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C o r p o r e m a
por uma Geografia Bailarina
1a Edição
por uma geografia bailarina
corpo
que é poema
que é mapa
corpo
corpo-afeto
corpo-grafia
que é
sobretudo
vida
CORPOREMA
por uma geografia bailarina
Antonio Carlos Queiroz Filho
CORPOREMA
por uma geografia bailarina
2018
1a Edição
E-book, 378 páginas
Abril, 2018
Vitória-ES, Brasil
ISBN: 978-85-924688-0-4
TÍTULO
Corporema: por uma Geografia Bailarina.
AUTOR
Antonio Carlos Queiroz Filho.
EDIÇÃO
Antonio Carlos Queiroz Filho.
CONSELHO EDITORIAL
Eduardo Marandola Jr., Manoel Fernandes. Rafael Borges, Igor Robaina
Prefácio; p. 13
Dizer, Dizeres; p. 20
Gesto, Gestos; p. 31
Saber, Saberes; p. 36
Palavra, Palavras; p. 39
Grafia, Grafias; p. 48
Dança, Alguém Dança; p. 72
Corpo-Grafia; p. 169
Habitar (de) um Corpo Triste; p. 175
Posfácio; p. 353
Referências; p. 355
Anexos; p. 362
Descomeços
E desaprendizagens.
AGRADECIMENTOS
- À minha amiga de longa data, Marília Colares, pela presteza nos momentos
mais necessários;
- À grande amiga Thay Bettini, pelas longas horas de companhia e afago, mesmo
estando do outro lado do oceano;
10
Marcos Saleme e Rick Alves, bem como, as bailarinas Layli Rosado, Aline
Canavese, Alana Moreira, Beatriz Afonso, Paloma Rigamonte e Rebeca Freitas;
neste livro:
- Portugal:
Universidade do Minho
Quorum Ballet
11
- Itália:
- Espanha:
LJ Studio de Dança
- Brasil:
12
PREFÁCIO em Pas de Deux,
13
- Quatro versos despisados
Descomeços
E desaprendizagens.
14
movimento corpóreo-sensível que eriça nossas geografias. Corpo que é mapa,
rua, no pensamento.
construção epistemológica de seu livro é este que agora tenta não encetar o
máximo, mesmo que não tenha tido a intenção, de que qualquer um lhe coloque
Tavares, Pellejero e Massey, Oliveira Jr. e Gil, Agamben e Augé são outros dos
vários diálogos entremeios, que são compostos entre política, estética, poética
15
e epistemologia, pois Queiroz Filho não se esquiva da questão do
Talvez por isso seja inútil delimitar que geografia seja esta. Com a
pela sensibilidade, o que dialoga de tantas formas com esforços e buscas das
descomeços.
16
- Desapresentando Corporema
formatadas.
tudo, improvável dizer todas as coisas apenas com palavras ou ainda alcançar
grafá-las e muito difícil pensar sem a existência delas. Mas as nomeações como
17
inimagináveis potências humanas, não podem servir a um projeto de
É talvez por isso que o livro, esse objeto com um corpo, tenha mudado
guardar e deixar soar vozes e sons e imagens que o habitam, para explodir com
possíveis.
Baraka dirigido por Ron Fricke; a figura do jovem chinês que fez, com seu balé,
18
Afetos afeitos a amar a cidade de Braga, os miúdos de Portugal que
como Ana Azevedo, tatuagens na epiderme dos suores musculares das palavras.
imaginárias. Lembrou como é bom dançar até que as pernas não saibam mais
Haesbaertianas.
O jogo epistêmico da obra que leitores vão paginar com mouses in/or
touche pads, propõe que não se está propondo ou defendendo nada além do
linguagem, linguaviagens.
expressar dizendo, porque tudo enfim falharia caso se prestasse a ser uma
saber o que dizer enfim, além de um conselho só, leia Corporema na des-ordem
19
DIZER, dizeres
20
Um querido amigo professor disse-me, na ocasião da leitura de uma
versão ainda bastante preliminar deste livro: você precisa balizar, de pronto, que
Geografia é essa que você está tentando fazer. E aqui estou eu, como um
de algum modo, colocar em palavras algo que considero ser da ordem do gesto,
Portanto, não sei se consigo ou, inclusive, não sei se devo tentar dizer,
em dois ou três parágrafos, sobre qual seria essa Geografia que estou
“tentando” fazer. Talvez porque desde 1998, ano em que entrei no curso de
Há algo que tem ficado para fora, como uma aresta que nunca se
apara e que eu até poderia tentar qualificá-la como definidora dessa geo-grafia.
uma Geografia que para mim se constituía como uma articulação desses três
elementos:
21
espécie de incompletude perenizada pela minha nostalgia de algo que não havia acontecido.
Hoje percebo que esse movimento fez com que eu deixasse de reconhecer a mim mesmo
enquanto ser – fazedor de uma geografia – tal que, meu estranhamento tornou-se tamanho,
a ponto de negá-la. Olhava para ela e não me sentia acolhido, seguro. Adormecido por este
sentimento de desamparo, fui seguindo, como se estivesse com os pés nus sobre um chão
duro, batido por outros tantos pés que já haviam por ali passado”
(Trecho da tese de doutorado, intitulada: Vila-Floresta-Cidade: território
e territorialidades no espaço fílmico, 2009).
Por isso, se fosse para dar algum tipo de “baliza”, arriscaria dizer que
Geografia para mim é mesmo como um gesto que partilha de tais artifícios. É
E são esses gestos que a “definem”. Qual seu gesto? Esta é a questão que
realmente importa, porque esta será “a” Geografia, dito de outro modo, esta
“humano”. Por isso, retomo algo que escrevi sobre a política dos afetos como
- Dizer-Humano
22
Descer ao porão é sonhar
exemplo
[…]
Depois outro;
Porque pensar
À própria linguagem.
duplo, aquilo que é e não é, que pode e não pode, ao mesmo tempo. É uma
23
Esse, talvez, seja nosso maior desafio, principalmente se pensarmos
num contexto de mundo que nos coloca diante de palavras e imagens que
menos. O fato é que talvez estejamos nós obedientes demais a elas, palavras e
ordem. E o modo como resolvi fazer isso tem amparo conceitual e imaginativo,
18).
24
E se, para ele, o ato poético é a “chama do ser na imaginação”, então
me vem a questão: o que temos apagado, o que temos silenciado, o que temos
científico como “um produto direto do coração” (Bachelard, 1993, p. 2), que se
assume como uma imaginação criadora: Bachelard diz que “não há poesia se
não houver criação” (Bachelard, 1993, p. 15) e porque não dizer: não há
25
normativo, mas, sim, o delineamento de um horizonte, ainda que anuviado, de
possibilidades.
Dizer-Poesia...
O que pode um
Dois
Três
Pode três?
Mas
Quem pode?
Quem diz?
Quem faz?
Quem quer?
Um dizer outro
Atravessado, provocado:
E se precipita:
26
– Num hífen, numa vírgula, num ponto:
Fora do lugar
Fazer-sentir
Um fazer-sentir inventivo
Comprometido com
A potência criativa
No rascunho
No fragmento
Na rasura
Considero importante evidenciar que tem sido cada vez mais difícil
27
ser desobedecida. Talvez nem seja uma permissão e sim uma tomada de poder
daqueles que fazem dela seu lugar de liberdade e emancipação. Daqueles que
ora desconfiam, ora desconhecem e, por isso mesmo, fazem atuar o indefinido
desobedecida, enfatiza Skliar (2014, 17), “não haveria filosofia, nem arte, nem
amor, nem silêncio, nem mundo, nem nada”. Do mesmo modo, Jorge Larrosa
(2015) fala de como ele tem se engajado diante do desafio de pensar em “como
deixarmos de ser o que somos para ser outra coisa, diferente do que vimos
linguagem, com o pensamento, com os outros, com nós mesmos, com o que se
diz e o que se pensa, com o que dizemos e o que pensamos, com que somos e
28
Dizer-Vida...
29
Geografia Minha...
Que é partilha
Que é
Senão
Talvez
Plural
Incompleta
Pedaço de pedaço
Fragmento
Instante
Momento
Contexto
Processo
Sensível
Pensamento
Poética
Política
Dos afetos
Das palavras
Dos gestos
Dos movimentos
Dos corpos
Das pessoas
Geo-grafia
Escrita da terra
Linguagem da terra
Terra que é gente
Gente que é
Por isso:
- geografias
30
GESTO, gestos
- Meu compromisso não é com a verdade, para fazer jus à poética manoelesca,
referência à Manoel de Barros, poeta das coisas pequenas e dos horizontes
esticados.
31
Este livro...
um
fr a g m e n t o
Como tal, foi escrito, por vezes, num tom ensaístico, outras, num tom
32
se busca mais o ponto de partida, nem o de chegada, e sim a
Então,
Este livro...
É isso:
Que indica
- Sussurro:
33
rizoma
________________________________________________________
Entra-se por qualquer lado, nenhum vale mais do que outro, nenhuma entrada
tem qualquer privilégio (...) Poder-se-á apenas procurar com que pontos se
liga aquele pode onde se entrar (...) qual é o mapa do rizoma e como é que este,
de repente, se modifica esse entrar por qualquer outro ponto. O princípio das
entradas múltiplas só impede a entrada do inimigo, o Significante, e as
tentativas para interpretar uma obra que, de facto, só propõe a experimentação
(Gilles Deleuze e Félix Guattari9)
8
https://www.youtube.com/watch?v=2k-wWziPk-g
9
2002, p. 19
34
Porque
sua história”:
— Filho?
— Sim, pai.
— Lembra-se que eu lhe dizia para inventar histórias?
Pois invente uma agora.
—Não tenho força.
— Tente.
— Pior que não saber contar histórias, pai,
…é não ter ninguém a quem
as contar.
— Eu escuto a sua história
(Mia Couto, 2013)
sentido daquela que se veste de toga autoritária. Meu compromisso não é com
poeta das coisas pequenas e dos horizontes esticados. Com ele aprendi a fazer
devaneios pueris nas unhas daquela criança que ainda acredita na sua própria
E isso basta.
35
SABER, saberes
- Então, este livro tem, assumidamente, um quê larrosiano, porque acabou por
se tornar, parafraseando o autor: cantos gestos, movimentos de experiência.
36
Preciso dizer que as palavras aqui gestadas, em sua parte mais
singular de estar no mundo, que é, por sua vez, uma ética (um
p. 32)
Dois destaques:
• Importância:
• Experiência:
37
A experiência, diz Bataille, não nos faz melhores, ao
experiência.
emocionantes”
subjetividade (...)”
38
PALAVRA, palavras
- Ocupar a casa, ocupar a vida, ocupar as palavras, mesmo que elas não sejam
as nossas. Mas então, elas já não são de ninguém. Porque fazer ecoar é tornar
indiscernível.
39
Por vezes, quando não conseguimos dizer, ouvimos. Por vezes,
E por mais que este livro seja um exercício perene para fala
de todas as vozes que tomei emprestado para conseguir fazer do silêncio, eco.
E talvez seja isso que esteja em questão. Ocupar a casa, ocupar a vida, ocupar
as palavras, mesmo que elas não sejam as nossas. Mas então, elas já não são de
Sinto dúvida sobre isso. A verdade é que não acredito que seja algo necessário,
autores como quem murmura no fundo da casa vazia. Quando os ouvir, eles
40
O rio que fazia uma volta atrás da nossa casa
era a imagem de um vidro mole...
Passou um homem e disse:
Essa volta que o rio faz... se chama enseada...
Não era mais a imagem de uma cobra de vidro
que fazia uma volta atrás da casa.
Era uma enseada.
Acho que o nome empobreceu a imagem.
(Manoel de Barros)
41
O resultado desse anuviado teórico-poético evidencia-se em alguns
aspectos, a saber:
experiencial;
epistemológicas;
• a escolha pelo habitar a cidade como lugar dessa e para essa grafia;
Especificidade essa que se inicia na assertiva de que o termo “dança” aqui não
42
A dança aqui, nesse sentido, não poderia ser outra coisa, senão,
10
Cf.: https://periodicos.ufsc.br/index.php/Outra/article/view/12576/11743
43
no seu sentido restrito – e mais naquilo que acontece com/quando alguém que
dança.
uma geografia da dança, como havia pensado de antemão, veio uma geografia
Ser bailarino
É escolher o corpo
E o movimento do corpo
Como campo de relação com o mundo,
Como instrumento de saber,
De pensamento e de expressão.
(Louppe, 2012, p. 69)
tempo, num certo lugar. Corpo que desacostuma o sensível e faz do si mesmo
mão, meu “por” não é manifesto. Ele não está aqui como algo que possa ser
lido como “em defesa de”. Não pede chancela, nem quer servir de modelo
44
- “Por”, como preposição:
tal, é possível encontrar cerca de 28 definições para seu uso11. Como enuncia
alguma dessas definições, “por uma geografia bailarina” pode sim ser
compreendida como:
11
Origem ⊙ ETIM lat. tar. por < prep. lat. pro 'diante de, em frente etc.' pôr. Fonte: Dicionário Google.
45
- “Por”, como verbo:
que me apetecem:
fazer um relato, uma descrição de; detalhar, narrar uma geografia bailarina
fazer figurar; incluir uma geografia bailarina
fazer tocar uma geografia bailarina
dar (nome) a; denominar uma geografia bailarina
aceitar como hipótese; admitir, supor uma geografia bailarina
empreender a construção de, edificar uma geografia bailarina
adotar determinada postura ou estado de uma geografia bailarina
de negligência ler “por uma geografia bailarina” de modo tão uníssono. Quero
12
Origem ⊙ ETIM lat. pono, is, posŭi, posĭtum, pon ĕre 'pôr, colocar, postar, fixar etc.' Fonte: Dicionário
Google.
46
Dá-me a tua mão:
Vou agora te contar
como entrei no inexpressivo
que sempre foi a minha busca cega e secreta.
De como entrei
naquilo que existe entre o número um e o número dois,
de como vi a linha de mistério e fogo,
e que é linha sub-reptícia.
Entre duas notas de música existe uma nota,
entre dois fatos existe um fato,
entre dois grãos de areia por mais juntos que estejam
existe um intervalo de espaço,
existe um sentir que é entre o sentir
- nos interstícios da matéria primordial
está a linha de mistério e fogo
que é a respiração do mundo
Clarice Lispector (Paixão segundo G.H.)
47
GRAFIA, grafias
- Falo a partir do corpo de alguém que dança, que vive intensivamente a dança.
Falo a partir dessa experiência: a de ter sido tomado inteiramente por essa forma
de arte.
48
O mapa da cidade
é o mapa do corpo.
(Mário Quintana)
certa forma a questão feita por Michel Agier no seu livro “Antropologia da
Cidade”:
Para mim, são as narrativas do corpo. Mas não qualquer corpo. Pelo
que dança, que vive intensivamente a dança. Falo a partir dessa experiência: a
de ter sido tomado inteiramente por essa forma de arte. Porque o corpo que
Por isso,
Com isso,
desafio.
13
Referência ao poeta brasileiro Mário Quintana.
49
Cidade-poesia
Cidade-Sensibilidade
Cidade-Palavra
Cidade-Grafia
Cidade-Linguagem
Cidade-Gesto
Cidade-Movimento
Cidade-Dança
Fazer-Cidade
Sentir-Cidade
Devir-Cidade
Diver-Cidade
50
- A cidade como sensibilidade
outros tantos possíveis do dizer e ver a cidade, que por sua vez, coloca-nos
processo.
produzir outras. A pergunta que cabe agora é: essa “outra” imaginação, seria
feita de que? Entra em cena então a poética. Em espacial aquela de que trata
palavras é a sensatez dos homens que não têm o compromisso com a gramática,
a loucura dessa Geografia talvez esteja exatamente naquilo que ela (e outras
51
...antes uma anunciação
Enunciados como que constantivos
Manchas. Nódoas de imagens
Festejos de linguagem
(Manoel de Barros, O Livro de Pré-Coisas)
(Rancière, 2009, p. 11), então, o que estamos desejando, no fim das contas, é
dar a essa “imagem” novos usos, novos sentidos, novas políticas, em resumo,
se:
52
• o que imediatamente nos leva a uma segunda questão: qualquer texto,
potência menor”, cidade intensiva, que faz proliferar a vida enquanto encontro
cidade-arte, todas misturadas, dobradas entre si, uma dizendo da outra, sendo
todas, a mesma. Cidade inventada para não mais caber no gesto repetido de
53
Tem a mesma cor da violência
Os dois acreditam em armas
Os dois abrem portas com dólares e euros
Um beijo na pátria amada
Ao lado de uma bandeira queimada
Braço, é braço, braço de terra negada
Braços pulando os muros do mundo
Do futuro por emprego, braços de refugiados
Apesar de tudo, por um instante
Pousam num estado de aleluia
Sem religião desterro, ah, desterro
Desterro (Marisa Monte, part. F.U.R.T.O)
que reconhece, tal qual nos aponta o filósofo italiano Gianni Vattimo, a
54
e que torna impossível conceber o mundo e a história segundo pontos de vista
unitários” (Vattimo, 1992, p. 12). Num diálogo direto com o filósofo francês, Jean
denominação, que também não deixa de ser paradoxal: a de que estamos diante
mesmo tempo, esse mesmo mundo vê-se “cheio de ‘abcessos de fixação’, sejam
55
“mercadoria sempre escassa e distribuída de forma desigual, logo se torna o
modernos” (Bauman, 1999, p. 08). Isso nos faz pensar, portanto, em duas
portanto, na relação desses dois aspectos que podemos pensar sobre um “dizer-
14
Tradução livre: “Um paradigma das mobilidades não é apenas substantivamente diferente, pois remedia
a negligência e as omissões de vários movimentos de pessoas, ideias e assim por diante. Mas é
transformador das ciências sociais, autorizando uma paisagem teórica e metodológica ao exterior”.
56
podemos destacar duas questões fundamentais quando pensamos na
a) a experiência:
nos fazendo pensar que estar informado é ter conhecimento. Vattimo alerta que
torne-se objecto de comunicação” (Vattimo, 1992, p. 12). Talvez por isso nos
“como se aprender não fosse outra coisa que não adquirir e processar
b) o sensível:
explica que “os atos estéticos configuram experiências” (Rancière, 2009) e, por
57
do viver citadino contemporâneo. A experiência do habitar urbano está
contexto, qual seria o ideal de emancipação que nos resta? Vattimo defende a
aquilo que ele vai chamar de “a distribuição das posições”. Ele afirma que:
no mundo que se alinha às questões com as quais estamos lidando. Para ele, é
nos deixando contagiar pelas estranhezas que nos cercam, ou ainda, nas
31).
58
O autor propõe uma mudança na seguinte questão: ao invés de dizermos: “o
Talvez assim possamos assumir uma orientação que tome a cidade não
mais como “‘uma coisa’ que eu possa ver, nem ‘um objeto’ que eu possa
apreender como totalidade” (Agier, 2011, p. 38), não mais como “uma
relacional e situacional, pois, “o próprio ser da cidade surge, então, não como
polifonia:
experiência, como no plano do sensível, que são, por assim dizer, a “recitação
59
Tavares fala dessa “recitação de movimentos, talvez da mesma
como fato verificável, mas como uma potencialidade combativa diante de fluxo
consumo. Poética do habitar é, por assim dizer, aquela em que existe porque
(Queiroz Filho; Damiani; Borges, 2013, p. 72). E, com isso, autorizo-me a fazer
60
Ainda que essa prática seja, para Jacobs, uma forma de olhar para as
pensar o mundo a partir do contato direto com o fluxo da vida e, o que exige
de nós, dentre tantas coisas, uma mudança de escala: olhar mais “de perto” e
Quando li Massey (2008) afirmar que, para ela, “a teoria surge da vida”,
aquilo me soou de uma forma, que poderia dizer, transformadora. Esse era uma
secreta da desarmonia”, ou aquilo que “não o que está feito mas o que
61
Nessa perspectiva, a intimidade, ou seja, o caráter proximal da vida
2004) tem se tornado um desafio perene, assim como foi instigante para
de fato. É possível?
redor do que não tem solução” (Tavares, 2013, p. 28), bem como, a “escovar as
pela “palavra engavetada. Aquela que não pode mudar de lugar” (Barros, 2010,
2013, p. 28):
62
Do mesmo modo, como docemente nos diz Manoel de Barros: “O
tamanho das coisas há que ser medido pela intimidade que temos com as
Canevacci ainda não tinha intimidade com São Paulo quando a viu pela
primeira vez. Como pôde ele então se dispor à polifonia? Porque era ele. Ser
paralelo entre a primeira parte de seu livro – Pelo Espaço (2008) e a bela obra
63
chegada de seus conquistadores. O resultado político de discursos como esse é
isso:
Tal espaço torna mais difícil ver, em nossa imaginação, as histórias que
fundava num espaço como superfície – que seria o espaço-Zora – aquele “que
conheciam de cor, pois ela havia sido “obrigada a permanecer imóvel e imutável
que significam outras coisas”, como “o torquês que indica a casa do tira-
dentes”. Símbolos nos ensinando que o olhar percorre as ruas como se fossem
páginas escritas: a cidade diz tudo o que você deve pensar, faz você repetir o
discurso, e, enquanto você acredita estar visitando Tamara, não faz nada além
de registrar os nomes com os quais ela define a si própria e todas as suas partes.
guiou Polo. O espaço-Zaíra, que comunica sua história pelos “ângulos das ruas”,
do passado”, a exemplo:
64
dos rasgos nas redes de pesca e os três velhos
remendando as redes que, sentados no molhe, contam pela
milésima vez a história da canhoneira do usurpador, que dizem
ser o filho ilegítimo da rainha, abanado de cueiro ali sobre o
molhe.
velhos, e nas demais aqui referidas como outras formas de se imaginar o espaço,
molhada e um olhar ingenuamente curioso que coloca tudo aquilo numa caixa
urbanista americano Kevin Lynch chama atenção para o ato de olhar as cidades.
Por mais corriqueira e repetida que possa ser nossa prática cotidiana, Lynch nos
diz que “Nada é vivenciado em si mesmo, mas sempre em relação aos seus
65
As paisagens urbanas pré-fabricadas tiram-nos dessa possibilidade,
paisagem na qual cada pedra conta uma história pode dificultar a criação de
2009, p. 40)
análise feita pelo referido Mike Davis no livro “A Cidade de Quartzo”, quando
fala do modo como o “mito do santuário no deserto” foi desfeito por meio de
uma série de atos de violência ocorridos a partir da virada do ano novo de 1990
(Davis, 2009). Mas há uma outra forma de pré-moldado que Davis trata muito
66
San Salvador, em infinitas reprises dubladas de Eu amo Lucy e
p. 47)
mobilizadora, não apenas dos sonhos de muitos que se dirigiam até lá, como os
mesmo daquele entre da Clarice Lispector quando ela diz: “quero uma verdade
“verdade”, nem ao menos pretende explicar qualquer coisa. Como ele mesmo
67
Então, analisar a cidade contemporânea é também compreender o
papel que as imagens e o corpo têm desenvolvido sobre a vida urbana atual,
visualidade. Nas palavras de Marc Augé, esse contexto corresponde ao que ele
cidade como uma categoria que está para além dos aspectos materiais
15
Tradução livre: “Procuro, assim, vislumbrar como a vida social pressupõe muitas questões de
movimento e não movimento, de movimento forçado e de fixidade escolhida, de pessoas, imagens, ideias
e objetos”.
68
fantástica o velho axioma: cria-se não apenas uma mercadoria
p. 10)
69
televisivas como sendo verdadeiras “celebrações visuais de modos de ver e
Oliveira Jr. quando fala de uma “paisagem única” que se dá, em grande medida,
sua maior potência. Isso implica dizer, em grande medida, que sua força motriz,
pontos de vista. Isso seria, nos termos do poeta Manoel de Barros (2010b), fazer
70
Geografia que toma o mundo como uma potência criadora e criativa para suas
– muitas – grafias.
71
DANÇA, alguém dança
72
Não há dança sem um sujeito que dança. Não há sujeito que dança
sem corpo. Não há corpo que dança sem experiência. Assertivas alinhavadas
p. 131);
toda vez que alguém questiona o modo como tenho me envolvido com a dança.
73
É preciso explicitar que a importância de se nomear tais processos, esses
explica que “A relação que existe entre duas percepções não depende das
vezes, pelo sentar num canto da sala de aula e se por passivamente diante de
tudo aquilo que estava “acontecendo”, para fazer jus ao sentido larrosiano de
do intensivo que aqui coloco. Corpo intensivo. Disso fala Lourence Louppe no
pesquisa sobre dança, realizada por alguém que não é um profissional da área.
Em Braga, por exemplo, onde o bailarino é tido como um atleta, o adulto “não
tem vez”. Lembro claramente da feição de espanto das mamães todas as vezes
74
que eu saia da sala ao fim das muitas horas de aulas e ensaios. Certo dia cheguei
eu tinha. Respondi para uma delas, em tom de brincadeira, que tinha a idade de
ser o pai dela. Gostaria de ter registrado em foto aquele semblante. Ela,
demonstrando uma completa confusão, afirmou que era impossível eu ser seu
pai, pois o mesmo jamais conseguiria fazer uma aula de ballet. E o fato de estar
ali, junto com ela, colocava minha afirmação num lugar de confusão e absurdo.
Perdi a conta de quantas vezes ouvi, em tom de deboche, que dançar é apenas
que um dia gostaria de ter “essa vida”, de passar o dia todo dançando, como
se estivesse dizendo assim: gostaria de passar o dia todo sem fazer nada ou o
dia todo realizando uma atividade de lazer. Como se, de algum modo, o único
equivocado. Mas quero sim enfatizar a importância do estudo teórico numa arte
que está longe de ser uma questão terminológica apenas, como ressalta Larrosa.
75
lutas pelas palavras, pelo significado e pelo controle das
essa de que fala Larrosa. Nesse sentido, uma geografia que aprendeu a:
no sentido deleuziano do termo. Ela realiza, portanto, uma partilha daquilo que
76
Uma emoção não seria uma e-moção, quer dizer, uma
como um ato primitivo, pelo menos pelas ciências humanas. Posso afirmar,
instantaneidade.
coisa nesses termos. Todos eles, de algum modo, demonstram que a emoção
77
Não interessa aqui, portanto, pautar o debate na perspectiva que
Jacques Rancière (1995) diz sobre o ato da escrita como um ato político. Para o
ocupação” (p. 07) que, por sua vez, constitui “uma relação entre os modos de
de uma ciência menos sujeita de si, portanto, menos tautológica, uma ciência
menos matter of fact, para citar Bruno Latour (in: Nunes; Roque, 2008) e mais
articulada e propositiva:
Guattari (2010), “são igualmente criadoras” (p. 11). Colocá-las à revelia uma da
outra é uma recusa que faço, do mesmo modo como também faz o “nativo
78
Nesse texto, o autor trata do modo como os discursos do antropólogo
2002, p. 118)
opera nas e pelas diferenças. O que fazer com elas é ponto interessante. Para
potencializarmos os atravessamentos?
nem chegam nesse patamar de reflexão, mas de certo modo, elas são um pano
79
“ciência” que assumiu para si, uma “arte” como sua fonte “epistêmica”. Sim,
16
Eduardo Yuji Yamamoto explica que “Efetuar e Contraefetuar constituem duas atividades opostas,
porém necessárias e complementares para a prática filosófica: produzir conceitos. Efetuar significa
conceituar, delimitar a potência semântica das coisas, aprisionar (totalizar ou saturar semanticamente) o
Ser. Contra- efetuar, ao contrário, significa liberar o Ser desta prisão ontológica (des-ontologizar), criar
linhas de fuga (um sentido) para o devir. A contraefetuação, neste caso, libera o Ser para as forças em si,
sem mediação das formas (como o fazem as filosofias abstratas e transcendentes). Conceituar, neste caso,
constitui uma atividade incessante de aprisionamento e libertação do sentido” (YAMAMOTO, 2012, p.
116).
80
Los tiempos em los que existía el otro se han ido. El
otro como misterio, el otro como seducción, el otro como eros,
el otro como deseo, el otro como infierno, el otro como dolor va
desaparecendo. Hoy, la negatividade del otro deja paso a la
coincidência”. É, pois, diante desse desafio que me vem outra questão, que
versa sobre o que se quer dizer e como se quer fazer esse “juntar”. Minha
escolha se dá, nesse sentido, na esteira daquilo explica Luciano Bedin da Costa
pelo simples prazer de jogar; bem como, uma ética do improviso, algo da ordem
do aberto e do transitório.
esteira de sua filosofia das impressões sensíveis. Por isso me faz tanto sentido a
(Castro, 2002). Por isso tenho cada vez menos me preocupado em escrever num
17
Tradução livre: “Os tempos em que existia o outro foram-se. O outro como mistério, o outro como
sedução, o outro como eros, o outro como desejo, o outro como o inferno, o outro como dor vai
desaparecendo. Hoje, a negatividade do outro deixa passar para a positividade do mesmo. A proliferação
da mesma forma é o que constitui as alterações patológicas de que o corpo social sofre”.
18
Cf.: http://coral.ufsm.br/gpforma/2senafe/PDF/005e2.pdf
81
tom explicativo e tautológico e muito mais, lidar com a perspectiva da partilha
transformações, nos termos que argumenta Viveiros de Castro quando diz que:
21-22).
É o que estou buscando: fazer da geografia uma ciência que diz: “Que
meu mapa de afetos. Ele partilha os gestos e movimentos que tenho tentado
a pensar sobre esse processo de aquisição de um corpo que dança, que seria,
19
Didi-Huberman (2016) explica que a exclamação indica a intensidade da experiência, já a interrogação,
o esforço de reflexão.
82
dentre outras coisas, a descoberta de si mesmo diante da realização de algo que
83
AFETAR, ser afetado
84
O ensinar a dançar é, dentre tantas coisas, ensinar a ter um corpo,
que seria, nos termos de Bruno Latour, “aquilo que deixa uma trajectória
é feito o mundo”. Disso fala o autor no texto “Como falar do corpo”, onde o
2008, p. 40).
a ser afetado. Ser afetado, então, é marca definidora daquilo que nos constitui
“corpo geográfico”, esse mesmo corpo, que diz respeito aquele que dança,
aquisição, não de novas formas de saber das coisas, para lembrar o que diz
85
Uma geografia bailarina, portanto, reivindica para si modos de ocupar
que dança. Então, posso afirmar, de início, que o principal gesto de uma
86
Portanto, uma geografia bailarina é, parafraseando Jacques Rancière,
uma maneira de fazer que intervém “na distribuição geral das maneiras de
fazer". Isso pode ser compreendido de diversas formas, mas foi a partir de uma
observação lenta e ativa, do ato fotográfico e do pensar sobre aquilo que foi
87
88
O plano fechado mostra, detalhadamente, o suor cobrindo quase que
escala, ou seja, aquela que problematiza a ideia do mapa como produto de uma
que, por meio dela, se alcança, de fato, o real. Não pretendo adensar essa
Jörn Seemann.
Quero sim, pensar noutra questão. Primeiro: não digo que pele “é”
mapa e sim, pele “que é” mapa, portando, pele “tornada” mapa, pele “tida
como” mapa. Pele que ocupa as funções de um mapa, pele em devir-mapa. Mas
que pele é essa que está aí na imagem? Estou falando de qualquer pele?
89
Então, é esse corpo que está aí, desse jeito, que é mapa. É um corpo
que dança, que é mapa. O que me leva a pensar junto com Deleuze em Crítica
e Clínica:
mas que está, a todo momento, sendo atravessado por subjetividades outras na
que o nomeia como “política da ficção”. Ele explica (Rancière, 2009, P. 17):
lugares”;
90
qualidade para dizer, das propriedades do espaço e dos
possíveis do tempo”
corpo que é mapa, por que é, senão, política da ficção. Isso me permite, de
que Rancière cita para dizer sobre um determinado tipo de regime estético. Mais
o gesto do bailarino, como explica José Gil, é oriundo da intimidade que ele
espaço que surge com seu próprio movimento. Então, essa cartografia se faz
Então, o corpo que dança gesta no seu próprio interior uma potência
movimentos que se busca, por exemplo, coreografar e, com isso, ocorre, num
“repetir, repetir, até ficar diferente”. Então, por que paradoxo? Porque é aquilo
que indica quando algo é e não é ao mesmo tempo. Ou ainda, que indica os
91
Um corpo que se abra e se fecha, que se conecta
pensar o corpo que dança, por que ele é exatamente da ordem do dizer-fazer:
Por isso me chama tanta atenção o gesto. Porque ele é detalhe. Ele
daquilo que José Gil vai considerar como a diferença entre executar passos e,
efetivamente, dançar.
Béjart afirma que “Vocês viram Cescaya fazendo um arabesque, vocês viram
92
Susanne Farrell fazendo um arabesque, vocês viram Barychnikov fazendo um
arabesque. Mas um arabesque, não” (In: Gadelha, 2010). Pensar nisso me fez
observar algumas das fotografias que ficam dispostas nas paredes da sala de
aula. Elas, de certo modo, dizem desse momento em que o corpo que está
93
94
Corpo como paisagem, mas não qualquer paisagem.
horizonte possível
95
É horizonte possível,
Disso escrevi:
Simetria descompassada
Faz acento e só
Porque
Consoante é o verso
Mas talvez
De sua
Inacabada rima
96
Paisagem que revela, pelo gesto, um estado de alma
97
Este é um exercício de posse e de abandono, não do texto em si, a
pequeno gesto, nem tanto aquele do grande horizonte, identificação mais clichê
contemplar. Não mais como uma mirada passiva, aquela que garante acesso
para citar Deleuze (2002), que se revela, sobretudo num corpo virado de costas
98
“Conhecemos um corpo pela sombra que fazem sobre nós,
e é por nossa sombra que nos conhecemos, a nós mesmos e a nosso corpo.”
E ainda há muito o que se pode ser dito sobre esse corpo que dança,
menos, a direção do seu movimento, portanto, sobre aquilo que captura sua
Por isso, no limite, até posso afirmar que ainda há um rosto que diz,
mas ele é a mão. Essa mesma, disposta num fragmento de tempo-espaço que
isso, brinco:
99
Corpo de palavras que é, também, corpo como pensamento. Corpo
portanto, que não quer mais ser “apenas o que é possível abarcar com a visão”20.
É, pois, em face dessas questões que me pus a pensar esse “apenas que é
possível abarcar com a visão”: como pensar a ideia de um sujeito que olha e de
recebe uma exterioridade pronta. Milton Santos parecia estar lidando com uma
Miranda:
20
Explicada como “Sistema material, relativamente imutável”, como um “Conjunto de objetos materiais
concretos”, “Conjunto de formas”, “distribuição de formas-objetos”, “história congelada”, “testemunha”,
“a-dialético” e talvez, a mais conhecida das acepções, como “apenas o que é possível abarcar com a visão”.
Esses são termos do ilustre e renomado geógrafo Milton Santos e estão no livro, A Natureza do Espaço
(2004).
100
Há uma questão fundamental que tem sido discutida, inclusive é essa
mesma questão que nos faz considerar os dois aspectos citados anteriormente
Diria ainda, do real como resultado da visão ou, dito de outro modo, o processo
nos permite pensar a constituição da paisagem como algo para além desse
figural/representacional.
Isso posto nos termos do próprio Deleuze quando argumenta sobre “o que
único.
101
Isso é, sem dúvida, o que tem me suscitado pensar o conceito e
do-olhar se dá. Deleuze e Guattari (2002) falam que “o desejo não é forma, mas
102
contemporânea, que não acredita mais no tempo. (nos
uma "edição dos lugares", que consiste na produção de uma "memória" que é
experiência:
103
daquele já consolidado nos sites e encartes (Queiroz Filho, 2010,
p. 37).
Não é por mero acaso que todos querem tirar "a mesma foto". O
acima. Nas duas imagens de cima, observamos os turistas atestando sua viagem
onde se deve fotografar. Por fim, a imagem de uma intervenção artística que
da cultura visual na qual estamos inseridos. Há uma outra, que eu poderia dizer
que é uma consequência dessa primeira, que diz respeito ao mosaico que irei
mostrar a seguir:
104
105
106
Propositalmente, não identifiquei a figura, pois gostaria que o leitor
manutenção de um dado ponto de vista e uma dada estética que, por sua vez,
grifos meus).
busca? Vejamos:
107
108
Dito de outro modo, esse é o resultado do processo de educação
tudo o que vemos)... A realidade, como tal, é redefinida – como uma peça para
uma brincadeira de troca de palavras. Sontag (2004) diz assim: “a única pergunta
109
“a única pergunta é
se a função da paisagem
espaço abre além do olhar” (Dardel, 2011, p. 31). E finaliza nos apontando um
ele está... mas essa realidade não toma forma senão em uma
110
• Jean-Marc Besse em Ver a Terra:
compartilham de uma questão só: “Não são esses autores que colocam
concluir é que, para esse autor, paisagem é experiência sensível e que suscita a
grande questão resumida por Besse: “como é possível habitar o espaço”? (p.
IX).
nos dar a ver um algo, o que irei chamar aqui de um estado da alma, e como tal,
impossível de ser traduzido, senão, na sua tensão, no limite entre o ser e o não
ser. Paisagem que nos interessa é, portanto, um devir imaginativo, uma política
111
2 - Todo o estado de alma é uma passagem. Isto é, todo o estado de alma é
Há em nós um espaço interior onde a matéria da nossa vida física se agita. Assim
uma tristeza é um lago morto dentro de nós, uma alegria um dia de sol no nosso
espírito. E - mesmo que se não queira admitir que todo o estado de alma é uma
representar por uma paisagem. Se eu disser "Há sol nos meus pensamentos",
se, de modo que o nosso estado de alma, seja ele qual for, sofre um pouco da
paisagem que estamos vendo - num dia de sol uma alma triste não pode estar
tão triste como num dia de chuva - e, também, a paisagem exterior sofre do
coisas como que "na ausência da amada o sol não brilha", e outras coisas assim.
De maneira que a arte que queira representar bem a realidade terá de a dar
exterior. Resulta que terá de tentar dar uma intersecção de duas paisagens. Tem
de ser duas paisagens, mas pode ser - não se querendo admitir que um estado
ambiente exterior, mas sua própria condição como ser. Como uma alegoria de
112
113
Há outras obras, principalmente filmes, que realizam esse mesmo
dado modo de vida (Queiroz Filho, 2011). Em “Apocalipse Now” (1979), em que
ele afirma: “Paisagem é uma construção da mente, assim como uma entidade
física mensurável. Diz respeito tanto aos estados psicológicos como ao meio
114
115
Sobre essa “potência de liberação”, trago os apontamentos feitos
21
In: https://www.youtube.com/watch?v=_yjnGDIqcyY
116
CORPO que sente,
- Então é isso que estou tentando compartilhar com vocês: o meu lugar de
atuação, que é no plano do pensamento e da linguagem, que é onde tenho
encontrado esperanças de, efetivamente, produzir, promover, agenciamentos
criativos e emancipatórios.
117
Tenho me preocupado, cada vez mais, com aquilo que pode se
portanto, o cenário que tem me capturado. Como em um filme, atuam nessa cena
“atores” como Jacques Rancière e Gilles Deleuze. O primeiro, por lidar com
Rancière está preocupado em tratar dos atos estéticos não como uma
118
“Saboreando o Espaço, Inventando Paisagens”. Na ocasião, propus-me a
de corpo inteiro;
ocasião, era um modo que eu havia encontrado para fazer uma provocação ao
narrativa única.
Rancière então chama nossa atenção para o cuidado que temos que
ter com isso quando ele não separa o modo de sentir do modo de saber. Ou
dos atos estéticos como ele mesmo se refere), mas daquilo que esses atos
119
estéticos configuram, agenciam. Por isso falo de “estética-política” como uma
incomodo-me com essa ideia do a priori, porque isso implica em aceitar que
existe uma essência ou uma verdade única e possível de ser alcançada. Então
adiante, que seria algo mais próximo da ideia de uma memória pretendida, de
angústia quando ele fala que não consegue ver o Tâmisa da literatura e só
Então, sem ressalvas, volto com Rancière, quando ele diz que a
dá a sentir, que é:
se pode dizer sobre o que é visto, de quem tem competência para ver e
120
Então, agora já não estamos mais falando apenas de – modo de
italiano Giorgio Agamben fala sobre a “ideia da política”: ele nos explica que
contra o qual não há mesmo mais nada a fazer, não é a cólera de Deus, mas o
questão: “como será possível pensar aquilo de que a própria onisciência divina
já não sabe nada, aquilo que foi apagado para todo o sempre da memória de
Deus?” (2012, p. 68), ou seja, “nem absolvido, nem condenado, note-se, mas
121
É, nesse sentido, que podemos pensar a estética como uma memória,
pois estamos lidando com a política como uma partilha do sensível, ou seja,
para isso, lancei mão da fotografia como ato estético e político que configura
essa tal “edição”, isto é, pela fotografia, ocorre a seleção daquilo que
importante o deslocamento que ela nos convoca a fazer quando diz que,
2004, p.13).
a pintura e até mesmo a oratória como “éticas do ver”, como formas de promover
a “boa forma”, “a maneira correta” do que seria o bom orador, o bom escritor,
o bom pintor, o bom ator, a boa escrita, a boa cena e nos termos do paradigma
22
Sobre a problemática “memória e lugar”, ver mais em Nora (1993) e Le Goff (2003).
122
Rancière está lidando com a política como sendo um modo de
Kafka: para uma literatura menor. Foi com esse texto que compreendi melhor
123
• “fuga na intensidade”;
sentidos que passam a ser reconhecidos como a “boa Geografia” ou, pior,
como “A” Geografia. Então, ao pensar nessas questões, penso também nos
124
• é afetada por um forte coeficiente de desterritorialização;
125
No aeroporto o menino perguntou:
E ficou sendo.
Manoel de Barros, Exercícios de Ser Criança
(in: Poesia Completa, 2013, p. 453)
126
Logo, eu poderia dizer que a peraltice em face do sentido bem
p. 15), que não é nem verdadeiro, nem falso, nem causa e efeito, mas é o puro
devir e o paradoxo:
Essa outra natureza, tem sido para mim, a aposta que tenho feito nos
configura como uma abstração, um bloco coerente e sólido, mas que são,
127
contrário: saber criar um devir-menor (Deleuze; Guattari, 2002, p.
56)
2. o paradoxo
de poder.
explica Deleuze, “é, em primeiro lugar, o que destrói o bom senso como
128
O acontecimento é coextensivo ao devir e o devir,
2011, p. 09)
que não existe essência, apenas “superfície”, que para ele, seria a linguagem.
Ele explica que “não há causas e efeitos entre os corpos: todos os corpos são
causas, uns com relação aos outros, uns para os outros (2011, p. 05). Sem entrar
no mérito da questão, que é por demais densa, e nem tenho essa pretensão, o
que me interessa, nesse sentido, é lidar com essa instância dos efeitos dos
corpos que, segundo Deleuze, “não são coisas ou estados de coisas, mas
acontecimentos (...) não são agentes nem pacientes, mas resultados de ações e
Paixões...
Deleuze diz “com os adjetivos podemos fazer o que quiser, mas não com os
verbos” (p. 26) e, ao mesmo tempo quando ele diz que “o atributo”, ou seja, o
“resultado”, a expressão do verbo, nos dá a ver, não um ser, mas uma “maneira
limite, ou seja, aquilo que não pode ser mudado? O que significaria, nesse
129
sentido, desobedecer a linguagem, desobedecer a gramática? E se
mudássemos o verbo16?
acredita que “o poeta é um ente que lambe as palavras e depois se alucina” (p.
acostumada” (p. 323). Enfim, Manoel nos ensina um pensar, um fazer e um sentir
bem assim:
***
16
Ver p. 187 e 188 (Deleuze, 2011)
130
O delírio do verbo está no começo, lá onde a criança diz:
A criança não sabe que o verbo escutar não funciona para cor,
E pois
Então é isso que estou tentando compartilhar com vocês: o meu lugar
Manoel de Barros quando ele fala que prefere viajar mais pelas palavras que de
trem (Barros, 2013, p. 332) e talvez, por isso, Deleuze, em Devir-Manoel, tenha
17
“A emancipação, por sua vez, começa quando se questiona a oposição entre olhar e agir, quando se
compreende que as evidências que assim estruturam as relações do dizer, do ver e do fazer pertencem à
estrutura da dominação e da sujeição. Começa quando se compreende que olhar é também uma ação que
confirma ou transforma essa distribuição das posições” (Rancière, 2014, p. 17).
131
- Modos de encontrar, modos de buscar
desejo com o qual estou lidando. De modo geral, seria aquilo que opera:
1) a possibilidade do encontro;
o processo como método. Por isso faz todo sentido o alerta de Deleuze e
Guattari quando chamam atenção para o fato de que “O desejo não é forma,
132
Tarkovski está dizendo, de outro modo, que o desejo, ou seja, a
devir.
ao processo, ao ato em si, à ação. É nesse sentido que Deleuze define o desejo.
Diz ele:
1998, p. 77)
nem qualquer processo, nem qualquer sono, passeio, música, escrita, enfim.
Não é qualquer ato constitutivo que me interessa. É por isso que me faz
133
* E um desejo (dizer18) forte (é aquele) que não visa o prazer, mas sim
p. 158-159)
coisa, um outro sentido20. É por isso que Gonçalo Tavares fala do desejo e das
palavras como movimento: “Eu sou autor dos meus movimentos porque em
certo sentido não apenas os faço, como também os digo” (Tavares, 2013, p. 170).
seja, o dizer como sentir e fazer. E é genial quando Tavares diz que “sim, as
palavras pensam” (p. 174). E mais, quando afirma que as palavras “também
E fico me perguntando:
- o que está faltando para ocuparmos nossa experiência com outras palavras, outros
dizeres, outros desejos, outras paixões?
18
Que seria o “nomear”, o ato constitutivo que gera, que produz, que mobiliza a imaginação.
19
“A ligação é uma força, não uma contemplação; qualquer ligação é um ir daqui para onde está o Outro,
a outra coisa” (Tavares, 2013, p. 156).
20
Ver Tavares (2013, p. 160)
21
Ver Tavares (2013, p 175-178)
134
Talvez nós estejamos habitados ou habitando demais aquilo que
(Deleuze, 2007, p.42). e, por esse motivo, argumenta que “a sensação é mestra
seus termos, “vivências medíocres e vulgares” (Tavares, 2013, p. 179). Ele conclui
22
“escrita esta - a comum -, que quer comunicar de imediato, que quer ser de imediato entendida, e por
isso, desleixa-se, simplifica-se até o ponto em que se transforma numa linha, interpretação. Frases que
ganham multidões, mas perdem indivíduos (Tavares, 2013, p. 180).
135
aventura, aventura essa que se disponha diante da “função do irreal” como
- o que significaria pensar o “dizer” sendo ele pautado pelas ligações que
possibilitem o movimento, o fluxo dos afetos como potência ativa?
Parnet (1998) sobre Espinosa (p. 49): o que pode um corpo? Então eu incluí a
É importante considerar:
consigo pensar de forma literal, mas sim, como uma provocação à nossa
136
Isso nos leva a outras duas questões: o que alimenta esse corpo –
esse corpo que “confunde” sensações? E que afetos se dão nesse encontro –
156-157).
23
Cf.: http://escolanomade.com
24
Cf.: https://www.youtube.com/watch?v=xP3ERarnm_s
137
digere e nem se expele; isso é uma fixação afetiva, que inicia um desejo
138
A FABRICAÇÃO DO corpo-montagem,
139
E o que nosso corpo pode?
Eis uma questão que está diretamente relacionada com outra
etapa importante desse processo de aprendizagem do corpo:
A montagem coreográfica.
E, sinceramente, como é mágico o que os professores e
professoras fazem com nossos corpos.
Como palavras, somos arranjados de modo a promover, pela
conjugação de nós mesmos, poesia dançada.
Para isso, ensaio, ensaio, ensaio.
Para isso, repetição, repetição, repetição.
140
141
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155
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157
Chegado o dia da apresentação:
Coxia;
- primeiro sinal...
Abraço coletivo;
- segundo sinal...
O corpo vibra;
- terceiro sinal...
Blackout
- e...
(2011):
158
acontecem. Interessa-me, sim, o território como local de cruzamentos e
mesmas que, ao entrar em cena, fazem condensar três ou quatro meses em três
Findo,
Vem a reverência,
Seguida de aplausos.
O corpo, novamente, vibra.
A cortina fecha
E a luz principal se apaga.
Pelas frestas,
Vê-se apenas uma pequena parte do linóleo25.
Como um mapa antigo,
Ele nos indica, apenas em traços,
Vestígios dos corpos suados,
Cabelos caídos
E o silencioso eco
Das inúmeras vezes que ouvimos a marcação do tempo:
Carto-corpo-coreo-grafia
De mundo
Disposta num pequeno pedaço
De tempo-espaço.
25
Nome dado ao tipo de tapete que cobre o piso da sala de dança ou palco.
159
160
161
162
163
O ato coreográfico é, maravilhosamente, uma cartografia de emoções.
dançado. À frente, ela escrevia cada frase musical e, atrás, “copiávamos”. Até
Uma das coreografias que dancei fazia alusão ao animal marinho “água
viva”. Sem camisa e de saia. Não havia homem ou mulher, apenas corpos e cada
um deles corria numa fruição de afetos para dizer daquele ser. Não estávamos
que todos se tornassem uma extensão, pelo movimento, da matéria criativa que
como poesia foi, aos poucos, tomando forma. Plano de desejos passou a se
grifos meus).
164
Essa era a nossa “epistemologia política”, para usar dos termos de
nosso corpo ia sendo constituído, a exemplo do que acontece com nariz quando
165
Quanto mais mediações melhor para adquirir um
45).
166
E foi exatamente isso que aconteceu. A cada nova frase de movimento
habitar o mundo. Ele sendo outro, eu sendo outro, como num plano de
composição.
2001): “Se a bailarina do ballet apagava todo o traço dos seus órgãos genitais,
Por isso mesmo, ela – a dança – não me serve como síntese ou revelação de
nu, que é a pele tornada espaço intensivo, espaço de emoções. Essa é a grafia
Lembro que, numa conversa com amigos sobre a experiência que tive
lugar lá era daquela forma. Logo expliquei que eu não tinha a pretensão, na
seria Portugal ou, até mesmo, Braga, cidade em que residi por quase 5 meses.
Mas sim, pensar nessa relação corpo-lugar a partir daquilo que vivi. Por isso,
167
Quando encerra a luz
Todos os corpos
Que antes faziam balanço
Misturam-se num só tom
Eis a melodia cromática
De que fala o poeta das flores
É dela que nasce o gesto
Como um modo particular de dizer
- Sim, eu danço!
Então…
Dancemos!
Para fazer desse ato repetido
Nossa calma
Dancemos!
Para fazer desse ato criativo
Nossa alma
- Dancemos…
168
CORPO-grafia,
169
Observação
Ande de ônibus
Olhe pela janela
Olhe para dentro
Olhe as pessoas no ponto em dia de chuva
Qual cheiro te invade?
Cigarro e roupas velhas?
Na Itália era perfume de grife
Há conversas?
Sobre o que?
És olhado? Por quem?
Quanto tempo dura o olhar?
Quem senta e quem levanta?
Quem dorme e quem sonha?
Quem viaja e quem chega?
Quem sorri?
170
Não descreva
Escreva
Faça as palavras dançarem
Vá a uma padaria ou cafeteria pela manhã.
Ponha-se a escutar
Não ouvir, escutar
Se puder, sente perto da porta ou do caixa
Quem chega?
O que dizem?
Os estranhos iniciam algum tipo de conversa?
Há televisão?
Música?
Jornais e revistas?
Há "bom dia"?
Há quem chegue de forma tão silenciosa que nem a percebemos?
Há uma coreografia dos corpos apaixonados?
Cidade-dança?
171
Há uma geografia do corpo delineada pela geografia do lugar?
Quando ou até que ponto essas grafias se misturam? Ao retornar para o Brasil,
fiquei alguns longos dias em estado de pausa. Louppe explica que “Toda
(2012, p. 70). Precisei desse tempo para depurar aquilo que havia vivenciado e,
uma paisagem corporal por demais atravessada pelas linhas duras que
como as experiências vividas numa dada cidade configuram aquilo que define
esse mesmo lugar. Na verdade, o exercício aqui é outro. Há, ressalto, uma
172
das relações não estabelecidas, das exclusões. Tudo isso
que tinha por função realizar, nos termos de José Gil (2010), um “mapeamento
agenciam uma potência de agir ancorada na ética do que ele deve e não do
que ele pode. A maior parte de minhas vivências em Portugal foram dessa
26
Cf.: https://www.youtube.com/watch?v=xWuZR0wcYOk
173
Então, o que vem a seguir revela, não o caráter do lugar, como se
isso fosse algo possível, mas sim, a de uma experiência com um lugar, num dado
174
HABITAR (de) um corpo triste,
- Não foi o frio, nem os longos dias chuvosos que enuviaram meu semblante.
Disso os agasalhos, vinhos e chocolates deram conta tranquilamente.
175
De início, pensei que poderia escrever algo que articulasse
teorizações para um fazer geográfico outro, que teria nos conceitos deleuzianos
“A teoria surge da vida”, afirma a geógrafa inglesa Doreem Massey. E este livro
não poderia ter sido escrito de outro modo, senão, como gesto marcado com
que, em eco com Eleonora Duse, aprendeu, à duras penas, dizer: “onde não
Foi o que me ocorreu logo nos primeiros meses em que estive como
inteiro. Não foi o frio, nem os longos dias chuvosos que enuviaram meu
tranquilamente.
Clarice Lispector. Tivesse feito, poderia não ter demorado tanto para perceber,
como ela mesma, que tocar o mundo é, antes, tocar a si próprio. Sem rodeios,
De lá saíram meus escritos de solidão. Eles são como mapas dessa experiência
176
Com Braga, cheguei ao ponto de que a única coisa que ouvia era o
é o próprio apesar de
é que isso é possível, aquilo que Fernando Pessoa escreveu sobre paisagem
27
Personagens do livro “Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres” de Clarice Lispector (1998b).
177
Fiquei pensando então e constatei que Braga teria sido facilmente
pintada por Hopper. Apesar de já ter afirmado que sua pintura não se resumia
a isso, é o cotidiano solitário que figura em suas telas. Por que digo “facilmente”
então? Porque, como ele mesmo responde ao ser questionado sobre o fato de
suas pinturas refletirem o isolamento da vida moderna: “acho que sou eu” (in:
E esse “eu sozinho” foi ganhando forma logo nos primeiros dias.
e registros fotográficos dessa corpografia bracarense. Eles são fruto daquilo que
vivi nos meus trajetos pela cidade e nas minhas aulas de dança. Portanto, falam
178
Ora bem, será possível viver
sem um lugar? Será possível habitar onde
não existem lugares? O habitar não tem
lugar lá onde se dorme e, por vezes, se
come, onde se vê televisão e se diverte
com o computador de casa; o lugar do
habitar não é mero alojamento. Só uma
cidade pode ser habitada; mas não é
possível habitar a cidade se ela não se
dispuser a ser habitada, ou seja, se não
“der” lugares. O lugar é o sítio onde
paramos: é pausa – é análogo ao silêncio
de uma partitura. Não há música sem
silêncio.
179
- relatos e poesias
(ou uma cartografia dos afetos)
180
QUANDO A MORADA NÃO SE FAZ CASA?
Sobre o meu primeiro local de morada em Braga (Portugal)
181
• Quando seu lugar de intimidade é a sala de estar ou a
da varanda.
limpo.
estrangeiro.
182
TODOS OS DIAS
Sobre o meu segundo local de morada em Braga (Portugal)
ares, nova vizinhança. Novos odores, novas memórias. Um novo, nada novo.
novidade.
Todos os dias...
hora do banho, que a água quente sempre esfriava e cortina grudava no meu
corpo devido ao espaço ser minúsculo. Ou nas duas primeiras semanas sem a
sensação horrível.
Todos os dias...
183
COTIDIANO
essencialmente a pé.
voltava para a biblioteca ou para umas mesas de estudos que ficavam nos
blocos de aula.
diálogo.
Mais para o fim da tarde voltava em casa para fazer uma refeição
184
O MOÇO DO RESTAURANTE
Estranhei. Aquele não era um hábito comum. Ele cutucou meu ombro e
Foi então que me veio a surpresa. Ele disse que gostava de almoçar sozinho.
185
A MOÇA DO RESTAURANTE
Certo dia, após almoçar num dos restaurantes que ficava nas
dia seguinte, ao chegar para almoçar, a mesma pessoa, que me viu ao chegar,
186
NOVO HORIZONTE
Por muito tempo, inclusive, tive receio de falar em voz alta, devido a
questão do preconceito. Isso contribuiu mais ainda para meu isolamento social.
Poucos foram os lugares em que senti que minha origem não era um possível
problema. Inclusive, sempre fazia questão de deixar claro para as pessoas que
minha passagem por Braga era rápida. Inclusive, geralmente esse era o tema da
primeira pergunta que me faziam: o que eu estava fazendo ali. Minha resposta,
quase como um gesto de defesa, era o de deixar claro que eu não estava ali
187
PEDAGOGIA DO GRITO
Passado algum tempo, agora posso falar sobre uma das experiências
mais intensivas que vivi nesses cinco meses de Portugal: o método de aula nas
acostumar com aquilo que inicialmente lhes era espantoso e passam a entender
diferentes. Em todas elas, fui inicialmente muito bem acolhido. Seria injusto de
cedo, afim de não presenciar mais aquilo que considero, no meu entendimento,
188
ou qualquer coisa do gênero, mas por se tratar de um movimento bastante
de repreender seus alunos com gritos como se eles, quando não conseguiam
assim. Talvez não passasse pela cabeça dela que todos possuem dificuldades e
outra escola. Saí em silêncio, sem me explicar. Passado algum tempo, enviei um
email para a professora explicando o motivo de minha saída. Pensei que talvez
ela pudesse refletir um pouco sobre sua prática docente. Afinal de contas, ouvi
de várias pessoas que eu não havia sido o primeiro e nem seria o último a sair
de lá por esse motivo. Inclusive na nova escola havia uma ex-aluna dela que
chegou a dizer que saiu de lá porque, com ela, havia perdido a alegria de
Olá Profa., aproveito esse dia tão especial para, enfim, dizer
algo. Primeiro, quero agradecer pela acolhida que tive por você e
toda sua equipe. Sou grato por isso. Então, o que me fez sair da
escola que estava sendo, até então, minha segunda casa? Sendo
189
realizar danças artísticas há menos de 1 ano) e que havia feito uma
quero que saiba que saí com muita tristeza. Adorava as aulas.
- Eco:
190
TOCA
com muito carinho e respeito por todos. O que me fez sair de lá foi o fato da
inserido noutro contexto. Lá não tinha aula de ballet (tinha apenas para crianças
semana. Então, sobre minhas vivências nessa segunda escola tenho apenas dois
“afago”, diz desse corpo que recebe o toque como ato poético, portanto,
contrário disso, pois foi escrito a partir da repulsa do toque, dito por uma aluna
191
“Afago”
Porque
1, 2, 3...
Toca!
192
“Corpo que é”
Nele
Ela vibra
Nele
Ele é
Apenas é
193
UM POUCO DE POESIA
mergulho e saturação do corpo. Saturar o corpo é fazê-lo vibrar de tal forma que
ele começa a ganhar novas formas movimento e gesto, portanto, novas formas
atletas da dança. Diferente de mim, que estava ali “apenas” como um aprendiz.
dois dias tive a oportunidade de ter como parceira de aula uma das mais
194
“Mexe-te Margarida”
Porque o corpo
Nem começa
Nem termina
Escrita de
Gesto
Movimento
E poesia...
195
“Géstica”
Gestos apaixonados
196
“Corpo Vibrátil”
Relicário imaginado
Verbo de sensações
197
“Meia Ponta”
Ficaria horas
Afinal
198
“Poesia para uma Bailarina”
Teu nome
É palavra
Relva menina
Caindo suavemente
É, portanto
Paisagem-bailarina
199
NÃO (ME) É NORMAL
espetáculo, percebi uma outra face da professora que nos ensinava: arrogância
e grosseria. Tentei lidar com aquilo da melhor forma possível. Então, certo dia,
numa sequencia da coreografia, a pessoa que estava na minha frente deveria ter
assumi a responsabilidade pelo ocorrido, mesmo sem ter, para evitar que o
outro aluno – uma criança – ouvisse algum tipo de abuso por parte da
professora.
Foi então que, para meu espanto, ouvi um sonoro “cala-te”. Ela não
era portuguesa. Falava um espanhol muito rápido. Na maioria das vezes não
atento. Falava pouco, apenas para tirar dúvidas sobre movimento. Então, ela ter
afirmado que eu ficava conversando durante as aulas e que, por isso, havia
passei a tomar nota daquilo que via e ouvia em aula e que eu, ainda hoje,
considero um absurdo.
será essa criança que cresce ouvindo tais palavreados e lidando com tais gestos?
Não devemos nos acostumar. E foi isso que ouvi de alguns: nós nos
acostumamos.
200
Puxão pelo braço: não é normal.
Não se esforçar para falar a língua e quando alguém fala que não
normal.
Quando o aluno erra, falar que vai matar, ridicularizar, ameaçar tirar
Dizer na frente de todos que não suporta a mãe de uma aluna: não é
normal.
Por isso minhas lágrimas não vieram no fim do espetáculo que dancei,
como um suspiro de desabafo. Elas vieram, por muitas vezes, nas longas
caminhada voltando para casa após as aulas. Passos que eram medida de tempo
jamais pode valer mais que a destreza humana, digamos assim. Dessa angústia
201
“Corpo cansado”
Intensidade mesma
Ou seria entardecido?
Fez-se.
202
“Cala-te”
E há, paradoxalmente
Este é o “Cala-te”
Ensimesmada
Portanto, inconcebível
Há um vazio anímico
Então
Por ora
Calo-me
Porque
Em todo “Calo-me”
Oportunamente
Ser abrigo para aqueles que sonham com outros horizontes possíveis
203
Após algum tempo, me peguei lendo Jorge Larrosa. Suas palavras
"Talvez tenhamos que aprender a nos apresentar em sala de aula com uma cara
mais humana, isto é, palpitante e expressiva, que não se endureça na autoridade. Talvez tenhamos
que aprender a pronunciar na sala de aula uma palavra mais humana, isto é, insegura e
balbuciante, que não solidifique na verdade. Talvez tenhamos que descobrir o segredo de uma
relação pedagógica mais humana, isto é, frágil e atenta, que não passe pela propriedade".
Eis uma clara referência que não compreende que toda relação
educa. Talvez seja ingênuo o professor que acha que apenas tem por função ser
adivinhem só: o professor também. Então, o mínimo que posso desejar é que
sejamos mais humanos nesse processo. Ensinar nunca fica apenas na esteira do
conteúdo.
204
VOYEUR
fazer isso, me pus a observar as pessoas nos ônibus, nas praças e nos cafés. Era
voyeurismo urbano causado pela invisibilidade como regra. Disso foram escritos
205
“Indiferença sem Pudor”
amo” (2006). A cena nos apresenta de modo esplêndido exatamente aquilo que
história e dos amantes, do amor”, mas que se deve “evitar o contato visual com
batedores de carteira”. O filme segue sua trama a partir disso. Não é à toa que
passam, inclusive, a cantar juntos. Há, no entanto, um sujeito que parece fazer
com seus fones de ouvido ligados e, por uma ou duas vezes, dirige aquele olhar
206
Há duas questões que me vêm à tona a partir dessas duas cenas e
Porto-Lisboa e que me fez lembrar exatamente dessas duas cenas: uma, sobre
mesma cena que eu? Caiafa constata que no Rio de Janeiro as pessoas
ter contato (...) é preciso ativamente evitá-lo” (Caiafa, 2005, 126). Pois bem, o
que presenciei foi exatamente isso. As cadeiras do comboio são dispostas umas
de frente para as outras. Ou seja, há ali uma configuração espacial que coloca
E que tempos são esses em que vivemos que já não basta mais ficar
calado nas viagens? Que tempos são esses que fazem com que uma pessoa que
esteja sentada numa cadeira junte suas coisas sem nenhum tipo de
constrangimento e faz questão de deixar claro que está saindo dali para sentar
em outro lugar porque outra pessoa sentou à sua frente? Se, nas palavras de
28
Sobre essa segunda questão, houve um experimento realizado pelo Washington Post e que foi bastante
divulgado na rede mundial de computadores. O renomado violinista Joshua Bell ficou por quase 1h
tocando no metrô no mesmo dia em que iria se apresentar no principal teatro da cidade. O que ele
arrecadou no metrô durante esse período foi quase 1/3 do valor equivalente a apenas um assento de seu
show no teatro. Cf.: https://goo.gl/rDGvGp
207
alteridade das cidades”, tendo em vista que ela mesma define o habitar a cidade
avistarmos pela janela do trem alguém que está fora, para nós, é como se sua
que nos toma de relance. Mas todos sabemos que a tal pessoa vista, continua
Queria muito perguntar para Massey o que ela teria para dizer sobre
Voltando de Porto para Braga me pus a observar e a pensar sobre isso. Talvez
seja o desencontro como marca de um corpo social cada vez mais delineado
distante e fugaz. Então fiquei pensando: Se alguém senta ao nosso lado, o que
posso levar dessa pessoa para que ela não se configure como a mulher da janela
Primeiro, penso ser importante dizer que esse outro não me é como
um souvenir que o turista faz questão de levar para casa depois de suas
"viagens". Sobre isso sugiro a leitura de Alain de Bottom, em especial, seu livro
208
“Todos os Velhos são Tarados”
futebol.
Odeio futebol.
e eu ofereci para que ele se sentasse. Atrás de mim uma moça em pé, com seu
algo do tipo: - sabes por que o verão é bom? Eu novamente sorrio. E ele
comentou algo que não entendi muito bem e apontou para a moça semi-
desnuda.
la com sua postura invasiva? Isso me diz que todo velho aqui é tarado? E quando
um senhor sussurra algo para uma garota que passa por ele na calçada? Todo
Não sei.
209
“Roupas Velhas”
Tentava disfarçar
De quem?
Nele embarcaram:
E as roupas?
210
MORTE DE SI
211
“Pele-Paisagem”
Aos cinquenta e dois anos, seu coração, que já nem era seu, parou.
Então, é isso.
- Morrer.
(Engana-se o poeta).
Esquece-se, no entanto,
212
ENCANTAMENTOS
pelo treinamento, no seu sentido mais material, mais normativo, mais utilitarista.
sentir um habitar a cidade como algo que reverbera um habitar o corpo. O fato
é que sempre me interessei mais, para continuar com Gonçalo Tavares, pelas
e de autonomia:
conterrâneo, pois o mesmo falava em espanhol. Mas foi num workshop de zouk
ministrado por ele num congresso de danças afro-latinas ocorrido em Braga que
(Espanha). Duas semanas depois estava na sua cidade. Com esse gesto, pude
sentir, por alguns dias, como uma morada se faz casa. Dessa experiência,
213
escrevi:
“Bailados en Pontevedra”
Cidade viva
Cidade plena
"Encantada"
À vida livre
Porque
Em Pontevedra
Ao receber
Em cada sorriso
Em cada abraço
Encantados
214
• Maria Carpaneto e Cristina Novo Faro Teixeira
com outros três colegas, viajamos para Milão por cinco dias. Nos preparativos,
procurei pela internet algum local para que eu pudesse realizar alguma atividade
com a dança. Inclusive, houve num dado momento a ideia de visitar algumas
contemporânea, cinema e vídeo. Com ela, tive a oportunidade de ter uma longa
215
“Passos Descabidos”
E chão
Dele
Eu quero tudo
Inclusive
E é o quê?
216
“Toda poesia”
Um suspiro esquecido
É bebida
Copo quebrado
Resto de desejo
Por isso
Todo poeta
Morre
Nem é
E disso
Sabe-se bem
217
PAISAGEM SONORA DE UM CORPO TRISTE
218
Estas foram minhas corpografias bracarenses.
em si. De fato, penso que isso não existe. Considero essas narrativas
comum como qualidade de arte defendida por Warhol quando diz: “se todo
mundo não é uma beleza, então ninguém é” (in: Laing, 2017, p. 63). Talvez por
isso o verso “does she know that we bleed the same”29, da música “where is my
love”30 foi, por quase todo o período que lá estive, a paisagem sonora de minha
experiência.
ao invés do convívio efetivo da diferença, isso seria, por assim dizer, uma de
nossas maiores “feiuras” como gesto humano. Talvez, por esse motivo, poderei
por diversas vezes quando cheguei a conversar com amigos sobre minha
Porto ou Lisboa, por exemplo, e fazer da minha experiência com aquele lugar
outro modo, não queria ser um brasileiro no meio de brasileiros. Ter, por assim
dizer, minha rotina ancorada no convívio com aquilo que me seria, mais
provavelmente, semelhante.
29
Tradução livre: “ela sabe que nós sangramos o mesmo?”.
30
Tradução livre: “Onde está o meu amor’.
219
Eu queria mesmo era a troca efetiva, a partilha, a interlocução
Sim, todos nós sangramos igual. Foi nesse sentido que a melodia de
Syml31 me trouxe uma série de outras canções. Todas elas, de algum modo, me
falavam desse sentimento que foi ficando cada vez mais forte: o de voltar para
casa. Estou me referindo, por exemplo, à “Não existe amor em SP”, de Criolo,
importante... Porra!”, onde descrevo a minha Braga, fruto das minhas andanças
e observâncias:
31
De seu estúdio de gravação no porão na pequena cidade de Issaquah, WA, fora de Seattle, Brian Fennell
escreveu e gravou uma coleção de músicas sob o nome Syml, o que significa simples em galês. Adotado e
não sabendo sua história ou conexão com suas raízes galês, muitas dessas músicas foram influenciadas
pelos sentimentos complexos que vêm de linhagem desconhecida”. Fonte: http://www.symlmusic.com
220
“Mais amor, por favor”
Há um pouco de SP
E ele chora.
Há um pouco de SP
Na cadeira vazia
Há um pouco de SP
Onde há pouco
(Em vão?)
Há um pouco de SP
No corpo extraviado
Abandonado
No chão e no palavrão
Há um pouco de SP
221
“O amor é importante... Porra!”
Em tempos de insensatez
Indiferença
Hipocrisia
Tanto talvez
Tanta apatia
- Devir
Inesperada hora
- Sentir
Porque
Tempos modais
Tempos cabais
Faço do gesto
Nossa verdade
222
Eco também no verso “não quero passar agosto esperando
poema:
“cotidiano insosso”:
Tchau!
Por quê?
Porque sim!
E mudo, escuto
Baleiro:
223
“Não quero medir a altura do tombo
Se bem me lembro
(Zeca Baleiro)
224
- série fotográfica
a morada e a rua
225
226
227
228
229
230
231
232
233
234
235
236
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238
239
240
241
242
243
244
Quais seriam os desdobramentos dessas experimentações epistêmico-
espetáculo, entram em cena no ato de pensar a cidade. Isso, por sua vez, implica
observação outros que apontam para uma geografia atenta aos gestos dos
devir.
relações de identificação:
245
corpo, uma grafia pelo corpo, no corpo. Corpo-lugar, a exemplo do que
questiona Ciacciari quando diz: “Se somos lugar, como podemos não buscar
lugares” (2009, p. 45). Nesse sentido, gostaria de fazer um breve pas de deux32
como uma cartografia daquilo que revela o corpo como inscrição de uma
experiência, vejo como potência exatamente o que ela tenta separar: aquilo que
32
Termo do ballet clássico que, em francês significa "Passo de dois". É o trecho do ballet dançado por um
bailarino e uma bailarina.
33
CF.: http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/08.093/165
246
é exatamente a linha de fuga que encontro diante do experimentador científico,
suas corpografias34.
porque não lido, por exemplo, com a concepção de mapa como algo que indica
de retorno às origens da experiência urbana que resultou tal corpo. Não adianta
Pas de trois35:
34
CF.: http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/08.093/165
35
Dança de ballet entre três pessoas.
247
compreendidos só em extensão, em relação a um espaço
geografia como corpo que dança”. De todo modo, se ter um corpo é aprender
a ser afetado, esse corpo - superfície de afetos múltiplos - quando dança, torna-
desprendidos pela coreógrafa alemã, Pina Bausch. Em especial, nas suas obras
cidades, “mas sim, captar as sensações do lugar. Trata-se de sempre tentar ´ver´
de uma outra maneira, de outros ângulos, de contaminar-se por algo que está
248
As obras residenciais de Pina Bausch nos presenteiam
2009, P. 144).
2002), que seria artifício de como se entra nos lugares e de como esse lugar
que talvez seja para mim o gesto intensivo mais significativo da coreógrafa sobre
o pensar a cidade. Ela diz: “Cidades são como pessoas, é preciso se apaixonar
Diante de tudo isso, meu retorno ao Brasil teve como máxima uma
assertiva definidora daquilo que meu corpo assumiu para si como afeto que lhe
é constituinte: “onde não puderes amar, não te demores“. Com isso, enchi
minha mala de livros, roupas sujas, alguns versos amarrotados e voltei. Porque
foi pela poesia que consegui vislumbrar algum sentido naquela experiência,
249
Não quero ter
A terrível limitação
De quem vive apenas
Do que é passível de fazer sentido.
Eu não:
Quero uma verdade inventada
(Clarice Lispector)
250
ESPAMOS de um corpo poético
251
- Grafias de mundo, com “g” minúsculo e no
plural: geografias
- Verdade e Representação: duas palavras que mais têm sido evitadas por
neste texto como ponto de partida para as reflexões que desejo evidenciar.
do nome que é próprio, grafia capital, que aspira poder, uma Grafia Maior.
convergir todas as múltiplas narrativas, linguagens, discursos e intenções para um lugar na fila
da nossa História Única, em maiúsculo. E “como é minúsculo o olhar de quem vive no escuro”,
canta o músico capixaba Sergio Sampaio. É essa grafia, feita no escuro e em minúsculo que nos
interessa.
empobrecedor, pois ela toma como referência aquilo que definia o fazer
científico no século da razão, o que a impede de sair desse divã egóico na qual
252
- Se Édipo é valor mercantil da neurose, positivá-lo
[...] (uma saída não é “a liberdade”), a saída, pelo contrário, não consiste de
possíveis não pela negação e, sim, pela rasura daquilo que a própria Geografia
verificada nas folhas e telas, mas para desterritorializar. Nesse sentido, não nos
253
(Queiroz Filho, 2010), daquilo que Susan Sontag (2004) chama de “gramática
do ver”.
outros.
- Deleuze e Guattari perguntam: como entrar na obra de Kafka? E nos perguntamos: como
“entrar” num lugar? E continuamos: como sair de um lugar? Deleuze e Guattari (2002, p. 19)
por um outro ponto [...]”. E nós: qual mapa [geografias] do lugar... Como entrar e sair de um
lugar? Deleuze responde: por meio de protocolos de experiência, por meio da experimentação.
jornada.
254
- A criança explora... o desejo e, ao mesmo tempo, o medo do que será
255
- Relatos feitos de memórias, rastros, pegadas, derivas, numa geografia do
e corpo como constituintes das geografias que fazemos dos lugares. Essa
atividade. Como não estávamos em busca da verdade sobre o lugar para o qual
autoria diz respeito ao movimento realizado por aquele que produz qualquer
obra na e pela linguagem, de dar a ver os traços de sua grafia, o peso de sua
- Não quero a ocultação daquele que fala, como nos chama atenção Jorge Larrosa
2010, p. 154).
- O que os relatos estão por fazer, no limite, é colocar em dúvida o poder da realidade
256
evidenciando o “caráter plural da verdade, [...] o caráter construído da realidade, [...] o
fragmentos. E lançar entre eles estranhas pontes, por intermédio das quais seja
sendo plurais.
257
- Há paisagem num olhar entristecido? Há fronteira num sorriso contido? Há território num
abraço apertado? Há lugar num suspiro de prazer? Qual seria a escala contida num corpo nu?
Qual seria a escala para uma geografia que saboreia o mundo? Saborear o mundo significa
reconhecer, em grande medida, que o espaço contém cheiros, gostos, sensações, esbarrões,
piscadelas, náuseas, enfim. Experienciamos o mundo de corpo inteiro, com o estômago, com a
boca, com as mãos, com o nariz, e também com os olhos (Queiroz Filho, 2007). Os dois relatos
geografia no seio daquela que se chama grande. Por isso nossos relatos são
e experimentações. Relatos feitos com uma grafia escrita com “g” minúsculo e
no plural: geografias.
258
Palavras,
Desejos,
E um pedaço de chão
...
Um não: todos!
Lugar-Ausência
Que cabe numa mochila
Daqueles que passam
Mesmo estando
Lugar-Silêncio
Revestido pelo mar
Que teima em anunciar suas ondas
Numa sinto(cro)nia elegantemente repetida
Lugar-Fronteira
Comarca de forasteiros
Onde o juízo é a ponta da faca
Ou o barulho do pipoco.
Lugar-Preguiça
Assumido por alguns
Entendido por poucos
Lugar-Intensivo
Remissivo
Alusivo
Lugar-Memória
Grafado nos pés
E no coração que cansou de bater
Continuadas
No Lugar-Geografias
De cada um.
259
REDESCOBERTA do corpo,
- Foi, no Brasil, que pude compreender o corpo como mapa intensivo. Mapa
como marca, gesto, movimento. Mapear, portanto, como ato político-poético
que utiliza como fonte aquilo que foi absorvido ou repelido, tal como um tecido
vibrátil, que reverbera sensações e afetos dos mais diversos, afinal de contas,
como enuncia Bruno Latour, “ter um corpo é aprender a ser afetado”.
260
A partir das palavras de alguns amigos, onde as mesmas me puseram
a fazer da solidão um exercício de criação com tudo aquilo tudo aquilo que via
e sentia. Busquei, a partir disso, tornar-me um observador ativo. Foi assim que
escrita aqui disposta. E isso era algo que não poderia ser negligenciado por uma
escrita feita na tessitura com o lugar, que é do corpo, mas que é também, da
apenas como uma necessidade, mas como último gesto para fazer sobreviver o
de Vinicius de Moraes, escrito em 1954. Foi nesse tom que a rua passou a ser
rua, a casa a ser casa, a cidade ser cidade e as pessoas serem pessoas.
Mapa como marca, gesto, movimento. Mapear, portanto, como ato político-
poético que utiliza como fonte aquilo que foi absorvido ou repelido, tal como
um tecido vibrátil, que reverbera sensações e afetos dos mais diversos, afinal de
contas, como enuncia Bruno Latour, “ter um corpo é aprender a ser afetado”.
261
mapa, criando assim, uma espécie de carto-corpo-grafia da experiência. E assim
este livro foi escrito, como fluxo, trajetória, como “uma valsa que não faz pose”,
pé”, “estica o joelho”, “meia ponta alta”, “linha do pé”, “tronco ereto”, dentre
tantas outras “posturas” que são tão eloquentemente demandadas pelo ballet
seja, quando Gabriela Camargo, bailarina e professora de ballet clássico, nos diz
que para dançar é preciso “ocupar o espaço da música”, hoje percebo como,
“repetir, repetir, até ficar diferente”. Ficar diferente, penso, trata de uma
diferente é não ser indiferente em relação aos afetos que, de algum modo, nos
atravessam.
262
Ficar diferente é produzir um “sujeito articulado”, nos temos de
Bruno Latour, que seria “Alguém que aprende a ser afectado pelos outros – não
por si próprio”. Por isso, uma vida citadina que tem indiferença a marca de suas
Talvez não tenha sido à toa que os registros fotográficos que fiz em
e de ensaios coreográficos foi o que pautou meus registros, que no seu conjunto
36
Gosto do entendimento do fotógrafo Ronaldo Carvalho sobre a ideia de “retrato”. Ele explica que
retratos são fotografias em que a pessoa sabe que está sendo fotografada, independente do lugar. Cf.:
https://goo.gl/dRHqsf
263
• Observação atenta, minuciosa
de ser algo passivo e sim, algo como a “escuta analítica ou poética” de que fala
Louppe. Por isso, essas fotos são algo mais como uma “hermenêutica da
dança”, no sentido que propõe Sally Gardner, citado por Louppe, a saber, como
um diálogo que é:
• Estímulo Sensível
Servir de disparador daquilo que pode ser dito pelo que se é visto
De um corpo que é
Corpo-palavra
264
Olho-dizer
Pés e pensamentos
Eco:
Corpo
Corpo-afeto
Como a si mesmo
Por isso
Corpo-grafia
Que é
Sobretudo
Vida
Por isso
Corporema
265
- série fotográfica
“corporema”
266
- corpo como território (Descrever? Descrever!)
267
268
269
270
271
272
273
274
275
276
277
278
279
280
281
282
283
Descrição pormenorizada
284
- corpo como paisagem (Estética? Estética!)
285
286
287
288
289
290
291
Estética do átomo
a estética do átomo.
a arte do átomo.
Que importa a beleza daquilo que se pode ser belo?
Importante a beleza do Impossível.
a ciência encontrou muito, não encontro nada, a ciência
não encontrou nada. encontrou nomes.
a estética do átomo.
a arte do átomo.
a deusa do interior foi mudar a cor do cabelo e cá fora os
atentos elogiam a brusca mudança brusca mas acertada
do cabelo da Mudança do cabelo, a deusa interior da
anatomia exterior está de parabéns porque mudou a
estética e a arte para azul claro, claro mas FUNDO.
(Preocupações estéticas com o átomo
Preocupar-se com a estética do átomo)
292
- corpo como espacialidade (Metodologia? Metodologia!)
293
294
295
296
297
298
299
300
301
302
303
304
305
Metodologia
306
“O CORPO é a nossa primeira geografia”,
307
308
Tatuagem (Chico Buarque e Ruy Guerra)37
37
1972 © Cara Nova Editora Musical Ltda.
309
Foi numa das primeiras aulas da disciplina de Estudos Culturais
corpo?”. A questão que me abraça agora versa, em conjunto com essa primeira,
sobre o sentido de corpo que estou lidando. Quando tatuei essa frase em meu
braço e publiquei uma foto na minha rede social, foi engraçado ler alguns
Duas questões: primeiro, a ideia do corpo como tela, como superfície, como
310
As palavras produzem sentido, isso diz não apenas Larrosa. Ficamos
assim. Portanto, dizer “acredito no que você acredita” não é a mesma coisa de
dizer, por exemplo, “estou de acordo com o que você pensa”. Pensar aqui não
pode ter seu sentido reduzido à crença ou opinião. Pensar é dar sentido, criar
palavras.
precisamos nos demorar um pouco mais nos detalhes do modo como isso é
delas. Provocações dessa natureza servem para criar inícios. Fazer mover
O fato é que, para fazer pensar, é preciso lidar com esta frase de
modo mais curioso. Como uma criança que interroga tudo aquilo que vê,
outro sentido que eu desconheça e que pode transformar esse suposto sentido
inicial que atribuí? Continuo: primeira geografia? Por que primeira e não
311
segunda? Quando ocorre a primeira e quando vem a seguinte? Qual seria essa
“atalhos e desvios, mas jamais em vias diretas” (Joseph Vogl39). Por isso
rizoma:
3) Sistema de passagens
38
Cf.: https://www.youtube.com/watch?v=2k-wWziPk-g
39
Idem.
312
este, de repente, se modifica se se entrar por qualquer outro ponto?” (Deleuze;
cometiam, a todo instante, “furto sem aquisição”. Por isso, corpo como primeira
experiência é o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca. Não o que
se passa, não o que acontece, ou o que toca” (Larrosa, 2015, p. 18). É, portanto,
irredutível” (Louppe, 2012) quando explica o modo pelo qual cada coreógrafo
ocorre não apenas por uma questão da forma ou do movimento em si, mas de
313
configuradas num constante exercício de ser criança, a exemplo do poeta
corpo nu? Qual seria a escala para uma geografia que saboreia
02).
para o terreno baldio. Ela deseja brincar “outramente”, que seria, noutras
atitude. Nesse sentido, não cabe alimentar também um certo sentido de que o
gesto repetido que gera automatismo deve ser eliminado, por assim dizer.
tenta expelir de si aquilo que considera um ente estranho. Tenta, sim, criar
314
“novas potências gramaticais ou sintáticas” (Deleuze, 1997, p. 09), ou seja, tenta
não apenas criar novos gestos, mas configurar dizeres outros a partir de seus
1997, p. 09). Eis que me deparo então com esse corpo geográfico que se põe
Absolutamente nada! Porque meu corpo não serve como simbologia, nem
permite aquele que está doente, expressar sua dor e, com isso, se curar. Gil
315
chama esse processo de “tradução”, onde ocorre a transição, em suas palavras,
corpo, a exemplo do que faz Kátia Kasper no seu texto que fala sobre os
316
sentir, de agir, etc. Uma aprendizagem também no sentido de
sentidos”. O autor fala das circunstâncias pelas quais podem isso pode ocorrer,
que seria pela “confusão levada ao extremo, dos códigos e línguas que tinha
por emblema o corpo (...) irrupção progressiva do corpo” (Gil, 1997, p. 24).
para fazer uma geografia é preciso fazer um corpo, aquele disponível ao outro
Por vezes Gil fala desse processo como algo que decorre de um
esvaziar para tornar-se novamente cheio. O “corpo novo”, como diz, o é porque
foi, “de novo codificado”. Não é bem nesses termos que gostaria de tratar. Nem
primitivo, nem transcendente. Aquilo que Gil aponta como uma “dificuldade”,
quando afirma que o corpo por si só é apenas expressão (Gil, 2001), vejo como
Ao dizer que “o corpo não fala, faz falar”, Gil está lidando com a
difícil criar uma gramática do corpo que dança, ou seja, uma “língua específica”,
317
Por isso, “desorganizar o corpo” em Gil não é o mesmo que, por
2010, p. 15-16)
Não há, nesse sentido, corpo puro, proliferador de signos. Não há,
não tem nada a ver com o corpo de cada um nem com uma
318
Ao invés do corpo semiótico, há o corpo paranoico, esquizofrênico,
porque a “criança não para de dizer o que faz ou tenta fazer: explorar os meios,
transforma lama em bolo de chocolate, enfeitado por uma flor. Criança que
brinca de fazer paisagem com aquilo que dispõe no limiar de seus trajetos mais
corriqueiros. Ela “flexiona”, pelos seus gestos, o modo como as coisas estão
319
corpo sem órgãos, “último resíduo de um socius desterritorializado” (Deleuze;
afirmação proferida por adultos de que “as crianças não brincam mais”, Renata
passou dois anos viajando por diversos estados brasileiros, coletando cenas de
registrar o lado potente da infância (...) o nosso foco era olhar o gesto”40. O seu
trabalho nos mostra como o gesto livre da criança brincante jamais imitação do
p. 20).
serventia das coisas pequeninas e, por isso mesmo, alimentam a poética como
40
Palestra proferida no TEDx São Paulo em 2016.
Cf.: https://www.youtube.com/watch?v=nWbcLVzmj7E
41
Idem.
320
Ao recolher a semente-brinquedo do chão e tentar devolver à criança,
semente, construir o pião, jogar, é tudo parte do mesmo ciclo. Depois, aquela
pelas corpografias que esse gesto agencia. Por isso que não existe movimento
refletido. O corpo que dança, nesse sentido, não aceita ser símbolo de
absolutamente nada.
Ballet do mundo, a Royal Ballet, podemos observar algo nesse sentido. Sergei
Polunin senta num canto, cabeça inclinada, a câmera enquadra sua perna. É
321
estrutura que agencia seu corpo para ser belo, leve, altivo. Há, portanto, no
322
O QUE PODE UMA GEOGRAFIA como corpo que dança?,
- Então, essa é a experiência que me interessa. Aquela que toma a palavra como
corpo que dança, que faz dançar, que brinca com os ritmos e silêncios, que afeta
e é afetado.
323
“O que pode uma Geografia como corpo que dança?” é, para além
As palavras que aqui articulo são, se assim quiserem, como a apresentação feita
Bausch42:
42
Intitulada “Nowhere”, foi realizada em 2009, na ocasião da reinauguração do Greek National Theatre.
Cf.: https://www.youtube.com/watch?v=aXDNoB5q9ik
324
NOWHERE explores the nature of the theatrical
measure and mark out the space using their bodies, pitting
de Dimitris: um lugar de não-lugares. Por ser assim, peço que o ocupem com
suas desmedidas, que façam dele outra coisa, que usem seus corpos semânticos
• (Não-Lugar)
Quando Marc Augé (1994) propôs este termo, ele o fez na perspectiva
325
O não-lugar é diametralmente oposto ao lar, à
questão, mas aquilo que, de certa forma, me parece ser pano de fundo.
diz que:
326
não implica, obrigatoriamente, desterritorialização, podendo
penso que o não-lugar de Dimitri está mais para esse lugar de encontros
• (Improviso)
O que você entende quando digo que este texto é improviso? Para
Nesse sentido, minha escrita está muito próxima daquilo que a autora
***
327
Retorno com uma questão: o que implica um gesto como esse ser-
mesma que o filósofo José Gil dá quando indaga: “Como constrói o bailarino o
Essa é a escrita como gesto que me interessa. Como tal, ela tem início
concreta (Gil, 2001). Então, escrever é como dançar. Por isso me apego ao que
sua existência. Penso que seria algo mais próximo daquilo que Deleuze define
328
como plano de imanência. Ao diferenciá-lo do plano de transcendência, ele
afirma que:
Um plano de imanência não dispõe de uma
captado por si mesmo, mediante aquilo que ele dá, naquilo que
p. 132).
com intimidade o mundo. Gesto expressivo e intensivo com o qual meu corpo
desliza pelo mundo faz dessa experiência de contato e movimento uma dança,
onde palavras são lugares e lugares são palavras. Talvez, por isso, Gil afirme que
“o espaço do corpo é o corpo tornado espaço” (2001, p. 19): ambos são, por
329
energia é transformada. Portanto, em ambas, potência é capacidade de
transformação.
o encontro como potência, o que pressupõe, pelo menos, duas partes. Não há
nos alerta para um certo tipo de perigo que podemos incorrer, que seria o de
equívoco, por exemplo, pensar que “palavras raras” são a garantia de uma
“experiência rara” ou, como se uma vida entediante não pudesse produzir
para Jorge Larrosa a experiência é algo que nos acontece, para Fernando
em cada um, apesar das rotinas impostas” (In: Tavares, 2013, p. 174). No fim
330
das contas, Tavares conclui que experiência é a capacidade que temos para
face daquilo que nos acontece. Por esse motivo, o que de fato importa é, nem
tanto naquilo que nos acontece, que nos afeta, mas sim, na nossa capacidade,
150).
É por isso que sempre falamos a partir daquilo que nos afeta e
331
poderia falar a linguagem da experiência e a experiência da linguagem43 – de
outro modo, senão a partir daquilo que tem configurado, em mim, uma afecção
ativa: a dança.
saltar”, quando ele diz que “falar e escrever são atos físicos” e que “a linguagem
é uma experiência física”, então, finalmente, posso dizer que fui tirado para
dançar. Nessa dança, Tavares me ensinou que a palavra tem peso e contrapeso,
pode ser entendida como sendo determinada por um ritmo corporal, uma
43
Título da mesa de abertura do I Seminário Rasuras – imagem, linguagem e sensibilidade no contexto
contemporâneo. Cf.: http://seminariorasuras2016.weebly.com/
332
gente desliza por entre, se introduz no meio, abraça-se ou se
palavra como corpo que dança, que faz dançar, que brinca com os ritmos e
silêncios, que afeta e é afetado. Por esse motivo, seja o corpo ou o corpus, deles
me interessa, portanto, pensar num corpo como anatomia, por exemplo, mas
nesse contexto:
e as almas não são para ele nem substâncias nem sujeitos, mas modos”
Isso porque “os corpos não se definem por seu gênero ou sua espécie, por seus
órgãos e suas funções, mas por aquilo que podem, pelos afetos dos quais são
Então, o que estamos tentando fazer encontrar, nesses termos, seria Linguagem
333
energia criativa, ou seja, algo da ordem do interno, “necessita ocupar espaço,
como ela ocorre, que o movimento dançado convida a Geografia para ser seu
Merce Cunningham, Gil (2011) aponta para aquilo que se denomina como o
combate ao mimetismo dos gestos e das figuras, a saber, o espaço cênico como
334
quando se retiram do corpo as motivações emocionais,
2001, p. 49).
Parafraseando Gil (2001), não é uma Geografia emotiva, nem perceptiva. Sendo
plano de desejo, provoca uma abertura naquilo que Massey (2008) intitula como
que seriam, por sua vez, “nossa política”, ou seja, nosso modo de pensar implica
335
o futuro for aberto haverá campo para uma política que possa
Azevedo (2009) afirma como a Geografia fez exatamente o contrário disso. Ela
que incorpora, ou seja, traz para dentro de seu corpus, um regime de verdade
centrado em duas bases: primeiro, na ideia de um olho que tudo vê, que por
sua vez, alimenta a ideologia do ver para crer. Um regime de verdade que
336
Assim, o corpo sem órgãos nunca é o seu, o meu...
método.
337
- O que fazer com os afetos de que somos capazes?
desenvolvido por Pina Bausch. Tavares explica que Pina desenvolveu uma
2013, p. 277):
217)
isso que irá garantir capacidade de decisão sobre o que fazer com os afetos de
338
que se movimenta (movimento-afeto), que seria aquele, posso dizer, que escapa
sensação (Tavares, 2013, 156): “Os afectos não são sensações paradas, são
sensações que se movem, aliás, são movimentos que sentem; movimentos: isto
Elas estão mais para uma grafia de mundo que é “pura matéria sonora”, “corpo
24).
afetado. Nesse sentido, faço coro com os gritos espinosanos: “Eis porque
Espinosa lança verdadeiros gritos: não sabeis do que sois capazes, no bom
339
como no mau, não sabeis antecipadamente o que pode um corpo ou alma, num
para nos ajudar a compreender que o decidir (géstica do pensamento) que falei
Agora, porque:
Aqui, porque:
44
Festival Contemporâneo de Dança (São Paulo, 2011).
Cf.: https://www.youtube.com/watch?v=lIwxWe_Tvo4
340
- Fuganti: “Quem desliza, quem tá em movimento, em devir, quem tá em
2001, p. 218).
2013) provocou isso. Interpretada por Phillip Chbeeb (PacMan) e Renee Kester45,
dentre outras coisas, deslizar, escorregar. Foi isso que aconteceu com cada uma
45
Cf.: https://www.youtube.com/watch?v=qk00gbDwGqM
341
incerto, mas por ser “processo, ou seja, uma passagem de Vida que atravessa o
ali estão em movimento e contato. A cada passo, a cada pulsar, criam-se meios
singularização.
342
Descrição do Vídeo46
46
Tradução Livre: “Todo mundo vai dizer que é difícil deixar a dor ir ... E é. Uma vez que somos crianças,
temos dito para abraçar o melhor de nossas experiências e desconsiderar o pior. Mas o que acontece
quando as mais belas memórias do nosso passado acabam fazendo o maior dano para o nosso futuro”?
343
Apesar da descrição do vídeo apontar para uma espécie de
que “escrever não é contar as próprias lembranças, suas viagens, seus amores,
não dançar, se queremos ou não – com nossas grafias, nossos gestos – realizar
47
Teoria que pontua a relação de forças que conectam os dois parceiros de uma dança. Ela é definida pela
relação entre “posture, tone, tension, energy, and the direction”. Ver mais em:
http://www.joeandnelle.com/assets/frame_matching_and_pted_by_joe_demers.pdf
344
responder isso quando conseguirmos responder à outra pergunta fundamental.
No aqui e no agora:
que me proponho a fazer e penso: O que pode uma geografia como corpo que
dança?
345
Numa Geografia fabuladora, criadora de devires e potências
Numa grafia (geografia) desviante
Que hesita, que se lança ao chão
E faz dele um novo começo
Que se abre intensivamente ao infinito
Geografia aberta e processual
Aquela que faz do seu corpo (corpus) um movimento dançado
Uma geografia bailarina,
Que faz do impulso interior sua força vital
346
BRAGA, te amo
347
Eis então que, ao reler tais apontamentos e anotações, me chega de
mansinho outra canção. A partir dela, encontro a calma e a paz necessária para
Braga, circunstâncias tão intensivamente tristes que tive em outros lugares que
a partir do nosso contato com novos lugares, novas experiências, são sempre
Por isso, relatos e narrativas interessam. Não porque eles podem ser
348
Em todas essas memórias revisitadas encontrei a permanência de um
modo específico de habitar que tonaliza essa relação corpo-lugar, a saber, esse
acolhimento da diferença.
este livro com um novo “aqui e agora”. Daquela corpografia triste, surge uma
grafia do avesso, a exemplo do que relata Caetano Veloso em sua bela canção:
Sampa.
349
“Braga, te amo”
Cidade festiva
Feita de ruas e praças floridas
Esquinas que apontam para um horizonte iluminado
Destes senhores e senhoras, gajos e raparigas
Que estão a nos oferecer, sempre
Seus semblantes discretos e corteses
Cortesia também presente no por do sol
Que é dos mais bonitos
E até quando há chuva (e muita há)
Faz-se poesia
Porque, de longe
Avistam-se os montes que vigiam e protegem seus habitantes
E assim, aos poucos e bem devagar
Ama-se Braga
Porque ela é, genuinamente
Um bailado eloquente
Que vai
A cada dia
Nos convencendo:
- Não adianta ser reticente
Importa mesmo
Simpatia e um pouco de coragem
Porque
No fim das contas
Sempre há tempo para que se diga
Amo-te
Ou melhor:
Sempre há tempo para que se diga
Braga, te amo!
350
“...Saudades!”
351
NOTA FINAL48
E não foi.
(Silêncio)
E o que se fez,
Já está.
(Eco)
48
Este livro é parte substancial dos resultados da pesquisa de pós-doutoramento realizada na
Universidade do Minho (Portugal), 2017/2018. Alguns textos de minha autoria publicados anteriormente
em periódicos, pelo fato de tratarem especificamente de aspectos importantes sobre o sentido de cidade,
de linguagem, narrativa e de dança, foram incorporados parcialmente neste livro, mediante revisão e
ajustes. Todas as fotografias que identificam o rosto da pessoa fotografada foram previamente
autorizadas pelas mesmas.
352
PÓSFÁCIO, sobre a experiência desta leitura
"você não vai poder estar ao lado de todo mundo que estiver lendo seu
trabalho para explicar o que quis dizer em cada parte. Ela estará sozinha e o
texto tem que ser o suficiente para ela entender suas ideias e argumentos".
Pois bem, solidão foi uma das poucas sensações que não senti
enquanto passeava entre as frases deste livro. Durante a leitura, aconteceu algo
novo para mim, parecia que você estava ao meu lado, me contando sobre tudo
isso. Com uma fala calma, sensível, delicada, poética, daquelas conversas que
começamos, passam-se horas e horas e ela não cessa nem enjoa, não cansa,
desentendimento, pois quem a estava contando foi minucioso para que tudo
parágrafos, hora poesias, hora poema, hora pausas (minhas para ir longe), hora
entristece, mas que utiliza tudo isso como matéria de poesia. Aliás, nesse livro
353
as emoções são passagens, nunca paradas ou fiéis companheiras ao longo de
todo percurso.
saber quem o escreveu, mesmo sem saber o autor. É nítido que esse livro foi
você que escreveu, é fato que essa é a sua geografia e que por tanto tempo
vem imaginando, mas que tínhamos apenas partes, artigos, pequenos escritos
perceber todos os seus artigos contidos ali, todos os Queiroz, todas as suas
que te acompanharam ao longo de todo esse tempo. Pude sentir todo o frio,
da volta. Este será um daqueles meus livros de cabeceira, sabe que você tanto
fala, que devem ficar ali e sempre irmos e virmos dentro dele, termos o contato
constante.
incredulidade sobre aquilo que acabamos de ver? assim "terminei" seu livro.
Percebeu que não falei da dança em momento nenhum? isso por que ela esteve
A dança neste livro não é para ser dita e sim sentida, vivenciada,
354
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Formatado de acordo com as normas da APA.
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361
ANEXOS
362
GEOGRAFIA E DANÇA
sistematização da produção bibliográfica (1998 – 2016)
- SISTEMATIZAÇÃO QUANTITATIVA
363
Observa-se ainda, no aspecto do tipo de produção, a seguinte relação no
quesito localidade/tipo de produção:
-PT: Portugal
-UK: Reino Unido
-FR: França
-US: Estados Unidos
-CH: Chile
-BR: Brasil
PT
RESUMO
50% 50%
ARTIGO
UK
33%
ARTIGO
CAP LIVRO
67%
364
FR
20% 20%
DOSSIE
ARTIGO
CAP LIVRO
60%
US
33%
LIVRO
ARTIGO
67%
365
CH
ENTREVISTA
100%
BR
12%
25%
DISSERTAÇÃO
ARTIGO
TCC
38%
TRABALHO COMPLETO
25%
366
Nota-se que a produção bibliográfica em artigos é aquela que compõe a
maior porcentagem nos seus respectivos lugares de produção. No entanto, quando
analisamos do ponto de vista da distribuição, percebemos que a produção em livro é
responsável pelo maior volume de conteúdo produzido. Para chegarmos a essa
informação, foi utilizado a métrica da quantidade páginas como medida referência para
mapear de forma equivalente a distribuição espacial e temporal das produções
encontradas. Disso resultaram os seguintes gráficos:
UK
5%
BR
US
CH
PT
US BR
54% FR
20%
UK
700 US
646
600
500
400
BR FR
300 233 209
200 PT UK
CH 42 55
100 4
0
BR US CH PT FR UK
PÁGINAS
367
LINHA DO TEMPO
332
300
152
100
8 21 4 18 29 14 12 31 1 17 13 11 41 3 41 18 16
FR UK CH US BR UK FR US FR BR US PT BR BR BR BR BR PT BR UK FR
1998 1999 2002 2003 2006 2007 2008 2008 2009 2013 2013 2014 2015 2015 2015 2015 2015 2015 2016 2016 2016
0 0 2 0 0 0 2 1 0 1 2 0 1 1 0 0
BR PT UK US FR CH
368
BR: 08 produções – 08 de acesso livre: 100%
PT: 02 produções – 02 de acesso livre: 100%
UK: 03 produções – 00 de acesso livre – acesso pago: 01 – acesso pago, mas garantido pela universidade: 02
US: 03 produções – 00 de acesso livre – acesso pago: 02 – acesso pago, mas garantido pela universidade: 01
FR: 05 produções – 04 de acesso livre – acesso pago: 01
CH: 01 produções – 01 de acesso livre: 100%
- SISTEMATIZAÇÃO QUALITATIVA
Corpo Geográfico: reflexões sobre comunicação do corpo e dança afro peruana, de Joana Fernandez.
Temas e Conceitos Aspectos Concepção de Matriz HPG
metodológicos Geografia
Estudos culturais, Observação, Espaço físico, Fenomenologia,
cotidiano, identidade, descrição; superfície, localidade, Geografia Humanista
poética, comunicação espaço poético, casa, Cultural, Geografia.
(como troca de Comunicação entre Física Tradicional
informação), corpo, indivíduo e lugar; (clima, vegetação,
espaço, espacialidade, relevo), Geografia
genética, símbolo, Crítica (Milton Santos);
linguagem, dança;
369
O que pode uma Geografia como corpo que dança? Linguagem-experiência `gesto-movimento `
(fragmentos), de Antonio Carlos Queiroz Filho.
Temas e Conceitos Aspectos Concepção de Matriz HPG
metodológicos Geografia
Corpo, linguagem, Experimentação Gesto, linguagem, Nova Geografia
experiência, gesto, devir, conceitual; sensibilidade, grafia Cultural, Geografia
potência, não-lugar, poética; contemporânea,
improviso, pós- Geografia criativa,
estruturalismo, afeto; Doreen Massey;
Geografia Cultural: Música e Dança Folclórica Gaúcha, Construindo Identidades nos Departamentos
Tradicionalistas Culturais Estudantis De Santa Maria – RS, de Deise Lorensi e Meri Bezzi.
Temas e Conceitos Aspectos Concepção de Matriz HPG
metodológicos Geografia
Identidade cultural, Conversas informais, Manifestação cultural, Fenomenologia,
dança, folclore, cultura, observação do localidade; Geografia Cultural
patrimônio, cotidiano, cotidiano, descrição; tradicional;
pertencimento, música,
teatralidade, gênero,
símbolo, percepção,
experiência;
370
Eu-Corpo: Geografia, Dança, Lugar, de Carolina Pereira.
Temas e Conceitos Aspectos Concepção de Matriz HPG
metodológicos Geografia
Lugar, percepção, Explorações teórico- Espaço simbólico, Geografia Humanista,
sensação, movimento, práticas, diário de mundo vivido; Nova Geografia
corpo, dança, imaginação; bordo, Cultural;
fenomenologia;
Uma nova Geografia de Ideias: diversidade de ações comunicativas para a dança, de Giancarlo
Martins.
Temas e Conceitos Aspectos Concepção de Matriz HPG
metodológicos Geografia
Corpomídia, Análise sistêmica de Localização, Geografia Cultural;
evolucionismo, estudos dados, entrevistas, superfície, circulação,
culturais, política cultural; estudo de caso; relações de poder,
ambiente
sociocultural;
Súcia: uma dança de manifestação cultural e religiosidade em Monte do Carmo – TO, de Marciléia
Bispo.
Temas e Conceitos Aspectos Concepção de Matriz HPG
metodológicos Geografia
Festa, religiosidade, Entrevistas, Localidade, espaço Geografia cultural;
cultura, identidade, observação, simbólico
cotidiano, tradição; narrativas;
371
#Textos em língua inglesa
Using folk dance and geography to teach interdisciplinary, multicultural subject matter: a school-
based study, de Inez Roveno e Madeleine Gregg.
Temas e Conceitos Aspectos Concepção de Matriz HPG
metodológicos Geografia
Educação, cultura, nativo Teoria de Cornelius Disciplina, localidade; Geografia cultural;
americano, índios, sobre ensino de
cotidiano, pluralidade; cultura, pesquisa
qualitativa;
The Cultural Geography of the Summer Dance Pavilions of Ostrobothnia, Finland, de Pentti Yli-Jokipii.
Temas e Conceitos Aspectos Concepção de Matriz HPG
metodológicos Geografia
Cultura, paisagem Pesquisa Localidade; Geografia cultural;
cultural, comunidade, etnográfica;
identidade, relações
sociais, migração, cultura
popular;
372
#Textos em língua francesa
Géographie exotique et imaginaire de la danse: la révélation de la danse espagnole dans 'De Paris à
Cadix' d’Alexandre Dumas, de Bénédicte Jarrasse.
Temas e Conceitos Aspectos Concepção de Matriz HPG
metodológicos Geografia
Narrativa, viagem, dança, Revisão teórica, Localidade, superfície; Geografia cultural;
imaginário, estudo literário;
representação,
antropologia, estética,
signo;
Danse exotique, danse érotique. Perspectives géographiques sur la mise en scène du corps de l’Autre
(XVIIIe-XXIe siècles), de Jean-François Staszak.
Temas e Conceitos Aspectos Concepção de Matriz HPG
metodológicos Geografia
Gênero, dança, pós- Estudo descritivo Localidade, superfície; Nova geografia
colonial; histórico, estudo de cultural;
caso;
Espaces et lieux du tango: la geographie d'une danse, entre mythe et réalité, de Apprill C. e Dorier
Apprill.
Temas e Conceitos Aspectos Concepção de Matriz HPG
metodológicos Geografia
Identidade, lugar; Estudo de caso; Localidade, superfície; Geografia cultural;
estudo descritivo
histórico;
Géographie de la danse et du bal, de Joëlle Dalègre, Maurice Garden et Pascal Dibie, Bénédicte
Tratnjek.
Temas e Conceitos Aspectos Concepção de Matriz HPG
metodológicos Geografia
Paisagem, território; Estudo de caso; Localidade, superfície; Geografia cultural;
estudo descritivo
histórico;
373
Quand le corps donne chair à la géographie.
Temas e Conceitos Aspectos Concepção de Matriz HPG
metodológicos Geografia
Corpo, espaço, fronteira. Fenomenologia, Pensamento, Nova geografia
Espaço público, gênero, experimentação; espacialidade, cultural, geografia
relações sociais e de geograficidade; humanista;
poder;
374
PORTUGUÊS
8%
INGLÊS
40%
Geografia Cultural
Nova Geografia Cultural
60%
375
FRANCÊS
17%
Geografia Cultural
50% Nova Geografia Cultural
Geografia Humanista Cultural
33%
ESPANHOL
Geografia Cultural
100%
376
Conforme os gráficos, nota-se que a maior parte desse material,
desenvolvimento da pesquisa.
de fundo criativo-sensível-poético;
377
SOBRE O AUTOR
378