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22/01/2024, 22:11 A Argonáutica de Apolônio de Rodes

A Argonáutica de Apolônio de Rodes

Personagens Principais
Jasão – filho de Éson, legítimo herdeiro do trono de Iolco
Medéia – filha de Eetes, feiticeira

Personagens Secundárias
Pélias – rei ilegítimo de Iolco, tio de Jasão
Eetes – rei de Cólquida
Apsirto – filho de Eetes, irmão de Medéia

Interpretação
O pai de Jasão foi destituído, pelo irmão, do trono de Iolco. Jasão é salvo da perseguição do
tio e educado pelo Centauro Quíron (centauro – metade cavalo – simboliza a banalidade,
perseguição dos desejos materiais). Ele carrega a legitimidade do trono, porém com uma
tendência a queda material em função de sua educação. Além disto, Jasão perde uma
sandália no caminho para Iolco. A sandália protege o pé – a alma – lembrando o “coxo” de
Édipo (igualmente com a alma deformada / problemática). Como no caso de Édipo, Teseu e
outros heróis mitológicos, Jasão precisa demonstrar sua capacidade de ser um rei justo
(conhecedor de si mesmo – voltado para o espírito – e com os desejos harmonizados) e
para tanto deverá vencer suas perversões. Como todo mito grego, esta é mais uma batalha
travada na alma humana.

O nome da nau construída para a jornada de Jasão, Argo, remete a cor branca, cor da
purificação. A ouro-cor do velocino representa a espiritualização, e o carneiro exprime a
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inocência (sublimação). O velocino é vigiado pelo dragão, símbolo tanto da perversão


dominadora como da devassidão (com frequência o dragão é o guardião da virgem). Jasão
precisa matar o dragão, matar a perversão dentro de si, sublimando seus desejos ilegítimos
para reinar justamente em Iolco. Tratar-se de uma jornada de conquista da força de espírito
(verdade) e pureza da alma.
Todavia o velocino representa tanto o ouro-cor como o ouro-moeda, portanto, tanto a
espiritualização como a exaltação impura dos desejos. O valor simbólico do velocino para
Jasão dependerá de como ele for conquistado.

Os argonautas tem que enfrentar as turbulências do mar para chegar a Cólquida onde está
o velocino (mar simboliza a vida cujos perigos devem ser encarados – perigos submersos
no subconsciente). Devem especialmente atravessar as Simplégades, duas rochas que se
chocam e podem esmagar a Argo (rocha e esmagamento simbolizam o esmagamento da
matéria sobre o espírito humano). Eles sobrevivem a travessia, mas a destruição do leme é
um mau presságio.

Eetes, rei de Cólquida, impõe duas condições para que Jasão leve o velocino. Antes de
enfrentar o dragão para ascender ao prêmio, ele deve arar o campo com touros indomáveis
que sopram fogo e têm pés de bronze, semear o campo arado com dentes de dragão e,
finalmente, enfrentar os homens de ferro que brotarão das sementes.

Vários significados neste desafio:


Arar a terra significa governar a terra de forma fecunda.
Domar os touros (sopram a chama devastadora e com pés de bronze, i.e. alma
endurecida) simboliza domar sua perversão titânica, o perigo do abuso brutal
inerente à pretensão ao poder.
Dragão remete também a perversão dominadora.
Vencer os homens de ferro, de alma endurecida, que nascem da inveja que o poder
desperta.
Jasão não enfrenta esta tarefa com auxílio de instrumentos ou conselhos concedidos pelos
deuses olímpicos de qualidade sublimada, mas sim, com o auxílio de Medéia, evoca a
titânica Hécate. Ele não vence os homens de ferro com a força e coragem, mas com o uso
de uma artimanha: atira uma pedra entre eles provocando intriga e jogando uns contra os
outros. Porém a intriga não vence a injustiça, ao contrário, propaga-a.

O herói não enfrentará o dragão, matando-o em um ato heroico como símbolo real de
libertação da perversão totalitária, mas fará uso de uma poção mágica preparada por
Medéia para adormecer o dragão. O velocino não foi conquistado mas sim roubado. Seu
valor simbólico não será a espiritualização do ouro-cor mas a perversão do ouro-moeda.
Fugindo de Cólquida com o velocino roubado, Medéia e Jasão matam Apsirto e atiram seus
pedaços ao mar para retardar Eetes e escapar. O filho morto, a verdade sacrificada, em
pedaços seriam as desculpas mentirosas atiradas ao rei-pai-espírito para fugir a culpa.
Medéia destrói em Jasão o espírito sob forma de arrependimento, condenando-o
definitivamente a perdição.

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A ligação de Jasão com Medéia não é uma união de duas almas. Mas fruto do desejo físico
(Eros flecha Medéia) e interesse (Jasão teme enfrentar os desafios). A feiticeira reina sobre
as forças terrestres com o auxílio do poder demoníaco. Ao unir-se a Medéia, Jasão apela às
forças demoníacas do subconsciente para avançar, e não se purifica no combate. Os
artifícios de Medéia, utilizados por Jasão, são um insulto ao espírito, um pacto demoníaco.
Jasão vendeu sua alma.

O fim de Jasão é contado em outras narrativas. Naturalmente, ele será um mau rei e
expulso de Iolco. Mais tarde tenta livrar-se da influência da feiticeira que rebelada mata seus
filhos. Representando as forças destruidoras do subconsciente, Medéia, de quem Jasão
quis servir-se para alcançar a vida sublime, é o instrumento fatal da sua perdição e
sofrimento.
Jasão vai repousar à sombra da Argo, mas o mastro cai sobre sua cabeça e o mata. O
símbolo da esperança heroica da sua juventude torna-se o símbolo da ruína final de sua
vida.

Notas
Apolônio de Rodes nasceu em Alexandria (morreu em Rodes) no início do século III
aC. A Argonáutica é sua obra mais conhecida.
Como todo mito grego há diferentes versões episódicas. Mas estas não interferem
na interpretação do mito.
Entre os Argonautas mais importantes encontram-se também Orfeu, Teseu e
Hércules, todos heróis que padecem da banalização titânica (dominação social
perversa) e dionisíaca (devassidão – incapacidade de uma escolha justa e ligação
amorosa duradoura).
Os poderes diabólicos de Medéia ainda seriam usados para matar o rei Pélias, e o
rei Creonte e sua filha Creusa (por quem Jasão queria trocá-la). Abrigada por Egeu
em Atenas, tentará envenenar o então príncipe Teseu. Expulsa também de Atenas
regressa à Cólquida.
A tragédia Medéia de Eurípides é normalmente comentada como uma demonstração
do poder do amor tanto para o bem como para o mal. Não podemos mais apreciar
esta tragédia dentro da trilogia original para buscar compreender melhor o que nos
queria dizer Eurípides. Mas buscar uma interpretação de Medéia como algo com
relação ao amor ou uma leitura da alma feminina é mirar somente a fabulação sem
nenhum valor simbólico (e uma ofensa às mulheres).
Assim como Medéia para com Jasão, Fedra também é a instigadora do castigo a
Teseu.
Mitologia • Literatura Grego-Romana

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