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Rudolf Steiner

Seres elementares e
seres espirituais

Sua existência e sua atuação

Duas conferências, proferidas


em Colônia, em 7 e 9 de junho de 1908, por ocasião de Pentecostes

Tradução:
Sérgio Corrêa
(primeira conferência)
Christa Glass
(segunda conferência)

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Os seres elementares, as almas de grupo e o eu humano
Em diferentes ocasiões já foi frisado que o desenvolvimento espiritual, tal como o
aspira o movimento da Ciência do Espfrito, precisa colocar o homem em viva relação com
todo o meio ambiente. Muita coisa, do meio ambiente, que ainda preenchia nossos ante-
passados de veneração, tornou-se morta e apagada para o homem. Um grande número de
pessoas adota uma postura alheia e fria, por exemplo, diante de nossas festas religiosas
anuais. À população urbana, em particular, só resta uma escassa recordação do que devem
significar as festas do Natal, da Páscoa e de Pentecostes.
Aquele poderoso conteúdo de sentimentos que ligava nossos antepassados às épocas
festivas, por conhecerem eles a relação com os grandes fatos do mundo espiritual, a
Humanidade de hoje não mais possui. Os homens, hoje, postam-se de maneira fria e
indiferente diante das festas do Natal, da Páscoa e, particularmente, também de
Pentecostes. A descida do Espírito tornou-se, para muitas pessoas, um fato abstrato. As
coisas só mudarão, só haverá vida e realidade, quando os homens chegarem a um
verdadeiro conhecimento espiritual do mundo todo.
Fala-se muito, hoje em dia, de forças naturais; porém, de entidades situadas atrás
dessas forças naturais fala-se bem pouco. Quando se fala de entidades naturais, o homem
de hoje considera o assunto como o reavivamento de uma antiga superstição. O fato de as
palavras que nossos antepassados usavam se basearem na realidade — quando alguém
afirma que gnomos, ondinas, silfos e salamandras significam algo real — só vale como
antiga superstição. O que os homens possuem em teorias e em idéias é, de imediato e em
certo sentido, indiferente; porém, se através dessas teorias os homens são tentados a
deixar de ver certas coisas e a empregar suas teorias na vida prática, só então o assunto
começa a ganhar seu pleno significado.
Tomemos um exemplo grotesco: quem crê em entidades cuja existência esteja ligada
ao ar, ou que estejam corporificadas na água? Quando, por exemplo, alguém diz “Nossos
antepassados acreditavam em certas entidades — em gnomos, ondinas, silfos, salamandras
—, mas isto tudo é coisa fantástica!”, temos vontade de revidar: “Pergunte, então, às
abelhas.” E se as abelhas pudessem falar, reponderiam: “Para nós os silfos não são
superstição, pois sabemos muito bem o que recebemos deles!” Ora, a pessoa cujos olhos
espirituais estão abertos consegue observar a força que atrai a abelhinha até à flor.
“Instinto, tendência natural”, como o homem responde, são palavras vazias. São entidades
o que conduz as abelhas ao cálice floral, para ali buscarem alimento; e no enxame de abe-
lhas todo, que enxameia em busca de alimento, há entidades ativas que nossos
antepassados denominavam silfos.
Em todo lugar onde reinos naturais diferentes se tocam, oferece-se uma
oportunidade para que certas entidades se manifestem. Por exemplo, no interior da Terra,
no ponto onde a pedra toca o veio metálico, nesse local se situam entidades especiais. Na
nascente, onde o musgo recobre a pedra e, em conseqüência, o reino vegetal toca o reino
mineral, estabelecem-se tais entidades. Onde animal e vegetal se tocam — no cálice
floral, no contato da abelha com a flor — corporificam-se determinadas entidades, do
mesmo modo como onde o homem entra em contato com o reino animal. Não, porém, no
decurso do contato corriqueiro. Não, por exemplo, quando o açougueiro esquarteja a rês
ou quando o indivíduo come a carne animal; não no decurso corriqueiro da vida — aí não é
o caso. Mas onde, em processos extraordinários, os reinos se tocam como que através de
um excesso de vida, como no caso das abelhas e da flor, corporificam-se entidades. E em
especial onde a índole do homem, seu intelecto, está particularmente empenhado no
relacionamento com os animais, numa relação como a que tem, por exemplo, o pastor

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com as ovelhas — uma relação da índole —, aí se corporificam tais entidades.
Tais relações mais íntimas do homem com os animais, encontramo-las mais
freqüentemente remontando a tempos antigos. Em épocas de culturas inferiores tinha-se,
muitas vezes, uma relação como a que o árabe tem com seu cavalo, e não como a do
proprietário de uma coudelaria com seus cavalos de corrida. Aí encontramos aquelas
forças da índole que atuam de reino para reino, como entre o pastor e as ovelhas — ou
onde forças de odor ou de sabor são desenvolvidas e se irradiam, como entre a abelha e a
flor; aí é criada oportunidade para que entidades bem determinadas possam corporificar-
se. Quando a abelha suga a flor, o clarividente pode observar como se forma uma pequena
aura na borda desta. Eis o efeito do sabor: a picada da abelha no cálice floral tornou-se
um certo agente de sabor — a abelha sente o sabor — e irradia como uma aura floral, que
é alimento para entidades sílficas. De igual modo, o elemento do sentir que atua entre o
pastor e as ovelhas é alimento para salamandras.
A pergunta que segue não vale para quem compreende o mundo espiritual: por que,
então, as entidades estão aí e não nos outros lugares? A respeito de sua origem, não
podemos perguntar; sua origem situa-se no Universo. Dando-lhes, porém, oportunidade
para se alimentarem, as entidades surgem. Por exemplo, maus pensamentos que o homem
derrama atraem entidades nocivas para sua aura, porque aí elas encontram alimento.
Então certas entidades corporificam-se em sua aura.
Por toda parte onde reinos naturais diferentes se tocam, oferece-se oportunidade
para que determinadas entidades espirituais se corporifiquem. No local onde o metal se
aconchega à pedra, no interior da Terra, quando o mineiro corta o solo o vidente vê, em
diferentes lugares, seres singulares encolhidos, juntos, acocorados num espaço muito
pequeno. Eles se espalham, dispersam-se quando a terra é removida. São entidades
singulares que, por exemplo, em certo sentido não são, de modo algum, dessemelhantes
do homem. Eles não têm, com efeito, um corpo físico, mas têm inteligência. O que os
diferencia do homem é o fato de possuírem inteligência sem responsabilidade. Daí
tampouco terem o sentimento de algo errado no caso das diversas peças que pregam ao
ser humano. Essas entidades chamam-se gnomos; numerosas espécies deles são abrigadas
pela terra, sendo que em casa se situam nos locais onde a pedra entra em contato com o
metal. Antigamente serviram muito bem ao homem, nas antigas minas — não nas minas de
carvão, mas nas minas de metal. A maneira como nos tempos antigos se construíam as
minas, o conhecimento sobre como estavam depositadas as camadas, foi aprendido
através dessas entidades. E os veios melhor dispostos eram conhecidos por essas entidades
que sabiam como as camadas estavam depositadas no interior da Terra e que, por
conseguinte, podiam dar a melhor instrução sobre como isso deveria ser trabalhado. Caso
não se queira trabalhar com as entidades espirituais, confiando só no sensorial, chega-se a
um beco-sem-saída. Precisamos aprender, com essas entidades espirituais, uma certa
maneira de proceder para explorar a Terra.
De igual maneira, na fonte tem lugar uma corporificação de entidades. No local onde
a pedra toca a fonte, corporificam-se os seres ligados ao elemento da água: as ondinas.
Onde o animal e vegetal se tocam, atuam os silfos. Os silfos estão ligados ao elemento do
ar; eles conduzem as abelhas às flores. Assim, devemos quase todos os conhecimentos
úteis da apicultura às antigas tradições, e justamente no caso da apicultura podemos
aprender muito com elas. Ora, o que hoje existe como ciência acerca de abelhas está
cheio de erros, e a antiga sabedoria, que se propagou pela tradição, só é confundida por
causa disso. A ciência prova-se, aí, como algo inaproveitável. Úteis são apenas os antigos
manejos, cuja origem é desconhecida porque naquela época o homem usava o mundo espi-
ritual como fio condutor.

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Os homens de hoje em dia conhecem também a salamandra, pois quando alguém diz
“Algo vem ao meu encontro, mas não sei de onde vem”, isto constitui, na maioria das
vezes, o efeito das salamandras.
Quando o homem entra em íntima ligação com os animais, como o pastor com suas
ovelhas, recebe conhecimentos segredados por entidades que vivem em seu meio
ambiente. Ao pastor foi segredado, pelas salamandras de seu meio ambiente, o saber que
ele tem a respeito de seu rebanho de ovelhas. Hoje em dia esses antigos conhecimentos
estão desaparecidos, precisando ser novamente obtidos por meio de conhecimentos
ocultos bem provados.
Se continuarmos pensando sobre essas idéias, teremos de dizer-nos: estamos
totalmente cercados por entidades espirituais! Andamos através do ar, que não é só
substância química: cada sopro de vento, cada corrente de ar é manifestação de entidades
espirituais. Estamos cercados e totalmente permeados por essas entidades espirituais; e
caso não queira experimentar, no futuro, um destino bem triste e ressecador de sua vida,
o homem precisa ter um conhecimento daquilo que vive ao seu redor. Sem esse
conhecimento, não conseguirá mais prosseguir. Ele precisa perguntar-se: de onde provêm
essas entidades? de onde vêm elas?
Essa pergunta conduz-nos a um conhecimento importante, e para formarmos uma
opinião a respeito precisamos ter em mente como, nos mundos superiores, desenrolam-se
certos fatos por cujo intermédio o que é nocivo e mau é metamorfoseado em bom por uma
direção sábia. Tomemos como exemplo o dejeto, o esterco: ele é descartado e atua na
economia, através de uma utilização sábia, como base para a posterior germinação de
vegetais. Coisas aparentemente despojadas pelo desenvolvimento superior são novamente
recolhidas por forças superiores e metamorfoseadas. Isto se nos antepõe de modo muito
particularmente forte nas entidades das quais falamos, e reconhecemos isso em medida
bem especial ao nos ocuparmos da origem dessas entidades.
Como se originam, então, entidades salamândricas? Expliquemos isso. Salamandras
são entidades que necessitam de uma certa relação do homem com o animal. Os animais
não possuem um eu, tal como o homem o possui. Tal eu só existe no homem de hoje, na
Terra. Esses eus humanos são de tal natureza que cada homem tem um eu encerrado em
si. No caso dos animais é diferente: os animais têm um eu grupal, uma alma grupal. O que
significa isso? Um grupo de animais da mesma espécie e de configuração idêntica tem um
eu comum; por exemplo, todos os leões individuais têm um eu conjunto, bem como todos
os tigres, todos os lúcios.
Os animais têm seu eu no mundo astral. É como se um homem estivesse atrás de uma
parede com dez orifícios e, através desses, enfiasse seus dez dedos. Não seria possível ver
o homem, mas qualquer cabeça sensata concluiria: aí atrás há um poder central que
pertence aos dez dedos. Assim ocorre com o eu grupal. Os animais individuais são apenas
os membros. Aquilo a que pertencem está no mundo astral. Esses eus animais não são
semelhantes aos humanos, embora considerados espiritualmente permitam-se comparar
bem, pois um eu grupal animal é uma entidade muito, muito sábia. O homem, como alma
individual, está longe de ser tão sábio. Consideremos, por exemplo, determinadas
espécies de pássaros: que sabedoria deve estar aí contida, para que eles migrem para
altitudes e direções bem determinadas a fim de escapar do inverno e, na primavera,
retornem por outros caminhos! Nesse vôo de pássaros reconhecemos forças de atuação
sábias, dos eus grupais. Podemos encontrá-las em toda parte, no reino animal.
Os homens são muito mesquinhos quando têm de registrar os progressos humanos.
Recordemo-nos de nossas aulas na escola, quando aprendemos como, na Idade Média,
pouco a pouco surgiu a corrente da época moderna. A Idade Média seguramente tem

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coisas significativas a registrar, como o descobrimento da América, a invenção da pólvora,
a arte de imprimir livros e, finalmente, também o papel de linho. Foi, sem dúvida, um
progresso significativo usar esse produto em lugar do pergaminho; entretanto, a alma
grupal das vespas já havia feito o mesmo há milhares de anos, pois o vespeiro é feito
precisamente do mesmo material que o papel produzido pelo homem: compõe-se de
papel.
Só gradualmente o homem vai descobrir como certas combinações de seu espírito se
relacionam com aquilo que as almas grupais elaboraram dentro do mundo.
As almas grupais estão em movimentação contínua. O vidente vê, ao longo da espinha
dorsal dos animais, um cintilar contínuo. A espinha dorsal fica como que encerrada em
cintilação luminosa. Os animais são perpassados por correntes que, em número infinito,
fluem em todas as direções ao redor da Terra toda e atuam sobre os animais fluindo em
torno da medula espinhal. Essas almas grupais de animais estão continuamente em
movimento circular, em todas as alturas e direções, em torno da Terra. São elas muito
sábias, mas falta-lhes algo que ainda não têm: elas não conhecem o amor, tal como é
chamado na Terra. Amor ligado à sabedoria só existe no homem, na individualidade.
A alma grupal é sábia, mas o animal individual possui amor na qualidade de amor
sexual e amor aos pais. O amor no animal é individual, mas a organização sábia, a
sabedoria do eu grupal, ainda é vazia de amor. O homem tem amor e sabedoria
unificados; o animal tem o amor na vida física mas, no plano astral, tem a sabedoria. Com
tais conhecimentos, acende-se para o indivíduo um número colossal de luzes.
O homem só chegou a seu eu atual gradualmente. Anteriormente ele também teve
uma alma grupal, e só gradualmente a alma individual se desenvolveu. Façamos um
acompanhamento retrospectivo do desenvolvimento da Humanidade até a antiga
Atlântida. Nos velhos tempos o homem vivia na antiga Atlântida, um continente que agora
está coberto pelo Oceano Atlântico. Naquela época, as amplas superfícies siberianas
estavam cobertas por grandes mares. O mar Mediterrâneo era então dividido de maneira
bem diferente. Também em nossas regiões européias havia amplas superfícies marftimas.
Quanto mais longe retrocedemos na antiga época atlântica, tanto mais se modificam todas
as condições de vida, tanto mais se modificam o estado vígil e o estado de sono no
homem.
Hoje, quando o homem dorme, permanecem no leito o corpo físico e o corpo etérico.
O corpo astral e o eu se retiram. A consciência se apaga — tudo se torna escuro, negro,
mudo. Na época atlântica, a diferença entre sono e vigília ainda não era tão grande. Em
estado de vigília o homem ainda não via contornos tão firmes, perfis tão nítidos, cores tão
intensas, ligados às coisas. Quando acordava, pela manhã, mergulhava como que em uma
massa nebulosa. Não havia nitidez maior do que quando, por exemplo, vemos luzes
passando através da neblina, com uma aura. Em compensação, sua consciência não
cessava completamente durante o sono, e então ele via as coisas espirituais.
À medida que o homem progredia o mundo físico ganhava sempre mais seus
contornos, mas em compensação o homem perdeu sua clarividência. Então a diferença
passou a ser cada vez maior: em cima, o mundo espiritual tornou-se cada vez mais
obscuro; embaixo, o mundo físico ficou cada vez mais claro. É do tempo em que o homem
ainda percebia as coisas lá em cima, no mundo astral, que derivam todos os mitos e
lendas. Ascendendo ao mundo espiritual ele conhecera Wotan, Baldur, Thor, Lokí1 e
entidades que ainda não haviam descido ao plano físico. Isto se vivenciava no passado; e
todos os mitos são recordações de realidades vivas.

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Personagens da mitologia germânica. (N.R.)

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Todas as mitologias são recordações desse tipo. Essas realidades espirituais
simplesmente desapareceram para o homem. Naqueles tempos, quando pela manhã
mergulhava no corpo físico, ele tinha a seguinte sensação: “Tu és uma unidade, algo
único.” À noite, porém, quando mergulhava de volta no mundo espiritual, vinha-lhe o
seguinte sentimento: “Tu não és único, és apenas um membro de uma grande totalidade;
fazes parte de uma grande comunidade.”
Tácito ainda conta que os antigos povos — os hérulos, os queruscos — sentiam-se mais
como tribo que como indivíduos separados. A partir desse sentimento de que o indivíduo
fazia parte do grupo tribal, de que ele se atribuía à comunidade tribal, originaram-se
ainda certos costumes como a vingança de morte baseada no sangue. Tudo era um corpo
que pertencia ao todo da alma grupal da tribo. Na evolução, tudo acontece gradualmente.
Só a partir dessa consciência grupal-tribal absoluta desenvolveu-se, pouco a pouco, a
consciência individual.
Também nas descrições da época dos patriarcas temos vestígios da passagem da alma
grupal para a alma individual. No tempo de Noé, a memória era bem diferente: ela
alcançava além daquilo que o pai, o avô, o bisavô haviam vivenciado. A fronteira do
nascimento não era fronteira. No mesmo sangue fluía a mesma recordação, alcançando
gerações situadas longo tempo atrás. Hoje em dia, interessa às autoridades saber o nome
do indivíduo. Naquela época, em que o ser humano se recordava do que seu pai e seu avô
haviam feito, isto era caracterizado por um nome coletivo. Aquilo que naquela época
estava ligado pelo mesmo sangue e pela mesma recordação era designado coletivamente.
Chamava-se isso de “Adão” ou “Noé”. Nomes como Adão e Noé não designam a vida entre
nascimento e morte de um indivíduo, mas sim o fluxo das recordações. Os nomes antigos
abrangem comunidades completas de pessoas que viveram na época.
O que ocorre, então, quando comparamos certas entidades — os macacos,
semelhantes ao homem — ao próprio homem? A prodigiosa diferença está no fato de que
os macacos têm uma alma grupal e o homem uma alma individual, ou, pelo menos, uma
disposição para desenvolver tal alma. A alma grupal dos macacos encontra-se numa
situação muito especial. Imaginemos a Terra [é feito o desenho]. Aqui em cima, no mundo
astral, pairam como numa nuvem as almas grupais dos animais, espalhando-se por sobre
nosso mundo físico. Tomemos agora o eu grupal dos leões e o eu grupal dos macacos. Cada
leão é um membro individual em que a alma grupal instila uma parte de sua substância.
Quando morre um leão, desprende-se da alma grupal o físico exterior, tal como no homem
a unha de um dedo. Então a alma grupal toma de volta o que havia instilado naquele corpo
e o entrega a um outro leão que nasce. A alma grupal permanece lá no alto. Ela estende,
por assim dizer, tentáculos que no físico se endurecem, depois se desprendem e voltam a
ser substituídos.
Por isso a alma grupal animal não conhece nascimento e morte. O animal individual é
algo que se desprende e volta a aderir; a alma grupal permanece intocada pela vida e pela
morte. No caso dos leões, a cada vez que um deles morre, tudo o que havia sido
transmitido pela alma grupal retorna a ela. Contudo, no caso do macaco não sucede assim.
Existem animais individuais que arrancam da alma grupal algo que depois não consegue
retornar. Quando o macaco morre, a parte essencial retoma, desligando-se2 porém um pe-
daço da alma grupal. O macaco como que amarra firme demais o que lhe é estendido, e
com sua morte desliga-se um pedaço da alma grupal — de certa maneira um pedaço dela
se desprende, é arrancado e não consegue retornar. Assim ocorrem desligamentos da alma

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O verbo “desligar” traduz aqui o verbo alemão abschnüren, que significa separar/seccionar alguma coisa por
meio de estrangulamento, com o uso de um cordel. No mesmo sentido se usará a seguir a palavra
“desligamento”. (N.T.)

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grupal. Em todos os tipos de macacos ocorrem desligamentos da alma grupal.
Semelhantemente ocorre com certos anfíbios, com certos tipos de aves e, de maneira
particularmente nítida, também com o canguru. Por meio desses desligamentos, algo da
alma grupal fica para trás; e aquilo que assim remanesce de animais de sangue quente
torna-se um ser elementar, um espírito da Natureza — a salamandra. Esses seres
elementares, esses espíritos da Natureza são, portanto, como que restos, produtos
residuais de mundos superiores tomados a serviço de entidades superiores. Se estivessem
entregues a si próprios, iriam perturbar o Cosmo. Assim, a sabedoria superior emprega,
por exemplo, os silfos para conduzir as abelhas às flores. Assim, a grande multidão dos
seres elementares é colocada sob a sábia direção superior e, destarte, o que eles
pudessem fazer de prejudicial é transformado em proveitoso.
Assim acontece nos reinos situados abaixo do homem. Pode ocorrer também que o
próprio ser humano se desligue de sua alma grupal e não encontre, como alma individual,
possibilidade alguma de continuar a desenvolver-se. Ora, enquanto na condição de mem-
bro de sua alma grupal ele era dirigido e conduzido por entidades superiores, agora ficou
entregue à sua própria direção. Se não assimilar os conhecimentos espirituais condizentes,
correrá o risco de desligar-se. É isto o que se apresenta como questão.
O que é, então, que preserva o indivíduo do desligamento, da divagação sem sentido
ou objetivo, enquanto no passado a alma grupal lhe havia dado um sentido? Precisamos ter
em mente que o homem se individualiza cada vez mais, e que no futuro terá de encontrar
sempre mais e mais, voluntariamente, a união com outros homens. No passado a união
existia por meio da consangüinidade, por meio de tribos e raças. Porém essa união chega
mais e mais ao fim. Tudo no homem se direciona cada vez mais no sentido de ele se tornar
um homem individual. Eis que só é possível um caminho inverso. Imaginem um número de
indivíduos, sobre a Terra, dizendo a si mesmos: “Seguimos nosso próprio caminho;
queremos encontrar em nosso próprio interior o sentido e o objetivo do caminho; estamos
todos em vias de tornar-nos homens cada vez mais individuais.” Aí existe o perigo da dis-
persão. Já hoje os homens tampouco sustentam mais uniões espirituais. Já chegamos
atualmente ao ponto de cada um ter sua própria religião e colocar sua própria opinião
como o ideal mais elevado. Mas se os homens interiorizarem ideais, isso levará à união, à
opinião comum. Reconhecemos interiormente, por exemplo, que três vezes três é igual a
nove, ou que os três ângulos de um triângulo somam 180 graus. Isto é um reconhecimento
interior. Não podemos submeter à votação conhecimentos interiores; não existem diferen-
ças de opinião sobre conhecimentos interiores — eles levam a união. Todas as verdades
espirituais são dessa ordem. O que a Ciência Espiritual ensina o homem encontra por meio
de suas forças interiores. Estas o conduzem a uma unidade absoluta, à paz e harmonia.
Não existem duas opiniões sobre uma verdade sem que uma delas seja errada. O ideal é a
maior interiorização possível; ela leva à unidade, à paz.
Primeiramente, havia uma alma grupal humana. Depois, em tempos passados, a
Humanidade foi libertada da alma grupal. Mas no futuro do desenvolvimento os homens
precisam estabelecer um objetivo mais seguro para si, ao qual aspirem. Quando homens se
unem numa sabedoria superior, desce por sua vez, de mundos superiores, uma alma grupal
— quando surgem, das sociedades naturalmente ligadas, sociedades livres. O desejo dos
dirigentes do movimento da Ciência Espiritual é que nela encontremos uma sociedade em
que os corações anseiem pela sabedoria, tal como as plantas anseiam pela luz solar. Onde
a verdade comum liga diferentes eus é dada, à alma grupal superior, a oportunidade de
descer. Ao voltarmos nossos corações conjuntamente para uma sabedoria superior,
acomodamos a alma grupal. De certa maneira formamos o leito, o ambiente no qual a
alma grupal pode corporificar-se. Os homens enriquecerão a vida terrena ao desenvolver

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algo que faça descerem entidades espirituais dos mundos superiores. Este é o objetivo do
movimento da Ciência Espiritual.
Isto foi colocado certa vez diante da Humanidade de forma grandiosa, poderosa, para
mostrar que sem esse ideal espiritual o homem passaria a uma condição diferente; há um
símbolo que pode mostrar ao homem, com força imponente, como a Humanidade pode
achar o caminho para, em união espiritual, oferecer ao espfrito coletivo um lugar para
corporificação. Esse símbolo nos é apresentado pela Comunidade Pentecostal, quando o
fervoroso sentimento coletivo de amor e devoção aqueceu um número de homens que se
havia reunido para uma ação coletiva. Ali estava um número de homens cujas almas ainda
estremeciam de tal modo pelo acontecimento comovente que o mesmo ainda vivia em
todos. Pelo confluir desse sentimento uno, igual, eles proporcionaram aquilo em que algo
superior, uma alma coletiva, pôde corporificar-se. Isto é expresso pelas palavras que
dizem que o Espírito Santo, a alma grupal, desceu e se dividiu como línguas de fogo. Este
é o grande símbolo para a Humanidade do futuro.
Se não houvesse encontrado essa ligação, o homem se teria tornado um ser
elementar. Agora a Humanidade precisa procurar um local para as entidades dos mundos
superiores que se inclinam para baixo. Nos eventos da Páscoa foi dada ao homem a força
para acolher em si tais representações poderosas e a aspirar a um espírito. A festa de
Pentecostes é fruto do desdobramento dessa força.
Incessantemente, pelo confluir das almas para a sabedoria coletiva, deve efetuar-se
aquilo que estabelece uma relação viva com as forças e entidades dos mundos superiores e
com algo que hoje ainda tem tão pouco significado para a Humanidade, como a festa de
Pentecostes. Através da Ciência Espiritual ela tornará a ser algo para o homem. Quando as
pessoas vierem a saber o que a descida do Espfrito Santo significará no futuro para os
homens, a festa de Pentecostes voltará a tornar-se viva. Então não mais será somente uma
recordação daquele evento em Jerusalém; surgirá para os homens aquela sempre
permanente festa de Pentecostes da aspiração anímica conjunta. Transformar-se-á em
símbolo para aquela futura grande comunidade pentecostal, quando a Humanidade se
encontrar conjuntamente numa verdade comum, para dar a entidades superiores a
possibilidade de se corporificarem. Dependerá dos próprios homens o quão valiosa a Terra
será, por esse meio, para o futuro, e quão eficazes podem ser esses ideais para a
Humanidade. Se a Humanidade se esforçar, desta maneira correta, no sentido da
sabedoria, os espfritos superiores se ligarão aos homens.

O homem como espiritualizador do mundo

Na última palestra consideramos alguns seres espirituais situados abaixo do homem,


alguns dos quais têm capacidades comparáveis às capacidades humanas; falta-lhes,
porém, o sentimento de responsabilidade. Vimos como eles devem ser considerados restos
da evolução, que se tornariam empecilhos caso ficassem entregues a si próprios; como,
entretanto, são usados sob uma sabedoria superior, e como são transformados de seres
nocivos em bons.
Desejamos, hoje, incrementar a multidão desses seres com alguns outros, que
consideraremos com o fim de mostrar como ocorre a atuação conjunta do ser humano com
esses seres. Primeiramente desejamos partir do fato de, a cada vez que a noite chega, o
homem passar pela mudança do estado de vigília para o estado de sono. Sabemos que,
estando o homem em estado diurno de vigília, seus quatro membros se encontram unidos
entre si, penetram-se reciprocamente. Além disso, lembremo-nos de que a cada noite o
corpo astral e o eu elevam-se para fora dos corpos físico e etérico. Assim, pois, vemos

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surgir à noite, a partir dessa união humana, a partir da entidade humana
quadrimembrada, duas entidades diferentes entre si. No leito permanecem o corpo físico
e o corpo etérico; no exterior ficam o corpo astral e o eu.
Para o homem atual, à noite apresentam-se condições bem diferentes do que de dia.
Podemos comparar o estado de consciência do homem atual, durante a noite, com o
estado de consciência dos vegetais, O vegetal tem o estado de consciência do sono sem
sonhos. Os homens, no sono, também são tomados por uma espécie de consciência
vegetal. À noite, nos mundos espirituais, o ser humano também está em estado de sono
sem sonhos.
Juntemos a essas representações a de que cada um dos membros da entidade
humana tem sua expressão no corpo físico. O corpo físico é, por assim dizer, o resultado
dos membros básicos do homem. O eu tem sua expressão no sangue, o corpo astral tem
sua expressão no sistema nervoso, o corpo etérico tem sua expressão no sistema glandular
e o sistema sensório coloca-se como expressão do corpo físico. Se virmos no corpo físico
do ser humano a expressão da revelação dos diversos membros, teremos então de dizer-
nos que a circulação sangüínea existe através do eu individual. Nenhum sistema nervoso
pode existir sem que o corpo astral crie e estruture esse sistema nervoso. À noite
retiramos do corpo físico o corpo astral e o eu, mas não o sistema nervoso e o sangue.
Contudo, o sangue e o eu se pertencem, bem como se pertencem o corpo astral e o
sistema nervoso.
À noite o homem se comporta com extremo desprezo perante seu corpo físico. Para
que o homem tivesse instrumentos adequados ao eu e o corpo astral, o sangue e o sistema
nervoso tiveram de surgir. No entanto, à noite ele abandona o sangue e o sistema nervoso.
Seria impossível a um corpo físico, com sangue e sistema nervoso, subsistir, mesmo que
por um segundo, sem o corpo astral e o eu. O vegetal pode subsistir sem estes por não
possuir sistema nervoso nem sistema sangüíneo. Encontraríamos o corpo físico morto pela
manhã se, durante a noite, estivéssemos dependendo só de nós mesmos. Tiramos do corpo
físico as forças superiores — o corpo astral e o eu — que dele devem cuidar. O que
deixamos de fazer durante a noite tem de ser feito por outras entidades. A noite elas
penetram nos corpos físico e etérico, mergulham nesse corpos. A cada noite, entidades
espirituais elevadas alojam-se no corpo físico e no corpo etérico humanos e desempenham
o trabalho que, durante a vida diurna, são propriamente desempenhados pelo eu e pelo
corpo astral. Entidades elevadas e sublimes, que em tempos idos criaram o corpo físico e o
corpo etérico do homem, são as que tornam a encarregar-se dos mesmos durante a noite.
À noite, o corpo astral e o eu ficam em cima, no mundo superior; o corpo físico e o corpo
etérico permanecem embaixo. Estes são abandonados, à noite, pelo corpo astral e pelo
eu. Na mesma medida em que são abandonados pelo corpo astral e pelo eu, instalam-se
neles forças de entidades superiores.
O corpo etérico do ser humano não é o mesmo que o corpo etérico do vegetal.
Durante a noite afluem, para dentro dos corpos físico e etérico do ser humano, forças
superiores advindas de um mundo superior. Pode acontecer o seguinte: durante a
consciência diurna, o homem atua constantemente sobre o corpo físico e o corpo etérico.
Quando ele pensa e sente, isto se desenrola no corpo astral mas passa ao corpo etérico e
ao corpo físico, imprimindo-se neles. Primitivamente, o corpo físico e o corpo etérico
provinham puramente da vontade das entidades superiores. Quando, porém, o homem se
tornou consciente do eu, essas influências safram do corpo etérico e do corpo físico.
Aquilo que vive na alma não deixa de atuar sobre o corpo físico e o corpo etérico. O
anatomista naturalmente não consegue determinar quais modificações ocorrem no corpo
físico e no corpo etérico humanos, mas elas ocorrem. Quando o homem mente, ocorre um

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grande efeito no corpo físico e no corpo etérico. Mentira e dissimulação são processos que
ocorrem na alma e no eu. Do ponto de vista materialista, pode-se crer que mentiras só se
desenrolam no interior. Mas o observador oculto sabe que através delas ocorrem
modificações até no corpo físico, até na estrutura. Tais modificações ocorrem também
com as numerosas mentiras convencionais que vivem no mundo. Lancemos o olhar sobre a
realidade material: sabemos como nossa vida está permeada de toda sorte de inverdades.
Quando as pessoas dizem a si algo que não corresponde inteiramente ao que pensam, isto
é como a estampa de um sinete no lacre. Essa estampa permanece. Toda dissimulação,
inverdade, calúnia, permanecem qual uma estampa no corpo físico. À noite, quando o
homem abandona seu corpo físico e seu corpo etérico, pode-se ver tais estampas. Então
chegam as entidades dos mundos superiores, encontrando ali essas impressões. Isto não é
compatível com os mundos superiores. Com isto surge algo novo, algo totalmente novo é
criado. Das entidades superiores são então desligados, por intermédio do corpo físico,
seres que depois passam a viver uma existência autônoma por entre nossos mundos. Na
Ciência Oculta denominamo-los Fantomas.3 Denominamo-los assim porque estão mais pró-
ximos da percepção física. Além disso, são seres com leis físicas. Eles esvoaçam por nosso
espaço. Detêm o desenvolvimento humano. Fazem com que as coisas que vivem no mundo
fiquem piores do que seriam sem sua presença. Esses fantomas são seres que os homens
criam através das mentiras, dissimulações e assim por diante, e que detêm o
desenvolvimento.
O fato de conhecermos a atuação das entidades espirituais ajuda-nos mais do que
prédicas morais. Uma Humanidade futura saberá o que estará criando através de mentiras,
de dissimulações e de calúnias. E conhecendo os fatos que se cria a moral mais eficaz, e
não por meio de príncipios morais. Através da fundamentação da existência pela Ciência
Espiritual são criados os mais fortes estímulos e impulsos da moral. Os fantomas são
também uma espécie de seres naturais que estão aí por serem criados pela atividade do
homem. À noite o homem abandona o corpo físico e deixa, impressas nele, as estampas do
sinete da mentira, da dissimulação e assim por diante. De manhã, quando ele regressa,
primeiramente esses fantomas saem do corpo físico.
Também o corpo etérico pode ser influenciado de maneira a produzir seres que dele se
desligam. São novamente certos processos no mundo dos homens que fazem com que tais
desligamentos ocorram por meio do corpo etérico. Todas as coisas como leis injustas e
más que castigam erradamente, instituições iníquas numa comunidade social, retroagem
sobre o corpo etérico de tal forma que dele se desligam aqueles seres de que hoje, em
nossa época supersticiosa, só zombamos. Esses seres são espectros, fantasmas. Fantasmas
verdadeiros são aqueles a cuja classe ou ordem pertencem tais seres. Os homens deveriam
esforçar-se por constituir suas instituições tão bem quanto possível, para não criar seres
deste tipo.
Voltemos, agora, nosso olhar para o eu e o corpo astral durante a noite.
Consideremos que também o corpo astral e o eu se encontram numa situação especial no
homem. Eles se adaptaram à vida do sangue e dos nervos. Sobre o corpo astral e o eu
fluem também, durante a noite, forças superiores que descem de um mundo superior.
Quando o indivíduo leva consigo determinadas coisas de sua vida diurna, volta a ter lugar
um processo de desligamento. São novamente coisas da vida anímica que produzem o
processo de desligamento. Imaginemos que duas pessoas tenham duas opiniões diferentes.
Uma tenta convencer a outra, tendo ânsia de convencê-la. Esta ânsia está muito difundida
entre as pessoas, hoje em dia. As pessoas deveriam apresentar sua opinião e esperar,

3
Neologismo proposital traduzido de Phantom, distinguindo-se de “fantasma”, tradução usada mais adiante
para o termo alemão mais comum Gespenst, empregado pelo Autor para caso diverso. (N.R.)

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vendo se no interlocutor se mexem forças pelas quais este aceita a opinião. Existem
indivíduos tão fanáticos pelas próprias opiniões que não ficam satisfeitos quando não se
encontram em condições de levar coercitivamente sua opinião ao outro. Quando acontece
algo assim, são prejudicados ambos os corpos astrais. Eles levam consigo persuasão e
falsos conselhos. O que é lançado ao fundo dos corpos astrais dá origem ao fato de durante
a noite se desligarem do corpo astral seres que denominamos demônios.
Esses seres demoníacos têm uma influência particularmente desfavorável sobre o
nosso desenvolvimento humano. Eles esvoaçam pelo espaço espiritual e impedem os
homens de desenvolver suas concepções pessoais. Imaginem o quanto se peca nesse
sentido nos cafés, nas mesas de bar! Aí são empenhadas, continuamente, forças para a
formação de demônios. Estes se insinuam na alma humana. Indague-se o quanto ocorre
neste ou naquele processo judicial — como é que as pessoas depõem! Elas estão
convencidas e, no fundo, não prestam juramento falso algum, porque estão convencidas.
Certa vez combinou-se um evento que decorreu conforme o programado. Trinta pessoas
deviam descrevê-lo. Duas descreveram o acontecimento corretamente; todas as demais
vinte e oito, porém, acrescentaram coisas que não haviam ocorrido. Daí advém toda sorte
de influências de seres demoníacos formados dessa maneira. Não há, para o homem, outro
meio que não seja o reconhecimento desses fatos para saber o que fazer para livrar-se das
influências desses seres espirituais nocivos. Em todo lugar em que exista oportunidade
para esses seres exercerem suas influências devastadoras, eles estão presentes. Na sala de
audiência do tribunal o observador ocultista pode ver isso. Os seres atuam sempre no
sentido pelo qual surgiram. Os seres que surgiram por meio de leis iníquas voltam a atuar
de maneira a induzir os homens a leis iníquas.
O homem deve olhar para dentro do mundo espiritual a fim de se tornar prático e não
criar constantemente obstáculos. Se passarmos uma vista d’olhos sobre o assunto recém-
abordado, teremos de concordar que, durante sua vida diurna, o homem dá motivos a que
surja toda sorte de seres espirituais, de seres elementares. Temos de perguntar-nos qual
significado têm esses seres para o desenvolvimento futuro da Humanidade. Olhemos
retrospectivamente para épocas antigas, quando nossos antepassados viveram no mundo
atlântico. Se retrocedêssemos suficientemente longe no antigo desenvolvimento atlântico,
chegaríamos ao ponto de gradualmente encontrar homens com uma configuração bem
diferente. Imaginemos retroceder até aproximadamente a metade da época atlântica. Aí
temos de imaginar os homens de tal forma que a parte do corpo etérico situado hoje em
nossa cabeça sobressaísse, naquela época, bem acima da cabeça física, tal como hoje
ainda é perceptível, ao clarividente, no cavalo. Isto é ainda especialmente acentuado no
elefante. Ele tem uma saliência diante e acima de sua atual cabeça física. Esse era o caso
do homem na antiga Atlântida. O avançar no desenvolvimento consistia em que essas
partes se juntassem mais, de modo tal que hoje a cabeça etérica e a cabeça física do
homem quase se justapõem.
Primitivamente, o homem tinha uma clarividência crepuscular. Quando mergulhava
em seu corpo físico durante o dia, via não os contornos firmes, mas os objetos circundados
por uma aura. À noite não via contorno algum — só o lado espiritual das coisas. Na era pós-
atlântica, temos a diferenciar, até agora, cinco épocas culturais. Na antiga Índia, durante
a primeira época pós-atlântica, a ligação da cabeça etérica com a cabeça física era, nos
homens, muito tênue. Tornou-se cada vez mais intensa a convergência do crescimento da
cabeça etérica com a cabeça física. Ela ganhou maior intensidade em nossa época, a
quinta pós-atlântica, em que os homens desceram ao mundo físico, material, penetrando
o mais profundamente possível na matéria. Nestas muitas encarnações, durante as
diferentes épocas, o homem aprendeu muitas coisas até o dia de sua encarnação atual.

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Tudo o que acontece no mundo acontece numa linha descendente e numa ascendente.
Tão real quanto o fato de a cabeça etérica haver-se ligado cada vez mais à cabeça física é
a perspectiva de que pouco a pouco surgirá um afrouxamento. Já chegamos ao momento
em que a cabeça etérica começa a afrouxar-se novamente. Aqui precisamos diferenciar
entre a evolução de raças e o desenvolvimento anímico. No futuro haverá almas que não
terão sido suficientemente ativas durante o período em que a cabeça etérica esteve
unificada com a cabeça física. Hoje, em conseqüência do crescimento unificado da cabeça
etérica com a cabeça física, muitas pessoas recusam-se a aceitar verdades espirituais. As
pessoas que agora aceitam verdades espirituais terão assimilado o suficiente, nesta
encarnação, para então encontrarem a ligação quando retomarem mais tarde. Porém,
aquelas que agora descuidaram do que deve acontecer não encontrarão, no futuro, corpos
que lhes sirvam. Pois a evolução das raças criará corpos normais adequados às almas que
de nada descuidaram. Outras serão de tal natureza que o corpo etérico afrouxado não
conseguirá assimilar coisa alguma. Estes indivíduos serão uma espécie humana particular,
que ficará excluída do avanço evolutivo da Humanidade.
Uma série de coisas são necessárias para uma alma se encontrar num futuro corpo.
Imaginem uma alma que irá viver num corpo físico cujo corpo etérico esteja afrouxado.
Essa alma não mais iria compreender quando se lhe falasse de demônios e assim por
diante. E no momento de hoje que se pode falar dessas coisas. Quando o corpo etérico
voltar a estar afrouxado, isto não mais será possível. Aí ele estará destinado a percepções
bem diferentes. Futuramente, o corpo etérico viverá no mundo espiritual, que se encontra
povoado de demônios e assim por diante. Depois esse mundo de seres espirituais estará ao
redor do homem; e se este não se preparar agora, através dos ensinamentos a respeito,
mais tarde não saberá o que fazer diante de tais seres. Todavia, aqueles que desta en-
carnação levarem consigo o conhecimento sobre esses seres saberão como se comportar
perante eles. Esses homens sabedores estão designados para, no futuro, transformar esses
seres em servidores de um desenvolvimento progressivo. Vimos, assim, como os homens
podem deixar perder-se sua tarefa na evolução da Humanidade e dos demais seres.
Todos esses demônios, fantasmas e fantomas são, hoje em dia, nocivos. Mas no
futuro iremos transformá-los em servidores da evolução da Humanidade. Para isso, porém,
o homem precisa preparar-se. Os desenvolvimentos de almas e de raças não correm lado a
lado.
No futuro os homens se dividirão em bons e maus. Enquanto uma parte se desenvolve
de maneira correta para, no futuro, transformar os demônios, fantasmas e fantomas, a
outra parte será impelida para baixo. Aquilo que o espírito humano cria tem um
significado real. Sempre foi assim na evolução da Humanidade. Vamos dar outro exemplo
de como o homem colabora hoje no mundo. Voltemos os olhos para a quarta época
cultural, para o templo grego. A idéia do templo originou-se, inicialmente, na alma hu-
mana. Repousa sobre o que denominamos coluna e sobre aquilo que a coluna sustenta.
Nunca mais o homem conseguiu, como naquela época, transpor-se para dentro do espaço
sustentado. Comparemos um templo grego com uma construção moderna. Quando a
coluna se torna decorativa, não é mais a coluna verdadeira, livre em pé e sustentando
realmente. É preciso o homem ter a sensação de que a coluna deve compor-se do material
correto. Se cobrirmos de tinta uma coluna de ferro, que é fina e sustenta o mesmo que
uma coluna mais grossa de pedra, ela nos estará mentindo.
Um templo grego é uma idéia grega de espaço. Isto os homens compreenderiam se
fossem capazes de imaginar que de cima para baixo, da direita para a esquerda, passam
forças. Podemos imaginar três anjos pintados, pairando no ar, de modo a sabermos que se
sustentam reciprocamente. Nos pintores antigos encontramos esse sentimento de espaço.

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Hoje não o encontramos mais, nem mesmo em Böcklin.4 Em sua Pietá há um anjo dando a
sensação de que deve despencar a qualquer instante.
Eis algo que pode faltar até mesmo ao maior gênio se não houver a cultura espiritual:
o sentimento do espaço. A cada vez que o homem cria uma verdadeira idéia de espaço,
dá-se oportunidade para entidades preencherem esse espaço. Atraímos, então, entidades
superiores a descer para dentro do espaço. Chamamos para baixo entidades bem
diferentes, por meio da coluna grega e do vigamento horizontal que sobre ela repousa, do
que por meio da catedral gótica e seus arcos ogivais. A catedral gótica diferencia-se es-
piritualmente do templo grego da seguinte maneira:
No templo grego o homem introduziu a idéia de espaço de tal forma que o próprio
templo é uma idéia cristalizada de espaço. Pelo fato de ser como é, o templo é a morada
de uma entidade superior, de um deus, mesmo que esteja abandonado pelo homem. Da
catedral gótica, porém, os homens fazem parte. Ela precisa ser complementada pela
devoção dos homens e pelas mãos unidas em prece, que a exaltam. O templo grego é uma
morada do deus. A catedral gótica é um lugar para cultos e uma morada de Deus quando
os homens estão presentes. O templo grego, mesmo quando abandonado, é a morada de
uma entidad piritual. Vemos assim que os homens, por estarem em harmonia com o mundo
espiritual, atuam em conjunto com ele. Quanto ao espírito, portanto, vemos como através
das ações dos homens pode-se trabalhar vez mais para trazer entidades superiores para
baixo.
Volta a surgir, diante de nossa alma, a idéia pentecostal. A idéia pentecostal
exprime, num símbolo o que podemos reconhecer através da seguinte consideração: por
meio de seu trabalho, os homens criam lugares para a descida de entidades espirituais;
eles trabalham na espiritualização do mundo.
Precisamos compreender a idéia da Ciência Espiritual de tal maneira que ela penetre
em cada uma das ramificações da vida. Em nossa época materialista, a vida exterior é
apenas uma pequena expressão da interior. Antigamente, cada trinco de porta, cada
chave era expressão de algo espiritual. Contrariamente, hoje é tudo tão inexpressivo! O
homem novamente aprenderá a criar de forma tal que o exterior seja imagem do interior.
Então, também uma estação de estrada-de-ferro surgirá como uma idéia, tal como o
templo grego e a catedral gótica. Nossa época também tem um estilo arquitetônico que
lhe corresponde: é o do armazém. Ele é a estampa do pensamento utilitário, a estampa do
egoísmo humano. A era da utilidade produziu o armazém como único estilo original.
Antigamente, os homens construíam suas sensações anímicas dentro do estilo
arquitetônico. O armazém é a expressão das sensações do século dezenove. Mas agora já
existe um movimento espiritual que faz o trabalho preparatório para uma futura
espiritualização. As pessoas que assim compreendem o movimento antroposófico
concretizam a idéia pentecostal. Veremos no futuro, naquilo que reveste a Terra, as idéias
antroposóficas cristalizadas.

4
Arnold Böcklin, pintor suíço (1827-1901). (N.R.)

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