CAPÍTULO V

Formação de Professores para Docência

Online no Brasil: Considerações
sobre um Estudo de Caso

MARCO SILVA
Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ
mparangole@gmail.com

SHEILANE CILENTO
SENAC- Rio de Janeiro
shei.lane@hotmail.com

Introdução
A modalidade educacional online que emerge c rn d WI ,11 I'
recente, ganha centralidade no cenário da educação sup I i(11 I', 1'111
isso mesmo, demanda pesquisas acadêmicas capazes d )llI'I ti I I 11111
o novo desafio que se apresenta à gestão dos sistem I' 1'11',111111'
às teorizações pedagógicas consolidadas na sala de aul 1>1 (H,I 'I li 1,11
Na cultura digital ou cibercultura (Lemos, 2007, 20] ; I. "vy, 11)1) /,
Silva, 2008), isto é, no cenário baseado na relação simbiót icd 1'11111'
sociedade, cultura e novas tecnologias de base micr 'I '11 ()1I11 "
conectadas à internet avançada, não basta o professor l r ) , '.SP I'
saber usar computador, tablet e celular conectados à intern t, I 11.1
lecionar na modalidade online. Ele precisa desenvolver bcr '5
docentes específicos em diálogo pemanente com os saberes con
truídos na modalidade presencial. E necessário mais investim nto
em pesquisas capazes de propiciar o fortalecimento e a oferta d
formação para docência online. Os professores deverão ser cap z
de reinventar sua prática docente classicamente construída ntre
quatro pared . Pr i r-o, portanto, construir uma nova id ntid d
profission I '''1 .I/', di' til nd r às demandas sociai ,cullur is I

profi i n.lis ('111 'oIl1l()llld C'Cl1l1 pírito do no o t m: digital.

 APfTULO V • FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA DOCÊNCIA ONLINE NO BRASIL
P r reinventar-ss , é necessário que a educação possibilite
d i n micas pedagógicas capazes de su perar a simples transmissão
A
u distribuição de informações. Para isso) o professor deverá estar
inserido no contexto da cultura digital) desenvolvendo atitudes)
modos de pensamento e práticas comunicacionais interativas no
ciberespaço através de interfaces de autoria e de colaboração como
e-rnails, wikis, redes sociais) blogs, chats.
O uso instrumental das tecnologias digitais e da web resultam na
velha distribuição de informações e na administração burocrática
do feedback dos cursistas. Para superar esse prejuízo à educação
autêntica) o professor precisará operar com as tecnologias digitais
de informação e comunicação em sintonia com uma estrutura curri-
cular aberta) flexível e com um desenho de conteúdos hipertextual.
O hipertexto é um conjunto de nós conectados por expressões)
figuras) gráficos) sons) imagens) vídeos e por documentos em teia
digital. Os itens de informação não são ligados linearmente. Cada
um deles estende suas ligações de forma que se pode navegar no
hipertexto desenhando um caminho em rede) podendo cada nó
acionar toda a rede.
Espera-se que o docente) na cultura digital) saiba operar com a
informaç,ão em hipertexto e que saiba explorar as redes de comu-
nicação em interatividade) isto é) como articulação da emissão e da
recepção na construção da mensagem e do conhecimento. Espera-se
que ele saiba desenvolver uma pedagogia que contemple a dinâmica
hipertextual e interativa da web. Espera-se que ele saiba lançar
mão das potencialidades das interfaces online para proporcionar
um aprendizado significativo aos sujeitos culturalmente imersos
no novo cenário sociotécnico. Interfaces online são espaços de
interlocução, de encontro das faces na web, potencialmente intera-
tivos, que permitem a mediação interpessoal, compartilhamento)
socialização e construção colaborativa) ainda que na dispersão
geográfica dos interlocutores. Essas disposições comunicacionais
favoráveis à prática educacional dialógica e colab rt t iv d mandam
novos saberes docentes que podem ser d nvorvkios 11,1( rmação
continuada dos professores sint niz, cio' (!llll 01 1111/ ""1<..)' ocio-
técnica qu m rg m om 1111111"
d,,:II.!1 ('dlv.!, '!)()I),2 12 ),
CAPÍTULO V • FORMAÇÃO DE PROFESSORes PAlIA IIIH I NI IA (lNIINI NII IIIIA li,
O docente precisa atentar para as especifi id 1 I',' ultura
digital no que tange às suas práticas comunic i I1Ji ') I volvendo
e-rnctis, listas) blogs) jornalismo onüne, web am ) hats e novos
empreendimentos que aglutinam grupo d int r se (ciberci-
dades, games) software livre) ciberativisrno, art digital etc). Com
as possibilidades abertas pelo computador) verificamos novas
possibilidades de tratamento da informação e da comunicação com
infinitas articulações e caminhos a explorar) que vão exigir cada
vez mais o uso dos sentidos (visão) audição) tato e voz) permitindo
um maior envolvimento entre alunos e docentes. Temos) assim) a
possibilidade de um processo educativo em que o aluno pode cons-
truir e expressar sua autoria de forma participativa, compartilhando
com outros sujeitos) com base na troca interativa de saberes e na
inteligência coletiva (Silva) 2010; 2011)
O professor que não se mobilizou para operar em sala de aula com
ajuda dos meios rádio e tv, tem agora o desafio inarredável de se
apropriar do laptop) tablet e celular conectados à web. Os pnmeiros,
fundados na lógica da transmissão unidirecional massiva, são) por-
tanto) de mais fácil apropriação docente) porque operam no mesmo
paradigma comunicacional da sala de aula tradicional a pedagogia
da transmissão. Os meios digitais) mais complexos) fundados na
autoria do usuário e na lógica da interatividade, demandam do
professor nova postura comunicacional e superação da prevalência
da prática docente unidirecional. Seu desafio aumenta na sala de
aula onlíne, onde os ambientes de gestão) docência e aprendizagem
- plataforma de e-learning ou Learning Management Systems (LMS)
- possuem características muito próprias e diferentes daquelas que
conformam o ambiente físico da sala de aula presencial. A tran-
sição de um ambiente a outro não tem sido fácil para os docentes
excluídos digitais e/ou habituados à pedagogia da transmissão.
Isto revela a necessidade de formação específica que contemple o
conhecimento da cultura digital ou cibercultura, bem como) dos
conteúdos) técnicas e metodologias a serem utilizadas em sintonia
com o novo cenário sociotécnico (Silva) 2012b; 2012C) 2012d).
A pesqui qu dá origem a este texto dedicou-se a estudar os
desdobr l1i nto,' 1\ UIl urso online recente) destinado à formação
I
CAPiTULO V • FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA DOCÉNClA ONLINE
til' pl f sares para docência no "campus virtual" de uma univer-
SI 11 privada de grande porte situada no Brasil. Tomou como
nl>j.tiv geral investigar a atuação dos professores-cursistas nesse
111 s verificar seu aproveitamento traduzido em práticas de
do ên ia online nos cursos de graduação dessa universidade. Seus
obj Livos específicos são: a) identificar as mudanças ocorridas na
111 di ção da aprendizagem realizada por esses docentes a partir
urso; b) contrastar as concepções dos professores sobre a
ência online antes e depois do curso; e c) apontar sugestões
p r a melhoria da docência online a partir das falas dos docentes,
pós a realização do curso.
A composição deste texto traz inicialmente aspectos gerais do
contexto da pesquisa realizada e de seus procedimentos meto-
dológicos. Em seguida, trata dos itens principais do seu quadro
teórico, como, cultura digital, saberes docentes, docência online no
ensino superior e formação para docência online. Por fim, ao tratar
das conclusões da pesquisa, explicita os impasses e sucessos, bem
como, sugestões a favor da qualidade da formação de professores
para docência online.
Contexto da Pesquisa e seus Procedimentos
Metodológicos
o curso"Formação para docência online" investigado contou com
a participação de 334 docentes da universidade, distribuídos em dez
turmas de 33 professores-cursistas em cada. Teve a duração de 40h
online distribuídas em três meses, incluindo mais ioh presenciais
destinadas a dois encontros presenciais de cinco horas cada, um
no início para motivação e esclarecimentos sobre a formação e
outro no final para avaliação da formação. Após seu término, 100
docentes seriam escolhidos por indicação de seus coordenadores
e por seu desempenho no curso de formação, para compor o grupo
I Omitimos o nome da universidade qu patr in 110 '111.'( d f rmação
docente investigado, visando garantir ill I iv,l( liI"tll' til 1'. ',1'11'. 111 of
cursistas que, nquanto uj ires cld Jl" '1111 .r, 1:1'11111t111'1111' "11'11 I 'r lTl à
olicit cõ S d S J1 squis.idon: 11111111.111 11.t11'1I1 11111'1"1'
NO BRASIL
CAPiTULO V • FORMAÇÃO DE PROl" S 111 "AliA 11111I NI IA IINIINI NII ""A1I11.
que ministra todas as disciplinas onlin (I" Itll"oItl" in ituição,
I tuando como autores dos conteúdos esp í(i 'os 1 " li) disciplinas
specíficas ("conteudistas") e como d 'l1tl. 1,1,' r mas. Eles
trabalhariam reunidos em presença fí i 11) ir) 'tit ui ão, em regime
de io, 30 e 40 horas semanais, junt m 'nl ' m toda a equipe
responsável pela coordenação, gestão, impl m ntação e "suporte
de EAD". Esta característica particular f v r u a investigação in
loco sobre os objetivos pretendidos pel p squisa no pós-curso,
especificamente conviver com os docentes e, assim, criar um clima
propício para descobrir as esperadas mudanças na mediação da
aprendizagem que vinha correndo no "campus virtual" daquela
universidade.
O processo investigativo iniciado com um mergulho no curso
online destinado à formação de professores para a docência online,
valendo-se da observação detalhada das atuações dos professores-
, I
cursistas nas diversas interfaces da plataforma de e-learning da
universidade, aprofundou-se no pós curso tendo como base de
observação o retrato vivo dos docentes em serviço, por meio de
entrevista individual e em grupos focais. Tratou-se, portanto, de
uma pesquisa que buscou a compreensão do modus operandi na
mediação docente promovido por uma formação específica, em
uma instituição específica. Por estas características, entendeu-se
que a pesquisa constitui um estudo de caso.
O estudo de caso é uma metodologia específica para orientar
investigações de um caso individual, específico, bem delimitado,
contextualizado em tempo e lugar, que contempla uma procura
circunstanciada de informações Os estudos de caso mais comuns
visam à unidade, ou seja, têm caráter único, mas há também os
que se caracterizam por serem múltiplos, onde vários estudos são
realizados ao mesmo tempo, podendo se referir a indivíduos ou
instituições. Para o âmbito desta investigação, voltada para um
grupo de professores convidados à docência em uma instituição
de ensino superior, a partir de seu engajamento bem avaliado em
um curso específico promovido a convite da mesma instituição, e
res- que passou a exercer de forma específica a docência online nesta
1""lo1Vi'l

CAPiTULO V • FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA DOCtNCIA ONLlNE NO BRASIL
. in tituição, admitiu-se a configuração do estudo de caso intrínseco
u particular (André, 1989; Yin, 2014).
Para a coleta de dados, foram utilizados questionários antes e
I pois do curso, de forma a identificar na fala dos professores-
ursistas suas percepções a respeito da docência online e, possíveis
mudanças na mediação da aprendizagem construídas a partir do
urso. Foram colhidas e mapeadas as falas desses professores,
r gistradas em suas participações nas interfaces da plataforma de
e-learning do curso, bem como, em seus depoimentos e reflexões
durante os encontros presenciais ocorridos no início e no final do
curso. Durante o semestre letivo transcorrido imediatamente após
o curso de formação, foram realizadas entrevi tas individuais e
grupos focais com os professores-cursistas engajados na docência
de disciplinas das graduações no "campus virtual" da universidade.
Na ocasião, ainda principiante na oferta de disciplinas online,
respaldada pela legislação brasileira (Portaria n? 4.059/2004) que
permite, em graduações presenciais, a oferta de até 20% das dis-
ciplinas regulares na modalidade online, essa universidade exige
a presença física de cada docente no seu "campus virtual" para o
cumprimento da sua carga horária na plataforma de e-learning. Jus-
tificava essa posição com o argumento da formação continuada "em
serviço". Em suma, ter reunidos em um espaço físico os professores
que participaram do curso de formação, favoreceu a realização das
entrevistas individuais, os grupos focais e até mesmo acompanhar a
performance de alguns docentes operando com seus alunos na tela
do computador. Para a observação participante, os pesquisadores
puderam estar mais próximos da realidade institucional, captar
os conflitos e tensões cotidianas, unindo o objeto a seu contexto,
numa tentativa de identificar ali a sensibilidade e motivação para
as mudanças pretendidas (Queiroz et ai, 2007).
Saberes Docentes
o professor na modalidade online traz, n lur( 1m nt ,consigo
os saberes docentes adquiridos 01 n 1(' tI,1 pl ,íl i IX ncial.
Tardif (2007), um r n m s 1\li clcI," cln' ',,1111'1 (' <I nt s,
CAPÍTULO V • FORMAÇÃO DE PROI'~ UIO. PAliA 11111 f NI IA IINI.IN~ N UItA IL
não aborda a extensão do modus operandi pr . 1 i 1 na modali-
dade online, entretanto nos permite inf rir qu qu ndo o docente
não teve formação específica para operar n modalidade online,
ele certamente trará consigo a sua experiência construída. Para
esse autor, os saberes docentes, construídos ao longo da carreira
profissional levam o professor a aprender, progressivamente, a
dominar o ambiente em que trabalha. O saber docente consolida-se
essencialmente na prática pessoal da sala de aula, estando ligado
à pessoa, sua identidade, experiência de vida e trajetória profis-
sional. A pesquisa observou que o curso de formação investigado
atentou para essa abordagem e a tomou como quadro teórico, com
a finalidade de o diálogo dos seus saberes docentes consolidados
pela modalidade presencial e aqueles demandados pela modalidade
online
O trabalho docente demanda do professor uma pluralidade de
saberes, ou seja, o docente deve: a) ser capaz de assimilar uma
tradição pedagógica estabelecida em hábitos, rotinas e truques do
ofício; b) possuir uma competência cultural decorrente da cultura
comum e de saberes cotidianos que ele partilha com seus alunos;
c) ser capaz de discutir com eles; d) ser capaz de se exprimir como
uma certa autenticidade diante de seus alunos; e) deve ser capaz de
administrar estrategicamente uma classe para atingir objetivos de
aprendizagem; e f) deve ser capaz de identificar comportamentos
e de modificá-los em uma certa medida [.. ] (Tardif & Gauthier,
2001, p. 201).
O docente utiliza seus conhecimentos pessoais de forma perso-
nalizada. São os saberes que se baseiam na utilização de programas
e livros que usa em seu dia a dia. Há também os saberes que são
provenientes de sua formação escolar e de sua formação para o
magistério. E somado a estes, há também os saberes construídos
em diferentes lugares sociais, antes e depois de sua formação para
a docência. Assim, o "saber profissional está, de certo modo, na
confluência de várias fontes de saberes provenientes da história
de vida individual, da sociedade, da instituição escolar, dos outros
tores educativo ,d lugares de formação" (Tardif, 2007, p. 64).
P rtanto, - Si S :.lh 'I s qu s rvirão de base para o ensino e
 CAPiTULO V • FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA DOCtNCIA ONLlNE NO BRASIL CAPÍTULO V • FORMAÇÃODEPROFES !tI. l'AI4A ltill rNllAllNllNI NlllutA II

cujos fundamentos, segundo o autor, são existenciais sociais e emocionais, afetivos, pessoais e interp i 1 . n ste
pragmáticos (Quadro 1). ' fundamento, que o docente está compr u hi tória
de vida e com a forma como vai us r r nsinar. É
QUADRO 1- SABERES DOCENTES através de sua história, construída p r i d r I ções sociais,
Saberesdos docentes Fontes sociais pelas Comose integramno familiares e profissionais, que ele conduzir' su ções em vista
quaissão adquiridos trabalhodocente
de novas situações a que será submetido.
Saberes pessoais Família, ambiente História de vida e por
Os saberes docentes são sociais por se originarem de fontes
social, a educação no meio da socialização
sentido lato primária diversas e em tempos sociais distintos, como na infância, na escola,
Provenientes da forma Es co Ia pnrnaria
.,. e Pela formação e socia- na universidade e na formação profissional e contínua, sendo
ção escolar anterior secu n dáana,
. os estu d os lização pré-profissionais legitimados e produzidos pelos grupos sociais. Neste contexto, é
pós-secundárias não
especializados, etc. importante destacar que a relação do docente com seus saberes
Provenientes da forma Estabelecimentos Pela formação e sociali-
está sempre acompanhada de uma relação social e que o uso destes
ção para o magistério de formação para o zação profissionais nas saberes implica também relacionar-se com outros grupos, que, da
magistério, os estágio , instituições de formação mesma forma, são responsáveis por produzirem saberes sobre o
os cursos de formação de docentes.
continuada, etc, ensino.
Provenientes dos Utilização do ferra- Pela utilização das "fer- Os saberes docentes são pragmáticos por estarem profundamente
programas e livros mental dos docentes: ramentas" de trabalho e ligados ao ofício e, da mesma forma, ao docente. São, portanto, de
didáticos que utiliza em programas, livros sua adaptação às tarefas
sua prática
ordem prática e normativos, adequando-se às funções exercidas,
didáticos e de exercícios
fichas, etc. ' aos problemas que surgem e aos objetivos educacionais. Os saberes,
Provenientes de sua Prática da profi são na Pela prática do trabalho neste contexto, "são mobilizados e modelados no âmbito de inte-
experiência profis ional, instituição e na sala de e pela socialização rações entre o professor e os outros atares educacionais" (Tardif,
na sala de aula e na aula, a experiência dos profissional
instituição
2007, p. 106). Cabe ressaltar que a prática docente deve ter por
pares
objetivo o ser humano e, desta forma, para que seja bem sucedida,
Adaptado do quadro - Os saberes dos professores (Tardif, 2007, p. 63).
deve ser essencialmente interativa, importando aqui, a "dimensão
da linguagem e, mais amplamente, a dimensão comunicativa de
Os saberes docentes permitem o enfrentamento de problemas
suas interações com os aluno" (Tardif; Lessard, 2008, p. 248).
do dia a dia em uma sala de aula. Ensinar pressupõe aprender a
A atividade comunicacional, segundo os autores, diz respeito à
ensinar, ou sej~, dominar os saberes que são essenciais para a prá-
interação entre um ou mais sujeitos capazes de iniciar uma relação
tica docente. Sao esses saberes que servirão de base para o ensino
interpessoal, verbal ou não, e cujos agentes procuram estabelecer
não se limitando exclusivamente a conteúdos dependentes de um
um entendimento sobre determinada situação e a partir daí agir
conhecimento especializado, mas que dizem respeito a diferentes
conforme as estratégias de ação criadas em comum acordo.
objetos, questões e problemas que estão diretamente relacionados
Existenciais, sociais e pragmáticos os saberes docentes trazidos
com o trabalho docente.
da história de vida do professor em sala de aula presencial não
Os saberes docentes são existenciais na m dide m qu profes-
podem ser transpostos para a sala de aula on/ine sem um frequente
sorelaboraseupensarapartirdesu hi l'li,) I('vi<l.l, 11~ mente
diálogo com os saberes específicos demandados por esta. Contra
intelectualmente, mas I v n j '111 ('(lll'.Jdl'l.t1 .1<1 o,' 1, I ctos
a tendência d ITI 'r tr nsposição que se acomoda fatalmente na

CAPiTULO V • FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA DOCtNClA ONLINE
01) va modalidade, só mesmo a incansável atitude de investigação,
r mantida pelo professor, sobre o seu entorno sociotécnico e
obre sua atuação na plataforma de e-learning. Para não subutilizar
as potencialidades comunicacionais desta, para não subestimar
o perfil comunicacional dos cursistas, para não comprometer a
formação e a educação, será preciso promover o diálogo constante
dos saberes em jogo.
Será preciso que o sistema educacional em geral e cada univer-
sidade em particular se organize estruturalmente para investir
na formação continuada dos seus docentes, de maneira a mobi-
lizá-los para a nova sala aula feita à base de fóruns, chats , wikis ,
blogs, webconferências etc, inserindo-os na cultura digital e na
construção da expertise necessária à dinâmica interativa do ensino
online. Os cursos de formação para docência online são e senciais,
entretanto, a última palavra está com o professor-pesquisador
mobilizado para realizar o diálogo dos saberes, em sintonia com o
espírito do seu tempo.
Docência no Ensino Superior
A estrutura em que se organiza o ensino superior no Brasil, desde
seu início, privilegia o domínio de conhecimentos e experiências
profissionais, como requisitos suficientes para se lecionar em
cursos universitários (Masetto, 2008). Essa estrutura privilegia
a transmissão de conhecimentos e experiências de um professor
que sabe para um aluno que não sabe e não conhece". A crença é
a de que quem detém o conhecimento sabe, e, por conseguinte,
pode ensinar. Porém, há a crescente consciência de que o papel da
docência no ensino superior precisa mudar, tendo em vista que,
assim como em qualquer outra atividade profissional, os docentes
necessitam de uma formação própria e específica, que "não se
restringe a ter um diploma de bacharel, ou mesmo de mestre ou
doutor, ou ainda, apenas o exercício de uma profi são" (Masetto,
2003, p. 13). Falta-lhe a competência p d I r mediar a
aprendizagem.
CAPiTULO V o FORMAÇÃO DE PROFESSOIU, I'AIIA IUU I NI IA IINIINI NIIIlItA IL
NO BRASIL
O modus operandi da docência no en iI)OI'lH'IIOI s zu basica- I
mente o mesmo padrão consolidado n xp 'i i '11 i, di' nte de cada
professor desde sua escola básica. E I ,1dl ao, undo Vilarinho
(1984), pode ser assim identificado:) 1j tiv bá sico do ensino é
o domínio do conteúdo de estudo; nest dir o ensino é sinônimo
çã
de transmissão de conhecimentos; b) prof sor é o elemento mais
importante do processo, pois representa a autoridade máxima; c) o
aluno recebe e aceita passivamente o conteúdo; é preparado para a
obediência, subserviência e passividade; d) a matéria é um fim em
si mesma, sendo organizada segundo a lógica do professor para ser
memorizada pelo aluno; e) o método por excelência da docência é
a exposição oral, ou seja, tem cunho verbalista, transmissivo e se
projeta para a dimensão intelectual do aprendiz; f) as orientações
da aprendizagem são coletivas, desconsiderando-se as diferenças
individuais.
O ensino superior, e certamente também o escolar, requer
mudança na postura docente. O especialista que transmite seu
conhecimento precisa formar-se para atuar como mediador que
promove a construção da comunicação e do conhecimento, nas
modalidades presencial e online. Ainda segundo Masetto (2003), o
principal foco de mudança encontra-se na própria ação do profes-
sor, que deixa de ser o centro do processo e passa para um cenário
de aprendizagem em que o aprendiz (aqui compreendendo tanto o
professor como o aluno) ocupa a centralidade. preciso que docente J:
e aluno tornem-se parceiros e coparticipantes do mesmo processo.
Essa transformação leva à necessidade de uma formação em
que se repense as competências básicas para realização da docên-
cia no ensino superior. Juntamente com a competência pedagó-
gica e técnica, o professor deverá desenvolver: a) competências
sócio-afetivas que permitem estabelecer relações interpessoais
com os alunos e favorecer a criação de um ambiente propício à
aprendizagem; b) competências para organizar seu tempo, para
gerenciar as atividades e procedimentos do curso; e c) competên-
cias tecnológicas que orientem a inclusão do aluno na dinâmica
específica d rI t, f rma de e-learning. Igualmente relevante é a
atençã d 1,111() ,,111110, qu r j de forma individual ou em relação

CAPiTULO V • FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA DOCtNClA ONLINE NO BRASIL
a grupo, ou mesmo ao grupo como um todo. O termo competência
qui utilizado, apoia-se na descrição de Perrenoud e Thurler, cujo
ntendimento mais sintético diz respeito a "aptidão para enfrentar
um conjuntode situações análogas, mobilizando, de uma forma
carreta, rápida, pertinente e criativa, múltiplos recursos cognitivos:
aberes, capacidades, informações, valores, atitudes, esquemas de
p rcepção, de avaliação e de raciocínio" (Perrenoud; Thurler, apud
Masetto, 2003, p. 25).
Um dos novos desafios para o docente é assimilar que o aprendiz
em nosso tempo está, desde o berço, sintonizado com a "multi-
mídia, e quando lidam com texto, fazem-no mais facilmente com
o texto conectado através de links, de palavras-chave, o hiper-
texto", mais próximo "da sensibilidade deles, das suas formas
mais imediatas de compreensão" (Moran, 2007, p. 21). Assim, ele
precisará levar em consideração o mundo e a cultura do aprendiz,
para que possa atender aos anseias, curiosidades e questionamentos
destes, diminuindo a distância entre o mundo do professor (aqui
compreendendo também as instituições) e o mundo do aluno.
Na sociedade caracterizada pelo dinamismo, abertura, interati-
vidade e complexidade do cenário midiático, que requer processos
pedagógicos também dinâmicos, abertos, flexíveis e criativos, a
mediação docente precisará operar com fluência pelo dialógico e
participação, possibilitando ao aprendiz relacionar-se e posicionar-
se frente na cultura digital. Desta forma, o docente poderá, equipar
a sala de aula, com agenciamentos de comunicação capazes de
contemplar o perfil comunicacional do novo espectador, permitindo
que os alunos tenham interatividade efetiva, entendida, por sua
vez, como articulação viva da emissão-mensagem-recepção que
promove a construção colaborativa do conhecimento e da própria
comunicação.
O cenário midiático na era digital amplia os mercados cultu-
rais e é responsável pela expansão e criação de novos hábitos de
consumo, tendo no computador, tablete e c lu I r O v ículos que
possibilitam converter a mensagem em r xto, 1lI, im m, vídeo
numa linguagem acessív I t d . 1\ liglt.IiI/,H,oIO, « pr ssão
e a conv rgên i d rnídias eliglloll" I.IVIIII'II'III d ruuniput
CAPÍTULO V • FORMAÇÃODEPRorcs 0111 I'AI'A I"" li" IA"~41IN' NIlIIIIA "
armazenamento, reprodução, modific ,lO' dl',11 ti 11111,010 f1 il dos
dados. Há, portanto, uma mudança n 1 'll~oIO 1('( 'JlllVoI I ntido
único com o televisor para o modo int I 1 ivo I' 111\111ielil ' i nal que
é exigido pelas telas digitais conect d s ,1wel) (. ',1111 11,2008).
Imersos nesse e desenvoltos n n 11 i, ' ~r ndizes são
capazes de, ao mesmo tempo, as i iir c um ví I ,enviar uma
mensagem de texto para diferentes u uá ri nversar em tempo
real. Eles gostam de experimentar novos games, participar de redes
digitais online, visitar blogs e sites, compartilhar dados e conversar
via MSM, Hangout, WhatsApp, Skype ete. Essa expertise favorece
sua atuação na plataforma de e-leaming, ainda que aqui o nível
de engajamento exigido seja diferenciado, o que vai demandar do
professor sensibilidade, proximidade e desenvoltura digital seme-
lhante associadas aos saberes docentes específicos. No entanto,
os professores ainda estão se integrando à mídia digital e muitos
ainda o fazem com restrições. Nesse contexto, entender a evolução
da cultura audiovisual própria dos meios massa para a interativi-
dade oportunizada na cultura digital é fator preponderante para a
operação com o perfil comunicacional e cognitivo do aprendiz, bem
como, para a reinvenção da formação continuada para docência
online no ensino superior
A Formação para a Docência Online
Através de mediações criativas nas diversas interfaces de comu-
nicação e colaboração utilizadas, o curso "Formação para docência
online", investigado pela pesquisa que dá origem a este texto,
insistiu com os professores cursistas nos aspectos sintetizados
nos subtítulos anteriores: saberes docentes, docência no ensino II
superior e especificidades da docência online. Os questionários I
aplicados, as entrevistas e grupos focais realizados revelam que
os professores-cursistas que concluíram satisfatoriamente o curso I
de formação sentiram desafiados e motivados diante de três con-
teúdos de aprendizagem trabalhados: 1) ser docente na web é estar
pessoal e coletivamente engajado na autoria de um novo estilo de
mediaçã da I I '11 liz rn; 2) comunicar não é simplesmente
CAP!TULO V • FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA DOCÊNClA ONLINE
distribuir conteúdos de aprendizagem e cobrar o feedback solitário
do aluno, mas disponibilizar múltiplas disposições à intervenção
do interlocutor, que participa por meio da interação e interven-
ção na mensagem; e 3) o conhecimento é construído por meio de
interações, diálogos, transformações e enriquecimentos
professores e alunos, uma vez que ambos ensinam e aprendem
em colaboração, em coautoria.
O curso de formação enfatizou que não se trata de negar o ensino
tradicional, mas de dialogar com ele e, assim, redimensionar a
ação docente nas modalidades presencial e online. Os professores-
cursistas puderam experimentar aspectos essenciais da formação
operando com o desenho didático - arquitetura que articula con-
teúdos, atividades e avaliações - e com a mediação docente. As
exigências de qualidade mais enfatizadas no curso foram:
Hipertexto: é preciso contemplar o hipertexto que, em sua
forma não sequencial, permite 1) articular nas interfaces
conteúdos e atividades de aprendizagem em hipermídia, isto é,
em convergência de vários suportes midiáticos abertos a novos
links e agregações e de várias linguagens (som, texto, imagens,
vídeo, mapas); 2) transformar a leitura em escritura através de
conexões autorais em rede e em diversos modos de navegar.
Mediação docente interativa: é preciso internalizar que mediar
a aprendizagem não é meramente distribuir conteúdos e ati-
vidades de aprendizagem, tirar dúvidas e cobrar o feedback dos
cursistas, mas potencializar suas autorias colaborativas nas
interfaces, seja formulando problemas, provocando inter-
rogações, coordenando grupos de trabalho, sistematizando
experiências e conhecimentos construídos com base no diálogo
entre interlocutores.
Avaliação formativa e contínua é preciso superar o modelo de
avaliação da aprendizagem baseada no exame pontual solitário,
em favor da avaliação formativa e contínua, que opera nas
interfaces de comunicação e colaboração com ba m critérios,
indicadores e instrumentos previam n t n f'oci" I coletiva-
mente como competent s p r, rosult.u 1'111 ,,,ti to qu lit tivo
na comunic ção tod -I lo. ,11.1 ,IPIl'llIlll. 1)'1'1111' 11.1 íorm ção.
NO BRASIL CAP!TULO V • FORMAÇÃO DE PROFESS IlI: !'AIIA 11111 I NI IA IINIINI NO OllAS11.
A análise da atuação dos professores- ur 'j 'ld . qu ncluíram
atisfatoriamente o curso "Formação par d ';, i online" permite
oncluir que eles tiveram oportunidad d viv n iar desafios da
decência e da aprendizagem na cultura digit I, diante novo aluno
entre exigir deles um novo modus operandi. Foram alertados insisten-
temente para o risco de serem atropelados pela força do hábito
edimentado no saber docente que faz reproduzir nas aulas online
os mesmos métodos já questionados em suas aulas presenciais,
resultando na sua insatisfação existencial e profissional, bem
como, na formação e educação dos cursistas. E compreenderam que
o docente pode e deve mobilizar os seus alunos para a conquista
do direito de se situarem na cultura digital, de dialogar com ela
e de criticar seus usos em consumos banais e inconsequentes,
construindo, a partir da interlocução competente na plataforma
de e-learning, a cibercidadania que diz respeito à construção da
democracia participativa no ciberespaço.
Conclusões
Estas conclusões vêm finalizar o tratamento dos dados da pes-
quisa que investigou o curso "Formação para docência online" e o
pós-curso, isto é, a atuação docente dos professores-cursistas no
"campus virtual" da sua universidade durante o semestre letivo
imediatamente depois desse curso. Até aqui, o texto explorou os
principais itens do quadro teórico adotado pelo curso: cultura
digital, saberes docentes, decência no ensino superior e formação
para docência online. Ao fazê-lo, assume sua relevância para o
tratamento do tema investigado, presta contas sobre os temas
estudados no curso e cria expectativas sobre seu impacto na atuação
dos professores-cursistas no curso, bem como, sobre seu apro-
veitamento traduzido em novas práticas de decência online Em
seguida, o tratamento do impacto e do aproveitamento diz respeito
à prestação de contas dos objetivos da pesquisa apresentados na
introdução.
Os dep im I t s do professores-cursistas no início do curso
d form ão I ('V!'I.llll o I rfil típico do docente despreparado para

CAPITULO V • FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA DOCtNCIA ONLINE NO BRASIL
a modalidade online. Três de suas expressões revelam o mal-es-
tar comum a muitos deles: "sinto falta da presença do aluno";
"somente o contato com suas fotografias no ambiente virtual
não satisfaz'.'j "não tenho segurança de que meus alunos estão
aprendendo efetivamente os conteúdos, já que não posso olhar o
olhar deles e vigiar de perto suas avaliações".
Essa inquietação revela, de imediato, que esses professores subu-
tilizavam as interfaces de interlocução e colaboração da plataforma
de e-Iearning. Revela que eles não sabiam construir o olho-no-olho
possível nos fóruns ou chats. Certamente que a intensidade do
presencial é insubstituível, entretanto é preciso considerar que
muitas vezes, no presencia I, nosso olhar pode ser extremamente
superficial e distante, como um olhar que não vê. Ao passo que,
em uma clássica correspondência via cartas em papel pode-se
viver a experiência de uma profunda proximidade. A inquietação
em busca do controle dos alunos através olhar e do vigiar físicos é
herdeira da sala de aula presencial e revela, por sua vez, o desafio da
formação de professores que passa necessariamente pela construção
da inclusão cibercultural capaz de permitir o estar-junto online,
mais intenso que aquele mais comum nas redes sociais da web. O
professor que leciona online precisará criar uma atmosfera amigável
e de proximidade entre os cursistas, que possibilite a convivência
de interlocutores em comunidade de comunicação e aprendizagem.
Precisará motivá-los para estabelecer parcerias e colaboração, bases
essenciais para a construção coletiva do conhecimento. De resto,
o mesmo vale para a sala de aula presencial, quando se pretende
educação autêntica.
O questionário aplicado no início do curso revela ainda que os
docentes, responsáveis por disciplinas online na universidade há
um ou dois anos, encontravam-se em diversas dificuldades. A
mediação interpessoal, a troca e o compartilhamento entre cursistas
era insipiente. Suas disciplinas eram oferecidas com conteúdos e
atividades de aprendizagem para o trabalho soli tá ri do cursistas ,
na lógica da atuação tarefeira e na au ên i( I, 111'cli, ~ docente.
O e-maü cadastrado na pl tafor m.i (',.I IIII('II.\( (' 11(i utili-
zadapeloprof sor( %)",1,,('1\(.111111111.111'111111,11
.u ivid d
CAPÍTULO V • FORMAÇÃODEPROn:S OUI I'AIIA 11111 t liA IINIINI NII HtA 11
tirar dúvidas, lembrar tarefas pendent S (' di', '1ItI.Id.l di: .iplina
O fórum é a segunda interface mais LI 1,1I 'Iw, do '('Ill \' (35%)·
Em sua maioria, na lógica da interaçã s 111.u : i( li I"c.;1 ,i to é, há
um enunciado e diversas mensagen indivi 11I,1isI 'f r ntes a ele.
Não é costumeiro cursista conversar 1 UIsi l . Interlocução,
colaboração, construção coletiva do c nh i nt é raridade. E,
o que é mais grave: as mensagens se av lurn m m resposta a um
enunciado e o professor nem sempre apar ce para se posicionar
a respeito. O efeito disso é a diminuição das participações dos
cursistas nos fóruns e a subutilização de uma potente interface
para o exercício da mediação docente. Quanto ao chat, 40% dos
docentes não utilizam essa interface de comunicação síncrona, onde
poderiam estar em tempo real com toda a turma ou com grupos
isolados E há ainda o "diário de bordo", ferramenta onde cada aluno
regista sua itinerância, suas reflexões pessoais, podendo tornar-se
interface, quando aberta aos outros cursistas para leitura, interlo-
cução e cocriação dos seus conteúdos. Apenas 39% dos professores
lançam mão desse quarto recurso de registro e interatividade
A justificativa mais citada pelos professores-cursistas para a
baixa apropriação e utilização desses recursos de interatividade
disponíveis na plataforma de e-learning é a ocupação excessiva à
frente de turmas numerosas. De fato, muitas turmas numerosas
resultam em um volume de postagens nas interfaces que inviabiliza
a mediação docente. Os professores com dez horas/aula semanais
eram responsáveis por cinco turmas que totalizavam trezentos
alunos. Com trinta horas/aula, quinze turmas e até novecentos
alunos. E, os professores com carga horária semanal de quarenta
horas eram responsáveis por vinte turmas e mil e duzentos alunos.
Um absurdo! E, o maior contrasenso apareceu na argumentação da
direção do "campus virtual" para o exagerado numero de cursistas
em sala de aula online: "poucos alunos participam".
A segunda justificativa mais recorrente é a inabilidade do docente
para operar com os recursos da plataforma de e-learning, cuja
funcionalidade, inclusive decisões sobre abertura e fechamento de
fóruns, chats u ju t s nos conteúdos de aprendizagem, encon-
trava- na: 11,10,' 1,1 quip técnica responsável p lo "campus
 CAPÍTULO V • FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA DOCtNCIA ONLlNE NO BRASIL

CAPÍTULOV-FORMAÇÃOOCPR II ~'UI l'Alj~I!lU,~114I1NIIfH .""lfA 11

virtual" da universidade, que) assoberbada com muitas demandas

dos professores) atrasava nas soluções) gerando um acúmulo de comunicacional muito precisa. Tod I I 'VI""II'IIII' .u ut r] <id. '11
prejuízos para a mediação docente e para a aprendizagem. reuniões com a coordenação da form .io I,,!tll'/'I',
Provocar situações de inquietaçã I i 1(1 11"
Enfrentar e superar as fragilidades da mediação docente tornou-
se) portanto) foco principal do curso "Formação para docência Promover ocasiões que despertem 0111'('111 lo ('llIlt'11 rn nto
online diante de situações que prov lU I1lI ('<H.; \. individuais
online". Os professores-cursistas foram estimulados a trazer para
e grupais.
o debate suas dificuldades explicitadas ou não no questionário
inicial. A formação deu o exemplo: dividiu os 334 em dez turmas Encorajar esforços no sentido da tr n tr l d os envol-
vidos) juntamente com a definição conjunt de atitudes de
com pouco mais de 30 docentes cada e lançou mão da mesma
respeito à diversidade e à solidariedade;
plataforma de e=tearnine tendo em vista) inclusive) a formação
para seu uso adequado. Incentivar a participação dos cursistas na resolução de proble-
mas apresentados) de forma autônoma e cooperativa.
O tema mais trabalhado) a partir da confluência dos itens do
Elaborar problemas que convoquem os cursistas a apresen.tar)
quadro teórico da pesquisa) foi a mediação docente baseada na
defender e) se necessário) reformular seus pontos de vista
prática da colaboração e interatividade) como superação da interação
constantemente.
sem articulação (Figura 1) Dez professores-mediadores foram
Formular problemas voltados para o desenvolvimento de
convidados para atuar na formação. Todos hábeis conhecedores
competências que possibilitem ao aprendiz ressignificar ideias)
de como promover a superação da interação sem articulação Cada
conceitos e procedimentos.
um) dedicado a uma única turma com pouco mais de trinta profes-
Implementar situações de aprendizagem que c~nsiderem
s~res-cursistas) mostrou na prática como desenvolver colaboração
e rnteratIvldade nas interfaces forum e chat. as experiências) os conhecimentos e as expectativas que os
estudantes já trazem consigo. _
INTERAÇÃO SEM ARTICULAÇÃO
OLABORAÇÃO, fNTERATIVIDADE Desenvolver atividades que propiciem não só a livre expressao,
o confronto de ideias e a colaboração entre os estudantes) mas
que permitam) também) o aguçamento da observação e da
interpretação das atitudes dos atares envolvidos. _ .
Mensagem 1
Responder às pastagens dos cursistas em até 24h) nao mais.

Mensagem 2 A pesquisa verificou que estas ações promoveram a construção

do aprendizado sobre como superar modus operandi co:n o qual os
professores-cursistas estavam habituados. Na fase pos-curso) o
questionário) as entrevistas individuais e os grupos focais r~velaram
Mensagem 3
que os professores-cursistas que concluiram satlsfat~nam:nte
Fig. 1- Modelos de interação no fórum e no chat a formação tornaram-se críticos da interação sem articulação e
se entusiasmaram com salto de qualidade possível baseado na
Os professores-docentes do cur I 01 11ldÇdO pu ram em colaboração e na interatividade (Quadro 2).
prática um conjunto de açõe vi. ndo d (I í.r, tiO rI(' (/111.1 ,lmbiAncia

I ••
\MI
09
 CAPiTULO V • FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA DOC~NClA ONLlNE NO BRASIL
CAPÍTULO V • FORMAÇÃO DE PRorc Ou, ,'AliA tuu I N' IA IlIIINI NIl "" A "

QUADRO 2 - MODELOS DE MEDIAÇÃO DOCENTE

poderem fazer o curso com mais calm , O/li /t'IIIII" , /lIi1i' til 'I l
lnteração sem articulação Colaboração e
interatividade
maiores participações nos fóruns e n ' /1(1/\, ""0 1""
'011' gui-
Mediação docente I m cumprir os prazos de postag m '111 f()J III'S, 10/ .x mplo ".
Instrucionista, transmis- Construcionista, interacio-
nas in terfaces . siva e tarefista. A apren- nista e colaborativa. Rela- Os professores-docentes manifest r 111 /(I."P(liIO ( tipo de
da plataforma de dizagem é centrada na ções horizontais abertas à justificativa, tendo em vista que, dur nt íor macào, P rmaneceu
e-learning atuação sol itária do cursista colaboração e à coautoria. o regime de io, 30 e 40 horas/aula, c rn I urm que totalizam
e nas relações assimétricas, O docente é um proponente
verticais: autor/emissor da formação. ]untamen te respectivamente 300,900 e 1200 alun i nt desse quadro
separado de aprendiz/ com os cursistas promove sdrúxulo, praticamente todos revelar rn urpresa e admiração
receptor. Cursista pouco a cocriação da comunica- diante da força de vontade dos 25% que tiveram maior aproveita-
interage com cursista. ção e do conhecimento.
Vinculação um-todos Vinculação todos-todo
mento. Ainda assim, se engajaram no que ficou conhecido como
separados pela distância em pre ença "virtual" nas "operações resgate", lançando mão de expedientes como "chats
físico-geográfica interfaces. queijos e vinhos" para encontros festivos, vídeos de motivação e
-mails personalizados.
~em todos os professores-cursistas concluíram a formação Nas avaliações negativas feitas pelos professores-cursistas à
satisfatortamente. Os critérios de avaliação do aproveitamento formação, apareceram outras explicações para a média e baixa
no curso de formação foram definidos em comum acordo com participações. Para alguns, houve um excesso de leituras propos-
os professores-docentes e os profes ores-cursistas, com base tas nas primeiras aulas que, somadas aos afazeres docentes no
na participação quantitativa e qualitativa nas interfaces fórum "campus virtual", prejudicam a aproveitamento. Outros criticaram
chat, diário de bordo e e-mail A participação de maior qualidade a instabilidade da plataforma de e-Iearning, alegando que não
foi aSSllTIconsiderada tendo em vista a maior correspondência conseguiram acessar, navegar, operar com suas interfaces em finais
com a mediação docente baseada na colaboração e interatividade de semana quando esteve "fora do ar" para manutenção. Por último,
(Figura 1). Definiu-se como maior aproveitamento aquele garantido aqueles que criticaram sua baixa funcionalidade ou usabilidade e
mediante participação acima de 70%; aproveitamento mediano, de não puderam contar com o helpdesck de tratar de questões de
50 a 70%; e menor aproveitamento, de 20 a 49%. Assim, somente ordem prática e técnicas referente ao uso de chats, fóruns e diário
25% dos professores-cursistas teve avaliação máxima 14% teve de bordo. Essa queixa surpreendeu os professores-docentes, uma
avaliação mediana e 42% teve menor aproveitamento. Dos 334 vez que os cursistas eram docentes online na instituição há pelo
professores inscritos, 19% não acessou uma vez sequer o curso de menos dois semestres. Ainda assim, o passo a passo para o uso
formação das interfaces do ambiente fora oferecido no início da formação.
As justi~icativas para as participações mediana e menor, que Quanto aos docentes que não acessaram o curso, 19% ou 63 ins-
somadas sao 56%, variam em torno de diversas queixas que podem critos, à primeira vista parece um numero bastante elevado, tendo
ser resumidas na fala de um dos professores-cursistas: "nas con- em vista que a instituição ofereceu o curso gratuitamente e online,
versas de corredores, tenho constatado que nós, agora alunos, não com apenas dois encontros presenciais. Entretanto, considerando
estamos conseguindo acompanhar as ativid cI I r po tas, pois, que muitos foram inscritos como observadores da instituição, outros
como professores, temos muitas I rig. ()(I, IIII~ '/lI serem da equipe técnica do "campus virtual" que acompanharam de perto
cumpridas também. Escuto rnuit s, ((l//II/I'II, " 1.11/1('111ir P r não a funcionalidad da plataforma de e-Iearning e, ainda aqueles
 ,1
I A_li 11111 v • I OIlMAÇAO DE PROFESSORES PARA DOCÊNCIA ONLlNE NO BRASIL
CAPiTULO V • FORMAÇÃO De PR I es '0111 I "AliA lIor' N( IA lINIINI, N ORASIL

inscritos muito depois do início do curso e que não encorajaram a

"pegar o bonde andando" .
Referências
. O a~~oveitamento _traduzido em novas práticas no "campus André, M E. D. (1989). Estudo de Caso: s u p t ncial na educação.
Virtual ou em sugestoes de melhoria para a docência online apa- Cadernos de Pesquisa, 49, 51-54·
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satisfatoriamente o curso de formação. No pós-curso, através temporânea. 3a ed. Porto Alegre: Sulina.
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. , acusaram
entusiasmados uma melhoria substancial em sua desenvoltura ciberdemocracia planetária. São Paulo: Paulus.
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Ressaltaram as trocas realizadas, os relatos de experiências e as tário. São Paulo: Sumrnus.
discussões ocorridas nos diversos fóruns temáticos, demonstrando Masetto, M. 1. (2007) Mediação Pedagógica e o uso da tecnologia.
que a interatividade é possível quando ocorre horizontalidade In Moran, J.M., Masetto, M.T., & Behrens, M.A. (orgs.). Novas
proximidade e cocriação. ' tecnologias e mediação pedagógica. 13a ed.
Campinas, SP Papirus .
. Os fórun~ inspirados no modus operandi da colaboração e interati- Masetto, M. 1. (2008). Docência na Universidade. Campinas, SP:
vidade ~otlvaram os cursistas à mediação docente capaz de superar Papirus.
a reativídade burocrática e solitária diante de um enunciado. Os Moran, JM. (2007). Ensino e aprendizagem inovadores com tecno-
chats, reunindo pequenos grupos, em horários alternativos além logias audiovisuais e telemáticas. In Moran, JM., Masetto, M.T.,
de possibilitar a vivência da multidirecionalidade em tempo' real e & Behrens, MA (orgs.) Novas tecnologias e mediação pedagógica.
momentos pontuais para tomada de decisões ou esclarecimentos 13aed. Campinas, P: Papirus.
,
passaram a ser adotados como espaços privilegiados para cons- Morin, E. (2000) Os sete saberes necessários à educação do futuro. 2a
trução de sentimento de pertencimento e vínculos de afetividade. Ed. São Paulo Cortez.
, A formação mostrou na prática que a mediação docente nos Perrenoud, P, & Thurler, M. (2003). As competências para ensinar
foruns e chats oferece diretrizes claras para a atuação dos cursistas no século XXI. In Masetto, M. (org.). Competência Pedagógica do
. . ,
incentiva e acompanha os trabalhos em grupos, estimula e orienta Professor Universitário. São Paulo: Summus.
a cooperação na apresentação de projetas, nas tarefas desafiadoras, Queiroz, D.T., Vall, J, Souza, A., & Vieira, N. (2007). Observação
nos estudos de caso, respeita os diferentes talentos e maneiras participante na pesquisa qualitativa conceitos e aplicações na
de aprender, valoriza as participações, resgata pastagens dos área da saúde. Revista Enfermagem, 15(2), 273-83.
cursistas e as torna proposições de aprendizagem, incentiva que Santaella, L (2008) Culturas e Artes do Pós-Humano: da cultura das
os alunos escolham os tópicos abordados nos projetas e que surjam mídias à cibercultura. São Paulo: Paulus.
Silva, M. (2005) Educación interactiva: ensenanza y aprendizaje pre-
diferentes
com a participação
- deatrva
pontos
..
vista e, por fim ou por princípio, estabelece
.
e coautoral dos cursistas, os critérios de
, sencial y online. Barcelona: Gedisa.
funcionamento do curso, isto é, da avaliação d pr ndizagem Silva, M. (2008). Cibercultura e educação: a comunicação na sala de
dos conteúdos e atividades de aprendiz rn, 1, r rrnação e da aula presencial e online. Revista Famecos, 3, 3-15.
própria mediação. Silva, M. (2005). D nho didático contribuições para a pesquisa
sobre forma .1O (I \ pr f ssores para docência online. In Silva, M.,