Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Pedro Cunha – prólogo – Se ofendermos a alguém, é com a nossa maior boa vontade.
Que os senhores e as senhoras devam pensar, que até aqui viemos, para ofender, mas
com a maior boa vontade. Mostrar nossas simples habilidades, esse é verdadeiramente o
motivo do nosso fim. Levem em consideração, portanto, que aqui viemos, pois, contra a
nossa vontade. Não viemos no intuito de agradar-lhes, nossa intenção é verdadeiramente
esta. Para dar-lhes tudo para o seu deleite, não estamos aqui. Para que os senhores
arrependam-se de aqui estar, os atores estão prontos; e, por sua apresentação, os
senhores vão ficar sabendo tudo o que os senhores vão ficar sabendo.
Damas e cavalheiros, que por ventura venham a se admirar com essa apresentação:
admirem-se, até que a verdade traga tudo a tona. Um casal apaixonado, Píramo e Tisbe
se encontram no muro, que aqui eu represento. E pela racha do muro, os amantes
contentam-se em sussurrar. Ao luar, esses amantes nem pensavam em rejeitar
encontrarem-se no túmulo de Ninus, para ali, namorar… Mas esta terrível fera, que
atende pelo nome de Leão, afugentou a fiel Tisbe, ou melhor assustou-a. Fugindo em
disparada ela deixou cair o seu manto, que o vil Leão manchou com a boca suja de
sangue. Em seguida chega Píramo, de encantadora juventude e muita coragem. Encontra
assassinado o manto de sua fiel Tisbe, com a mão sanguinária e censurável ele pega da
espada, espeta o peito, e faz sangrar o sangue que lhe ferveu ardente nas veias. Tisbe,
que por ele esperava na sombra de uma amoreira, saca da adaga de seu amado e morre.
Quanto ao resto dessa história deixo que, nós, limitados atores a representemos.
Entra o muro
Píramo – Ah, que noite de cara fechada! Ah, noite tão escura! Ah, noite, tu que és sempre
noite quando não é dia! Ah, noite, ah, noite, ai, ai, ai, Tisbe esqueceu-se, eu temo, deste
encontro! E tu, ó muro, ó muro, ó lindo muro, que se interpõe entre a terra do pai dela e a
terra de meu pai. Tu, muro, ó muro, ó doce e lindo muro, mostra-me tua fenda, para que
nela eu pisque meus olhos. Obrigado pela cortesia, muro. Que Júpiter te proteja contra os
males por isso! Mas, que vejo? Não vejo nenhuma Tisbe! Ah, muro malvado, através de
quem não vejo nenhuma felicidade, amaldiçoadas sejam tuas pedra, por enganar-me
desse jeito! Enganar-me desse jeito! Enganar-me! Enganar-me é a deixa para que Tisbe
entre. Ela deve entrar agora e eu devo espiá-la pelo muro.
Tisbe – Ah, muro, tantas e tantas vezes ouviste meus lamentos por nos ter separado, o
meu belo Píramo e eu! Meus lábios de cereja, quantas vezes não beijaram tuas pedras!
Tuas pedras cobertas de cal e palha grudadas numa liga em cima de ti.
Píramo – Enxergando estou uma voz; vou já me chegar ao buraco, para escutar o rosto
de minha Tisbinha. Tisbe!
Tisbe – Que venha a vida! Que venha a morte! Eu vou… com pressa.
Muro – Assim eu, O Muro, fiz a minha parte. Vou-me agora embora, que acabou minha
arte.
No túmulo de Ninus.
Leão – [Ruge]Ah…!
Tisbe foge deixando cair um manto.
Apunhala-se