrica para fabricar armas), culminando com a reprodução de novas cópias suas
(clones) num processo de produção por montagem digno das mais modernas fábricas.
Diante de tamanha precisão e planejamento há de se perguntar: que obra do acaso
engendraria plano tão inteligente?
Alguém poderá dizer que estamos diante do automatismo da matéria, de reflexos
ou movimentos instintivos. Mas por que isso não ocorre em uma pedra, já que ela é
também matéria? O fato é que existe uma evolução e uma complexidade claras a partir
de determinado ponto de organização da matéria, caminhando progressivamente até o
homem.

Sugestão: Podem distinguir-se assim: os seres inanimados, constituídos de matéria, sem


vitalidade nem inteligência, que são os corpos brutos; os seres animados, constituídos
de matéria e com vitalidade, mas dotados de princípios inteligentes, sendo que entre
estes há aqueles cuja inteligência apenas desabrocha, e outros cuja inteligência já se
manifesta de maneira mais ostensiva.

Pergunta 84

- Os Espíritos constituem um mundo à parte, fora daquele que vemos?

- Sim, o mundo dos Espíritos ou das inteligências incorpóreas.

Podemos admitir pelo pensamento que o Espírito seja, em si, uma inteligência
incorpórea, já que é ele quem detém a inteligência. Todavia, ele não existe separado do
seu perispírito ou corpo espiritual, por mais quintessenciado que este seja. Ora, sendo o
perispírito inseparável do Espírito e um corpo que deve obedecer à composição fluídica
do mundo em que habita no momento, não podemos admitir a sua existência sem o seu
inseparável revestimento. É por esta razão que vemos e reconhecemos alguém no
mundo espiritual devido ao seu invólucro, e jamais o Espírito propriamente dito.
A pergunta feita por Kardec refere-se ao mundo espiritual tal qual o
conhecemos, e neste os Espíritos são corpóreos, ou seja, possuem o corpo espiritual.
45

Para referir-se a um mundo de inteligências incorpóreas, seria necessário que existisse


um orbe onde apenas os Espíritos destituídos de seus perispíritos pudessem habitar.
Segundo a codificação kardeciana tal lugar não existe.

Sugestão: Sim, o mundo dos Espíritos.

Pergunta 89

- Os Espíritos gastam algum tempo para percorrer o espaço?

- Sim, porém, rápido como o pensamento.

O deslocamento do Espírito no espaço obedece a dois fatores: o grau evolutivo e


o meio no qual se desloca. Quanto mais evoluído é o Espírito, mais rápido ele se
desloca; quanto mais o meio é purificado, sem o “piche” proveniente das construções
mentais negativas produzidas pelas mentes desequilibradas, mais seu “vôo” é facilitado.

Sugestão: Isso varia conforme a evolução de cada um. Existem aqueles cujos
perispíritos são mais densos e que, por isso mesmo, se locomovem mais lentamente, e
outros são rápidos como o pensamento.

Pergunta 89-a

- O pensamento não é a própria alma que se transporta?

- Quando o pensamento está em qualquer parte, a alma aí está também, pois é a alma
quem pensa. O pensamento é um atributo.

Pensamos que nesta pergunta Kardec referiu-se à transmissão do pensamento,


assunto que mais tarde, em 1864, em O Evangelho Segundo o Espiritismo, cap. XXVII,
Pedi e Obtereis, elucidou magistralmente: “O Espiritismo torna compreensível a ação
da prece, explicando o modo de transmissão do pensamento – vindo o ser rogado ao
nosso apelo, ou indo nosso pensamento até ele. Para se ter idéia do que se passa em tal
circunstância, é preciso imaginar todos os seres, encarnados e desencarnados,
mergulhados no fluido universal que ocupa o espaço, assim, como, aqui, estamos
mergulhados na atmosfera. Esse fluido recebe um impulso da vontade – é o veículo do
pensamento, como o ar é o veículo do som. Com a diferença que as vibrações do ar são
circunscritas, enquanto as do fluido universal estendem-se infinitamente. Portanto,
quando o pensamento é dirigido a um ser qualquer, na Terra ou no espaço, de
encarnado a desencarnado, ou de desencarnado a encarnado, uma corrente fluídica
estabelece-se de um a outro, transmitindo o pensamento como o ar transmite o som”.
Se o pensamento é transmitido de um local para outro qualquer, a depender da
potência mental e moral de cada ser, não é obrigatoriamente necessária a presença do
Espírito onde seu pensamento esteja.

Sugestão: Quando o pensamento está em determinado lugar, não significa que o


Espírito seguiu com ele, pois este pode transmitir o seu pensamento através do fluido
universal para alguém que o sintonize em qualquer parte.

Pergunta 91
46

- A matéria constitui obstáculo aos Espíritos?

- Não; eles penetram em tudo: o ar, a terra, as águas e mesmo o fogo lhes são
igualmente acessíveis.

Se assim fosse, qual seria a utilidade das construções no mundo espiritual? Não
existem nele hospitais, habitações, templos, fortalezas tidas como inexpugnáveis? Mais
uma vez a resposta generaliza a questão. Os habitantes de uma colônia espiritual, Nosso
Lar, por exemplo, não atravessam as paredes que constróem para seus abrigos, pois
estes são compatíveis com o nível vibracional que ocupam na escala evolutiva. De outra
maneira, que sentido teria construí-las, caso fossem devassáveis por qualquer um?
Todavia, um Espírito de maior nível vibracional, de perispírito mais quintessenciado,
mais imponderável, portanto, poderá atravessar as paredes daquela colônia. Um inferior,
jamais. As leis de Deus permitem que os superiores a tudo vejam e atravessem desde
que o objeto de suas investigações se encontre em nível vibracional abaixo do estágio
que ocupam. Pois, se assim agem, o motivo é sempre ajudar e aperfeiçoar. Deus a tudo
vê e a tudo penetra e, da mesma maneira, em escala descendente, seus auxiliares. Neste
caso, ainda que a pergunta de Kardec se refira a matéria como a entendem os cientistas,
necessita, no mínimo, de um comentário adicional ou de uma nota explicativa a fim de
que o assunto seja devidamente esclarecido.

Sugestão: Não; eles penetram em tudo que se situe abaixo do seu estado vibracional, ou
seja, da quintessência adquirida pelo seu corpo espiritual. Para os superiores tudo é
devassável.

Pergunta 94

- De onde o Espírito toma o seu invólucro semimaterial?

- Do fluido universal de cada globo. Por isso, ele não é o mesmo em todos os mundos.
Passando de um mundo para outro, o Espírito troca seu envoltório, como muda de
roupa.

Quando o mergulhador vai a águas profundas, mune-se de equipamentos


necessários para poder atuar no meio aquático. Assim também ocorre se ele vai a uma
severa geleira, a Lua ou outro local inadequado à sua sobrevivência. Nessas ocasiões ele
não troca de corpo, mas de vestimenta, ou seja, cobre-se de acessórios que lhe permitem
atuar no meio a que foi chamado. O mesmo ocorre com o Espírito que deixa um mundo
e adentra outro. Ele não troca de perispírito, pois este é uma modelação sua, cuja
construção dura milênios, uma conquista intransferível, sem a qual ele não poderá
manifestar-se, já que tal corpo é o veículo de manifestação que ele possui para atuar no
mundo espiritual.
Na resposta acima, envoltório não quer dizer perispírito, mas camada de fluidos
que o reveste, como a roupa do astronauta o cobre para que ele atue na Lua. O
comentário que faço a esta questão se deve ao fato de que já ouvi dezenas de vezes
pessoas dizerem que o Espírito, ao passar de um mundo para outro, troca de perispírito.
Trocando de envoltório ele continua sendo ele mesmo e trocando de perispírito, o que
não é possível, ele perderia as conquistas evolutivas já feitas e adicionadas a este corpo,
e não poderia, portanto, atuar no novo meio.
47

Sugestão: Do fluido universal de cada globo. Por isso, ele não é o mesmo em todos os
mundos. Passando de um mundo para outro, o Espírito troca os fluidos que envolvem
seu perispírito, como muda de roupa.

Pergunta 124

- Uma vez que há Espíritos que, desde o princípio, seguiram o caminho do bem absoluto
e outros do mal absoluto, deve haver sem dúvida, degraus entre esses dois extremos?

- Sim, certamente, e é a grande maioria dos Espíritos.

Comentário:

Experiência significa ato ou efeito de experimentar, surgindo dessa


experimentação certa prática que se traduz em habilidade. Quando dizemos que é
necessário que o Espírito adquira experiência através do conhecimento do bem e do
mal, estamos nos referindo à aprendizagem que ele vai construindo para si através dos
seus acertos e erros. Não nos referimos aqui ao conhecimento teórico, que apenas
fornece uma descrição isenta de vivência. Ler sobre uma dor de dente em um
compêndio médico não dá ao dentista a experiência de, verdadeiramente, conhecer a
essência da dor. É a vivência que dá o total conhecimento, pois une teoria à prática,
fechando o círculo do saber. Por isso costuma-se dizer: “na prática, a teoria é outra”.
Determinadas experiências que dão prazer ao Espírito são repetidas por ele na busca de
aprimorar uma fórmula que lhe dê gratificação. Outras, cujo resultado final não o
satisfaz, são evitadas. É assim que, aos poucos, ele vai construindo sua metodologia na
tentativa de sofrer menos. Acertar e errar são próprios da espécie humana, notadamente
nos estágios iniciais da caminhada. Por isso perguntamos: será possível a um
determinado Espírito jamais errar, seguindo sempre o caminho do bem absoluto?
Segundo o Espírito Emmanuel, em seu livro O Consolador pergunta 277, Jesus
foi o único Espírito que se elevou para Deus em linha reta, ou seja, sem as quedas que
nos são comuns. Justamente por isso ele foi escolhido, ou eleito, para a invulgar tarefa
de ser Seu representante direto no planeta que habitamos.
O pensamento de que existem tais Espíritos que seguem o caminho do bem
absoluto desde o início de sua caminhada é de Kardec, a julgar pela inclusão da idéia na
pergunta e não nas respostas dos Espíritos. Todavia, o Espírito que a respondeu, não
contestando a idéia, a endossou.
A Doutrina utiliza o controle universal como exigência para validar seu corpo de
ensinamentos, ou seja, para que uma teoria espírita seja aceita pelos seguidores do
Espiritismo, é necessário que ela seja revelada a muitos médiuns honestos em diferentes
localidades. Vasculhei dezenas de livros à procura da confirmação da resposta acima e a
única nota que registrei a favor foi citada por Emmanuel, mesmo assim com a
discordância numérica, pois se a maioria se situa entre os dois extremos, deve haver
uma minoria preenchendo as duas pontas. Comentando sobre esta questão ao ler a
observação que eu fizera, uma amiga, Hilda Fontoura, que ainda não tive o prazer de
abraçar e cumprimentar pelo excelente trabalho na revisão dos meus livros, assim se
expressou: “Em minha opinião, se Jesus se elevou a Deus sem as quedas inerentes aos
seres humanos em geral, não nos serve como modelo e guia, por ser de natureza
diferente da nossa, coisa que não acredito. Se esse pensamento foi de Kardec, que o
48

incluiu na pergunta e os Espíritos o endossaram, não contestando, na resposta, a idéia,


temos dois enganos ao invés de um. Essa idéia é também de Roustaing”.

Sugestão: aguardar a comprovação pelo consenso universal.

Pergunta 154

- A separação da alma e do corpo é dolorosa?

- Não, o corpo sofre, freqüentemente, mais durante a vida que no momento da morte; a
alma está por um fio. Os sofrimentos que experimenta, algumas vezes, no momento da
morte, são um prazer para o Espírito que vê chegar o fim do seu exílio.

Apesar da palavra “freqüentemente”, o que quer dizer, nem sempre, existe uma
negação no início da resposta. Aqui podemos observar uma variedade de casos que se
contam aos milhares, todos ligados ao estado evolutivo do Espírito. O livro “O Céu e o
Inferno” registra uma síntese admirável acerca desse problema: “O estado do Espírito
por ocasião da morte pode ser assim resumido: tanto maior é o sofrimento, quanto mais
lento for o desprendimento do perispírito; a presteza desse desprendimento está na
razão direta do adiantamento moral do Espírito; para o Espírito desmaterializado, de
consciência pura, a morte é qual um sono breve, isento de agonia, e cujo despertar é
suave”.
Não convém generalizar essa resposta devido à importância da questão, pois isso
prejudica o entendimento e estabelece certa confusão em contextos diferentes.

Sugestão: Isso depende do adiantamento moral do Espírito. Em alguns, o corpo sofre,


freqüentemente, mais durante a vida que no momento da morte. Em outros, o Espírito
se aturde, sofre e, às vezes, durante muito tempo sente as dolorosas sensações da vida
orgânica do corpo que já deixou.

Pergunta 155-a

- A separação se opera instantaneamente e por uma transição brusca? Há uma linha de


demarcação bem nítida entre a vida e a morte?

- Não, a alma se liberta gradualmente e não escapa como um pássaro cativo que ganha
subitamente a liberdade. Esses dois estados se tocam e se confundem; assim o Espírito
se liberta pouco a pouco de seus laços: os laços se desatam, não se quebram.

Nas mortes violentas, por acidentes, o Espírito é colhido de surpresa tendo seus
laços perispirituais quebrados com grande violência. Nesses casos a separação da alma e
a cessação da vida orgânica ocorrem quase que instantaneamente. Nesse caso, a
perturbação pode ser maior, a depender do estágio evolutivo do Espírito, devido ao
inesperado gênero de morte que o toma de súbito, o que não ocorre nas mortes naturais
pelo esgotamento dos órgãos que, aos poucos, vão perdendo o fluido vital.

Sugestão: Nas mortes naturais, ou seja, por esgotamento do fluido vital, a alma se
liberta gradualmente e não escapa como um pássaro cativo que ganha subitamente a
liberdade. Nas mortes bruscas há uma quebra dos laços perispirituais que prendem o
49

Espírito ao corpo, fazendo, geralmente, com que aquele mergulhe em grande confusão.
Genericamente, podemos dizer que esses dois estados se tocam e se confundem.

Pergunta 157

- No momento da morte, a alma tem, algumas vezes, uma inspiração ou êxtase que lhe
faça entrever o mundo em que vai entrar?

- Freqüentemente a alma sente se desatarem os laços que a ligam ao corpo; ela faz
então todos os seus esforços para rompê-los inteiramente. Já em parte desligada da
matéria, ela vê o futuro se desenrolar diante dela e alegra-se, por antecipação, da
situação de Espírito.

Isso ocorre apenas com os Espíritos sem grandes culpas, pois há os que
desencarnam, e não são poucos, pensando apenas em ódio e vingança. Outro tanto,
mergulhado na ignorância, prolonga o estágio no vício que se permitiu quando
encarnado, e outros enlouquecem de dor e sofrimento devido ao gênero de vida e de
morte pelos quais passaram. O Espírito de alguns suicidas, simplesmente desmaia,
permanecendo neste estado durante meses.

Sugestão: Freqüentemente a alma que já pratica o Bem, sente se desatarem os laços


que a ligam ao corpo; ela faz então todos os seus esforços para os romper inteiramente.
Já em parte desligada da matéria, ela vê o futuro se desenrolar diante dela e alegra-se,
por antecipação, da situação de Espírito. Aquela que ainda se compraz no Mal pode ter
visões bem diferentes, que a enchem de pavor.

Pergunta 160

- O Espírito reencontra imediatamente aqueles que ele reconheceu sobre a Terra e que
morreram antes dele?

- Sim, segundo a afeição que lhes tinha e a que tinham por ele. Freqüentemente, eles o
vêm receber em sua volta ao mundo dos Espíritos, e ajudam a libertá-lo das faixas da
matéria; reencontra, também, a muitos que havia perdido de vista em sua permanência
sobre a Terra. Vê aqueles que estão na erraticidade, aqueles que estão encarnados, e
os vai visitar.

Este tema já foi tratado no item 3 da introdução da obra. Portanto daremos


apenas a sugestão de como o expressaríamos.

Sugestão: Nem sempre. Isso depende da afeição que lhes tinha e a que tinham por ele.
Freqüentemente, eles o vêm receber em sua volta ao mundo dos Espíritos, e ajudam a
libertá-lo das faixas da matéria; reencontra, também, a muitos que havia perdido de
vista em sua permanência sobre a Terra. Vê aqueles que estão na erraticidade, aqueles
que estão encarnados, e os vai visitar. Para alguns a realidade é diversa, pois podem
ser aprisionados por inimigos, juntar-se a outros em busca de vingança, ser deslocados
para regiões de sofrimento, internados para refazimento por longos períodos e até, em
caso extremo, serem enviados a mundos ainda mais inferiores ao que habitaram.
50

Pergunta 162

Comentário de Kardec (no final): Ao contrário, em todos os casos de morte violenta,


quando ela não resulta da extinção gradual das forças vitais, os laços que prendem o
corpo ao perispírito são mais tenazes e o desligamento completo é mais lento.

Segundo a resposta da questão 161 (em todos os casos de morte acidental o


instante que separa a alma da cessação da vida é muito curto) podemos afirmar que o
desligamento é brusco devido à quebra dos laços que prendem o perispírito ao corpo. A
perturbação do Espírito é que seria maior devido ao inesperado golpe que recebe.

Sugestão: Ao contrário, em todos os casos de morte violenta, quando ela não resulta
da extinção gradual das forças vitais, os laços que prendem o corpo ao perispírito são
mais tenazes, mas quebrados de súbito, fazem o Espírito imergir em profunda
perturbação na qual ele confunde a vida espiritual que já adentrou com a vida material
que acaba de deixar.

Pergunta 188

- Os Espíritos puros habitam mundos especiais ou estão no espaço universal sem


estarem mais ligados a um mundo que a outro?

Nota de Kardec: Segundo os Espíritos, de todos os globos que compõem o nosso


sistema planetário, a Terra é um daqueles onde os habitantes são os menos avançados,
física e moralmente. Marte seria ainda inferior e Júpiter, o mais superior em relação a
todos. (...), pois parece que Vênus é mais adiantado que a Terra e Saturno menos
adiantado que Júpiter. Vários Espíritos que animaram pessoas conhecidas sobre a Terra
disseram estar encarnadas em Júpiter, um dos mundos mais próximos da perfeição, e
ficaram admirados de ver, nesse globo tão adiantado, homens que, na opinião do nosso
mundo, não eram tão elevados.

Estranho esse comentário de Kardec, mesmo estando no condicional, ele que de


tantos cuidados se cercava ao fazer uma afirmativa, por mais simples que ela fosse.
Diante de tantas informações não confirmadas e mesmo contestadas ou negadas por
outros Espíritos, e levando em conta que a permanência do texto que as contém pode,
no momento presente, causar mais prejuízo que certeza, seria uma sábia decisão, já que
não existe nenhuma vantagem em mantê-lo agregado a obra, simplesmente descartá-lo.
Estranha a afirmação de que várias pessoas, antes encarnadas na Terra, agora habitam
Júpiter, um dos mais perfeitos planetas do sistema solar. Não sei qual a amostragem de
pessoas utilizada na observação, se da França ou da Europa, nem tampouco o critério
para estabelecer o grau de elevação dessas várias pessoas. Todavia, extrapolando essa
amostragem para a população terrena, esses “vários” podem sofrer considerável
aumento, transformando-se em muitos. Isso faz da Terra um planeta que abriga muitos
Espíritos dignos de alçar vôos a planetas já evoluídos. Sempre julguei que fossem
poucos, assim como Madre Teresa de Calcutá, Bezerra de Menezes, Gandhi, Luter
King, Chico Xavier, pessoas assim.

Sugestão: Deixar a nota de quarentena até a sua confirmação.


51

Pergunta 199

- Por que a vida, freqüentemente, é interrompida na infância?

- A duração da vida de uma criança pode ser, para o Espírito que está nela encarnado,
o complemento de uma existência interrompida antes do seu término marcado, e sua
morte, no mais das vezes, é uma prova ou uma expiação para os pais.

A primeira parte dessa resposta implica na matematização das etapas


encarnatórias, ou seja, não cumprindo o tempo integral em uma encarnação, deve o
reencarnante retornar em outra, a fim de pagar o tempo restante, obrigando-se a
espiritualidade maior a sair em busca de um casal que se adéqüe àquele tipo de prova ou
expiação. A vida é um continuum, bem como a evolução e não necessita desse
fatiamento reencarnatório.

Sugestão: Freqüentemente é uma prova para ele e (ou) para os pais.

Pergunta 200

- Os Espíritos têm sexo?

- Não como o entendeis, pois, os sexos dependem do organismo. Entre eles há amor e
simpatia baseados na identidade de sentimentos.

É correto dizer que o Espírito não tem sexo. Todavia ele é revestido por um
corpo fluídico a que chamamos de perispírito que, geralmente, apresenta as
características físicas da sua última encarnação. É dessa maneira que o Espírito pode ser
identificado por aqueles que o conheceram na Terra. Assim falamos e nos dirigimos a
eles, como Antônio de Pádua, Francisco de Assis, Maria de Nazaré, dentre outros. Esse
perispírito tem órgãos e sistemas, à semelhança do corpo físico, sendo, contudo, menos
grosseiro.

Sugestão: Não como o entendeis, pois, os sexos dependem do organismo. Entre eles há
amor e simpatia baseados na identidade de sentimentos. No entanto, seu perispírito
apresenta-se, geralmente, com a aparência da última encarnação, tenha sido esta de
homem ou mulher.

Pergunta 202

Comentário de Kardec: Aquele que fosse sempre homem não saberia senão o que sabem
os homens.

Séculos atrás essa afirmativa soaria bem. Atualmente a mulher ocupa todas as
posições sociais e profissionais, a maioria delas, no passado, privilégio apenas
masculino. Os homens, por sua vez, vão à cozinha, lavam roupas, criam seus filhos com
imenso carinho e, com exceção da gestação e da amamentação, fazem qualquer
trabalho, antes destinado apenas às mulheres. Não há mais universo masculino ou
feminino, mas universo humano. Alguns podem até dizer que ternura, delicadeza,
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sensibilidade, dentre outras virtudes, são aquisições exclusivamente femininas. Ledo


engano. São atributos do Espírito e isso ele pode conquistar encarnando na condição de
homem ou de mulher. Lembremos de que Jesus era conhecido como o meigo e doce
rabi da Galiléia. Quanto a este tema, a opinião de Léon Denis, continuador da obra de
Kardec, exposta em seu excelente livro “O Problema do Ser do Destino e da Dor” é de
que, segundo os guias espirituais, a mudança de sexo, sempre possível para o Espírito,
é, em princípio, inútil e perigosa. Os Espíritos elevados reprovam-na.
Desde que haja controvérsias, é necessário chegar-se a um denominador comum
para que este seja exposto em nome da Doutrina.

Sugestão: No entanto, nada há que comprove a impossibilidade de um Espírito seguir a


sua linha evolutiva reencarnando sempre na condição feminina ou masculina.

Pergunta 228

- Os Espíritos conservam algumas das paixões humanas?

- Os Espíritos elevados, perdendo seu envoltório físico, deixam as más paixões e só


guardam as do bem; quanto aos Espíritos inferiores, conservam-nas, pois, de outra
forma, seriam de primeira ordem.

Um Espírito elevado, em qualquer meio, é sempre elevado e age como tal. O


fato de reencarnar, o que implica no esquecimento e, às vezes, no ingresso em um meio
moralmente inferior ao já alcançado por ele, não implica no comprometimento,
aprovação ou prática dos costumes que o cercam. Ele não pode retrogradar. Dizem que
o homem é produto do meio. Em parte isso é verdade. Mas os valores já conquistados
pelo Espírito são conservados em qualquer meio. Vemos, freqüentemente, pessoas
abnegadas em meio a outras egoístas, honestas em meio a desonestas. Se o meio fizesse
o homem, de que valeria encarnar e viver nele se já haveria uma condenação prévia a
esperá-lo? Se o meio influencia, o homem pode resistir a ele e, às vezes, mudá-lo com a
sua vontade. A resposta seria correta quando interpretada da seguinte maneira: “Os
Espíritos elevados, perdendo o envoltório físico, deixam as más paixões do meio em que
viveram, visto que jamais participaram delas ou as aprovaram”. Acredito que esta seja
a essência da resposta, mas a dubiedade a empana.

Sugestão: Os Espíritos elevados, perdendo seu envoltório físico, deixam as más paixões
do meio em que viveram, visto que jamais as aprovaram ou participaram delas; quanto
aos Espíritos inferiores, conservam-nas, pois, de outra forma, seriam de primeira
ordem.

Pergunta 258

- Quando no estado errante e antes de reencarnar, o Espírito tem a consciência e a


previsão das coisas que lhe sucederão durante a vida?

- Ele próprio escolhe o gênero de provas que quer suportar e é nisso que consiste o seu
livre-arbítrio.

a) - Não é Deus que lhe impõe, então, as tribulações da vida como castigo?
53

- Nada ocorre sem a permissão de Deus, pois é ele quem estabelece todas as leis que
regem o universo. Perguntai, então, por que ele fez tal lei ao invés de outra. Dando ao
Espírito a liberdade de escolha, deixa-lhe toda a responsabilidade de seus atos e suas
conseqüências, de maneira que nada entrava o seu futuro; o caminho do bem, como o
do mal, lhe está aberto. Se sucumbe, resta-lhe a consolação de que nem tudo se acabou
para ele; Deus, na sua bondade, lhe dá a oportunidade de recomeçar o que foi mal
feito. É necessário, aliás, distinguir o que é obra da vontade de Deus do que é da
vontade do homem. Se um perigo vos ameaça, não foste vós que criastes esse perigo,
mas Deus; contudo, vós, pela própria vontade, vos expondes porque vedes nele um
meio de adiantar-vos e Deus o permite.

A pergunta se refere ao próximo estágio na carne, e não à vida em um período


muito distante, pois esta jamais se extingue e o Espírito não abarca o futuro,
principalmente, se ainda precisa encarnar. Quanto ao gênero de provas, o pedido pode
ser feito, mas isso não significa atendimento satisfatório, pois seus avalistas sabem mais
do que ele o que melhor lhe convém. Há ainda aqueles que se encontram sem condições
de optar, porque se mostram brutalizados, alheios ao que irão enfrentar, bem como
outros que se recusam a aceitar o que lhes é imposto. Neste último caso, reencarnam
compulsoriamente.
Quanto aos perigos, muitos dos que nos ameaçam são criados por nós próprios.
Quando um nos ameaça, manda nosso instinto de sobrevivência que nos resguardemos
dele. Qual seria, pois a natureza e a finalidade do perigo a que o Espírito poderia se
expor para progredir? Como reconhecê-lo? E diante de um perigo real, como identificar
nele a mão de Deus e a possibilidade de ser um teste para a evolução do Espírito e não
uma situação criada por um obsessor? Entendo que aquele que se lança ao fogo para
salvar um amigo ou um estranho, desde que não seja com a intenção de se tornar herói,
embora não o faça para se adiantar, pode evitar uma morte. Mas, igualmente pode
morrer devido a sua inabilidade para enfrentar situações desse gênero. O que não sabe
nadar e tenta salvar alguém que está se afogando deveria submeter-se a esse perigo?
Como saber se devo ou não me submeter a situações de risco? Não seria melhor
suprimir parte da resposta questão?

Sugestão para a pergunta: Quando no estado errante e antes de reencarnar, o Espírito


tem a consciência e a previsão das coisas que lhe sucederão durante a próxima
encarnação?

Sugestão para a resposta: Ele próprio escolhe o gênero de provas que quer suportar e é
nisso que consiste o seu livre-arbítrio. No entanto há aqueles que não têm condições de
pedir devido ao estado de alienação em que se encontram, bem como aqueles que têm
seus pedidos rejeitados e substituídos por programas mais condizentes com seus
méritos e deméritos.

Sugestão para a segunda parte da resposta: Nada ocorre sem a permissão de Deus, pois
é ele que estabelece todas as leis que regem o universo. Perguntai, então, por que ele
fez tal lei ao invés de outra. Dando ao Espírito a liberdade de escolha, deixa-lhe toda a
responsabilidade de seus atos e suas conseqüências, de maneira que nada entrava o seu
futuro; o caminho do bem, como o do mal, lhe está aberto. Se sucumbe, resta-lhe a
consolação de que nem tudo se acabou para ele; Deus, na sua bondade, lhe dá a
54

oportunidade de recomeçar o que foi mal feito ou está inacabado. É necessário, aliás,
distinguir o que é obra da vontade de Deus do que é da vontade do homem.

Pergunta 269

- O Espírito pode enganar-se quanto à eficiência da prova que escolheu?

- Ele pode escolher uma que esteja acima de suas forças e, então, sucumbe; pode,
também, escolher uma que não lhe dê proveito algum, como ocorre se prefere um
gênero de vida ociosa e inútil. Nesse caso, uma vez de volta ao mundo dos Espíritos, ele
percebe que nada ganhou e pede outra existência para reparar o tempo perdido.

Geralmente, a preparação para a reencarnação é precedida de um planejamento


levado a efeito pelos Espíritos interessados no bem-estar do reencarnante. Seus amigos,
protetores, o anjo guardião que lhe seguirá e ele próprio, discutem até que chegam à
elaboração de um projeto, sempre voltado para o seu progresso, pois ninguém reencarna
com o destino selado para ser criminoso, suicida, preguiçoso ou desonesto. A resposta
induz o leitor ao raciocínio equivocado no qual a escolha do reencarnante é soberana,
não sendo este orientado, nessa ocasião, quanto aos aspectos que podem levá-lo ao
fracasso. Os bons Espíritos não são carrascos que nos empurram para um terreno
minado sem os devidos cuidados e conselhos. Somente quando ultrapassamos os limites
do bom senso com nossas exigências descabidas é que nos deixam sofrer os efeitos da
nossa crassa e orgulhosa ignorância.

Sugestão: Ele pode escolher uma que esteja acima de suas forças e, então, sucumbe;
pode, também, escolher uma que não lhe dê proveito algum, como ocorre se preferir um
gênero de vida ociosa e inútil. Contudo, nessa ocasião, é esclarecido quanto às
questões que podem levá-lo ao fracasso e, freqüentemente, muda de opinião diante dos
argumentos daqueles que o orientam. Insubmisso e orgulhoso, pode fazer-se de surdo
aos bons conselhos e, nesse caso, uma vez de volta ao mundo dos Espíritos, percebe
que nada ganhou e pede outra existência para reparar o tempo perdido.

Pergunta 275

- O poder e a consideração que um homem desfrutou sobre a Terra dão-lhe supremacia


no mundo dos Espíritos?

- Não, porque os pequenos serão elevados e os grandes rebaixados. Lede os salmos.

A resposta leva a crer que a pergunta se refere ao poder desfrutado na Terra em


virtude de um cargo ocupado ou da riqueza possuída. Por este ângulo os ricos são os
grandes e os pequenos, os pobres. No entanto, há ricos (grandes) generosos e pobres
(pequenos) orgulhosos, podendo a consideração que os primeiros gozam sobre a Terra
permanecer intacta ou até maior no mundo espiritual, e a desgraça dos segundos
acompanhá-los além da sepultura. A consideração que é levada em conta após a
desencarnação prende-se à evolução espiritual de cada Espírito. Gandhi era pobre,
honesto, pacífico e desfrutava de imensa consideração e respeito entre os seus. Este
prestígio e consideração estenderam-se ao plano espiritual por ocasião do seu retorno. O
respeito e a consideração que Hitler gozava frente aos seus comparsas se extinguiram
55

com o seu suicídio. Todavia, se por pequenos entendermos os humildes e por grandes os
orgulhosos, a resposta dada pelos Espíritos é irretocável.

Sugestão: Mais uma vez, isso depende da evolução espiritual de cada um. O homem
bom não degenera. Segue-se que os humildes são elevados e os orgulhosos são
rebaixados.

Pergunta 282

- Como os Espíritos se comunicam entre si?

- Eles se vêem e se compreendem, a palavra é material: é o reflexo do Espírito. O fluido


universal estabelece entre eles uma comunicação constante; é o veículo da transmissão
do pensamento, como para vós o ar é o veículo do som; uma espécie de telégrafo
universal que liga todos os mundos e permite aos Espíritos corresponderem-se de um
mundo a outro.

A resposta se refere a Espíritos já conhecedores deste fato e com méritos para


exercitá-lo. Não é outra a decisão de trazer determinados Espíritos às reuniões
mediúnicas senão a situação de “surdos-mudos” em que se encontram com relação
àqueles que poderiam aconselhá-los. Outros comparecem cegos, deformados,
amputados para que, uma vez auxiliados, se recomponham. Constata-se nas centenas de
romances, bem como em obras científicas e filosóficas espíritas, que as palestras, os
diálogos, a vida de relação, enfim, obedece ao uso da palavra, como ocorre entre os
encarnados. É comum até mesmo o mensageiro que vem de um plano mais elevado e
que poderia utilizar de tal expediente, a transmissão do pensamento, fazer sua palestra
através da palavra, pois todos os presentes podem não portar a condição e a sintonia
necessárias para captar suas idéias apenas pelo pensamento.

Sugestão: Eles se vêem e se compreendem, a palavra é material: é o reflexo do Espírito.


O fluido universal estabelece entre eles uma comunicação constante; é o veículo da
transmissão do pensamento, como para vós o ar é o veículo do som; uma espécie de
telégrafo universal que liga todos os mundos e permite aos Espíritos corresponderem-
se de um mundo a outro. Todavia, há Espíritos que ainda não conseguem utilizar
totalmente os recursos que lhes são próprios, devido à ignorância com relação a eles e
ao estágio de adiantamento que ainda não atingiram.

Pergunta 283

- Podem os Espíritos, reciprocamente, dissimularem seus pensamentos? Podem se


ocultar uns dos outros?

- Não, para eles tudo está a descoberto, sobretudo aos que são perfeitos. Podem se
distanciar, mas se vêem sempre. Isto, entretanto, não é uma regra absoluta, pois certos
Espíritos podem muito bem se tornar invisíveis para outros Espíritos, se julgam útil
fazê-lo.

Qual seria, então, o motivo de perseguidores levarem tanto tempo, às vezes


séculos, à procura daqueles a quem querem castigar? Por que aqueles que se situam no
mesmo patamar evolutivo constróem casas, cidades, se tudo está a descoberto e é
56

devassável? Cada Espírito que se encontra em determinado degrau da evolução pode


ocultar seu pensamento, bem como subtrair-se à visão de outro que se situa em degrau
inferior. Sabe-se que os degraus evolutivos separam-se por séculos de conhecimento e
experiência. Quando se generaliza uma resposta, fato freqüente na obra em estudo
corre-se o risco de passar um pensamento incorreto, ou pelo menos, incompleto, sobre o
que se discute. Os detalhes, as nuanças são necessárias, a fim de que se tenha uma visão
de conjunto e se forme um corpo de pensamentos sólido, sem as costumeiras
contradições imposta pelas generalizações.

Sugestão: Insistentemente temos afirmado que tudo obedece à lei de evolução. Para os
que se adiantaram tudo está a descoberto. Podem se distanciar, mas se vêem sempre.
Os mais inferiorizados, à medida que progridem, vão conquistando seus atributos,
alargados na proporção dos esforços que empreendem para mais se libertarem do
julgo da matéria.

Pergunta 284

- Como os Espíritos que não têm mais corpo, podem constatar sua individualidade e se
distinguir dos outros seres espirituais que os cercam?

Comentário sobre a pergunta: não podemos admitir o Espírito desvinculado de


um corpo que jamais o deixa: o perispírito.

Sugestão: introduzir na pergunta a palavra carnal após o vocábulo corpo.

Pergunta 285-a

- Como homens que se conheceram sobre a Terra se reconhecem no mundo dos


Espíritos?

- Vemos nossa vida passada e a lemos como em um livro; vendo o passado de nossos
amigos e de nossos inimigos, vemos sua passagem da vida para a morte.

Os homens se conhecem pela aparência física que o perispírito apresenta,


geralmente, a da última encarnação. Concorre também, para este fato, a similitude de
idéias geradora de sintonias, fato que estabelece uma compatibilidade fluídica,
permitindo que os afins se aproximem e os antípodas se evitem. O desencarnado que
busca um inimigo para dele se vingar, mesmo estando tal inimigo encarnado, acaba por
reconhecê-lo devido aos clichês mentais que dele se projetam, dos estados mórbidos por
ele apresentados, cuja gênese, geralmente, se encontra em existências passadas. Apesar
de estar o perseguido em outro corpo com características diversas do anterior, o
perseguidor sente-se atraído para ele e vê crescer, sem entender bem o motivo, uma
antipatia que acaba por fornecer verdadeiro plugue a ser conectado com exatidão às
idéias de vingança acalentadas por ele. A resposta apresentada não deixa claras estas
questões.

Sugestão: Pela aparência que o perispírito toma da última encarnação e pela afinidade
de gostos. Aqueles que simpatizam das mesmas idéias se atraem, caso contrário, se
evitam.
57

Pergunta 293

- Duas pessoas que foram inimigas sobre a Terra, conservarão ressentimento, uma
contra a outra, no mundo dos Espíritos?

- Não, elas compreenderão que seu ódio foi estúpido e o motivo pueril. Os Espíritos
imperfeitos conservam apenas uma espécie de animosidade até que estejam purificados.
Se foi um interesse material que os dividiu, eles não pensarão mais nisso, por pouco
que sejam desmaterializados. Se não há mais antipatia entre eles, o motivo da
discussão não mais existindo, eles podem se rever com prazer.

Em virtude de ser a Terra um mundo de provas e expiações onde o mal ainda


predomina, esse fato, conservar ressentimento, é comum, gerando perseguições e
obsessões, às vezes, severas. À proporção que o Espírito vai, aos poucos, se liberando
da influência material, ele compreende as vantagens do perdão e não pensa mais em
responder ao mal com o mal.

Sugestão: Os Espíritos imperfeitos conservam uma espécie de animosidade entre si, no


que se buscam, na maioria das vezes, a fim de ajustarem suas diferenças. À medida que
evoluem, os sentimentos de vingança vão desaparecendo de tal forma que, ao se
perdoarem mutuamente, o motivo da discussão não mais existindo, eles podem se rever
com prazer.

Pergunta 306-b

- O Espírito entrevê a finalidade da vida terrena com relação à vida futura?

- Certamente ele a vê e a compreende bem melhor que enquanto encarnado;


compreende a necessidade de purificação para alcançar o infinito e sabe que, a cada
existência, deixa alguma impureza.

A resposta induz a que se pense que o Espírito sempre sai de uma encarnação
com seu débito aliviado, o que não é verdade. Igualmente, pode fazer planos de realizar
determinada tarefa e, por sua vontade, trabalhando no limite de suas forças, avançar na
tarefa muito além do prometido, como pode estacionar sem lucros reais, para abater
parcelas de sua dívida. Havia um planejamento para que Chico Xavier escrevesse 30
livros. Cumprida a tarefa, o total foi aumentado para 50, depois para 100, 150... e o
Chico chegou a mais de 400. Temos, pois, no que se referem a este tema, débitos
agravados, estacionados e aliviados, como elucida André Luiz em sua obra Ação e
Reação, sem, contudo, o Espírito retrogradar nas virtudes já conquistadas e na
aprendizagem já consolidada.

Sugestão: Certamente ele a vê e a compreende bem melhor que enquanto encarnado;


todavia, necessita para a purificação de sua alma, perder a cada existência um pouco
de sua impureza.

Pergunta 308

- O Espírito se recorda de todas as existências que precederam a que acaba de ter?


58

- Todo o seu passado se desenrola diante dele como as etapas do caminho que o
viajante percorreu. Mas, dissemos que ele não se lembra de maneira absoluta de todos
os atos, porém em razão da influência que tem sobre seu estado presente. Quanto às
primeiras existências, as que podemos considerar a infância do Espírito, perdem-se no
vago e desaparecem na noite do esquecimento.

Este assunto já foi comentado alhures, mas retorno a argumentação a fim de


poupar o leitor de uma busca nas páginas iniciais. Quando o Espírito desencarna, segue-
se um período de perturbação que é variável para cada um, a depender de seus méritos e
deméritos. O que temos ouvido em inúmeras reuniões de desobsessão é que não existem
regras fixas para cada Espírito. Alguns passam longo tempo, dementados; outros não
lembram de imediato de suas encarnações passadas por serem um fardo pesado demais
para o suportarem no momento; terceiros são levados através de regressão de memória
para um tempo em que foram mais felizes, a fim de se ausentarem da dor que lhes
fustiga e iniciarem um tratamento nesse novo clima de confiança; Espíritos de grandes
conhecimentos, mas que faliram na utilização destes, podem ter como tratamento a seu
favor, ou a pedido dos mesmos, quando arrependidos, tais conhecimentos “deletados”
da sua mente, permanecendo assim longo tempo, ou definitivamente, se o quiserem,
sem o conhecimento de parte de sua história de vida. Aqui vale o já conhecido chavão:
“cada caso é um caso”.

Sugestão: O Espírito vai lembrando, à proporção que se adapta à sua nova situação,
dos fatos da antecedente existência. Quanto às existências anteriores, isso depende do
grau de adiantamento de cada um. Geralmente, é aos poucos que ele vai penetrando no
passado e resgatando a sua história de vida. Quanto mais evoluído mais conhecedor de
si ele é. Porém, há acontecimentos que permanecem obscuros à sua visão até que ele
tenha o amadurecimento para enfrentá-los, e as primeiras encarnações perdem-se na
noite do esquecimento.

Pergunta 328

- O Espírito daquele que acaba de morrer, assiste à reunião dos seus herdeiros?

- Quase sempre. Deus o permite para a sua própria instrução e o castigo dos culpados;
é então que ele julga o valor das manifestações que lhe fazem. Para ele, todos os
sentimentos estão a descoberto e a decepção que experimenta vendo a cobiça dos que
partilham seus despojos o esclarece sobre seus sentimentos; mas a vez deles chegará.

É certo que Deus pode permitir que alguém assista a partilha dos seus bens com
a finalidade de aferir quem são seus verdadeiros afetos. Mas quem aplicará o castigo aos
culpados? Será que o reencarnante vai à forra punindo os que agem como vilões e
dilapidadores do seu patrimônio? Acreditamos que não, pois isso implicaria num revide,
numa vingança, e tal conselho seria indigno da parte dos bons Espíritos. Do castigo dos
culpados se encarregará a Lei. Não estou afirmando em meu comentário que a questão
induz a uma desforra, mas sugerindo que se atenue a linguagem da última frase.

Sugestão: Quase sempre. Deus o permite para a sua própria instrução; é então que ele
julga o valor das manifestações que lhe fazem. Para ele, todos os sentimentos estão a
59

descoberto e a decepção que experimenta vendo a cobiça dos que partilham seus
antigos bens o esclarece sobre os sentimentos que a ele dedicavam.

Pergunta 402

- Como podemos apreciar a liberdade do Espírito durante o sono?

No 3º parágrafo, após a segunda frase: Espíritos que se desligam logo da matéria, em


sua morte tiveram sonhos inteligentes; estes quando dormem (tradução de Salvador
Gentile)...

O que realmente quer dizer a frase acima? Que alguns Espíritos, por ocasião da
morte física, têm sonhos inteligentes? Que Espíritos que dão pouco valor às coisas
materiais e que, por isso mesmo, vão se “desmaterializando” enquanto encarnados, têm
sonhos inteligentes? Aliás, desligar-se rapidamente da matéria não implica em adquirir
ao mesmo tempo a lucidez, pois nas mortes bruscas o Espírito, tomado de surpresa, logo
se desliga da matéria, mas entra em profunda perturbação, e nesse estado de
aturdimento seus sonhos são, geralmente, confusos. Segue-se à morte um período de
perturbação no qual os sonhos podem ser inteligentes ou sofridos segundo o
adiantamento de cada Espírito. Aqueles que vão aos poucos se desapegando das coisas
materiais têm sonhos inteligentes, mas podem, também, ter outros que são fruto das
preocupações do dia. Além do mais, o corpo não fica como morto durante o sono, pelo
contrário, em certas fases do sono o cérebro trabalha ativamente.

Sugestão: retirar a frase, substituindo-a por: Nesse estado, reúne-se à sociedade de seres
superiores ou afins a ele. Com eles, viaja, conversa...

Pergunta 406

- Quando vemos em sonho pessoas vivas, que conhecemos perfeitamente, realizando


atos que não sonham de maneira alguma, não é um efeito da imaginação?

- Atos que não sonham de maneira alguma? Que sabes tu? Seu Espírito pode visitar o
teu, assim como o teu pode visitá-lo, e nem sempre sabes em que ele pensa. Aliás,
freqüentemente, atribuís às pessoas que conheceis, e segundo vossos desejos, o que se
passou ou se passa em outras existências.

A pergunta pode ser exposta de uma maneira mais clara.

Sugestão para a pergunta: Quando vemos em sonho pessoas ainda encarnadas, que
conhecemos perfeitamente, realizando atos que não realizariam no estado de vigília,
estamos diante de um efeito da imaginação?

Sugestão para a resposta: Atos que não sonham de maneira alguma? Que sabes tu? Seu
Espírito pode visitar o teu, assim como o teu pode visitá-lo, e nem sempre sabes em que
ele pensa. Aliás, freqüentemente, atribuís às pessoas que conheceis, e segundo vossos
desejos, o que se passou em outras existências, e até mesmo nesta, estabelecendo
confusão entre datas, episódios e personagens.

Pergunta 420
60

- Podem os Espíritos se comunicar se o corpo está completamente desperto?

- O Espírito não está encerrado no corpo como numa caixa: irradia para todos os
lados. Por isso ele pode se comunicar com outros Espíritos mesmo no estado de vigília,
ainda que o faça mais dificilmente.

No estado de vigília os Espíritos podem se comunicar através de palavras,


gestos, aparelhos e da transmissão do pensamento, quando conseguem estabelecer uma
sintonia gerada pela semelhança de pensamentos. A telepatia é, portanto, um fenômeno
devidamente comprovado pela equipe da Duke University comandada pelo professor
Rhine. Todavia, restringindo a área para apenas a comunicação espiritual, resta-nos a
telepatia e a projeção da consciência, também conhecida como desdobramento.

Sugestão: O Espírito não está encerrado no corpo como numa caixa: irradia para todos
os lados. Por isso ele pode se comunicar com outros Espíritos, mesmo no estado de
vigília, ainda que o faça mais dificilmente, através da telepatia ou da projeção da
consciência.

Pergunta 422

- Os letárgicos e os catalépticos vêem e ouvem, geralmente, o que se passa ao seu redor,


mas não podem se manifestar; é pelos olhos e orelhas do corpo?

- Não, pelo Espírito. O Espírito se reconhece, mas não pode se comunicar.

a) - Por que ele não pode se comunicar?

- O estado do corpo se opõe a isso. Esse estado particular dos órgãos vos dão a prova
de que há, no homem, outra coisa além do corpo, visto que o corpo não tendo mais
função, o Espírito age.

Enquanto o Espírito permanece encarnado, o corpo cumpre a função para a qual


foi designado, ou seja, servir de templo carnal para as atividades do Espírito. É
preferível dizer que, àquela hora, algumas funções do corpo não estavam sendo
utilizadas pelo Espírito, já que ele permanecia em sono profundo, do qual só com
dificuldade e, temporariamente, poderia despertar. Todavia, se pode retornar à vida é
porque estava potencialmente vivo. Dizer que o corpo não tem mais função é tomá-lo
como morto, o que não é o caso, pois o Espírito continua a ele ligado, à espera que
retornem as condições favoráveis para se manifestar.

Sugestão: O estado do corpo se opõe a isso. Esse estado particular dos órgãos vos dá a
prova de que há, no homem, outra coisa além do corpo, visto que este, por momentos,
entregue ao seu próprio automatismo, devido à liberdade que o Espírito desfruta,
permanece aparentemente sem função para seu usuário.

Pergunta 440

- O Espírito do extático penetra, realmente, nos mundos superiores?


61

- Sim, ele os vê e compreende a felicidade dos que ali habitam; por isso gostaria de lá
ficar. Mas, existem mundos inacessíveis aos Espíritos que não são bastante depurados.

Nem todo extático penetra nos mundos superiores. Sendo o êxtase um


arrebatamento íntimo, um enlevo, um encanto, isso pode ocorrer na própria Terra
quando o Espírito se desloca a regiões de beleza e bem-estar que são verdadeiras ilhas
de paz existentes na atmosfera espiritual do planeta. Tais colônias espirituais vinculadas
a Terra se destinam ao descanso das almas após longas e frutíferas batalhas, à
aprendizagem nas artes e ciências, dentre outros roteiros de elevação espiritual,
funcionando como verdadeiros oásis para os sedentos de paz. Sendo o êxtase uma
admiração das coisas sobrenaturais, um pasmo, um assombro, um arroubo, não seria
possível a ocorrência de tal evento em sentido contrário? Alguém que seja admirador do
mal não poderia extasiar-se com ele e nele sentir encantamento por absoluta afinidade?
Admitindo-se tal possibilidade todo o processo seria inverso, ou seja, no lugar de o
extático ir a um mundo superior, adentraria uma região inferior, podendo lá desejar
permanecer. Por outro lado, como estamos em um mundo imperfeito, há extáticos que
são joguetes de Espíritos maldosos e, se o são, é ainda por suas imperfeições, que os
tornam sem crédito, portanto, para usufruir de um passaporte para um mundo superior.

Sugestão: Sim, isso pode ocorrer, se ele tem méritos para tanto. Nesse estado ele os vê e
compreende a felicidade dos que ali habitam; por isso gostaria de lá ficar. Mas,
existem mundos inacessíveis aos Espíritos que não são bastante depurados.

455: Resumo teórico do sonambulismo, do êxtase e da segunda vista.

17º parágrafo: No sonho e no sonambulismo, a alma erra nos mundos terrestres;

Não existem mundos terrestres, mas sim um mundo chamado Terra. É preciso
utilizar termos corretos conforme o contexto em que situamos o leitor. Quando o
homem pisou na lua pela primeira vez criou-se um novo verbo para o evento, alunissar,
porque aterrissar refere-se a um pouso na Terra. De igual forma, tomando-se como
modelo o vocábulo geografia, que quer dizer escrita da Terra, foram cunhadas as
palavras selenografia e areografia, respectivamente, escrita da Lua e escrita de Marte.

Sugestão: No sonho e no sonambulismo, a alma erra em regiões terrenas;

Pergunta 466

- Por que Deus permite que Espíritos nos incitem ao mal?

- (...) Tu, sendo Espírito, deves progredir na ciência do infinito e é por isso que
passas...

Sendo um dos lemas do Espiritismo, o mais importante deles, por sinal, amai-
vos e instruí-vos, parece-nos óbvio que o Espirito necessita evoluir através desses dois
caminhos, o amor e a instrução, a fim de conquistar a sua maioridade moral-intelectual,
livrando-se assim das sucessivas reencarnações.
62

Sugestão: Tu, sendo Espírito, deves progredir na ciência e na moral, e é por isso que
passas...

Pergunta 475

- Pode-se, por si mesmo, afastar os maus Espíritos e se libertar da sua dominação?

- Pode-se sempre sacudir um jugo, quando se tem vontade firme.

Antes de ser dominado por outro, dispõe o Espírito do seu senso crítico, o que
lhe permite analisar a situação em que se encontra e esboçar uma reação de defesa.
Tolhido físico e moralmente, encontra-se nas mãos do seu perseguidor, que o faz de
joguete de sua maldade. Nesse estágio do processo obsessivo severo, a subjugação, o
obsidiado necessita da ajuda de terceiros para subtrair-se de tão humilhante situação a
que se expôs, em razão de suas próprias falhas. Portanto, que utilize a vontade firme
antes que o pior lhe aconteça, pois atingindo a culminância almejada pelo obsessor, a
dominação completa do seu inimigo, na imensa maioria das vezes, somente com a ajuda
dos bons Espíritos tal desenlace se opera.

Sugestão: Pode-se sempre sacudir um jugo, quando se tem vontade firme e a


dominação por parte do mau Espírito ainda não se completou.

Pergunta 477

- As fórmulas de exorcismo têm alguma eficácia sobre os maus Espíritos?

- Não, quando esses Espíritos vêem alguém tomar a coisa a sério, riem e se obstinam.

Entre os Espíritos maus há inteligentes e ignorantes. Os primeiros sabem que tais


fórmulas ou rituais, desde que não ministradas por um exorcista com méritos morais
que chamem a si o auxílio dos bons Espíritos, não os afetam, pois reconhecem que
somente a autoridade moral surte efeito sobre eles. Entre os segundos, alguns podem
conhecer tal realidade, mas há outros que se deixam impressionar pelo pretenso poder
do exorcista e de seus rituais e se afastam, pelo menos, momentaneamente, ficando na
espreita para novas investidas. Entre os Espíritos, como entre os encarnados, há os que
se intimidam com nomes pomposos e se impressionam com a fanfarra de falsos
poderosos. Nesse caso, a perseguição pode ter um fim devido à covardia ou à ignorância
do obsessor e não pela eficácia dos métodos do exorcista. Como em qualquer situação,
há de se analisar o drama em questão, seus personagens e o contexto em que se inserem,
para formar um juízo correto dos acontecimentos. A contestação que faço tem por base
a atuação de feiticeiros que, lidando com magia negra, afastam e subjugam com a ajuda
de suas fórmulas e rituais, outros maus Espíritos a quem desejam escravizar. Se há
influência exercida por fórmulas e rituais que através do medo dominam e fazem
vítimas, pode haver eficácia para afastar ou para subjugar. Não nos esqueçamos de que
por trás das fórmulas, pontos riscados, e exorcismos existe o pensamento firme de quem
os pratica.

Sugestão: Não, na maioria das vezes, quando esses Espíritos vêem alguém tomar a
coisa a sério, riem e se obstinam. Contudo, há os ignorantes que se deixam
impressionar pelas fórmulas e palavras do exorcista, bem como os covardes que fogem
63

ao primeiro grito de um falso poderoso. Notando, posteriormente, que o espetáculo em


nada os atingiu, podem voltar com ânimo redobrado, reiniciando a perseguição. É
preciso entender, também, que um exorcista abnegado e com autoridade moral pode
afastar maus Espíritos, mas será, sobretudo, pela sua autoridade moral e não devido as
suas fórmulas e rituais.

Pergunta 488

- Nossos parentes e nossos amigos, que nos precederam na outra vida, têm por nós mais
simpatia que os Espíritos que nos são estranhos?

- Sem dúvida, e freqüentemente eles vos protegem como Espíritos, segundo seu poder.

a) - Eles são sensíveis à afeição que lhes conservamos?

- Muito sensíveis, mas se esquecem daqueles que os esquecem.

Nem sempre. Diria mesmo que é comum em reuniões de desobsessão a presença


de pais, mães, avós já desencarnados, cujos filhos e netos os esqueceram. Tal presença
se deve ao desejo de auxiliá-los através de pedidos de ajuda, preces e intervenções. Há
casos em que o familiar se transvia durante séculos, sendo acompanhado pelo vigilante
amor materno, esperando o instante propício para resgatá-lo e encaminhá-lo às estações
de refazimento. O verdadeiro amor não se ofende com a ingratidão nem com a
ignorância temporária daqueles a quem cuidam.

Sugestão: Muito sensíveis, mas pode ocorrer que, em alguns casos, eles se esqueçam
daqueles que os esqueceram, devido à falta de afinidade entre eles.

Pergunta 490

- O que se deve entender por anjo guardião?

- O Espírito protetor de uma ordem elevada.

O Espírito protetor pertence sempre a uma categoria mais elevada que a do seu
protegido. Mas, tal como em outras questões, aqui temos que considerar o estágio
evolutivo em que o protegido se encontra. Nesse sentido, e somente neste, podemos
mencionar o protetor incluso em uma ordem elevada, ou seja, elevada em relação as que
se situam abaixo dele.

Sugestão: O Espírito protetor de uma ordem mais elevada do que a do seu protegido.

Pergunta 497

- O Espírito protetor pode deixar seu protegido à mercê de um Espírito que poderia lhe
desejar o mal?

- Há união dos maus Espíritos para neutralizar a ação dos bons. Mas, se o protegido
quiser, ele dará toda a força ao seu bom Espírito. O bom Espírito pode ser que
64

encontre uma boa vontade, alhures, para ajudar; ele disto aproveita até seu retorno
junto ao seu protegido.

O acompanhamento do protegido é uma missão que o protetor toma para si, não
podendo se afastar para outra desempenhar, a não ser deixando em seu lugar alguém
que a desempenhe de forma semelhante ou superior. Ele pode afastar-se ficando em
observação à distância, se o seu protegido negligencia suas tarefas, não escutando seus
reiterados apelos no sentido de cumprir o que lhe foi designado. Pode afastar-se,
igualmente, se por um motivo inadiável, sua presença for exigida em algum lugar
distante, devendo concentrar-se em outra atividade até que dela se desembarace. Nesse
caso, deixa alguém com igual competência a lhe substituir. A primeira parte da resposta
pode ser dispensada sem prejuízo para a segunda, que não detalha bem o caso.

Sugestão: Ao tomar como tarefa proteger alguém, o anjo guardião dele só se afasta por
um motivo realmente sério e, nesse caso, outro de igual competência ou superior, o
substitui.

Pergunta 498

- Quando o Espírito protetor deixa seu protegido se transviar na vida é por falta de força
da sua parte na luta contra outros Espíritos malévolos?

- Isso não é porque ele não pode, mas porque ele não quer. Seu protegido sai das
provas mais perfeito e mais instruído. Ele o assiste com seus conselhos pelos bons
pensamentos que lhe sugere, mas que, infelizmente, não são sempre escutados. Não é
senão a fraqueza, a negligência ou o orgulho do homem que dá força aos maus
Espíritos; seu poder sobre vós resulta de não lhes opordes resistência.

Acreditamos que todo Espírito protetor queira, sinceramente, encorajar e ajudar


ao seu protegido. Ocorre que nem sempre encontra as condições necessárias para a
missão que recebeu, não por demérito seu, mas pela imaturidade daquele a quem tenta
proteger; pode ocorrer, também, que o resultado a ser obtido com o aparente fracasso
anunciado pelo assédio do mau Espírito venha a funcionar como lição para o progresso
do protegido. Nesse caso, o erro é contabilizado como uma instrução da escola da vida,
fato comum na pedagogia da dor, mestra bastante requisitada na Terra. Importa em
casos tais mais o resultando que o drama. Se o desfecho final é positivo para o aprendiz,
seu mestre o deixará seguir em frente. Dizer simplesmente que é porque o protetor não
quer pode soar como um descaso. O protetor analisa o caso e se é mais produtivo para o
protegido sofrer a influência do mau Espírito, disso resultando um bem, ele o deixa
entregue, naquele momento, ao seu livre-arbítrio.

Sugestão: Isso não é porque ele não pode, mas porque analisa e decide pelo que é mais
benéfico para o progresso do protegido. Permitindo o assédio, este poderá sair das
provas mais perfeito e mais instruído. Ele o assiste com seus conselhos pelos bons
pensamentos que lhe sugere, mas que, infelizmente, não são sempre escutados. Não é
senão a fraqueza, a negligência ou o orgulho do homem que dá força aos maus
Espíritos; seu poder sobre vós resulta de não lhes opordes resistência.

Pergunta 507
65

- Os Espíritos protetores pertencem todos à classe dos Espíritos superiores? Pode se


encontrar entre os médios? Um pai, por exemplo, pode vir a ser o Espírito protetor de
seu filho?

- Ele o pode, mas a proteção supõe certo grau de elevação, um poder ou uma virtude a
mais concedida por Deus. O pai que protege seu filho pode ser, ele mesmo, assistido
por um Espírito elevado.

Deus não concede medalhas ou chagas, virtudes ou poderes a nenhum Espírito,


pois nas leis divinas não existem discriminações nem privilégios. Toda a soma de
méritos que um Espírito tem, vem de suas conquistas que são pessoais e intransferíveis.
Deus ajuda a quem se ajuda, mas não concede gratuitamente dons, sendo a sua
imparcialidade ponto inegociável, sob pena de não ser Deus, por lhe faltar um dos
atributos mais importantes: a justiça.

Sugestão: Ele o pode, mas a proteção supõe certo grau de elevação, um poder ou uma
virtude a mais conquistada pelo protetor. O pai que protege seu filho pode ser, ele
mesmo, assistido por um Espírito elevado.

Pergunta 510

- Quando o pai que vela sobre seu filho vem a reencarnar, vela ainda sobre ele?

- Isso é mais difícil, mas ele convida, num momento de desprendimento, um Espírito
simpático para o assistir nessa missão. Aliás, os Espíritos não aceitam senão missões
que podem cumprir até o fim. O Espírito encarnado, sobretudo nos mundos onde a
existência é material, está mais submetido ao seu corpo para poder ser inteiramente
devotado, quer dizer, assistir pessoalmente. Por isso, aqueles que não são bastante
elevados, são, eles mesmos, assistidos por Espíritos que lhe são superiores, de tal sorte
que se um falta por uma causa qualquer, ele é substituído por outro.

Os Espíritos, atingindo certo grau de maturidade moral, é que só aceitam


missões que possam cumprir integralmente. Outros, cuja inferioridade não os permitem
vislumbrar a excelência da honestidade, da fidelidade, dentre outras virtudes, aceitam
sem critério qualquer missão sem se importarem se a concluirão. Mesmo sendo, o
candidato a anjo guardião profundamente analisado quanto à sua capacidade de
proteger alguém, é necessário que se faça essas ressalvas em nome do bom
entendimento da Doutrina.

Sugestão: Isso é mais difícil, mas ele convida, num momento de desprendimento, um
Espírito simpático para o assistir nessa missão. Aliás, Espíritos de valores morais já
consolidados, não aceitam senão tarefas que possam cumprir integralmente. O Espírito
encarnado, sobretudo nos mundos onde a existência é material, está mais submetido ao
seu corpo para poder ser inteiramente devotado, quer dizer, assistir pessoalmente. Por
isso, aqueles que não são bastante elevados, são, eles mesmos, assistidos por Espíritos
que lhe são superiores, de tal sorte que se um falta por uma causa qualquer, ele é
substituído por outro.

Pergunta 511
66

- Além do Espírito protetor, um mau Espírito é ligado a cada indivíduo, tendo em vista
compeli-lo ao mal e lhe fornecer uma ocasião de lutar entre o bem e o mal?

- Ligado não é o termo. É bem verdade que os maus Espíritos procuram desviar do bom
caminho, quando encontram oportunidade; mas quando um deles se liga a um
indivíduo, ele o faz por si mesmo, posto que espera ser escutado. Então, há a luta entre
o bom e o mau, e vence aquele ao qual o homem deixa imperar sobre si.

Supondo que cada Espírito, desde que ainda necessite da orientação de um anjo
guardião, reencarne sob seus cuidados, mais necessariamente aqueles ainda sem valores
morais destacados, não é conveniente polarizar a questão entre o bom e mau, já que, em
alguns casos, nenhum dos envolvidos, nem o homem, nem seu guardião, nem seu
obsessor é bom. Explicando melhor: se todos os Espíritos nascem sob a orientação de
um guardião, nos mundos inferiores, onde reina a força bruta, não existe ainda a noção
do justo e do injusto, os anjos guardiões não necessariamente são Espíritos superiores.
Comparando os anjos guardiões de um mundo inferior com os de um mundo de provas
e expiações, pode ocorrer que alguns dos primeiros sejam considerados maus quando
analisados sob a ótica e no contexto dos segundos. Se não tratarmos essa questão com a
relatividade que ela exige, precisaremos explicar este fato, pois nem Jesus aceitou o
título de bom, afirmando que só Deus o era. Neste caso a que me refiro, aquele que
opta por um caminho menos ruim pode ser classificado como menos mau, mas jamais
bom.

Sugestão: Ligado não é o termo. É bem verdade que os maus Espíritos procuram
desviar do bom caminho quando encontram oportunidade; mas quando um deles se liga
a um indivíduo, ele o faz por si mesmo, posto que espera ser escutado. Então, há uma
luta entre as duas vontades capitulando aquela que se deixa subjugar.

Pergunta 526

- Os Espíritos tendo uma ação sobre a matéria podem provocar certos efeitos para que
se cumpra um acontecimento? Por exemplo, um homem deve perecer: ele sobe em uma
escada, a escada se quebra e o homem morre da queda; são os Espíritos que fazem a
escada quebrar para cumprir o destino desse homem?

- É bem verdade que os Espíritos têm uma ação sobre a matéria, mas para o
cumprimento das leis da Natureza e não para as derrogar, fazendo surgir no momento
oportuno um acontecimento inesperado e contrário a essas leis. No exemplo que tu
citas, a escada se rompe porque ela estava carcomida ou não bastante forte para
suportar o peso do homem. Se estava no destino desse homem perecer dessa maneira,
eles o inspirarão o pensamento de subir por essa escada que deverá se romper sob o
seu peso, e sua morte terá lugar por um efeito natural e sem que seja necessário fazer
um milagre para isso.

Estamos acostumados a ouvir e a ler relatos nos quais os Espíritos obsessores


inspiram idéias que, se executadas, podem resultar na morte de alguém a quem querem
prejudicar. Espíritos bondosos disseminarem tais idéias, quando existem dezenas de
maneiras menos traumáticas e naturais de provocar um desencarne a fim de que os
familiares tenham mais calma em momento tão doloroso, enfrentem sem alarido e
maiores traumas a partida de um ser amado, confesso que desconheço tal procedimento,
67

principalmente, se o homem em questão tiver méritos. Vale ressaltar que no


planejamento que antecede a reencarnação do Espírito consta o volume fluídico
correspondente ao número de anos que ele viverá sobre a Terra, podendo tal volume, se
reposto conforme as necessidades do corpo e a parcimônia com que for gasto, ou seja,
sem os excessos de consumo em atos inúteis à sua evolução, ultrapassar a provável data
do desencarne. Esgotado o fluido, a máquina orgânica pára naturalmente. Não é regra
geral fazer constar no planejamento reencarnatório, flexível quanto a este ponto, a
determinação exata de que o corpo deva perecer àquele dia, hora e circunstância
determinados. O desencarne pode ocorrer antes, depois ou na data prevista. Nas
reuniões de desobsessão os bons Espíritos não trazem à força um obsessor e o fazem
sentir tonturas, queimação, açoites, porque não têm mais afinidade com tais práticas.
Embora sabedores de que essa é a única linguagem que os endurecidos entendem e
merecem, não o fazem, sendo tal missão destinada a subalternos que auxiliam na
captura e transporte dos mesmos. Por que, então, inspirariam alguém a subir em uma
escada sabendo antecipadamente do desastre que disso resultaria? Não existe, neste
caso, tal como nas leis terrenas, um crime induzido e premeditado? Dependerá a justiça
divina de fomentadores de desgraças para se fazer cumprir?
Nossos protetores não são carrascos que nos vigiam, julgam e punem como
algozes cruéis. O planejamento reencarnatório é feito em parceria com familiares que
desejam nosso progresso, protetores que nos acompanham velando pelo nosso bem-
estar e, principalmente, quando temos consciência para tanto, de nós próprios. O roteiro
mais útil, melhor elaborado e menos traumático para a evolução do interessado é
aprovado sem segundas intenções. Na pior das hipóteses o infrator é tratado como filho
de Deus que se transviou, perfeitamente suscetível de voltar vitorioso em novo
mergulho na carne. Em alguns casos, se precisamos de mais tempo na matéria carnal
para concluirmos determinada missão, se ela nos faculta méritos e temos créditos,
poderemos até ser agraciados com uma sobrevida de alguns anos.
Se há Espíritos que nos incentivam a subir em uma escada, condenando-nos à
morte porque é chegada nossa hora, não poderia alguém baseado em tal argumento,
praticar a eutanásia naquele que já não suporta a dor superlativa, diante de um quadro
clínico terminal cuja morte é inadiável, pelo mesmo motivo? Quem determina a hora da
morte? Dirão que só Deus sabe essa hora e que é preciso acreditar nisso. Mas se Deus
sopra seus planos aos ouvidos de muitos, não poderia alguém se sentir inspirado e,
diante disso, afirmar que recebeu Dele a ordem para desligar o tênue fio que sustenta
uma vida agonizante?
Acredito que essa exigência de uma morte apressada possa acontecer em
circunstâncias especiais e não como uma regra geral. Esta obedeceria ao curso natural
dos acontecimentos sem a necessidade de convites forçados.
Aquietemo-nos quanto ao instante da nossa morte e não nos impressionemos
com o que temos a fazer, seja subir uma escada ou o Everest. Deus não é juiz parcial
que cobra de quem não tem e ceifa onde não semeou. Permite, inclusive, ao bom pai,
que fique um pouco mais junto aos filhos para um último conselho, um adeus tranqüilo.
Além do mais, essa discussão é um pouco enfadonha porque todos morrem na hora.
Diante de um fato milagroso onde alguém escapa, diz-se que não era a sua hora. Por
outro lado, se alguém morre por descuido, de graça, como se costuma dizer, afirma-se
que sua ora era chegada. Então todo mundo pode afirmar que era e que não era a hora
da partida.

Sugestão: É bem verdade que os Espíritos têm uma ação sobre a matéria, mas para o
cumprimento das leis da Natureza e não para as derrogar, fazendo surgir no momento
68

oportuno um acontecimento inesperado e contrário a essas leis. No exemplo que tu


citas, a escada se rompe porque ela estava carcomida ou não bastante forte para
suportar o peso do homem. Manter-se preocupado ou impressionado em demasia
quanto a hora e o gênero da morte pode causar um desperdício de energia e precipitar
decisões que, se tomadas, nem sempre serão as melhores. Quando alguém faz o que lhe
compete com honestidade e respeito às leis divinas, a morte não deve ser um motivo de
preocupação.

Pergunta 535

- Quando nos acontece alguma coisa feliz é ao nosso Espírito protetor que devemos
agradecer?

- Agradecei, sobretudo, a Deus, sem cuja permissão nada se faz, pois os bons Espíritos
foram seus agentes.

a) - O que aconteceria se se negligenciasse em agradecer?

- O que acontece aos ingratos.

b) - Entretanto, há pessoas que não oram, nem agradecem e às quais tudo sai bem?

- Sim, mas é preciso ver o fim, pois pagarão bem caro essa felicidade passageira que
não merecem, porque mais tenham recebido, mais terão que restituir.

Primeiro é preciso que se diga que alguém pode não orar, esquecer de agradecer
a Deus as bençãos recebidas diariamente, permanecendo com créditos frente à vida, por
ações meritórias que desenvolve.
Deus não se ofende quando não agradecemos as dádivas de cada dia, tais como o
ar que respiramos, a comida que ingerimos, o deslocamento que fazemos e centenas de
situações nas quais nos situamos e que nos causam certa dose de alegria. A cada um é
dado segundo as obras e, na maioria das vezes, merecemos o que temos e o que nos
acontece, já que somos o resultado do que fazemos. Claro que a gratidão é um
sentimento nobre e demonstra no Espírito que a cultiva uma sensibilidade mais apurada.
Todavia, algumas pessoas são mais “desligadas” quanto a este aspecto; outras são
excessivamente compenetradas em suas tarefas e terceiras são tímidas o bastante para
nutrirem medo de se sentirem felizes. Estas se subestimam, carregam certa vergonha de
se admitirem merecedoras dos prazeres sadios desta vida. Existem pessoas que, sob o
tacão dos complexos que lhes impuseram, se travam diante das belezas e alegrias que
podem desfrutar, principalmente se tiveram uma educação castradora. Tais pessoas, até
porque não vêem em si as bençãos que em outras julga fecundas, se sentem desmotivas
para agradecer. Por outro lado, poderia gerar fanatismo o ato de, a todo instante,
agradecermos pelo que nos ocorre. Devemos ter a consciência de que tudo de bom que
nos alcança vem de Deus, do seu imenso amor para conosco; ao levantar e ao deitar
agradecermos por um novo dia e uma boa noite concedidos para o exercício na prática
das leis divinas. Deus sabe de nossas imperfeições e não nos cobra um regime de
adoração contemplativa, competindo com a nossa luta pela sobrevivência.
Apenas os ingratos pagam pela ingratidão. Um filho parte para um país distante
e, após anos sem comunicação, entretido em suas atividades produtivas, chega e diz:
69

Pai, estive ocupado, mas jamais esqueci da sua amizade. Haverá ingratidão nessa
atitude? Deverá pagar ele o quinhão dos ingratos? Estejamos convictos de que devemos
perseguir o estado de agradecimento espontâneo, que é uma atitude íntima, uma
conquista do Espírito na qual ele, mesmo sem gestos e palavras, o reflete, pois já o tem
incorporado como estado natural.

Sugestão para a primeira pergunta: Agradecei, sobretudo, a Deus, sem cuja permissão
nada se faz, pois os bons Espíritos foram seus agentes. Mas não julgueis que Deus
exige de vós atitudes fanáticas, contemplação exagerada ou bajulações inúteis. Buscai
antes, um estado de agradecimento natural, ou seja, sede gratos, em Espírito e
naturalmente, por todo bem que vos ocorre.

Sem as ressalvas ou os devidos aprofundamentos as questões a e b não retratam


a realidade de maneira clara, sendo preferível, no meu ponto de vista, que sejam
suprimidas.

Pergunta 538

- Os Espíritos que presidem aos fenômenos da Natureza formam uma categoria especial
no mundo espírita? São seres à parte ou Espíritos que estiveram encarnados como nós?

- Que o serão ou que foram.

a) - Esses Espíritos pertencem a ordens superiores ou inferiores da hierarquia espírita?

- Isso depende do seu papel mais ou menos material ou inteligente. Alguns comandam,
outros executam. Os que executam as coisas materiais são sempre de uma ordem
inferior, entre os Espíritos como entre os homens.

Subentende-se das palavras que o serão a existência de seres ainda não


completamente humanos, ou seja, princípios inteligentes que ainda não sofreram a
transformação definitiva para se tornarem Espíritos. Estes, dentre outras denominações,
são chamados de elementais.
Entre os encarnados, há os inteligentes que, estando em expiação ou prova,
podem executar coisas materiais, tal como aquele que escravizou e, por força da lei de
ação e reação, torna-se escravo. O mesmo se pode dizer do missionário, que vem para
servir o povo dando exemplos de humildade e compaixão pela massa sofredora. Jesus
disse: “Aquele que quiser ser o maior que seja o menor entre os homens”. A Terra está
repleta, principalmente na atualidade, onde o capitalismo domina o mundo, de Espíritos
inteligentes que não encontram oportunidade de serviço compatível à sua inteligência,
passando a ocupar cargos sem expressão, onde as tarefas são mais materiais que
intelectuais. Recorrendo-se à história de alguns personagens terrenos vamos encontrar
Jesus, o Espírito mais perfeito que encarnou entre nós dizendo: “Eu trabalho e o meu
Pai trabalha sem cessar. Aquele que dentre vós quiser ser o maior que seja o menor,
aquele que serve”. Francisco de Assis reformou com as próprias mãos a igreja de São
Damião e trabalhou sua vida inteira na pobreza e pelo bem-estar espiritual dos pobres.
Poderíamos citar dezenas de Espíritos superiores que priorizaram o trabalho braçal no
lugar de páginas filosóficas, discursos dourados ou consolações sem exemplos. Madre
Teresa de Calcutá, Albert Schweitzer, Ghandi, Vicente de Paulo e tantos outros. Essa
70

idéia que afirma serem os executantes de um trabalho braçal menos evoluído do que
outros que desempenham tarefas intelectuais, gerou um grande vago nos estudos dos
efeitos físicos por parte da codificação kardeciana, sendo preenchida por outros
pesquisadores do tema (ver Kardec, o homem, o cientista, no início da obra).

Sugestão: Isso depende do seu papel mais ou menos material ou inteligente. Alguns
comandam, outros executam. Os que executam as coisas materiais são, na hierarquia
espiritual, geralmente, de uma ordem inferior, entre os Espíritos como entre os homens.

Pergunta 539

- Na produção de certos fenômenos, as tempestades, por exemplo, é um Espírito que age


ou se reúnem em massa?

- Em massas inumeráveis.

Essa é uma das questões que eu gostaria de ter subsídios para desenvolver. Sinto
falta, nesse caso, do consenso universal que, certamente, o aprofundaria, de vez que,
abordado por outros médiuns e pesquisadores seria de se esperar que todos não se
limitassem a repetir o que já fora dito. Confesso minha ignorância diante dela e, mais
ainda, a dificuldade de entender como e por que os Espíritos promovem um tsunami
levando com ele milhares de vidas. Vejamos como Kardec, em 1868, mais de 10 anos
após ter selecionado esta questão, se reporta em A Gênese, Cap. XV, Tempestade
Aplacada, sobre a ação dos Espíritos nos fenômenos da natureza: Ainda não
conhecemos o bastante os segredos da Natureza para dizer se há ou não inteligências
ocultas presidindo à ação dos elementos. Na hipótese de haver, o fenômeno em questão
poderia ter resultado de um ato de autoridade sobre essas inteligências e provaria um
poder que a nenhum homem é dado exercer.

Sugestão: Se a Doutrina não tem como explicar o fenômeno ainda, é necessário que se
promova seminários, debates, pesquisas, consultas ao plano espiritual, até que se chegue
a uma conclusão, pelo menos à altura do nosso entendimento. Como está, pode levar o
leitor a impressões vagas ou errôneas. Esse foi o conselho de Allan Kardec em “Obras
Póstumas”: O conjunto da Doutrina deve ser determinado com precisão e clareza, sem
nada deixar de vago. Penso que essa resposta poderia ficar de quarentena até tivéssemos
a sua confirmação, ou por outro lado, a sua negação.

Pergunta 540

- Os Espíritos que exercem uma ação sobre os fenômenos da Natureza agem com
conhecimento de causa, em virtude do seu livre-arbítrio ou por um impulso instintivo e
irrefletido?

- Alguns sim, outros não. Eu faço uma comparação: figura-te entre essas miríades de
animais que, pouco a pouco, fazem surgir do mar as ilhas e os arquipélagos; crês que
nisso não há um fim providencial e que certa transformação da superfície do globo não
seja necessária à harmonia geral? Esses não são mais que animais da última ordem
que cumprem essas coisas, para proverem suas necessidades e sem desconfiarem que
são os instrumentos de Deus. Muito bem! Da mesma forma, os Espíritos, os mais
atrasados, são úteis ao conjunto. Enquanto ensaiam para a vida e antes de terem a
71

plena consciência dos seus atos e seu livre-arbítrio, eles agem sobre certos fenômenos
dos quais são agentes inconscientes; eles executam primeiro; mais tarde, quando sua
inteligência estiver mais desenvolvida, eles comandarão e dirigirão as coisas do mundo
material. Mais tarde, ainda, eles poderão dirigir as coisas do mundo moral. É assim
que tudo serve, tudo se coordena na Natureza, desde o átomo primitivo até o arcanjo
que, ele mesmo começou pelo átomo. Admirável lei de harmonia da qual vosso Espírito
limitado não pode ainda entender o conjunto.

Comentário:
“É assim que tudo serve, tudo se coordena na Natureza, desde o átomo
primitivo até o arcanjo que, ele mesmo começou pelo átomo”. Eis aí outra questão que
gostaria de entender. Se o arcanjo começou pelo átomo, sua origem seria material?
Existem no elemento inteligente universal átomos que, a semelhança de sementes, irão
gerar Espíritos? Que benefício traz uma resposta que tudo quanto consegue transmitir é
um sem número de perguntas que, mesmo verticalizadas, não se mostram conclusivas?
Aqui há um grande vago que dificilmente será preenchido no presente estágio de
conhecimento em que nos encontramos. Segue-se aqui a mesma opinião emitida na
sugestão da questão anterior.

Pergunta 547

- Os Espíritos que se combatiam, estando vivos, uma vez mortos se reconhecem por
inimigos e são ainda obstinados uns contra os outros?

Sugestão: substituir as expressões estando vivos por enquanto encarnados e mortos por
desencarnados.

Pergunta 551

- Pode um homem mau, com a ajuda de um mau Espírito que lhe é devotado, fazer mal
ao seu próximo?

- Não, Deus não o permitiria.

A pergunta não esclarece sobre a condição moral da suposta vítima. Se ela for
má, estando suas defesas vulneráveis, certamente não escapará quando perseguida, do
assédio e da violência daqueles que a buscam. Tal procedimento é comum nos “ajustes
de contas” entre malfeitores encarnados e desencarnados que se unem em torno de
objetivos de vingança. Até mesmo um homem honesto na presente encarnação, mas
com o passado comprometido por desrespeitar as leis divinas em encarnação anterior,
fato que o credencia a sofrer agressões por imposição cármica, pode sofrer assédio,
perseguição e agressão de um mau Espírito, que age sob o comando de outro, encarnado
ou desencarnado.

Sugestão: Se for um homem bom cujo passado honesto desautorize uma agressão, Deus
não o permite. Caso contrário, segue-se a lei geral, ou seja, a cada um é dado segundo
as suas obras.
72

Pergunta 557

- A benção e a maldição podem atrair o bem e o mal sobre aqueles que são seu objeto?

- Deus não escuta uma maldição injusta e aquele que a pronuncia é culpado aos seus
olhos. Como nós temos os dois gênios, o bem e o mal, ela pode ter uma influência
momentânea, mesmo sobre a matéria, mas essa influência não ocorre senão pela
vontade de Deus e como acréscimo de prova para aquele que objetiva. De resto, o mais
freqüentemente, se maldizem os maus e se bendizem os bons. A benção e a maldição
não podem jamais desviar a Providência do caminho da justiça; ela não atinge o
maldito senão se é mau, e a sua proteção não cobre senão aquele que a merece.

Nós temos os dois gênios, o bem e o mal, somente até certo ponto da escala
evolutiva a que todos são obrigados a percorrer, ocasião em que superamos o mal em
nós e passamos a agir visando apenas o bem geral. Quanto a acrescentar mais
sofrimento aos que carpimos, já que uma maldição não se destina a beneficiar, mas a
prejudicar, soa como se pudessem cobrar mais do que devemos, a não ser que tenhamos
dívidas passadas reais e tenhamos concordado com o tal acréscimo anteriormente. Se o
planejamento reencarnatório vem a sofrer mudanças segundo as bençãos e as maldições
que nos são lançadas, pouca consideração ele merece, além da insegurança que pode
gerar. E se nessa prova adicional o Espírito cair e disso resultar um atraso evolutivo no
lugar de um progresso? Dirão que Deus permite quando aquele que sofre a prova tem a
garantia da vitória. Mas, se assim for, por que tudo isso não é explicado às claras para
que não pairem dúvidas em nosso caminho?

Sugestão: Deus não escuta uma maldição injusta e aquele que a pronuncia é culpado
aos seus olhos. Enquanto imaturos moralmente temos os dois gênios, o bem e o mal, e
nesse caso ela pode ter uma influência momentânea, mesmo sobre a matéria, mas essa
influência não ocorre senão pela vontade de Deus e como uma prova para aquele que
dela necessita se disso puder resultar algum progresso ao seu Espírito. De resto, o mais
freqüentemente, se maldizem os maus e se bendizem os bons. A benção e a maldição
não podem jamais desviar a Providência do caminho da justiça; ela não atinge o
maldito senão se é mau, e a sua proteção não cobre senão aquele que a merece.

Pergunta 565

- Os Espíritos examinam nossos trabalhos de arte e se interessam por eles?

- Eles examinam o que possa provar a elevação dos Espíritos e seus progressos.

Espíritos que se encontram no mesmo patamar evolutivo que nós ou abaixo dele
se interessam por nossas obras de arte, conosco interagindo, ensinando e aprendendo
como alunos de uma mesma série. Espíritos mais evoluídos, com a missão de fazerem
progredir a Humanidade ou parte dela é que selecionam dentre os trabalhos de arte
existentes, aqueles que facultam mais diretamente o progresso dos Espíritos. Ocorre o
mesmo em uma escola onde todos os alunos são convidados a expor seus trabalhos,
indo à exposição apenas os selecionados pelo valor que apresentam.
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Sugestão: Assim procedem aqueles que se encontram no mesmo patamar evolutivo que
vós, ou abaixo dele. Os mais adiantados examinam o que possa provar a elevação dos
Espíritos e seus progressos.

Pergunta 579

- Visto que o Espírito recebe sua missão de Deus, como Deus pode confiar uma missão
importante e de interesse geral a um Espírito que poderá nela falir?

- Deus não sabe se o seu general obterá a vitória ou será vencido? Ele o sabe, estais
seguros, e seus planos, quando são importantes, não repousam sobre aqueles que
devem abandonar a obra no meio do seu trabalho. Toda questão está para vós no
conhecimento do futuro que Deus possui, mas que não vos é dado.

Acredito que Kardec, admitindo que um Espírito ao receber uma missão de Deus
pudesse falhar na execução de sua tarefa, quis saber sobre a utilidade dessa atitude,
entregar uma tarefa a quem não a cumprirá integralmente. Nesse caso a resposta ficaria
mais clara explicada através do raciocínio seguinte: o Espírito que recebe uma missão e
não a desempenha a contento adquire experiência e, conseqüentemente aprende lições
que lhe serão úteis em uma segunda tentativa, não resultando de todo inútil a sua tarefa.
Digamos que um homem receba a missão de fundar um Centro Espírita e com ele
promover a assistência social e espiritual bem como a divulgação da Doutrina em uma
grande favela. Se ele apenas começa o seu trabalho e logo desiste, aquele seu exemplo
pode ser imitado por outro que lhe dará prosseguimento, resultando daquele fracasso um
bem. Teria sido inútil a missão do primeiro? Como Deus tudo sabe, certamente permitiu
a tarefa inicial ao general acomodado, incentivando a outro lhe tomar o lugar sem
prejuízo da obra.

Sugestão: Para grandes batalhas Deus escolhe grandes generais. Seus planos não
repousam sobre aqueles que devem abandonar a obra no meio do trabalho. Todavia,
das derrotas podem ser extraídas grandes lições. Toda questão está para vós no
conhecimento do futuro que Deus possui, mas que não vos é dado.

Pergunta 583-a

- Se uma criança resulta um bom sujeito, malgrado a negligência ou os maus exemplos


dos pais, estes retiram algum fruto?

- Deus é justo.

Retiram o fruto do arrependimento expresso na perda da oportunidade de


serviço. Há sempre o que lamentar quando uma chance de crescimento é desperdiçada
e, nesse caso, mais mérito terá o filho que não se deixou conduzir pelos exemplos
negativos que recebeu.

Sugestão: Deus, sendo justo, não pode fazer constar na “folha de serviço” de alguém
méritos que ele não tem.

Pergunta 585
74

- Que pensais da divisão da Natureza em três reinos, ou em duas classes: os seres


orgânicos e os seres inorgânicos? Alguns fazem da espécie humana uma quarta classe.
Qual dessas divisões é preferível?

- Elas são todas boas, dependendo do ponto de vista. Materialmente, não há senão
seres orgânicos e seres inorgânicos; sob o ponto de vista moral há, evidentemente
quatro graus.

Depois de bastante estudo, os cientistas concluíram que vários seres não se


enquadravam nos critérios de classificação animal ou vegetal. Vejamos dois exemplos:
o cogumelo possui parede celular, característica de células vegetais, mas é heterótrofo,
ou seja, não fabrica seu próprio alimento, que é uma característica animal; a euglena é
dotada de locomoção, que é uma característica animal, possui clorofila e é autótrofa, ou
seja, fabrica seu alimento, que é uma característica vegetal.
Por esta razão, Whittaker, em 1969 apresentou um moderno sistema de
classificação, atualmente adotado em todo o mundo:
* Reino Monera: abrange todos os organismos unicelulares e procariontes, ou seja, que
não possuem membrana nuclear, representado pelas bactérias e algas azuis;
* Reino Protista: compreende os organismos unicelulares e eucariontes, ou seja, que
possuem membrana nuclear, representado pelos protozoários e certas algas;
* Reino Fungi: abrange todos os fungos. Estes são eucariontes e heterótrofos por
absorção podendo ser unicelulares ou pluricelulares;
* Reino Plantae: compreende os organismos pluricelulares, eucariontes e autótrofos,
sendo representado por certas algas e todos os outros vegetais;
* Reino Animalia: compreende os organismos pluricelulares, eucariontes e heterótrofos
por ingestão, sendo representados por todos os animais, dos poríferos aos mamíferos.
* O vírus constitui um sistema à parte por não se enquadrar na nova classificação.
Não é que a classificação anterior representada pelos reinos mineral, vegetal e
animal esteja errada, mas incompleta e, portanto, sujeita a melhoramentos, como a atual
será um dia.

Sugestão: Elas são todas boas, dependendo do ponto de vista. Materialmente, não há
senão seres orgânicos e seres inorgânicos. Todavia, a fim de evitar confusões
desnecessárias é preferível seguir o progresso da ciência, que muda conforme a época
e a necessidade. Sob o ponto de vista moral há, conforme o pensamento que ora
expressais, quatro graus.

Pergunta 587

- As plantas experimentam sensações? Sofrem quando mutiladas?

- As plantas recebem as impressões físicas que agem sobre a matéria, mas não têm
percepções e, por conseguinte, não têm sentimento de dor.

Comentário a ser adicionado a questão:

Atualmente alguns cientistas têm desenvolvido pesquisas sobre a inteligência


das plantas, chegando à conclusão de que elas são capazes de agir, em alguns casos,
com racionalidade e precisão.
75

Defendem alguns estudiosos desse tema que a inteligência só se concentra no


cérebro em espécies mais evoluídas, enquanto que nos seres que não o possuem
encontra-se dispersa em suas células, ou seja, em todo o corpo. Alguns vão mais
adiante, afirmando que a própria célula, devido às complexas e numerosas tarefas que
realiza com grande precisão e sempre utilizando o mais racionalmente possível seus
materiais, apresenta inteligência. No Espírito, a capacidade de ver, ouvir, sentir, dentre
outras que lhes são inerentes, não são, por assim dizer, disseminadas por todo o corpo?
As árvores colhem dados do ambiente, armazena-os em uma espécie de memória, e com
eles trabalham planejando a sua sobrevivência no meio em que vivem. Por tais razões
as plantas, segundo a interpretação de alguns biólogos, podem ser consideradas como
possuidoras de um sistema rudimentar de percepção da realidade que as cercam.

Pergunta 646

- O mérito do bem que se fez está subordinado a certas condições; dizendo melhor, há
diferentes graus no mérito do bem?

- O mérito do bem está na dificuldade. Não há mérito em fazer o bem sem trabalho, e
quando nada custa. Deus tem mais em conta o pobre que reparte seu único pedaço de
pão, do que o rico que não dá senão seu supérfluo. Jesus disse-o a propósito do óbulo
da viúva.

Comentário:
Que Deus tenha mais em conta o pobre que doa do seu necessário do que o rico
que distribui do seu supérfluo, isso nos parece lógico. Todavia, o complemento da
resposta, “tem mais em conta”, ou seja, dá mais valor, representa uma gradação ou
valoração do bem que cada um faz e não está compatível com a negação do mérito
anteriormente afirmado. O rico que já inicia o seu processo de desprendimento dos bens
terrenos, mesmo sem o saber, doando do seu supérfluo, não está adiante daquele que,
igualmente rico, nada doa devido a sua sede de posse? O supérfluo que ele doa não mata
a fome e veste o corpo do pobre igualmente ao que é doado por outro pobre? Gerando
benefícios, ou seja, atendendo às necessidades básicas de alguém, não representa um
bem diante da vida? E aquele que beneficia a vida em seus passos angustiantes não tem
algum mérito diante de Deus?
A caridade, para firmar-se como uma virtude adquirida, necessita de muito
treinamento em seu processo de construção. Ninguém se santifica do dia para a noite,
mas nos passos dos milênios. É assim que o rico, doando do seu supérfluo, séculos mais
tarde permitirá que outros participem de suas reservas para, então, culminar um dia
doando do seu necessário.
Desvalorizar por completo a dádiva do rico porque esta, quando praticada, não
lhe arranha a abastança não nos parece lógico, já que em si ela é um bem. Algum mérito
ela deve ter, nem que seja o do não desperdício. O mesmo já não se pode dizer daqueles
que doam por orgulho fazendo tocar as trombetas em louvor à sua “bondade”.

Sugestão: O mérito do bem está na dificuldade. Há pouco mérito em fazer o bem sem
trabalho e quando nada custa. Deus tem mais em conta o pobre que reparte seu único
pedaço de pão, do que o rico que não dá senão do seu supérfluo. Jesus disse-o a
propósito do óbulo da viúva.
76

Pergunta 657

- Os homens que se abandonam à vida contemplativa, não fazendo nenhum mal e não
pensando senão em Deus, têm algum mérito aos seus olhos?

- Não, porque se eles não fazem o mal, não fazem o bem e são inúteis. Aliás, não fazer o
bem já é um mal. Deus quer que se pense nele, mas não quer que se pense apenas nele,
visto que deu ao homem deveres a cumprir sobre a Terra. Aquele que se consome na
meditação e na contemplação, não faz nada de meritório aos olhos de Deus, posto que
sua vida é toda pessoal e inútil à Humanidade e Deus lhe pedirá contas do bem que não
haja feito.

Segundo o Novo Dicionário Aurélio, da língua portuguesa, contemplar significa


considerar com admiração ou com amor. Um homem que pensa apenas em Deus deve,
certamente, meditar em sua beleza, justiça, sabedoria, dentre outras virtudes a Ele
inerentes. Se essa é a sua preocupação, admirar com amor, atrairá para si companhias
espirituais condizentes com esse pensar, afastando de si mentes doentias e maléficas.
Ele poderá mesmo isolado em seu mundo contemplativo, orar pelos mais necessitados e
disciplinar seus pensamentos, repelindo outros que o induziriam ao mal, resultando
disso um fortalecimento do seu Espírito para embates futuros junto à sociedade, pois de
atmosfera mental saneada, mais facilmente se entregará ao trabalho em oportunidade
próxima. Não seria isso algo positivo, um pequeno mérito, no lugar de nenhum? Essa
vida de contemplação não poderia culminar em uma disciplina, uma espécie de reflexo
condicionado que o ligaria a Deus em futuras situações de conflito? Em caso afirmativo
não seria este um imenso lucro para o Espírito?
Alguém poderá dizer: mas ele orando pela Humanidade está fazendo um bem, o
que não é o caso da pergunta. A pergunta diz apenas que este homem não faz nenhum
mal. A resposta é que diz que ele não faz o bem, induzindo o leitor a pensar que o bem
só se expressa através de meios materiais ou em sociedade. Quem emite um bom
pensamento está ajudando a sanear o clima psíquico do planeta e isso é um bem.
Na verdade, quem pensa em Deus, entra em contemplação, liga-se a uma fonte
eterna de virtudes e, naturalmente, cede ao desejo de expandir a emoção de que é
tomado para toda a Humanidade. As emoções oriundas da oração, da contemplação e da
meditação possuem o caráter distributivo no qual o ser tende a expandir os benefícios
que recebe. Esta é uma característica da fonte inesgotável na qual ele se abastece, escoar
sempre em direção àqueles que a merecem. As energias dessa fonte, atingindo o
solicitante e tocando-o, acabarão por modificá-lo, influenciando-o a socializar o
benefício recebido. É muito difícil compatibilizar a contemplação com o egoísmo e o
orgulho. Existirá alguém que pensa em Deus desejando-o apenas para si? Se é que
existe, esta não é a situação a que se refere o texto em análise. Com tal comentário não
estou aconselhando a que ninguém fique em contemplação, mas que não se generalize,
rotulando de improdutivas, situações que, analisadas a fundo, podem gerar algum fruto.
Teriam sido inúteis os 40 dias em que Jesus se isolou para orar e armazenar forças para
a missão que iria desempenhar? Alguns que se isolam não estarão, igualmente,
armazenando forças e conhecimentos para uma missão futura?

Sugestão: Raramente, porque se eles não fazem o mal, nem sempre fazem o bem e, neste
caso, são inúteis. Aliás, não fazer o bem já é um mal. Deus quer que se pense nele, mas
não quer que se pense apenas nele, visto que deu ao homem deveres a cumprir sobre a
77

Terra. Aquele que se consome na meditação e na contemplação vazias de propósitos


que o eleve, não faz nada de meritório aos olhos de Deus, posto que sua vida é toda
pessoal e inútil à Humanidade e Deus lhe pedirá contas do bem que não haja feito.

Pergunta 661

- Pode-se utilmente pedir a Deus que nos perdoe nossas faltas?

- Deus sabe discernir o bem e o mal: a prece não oculta as faltas. Aquele que pede a
Deus o perdão de suas faltas, não o obtém, senão mudando de conduta. As boas ações
são as melhores preces, porque os atos valem mais que as palavras.

Não é apenas mudando de conduta dali para adiante, ou seja, arrependendo-se do


que praticou. É preciso reparar o mal que haja feito. Deus não concede prêmios ou
castigos, medalhas ou chagas a ninguém. Regula Ele o universo através de leis perfeitas
e imutáveis que se cumprem sem a preocupação de que sejam burladas. Se alguém
pratica algum mal, deve repará-lo através da dor ou do amor, não restando outra
alternativa de quitação para o débito. Deduzimos deste raciocínio que Deus não perdoa,
pois nem mesmo se magoa com nossas fragilidades. Lamenta nossa insensatez,
considera atenuantes e agravantes, vê no fundo da alma a intenção mais que o fato em
si, todavia, cabe-nos reparar o mal que fizemos. Esta é a lei: “a cada um é dado segundo
as suas obras”. Nós é que não nos perdoamos diante de uma agressão à lei e só nos
aquietamos quando a reparamos. Nosso juiz imparcial, a consciência, assim determina.
Portanto, afirmar que Deus perdoa nossas faltas não nos parece correto, apesar de a
oração nos fornecer fortaleza, resignação e certo bem-estar na expiação. O fato de
sinceramente pedir perdão a Deus deve refletir o remorso e a disposição à devida
reparação.
Não nos enganemos quanto ao perdão gratuito, pois ele não existe. Deus não
descumpriria uma lei criada por Ele para nos favorecer. A misericórdia que O
caracteriza é representada pela ajuda que seus emissários nos prestam quando fazemos
por merecer. “Vinde a mim todos vós que estais aflitos e sobrecarregados que eu vos
aliviarei”, disse Jesus. Aliviar o peso da cruz não é o mesmo que retirá-lo. “Renuncie a
si mesmo, tome sua cruz e siga-me”, foi o chamado de Jesus.

Sugestão: A prece não invalida as faltas. Aquele que pede a Deus o perdão de suas
faltas, deve fazê-lo reparando o mal que haja feito e mudando de conduta. Assim ele
mesmo se perdoará através da sensação de alívio e de dever cumprido que sentirá.

Pergunta 664

- É útil orar pelos mortos e pelos Espíritos sofredores e, nesse caso, como nossas preces
podem proporcionar-lhes alívio e abreviar seus sofrimentos? Têm elas o poder de dobrar
a justiça de Deus?

- A prece não pode ter por efeito mudar os desígnios de Deus, mas a alma pela qual se
ora experimenta alívio, porque é um testemunho de interesse que se lhe dá, e o infeliz é
sempre aliviado quando ele encontra almas caridosas que se compadecem de suas
dores. Por outro lado, pela prece, provoca-se o arrependimento e o desejo de fazer o
que for preciso para ser feliz. É nesse sentido que se pode abreviar sua pena, se, por
seu turno, ele ajuda com sua boa vontade. Esse desejo de melhorar-se, excitado pela
78

prece, atrai, antes de Espíritos sofredores, Espíritos melhores que vêm esclarecê-lo,
consolá-lo e dar-lhe a esperança. Jesus orou por todas as ovelhas desgarradas,
mostrando-vos, com isso, que sereis culpados não o fazendo por aqueles que mais
necessitam.

Admitir culpa naquele que não ora pelos mortos e por Espíritos sofredores é dar
status de obrigatoriedade a esse procedimento. Pode-se amar ao próximo sem orar por
ele, estando o mesmo encarnado ou desencarnado? Um homem pode ser honesto, justo
e caridoso sem orar por seus mortos? Aqueles que ainda não entendem o valor da prece
serão igualmente culpados por não orarem? Separando a prece tradicional dos bons
pensamentos que enviamos a nossos mortos, pois a pergunta acima se refere à prece
praticada formalmente, podemos afirmar que existem pessoas caridosas sem o concurso
da oração. Na lista de mandamentos a que chamamos decálogo, regra ideal de conduta
para o ser humano, não consta esta obrigatoriedade.
Não estamos, em nenhum instante, desaprovando a prece, provocando uma
rebelião para que não a pratiquem ou retirando o alto valor que ela tem. Questionamos a
culpa imputada a quem não a movimenta em favor dos mais necessitados. Essa questão
não seria melhor explicada admitindo-se a prece como uma das maneiras de alguém
exercitar a caridade e, portanto, ter mais mérito se comparado a outro que não ora, no
lugar de pesar sobre este uma culpa que soa como uma falta cometida? Não basta ao
homem trabalhar pelos desvalidos, cumprir suas obrigações enquanto cidadão e honrar a
religião que adotou através de uma conduta reta? Deve também orar pelos necessitados
senão será culpado? De quê?
Deus e os Espíritos superiores não são verdugos que nos vigiam a cada passo,
culpando-nos por qualquer deslize. Incentivam-nos ao bem incessantemente, mas não
nos culpam quando as forças nos faltam ou a lucidez ainda é criança em nós. Aquele
que tem a felicidade de praticar algum bem além de suas obrigações rotineiras é
inspirado e amparado para que mais produza, e não culpado pelo que ainda não
conseguiu fazer. Lançar culpa sobre pessoas porque elas não oram pelos semelhantes
pode gerar fanatismo, complexos, rejeições, necessidade de autopunição em Espíritos
ainda imaturos. Pode ainda fomentar o vício de apenas recitar fórmulas decoradas sem
nenhum valor sentimental, com vistas a serenar a consciência que, alertada da
obrigatoriedade da prece pelos necessitados, passe a cobrar uma providência a fim de
resguardar-se da culpa. Somos daqueles que consideram todo bom pensamento ou boa
obra uma prece.

Sugestão: A prece não pode ter por efeito mudar os desígnios de Deus, mas a alma pela
qual se ora experimenta alívio, porque é um testemunho de interesse que se lhe dá, e o
infeliz é sempre aliviado quando ele encontra almas caridosas que se compadecem de
suas dores. Por outro lado, pela prece, provoca-se o arrependimento e o desejo de fazer
o que for preciso para ser feliz. É nesse sentido que se pode abreviar sua pena, se, por
seu turno, ele ajuda com sua boa vontade. Esse desejo de se melhorar, excitado pela
prece, atrai, antes de Espíritos sofredores, Espíritos melhores que vêm esclarecê-lo,
consolá-lo e dar-lhe a esperança. Jesus orou por todas as ovelhas desgarradas,
mostrando-vos, com isso, o exemplo de caridade que deveríeis seguir.

Pergunta 670

- Os sacrifícios humanos feitos com uma intenção piedosa foram, alguma vez,
agradáveis a Deus?
79

- Não, jamais; mas Deus julga a intenção. Os homens, sendo ignorantes, poderiam crer
que faziam um ato louvável imolando um dos seus semelhantes. Nesse caso, a Deus não
interessava senão o pensamento, e não o fato. Melhorando-se os homens, deviam
reconhecer seus erros e reprovar esses sacrifícios, que não deviam mais entrar na idéia
de Espíritos esclarecidos; eu digo esclarecidos porque os Espíritos estavam então
envolvidos por um véu material. Mas, pelo livre-arbítrio, eles poderiam ter uma
percepção de sua origem e de seu fim, e muitos compreendiam já, por intuição, o mal
que faziam, embora não o fizessem menos para satisfazerem suas paixões.

Não é aconselhável dizer que, na questão dos sacrifícios humanos, interessava a


Deus somente o pensamento. Na ocorrência de um assassinato há sempre um prejuízo
para alguém e acredito que Deus não se contenta com isso. Se Ele escolheu como um
dos seus mandamentos “não matar”, foi por valorizar e defender ardorosamente a vida
humana, seu maior investimento em toda a criação. E se os homens agiam
contrariamente a este mandamento por estarem ainda no estado de ignorância, não seria
o livre-arbítrio que lhes daria a percepção do erro, mas a intuição da existência de uma
lei cuja essência é a defesa intransigente da vida, inscrita na consciência. Grandioso
lema amai-vos e instrui-vos, que liberta o Espírito da ignorância e o coloca nas trilhas
traçadas por Deus, para o correto caminhar de seus filhos.

Sugestão: Não, jamais; mas Deus julga a intenção. Os homens, sendo ignorantes,
poderiam crer que faziam um ato louvável imolando um dos seus semelhantes.
Melhorando-se eles chegariam ao ponto de reconhecer seus erros e reprovar esses
sacrifícios, que não deveriam mais entrar na idéia de Espíritos esclarecidos; eu digo
esclarecidos porque os Espíritos estavam então envolvidos por um véu material. Mas,
pela evolução do pensamento, eles poderiam ter uma percepção de sua origem e de seu
fim, e muitos compreendiam já, por intuição, o mal que faziam, embora não o fizessem
menos para satisfazerem suas paixões.

Pergunta 676

- Por que o trabalho é imposto ao homem?

- É uma conseqüência de sua natureza corporal. É uma expiação e, ao mesmo tempo,


um meio de aperfeiçoar sua inteligência. Sem o trabalho, o homem permaneceria na
infância da inteligência. Por isso ele não deve seu sustento, sua segurança e seu bem-
estar senão ao seu trabalho e à sua atividade. Àquele que é muito fraco de corpo, Deus
deu a inteligência para isso suprir; mas é sempre um trabalho.

Nem sempre aquele que é muito fraco de corpo pode manifestar a inteligência
para suprir suas necessidades. Essa questão, atrelada à Lei de Causa e Efeito, nos mostra
centenas de casos em que o homem deve enfrentar a fraqueza do seu corpo e o mau
desempenho de seu cérebro, tornando-se um peso para a sociedade devido suas más
ações praticadas em encarnações passadas. A questão não se refere ao carma, dirão
alguns. Mas, excetuando-se esse importante detalhe, temos que a inteligência não é dada
a alguém pela fragilidade do seu corpo ou por outro motivo qualquer. Ela é uma
conquista pessoal e intransferível do Espírito a ser efetuada através dos milênios. Como
temos insistido, Deus não doa gratuitamente as virtudes que nos cabem conquistar.
80

Sugestão: É uma conseqüência de sua natureza corporal. É uma expiação e, ao mesmo


tempo, um meio de aperfeiçoar sua inteligência. Sem o trabalho, o homem
permaneceria na infância da inteligência. Por isso ele não deve seu sustento, sua
segurança e seu bem-estar senão ao seu trabalho e à sua atividade. Aquele que é muito
fraco de corpo deve efetuar um trabalho compatível com suas forças e inteligência; mas
é sempre um trabalho. Caso nada possa realizar sua família ou a sociedade deve velar
por ele.

Pergunta 744

- Qual foi o objetivo da providência, tornando a guerra necessária?

- A liberdade e o progresso.

Tanto a pergunta quanto a resposta, segundo minha ótica, estão absolutamente


corretas. Todavia, alguns espíritas consideram que a guerra nunca é necessária e que a
providência jamais a aprovaria considerando-a necessária. Quem se der ao trabalho de
estudar um pouco da história e da evolução do planeta Terra verá que centenas de
usurpadores dos direitos naturais dos povos instalaram verdadeiros regimes de terror
para subjugá-los. Tais Espíritos endurecidos ainda estariam vampirizando populações
inteiras, se estas não tivessem praticado uma reação de defesa no sentido de expulsá-los.
A liberdade é um direito natural e o homem tem o dever de lutar por ela. Que
inicialmente tente o diálogo. Não ouvido, busque outras formas de persuasão. Em nome
desse direito, a liberdade, milhares de pessoas deram a vida em campos de batalha.
Para os que acham a guerra contra os que procuram bloquear a liberdade e o
progresso uma violência, mas que geralmente se voltam agressivamente contra quem
lhe pisa no calo de estimação, indagamos: como os bons Espíritos fazem o resgate de
um prisioneiro em uma região trevosa? Armam-se de flores e após beijá-las as lançam
contra aqueles que querem fulminá-los? As colônias espirituais, a exemplo de Nosso
Lar e outras, possuem ou não, baterias elétricas e pesado armamento bélico para se
defenderem da sanha dos Espíritos violentos e perturbadores? Nas reuniões de
desobsessão, quando o doutor Bezerra de Menezes necessita falar com um obsessor que
está prejudicando dezenas de pessoas, manda um convite formal em papel dourado ou
milicianos que o trazem manietado, caso ele se recuse a comparecer a entrevista? Os
desastres naturais, tais como a explosão de um vulcão que mata vinte e cinco mil
pessoas (Nevado Del Ruiz na Colômbia em novembro de 1985) têm ou não a aprovação
de Deus? Dirá o pacifista que Deus é impiedoso? A erupção de um vulcão dessa
natureza não equivale à explosão de uma bomba de grande potência em meio a uma
população indefesa?
Não bastam mil anos de trevas impostos pela Idade Média? Quem não lembra o
que fizeram a Sócrates, Giordano Bruno, Galileu e tantos outros cujo pecado que
cometeram foi à defesa da verdade? Nossa visão acanhada não é capaz de perceber o
resultado do conjunto, em termos de progresso, para os Espíritos envolvidos no
contexto em que se insere o evento. Talvez por isso discordemos da resposta dada pelos
Espíritos a esta pergunta.

Pergunta 751
81

- Como se explica que, entre certos povos já avançados do ponto de vista intelectual, o
infanticídio esteja nos costumes e consagrado pela legislação?

- O desenvolvimento intelectual não leva à necessidade do bem. O Espírito, superior em


inteligência, pode ser mau. É aquele que tem vivido muito, sem se melhorar: ele sabe.

O desenvolvimento intelectual, ou seja, a instrução, sendo uma das asas do


progresso espiritual, acaba por induzir o Espírito à modelação da outra, o amor, já que é
aspiração íntima e última de todos, o desejo de se liberar dos pesados grilhões com o
qual a ignorância e a dor os aprisionam. Não é correto afirmar que o ser intelectualizado
seja, ao mesmo tempo, moralizado. Mas podemos argumentar que o desenvolvimento
do intelecto tende a arrastar o Espírito para a zona de acertos, devido ao alargamento da
percepção, que resulta do crescimento da sua inteligência, fato que o capacita a
distinguir melhor as forças positivas e negativas que o cercam, abrindo um leque de
opções à sua escolha.
Assim sendo, podemos afirmar que o progresso intelectual influencia no
progresso moral. Vejamos como os Espíritos responderam a Kardec sobre este tema:
pergunta 780: “O progresso moral segue sempre o progresso intelectual? – Ele lhe é
conseqüência, todavia, não o segue sempre imediatamente”. Pergunta 780-a: “Como o
progresso intelectual pode conduzir ao progresso moral? – fazendo compreender o bem
e o mal; o homem, então, pode escolher. O desenvolvimento do livre arbítrio segue o
desenvolvimento da inteligência e aumenta a responsabilidade dos atos”. Ora, sendo o
progresso moral, que traz consigo a necessidade do bem, uma conseqüência do
progresso intelectual, segue-se daí que o intelecto tem bastante influência sobre a moral
e vice-versa. Não foi à toa que o Espírito de verdade aconselhou: “Espíritas! Amai-vos e
instrui-vos”.
Com o avanço do intelecto, o Espírito não age mais unicamente pelo instinto.
Seus sentidos, antes embrutecidos, passam a perceber que existem leis que regulam os
acontecimentos da vida e que dentre as ações que pratica, algumas lhe dão prazer e
outras lhe trazem sofrimento. Selecionando atitudes, entendendo melhor a si e à
natureza, tem oportunidade de agir conforme as leis que vem assimilando, ao mesmo
tempo em que sua consciência, esclarecida pelo intelecto, exerce maior poder de pressão
sobre seus atos, fazendo o prato da balança pender para a aludida zona de acertos. Não
restam dúvidas, portanto, de que o avanço intelectual tende a arrastar o Espírito para o
progresso moral.

Sugestão: O desenvolvimento intelectual nem sempre caminha ao lado da necessidade


do bem. O Espírito, superior em inteligência, pode ser temporariamente mau. É aquele
que tem vivido muito, sem se melhorar.

Pergunta 815

- Qual das duas provas é a mais terrível para o homem, a da infelicidade ou a da


fortuna?

- Tanto uma como outra, o são. A miséria provoca o murmúrio contra a Providência e
a riqueza leva a todos os excessos.

Uma coisa é ou não é. Se existe meio termo devemos dizê-lo. Quando afirmo:
café produz azia, generalizo. Se ele produz azia a uns e a outros não, devo fazer uma
82

ressalva. É certo que em nenhum instante os Espíritos disseram que a miséria sempre
provoca murmúrio e que a riqueza sempre leva a todos os excessos. Mas também é
correto dizer que nesta resposta em nenhum momento eles fizeram tais ressalvas. As
pessoas versadas no Espiritismo podem dizer: isso está implícito. Para tais pessoas;
volto a lembrar que os iniciantes na Doutrina precisam de idéias justas, como disse
Kardec em Obras Póstumas: “Com precisão e clareza, sem nada deixar no vago”.
Murmúrio e excessos a depender do Espírito testado. Um personagem bem
conhecido da Bíblia, Jó, parece um bom exemplo de vitória nos dois casos. O caráter de
uma prova é o de testar o aprendiz em determinada área de conhecimento no que ele
pode sair vitorioso ou derrotado da avaliação a que se submete. Sabe-se que a
infelicidade pode levar à rebeldia ou à lamentação, mas que também pode ser enfrentada
com bravura e resignação saindo, neste caso, o Espírito da peleja em que se envolveu
com méritos incorporados ao seu patrimônio evolutivo. O mesmo raciocínio vale para a
riqueza, pois tanto há ricos generosos quanto pobres orgulhosos e mesquinhos.
Nesse campo, o das virtudes, tudo depende da vontade de superar, da fé em si e
em Deus que cada ser nutre, diante dos obstáculos postos à sua frente.

Sugestão: Tanto uma como outra, o são. Todavia, apesar de a miséria poder levar ao
murmúrio contra a Providência e a riqueza induzir a todos os excessos, não significa
que aquele que passa por uma ou por outra prova citadas esteja condenado ao
fracasso.

Pergunta 818

- De onde se origina a inferioridade moral da mulher em certos países?

- Do império injusto e cruel que o homem tomou sobre ela. É um resultado das
instituições sociais e do abuso da força sobre a fraqueza. Entre os homens pouco
avançados do ponto de vista moral, a força faz o direito.

A inferioridade moral, bem como a superioridade, representam estágios


evolutivos próprios de qualquer Espírito, exteriorizado através de ações e
pensamentos, facilmente aferidos pelos resultados que geram. Portanto, a inferioridade
moral da mulher não poderia ser gerada ou imposta, nem pela sociedade, nem por um
indivíduo, através do seu comando autoritário, mas pelo procedimento dela frente ao
tratamento que lhe é destinado. A inferioridade moral é o resultado de uma postura
frente à vida, de uma imaturidade do senso moral, ainda em construção.
Mas será que Kardec, na questão em análise, referiu-se ao tratamento desigual e
descaridoso dedicado à mulher por aqueles que deveriam auxiliá-la em sua aparente
fragilidade, ou as mulheres apontadas por ele, não sendo reconhecidas como indivíduos,
só poderiam ser produto do meio? Prefiro acreditar no primeiro caso, pois contra o
segundo, a agressividade do meio, se opõe a afirmativa de que ninguém nasce sem uma
programação para o período reencarnatório, sendo a mesma exeqüível caso o
reencarnante se empenhe em realizá-la, já que a cruz que cada um traz nunca ultrapassa
o limite de suas forças. Não há como negar que o meio influencia bastante no
comportamento do indivíduo e de que isso será levado em conta como atenuante ou
agravante para os seus débitos. Todavia, ninguém nasce sem um preparo adequado para
resistir às tentações e às agressões do meio aonde veio habitar. Nas favelas onde o
tráfico de drogas é banal a esmagadora maioria dos habitantes é honesta e desaprova a
violência dos traficantes.
83

Nota-se que no primeiro caso, a inferioridade moral fica mais evidente naquele
que pratica a ação, o homem, do que naquela que a sofre, a mulher.
Argumentamos, igualmente, que em muitos relacionamentos sociais ou
conjugais, a mulher é um Espírito cuja superioridade moral ultrapassa ao homem que,
despoticamente a comanda, quando melhor seria para ele ser comandado por ela.
Resumindo: Os termos, inferioridade moral, não me parecem condizentes com a
resposta dada pelos Espíritos, portanto, a sugestão é apenas para a pergunta.

Sugestão: De onde se origina o tratamento inferior dedicado à mulher em certos países?

Pergunta 819

- Com que objetivo a mulher é fisicamente mais fraca que o homem?

- Para lhe assinalar funções particulares. O homem é para os trabalhos rudes, por ser
o mais forte; a mulher para os trabalhos suaves, e todos os dois para se entreajudarem
nas provas de uma vida plena de amargura.

Ser fisicamente mais fraca não implica na não realização de trabalhos rudes e
estafantes. Atualmente a mulher compete com o homem de igual para igual em todos os
campos de trabalho, mesmo nos mais pesados. Grande parcela das sertanejas
nordestinas passa todo o dia no roçado, ao lado do marido, tratando a terra com a
enxada, e quando volta para casa ainda têm que fazer a comida. Se a mulher é para os
trabalhos suaves a necessidade a vem preparando para os mais rudes testes de
resistência física. A noção de superioridade física, de fortaleza atribuída ao homem já é
contestada no enfrentamento de soluções que exigem sacrifício e renúncia, onde as
mulheres se saem melhor.
Nesse campo é digno de nota o esforço e exemplo das impropriamente chamadas
de mães solteiras, cujos maridos fogem à obrigação de ajudar na criação dos filhos,
deixando-as sozinhas com o pesado fardo. Como dizia Chico Xavier, a mãe nunca
abandona os filhos e aquela que o faz, é caso patológico.
Não percamos de vista que há um Espírito por trás da roupagem masculina ou
feminina e que para ele, um corpo aparentemente frágil nem sempre é obstáculo às
realizações que pretende concretizar. Se no campo da delicadeza o homem pode se
exercitar, sendo carinhoso, compreensivo e terno, a mulher pode a ele igualar-se em
força através do esforço e da vontade. Não nos esqueçamos de que Jesus era conhecido
como o meigo e doce rabi da Galiléia e de que Madre Teresa de Calcutá passou toda a
sua vida em trabalho estafante, que a grande maioria dos homens não suportaria.
Acredito que não cabe generalização nesse tema, pois existem mulheres com mais força
física que homens e, logicamente, homens com mais força física que mulheres. Na
minha terra, O Ceará, as mulheres fazem prédios (pedreiras e serventes de pedreiras),
quebram pedras com maretas para calçar ruas, dirigem caminhões, realizando tarefas
antes exclusivas apenas de homens.

Sugestão para a pergunta: Com que objetivo a mulher possui a aparência mais frágil que
o homem?

Sugestão para a resposta: Para lhe assinalar funções particulares. Na divisão de


trabalho, o homem opta por trabalhos rudes, por considerar-se o mais forte; à mulher
são destinados os trabalhos suaves, o que não implica que, tanto um quanto o outro,
84

não possam se exercitar em qualquer trabalho. Feita a partilha os dois devem se


entreajudarem nas provas que a vida lhes apresenta.

Pergunta 928

- Pela especialidade das aptidões naturais, Deus indica evidentemente nossa vocação
neste mundo. Muitos dos males não decorrem do fato de não seguirmos essa vocação?

- É verdade, e, freqüentemente, são os pais que, por orgulho ou avareza, fazem seus
filhos saírem do caminho traçado pela natureza e, por esse deslocamento,
comprometem sua felicidade. Eles serão responsáveis.

É natural e lógico que cada pessoa siga suas aptidões naturais, tal como aquele
que é treinado no cálculo torne-se um matemático ou um engenheiro. Todavia, é
também digno de observação, sob pena dessa pessoa ficar parada em uma face do
conhecimento geral, justamente aquela em que é mais hábil, que ela precisa ser treinada
em outras habilidades, expandindo assim sua área de conhecimento, o que não implica
em fracasso intelectual ou profissional no campo de atuação escolhido.
Nesses tempos de globalização e de Neoliberalismo onde o subemprego e o
desemprego rondam as portas da juventude, é muito difícil obedecer à especificidade
das aptidões naturais. Na minha atuação de professor, vejo mais em meus alunos a
busca por profissões mais rendosas ou em maior oferta no mercado de trabalho. A
esmagadora maioria, de pré-vestibulandos com os quais convivo não sabe qual é a sua
vocação, nem está interessada em sabê-la. Muitos deles temem ingressar em uma
profissão cuja saturação no mercado de trabalho não lhes permita um emprego
garantido, retrato da realidade atual, resultando disso o ingresso em subempregos fora
da sua especialização, o que é pior, para alguns, do que o deslocamento aludido na
resposta.
O problema econômico e social da atualidade, no qual a maioria dos indivíduos
está sempre sem tempo na luta pela sobrevivência, nos leva a refletir que as vocações,
quando não rendem bom dinheiro, para muitos que as identificam em si, podem ser
praticadas muito mais por hobby quando o tempo lhes permitirem, que como profissão.
Ainda quanto às vocações, não é tão fácil descobri-las, por isso muitos jovens se
confundem e se questionam a respeito de as possuírem ou não. Conversando certa feita
com meus alunos sobre este tema, ocasião em que alguns disseram o que pretendiam
ser, muito mais pelo dinheiro que pelo prazer de executarem uma tarefa, ouvi a jocosa
observação de um deles que me fez rir da sua franqueza: professor, disse-me ele, o
senhor notou que aqui só tem futuros médicos, engenheiros, advogados e nenhum
padeiro, pedreiro ou sapateiro? Não existem vocações para as tarefas mais humildes?
O maior de todos os engenheiros siderais que veio a este planeta foi um carpinteiro,
respondi, sem deixá-lo convencido da sinceridade de seus colegas.

Sugestão: É verdade que isso possa ocorrer. Todavia, é preciso observar também que
existe para o Espírito a necessidade de diversificar seus conhecimentos, bem como as
exigências das leis que regulam o mercado de trabalho. Mas, se ocorrer prejuízo para
o filho devido à influência dos pais, que com seu orgulho ou avareza, contribuíram
para que ele saísse do caminho traçado pela natureza, eles serão responsabilizados.

Pergunta 940
85

- A falta de simpatia entre os seres destinados a viverem juntos, não é igualmente uma
fonte de desgostos tanto mais amarga quanto envenena toda a existência?

- Muito amargas, com efeito. Mas é uma dessas infelicidades das quais,
freqüentemente, sois a primeira causa. Primeiro, são vossas leis que são erradas. Por
que crês que Deus te constrange a ficar com aqueles que te descontentam? Aliás,
nessas uniões, freqüentemente, procurais mais a satisfação do vosso orgulho e da
vossa ambição, do que a felicidade de uma afeição mútua; suportareis, nesse caso, a
conseqüência dos vossos preconceitos.

a) - Mas, nesse caso, não há quase sempre uma vítima inocente?

- Sim, e é para ela uma dura expiação; mas a responsabilidade de sua infelicidade
recairá sobre aqueles que lhe foram a causa. Se a luz da verdade penetrou sua alma,
ela terá sua consolação em sua fé no futuro. De resto, à medida que os preconceitos se
enfraquecem, as causas de suas infelicidades íntimas desaparecerão também.

Se a vítima é inocente nada há para expiar. Trata-se, pois, de uma prova e não de
uma expiação. O caráter da prova é testar o Espírito, que se eleva ao vencê-la. Na
expiação pressupõe-se um débito que, necessariamente, deve ser resgatado. Verifica-se
nela o caráter da obrigatoriedade nem sempre existente na prova.

Sugestão para a segunda parte da resposta: Sim, e é para ela uma dura prova; mas a
responsabilidade de sua infelicidade recairá sobre aqueles que lhe foram a causa. Se a
luz da verdade penetrou sua alma, ela terá sua consolação em sua fé no futuro. De
resto, à medida que os preconceitos se enfraquecem, as causas de suas infelicidades
íntimas desaparecerão também.

Pergunta 945

- Que pensar do suicídio que tem por causa o desgosto da vida?

- Insensatos! Por que não trabalhavam? A existência não lhes seria uma carga!

O desgosto da vida pode ter muitas origens, sem ser, contudo, fruto da
ociosidade. Pode ser, inclusive, gerado pelo excesso de trabalho mal remunerado, que
impõe ao trabalhador uma vida cheia de humilhações e de necessidades. Note o leitor
que citamos uma causa oposta à registrada na resposta em análise. Outra causa de
desgosto e de depressão pode ser o remorso, com ou sem motivos aparentes, gerado por
fatos desta ou de outras encarnações. Podem ser levadas em conta as doenças terminais,
os dramas íntimos e inconfessáveis que destroem a alegria de viver.
Aconselha a medicina e, muito mais a providência divina, a que se análise certos
casos de “desgosto pela vida” sob a ótica da patologia, ou seja, veja-se o depressivo
como um enfermo da alma e não como um preguiçoso que prefere morrer a trabalhar.
Em casos dessa natureza, é difícil averiguar as causas reais da tristeza que se abateu
sobre o Espírito e um pouco de caridade no trato da questão é muito mais sábio e
prudente do que um julgamento precipitado.

Sugestão: Há de se averiguar as causas com as devidas reservas para não incorrer em


prejulgamentos. Contudo, o suicídio, independente da causa, é sempre um fato
86

lamentável e digno de misericórdia, de vez que por motivos, às vezes, conhecidos


apenas pela vítima, a condena ao despenhadeiro da dor.

Pergunta 956

- Os que, não podendo suportar a perda de pessoas que lhe são queridas, se matam na
esperança de reencontrá-las, atingem seu objetivo?

- O resultado para eles, é diferente do que esperam, e em lugar de estar reunido ao


objeto de sua afeição, eles dele se distanciam por maior tempo, porque Deus não pode
compensar um ato de covardia e o insulto que lhe é feito, duvidando de sua
providência. Eles pagarão esse instante de loucura por desgostos maiores que aqueles
que acreditavam abreviar e não terão para compensá-los a satisfação que esperavam.

Considero muito rigorosa e até com certo tom vingativo a linguagem atribuída
ao gesto, como diz a resposta, de loucura do suicida: “Deus não pode recompensar um
ato de covardia e o insulto que lhe é feito duvidando de sua providência”. Quis mesmo
o suicida insultar a Deus? Foi um covarde ou um louco alucinado pela dor?
Se no instante em que ele cometeu o suicídio estivesse louco o crime não lhe
seria imputado, pois o louco que se mata não sabe o que faz. (O suicídio não é sempre
voluntário? - O louco que se mata não sabe o que faz. Pergunta 944-a de O Livro dos
Espíritos).
Deus não se ofende nem se sente insultado com as nossas fraquezas. Antes, delas
se apieda e, como previsto em Sua lei, em seu tempo, proporciona alívio e atendimento
ao filho que se transviou. Que se coloque o julgador do ato no lugar da vítima que
perdeu seu único filho, a quem destinava todos os cuidados, razão maior de sua vida, e
que, num instante de loucura, tenta ir ao seu encontro através da morte. Essa pessoa
deve ser rotulada de covarde e receber no rosto a acusação de que insultou o seu
Criador?
O sofrimento que ela sente já não é bastante para embrutecê-la? Por que lhe
adicionar um pouco mais de fel ao já sorvido, lançando-lhe no rosto palavras ásperas?
Insistentemente tenho dito que Deus não é carrasco nem sádico que sente prazer em nos
vigiar e punir quando nos equivocamos.
Estudemos o contexto, a cultura do país em que se deu o suicídio, a educação
que a vítima recebeu, a influência do meio sobre ela, a situação psicológica que
atravessava. Averiguemos se o auxílio de que necessitava não lhe foi negado e tantas
outras variáveis que alfinetavam sua alma no crucial instante, e assim, certamente, nossa
linguagem será mais moderada para com a dor alheia. Certamente que o suicídio é uma
transgressão da lei divina e não estamos aqui a justificá-lo, mas como ocorre em todos
os crimes, há atenuantes e agravantes.

Sugestão: O resultado para eles é diferente do que esperam, e em lugar de estarem


reunidos ao objeto de sua afeição, dele se distanciam por maior tempo. Esse tempo,
eivado de grandes dores, é para eles o quinhão que a vida reserva a quem dela tenta
evadir-se pelas portas da morte.

Pergunta 958

- Por que o homem tem, instintivamente, horror ao nada?


87

- Porque o nada não existe.

Não podemos ter horror ao nada justamente porque o nada não existe. Digamos
antes, horror ao desconhecido. Tememos o desconhecido porque sobre ele paira a
incerteza que nos desconforta e nos torna ansiosos e cismarentos. No desconhecido
existe a possibilidade de sofrimento, mas como não sabemos o gênero desse sofrimento,
não temos como arquitetar um mecanismo de defesa e isso nos fragiliza, tornando-nos
vulneráveis.
É essa ausência de conhecimento, esse vácuo mental que nos faz temerosos.
Nisso o Espiritismo é de grande valia ao revelar as relações existentes entre o mundo
material e o mundo espiritual.

Sugestão: Porque o nada não existe. Instintivamente ele sabe que deve haver algo após
a morte. É o desconhecimento que o amedronta.

Pergunta 977

- Os Espíritos, não podendo esconder reciprocamente seus pensamentos, e todos os atos


da vida sendo conhecidos, seguir-se-á que o culpado está na presença perpétua de sua
vítima?

- Isso não pode ser de outro modo, o bom senso o diz.

a) - Essa divulgação de todos os nossos atos repreensíveis e a presença perpétua


daqueles que lhe foram vítimas são um castigo para o culpado?

- Maior do que se pensa, mas somente até que ele tenha expiado suas faltas, seja como
Espírito, seja como homem, nas novas existências corporais.

Não são todos os Espíritos que podem ler pensamentos. Isso é uma conseqüência
da evolução do senso moral-intelectual de cada um. Atentemos para a sutileza da
resposta que faz alusão, não a vítima em si, mas à sua existência no pensamento do
algoz. Se a vítima, além da agressão sofrida, tivesse que permanecer continuamente
junto do seu algoz, teria duplo prejuízo, o que é inadmissível. Isso pode acontecer em
casos de vingança, quando a vítima parte para o revide. Contudo, há os que perdoam e
seguem em frente.
O que ocorre, freqüentemente, é que o Espírito culpado cristaliza o seu
pensamento no ato criminoso que cometeu, formando assim clichês que se refletem no
ambiente como em um filme, fazendo-o acreditar que suas vítimas estão ali presentes.
Tais cenas, plasmadas por sua própria mente, representam as testemunhas que o
acusam, na realidade um fenômeno de ideoplastia refletindo a culpa, o remorso, a
acusação que ele faz a si mesmo, e isso é o seu suplício.

Sugestão 977-a: Isso não pode ser de outro modo, já que a vítima passou a habitar seus
pensamentos torturados.

Sem comentários ( capítulo em aberto)


88

Neste capítulo colocaremos questões que, em alguns casos, deixam dúvidas no


leitor devido à inadequação de uma ou mais palavras que não dão precisão ou coerência
ao texto.
Por não exigirem, na maioria das vezes, a profundidade das questões iniciais já
discutidas, permitindo que o leitor conclua e absorva o raciocínio por si mesmo quando
já tenha certa dose de conhecimentos acerca da Doutrina, não faremos um comentário
para cada uma delas. A parte a ser modificada estará em negrito, bem como a sugestão,
exposta logo abaixo.

Pergunta 59: Considerações e concordâncias bíblicas referentes à criação: parágrafo: ...


supondo-se que os outros não o fossem , mas que, nesse curto intervalo a espécie
humana pudesse se elevar da ignorância absoluta do estado primitivo, ao mais alto
grau de desenvolvimento intelectual, o que é contrário a todas as leis antropológicas.

Sugestão: Ao estágio intelectual então alcançado.

Pergunta 70

- Em que resultam a matéria e o princípio vital dos seres orgânicos, quando estes
morrem?

- A matéria inerte se decompõe e toma nova forma; o princípio vital retorna à massa.

Sugestão: fonte universal.

Pergunta 72-a

- Poder-se-ia dizer que cada ser toma uma porção de inteligência da fonte universal e a
assimila, como toma e assimila o princípio da vida material?

- Isso não é mais que uma comparação e que não é exata, porque a inteligência é uma
faculdade própria de cada ser, e constitui sua individualidade moral. De resto, como
sabeis, há coisas que não é dado ao homem penetrar e esta é desse número, no
momento.

Sugestão: retirar a palavra, moral.

Pergunta 99

- Os Espíritos de terceira ordem são, todo eles, essencialmente maus?

- ... A primeira, enfim, compreende os Espíritos puros, aqueles que alcançaram o


supremo grau da perfeição.

Sugestão: determinado grau de perfeição que lhes permite atuar como co-
criadores, auxiliares diretos na manutenção da ordem e da harmonia universais,
daquele que detém o supremo grau de perfeição, Deus. Entendemos que o supremo
grau de perfeição cabe apenas a Deus e que não existe um limite para a aprendizagem
do Espírito. Nesse ponto podemos dizer que a evolução é infinita.
89

Pergunta 103

- Nona classe. Espíritos levianos. ... Nas comunicações com os homens sua linguagem é
algumas vezes espiritual e engraçada...

Sugestão: espirituosa no lugar de espiritual

Pergunta 194

- A alma de um homem de bem pode, em uma nova encarnação, animar o corpo de um


homem perverso?

Sugestão: Um bom Espírito, ao encarnar, pode vir a se tornar um homem


perverso?

- A alma de um homem perverso pode vir a ser a de um homem de bem?

Sugestão: Um Espírito perverso pode vir a ser um homem de bem?

Pergunta 224 a

- Qual pode será duração desses intervalos?

- De algumas horas a alguns milhares de séculos...

Pergunta 230

- O Espírito progride no estado errante?

- Ele pode melhorar-se muito, sempre segundo a sua vontade e seu desejo; mas é na
existência corporal que ele põe em prática as novas idéias que adquiriu.

Que me desculpe o leitor, mas não resisto a um comentário neste caso. Juntemos as duas
perguntas e respostas acima, 224 a e 230, e veremos quão complicado fica para o
Espírito errante (aquele que ainda precisar encarnar) passar milhares de séculos para
aplicar na prática o que aprendeu. Se tal situação existe deveria ser exposta como
exceção, sempre enfatizando que a lei do progresso, através de suas exigências, empurra
a todos para a frente e para o alto, ou seja, para a aprendizagem e para o amor.

...

* Este capítulo está em seus estudos finais. Dê sua sugestão. Ele é necessário?
90

Comentários do autor

Kardec era adepto da abiogênese?

No ano de 1857, data da publicação de O Livro dos Espíritos, era grande a


disputa cientifica entre os adeptos da biogênese e da abiogênese. A primeira afirmava:
um ser vivo não nasce espontaneamente, mas somente pela união das células
reprodutoras de um casal da mesma espécie através da reprodução. A segunda garantia:
os seres vivos nascem espontaneamente, sem a necessidade de um casal prévio para
acasalar, desde que sejam obedecidas determinadas condições.
A hipótese da geração espontânea, ou abiogênese, foi muito defendida entre os
antigos povos da China, da Índia e do Egito, tendo sido divulgada por Aristóteles que,
com sua autoridade científica, a fez chegar com crédito ao século XIX, quando
finalmente foi soterrada.
O médico belga Jean Baptista Helmont, no século XVII, chegou a ponto de
elaborar uma receita para produzir ratos através da abiogênese: “coloca-se, num canto
sossegado e pouco iluminado, camisas sujas. Sobre elas espalham-se grãos de trigo, e o
resultado será que, em 21 dias, surgirão ratos”.
Apesar de ardorosamente defendida, a abiogênese não resistiu às investidas de
Redi, Spallanzani e Pasteur. Após a difusão do método experimental pela ciência, o
italiano Francesco Redi, aproveitando uma das principais evidências da abiogênese, o
“aparecimento espontâneo” de “vermes” em carne podre, fez a seguinte experiência:
colocou alguns vermes retirados de material em putrefação, em ambiente fechado para
observação. Passados alguns dias, notou que eles se transformavam em pequenos
casulos ovóides. Posteriormente, tais casulos se romperam e de cada um deles saiu uma
mosca, semelhante às que são vistas diariamente nos açougues sobrevoando a carne.
Com tal experiência, Redi concluiu que os vermes que surgiam na carne em putrefação
eram apenas larvas, um estágio do ciclo de vida das moscas.
Convencido de que sua hipótese era verdadeira, colocou pedaços de carne em
frascos de boca larga, deixando alguns deles abertos e fechando os demais com gaze.
Nos frascos abertos, onde as moscas tinham pousado, depois de alguns dias surgiram
larvas, e nos fechados, onde as moscas não tiveram acesso, não apareceu nenhuma
larva. Sua conclusão foi óbvia: as larvas presentes na carne em putrefação se
desenvolveram a partir de ovos de moscas e não pela transformação da carne, como
afirmavam os seguidores da geração espontânea.
Todavia, a abiogênese apenas fora ferida, mas não morta. Em meio à contenda
surge Antonie van Leeuwenhoek que, através de um microscópio fabricado por ele,
descobriu a existência dos micróbios, seres pequenos o bastante para permanecerem
ignorados sem o auxílio de uma possante lente de aumento. A descoberta dos micróbios
fortaleceu a abiogênese, pois boa parte dos cientistas da época não acreditou que seres
tão pequenos pudessem se reproduzir.
Como passo seguinte, o francês Louis Joblot resolveu entrar em cena em 1711
fervendo um caldo nutritivo preparado à base de carne e repartindo-o entre duas séries
de frascos devidamente higienizados. Deixou metade deles abertos e a outra metade
cobriu cuidadosamente com pergaminhos. Após alguns dias, os frascos abertos estavam
repletos de micróbios e os fechados continuavam inalterados. Anunciou então que os
micróbios existiam no ar e que não surgiam espontaneamente da matéria inanimada,
como o caldo que preparara.
91

Em 1745, o naturalista inglês John Needhan publicou um livro descrevendo uma


experiência que fizera, cujo resultado mostrava-se favorável à geração espontânea. Tal
cientista colocou caldo nutritivo em diversos frascos, fervendo-os por 30 minutos e
arrolhando-os em seguida. Dias depois os caldos estavam repletos de micróbios.
Afirmando que a fervura tinha matado todos os micróbios existentes eventualmente no
caldo e que nenhum ser vivo poderia ter penetrado através das rolhas, Needhan deu
como certa, para os microrganismos lá existentes, a geração espontânea.
Em resposta a Spallanzani, Needhan disse que a fervura demasiada destruía a
força vital, um princípio inerente à vida que deveria existir no caldo. Aproveitando a
polêmica e dela retirando proveito, François Appert teve a idéia de guardar alimentos
fervidos e cozidos sob vedação hermética sem se estragar. Com isso inventou a
indústria de enlatados.
Com certo avanço a favor da abiogênese, construiu-se o conceito de que o
aquecimento de caldos nutritivos e a sua vedação impediam a proliferação de micróbios
porque excluía o oxigênio, gás essencialmente necessário à geração de qualquer forma
de vida.
Em 1860, quando já estava nas livrarias a primeira edição de O Livro dos
Espíritos, a Academia Francesa de Ciências ofereceu um prêmio para quem realizasse
um experimento que acabasse em definitivo com aquela guerra de hipóteses.
Pasteur, entrando no cenário das discussões, ferveu frascos de vidro contendo
caldos nutritivos e derreteu seus gargalos no fogo, de modo a fechá-los por inteiro. Os
frascos foram levados até grandes altitudes, nos Alpes, onde foram abertos para que o
caldo entrasse em contato com o ar das montanhas. Em seguida, os gargalos dos frascos
foram novamente derretidos e fechados. De volta ao laboratório, Pasteur verificou que
apenas um dos vinte frascos abertos nas montanhas estava contaminado. Com esse
experimento ele provou apenas que o ar das montanhas era menos contaminado que o
da cidade, pois ao quebrar o gargalo de alguns frascos e expô-los por alguns minutos
perante os membros da Academia, vedando-os novamente, estes se mostraram
contaminados após três dias.
Contudo, a Academia não se convenceu por completo a favor da biogênese e
exigiu mais provas, partindo Pasteur para novos experimentos. Desta feita preparou
quatro frascos de vidros contendo caldos nutritivos e amoleceu seus gargalos no fogo,
esticando-os de modo a que se assemelhassem a um pescoço de cisne. Em seguida
ferveu os caldos até que saísse vapor pela extremidade do gargalo. À medida que os
frascos esfriavam, o ar do exterior penetrava pelo gargalo. Partículas suspensas no ar
podiam ser observadas retidas no pescoço dos vasos, que funcionava como um filtro
para o ar. Nenhum frasco se apresentou contaminado após alguns dias. Não era,
portanto, a falta de ar fresco que impedia a proliferação de microrganismos, de vez que
o oxigênio passava livremente pelo gargalo encurvado, sendo a conclusão lógica a de
que os micróbios estavam no ar e que nada se forma espontaneamente. Com esta
experiência, Pasteur explodiu de vez a geração espontânea (toda a pesquisa nesta área
foi efetuada em: Biologia, volumes I, II, II de Amabis e Martho, Editora Moderna).
Mas, diante dessa polêmica científica, como Kardec se comportou e por qual
lado se definiu?
Vejamos através de suas próprias palavras extraídas da Revista Espírita, vol. 7,
1868: “Em nossa obra A Gênese, desenvolvemos a teoria da geração espontânea como
hipótese provável. Alguns partidários absolutos desta teoria admiraram-se que não a
tenhamos afirmado como princípio. (...) Pessoalmente é para nós uma convicção e se a
tivéssemos tratado numa obra comum, te-la-íamos resolvido pela afirmativa. (...)
Afirmando a coisa sem restrição, teria sido comprometer a Doutrina prematuramente,
92

o que não fazemos nunca, mesmo para fazer prevalecerem as nossas simpatias. (...) O
que se passou na origem do mundo para a formação dos primeiros seres orgânicos
acontece em nossos dias, pela via do que se chama geração espontânea? Eis a questão.
Por outro lado, não hesitamos em nos pronunciar pela afirmativa. (...) É hoje
reconhecido que os pêlos do mofo constituem uma vegetação espontânea, que continua,
revestindo formas diversas, conforme o meio e as circunstâncias, nos dá os liquens, os
musgos, etc. Quer-se um exemplo mais direto? Que são os cabelos e os pêlos do corpo
dos animais, senão uma geração espontânea?
(...) A matéria orgânica animalizada, isto é, contendo certa porção de azoto dá
origem a vermes que têm todos os caracteres de uma geração espontânea. Quando um
homem ou um animal qualquer está vivo, a atividade da circulação do sangue e o jogo
incessante dos órgãos mantêm uma temperatura e um movimento molecular que
impedem os elementos constitutivos dessa geração de se formar e se reunir. Quando o
animal está morto, a parada da circulação e do movimento, o abaixamento da
temperatura num certo
limite, produzem a fermentação pútrida e, em conseqüência, a formação de novos
compostos químicos. É então que se vêem todos os tecidos subitamente invadidos por
miríades de vermes que neles se repastam, sem dúvida para apressar a sua destruição.
Como seriam procriados, desde que antes não houvesse os seus traços?
Objetarão, sem dúvida, que são os ovos das moscas na carne morta. Mas isto
nada provaria, porque os ovos das moscas são depositados na superfície, e não no
interior dos tecidos e porque a carne, posta ao abrigo das moscas, ao cabo de certo
tempo não está menos pútrida e cheia de vermes; muitas vezes, até, são vistos
invadindo os corpos antes de morrer, quando há um começo parcial de decomposição
pútrida, notadamente nas feridas gangrenosas. Certas espécies de vermes se formam
durante a vida, mesmo num estado de saúde aparente, sobretudo nos indivíduos
linfáticos, cujo sangue é pobre e que não têm a superabundância de vida que se nota
em outros. São as lombrigas ou os vermes intestinais. (...) Sua formação bem podia ser
devida à geração espontânea. (...) Poderia dar-se o mesmo com os vermes do queijo, o
ácaro da sarna, e numa porção de animáculos que podem nascer do ar, na água e nos
corpos orgânicos.
(...) Aliás, aí não estão senão hipóteses, mas que parecem vir em apoio do
princípio. Até onde estende sua aplicação? É o que não se poderia dizer. O que se pode
afirmar é que ela deve ser circunscrita aos vegetais e aos animais de organização mais
simples, e não nos parece duvidoso que assistamos a uma criação incessante”.
Baseado em suas convicções a favor da abiogênese Kardec optou por recusar as
respostas dos Espíritos cujo teor era contrário à geração espontânea, ou seja, o
evolucionismo biológico, a descendência do homem e a seleção natural, até que Darwin,
em 1859, lançou o seu livro sobre a evolução das espécies, colocando a ciência nos
trilhos da razão, definitivamente.
Segundo o Boletim GEAE (Grupo de Estudos Avançados Espíritas) “Kardec
rejeitou as mensagens espirituais que afirmavam o evolucionismo biológico, a
descendência do homem e a evolução das espécies. Essa atitude foi criticada por
escrito por d’Ambel, seu secretário e seu médium preferido, além de Alexandre Canu,
secretário das sessões da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas que também fez
críticas por escrito”.
É justamente devido a sua crença na abiogênese que Kardec incluiu na primeira
edição de O Livro dos Espíritos, o seguinte ensinamento: “O homem não foi jamais
outro ser senão o homem” (questão 127). Vejamos como essa questão é tratada na
primeira edição de O Livro dos Espíritos, página 65, questão 127: - “A alma do homem
93

não teria sido primitivamente o princípio vital de ínfimos seres vivos da Biocriação,
que chegou, ex-vi da lei de progressiva, até o ser humano, percorrendo os diversos
graus da escala orgânica?” – “Não! Não! Os Espíritos, homens somos desde natos.
Cada ser vivo só progride na sua espécie e em sua essência. O homem não foi
jamais outro ser senão homo”. (grifos do autor). Kardec ainda tece comentários sobre
esta enfática negativa: “Seja qual for a diversidade das existências por que passe o
nosso Espírito ou nossa alma, elas pertencem todas à espécie humana; seria um erro
supor que, ex-vi duma lei progressiva, o homem haja passado pelos diferentes graus da
escala orgânica para chegar a seu estado atual. Assim, sua alma não foi inicialmente o
princípio vital de ínfimos seres vivos da Biocriação que chegou sucessivamente ao grau
superior: ao homem”.
* Revista Espírita, Volume 7, 1868

Nota-se que aqui se estabelece uma confusão entre princípio vital e princípio
inteligente, pois este é que será, futuramente, o Espírito, e aquele é o que permite a
animalização da matéria.
Na segunda edição, já constando nas livrarias o livro de Darwin sobre a
evolução das espécies, Kardec notou a sua falha e, como ele mesmo apregoava a
concordância com a ciência, retomou as respostas dos Espíritos que defendiam a
biogênese, deixando de lado o que escolhera antes.
Todavia, é difícil fugir de uma convicção enraizada. Temeroso de estar fazendo
uma escolha apressada, Kardec introduziu na segunda edição novas questões (604 a
611) sobre o tema (a primeira edição tinha 501 perguntas), sendo que estas se referem
mais à origem do Espírito que do corpo carnal. Percebe-se ainda que ele em nada
modificou as questões 46 a 59, que reforçam a geração espontânea. A crítica que alguns
estudiosos fazem ao codificador neste episódio é que ele, ferrenho defensor do consenso
universal para novas revelações, não procedeu com igual zelo nessa questão.
Em seu livro A Gênese, editado em 1868, Kardec ainda demonstrava dúvidas a
respeito da validade da biogênese: “De acordo com o que fica dito, percebe-se que não
existe geração espontânea senão para os seres orgânicos elementares; as espécies
superiores seriam produto das transformações sucessivas desses mesmos seres,
realizadas à proporção que as condições atmosféricas se lhes foram propícias”.
A biogênese hoje é uma teoria irrefutável, base de todas as questões biológicas
no que se refere à evolução orgânica das espécies. Mas por que Kardec, recebendo dos
Espíritos os ensinamentos sobre a evolução espiritual e mesmo sobre a evolução
orgânica das espécies, como se vê na resposta à pergunta 607, posteriormente
adicionada à segunda edição, demorou tanto a se convencer da veracidade da
biogênese? Nota-se mesmo que em 1868 ele ainda acreditava na geração espontânea dos
seres primitivos, procedendo a ressalvas, como quem se agarra a uma âncora para salvar
bens preciosos. Ao modificar as respostas tentando adequá-las à nova maneira de pensar
que se generalizava na comunidade científica, ele o fez com reservas, sem, contudo,
modificar o teor francamente favorável à geração espontânea embutido nas respostas
dadas às perguntas 46 a 59.
Não sei o motivo pelo qual Kardec tanta simpatia dedicou à abiogênese, apesar
de ser um cientista lúcido, dotado de grandioso bom senso e severo senso crítico. Aqui
talvez tenha falado mais alto o seu lado humano, a simpatia por uma hipótese, mesmo
combatida por tantos homens de gênio. Todavia, isso em nada abala o diamantino pilar
sobre o qual repousa o Espiritismo, de vez que, em essência, ele continua e permanecerá
inalterado pelos séculos afora.
94

Sobre a polêmica da inteligência das plantas

Experiências feitas pelo britânico Tony Trewavas, da Universidade de


Edimburgo, divulgadas pela Internet e órgãos científicos, demonstram que as plantas
possuem memória, inteligência, determinação e paciência. A razão pela qual ignoramos
tais virtudes deve-se ao fato de que entre nós, humanos, tais características se revelam
através de ações e de palavras. As plantas não possuem mobilidade nem se expressam
por palavras, mas agem, na maioria das vezes, demonstrando inteligência em situações
de sobrevivência. Como uma das definições de inteligência é “a capacidade de resolver
problemas”, as plantas resolvem seus problemas de maneira bastante satisfatória.

Vejamos, pois, algumas semelhanças no modo de agir das plantas com o dos
animais quando essas precisam tomar decisões que envolvem a sua sobrevivência e
bem-estar:

* Elas têm sentidos, por isso detectam e reagem à luz, sons, substâncias
químicas, vibrações e toque. A resposta a esses estímulos, já que elas não falam nem
podem se evadir do local é mudar o padrão de crescimento.

* As plantas ajustam o seu crescimento e desenvolvimento de maneira a


maximizar sua adaptação a um ambiente mutável. Em outras palavras, elas possuem
uma espécie de presciência que se encaixa perfeitamente na definição de inteligência
ainda em processo de evolução para estágios ascendentes. Nesse contexto, as plantas
podem antecipar problemas futuros e tomar decisões visando suprimi-los. Os brotos de
uma árvore podem sentir a vegetação vizinha, pois as folhas verdes absorvem luz
vermelha, embora reflitam o infravermelho. Baseado na variação de luz, as plantas
detectam vegetação próxima e, prevendo as conseqüências de tal proximidade, se
programam para a concorrência que terão que enfrentar. Dessa maneira, alteram sua
forma, o número e o tamanho das folhas, bem como o desenho do caule, de modo a
garantir um maior espaço frente ao sol.

* Determinadas ervas que não realizam fotossíntese, como a cuscuta, por


exemplo, tornam-se parasitas enrolando-se em volta da hospedeira, perfurando o caule
com seus brotos para dele extrair a seiva elaborada. Todavia, tal erva parece prever
quanta energia o hospedeiro produzirá e, em função disso, decide quanto esforço será
necessário para explorá-lo. A partir desse levantamento prévio, ela, de alguma forma,
antecipa o quão lucrativo será o hospedeiro, programando o seu desenvolvendo de
acordo com a capacidade de extrair alimento. De que adiantaria expandir galhos e
aumentar o número de folhas se não há alimento para tanto? A cuscuta se enquadra em
todos os modelos matemáticos que expressam bom aproveitamento e racionalidade,
exigidos para a sobrevivência, efetuado por qualquer animal.

* As plantas utilizam mudanças de voltagem nas membranas de suas células


para enviar sinais elétricos de um local para outro, da mesma maneira que o sistema
nervoso animal. Assim como a dor é uma resposta a uma agressão sofrida pelo animal,
95

enviada por seu sistema nervoso, os sinais emitidos pela voltagem das membranas
celulares vegetais indicam que a planta foi ferida. Muitas das substâncias químicas
utilizadas para transmitir mensagens no interior e exterior das células vegetais são
empregadas para processar informações dentro e entre as células do cérebro animal.
Portanto, boa parte das substâncias que fazem funcionar a complexa rede de sinalização
geradora de mensagens são semelhantes nos dois reinos.

* As bases moleculares de aprendizado e de memória também se assemelham.


Quando os animais aprendem a se afastar mais rapidamente de uma ameaça que se
repete tal como uma fonte envenenada ou uma cerca elétrica, a velocidade e o tamanho
do sinal elétrico com o qual se deparam repetidamente se ampliam em questões de
minutos. Um sistema que utiliza íons de cálcio, substâncias químicas por nome de
segundo mensageiro e algumas enzimas ampliam a resposta dos canais de íons que
transmitem os sinais. Se a ameaça continuar, essa percepção acentuada se torna
permanente com uma alteração genética que resulta na produção de mais canais ou mais
conexões entre as células.
Quando a planta sente falta de água, ocorre o mesmo mecanismo de sinalização,
orientando a formação de mais canais sensíveis para fechar os estômatos e adotar
medidas para ajudar a controlar a quantidade de água em suas células. A longo prazo, a
expressão dos genes e a taxa de síntese de proteína muda, as paredes celulares
engrossam e as folhas diminuem de tamanho. A planta aprende, exatamente como os
animais, por tentativas e erros, promovendo mudanças com a finalidade de diminuir seu
estresse e aumentar seu bem-estar.

* As plantas possuem certa individualidade, pois duas sementes semelhantes não


produzem árvores exatamente iguais e suas respostas vão depender do meio em que elas
se encontram e das ameaças que sofrerem.
Como se vê, apenas engatinhamos nesse campo imenso que é a vida e muito
temos que aprender antes de afirmar ou negar a possibilidade de inteligência nos
vegetais. Deixemos ao leitor o julgamento de tão delicado tema enquanto a ciência não
nos fornece uma resposta definitiva.

A antropologia criminal

O fato de Kardec haver defendido na primeira edição de O Livro dos Espíritos a


idéia de que há, às vezes, predisposição física para o assassinato e para outras
inclinações cruéis nos lembra a antropologia criminal de César Lombroso. Este
considerava em seu livro L’uomo Delinquente, o delito como sendo um fenômeno
biológico. Consultemos a primeira edição de O Livro dos Espíritos, página 140, questão
433: “O homem traz consigo ao nascer, por sua organização física, a predisposição para
tais ou tais atos? – Sim”. Recorramos ao comentário de Kardec: “A organização física
do ser humano o predispõe a tais ou quais atos aos quais é impelido por uma força, por
assim dizer, instintiva. Este pendor natural, se o conduzir ao Mal, poderá tornar-lhe o
Bem mais difícil, não, porém lhe tira a liberdade de fazer ou deixar de fazer...”
Notemos que o tema abordado nessa questão não se refere às tendências ou
inclinações que o Espírito traz devido ao seu atraso ou adiantamento moral, mas de uma
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organização física imposta por uma herança genética que lhe impõe características que
podem torná-lo um condenado antes mesmo de nascer.
Lombroso, médico psiquiatra, afirmava a existência de criminosos natos,
caracterizados por determinados estigmas somato-psíquicos que os condenavam
invariavelmente à delinqüência, sempre que determinadas condições ambientais
surgissem.
Para este cientista o criminoso nato seria dotado de: assimetria craniana,
zigomas salientes, face ampla e larga, cabelos abundantes e barba escassa. Apresentaria
também insensibilidade física, resistência a traumatismos, seria canhoto ou ambidestro,
moralmente impulsivo, insensível, vaidoso e preguiçoso.
Tal hipótese, felizmente rejeitada atualmente, condenava determinadas pessoas
que apresentassem uma ou mais características acima citadas à desconfiança e ao
preconceito social, fato que, certamente, dificultaria a busca de emprego, de amigos, de
namoradas, enfim, seriam pessoas condenadas injustamente, pois, na presente
encarnação jamais teriam cometido crime algum que justificasse tal rejeição social.
Como a genética garante a transmissão dos caracteres hereditários, os filhos
desses indivíduos, herdando suas características, seriam, igualmente, vítimas de
preconceitos e de injustiças.
Felizmente, na segunda edição, O Livro dos Espíritos surgiu sem este
pensamento, ou seja, a predisposição física para a crueldade, sendo a alteração norteada
para as predisposições do Espírito, este sim, podendo apresentar características mais ou
menos puras.

Sobre a formação de novos mundos pelos cometas


A grande maioria dos astrônomos acredita, atualmente, que os cometas são
escombros deixados para trás pela nebulosa que se condensou para dar origem ao sol e
aos planetas que o rodeiam formando o sistema solar. Há, segundo esses cientistas,
cerca de um milhão de núcleos cometários na grande nuvem esférica situada além do
nosso sistema e, ocasionalmente, quando uma estrela passa pelas redondezas pode
provocar uma agitação capaz de empurrar um deles para junto de nós. Capturado pela
força gravitacional, ele passa a pertencer ao sistema que o acolheu, perdendo massa
cada vez que se aproxima do sol. Este, através do vento solar, sempre que o cometa
passa na sua área de atuação, arranca grande quantidade de matéria de seu núcleo,
formando uma longa cauda de milhares de quilômetros. Nesse caso, o destino do
cometa capturado é a exaustão de sua massa, até que se quebre e desapareça
completamente, sendo sua matéria espalhada pelo espaço.
Segundo a Astronomia, a fragmentação de um núcleo cometário é evento
comum já observado muitas vezes pelos astrônomos. Relatos sobre este acontecimento
são fartos. Segundo anotações de Éfora, historiador grego, em 317 a. C. um cometa que
cruzava o céu se partiu em dois; Johann Cysat e outros dois astrônomos observaram o
cometa de 1618 dividindo-se em múltiplos fragmentos; o famoso cometa Biela bipartiu-
se em 1846. Seus pedaços voltaram a ser vistos em 1852. Em sua nova passagem em 27
de novembro de 1872, na região onde deveriam aparecer, observou-se uma grande
tempestade de meteoros que durou 6 horas, na qual calcula-se que foram observados
cerca de 160.000 meteoros. Ambos não foram mais vistos. Outros cometas que se
partiram: o de 1652; o cometa de Olinda em 1860; o Sawerther em 1881; o Brooks em
1889; o Swift em 1899, o Taylor em 1916; o Austral em 1947; o West em 1976,
partindo-se em quatro pedaços; o Shoemaker-Levy-9, que se partiu em 21 pedaços que
caíram sobre Júpiter em 1994; o Hyakutake, que se partiu em três pedaços em 1996.
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Allan Kardec, em A Gênese, Cap. VI, Os Cometas, faz a seguinte observação:


“Entretanto, os quadros da natureza deveriam bastar amplamente para afastar o
observador da preocupação de perquirir relações inexistentes e deixar aos cometas o
papel modesto, porém útil, de astros errantes, que servem de exploradores aos impérios
solares. Porque, os corpos celestes de que tratamos são coisas muito diversa dos
corpos planetários; não têm por destinação, como estes, servir de habitação a
humanidades. Vão sucessivamente de sóis em sóis, enriquecendo-se, às vezes, pelo
caminho, de fragmentos planetários reduzidos ao estado de vapor, haurir, nos focos
solares, os princípios vivificantes e renovadores que derramam sobre os mundos
terrestres”.
Como se constata no texto acima, Kardec não considerava os cometas como
futuros mundos, mas como astros errantes a espalhar pelos planetas que visitam
princípios vivificantes, dando a estes o papel de semeador e não de abrigo de almas. Por
outro lado, Kardec também não se expressou corretamente, pois um cometa não vai de
sol em sol de vez que, capturado por um deles, fica prisioneiro do sistema por ele regido
até que seu inevitável desgaste lhe interrompa a trajetória. Pode, igualmente, quando se
aproxima de uma região com planetas gigantes, ser empurrado para fora do sistema que
o abriga, por ter sua órbita e velocidade aumentadas, resultando nisso a sua expulsão do
sistema que o abrigava com a conseqüente captura por outro. Mas mesmo nesse caso,
ele não vai a passear de sol em sol.
Deduz-se, portanto, que o destino dos cometas é a morte por desgaste material,
sentido oposto ao declarado pelos Espíritos, evolução e formação de um mundo, o que
nos leva a crer que, segundo a ciência atual, um bom reparo deve ser feito nessa
primeira parte da resposta.

Sobre a superioridade de Marte e de outros planetas

Em A Gênese, capítulo VI (Uranografia Geral), psicografado por Camille


Flamarion, de “autoria” do Espírito Galileu, encontramos significativo relato sobre
Marte: O número e o estado de cada planeta tem variado de acordo com as condições
especiais em que eles se formaram. Alguns não deram origem a nenhum astro
secundário, como se verifica com Mercúrio, Vênus e Marte.
Hoje sabemos que Marte tem dois satélites, Fobos e Deimos, medo e terror,
companheiros íntimos do deus da guerra. Como explicar esse erro tão grosseiro acerca
das luas de Marte, se menos de 20 anos após a publicação da obra acima citada a ciência
terrena os descobria? Por que Kardec, tão meticuloso em suas anotações e na seleção de
textos para compor a obra, tão bem assistido pelos Espíritos superiores, tão consciente
do critério exigido para validar uma teoria espírita, a sanção universal, da qual
determinado ensinamento ganha crédito ao ser recebido através de vários médiuns e em
diferentes lugares não deixou essa informação de quarentena até que a ciência se
pronunciasse a respeito? Por que Galileu, cientista pioneiro na experimentação
científica aliada a cálculos matemáticos, diria algo sem comprovação anterior? Tal
atitude anticientífica não condiz com o gênio de Galileu, para quem a forma, a
quantidade e o movimento eram fundamentais.
Admitindo-se a ciência dos Espíritos bem mais avançada que a dos encarnados
e, havendo Galileu desencarnado em 1642, mais de dois séculos antes dos (seus?)
escritos ditados à Sociedade Espírita de Paris (em 1862), passado bastante tempo para o
aprofundamento de suas pesquisas, cremos que ele jamais faria tal dissertação sobre
Marte. Primeiro, porque já deveria saber que este planeta tem duas luas; segundo,
porque, como cientista criador do método científico, não faria afirmações sem antes tê-
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las comprovado, a não ser que falasse em hipótese, no campo das teorias ainda não
comprovadas, o que não corresponde ao seus escritos em A Gênese.
Especulemos: seria a confiança de Kardec na mediunidade de Flamarion tão
grande que contestá-la lhe era inadmissível? Teria o Espírito de Verdade permitido a
divulgação do texto para que os espíritas, tropeçando nessa “pedra”, tivessem mais
cuidado na divulgação de fatos científicos ainda não comprovados? Mais fácil nos é
admitir que Galileu e Flamarion, sendo o mesmo Espírito em encarnações diferentes,
este, através de processo anímico assumira durante o transe a personalidade anterior,
escrevendo o que pensava em sua época, quando viveu entre nós, embora acrescido de
detalhes observados no seu estágio na erraticidade. Outra hipótese é que ele apenas
passara por um fenômeno anímico, discorrendo ele próprio, embora inconscientemente,
a mensagem sobre Marte que contém, em suma, o que se sabia sobre este planeta
naquela época.
Ainda quanto ao planeta Marte, existe farto material na literatura espírita e fora
dela, que o coloca na posição de planeta superior a Terra. Vejamos parte dele:

Livro Cartas de uma Morta, psicografado por Chico Xavier, cuja autora é sua mãe,
Maria João de Deus: “É para vossa ciência uma afirmativa audaciosa dizer-vos que
pude ver o planeta Marte, identificando-me com os seus elementos a fim de conhecer de
mais perto as suas belezas ignoradas. Vi-me à frente de um lago maravilhoso, junto de
uma cidade formada de edificações profundamente análogas às da Terra. Vi homens
mais ou menos semelhantes aos nossos irmãos terrícolas, mas os seus organismos
possuíam diferenças apreciáveis. Percebi que a vida da humanidade marciana é mais
aérea”.

Livro Emmanuel, psicografia de Chico Xavier e autoria do próprio Emmanuel: “A Terra


é, pois componente da sociedade dos mundos. Assim como Marte ou Saturno já
atingiram um estado mais avançado em conhecimento, melhorando as condições de
suas coletividades, o vosso orbe tem, igualmente, o dever de melhorar-se, avançando
pelo aperfeiçoamento de suas leis para um estágio superior, no seu quadro universal”.

Livro Novas Mensagens, psicografia de Chico Xavier e autoria de Humberto de


Campos: “Dentro da atmosfera marciana experimentamos uma extraordinária
sensação de leveza. Ao longe divisei cidades fantásticas pela sua beleza inédita.
Máquinas possantes, como se fossem movidas por novos elementos do nosso helium,
balouçavam ao pé das nuvens. Ante meus olhos atônitos rasgavam-se avenidas extensas
e amplas, onde as construções eram profundamente análogas às da Terra”.

Livro Ressurreição e Vida, psicografia de Yvonne Pereira e autoria de Léon Tolstoi:


“Eis Marte com sua cor avermelhada, companheiro imediato da própria Terra, menor
que esta, e ainda mais distante do Sol, em cujos ambientes fluxos e refluxos
reencarnatórios são estabelecidos ainda com a própria Terra, apresentando superfície
semelhante à desta, e padrão científico superior, enquanto a moral dos seus habitantes
é mais ou menos idêntica à dos homens considerados honestos e progressistas na
sociedade terrena”.

Livro Princípios da Natureza, de Andrew Jackson Davis: “Não decorrerá muito tempo
para que essa verdade seja demostrada de maneira viva. E o mundo saudará
alegremente o alvorecer dessa era, enquanto o íntimo dos homens se abrirá, para
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estabelecer a comunicação espiritual, como a desfrutam os habitantes de Marte, Júpiter


e Saturno”.

Não descreveremos aqui os relatos de Ramatis feitos na obra de sua autoria A


vida no Planeta Marte, por serem longos e detalhados, exigindo uma extensa
abordagem, o que não é nosso propósito imediato.
Não deixa de ser estranho, essas obras colocarem o planeta Marte na condição
superior e Kardec mencioná-lo como inferior? Atualmente, dois robôs americanos
estudam o solo marciano e os europeus têm uma sonda mapeando sua superfície sem,
todavia, nem mesmo uma simples bactéria haverem encontrado para nos dar a esperança
de que haja vida naquela terra inóspita.
Dessa dissonância entre a ciência e a religião, nascem os cépticos, os
materialistas, os desconfiados que dizem acreditar apenas no que tocam e vêem. Certas
informações, como as que comentamos, fazem mais descrentes que adeptos, e
deformam, pela pequenina aresta que apresentam, todo um edifício, devido à tendência
que geralmente temos para ver antes a deformidade que a beleza. Se em um lindo e
seguro edifício algum pedreiro descuidado deixar uma ponta de ferro à mostra em
alguma parede, ela será imediatamente notada e tanto a segurança quanto a beleza,
embora sobrepujem em muito o aspecto insignificante do ferro à mostra, porão em
dúvida todo o conjunto da obra.
Todos nós, que já somos espíritas, sabemos que o importante e fundamental na
Doutrina Espírita é a renovação moral do ser que a toma como referencial de vida.
Todavia, vivemos em uma época onde o conhecimento científico é disseminado com
facilidade, o senso crítico é exigido nas escolas e incentivado na conquista da cidadania.
A geração atual costuma prestar bastante atenção naquilo que ouve e lê. Os comentários
sobre um deslize deságuam fatalmente na seguinte interrogação: se há uma falha nesse
ponto, não haveria em outros? Uma doutrina para sobreviver, principalmente quando
adota por lema a instrução e o amor, incentivando seus adeptos a praticá-los, deve
primar pela coerência em seus ensinamentos. Não seria a afirmativa de que existe um
inferno eterno, um perdão que é concedido gratuitamente, um satanás que mede forças
com Deus e que ainda não foi vencido, dentre outras afirmativas, a causa da redução do
número de fiéis, em determinadas religiões, devido, principalmente, à humanidade
encontrar-se a caminho da maturidade intelectual?
Se no Espiritismo encontra-se a parcela da população com maior tempo de
escolaridade, segundo o IBGE, não seria este fato mais uma razão para que os textos a
ela oferecidos estejam devidamente atualizados, sob pena de se tornarem inadequados
ou ultrapassados?

Sobre o momento da união da alma ao corpo

Busquemos a primeira edição de O Livro dos Espíritos, página 55, questão 86, a
fim de avaliarmos as conseqüências negativas que este equívoco geraria, caso não
houvesse sido retirado da sua primeira edição: “Em que momento a alma se une ao
corpo? - Ao nascimento; - Antes do nascimento a criança tem uma alma? - Não; - Como
vive então? - Como as plantas”. Comentário de Kardec: “A alma ou Espírito se une ao
corpo no momento em que a criança vê a luz e respira. Antes do nascimento a criança
só tem vida orgânica sem alma. Ela vive como as plantas, tendo apenas o instinto cego
de conservação, comum em todos os seres vivos”.
A validação dessa teoria seria igualmente a legalização do aborto e da utilização
de fetos para pesquisas e retiradas de órgãos. Por outro lado, negaria as implicações que
100

o perispírito tem na formação do novo corpo. Sabe-se, através da literatura espírita, que
o perispírito, inseparável do Espírito, traz determinadas características a serem
impressas no novo corpo carnal, fato que influencia positivamente ou não a condição
física do reencarnante. Além do mais, se o corpo que se forma serve apenas para o
Espírito que lhe foi destinado justamente porque seu perispírito a ele se encaixa ligando-
se célula a célula, perguntamos: caso o Espírito só se unisse ao corpo no instante do
nascimento, qualquer Espírito serviria àquele corpo? Ao terceiro mês a criança está
completamente formada e é capaz de ouvir a mãe, sentir agressões ou ficar feliz com os
afagos maternos. Se aprofundarmos essa questão muitos argumentos contrários e óbvios
encontraremos contra a resposta contida na primeira edição e, francamente, ainda não
entendi a causa da aceitação, por parte de Kardec, de uma resposta tão visivelmente
contrária ao corpo doutrinário em uma obra revisada.

Sobre a meditação e a contemplação

Nos últimos anos o Dr. Richard J. Davidson e sua equipe de cientistas estudaram
o cérebro de centenas de pessoas em busca do ser humano feliz, utilizando sensores,
ressonância magnética, dentre outras técnicas, até chegarem à estranha e maravilhosa
personalidade conhecida como Matthieu Ricard, um francês que se tornou budista.
Alguns membros da equipe que o elegeu o homem mais feliz do planeta chegara
á seguinte conclusão: somos condicionados a crer que a felicidade é uma espécie de
competição olímpica onde sai vitorioso aquele possui mais bens, influencia mais
mercados, comanda mais pessoas e é mais citado nos círculos da fama.
Outros sabiamente assim se expressaram: o homem mais feliz do planeta,
presentemente, é um indivíduo que vive em uma cela com área de quatro metros
quadrados, não é dono de empresas, não é executivo, não faz parte da lista das 500
pessoas mais ricas, não possui ferraris, puros-sangues, petróleo ou qualquer valor
digno de um assalto. Nem sequer usa celular, roupa de grife, desconhece o Viagra e
não se interessa em matar a sede com uma coca-cola. Resumindo: o homem mais feliz
do planeta não necessita de dinheiro, competição profissional, vida sexual e
popularidade.
Ricard, examinado exaustivamente durante anos através de 256 sensores e
dezenas de ressonâncias magnéticas foi o único entre os examinados, cujo cérebro não
só alcançou a máxima qualificação de felicidade prevista pelos métodos científicos,
demonstrando elevada satisfação e plenitude existencial, como registrou a inexistência,
ao contrário de outros examinados, de estresse, medo e frustração. Diante de resultados
tão surpreendentes os cientistas foram unânimes em afirmar que estavam à frente do
homem mais feliz do planeta.
Mas quem é Matthieu Ricard? Ele é PhD em genética molecular, filho do
famoso filósofo Jean François Revel (membro emérito da Academia Francesa) e
trabalhou com o prêmio Nobel de medicina François Jacob. Seu futuro estava marcado
para ser um grande cientista, caso continuasse neste caminho. Conhecendo a filosofia
oriental, tornou-se budista e deu outro rumo à sua vida.
Dedicando-se à meditação tornou-se discípulo do mestre tibetano Rinpoche;
mudou-se para o Himalaia onde se tornou um monge budista. Atualmente é estudioso
do Budismo e escritor com obras de grande sucesso, cujos direitos autorais são doados
para templos diversos. É também o principal auxiliar do Dalai Lama, nas traduções
francesas de sua obra.
Segundo o Dr. Richard Davidson, o que aconteceu a Ricard não é nenhuma
graça divina: Chama-se de plasticidade mental, ou seja, a capacidade humana de
101

modificar fisicamente o cérebro por meio dos pensamentos que escolhemos ter. Igual
aos músculos do corpo, o cérebro desenvolve e fortalece os neurônios mais utilizados.
Tudo indica que o cérebro pode ser treinado, na idade adulta, e até modificar a sua
organização interna.
Quanto mais pensamentos negativos alguém cultiva, maior atividade no córtex
direito do cérebro e em conseqüência, maior ansiedade, depressão e hostilidade. Em
outras palavras, mais infelicidade auto-gerada. Por outro lado, quem desenvolve bons
pensamentos e uma visão amorosa da vida exercita o córtex esquerdo, elevando as
emoções prazerosas e a felicidade. Nos estados de meditação, as ondas cerebrais
permanecem intensas, sugerindo que é possível treinar o cérebro e controlar as
emoções, mudando a estrutura da própria mente. A meditação pode mudar as funções
cerebrais de forma durável.
Comentários de Ricardo: Não se trata de, a partir de determinado momento,
passar a ver a vida colorida e não ter mais nenhum problema relativo à posse ou ao
desejo. É preciso trabalhar sistematicamente para debilitar os “músculos” da
infelicidade que tanto temos fortalecido acreditando-nos vítimas do passado, dos pais
ou do meio. Paralelamente devemos começar a exercitar os “músculos” mentais que
nos fazem absoluta e diretamente responsáveis por nossa própria felicidade.
Por tais razões discordamos da resposta 657 que afirma que os homens que
vivem na contemplação, pensando apenas em Deus não possuem nenhum mérito.

Sobre a elaboração em segredo do livro “Imitação do Evangelho” e outros


temas

Para quem propunha que qualquer revelação espírita deveria passar por uma
espécie de consenso universal, no qual diversos médiuns e variados Espíritos em
diferentes locais e épocas teriam que desenvolver semelhantemente determinado tema,
ou seja, falar a mesma linguagem e refletir a mesma essência, Kardec não se enquadrou
em seu próprio raciocínio nas questões abaixo:

a) Elaborou sozinho, sem o conhecimento, a contribuição ou a aprovação dos seus


colaboradores, o livro Imitação do Evangelho que viria a ter o título definitivo de O
Evangelho Segundo o Espiritismo. Eis como Kardec narra o fato: “Eu não tinha
comunicado a ninguém o assunto do livro no qual trabalhava; tivera-lhe o título de tal
modo em segredo que o editor, sr. Didier, não o conheceu senão quando da impressão.
Esse título foi de início, para a primeira edição: Imitação do Evangelho. Mais tarde,
sobre as observações reiteradas do sr. Didier, e de algumas outras pessoas, foi mudado
para o de: O Evangelho Segundo o Espiritismo”. Segundo Zêus Wantuil e Francisco
Thiesen, no livro Allan Kardec – Pesquisa Bibliográfica e Ensaios de Interpretação,
Kardec procedeu igualmente na edição do primeiro número da Revista Espírita: “Allan
Kardec sentiu novas forças a lhe revigorarem o Espírito e, desde então, estimulado
indiretamente pelos Espíritos, e diretamente por sua dedicada esposa, cuja elevada
compreensão lhe fora precioso refúgio nos momentos mais críticos, ele se apressou em
redigir o primeiro número da Revue Spirite, sem nada ter informado a seus amigos”.

b) Considerava os que executam coisas materiais de uma ordem inferior, tanto entre os
Espíritos quanto entre os homens. Essa opinião é reforçada mais de uma vez nos artigos
que falam sobre Home: “O senhor Home é um médium do gênero daqueles que
produzem manifestações ostensivas, sem excluir, por isso, as comunicações inteligentes
102

(grifo meu); mas as suas predisposições naturais lhe dão, para as primeiras, uma
aptidão mais especial”. Para Kardec os efeitos físicos se tornaram secundários devido a
esse argumento, razão pela qual, outros pesquisadores tiveram que aprofundar todo esse
tema, notadamente, no que diz respeito à feitiçaria (ver o livro Homens e Fatos que
Fizeram História do mesmo autor).

c) Transcreveu com alterações para O Evangelho Segundo o Espiritismo o texto


considerado apócrifo em O Livro dos Médiuns, cuja assinatura era, originalmente, de
Jesus de Nazaré, atribuindo sua autoria, no novo livro, ao Espírito de Verdade.
Comparemos os dois:

O Livro dos Médiuns (Paris 1860)


“Venho, eu, vosso Salvador e vosso juiz; venho, como outrora, aos filhos
transviados de Israel; venho trazer a verdade e dissipar as trevas. Escutai-me. O
Espiritismo, como outrora a minha palavra, tem que lembrar aos materialistas que
acima deles reina a imutável verdade: o Deus bom, o Deus grande, que faz germinar a
planta e que levanta as ondas. Revelei a Doutrina Divina; como o ceifeiro, atei em
feixes o bem esparso na Humanidade e disse: Vinde a mim, vós todos que sofreis!
Mas, ingratos, os homens se desviaram do caminho reto e largo que conduz ao
reino de meu Pai e se perderam nas ásperas veredas da impiedade. Meu Pai não quer
aniquilar a raça humana; quer, não mais por meio de profetas, não mais por meio de
apóstolos, que, ajudando-vos uns aos outros, mortos e vivos, isto é, mortos segundo a
carne, porquanto a morte não existe, vos socorrais e que a voz dos que já não existem
ainda se faça ouvir, clamando-vos: Orai e crede! Por isso que a morte é a ressurreição,
e a vida - a prova escolhida, durante a qual, cultivadas, as vossas virtudes têm que
crescer e desenvolver-se como o cedro.
Crede nas vozes que vos respondem: são as próprias almas dos que evocais. Só
muito raramente me comunico. Meus amigos, os que hão assistido à minha vida e à
minha morte são os intérpretes divinos das vontades de meu Pai.
Homens fracos que acreditais no erro das vossas inteligências obscuras, não
apagueis o facho que a clemência divina vos coloca nas mãos, para vos clarear a
estrada e reconduzir-vos, filhos perdidos, ao regaço de vosso Pai.
Em verdade vos digo: crede na diversidade, na multiplicidade dos Espíritos que
vos cercam. Estou infinitamente tocado de compaixão pelas vossas misérias, pela vossa
imensa fraqueza, para deixar de estender mão protetora aos infelizes transviados que,
vendo o céu, caem no abismo do erro. Crede, amai, compreendei as verdades que vos
são reveladas; não mistureis o joio com o bom grão, os sistemas com as verdades.
Espíritas! amai-vos, eis o primeiro ensino; instruí-vos, eis o segundo. Todas as
verdades se encontram no Cristianismo; são de origem humana os erros que nele se
enraizaram. Eis que do além-túmulo, que julgais o nada, vos clamam vozes: Irmãos!
nada perece; Jesus-Cristo é o vencedor do mal, sede os vencedores da impiedade.
Jesus de Nazaré”

O Evangelho Segundo o Espiritismo (1864)


“Venho, como outrora dentre os filhos desgarrados de Israel, trazer a verdade e
dissipar as trevas. Escutai-me. O Espiritismo, como outrora minha palavra, deve
relembrar aos incrédulos que acima deles reina a imutável verdade: o Deus bom, o
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Deus grande, que faz germinar as plantas e eleva as ondas. Revelei a doutrina divina; e
como um ceifeiro, atei em feixes o bem disperso pela humanidade e disse: Vinde a mim,
todos vós que sofreis!
Mas os homens ingratos desviaram-se do caminho reto e largo que conduz ao reino de
meu Pai, e desgarram-se pelos ásperos atalhos da impiedade. Meu Pai não quer
aniquilar a raça humana. Quer que, ajudando-vos uns aos outros, mortos e vivos, isto
é, mortos pela carne, pois a morte não existe, socorrei-vos. E que não mais a voz dos
profetas e dos apóstolos, mas a voz dos que não estão mais aqui, se faça ouvir, para
clamar-vos: Orai e acreditai! A morte é a ressurreição, e a vida é a prova escolhida,
durante a qual vossas virtudes cultivadas devem crescer e desenvolver-se como o cedro.
Homens fracos, que estais limitados às trevas de vossas inteligências, não afasteis a
chama que a clemência divina coloca em vossas mãos para iluminar vosso caminho e
para conduzir-vos, filhos perdidos, ao seio de vosso Pai.
Sinto compaixão por vossas misérias e vossa imensa fraqueza em não estender uma
mão segura aos infelizes transviados que, vendo o céu, caem no abismo do erro.
Acreditai, amai, meditai sobre as coisas que vos são reveladas; não mistureis o joio ao
bom grão, as utopias às verdades.
Espíritas! amai-vos, eis o primeiro ensinamento; instruí-vos, eis o segundo. Todas as
verdades são encontradas no Cristianismo; os erros que nele criaram raiz são de
origem humana. E eis que, além do túmulo, em que acreditáveis o nada, vozes vêm
clamar-vos: Irmãos! Nada perece. Jesus Cristo é o vencedor do mal; sede os
vencedores da impiedade!”
O Espírito de Verdade

Acredito que Kardec tinha a certeza de que o Espírito de Verdade era, realmente,
o Cristo, apesar de não ter confirmado essa certeza para seus colaboradores. Afirmei
alhures que não considero adulteração por parte do médium ou do escritor repassar a
mensagem do comunicante adequando-a àqueles que a receberão, desde que sua
essência permaneça inalterada. É certo que há casos em que o estilo do comunicante
deve ser preservado a fim de melhor identificá-lo, o que não é o caso. Observando
atentamente ambos os textos verifica-se que Kardec, ao repassar a mensagem para O
Evangelho Segundo o Espiritismo, a tornou mais elegante, concisa, sem nada alterar da
sua substância. Mas é importante que isso seja feito às claras, com explicações
necessárias e idéias compartilhadas. Por ter elaborado sozinho o citado livro, Kardec
não foi alertado para possíveis contestações à transferência da mensagem com as
modificações bastante visíveis.
Uma pista deixada sutilmente por Samuel Hahnemann, o criador da homeopatia,
na Revista Espírita do mês de janeiro do ano de 1864, parece confirmar a hipótese de
que o Espírito de Verdade era mesmo o Cristo: “Esses casos de possessão vão
igualmente abrir ao magnetismo, horizontes totalmente novos e lhe fazer dar um grande
passo à frente pelo estudo, até aqui tão imperfeito, dos fluidos. Ajudado por esses novos
conhecimentos e por sua aliança com o Espiritismo, ele obterá grandes coisas. (...)
Essas obsessões freqüentes terão, também, um lado muito bom, por isso que, sendo
penetrado pela prece e pela força moral, é possível fazê-las cessar e adquirir o direito
de expulsar os maus Espíritos e, pelo melhoramento de sua conduta, cada um
procurará adquirir o direito que o Espírito de Verdade, que dirige este globo, (grifos
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do autor) conferirá quando for merecido”. Vale lembrar que Hahnemann era um dos
orientadores diretos de Kardec.
Talvez, por ter a certeza de que o Espírito de Verdade era o Cristo, Kardec
tenha considerado normal o burilamento que fez na mensagem aludida, bem como sua
inclusão com o nome modificado autor, em outro livro. Para ele estava tudo correto. E
realmente estava. Apenas não quis dizer aos leitores que considerava o Cristo e o
Espírito de Verdade o mesmo Espírito. O seu silêncio quanto a esta questão se justifica
pela enorme polêmica que tal revelação geraria, principalmente, entre os detratores da
Doutrina nascente. Todavia, esse embaraço já poderia ter sido desfeito há muito tempo,
desde o primeiro Congresso Mundial, simplesmente retirando-se de O Livro dos
Médiuns a mensagem original, considerada apócrifa, lá colocando uma nota explicativa
para o que realmente acontecera. O que não é nada confortador é deixar tudo como está,
ao sabor da interpretação de cada leitor.

Conclusão

Este é um livro para as pessoas que verdadeiramente amam o Espiritismo, se


interessam pelo seu progresso e pelo aperfeiçoamento da obra de Allan Kardec. Aquele
que ama quer o progresso e a beleza do ser ou do objeto amado, não medindo para isso
esforços no sentido de concretizar seus objetivos.
A dificuldade que alguns espíritas têm de aceitar a atualização científica da
codificação kardeciana prende-se ao conservadorismo, ao medo de se mostrarem
frágeis, à falta de coragem para novas construções e novas aprendizagens, fato que os
mantêm aferrados ao status quo. Este fato é marcante em qualquer agremiação humana,
seja ela política, religiosa ou de outra natureza qualquer, e se caracteriza pela neurose
que determinados grupos apresentam quando uma idéia nova parece abalar o edifício
que ergueram e deixaram sem manutenção. Diante da ameaça do novo, do qual sentem
fobia, se exasperam e, geralmente, tentam impor a qualquer preço as características do
velho casarão, se esforçando para dar a impressão de que lutam pela pureza das idéias
que defendem e defesa daquele que as elaborou.
Qualquer pessoa que pesquise na internet os erros científicos da codificação vai
encontrar milhares de páginas apontando-os, não que eles sejam muitos, mas descritos
de maneira repetida, monótona, numa ladainha de fazer inveja a qualquer fofoqueira
profissional. Perguntamos: Diante desse ataque brutal à Doutrina e a seu codificador
quem a está defendendo? Aquele que a quer atualizada ou aquele que a deseja com os
erros científicos?
Foi por admirar esse grande homem que ousei tentar entender um pouco do seu
pensamento e da sua vontade. O que descobri sobre ele ao longo de anos de estudo foi o
bastante para convencer-me de que ele não é exatamente o que pensa grande parte do
universo espírita. É muito maior, mais honesto, mais racional, mais aberto ao novo do
que julgam seus admiradores.
Aquele que pensa honrá-lo condenando suas obras ao imobilismo apenas o
contraria; quem julga amá-lo e defende a não adequação de sua obra ao tempo, dele se
distancia; se um adepto da doutrina que ele ajudou a coordenar o considera um ser
perfeito, criador de uma obra pronta e acabada, subestima sua inteligência, pois só
alguém de idéias curtas é capaz de se considerar o supra-sumo da perfeição.
Ao escrever sobre os Apelos do Tempo quis antes prestar uma homenagem a este
incansável pesquisador e, jamais, diminuir-lhe o mérito tantas vezes provado. Em nada
alterei sua obra, como se verifica nos textos que escrevi. Apenas cometei perguntas e
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respostas, utilizando os mesmos ensinamentos e argumentos que ele nos legou,


enfatizando a necessidade de adequá-los, em alguns casos.
Foi uma conversa, digamos, de um grande professor com um seu aprendiz que
vê no erro, pedagogicamente falando, uma tentativa de acerto. Se um professor se sente
ofendido frente às indagações de um seu aluno, ainda não está preparado para tão
delicada profissão, a de formador de opiniões, partejador de idéias, professor, enfim.
Portanto, Kardec jamais se sentiria diminuído ou insultado por um seu discípulo lhe
fazer questionamentos, pois sua grandeza não o permitiria.
Estamos em um século privilegiado em que o conhecimento parece brotar do
próprio ar convidando os amantes da pesquisa para o festim da libertação da ignorância
que ainda se hospeda em nós.
Amigos! Unamo-nos em torno do conhecimento e do amor à causa espírita sem
preconceitos e sem julgamentos apressados. Façamos como o homem simples que
resume o seu modo de agir dizendo: “se não posso ajudar não devo atrapalhar”.
Respeitemos o ponto de vista daqueles que pensam diferentemente, pois eles podem
estar certos em suas opiniões. Aprendamos a ouvir antes de acusar, a aconselhar antes
de agredir, a olhar para nós próprios para só então lavrarmos alguma sentença. Não nos
esqueçamos das palavras daquele que veio a nós com a finalidade de aliviar nossos
sofrimentos e disse: “Bem-aventurados os misericordiosos porque obterão
misericórdia”.
Não tenhamos medo do progresso, pois este é o nosso destino, progredir sempre.
Talvez esteja sendo piegas nestes argumentos, mas eles são propícios para o contexto
em que nos situamos: quando duas pessoas discutem, no presente estágio de
desenvolvimento humano, podemos admitir três verdades: a da primeira pessoa, a da
segunda pessoa e a verdade verdadeira.
Apelos do Tempo é um livro que eu sempre quis escrever para aqueles que
esperam uma abordagem nova, com algumas filigranas de aprofundamento a mais, nos
verdejantes campos do Espiritismo.
Que Deus nos inspire sempre à fraternidade e à delicadeza dos ninhos.
Feito o resumo, o tempo se deu por satisfeito e saiu à procura de outros homens
para atormentá-los com sua cobrança ou exaltá-los por sua coerência. O dia já
amanhecia quando ele, olhando os primeiros raios de sol, enfatizou: é a batalha da luz
contra as sombras. E desapareceu rápido como havia chegado, deixando-me com a
sensação de que rejuvenescera.

Bibliografia
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Fac-Símile da primeira edição, Versão em Face, Primeiro Centenário, trad. de Canuto
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6. KARDEC, Allan. – O Que é o Espiritismo. Federação Espírita Brasileira, Rio de


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11. KARDEC, Allan. – O Céu e o Inferno. Federação Espírita Brasileira, Rio de


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12. KARDEC, Allan. - Coleção Revista Espírita – Jornal de Estudos Psicológicos.


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13. WANTUIL, Zeus e THIESEN, Francisco. – Allan Kardec – Pesquisa Bibliográfica


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15. SAGAN, Carl. – Cosmos. – Francisco Alves, Rio de Janeiro, 1983, trad. de Ângela
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19. BARROS, Júlio César Siqueira – Erros do Kardecismo –


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20. Astro Manual – Astronomia Observacional Amadora – hppt://geocities.


yahoo.com.br/rgregio2001
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Orelha ou contra capa

A Doutrina Espírita é o que se tem de melhor para responder às perguntas


básicas que nos inquieta a alma.
Quanto mais coerentemente ela se expressar, mais admiradores terá, e,
conseqüentemente, menores serão as críticas aos seus ensinamentos. Esta obra relata o
encontro do autor com um homem chamado tempo, que o buscou para conhecer
minúcias e especificidades relativas à obra “O Livro dos Espíritos”. Da conversa entre
ambos, utilizando temas transversais e raciocínios lógicos, resultou uma série de
questionamentos, aprofundamentos, adendos e comentários que levam o leitor reler a
citada obra, tendo assim a oportunidade de maravilhar-se com a sua solidez e coerência.

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