Você está na página 1de 4

‭ ONÓLOGOS DE SHAKESPEARE‬

M
‭PARA MULHERES‬
🎭
‭ SHAKESPEARE – CONTO DO INVERNO (Ato III, Cena II)‬
‭HERMÍONE‬‭— Já que quanto eu pudesse ora dizer-vos‬‭consistiria apenas no‬
‭protesto contra essa acusação, não me amparando E nenhuma testemunha, afora‬
‭eu própria, quase não me aproveita declarar-me “Não culpada”. Uma vez que está‬
‭estimada minha virtude como hipocrisia, quanto eu viesse a dizer, do mesmo modo‬
‭será interpretado. Apenas isto: se os poderes divinos se interessam pelos atos‬
‭humanos, como o fazem, não duvido de que minha inocência fará corar a acusação‬
‭indébita e tremer, ante a calma, a tirania. Vós, meu senhor, sabeis perfeitamente —‬
‭conquanto simuleis ora o contrário — que toda minha vida foi tão pura, tão leal e‬
‭casta, quanto desgraçada presentemente sou, mais do que todos os exemplos da‬
‭história, sem excluirmos os casos de invenção postos em cena, para abalar o‬
‭público. Ora vede-me: companheira de leito de um monarca, tendo direito a parte‬
‭igual no trono, filha de um grande rei e mãe de um príncipe esperançoso,‬
‭compareço à barra de um tribunal, para falar acerca da honra e da vida, ante‬
‭qualquer pessoa que me deseje ouvir. A vida, estimo-a como dor, que de grado‬
‭evitaria; quanto à honra, é herança que transmito aos meus. Por isso, defendê-la me‬
‭proponho. Senhor, apelo para vossa própria consciência. Antes de haver a vossa‬
‭corte Políxenes chegado, não me achava na vossa graça, e digna não me tinha dela‬
‭sempre mostrado? E, após sua vinda, por que conduta extraordinária, acaso, me‬
‭mostrei censurável, para, agora, ser citada a esta côrte? Se os limites da honra‬
‭ultrapassei de um fio, apenas; se por ações ou pensamentos a isso me sentisse‬
‭inclinada, endurecido torne-se o coração dos que me escutam, e que as pessoas‬
‭que me são mais próximas a pelo sangue me insultem sobre o túmulo.‬
🎭
‭ SHAKESPEARE – MACHBETH (Cena I, ATO VII)‬
‭LADY MACBETH‬‭– Encontra-se embriagada a esperança‬‭que até há pouco vos‬
‭revestia? Adormeceu, decerto, desde então e acordou agora, pálida e verde a‬
‭contemplar o que ela própria começara tão bem?‬
‭Desde este instante para mim teu amor vale isso mesmo; tens medo de nos atos e‬
‭coragem mostrar-te igual ao que és em teus anelos? Queres vir a possuir o que‬
‭avalias como ornamento máximo da vida, mas qual poltrão viver em tua estima,‬
‭deixando que um “Não ouso” vá no rasto de um “Desejara”, como o pobre gato de‬
‭que fala o provérbio?‬
‭Que animal foi, então, que teve a idéia de me participar esse projeto? Quando‬
‭ousastes fazê-lo éreis um homem, e querendo ser mais do que então éreis tanto‬
‭mais homem a ficar‬
‭viríeis; Lugar e tempo então não concordavam; no entanto desejáveis ajeitá-los; e‬
‭ora que se acomodam por si mesmos, essa boa vontade vos abate! Já amamentei e‬
‭sei como é inefável amar a criança que meu leite mama; mas no momento em que‬
‭me olhasse, rindo, o seio lhe tirara da boquinha desdentada e a cabeça lhe partira,‬
‭se tivesse jurado, como o havíeis em relação a isso.‬

🎭
‭ SHAKESPEARE – SONHO DE UMA NOITE DE VERÃO (Ato I, Cena I)‬
‭HELENA‬‭— Como é possível que a felicidade possa reinar‬‭em tal desigualdade! Em‬
‭toda Atenas sou considerada tão formosa quanto Hérmia; mas a nada quer‬
‭Demétrio atender. Ele, somente, ver não pode o que enxerga toda a gente. Erra ele‬
‭ao se deixar pender do lindo semblante de Hérmia, tal como eu, caindo em igual‬
‭erro, prendo o coração na sua compostura sem senão. As coisas baixas, sem valia‬
‭alguma, de crassas deixa o Amor leves qual pluma. O Amor não vê com os olhos,‬
‭mas com a mente; por isso é alado, e cego, e tão potente. Nunca deu provas de‬
‭apurado gosto; cego e de asas: emblema de desgosto. Eterna criança: eis como é‬
‭apelidado, por ser sempre na escolha malogrado. Como os meninos quebram‬
‭juramentos, perjura o Amor a todos os momentos. Assim Demétrio, quando Hérmia‬
‭não via, me granizava juras noite e dia; mas ao calor do seu formoso riso‬
‭dissolveu-se de súbito o granizo. Da formosa Hérmia vou contar-lhe a fuga. É‬
‭certeza: no bosque ele madruga, para segui-la. A mim essa notícia vai ensejar de‬
‭vê-lo a hora propícia. Se o vir na ida e na volta, de corrida, feliz me considero e‬
‭enriquecida.‬
🎭
‭ SHAKESPEARE – ROMEU E JULIETA (Ato III, Cena II)‬
‭JULIETA‬‭– Correi, correi, corcéis de pés de fogo,‬‭para a casa de Febo. Um‬
‭condutor como Faetonte vos teria há muito tocado para o poente e, na mesma hora,‬
‭trazido a noite escura. Espalha tua cortina, ó noite, guarda dos amores, porque os‬
‭olhos curiosos nada vejam e a estes braços Romeu se precipite, de manso e sem‬
‭ser visto. Os namorados enxergam no ato do amoroso rito, pela própria beleza; ou‬
‭então, se é cego, de fato, o amor, diz bem com a negra noite. Vem, noite‬
‭circunspecta, com teu manto de matrona severa, todo preto, e me ensina a perder‬
‭uma partida que já está ganha e em que se jogam duas virgindades sem mancha.‬
‭Ao rosto sobe-me o sangue tímido; em teu manto envolve-o, até que o amor‬
‭esquivo, já se tendo tornado corajoso, só inocência veja no ato do amor sincero e‬
‭puro. Vem, noite! Vem, Romeu! tu, noite e‬
‭dia, pois vais ficar nas asas desta noite mais branco do que neve sobre um corvo.‬
‭Vem, gentil noite! vem, noite amorosa de escuras sobrancelhas! Restitui-me o meu‬
‭Romeu, e quando, mais adiante, ele vier a morrer, em pedacinhos o corta, como‬
‭estrelas bem pequenas, e ele a face do céu fará tão bela que apaixonado o mundo‬
‭vai mostrar-se da morte, sem que o sol esplendoroso continue a cultuar. Comprei a‬
‭casa de um amor, sem estar na posse dela; vendida embora me ache, possuída não‬
‭fui ainda. Tão tedioso e lento é este dia, tal como a noite em véspera de alguma‬
‭grande festa para criança impaciente que tenha roupa nova, mas não possa vesti-la.‬
‭Oh! aí vem a ama. (Entra a ama, com cordas.) Traz novidades, sim. Todas as‬
‭línguas que só sabem dizer Romeu, Romeu, falam com eloquência celestial.‬
🎭
‭ SHAKESPEARE – RICARDO III (Ato I, Cena II)‬
‭ANA –‬‭O quê? Tremeis? Haveis medo? Pobre de mim, não‬‭vos posso censurar, que‬
‭sois mortais, e os olhos dos mortais não podem sofrer o maligno. Vai-te de ante‬
‭mim, temeroso ministro dos infernos! Tão só sobre seu corpo mortal tinhas poder; a‬
‭alma, essa, não a podes ter; por isso, vai-te. Demônio imundo, vai-te por amor de‬
‭Deus, e não nos atormentes; que da terra feliz fizeste o teu inferno, encheste-a com‬
‭gritos de maldição e com profundos clamores. Se te deleitas em contemplar teus‬
‭feitos odiosos, põe os olhos neste exemplo de tua carnificina. Oh, senhores! Olhai,‬
‭olhai as feridas do Rei Henrique sem vida abrindo bocas congeladas e de novo‬
‭sangrando. Vergonha para ti, vergonha, ó tu, massa informe de sórdida‬
‭disformidade, pois que é tua presença que aqui faz verter o sangue das veias‬
‭geladas e vazias onde o sangue já não tem morada! O teu feito inumano e contrário‬
‭à natureza provoca este dilúvio contrário a toda a natureza. Oh, Deus! Tu que‬
‭criaste este sangue, vinga a sua morte. Oh, terra! Tu que bebes este sangue, vinga‬
‭a sua morte. Ou que os relâmpagos dos céus se abatam sobre o assassino, ou que‬
‭a terra se abra e de súbito o devore, tal como tu, ó terra, sorves todo o sangue deste‬
‭bondoso Rei que seu braço comandado pelo inferno tão cruelmente matou.‬

Você também pode gostar