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Artigo vencedor do Prêmio Naíde Teodósio Ano VIII - 2015

Categoria: Estudante de Pós-graduação


Autora: Clarissa B. Carvalho 1

Análise da participação das mulheres na política de Santa Cruz do Capibaribe: sub-


representação, desvelo e parentesco 2

RESUMO
Este trabalho busca compreender qual o espaço ocupado pelas mulheres na política de Santa
Cruz do Capibaribe, desde a emancipação da cidade, em 1953, até o último mandato
concluído em 2012. Para tanto, analisamos a presença das mulheres na Câmara Municipal e
no primeiro escalão do poder executivo municipal, e a área das secretarias chefiadas por
mulheres. Trabalhamos com a hipótese de que, embora as mulheres tenham muito
protagonismo na história econômica da cidade, elas ocuparam poucos espaços de poder e
decisão na política. Para levantar os dados, procedemos à análise dos documentos disponíveis
na Câmara Municipal e na Prefeitura Municipal, como também realizamos entrevistas com
pessoas que participaram e/ou acompanharam a política local em diferentes períodos.
Concluímos que a média de participação das mulheres em cargos eletivos em Santa Cruz está
abaixo da medíocre média nacional. No âmbito do poder executivo constatamos que foram
poucas mulheres que participaram do primeiro escalão, que a maioria comandou espaços da
política social como educação, saúde e assistência social e que parcela considerável destas
mulheres tem relação de parentesco com o chefe do executivo.

PALAVRAS-CHAVE: gênero, política, Santa Cruz do Capibaribe

ABSTRACT
This paper seeks to understand what the role women played in Santa Cruz do Capibaribe
politics and policy, since the emancipation of the city, in 1953, until the last mandate
completed in 2012. To this end, we analyze the presence of women at City Hall and the high-
level municipal government, besides the area of the State Department headed by women. The
hypothesis is that although women have much role in the city economics, they occupied few
positions of power and decision-making. We analyzed the documents available at City Hall
and at Municipality, as well as conducted interviews with people who participated and/or
followed local politics in different time. We conclude that the average participation of women
in elected office in Santa Cruz is below the national average. Within the executive branch, we
found that there were few women in the high-level government. Most of them led areas of
social policy such as education, health and social care and that a considerable number of these
women have family relationship with the chief executive.

KEYWORDS: gender, politics, Santa Cruz do Capibaribe

1
Graduada em Relações Internacionais (FIR/PE, 2007), Especialista em Gestão Pública (IFPE, 2015) e Mestra em
Ciência Política (UFPE, 2011). Contato: clarissacarvalho1@gmail.com
2
CARVALHO, Clarissa B. Análise da participação das mulheres na política de Santa Cruz do Capibaribe: sub-
representação, desvelo e parentesco [trabalho de conclusão de curso]. Santa Cruz do Capibaribe: Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco, Especialização em Gestão Pública, 2015.

1
1. Introdução

Analisar a participação das mulheres santa-cruzenses nos espaços de poder e decisão


da esfera pública municipal passa inexoravelmente pela compreensão de que a política é a
esfera de disputa e de decisão das questões coletivas, e pela problematização dos ideários da
república e de democracia que nos foram legados pelo Liberalismo 3.
Dada a histórica desigualdade de participação entre homens e mulheres no processo
político, “a fraca presença de mulheres nos espaços de tomada de decisão firmou-se como um
problema político de primeira grandeza” (MIGUEL, 2010, p. 25). Questionamo-nos, pois:
como as mulheres participam de espaços de poder e decisão na esfera política de Santa Cruz
do Capibaribe desde a emancipação da cidade até os dias atuais?
A democracia trouxe grande avanço para o povo: a faculdade de se auto-governar, seja
de forma direta ou através da escolha de representantes. A democracia, liberal e
representativa, estabeleceu que um pequeno grupo parlamentar fosse responsável por dar voz
a este povo; ao poder executivo caberia transformar em ações os interesses da maioria. A
matização dos diferentes segmentos desse povo nos revela, contudo, que o conceito de povo é
geral demais e não nos serve por sugerir uma homogeneização entre os diferentes grupos da
sociedade.
Ao analisar a partir de um recorte de gênero, raça, geração e sexualidade, as pessoas
que ocupam a maior parte dos espaços de poder e decisão na política formal e
institucionalizada no Brasil pertencem a um perfil muito similar: são homens brancos
heterossexuais. Indígenas, negros/as, gays, lésbicas, transexuais e as mulheres são minoria em
cargos eletivos assim como em cargos do primeiro escalão no poder executivo.
No que concerne à participação das mulheres na política, assunto ao qual nos
dedicaremos neste trabalho, o Brasil ainda tem muito que avançar. Além de recente, a
participação das mulheres nos espaços políticos é muito baixa, mesmo quando comparamos
com os demais países latino-americanos. Em 2013, O Ranking da União Interparlamentar
(IPU) analisou 188 países. O Brasil ocupou a posição 156ª no ranking de representação
feminina no Legislativo com apenas 8,6% das cadeiras sendo ocupada por mulheres.
Apesar de o voto feminino ter sido aprovado em 1932, só recentemente alguns
mecanismos foram criados para incentivar a candidatura de mulheres para as câmaras
legislativas, como a Lei nº 9.100 de 1995, a Lei nº 9.504 de 1997 e a Lei nº 12.034 de 2009

3
Ideário político ocidental originado nos séculos XVII e XVIII, que se desenvolveu baseado na proteção do
indivíduo, de sua liberdade e de seus bens. Inspirou a Revolução Gloriosa, a Independência Americana e a
Revolução Francesa.

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que ao fim e a cabo instituem que um dos gêneros não pode ocupar mais que 70% das
candidaturas para cargos do poder legislativo, tanto no nível municipal, estadual e federal.
Como a legislação se refere às candidaturas e não às pessoas eleitas, o seu impacto para
aumentar a quantidade de mulheres na política tem sido pouco sentido até agora (MIGUEL,
2010).
Se a bancada feminina nas Câmaras de Vereadores, nas Assembleias Legislativas e no
Congresso Federal não tem sido expressiva em quantidade, não muito diferente tem sido a
participação das mulheres nos cargos de chefia do poder executivo, nem nos cargos do
primeiro escalão do poder executivo. A nomeação da primeira ministra no Brasil, Esther
Figueiredo Ferraz, aconteceu somente em 1982.
A maior parte das pesquisas que tratam da mulher na política faz referência ao espaço
que as mulheres conseguem ocupar através de cargos eletivos. Contudo, o déficit democrático
causado pela baixa participação das mulheres coloca em questão também a relação
sociedade/Estado, tanto no que concerne a criação da agenda política, quanto para a
elaboração e implementação de políticas públicas.
Matos é categórica ao afirmar que este processo se retroalimenta na medida em que,
A pouca representação das mulheres na vida política já é um dado
histórico e seu estado subordinado na economia, na sociedade e na
família provavelmente não mudarão se não se expandir (e muito) uma
representação política efetivamente pluralista, e se a participação das
cidadãs brasileiras na construção de políticas públicas permanecer
limitada (2011, p. 207).

Quantitativamente, a participação de mulheres como ministras, secretárias estaduais e


secretárias municipais tem sido marginal frente aos espaços ocupados por homens. Há uma
literatura crescente que busca explicar as barreiras formais e informais com as quais as
mulheres se deparam para ocupar e permanecer nestes cargos (NÓBREGA E LOPES, 2007).
Além do pouco espaço que ocupam, os temas que tem sido coordenados por mulheres
guardam uma grande semelhança com o papel social do espaço doméstico, concentrando-se
em comissões e secretarias cujo foco é o cuidado das pessoas como a assistência social,
educação e saúde.

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2. Objetivos

Diante deste cenário e ciente que a mulher tem tido um papel fundamental na
economia santa-cruzense (SOUZA, 2012; MELO, 2011; LINDOSO, 2011; BEZERRA,
2013), buscamos analisar neste trabalho qual o espaço que tiveram as mulheres na política de
Santa Cruz do Capibaribe no legislativo e no executivo municipal desde 1953 até 2012 (data
da emancipação da cidade até o ano de conclusão do último mandato de prefeito e de
vereadores).
Nossa hipótese é que as mulheres de Santa Cruz do Capibaribe embora tenham muito
protagonismo na história econômica da cidade, tem tido uma presença limitada nos espaços
de poder e decisão na política, tanto no legislativo quanto no executivo. No legislativo,
comparamos quantitativamente os mandatos exercidos por mulheres e por homens. No
executivo, estudamos quais foram os setores que foram delegados à chefia de mulheres.
Para fazer o levantamento dos dados, recorremos ao site da Câmara Municipal, ao
Arquivo da Secretaria de Administração da Prefeitura Municipal e realizamos 06 entrevistas
semiestruturadas com pessoas que participaram da política santa-cruzense em diferentes
períodos. Após esta introdução, debruçamo-nos na revisão de literatura, a fim de compreender
como o ideário liberal, que embasa a teoria política ocidental, foi condescendente com a
discriminação das mulheres ao mesmo tempo em que clamava por liberdade e participação
popular. As leituras feministas que seguem, embasaram a discussão acerca da interface que há
nas dicotomias entre público versus privado e masculino versus feminino.
No intuito de situar o debate na realidade nacional e local, apresentamos dados que
apontam a situação crítica do Brasil quanto à participação das mulheres em cargos de
comando, seja no setor público ou no setor privado. Por fim, analisamos a predominância da
atuação de mulheres em espaços públicos que guardam uma estreita semelhança com as
atividades relacionadas com o espaço doméstico.
Por fim, ao confrontar as informações coletadas com a hipótese levantada, concluímos
que a política santa-cruzense tem sido uma esfera pública na qual poucas mulheres
participaram como protagonistas. Além de que, na maioria dos casos quando a mulher obteve
cargos de chefia, foi em espaços da política do cuidado como a secretaria de educação, saúde
e de assistência social, que se relaciona com o papel social que a sociedade machista reserva
para ela no espaço privado. Chamou nossa atenção durante a investigação, embora não fosse
uma questão de pesquisa a priori, a constância no grau de parentesco que essas mulheres tem
com os prefeitos (e em poucos casos, o vice-prefeito) que as nomearam como secretárias.

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3. Revisão de Literatura
Durante séculos, mulheres, negros e estrangeiros ficaram excluídos das esferas
políticas. E durante muito tempo, esta exclusão não foi compreendida como uma injustiça que
precisava ser sanada vide as argumentações dos clássicos contratualistas 4 Hobbes, Locke e
Rousseau acerca da participação das mulheres na política (MIGUEL, 2001).
As grandes transformações clamadas pelas revoluções burguesas do século XVII e
XVIII também não foram dirigidas às mulheres, salvo por algumas vozes marginais. Os
direitos humanos fundamentais tão bravamente defendidos contra o absolutismo dos
monarcas se conformaram, por um longo tempo, como direitos dos homens.
Seria necessário o movimento feminista surgir para reivindicar para as mulheres os
direitos conquistados para os homens. Surgido no século XIX, o movimento feminista
ganharia força no século XX com manifestações na Europa e nas Américas conclamando
direitos civis e, posteriormente, direitos políticos para as mulheres. Porém, a estrita divisão
social que relegava a mulher ao estrito espaço familiar e não a reconhecia como sujeito
autônomo impôs diversas condicionalidades à participação feminina no mundo público, no
que tange o acesso à educação, ao mercado formal de trabalho e aos direitos civis e políticos
(OLIVEIRA, 2013).
Até que as candidaturas de mulheres e a paridade na representação política fossem
vistas como uma questão de justiça e de democracia, ao menos no mundo ocidental, muitas
batalhas foram travadas. No início do século XXI, o empoderamento das mulheres continua a
ser um desafio. As mulheres têm aumentado substancialmente o seu nível de escolaridade e o
acesso ao mercado de trabalho formal, embora persistam as diferenças salariais e forte
presença em condições de trabalho mais precárias. Contudo, as barreiras para a participação
política têm diminuído ainda lentamente.
Os argumentos, inclusos das feministas, sobre a necessidade de as mulheres terem
acesso à educação e ao sufrágio, se alteraram no decorrer das décadas. Só a partir dos anos de
1960 que o movimento feminista passou a contestar incisivamente o conceito patriarcal de
que o papel social das mulheres era exclusivamente o cuidado do lar e de filhos/as (OKIN,
2008).
A separação tão comumente feita entre o público e o privado está intrinsecamente
ligada ao uma visão binária do mundo que polariza também o feminino/masculino,
político/doméstico, produção/reprodução, cultura/natureza, independência/dependência, onde

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Denomina-se contratualistas os teóricos que buscaram explicar o surgimento da sociedade e do Estado como
consequência da pactuação de um Contrato Social.

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o polo mais fraco está relacionado ao feminino. Baseada nas práticas sociais e culturais do
patriarcado, esta visão de mundo tem sido um dos pilares para o desenvolvimento da teoria
liberal, sobretudo a partir de Locke e permanece até a atualidade (OKIN, 2008). No mesmo
sentido, expõem Carloto e Mariano que a imbricação desta polaridade resulta que:

De um lado, tem-se a família como paradigma do privado, espaço da


vida doméstica, das relações interpessoais, lugar do feminino e da
subjetividade. De outro lado, tem-se o domínio do público, dos
interesses impessoais, portanto civis e universais, lugar da política e
dos negócios, arena exclusiva dos homens. Enquanto a esfera privada
implica uma relação de dependência, a esfera pública é marcada por
pressupostos igualitários que caracterizam a relação de cidadãos
independentes entre si (2010, p. 453).

Desta feita, e com o mundo organizado em polos dicotômicos que se relacionam, é fácil
concluir que: o mundo privado e doméstico está para a mulher na mesma medida em que o
mundo público e político está para o homem.
A análise de Okin sobre as ambiguidades que envolvem a dicotomia público versus
privado revelam que tanto o sentido de público não é fixo quanto a definição de privado não é
estendível a todos os indivíduos. Na divisão Estado/Sociedade, tendo em vista que o Estado é
público, a sociedade é considerada como esfera privada. Porém, quando classificamos
Sociedade/Família nesta mesma dicotomia (vida não-doméstica e vida doméstica), a
sociedade que era outrora privada, torna-se pública e a família é que se torna o reino do
privado.

A própria ideia de que a família é um reino privado que deve deter a interferência do
Estado precisa ser matizada; De acordo com Okin, quem tem garantida a privacidade por esta
estrutura é o homem e sua relação de controle com as demais pessoas que compõe a família; a
privacidade não é para todos os indivíduos de forma equânime.
Desse modo, a teoria política tem relegado a segunda ordem as diferenças sociais que
existem entre os homens e a as mulheres. E ao teorizar sobre o privado, toma a família como
harmônica e não a problematiza. Um dos pilares do ideário liberal tem sido, desde o século
XVII, a defesa dos direitos políticos e os direitos de privacidade dos indivíduos, porém toma
como pressuposto que estes indivíduos são adultos, chefes de família e masculinos (OKIN,
2008). Sobre a naturalização da desigualdade entre homens e mulheres, baseadas em suas
diferenças biológicas, Bourdieu esclarece que:

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As diferenças entre homens e mulheres, que se observa em diferentes
campos, se apresentam como esquemas de pensamento, de aplicação
universal, e se registram como diferenças de natureza, inscritas na
objetividade. Tais diferenças biológicas são transferidas para o campo
social, sendo neste naturalizadas. As diferenças são percebidas como
normal, natural e inevitável, sendo, portanto, legitimadas. Há,
portanto, uma naturalização da construção social que legitima a
histórica diferença e inferioridade da mulher perante o homem
(BOURDIEU apud OLIVEIRA, 2013, p. 4).

Destarte, a análise da participação política baseada no gênero é imprescindível para


uma real compreensão acerca dos avanços, desafios e barreiras relativos à participação das
mulheres na política. Adotamos a conceituação de gênero de Okin para quem o conceito de
gênero faz menção ao processo e consequências sociais da institucionalização das diferenças
sexuais.
Dantas e Morais (2010) apontam que o processo de socialização das meninas e das
mulheres tem se constituído como um grande obstáculo à participação delas na política, uma
vez que enfatizam e valorizam a fraqueza, a timidez e a vaidade, moderando suas
responsabilidades no que tange à moral e a política. A educação das meninas durante longo
período e até recentemente as preparava para o domínio das habilidades do lar, formando-as
para questões „compatíveis com a natureza feminina‟. Como afirmam Lopes e Nóbrega
(2007), o universo da política foi construído socialmente como pertencente ao domínio do
masculino e isto tem inibido a ambição das mulheres em relação à política.
Desde a conquista nacional do voto feminino em 1932, através do Decreto 21.076 do
Código Eleitoral Provisório no Governo de Getúlio Vargas, tem sido crescente a participação
das mulheres no cenário político, porém o ritmo lento que tem marcado a participação das
mulheres na política institucional tem sido alarmante. Algumas mulheres se candidataram,
poucas se elegeram e um número ainda menor conseguiu atingir postos do alto escalão. A
tônica da participação das mulheres na política eleitoral tem sido de sub-representação e a
presença de mulheres no comando de secretarias e ministérios tem sido minoritária.
No Relatório Social Watch 2012, sobre equidade de gênero em educação, mercado de
trabalho e empoderamento das mulheres, o Brasil está na posição 51, com a pior colocação
entre os países do Mercosul, apresentando a pior pontuação no quesito empoderamento das
mulheres. Dados da ONU de 2010 revelam que a média de participação das mulheres nas
Câmaras Baixas é de 19% no mundo. Os países nórdicos apresentam a melhor taxa de
participação com 44% e os Estados Árabes a pior média, com 9,2%. No Brasil, apesar dos
esforços dos movimentos feministas e da adoção de uma legislação específica para incentivar

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a participação das mulheres em cargos eletivos, a participação delas não alcança os 15%.
Mesmo com a adoção de ações afirmativas para fomentar a participação das mulheres na
disputa eleitoral, as cotas adotadas no Brasil não tem sido exitosas, ao menos no curto prazo,
para alterar o cenário político de sub-representação das mulheres (MIGUEL, 2010). Para o
fortalecimento da democracia é mister enfrentar a desigualdade de gênero na política.
Os resultados das eleições de 2009 apontaram que das 52.006 vagas de vereadores/as,
apenas 6.508 foram ocupadas por mulheres, correspondendo a 12,5% do total. O percentual
de cadeiras ocupadas pelas deputadas é ainda mais baixo. Das 1.028 cadeiras de deputados/as
estaduais, apenas 98 eram mulheres, com 9,5% de representação. Quanto aos 513
deputados/as federais, só 8,7% eram mulheres, ocupando 45 cadeiras. No Senado, as
mulheres são 12,3% da representação, tendo conquistado 10 cadeiras das 81 possíveis. A
representação no poder executivo não é muito diferente, pois das 5.530 prefeituras, apenas
506 eram chefiadas por mulheres, o que equivale a 9,1%. No que tange aos 26 cargos de
Governadores/as, 04 eram mulheres, correspondendo a 15,3% (OLIVEIRA, 2013).
Os muros que inibem a participação dos diferentes segmentos precisam ser
desnaturalizados, pois colocam em xeque o caráter não-democrático dos nossos sistemas
políticos. A legitimidade do processo democrático, sobretudo a democracia representativa,
encontra-se fincado na capacidade que os cidadãos e as cidadãs possuem em participar e
alterar as decisões coletivas. A cidadania não pode ficar restrita ao papel de eleitora. A
„interação argumentativa entre os sujeitos democráticos‟ é o pano de fundo da efetiva
participação popular, sem a qual os direitos fundamentais se encontram em situação de
fragilidade (DANTAS E MORAIS, 2010).
A dificuldade das mulheres conquistarem os mesmos espaços políticos que os homens
tem sido discutida especialmente no que refere aos cargos eletivos. Faz-senecessário analisar
também a baixa presença de mulheres em cargos políticos de poder e decisão do alto escalão
do poder executivo, sobre o qual nos detemos também em nossa pesquisa de campo.
Para lançar luzes sobre essa discussão, recorremos ao conceito de „teto de vidro‟
utilizado no âmbito organizacional para explicar as barreiras invisíveis com a quais as
mulheres se deparam para alcançar os postos mais altos nas organizações. Barreiras estas que
não se relacionam com suas capacidades pessoais ou com demandas inerentes ao trabalho,
mas com obstáculos que se impõem pelo simples feito de ser uma mulher. E o vidro deste teto
fica mais grosso na medida em que aumenta o posto na hierarquia.

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Conforme Crampton e Mishra,

[...] o maior obstáculo para que as mulheres alcancem postos de poder


deve-se a constrangimentos impostos a elas pela sociedade, pela
família e por elas mesmas. Muitos desses constrangimentos
configuram-se como estereótipos, mitos, ideias preconceituosas e
noções sem sustentação sobre a mulher. Por exemplo, mulheres são
frequentemente vistas como dependentes, frágeis, sem
competitividade e ambição, sensível, subjetiva e intuitiva (apud
OLIVEIRA, 2013, p. 7).

Assim, o enquadramento do feminino e a divisão sexual do trabalho tem sido uma


combinação nefasta para a entrada e ascensão das mulheres na esfera da vida não-doméstica.
E estas barreiras continuam erguidas àquelas mulheres que se destinam a participar da
atividade política.
O Grupo de Pesquisa de Direito e Gênero da Escola de Direito da Fundação Getúlio
Vargas coordenou uma pesquisa em 2013 com 73 mil cargos de 837 diferentes empresas de
capital aberto no país para analisar a participação das mulheres nos altos postos de comando
destas empresas. O estudo constatou que a presença das mulheres no alto escalão é de apenas
8% e que este dado não tem se alterado há 15 anos. É revelador também saber que apesar de
as mulheres terem maior escolaridade que seus colegas, entre 1997 e 2012, 48% das empresas
não contavam com nenhuma mulher em seu conselho de administração e 66,5% das empresas
não contava sequer com uma mulher na diretoria executiva.
Tanto no âmbito estatal como das empresas, a presença de mulheres em cargos de
poder e decisão tem sido escassa. Não obstante a primeira mulher ter sido eleita antes mesmo
de a legislação nacional autorizar o sufrágio feminino (vide a eleição em 1928 de Alzira
Soriano em Lages/RN) e Carlota Queirós ser eleita a primeira deputada federal em 1933, até a
chegada das próximas mulheres que conquistaram postos de comando, passaram-se
aproximadamente 50 anos.
Apenas na década de 1980 é que as mulheres voltariam a galgar degraus mais altos.
Em 1982 a primeira mulher ocuparia o cargo de Ministra, com Esther Figueiredo Ferraz
sendo nomeada Secretária de Educação. Em 1986, foi eleita em Fortaleza/CE, Maria Luiza
Fontanele, a primeira mulher prefeita de uma capital e Iolanda Fleming foi empossada no
Acre como a primeira governadora. Em 1989, Luiza Erundina tornou-se prefeita de São
Paulo, maior cidade do país. Só na década de 1990 é que o Senado contaria com a presença
das mulheres, com a vitória de Júnia Marise, por Minas Gerais, e Marluce Pinto, por Roraima.
Em 1994, no Maranhão, Roseana Sarney seria a primeira mulher eleita governadora.

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Após 78 anos depois de as mulheres conquistarem o direito nacional ao voto, Dilma
Rousseff foi eleita a primeira Presidente da República em 2010. Todavia, com toda a carga de
representação simbólica que foi a chegada de uma mulher ao mais alto posto político do país,
o mandato presidencial de Dilma Rousseff não significou a paridade de poder para as
mulheres nos postos de comando.
Interessante analisar a situação de paridade em que se encontram mulheres e homens
nos poderes executivo e judiciário nos cargos iniciais, em que o requisito para entrada é o
concurso público. Se compararmos o quadro dos ministérios e da presidência no que tange
aos servidores, veremos uma situação muito parelha para homens e mulheres, com as
mulheres servidoras ocupando 45,7% das vagas. Porém essa paridade se esvai quanto mais
alta a hierarquia. No segundo escalão do governo federal, de 310 postos de trabalho, 61 são
ocupados por mulheres, enquanto que no posto de ministros e ministras, em 2014, dos 39
ministros, apenas 08 eram mulheres (SOUSA, 2011).
Conforme pesquisa realizada por Nóbrega e Lopes (2007), nas funções de Ministério
da Justiça, de Defensoria Pública e nos cargos iniciais da magistratura há forte presença das
mulheres, porém ao olhar para os desembargadores e Ministros das Cortes de Justiça
voltamos a ver a predominância dos homens.
Oliveira (2013) analisou a presença das mulheres em cargos de Mesas Diretoras das
Assembleias estaduais entre 1993 e 2013 e descobriu que não passou de 10% a ocupação de
mulheres em cargo de presidente, vice-presidente ou secretaria. A diminuição das mulheres se
agrava novamente na medida em que aumenta a hierarquia dos cargos. De acordo com a
pesquisa, 62 mulheres ocuparam a Secretaria da Mesa, 43 ocuparam o cargo de Vice-
presidente e apenas 01 mulher tornou-se presidente da Mesa Diretora. Diante do exposto,
constatamos que a existência de um „teto de vidro‟ é uma constante para as mulheres, seja na
empresa privada ou no setor público.

4. Metodologia
Para compreender o grau de participação das mulheres na política institucional santa-
cruzense e quais os espaços que ocuparam, procedemos a uma pesquisa de natureza
exploratória e analítica, cujo método adotado foi o estudo de caso. A opção pelo estudo de
caso se deu em função da questão de pesquisa proposta, a saber, “Como as mulheres
participam de espaços de poder e decisão na esfera política de Santa Cruz do Capibaribe
desde a emancipação da cidade?”. O estudo de caso é indicado também porque nesta pesquisa

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não há necessidade de controle de eventos comportamentais e o foco da investigação se dá em
eventos contemporâneos. Desse modo, o estudo de caso possibilita uma investigação com
profundidade de um fato contemporâneo em seu contexto (YIN, 2010).
Para tanto, realizamos uma análise quantitativa e qualitativa dos dados. Procedemos a
um levantamento de informações e resgate histórico através da técnica de entrevistas
semiestruturadas com Zélia Rodrigues Mendes (irmã da primeira vereadora do município,
eleita no final da década de 1960), Augustinho Rufino (vice-prefeito e prefeito na década de
1980), Zilda Moraes (vereadora por 6 mandatos, nas décadas de 1980, 1990, e 2000), Carlos
Lisboa (Chefe de Gabinete do Prefeito de 2001 a 2012), José Oliveira de Gois e Alda Santana
da Costa (servidores efetivos da prefeitura).
Como o registro destas mulheres foi feito através de entrevistas e, em alguns casos,
não foi comprovado documentalmente, é possível que alguma informação tenha permanecido
oculta. Ao mesmo tempo em que agradeço aos entrevistados/as por compartilhar as
informações, assumo a responsabilidade por qualquer erro ou omissão que tenha este trabalho.
Adotamos como método de trabalho também a pesquisa bibliográfica e a análise
documental a partir dos documentos coletados no Arquivo da Secretaria de Administração
municipal e no site da Câmara Municipal. O referencial teórico proposto orientou a coleta de
informações, possibilitando a investigação sobre o espaço das mulheres no Legislativo e no
primeiro escalão do Executivo.
Com isso, propomo-nos a investigar se as mulheres chefiaram secretarias dos mais
diversos temas de políticas públicas ou se ficaram confinadas a comandar secretarias de maior
afinidade com as questões sociais como são as secretarias de assistência social, educação e
saúde. Levantamos o questionamento se o lugar que as mulheres ocupam na política é o
espelho do espaço que a divisão social e sexual em uma sociedade sexista e patriarcal define
para as mulheres no espaço privado, ou seja, o lugar do cuidado.
Assim, analisamos 15 mandatos de prefeitos, de 1953 a 2012, buscando identificar o
grau de paridade entre os homens e as mulheres eleitas para o legislativo municipal e os
setores de ocupação das mulheres nos cargos de chefia do primeiro escalão do poder
executivo municipal. Não está no escopo da pesquisa analisar os mandatos nem as políticas
implementadas por estas mulheres.

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5. Análises e Resultados
Ao analisar a presença das mulheres no Legislativo municipal, dos mandatos de 1955
até o de 2009, encontramos a presença constante de vereadoras nas legislaturas, mas em
número muito inferior a quantidade de homens. Das 13 legislaturas municipais que houveram
no intervalo estudado, foram eleitas vereadoras em 09 delas, correspondendo a 69% do total
das legislaturas.
Porém, quando avaliamos a paridade entre homens e mulheres, os números ficam
abaixo dos números nacionais. Dos 130 mandatos de vereadores exercidos entre 1955 e 2012,
apenas 10 foram exercidos por mulheres, o que equivale a apenas 7,79% dos mandatos.
Levando em consideração a ocorrência de reeleições, identificamos que 64 pessoas exerceram
a vereança, das quais 61 eram homens e apenas 03 eram mulheres (4,68%). Assim, em termos
absolutos, podemos dizer que menos que 5% da representação política santa-cruzense na
Câmara Municipal foi exercida por mulheres.
Ao analisar a história destas três mulheres, encontramos uma situação recorrente: a
existência de uma relação de parentesco e/ou familiar, de matrimônio ou filiação, com um
homem que já participava do cenário político local antes da entrada delas na política.
Entendemos como pertinente o registro dessa relação familiar, embora esta questão não
tivesse sido levantada no desenho da pesquisa.
A primeira vereadora de Santa Cruz do Capibaribe, Josefa Eloina Mendes, mais
conhecida como „Dona Nenzinha‟, foi eleita em 1969 e reeleita em 1973 e 1977, tendo
exercido a presidência da Câmara em 1977. Ela era esposa de João Deodato de Barros,
prefeito de Santa Cruz do Capibaribe entre 1954 e 1955, eleito vereador para o mandato de
1955 e Presidente da Câmara em 1956.
Zilda Moraes foi a segunda mulher a se tornar vereadora (nascida Josefa Barbosa de
Moraes Mena, alterou seu nome em cartório para Zilda). Com uma carreira política extensa,
Zilda Moraes foi a vereadora que exerceu a maior quantidade de mandatos dentro do período
pesquisado, junto com Francisco Ricardo Barboza Filho. Popularmente conhecida como „a
guerreira‟, elegeu-se pela primeira vez em 1983, reelegeu-se nos próximos 05 mandatos
(1988, 1993, 1997, 2001 e 2004) e foi Presidente da Câmara de Vereadores 03 vezes (1987,
1992 e 2003). O pai de Zilda Moraes, Lourival Ferreira Moraes, disputou em 1963, sem êxito,
o mandato de Prefeito contra Raymundo Aragão, e foi vereador por três mandatos (1955,
1960 e 1963).

12
A terceira mulher a se tornar vereadora foi Nautília Nailza Ramos, eleita em 1997,
reeleita e eleita Presidente da Câmara em 2001. Nailza Ramos é filha de Cyraco Ramos de
Lima, que havia sido vereador por 5 mandatos consecutivos (1969, 1973, 1977, 1983 e 1988).
Observamos também que as três mulheres que foram vereadoras foram reeleitas, pelo
menos para o mandato subsequente e as três exerceram a Presidência da Câmara.
A análise das mulheres que ocuparam postos no primeiro escalão do executivo
municipal e suas respectivas secretarias guarda algumas similaridades com as mulheres do
legislativo e nos revela uma linha tênue entre o papel da mulher na família (e em sua própria
família) e o espaço que ocuparam na política.
Assim como no legislativo, na maioria dos mandatos do poder executivo, havia
mulheres ocupando pastas no primeiro escalão. Dos 15 mandatos de prefeito, em apenas 03
não identificamos a presença de mulheres em cargos de poder e decisão.
A primeira mulher a ocupar um posto de chefia no primeiro escalão foi Ivone
Gonçalves, que coordenou de 1954 a 1968 as áreas de Educação, Administração e Governo
nos mandatos de João Deodato de Barros, Raimundo Francelino Aragão, Pedro da Silva
Neves e Raimundo Francelino Aragão. Ivone era sobrinha do prefeito Raimundo Francelino
Aragão.
Após a ausência das mulheres no primeiro escalão no primeiro governo do padre José
Pereira Assunção, mais conhecido como Padre Zuzinha e no mandato do prefeito Braz de
Lira, Marly Jordão assumiu a coordenação da Ação Social entre 1977 e 1982, ainda sem
secretaria, mas através da Legião Brasileira da Assistência. Marly Jordão era cunhada de
Salete Jordão, esposa do vice-prefeito à época, Augustinho Rufino.
No governo subsequente de Augustinho Rufino, de 1983 a 1988 tivemos duas
mulheres: Evanir Patriota Cordeiro chefiou a pasta de Educação e a primeira-dama Salete
Jordão tornou-se secretária da recém-criada Secretaria de Ação Social. Inaugura-se aqui o
ciclo de primeiras-damas a frente desta Secretaria.
Durante o mandato de Ernando Silvestre, dado a condição de solteiro do prefeito,
Creuza Rocha, que já trabalhava na prefeitura e não tinha vínculo familiar com o prefeito,
ficou responsável pela Secretaria de Ação Social de 1989 a 1992.
No período de 1993 a 1996, durante o mandato do prefeito Raimundo Francelino
Aragão Filho conhecido como Aragãozinho, várias mulheres participaram do primeiro
escalão. Janete Pereira Aragão, primeira-dama, foi secretária de Ação Social durante todo o
mandato. A Secretaria de Educação foi comandada por Socorro Maia de 1993 a 1994 e depois
por Terezinha Moraes Aragão, de 1995 a 1996, irmã do prefeito. Maria Lusiana Lins, prima

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do prefeito, foi Secretária de Saúde no ano de 1996. Foi neste governo, que pela primeira vez
uma mulher assumiu o comando de uma Secretaria que não era da área social. Coube a Telma
Oliveira Pereira, servidora concursada e sem relação de parentesco com o chefe do executivo,
ser Secretária de Finanças de 1995 a 1996.
A volta de Ernando Silvestre ao palácio municipal, de 1997 a 2000, agora já casado,
levaria sua esposa Celina Padilha Silvestre a ser responsável pela Secretaria de Ação Social.
Avanísia Maria de Souza assumiria a Secretaria de Educação durante todo o mandato e
Wedneide Oliveira estaria no comando da Saúde de 1998 a 2000.
Chegando à década de 2000, os governos de José Augusto Maia (2001-2004 e 2005-
2008) continuariam alocando mulheres nas pastas de Educação, Ação Social e Saúde. Leila
Gorayeb exerceu um curto mandato em 2001 na Secretária de Educação, sendo sucedida pela
cunhada do prefeito Socorro Maia, de 2001 até 2012 (final do governo Antônio Figueiroa,
sucessor de José Augusto Maia).
A sequência de primeiras-damas a frente da Ação Social foi interrompida em 2001.
Agora denominada Secretaria de Desenvolvimento e Planejamento Social, o setor foi chefiado
por Joselma Bezerra da Silva de 2001 a 2011 e depois por Ajoziene Maria Ramos que
terminou o mandato do prefeito Antônio Figueiroa.
Na Secretaria de Saúde, algumas mulheres participaram do primeiro escalão. Flora
Raquel Freitas coordenou de 2001 a 2003; Josete Gomes coordenou de janeiro a junho de
2005; Cristina Sette ficou como Secretária de Saúde de julho de 2005 até 2006, e Isalta Lopes
encerra o período coordenando a saúde de agosto de 2010 até o final de 2012.
Encerra este ciclo governamental, duas atuações que divergem do perfil das
nomeações anteriores. A nomeação de Patrícia Souto de Barros a frente da Secretaria de
Obras de 2003 a 2008; a volta de Telma Oliveira Pereira à Secretaria de Finanças, de 2009 a
abril de 2010, e a presença de Silvia Félix a frente da Secretaria de Finanças, de abril de 2010
a agosto de 2011.
Constatamos que 22 mulheres atuaram no primeiro escalão do executivo municipal,
exercendo 24 gestões de duração diversa. Verificamos que houve 06 mulheres Secretárias de
Educação (Socorro Maia ocupou o cargo duas vezes), 07 mulheres que chefiaram o setor de
Ação Social e 06 mulheres que foram Secretárias de Saúde. Apenas 03 mulheres chefiaram
secretarias que não pertencem a área social (Finanças e Obras). Desta feita, concluímos que
19 das 22 mulheres que acenderam ao primeiro escalão ficaram restritas a áreas
tradicionalmente relacionados a ideia do cuidado (86%).

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Identificamos ainda que foi na chefia das Secretarias de temas sociais (19 mulheres na
Saúde, Ação Social e Educação) que se concentraram as mulheres que apresentaram algum
tipo de relação familiar ou de parentesco com o chefe do executivo (8 mulheres - Ivone
Gonçalves, Terezinha Moraes Aragão Santiago, Marly Jordão, Salete Jordão, Janete Pereira
Aragão, Maria Lusiana Lins Aragão, Celina Padilha Silvestre e Socorro Maia ), representando
42% das mulheres nomeadas secretárias para algum destes temas.
A partir dos dados levantados pode-se perceber a confinamento das mulheres na
política às áreas espelhos do espaço doméstico e que se relacionam com o cuidado das
pessoas. A predominância das mulheres na política de Santa Cruz do Capibaribe nas áreas da
Saúde, Educação e Ação Social, salvo três exceções, demonstram o quão limitado é o espaço
para as mulheres participarem da política santa-cruzense.
Percebemos também a frágil distinção entre o público e o privado, onde a política é o
espaço público e a família o espaço privado; o pouco espaço que as mulheres tem ocupado no
executivo municipal e os setores que chefiaram as remetem majoritariamente ao papel que a
sociedade espera que desempenhem no âmbito privado. E mais, a relação familiar que
envolve parte considerável das mulheres que ocupam um cargo de poder e decisão, tanto no
legislativo quanto no executivo, faz-nos questionar o quão autônoma e independente consegue
ser a entrada destas mulheres na política.

6. Considerações Finais
A participação das mulheres reduzida substancialmente aos tópicos da política social
traz à tona a necessidade de desconstruir a política do desvelo ou o „pensamento maternal‟,
que Miguel (2001) tão bem aborda em seu artigo e que tão comumente tem justificado e
constrangido a participação das mulheres.
A política do desvelo defende que a participação das mulheres na política resultaria
em uma política mais solidária e mais afeita ao cuidado com o outro, uma vez que as
mulheres trariam consigo e aplicariam em seu trabalho político essa diferenciação moral e
social. Propõe também uma alteração da hierarquia do prestígio das atividades políticas, numa
tentativa de alterar o valor atribuído aos soft political issues, como são os temas de saúde,
meio ambiente, educação, assistência social e família e aos hard political issues, tais como
assuntos de segurança nacional, reforma política e reformas econômicas (DANTAS E
MORAIS, 2007).
Esta corrente teórica que parece perpassar a concepção dos gestores santa-cruzenses
tem se configurado em uma armadilha, pois ao mesmo tempo em que abre espaço para a

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participação no alto escalão, confina esta participação quase sempre às esferas públicas que a
sociedade patriarcal destina às mulheres no âmbito doméstico: o cuidado com o lar e a
família.
Findamos, pois, constatando que embora a dinâmica econômica santa-cruzense tenha
sido liderada e focada na força de trabalho feminina, a política se configurou com uma arena
preponderantemente masculina. A conquista das mulheres ao voto, ao direito a se candidatar e
de exercerem cargos de poder foi resultado de muita luta, principalmente do movimento
feminista. O desafio das mulheres santa-cruzenses persiste diante de uma sociedade que abriu
pouco espaço público a sua participação e ainda insiste em limitar o potencial político destas
mulheres a gestão dos temas sociais.

7. Referências Bibliográficas

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inserção social das mulheres e a baixa participação feminina nos espaços de poder: refazendo
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8., 2008, Florianópolis. Anais... (Seminário Temático 29: Relações de poder e de gênero).
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16
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17
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2012.

YIN, Robert K. Estudo de caso: planejamento de métodos. 4.ed. Porto Alegre: Bookman,
2010.

18
ANEXO I - Presença das mulheres no Primeiro Escalão do Executivo Municipal e no
Legislativo Municipal (1953-2012).

PREFEITO SECRETÁRIA VEREADORA


1953 – 1954
TEÓFANES FERRAZ TORRES FILHO
1954 – 1955 Ivone Gonçalves Educação, Governo e
JOÃO DEODATO DE BARROS Administração
29/12/1955 – 1959 Ivone Gonçalves Educação, Governo e
RAIMUNDO FRANCELINO Administração
ARAGÃO
29/12/1959 – 1963 Ivone Gonçalves Educação, Governo e
PEDRO DA SILVA NEVES Administração
Vice: José Gomes Ribeiro
29/12/1963 – 1968 Ivone Gonçalves Educação, Governo e
RAIMUNDO FRANCELINO Administração
ARAGÃO
Vice: José Gomes Ribeiro
01/04/1969 – 1972
PADRE ZUZINHA (JOSÉ PEREIRA Josefa Eloina de Barros
DE ASSUNÇÃO)
31/01/1973 – 1976
BRAZ DE LIRA Josefa Eloina De Barros
Vice: Fernandes Silvestre Da Silva
31/01/1977 – 1982
PADRE ZUZINHA Marli Jordão Ação Social – LBA Josefa Eloina De Barros
Vice: Augustinho Rufino
31/01/1983 – 1988 Evanir Patriota Educação Zilda Barbosa De
AUGUSTINHO RUFINO DE MELO Cordeiro Moraes Mena
Vice: Braz De Lira
Salete Jordão Ação Social

01/01/1989 – 1992 Creuza Rocha Ação Social Zilda Moraes


ERNANDO SILVESTRE DA SILVA
Vice: João Januário Nunes
01/01/1993 – 1996 Socorro Maia Educação Zilda Moraes
RAIMUNDO FRANCELINO 1993/1994
ARAGÃO FILHO
Vice: José Augusto Maia Terezinha Moraes Educação
Aragão

Janete Pereira Ação Social


Aragão

Maria Lusiana Lins Saúde


Aragão 1996

Telma Oliveira FINANÇAS


Pereira

01/01/1997 – 2000 Avanísia Maria De Educação Zilda Moraes


ERNANDO SILVESTRE DA SILVA Souza
Vice: José Elias Filho Nautília Nailza Ramos
Celina Padilha Ação Social

19
Silvestre

Wedneide Oliveira Saúde


1998/2000

01/01/2001 – 2004 Leila Gorayeb Educação Zilda Moraes


JOSÉ AUGUSTO MAIA 2001
Vice: ANTÔNIO FIGUEIROA DE
SIQUEIRA Socorro Maia Educação
2001/2012

Joselma Bezerra da Ação Social


Silva 20012011

Flora Raquel Saúde


Freitas 2001/2003

01/01/2005 – 2008 Socorro Maia Educação Zilda Moraes


JOSÉ AUGUSTO MAIA 2001/2012
Vice: JOSÉ ELIAS FILHO
Joselma Bezerra Ação Social
Da Silva 20012011

Josete Gomes – Saúde


Jan/jun 2005

Cristina Sette
07/2005 a 2006 Saúde

Patrícia Souto de
Barros OBRAS
2003 - 2008
01/01/2009 – 2012 Socorro Maia Educação
ANTÔNIO FIGUEIROA DE 2001/2012
SIQUEIRA
Vice: JOSÉ ELIAS FILHO Joselma Bezerra da Ação Social
Silva
2001- 2011

Ajoziene Maria Ação Social


Ramos 2012

Isalta Lopes Saúde


08/2010- 2012

Telma Oliveira FINANÇAS


Pereira
2009 – 04/2010

Silvia Félix
04/2010 - 08/2011 FINANÇAS

20

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