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RESUMO
Este artigo objetiva mostrar a influência do latim no português, bem como apresenta, de modo sucinto, o
panorama histórico da evolução da língua portuguesa. Posteriormente, faz uma verificação do tratamento que as
gramáticas pós-Nomenclatura Gramatical Brasileira (tradicionais) e as gramáticas históricas dão aos nomes
terminados em “ão”, a fim de evidenciar a importância das últimas, as quais explanam mais detalhadamente a
temática. Desse modo, por meio de uma análise confrontativa, foi possível verificar a importância da gramática
histórica, bem como tornou evidente a necessidade de sua adoção no ensino da língua portuguesa, pois apresenta
justificativas mais coerentes ao estudo gramatical.
ABSTRACT
This article intends to show the influence of Latin in Portuguese language; furthermore it intends to
present, succinctly, the historical panorama of Portuguese language evolution. Subsequently, it makes a verification
about the treatment that post-Nomenclatura Gramatical Brasileira grammar (traditional) and historical grammar give
to nouns that finish in “ão”, in order to evidence the importance of historical grammar, that shows with details the
theme. As a result of this, using a comparative analysis, it was possible to verify the importance of historical grammar
and it became evident the necessity of adopting it in Portuguese teaching, because it presents coherent justification for
grammatical studying.
INTRODUÇÃO
1
Graduado em Direito pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL); graduando em Letras pelas
Faculdades Integradas Teresa D’Ávila (FATEA); pós-graduando em língua portuguesa: linguagem e literatura;
pesquisador do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID).
No que tange à metodologia, foi empregada uma pesquisa estritamente bibliográfica,
embasada em gramáticas pós-NGB - Lima (1978); Bechara (1980) e Cintra e Cunha (2001) –
e em gramáticas históricas – Pereira (1935); Ali (1964) e Coutinho (1976). Quanto ao
levantamento histórico da língua portuguesa, além das obras mencionadas, foram usados os
trabalhos dos seguintes autores: Camara Jr. (1975); Silva Neto (1979); Geiser e Silva (2009) e
Carvalho [2003?].
2
Coutinho (1976, p. 46) chega a afirmar que o português é o próprio latim modificado.
4ª com a 2ª e da 5ª com a 1ª), 3 conjugações (fusão da 3ª em -ĕre com a 2ª em -ēre),
2 gêneros (masc. e fem., com a eliminação do neutro) e redução dos 6 casos a 2
(nom. e acus.) e depois a 1 (acus.).
Conforme mencionado, a língua portuguesa proveio do latim vulgar, razão pela qual é
denominada neolatina ou novilatina, jungindo a esse grupo de línguas o espanhol, o catalão, o
francês, o provençal, o italiano, o reto-romano, o dalmático, o romeno e o sardo. Salienta-se
ainda outra denominação conferida a tais línguas: línguas românicas.3
Quanto ao agrupamento das línguas neolatinas apresentado, Camara Júnior (1975, p.
14-15) menciona que o fato de haver insegurança no que toca à distinção entre língua e
dialeto leva a enumerações equivocadas. Algumas dessas línguas, importantes na Idade
Média, tornaram-se obsoletas ou desapareceram, bem como perderam essa condição. Do
provençal só restam remanescentes dialetais; o sardo, que possui traços peculiares, fá-lo ser
considerado uma variante dialetal do italiano; o rético é apresentado como fora do âmbito das
línguas nacionais ou literárias; e, por fim, o dalmático que existiu até o século XIX.
Ainda, antes de se adentrar o aspecto histórico, cumpre observar que as línguas
neolatinas não derivaram diretamente do latim, mas entre aquelas e este houve uma fase de
transição, chamada romance, que consistia em modificações regionais do latim (COUTINHO,
1976, p. 43).
Diante do explanado, verifica-se a importância do latim, inserido na ramificação
itálica dentro do grupo de línguas indo-europeias (PEREIRA, 1935, p. 9), à medida que a
origem do português remonta a ele. A seguir, tratar-se-á da chegada do latim à Península
Ibérica, a fim de se evidenciar o longo percurso linguístico pelo qual passou a região.
3
A România, segundo Said Ali (1964, p. 17)., é a região que abrange a Europa, a partir de leste para oeste, a
Romênia, como região isolada, a Itália, compreendendo a borda do Adriático com o Trieste e toda a Dalmácia,
parte da Suíça, a França com parte da Bélgica e finalmente a Península Ibérica.
4
Silva Neto (1979, p. 58) afirma que a primeira incursão celta deu-se no século VIII a. C. Dois séculos
posteriores, haveria nova incursão mais expressiva e significante.
a identificar as numerosas e distintas tribos da região. A unidade refere-se aos traços comuns
célticos que apresentaram.
Roma não via de modo bom a expansão e o progresso de Cartago, cujo domínio se
estendia por regiões fronteiriças ao Lácio. Desse modo, uma guerra foi travada, cujo
prolongamento foi de 264 a.C. até 146 a.C., cabendo a vitória às legiões romanas
(COUTINHO, 1976, p. 48). Camara Júnior (1975, p. 17) relata que Roma adentrou o território
Peninsular a partir do século II a. C.
Com relação à romanização da Ibéria, é feita uma distinção em duas épocas: a primeira
abrange desde as guerras púnicas, período da República, até o estabelecimento do Império. A
segunda, conhecida por ser uma época de paz e de assimilação, inicia-se com o advento de
Augusto e abrange o período imperial (COUTINHO, 1976, p. 48).
O território foi dividido em três grandes zonas militares e administrativas: Bética, ao
sul, subindo a princípio por todo o litoral mediterrâneo; a Província Tarraconense, ao centro e
ao norte, e em seguida também a leste; e finalmente a oeste, confinando com o Atlântico, a
Lusitânia (CAMARA JR., 1975, p. 17).
O latim fixou-se aos poucos na Península, fazendo desaparecer as línguas nativas. No
entanto, uma zona habitada por Pirineus manteve seu idioma: o basco. Salienta-se que o latim
não foi imposto coercitivamente; a respeito da absorção da cultura romana, afirma Silva Neto
(1979, p. 75):
17- Era enorme o prestígio da nova civilização aos olhos dos povos conquistados.
Além disso, é preciso contar com a habilidade dos Romanos, que procuravam
associar os nativos ao governo das províncias e, longe de levá-los a uma absorção,
pela força, asseguravam a ordem, construíam excelente rede de comunições, em
suma, estabeleciam uma organização administrativa exemplar. Não admira, pois,
que todos aspirassem à cidadania, privilégio que os habilitava a casar, herdar e
comerciar sob a proteção das leis romanas. E não só: abria-lhes as portas das
carreiras do serviço público: funcionários, oficiais, procuradores e, finalmente,
governadores. 5
No século V, os bárbaros chegaram à Península. Precisamente no ano de 409 os
Alanos, Vândalos e Suevos invadiram a Espanha (SILVA NETO, 1979, p. 317). Segundo
Coutinho (1976, p. 51), o povo bárbaro era afeito às guerras, não se opuseram, assim, à
admissão da civilização romana. Adotou-se o idioma latino, o qual já estava sensivelmente
modificado.
No século VIII, a Península foi invadida pelos Árabes, ocasião em que se adotou o
idioma árabe como língua oficial, no entanto o povo subjugado continuou a falar o latim
modificado (romance) (COUTINHO, 1976, p. 52) 6
Durante a dominação mulçumana, cristãos organizavam cruzadas com o fito de
reconquistar os Santos Lugares, em troca o papa concedia a eles indulgências. Àqueles que
lutaram para libertar o território ibérico o papa concedeu iguais indulgências. Consoante
Coutinho (1976, p. 54), foi da eficiência das cruzadas que surgiram os reinos de Leão, de
Castela e de Aragão.
Dom Henrique, conde de Borgonha, após lutar pela reconquista do território ibérico,
recebeu de D. Afonso VI, rei de Leão e Castela, o Condado Portucalense, bem como a mão de
sua filha, D. Tareja. (COUTINHO, 1976, p. 54). A nação portuguesa, no entanto, só se
constituiu em 1128, na batalha de São Mamede. Em 1139 ou 1140, D. Afonso Henriques,
5
O latim impôs-se pela força das circunstâncias, visto que possuía o prestígio de língua oficial, era o idioma da
escola, bem como viabilizava o acesso a uma cultura superior (COUTINHO, 1976, p. 49).
6
Muitos hispano-godos, influenciados pela civilização árabe, adotaram os costumes e, muitas vezes, o próprio
idioma árabe. A esse grupo deu-se o nome de moçárabes (COUTINHO, 1976, p. 52).
filho de Dom Henrique, selou definitivamente a independência de Portugal (SILVA NETO,
1979, p. 362).
Ressalta Coutinho (1976, p. 54-55), por fim, que o latim recebeu tratamento
diferenciado na região. O falar da faixa ocidental da Hispânia distinguia-se do(s) falar(es) das
outras regiões. O romance que era falado nessa região deu origem aos dialetos galaico-
português, ao norte, e a outro, ao sul, cuja influência era árabe.
O galaico-português, por sua vez, expandiu-se à proporção das conquistas e, no
reinado de Afonso III, adentrou Algarve. Posteriormente, devido à independência política de
Portugal, houve a diferenciação entre português e galego, a qual se acentuou com o tempo
(COUTINHO, 1976, p. 55).
Após explanar sucintamente acerca da história da língua portuguesa, adentrar-se-á o
cerne do trabalho, consistindo na análise da flexão dos substantivos terminados em “ão”
segundo as gramáticas pós-Nomenclatura Gramatical Brasileira.
7
Em 03.04.1957, foi designada uma comissão com renomados professores do Colégio Dom Pedro II (Antenor
Nascente, Clóvis do Rego Monteiro, Cândido Jucá Filho, Carlos Henrique da Rocha Lima e Celso Ferreira da
Cunha; assessores: Serafim Pereira da Silva Neto, Antônio José Chediak e Sílvio Edmundo Elia), pelo Dr. Clóvis
Salgado da Gama, Ministro da Educação e da Cultura, a fim de colocar ordem às confusões terminológicas
existentes, o que culminou na Nomenclatura Gramatical Brasileira (GURPILHARES; LUCAS, 2006, p. 9).
Também, tratam dos nomes terminados em “ão”, cuja forma de plural ainda não é
definitivamente fixada, afirmando, no entanto, que há uma certa preferência pela formação em
“ões”. Cita como exemplo os nomes: alão, alazão, aldeão, anão, ancião, castelão, corrimão,
deão. Por fim, fazem uma última observação que toca ao nome corrimão, mostrando que,
como composto de mão, deveria apresentar o plural corrimãos, mas existe também corrimões,
oportunidade em que isso decorre do esquecimento da formação original da palavra
(CINTRA; CUNHA, 2001, p. 183).
Consoante se verifica, as gramáticas analisadas não justificam o porquê da existência
de mais de uma forma plural para os nomes terminados em “ão”. Apenas enumeram alguns,
afirmando que os plurais terminados em “ões” são maioria. Ademais, limitam-se a apresentar
uma lista com admissibilidade de mais de um plural. A próxima seção evidenciará o
tratamento dado a essa formação de plural pelas gramáticas históricas.
Esta seção abordará a temática da flexão dos nomes terminados em “ão” segundo as
gramáticas históricas de Eduardo Carlos Pereira (1935), de Manuel Said Ali (1964) e de
Ismael de Lima Coutinho (1976).
Pereira (1935, p. 151) afirma que, até o século XVI, os nomes terminados em “ão”
apresentavam três terminações correspondentes ao tipo morfológico latino, tanto no singular
como no plural. A partir daí, uniformizaram-se por analogia sob a forma de “ão” no singular.
Quanto ao plural, conservaram-se as diferenças. 9
Pereira (1935, p, 151) ainda explica que, tanto no singular como no plural, houve a
queda do n intervocálico com nasalização da vogal anterior. Aponta em seguida que “Na
orthographia archaica essa attenuação do n era indicada por uma fórma menor do n,
superposto á vogal nasalada; do afastamento das extremidades deste n, convertido em sinal
diacrítico, nasceu o til (~).” (PEREIRA, 1935, p. 151).
Por fim, menciona que a uniformização no singular decorreu de influência analógica; e
a adoção do primeiro tipo morfológico, do fato de ser mais eufônico. Reitera que, no plural,
foram conservadas as formas primitivas.
Ali (1964, p. 59) principia a apresentação dos nomes terminados em “ão”, relatando
que por procederem de nomes latinos em –o, cujo genitivo é –oni, formam o plural
naturalmente em “ões”, salvo em poucas exceções, em virtude de filiação direta ou por
8
De acordo com Coutinho (1976, p. 13): A gramática histórica é a ciência que estuda os fatos de uma língua, no
seu desenvolvimento sucessivo, desde a origem até a época atual.
9
Pereira (1935, p. 151) apresenta em sua obra a seguinte tabela, cujas setas foram substituídas por “>”:
germanum> ermano> irmão
germanos> ermanos> irmãos
manum> mano> mão
manus> manos> mãos
panem> pane> pãe > pão
panes> pães
rationem> razões > razom (razõ) > razão
rationes> razões
multitudinem> multidões > multidom (multidõ) > multidão
multitudines > multidões
criação analógica. No caso de “ões”, manteve-se a regularidade do plural. Quanto à antiga
terminação do singular –õ (ou –õm), alterou-se em ditongo.
Segundo Ali (1964, p. 60), a regra geral, consistindo no plural em –ões vige para a
linguagem moderna, isto é, a quaisquer termos novos deve ser aplicada mencionada regra.
Oferece alguns exemplos de plurais em “ães” e “ãos”, apontados como exceções e diferentes.
Apresenta, também, alguns tipos de plurais, aos quais atribui o adjetivo duvidoso, mencionado
que nesses casos há uma tendência pela fixação em “ões”.
São apontados por Ali (1964,p.60) alguns empregos por quinhentistas e seiscentistas,
que evidenciam exceções e oscilações:
Cidadães (ocorre ainda em Sá de Miranda, vol. 2, páginas 105, 139 e 140); gaviães
(Couto, Déc. 4,7,10); anãos (Bernardes, N; Flor. 1, 402); cidadões (Bernardes, N.
Flor. 2, 114); ermitãos (Arrais 440); ermitães (em português antigo e Vieira, Serm.
8, 403); pãaos (=pavãos, L. de Esopo 23); cirurgiães (Bernardes, L. e C. 334); peães
(freqüente entre os quinhentistas).
Finaliza a análise dessa modalidade de plural, mostrando que o plural do antigo diamã
ou diamão (=diamante) era diamães, bem como explica que os termos –ane e –anu, os quais
deram origem aos plurais em –ães (português antigo –ãaes) e –ãos (português antigo –ãaos),
são provenientes do latim e seus casos são menos frequentes. Para Ali (1964, p. 60), a
dificuldade na formação do plural desses nomes teria sido menor, se no singular tivesse
persistido –om, -am e –ão.
Com relação a Coutinho (1976, p. 238), ele afirma que as terminações latinas –anu, -
ane, -one, -udine deram, em português -ão,-ã, -om, devido à nasalidade transferida pelo –n– à
vogal anterior. Ulteriormente, afirma o autor, as terminações –ã e –om foram absorvidas por –
ão, mas no plural permanece a distinção originária.
De acordo com Coutinho (1976, p. 238-239), a confusão existente na língua arcaica
entre os nomes terminados em –ão justifica o fato de algumas palavras, além do plural
próprio, apresentarem outros por analogia. Cita como exemplo: aldeão, anão, gavião,
sacristão, alão, ancião, truão, ermitão, hortelão, vilão. Encerra a abordagem, afirmando que a
terminação em –ães é a menos comum das três e a mais popular é –ões, que tende a
prevalecer.
Após analisar detidamente a abordagem da temática segundo as gramáticas
mencionadas no início desta seção, passar-se-á às considerações finais, às quais chegou o
presente trabalho.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo apresentou a temática em quatro seções. A primeira mostrou a
influência do latim na língua portuguesa; a segunda traçou a evolução galgada pela língua
portuguesa ao longo da história; a terceira e a quarta seções abordam o plural dos substantivos
terminados em “ão” segundo gramáticas pós-Nomenclatura Gramatical Brasileira e históricas.
A abordagem segundo as gramáticas tradicionais pós-NGB possibilita afirmar que o
tratamento dispensado à temática é superficial e, muitas vezes, pouco significativo, não
contribuindo para um estudo significativo e, por conseguinte, não tornando os alunos leitores
críticos.
Já a abordagem segundo as gramáticas históricas mostrou, de modo mais
pormenorizado e justificado, os diferentes plurais dos nomes terminados em “ão”, bem como
evidenciou o porquê de haver distinções entre tais plurais.
Posto isso, ficam evidentes a importância e a necessidade de se adotar a gramática
histórica no ensino da gramática da língua portuguesa, pois ela viabiliza um estudo justificado
dos tópicos gramaticais e, por conseguinte, contribui para um aprendizado significativo e, por
fim, para a formação de leitores críticos.
REFERÊNCIAS
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