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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE – UERN

CAMPUS AVANÇADO PREFEITO WALTER DE SÁ LEITÃO – CAWSL


DEPARTAMENTO DE LETRAS ESTRANGEIRAS– DLE

O MEDO DO DESCONHECIDO:
Um diálogo entre o terror psicológico em “The Fall of the House of Usher”, de Edgar A.
Poe, e o horror cósmico em “The Outsider”, de H. P. Lovecraft

JEFFERSON FELIPHE DA COSTA CABRAL

ASSU/RN
2018
JEFFERSON FELIPHE DA COSTA CABRAL

O MEDO DO DESCONHECIDO:
Um diálogo entre o terror psicológico em “The Fall of the House of Usher”, de Edgar A.
Poe, e o horror cósmico em “The Outsider”, de H. P. Lovecraft

Monografia apresentada à disciplina Seminário


de Monografia I (Inglês), ministrada pelo
professor Me. Leodécio Martins Varela, como
requisito para obtenção do título de licenciado
em Letras Língua Inglesa.
Orientadora: Prof. Dra. Letícia Fernandes
Malloy Diniz

ASSU/RN
2018

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Catalogação da Publicação na Fonte. Universidade do Estado do Rio Grande do Norte.

C117m
Cabral, Jefferson Feliphe da Costa
O medo do desconhecido: um diálogo entre o terror psicológico em The
Fall of the House of Usher, de Edgar A. Poe e o horror cósmico em The
Outsider, de H. P. Lovecraft. / Jefferson Feliphe da Costa Cabral. - Assú,
2018.
40p.

Orientador(a): Profa. Dra. Letícia Fernandes Malloy Diniz.


Monografia (Graduação em Letras (Habilitação em Língua Inglesa e suas
respectivas Literaturas)). Universidade do Estado do Rio Grande do Norte.

1. Poe. 2. Lovecraft. 3. Horror. 4. Gótico. 5. Literatura norte-americana. I.


Diniz, Letícia Fernandes Malloy. II. Universidade do Estado do Rio Grande
do Norte. III. Título.

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JEFFERSON FELIPHE DA COSTA CABRAL

O MEDO DO DESCONHECIDO:
Um diálogo entre o terror psicológico em “The Fall of the House of Usher”, de Edgar A.
Poe, e o horror cósmico em “The Outsider”, de H. P. Lovecraft

Monografia apresentada como requisito para a obtenção do grau de licenciado em Letras,


Língua Inglesa, ao Departamento de Letras Estrangeiras (DLE), da Universidade do Estado
do Rio Grande do Norte (UERN), Campus Avançado Prefeito Walter de Sá Leitão (CAWSL),
tendo sido defendida e aprovada em ___ de Julho de 2018, pela seguinte banca examinadora:

_____________________________________________________________
Prof. Letícia Fernandes Malloy Diniz (UERN)
Presidente

______________________________________________________
Prof. Francisco José Costa dos Santos
Examinador

______________________________________________________
Profa. Lilian de Oliveira Rodrigues (UERN)
Examinadora

ASSU/RN
2018

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DEDICATÓRIA

Dedico este estudo monográfico aos apreciadores da


literatura gótica e fantástica, que assim como quem vos
escreve, compactuam da admiração pelo obscuro e pelo
desconhecido.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço ao corpo docente do Departamento de Letras Estrangeiras do CAWSL-


UERN, o qual me acompanhou durante а graduação e tem parte importante na minha
formação acadêmica.
Em especial aos professores que considero responsáveis pеlа realização deste trabalho,
que são eles: Silvano Pereira, que me ingressou no âmbito da pesquisa científica; Leodécio
Varela, que foi meu coordenador/supervisor durante o estágio e o seminário de monografia, e
a minha professora e orientadora Letícia Malloy, pelo aprimoramento do meu conhecimento
na área da literatura norte-americana e pela paciência e incentivo na orientação, o que tornou
possível a conclusão dessa monografia.
Também quero agradecer aos meus colegas de turma (Letras Inglês e Vernáculas) que
me deram motivação para continuar com a produção do TCC, quando eu mesmo achei que
não conseguiria concluir a tempo. Sou grato a todos os laços de amizade que foram
construídos durante esse tempo que permaneci na instituição.

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“Nossos pensamentos são as sombras de nossos sentimentos, sempre
mais obscuros, mais vazios, mais simples que estes.”

Friedrich Nietzsche

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SUMÁRIO

RESUMO................................................................................................................ 8
CONSIDERAÇÕES INICIAIS .......................................................................... 10

1. EDGAR ALLAN POE E O CONTO DE HORROR.................................... 13


1.1 A perspectiva de Poe sobre a composição literária ............................. 13
1.2 O conto de horror no projeto estético de Poe ...................................... 16
1.3 O gótico no projeto estético de Poe ..................................................... 19
2. HOWARD PHILLIPS LOVECRAFT E O CONTO DE HORROR.......... 22
2.1 H. P. Lovecraft e a tradição literária .................................................... 22
2.2 A ficção gótica e sobrenatural no projeto estético de Lovecraft ......... 24
2.3 O conto de horror no projeto estético de Lovecraft ............................. 26
3. ANÁLISE DOS CONTOS .............................................................................. 30
3.1 A simbologia e figuração da casa/castelo ............................................ 30
3.2 Um diálogo entre os contos ................................................................. 33

CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 38


REFERÊNCIAS .................................................................................................. 40

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Resumo

O horror permeia obras literárias até os dias atuais e tem sido definido de acordo com a ênfase
na exploração da estética do medo e a relação entre realidade e fantasia. O horror foi
mundialmente difundido pela obra de Edgar Allan Poe (1809 - 1849), mas foi posteriormente
com Howard Phillips Lovecraft (1890 – 1937) que o gênero ganhou contornos mais definidos,
pois, além de ter produzido uma grande quantidade de contos góticos, criando seu próprio
subgênero, o chamado Horror Cósmico, ambos os autores teorizaram sobre a literatura de
horror, publicando sua perspectiva nos ensaios “A Filosofia da Composição de (1846) e
“Horror Sobrenatural na Literatura” (1927). Entre os contos góticos escritos por Poe e
Lovecraft estão “A Queda da Casa de Usher” (1839), e “O Forasteiro” (1926), os quais este
presente trabalho se propõe a analisar a constituição gótica dessas referidas obras dos autores
americanos. Fazendo uso de uma metodologia comparativista e bibliográfico-interpretativista
com base em discussões teóricas sobre a literatura gótica, a pesquisa destacou, nos contos em
análise, considerações sobre efeitos de medo e horror e sobre os temas da loucura e da morte,
além da condição trágica de isolamento dos protagonistas de ambos os contos e seu caráter
duplo, a simbologia presente na narrativa, entre outros aspectos.

Palavras-chave: Poe. Lovecraft. Horror. Gótico. Literatura norte-americana.

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Abstract

The Horror permeates literary works to this day and has been defined according to the
emphasis on the exploration of the aesthetics of fear and the relationship between reality and
fantasy. The horror was spread worldwide by Poe’s work (1809 - 1849), but was later by
Lovecraft’s (1890 – 1937) that the genre gained more defined contours, because besides
having produced a large amount of Gothic tales, creating a particular subgenre, called Cosmic
Horror, both of the authors theorized about horror literature, publishing their perspective in
the essays “The Philosophy of Composition” (1846) and “Supernatural Horror in Literature”
(1927). Among the Gothic tales written by Poe and Lovecraft are “The Fall of the House of
Usher” (1839) and “The Outsider” (1926), which this research proposes to analyze the Gothic
constitution of these works of the American authors. Using a comparative and bibliographic-
interpretative methodology based on theoretical discussions about Gothic literature, the
research highlighted, in the chosen tales for the analysis, considerations about the effects of
fear, madness and death beyond the tragic condition of isolation of the protagonists of both
tales and its dual character, the present symbology in the narrative, among other aspects.

Keywords: Gothic. Horror. Poe. Lovecraft. North American literature.

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Considerações iniciais

Este estudo propõe um diálogo entre as obras de Edgar Allan Poe e Howard Phillips
Lovecraft, levando em consideração os elementos e fenômenos que caracterizam o horror
ficcional nas obras dos dois autores. Para isso, tomam-se por foco os contos “The Fall of the
House of Usher” (1839), de Poe, e “The Outsider” (1926), de Lovecraft, por se tratarem de
textos representativos das concepções de horror nas obras dos dois autores.
Um dos principais objetivos desta pesquisa é oferecer contribuições para a fortuna
crítica de Lovecraft no Brasil e, para isso, busca-se apontar diálogos entre as perspectivas
deste e de Poe, seu predecessor, a respeito do terror. Atualmente, após mais de cem anos de
seu nascimento, as histórias de Lovecraft estão disponíveis em edições com texto revisado.
Seus ensaios, poemas e cartas circulam amplamente, e muitos estudiosos de países anglófonos
têm analisado a complexidade de sua obra e de seu pensamento. Porém, os estudos no Brasil
sobre a obra de Lovecraft ainda não são expressivos. Lovecraft possui o mérito de ocupar um
espaço no cânone da literatura norte-americana, e sua obra merece maior atenção por parte de
docentes e discentes de cursos de Letras – Língua Inglesa no Brasil.
Desse modo, esta pesquisa é voltada a estudantes e pesquisadores das literaturas de
língua inglesa, assim como a leitores interessados na estética gótica, e foi estimulada pela
relevância do tema, frequentemente revisitado – mas não esgotado –, em especial, na fortuna
crítica de Edgar Allan Poe.
Ao propor a análise de textos literários, esta pesquisa se desenvolve a partir da
abordagem interpretativista e bibliográfica. A análise ora desenvolvida adota, também, a
perspectiva comparatista, uma vez que objetiva estabelecer cotejos entre textos de Poe e
Lovecraft. Dentre esses textos, escolheram-se “The Fall of the House of Usher” e “A filosofia
da composição”, de Poe, e “The Outsider” e “O Horror Sobrenatural na Literatura”, de
Lovecraft.
A primeira parte deste estudo monográfico investiga características da ficção gótica no
projeto composicional de Poe, incluindo os temas e os componentes mais proeminentes que
formam a atmosfera de terror em sua obra. Poe é conhecido por seu trabalho com a linguagem
e pelo objetivo de criar um efeito singular em seus textos. O efeito de uma história de terror
deve ser o medo, por isso, concentrei minha atenção nas estratégias que encorajam essa
reação no leitor.

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Assim como a anterior, a segunda parte da monografia aborda as características do
estilo narrativo de Lovecraft. Mais precisamente, este capítulo diz respeito aos componentes
do estilo narrativo que ele adotou em seu universo cósmico-literário, sendo o seu efeito de
horror sobrenatural o principal dos componentes de seu projeto literário. Tal efeito amplifica
enormemente o potencial da atmosfera, pois influencia o leitor, e guia-o para a história e,
assim, aumenta consideravelmente a imersão do leitor na narrativa, porque dessa forma ele
tende a experimentar mais vividamente os incidentes do conto.
A última parte dessa pesquisa detalha o espaço narrativo dos contos que estão sendo
explorados; as descrições do ambiente em ambos os contos estudados; a simbologia por trás
de elementos da narrativa como a casa e o castelo; e ainda uma análise dos contos
selecionados, sob uma perspectiva comparativista.

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1. Edgar Allan Poe e o conto de horror

1.1A perspectiva de Poe sobre a composição literária

Nesta seção, investigaremos o modo de composição literária proposto por Poe como
ponto de ignição para construir uma boa narrativa. No ensaio “A Filosofia da Composição”
(1846), Poe afirma que a construção de uma narrativa deve se orientar pelo raciocínio lógico.
O escritor deve começar a elaborar seu texto considerando um determinado efeito a ser
alcançado junto ao leitor – e.g., medo, tristeza – Uma vez escolhido o efeito, o escritor deve
organizar os incidentes na narrativa de modo a alcançá-lo.
Ainda de acordo com “A Filosofia da Composição”,

Somente não descuidando do desenrolar da trama que podemos conferir ao


enredo seu aspecto indispensável de conseqüência (sic), ou causalidade,
fazendo com que os incidentes e, especialmente, o tom da obra tendam
para o desenvolvimento de uma ideia. (POE, 2017, p. 341)

Poe considera indispensável o estabelecimento de relações de causalidade em uma


obra de ficção, pois essa relação intensifica o efeito escolhido e orienta o desenvolvimento da
estrutura da narrativa. Segundo Poe, a construção do texto começa a partir dessas
considerações e da premissa de que os elementos da narrativa devem ser objeto de meditação
para só depois serem escritos. A respeito do fato de que a escrita literária é resultado de um
processo meditativo, e não puramente intuitivo. Poe comenta:

A maioria dos autores – sobretudo os poetas – prefere dar a entender que


compõe em uma espécie de refinado frenesi, arrebatado pela intuição. Tais
escritores iriam estremecer diante da idéia (sic) de permitir que o público
visse o que ocorre nos bastidores, que acompanhasse as elaboradas e
vacilantes cruezas do pensamento [...] (POE, 2017, p. 342)

Com isso, Poe dá a entender que nem todo autor deseja refazer e divulgar o percurso
que o conduziu aos objetivos alcançados. Ao contrário de autores que critica, Poe disseca seu
processo composicional em “A filosofia da composição”. Neste ensaio, o autor tece
considerações sobre o processo de escrita de “O corvo”1 (1845), um de seus mais famosos

1
Vale lembrar que o célebre poema “O corvo” foi traduzido para o português por autores como Machado de
Assis, em 1883, e Fernando Pessoa, em 1924. Assim como os contos aqui analisados, “O Corvo” está repleto de
elementos que remetem à morte, à obscuridade, à loucura, à perda e ao luto.
13
poemas, e ali expõe diretrizes de composição que também se aplicam a seus contos. Como
relata Diniz:

Poe medita sobre a composição literária a partir da observação de sua


própria escrita e toma “O corvo” como principal objeto de atenção em “A
filosofia da composição”. Neste ensaio, o autor estadunidense se concentra
em considerações sobre a poesia, mas a maior parte das meditações ali
dispostas se mostra válida ao exame do panorama de contos por ele
publicados. (DINIZ, 2017, p. 105)

No intuito de apresentar de forma sumarizada o modus operandi que Poe empregou


para compor alguns de seus trabalhos, explicam-se, a seguir, em tópicos, os pontos desse
processo de acordo com o disposto em “A filosofia da composição”. Antes de qualquer coisa,
é preciso observar que a leitura do ensaio permite a inferência de que nada na composição dos
textos de Poe é acidental ou meramente intuitivo. O autor enfatiza que o poema “O Corvo” foi
trabalhado e retrabalhado com esmero, até que alcançasse sua versão final.
A primeira consideração de Poe no ensaio referido diz respeito à extensão do texto.
Partindo da premissa de que na poesia a unidade de efeito é imprescindível, o autor afirma
que:

Se uma obra é demasiada extensa para ser lida de uma vez só, deve-se
dispensar de bom grado o importantíssimo efeito gerado pela unidade de
impressão – pois, se tiver de ser lida em dois momentos distintos, os
assuntos mundanos interferem no texto e seu senso de totalidade é
destruído. (POE, 2017, p. 343)

No caso da poesia, e também do conto, é importante verificar a extensão do poema de


acordo com o efeito que se deseja causar no leitor, tendo-se em mente que a extensão do texto
permita que este seja lido de uma só assentada.
A segunda questão, comentada anteriormente, consiste em escolher o efeito poético a
ser transmitido. No caso do texto poético, por exemplo, Poe afirma que o efeito almejado
deve ser trabalhado na província da beleza: “Na verdade, quando se fala em beleza, não está se
referindo exatamente a uma qualidade, como se supõe, e sim a um efeito – está se referindo,
em suma, à intensa e pura elevação da alma, não do intelecto ou do coração.” (POE, 2017, p.
345)
Observa-se que, segundo a perspectiva de Poe, a beleza deve ser tomada por efeito, e
não por qualidade, podendo se manifestar das mais diversas formas. Após escolher a beleza
como esfera central, o próximo passo é decidir o tom sem itálico dessa manifestação. O tom

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escolhido por Poe é a tristeza, já que para ele não há tom poético mais legítimo. O autor afirma
que o efeito melancólico é tão intenso que é capaz de levar até os menos sensíveis às lágrimas.
Portanto, o processo de composição parte da consideração da extensão, da esfera, e por
último, do tom. Determinados esses elementos, Poe segue em busca de um estimulo artístico
que possa servir à composição do poema, uma base sólida que sustente toda a obra.Na
composição de “O corvo”, o autor afirma não ter dificuldades para rapidamente perceber que
um recurso que poderia ser utilizado para o alcance do efeito de beleza e do tom de tristeza
seria o refrão.
Tendo em vista esse recurso, Poe opta pelo uso de uma única palavra única como
refrão. Essa palavra deveria ser curta, pois uma frase longa iria dificultar o uso de variações no
refrão. Dessa forma, quanto mais breve fosse o refrão, mais fácil seria usar variações.
Delimitada a palavra, Poe passa a refletir sobre o som do refrão mais apropriado a seus
propósitos, dentre os quais estava a manutenção da melancolia. A expressão que lhe ocorre é
“nevermore” – nunca mais –, sendo necessário um gatilho para usá-la continuamente.
Uma das dificuldades expressas por Poe reside em atribuir a expressão, repetidamente,
a um ser humano, algo que se tornaria monótono e incoerente à capacidade de raciocínio do
indivíduo que haveria de repeti-la. O autor atribuir o enunciado, então, à uma criatura
irracional que fosse capaz de articular palavras. De início, Poe pensou em um papagaio, mas
depois lhe ocorreu a figura de um corvo, um animal que também é dotado de tal capacidade e
que se afinaria muito mais ao tom de tristeza que Poe havia conferido ao poema.

Cheguei assim à seguinte elaboração: um corvo, pássaro de mau agouro,


repetindo monotonamente uma única palavra “nevermore”, no fechamento
de cada estrofe de um poema de aproximadamente cem linhas escrito em
tom melancólico. (POE, 2017, p. 347)

Tendo em vista essa dinâmica de estruturação feita por Poe, Diniz comenta:

Poe adota o entendimento de que o texto literário é organizado de modo a,


em certo ponto da narrativa, ser interpelado por uma “subcorrente”. Em um
primeiro plano do texto, aqui denominado “corrente” em oposição ao termo
“subcorrente” utilizado por Poe, encontram-se combinações de elementos e
incidentes que constituem o quadro narrativo logo posto à vista. Tais
combinações são submetidas a um estado de tensão à medida que a
“subcorrente” vem à superfície, confronta-se com a corrente e a esta confere
significações que até então não teriam sido depreendidas pelo leitor.
(DINIZ, 2017, p. 105)

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Dessa forma, podemos identificar a organização dos elementos que compõem a
estruturação da narrativa de Poe, que neste caso exemplifica-se por meio de um poema. Após
escolher os procedimentos principais da composição, Poe fez com antecedência uma relação
conjunta dos itens escolhidos. O tom selecionado para o poema foi a melancolia, o tema mais
melancólico de todos para Poe é a morte e o efeito é o de beleza, que seria obtido pela
apresentação da morte de uma bela mulher.

1.2 O conto de horror no projeto estético de Poe

Em “A Queda da Casa de Usher”, um dos contos analisados neste estudo monográfico,


o efeito escolhido por Poe é o medo, o terror psicológico. Logo no início da narrativa, o
narrador lança ao leitor a sensação de terror que envolve o ambiente e as personagens. O
sujeito não nomeado afirma que foi acometido por um “insuportável sentimento de angústia”
que invadiu sua alma, provocado pelas “mais cruéis imagens de desolação e terror”. Essas
sensações são retomadas em várias passagens do conto.
Dessa forma, toda a narrativa é construída com base no efeito escolhido, que nesse
caso foi o medo. Esse efeito vai permear todo o conto e determinar a construção do espaço, a
organização do tempo e a caracterização das personagens. O principal elemento utilizado para
a geração desse efeito é o estranho, o desconhecido.
Como afirmaria Lovecraft, anos após Poe, no ensaio “O Horror Sobrenatural na
Literatura”: “A emoção mais forte e mais antiga do homem é o medo, e o medo mais antigo e
mais forte é o medo do desconhecido.” (LOVECRAFT, 1973, p. 1) Então, quanto maior for o
espanto causado por esse elemento desconhecido, mais amedrontador será o efeito sob os
personagens e sobre o leitor.
Em “A Queda da Casa de Usher”, observa-se a relação de causa e efeito preconizada
por Poe em seu ensaio. O tom é melancólico, e tanto a ambientação da narrativa quanto as
características das personagens são mórbidas e obscuras. Conforme afirmado pelo narrador nas
linhas introdutórias do conto,

Ao longo de um letárgico, sombrio e silencioso dia de outono, quando as


nuvens pairavam baixas e opressoras no céu, percorri sozinho a cavalo uma
área desolada da região e, por fim, envoltas nas sombras crepusculares que
se avizinhavam, avistei ao longe a melancólica casa de Usher. (POE, 2017,
p. 53)

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Ao invés da beleza, que foi escolhida para o poema O Corvo, em “A queda da Casa de
Usher” temos como esfera do conto a província da insanidade, que permeia Roderick Usher
em seus últimos momentos de existência.
Outro aspecto relevante da composição de Poe neste conto é notado na passagem em
que o narrador, que está imerso naquele ambiente desconhecido e tenebroso, ajuda Roderick a
enterrar Madeline Usher – irmã de Roderick – após sua aparente morte.
Tem-se explorado, aqui, o aspecto da dupla personalidade, que caracteriza a relação
entre Roderick e Madeline. Poe filosoficamente experimenta uma divisão entre mente e corpo
associando Roderick exclusivamente ao primeiro e Madeline exclusivamente ao segundo.
Esse efeito de duplicidade, também conhecido por “doppelgänger” ressalta a separação entre
corpo e mente. Esse efeito duplo também é sugerido a partir da rachadura da casa, já que a
fenda simboliza a separação de dois pedaços, pedaços estes que podemos associar aos gêmeos
Usher.
O conto aborda o duplo gótico de três maneiras diferentes. Primeiro, o leitor identifica
Roderick como o personagem principal e sua irmã como seu duplo. Além de serem gêmeos,
Roderick e Madeline sofrem de doenças desconhecidas, que acabam por levá-los à morte.
Em segundo lugar, o duplo assume a forma do tipo de personalidade dividida, pois os
gêmeos representam o medo filosófico da divisão entre o corpo e a mente, sendo Roderick a
expressão da mente e Madeline a do corpo. Enquanto o contraste constante entre os gêmeos se
intensifica, o terror e o fato de que suas vidas dependem tanto uma da outra sugerem que uma
divisão completa entre o corpo e a mente é impossível. Assim, a história sublinha a
necessidade de um indivíduo chegar a um acordo entre o corpo e a mente para completar sua
individualidade.
Finalmente, em terceiro lugar, Poe faz uso do duplo maligno também. Em "A Queda
da Casa de Usher", a própria casa funciona como o alter ego demoníaco de Roderick e
Madeline. A casa é apresentada como uma entidade viva do mal, que também é um símbolo
para a família Usher. Sendo parte da identidade e do passado dos gêmeos, a casa pode ser lida
como um “eu” obscuro dos irmãos, com os quais eles não se identificam. Sua incapacidade de
chegar a um acordo com seu próprio lado sombrio leva-os a suas mortes sociais e físicas.
Assim, a história sublinha a necessidade de aceitar o próprio ser escuro ou o próprio passado
como um componente vital na socialização de alguém. Portanto, Poe de fato conseguiu
internalizar o terror gótico usando o tema doppelgänger de três maneiras diferentes.

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Ainda sobre o duplo na obra de Poe, em "A Queda da Casa de Usher", o autor usa o
duplo significado do título (a destruição da família Usher, juntamente com a queda de sua
moradia) em toda a extensão. Ele também usa o simbolismo quase alegórico para elevar o
significado da narrativa, descrevendo a casa como tendo "janelas parecidas com os olhos
vazios" (POE 2017, p. 54) e outras características faciais. Nesta e em muitas outras histórias
de terror, Poe usa linguagem descritiva e recursos visuais arrepiantes para dar às histórias um
senso gráfico e realista de terror.
O conto aborda a íntima conexão entre corpo e mente pela apresentação dos gêmeos
biológicos Roderick e Madeline. Sugere, além disso, que o relacionamento entre gêmeos
envolve não apenas a semelhança física, mas também a comunicação psicológica ou
sobrenatural. Nota-se que quando a doença afeta um deles, ela se espalha contagiosamente
para o outro. Tendo em vista essas atribuições, percebemos que Poe explora essas ligações
misteriosas entre as personagens, ligações estas que transcendem as definições do real que
conhecemos e que dão um tom sobrenatural à narrativa.
Outro detalhe importante que está presente no conto de horror de Poe é a criação da
atmosfera sombria para a narrativa, e seu efeito no leitor. Primeiramente, o leitor deve ser
atraído para a história para que o potencial desta seja totalmente explorado. Assim, a
descrição minuciosa de um lugar tem o papel de influenciar o leitor, preparar sua imaginação
para os acontecimentos do conto, potencializando o impacto da atmosfera. Isso torna mais
fácil para o autor provocar o efeito que ele ou deseja com o uso de uma configuração
apropriada.
Contudo, Poe nem sempre faz uso dessa estratégia. Ele é capaz de criar uma atmosfera
densa sem precisar detalhar sua localização. E segurar a atenção do leitor dessa forma é uma
tarefa bastante exigente, mas que Poe faz com maestria.
Portanto, é importante equilibrar o real e o sobrenatural. Poe lida com isso de forma
admirável. Embora às vezes ele use aspectos que parecem inacreditáveis, eles não são
artificiais e não perturbam a realidade ostensiva do conto. Assim, as histórias de Poe estão
sempre próximas o suficiente da realidade, permitindo ao leitor acreditar e fantasiar o
suficiente para que seja tomado pelo medo.

18
1.3 O gótico no projeto estético de Poe

A ficção gótica no projeto estético de Edgar Allan Poe compreende uma variedade de
temas e motivos. Entre os elementos do gótico verificáveis nos textos de Poe estão os temas
da morte e da decadência, que são elementos centrais nesse tipo de narrativa. Outros
elementos característicos do gótico que se fazem presentes na narrativa de Poe são a loucura,
a insanidade, o caos interno, o sobrenatural em todas as suas formas e os locais assombrados
ou assustadores. Boa parte dos poemas e contos de Poe explora esses elementos.
Um dos temas mais proeminentes na ficção gótica de Edgar Allan Poe é a morte,
antecedida do processo de decadência do indivíduo. Na maior parte de seus contos, um dos
personagens morreu ou está se lamentando, e isso define o tom sombrio encontrado nas obras
de Poe. Outra característica notável na narrativa de Poe é que o processo de decadência do
indivíduo está atrelado a acontecimentos sobrenaturais. Isso é claramente observado em “A
Queda da Casa de Usher”, em que a casa decai à medida que o mesmo ocorre com seu
proprietário.
No conto de Poe, a morte é uma sombra que se estende por toda a história,
especialmente porque parece que a casa e Roderick também estão se encaminhando ao fim
inevitável. Em meio a tanta obscuridade, é possível notar uma mescla entre real e
sobrenatural, o que se associa às alucinações sofridas por Roderick Usher. Esses dispositivos
do enredo convidam o leitor a associar a morte ao sobrenatural e ao grotesco. Em geral, a
morte e o processo de decadência são temas centrais na narrativa de Poe e não estão ali
simplesmente como elementos de fundo. Ao invés disso, funcionam como elementos-chave
em muitos de seus contos.
A loucura é outro elemento presente na ficção gótica de Poe e verificado em alguns de
seus contos mais conhecidos, como “O Barril de Amontillado”, “Ligeia” e “O Coração
Delator”. Em “Ligeia”, por exemplo, a loucura está associada à doença mental de Rowena,
que faz com que ela se comporte e fale de forma irregular. No final da história, quando o
narrador remove os envolvimentos para encontrar sua amante falecida, o leitor deve
questionar a sanidade da pessoa que conta a história. Assim, a loucura acrescenta um
elemento do desconhecido que é diferente das ocorrências sobrenaturais. Em “A Queda da
Casa de Usher”, a loucura também é claramente percebida, já que um dos personagens
principais, Roderick, está perdendo a razão. Como o narrador relata, o comportamento de
Roderick é estranho e sua aparência possui “[...] uma pele cadavérica, um olho grande, líquido

19
e luminoso além de comparação; lábios um tanto finos e muito pálidos.” (POE, 2017, p. 57)
Desse modo, acrescenta-se o tema da loucura em um texto no qual já se encontram os temas
da morte e do sobrenatural.
Geralmente, os personagens de Poe não possuem vínculos. Na maioria das vezes, não
vemos famílias, nem pais nem filhos. Seus narradores são sempre masculinos, e em sua
maioria não têm laços afetivos, sendo dessa forma espiritualmente e emocionalmente
separados do resto da sociedade. Pode-se dizer que a obra de Poe é bastante fria quanto a
questões de afeto em família. E complementando essa sugestão:

The beloved is always described in very general, conventional terms. She


is always a maiden of rarest beauty or a girl just ripening into womanhood.
Even when she speaks for herself – which is seldom – she remains a cliché,
an archetype; she has no personality, no role beyond that of expressing the
author’s intention.2 (Telegraph Reporters, 2016)

Por meio de toda essa aparente frieza na obra de Poe, existe um sentimento bastante
humano que envolve o texto e o leitor, e ter o conhecimento disso é suficiente para encher o
leitor não apenas com o horror, mas com empatia.
Para muitos, “O corvo” pode carregar certo mau presságio, mas o sentimento
permanece o mesmo: por trás das da narrativa gótica, ou mesmo do humor negro, há uma
genuína sensação de perda e arrependimento, de coisas belas desperdiçadas, sejam elas o
amor de uma bela dama, sejam grandes aventuras que terminam em tragédia.
Outra característica gótica na ficção de Poe é que quase sempre há locais remotos ou
assombrados nos quais a ação ocorre. Geralmente, esses locais assombrados se entremeiam à
morte e à loucura e aumentam o tom sobrenatural dos contos. Dessa forma, o gótico contribui
para a construção das narrativas de horror de Poe, e assim o faz a partir do espaço narrativo e
da ambientação. Um dos melhores exemplos é justamente o trabalhado neste estudo
monográfico. Em “A Queda da Casa de Usher”, a morte, a loucura, o espaço e a ambientação
estão interligados.
A casa, por exemplo, é descrita como um espaço em forma de cabeça, com uma
rachadura, e se associa ao estado mental de Roderick: a casa é sua cabeça, sua mente, sua
sanidade. A rachadura é a insanidade que levará a linhagem dos Usher à ruína. Assim, a casa
ecoa o estado mental do morador e, quando ela vem abaixo, o sujeito também cai.
2
A amada é sempre descrita em termos muito gerais e convencionais. Ela é sempre uma donzela de beleza mais
rara ou uma garota apenas amadurecendo até a feminilidade. Mesmo quando fala por si mesma – o que
raramente acontece – ela permanece um clichê, um arquétipo; ela não tem personalidade, nenhum papel além de
expressar a intenção do autor.
20
A marca de ficção gótica de Poe difere muito da de outros autores que também
empregam elementos do sobrenatural. Alguns autores do gênero, como Mary Shelley, buscam
explorar os perigos da modernidade, como a ciência, a reanimação, enquanto Poe parece mais
interessado em contar um conto por si só. Embora morte, decadência e reanimação façam
parte de algumas das histórias de Poe, elas se relacionam mais ao amor, à loucura e à afeição
pelo obscuro. Como em “A Queda da Casa de Usher”, que é um conto sobre doença, loucura,
incesto e o perigo da criatividade irrestrita.
O conto é uma das histórias de horror mais populares e analisadas pela fortuna crítica
de Poe. Seus contos estão repletos de medo, angústia, loucura, dor e escuridão. Poe ainda
oferece aos seus leitores uma visão íntima da psique do personagem e fornece uma camada
adicional de vividez às suas histórias, assim fazendo com que o leitor sinta-se mais imerso e,
portanto, com mais medo. Há quem diga que são tão obscuros quanto às trevas do mais
sombrio pesadelo.

21
2. Howard Phillips Lovecraft e o conto de horror

2.1 H. P. Lovecraft e a tradição literária

Seguindo o legado de seu ilustre antecessor, H.P. Lovecraft é o próximo escritor a


introduzir novos elementos na literatura de horror norte-americana. E de acordo com
informações extraídas com base na publicação de Duarte (2013, p. 3), Lovecraft nasceu e
morreu em Providence, capital de Rhode Island. Tornou-se leitor na infância e demonstrava
bastante interesse pela literatura e pela escrita. Lovecraft iniciou suas atividades literárias em
1905, mas foi em 1917 que elas se intensificam a partir do conto “A tumba” (1919), publicada
no periódico The Vagrant. Em 1923 é fundada a revista Weird Tales, e a pedido de colegas e
amigos, o autor envia seus contos para publicação. Pelo reconhecimento, Lovecraft iniciou
uma parceira com o editor da referida revista, Edwin Baird, o que contribui para a publicação
de vários contos do escritor. Porém, em 1924, Baird é demitido e Farnworth Wright assume o
cargo de editor-chefe da revista. Ele critica negativamente a ficção de Lovecraft e inclusive
nega a publicação de “Nas Montanhas da Loucura” (1931), alegando ser esta extensa demais.
Em contrapartida, atualmente essa novela é considerada uma das melhores obras do autor.
Lovecraft segue escrevendo contos e novelas até 1935, quando então cessa de produzir,
falecendo dois anos depois.
Seu único romance é O caso de Charles Dexter Ward (1927) e sua última narrativa
intitula-se “The Haunter of the Dark”, publicada em 1936, ainda não traduzida no Brasil. Suas
obras mais importantes são “O Chamado de Cthulhu” (1926), “A Cor que Caiu do Espaço”
(1927), “Um Sussurro nas Trevas” (1930), “Nas Montanhas da Loucura” (1931) e o referido
romance.
Pode-se considerar que a produção total de H.P. Lovecraft foi bastante modesta, se
comparada com a produção de Poe. Exceto por sua correspondência pessoal com outros
autores renomados, como Robert E. Howard, escritor de “Conan, O Bárbaro” (1932). Sua
vida foi relativamente curta, como a de seu ilustre antecessor, Edgar Allan Poe, e quase todas
as narrativas de Lovecraft estão nas formas mais curtas. Além de ficção, seus escritos
consistem em algumas poesias, alguns ensaios sobre literatura e ciência, e uma quantidade
imensa de correspondência pessoal. Lovecraft revisou e reescreveu um grande número de
trabalhos para outros autores, incluindo um conto para Harry Houdini. Embora algumas de
suas histórias tenham servido de base para filmes, as obras adaptadas raramente se pareciam
com os originais.
É evidente o diálogo entre as obras de Poe e de Lovecraft, não só pela temática do
gótico, mas até pelo uso exagerado de superlativos para descrever minuciosamente alguma
emoção, característica ou alguma coisa que esteja presente na narrativa. Ambos fazem uso do
sobrenatural e do obscuro em suas obras. Um exemplo desse diálogo é o romance de Poe, A
Narrativa de Arthur Gordon Pym (1938), que tem aspectos retomados em “Nas Montanhas da
Loucura” (1931) de Lovecraft, já que ambos tratam um mistério fantástico e abordam uma
enigmática expedição na Antártida.
Observa-se que do início do século XIX até quase a metade do XX, a ficção fantástica
dos EUA desenvolveu-se por meio da produção de quatro escritores: Washington Irving,
Nathaniel Hawthorne, Edgar Allan Poe e H.P. Lovecraft, que constituem o centro do cânone
da narrativa sobrenatural de horror norte-americana, e cada desenvolveu um projeto estético.
Lovecraft, que se situa no fim desse percurso, ocupa literariamente um lugar menor se for
comparar seu arco de obras com o dos outros autores mencionados, apesar de ser o único
escritor que apresenta, nas suas obras mais maduras, uma síntese literária entre o gênero
fantástico e a ficção científica de temática cósmica.
Não é tão comum mencionar a singularidade de Lovecraft ao abordar evolução do
gênero fantástico nos EUA, pois o autor não alcançou os holofotes que iluminaram Poe ou
Stephen King. De qualquer forma, Lovecraft é bastante reconhecido e prestigiado por um
público de leitores e adoradores da literatura de horror, já que sua obra também permeou e
exerce influência até os dias atuais em diversas vertentes da cultura pop como filmes, música
e arte.
Lovecraft foi um dos principais escritores norte-americanos do gênero e assim
contribuiu significativamente para a literatura fantástica universal. Mas mesmo tendo toda
essa genialidade ele nunca obteve o devido reconhecimento no campo da crítica literária. Um
dos diversos motivos dessa falta de visibilidade é o fato de suas obras ainda permanecerem
escassas em algumas línguas. No Brasil já foram traduzidas diversas de suas principais obras,
mas há muitas que ainda podem ser lidas apenas em inglês.

23
2.2 A ficção gótica e sobrenatural no projeto estético de Lovecraft

Tratando de temas semelhantes aos de Poe, tais como a morte e a loucura, Lovecraft
ainda aborda em suas obras a temática sideral, apresentando entidades cósmicas, inomináveis
e tão antigas quanto o universo. Segundo Guillermo Del Toro, “Lovecraft fala do tamanho do
homem no universo cósmico, e quem melhor articula a indiferença dos deuses antigos para
com o homem. Ele toma isso para sua obra e aposta alto no cosmos.” (WOODWARD, 2009)
O termo “Cthulhu” criado por Lovecraft deu origem à narrativa “O Chamado de
Cthulhu” (1926) e à expressão “Mitos de Cthulhu”, que se tornou um cânone de trama
brilhante e influente para suas criações literárias e passou a designar o conjunto de narrativas
que têm como referência especifica as antigas e inomináveis entidades Azathoth,
Nyarlathotep, Dagon, Shub-Niggurath, ou o universo desconhecido no qual as criaturas têm
origem. Tais criaturas possuem forma diferente de tudo que já contemplamos: proporções
gigantescas, cabeças polpudas, múltiplos tentáculos, corpo grotesco e escamoso, às vezes com
asas, quando vindos do espaço e outras vezes com guelras e membranas quando emergidos
das profundezas do oceano.
Neil Gaiman afirma o seguinte: “Não acho que Lovecraft resolveu de início: “Vou
criar um grande mito”. Acredito que apenas começou, e ao longo tudo foi se encaixando.”
(WOODWARD, 2009) Quem conhece a obra de Lovecraft sabe que sua mitologia parte de
uma combinação bastante complexa e centrada na ideia de que certas coisas, mais antigas que
a humanidade e até mesmo mais antigas que a Terra, estão nos observando com indiferença e
crueldade.
Uma questão que singulariza a ficção gótica e sobrenatural no projeto estético de
Lovecraft é que ao invés de demônios vindos do inferno, Lovecraft utiliza em sua ficção essas
criaturas de forma estranha e tentacular, sendo são oriundas de outros mundos distantes e
desconhecidos. Por alguma razão foram banidas de suas terras e vieram reivindicar ou até
mesmo colonizar o planeta dos homens.
Lovecraft proporciona ao leitor a sensação de que o cosmos é tão vasto e tomado por
poderes superiores incontroláveis que está além da compreensão humana. Antes de Lovecraft,
liam-se histórias de horror e de fantasmas com uma visão de um mundo, digamos,
hospitaleiro: “Deus cuida das pessoas boas”. E essas pessoas boas sempre sobreviviam
naquelas histórias de terror. Lovecraft redefiniu conceitos, afastando-se desse tipo de história,
propondo um mundo aterrorizado e cercado por coisas monstruosas e malignas, que tentam

24
dominar e não se importam com a humanidade – sejam boas ou más pessoas – todos estão
sujeitos ao mesmo risco de punição.
Os contos de Lovecraft possuem um ar de desolação e desespero, sejam essas
características mencionadas de forma direta pelo narrador, ou indireta pela descrição do
ambiente/atmosfera onde se passa a trama. Sua escrita se assemelha bastante à de Poe, pelo
uso exagerado de superlativos e adjetivos para enfatizar o efeito desejado, que na maioria das
vezes era o horror.
Um breve exemplo disso encontra-se em seu primeiro conto publicado, intitulado
“Dagon” (1917): “O sol ardia em um céu que aparentava quase negro em sua crueldade
límpida; como se a refletir o palude escuro como nanquim sob os meus pés.” (LOVECRAFT,
1917, p. 18) A narrativa trata de um marinheiro prisioneiro de piratas alemães que consegue
escapar, mas fica preso numa extensão de solo marinho elevada à superfície por uma erupção
vulcânica. “Dagon” e outros contos desse período estabeleceram o modelo lovecraftiano:
estudiosos que descobrem violações da lei natural e são conduzidos à loucura ou à morte.
Além disso, essas narrativas apresentam descrições barrocas e exploram a subjetividade.
Outra característica do seu projeto estético é a tendência a apresentar um narrador em
primeira pessoa. O modelo lovecraftiano basicamente consiste na caracterização de alguém
enlouquecendo enquanto escreve e algo se aproxima, como se o narrador, por exemplo,
estivesse escrevendo no quarto enquanto alguma coisa sobe os degraus em direção ao seu
recinto e instantes depois arranha a porta com seus tentáculos. Então, ao contemplar a
criatura, tudo acaba em reticências. Como disse Del Toro: “Lovecraft fazia e refazia inúmeras
vezes, até que as combinações ficassem ao seu gosto, que para alguns pode parecer tolice,
mas era um equilíbrio perfeito.” (WOODWARD, 2009)
Além de Poe, outra coisa que influenciou o estilo rebuscado de Lovecraft foi seu
fascínio com a obra de Lord Dunsany. Este possuía um estilo clássico influenciado pela Bíblia
do Rei James. O biógrafo e autor S.T. Joshi, afirmou numa entrevista para o documentário
“Fear of the Unknown”:
Lovecraft ficou tocado pelo panteão mitológico de deuses de
Dunsany, e eventualmente admitiu que foi de onde tirou a
ideia dos Mitos de Cthulhu. Tomou os deuses de Dunsany que
viviam em um mundo fantástico, e os colocou no mundo real
de forma caótica, criando sua própria mitologia cósmica.
(WOODWARD, 2009)

25
Pode-se distinguir claramente o projeto estético de Lovecraft se comparado ao de Poe
nesse aspecto sobrenatural e cósmico. Poe inclina-se mais para o lado do terror psicológico,
enquanto que Lovecraft mergulha fundo nas profundezas abissais do horror cósmico.
Além do tempo e geralmente além da individualidade, os personagens de Lovecraft
têm poucas distrações. Não há detalhes, objetivos, propósito, amigos, desvios, nada para se
medir. Em uma vida tão desimpedida quanto a do protagonista do conto “O Forasteiro”, o
tédio pode tornar-se aterrorizante à medida que horas, dias e meses e até mesmo décadas se
estendem para trás e para trás, numa paisagem estéril de semelhança imutável. Como
resultado, os personagens de Lovecraft são paradoxalmente atraídos para fora de si mesmos.
Há possivelmente um desejo ligado à tristeza existencial dos personagens.
Assim, as assombrosas entidades ilustradas com uma linguagem arcaica e sombria,
que brincam com o limiar da sanidade humana, são uma metáfora para a frágil posição
ocupada pelo homem; e, se o autor busca infundir o medo em seus leitores, isso se dá não por
entretenimento, mas pela intuição de que a vida é um sinônimo para o medo, já que tudo é
desconhecido e destruidor.

2.3 O conto de horror no projeto estético de Lovecraft

Segundo Peter Straub, “Lovecraft soltou as amarras do que chamamos horror,


recriando-o do seu jeito, inventando seu próprio gênero.” (WOODWARD, 2009) Nesta seção,
aborda-se o horror na narrativa de Lovecraft por meio de um de seus principais contos: “The
Outsider” (1926), que em português significa o forasteiro, o lado de fora. Ambas as traduções
fazem sentido já que a criatura que habita o castelo desconhece sua própria origem e nunca
contemplou o lado de fora de tal edificação. Também serão feitas referências aos Mitos de
Cthulhu.
Diversas vezes incluído em compilações e republicado, um dos trabalhos mais
conhecidos de Lovecraft é provavelmente o conto um pouco atípico “The Outsider”. No texto,
contempla-se um narrador sem nome que lamenta sua juventude infeliz e bizarra. Ele cresceu
desprovido de contato humano em um castelo sombrio e decadente, cheio de “corredores
esfarrapados” e úmidos que cheiram a “cadáveres empilhados de gerações mortas”.
O efeito dessa história sobre o leitor é assustador, mesmo que a história, quando
analisada, seja um pouco absurda. Lovecraft consegue ganhar a empatia do leitor junto ao
narrador, de modo que a revelação de seu ser monstruoso é um choque. Ao mesmo tempo, a

26
história se volta essencialmente para uma enganação inteligente: o leitor é levado a
identificar-se com uma criatura deformada que se revela um cadáver, zumbi, carniceiro ou
algo do tipo, um fato que não é revelado até o final da história. Assim, o leitor sensível
provavelmente se comove e se irrita com a história. Essa reação mista é característica de
muitas das histórias de Lovecraft, e qualquer tentativa de análise deve, de alguma forma, levar
isso em consideração.
Apesar de sua popularidade, “The Outsider” não sugere toda a gama de poderes do
autor. Na melhor das hipóteses, é uma história com mais ressonância do que substância, e
podemos ver uma notável influência de Poe, já que Lovecraft também faz uso do espaço
isolado para a instauração do horrível e do sobrenatural. Ambos permitem que a ambientação
dialogue com o comportamento das personagens.
Para apreciar os contos de Lovecraft, é preciso levar em conta algo erroneamente
chamado “Cthulhu Mythos” (Mitos de Cthulhu). O termo foi cunhado por August Derleth,
mas Cthulhu não é realmente a principal figura na rica obra do escritor. Os Mitos de Cthulhu
não brotaram completamente da cabeça de Lovecraft, mas emergiram em pedaços. Em
“Nyarlathotep”, um fragmento, Lovecraft apresentou a primeira figura importante em seu
panteão. “The Nameless City” introduziu o “árabe louco, Abdul Alhazrad”, autor do
Necronomicon, um texto fictício de feitiços mágicos e conhecimento arcano que se tornou a
bíblia dos Mitos de Cthulhu. O livro em si foi trazido para “The Hound” e “The Festival”,
sendo que a última história tem o espaço narrativo disposto na região de “Arkham,
Massachusetts”, local da maioria dos contos dos Mitos. Não foi até 1926, no entanto, que
Lovecraft realmente consolidou suas ideias e as apresentou em uma única história, “The Call
of Cthulhu”.
O Necronomicon tornou-se muito influente em outras vertentes da arte, como no
cinema, tendo sido adotado por Sam Raimi no filme The Evil Dead (1981), o próprio filme
Dagon, de Stuart Gordon (2001), e também na música em que a banda natalense “Sanctifier”
fundada em 1989, apresenta temática lírica e estética influenciada pelas obras Lovecraftianas,
ainda possui vários álbuns e músicas que fazem referência ao arsenal de Lovecraft, dentre elas
as músicas: Necronomicon – The Book of the Damned; Cthulhu The Unspeakable; The Old
Ones Are, The Old Ones Shall Be; Shoggoths Lullaby.
A suposição artística dos Mitos de Cthulhu é que, na década de 1920, as habituais
ameaças da ficção de horror como Satanás, demônios, lobisomens e vampiros haviam se

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tornado obsoletas. Lovecraft precisava de um novo tipo de ameaça, uma de acordo com as
visões contemporâneas dos humanos e seu lugar no universo.
O metafísico por trás dos Mitos de Cthulhu é afirmado no famoso primeiro parágrafo
do “The Call of Cthulhu”:
A coisa mais misericordiosa do mundo é, segundo penso, é a incapacidade
da mente humana de correlacionar todos os seus conteúdos. Vivemos em
uma ilha plácida de ignorância no meio dos mares negros do infinito, e isso
não significa que devemos viajar para longe. As ciências, cada uma
esforçando-se em sua própria direção, até agora nos prejudicaram pouco;
mas, algum dia, a junção do conhecimento dissociado abrirá visões
aterrorizantes da realidade e de nossa assustadora posição, de que ou
enlouqueceremos da revelação ou fugiremos da luz mortífera para a paz e a
segurança de uma nova era das trevas. (LOVECRAFT, 2014, p.64)

Nos Mitos de Cthulhu, essa “realidade aterrorizante” consiste em uma ordem de seres,
vastos, assombrosos, poderosos e imortais, que pairam nas bordas da consciência dos
humanos, posicionados para entrar em seu mundo e varrê-los como se fossem criaturas débeis
e inúteis. E seguindo a ideia fantástica de todos esses adjetivos utilizados acima, é correto
afirmar que o conto de horror se ramifica em vários outros subgêneros, e nessa grande gama
serão encontrados todos os diferentes graus do horror: psicológico, social, alegórico, gótico,
ficção científica, fantasia, entre muitas outras subdivisões, os quais possuem como função
principal causar o sentimento tão frequentemente explorado por Lovecraft: o medo.
Uma das dúvidas mais frequentes entre os leitores do gênero horror/terror é distinguir
a diferença entre ambos. Se fôssemos categorizar esses dois gêneros poderíamos dizer que o
horror trataria do medo em seu estado mais interno e psicológico; o horror íntimo do homem,
o medo de olhar embaixo da cama, ou ir à cozinha durante a madrugada, ou, ainda, o medo de
um estranho na rua ou de um assassino em série, por exemplo. O terror, por outro lado, trata
de levar o leitor ao mundo das anomalias naturais e sobrenaturais, explorando o medo visceral
do ser humano, do inevitável, de criaturas monstruosas, daquilo que foge do seu
conhecimento mundano.
Como afirmou o autor Ramsey Campbell no documentário “Lovecraft: Fear of the
Unknown”, “Qualquer tipo de horror sobrenatural que se pensar é quase certo que em algum
momento de sua carreira, Lovecraft o tenha desenvolvido. E quando o fazia direito, o que era
frequente, era inigualável!” (WOODWARD, 2009) Com isso Campbell reforçou a grande
influência que Lovecraft exerceu e continua exercendo no gênero horror. Seja na literatura, no
cinema, na música ou em qualquer outra vertente que remeta ao gênero.

28
Podemos complementar que Lovecraft fez uso desses gêneros de forma única,
sobretudo quando se trata do terror. O autor criou todo um universo cósmico repleto de
criaturas monstruosas, inomináveis e desconhecidas pela humanidade. Neil Gaiman
acrescenta: “Lovecraft definiu os temas e obsessões de horror do século XX, e ao entrarmos
no século XXI ele se mantém presente.” (WOODWARD, 2009)
Uma transgressão inicialmente proposta por Poe e posteriormente adotada por
Lovecraft foi a extinção de convenções literárias como o final feliz, a virtude recompensada e
a didática moral vazia generalizada, a aceitação dos valores e padrões populares e os esforços
empregados pelo autor para infiltrar suas próprias emoções na narrativa e postar-se ao lado
dos partidários das ideias superficiais da maioria.
É fato que Lovecraft faz uso do obscuro, e isso se mostra em contrapartida à maioria
das narrativas mitológicas tradicionais nas quais o suposto herói adentra num mundo
maravilhoso de onde emerge realizado. Os protagonistas de Lovecraft lançam-se às
profundezas do horror e do desespero apenas para emergir com o conhecimento de que a
humanidade não tem importância alguma na vastidão do cosmos.
Portanto, se é possível extrair uma reflexão filosófica das obras literárias de Lovecraft,
ela exprime a condição de que o universo não foi criado por uma inteligência divina que
prescreveu aos homens um propósito. O conto de horror de Lovecraft mostra o cosmos como
algo imperiosamente indiferente aos homens, e estes se debatem em suas próprias limitações
fisiológicas na busca de sentido para – segundo o autor – as suas existências insignificantes.

29
3. Análise dos contos

3.1 A simbologia e a figuração da casa/castelo

A casa de Usher possui bem mais que o sentido de uma edificação ou moradia. Ela
pode simbolizar o ser ou a família que a habita. A casa é uma referência a refúgio e abrigo,
como um símbolo materno de proteção, um escudo que possa proteger aqueles que nela
habitam dos infortúnios do mundo exterior. Desse modo, pode-se afirmar que a casa é a
realização concreta dos seus habitantes. Cada cômodo da edificação pode ter um significado
mais amplo, como o interior do ser que a habita e seus segredos mais íntimos. Pode-se dizer
que a casa e seu morador são uma única coisa, devido à imensa cumplicidade que há entre
ambos.
Outro aspecto importante que foi notado nos contos analisados é que o espaço físico e
a atmosfera em que as personagens estão situadas estão profundamente associados às suas
personalidades, dessa forma moldando todos os seus atos ao longo da narrativa.
Tanto o ambiente interno quanto o externo, dependem de outros fatores para serem
identificados na narrativa. É sabido que o ambiente é a localização, o cenário que se situa no
espaço. É onde os fatos narrados acontecem, o meio, onde reina o clima no qual se desenvolve
a ação. Segundo Wellek e Warren (1976, p.275): “O ambiente é o meio circundante; e este,
especialmente o interior doméstico, pode ser concebido como expressão metonímica ou
metafórica da personagem. A casa em que um homem vive é um prolongamento deste.
Descrevê-la é descrever o seu ocupante”.
É através dele que se pode ter uma noção de espaço na trama. O ambiente é toda a
geografia da narrativa, é o lugar onde agem as personagens, e estes podem ser percebidos por
vários elementos como cor, som etc. Ambiente e casa são elementos muito importantes no
conto. A paisagem e o ambiente ao redor dela são essenciais para sentir-se imerso na
atmosfera da obra. Nesses dois contos trabalhados, a descrição do ambiente é parte
fundamental para descrever o horror que há no cenário e nos personagens.

O ambiente pode ser a expressão de uma vontade humana. Pode, ainda, o


ambiente constituir uma determinação causal em geral o ambiente
entendido como uma relação de casualidade física ou social, algo que o
indivíduo, por si, pouco pode controlar. (WELLEK e WARREN, 1976, p.
275)
Wellek e Warren interpretam o ambiente como um cenário onde o ser que nele está
situado expressa as suas vontades e ações. É através do ambiente que o indivíduo se apresenta
e se torna ativo. Afirmam também que o ambiente é algo incontrolável pelo indivíduo.
Logo, pode-se perceber que o ambiente, e por que não dizer a casa, é a personagem
principal do conto de Poe. Há uma relação de paralelismo entre casa e morador. Quando o
morador entra em colapso, a casa também vai à ruína. A casa em que um homem vive é um
prolongamento deste. Descrevê-la é descrever o seu ocupante. Seguindo a perspectiva de Poe
e como será visto adiante, de Lovecraft, percebe-se a relevância da casa no conto e na vida do
ser humano. A casa é extensão de seu morador, não se pode descrever um sem descrever o
outro. Ambos estão unidos, um é reflexo do outro.
Do mesmo modo que a casa de Usher reflete sua personalidade, no conto “The
Outsider” tem-se o decrépito castelo descrito como: “infinitamente velho e horrível, cheio de
passagens escuras e de tetos onde os olhos podiam descobrir não mais que teias de aranhas e
sombras”. (LOVECRAFT, 2005, p. 125) Era essa a moradia em que habitava o forasteiro, o
ser sem nome que desconhecia sua própria origem e era frequentemente atormentado por suas
perturbadoras memórias de infância.
Em ambos os contos pode-se perceber que a moradia (como serão tratadas a casa de
Usher e o castelo em que vivia o forasteiro) é um dos, se não o mais importante elemento na
narrativa, por ser apresentada como um microcosmo, uma dimensão que representa abrigo,
repouso, luz e trevas. O lugar onde nasce e morre uma história, a ascendência e culminância
de quem a habita.
Após a leitura dos contos, foi possível perceber que é na moradia onde ficam
preservadas as lembranças das personagens, e quando a casa possui cômodos onde se
guardam pedaços de um passado distante, como é o caso de Roderick Usher no texto de Poe e
do forasteiro no conto de Lovecraft, significa que essas memórias têm esconderijos cada vez
mais difíceis de serem acessados. Esses espaços tornam ainda mais aterrorizante a experiência
de se aventurar nas páginas de ambos os contos.
Pode-se assim compreender com maior clareza a simbologia da casa no conto “A
Queda da Casa de Usher” de Poe. A casa neste conto é uma continuação da linhagem da
personagem, um espelho de seu morador. Ela é o seu ambiente, e a paisagem e imagens deste
ambiente refletem o caráter, a personalidade, a intimidade e o estado de espírito do seu
morador. Retornando Wellek e Warren:

31
A imagem pode ser visual, auditiva ou inteiramente psicológica. Em
escritores como Poe, podemos ver que o ambiente (um sistema de adereços
de cena) é frequentemente uma metáfora ou um símbolo; o mar
encapelado, a tempestade, a duna selvática, o castelo em ruínas sobre o
lago frio e escuro. (WELLEK e WARREN, 1967, p. 232)

Para os Wellek e Warren, no conto de Poe o ambiente é inserido em forma de


metáfora ou de símbolo. “[...] Corredores escuros e intrincados; excessiva antiguidade;
descoloração; sombrias tapeçarias nas paredes; negrura de ébano dos assoalhos;
fantasmagóricos troféus; mobiliário incômodo [...]” (POE, 2017, p. 56) Logo se pode perceber
que a imagem da casa nesse conto quer dizer muito mais que uma simples construção. Ela é o
símbolo de algo muito maior. Simboliza o interior da personagem, sua alma, o seu eu mais
profundo, uma vez que já foi afirmado que a casa e seu habitante são uma coisa só.
Seguindo essa observação, é possível afirmar o mesmo sobre a ambientação na obra de
Lovecraft, pois a maior parte do ambiente também é descrita de forma metafórica, como se
verifica na passagem a seguir: “Cômodos enormes e tristes, entre cortinados marrons e fileiras
enlouquecedoras de antigos livros, espantadas vigílias, passadas entre renques de árvores
descomunais”. (LOVECRAFT, 2005, p. 124)
Edificações horríveis como essas que estão sendo analisadas refletem claramente seus
respectivos hospedeiros. Desde o obscuro castelo de localização desconhecida até a casa da
família Usher que está à beira da ruína.
De um lado temos o forasteiro, um ser que desconhece sua própria linhagem, e jamais
viu sua própria face. Tudo que ele sabe foi consequência do que aprendeu nos livros e
manuscritos que leu durante longas décadas em confinamento no castelo.
O personagem Roderick, por sua vez, tem plena consciência da decadência do seu
estado físico e mental, ou seja, ele já pressente a sua própria destruição. Não só a dele, mas
também a da casa, logo a de sua linhagem. E a casa é uma parte dele.
No conto de Poe, a combinação entre o estado mental das personagens e o ambiente
em que elas se encontram é vital para a decadência deles, ou seja, o ambiente possui uma
influência muito forte sobre as personagens e acaba levando-as à morte. A casa pode
influenciar seus moradores tanto para o bem quanto para o mal. No caso do conto de Poe,
pode-se acreditar que foi para o mal, pois a casa e sua decadência são vistas como um dos
principais fatores que levam os últimos representantes da família Usher à destruição.
Já no conto de Lovecraft, o castelo não guiou o seu habitante para o bem nem para o
mal. O espaço o manteve no desconhecido, na inocência, de certa forma, abstendo-o do que

32
existe lá fora e do conhecimento mundano. O título do conto deixa bem claro: “The Outsider”,
que traduzido remete a algo como “o forasteiro”, “o lado de fora”.
Em ambos os contos as descrições do cenário causam a impressão de horror, como a
casa de Usher que tristemente é refletida em um lago. Da mesma forma que no conto de
Lovecraft, o castelo é descrito envolto por árvores grotescas com galhos retorcidos. Dessa
forma, chegamos à conclusão de que não só a casa ou castelo, mas os elementos existentes ao
seu redor podem transmitir impressões e reações não só para as personagens, mas
principalmente para o leitor. Esses dois contos em específico são permeados de imagens
assustadoras que dão um clima de suspense e terror na narrativa.

3.2 Um diálogo entre os contos

Há quem conheça Poe e nunca tenha ouvido falar em H.P. Lovecraft, mas pouco
provavelmente o contrário. Um dos objetivos desse trabalho é dar maior divulgação à obra de
Lovecraft no Brasil e trazer aos leitores desse estudo os aspectos semelhantes entre esses
autores e algumas de suas principais obras. Para isso, foram selecionados os contos “A queda
da Casa de Usher”, de Poe e “The Outsider”, de Lovecraft, para fazer uma comparação entre
diversos efeitos similares que permeiam esses textos.
Nesse diálogo, faz-se uma comparação entre as características gerais das obras
selecionadas, levando-se em consideração a perspectiva de Osman Lins sobre o estudo do
espaço na narrativa:
O estudo de uma determinada personagem será sempre incompleto se
também não for investigada a sua caracterização. Isto é: os meios, os
processos, a técnica empregada pelo ficcionista no sentido de dar
existência à personagem. Pode-se dizer, a grosso modo, que a personagem
existe no plano da história e a caracterização no plano do discurso. A
personagem diz respeito ao objeto em si; a caracterização, à sua execução.
Esta a distância que subsiste entre espaço e ambientação. Por ambientação,
entenderíamos o conjunto de processos conhecidos ou possíveis,
destinados a provocar, na narrativa, a noção de um determinado ambiente.
Para a aferição do espaço, levamos a nossa experiência do mundo; para
ajuizar sobre a ambientação, onde transparecem os recursos expressivos do
autor, impõe-se um certo conhecimento da arte narrativa. (LINS, 1976 p.
78)

Nesta seção, dá-se continuidade à análise dos contos. É evidente que “A queda da casa
de Usher” possui fortes características do conto de horror: uma casa mal-assombrada, uma
paisagem mórbida, uma doença misteriosa e uma personalidade dupla. Porém, apesar de todos

33
os seus elementos góticos serem facilmente identificáveis, parte do terror desta história está
em sua imprecisão, já que não podemos afirmar precisamente em qual lugar a narrativa e ano
se passa (percebe-se apenas que se trata de um ambiente europeu ou norte-americano do final
do século XVIII ou início do século XIX). Em vez de marcadores narrativos precisos de lugar
e tempo, Poe usa elementos góticos tradicionais, como mau tempo e uma paisagem árida.
Neste conto estamos sozinhos com o narrador neste espaço assombrado, e nem o leitor nem o
narrador sabem o motivo.
Embora o narrador seja um íntimo amigo de infância de Roderick, ele aparentemente
não sabe muito sobre Mr. Usher, como o fato básico de que Roderick tem uma irmã gêmea.
Poe sugere ao leitor o questionamento dos motivos da decisão de Roderick de contatar o
narrador em um momento de necessidade. Enquanto Poe fornece os blocos de construção
reconhecíveis do conto gótico tradicional, ele contrasta essa forma-padrão com um enredo que
é inexplicável, súbito e cheio de interrupções inesperadas, tornando-a bem característica. A
história começa sem qualquer explicação completa dos motivos do narrador para chegar a
casa de Usher, e é justamente essa ambiguidade que enfatiza o tom para uma trama que
continuamente funde o real e o sobrenatural.
Poe adota uma sensação claustrofóbica nesta obra. O narrador é misteriosamente preso
pela atração de Roderick, e ele não pode escapar até que a casa de Usher desmorone
completamente. Os personagens não podem se mover e agir livremente na casa por causa de
sua estrutura instável, que assume um caráter monstruoso próprio. A edificação se torna uma
espécie de mentor sombrio que controla o destino de seus ocupantes.
Poe cria uma mescla entre os seres vivos e os objetos inanimados, fundindo a casa
física de Usher à linhagem genética familiar da família Usher, à qual ele se refere como a casa
de Usher. O autor emprega a palavra “casa” metaforicamente, mas ele também descreve uma
casa real. Não só o narrador fica preso dentro da mansão, mas também se percebe que esse
confinamento descreve o destino biológico da família Usher. A família não tem ramos
duradouros, portanto toda a transmissão genética ocorreu por meio de atos incestuosos nos
domínios da casa.
O efeito de claustrofobia na casa de Usher afeta as relações entre os personagens. O
narrador, por exemplo, percebe quase no final da narrativa que Roderick e Madeline são
irmãos gêmeos, e essa percepção ocorre quando os dois homens se preparam para sepultar a
madame Usher.

34
A configuração asfixiante e confinada da catacumba onde é colocado o corpo de
Madeline se espalha metaforicamente na caracterização dos personagens. Os gêmeos são tão
semelhantes que não podem se desenvolver como indivíduos livres. Retomando-se o sentido
de duplicidade e ligação mencionado anteriormente, Madeline Usher está sepultada, mas não
morta, porque sua semelhança com Roderick é como um caixão que mantém sua identidade.
Ela também é submetida a generalizações típicas, relacionadas a mulheres na literatura do
século XIX. Ela investe toda a sua identidade em seu corpo, enquanto Roderick é dotado das
habilidades intelectuais. Apesar dessa desvantagem, Madeline possui o poder na história,
quase sobrenatural às vezes, como quando ela sai de seu túmulo. Assim, ela neutraliza a
disposição fraca, nervosa e imóvel que pertence a Roderick.
A irmã gêmea de Roderick é fundamental para a lógica simétrica e claustrofóbica do
conto. Madeline sufoca Roderick impedindo-o de se ver essencialmente diferente dela. Ela
completa esse ataque quando seu irmão morre ao final da narrativa, levando consigo para o
túmulo qualquer resquício da linhagem dos Usher.
Tendo em vista os aspectos relatados nos parágrafos acima, analisa-se agora a obra “O
Forasteiro”. Nesse conto, Lovecraft relata um episódio da vida de um personagem misterioso.
Sabemos pouquíssimo acerca de sua personalidade e origem no início do conto. O que se sabe
é que ele nasceu em um castelo muito antigo e isso é provavelmente toda informação de que
dispõe o personagem das suas origens.
Sua identidade permanece desconhecida até mesmo para o próprio sujeito, que nunca
viu sequer sua própria silhueta. A narrativa é dirigida em forma de relato e em primeira
pessoa, o que confere maior credibilidade à obra. A primeira impressão percebida no conto é a
ambientação e sua relação direta com a condição de reclusão do personagem. Trata-se
basicamente de um castelo com características góticas e arquitetura antiga, torres, fossos e
passagens subterrâneas. Conhecemos a estrutura do castelo a partir da descrição do sujeito, o
que possibilita ao leitor relacionar a ambientação do conto à personalidade do indivíduo.
Assim como a casa de Usher, esse castelo possui características sombrias e macabras.
O protagonista estabelece um diálogo entre a ambientação do conto e sua própria condição
física e psicológica, reforçando-a enquanto a justifica por meio do castelo, por exemplo,
quando afirma logo no início do conto que “Infeliz daquele que recorda as horas solitárias em
salas vastas e sombrias” (LOVECRAFT, 2005, p. 124) Ele reconhece sua condição grotesca,
de isolado, e transfere a razão dessa condição para o castelo, que o acolhe enquanto
representação da sua solidão incondicional.

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Esse diálogo estrutura-se em sua relação com o escuro, construída durante o conto, em
que a busca pela luz simboliza a esperança do personagem, como na passagem a seguir:
“Estava sempre escuro e eu costumava acender velas e olhar fixamente para elas em busca de
consolo” (LOVECRAFT, 2005, p. 125) A contemplação da luz da vela, oposto da escuridão,
remete seu desejo de sair do castelo. Outra representação da luz da vela é que ela tem duração
finita e logo ele estará novamente no escuro.
O conflito interno do protagonista e a negação de sua condição de intruso guiam sua
busca interior por identidade e origem. A sua condição de prisioneiro está relacionada tanto às
paredes quanto à escuridão do castelo. “O sol não brilhava no lado de fora do castelo devido
aquelas árvores terríveis elevando-se para além da mais alta torre acessível” (LOVECRAFT,
2005, p. 124) A escuridão é um elemento bastante representativo na obra, e ela atua
retardando o desenvolvimento do personagem e fazendo com que o protagonista busque cada
vez mais a luz.
No conto de Poe, o narrador por algum motivo entrou na edificação, enquanto que no
conto de Lovecraft o protagonista almeja com todas as suas forças sair da edificação. Neste
conto também são notados efeitos claustrofóbicos e insanos, quando observada a descrição do
espaço narrativo. Outra característica semelhante à obra de Poe é a da indecisão, já que da
mesma forma que em “A Queda da Casa de Usher”, o leitor não sabe onde se localiza o
espaço e nem em que momento exato se passa a trama de “O Forasteiro”.
No decorrer do conto, após o protagonista enfrentar muitas dificuldades, ele consegue
enfim escapar dos confins do castelo. É interessante mostrar como Lovecraft caracteriza a
ascensão do personagem até a superfície do outro ambiente. Após várias tentativas, ele
consegue subir em uma das torres, onde abre uma espécie de alçapão. Ao chegar ao topo, ele
é recompensado por um vislumbre instantâneo da tão adorada Lua3, quando relata:

[...] fui tomado pelo mais puro êxtase que já conhecera, pois, brilhando
mansamente através de uma grade de ferro trabalhado e um curto lance de
degraus de pedra descendente, lá estava a Lua, cheia e radiante, que eu
jamais vira, exceto em sonhos e em nebulosas visões. (LOVECRAFT,
2005, p. 128).

O personagem finalmente contempla coisas jamais vistas por ele anteriormente, como
o vislumbre do luar e das árvores, e isso representa sua condição de liberdade. Após vagar
sem rumo, ele então se depara com um castelo onde está havendo uma festa. Ao entrar no

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Lovecraft escreve a palavra Lua com letra maiúscula para aumentar seu efeito para o personagem, assim
personificando-a para que exerça uma influência maior no indivíduo.
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local, os convidados correm gritando em desespero. Ele então supõe que há uma presença
horrível à espreita perto dele e fica assustado. Avistando a fera, ele supera seus medos e se
aproxima dela, finalmente tocando a “pata estendida” apodrecida da coisa. Aterrorizado, ele
foge de volta para o alçapão, mas o encontra bloqueado. Assim, ele é forçado a permanecer
nas margens do mundo exterior, alienado de todo contato com seus habitantes. Na última
frase da narrativa, o protagonista revela que o que ele tocou e o assustou tanto foi uma
superfície fria e inflexível de vidro polido, um espelho.

A partir do momento da narrativa em que o personagem conhece sua


imagem como forma exterior a si mesmo, ele passa por uma
transformação. Poderíamos ainda dizer que há uma perda da humanidade
presente no início do conto. O espelho, elemento ilustrativo para o Duplo,
assume seu papel principal quando permite ao personagem um ensaio da
sua própria condição. Um vislumbre e uma amálgama de sensações
propiciadas pelo seu reflexo. Trata-se de um confronto entre a imagem que
o personagem tinha de si mesmo (imaginada), incoerente em relação à
realidade, e a imagem real, relacionando imediatamente, de maneira
objetiva, o monstro a tudo aquilo que remonta à vida do personagem. Um
processo inverso ao da purificação, ou seja, uma perda da humanidade.
(RIBEIRO e JUNIOR, 2014, p. 13)

Ribeiro e Júnior também afirmam que “Propondo uma descrição estrutural do conto, é
possível dividi-lo em dois aspectos principais: (a) aquilo que acontece dentro do primeiro
castelo, em que o personagem se desenvolveu, e (b) aquilo que acontece no segundo castelo,
encontrado por ele após deixar o primeiro.” (RIBEIRO e JUNIOR, 2014, p. 11)
O efeito dessa história sobre o leitor é terrível, mesmo que o enredo, quando analisado,
pareça absurdo. Lovecraft consegue construir uma identificação simpática do leitor com o
narrador, de modo que a revelação de seu ser monstruoso é um choque. E embora Lovecraft
se assemelhe a Poe em certos aspectos relacionados à composição literária, cada um desses
autores possui suas próprias singularidades, que foram vistas no decorrer desse estudo
comparativo.

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Considerações finais

Neste estudo, buscou-se dialogar e confrontar conceitos próprios da literatura gótica


por meio das obras de autores com enorme peso representativo nesse campo, os americanos
Edgar A. Poe e H. P. Lovecraft. Após uma revisão feita tendo como base teóricos do gótico,
do fantástico e trabalhos que remetem a esta vertente literária, foi possível encontrar aspectos
relacionados a esta literatura nos contos “A Queda da Casa de Usher” (1839) e “O Forasteiro”
(1926).
Foi enfatizada a maneira como Poe e Lovecraft buscam construir a relação entre o
leitor e o texto a partir do compartilhamento das sensações vividas pelos personagens, a forma
como a ambientação do conto foi descrita, o castelo, a casa, os próprios personagens em sua
condição trágica de isolamento e ainda a abordagem dos autores em seus ensaios sobre o
próprio a composição do conto. Tudo isso configura literatura gótica e seus desdobramentos
de horror em uma história sobre solidão, e no caso de “O Forasteiro”, acrescenta-se a busca
por identidade. Com a pesquisa, certamente não se pretende esgotar, nem ao menos de
maneira relativa, os domínios do gênero gótico, uma vez que, como o próprio estudo mostrou,
sua concepção e caracterização deixam abertas múltiplas perspectivas de análise.
Uma das conclusões obtidas ao longo dessa pesquisa é que a casa no conto de Poe
pode ser vista como um prolongamento da personagem. Pode-se, portanto, ser entendida tanto
como uma protagonista da trama como também o ambiente no qual a mesma narrativa se
desenvolve. E isso não se difere muito do castelo no qual o Forasteiro habitava, já que
também é o ambiente onde a história se desenvolve e tem parte importante na personalidade
do protagonista do conto.
Ao final do estudo, o texto de Poe parece menos macabro e mais como um estudo
psicológico da condição humana. Seu desejo inarticulado de amor, sua autodestruição, sua
revolta contra o esquecimento e conceitos de dupla personalidade. Lovecraft, em
contrapartida, explora tanto o terror abordado por Poe quanto o horror sobrenatural que ele
mesmo conseguiu refinar a partir do gênero fantástico, cujo resultado é a apresentação de uma
nova maneira de conceber essa tão estimada, porém não inteiramente reconhecida, arte
literária do medo sobrenatural.
Em ambos os contos conseguimos observar e refletir acerca de elementos simbólicos que
oferecem importante relação com as personagens. Seja de forma direta ou de forma subjetiva,
esses elementos possuem um papel relevante na narrativa como um todo. E agora depois
desse estudo, as semelhanças e peculiaridades de cada autor e obra me parecem mais claras e
definidas.
Por fim, este estudo busca se apresentar como fonte de reflexão para futuras pesquisas
– na área de Literatura principalmente – ou como referencial para uma análise
interpretativista, comparativista ou bibliográfica das obras de Poe e Lovecraft, assim
enriquecendo cada vez mais a fortuna literária de ambos na nossa língua materna.

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Referências

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em contos de Adolfo Bioy Casares. 2017.224 f. Tese (Doutorado em Estudos Literários) –
Faculdade de Letras, Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2017.

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RIBEIRO, Emílio Soares; JUNIOR, Jorge Witt de Mendonça. O Intruso, de H.P. Lovecraft:
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WELLEK, René; WARREN, Austin. Teoria da literatura. 3. ed. São Paulo: Biblioteca
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TELEGRAPH REPORTERS. Edgar Allan Poe: the master of horror writing. In: The
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