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Técnicas construtivas do período colonial – I

Sílvio Colin

Foto Pedro Martinelli

A alvenaria é uma técnica de confecção de muros utilizando tijolos, lajotas ou pedras de mão,
aglutinados entre si por meio de uma argamassa. No período do Brasil colonial as argamassas
mais utilizadas eram de cal e areia ou de barro.

O adobe é uma lajota feita de barro com dimensões aproximadas de 20 x 20 x 40 cm,


compactados manualmente em formas de madeira, postos a secar à sombra durante certo
numero de dias e depois ao sol. O barro deve conter dosagem correta de argila e areia, para não
ficar nem muito quebradiça, nem demasiadamente plástica. Para melhorar sua resistência,
pode-se acrescentar fibras vegetais ou estrume de boi. As lajotas assim confeccionadas são
assentadas com barro, e revestidas com reboco de argamassa de cal e areia. Embora
encontremos importantes construções feitas inteiramente de adobe, como a matriz de Santa
Rita Durão, MG[1], o material era usualmente reservado a divisórias interiores.

Fig. 1 – Adobe. Confecção e assentamento


Usando a mesma matéria prima – a argila, o tijolo cerâmico difere do adobe pelas suas
dimensões menores e pelo fato de ser cozido em fornos, a altas temperaturas. Sua durabilidade o
rivaliza com a pedra. Foi talvez o primeiro material de construção durável utilizado pelo homem.
Aliás, mesmo o homem fora feito de argila, de acordo com a Bíblia, que ensinava a utilizá-
lo [2],e sua presença assinalava para a possibilidade de vida sedentária, junto aos aluviões dos
rios. O Portão de Ishtar, na Babilônia, do século IV a.C. e a Muralha da China, do século III a.C.,
constituem-se em exemplos não somente da durabilidade como também do grau de evolução a
que chegou esta técnica no período proto-histórico. Desde o século XVII, o tijolo era comumente
empregado na Bahia e em 1711 já existe registro de uma olaria em Ouro Preto. A precariedade de
condições, entretanto, reservava a maior parte da produção das olarias para telhas. As
alvenarias de tijolos somente vão se tornar comuns no século XIX. Nos séculos precedentes
perde, em importância para a taipa de pilão, a pedra e cal, e mesmo o adobe. Encontramos,
entretanto, fiadas de tijolos associadas à pedra em muros de pedra e cal.

Fig. 2 – Alvenaria de tijolos. Aparelhos.

Era o material que conferia maior resistência aos muros, razão porque era utilizada nas
fortificações, igrejas monumentais e nas construções oficiais. No início da colonização, ainda no
século XVI, já encontramos construções assim realizadas. É o caso da torre que Duarte Coelho
ergueu em Olinda em 1535. Foi a técnica preferida das igrejas de Ouro Preto [3].

Fig. 3 – Alvenaria de pedra

As pedras utilizadas eram calcários, arenitos ou pedra de rio e granitos , no Rio de Janeiro, e
mesmo a pedra-sabão e a canga [4], em Minas. As argamassas eram cal e areia, mais resistente,
ou o barro, onde não existia a disponibilidade de cal. As pedras eram de tamanho variável, até
40 cm na maior dimensão ou mais, e acabamento irregular, sem qualquer trabalho de
aparelhagem. Pedras menores eram colocadas para calçar as maiores.

Na alvenaria de pedra seca, é dispensada a argamassa. As paredes têm grande espessura (0,60 a
1,00 m) e são assentadas com a ajuda de formas de madeira. Esta técnica é mais utilizada para
muros exteriores. As pedras de mão, maiores, contornadas por pedras menores recebe o nome
de cangicado.

Fig. 4 – Canjicado.

Por cantaria entendemos o serviço utilizando a pedra lavrada de maneira precisa, de modo que
as peças se ajustam perfeitamente umas sobre as outras sem o auxílio de argamassa aglutinante.
Para o assentamento rigoroso utilizam-se grampos metálicos e, às vezes, óleo de baleia como
adesivo, para auxiliar na vedação. Apesar de ser um serviço sofisticado, que exige profissional
bastante habilitado – o canteiro, é também milenar. Os templos gregos e romanos, as grandes
catedrais medievais foram, em sua maioria, executados em cantaria.

Fig. 5 – Aparelho de cantaria e aparelho misto de cantaria e alvenaria de pedra.

No Brasil, entretanto, como também em Portugal, devido à dificuldade de mão de obra


qualificada e também devido ao custo, a cantaria não era utilizada na totalidade do edifício, mas
apenas em suas partes mais importantes: nos frontispícios, nas soleiras, nas pilastras, nas
cornijas, nos portais, nas janelas e nos cunhais, sendo, no restante das vedações, utilizada outra
técnica mural. O aparelho das pedras não era muito elaborado, exceto no Rio de Janeiro, a
partir da segunda metade do século XVIII.

Fig 6. Portal de cantaria. Imagem RODRIGUES, 1979.

A taipa de pilão foi o material mais empregado nas construções coloniais no Brasil, devido
sobretudo à abundância de matéria prima – o barro vermelho, à relativa facilidade de execução,
à satisfatória durabilidade [5] e às excelentes condições de proteção que oferece quando
recebem manutenção adequada. É uma técnica de origem mourisca praticada pelos portugueses
e espanhóis desde tempos imemoriais, conhecida também pelos negros africanos. Era de uso
comum na Europa, até meados do século XIX. Na França recebia o nome de pisé.

Fig. 7 – Taipal e pilão


A técnica consiste em amassar com um pilão o barro colocado em formas de madeira, os taipais,
semelhantes às formas de concreto utilizadas hoje. Os taipais têm somente os elementos
laterais, e são estruturados por tábuas e montantes de madeira, fixados por meio de cunhas, em
baixo, e um torniquete em cima. Suas dimensões são de aproximadamente 1,0 m de altura por
3,0 a 4,0 m lateralmente, e têm a espessura final da parede, 0,6 m a 1 m. Após a secagem, o
taipal é desmontado e deslocado para a posição vizinha. E assim sucessivamente.

Fig. 8 – Execução da taipa de pilão. Imagem BARDOU, 1981.

Os critérios de escolha do barro não se conservaram plenamente, de vez que dependia de


tradição oral e ficou perdida no tempo. Sabe-se que, semelhante ao adobe, deve ser uma mistura
bem dosada de argila e areia e alguma fibra vegetal, crina de animal ou mesmo estrume. Podia-
se também misturar óleo de baleia, que “conferia uma resistência extraordinária” [6]. O barro é
colocado em pequenas quantidades, em camadas sucessivas de aproximadamente 20 cm, que se
reduzem a 10 ou 15 cm depois de comprimidas.

A secagem durava de 4 a 6 meses, findos os quais as paredes poderiam receber revestimento,


geralmente argamassa de cal e areia, que lhe aumentava a resistência. A esta argamassa era, às
vezes acrescentada “bosta de vaca”. O resultado era uma argamassa capaz de resistir “à mais
forte e duradoura chuva” [7]. Como a parede não podia receber água de chuva, alguma
providências eram tomadas, entre elas o uso de grandes beirais e a elevação acima do terreno
com alvenaria de pedra. Paulo Santos nos fala de “uma construção existente em Cabo Frio,
datando de pelo menos três séculos”, de taipa de pilão, cuja resistência é tão grande, “a ponto de
se assemelhar ao nosso concreto” [8] Uma variante do sistema, chamado formigão [9], consiste
em misturar à massa de barro pedras miúdas e pedras maiores (pedras de mão).

A taipa de pilão foi mais utilizada nas regiões de São Paulo e Goiás. Em Minas, a encontramos
em igrejas mais antigas e em residências. Nas cadeias, quando não era possível sua execução
com pedra e cal, a taipa era reforçada com engradamento de madeira, nas paredes e nos pisos.
Fig. 9 – Taipa de pilão reforçada com madeira, utilizada nas cadeias. Fonte BARRETO, P. T.
“Casas de câmara e cadeia” In: Arquitetura Oficial I,

Pau-a-pique, taipa de sebe, taipa de mão, barro armado ou taipa de sopapo, são diversos
nomes para um dos sistemas mais utilizados tanto nos tempos da colônia como ainda hoje em
construções rurais, devido a suas qualidades – baixíssimo custo (todos os materiais são
naturais), resistência e durabilidade. Conhecido dos indígenas e dos negros africanos, utilizado
no Nordeste, nos Massapés e em Minas.

Fig. 10 – Construção em pau-a-pique rustica. Imagem BARDOU, 1981

Na sua versão mais depurada, consiste em uma estrutura mestra de peças de madeira, cuja
seção pode variar 50 x 50 cm, 40 x 40 cm até 20 x 20 cm composta de esteios – peças verticais
enterradas no solo, baldrames – peças horizontais inferiores, e frechais – peças horizontais
superiores. Os esteios tem comprimento de até 15 m, dos quais 2 a 4 m são enterrados.
Fig. 11 – Construção em pau-a-pique apurada. Detalhe. Imagem SANTOS, 1951

A parte extrema dos esteios, que ficava enterrada não era afeiçoada em seção quadrada,
mantendo a forma roliça das árvores. Era popularmente denominada nabo. As madeiras
preferidas era a Aroeira ou Braúna. Os baldrames era ligados aos esteios por sambladuras tipo
rabo-de-andorinha. Entre os esteios e os frechais eram então colocados paus roliços verticais
(paus-a-pique), de aproximadamente 10 cm de diâmetro. A este eram ligados horizontalmente
outros mais finos, compondo uma malha quadrangular, em apenas um dos lados ou nos dois
lados. Esta trama era amarrada com cordões de seda, linho, cânhamo ou buriti. Feita a trama, o
barro era jogado e apertado com as mãos, daí o nome de sopapo.

Fig. 12 – Elementos de estrutura em pau-a-pique apurada. Imagem SANTOS, 1951

No caso de paredes muito altas, utilizam-se peças intermediárias entre o baldrame e o frechal,
denominadas madres [10]. Sob os baldrames estão os socos, o espaço preenchido com alvenaria,
funcionando apenas para vedação. Para reforço do baldrame, entre este e o solo, pode-se colocar
peças de madeira, denominadas burros.
Paulo Santos nos informa de diversas igrejas de Minas construídas por esta técnica: Santa Rita e
Nossa Senhora do Ó, em Sabará, Matriz de Nossa Senhora da Conceição, em Catas Altas, Nossa
Senhora das Mercês, em Mariana, Nossa Senhora das Mercês e Perdões em Ouro Preto [11].

Era a técnica muito utilizada também para divisórias internas, sobretudo nos pavimentos
elevados, em construções cujas paredes externas eram de taipa de pilão.

Em tudo semelhante ao sistema anterior no que se refere à estrutura principal, dele difere
quanto à vedação. Neste caso o vão entre os esteios, estes também denominados enxaiméis, e as
madres, baldrames e frechais, é reforçado com peças inclinadas nos cantos ou na diagonal dos
quadros. Estas peças têm o nome de cruz de Santo André ou aspas francesas. O vão é
preenchido com adobe ou mesmo tijolos. Esta técnica é também milenar, utilizada na Europa
medieval, e muito popular no sul do país. Mas tanto Paulo Santos como Sylvio de Vasconcelos
registram a utilização em outras regiões.

Fig. 13 – Muro de enxaimel. Imagem BARDOU, 1981

Tabique é uma divisória feita com estrutura de vigas de madeira e revestimento de tábuas. È um
serviço e grande simplicidade e facilidade de execução, utilizado no Brasil colonial sobretudo
para divisórias internas. As madeira utilizadas são as mesmas das estruturas de maior
responsabilidade, isto é, aroeira, ipê, peroba, maçaranduba, jatobá, e também aquelas de menor
densidade como o cedro, a canela, o vinhático, a caviúna, entre outras. Esta grande simplicidade
entretanto não quer dizer que lhe foi reservado papel de menor responsabilidade. O exemplo
mais marcante é, sem dúvida, o da Matriz de Nossa Senhora do Pilar, de Ouro Preto, cujas
paredes externas são de alvenaria de pedra e a parede da nave, de madeira, conferindo-lhe a
forma poligonal.
Fig. 14 – Tabique. Imagem www.masisa.com

Fig. 15 – Planta da matriz de Nossa Senhora do Pilar, em Ouro Preto com as divisórias da nave
construídas em tabique. Imagem SANTOS, 1951

Notas

[1] BAZIN, 1956, Vol. 1, p. 58.


[2] “Vamos, façamos tijolos e cozamo-los ao fogo. Serviram-se de tijolos em vez de pedras, e de
betume em lugar de argamassa.” (Gênese, cap. 11-3)
[3] SANTOS, 1951, p. 90.
[4] Minério de ferro.
[5] John Mawe, em seu livro Viagens ao Interior do Brasil (1812) relata: “Essa espécie de
estrutura é durável; vi casas assim construídas que dizem ter duzentos anos…”. Apud
VASCONCELOS, 1979, p. 21.
[6] BAZIN, 1956, Vol. 1, p.57.
[7] BARRETO, Paulo Thedim. “Casas de câmara e cadeia”, p. 173. In: Arquitetura Oficial I, 1975.
[8] SANTOS, 1951, p. 83.
[9] O termo formigão pode também designar a mistura de cascalho, saibro ou areia, e cal usada
em fundações. Em Portugal, designa a mistura de cal e saibro umidecida, apiloada dentro de
formas, como a taipa de pilão.
[10] Madre é também o nome genérico de todas as peças horizontais, baldrames e frechais e
também das linhas de tesouras, quando estas suportam a carga de um pavimento
imediatamente sob o telhado.
[11] SANTOS, 1951, p. 86.

Bibliografia
Arquitetura Civil I, II e III. Textos Escolhidos da Revista do IPHAN. São Paulo: FAUUSP e
MEC-IPHAN, 1975.
Arquitetura Oficial I e II. Textos Escolhidos da Revista do IPHAN. São Paulo: FAUUSP e MEC-
IPHAN, 1975.
BARDOU, Patrick e ARZOUMANIAN, Varoujan. Arquitecturas de adobe. Barcelona: Gustavo
Gili, 1981.
BAZIN, Germain. A arquitetura Religiosa Barroca no Brasil. Rio de Janeiro: Record, 1983. 2
vols.
CORONA, Eduardo e LEMOS, Carlos A. C. Dicionário da arquitetura brasileira. São Paulo:
Edart, 1972.
RODRIGUES, José Wasth. Documentário arquitetônico. Belo Horizonte, Itatiaia; São Paulo,
Edusp, 1979.
SANTOS, Paulo F. Arquitetura religiosa em Ouro Preto. Rio de Janeiro: Kosmos, 1951.
VASCONCELLOS, Sylvio de. Arquitetura no Brasil: sistemas construtivos. Belo Horizonte:
Unversidade Federal de Minas Gerais, 1979
Técnicas construtivas do período colonial – II
Silvio Colin

Telhas

Os telhados são, por assim dizer, a marca da arquitetura colonial. Embora no século XVI as boas
construções, como casas de Câmara e Cadeia ainda usassem o sapé, eram depois substituídas
por telhas. As telhas são sempre cerâmicas, de capa e canal, ou capa e bica, também chamadas
telhas canal ou colonial. Fora do Brasil são conhecidas por telhas árabes ou mouriscas.
Inicialmente eram moldadas artesanalmente por escravos, que usavam suas coxas como molde,
o que dá idéia de suas dimensões e forma. Eram naturalmente muito irregulares, o que gerou
uma expressão popular “feitas nas coxas” para designar pejorativamente as telhas feitas desta
maneira quando comparadas às telhas mais sofisticadamente industrializadas. Por extensão, a
expressão passou a designar qualquer coisa mal feita ou irregular.

O cozimento também não era perfeito, como viria a ser no século XIX, quando aqui aparecem as
telhas francesas ou marselha e as telhas romanas. O processo de moldagem e cozimento davam
a estas telhas forma e coloração muito características responsáveis pela aparência inconfundível
das edificações coloniais, que tanto agradam às novas gerações.

Estruturas de telhado

A estrutura de assentamento das telhas era sempre de madeira. O desdobramento das peças era
artesanal, executado geralmente por escravos, como mostra a bela gravura.
Desdobramento da madeira. Gravura de Jean-Baptiste Debret. Imagem
http://www.comciencia.br

As tesouras (em Portugal chamadas asnas) mais utilizadas eram a tesoura de linha suspensa, ou canga de

porco e a tesoura de Santo André; mais raramente a tesoura paladiana. A tesoura romana seria mais comum

a partir do século XIX.

Tesoura de linha suspensa

Tesoura francesa

Tesoura clássica ou paladiana


Tesoura de Santo André

Tesoura romana

O uso de tesouras como estrutura principal e terças e caibros como estrutura secundária é mais
apurado e recente. Primitivamente era comum o sistema de caibro armado, isto é, sem
tesouras, com cada caibro recebendo o seu próprio tirante ou olivel. Acima deste, apenas as
ripas e telhas. O encaibramento era executado de maneira variada, sendo comuns os paus
roliços – “caibros de mato virgem, redondos e bons”. Podiam também ser lavrados a machado,
ou ainda, serrados. Quando serrados, tinham dimensões aproximadas “de altura três quartos de
palmo e de grosso meio palmo e assentados em distância outros dois palmos”

Estrutura de caibro armado. Fazenda Viegas. Imagem Cardoso, 1975

Telhado de caibro armado


Telhados feitos com pau roliço. Imagem
Barreto 1975.

Detalhe do frechal

As seções das peças das tesouras eram maiores que as utilizadas hoje e suas medidas eram em
palmos: um palmo quadrado (22 x 22 cm), um palmo por um e meio (22 x 33 cm), e assim por
diante. Para melhor distribuição das cargas, no caso de paredes de taipa de pilão, é feito um
reforço de madeira que recebe os caibros ou pernas das tesouras. Cada tarufo corresponde a um
caibro, que é juntado aos frechais por meio de sambladuras tipo rabo de andorinha. As
madeiras mais utilizadas eram a canela, peroba do campo, angelim, braúna jatobá e jacarandá.

Beirais e beiras

Os beirais são um capítulo à parte devido a sua importância na proteção das paredes, na
condução das águas de chuva e na linguagem estética. A própria existência dos beirais é uma das
características dos edifícios coloniais. Os beirais protegiam da chuva as paredes de taipa ou pau-
a-pique. A forma característica de mudança de inclinação das águas, que tem o nome de galbo,
tinha a finalidade de projetar a água para mais distante. A peça de madeira que propicia e
execução do galbo chama-se contrafeito.

Elementos do beiral de caibro armado

Na ponta dos caibros que faziam os contrafeitos, esculpiam-se cabeças de cachorro, às quais
atribuíam a função simbólica de proteção da casa, à semelhança das carrancas das navegações
medievais. Por extensão estas peças ficaram sendo chamadas de cachorros, e o conjunto de
caibros do beiral era a cachorrada.
Cachorros ornamentados. Imagem Lemos 1979.

As beiras são ornamentos de pequena profundidade na alvenaria, no ponto de ligação com o


telhado. Muitas vezes eram executados com o próprio material do revestimento, usando telhas
como moldes. A expressão “sem eira nem beira” para designar uma pessoa pobre, sem posses,
vem da arquitetura colonial. Eira é um pequeno quintal nos fundos da casa; beira é a decoração
da alvenaria, de que falamos. “Sem eira nem beira” é pois, uma pessoa que tem uma casa tão

pobre que não tem quintal nem ornamento na parede.

Beira. Imagem RODRIGUES, 1979.

Varandas e alpendres

Devido à grande divergência entre autores quanto a estes elementos, Sylvio de Vasconcelos
sugere a adoção da seguinte nomenclatura. Varanda é o espaço resultante do prolongamento da
água principal do telhado e apoiado diretamente no solo, guarnecido por guarda-corpo, peitoril
balaustrado ou grade de ferro.

Varanda e alpendre

O alpendre é uma peça coberta, geralmente no pavimento térreo, com uma cobertura autônoma,
que não se constitui prolongamento do telhado, como a varanda, mas é apoiada na parede
principal do edifício. Vasconcelos conclui dizendo que o alpendre é apoiado na outra
extremidade diretamente no solo. Na nomenclatura da técnica edilícia, entretanto, isto se
constitui um falso alpendre, pois o verdadeiro alpendre tem uma de suas extremidades em
balanço (MONTEIRO, 1976). É comum entretanto vermos o termo alpendre utilizado como
sinônimo de varanda, como no texto clássico de Luís Saia, O alpendre nas capelas brasileiras.
Existe portando uma divergência entre a terminologia técnica, mais precisa, e aquela dos textos
históricos, mais livre.

Estruturas de alpendre e falso alpendre

Forros

Os forros mais comuns eram de tábuas de madeira, planos, assentes diretamente na estrutura
dos telhados, ou em um barroteamento complementar. As tábuas tinham geralmente largura
aproximada de um palmo. Neste caso, a junção das peças de madeira poderia ter várias formas.

Tipos de forro. Fonte Santos, 1951.

Havia também os forros com esteira de taquara.

Forro de taquara. Detalhe e assentamento.


Imagem Santos, 1951.

Além da forma plana, os forros poderiam possuir a forma abobadada, muito comum nas igrejas,
ou a chamada forma de esquife, caixão ou gamela. No forro abobadado são feitas cambotas
auxiliares, encurvadas na forma final da forração. No segundo caso, é muito comum que se
utilizem as mesmas peças do madeiramento do telhado. O forro compõe-se de cinco painéis,
quatro deles inclinados e o último plano.

Forro abobadado e forro em esquife.

Forro em esquife. Museu do ouro em Sabará. Imagem Smith, 1975.

Em construções mais luxuosas, os forros poderiam formar painéis moldurados. Neste caso as
molduras tinham altura de cerca de 15 cm, e eram feitas de caixotões de madeira.Os forros eram
geralmente pintados ou em uma cor somente ou decorada com pintura abstrata ou figurativa.

Era comum a pintura faiscada, isto é, imitando madeira ou pedra.

Bibliografia

Arquitetura Civil I, II e III. Textos Escolhidos da Revista do IPHAN. São Paulo: FAUUSP e
MEC-IPHAN, 1975.
Arquitetura Oficial I e II. Textos Escolhidos da Revista do IPHAN. São Paulo: FAUUSP e MEC-
IPHAN, 1975.
BARDOU, Patrick e ARZOUMANIAN, Varoujan. Arquitecturas de adobe. Barcelona: Gustavo
Gili, 1981.
BARRETO, Paulo T. “O Piauí e sua arquitetura” In: Arquitetura Civil I (ver acima), p. 191-219.
BAZIN, Germain. A arquitetura Religiosa Barroca no Brasil. Rio de Janeiro: Record, 1983. 2
vols.
CARDOSO, Joaquim. “Um tipo de casa rural do Distrito Federal e Estado do Rio” In:
Arquitetura Civil I (Ver acima), p. 1-46.
CORONA, Eduardo e LEMOS, Carlos A. C. Dicionário da arquitetura brasileira. São Paulo:
Edart, 1972.
LEMOS, Carlos A. C. Arquitetura brasileira. São Paulo: Melhoramentos, 1979.
RODRIGUES, José Wasth. Documentário arquitetônico. Belo Horizonte, Itatiaia; São Paulo,
Edusp, 1979.
SANTOS, Paulo F. Arquitetura religiosa em Ouro Preto. Rio de Janeiro: Kosmos, 1951.
VASCONCELLOS, Sylvio de. Arquitetura no Brasil: sistemas construtivos. Belo Horizonte:
Unversidade Federal de Minas Gerais, 1979.
Técnicas construtivas do período colonial – III

As folhas das portas e janelas eram sempre de madeira e não diferiam muito conceitualmente de
nossas práticas atuais. As diferenças ficam por conta das disponibilidades técnicas e
características acessórias. As folhas podiam ser de réguas, de almofadas, de treliças (urupemas)
ou rendas de madeira – estas últimas no caso de folhas de janelas. Mais recentemente, a partir
do século XVIII, quando o uso do vidro se torna mais comum, aparecem as folhas de pinásios
com vidros.

Folha de réguas (E). Porta principal fazenda em


Embu e folha de almofadas (D) Janela da fazenda do Padre Inácio. Imagens Luis Saia, 1975
Janela com conversadeira

Folha de treliça. Fazenda Viegas. Imagem Cardoso 1975

Nos primeiros séculos, o vidro era artigo de luxo, “os mais custosos ornamentos no interior do
Brasil”[1]. Conta-se inclusive que, nas mudanças, os moradores levavam as peças de vidro consigo[2].
Robert Smith nos conta que o primeiro a fazer menção de vidros em janelas é o viajante sueco Johan
Brelin, em 1756. [3]
Janela com postigo.

Porta com folhas de pinázios.

Era comum, nas janelas, o uso de postigos, pequenas portinholas fixadas nas folhas principais,
para auxiliar na iluminação e mesmo para vigia.

O mais comum era a abertura segundo um eixo vertical – abertura à francesa, ou horizontal, que
hoje chamamos de basculante. Sylvio de Vasconcelos denomina as primeiras de gelosias e as
segundas de rótulas. Não é entretanto uma unanimidade a denominação. Na verdade a palavra
italiana gelosia significa ciúme, e designa mais o elemento que permitia às mulheres
observarem o movimento das ruas sem serem vistas. “Quem está por trás das varinhas em
xadrez pode ver e não ser visto. Em suma (…) traz também a idéia de zelo e ciúme.”[4] Designa
portanto mais as treliças ou urupemas, e mesmo mais tarde, as venezianas, do que a articulação
das janelas. Por outro lado rótula, independente de serem verticais ou horizontais, designa a
articulação, o tipo de funcionamento – diferente das janelas de guilhotina por exemplo. Na
literatura especializada vemos portanto os termos rótula e gelosia serem utilizados no sentido
oposto ao definido por Vasconcelos, e até mesmo encontramos a palavra rótula designando as
treliças, mesmo quando fixas[5], o que se constitui evidentemente num erro. Optamos portanto
pela designação abertura à francesa para as janelas e portas acionadas por dobradiças de eixo
vertical. Utilizamos rótula, seguindo uso consagrado, para janelas de eixo horizontal. Adotamos
gelosia como sinônimo de rótula, embora possa também designar o enchimento do quadro das
janelas com treliças. Já no século XVIII tornam-se comuns as janelas de guilhotina, ou abertura
à inglêsa.

(E) Rótula (C) Abertura à inglesa. Janela de guilhotina (D) Abertura à francesa.

Os vãos eram compostos de quatro elementos. As vergas, elemento superior, as ombreiras,


laterais e os peitoris e soleiras, inferiores. Nas paredes de alvenaria, pau a pique e adobe, de
menor espessura, a solução não diferia do que hoje faríamos. Nas paredes de taipa de pilão e
alvenaria de pedra, mais espessas, temos uma solução característica, que chama0mos janelas de
rasgo ou janelas rasgadas. Com a finalidade de aumentar a luz do compartimento, as laterais
do vão eram chanfradas ou ensutadas. A parte da alvenaria que preenchia o vão da soleira até o
peitoril, geralmente menos espessa que o restante da parede, chamava-se pano de peito. O
espaço conseguido com o rasgo da parede, bem iluminado e fresco, recebia assentos de madeira,
taipa ou alvenaria chamados conversadeiras.

Tipos de vãos. Fonte Barreto, 1975.


O peitoril levava um gradil de madeira torneada, ou de ferro batido, dizia-se que era uma janela
de peitoril entalado, isto é, contido no vão. Quando projetado para fora tínhamos as janelas
sacadas, simplesmente sacadas ou janelas de púlpito. Várias sacadas unidas, com espaço de
circulação entre elas formavam um balcão, que usualmente era coberto pela projeção do
telhado. As sacadas e balcões tinham, na parte interior um reforço estrutural, que poderia ser de
madeira ou de pedra, chamado cão, cachorro, ou consolo. Estes consolos suportavam o piso da
sacada, uma peça de pedra – a bacia. Os muxarabis eram construído sobre as sacadas.

O acabamento das janelas poderia ser de madeira, ou nas construções mais sofisticadas, de
cantaria de pedra, material que a partir do século XIX se consagrou. Quando de cantaria, as
vergas podia receber cornijas. O uso de vergas curvas ou onduladas aparecem talvez pela
primeira vez no Brasil, segundo Robert Smith, em 1743, no Paço dos Governadores do Rio de
Janeiro. Em Portugal fora empregado em 1717, na fachada do Palácio de Mafra, edifício assinado
por João Frederico Ludovice.

O muxarabi é um dos elementos mais característicos da nossa arquitetura colonial, uma das
mais persistentes influências da arquitetura árabe. Segundo Estêvão Pinto [6], muxarabi
significa local fresco [7]. Para nós designa um balcão fechado por treliças, chamadas também de
urupemas, geralmente com janelas de rótula. As frasquias que formavam as urupemas tinham
dimensões bem pequenas, em torno de 15 mm, e eram sobrepostas, formando uma malha bem
delicada.

Hoje em dia existem muito poucos exemplares de muxarabis. A vinda da Corte portuguesa foi
um golpe de morte para eles. Oficialmente alegava-se que o país devia perder os ares de colônia,
e assimilar as novas tendências européias, isto é, o Neoclassicismo, que não admitia a influência
“espúria” da arquitetura árabe, mas somente a tradição greco-romana. Conta-se, entretanto, que
o Príncipe Regente tinha medo de possíveis ataques contra ele e os membros da corte, ataques
este que seriam camuflados pelas treliças. A verdade é que a operação iniciada com o intendente
Paulo Fernandes Viana teve efeito devastador sobre os muxarabis. No Rio de Janeiro não restou
nenhum. “A impressão era que se tinham deixado as casas em trajes menores” [8]

Muxarabi e balcão. Desenho Rodrigues, 1979.


Balcão é uma peça sacada do corpo principal, um pouco maior em profundidade que a sacada,
permitindo o trânsito entre um peça e outra da construção principal pelo exterior.

As seteiras são pequenas aberturas verticais, utilizadas na arquitetura militar como vão de
observação, vigia e tiro. mas são também usadas na arquitetura civil e religiosa. Os óculos têm
forma circular, quadrifólio ou outras. Na arquitetura militar as seteira têm também o nome de
balestreiro. Os óculos são muito comuns nas igrejas, para luminação adicional das tribunas,
consistórios ou outros compartimentos. Neste caso têm moldura de pedra e são esculpidas em
perfís diversos.

Óculo e seteira

As ferragens para acionamento eram as chamadas dobradiças de cachimbo ou dobradiças de


leme. O leme era a chapa de ferro fixada nas folhas das portas, os quais tinham as mais variadas
dimensões e desenhos. As aldrabas, ou aldravas eram pequenas argolas ou maças metálicas
fixadas em um eixo, para o visitante bater na porta; servia em outros casos, para acionar uma
tranqueta e assim abrir a porta pelo lado de fora.

Dobradiças de leme

Puxadores e trancas
Aldraba. Fazenda Embu.

[1] SPIX E MARTIUS. Viagem pelo Brasil. Rio de Janeiro, 1938. Apud VASCONCELOS. 1979.
[2] Joseph de Laporte. Apud SMITH, Robert. (1969)” Arquitetura civil no período colonial” In:
Arquitetura Civil I. São Paulo: FAUUSP e MEC-IPHAN, 1975.
[3] SMITH, Op. cit..
[4] PINTO., Estêvão (1943). “Maxarabis e balcões”. In: Arquitetura Civil II.Textos Escolhidos da
Revista do IPHAN. São Paulo: FAUUSP e MEC-IPHAN, 1975.
[5] No Novo Dicionário Aurélio temos Rótula. 1. Gelosia; e Gelosia 1. Grade de frasquias de
madeira cruzadas intervaladamente que ocupa o vão de uma janela; rótula. 2. Janela de rótula.
[6] PINTO, Op. cit.
[7] Sítio das bebidas, ou local onde se punham as bilhas a fim de refrescar a água.
[8] PINTO, Op. cit..
[9] Ver, p. e., MONTEIRO, J. C. R. Tesouras de telhado, Rio de Janeiro: Interciência, 1976.
Bibliografia
Arquitetura Civil I, II e III. Textos Escolhidos da Revista do IPHAN. São Paulo: FAUUSP e
MEC-IPHAN, 1975.
Arquitetura Oficial I e II. Textos Escolhidos da Revista do IPHAN. São Paulo: FAUUSP e MEC-
IPHAN, 1975.
BARDOU, Patrick e ARZOUMANIAN, Varoujan. Arquitecturas de adobe. Barcelona: Gustavo
Gili, 1981.
BARRETO, Paulo Thedim. “Casas de câmara e cadeia” In: Arquitetura Oficial I, 1975.
BAZIN, Germain. A arquitetura Religiosa Barroca no Brasil. Rio de Janeiro: Record, 1983. 2
vols.
CORONA, Eduardo e LEMOS, Carlos A. C. Dicionário da arquitetura brasileira. São Paulo:
Edart, 1972.
PINTO, Estêvão. “Muxarabis e Balcões“ In: Arquitetura Civil II.
RODRIGUES, José Wasth. Documentário arquitetônico. Belo Horizonte, Itatiaia; São Paulo,
Edusp, 1979.
SANTOS, Paulo F. Arquitetura religiosa em Ouro Preto. Rio de Janeiro: Kosmos, 1951.
SMITH, Robert C. Arquitetura civil no período colonial. In: Arquitetura Civil I.
VASCONCELLOS, Sylvio de. Arquitetura no Brasil: sistemas construtivos. Belo Horizonte:
Unversidade Federal de Minas Gerais, 1979
Técnicas construtivas do período colonial – IV
Silvio Colin

O piso mais simples era de terra batida. A terra era socada com certa mistura de argila, areia e
água, à qual se adicionava às vezes sangue de boi, para uma melhor liga. No piso de terra batida
podia-se assentar ladrilhos de barro cozido, de 7 a 8 mm de espessura e 20 a 30 cm de largura.
O desenho de assentamento podia ser de junta reta, com junta matada ou mata-junta, paralelo
ou em xadrez. Especial destaque para os pisos das enxovias nas casas de câmara e cadeia.

Piso de ladrilhos. Tipos de juntas. Junta


reta, junta matada e xadrez.

Piso em frisos de madeira

Os pisos de tábuas corridas de madeira eram os mais comuns em pavimentos elevados do solo.
Em alguns lugares, a única solução possível. Os frisos de madeira tinham em torno de 40 cm de
largura e espessura de 3 a 4 cm, apoiados em barrotes. Com o passar do tempo, as peças vão se
adelgando, chegando a 2,5 cm, e se estreitando, chegando a 10 ou 15 cm. A seção dos barrotes
eram “em quadra”, isto é, quadrada, medindo em torno de um palmo (22 cm) até “palmo e
meio” ou “um pé” (cerca de 30 cm), dependendo do vão.
Detalhe dos frisos e sua estrutura apoiados em parede de taipa de pilão.

Na cadeia de Ouro Preto, em 1723, os pisos foram feitos com lastro de coçoeiras “de três quartos
de palmo em quadra”[1] (cerca de 16 cm, de seção quadrada). Nas enxovias dos negros, tal lastro
de madeira era recoberto com terra batida misturada com sangue de boi, nas cadeias dos
brancos, a grade era assoalhada. À semelhança dos forro, podiam ser assentados em junta seca,
com ou sem mata-junta por baixo, em meio-fio ou em macho e fêmea, mais raro. As madeiras
utilizadas eram sempre de boa qualidade: ipê, jacarandá, canela parda, jatobá, e outras,
variando com a época e a disponibilidade.

Detalhe de pisos de enxovias com lastro de


madeira. (E) Com frisos de madeira. (D) De terra batida.
Detalhe de pisos e paredes de enxovias
reforçados com lastro e grades de madeira.

Os lajeados eram lajes de pedra – arenitos, gneiss ou calcários, assentados com argamassa de
barro. Estas lajes podiam ser trabalhadas por canteiro apenas na face superior, ou também nas
faces laterais. Tinham estas lajes de 5 a 10 cm de espessura normalmente, porém em casos
excepcionais podiam ser mais espessas. É o caso da cadeia de Ouro Preto, para a qual José
Fernandes Pinto Alpoim, em 1745, mandou que os pisos fossem que eram “lageados por
baycho com lagedo de morro, e que nenhuma pedra tivesse menos que cinco palmos de
comprido e hum ou dous de groço”[2].

Lajeado

Os lajeados podiam ser feitos de mármore, caso em que o acabamento era bem melhor, e
reservado a compartimentos mais nobres, como saguões de edifícios públicos civís ou religiosos.
O pé-de-moleque ou calçada portu-guesa era muito comum. Consistia no assentamento sobre a
terra batida de seixos rolados (pedras redondas de rio). Podem ser empregados seixos de duas
cores, formando mosaico. Podem ser utilizados em interiores de pavimentos térreos, caso em
que se utilizam pedras de diâmetro menor, com cerca de 3 cm, ou também para pavimentos de
calçamentos de vias públicas, com pedras maiores, de diâmetro aproximado de 10 cm.
Pé de moleque com costelas

Nas vias públicas, para reforçar a pavimentação, podem-se colocar lajes de pedra enterradas a
prumo, em forma de costelas. Os espaços entre as costelas são preenchidos com pé de moleque.

Costelas

Capistrana é uma faixa contínua de lajeado no meio de uma via pública, em cujas laterais se
adiciona a pavimentação de seixos ou lajes. O nome capistrana refere-se a Capistrano Bandeira
de Mello, presidente da província de Minas, que mandou executar este serviço em 1878.

Capistrana
As paredes eram geralmente caiadas. A cor branca foi, por isso mesmo notada por todos aqueles
que deram notícias sobre nossas construções coloniais, como Maria Graham, Vauthier, Kidder e
Spix e Martius. A caiação era feita de cal de mariscos, de pedra ou tabatinga[3].

As madeiras eram preferencialmente pintadas a cola, têmpera ou óleo, sendo o óleo utilizado
como veículo extraído de mamona, de baleia ou de linhaça. Quando o veículo era a cola, usava-
se cola de peixe, de pelica ou couro de boi. Para a têmpera, utilizava-se a secular albumina de
ovo. Os corantes mais comuns eram o anil ou índigo -indigueiro-leguminosa (azul), sangue de
drago e urucum (vermelho), a açafroa (amarelo), a braúna (preto), o ipê e a cochonilha (cor de
rosa)[4].

Nas pinturas decorativas, era comum a chamada “pintura de fingimento”, que procuravam
imitar madeira ou mármore. Faiscado era o nome que se dava em Minas Gerais à pintura a óleo
ou tempera de portais, ombreiras e batentes de madeira imitando pedra.

Nas construções coloniais eram utilizadas sempre fundações diretas, no mais das vezes de
alvenaria de pedra seca, qualquer que seja o tipo de parede. A exceção fica com as construções
estruturadas com esteios – o pau-a-pique e o enxaimel. Neste caso as peças de madeira que
formam os esteios são enterradas no solo com 2 a 4 m de profundidade. A parte enterrada não
era afeiçoada em seção quadrada mas mantinha a seção do tronco original. Esta parte do esteio
é popularmente chamada de nabo e recebia um tratamento contra o apodrecimento e contra
brocas e fungos. Este tratamento consistia em crestar a madeira com fogo. Paulo Santos nos diz
que existem esteios mergulhados no solo há mais de dois séculos e com o núcleo central em
perfeito estado, embora com a parte externa apodrecida[5].
Alicerce de parede de pau-a-pique. Fonte SANTOS, 1951.

Para as outras técnicas, os alicerces eram sempre a alvenaria de pedra, às vezes seca, às vezes
com barro, ou apenas rejuntada com calda. A calda é um barro muito liqüefeito, que pode ser
derramado e preenche os vazios entre as pedras. Pode ser derramado depois de uma ou duas
fiadas prontas.

As dimensões dos alicerces eram variáveis, mas não diferiam muito das práticas atuais para
fundações diretas. Para a igreja de Nossa Senhora do Monte do Carmo de Ouro Preto foram
usados baldrames[6] de cerca de 2 m de profundidade (dezoito palmos) e de largura 90 cm
(quatro palmos) externamente para fora da parede e 30 cm (palmo e meio) para dentro, isto é, a
largura da parede mais 1,2 m (um total de aproximadamente 3,5 m)[7]. Mais recentemente, os
aliceces tornam-se menos profundos e a parte saída das paredes diminui para aproximadamente
um palmo. O acabamento dos alicerces é sempre bem nivelado com uma pedra, que os cobre em
toda a extensão, não sendo interrompido nem para as obreiras das portas, que são nele
encaixados.

Encaixe das ombreiras na soleira do alicerce. Fonte Vasconcellos,


1979.
Enchimento do espaço entre o baldrame e o solo. Fonte
Vasconcellos, 1979.

Acabamento do alicerce e sargeta. Fonte Vasconcellos, 1979.

Notas
[1] BARRETO, sd., p.191.
[2] Apontamentos, Vila Rica, 1745. Apud BARRETO, Op. cit., p. 193.
[3] Barro branco, untoso ao tato. De “toba-tinga”, i. e. barro branco. Sendo mais fácil de
encontrar que a cal de mariscos, seu uso se generalizou na pintura de casas mais simples. À
tabatinga adicionava-se algum fixador, seja albumina de leite, de sorveira (árvore resinosa) ou
soluções de pedra-ume.
[4] Excetuando a cochonilha, inseto que fornece um corante carmim, os otros pigmentos são de
origem vegetal. São tirados das folhas, como o índigo – do indigeiro, uma leguminosa; dos
frutos, como o urucum; de flores, como a açafroa, ou do próprio tronco, como a braúna e o
drago
[5] SANTOS, 1951, p. 86.
[6] Muros contínuos de fundação. Não confundir com a peça de madeira chamada de baldrame
nas paredes de pau-a-pique.
[7] SANTOS, 1951, p. 92.
Bibliografia
Arquitetura Civil I, II e III. Textos Escolhidos da Revista do IPHAN. São Paulo: FAUUSP e
MEC-IPHAN, 1975.
Arquitetura Oficial I e II. Textos Escolhidos da Revista do IPHAN. São Paulo: FAUUSP e MEC-
IPHAN, 1975.
BARDOU, Patrick e ARZOUMANIAN, Varoujan. Arquitecturas de adobe. Barcelona: Gustavo
Gili, 1981.
BAZIN, Germain. A arquitetura Religiosa Barroca no Brasil. Rio de Janeiro: Record, 1983. 2
vols.
CORONA, Eduardo e LEMOS, Carlos A. C. Dicionário da arquitetura brasileira. São Paulo:
Edart, 1972.
RODRIGUES, José Wasth. Documentário arquitetônico. Belo Horizonte, Itatiaia; São Paulo,
Edusp, 1979.
SANTOS, Paulo F. Arquitetura religiosa em Ouro Preto. Rio de Janeiro: Kosmos, 1951.
VASCONCELLOS, Sylvio de. Arquitetura no Brasil: sistemas construtivos. Belo Horizonte:
Unversidade Federal de Minas Gerais, 1979

Créditos: http://coisasdaarquitetura.wordpress.com/2010/09/06/tecnicas-construtivas-do-
periodo-colonial-ii/

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