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DEVIR LIVRARIA

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MUITO ALÉM DOS QUADRINHOS © 2009 Waldomiro Vergueiro e


Paulo Ramos (organizadores), Agda Dias Baeta, Gêisa F. D' Oliveira, Alexan-
dre Barbosa, T úlio Vilela, Eloar Guazelli, Ãngela Rama e Fernando Mafra (ar-
ticulistas). Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou
parcial do conteúdo desta obra, por quaisquer meios existentes ou que venham
a ser criados no futuro, sem a autorização prévia por escrito do autor e/ou
editores, exceto para fins de divulgação. As imagens deste livro foram uti-
lizadas apenas para ilustrar os textos dos autores. Cada uma delas pertence ao
seu respectivo detentor de direitos autorais.

Todos os direitos para a língua portuguesa reservados


à DEVIR Livraria Lrda.

1a edição: Setembro de 2009

ISBN: 978-85-7532-387-8

Dados Internacionais de
Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do livro, SP, Brasil)

Muito além dos quadrinhos: análise e reflexões sobre


a 9a arte / Waldomiro Vergueiro, Paulo Ramos,
(organizadorcs) . -- São Paulo: Devir, 2009.

Vários autores
Vários ilustradores

1. Histórias em quadrinhos - Crítica e


interpretação I. Vcrguciro, Valdomiro.
lI. Ramos, Paulo.

09-09141 CDO-741.5

Índices para catálogo sistemático:


1. Histórias em quadrinhos:
Apreciação crítica 741.5
o USO DA GíRIA NAS HISTÓRIAS
EM QUADRINHOS
PAULO RAMos

E aí, geral da Panini, na boa? Fala sério, cês tão mandando muito
bem, sem zoação ... T á muito f#%@ mermo, sacoé? Tipo, o
formato e a capa dura tão na moral, sem falar naquelas paradas de
notícia e correio manero ... Se vocês não entenderam alguma coisa,
foi mal- quer dizer, desculpa, mas é mais ou menos assim que os
cariocas, mineiros, gaúchos se sentiam quando viam o Wolverine
falando "faz uma cara" e "desencana". Eu sei que vocês estão
começando, então, considerem isso um pedido: não usem gírias
paulistas! Entendo que elas servem pra aproximar os personagens
da realidade, mas tentem usar gírias conhecidas e usadas na maior
parte do País, por favor.
Thiago do Valle Mattos - Rio de Janeiro (RJ)

Antes de qualquer consideração, o contexto. O trecho acima é uma


carta, publicada no quarto número da revista em quadrinhos X-Men, de
abril de 2002. A editora paulistana Panini, responsável pela edição, havia
lançado o título, de periodicidade mensal, três meses antes. Os
personagens que dão nome à publicação, os super-heróis X-Men, são mais
conhecidos pelo grande público por causa de adaptações de suas aven-
turas para o cinema norte-americano. São seres dotados de mutação
genética (chamados de mutantes), que lhes confere dons fora do comum:
lançar raios pelos olhos, usar o poder da mente para penetrar nos
pensamentos de outras pessoas, controlar os fenômenos climáticos.

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PAULO RAMos

Wolverine, dono de afiadas garras que saem das mãos e de um tem-


peramento agressivo, é o mais popular junto aos fãs (o que justificaria o
fato de ter sido citado na carta).
As histórias dosX-Men são produzidas nos Estados Unidos. Meses
depois, são traduzidas e editadas no Brasil. É sobre a edição nacional a
principal crítica feita pelo leitor carioca Thiago do Valle Mattos,
Segundo ele, a presença de gírias paulistas (sic) dificulta a leitura da
revista para quem não mora no estado de São Paulo. Na revista em que
a carta foi publicada é possível encontrar, numa só página (p. 8),
vocábulos como "sacumé" (sabe como é) e "xará" (amigo, qualquer
pessoa). Ambos têm teor gírico e constam no dicionário de gírias de
Gurgel (1998).
O leitor, na verdade, levanta na carta algumas questões bem
pertinentes e ainda pouco exploradas cientificamente. Existem gírias
nacionais, conhecidas na maior parte do país? Se sim, como se
difundiram e se tornaram conhecidas? As gírias servem mesmo para
aproximar os personagens da realidade do leitor? Se a língua, em especial
a falada, é passível de constantes mudanças, de que realidade estamos
falando? Não seria inconveniente questionar também o que se entende
por gíria?
Nosso objetivo aqui é buscar algumas respostas.

o QUE É GÍRIA?

O conceito de gíria, no senso comum, é facilmente assimilável. "São


aquelas palavras que nós falamos, mas com sentido de outra coisa, e que
não tem quase como dizer de outra formà', poderia explicar alguém com
certo grau de segurança. Não é tão simples assim. Nem sempre a
definição se ajusta à prática como gostaríamos, e não se pode caminhar
adiante sem ter uma clara ideia do que seja gíria. Urbano (2001, P: 197),
após análise de mil palavras gírias, reconheceu a dificuldade de se
obterem conclusões definitivas pelo fato de ser uma "área muito mo-
vediça de explicação etimológico-semântica".
Vamos do começo. Todos os dias, mesmo sem nos darmos conta,
exercitamos o uso da nossa língua. Falamos, falamos, falamos, embora

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o Uso DA GfRIA NAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS

nem sempre do mesmo jeito. Em casa, em ambiente familiar, tendemos


a nos expressar de maneira mais informal. Um cumprimento entre um
pai e um filho poderia ser algo como "Tudo joia, meu filho?" / "Beleza,
pai." Na firma, junto ao chefe ou a um cliente, o mesmo pai tenderia a
se comunicar de maneira bem mais formal. O filho, na escola, ao lado
dos colegas, teria mais liberdade para usar outras palavras, algumas até
chulas, talvez jamais ditas dentro de casa. São apenas exemplos hipo-
téticos, mas ilustram nosso ponto de vista: usamos a língua de formas
diferentes, o que a área da Sociolinguística convencionou chamar de
níveis de fola (PRETI, 1973, p. 33). Vários fatores podem estimular a
presença dos níveis: contexto situacional, classe social, idade, posição
geográfica, profissão, sexo, papel social.
Apesar de a língua ter caráter variável e de sua utilização ser
segmentada em níveis, a própria sociedade convenciona determinados
usos e construções e os estabiliza numa norma linguística, seguida pela
maioria dos falantes. A norma se manisfesta mais visivelmente nos
campos sintático e lexical. O primeiro tem caráter mais tradicional,
menos propenso a mudanças. O segundo, o lexical, está mais apto a
alterações e é "o reflexo mais perfeito das mudanças sociais" (PRETI,
1998, p. 119).
O estudo da gíria se insere nesse contexto. Determinados grupos
de pessoas podem, por razões diversas, não seguir parte do uso lexical
convencionado pela norma linguística, formando uma espécie de
linguagem particular. Os jovens em geral, movidos talvez por um desejo
de autoafirmação, buscam se distanciar dos vocábulos tidos como
formais. A Jovem Guarda, movimento musical brasileiro da década de
1960, do qual faziam parte Roberto e Erasmo Carlos, consagrou em
suas canções um conjunto próprio de palavras: "brasa", "mora' e outras.
Reportagens baseadas em gravações telefônicas de diálogos entre
supostos traficantes também fornecem material rico de exemplos. Há,
em várias das gravações, um código próprio, intencionalmente distante
do uso convencional. Vocábulos como "tênis", para citar um caso,
adquirem sentido de "armamento pesado".
Tal linguagem, quando consolidada, torna-se um signo de grupo,
composto de vocabulário próprio, uma parte dele gírio. Quanto maior
for a afinidade entre seus integrantes, maior será a importância lexical.

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PAULO RAMos

Um problema que parece ser comum aos trabalhos sobre o tema


é estipular critérios para delimitar a aplicação do termo gíria. O que
difere, por exemplo, do jargão ou da linguagem obscena ou da gíria
comum? Preti (1984, p. 26-27) vê distinções entre todos. Em linhas
bem gerais, o jargão seria uma linguagem técnica banalizada - visão
reforçada por Alves (2001) -, e a linguagem obscena teria no caráter não
efêmero sua principal distinção da gíria.
Outra observação é com relação aos termos gíria e expressão gíria
(dois ou mais vocábulos que adquirem função de gíria). Embora
diferentes na forma de apresentação, trabalharemos os dois termos como
equivalentes.
Quanto ao processo de formação das gírias, há basicamente dois,
segundo Preti (1984, p. 5-6):

1. alteração do sentido original por meio de processo metafórico.


Ex.: piranha (sentido original: tipo de peixe carnívoro; sentido
metafórico: prostituta).
2. deformação dos significantes dos vocábulos. Ex.: mulherengo
(pessoa do sexo masculino afoita por mulheres).

Urbano (2001, p. 182) acrescenta que podem ocorrer concorni-


tantemente os dois processos, o de alteração (ou desvio semântico) e o
de deformação. O autor defende que as gírias dificilmente criam termos
novos. Elas, na verdade, normalmente recriam os antigos, em especial
nos processos de deformação.

GÍRIA ou GÍRIA COMUM: EM BUSCA DE UMA DEFINIÇAo

Um dos sucessos do conjunto Mamonas Assassinas foi a música "Pelados


em Santos". O início da letra dava o tom do resto da canção: "Mina, seus
cabelo é da hora". Era uma clara tentativa de dar informalidade - e
irreverência - à letra. Havia um pronome no plural ("seus") seguido de
nome no singular ("cabelo"), comum à linguagem oral informal.
Continha dois usos gírios: "Mina" (com idéia de mulher) e "da hora"
(no sentido de muito belos, bonitos, bons). O fato de os músicos terem

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o Uso DA GIRlA NAS HISTóRIAS EM QUADRINHOS

utilizado duas gírias faz da música um signo de grupo, restrito a deter-


minado conjunto de pessoas?
A resposta, evidentemente, é negativa. "Pelados em Santos" foi
uma das músicas mais tocadas na curta carreira do grupo. O que
acontece é que a gíria tem, em geral, dois destinos: ou cai em desuso
(caso de "prafrentex", usada nos anos 1970 no sentido de pessoa com
idéias avançadas) ou é incorporada ao vocabulário da grande comu-
nidade de falantes ("carà', para citar apenas um caso). "Mina" e "da horà'
seriam dois possíveis casos de vocabulário gírio que, em razão da difusão
da música pela mídia, perdeu seu caráter exclusivamente de grupo. Na
pior das hipóteses, a música serviu para sua popularização.
Preti (1984; 1998; 2000) vê nas várias formas de mídia (jornal,
televisão e outras) a principal fonte de expansão do vocabulário gírio de
grupo a um maior número de falantes. Como veículo de comunicação
de massa, os meios midiáticos têm como característica usar uma mesma
forma de linguagem para um grupo amplo de pessoas, por mais hete-
rogêneo que seja. O autor ilustra bem o tópico quando diz não haver
duas telenovelas: há uma só, padronizada para a grande massa. Seguindo
o mesmo raciocínio, percebemos que também não há dois telejornais
nacionais, dois filmes, dois jornais impressos, duas crônicas.
Do ponto de vista sociolinguístico, interessa saber que a mídia
procura padronizar e unificar a língua, enviando uma mesma mensagem
aos vários cantos do país. Tem-se em mente um leitor, ouvinte ou
espectador padrão. Como consequência, segundo Preti, houve um
inesperado prestígio social da linguagem popular, em especial na década
de 90 do século passado. A gíria, até então tida como marginal e con-
testadora da norma seguida pela grande massa, é gradativamente
incorporada ao vocabulário nacional e torna-se "um poderoso elemento
expressivo da linguagem popular no sentido de transmitir os sentidos
de rebeldia, insatisfação, agressividade, não raro por meio da ironia e do
humor." (PRETI, 1998, p. 121) É importante registrar que um
vocabulário, originado e usado estritamente num universo oral, migra
também para a forma escrita e é por ela incorporado.
O vocabulário gírio, agora amplamente difundido, perde seu
caráter de signo de grupo e muda de nome, passa a ser uma gíria popular
ou comum ou vocabuldrio popular. Uma tarefa de difícil elucidação é

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PAULO RAMos

determinar o exato momento em que o vocábulo deixa de ser restrito a


um grupo e passa a se incorporar na fala de outras pessoas.

A GiRIA NOS DIÁLOGOS DE FICÇÃO DA MiDIA

- Eu já tinha falado pra vocês que tinha corujado a cachanga.


- Hã-ram - concordou Inferninho.
- Então ... - Tomou um gole longo, passou a língua nos lábios.
- Primeiro eu passei de camelo, vi que a cachanga tava vazia.
Não tinha ninguém na rua e era cedo pros otário chegar de
batalha. Aí, eu parei assim...
- Tava trepado? - perguntou Inferninho.
- Não, não tava de revólver, não. Aí, eu comecei a gritar:
"Light!". Ninguém veio, aí eu fui atrás e arrombei a janela da
cozinha e entrei. Aí, cumpádi, era maior cachangão, tinha coisa
pra caralho... Se tivesse mais um parceiro, nós ia se dar bem. Aí,
eu saí rapidinho, peguei o camelo, pedalei com vontade até sair
da Estrada de ]acarepaguá.

o diálogo faz parte do livro Cidade de Deus, de Paulo Lins (2002,


p. 36-37). O autor narra a evolução da favela carioca que dá nome à
obra e a ligação de muitos de seus moradores com o tráfico de drogas.
No trecho, o personagem Tutuca descreve para o amigo lnferninho,
"entre um gole e outro de cerveja", como havia feito um roubo. O
trecho, mesmo pequeno, fornece rico material para vários estudos
linguísticos. Interessa-nos, aqui, destacar os níveis de fala. Tutuca e
lnferninho são apresentados com um linguajar bem informal: usam
reduções ("tavà'), marcadores conversacionais ("aí"), concordância que
foge à variante culta ("nós ia se dar bem"). Lins se vale também de gírias
como suporte lexical para caracterizar estilisticamente os dois ("corujado
a cachanga", "cachangão", "camelo", para citar algumas). O sentido da
maioria do vocabulário gírio utilizado só é compreendido se for
considerado o contexto situacional e o conteúdo da fala. O narrador,

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o Uso DA GIRIA NAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS

merece registro, possui nível de fala mais próximo da linguagem formal


("Tomou um gole longo, passou a língua nos lábios"; concordou
cc •••

lnferninho"; cc ••• perguntou lnferninho.").


O romance Cidade de Deus, anos depois, tornou-se o filme Cidade
de Deus, dirigido por Fernando Meirelles. A produção levou para a tela
grande muitos dos diálogos do livro, mesmo que adaptados. As gírias de
lnftrninho, Tutuca e outros personagens ganhavam uma vitrine maior.
Preti (2003, p. 13-14) vê nos diálogos de ficção veiculados pela
mídia, como "Cidade de Deus", uma excelente fonte de pesquisas para
a análise da fala espontânea. O motivo seria a busca dos autores em
representar a fala dos personagens o mais realisticamente possível. Preti
cita os casos de cenas de teatro, telenovelas e obras cinematográficas.
Curiosamente, o autor não inclui as histórias em quadrinhos,
alvo de estudo seu em 1973, em que busca mostrar como é feita a
caracterização dos níveis de fala nessa mídia. Preti entende que os
quadrinhos poderiam representar um expressivo campo de pesquisas
da fala.
Ele tomou como corpus 37 edições da revista Mônica, de Mauricio
de Sousa. Nessa pesquisa, Preti constatou que havia diferentes níveis de
fala, usados muitas vezes pelos mesmos personagens em situações
distintas. Os níveis, em linhas gerais, variavam do formal ao informal,
fosse ele infantil ou não. Houve registro de uso gírio pela personagem
Tina, então ligada ao estilo de vida próximo ao do movimento hippie.
Ela utilizava vocábulos como "bicho", "careta", "meu", "inserido".
Mesmo identificando alguns diferentes níveis, o linguista afirma
claramente que o formal, mais próximo à variante culta da língua,
dominava os diálogos no começo dos anos 1970. Nas palavras do autor,
"os códigos morais pelos quais se pauta a atividade das editoras, os quais,
atuando no sentido de transformar as revistas em quadrinhos em
instrumento de educação coletiva, transferem essa intenção também para
o plano da língua, preservando com zelo a ortografia oficial e nivelando
a fala das personagens pela norma culta, o que impede, frequentemente,
qualquer identificação mais precisa dos níveis sociolinguisticos." (PRETI,
1973, p. 36)
Uma possível conclusão é que a maioria dos personagens
dialogava usando um mesmo nível de fala, o mesmo utilizado pela

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PAULO RAMos

variante culta. Isso explica o baixo número de gírias encontrado. Em


termos estilísticos, obtém-se uma antítese: os aspectos visuais mostravam
a personagem Mônica como uma criança, mas sua caracterização da fala,
bem como seu uso lexical, era própria de um adulto. É possível supor
que um diálogo como o do romance Cidade de Deus, à época, seria algo
inimaginável nas histórias em quadrinhos de grande divulgação. Não
havia, tanto por parte de produtores como de leitores, uma expectativa
de encontrar construções extremamente informais.

A REPRESENTAÇÃO DA FALA NAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS

Na literatura, os diálogos dos personagens são representados por meio


de discursos direto, indireto, direto livre e indireto livre. Especi-
ficamente no caso do direto, dá-se voz ao personagem, como num
processo de citação. Os diálogos podem ou não ser acompanhados por
verbos dicendi (tais como "disse", "falou" e outros). O trecho extraído
do romance Cidade de Deus, reproduzido anteriormente, é construído
nessa forma de discurso.
Nas histórias em quadrinhos, o discurso direto é o principal
(embora não o único) meio de representação da fala dos personagens. A
diferença é que é feito com o auxílio de balões, recurso visual que contém
os caracteres escritos do diálogo. Ou, na definição de Eguti (2001, p.
77), é "um espaço onde são escritas as palavras proferidas pelas diversas
personagens", podendo apresentar diferentes formatos.
No exemplo da figura 1, há três personagens. Sabemos o que cada
um diz por meio das falas dispostas dentro do espaço dos balões. A
indicação de quem é o falante de cada trecho é feita com o auxílio do
apêndice (EGUTI, 2001, p. 78; RAMOS, 2007, p. 221) ou rabicho
(SANTOS, 2002). O apêndicelrabicho tem função semelhante à do
travessão nos diálogos literários e, visualmente, afunila-se na direção do
personagem. Percebemos que o trecho "Tem razão! Lembra como
éramos quando rapazes?" é dito pelo Senhor Fantástico, que aparece bem
no centro, com o número quatro estampado na camisa. Isso porque o
rabicho/apêndice afunila-se no sentido de sua cabeça. O mesmo racio-
cínio vale para os demais personagens do exemplo.

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o Uso DA GIRJA NAS HISTORIAS EM QUADRINHOS

Figura 1 - Os balões representam a fala dospersonagens.

Para nossa linha de argumentação, interessa destacar que é por


meio dos textos contidos dentro dos balões que é feita a caracterização
verbal dos personagens numa história em quadrinhos. Em tese, o balão
procura representar diálogos da língua oral. Tal representação pode ser
mais ou menos expressiva. Pode, inclusive, contradizer as características
visuais do personagem, como ocorreu em estudo feito por Preti (1973),
citado anteriormente.

DESCRIÇÃO DO CORPUS

É necessária uma análise prática para perceber a presença e a evolução


das gírias. É a etapa que iniciamos agora. O corpus ideal seria abordar
uma mesma história em quadrinhos, publicada em língua portuguesa
em épocas diferentes. Descartamos edições produzidas por autores
brasileiros pelo fato de manterem, em cada republicação, a tendência
de reprodução exata da mesma caracterização verbal. Os olhares
voltam-se, então, para materiais estrangeiros, traduzidos para o por-
tuguês em momentos distintos. Se possível, três ou mais traduções, de
modo a aumentar o volume de dados a serem comparados.
O corpus proposto neste estudo é uma história do personagem
Homem-Aranha, publicada no Brasil por três editoras diferentes - Editora
Brasil América Ltda. (EBAL), Bloch e Abril-, em três datas diferentes
(1970, 1976, 1997), com três traduções diferentes. EBAL e Abril a

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PAULO RAMos

veicularam em preto e branco; Bloch, em cores. A história original teve


sua primeira publicação no número 34 da revista norte-americana
Amazing Spider-Man, de março de 1966, e é de autoria dos criadores
do super-herói, Stan Lee eSteve Ditko.
O personagem principal é o adolescente Peter Parker. Após
ser picado por uma aranha radioativa, ganhou poderes semelhantes às
habilidades de uma aranha: escalaparedes, tem agilidade sobre-humana.
Como tem aptidão para invenções científicas (é estudante de ciências
numa faculdade de Nova Iorque), desenvolveu aparelhos lançadores
de teias. As teias aderem ao concreto e funcionam como cordas pa-
ra ele se locomover pelos arranha-céus. Parker vive uma aparente
contradição. Órfão, mora com a tia; é constantemente mimado e
superprotegido por ela. A situação muda quando veste uma fantasia
azul e vermelha, que lhe cobre todo o rosto, e se transforma no seguro
super-herói Homem-Aranha.
Na história que serve de corpus, Peter Parker enfrenta Krauen, um
caçador que sonha em ter a máscara do Homem-Aranha junto a seus
prêmios. O vilão prepara uma armadilha num prédio condenado, mas
é derrotado no final. Em meio à trama central, outras são desenvolvidas:
Parker está a um passo de terminar o namoro com a secretária Betty
Brant; é observado por Gwen Stacy, colega de faculdade que será seu
futuro amor; é visto como prepotente pelos colegas;acompanha o estado
de saúde de sua Tia May, que estava internada e teve alta do hospital.
Algumas dessas tramas paralelas só são resolvidas em edições futuras,
fato comum às histórias de super-heróis a partir da década de 1960. Em
termos expressivos, o personagem Homem-Aranha tende a fazer pia-
dinhas enquanto luta. Costuma ironizar seus inimigos.
Juntamente com os estudos, Peter Parker trabalha como fotógrafo
para um jornal de Nova Iorque. Vende as fotos para J Jonah Jameson,
dono e editor do periódico, que busca sempre difamar a imagem do
super-herói perante a opinião pública.
Com as três versões da história, será possível verificar como cada
tradução utilizou o vocabulário gírio e se tal uso, com o passar dos anos,
aumentou ou não, se foi ou não incorporado pela mídia história em
quadrinhos. Pretendemos analisar também se há mudança nos níveis de
fala nos três momentos.

48
o Uso DA GIRIA NAS HISTORIAS EM QUADRINHOS

A metodologia utilizada obedeceu aos seguintes critérios:


• levantamento de possíveis vocábulos gírios nos balões
dos personagens em cada uma das três edições;
• confirmação do vocabulário gírio, com base nos critérios:
o definição de gíria, apresentada anteriormente;
o presença do vocábulo em dicionários de gíria;
o consideramos como gíria a palavra ou expressão gíria que
correspondeu à definição defendida neste artigo e que constou
num dos dicionários de gíria adotados; casosque não forem
dicionarizados serão elencados separadamente.

• análise das gírias em cada uma das edições;


• análise das gírias, comparando as três edições.

A EDIÇÃO DA EBAL (1970)

A história The tbrill o/ the hunt, nome original americano, foi batizada
pela EBAL como O prazer da caçada. A publicação brasileira ocorreu
no Almanaque O Homem-Aranha, lançado no final de 1970.
Ao longo das 20 páginas da história, levantamos 34 possíveis
ocorrências de gíria. 18 se configuram efetivamente vocabulário gírio
(Quadro 1).

CASO PÁGINA TEXTO QUEM FAIA

"Enquanto isso, muito distante dali, vamos


68 Narrador
presenciar um quadro fantástico ... "

"Admita, boneca! Colega de


2 70
Você me escolheu." universidade 1

Colega de
3 70 "Que nada! Sou eu o sortudo!"
universidade 2

"Beleza, o sujeito que tirá-Ia de circulação Colega de


4 70
vai ser o mais odiado da Universidade." universidade 3

"Beleza, o sujeito que tirá-Ia


Colega de
5 70 de circulação vai ser o mais odiado
universidade 3
da Universidade."

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PAULO RAMos

CASO PÁGINA TEXTO QUEM FALA

"Você tem nos esnobado desde Colega de


6 70
que as aulas começaram!" universidade 1
"Dissemos umas boas verdades Colega de
7 71
àquele convencido, hem?" universidade 1

"Mas o velho Homem-Aranha pode


8 77 Homem-Aranha
superar um obstáculo tão simples."

"Bem, não há mais nenhum


9 81 para atrapalhar! Mas onde Homem-Aranha
se meteu Krauen?"

"Acho que nos metemos


10 80 Capanga
numa encrenca!"

"Acho que nos metemos numa


II 80 Capanga
encrenca!" (capanga)

"Prepare-se, pois vai levar um grande


12 68 Peter Parker
choque ... "

"Senti vontade de dar uma


13 75 Amiga de Tia May
prosinha com você, querida!"

Médico de Tia Ma.!


"Depois de alguns dias (mantivemos o
14 69 de repouso, estará acento circunflexo
nova em fôlha!" em "fôlha", confor-
me o original)

15 69 "Doutor, o senhor é o maior!" Peter Parker

"Pensa que é grande coisa,


Colega de
16 70 só porque ganhou uma bolsa
universidade 1
de estudos!"

"Ufa! Finalmente consegui Homem-


17 83
acertá-lo em cheio!" Aranha

"Estranho! Peter Parker é o único


18 70 Gwen Stacy
que não anda atrás de mim!

Quadro 1 - Gírias na edição de Homem-Aranhapublicada pela EBAL

A maioria das palavras encontra ao menos uma referência em


dicionários de gíria, em especial naqueles posteriores à data da revista.
Adotaremos como procedimento comentar mais especificamente os
termos que nos parecerem relevantes a esta análise.

50
o Uso DA GIRlA NAS HISTORlAS EM QUADRINHOS

Se meteu / nos metemos (casos 9 e 10) aparece uma vez cada.


Apesar disso, para a contagem geral de casos de gíria, somamos como
duas ocorrências. Houve casos de registros dicionarizados de forma
próxima à encontrada no corpus, porém com o mesmo sentido. Foi o que
ocorreu com esnobado (caso 6). O vocábulo consta em Silva (1973) e
em Gurgel (1998) como "esnobadà' ou "esnobar", com ideia de "hu-
milhar", "ostentar grandezà'. Fato semelhante aconteceu com prosinha
(caso 13). Dicionarizou-se como "prosa", Houve duas ocorrências
encontradas: Viotti (1956) e Gurgel (1998). Acreditamos ser gíria,
formada a partir de outro vocábulo gírio ("prosa"). Duas hipóteses
poderiam ser lançadas para explicar sua formação. Ou se trata de defor-
mação da palavra "prosa" ou ocorreu apenas o acréscimo de um sufixo
indicador de diminutivo.

Figura 2
Onde se meteu
Kraven?"

Dois vocábulos e uma expressão não tiveram registro nos dicio-


nários de gíria, mas consideramos termos gírios. As três ocorrências
encontrariam justificativa nos critérios do processo metafórico e do uso
popular.Choque (caso 12) é apresentado no Dicionário Houaiss da
Língua Portuguesa (2001) como metáfora para "perturbação brusca no
equilíbrio mental ou emocional" ou "abalo psíquico devido a causa
externa". O maior (caso 15) consta no Houaiss como uso brasileiro
informal, no sentido de "ser o melhor de todos, o mais ilustre entre seus
pares". Tirá-Ia de circulação (caso 5) não encontra registro nos
dicionários. Entendemos ser uma construção metafórica, conotando, pelo

51
PAULO RAMos

contexto situacional, "a pessoa que conseguir namorá-Ia, seduzi-Ia, sair


com ela". Trata-se, a nosso ver, de expressão metafórica, com teor gírio.
Analisando os registros como um todo, percebemos um dado
curioso: o maior número de gírias é usado pelas personagens coadju-
vantes. Ocorre com o narrado r, com um dos capangas, com Gwen Stacy,
com a amiga de Tia May e, mais visivelmente, nas seis falas dos colegas
de universidade. Juntos, os universitários chegam a usar mais vocabulário
gírio do que Peter Parker/Homem-Aranha. Parece haver um cuidado dos
tradutores da época em caracterizar as personagens coadjuvantesou
esporádicos com níveis de fala não formais. Optam pelo uso de gíria
para ajudar na caracterização de um nível informal. Com relação aos
personagens Gwen Stacy e colegas de universidade, é possível outra
inferência. Por serem jovens, pode ter sido intenção dos tradutores o uso
de vocabulário gírio para melhor caracterizá-Íos.
Peter Parker e Homem-Aranha, se considerados um personagem
só, usam poucas gírias, cinco ao todo. Há aqui uma contradição, tal qual
a apurada por Preti (1973) no estudo dos personagens de Mauricio de
Sousa. Parker, mesmo sendo visualmente um adolescente, tem voca-
bulário e construções próprias de um nível de fala adulto. Apesar de não
ser nosso objetivo extrapolar o limite da gíria, uma frase do personagem
exernplifica tal uso. Na última página da história, a fala num dos balões
é: "Temerei sua reação quando souber o segrêdo ' que ocultei-lhe por
tanto tempo?" Há um nítido formalismo no uso da linguagem, cons-
truído pela aproximação à norma culta da língua.
Beleza (caso 4) teve mudança semântica. Na década de 50, o
registro mais próximo apresentado por Viotti (1956) era o de "ficar de
beleza", ou seja, "ficar impassível, no momento em que todos fazem
alguma coisa". O sentido é reforçado pela gíria marginal uma década
depois, dicionarizado por Tacla (1968) como "que não faz nada". Só
encontra registro equivalente ao do corpus, com ideia de "ótimo" (ou
eX~-IDnilar) na década de 90.
No caso de beleza (caso 4), é importante perceber que a história
em quadrinhos já registrava com o sentido de "ótimo" duas décadas
antes do dicionário de gíria de Gurgel (1998), o único a mencionar o

1 Na palavra segredo, mantive na mesma acentuação do original.

52
o Uso DA GIRIA NAS HISTORlAS EM QUADRINHOS

termo nessa acepção. O mesmo ocorre com outros vocábulos do corpus.


Se o caminho da gíria é migrar do oral para o escrito, e se os quadrinhos
buscam reproduzir parte da linguagem popular nos balões, temos aqui
um bom material para corroborar tal premissa.
Outra palavra merece menção (ver figura 3): boneca (caso 2).
Com ideia de "garota linda; broto legal", como explica Silva (1973),
"boneca" era uso comum até meados dos primeiros anos da década de
70. Nos anos seguintes, adquire a conotação de "homossexual", como
atesta Silva. Na década de 90, mantém o sentido de pessoa homossexual.
A revista em quadrinhos tem um registro de época interessante neste
vocábulo e particularmente revelante para este estudo. Infere-se que os
tradutores da história se valeram de vocábulos orais comuns à época.
Esse uso deu aos quadrinhos um outro status: o de serem uma relevante
fonte para estudos de evolução léxica.

Figura 3 - "Admita, boneca!"

A EDIÇÃO DA BLOCH (1976)

A mesma história do personagem Homem-Aranha recebe o título de A


emoção da caçada na edição da Bloch, de junho de 1976 (número 14 da

53
PAULO RAMos

revista). Nessa versão da história - publicada em cores e em formato


menor do que o original -, marcamos 57 palavras que poderiam ter
traços de vocabulário gírio; 25 se configuraram gírias, sete a mais que na
versão da EBAL (Quadro 1):

CASO PÁGINA TEXTO QUEM FALA

1 50 "Caramba! Estou exausto." Peter Parker

"Uh, uh! Dessa vez, Colega de


2 51
o felizardo sou eu ... " universidade 1

"O cara escolhido vai ser Colega de


3 51
odiado por todos." universidade 2

"Você tem nos esnobado desde


Colega de
4 51 o princípio do ano, só porque ganhou
universidade 3
uma bolsa de estudos."

Capanga
5 57 "Ok! Estou doido para pôr as mãos nele."

"E agora, Homem-Aranha,


6 57 Kraven
a palhaçada acabou!"
"Se eu quiser pegá-Io, tenho que
7 58 Homem-Aranha
aceitar o seu jogo e caçá-Io."
"Seus deboches não me enganam!
8 61 Kraven
Você está é com medo e sabe disso."
"Você nunca mais ousará
9 61 Kraven
debochar de Kraven. "
"Acho que pus aquele cara no Colega de
10 52
seu lugar, hein, Gwen. n universidade 3

11 61 "Se você acha, cara ... " Homem-Aranha

"Espero que vocês não tomem isso


12 61 Homem-Aranha
como algo pessoal, caras!"
Colega de
13 51 "Você nos deixa na mão toda a semana!"
universidade 4
Gwen Stacy
"Estranho. Peter Parker é o único (há duas ocorrên-
14e15 51
que não me dá a mínima bola" cias: dá bola e
a mínima)

"Eu estava preocupado com Peter Parker


16 51 Tia May e eles pensavam que eu (as aspas constam
queria bancar o 'bom'" no original)

54
o Uso DA GIRIA NAS HiSTÓRIAS EM QUADRINHOS

CASO PÁGINA TEXTO QUEM FAIA


"Realmente ele tem nos dado um 'gelo'
17 52 Gwen 5tacy
desde que veio para a universidade."

18 52 "Esta Gwen é um saco." Peter Parker


19 52 "Ele não dá a mínima. Olha só." Gwen Stacy
"Deixe-o pra lá. Com esses artigos estou
20 55 J [onah [ameson
vendendo mais jornais ... "

21 59 "Vou provar que ele não é de nada." Capanga

22 49 "Isso poderá ser um choque para você." Peter Parker

"Já que você tem companhia, tia,


23 56 vou pegar um cinema."
Peter Parker

"Agora só o Homem-Aranha sabe


24 54 que sou um impostor e virá atrás de mim Kraven
e cairá numa armadilha."

25 65 "Logo agora que eu o tinha nas mãos." J Jonah Jameson

Quadro 2 - Gírias na edição de Homem-Aranha publicada pela Bloch

Pegar (caso 23) é parte de várias construções gírias dicionarizadas.


"Pegar de pau" (igual a bater), "pegar firme" (agir depressa) e "pegar as
rebarbas" (sofrer as conseqüências) são apenas três exemplos. Curio-
samente, não consta nos dicionários de gíria o sentido de ir, locomover-
se a, como na expressão do corpus "pegar um cinema". A referência
mais próxima é apresentada por Houaiss (2001), que acusa a ideia de
"deslocar-se para algum lugar". Entendemos tratar-se de gíria pelo
motivo de ter uma função metafórica, o que é reforçado nas várias outras
expressões gírias dicionarizadas.
A expressão gíria a mínima (casos 14/15 e 19) aparece duas
vezes. Numa delas, funde-se a outra construção, dá bola (casos 14115),
formando dá a mínima bola. Duas hipóteses podem ser levantadas
para explicar tal junção. Primeira: trata-se de duas expressões em uma,
ocorrendo uma espécie de deformação. Segunda: a expressão a mínima
pode prever a elipse do termo "bola", Como os dicionários registram
as duas construções separadamente, tendemos a dar mais crédito à
primeira possibilidade.

55
PAULO RAMos

li!L.e NJ/:) o( A MfNIMA.


OLHA SÓ.lOCO ~
SACO NAGoEI.ES
TUBOS De ENS4.IO.
Ok.MR.~.
ESPEREs6.
Figura 4
"Ele não dá a
ttununa,"
/.

Deboche/debochar (casos 8 e 9) encontra registros gírios nas


décadas de 50 e 60 (Viotti, Tacla). Não consta nos dicionários de gíria dos
anos seguintes. Houaiss (2001) dicionarizou a palavra, como idéia jocosa,
não considerando seu histórico gírio. Entendemos ser um daqueles
vocábulos que, em dado momento, deixou o uso exclusivamente popular
e passou a ser incorporado pela língua. É possível que tal passagem tenha
ocorrido em meados dos anos 1970, data aproximada da publicação.
Postulamos que tivesse teor de gíria à época de publicação do corpus.
Parece que os tradutores depositaram na palavra cara (no sentido
de indivíduo ou com ideia fática) parte da informalidade pretendida. Ela
aparece quatro vezes (casos 3, 10, 11 e 12, sendo, neste último, no plural,
caras). É também o único vocábulo unanimemente gírio: consta em todos
os dicionários de gíria, inclusive no Dicionário dos marginais (1%8).
Outras duas gírias merecem menção: o "bom" (caso 16) e dado
um "gelo" (caso 17), como mostram as figuras 11 e 12. O registro é
em razão de um fato inusitado: ambas aparecem entre aspas. Descartada
a hipótese de marcar ironia, é possível inferir que as aspas evidenciam ao
leitor que não se trata de vocabulário comum à variante culta. Em outras
palavras, parece ter havido uma preocupação dos tradutores de marcar
graficamente as duas ocorrências gírias. Há uma aparente contradição:
destacam-se com sinais gráficos dois vocabulários gírios e se esquecem
de marcar os demais.
Qual seria, então, o critério para o uso das aspas? Olhando o
corpus, não é possível dar uma resposta precisa. Uma hipótese, que carece

56
o Uso DA GlRIA NAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS

de confirmação em outras edições da Bloch, é a de que determinadas


gírias, consideradas mais atuais ou exclusivamente orais ou de uso ainda
inédito à escrita, seriam evidenciadas com aspas para "preparar" o leitor
de que o vocábulo é informal. Qualquer que seja a resposta, temos aqui
a constatação de que a editora tinha a intenção de inserir gírias para
informalizar determinados diálogos, mesmo que tal inserção não
ocorresse de forma consciente em todos os casos, o que justificaria a au-
sência de aspas nos demais vocábulos gírios.
Ainda sobre a expressão dado um "gelo", não há registro dela
nos dicionários de gíria. Há uma ocorrência de "gelo" em Gurgel (1998),
mas com o sentido de esquecimento. Quem acusa o teor gírio é Houaiss
(2001), admitindo ser comum à linguagem informal a expressão "dar
um gelo", com ideia de evitar alguém. Os quadrinhos, também neste
caso, anteciparam a dicionarização.

~n;; Q.E reM


AIOS 0iIlD0 UU·GE/..O"
C!eSDE QUe \ISO FI&U?A
A LlNIVERSIDAOE'.
TALIIIiZ.ElE TE-
UM IW.JH""'J.I

Figuras 5 e 6- eu queria bancar o 'bom'."; "Realmente ele


cc•••

tem nos dado um 'gelo' desde que veiopara a universidade. "

Olhando os dados de um ponto de vista mais geral, repete-se a


tendência de os coadjuvantes serem caracterizados com níveis de fala
informais. Tendência que não apenas se repete, como se acentua tam-
bém. Gwen Stacy aumenta consideravelmente o uso de vocabulário gírio
(há três ocorrências), se compararmos com a edição da EBAL. J Jonah
[ameson, personagem ausente nos casos do levantamento anterior, en-
contra dois registros. Kraven, caracterizado na EBAL de maneira mais
formal, arrisca algumas gírias (quatro casos). Em termos verbais, Krauen,

57
PAULO RAMos

Gwen e Jameson tornam-se personagens sensivelmente diferentes dos


lidos na EBAL. O mesmo vale para Peter Parker/Homem-Aranha, que
passa a usar mais gírias (oito casos).
A Bloch parece ensaiar o uso de vocabulário gíria, com vistas a
tornar mais informal o nível de fala de todos os personagens, sem critério
quanto a seus papéis sociais ou faixa etária. As aspas em dois casos
reforçam a idéia de que ainda não dominam cem por cento tal uso, nem
que exista um rigoroso critério para sua utilização. Assim como a EBAL,
a Bloch antecipa gírias que viriam a ser dicionarizadas anos mais tarde.

A EDIÇÃO DA ABRIL (1997)

A Editora Abril, nos anos em que deteve os direitos do personagem


Homem-Aranha, sempre fez as publicações do super-herói em cores. A
edição selecionada, de 1997, foi uma exceção. Faz parte de uma coleção
que reunia suas primeiras aventuras. Todos os números da série especial
foram editados em preto e branco, tal qual o fez a EBAL, décadas antes.
O formato também era o mesmo da Editora Brasil-América Limitada.
O título adotado é idêntico ao da versão da Bloch, A emoção da caçada.
34 dos 66 casos levantados se configuraram gírias (Quadro 3):

CASO PÁGINA TEXTO QUEM FALA

1 51 "Mas talvez isso seja um choque pra você!" Peter Parleer

2 52 "Cara, estou moído. " Peter Parker

3 52 "Cara, estou moído." Peter Parker

Colega de
4 53 "Não, o sortudo sou eu!"
universidade 1

"O cara que sair com você vai ser Colega de


5 53
o mais odiado da faculdade!" universidade 2

"Você é tão popular aqui Colega de


6 53
quanto Hitler, cara!" universidade 3

"Você vive bancando o metido só porque


7 53 Gwen Stacy
conseguiu uma bolsa de estudo!"

58
o Uso DA GfRIA NAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS

CASO PÁGINA TEXTO QUEM FALA

"Já entendi! Enquanto eu estava preocu-


8 53 pado com Tia May e meus problemas eles Peter Parker
acharam que eu estava esnobando!"

"O cara não tira os olhos


9 54 dos tubos de ensaio."
Gwen Stacy

"Ainda tenho uma grana das últimas


10 54 fotos que vendi pro [ameson. "
Peter Parker

11 58 "Passei aqui pra papear um pouco, May!" Amiga de Tia May

"Tô louca pra encher ele


12 59 Amiga de Tia May
de porrada!"

13 59 "Tô louco pra encher ele de porrada!" Capanga

"O desgraçado não pode com


14 60 todos nós!"
Capanga 2

15 61 "E nada me irrita mais do que bícões!" Homem-Aranha

16 52 "As coisas estão entrando nos eixos!" Peter Parker

17 56 "Sabe que detesto correr riscos!" Peter Parker

"Mesmo assim, vale correr qual~uer


18 18 Krauen
risco para destruir o maldito!
Peter Parker
19 57 "Vou dar um tempo!"

Kraven
20 65 "Ainda não entregou os pontos?"

21 66 "Tiramos a sorte grande!" Policial

22 63 "Dessa vez ela já era!" Capanga

"Você só está falando grosso


23 66 Kraven
para se encorajar!"

"Você pode ser bom com elefantes,


24 63 Homem-Aranha
mas é uma negação com aranhas."

Quadro 3 - Gírias na edição de Homem-Aranha publicada pela Abril

59
PAULO RAMos

o
material levantado fornece um volume consideravelmente
maior de gírias e expressões gírias. Como os dados são relativamente
recentes, de 1997, podemos perceber muitas construções familiares,
embora nem todas dicionarizadas. É o caso de vai nessa (caso 33),
conotando ideia de "continue pensando desse jeito, uma ironia ao fato
de a pessoa não mudar sua linha de raciocínio". (Você) não existe (caso
30) consta apenas no dicionário elaborado pelo Instituto Antônio
Houaiss (2001), que acusa a expressão como "ser excelente, boníssimo",
comum ao nível informal. Postulamos que tais sentidos, por serem
metafóricos e populares, configuram casos gírios.
O fato de o levantamento ter dados recentes traz também um
problema: nem todos são de fácil classificação. Encarar (caso 32)
encontra um registro em Gurgel (1998) e está dicionarizado no Houaiss
(2001). A ideia é a mesma, de "enfrentar". É um vocábulo polêmico por
estar na exata linha que separa a gíria de uma palavra dicionarizada e
incorporada ao léxico nacional. Embora seja passível de questio-
namentos, e considerando que consta em dicionário de gíria contem-
porâneo à publicação da revista em quadrinhos, postulamos que tal
vocábulo pode constituir gíria.

Figura 7- a•.• encarar o seu mau hálito!"

O mesmo problema vale para porrada (caso 13). Consta no


Houaiss (2001) e em Gurgel. O sentido é de "soco, pancada". As
observações feitas para encarar (caso 32) valem também para este caso.
A expressão se ferrou (caso 25) tem trajetória curiosa. Aparece
em Silva (1973), em forma não pronominal, com ideia de "dar facada,

60
o Uso DA GIRIA NAS HISTORIAS EM QUADRINHOS

achacar". Com o sentido de "dar-se mal", acompanhada de pronome,


encontra registro em Gurgel. Não consta, com essa conotação, no
Houaiss (2001). O distanciamento dos anos dará o espaço necessário
para afirmações mais precisas, mas podemos inferir que se trata de
vocabulário gírio recente, ainda não dicionarizado, embora antecipado
pelos quadrinhos.
Encher (caso 12) tem evolução semântica interessante. Nos anos
1950 e 60, tem sentido de "agredir, espancar". Em tese, reforçaria a
expressão do corpus encher de porrada (casos 12 e 13). Em 1970,
adquire conotação que resiste até hoje: "irritar". No Houaiss, foi dicio-
narizado, entre outros sentidos, como algo que "impõe carga excessiva'.
Polêmica lançada, adotamos ser gíria, com ideia próxima à das décadas
de 1950 e 60. Soma-se o fato de "encher" compor várias outras expres-
sões gírias dicionarizadas, tais como "encher o bolso" (igual a ganhar
muito dinheiro), "encher o saco" (equivalente a irritar) e "encher os
olhos" (satisfazer).
Se alguns vocábulos ou expressõessuscitam justa polêmica, outros
primam pela unanimidade. Em todos os dicionários de gíria con-
sultados, grana e cara foram citados. No Houaiss, grana (caso 10) consta
como própria de nível informal; cara (casos 2, 5, 6, 9 e 34) aparece
como já incorporada à língua. De qualquer modo, é interessante a
resistência das duas palavras. Desde os anos 1950, são vistas como gírias
e ligadas ao vocabulário mais popular.

Figura 8 - "Ainda tenho grana das últimas fotos que vendi ... "

61
PAULO RAMos

Ainda sobre a palavra cara, sua incidência é alta, assim como


ocorreu na Bloch. Cinco ocorrências ao todo, sendo uma delas com ideia
de "rosto, face", também presente em dicionários de gíria. Já é possível
dizer com mais segurança que foi uma das gírias preferidas pelos
tradutores do personagem para alcançar informalidade.
Em termos expressivos, há um considerável uso de gírias. Peter
ParkerlHomem-Aranha é caracterizado com um nível de fala mais
compatível à faixa etária adolescente. Há registro de 16 ocorrências gírias
do personagem, número bem maior que o usado pelas editoras an-
teriores. Mantém-se também a tendência de caracterizar os coadjuvantes,
aqueles que têm uma aparição esporádica na história, com nível de fala
informal. O destaque vai para os capangas, que se valem de seis
ocorrências gírias. Kraven, o vilão, também aproxima a fala de um uso
mais popular.
Há um evidente interesse maior pelo uso de gírias no caso da
Abril. Interesse maior e mais criterioso, tanto em relação à sua utilização
quanto às características dos personagens. Peter Parker é visualmente um
adolescente, caracterizado verbalmente como tal. O mesmo ocorre
quando atua como Homem-Aranha, o que fica claro nas várias ironias
feitas a seus oponentes. Nesse aspecto, há mais coerência em termos de
caracterização do personagem se compararmos às edições anteriores.

COMPARANDO AS TRÊS EDIÇÕES

Há inevitáveis semelhanças entre as três edições da história do per-


sonagem Homem-Aranha. Todas partem da mesma matriz americana e
das mesmas imagens. Todas se valem de gírias, em maior ou menor grau,
o que confirma a utilização de vocabulário gírio pelos quadrinhos. É nas
diferenças, no entanto, que reside nosso interesse.
A primeira constatação é com relação ao número de gírias ou
expressõesgírias utilizado. A quantidade aumenta com o passar dos anos:
18 em 1970,25 em 1976, 34 em 1997. Os números indicam que as
histórias em quadrinhos, como outras formas de mídia, passam a
prestigiar, com o passar dos anos, o vocabulário gírio e, por conse-
quência, popular.

62
o Uso DA GIRIA NAS HiSTORIAS EM QUADRINHOS

Um problema talvez resida no critério adotado para o uso das gírias.


Ou na falta de critério. Em todas as edições, os coadjuvantes usavam nível
de fala informal. Em parte dos casos, justifica-se. Os universitários, em
geral, têm faixa etária jovem. Os capangas talvez tenham origem ligada à
marginalidade. Nos demais, há uma espécie de normatização: é
personagem secundário, é marcado com caracterização informal.
Nos personagens principais, Peter ParkerlHomem-Aranha e o vilão
Krauen; há gritantes diferenças do ponto de vista de suas caracterizações.
A imagem utilizada pelas três editoras era rigorosamente a mesma. O
modo de falar dos protagonistas, no entanto, era distinto. Na EBAL,
temos um Peter ParkerlHomem-Aranha com nível de fala de adulto, bem
próximo à variante culta. A exceção era marcada principalmente pelo
uso das gírias. Nas edições seguintes, o personagem vai gradualmente
informa1izando seu modo de fala, o que se reflete no aumento de vo-
cabulário gírio. A B10chfigura numa posição intermediária: ora é formal,
ora informal. A Abril assume o nível informal, não só no uso de gírias,
como também de construções tipicamente orais. Um caso ilustra bem a
evolução das mudanças:

Figuras 9, 10 e 11 - "Mesma cena apresenta diálogos diferentes nas edições da


EBAL (à esquerda), da Bloch (ao centro) e da Abril.

A frase migra de uma construção mais próxima do formal,


na EBAL, para outras bem mais informais na B10che, principalmente, na
Abril. Há um continuum de níveis de fala, sendo o mais informal o da
versão da Abril, como exemp1ificaa frase "Tô louco pra encher ele de por-
radà'. Embora não seja o objetivo central deste estudo, merecem menção
as construções comuns à língua oral, como a redução do verbo estar
(estou/tô) e da preposição para (pra), além do uso de "ele" no lugar de
"10",como utilizado pela variante culta e comum às demais edições.

63
PAULO RAMos

Com Kraven, ocorre processo semelhante. Não utiliza nenhuma


gíria na edição de 1971 e tem nível de fala bem próximo do formal
culto. Na Bloch, ensaia as primeiras gírias, o que se repete na Abril. Se
analisarmos diacronicamente do ponto vista de caracterização verbal
dos personagens principais, temos três Peter ParkerlHomem-Aranha e
três Kraven.
Três gírias - choque, esnobado/esnobando e atrás de mim -
foram utilizadas em todas as edições. Talvez a maior importância não
esteja nas reincidências, e sim nas diferentes gírias utilizadas. Aparen-
temente, não há um critério para a escolha do vocabulário gírio. Seu
uso, no entanto, transmite informações relevantes. Nos três levan-
tamentos, houve casos de palavras que ainda não haviam sido registradas
pelos dicionários de gíria. Os casos mais evidentes são o de beleza,
registrado na EBAL, e dado um "gelo", na Bloch.
O caso mais relevante para este estudo de vocabulário de época é
seguramente boneca, visto na EBAL. Mostra que a escolha das gírias é
diretamente ligada ao momento histórico em que a narrativa é traduzi da.
O mesmo vocábulo, boneca, mudaria de sentido anos mais tarde,
ganhando conotação de pessoa homossexual ou travesti.

As HISTÓRIAS EM QUADRINHOS COMO UM DOCUMENTO


HISTÓRICO DA LÍNGUA ORAL

Iniciamos este artigo levantando uma série de questões e assumindo o


risco de fazer um estudo sobre tema pouco explorado, interligando
gírias e histórias em quadrinhos. É bem possível que outro pes-
quisador, caso consulte dicionários ou material diferentes do nosso,
venha a obter resultados não coincidentes. Conforme o corpus ou os
critérios adotados, duas análises podem seguir caminhos sensivelmente
distintos. O território das gírias, como já alertado por Urbano (2001),
é muito movediço.
Com base nos critérios evidenciados ao longo do estudo,
pudemos perceber aspectos extremamente relevantes do ponto de vista
sociolinguístico:

64
o Uso DA GIRIA NAS HISTóRIAS EM QUADRINHOS

a) Há um uso acentuado de gírias nas histórias em quadrinhos

-+ As gírias são uma das formas de caracterizar o nível de fala


informal dos personagens. Nas edições mais antigas (caso da
EBAL), o vocabulário gírio adquire importância ainda maior,
já que muitas vezes é o único indício de informalidade dentro
de uma construção mais próxima do formal.
-+ Não há um critério extremamente rigoroso na relação gíria /
caracterização do personagem. Nas edições antigas, é regra
coadjuvantes se valerem de gírias para configurarem nível de
fala informal; os personagens principais gozam de um
nivelamento no nível formal, tal qual constatado em estudo
de Preti, de 1973. Anos depois, o cenário é outro: na Abril, a
informalidade atinge praticamente todos os personagens, não
só os coadjuvantes.
-+ O aspecto verbal das histórias em quadrinhos, visivelmente
negligenciado pelas editoras ao longo dos anos por razões
ainda a serem exploradas a contento, é de suma importância
para reforçar a caracterização de um personagem; do contrário,
obtém-se uma uniformização de falas e, possivelmente, casos
de incoerência entre o aspecto visual e o que é representado
nos balões.

b) As histórias em quadrinhos seguem a tendência de outras mídias


e incorporam gradativamente as gírias

-+ Há um visível aumento no uso de gírias com o passar dos anos.


18 na EBAL, 25 na Bloch, 34 na Abril.
-+ O preconceito com o vocabulário popular, do qual fazem parte
as gírias, reduz-se com os anos. Um forte indicativo de que o
uso gírio nos quadrinhos não era totalmente natural na década
de 1970 são as aspas em gírias da Bloch ("gelo" e o "bom").
A gíria vinha indicada para o leitor. A contradição é que as
demais não eram acompanhadas de aspas, o que só reforça a
falta de critério e de experiência no trato com tais vocábulos.
Evidencia, também, que tanto produtores como leitores não

65
PAULO RAMos

estavam completamente acostumados a esse tipo de voca-


bulário na língua escrita. Saliente-se, no entanto, que o recurso
de marcar as gírias com aspas não é exclusivo da Bloch; a
própria EBAL costumava utilizar o recurso, embora não
apareça nenhum caso na história do Homem-Aranha publicada
pela editora. Na mesma edição da EBAL, no entanto, há uma
história do Quarteto Fantástico em que um dos personagens
diz que o outro é um "pão" (homem muito bonito ou
atraente), gíria em desuso nos dias de hoje.

c) Os dados permitem inferir que as gírias escritas reproduzidas nos


quadrinhos eram um possível reflexo do vocabulário oral popular
usado à época

-+ Muitas foram antecipadas nas histórias em quadrinhos. Só


seriam reconhecidas como gírias anos ou décadas depois.
Beleza e gelo corroboram a tese.
-+ Do ponto de vista histórico, as histórias em quadrinhos são
um promissor campo para o estudo do léxico gírio, embora
até o momento pouquíssimo explorado. Boneca talvez seja o
dado mais relevante. É um registro de época. Seu sentido, anos
depois, mudaria por completo.
-+ O vocabulário gírio nos quadrinhos permite pesquisas
diacrônicas, como a feita por nós, e até mesmo sincrônicas,
em que pode ser feita comparação entre dicionários de
uma determinada época, próxima ao levantamento de um
suposto corpus.

As histórias em quadrinhos se revelaram um campo extre-


mamente promissor para as pesquisas linguísticas. Limitamos o estudo
ao levantamento e análise de gírias. Seria interessante que fossem
realizadas outras abordagens, não só com vocabulário gírio, mas também
com aspectos expressivos, estilísticos, sintáticos. Há rico material para
isso, até o momento pouco estudado.

66
o Uso DA GIRlA NAS HISTóRIAS EM QUADRINHOS

REFERÊNCIAS

ALMANAQUE O HOMEM-ARANHA, Rio de Janeiro:


EBAL,1971.
ALVES, Ieda Maria. Em torno de um jargão técnico: o economês.
In: URBANO, Hudinilson et al. Dino Preti e seus temas:
oralidade, literatura, mídia, ensino. São Paulo: Cortez, 2001.
p. 173-180
EGUTI, Clarícia Akemi. A representatividade da oralidade nas histórias
em quadrinhos. São Paulo: FFLCH/USP, 200l.
[Dissertação de mestrado]
ESSENTIAL THE AMAZING SPIDER-MAN v. 2. Nova York:
Marvel Comics, 2002.
GURGEL, J. B. Serra. Dicionário de gíria: modismo linguístico -
o equipamento falado do brasileiro. 5a ed. Edição do autor: 1998.
HOMEM-ARANHA, Rio de Janeiro: Bloch, n? 14, 1976.
INSTITUTO ANTÔNIO HOUAISS. Diciondrio Houaiss da
língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
UNS, Paulo. Cidade de Deus. 2a ed. São Paulo: Companhia das
Letras, 200 l.
PRETI, Dino. O didlogo de ficção na mídia: Tv, Cinema e Teatro.
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