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Intoxicação Aguda por Antidepressivos 6

Actuação Imediata

ÍNDICE pág.

1 – INTRODUÇÃO........................................................................................................8

2 – INTOXICAÇÕES AGUDAS....................................................................................9

2.1 – TOXICOLOGIA – CONSIDERAÇÕES GERAIS..................................................9


2.1.1 – Absorção.........................................................................................................10
2.1.2 – Distribuição......................................................................................................12
2.1.3 – Excreção.........................................................................................................13
2.2 – INTOXICAÇÕES E A SUA PREVENÇÃO.........................................................13
2.3 – CUIDADOS IMEDIATOS AO DOENTE INTOXICADO.....................................15
2.3.1 – Manutenção das Funções Vitais.....................................................................16
2.3.2 – Colheita de Informação...................................................................................18
2.3.3 – Descontaminação............................................................................................20
2.3.4 – Esvaziamento Gástrico...................................................................................21
2.3.5 – Absorção do Tóxico a nível Intestinal.............................................................26
2.3.6 – Irrigação a nível Intestinal...............................................................................27
2.3.7 – Depuração do Tóxico......................................................................................28
2.3.8 – Administração de Antídotos............................................................................29
2.3.9 – Resumo da Actuação......................................................................................31
2.4 – INTOXICAÇÕES MAIS FREQUENTES............................................................33
2.4.1 – Intoxicações Medicamentosas........................................................................33
2.4.2 – Intoxicações por Pesticidas.............................................................................36
2.4.3 – Intoxicações por Produtos Caústicos..............................................................40

3 – INTOXICAÇÕES POR ANTIDEPRESSIVOS.......................................................42

3.1 – EPIDEMIOLOGIA...............................................................................................42
3.2 – FARMACOCINÉTICA........................................................................................42
3.3 – TOXICIDADE.....................................................................................................44
3.4 – TRATAMENTO...................................................................................................44
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4 – CONCLUSÃO.......................................................................................................46

BIBLIOGRAFIA..........................................................................................................47
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1 – INTRODUÇÃO

A elaboração deste trabalho surge no âmbito do Ensino Clínico X de


Enfermagem Médico-Cirúrgica, integrado no 4º ano 8º semestre, no curso de
Licenciatura em Enfermagem, tendo como tema de trabalho: Intoxicação Aguda
por Antidepressivos.
O tema surgiu pelo facto de ter surgido uma jovem com esta situação clínica,
pretendendo efectuar uma revisão teórica de toda a actuação e especificamente no
caso de Intoxicação por Antidepressivos.
Tendo em conta o tema proposto, tracei os seguintes objectivos:
 Apontar considerações gerais acerca de toxicologia;
 Enumerar medidas preventivas deste tipo de incidente;
 Enunciar os cuidados imediatos ao doente intoxicado, dando relevância
à remoção do tóxico;
 Expor as intoxicações mais frequentes, tendo em conta as suas
manifestações clínicas e actuação;
 Descrever a intoxicação aguda por antidepressivos, considerando
dados epidemiológicos, toxicidade e tratamento.
O presente trabalho está estruturado numa única parte. Esta é composta por
dois capítulo teórico, realizada a partir da consulta e análise bibliográfica.
Num primeiro capítulo, desenvolverei de forma sucinta algumas
considerações gerais acerca de toxicologia, bem como as formas de prevenção
deste tipo de incidente, a abordagem inicial ao doente intoxicado e ainda as
intoxicações mais frequentes.
Num segundo capitulo, especificarei a intoxicação por antidepressivos, tendo
em conta alguns dados epidemiológicos, a farmacocinética, toxicidade e ainda o
tratamento a desenvolver.
Assim, com a realização deste trabalho espero contribuir para a aquisição de
novos conhecimentos e consolidação dos já existentes, permitindo uma melhoria na
prestação de cuidados ao doente intoxicado, numa situação de Urgência.
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2 – INTOXICAÇÕES AGUDAS

As intoxicações constituem ainda hoje uma das situações de emergência


muito frequentes nas unidades de urgência do nosso país (BATUCA, 2003, p.85).
As inúmeras situações ou factores, a multiplicidade de tóxicos que podem
conduzir a uma intoxicação e o carácter severo de que elas se podem revestir, torna
imperioso que a assistência seja prestada de forma eficiente e eficaz (BATUCA,
2003, p.85).

2.1 – TOXICOLOGIA – CONSIDERAÇÕES GERAIS

Muitas vezes, quando se fala de tóxico, associa-se a este termo a noção de


que é toda a substância estranha ao organismo, isto é, exógena, e quando ingerida,
inalada, ou absorvida por via cutânea, é capaz de conduzir a lesões orgânicas que
podem colocar em risco a vida do indivíduo (BATUCA, 2003, p.87).
Segundo GONÇALVES sit in BATUCA (2003, p.87), pode definir tóxico como
qualquer substância exógena ou endógena capaz de, em determinada
concentração, lesar a estrutura ou perturbar negativamente os processos
bioquímicos de um ser vivo.

Uma substância pode ou não ter uma acção tóxica dependendo de:
Æ Quantidade contactada;
Æ Via e intensidade de absorção;
Æ Tipo de distribuição;
Æ Rapidez e grau de bio-transformação;
Æ Excreção;
Æ Características do indivíduo (idade, dotação genética e estado de
saúde ou doença) (BATUCA, 2003, p.85).
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O efeito tóxico de uma substância surge num sistema biológico quando o


tóxico, seus metabólitos ou produtos de conversão atingem um receptor em
concentrações suficientemente elevadas e durante tempo suficiente para conduzir a
manifestações tóxicas (BATUCA, 2003, p.87).

As intoxicações podem resultar de uma única exposição ao produto tóxico,


designando-se de intoxicações agudas, ou resultar de contactos repetidos,
intoxicações crónicas (BATUCA, 2003, p.87).

Uma vez estabelecido o contacto entre o organismo e o tóxico, este sofre os


mesmos processos a nível orgânico que qualquer outro produto, após a sua entrada
é absorvido, distribuído, fixado, bio-degradado ou metabolizado e excretado
(BATUCA, 2003, p.88).

2.1.1 – Absorção

A absorção é o processo através do qual o tóxico penetra no organismo


atravessando as membranas celulares até chegar à corrente sanguínea.
Este processo varia com a natureza do tóxico, quantidade, tempo de
exposição e via de absorção. São melhor absorvidos os tóxicos lipossolúvel e
aqueles que estão sob a forma não ionizada (BATUCA, 2003, p.88).

As vias de contacto do tóxico com o organismo, atendendo à rapidez de


absorção e à magnitude de resposta, são:
Æ Intravenosa;
Æ Inalatória;
Æ Intraperitoneal;
Æ Intramuscular;
Æ Subcutânea;
Æ Intradérmica;
Æ Digestiva;
Æ Cutânea – pele e mucosas (MACEDO e COSTA, 1995 cit in
BATUCA, 2003, P. 88)
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A absorção do tóxico dá-se preferencialmente por uma ou outra via,


ocorrendo regra geral, por mais do que uma via simultaneamente, dependendo da
forma física do tóxico.
A via mais frequente da intoxicação é a digestiva. Ela é utilizada
preferencialmente nas intoxicações voluntárias (tentativas de suicídio) e nos
acidentes não profissionais (acidentes domésticos e em crianças). As intoxicações
por via cutânea e respiratória são também bastante frequentes, em resultado dos
acidentes profissionais. Hoje em dia, com o aumento do consumo de drogas “duras”,
a via intravenosa adquire um significado importante (BATUCA, 2003, p.89).

1) Via Digestiva

Todo o tubo digestivo pode ser sede de absorção, desde a boca até ao recto.
Podemos dizer, que é no terço inicial do intestino delgado que se dá a absorção da
maior parte do tóxico. Quando é absorvido a nível da boca a toxicidade é maior, uma
vez que, o produto não sofre metabolização.
A presença de alimentos no tubo digestivo dificulta o processo de absorção,
pois o contacto do tóxico com as membranas celulares é mais difícil e podem
formar-se complexos não absorvíveis. A absorção é ainda influenciada pela
motilidade gastrointestinal, a sua aceleração reduz a absorção do tóxico ingerido
(BATUCA, 2003, p.89).

2) Via Inalatória

A absorção a nível pulmonar do tóxico (sob a forma gasosa ou em aerossol)


depende do diâmetro das suas partículas. Partículas com uma dimensão inferior a 4
unidades são rapidamente absorvidas porque chegam até ao alvéolo, sendo esta
uma área de absorção extensa e muito vascularizada.
O único processo de diminuir ou abolir a absorção pulmonar é remover o
indivíduo do local de exposição ou promover o arejamento da zona (BATUCA, 2003,
p.89).
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3) Via Cutânea

A lipossolubilidade é o factor mais importante na determinação da intensidade


das intoxicações por via cutânea. Quanto mais lipossolúvel for o produto mais fácil é
a sua penetração percutânea. Esta é ainda influenciada pela hidratação (a
permeabilidade da pele aumenta com o seu grau de humidade), temperatura,
irrigação sanguínea e integridade cutânea. Varia ainda de acordo com o tempo de
exposição e a superfície corporal exposta (BATUCA, 2003, p.90).

Nas restantes vias, intravenosa, intraperitoneal, intramuscular, subcutânea e


intra-dérmica, o contacto do tóxico com o meio interno estabelece-se directamente.
Na via intravenosa o processo de absorção está eliminado, pois o tóxico entra
directamente na corrente sanguínea levando a que rapidez e a intensidade das
manifestações sejam maiores (BATUCA, 2003, p.90).

2.1.2 – Distribuição

Após a absorção dá-se a distribuição do tóxico por todo o organismo. A


passagem deste para os diferentes tecidos e a sua fixação dependem da
concentração plasmática, da irrigação desses tecidos, da facilidade com que o tóxico
atravessa as paredes capilares e as membranas celulares. A penetração está
relacionada com as características lipo ou hidrossoluveis do tóxico e o facto de estar
ou não ligado a uma proteína de transporte.
O local de acumulação do tóxico pode não ser coincidente com o seu órgão
alvo. Nos locais de acumulação a actividade do tóxico é pequena ou mesmo nula, e
em geral, só se faz sentir quando libertado.
No que respeita à bio-transformação dos tóxicos, o fígado é o órgão que
desempenha o papel principal.
A bio-transformação do tóxico pode conduzir a metabólitos menos tóxicos ou
a metabólitos mais tóxicos (exemplo: o paratião por si só não é tóxico, mas o seu
metabólito o paraoxone, é altamente tóxico) (BATUCA, 2003, p.90).
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2.1.3 – Excreção

As substâncias tóxicas podem ser excretadas por qualquer um dos


emunctórios naturais. As principais vias são os rins, os pulmões, o fígado (por
intermédio da bílis e desta para as fezes), a pele e faneras, embora não tão
importantes quantitativamente. Durante o processo de excreção podem ocorrer
danos para o órgão em causa.

A excreção dos tóxicos também é influenciada pelas características de cada


tóxico, assim:
Æ Os tóxicos hidrossolúveis são excretados pelo rim;
Æ Os tóxicos voláteis pelos pulmões;
Æ Os tóxicos que sofrem conjugação hepática pela bílis (BATUCA, 2003,
p.91).

2.2 – INTOXICAÇÕES E A SUA PREVENÇÃO

A prevenção das intoxicações é sem dúvida a medida prioritária a instituir no


planeamento de qualquer programa de educação para a saúde.
A necessidade de prevenir a ocorrência de acidentes toxicológicos deve ser
uma preocupação conjunta dos técnicos de saúde, das organizações industriais e
comerciais, dos Estados e de cada um de nós em particular.
Entre as medidas preventivas de qualquer programa de saúde adquirem
particular relevância:

1) Educação das populações através da melhoria do nível de conhecimento


relativamente:
Æ À toxicidade e manuseamento dos produtos químicos e domésticos
(lixívia e petróleo) e agrícolas;
Æ À importância do armazenamento dos produtos tóxicos
(medicamentos, produtos de limpeza, pesticidas e insecticidas) em
locais específicos, fora do alcance das crianças (estas são as
grandes vitimas das intoxicações acidentais) e devidamente
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identificados (nunca colocar em copos ou recipientes de uso diário),


estes devem ser conservados sempre na sua embalagem de origem
(FIGURA 1);
Æ O cumprimento das normas de segurança na utilização e
manuseamento dos produtos tóxicos (protecção individual e
destruição das embalagens após utilização);
Æ À importância de não ingestão de fármacos perante as crianças
(estas têm tendência para imitar os adultos), da destruição dos
mesmos em esgotos ou a sua devolução às farmácias e não
colocação nos caixotes de lixo;
Æ Respeito pelas normas de protecção nos locais de trabalho
(BATUCA, 2003, p.93).

FIGURA 1 – Colocação de produtos tóxicos em locais seguros e devidamente


identificados

Fonte: BATUCA, Artur Alberto Lacerda R. ; COELHO, José Carlos Quaresma ; MOREIRA, Isabel
Maria Pinheiro Borges - Técnicas de Urgência. 2ª ed. Coimbra : Formasau, 2003, p. 94.

2) Valorização dos estados depressivos e das tentativas de suicídio,


respeitando os motivos do doente, e alertando as famílias para a necessidade
do recurso atempado ao psiquiatra face aos primeiros sinais de depressão,
nomeadamente apatia, insónia e anorexia Uma vez estabelecido o contacto
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entre o organismo e o tóxico, este sofre os mesmos processos a nível


orgânico que qualquer outro produto, após a sua entrada é absorvido,
distribuído, fixado, bio-degradado ou metabolizado e excretado (BATUCA,
2003, p.94).

3) Melhoria da assistência pré-hospitalar, isto é, no local da intoxicação:


Æ Colher toda a informação que permita a identificação do tóxico, a via
e a hora da intoxicação;
Æ Sempre que possível, devem ser tomadas as primeiras medidas de
modo a minorar os efeitos do tóxico, nomeadamente a
sintomatologia que o doente possa vir a apresentar e a favorecer a
recuperação.

Em síntese, prevenir os acidentes toxicológicos deve ser a primeira norma de


conduta a instituir na assistência ao doente intoxicado (BATUCA, 2003, p.94).

2.3 – CUIDADOS IMEDIATOS AO DOENTE INTOXICADO

O atendimento do doente intoxicado ou com suspeita de intoxicação deve


desenrolar-se num espírito de equipa e inter-ajuda. É importante que alguém
assuma a coordenação das actividades de modo que estas se desenvolvam num
clima de calma, sem precipitações e atropelos (BATUCA, 2003, p.95).

Os princípios gerais a adoptar face a qualquer doente intoxicado passa pela


manutenção das funções vitais, colheita de dados, remoção do tóxico, sendo que
neste princípio enquadra-se a descontaminação, o esvaziamento gástrico, a
administração de produtos absorventes, a depuração do tóxico e a administração de
antídotos (BATUCA, 2003, p.95).
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2.3.1 – Manutenção das Funções Vitais

Em simultâneo com a instituição dos primeiros procedimentos deve proceder-


se à colheita de informação. Torna-se difícil descrever por ordem cronológica as
acções a desenvolver, uma vez que estas se desenrolam num único tempo
(BATUCA, 2003, p.95).

a) Posicionamentos

O doente deve ser colocado preferencialmente em decúbito lateral em


Trendlenbourg (FIGURA 2) prevenindo a aspiração do vómito e facilitando o aporte
sanguíneo aos órgãos nobres (BATUCA, 2003, p.95).

FIGURA 2 – Primeiras medidas a instituir perante um doente intoxicado

Fonte: BATUCA, Artur Alberto Lacerda R. ; COELHO, José Carlos Quaresma ; MOREIRA, Isabel
Maria Pinheiro Borges - Técnicas de Urgência. 2ª ed. Coimbra : Formasau, 2003, p. 97.
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b) Avaliação das Funções Vitais

A preocupação imediata dá-se no sentido de preservar a manutenção das


funções vitais, garantindo a sobrevivência do doente.

Æ Avaliação da Função Respiratório: determinação da frequência, amplitude


dos movimentos respiratórios, coloração da pele e mucosas, dosagem do pH
e gases arteriais; caso o doente se apresente com insuficiência respiratória –
deve proceder-se imediatamente à manutenção da permeabilidade das vias
aéreas através da aspiração de secreções e remoção de próteses dentárias,
hiperextensão de cabeça e início da ventilação através do ambu até
entubação endotraqueal ou restabelecimento da autonomia ventilatória;

Æ Avaliação da Função Cardiovascular e Térmica: determinação do pulso e


suas características, da pressão arterial e temperatura corporal; em situação
de paragem cardíaca, realização de massagem cardíaca externa,
pressionando ritmadamente com força, com as mãos sobrepostas, o terço
inferior do esterno; reposição da volémia; elevação dos membros inferiores e
soroterapia.

Æ Avaliação do Estado Neurológico: determinação do estado de consciência,


tonicidade muscular, reacção e diâmetro pupilar (BATUCA, 2003, p.96).

c) Cateterização Venosa

A cateterização venosa permite a reposição hidroelectrolítica e administração


de fármacos se for caso disso.
Aquando da punção venosa deve proceder-se à colheita de uma amostra de
sangue para doseamento do tóxico e determinação de parâmetros bioquímicos
(BATUCA, 2003, p.96).
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d) Cateterização Vesical

A algaliação permite a monitorização do volume urinário horário, devendo


também ser colhida uma amostra de urina para estudo toxicológico.
No caso de tratar-se de uma intoxicação por paraquato ou caso se suspeite,
deve fazer-se de imediato o teste de paraquato na urina para despistagem rápida do
tóxico (BATUCA, 2003, p.96).

e) Entubação Nasogástrica

Quando sabemos que o tóxico foi ingerido e caso não esteja contra indicado
(exemplo produtos caústicos) deve proceder-se à entubação gástrica com uma
sonda de calibre grosso e à colheita de conteúdo gástrico para doseamento
toxicológico.
Após a implementação das acções iniciais, a nossa actuação centrar-se-á na
remoção do tóxico (BATUCA, 2003, p.97).

2.3.2 – Colheita de Informação

Ao mesmo tempo que vão sendo instituídas as primeiras acções, deve


proceder-se à colheita de informação para que logo que possível se estabeleça o
contacto com o Centro de Informação Anti-Venenos (CIAV). A informação facultada
pelo Centro depende da precisão dos dados fornecidos.

A colheita de informação deve incidir sobre:

Æ Caracterização do Tóxico:
 O nome químico do produto ou o nome por que é conhecido em
linguagem corrente. Na impossibilidade de se saber o nome
deve indagar-se, as características do mesmo, a cor, o cheiro, e
a forma do produto.
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Æ Condições da Intoxicação:
 Via de contacto com o tóxico;
 Quantidade ingerida, tempo de exposição no caso de inalação
ou ainda a superfície cutânea exposta;
 Hora da intoxicação, para cálculo do tempo decorrido durante o
contacto com o tóxico;
 Se o contacto se deu ou não após a ingestão de alimentos;
 Se foram executadas algumas medidas e quais.
Æ Avaliação do Doente:
 Idade, estado geral, antecedentes de saúde, se é portador de
doenças prévias, nomeadamente ao nível renal, cardiovascular,
pulmonar, hepático e psiquiátrico;
 Estilos de vida, em particular hábitos alcoólicos e
toxicodependência;
 Parâmetros vitais – frequência e tipo de respiração, frequência
cardíaca e suas características e tensão arterial;
 Estado de consciência – avaliado segundo a Escala de
Glasgow;
 Alterações apresentadas pelo doente, nomeadamente:
o Sinais de queimadura ao nível da boca ou
orofaringe;
o Da motilidade intestinal – presença de diarreia;
o Perda de controlo dos esfíncteres;
o Da pele e mucosas;
o Do estado de consciência (crises convulsivas).

A colheita de informação deve ser realizada junto do doente, familiares,


acompanhantes ou tripulantes da ambulância. Estes só devem abandonar os
serviços de saúde após a obtenção da certeza que os dados colhidos são
necessários.
Após a implementação das acções iniciais, a nossa actuação centra-se na
remoção do tóxico (BATUCA, 2003, p.99).
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Actuação Imediata

A remoção do tóxico inclui a descontaminação, o esvaziamento gástrico, a


absorção do tóxico a nível intestinal, a irrigação a nível intestinal e a maior
eliminação.

2.3.3 – Descontaminação

A técnica geral que se utiliza na maior parte das exposições requer que se
retire o doente da substância ou que esta seja eliminada da pessoa (TINTINALLI,
2006, p.1198).
Consoante a via de absorção assim serão instituídos os primeiros cuidados
tendo em vista a redução da absorção. No entanto, independentemente da via, o
primeiro tóxico para remover (aquele que ainda não atravessou as membranas
celulares), será sempre aquele que ainda não foi absorvido (BATUCA, 2003, p.99).

De acordo com a via, assim serão descritos os cuidados a ter na intoxicação:

Æ Via Inalatória: remoção do doente do local ou na sua impossibilidade,


arejamento do local (BATUCA, 2003, p.99).

Æ Via Cutânea: remoção da roupa, banho de chuveiro ou lavagem cutânea com


água e sabão, a pele deve ser lavada de forma suave para não lesionar (o
que permitiria que o tóxico atravessa-se através de uma barreira lesionada).
O material utilizado neste procedimento, bem como a roupa e os acessórios
do doente devem ser manipuladas como potencialmente perigosos
(TINTINALLI, 2006, p.1198).

Ter sempre em consideração que, na realização da lavagem cutânea ou


gástrica, deve usar-se sempre luvas, bata e máscara de modo a obter-se adequada
protecção (BATUCA, 2003, p.99).

Æ Olhos: no caso do produto ser projectado sobre os olhos, é imperioso que se


faça uma lavagem contínua para remoção do tóxico, lavagem esta efectuada
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com água corrente ou soro fisiológico durante 10 a 15 minutos, mantendo as


pálpebras separadas (BATUCA, 2003, p.99).

Æ Via Digestiva: cada um dos métodos que se usam para remoção do tóxico na
via digestiva acarreta benefícios e riscos potenciais que devem ser
considerados antes da sua aplicação (TINTINALLI, 2006, p.1198).
A remoção do tóxico ingerido pode fazer-se por indução do vómito, lavagem
gástrica, aspiração do conteúdo gástrico, aumento do peristaltismo e
administração de produtos absorventes. A utilização de um ou outro método
depende da avaliação do estado de consciência e da natureza e quantidade
do tóxico (BATUCA, 2003, p.100).

As diversas formas de remoção do tóxico na via digestiva, serão


desenvolvidas nas secções seguintes de forma pormenorizada.

2.3.4 – Esvaziamento Gástrico

O esvaziamento gástrico inclui a indução do vómito (emese) e lavagem


gástrica.

a) Indução do Vómito (emese)

Este é o método mais eficaz, estando no entanto, contra-indicado quando o


doente está inconsciente, semicomatoso, sonolento, no caso de ingestão de
cáusticos, petróleo e seus derivados, produtos susceptíveis de produzir espuma e
ingestão de convulsivantes (BATUCA, 2003, p.100).
A estimulação do vómito pode ser conseguida com a colaboração do doente,
por estimulação mecânica da úvula (usando os dedos, uma espátula ou o cabo de
uma colher), administração de água quente com sal ou administração de sulfato de
magnésio ou xarope de ipecacuanha. De modo a evitar-se a aspiração do conteúdo
gástrico o doente deve ser adequadamente posicionado, sentado, ligeiramente
inclinado para a frente (FIGURA 3). No caso da criança também devem estar
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Actuação Imediata

sentadas e, durante a emese a posição ideal é ao colo de um adulto em decúbito


ventral (BATUCA, 2003, p.100).

FIGURA 3 – Estimulação do Vómito

Fonte: BATUCA, Artur Alberto Lacerda R. ; COELHO, José Carlos Quaresma ; MOREIRA, Isabel
Maria Pinheiro Borges - Técnicas de Urgência. 2ª ed. Coimbra : Formasau, 2003, p. 100.

O xarope de ipecacuanha é um composto de origem vegetal, que actua de


maneira periférica no estômago e centralmente na zona de activação quimiotáctica
para induzir o vómito. As doses de xarope são de 15 ml para as crianças de 1 aos
12 anos de idade, e 30 ml para adultos. Cerca de 90% dos doentes vomita ao fim de
20 minutos. Repete-se a dose, se não ocorreu vómito depois de 30 minutos da
primeira administração. Um doente típico, vomita cerca de três a cinco vezes, e os
sintomas, de uma forma geral, cedem ao fim de 2 horas (TINTINALLI, 2006, p.1198).
As situações clínicas em que se utiliza o xarope de ipecacuanha são
limitadas, já que a maioria dos doentes acede ao Serviço de Urgência depois do
período de tempo em que a administração deste xarope seria benéfica, ou seja,
quando acedem ao Serviço de Urgência, o tóxico já terá sido absorvido ou já terá
passado o piloro (TINTINALLI, 2006, p.1199).
A administração do xarope de ipecacuanha também prolonga o tempo para
administrar antídotos orais por 1 a 6,5 horas.
O xarope de ipecacuanha está indicado para induzir o vómito, sobretudo se
for administrado imediatamente após a ingestão de um tóxico conhecido, que se
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Actuação Imediata

prevê que estará no estômago e que não tenha as contra-indicações anteriormente


mencionadas.
As possíveis indicações (raras), para a sua aplicação no hospital inclui
ingestão muito recente de substâncias, sobre as quais não se prevê
comprometimento das vias respiratórias, alteração do estado mental, alterações
hemodinâmicas ou convulsões (TINTINALLI, 2006, p.1199).

b) Lavagem Gástrica

A lavagem gástrica é o principal método de esvaziamento gástrico, e realiza-


se com o doente deitado em decúbito lateral esquerdo (TINTINALLI, 2006, p.1201).
A lavagem gástrica faz-se com água ou soro fisiológico. Esta está também
contra-indicada no caso de ingestão de cáusticos, petróleo e seus derivados e
substâncias produtoras de espuma. A lavagem gástrica utiliza-se quando a indução
do vómito está contra-indicada ou para complementar o esvaziamento gástrico.
A lavagem está particularmente indicada quando a ingestão do tóxico
decorreu num período não superior a 4 horas. No entanto, sabe-se que alguns
produtos provocam estase (diminuem a motilidade gastrointestinal) pelo que há
vantagem em proceder-se à lavagem gástrica por um período até 12 horas e por
vezes até mais tempo após a ingestão do tóxico (BATUCA, 2003, p.101) (FIGURA
4).

FIGURA 4 – Lavagem Gástrica

Fonte: BATUCA, Artur Alberto Lacerda R. ; COELHO, José Carlos Quaresma ; MOREIRA, Isabel
Maria Pinheiro Borges - Técnicas de Urgência. 2ª ed. Coimbra : Formasau, 2003, p. 101.
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Actuação Imediata

Durante a lavagem gástrica deve-se observar a reacção do doente e avaliar


com frequência o pulso, a tensão arterial e a respiração pois nem sempre a lavagem
é inócua, pode ocorrer aspiração do conteúdo gástrico e bradiarritmias (BATUCA,
2003, p.101).

Na tabela 1 são descritas as acções de enfermagem na lavagem gástrica.

Como medida complementar da remoção do tóxico no tubo digestivo pode


ainda utilizar-se a administração de enemas de limpeza (reduzem o potencial de
absorção) e administração de laxantes por via per os – manitol a 10%, parafina ou
sulfato de sódio e magnésio. Estes aceleram o trânsito intestinal, diminuem o tempo
de contacto do tóxico com a mucosa e consequentemente a absorção, para além de
poder contrariar eventualmente a acção obstipante do carvão activado (BATUCA,
2003, p.101).
Intoxicação Aguda por Antidepressivos 25
Actuação Imediata

TABELA 1 – Acções de Enfermagem na Lavagem Gástrica e suas Justificações

Procedimentos Justificação
Explicar ao doente a necessidade e os Diminui a sua ansiedade e facilita a sua
procedimentos que vão ser efectuados colaboração.
Em doentes com depressão do sistema
nervoso central, ou diminuição dos
Diminui o risco de aspiração brônquica.
reflexos, deve proceder-se à entubação
endotraqueal e insuflação do “cuff”.
Diminui a passagem dos conteúdos
Posicionar os doentes em decúbito gástricos para o interior do duodeno
lateral esquerdo e em Trendlenbourg. durante a lavagem, e minimiza a
possibilidade de aspiração.
Usar sonda de Levin nº30 a 36 para Facilita a remoção dos resíduos
adultos. alimentares.
Introduzir a sonda através do nariz ou
boca com movimentos suaves e fixar Diminui o risco de traumatismo.
com adesivo.
Permite verificar se a sonda está no
Aspirar a maior quantidade possível de estômago, recolher o maior volume
conteúdo gástrico. possível de conteúdo gástrico e recolher
uma amostra para estudo toxicológico.
Instilar de cada vez cerca de 200 a 500
Quantidades superiores podem acelerar a
ml (em adultos) e 10 ml/kg (em
passagem das substâncias para o interior
crianças) de soro fisiológico ou água
do duodeno.
morna.
Aspirar o conteúdo gástrico após cada
Permite contabilizar a saída de líquidos e
insuflação realizando simultaneamente
facilita a remoção dos resíduos
massagens ao nível da região
alimentares e tóxicos.
epigástrica.
Quando a lavagem é em grande
Realizar a lavagem até que o líquido de quantidade pode haver espoliação de
retorno seja claro não excedendo os 10 electrólitos, alteração da pressão dos
litros. gases arteriais e estimulação vagal com
possíveis complicações.
Permite controlar se houve retenção de
Anotar sempre os líquidos entrados e
líquidos e/ou a sua passagem para o
saídos.
duodeno.

Fonte: BATUCA, Artur Alberto Lacerda R. ; COELHO, José Carlos Quaresma ; MOREIRA, Isabel
Maria Pinheiro Borges - Técnicas de Urgência. 2ª ed. Coimbra : Formasau, 2003, p. 102.
Intoxicação Aguda por Antidepressivos 26
Actuação Imediata

2.3.5 – Absorção do Tóxico a nível Intestinal

A absorção pode ainda ser diminuída com a administração de produtos que


modifiquem a estrutura do tóxico ou o fixem até ser eliminado.
Os produtos mais utilizados nesta situação são o carvão activado, o carvão
vegetal, a terra de Fuller (BATUCA, 2003, p.104) e catárticos (TINTINALLI, 2006,
p.1201).
A terra de Fuller fixa e inactiva alguns tóxicos nomeadamente o paraquato
(BATUCA, 2003, p.104).

a) Carvão Activado

O carvão activado é o agente mais adequado para descontaminar a via


gastrointestinal. Este é útil porque absorve o tóxico que se encontra no interior da
parte intestinal, evitando que o tóxico seja absorvido pelos tecidos, além de
estimular a eliminação do tóxico (TINTINALLI, 2006, p.1201).
O carvão activado é tanto mais eficaz quanto mais precoce é a sua
administração. Não deve ser administrado antes do xarope de ipecacuanha actuar
(absorve a ipeca) e nos casos em que é necessário fazer endoscopia (nas
intoxicações por cáusticos) (BATUCA, 2003, p.104). Outras contra-indicações do
carvão activado incluem ingestão isolada de uma substância não conhecida que
absorve o carvão activado (por exemplo: ferro, lítio) (TINTINALLI, 2006, p.1201).
É administrado em água em doses de 30 a 60 g nas crianças e 60 a 100 g
nos adultos. Nas crianças pode ser dado com um sumo de forma a tornar-se mais
agradável. Pode ser dado oralmente ou através de sonda de Levin (BATUCA, 2003,
p.104).

b) Catárticos

Muitas vezes administra-se carvão activado com um catártico osmótico, como


solução de sorbitol ou solução de citrato de magnésio.
Intoxicação Aguda por Antidepressivos 27
Actuação Imediata

As indicações para o uso de catárticos isolados são idênticas às do carvão


activado. Quando o carvão activado se utiliza em doses numerosas, só na primeira
dose se adiciona um catártico, com o objectivo de limitar as complicações, as quais
incluem náuseas e dor abdominal, desequilíbrio eletrolítico e hipermagnesemia em
doentes com compromisso renal.
Entre as contra-indicações do uso de catárticos encontram-se: administração
depois da ingestão de uma substância que produzirá diarreia, crianças com menos
de 5 anos de idade, doente com insuficiência renal, obstrução intestinal ou ingestão
de cáusticos (TINTINALLI, 2006, p.1202).

2.3.6 – Irrigação a nível Intestinal

Outra técnica para limpar o intestino é a irrigação intestinal total, que requer
instilar grandes volumes de glicol de polietileno num electrólito e uma solução
equilibrada osmoticamente que não ocasione alterações hídricas ou electrólitas.
Este técnica realiza-se com a instilação de 2l/h de solução de glicol de polietileno por
via oral ou através de uma sonda nasogástrica, e em crianças, com a instilação de
50 a 250 ml/kg/h ou a quantidade de solução que se tolere. O objectivo é obter a
saída rectal de líquido transparente.
As contra-indicações incluem doentes com diarreia precedente, ingestão de
tóxicos que se prevê causar diarreia considerável, ausência de ruído intestinal ou
presença de obstrução.
Entre as complicações encontram-se: inflamações intestinais e irritação rectal
por evacuações frequentes.
As indicações usuais para a irrigação intestinal total incluem: ingestão de
substâncias que não absorvem o carvão activado, ingestão de preparado de
libertação lenta, situações clínicas em que se encontram corpos estranhos não
obstrutivos do intestino (TINTINALLI, 2006, p.1202).
Intoxicação Aguda por Antidepressivos 28
Actuação Imediata

2.3.7 – Depuração do Tóxico

É realizado quando tóxico atinge o meio interno, porque os processos


anteriores foram instituídos tardiamente, foram pouco eficazes ou porque o tóxico foi
colocado directamente no meio interno.
A depuração vai depender das propriedades físicas e bioquímicas de cada
produto e dos meios naturais do organismo (BATUCA, 2003, p.104).

a) Depuração Renal

Esta pode ser aumentada forçando a diurese, aumentando o aporte hídrico


segundo prescrição médica.
Regra geral, nesta situação o aumento da diurese não é feito através da
administração de diuréticos a menos que o balanço hídrico seja positivo.
O aumento da diurese não se justifica se o tóxico não for hidrossoluvel e se
estiver ligado a proteínas de transporte.
Nesta situação é de extrema importância a realização do balanço hídrico,
avaliação frequente dos parâmetros vitais e determinação de valores do ionagrama
(Na e K) (BATUCA, 2003, p.104).

b) Depuração Respiratório

Se o tóxico é um produto volátil, este será eliminado através dos pulmões. Para
evitar a respiração do gás expirado é necessário o arejamento do quarto onde o
doente está instalado ou no caso, estar sujeito a ventilação mecânica, deve
assegurar-se a ligação do circuito expiratório para o exterior e evitar assim a
concentração de tóxico à saída do ventilador.
A depuração pode ainda ser feita através de outros meios artificiais,
nomeadamente diálise peritoneal, hemodiálise, hemotransfusão com carvão
activado ou resinas sintéticas, hemofiltração arterio-venosa, plasmaférese e outros
(BATUCA, 2003, p.104).
Intoxicação Aguda por Antidepressivos 29
Actuação Imediata

2.3.8 – Administração de Antídotos

O número de antídotos é relativamente pequeno quando comparado com as


substâncias potencialmente tóxicas e é de considerar que o antídoto é também uma
droga, com os seus riscos e limiares de toxicidade.
O poder de modificação da acção tóxica tomando-o mais inócuo, não reverte
as lesões estruturais já estabelecidas, nem representa uma cura pelo que é
essencial que a intoxicação seja detectada precocemente e de imediato sejam
instituídas as primeiras medidas (BATUCA, 2003, p.105).
Na tabela 2 são descritos os antídotos mais utilizados nas Intoxicações
Agudas.

Por último, salienta-se que para além das acções abordadas é fundamental
que a assistência a estes doentes se desenvolva num clima de ajuda, evitando
atitudes hostis que exacerbam sentimentos de culpa e diminuam a auto-estima do
doente. Este aspecto reverte-se de extrema importância, tanto mais, que a maioria
das intoxicações são voluntarias numa tentativa de suicídio que não corresponde a
um desejo suicida, mas a uma resposta impulsiva face a situações de stress ou a
uma chamada de atenção (BATUCA, 2003, p.105).
Intoxicação Aguda por Antidepressivos 30
Actuação Imediata

TABELA 2 – Antídotos mais utilizados nas Intoxicações Agudas

TÓXICO ANTÍDOTO DOSES


Amanita Ácido tióctico 100 mg/6h EV, 7 dias
1 g de cloreto de cálcio EV em 5
Antagonistas de cálcio Cálcio
min
1-2 md EV em 5 min, repetir até um
Anticolinérgicos Fisostigmina
total de 6 mg
Colinérgicos 1-5 mg EV (alternativa IM ou SC)
Atropina
(insecticidas cada 15 min até diminuir as
organofosforados, etc) secreções
1-2 mEq/kg EV para manter o pH
ATC Bicarbonato
sanguíneo superior a 7,5
0,2 mg em 30 seg, doses
sucessivas de 0,3-0,5 mg até um
Benzodiazepinas Flumazenil
total de 3-5 mg. Perfusão 0,1-0,4
mg/h
Betabloqueantes Glucagón 5-10 mg EV, perfusão de 1-5 mg/h
5 g EV em 15 min. Se não houver
resposta ou não está disponivel
Cianeto Hidroxicobalamina
600 mg EV. Se há resposta, 300
mg aos 15 min.
Mesma dose que na intoxicação
Etilenglicol Etanol
por metanol
5 g EV se se desconhece a dose
do tóxico. 1 g por cada grama de
Hidrazidas Piridoxina
tóxico se se conhece a dose do
tóxico.
Mesilato de 15 mg/kg/h EV/8h (1g por cada
Ferro
desferroxamina dose).
Monóxido de Carbono Oxigénio a 100%
10 ml a 10%/kg, passados 60 min
Metanol Etanol manter 1,5 ml a 10%/kg/h. dobrar
se alcóolico crónico.
0,4 mg em bolus EV, repetir até 2
Opiáceos Naloxona mg (pode-se administrar IM, SC ou
endotraqueal)
150 mg/kg oral, seguido de 70
Paracetamol Acetilcisteína
mg/kg/4h, 3 dias.

Fonte: MIR, Moya – Normas de Actuácion en Urgências. 3ª edición. Buenos Aires : Médica
Panamericana, 2005, p.612-613. ISBN: 84-7903-984-1.
Intoxicação Aguda por Antidepressivos 31
Actuação Imediata

2.3.9 – Resumo da Actuação

Nesta secção, será feito um resumo da actuação de enfermagem perante um


doente intoxicado. Sendo que esta actuação engloba duas avaliações distintas:
avaliação inicial e avaliação secundária.

a) Avaliação Inicial

Æ Sinais Vitais: até garantir o ABC (A – permeabilidade da via aérea; B –


oxigenação e ventilação adequada  oxigénio por máscara, tubo de Guedel e
posição de segurança em doentes em coma, entubação orotraqueal se
paragem respiratória; C – estabilização hemodinâmica  corrigir a hipotensão
arterial administrando soro fisiológico). Monitorizar o doente. Em alguns
casos, administração de imediato de antídoto.
Æ Identificação do Tóxico: interrogar o doente, família e/ou acompanhante,
questionar quanto aos restos de tóxicos que existia junto do doente,
embalagens vazias, informações médicas prévias.
Æ Despir por completo o doente, pesquisando alterações de sinais vitais,
alteração do estado de consciência, tamanho e reactividade pupilar, odores
característicos, coloração da pele e mucosas (MIR, 2005, p. 608).

b) Avaliação Secundária

Inicia-se a avaliação secundária quando a situação clínica do doente está


estabilizada.

Æ Bloquear a absorção do tóxico:


 Ocular: aplicar gotas de anestésico local para facilitar a limpeza
ocular. Lavar abundantemente os olhos com água ou soro
fisiológico durante 15 minutos;
 Dérmica: retirar a roupa do doente e lavar a pele com água
abundante. Utilizar sabão ou champô em substâncias oleosas:
 Extracção digestiva do tóxico: ter em conta o tipo de tóxico, o
intervalo de tempo desde a ingestão e a absorção
Intoxicação Aguda por Antidepressivos 32
Actuação Imediata

gastrointestinal. As técnicas utilizadas são: lavagem gástrica,


carvão activado, lavagem intestinal e indução do vómito com
xarope de ipecacuanha.
Æ Forçar a eliminação do tóxico do sangue: estas técnicas são
fundamentalmente utilizadas nas unidades de cuidados intensivos. As
técnicas são: alcalinização da urina, hemodiálise e hemoperfusão.
Æ Exploração física exaustiva: quando o tóxico não está identificado, procede-
se a uma exploração física exaustiva, uma vez que existem síndromes mais
ou menos específicos de determinados tóxicos (TABELA 3).

TABELA 3 – Síndromes mais frequentes nas Intoxicações


Hipertermia, taquicardia e outras arritmias, retenção
Clínica:
urinária, íleo, mioclonias, convulsões, delírios, midriase.
SÍNDROME
Antihistmínicos, antiparkinsónicos, atropina,
ANTICOLINÉRGICO Agentes
espasmolíticos, antipsicóticos, antidepressivos,
Causais:
relaxantes musculares.
Bradicardia ou taquicardia, edema pulmonar, vómitos,
espasmos intestinais, incontinência fecal ou urinária,
Clínica:
SÍNDROME hipersalivação, fasciculações, convulsões, confusão,
COLINÉRGICO miose, diminuição do nível de consciência.
Agentes
Insecticidas organosfosforados, fisostigmina, edrofonia.
Causais:
Diaforese, hiperpirexia, taquicardia, hipertensão,
Clínica: arritmias, convulsões, midriase, alucinações,
SÍNDROME
piloerecção.
SIMPATICOMIMÉTICO Agentes Cocaína, anfetaminas, cafeína, teofilina,
Causais: descongestionantes nasais.
SÍNDROME POR DEPRESSÃO Brdicardia, hipotensão, edema do pulmão, hiptermia,
Clínica:
íleo, hiporreflexia, convulsões, coma, miose.
DO SISTEMA NERVOSO
Agentes Opióides, barbitúricos, benzodiazepinas, etanol,
CENTRAL Causais: clonidina.
Alteração do nível de consciência, aumento do tonus
Clínica: muscular, hipertermia, hiperreflexia, tremores
SÍNDROME
intermitentes de todo o corpo.
SEROTONINÉRGICO Agentes
Antidepressivos.
Causais:
Fonte: MIR, Moya – Normas de Actuácion en Urgências. 3ª edición. Buenos Aires : Médica
Panamericana, 2005, p.610. ISBN: 84-7903-984-1
Intoxicação Aguda por Antidepressivos 33
Actuação Imediata

Æ Provas complementares: colher sangue para hemograma e bioquímica


(iões, ureia, glucose, creatinina, bicarbonato e osmolaridade), e
eventualmente gasimetria arterial.
Æ Cateterização de uma ou duas vias endovenosas
Æ Fazer electrocardiograma e monitorizar: detectar bradicardias, bloqueios,
prolongação do complexo QRS (sugestiva de antidepressivos tricíclicos),
aumento do intervalo QT e taquiarritmias.
Æ Radiografia do tórax: em doentes comatosos, para despiste de
broncoaspiração.
Æ Administrar antídoto: em intoxicados de causa desconhecida com baixo
nível de consciência e depressão respiratória administrar empiricamente
naloxona 0,4-2 mg por via endovenosa (MIR, 2005, p. 611).

2.4 – INTOXICAÇÕES MAIS FREQUENTES

Abordados os cuidados a adoptar de um modo geral perante um doente


intoxicado e a importância do desenvolvimento das primeiras medidas tão
precocemente quanto possível, passa-se a tratar da assistência de enfermagem
perante doentes intoxicados por diferentes tipos de tóxicos. A sua apresentação far-
se-á de acordo com a maior incidência das intoxicações (BATUCA, 2003, p.107).

2.4.1 – Intoxicações Medicamentosas

O desenvolvimento e a comercialização de alguns fármacos, bem como a sua


acessibilidade (alguns medicamentos facilmente adquiridos sem receita médica,
nomeadamente analgésicos), levam a haja um aumento do seu consumo, consumo
este que nem sempre é acompanhado de vigilância médica, pois muitas vezes a
população recorre à auto-medicação. A estes hábitos está ainda associada a
tendência para se guardarem em locais de fácil acesso. O facto de algumas formas
medicamnetosas serem coloridas, adocicadas e estarem ao alcance das crianças,
representa um risco acrescido para a ocorrência de intoxicações neste grupo etário
(BATUCA, 2003, p.107).
Intoxicação Aguda por Antidepressivos 34
Actuação Imediata

Estes factores são responsáveis em grande medida pelo elevado número de


intoxicações por medicamentos, sendo tanto mais graves quando associadas a
outros fármacos ou a álcool etílico. De entre as intoxicações medicamentosas mais
frequentes salientamos as provocadas por:
Æ Benzodiazepinas;
Æ Barbitúricos;
Æ Analgésicos e antipiréticos.

1) Benzodiazepinas

Este grupo de fármacos caracteriza-se por actuar a nível do sistema nervoso


central.
As benzodiazepinas têm uma acção secante, hipnótica, ansiolítica e
anticonvulsivante. Regra geral, os doentes intoxicados por benzodiazepinas
apresentam alterações neurológicas, nomeadamente: sonolência, confusão,
disartria, ataxia e flacidez muscular mais ou menos generalizada. Pode ainda
apresentar hipotermia e um estado de coma mais ou menos profundo que depende
de vários factores (dose ingerida, tipo de droga, associação com outros fármacos,
idade, presença de patologias associadas) e estar ou não associado a depressão do
sistema nervoso central (BATUCA, 2003, p. 108).
Este tipo de intoxicações ocorre preferencialmente por via digestiva, uma vez
que, as formas por via parenteral são usadas em meio hospitalar. As
benzodiazepinas são rapidamente absorvidas no tubo digestivo em virtude da sua
moderada a alta lipossolubilidade.
De acordo com a observação e avaliação inicial assim irão incidir os cuidados
a instituir a estes doentes. Na globalidade devem compreender:
Æ Avaliação inicial e periódica das funções vitais e estado de
consciência. Alguns doentes necessitam de suporte ventilatório e
cardiocirculatório;
Æ Remoção do tóxico. Deve ser realizada por meio de lavagem gástrica,
tendo em conta o grau de consciência do doente e a protecção das
vias respiratórias.
Intoxicação Aguda por Antidepressivos 35
Actuação Imediata

A indução do vómito é geralmente difícil uma vez que o doente se apresenta


quase sempre sonolento e pouco colaborante, podendo correr-se riscos nesta
situação.
A lavagem gástrica deve ser sempre realizada independentemente do tempo
decorrido sobre a ingestão. Por vezes, passadas algumas horas, ainda se observam
fragmentos de comprimidos.
Após a lavagem gástrica pode estar indicado a introdução de carvão activado,
dado o seu poder absorvente relativamente às benzodiazepinas.
Aquando da instituição das medidas anteriores, deve-se ter em conta que,
estes doentes podem apresentar hipotermia, pelo que, deve-se manter o doente
aquecido com cobertores (BATUCA, 2003, p.108).

2) Barbitúricos

Na intoxicação por barbitúricos o doente pode apresentar letargia,


instabilidade emocional, incoordenação motora, arreflexia osteotendinosa, miose,
numa fase inicial e posteriormente midriase fixa, hipotensão, hipotermia e coma
profundo, sendo por vezes acompanhado de linha isoeléctrica no
electrocardiograma, não significando contudo morte cerebral. Frequentemente
podem ocorrer flictenas nas zonas de pressão (em consequência da compressão
mecânica).
Os princípios a adoptar na assistência a estes doentes são basicamente os
apontados anteriormente, estando nesta situação indicada o aumento da eliminação
urinária através da alcalinização da urina com glicose a 10% e bicarbonato de sódio,
pelo que se deve proceder ao controlo da diurese horária.
Deve ainda dar-se particular atenção ao posicionamento do doente de modo a
evitar o aparecimento de zonas de pressão (provocadas pelo peso corporal devido à
flacidez) (BATUCA, 2003, p.109).
Intoxicação Aguda por Antidepressivos 36
Actuação Imediata

3) Analgésicos e Antipiréticos

A livre comercialização destes produtos e o seu consumo sem vigilância


médica fazem com que muitos doentes desenvolvam intoxicações crónicas,
particularmente se não se apercebem das alterações precoces deste tipo de
intoxicação nomeadamente: a presença de zumbidos, cefaleias, diminuição da
audição e epigastralgias.
Nas intoxicações agudas, as alterações apresentadas ocorrem a nível do
sistema digestivo (náuseas, vómitos, hematemeses e melenas), do sistema
respiratório (aumento da frequência respiratória e cianose), do sistema
cardiovascular (instabilidade hemodinâmica) e do sistema nervoso central (vertigens,
alucinações, convulsões e coma).

Os cuidados visam:

– Garantir o suporte respiratório e hemodinâmico. Avaliação das funções vitais


(frequência respiratória, cardíaca, tensão arterial e temperatura corporal),
sinais de desidratação e hemorragia;
– Eliminar o tóxico através de indução do vómito, lavagem gástrica repetida
com carvão activado e lavagem cutânea. Quando a dose absorvida é elevada
ou quando a situação o exige poderá ser necessário preparar o doente para a
realização da hemodiálise;
– Corrigir as alterações iónicas, hídricas, pH e endócrinas apresentadas pelo
doente e que ponham em risco a sua sobrevivência, como a acidose
metabólica ou respiratória (BATUCA, 2003, p.110).

2.4.2 – Intoxicações por Pesticidas

A difusão do uso de pesticidas no meio agrícola ocasionou um aumento


significativo do número de intoxicações por estes compostos, quer de natureza
voluntária, quer acidental. Estas, devido ao não cumprimento das regras de
utilização (BATUCA, 2003, p.110).
Intoxicação Aguda por Antidepressivos 37
Actuação Imediata

ORGANOFOSFORADOS

Existem comercializados no mercado um número significativo de compostos


organofosforados distribuídos por um elevado número de marcas comerciais. Estes
produtos, bem como alguns carbonatos, são inibidores das colinesterases, levando a
incapacidade de hidrólise de acetilcolina, com consequente acumulação da
acetilcolina nas sinapses do sistema nervoso autónomo, sistema nervoso central,
glândulas exócrinas e placa-motora neuro-muscular.
A acumulação de acetilcolina leva ao aparecimento dos síndromes
muscarínico, nicotírico e sintomas a nível do sistema nervoso central, podendo o
doente apresentar as alterações a seguir indicadas (BATUCA, 2003, p.110).

Na tabela 4, são apresentadas as alterações decorrentes de intoxicação por


organofosforados.
Intoxicação Aguda por Antidepressivos 38
Actuação Imediata

TABELA 4 – Alterações decorrentes de intoxicação por organofosforados

SINDROMAS/SINTOMAS ALTERAÇÕES
– Respiratório: constrição torácica, hipersecreção
brônquica, tosse, dispneia, cianose e edema
pulmonar.
– Digestivo: náuseas, vómitos, cólicas abdominais,
Muscarínico diarreia, tenesmo e incontinência fecal;
(aumento do estímulo – Cardiovascular: hipotensão arterial e bradicardia;
vagal) – Urinário: polaquiúria e incontinência urinária;
– Glandular: hipersecreção lacrimal, salivar e
sudorípara;
– Pupilar: miose, por vezes anisocória;
– Visual: perturbações visuais.
– Aumento da acção dos gânglios simpáticos: palidez,
taquicardia e perturbações tensionais;
Nicotínico
– Reforço da sinapse músculo-estriada: fasciculações,
cãibras e hipotonia.
– Labilidade emocional, cefaleias, tremores, apatia,
ataxia, astenia generalizada, respiração cheyne-
Sistema Nervoso Central
stokes, convulsões, depressão dos centros
respiratórios e circulatórios e coma.

Fonte: BATUCA, Artur Alberto Lacerda R. ; COELHO, José Carlos Quaresma ; MOREIRA, Isabel
Maria Pinheiro Borges - Técnicas de Urgência. 2ª ed. Coimbra : Formasau, 2003, p. 111.

A maioria das intoxicações dá-se por via oral (ingestão do tóxico), no entanto
podem também ocorrer por via respiratória e cutânea.
A absorção é favorecida pelo calor, pela humidade ambiente e pela sudação.
Aquando da avaliação inicial o doente intoxicado por organofosforados pode
apresentar-se assintomático. O período de latência entre a intoxicação aguda e o
aparecimento da sintomatologia tem uma duração variável (dependendo da via de
contacto, da quantidade absorvida e do tipo de tóxico) em virtude de muitos
organofosforados serem toxicologicamente inertes e só após a sua bio-
transformação se convertem em metabolitos quimicamente reactivos.
Intoxicação Aguda por Antidepressivos 39
Actuação Imediata

Na assistência a estes doentes, aquando da colheita de informação, deve


valorizar-se qualquer alteração que o doente manifeste, ou informação, pois podem
traduzir-se em achados importantes para a identificação do tóxico (BATUCA, 2003,
p.112).

As acções a desenvolver, de uma maneira geral e de acordo com as


alterações apresentadas pelo doente são:
1) Manutenção das funções vitais;
2) Remoção do tóxico;
3) Administração de terapêutica vagolítica.

1) Manutenção das Funções Vitais

Assegurar uma boa oxigenação constitui o cuidado prioritário a ser tomado.


Assim, deve proceder-se-á:
– Rápida aspiração das secreções – manutenção das via aéreas permeáveis;
– Preparação do doente para entubação oro-traqueal e ventilação assistida
caso este apresente depressão respiratória ou insuficiência respiratória
aguda;
– Administração de O2 (a administração de oxigénio está totalmente contra-
indicada nas intoxicações por paraquato);
– Avaliação frequente dos parâmetros vitais e estado de consciência (BATUCA,
2003, p.113).

2) Remoção do Tóxico

De imediato e em simultâneo, deve proceder-se à remoção do tóxico antes


que este seja absorvido. Se o doente estiver consciente recorre-se à indução do
vómito seguida de lavagem gástrica de forma a completar o esvaziamento gástrico.
Caso não seja possível (se o doente estiver em coma) deve recorrer-se logo à
entubação nasogastrica, aspiração do conteúdo gástrico e lavagem gástrica. Após a
lavagem deve administrar-se terra de Fuller.
Como a absorção é rápida por qualquer das vias e o contacto nunca se dá
somente por uma via, pode haver derrame do produto sobre a pele, deve realizar-se
Intoxicação Aguda por Antidepressivos 40
Actuação Imediata

sempre a lavagem abundante da pele com água e sabão, se possível um sabão


neutro (BATUCA, 2003, p.113).

3) Administração de Terapêutica Vagolítica

A administração de atropina, segundo prescrição médica, dá-se enquanto o


doente apresentar alterações que o justifiquem. Durante a sua administração deve
proceder-se à observação global do doente, pois a atropinização excessiva não é
isenta de riscos.
Os sinais de atropinização são:
– Midriase;
– Pele seca e ruborização (rubor facial);
– Taquicardia;
– Ausência de secreções.

A atropina inibe a transmissão do estímulo colinérgico funcionando como


“antídoto” farmacológico. A sua administração faz-se inicialmente em doses de 2 a 4
mg por via endovenosa com intervalos de 5 a 15 minutos.
Após a atropinização dos doentes intoxicados por organosfosforados pode
estar indicado a utilização de oximas (fármacos regeneradores da esterase inibida)
(BATUCA, 2003, p.114).

2.4.3 – Intoxicações por Produtos Caústicos

Os produtos cáusticos conduzem rapidamente a alterações tecidulares


irreversíveis, provocam coagulação das proteínas e destroem as estruturas
plásticas.
O contacto dá-se principalmente pela via digestiva, podendo também ocorrer
através da pele e por inalação. Após o contacto com o cáustico dá-se imediatamente
lesão que pode terminar em perfuração a nível orgânico (esófago e estômago).
Intoxicação Aguda por Antidepressivos 41
Actuação Imediata

Assim, devem ser tomadas os seguintes cuidados:


– Não induzir o vómito;
– Avaliar as lesões examinando a boca e a orofaringe;
– Preparar o doente para fibroscopia (examinar o esófago, estômago e
duodeno) para despistar a existência de lesões baixas;
– Fazer palpação abdominal, verificando se há defesa;
– Preparar o doente para a realização de raio X simples do abdómen
em pé e tórax;
– No caso de haver lesões gástricas, o doente deve ficar em pausa
alimentar durante 3 semanas, sendo instituída alimentação parenteral;
– No caso de se ter dado contaminação da pele e olhos deve proceder-
se à remoção rápida do produto através de lavagem continua com
água corrente.

A entubação e indução do vómito são contra-indicados pelo risco de


perfuração. A lavagem gástrica só está indicada nas intoxicações por paraquato e
ácido flurídico.
Por vezes justifica-se a aspiração gástrica (se possível através de
fibroscópio), como é o caso de cáusticos fracos mas ingeridos em grande
quantidade.
Nestas situações importa não só os sinais vitais mas também despistar sinais
de hemorragia (BATUCA, 2003, p.114).
Intoxicação Aguda por Antidepressivos 42
Actuação Imediata

3 – INTOXICAÇÕES POR ANTIDEPRESSIVOS

Neste capítulo será feita uma breve abordagem às intoxicações por


antidepressivos, fazendo referência à sua epidemiologia, farmacocinética, toxicidade
e tratamento.
Dada a diversidade de terapêutica antidepressiva, a abordagem debruçar-se-
á essencialmente sobre os antidepressivos tricíclicos (tricyclic antidepressants,TCA).

3.1 – EPIDEMIOLOGIA

Os antidepressivos tricíclicos relacionam-se com maior número de mortes


associadas a fármacos que qualquer outra classe de medicamentos por prescrição,
já que a sua actividade farmacológica complexa, baixo índice terapêutico e
disponibilidade geral predispõe ao desenvolvimento de toxicidade clínica.
Estudos revelam que uma em cada 27 exposições em adultos a
medicamentos farmacêuticos implicou um TCA. Nos últimos cinco anos terão
ocorrido, em média, 19 000 exposições e 120 mortes relacionadas com este
fármaco. No entanto, sem dúvida que estes números subestimam a magnitude real
da toxicidade farmacológica relacionada com estes antidepressivos. A maior parte
das exposições a TCA ocorre essencialmente em adultos jovens, e considera-se que
cerca de 60% de todas as exposições são intencionais (TINTINALLI, 2006, p.1204).

3.2 – FARMACOCINÉTICA

Os ADT (antidepressivos) sofrem metabolização hepática por oxidação e


hidroxilação numa via metabólica, noutra via sofrem dimetilação originando
metabólitos também activos. Eles têm uma forte tendência em ligar-se às proteínas
plasmáticas, embora a fracção livre tenha também uma grande importância na
acção terapêutica. Apenas 5% da dose ingerida é excretada em sua forma original.
Intoxicação Aguda por Antidepressivos 43
Actuação Imediata

Como os metabólitos dos ADT são activos terapeuticamente, as diferenças


individuais de metabolização fazem com que as doses equivalentes prescritas
resultem, com frequência, em níveis plasmáticos discrepantes de uma pessoa para
outra.
O local de acção dos ADT é no Sistema Límbico aumentando a NE
(noradrenalina) e a serotonina (5HT) na fenda sináptica.
Este aumento da disponibilidade dos neurotransmissores na fenda sináptica é
conseguido através da inibição na recaptação destas aminas pelos receptores pré-
sinápticos. Parece haver também, com o uso prolongado dos ADT, uma diminuição
do número de receptores pré-sinápticos do tipo Alfa-2, cuja estimulação do tipo
feedback inibiria a liberação de NE. Desta forma, quanto menor o número destes
receptores, menor seria sua estimulação e, consequentemente, mais NE seria
liberada na fenda.
Portanto, dois mecanismos relacionados à recaptação; um inibindo
directamente a recaptação e outro diminuindo o número dos receptores.
Alguns autores tentam relacionar subtipos de depressão de acordo com o
envolvimento do sistema serotoninérgico ou noradrenérgico. Teríamos então,
bioquímica e farmacologicamente, a depressão por défice de 5HT, considerada
depressão ansiosa e a depressão por défice de NE, depressão inibida.
Importa, em relação à farmacocinética dos ADT, o conhecimento do período
de latência para a obtenção dos resultados terapêuticos. Normalmente estes
resultados são obtidos após um período de 15 dias de utilização da droga e, não
raro, podendo chegar até 30 dias.
Os ADT são potentes anticolinérgicos e por esta característica seus efeitos
colaterais são explicados. Enquanto os efeitos terapêuticos exigem um período de
latência, o mesmo não acontece com os efeitos colaterais. Estes aparecem
imediatamente após a ingestão da droga e são responsáveis pelo grande número de
doentes que abandonam o tratamento antes dos resultados desejados (BALLONE,
2005).
Intoxicação Aguda por Antidepressivos 44
Actuação Imediata

3.3 – TOXICIDADE

As doses terapêuticas dos TDA são muito variáveis e determina-se com base
em muitos factores. Qualquer dose superior a 1 a 5 mg/kg por dia tem o potencial de
produzir toxicidade, e os sintomas de perigo de morte surgem em doses superiores
a 10 mg/kg em adultos (TINTINALLI, 2006, p.1207).
Pode ocorrer óbito com a sobredosagem com esta classe de drogas. A
ingestão múltipla de drogas, incluindo o álcool, é comum na sobredosagem
deliberada de antidepressivos tricíclicos.
Os sinais e sintomas de toxicidade desenvolvem-se rapidamente, havendo
necessidade, o mais rápido possível de monitorização hospitalar.
As manifestações clínicas de sobredosagem incluem: disritmias cardíacas,
hipotensão grave, convulsões e depressão do SNC incluindo coma. Alterações no
eletrocardiograma são indicações clínicas significativas de toxicidade com
antidepressivo tricíclico. Outros sinais podem incluir contractilidade diminuída do
miocárdio, confusão; concentração perturbada, alucinações visuais transitórias,
pupilas dilatadas, desordens da motilidade ocular, agitação, reflexos de
hiperactividade, poliradiculoneuropatia, estupor, sonolência, rigidez muscular,
vómito, hipotermia, hiperpirexia ou qualquer um dos sintomas descritos como
reacções adversas (INFARMED, 2007)

3.4 – TRATAMENTO

Deve ser feito um electrocardiograma e iniciar imediatamente a monitorização


cardíaca. Proteger as vias aéreas do doente, estabelecer uma linha intravenosa e
iniciar a descontaminação gástrica. Esta descontaminação inclui lavagem gástrica
com grandes volumes, seguida de administração de carvão activado. Se o estado de
consciência estiver prejudicado, as vias aéreas devem ser asseguradas antes da
lavagem. A emese é contra-indicada.
Deve haver um mínimo de 6 horas de observação com monitorização
cardíaca e para os sinais de depressão respiratória ou do sistema nervoso central,
hipotensão, disritmias cardíacas e/ou bloqueios de condução e convulsões.
Intoxicação Aguda por Antidepressivos 45
Actuação Imediata

A monitorização deve ser estendida caso hajam sinais de toxicidade no


período, pois existem relatos de disritmias fatais tardias após a sobredosagem; estes
doentes apresentaram evidências clínicas de envenenamento significativo antes do
óbito e a maioria não recebeu descontaminação gastrointestinal adequada. A
monitorização cardíaca deve ser mantida por pelo menos 5 dias.
Para a manutenção do pH sérico entre 7,45 a 7,55 deve-se administrar
bicarbonato de sódio EV. Se a resposta ao pH for inadequada, a hiperventilação
pode também ser usada. O uso simultâneo de hiperventilação e bicarbonato de
sódio deve ser feito com extremo cuidado e com monitorização contínua do pH. O
pH > 7,6 ou o pCO2 < 20 mm Hg não é desejável. As disritmias que não respondem
à terapia bicarbonato de sódio / hiperventilação podem responder à lidocaína,
bretílio ou fenitoína. Os antiarrítmicos tipo quinidina, disopiramida e procainamida
são geralmente contra-indicados.
Em doentes com depressão do SNC, a entubação rápida é aconselhada
devido ao potencial para a deterioração abrupta. As convulsões devem ser
controladas com benzodiazepínicos, ou se não forem efectivos, com outros
anticonvulsivantes como fenobarbital ou fenitoína. A fisostigmina não é
recomendada a não ser que hajam sintomas de risco de vida que não responderam
a outras terapias e nesse caso devem ser administrados via EV de 1 a 3 mg de
salicilato de fisostigmina, repetindo-se a dose se necessário.
Raramente a hemoperfusão pode ser benéfica na instabilidade cardiovascular
refractária aguda em doentes com toxicidade aguda. Entretanto, a hemodiálise, a
diálise peritoneal, transfusões e diurese forçada têm sido relatadas em geral como
inefectivas no envenenamento por antidepressivos tricíclicos.
Pelo fato de a sobredosagem ser frequentemente deliberada, os doentes
podem tentar o suicídio através de outros meios durante a fase de recuperação.
Deve haver acompanhamento psiquiátrico (INFARMED, 2007).
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Actuação Imediata

4 – CONCLUSÃO

Após a realização deste trabalho, torna-se possível a melhoria dos cuidados a


nível do doente intoxicado. A busca de conhecimento culmina com a consolidação
das aprendizagens já vivenciadas e com a aquisição de competências que tornam
cada indivíduo capaz de prestar cuidados com qualidade.
Assim, deste modo foi possível abordar alguns conceitos gerais sobre
toxicologia, no qual se inclui a absorção, distribuição e excreção do tóxico. Por outro
lado, é importante reforçar a importância da adopção de medidas de prevenção e da
instituição de cuidados precocemente na tentativa de diminuir a incidência destas
situações e as taxas de mortalidade e morbilidade.
Em termos de intervenções imediatas ao doente intoxicado, estas baseiam-se
essencialmente na manutenção das funções vitais, colheita de informação, uma vez
que a identificação do tóxico determina algumas intervenções um pouco distintas, e
ainda a remoção do tóxico, em que as técnicas mais usuais são a lavagem gástrica,
administração de carvão activado e catárticos, lavagem intestinal e indução do
vómito.
Outro ponto deste trabalho acenta na exposição das intoxicações mais
frequentes, nas quais se insere as intoxicações medicamentosas, por pesticidas e
por produtos cáusticos.
Num segundo capitulo do trabalho, foi descrita a intoxicação por
antidepressivos, dando-se ênfase a alguns dados epidemiológicos que dão conta
que é uma substância frequente nas intoxicações e por vezes fatal, e ainda as
manifestações clínicas da sobredosagem de antidepressivos, bem como o
tratamento imediato.
Finalizo este trabalho com a ideia de que poderá ser um contributo para a
ampliação de conhecimentos e sobretudo para a melhoria da prestação de cuidados.
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Actuação Imediata

BIBLIOGRAFIA

ADT® [em linha] INFARMED, 2007. [citado 4 de Abril de 2008]. Disponível em <URL:
http://www.infarmed.pt/infomed/download_ficheiro.php?med_id=137&tipo_doc=fi>

BALLONE, GJ - Antidepressivos Tricíclicos [em linha] PsiqWeb, 2005. [citado a 4 de


Abril de 2008]. Disponível em <URL:http://virtualpsy.locaweb.com.br/index.php?sec
=61&art=261>

BATUCA, Artur Alberto Lacerda R. ; COELHO, José Carlos Quaresma ; MOREIRA,


Isabel Maria Pinheiro Borges - Técnicas de Urgência. 2ª ed. Coimbra : Formasau,
2003, p. 83-115.

MIR, Moya – Normas de Actuácion en Urgências. 3ª edición. Buenos Aires :


Médica Panamericana, 2005, p.607-614. ISBN: 84-7903-984-1.

TINTINALLI, Judith E. [et al] - Medicina de urgencias. 6ª ed. México : McGraw-Hill, .


2006, p.1197-1229. ISBN 970-10-5134-3.

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