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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA

ANDRÉ LUIZ MAGALHÃES BOTELHO

Urbanização na Grande São Pedro,


Vitória/ES e a conservação do manguezal:
palco de contradições

Niterói
2011
ANDRÉ LUIZ MAGALHÃES BOTELHO

Urbanização na Grande São Pedro,


Vitória/ES e a conservação do manguezal:
palco de contradições

Tese de doutorado apresentada ao Programa de


Pós-graduação em Geografia do Instituto de
Geociências para obtenção do título de Doutor em
Geografia.

Niterói
2011
B748 Botelho, André Luiz Magalhães
Urbanização na Grande São Pedro, Vitória (ES) e a conservação
do manguezal: palco de contradições / André Luiz Magalhães
Botelho. – Niterói : [s.n.], 2011.
191 f.

Tese (Doutorado em Geografia) – Universidade Federal


Fluminense, 2011.

1.Urbanização. 2.Conflito socioambiental. 3.Manguezal –


conservação. 4.Vitória (ES). I.Título.

CDD 333.7098152
ANDRÉ LUIZ MAGALHÃES BOTELHO

Urbanização na Grande São Pedro,


Vitória/ES e a conservação do manguezal:
palco de contradições

Tese de doutorado apresentada ao Programa de Pós-graduação em Geografia


do Instituto de Geociências para obtenção do título de Doutor em Geografia .

Aprovado em__________________________

BANCA EXAMINADORA

Prof. Dr. Luiz Renato Vallejo


Universidade Federal Fluminense
Orientador

Prof. Dr. Jorge Luiz Barbosa


Universidade Federal Fluminense

Profª. Dra. Cristina Pessanha Mary


Universidade Federal Fluminense

Prof. Dr. Gilberto Fonseca Barroso


Universidade Federal do Espírito Santo

Drª. Denise Kronemberger


Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
A Ana, sempre companheira que além do
apoio incondicional, mostrou-me o valor da
auto-confiança.
AGRADECIMENTOS

A Deus, que proporcionou-me forças e clareza para obter as informações e


concatená-las de maneira concisa.

Ao professor Luiz Renato Vallejo, pela amizade, paciência, valiosos


esclarecimentos e sugestões durante toda elaboração deste documento.

Aos amigos Walace Conti e Liliana Barbosa, moradores e ex-companheiros de


trabalho que estiveram sempre prontos a me receber e proporcionaram
contatos valiosos para a finalização deste trabalho.

Ao Sr. Antonio Fernando Ribeiro, Gerente da Regional 7 que, por mais de uma
vez abriu as portas para mim, fornecendo dados valiosos para o
enriquecimento do estudo.

Ao Sr. Edivaldo Damaceno, um dos mais antigos moradores de São Pedro, que
enriqueceu o trabalho com informações históricas da ocupação e indicou-me
outras valiosas fontes de informações.

Aos pescadores de Resistência, sobretudo Manoel Ferreira e Alexandre Souza,


que foram pacientes durante as conversas e mostraram-se dispostos a
contribuir com mais informações e visitações dentro do bosque.

Aos funcionários da Prefeitura Municipal de Vitória, que me forneceram mapas,


fotos, filmes e informações valiosas para a descrição histórica da ocupação.

Aos funcionários do IEMA, pela disponibilização de mapas cartográficos das


bacias hidrográficas.

Aos funcionários do IBGE, Mauro e Evandro, que foram solícitos em me


receber e disponibilizaram imagens de cartas topográficas do município.

A todos aqueles que de uma forma ou de outra contribuíram para a realização


deste.
Ainda que o trabalho árduo nos tome a mente e o ânimo,
Ainda que o relógio simule uma disputa contra nós
Se os meus olhos por minutos perderem o brilho
E se - como quase sempre - desistir parecer o mais
apropriado...

Por cima das nuvens sabemos que ainda brilha um sol,


Que brilhará para sempre
E veremos que por detrás da tempestade esconde-se um
lindo dia...

Dani Cabrera

…O teu trabalho é a oficina


Em que podes forjar a tua própria luz."

Emmanuel Kant
RESUMO

O município de Vitória/ES foi palco de um processo de urbanização muito


semelhante ao que ocorreu em diversas metrópoles brasileiras em que áreas,
consideradas nobres, são beneficiadas com investimentos e projetos
urbanísticos enquanto outras, de menor interesse imobiliário, são destinadas à
deposição dos resíduos produzidos na cidade. A região noroeste de Vitória/ES,
objeto deste estudo, representa uma destas áreas periféricas, onde a ocupação
ocorreu de forma espontânea e desorganizada. É nesta área também que se
encontra, um vigoroso ecossistema de manguezal mesmo após profundas
modificações estruturais resultantes das demandas da população excluída por
moradia e descaso das autoridades para com a preservação ambiental.
Embora a área já esteja ocupada desde a década de 1940, a taxa de ocupação
intensificou-se a partir da década de 1960 como conseqüência, principalmente,
de alterações no quadro econômico brasileiro e internacional estimulando o
movimento migratório campo-cidade. A ocupação da região alcançou seu ápice
na década de 1980 e expandiu-se urbanisticamente de maneira vertiginosa até
o inicio do século XXI. Após diversas alterações nas políticas públicas desde o
início da ocupação, na década de 1990 o poder público iniciou a
implementação de projetos co-participativos, que culminaram na atual
conformação urbana dos bairros integrantes da Grande São Pedro.
Atualmente, embora a malha urbana dos bairros da região esteja estruturada
por meio de diversas ações e políticas implementadas, ainda existem
problemas, sobretudo na interface meio urbano-natureza, a serem corrigidos. A
despeito da importância da conservação do exuberante manguezal
remanescente na área, os instrumentos para garantir sua preservação são
frágeis e o saneamento da malha urbana adjacente é ainda ineficaz, causando
impactos neste ecossistema.

Palavras-chave: Urbanização, Conflitos socioambientais da ocupação e


Conservação do manguezal
ABSTRACT

The municipality of Vitória/ES was the scene of an urbanization process very


similar to what occurred in several Brazilian metropolis in which areas,
considered nobles, benefit with investments and urban designs while other, less
real estate interest, are intended for deposition of waste produced in the city.
The region Northwest of Vitória/ES, object of this study, represents one of these
peripheral areas where the occupation occurred spontaneously and
disorganized. It is in this area too, that is, even after profound structural
changes resulting from the demands of the population excluded by housing and
neglect of the authorities towards environmental preservation, a vigorous
ecosystem of mangrove swamp. Although the area is already occupied since
the Decade of 1940, the occupancy rate has intensified from the Decade of
1960, mainly as a result of changes in Brazilian and international economic
framework encouraging migratory movement field-city. The occupation of the
region reached its Apex in the late 1980 and expanded urbanistic spectacularly
until the beginning of the 21st century. After several changes in public policy
from the beginning of the occupation, in the Decade of 1990 the Government
began implementing co-participativos projects, culminating in the current urban
conformation of integral neighbourhoods of greater São Pedro. Currently,
although the urban fabric of neighborhoods of the region is structured through
various actions and policies implemented, there are still problems, especially in
the urban interface-nature, to be fixed. Despite the importance of conservation
of lush mangrove remaining in the area, the instruments to ensure its
preservation are fragile and the improvement of the urban fabric adjacent is still
ineffective causing impacts in this ecosystem.

Keywords: Urbanization, Environmental conflicts of the occupation and


Mangrove Conservation
10

1. Introdução .................................................................................................................. 13

2. Métodos e Técnicas .................................................................................................... 24

3. Fundamentos conceituais e Teóricos ......................................................................... 28

3.1 ESPAÇO URBANO E URBANIZAÇÃO ................................................................................................................. 28

3.2 TRANSFORMAÇÕES INERENTES AO CRESCIMENTO URBANO ................................................................................. 30

3.3 POLÍTICAS PÚBLICAS, COMPETÊNCIAS E O ORDENAMENTO URBANO...................................................................... 35

3.4 MANGUEZAIS E OS SERVIÇOS AMBIENTAIS ....................................................................................................... 46

3.5 O AUMENTO POPULACIONAL E A PRESSÃO SOBRE OS MANGUEZAIS ..................................................................... 52

3.6 CONSERVAÇÃO DOS MANGUEZAIS NO BRASIL .................................................................................................. 59

4. A Urbanização em diferentes escalas ......................................................................... 63

4.1 BREVE HISTORICO GLOBAL DA URBANIZAÇÃO ................................................................................................. 63

4.2 HISTÓRICO NACIONAL DO CRESCIMENTO URBANO ........................................................................................... 65

4.3 PROBLEMAS GERAIS DO CRESCIMENTO URBANO NO BRASIL ............................................................................... 70

4.4 URBANIZAÇÃO DO TERRITÓRIO NO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO ......................................................................... 72

4.5 URBANIZAÇÃO DA CIDADE DE VITÓRIA ........................................................................................................... 77

5. Os manguezais em Vitória (ES) e sua conservação legal ............................................ 85

5.1 OS MANGUEZAIS DA BAÍA DE VITÓRIA ........................................................................................................ 85

5.2 INSTRUMENTOS LEGAIS DE CONSERVAÇÃO DOS MANGUEZAIS EM VITÓRIA ............................................................. 92

6. Conflitos entre crescimento urbano e a conservação dos manguezais em Vitória . 104

6.1 DESTRUIÇÃO E DEGRADAÇÃO DOS MANGUEZAIS EM VITÓRIA ............................................................................ 104

6.2 URBANIZAÇÃO DO MANGUEZAL DA REGIÃO NOROESTE ................................................................................... 112

6.3 A QUESTÃO SOCIAL E OS MANGUEZAIS ......................................................................................................... 141

7. As grandes contradições entre a urbanização e a conservação do manguezal na


Grande São Pedro ......................................................................................................... 150

8. Conclusões ................................................................................................................ 156

9. Referências Bibliográficas ......................................................................................... 163

ANEXOS ......................................................................................................................... 179


11

ÍNDICE DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Distribuição das florestas de manguezal no globo...................................................... 47


Figura 2 - O emaranhado de raízes dos manguezais ajuda na retenção de sedimentos fluviais e
protegem a costa dos processos erosivos causados pela hidrodinâmica (foto inferior - Baía de
Bengala, África). .......................................................................................................................... 49
Figura 3 - Modelo ilustrativo do sistema de manguezal. ............................................................ 50
Figura 4 - Os manguezais abrigam elevada biodiversidade ........................................................ 51
Figura 5 - População costeira mundial ........................................................................................ 55
Figura 6 - Supressão de manguezais entre 1980 e 2005 no mundo. .......................................... 58
Figura 7 - Evolução demográfica do Estado do ES (1872 – 2009) ............................................... 73
Figura 8 - Principais indústrias da microregião de Vitória e municípios vizinhos ....................... 75
Figura 9 - Mapa das Indústrias da microregião de Vitória e municípios vizinhos ....................... 76
Figura 10 - Planta do Projeto Novo Arrabalde. ........................................................................... 79
Figura 11 - Traçado da estrada de ferro Vitória-Minas. .............................................................. 79
Figura 12 - Mapa Ferroviário Brasileiro....................................................................................... 80
Figura 13 - Embarque de carvão no Porto de Vitória na década de 1950. ................................. 81
Figura 14 - Evolução demográfica de Vitória/ES. ........................................................................ 84
Figura 15 - A região Noroeste da Baía de Vitória insere-se na malha urbana de dois municípios,
Vitória (delimitado pela linha vermelha) e o município de Serra (ao norte). Destacam-se os
bairros da grande São Pedro (na porção inferior) e ao centro a área do manguezal exposto aos
impactos urbanos. ....................................................................................................................... 86
Figura 16 - Bacia do rio Santa Maria de Vitória........................................................................... 87
Figura 17 - Foz do rio Santa Maria de Vitória .............................................................................. 87
Figura 18 - Área intensamente urbanizada em Resistência, com destaque para a exuberante
vegetação do manguezal em seu entorno. ................................................................................. 89
Figura 19 – Manguezais em frente à ilha das Caieiras, porção noroeste, preservados. ............. 90
Figura 20 - Unidades de Conservação existentes no município de Vitória. Destaque para o
Manguezal da UFES (3), a Ilha do Campinho (9), a Ilha do Crisógono (29), Estação Ecológica Ilha
do Lameirão (54), Parque Nat. Mun. Vale do Mulembá-Conquista (56) e Parque Dom Luis
Gonzaga Fernandes (Baía Noroeste) (61); todos em interface direta com a Grande São Pedro.
..................................................................................................................................................... 91
Figura 21 - Unidades de Conservação do Espírito Santo............................................................. 95
Figura 22 - Grande São Pedro em 1988. ..................................................................................... 96
Figura 23 - Pier na Ilha das Caieiras, com restaurantes (abaixo à direita) e passeio público
(abaixo à esquerda) para contemplação da natureza................................................................. 98
Figura 24 - Parque Municipal Baia Noroeste de Vitória. ........................................................... 101
12

Figura 25 - Praia do Canto no início da década de 1970 ........................................................... 105


Figura 26 - Av Cesar Hilal, bairro Praia do Canto ao final da década de 1980 .......................... 105
Figura 27 - Inicio da ocupação da Grande São Pedro (1985). ................................................... 107
Figura 28 - Estação Rodoviária recém construída ..................................................................... 108
Figura 29 – Condições de moradia no inicio da ocupação em São Pedro (1985) ..................... 109
Figura 30 - Uso do bairro São Pedro como lixão municipal na década de 1970. ...................... 110
Figura 31 - Lixão de São Pedro (1986) ....................................................................................... 113
Figura 32 - Lixão como fonte de renda em São Pedro .............................................................. 114
Figura 33 - Caminhões levando terra destinada a cobrir o lixo em São Pedro (1989) .............. 116
Figura 34 - Caminhão aterrando o lixão sobre o manguezal em São Pedro. ............................ 116
Figura 35 - Grande São Pedro (1986) ........................................................................................ 118
Figura 36 - Ocupação inicial do manguezal em São Pedro (1980) ............................................ 120
Figura 37 – Área aproximada (em laranja) dos atuais limites dos bairros São Pedro III e
Conquista .................................................................................................................................. 121
Figura 38 - Usina de tratamento de Lixo, São Pedro (1991) ..................................................... 124
Figura 39 - Inicio da urbanização em Resistência (1991). ......................................................... 125
Figura 40 - Invasão anterior à delimitação da área de Preservação (1988).............................. 127
Figura 41 - Retomada da área pelo bosque de mangue após remoção das casas e delimitação
da área a ser preservada (1997)................................................................................................ 127
Figura 42 - Bairros formadores da Grande Sâo Pedro. ............................................................. 128
Figura 43 - Mapa atual dos bairros do município de Vitória dividido em regionais. ................ 128
Figura 44 - Manilhas de saída dos efluentes da Elevatória de Água Tratada da Cesan em
Resistência................................................................................................................................. 135
Figura 45 – Efluentes oriundos da Elevatória lançados no manguezal ..................................... 135
Figura 46 - Drenagem do esgoto dos bairros Ilha das Caieiras, Nova Palestina e adjacentes e
seu lançamento no mangue. ..................................................................................................... 138
Figura 47 - Demarcação de lotes em área subjacente ao manguezal (1977) ........................... 144
Figura 48- Demarcação de lotes no manguezal (1986) ............................................................. 144
Figura 49 - Ilha das Caieiras em 1970 (área elevada à esquerda) ............................................. 147
Figura 50 - Ilha das Caieiras em 1980 (dimensão aproximada da área atual, delimitada em
preto)......................................................................................................................................... 147
Figura 51 - Ilha das Caieiras em 2009 (delimitada em laranja) ................................................. 148
Quadro 1 – Síntese das contradições entre conservação e ocupação/degradação dos
manguezais na Grande Vitória/ES (instrumentos políticos e processos)…………………………..151
13

1. INTRODUÇÃO

Desde que o ser humano aglomerou-se para viver em sociedade, o ritmo

do uso dos recursos naturais existentes à sua volta, os quais serviram para

suprir suas necessidades de crescimento demográfico, acelerou-se

geometricamente (STERN, 1993). Esta situação está diretamente relacionada

com a crescente necessidade de bens de consumo pela sociedade humana,

comportamento notado já a partir das primeiras culturas milenares na China,

Índia, Mesopotâmia, Egito, Roma e mesmo dos povos das culturas americanas

que nasceram às margens dos grandes cursos de água, utilizando-se deste

recurso para atender suas necessidades primárias de vida e subsistência

agrícola e pecuária (SCHNIFF, 1996).

Como consequência da aglomeração humana, os ecossistemas

explorados foram paisagisticamente alterados de forma profunda, para atender

às necessidades geradas pelo aumento populacional. O exemplo mais evidente

de tais alterações, a nível global, numa ampla escala temporal, foi a intensa

exploração agrícola que contribuiu para a desertificação da região norte da

África com o objetivo de atender a demanda por grãos do crescente “mundo

romano” (WRI, 1997).

Embora, historicamente os locais de origem e crescimento das cidades

estivessem intrinsecamente relacionados aos corpos de água doce para sua

utilização direta, estas áreas não são necessariamente as mais produtivas do

planeta. Isto, certamente, contribuiu para impulsionar a espécie humana em

direção às regiões costeiras, já que um percentual superior a 60% da


14

população mundial vive numa faixa estreita de terra de até 50 km de distância

do mar e se utiliza de seus recursos de forma direta ou indireta (UNEP, 1997)1.

Em regiões tropicais os diversos ecossistemas, tanto terrestres como

aquáticos, apresentam elevada taxa de produtividade primária líquida 2. Dentre

os mais produtivos destacam-se os manguezais, que também detem uma das

maiores biodiversidades do planeta (FONSECA; DRUMMOND, 2002). Estes

ecossistemas contêm os elementos primordiais para atender, com relativa

eficiência, as necessidades biológicas básicas e, por isso, se constituíram em

alvos de assentamentos de uma grande parte da população humana.

Contudo, esta biodiversidade tem diminuído, à medida que a população

humana se expande. Estudos, como o realizado por Wilson (1989), indicam

que nada menos que 40% da produtividade primária líquida total do ambiente

terrestre é usada ou desperdiçada, de alguma maneira, por populações

humanas.

Como exemplo desta assertiva, o citado autor estimou, de maneira

otimista, que 1% das florestas tropicais do mundo é destruído anualmente.

Além disso, cálculos realizados sugeriram uma perda anual entre 0,2% e 0,3%

de todas as espécies (20.000 a 30.000 espécies, baseando-se num total de 10

milhões). A estimativa do autor dificilmente seria projetada para os

manguezais, devido à elevada gama de funções associadas a estes sistemas.

Os manguezais são considerados áreas de transição, onde ocorrem

intensos processos de reciclagem de nutrientes e de elementos geoquímicos,

1
United Nations Environment Programme
2
Produtividade primária líquida é a taxa de armazenamento de matéria orgânica nos tecidos da
planta que excedam o uso respiratório durante certo período (ODUM; BARRETT, 2007).
15

além se se constituírem em áreas de reprodução, crescimento e alimentação

para diversas espécies de importância ecológica e econômica. Também

servem como áreas de descanso para espécies migratórias (SCHAEFFER-

NOVELLI; CINTRÓN, 1986). Quantificar a perda da biodiversidade e recursos,

sofrida por esses ecossistemas em escala global, torna-se extremamente difícil

diante da complexidade dos processos envolvidos e suas interações com as

interferências humanas.

Esses aspectos conferem aos manguezais extrema importância para os

povos costeiros dos trópicos, tanto que esta relação é denominada como

„simbiose‟ entre as comunidades tradicionais e estes ecossistemas; um modo

de vida em que atividades econômicas, sociais e culturais dependem

fundamentalmente da existência do manguezal (DIEGUES, 1993).

As análises sobre a destruição da biodiversidade também devem

considerar as desigualdades econômico-sociais. Desde a década de 1970 as

relações entre a desigualdade social e perda de biodiversidade têm sido

assinaladas nos trabalhos de Dasmann, Milton e Freeman (1973), Kummer e

Turner (1994) e Skole e colaboradores (1994). Estes pesquisadores defendem

a hipótese de que, em muitas situações, as pessoas de menor poder

econômico que vivem no meio rural, ou em áreas de maior riqueza biológica,

são naturalmente levadas a explorar comunidades biológicas e caçar espécies,

mesmo aquelas ameaçadas de extinção, por força das necessidades de

sobrevivência.

Entretanto, a destruição de manguezais também tem como responsáveis

a implementação de atividades de alta rentabilidade como no caso de resorts e

construção de condomínios de luxo (BOTELHO; VALLEJO, 2001)


16

exemplificados no município de Angra dos Reis. Além disto, existem muitos

casos em que os assentamentos populacionais não significam a sobre-

exploração ou esgotamento dos recursos ou de qualquer de seus elementos

(peixes, crustáceos, árvores, etc). Prova disto são as comunidades

tradicionais3 que mantém suas atividades de origem respeitando as limitações

dos recursos naturais de que dispõem (DIEGUES, 1983; PRIMARCK;

RODRIGUES, 2001).

Contudo, com a consolidação do capitalismo e das sociedades

modernas materialistas houve uma aceleração na demanda por recursos

naturais, de forma a atender ao novo modelo de desenvolvimento e os

interesses de determinados grupos dentro da sociedade. Desta forma, as

atividades comerciais em grande escala e a especulação imobiliária, se

expandiram vertiginosamente (MEYER; TURNER, 1994).

O ápice destas demandas concretizou-se na metade do século XX com

o ritmo de expansão desenfreada das cidades que, segundo Dias (2002) são

“uma das maiores criações do homem”. O citado autor sugere ainda que, entre

as principais causas deste crescimento estão a má administração, a corrupção,

a pressão populacional e o colapso ambiental.

A aglomeração nas cidades continua causando profundas modificações

nas paisagens naturais e promovendo um aumento no consumo, ocasionando

pressões ecológicas até então não registradas na evolução humana, porém

com consequências já apontadas no ano de 1962 por Fritz Kahn ao assinalar,


3
Povos e Comunidades Tradicionais no contexto do Art. 3º do Decreto Lei 6040 de 07 de
Fevereiro de 2007 são descritos como grupos culturalmente diferenciados e que se
reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e
usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social,
religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e
transmitidos pela tradição. (BRASIL, 2007)
17

em sua obra “O Livro da Natureza”, que “a cidade transformou-se em aranha

cujas pernas são as estradas, com a Terra como sua presa, os fios do telégrafo

e os trilhos da estrada de ferro são as teias” (KAHN, 1962, p.283).

Acompanhando os processos de desenvolvimento da sociedade

ocidental, o Brasil industrializou-se e urbanizou-se ao longo do século XX

(ROCHA; PIZZOLATTI, 2005), passando de uma sociedade fundamentada na

vida e na produção agrária para o modelo urbano-industrial no contexto das

transformações internas e externas (GRAHAM; HOLANDA FILHO, 1973).

Estas mudanças geraram relações urbano-rurais diretas, em função das

transformações técnicas e sociais no campo, resultantes da revolução

tecnológica das práticas agrícolas e da industrialização do território,

estimuladas pela urbanização (ROCHA; PIZZOLATTI, 2005). A configuração da

urbanização, segundo os autores, estimulou cada vez mais a preferência pela

cidade em relação ao campo, tanto pela disponibilidade de diversas estruturas

e equipamentos urbanos, como também por sua função catalisadora,

possibilitando a incorporação dos moradores de áreas rurais ao mercado de

trabalho das cidades.

Admitindo a forte relação entre crescimento urbano e a migração

interna associada ao processo de urbanização e a complementaridade dos

processos, Graham e Holanda Filho (1973) argumentam que, a princípio, o

crescimento urbano ocorria de forma quase indistinta. No entanto, quando se

consolidou o processo de desenvolvimento industrial no sudeste do Brasil, a

força concentradora dos investimentos produtivos colaborou para o

crescimento das cidades de médio e grande porte e, especialmente das

metrópoles.
18

A evolução do processo de urbanização no município de Vitória-ES não

foi diferente. Até 1890, o município convivia com a ausência de tratamento de

esgoto, escasso abastecimento de água e péssimo serviço de iluminação a gás

(OLIVEIRA, 1975).

A expansão da lavoura cafeeira, aliada ao aumento dos preços no

mercado externo, impulsionou o crescimento da receita, acentuando a função

comercial da cidade. Embora esse tenha sido um período de expansão urbana

e econômica, não existem registros de crescimento populacional urbano e sim

de um maior adensamento nas regiões rurais cafeeiras, portanto, os

aterramentos que ocorreram neste período vieram atender ao mercado

emergente em regiões próximas à Baía de Vitória (CAMPOS JÚNIOR, 1996).

O crescimento populacional mais intenso só veio ocorrer a partir da

década de 1960, devido à crise no mercado do café que ocasionou maiores

taxas de migração da zona rural para a região urbana, pela busca de empregos

nos setores portuário, industrial e da construção civil; atingindo seu auge na

década de 1980. Neste período, a população do município de Vitória aumentou

em 363% (de 194.311 para 706.138 habitantes), o que acarretou problemas

sociais graves, tais como o surgimento de subempregos e submoradias. Este

novo contingente populacional de desempregados distribuiu-se em áreas

menos valorizadas e pouco seguras, tais como encostas de morros e

manguezais (FERREIRA, 1989).

A Ilha de Vitória com sua face ocidental quase totalmente ocupada pelo

Maciço Central, de relevo acidentado e escarpado, com cotas de 130 metros e

declividades acentuadas, foi palco, ao longo do tempo, de intensa ocupação da

face noroeste, composta principalmente, por manguezais.


19

Contudo, o assentamento da população nestas áreas exigiu uma série

de aterramentos, que foram intensificados em 1977 e estenderam-se até o ano

de 1989, quando a Prefeitura Municipal iniciou um projeto de contenção às

invasões e proteção dos remanescentes de manguezais (NUNES, 1998). A

despeito da importância que se atribui hoje às áreas de manguezal, o Brasil

apresenta diversos problemas e contradições flagrantes associados com a

urbanização e gestão territorial dessas áreas.

No contexto do uso do solo, se consideradas a propriedade da terra e

inexistência de programas para atender o público local e das áreas limítrofes,

os ecossistemas protegidos tornam-se suscetíveis à ocupação,

desmatamentos, agricultura ilegal, poluição dos recursos hídricos e solo,

turismo desorganizado, mineração e manejo pelo uso do fogo (OLIVEIRA;

PANITZ; POMPÊO, 2002).

Entretanto, em geral as iniciativas no sentido de envolver as

comunidades próximas na conservação de áreas naturais, incluindo a

possibilidade de implantação de Unidades de Conservação4 (UCs), acabam se

transformando num fator de conflito, gerando na população um sentimento de

rejeição às próprias áreas preservadas. Isso explica, em parte, as práticas de

vandalismo e crimes ambientais cometidos em muitos parques, reservas, etc

(HARRIS; FELLOWS, 1994).

Paralelamente aos conflitos resultantes das estratégias utilizadas para

preservação de áreas-chave incluindo os manguezais, também ocorreram

4
As Unidades de Conservação (UCs), conforme o disposto na Lei nº 9.985, de 18 de julho de
2000, são espaços territoriais e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais,
com características naturais relevantes, legalmente instituídos pelo Poder Público, com
objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se
aplicam garantias adequadas de proteção. (BRASIL, 2000)
20

embates associados com a expansão urbana, envolvendo a perda de recursos

naturais e uso das áreas pelas comunidades tradicionais, principalmente

porque a preocupação em planejar, de forma coerente, a ocupação e o uso do

espaço costeiro é recente no Brasil (MORAES, 2007).

Quando as pressões da expansão da malha urbana sobre áreas de

preservação permanente são constantes, sobretudo quando exarcebadas pela

indisponibilidade de espaço, como no caso da Ilha de Vitória, são necessários

estudos de viabilidade que forneçam subsídios às propostas alternativas de

desenvolvimento.

Dentro deste contexto conflituoso envolvendo o crescimento urbano e

a conservação ambiental em manguezais, a presente proposta se volta para

análise do crescimento histórico da malha urbana do município de Vitória -

Espírito Santo, considerando a forma de ocupação desordenada das

populações instaladas nos limites de áreas naturais do município. Para esse

fim, foi selecionada a floresta de manguezal localizada no setor noroeste da

Baía de Vitória inserida na Região Metropolitana, portanto, constituinte de

áreas que sofrem continuamente pressões decorrentes do crescimento urbano.

Em face das contradições socioespaciais apresentadas, emergem

várias questões, dentre as quais destacamos como central para o projeto em

tela a seguinte:

De que forma as ações do poder público interferiram na supressão do


manguezal na região noroeste, em Vitória/ES, visando a urbanização da
Grande São Pedro?

A partir da questão central, apresentam-se subquestões que se


complementam:
21

 Quais foram as contradições socioespaciais do processo de expansão


sócio-econômica da cidade de Vitória que responderam pela ocupação das
áreas naturais selecionadas para o presente estudo?

 Em que medida a ocupação do solo e o uso de recursos naturais foram


responsáveis pela degradação das áreas naturais selecionadas para o
presente estudo?

A partir desses questionamentos busca-se analisar as contradições

socioespaciais inerentes à gestão territorial aplicada à cidade de Vitória, tendo-

se como hipótese central:

“Considerando que a expansão urbana é um dos processos responsáveis

pela degradação dos espaços naturais, supõe-se que o mesmo modelo

contraditório tenha ocorrido na região Noroeste da Baía de Vitória/ES em

relação aos manguezais”

Objetivos Geral e Específicos

 Geral

Identificar as contradições socioespaciais do processo de produção e

expansão territorial da malha urbana dos bairros constituintes da Grande São

Pedro sobre o ecossistema de manguezal anteriormente existente na área e de

outros manguezais circunvizinhos à cidade de Vitória/ES.

 Específicos

1. Descrever o processo histórico de urbanização da Grande São Pedro e seus


efeitos na distribuição espacial do manguezal da região Noroeste da Baía de
Vitória

2. Avaliar os conflitos de uso do solo durante a urbanização da Grande São Pedro


sobre o manguezal circunvizinho

3. Identificar as políticas públicas voltadas à urbanização da Grande São Pedro e


suas conseqüências acerca da ocupação populacional sobre o manguezal
22

Esta tese está estruturada em quatro capítulos. Inicialmente foram

abordados os grandes temas e conceitos fundamentais que respaldam o

debate teórico, tais como: espaço urbano e urbanização; impactos ambientais

do crescimento urbano; políticas públicas, competências e ordenamento

urbano; manguezais, serviços ambientais e os conflitos do aumento

populacional; e a conservação dos manguezais no Brasil.

No capítulo seguinte, o tema principal é o histórico da urbanização e do

crescimento urbano, tratados em múltiplas escalas (do mundial ao local)

buscando-se estabelecer padrões no processo de crescimento, descrevendo-

se os processos de estruturação urbana associados à evolução econômica e

social nestas esferas, possibilitando a comparação entre o processo nas

diferentes dimensões.

A seguir, são descritos os processos ecológicos do manguezal e a

importância deste ecossistema na região noroeste da Baía de Vitória. De

maneira geral, buscou-se estabelecer as relações com o modo de vida das

comunidades tradicionais locais e os vínculos entre as atividades de extração

sustentáveis e a importância do ecossistema. Além disso, são discutidas as

ações tomadas pelos diversos atores e os instrumentos legais existentes e

criados para a conservação dos recursos naturais deste ecossistema, ao longo

do período estudado.

No último capítulo, são apresentadas as consequências do processo de

urbanização do manguezal da região noroeste da baía de Vitória cristalizados

na forma de conflitos territoriais, degradação ambiental e as influências sobre

as comunidades tradicionais. Também são explorados a criação e a

implementação de instrumentos de política urbana que visaram ordenar a


23

urbanização equilibrando-a com os pressupostos da conservação aplicados

aos manguezais, principalmente em função do potencial produtivo da área.

Nas conclusões, procurou-se associar os processos sócio-históricos que

ocorreram ao longo da ocupação e que conduziram a urbanização da área,

relacionando-os com as políticas públicas implantadas e suas conseqüências,

tanto sobre a população local quanto sobre o manguezal remanescente.


24

2. MÉTODOS E TÉCNICAS

O recorte espacial da pesquisa é a porção noroeste da Baía de Vitória -

ES, contudo, o objetivo do estudo não foi entender a situação territorial dos

manguezais e sua relação com o complexo urbano da Grande São Pedro com

base apenas nas realidades imediatamente visíveis. Enquanto método de

investigação científica, acredita-se que essas realidades são extensões do que

já ocorreu ou continua ocorrendo localmente, além de estarem relacionadas,

direta ou indiretamente, aos contextos nacionais e internacionais. Assim sendo,

a escala geográfica emerge enquanto instrumento analítico da realidade social

em questão. Para tanto, o método de investigação implica o entrecruzamento

de políticas e práticas sociais nas mais diversas escalas geográficas, visando

destacar aspectos gerais e singulares do objeto de pesquisa em questão.

De um modo geral, as características e problemas sócio-ambientais

contemporâneos originam-se em processos sócio-históricos, como apontado

por Milton Santos em sua reflexão sobre a relação espaço-tempo. O autor

destaca a heterogeneidade das formas existentes no espaço; “os objetos

espaciais não são todos do mesmo período e possuem idades diferentes

perfazendo o espaço como uma acumulação desigual de tempos” (SANTOS,

1978, p. 209). Com base nesta argumentação, a pesquisa orientou-se por uma

abordagem eminentemente geográfica, já que as realidades espaciais foram

entendidas como produtos de dinâmicas temporais. Cabe lembrar que a

criação de espaços naturais protegidos surge como resultado de um esforço

internacional no sentido de resguardar o que restou dos ecossistemas nativos.


25

Em linhas gerais, a investigação promove o entrecruzamento de escalas

geográficas, acumulação desigual de tempos, isto é, a presença de

territorialidades distintas nos manguezais circunjacentes à malha urbana das

cidades e, por fim, os conflitos territoriais. Neste contexto, a dialética, enquanto

método de investigação das realidades sociais torna possível resgatar o

território enquanto expressão das contradições sociais.

Para fins de operacionalização, no primeiro momento a pesquisa

considerou os aspectos históricos mais importantes que levaram à expansão

urbana em escala mundial e nacional. Buscaram-se elementos sobre a

evolução do processo considerando as suas origens mais remotas e o

conhecimento das diretrizes atuais. Quais as contradições e motivações que

conduziram à ocupação e urbanização da área? Quais as políticas públicas

implantadas? Essa demanda foi atendida através de pesquisa bibliográfica,

priorizando-se a compreensão da evolução conceitual; e de campo observando

as vivências locais e comparando o panorama real com as propostas

institucionais.

O crescimento urbano acelerado em uma região originalmente rica em

recursos naturais, assim como na região da Grande São Pedro em Vitória/ES,

pode causar alterações irreversíveis aos ecossistemas existentes na área e

trazer consequências severas à população dependente destes sistemas.

Assim, a análise, tanto do crescimento da malha urbana quanto dos processos

sociais associados, poderá ser útil para futuras tomadas de decisão visando a

um desenvolvimento equilibrado em cenários similares.

A busca por informações que pudessem testar a hipótese proposta no

estudo foram realizadas no âmbito de órgãos públicos e privados que detêm


26

dados acerca do desenvolvimento urbano da cidade. Para tanto foram

coletadas informações sobre a ocupação e expansão da malha urbana da área

no Arquivo Público Estadual, no Arquivo Público Municipal, no Instituto Jones

dos Santos Neves, na biblioteca central da Universidade Federal do Espírito

Santo e na Prefeitura Municipal de Vitória.

Dados cartográficos, sob a forma de imagens de satélites,

aerofotogramas e mapas que pudessem elucidar a evolução temporal da malha

urbana e sua relaçao direta com a supressão do manguezal, foram obtidos

junto ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), o Instituto Estadual

de Meio Ambiente do Espírito Santo, o Instituto de Defesa Agropecuária e

Florestal do Espírito Santo e junto a Subsecretaria de Tecnologia da

Informação (GEO) da Secretaria de Fazenda da Prefeitura Municipal de Vitoria.

Analisar as alterações e processos que ocorrem durante a

transformação de um sistema natural em área urbana, considerando as

diversas dinâmicas sociais envolvidas, é utilizar-se de um método empírico já

que decorre de tentativa de enquadramento dos processos observados em

seus arcabouços teórico-conceituais

Na prática a técnica de coleta de dados utilizada foi, em sua maior parte,

a pesquisa documental e bibliográfica, e em menor monta a observação direta

intensiva assistemática e individual na forma de entrevistas qualitativas

despadronizadas e não dirigidas que permitiram estabelecer um contraponto às

informações fornecidas pelos órgãos públicos a partir da percepção de atores

sociais locais.
27

A análise comparativa entre cenários prévios da área estudada e sua

condição atual foi realizada adotando a lei da mudança da dialética, ou seja,

pela observação das alterações estruturais socioambientais que ocorreram

tanto de maneira contínua quanto por meio de saltos.

Para atender aos objetivos estabelecidos e testar a hipótese aqui

proposta buscou-se descrever o processo de crescimento da malha urbana da

região noroeste da baía de Vitória com destaque para o período entre os anos

de 1980 quando inciou-se a ocupação, e 2000, período considerado como

ápice da urbanização dos bairros formadores da região.


28

3. FUNDAMENTOS CONCEITUAIS E TEÓRICOS

3.1 ESPAÇO URBANO E URBANIZAÇÃO

O „espaço urbano‟ pode ser abordado de diversas maneiras de acordo

com suas múltiplas características. Segundo Corrêa (1997), ele pode ser

fragmentado e justaposto de inúmeras paisagens e usos do solo, que na

cidade originam um mosaico urbano constituido pelo núcleo central, a zona

periférica do centro, áreas industriais, subcentros terciários e áreas residenciais

distintas em termos de formas e conteúdo, tais como áreas de lazer,

condomínios exclusivos e favelas.

O „espaço urbano‟, para o autor, é fragmentado, desigualmente

produzido e apresenta diferentes arranjos espaciais desta fragmentação,

contudo, é articulado com as diversas partes mantendo relações entre si e,

graças à articulação, o „espaço urbano‟ conquista unidade e manifesta-se

através de fluxos de pessoas e produtos.

Além disto, o espaço urbano é uma condicionante social que se

materializa através das condições e relações de produção reproduzindo as

diversas classes sociais e suas funções (SANTOS, 1996), tornando-se então

um campo simbólico de dimensões e significados variáveis, conforme as

classes e grupos etários e étnicos; portanto, estruturado pela confluência de

processos sociais e espaciais.

A concepção de espaço urbano, estruturado a partir de uma

convergência dos processos sociais e espaciais, coincide com o conceito

adotado por Lefebvre (1991) para descrever a urbanização como parte

integrante e essencial da produção do espaço pelo capitalismo. Desta forma,


29

adotando o conceito de espaço como algo mais do que uma área geográfica

física a ser preenchida por populações organizadas social, econômica e

politicamente, pode-se considerar a concepção ampliada de urbanização de

Giddens (1989) caracterizada por processos sociais de maior significação na

estruturação do território.

Assim a urbanização pode ser compreendida como a concatenação e

concretização espacial de movimentos, de reprodução e distribuição das

atividades produtivas e da população, em disputa pelo espaço, que no

capitalismo traduzem-se nas estratégias do capital e do trabalho para garantir

suas respectivas reproduções. As diferenças de intensidade e de articulação

entre tais processos variam historicamente e conformam a estruturação da

produção e do território.

Em uma análise contemporânea, não se pode enfocar a questão urbana

sem destacar a história do processo de urbanização, que, por sua vez, introduz

a problemática do desenvolvimento das sociedades (CASTELLS, 1974). Para o

autor, o termo urbanização tem dois sentidos distintos: concentração espacial

de uma população, a partir de certos limites de dimensão e de densidade e

difusão de sistema de valores, atitudes e comportamentos denominado “cultura

urbana”.

Sob esta ótica, o termo urbanização se refere tanto à constituição de

formas espaciais particulares que tomam as sociedades, caracterizadas pela

concentração de atividades e de população sobre um determinado espaço,

quanto à existência de um sistema de organização cultural particular

denominado „cultura urbana‟.


30

O processo de urbanização contém uma dinâmica própria na qual uma

população se concentra em um determinado espaço e estabelece relações

sociais que se materializam e conformam o espaço físico-territorial urbano. São

as aglomerações urbanas que se apresentam funcionalmente e socialmente

interdependentes, com uma relação de articulação hierarquizada, formando

redes urbanas de cidades.

Considerando a análise de Castells (1974) para o termo urbanização, é

possível então adotar a concepção de crescimento urbano proposta por Mello e

Silva (1989). Este autor considera que, há uma correspondência direta entre a

concepção de crescimento urbano e a idéia da expansão urbana, com suas

repercussões nos padrões de povoamento e organização de uma determinada

sociedade.

De acordo com esta ótica, o crescimento urbano deve ser associado

principalmente ao crescimento em tamanho elou em número dos centros

urbanos e à complexidade de suas funções, havendo, portanto, a necessidade

de especificação das suas mensurações.

3.2 TRANSFORMAÇÕES INERENTES AO CRESCIMENTO URBANO

Quanto às forças impulsionadoras da urbanização, Irwin (1999) e

McNeill (2000) sustentam que um grande número de pessoas reúne-se nas

cidades em busca de trabalho e melhores serviços, representados por

empregos e educação de melhor qualidade, oferecidos nas áreas urbanas

como resposta à demanda de mão de obra qualificada no campo em função da

mecanização das fazendas. Além disso, os autores assinalam a importância


31

dos conflitos sociais, da degradação da terra e do esgotamento dos recursos

naturais como fatores catalizadores da urbanização.

A globalização da economia também é considerada uma mola

propulsora a partir do momento em que as cidades são consideradas centros

de força econômica (WRI, 1997). Neste contexto, a United Nations Centre for

Human Settlements (UNCHS, 2000) sugeriu que as cidades desempenham um

importante papel, cumprindo as funções tanto de provedoras de emprego, de

moradia e serviços, de centros de desenvolvimento cultural, educacional e

tecnológico, como de centros industriais de processamento de produtos

agrícolas e manufaturados.

Portanto, as cidades são locais onde se gera renda havendo, sob esta

ótica, um forte e positivo vínculo entre os níveis de desenvolvimento humano e

os níveis de urbanização. Existe ainda, a percepção geral de que a „vida

urbana' representa alta “qualidade de vida” e por isto o citadino tem uma vida

tranquila se comparada a de seus vizinhos de áreas rurais.

Entretanto, é de conhecimento comum que os benefícios não são

universais, Satterthwaite (1996) aponta que, entre um quarto e a metade da

população de cidades em desenvolvimento vive em bairros em condições

precárias e mesmo miseráveis e aglomerados em comunidades com extremas

limitações no que diz respeito aos serviços urbanos.

Condições precárias de estrutura sanitária promovem o aparecimento de

epidemias e doenças expansivas (SARRETA, 2009), além da degradação

ambiental. Esta assertiva é corroborada pela UNCHS (2001) que indica como

consequências do crescimento urbano acelerado o desemprego crescente, a


32

escassez de serviços urbanos, a sobrecarga da infraestrutura existente e falta

de acesso à renda e à moradia adequadas.

A cristalização do capitalismo, processo apontado pela ONU (1996), é

denominado por Castells (1999) “cidade dual”. Segundo análise do autor é um

processo descrito como paradoxal e individualista, na medida em que o

atendimento às demandas por serviços urbanos não acompanha o crescimento

cada vez mais acelerado das cidades e de suas populações. Neste contexto,

os pobres das cidades, impedidos de ter acesso aos escassos recursos

naturais do meio urbano ou de se proteger das condições ambientais adversas,

são mais afetados pelos impactos negativos da urbanização.

A dualidade entre território e poder no meio urbano, pode ser percebida

no processo de fragmentação do espaço para a comercialização imobiliária

(LEFEBVRE, 1991) destacando-se o fato de que, nas cidades capitalistas,

existem várias maneiras de apropriação do espaço urbano para moradia

(FERREIRA, 2007), nas quais a terra é apropriada, vendida e comprada em

“pedaços”, logo compartimentada.

O „marco‟ divisório dessa apropriação é a capacidade diferenciada de

pagar pela terra e pela casa, expressa pelas classes ou parcela de classes.

Esta apropriação, relativa a um espaço vivido, ou a um sistema percebido no

seio do qual um sujeito se sente 'em casa' (GUATARI; ROLNIK, 1996), permite

considerar a territorialização do espaço urbano, como um conjunto dos projetos

e de representações que definem uma diversidade de comportamentos, de

investimentos, nos tempos e nos espaços sociais, culturais e estéticos, de

maneira a determinar funções a estes espaços.


33

Adotando esta conceituação para análise aqui proposta, a

territorialização do espaço é caracterizada pelo local de moradia, necessidade

biológica e necessidade social, a terra e a habitação onde alguns ainda obtêm

renda, juros, lucro e, a maioria dos demais, dispendem esforços e dinheiro para

obter um abrigo. Complementarmente a este conceito cabem ser destacadas

as argumentações de Holzer (1997) ao sugerir a visão de território como um

conjunto de lugares, onde se desenvolvem laços afetivos e de identidade

cultural de um determinado grupo social, dissociando a obrigatoriedade do

território como área geográfica fechada obedecendo uma delimitação rígida de

fronteiras.

A ênfase na análise da terra e/ou habitação nela edificada, é uma forma

de tornar explícito o processo de produzir e consumir a cidade e a concorrência

entre as diferentes “necessidades” de moradia, e entre as necessidades de

reprodução do capital e de reprodução da força de trabalho.

Em função da elevada taxa de urbanização, o espaço necessário para

moradia também conflita com diferentes usos urbanos (HARVEY, 1982) e,

grande volume de urbanização gera grande diversidade, seja dos espaços

apropriados, seja de localização das habitações, tanto em locais bem

aparelhados por equipamentos urbanos como em áreas caracterizadas pela

segregação espacial.

Esta multiplicidade de processos privados de apropriação do espaço

urbano capitalista, determinados pela propriedade privada da terra foi analisada

por vários autores (CASTELLS, 1974; MARICATO, 1979; HARVEY, 1982;

SEABRA, 1983), que buscaram demonstrar as formas como esta produção


34

ocorre no circuito imobiliário urbano e discutiram a lógica do capital na

produção do espaço urbano e da miséria humana.

Uma análise panorâmica do capitalismo realizada por Rodrigues (1988

p.161) aponta que, além deste provocar “a expropriação no campo, provoca

também a super exploração na cidade e cria uma população excedente para as

necessidades médias de acumulação”. A urbanização para Takács-Sánta

(2004) é acompanhada desde sua gênese da piora e do aumento de diversos

problemas urbanos ambientais locais. A rápida expansão urbana, durante o

último meio-século, mudou a fisionomia da Terra mais do que, provavelmente,

qualquer outro resultado da atividade humana em toda a história.

Os habitantes do planeta esqueceram-se da sua profunda dependência

da natureza; natureza que foi vista como uma simples coleção de serviços e

benefícios gratuitos e à disposição de todos (SATTERTHWAITE, 1996). Assim,

a aglomeração populacional, os padrões de consumo, os padrões de

deslocamento e as atividades econômicas urbanas causam diversas alterações

e impactos sobre o meio ambiente em termos de consumo de recursos e

eliminação de resíduos (UNPD, 2001), com reflexos sobre a própria população

que se utiliza destes serviços.

Como consequência dos impactos socioambientais resultantes da

aglomeração humana centralizada nas cidades, algumas análises sugerem que

as áreas urbanas, com um pouco mais da metade da população mundial e

ocupando apenas entre 1 e 5% da superfície, são responsáveis por 80% das

emissões de carbono, 75% do uso da madeira e 60% do consumo de água

(O‟MEARA, 1999).
35

Embora Satterthwaite (1996) tivesse sugerido que as cidades param seu

crescimento ao se tornarem ineficientes e desagradáveis, na medida em que

os problemas de congestionamento e poluição superam os benefícios do

desenvolvimento, para a ONU (1996), mesmo com uma pequena queda, o

ritmo da urbanização deverá continuar intenso nas próximas décadas.

3.3 POLÍTICAS PÚBLICAS , COMPETÊNCIAS E O ORDENAMENTO URBANO

No Brasil, para Pechman (2002) o urbanismo fugiu à política e travestiu-

se de pura técnica de controle dos problemas produzidos pela “disfunção”

urbana; revestindo-se de uma forma de dominação, fundada exclusivamente na

técnica. Desta forma, continua o autor, o processo de formação da “cidade

desejada”, fruto do trabalho e participação coletivos de uma sociedade, lugar

onde se materializa a história de um povo, pela via das suas relações sociais,

políticas, econômicas, artísticas e religiosas, passou despercebido para os

gestores e urbanistas.

Por mais utópica que seja a idéia de “cidade desejada” ela integra e

carrega em si a definição de aplicação prática das políticas públicas que estão

ligadas, fortemente em essência ao Estado, já que este determina como os

recursos são usados para o beneficio de seus cidadãos. Souza (2006)

classifica a política segundo três visões. Primeira como um equilíbrio no

orçamento entre receita e despesa, segunda como uma nova visão do estado,

evolução da política keynesiana para uma política restrita aos gastos, e terceira

na relação que existe entre os países desenvolvidos e os que iniciaram a sua

caminhada democrática recentemente. De um modo particular os países da

América Latina, que ainda não conseguem administrar bem os seus recursos
36

públicos e equacionar os bens em beneficio de sua população, de modo a

incluir os excluídos.

Sob esta ótica cabe um maior detalhamento conceitual do que é política.

No entendimento de Jenkins (1978, p. 15), política é um ”conjunto de decisões

interrelacionadas, concernindo à seleção de metas e aos meios para alcançá-

las, dentro de uma situação especificada”. Entretanto, Heclo (1972) propõe

outro conceito, segundo o qual, uma política seria o curso de uma ação ou

inação (ou “não-ação”), considerando-a mais do que decisões ou ações

específicas. Além disto, à conceituação do termo política pode-se agregar o

produto do processo de tomada de decisões como sugere Wildavsky (1979).

Dagnino e colaboradores (2002) discutem a amplitude das aplicações do

termo política; os autores sugerem que política é gerada por uma série de

interações entre decisões mais ou menos conscientes de diversos atores

sociais (e não somente dos tomadores de decisão). Para eles, política envolve

tanto intenções quanto comportamentos, logo, tanto ação como não-ação; além

disso, é um processo que se estabelece ao longo do tempo e envolve relações

intra e inter-organizações, além de ser estabelecida no âmbito governamental

em várias escalas, envolve múltiplos atores, e é definida subjetivamente

segundo as visões conceituais adotadas.

Dentro desta ótica inter escalar e de multiplicidade de atores para a

produção de políticas, vale destacar a concepção de política local sugerida por

Cox (1998), que se integra e interage com a política global e reconhece uma

integração em processos que ocorrem em níveis mais altos e mais baixos de

abstração e da realidade. Para o autor, localidades, como tipos específicos de


37

espaços podem ser distinguidos em duas maneiras fundamentais: como

espaços de dependência e espaços de engajamento.

O autor define os espaços de dependência como as relações sociais em

que empresas, povos e agências dependem para a realização de suas

atividades, incluindo aí condições específicas do local. Desta forma, pessoas,

empresas e agências estatais organizam-se a fim de garantir as condições

para a manutenção dos seus espaços de dependência, porém, essa ação os

obriga a interagir com outros centros de poder social; seja governo local, a

mídia, e de forma mais ampla, a comunidade internacional. Esses espaços

extra-dependentes são, de acordo com o autor, denominados espaços de

engajamento, que característicamente são mais variáveis do que os espaços

de dependência; e ainda podem ser mais extensos e/ou restritivos.

A tensão que existe entre os espaços de dependência e envolvimento

cria uma política de escalas em que algumas localidades são mais ou menos

envolvidas em redes de associação além de seus limites imediatos do que

outras. Tais redes de associação podem esticar-se em diferentes escalas.

Portanto, atores situados localmente, através de redes de associação,

constroem espaços de participação. Por fim, Cox (1998) sugere que se deva

pensar a escala além de uma área ou espaço circunscrito, mas sim

compreender a politica em escalas como uma rede ou estratégia que relaciona

conflitos e contradições locais, regionais ou eventos globais.

Para Verza (2000) a política pública associa-se fortemente à

globalização já que é um fenômeno que atinge todas as sociedades,

manifestando-se, no entanto, de forma excludente pela geração de

desemprego, exclusão social e causando danos socioeconômicos e


38

socioambientais. Nesta visão, cabe salientar que “a pressão da globalização

cria a necessidade do governo buscar alternativas novas do contato direto com

o cidadão, superando a forma tradicional de fazer política” (VERZA, 2000, p.84-

87).

Segundo Moraes (1994), as políticas públicas podem ser agrupadas em

três grandes segmentos: políticas econômicas, incluindo neste grupo as

políticas cambial, financeira e tributária; políticas sociais, englobando as

políticas de educação, saúde e previdência; e, políticas territoriais, compostas

por políticas de meio ambiente, urbanização, regionalização e de transportes.

Em termos gerais, política pública pode ser definida como "tudo o que o

governo faz". No entanto, Pal (1987) distingue decisões de políticas; para o

autor, decisões são tomadas todos os dias e em grande quantidade, muitas

vezes como simples reação às circunstâncias. As políticas públicas estão

acima das decisões, e em geral são produtos de planejamento. Contudo vale

lembrar também que, para Reis e Motta (1994) o acúmulo de decisões no

tempo pode também vir a se constituir numa política.

O Brasil, com suas dimensões continentais, apresenta complexas

distinções para além da condição multifacetada do espaço enquanto territórios

e poderes locais, o que faz com que instrumentos normativos tradicionais como

as leis disciplinadoras do parcelamento do solo urbano, leis de zoneamento,

códigos de edificação e outras disposições de ordem urbanística, e até de

preservação do meio ambiente, não sejam suficientes para a solução de muitos

dos grandes problemas que afligem as cidades.


39

O processo de urbanização, ao final do século XX, marcadamente

desigual, propiciou uma grande concentração espacial de pobreza, com

diversas consequências socioambientais, dentre as quais destacam-se para o

tema em tela: o crescimento desigual, a exclusão social e a insustentabilidade

social e ambiental (MARICATO, 2001).

A necessidade de ordenar o uso do solo urbano e minimizar os

problemas acima descritos, além de diversos outros, está contida no Capítulo

de regulamentação da Política Urbana, no âmbito da Constituição Federal, com

os artigos 182 e 183. Nesses estão estabelecidas diretrizes que visam “ordenar

o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar

de seus habitantes”. Contudo, em função da complexidade das funções da

cidade, o Governo Federal promulgou, em 2001, o Estatuto da Cidade, que

regulamenta os artigos acima citados e estabelece, segundo descrito na Lei,

diretrizes gerais de “ordem pública e interesse social que regulam o uso da

propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos

cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental” (BRASIL, 2001).

Embora tendo sido criado com objetivo de ordenar o desenvolvimento

das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, o Estatuto da Cidade e

suas diretrizes gerais, esbarram em várias dificuldades de operacionalização.

Tais obstáculos podem ser cristalizados ao considerar a precária qualidade de

vida urbana, a insustentabilidade nos processos sociais, econômicos,

ambientais, culturais e institucionais decorrentes de ações urbanas

implementadas (SILVA, 2006).

O estabelecimento dessas condições não se deu a partir de um

processo recente, ele é fruto de meio século de crescimento desorganizado


40

das cidades, desarticulado de um planejamento urbano eficaz e

complementado pela migração maciça do campo para a cidade, políticas

públicas ineficientes, distribuição desigual de riqueza, entre outros fatores; e

pode ser caracterizado pela configuração de duas cidades distintas. A “cidade

legal”, caracterizada pela implementação de parcelamentos oficiais localizados,

em geral, em áreas mais centrais, destinados à moradia das classes médias e

altas; e a “cidade ilegal”, destinada à moradia das classes baixas, caracterizada

pela implantação de loteamentos ilegais ou irregulares nas porções periféricas

dos municípios e pela consolidação de favelas em diversas áreas das regiões

mais centrais (SILVA, 2000; MARICATO, 2001).

Mesmo nas áreas em que existe uma redução acentuada das taxas de

crescimento da população como um todo, assentamentos espontâneos,

principalmente favelas, vêm se desenvolvendo (IBGE, 2002). Esta forma de

expansão urbana coloca, em algumas cidades, quase a metade do espaço

construído na esfera do irregular e do informal, o que envolve questões que

vão desde a insegurança do morador até a forma de ocupação „físico-territorial‟

das favelas e dos loteamentos.

A irregularidade fundiária teve, e ainda tem uma forte implicação nos

obstáculos ao acesso ao crédito e aos programas habitacionais oficiais, que

exigem a regularização como condição para a obtenção dos financiamentos

(IPEA/PNUD, 1996). Sob este olhar, Freitas (2000) argumenta que

parcelamentos ilegais do solo são considerados um dos problemas mais

graves estudados atualmente, no direito urbanístico e no direito municipal, com

reflexos no âmbito dos direitos ambiental, econômico e penal. Esses

parcelamentos proliferam-se nas periferias urbanas e nas zonas rurais, como


41

resultado da carência de oferta imobiliária de baixo custo, da especulação e,

ainda, como resultado da ocupação de terras públicas.

A implantação ou regularização de um loteamento demanda o

cumprimento de diretrizes urbanísticas junto ao município, tais como

elaboração de planta, memorial descritivo e projeto, contratação de técnicos,

execução de obras conforme padrões técnicos, incluindo demarcação dos lotes

e áreas, abertura de ruas, implantação de rede de distribuição de água, de

energia elétrica e de coleta e disposição de esgoto, pavimentação, implantação

das galerias de escoamento de águas pluviais, guias e sarjetas;

comercialização dos lotes considerando profissionais, marketing e propaganda;

recolhimento de impostos; manutenção de elemento de empresa e

consequentemente encargos correspondentes, entre outras.

Além disso, parte da gleba é transferida ao patrimônio do município 5

gratuitamente, para a formação das vias de circulação, espaços livres, áreas

verdes e de lazer, praças e prédios públicos, e assim por diante. Todo esse

quadro eleva os custos do empreendimento, o que, obviamente é repassado ao

comprador, inviabilizando a flexibilização econômica desse mercado.

Segundo Bezerra e Fernandes (2000), à questão fundiária mal resolvida

associam-se as limitações decorrentes da fragilidade dos processos e

instrumentos de regulação e controle do uso do solo e do planejamento e da

gestão urbana, sem que o governo disponha de meios de intervenção sobre a

propriedade da terra, capazes de efetivamente, assegurar a função social da

propriedade e proteger o interesse coletivo no uso e na ocupação do solo

urbano.

5
Art.4 da Lei 6.766/79 Parcelamento do solo urbano no Registro Imobiliário. (BRASIL 1979)
42

Ocorre então a segregação socioeconômica e o aumento da

informalidade nos padrões já inadequados de uso e ocupação do solo urbano

ocasionando o aumento de riscos ambientais para a população. Esta situação

de irregularidade traduz-se, na grande maioria das vezes, por grande

concentração populacional vivendo em áreas consolidadas com pouca ou

nenhuma infraestrutura urbana e carente de serviços públicos, nas áreas

periféricas das cidades.

A população destas áreas, devido à inexistência de infraestrutura, está

exposta a inundações e deslizamentos de encostas; agravados pelas formas

de ocupação sem planejamento e/ou assistência técnica na consolidação da

estrutura habitacional e associados a doenças (CORDEIRO, 1995). A autora

afirma também que as inundações são, em geral, acompanhadas de

enfermidades, tais como a leptospirose, doenças diarréicas, febre tifóide e as

hepatites virais A e E que, nestes casos, chegam a acometer cerca de

seiscentas mil pessoas anualmente. Além destas doenças, recorrentes na

época de inundações, outras já controladas, transmitidas através de vetores

reaparecem, como a dengue, a leishmaniose e o cólera.

Pode-se sugerir que a ocupação irregular do solo é um dos elementos de

maior relevância na gênese dos principais problemas urbanos, em áreas tão

distintas quanto segurança, saúde, transportes, meio ambiente, defesa civil e

provisão de serviços públicos. Esses problemas não afetam apenas a

população residente das áreas ocupadas irregularmente, mas estendem-se

para toda a população, seja pela ampliação desnecessária dos custos de

urbanização ou ainda pelas externalidades negativas decorrentes de


43

fenômenos como a contaminação e o assoreamento dos recursos hídricos e a

disseminação de doenças contagiosas.

Segundo determinado pela Constituição Federal (BRASIL, 2010), em seu

artigo 30, VIII, compete ao Município a responsabilidade pelo controle do uso

do solo. Embora os municípios tenham competência para planejar, regular e

controlar o uso e a ocupação do solo urbano e executar a política de

desenvolvimento urbano, lançando mão de vários instrumentos, tais como as

normas de parcelamento e construção compulsória, a concessão do direito real

de uso, a urbanização consorciada, entre outros; são poucos aqueles que

avançaram adequadamente na sua formulação e aplicação (BEZERRA;

FERNANDES, 2000). Além disso, não está claro, no contexto da Constituição,

a competência municipal para a repressão às infrações urbanísticas.

A despeito da crescente descentralização das ações governamentais,

torna-se patente que nem todos os problemas urbanos e ambientais são

gerados e podem ser resolvidos exclusivamente na esfera local. Nesse sentido,

as cidades ressentem-se da ausência de formas mais adequadas de

cooperação governamental (vertical e horizontal), indispensáveis para

equacionar os problemas ligados ao solo urbano, agravados pela ausência de

uma regulamentação que defina mais claramente a competência e os papéis

de cada esfera de governo (CAVALCANTI, 1997).

Em função destas deficiências, é comum as empresas concessionárias

preferirem oficializar a combater as ligações clandestinas. No caso do

saneamento, é comum que se faça a ligação de água, mas não a de

esgotamento, o que cria o chamado “esgoto a céu aberto”, uma das principais

fontes de transmissão de doenças.


44

Ocorre que o fornecimento oficial de água e energia elétrica consolida

irreversivelmente o assentamento e até contribui para sua expansão, uma vez

que viabiliza a implantação de novas ligações clandestinas a partir das oficiais.

As ligações oficiais em assentamentos ilegais representam, em última

instância, o próprio Poder Público contribuindo para o desenvolvimento urbano

desordenado (PINTO, 2007).

O mais grave é que, uma grande parte desses assentamentos localiza-se

em áreas de risco ou de preservação ambiental e não podem ser

regularizados. Tomam-se como exemplo os assentamentos comuns, em todo o

país, em áreas de proteção de mananciais, em encostas sujeitas a

desmoronamentos ou em várzeas alagáveis, realizados clandestinamente,

porém totalmente eletrificados.

Esta condição representa o perfil da demanda por serviços de

saneamento no Brasil, que guarda relação histórica com a exclusão social e a

segregação espacial (CORDEIRO, 1995), vivenciando-se, atualmente, um

modelo de gestão urbana excludente, segundo classes sociais, desigual para

homens e mulheres, e competitivo em relação aos recursos naturais.

O modelo acima descrito tem como conseqüência patente, os conflitos

socioambientais envolvendo classes sociais e grupos distintos. Apoiando-se

nesta assertiva é possível conceituar conflitos socioambientais como disputas

entre grupos devido às suas relações distintas com o meio natural (LITTLE,

2001).

Os conflitos ambientais podem expressar contradições dos modelos de

desenvolvimento, envolvendo populações tradicionais, ocupação de ambientes


45

urbanos e mercantilização de recursos naturais, dentre outros (ACSELRAD,

2004). Para o autor, sob o ponto de vista econômico, o conflito pode ser de

dois tipos: conflito por distribuição de externalidades, em que o responsável

pelo impacto não assume as suas conseqüências e; conflito pelo acesso e uso

dos recursos naturais, devido à dificuldade de definir a propriedade dos

recursos. Em função deste último aspecto os recursos naturais são

frequentemente classificados como de propriedade comum, de

responsabilidade do governo, do poder público e da comunidade

(DRUMMOND, 2001).

Na ótica de Nascimento (2001) é possível caracterizar o conflito à partir

de um conjunto de elementos, tais como a natureza do conflito, atores sociais

diversos, campo específico, objeto de disputa, dinâmica de evolução,

mediadores ou observadores. Para o autor, o conflito pode ser de natureza

econômica, política, social, ambiental, cultural, geracional, geográfica, dentre

diversos outros. Os atores articulam-se entre si ou se opõem uns aos outros e

nem sempre seus discursos são coerentes, existem também os mediadores ou

observadores que presenciam o conflito, defendendo ou não uma posição. O

objeto pode ser material ou simbólico, real ou irreal, e o campo é o espaço de

movimento dos atores. A dinâmica é o modo pelo qual o conflito se manifesta e

evolui.

O autor sugere que os conflitos evoluem em três fases, a preparação,

fase em que os atores se estudam e estabelecem estratégias; o embate,

quando os atores se enfrentam; e a conclusão, quando há uma resolução.

Caso não haja resolução, o conflito persiste de forma crônica, podendo gerar

novos embates (NASCIMENTO, 2001).


46

Apesar de Brody e colaboradores (2004) sugerirem que a resolução de

um conflito ocorre quando é alcançado o melhor resultado para todas as partes

interessadas, para Little (2001) só há resolução de qualquer conflito com o fim

das causas originárias da contenda, e não apenas com a eliminação das

divergências das partes. Portanto, com a intensificação do desenvolvimento

econômico e da escassez de recursos naturais, conflitos latentes podem se

transformar em disputas longas, de alto custo e sem resultados satisfatórios

(BRODY et al., 2004).

3.4 MANGUEZAIS E OS SERVIÇOS AMBIENTAIS

Conforme a Figura 2, os manguezais distribuem-se no globo, por mais

de 18 milhões de hectares cobrindo um quarto da linha costeira intertropical

mundial estendendo-se eventualmente ao norte do Trópico de Câncer e ao sul

do Trópico de Capricórnio (WALSH, 1974). Dominam deltas e enseadas do

sudeste asiático desde a Tailândia, Bruma e Vietnam através da Malásia até a

Indonésia, com mais de 5 milhões de hectares ao redor das ilhas habitadas da

Nova Guiné e Bornéu (HINRICHSEN, 1996).

O maior sistema contínuo cobre 570.000 hectares em Bangladesh, onde

está instalado o porto de Tigre de Bengala que sustenta 300.000 pessoas. São

ecossistemas que contribuem para a ampla biodiversidade de grande parte do

globo e assumem funções vitais na manutenção desta diversidade e de

variadas atividades antrópicas.


47

Figura 1 - Distribuição das florestas de manguezal no globo.


Fonte: National Geographic Magazine (2007)

O manguezal em geral, sempre foi desconsiderado sob a ótica de objeto

de valorização imobiliária e de importância sanitária, principalmente por sua

associação (indevida) como área dispersora de doenças e de aspecto

degradante. A partir dos anos sessenta do século vinte, uma série de trabalhos

de autores de renome, tais como Eugene e Howard Odum foram produzidos,

subsidiando uma mudança de percepção sobre a importância de tais habitats,

uma vez que estes apontavam para uma alta produção de biomassa e

aparente relação direta com a produtividade das águas costeiras.

A partir de então, estabeleceu-se grande importância ecológica a este

ecossistema, sobretudo para o espaço urbano; contudo a compreensão do

papel ecológico do mangue passa por uma análise conceitual mais ampla, que

esclareça seus aspectos mais relevantes, permitindo descrever o mangue

como um ecossistema costeiro e de transição entre os ambientes terrestres e

marinhos característicos de regiões tropicais e subtropicais e sujeitos ao

regime das marés. É constituído de espécies vegetais lenhosas típicas, além

de micro e macroalgas, adaptadas às alterações de salinidade e caracterizadas


48

por colonizarem sedimentos predominantemente lodosos, com baixos teores

de oxigênio (NOVELLY, 1995).

A autora completa apontando que os manguezais ocorrem em regiões

costeiras abrigadas e apresentam condições propícias para alimentação,

proteção e reprodução de muitas espécies animais, sendo considerados

importantes transformadores de nutrientes em matéria orgânica e geradores de

bens e serviços.

Apesar da grande relevância das funções acima descritas, tais aspectos

não encerram as possibilidades funcionais deste ecossistema tão complexo.

Assim, outras definições, tais como a proposta por Soares e colaboradores

(2003), que descreve elementos e processos existentes num contexto cíclico,

também devem ser destacadas a fim de buscar um melhor entendimento da

importância deste sistema.

Apropriando-se destes conceitos, dentre os vários existentes, pode-se

afirmar que os manguezais são compostos de árvores e arbustos tolerantes à

variabilidade salina, crescem em águas rasas que sofrem ação das marés de

áreas costeiras e estuarinas da região intertropical, requerem correntes lentas,

quentes e ricas em sedimentos finos onde fixam suas raízes e abrigam uma

alta diversidade de organismos aquáticos e semi-aquáticos durante parte ou

todo periodo da vida destes organismos (CHOUDHURY,1997).


49

O papel do mangue originalmente ecológico funde-se a funções

econômicas a partir do momento em que se torna claro o fornecimento de

serviços de alta relevância para o equilíbrio ambiental e para a manutenção da

vida (WALSH, 1974). Ademais, este ecossistema fixa terras e controla a

erosão, já que, ao colonizar o espaço, sua elevada biodiversidade e sua

estrutura geomorfológica, são capazes de atenuar a energia do mar, com suas

ondas e marés (Figura 2).

Figura 2 - O emaranhado de raízes dos manguezais ajuda na retenção de


sedimentos fluviais e protegem a costa dos processos erosivos causados pela
hidrodinâmica (foto inferior - Baía de Bengala, África).
Fontes http://www.mbgnet.net/salt/sandy/mangroots.html
http://www.printsngs.com/natgeo/

O mangue também atua como um bloqueador eólico, reduzindo a força

dos ventos marítimos e evitando a erosão eólica. Considerando a dinâmica

fluvial natural, a descarga de sedimentos continentais carreados através dos

rios encontra uma verdadeira malha retentora nos manguezais, desta forma,
50

enquanto as áreas sedimentadas, em torno destes ecossistemas e banhadas

por marés são colonizadas por eles, a estrutura uma vez constituída fixa tais

áreas.

Tal como qualquer ecossistema natural, o manguezal é uma

geobiocenose6 aberta (ODUM, 1985) caracterizando-o por sua contínua troca

de elementos e energia com ambientes de entrada e de saída circunvizinhos,

tais como florestas, fonte de água doce e o mar, organizando os elementos das

três macro-esferas e reunindo-os numa estrutura singular que o distingue dos

demais ecossistemas naturais (Figura 3).

Figura 3 - Modelo ilustrativo do sistema de manguezal.


Fonte: Adaptado de Odum e Barret (2007)

Por fim, o volume de matéria orgânica processada pelos organismos

decompositores que a remineralizam e disponibilizam seus nutrientes para os

demais organismos, garantem o equilíbrio cíclico da cadeia alimentar em vários

níveis. Por isto a relação direta da produção pesqueira em alto mar com a

6
Termo expandido por Sukachev (1944) englobando o ambiente ao redor dos organismos, a
partir de “biocenose” – descrição de uma comunidade de organismos. (MÖBIUS, 1877)
51

produção de biomassa proveniente dos manguezais, já foi apontada em

diversos estudos (HEALD, 1971; LUGO; SNEDAKER, 1974; RODRIGUEZ,

1975).

Contudo, os serviços oferecidos pelo mangue não se limitam à esfera

ecológica, enquanto produtor primário que subsidia atividades exploratórias,

como a pesca e coleta de caranguejos, existe grande diversidade de usos

comerciais para esses sistemas (CHOUDHURY, 1997). Eles fornecem grandes

quantidades de alimento, combustível, materiais para construção e

medicamentos, além de servirem às atividades turísticas e educativas. Os

autores supracitados afirmam ainda que, a estrutura vegetal heterogênea dos

manguezais proporciona abrigo para diversos animais, tanto endêmicos quanto

migradores (Figura 4).

Figura 4 - Os manguezais abrigam elevada biodiversidade


Fonte: Fotos Nunes (1998)
52

3.5 O AUMENTO POPULACIONAL E A PRESSÃO SOBRE OS MANGUEZAIS

Até os últimos cem anos, a taxa de crescimento populacional humano

era relativamente baixa, com uma taxa de natalidade apenas um pouco

superior à taxa de mortalidade (MEYER; TURNER, 1994). Para os autores

citados, a grande destruição de comunidades biológicas ocorreu durante os

últimos 150 anos, quando a população humana cresceu de 1 bilhão em 1850,

para 2 bilhões em 1930, chegando a 6 bilhões em 1998 (PRIMARCK,

RODRIGUES, 2001).

O crescimento populacional associado ao modo de vida consumista,

intensamente explorador e apropriador de recursos naturais, tem diminuído nos

países industrializados, mas ainda é elevado em muitas regiões da África

Tropical, América Latina e Ásia, áreas onde é encontrada a maior diversidade

biológica do planeta (WRI/UNEP/UNDP, 1994). O uso dos recursos naturais

para diversos fins, impulsionado pelo intenso crescimento populacional a

passos largos, é parcialmente responsável pela perda da diversidade biológica,

o que leva alguns cientistas a argumentarem que a proteção da biodiversidade

depende do controle do tamanho da população humana (HARDIN, 1993;

MEFFE; EHRLICH; EHRENFELD, 1993).

A desigualdade econômico-social relativa à distribuição de riquezas

também é outro aspecto relevante para a análise da destruição da

biodiversidade. Pesquisas do Banco Mundial (1995) e de Rocha (1997)

indicaram a existência de 18,0 a 25,5 milhões de pessoas em estado de

pobreza absoluta ou miseráveis.


53

No contexto brasileiro, a pesquisa de Peliano (1993), chamada de o

“Mapa da Fome no Brasil” demonstra que pobreza e fome são fenômenos

presentes em todo o país e são caracterizados tanto como fenômeno rural

como urbano, e que as regiões metropolitanas que polarizam o

desenvolvimento econômico são tão afetadas como as cidades pequenas e

médias. Informações deste tipo permitem argumentar que as pessoas do meio

rural são forçadas a destruir comunidades biológicas e caçar espécies, mesmo

as ameaçadas de extinção, porque são pobres e não possuem terra e recursos

próprios (DASMANN; MILTON; FREEMAN, 1973; KUMMER; TURNER, 1994;

SKOLE et al., 1994), embora caiba apontar que o ecossistema de manguezal

é constantemente alvo de degradação originada por populações de alta renda,

tais como sua supressão como consequencia da apropriação de espaços para

construção de casas e hotéis.

O destino dos manguezais mostra-se incerto frente à crise existente nas

regiões costeiras mundiais onde tem havido elevação das taxas de

urbanização e crescimento populacional. Estima-se que a metade da

população mundial, cerca de 3 bilhões de pessoas viva até 200 quilômetros de

distancia da costa (CREEL, 2003). Sob o prisma sistêmico, esta aglomeração

humana cria um sistema denominado socioecossistema urbano (DIAS, 2002),

que como qualquer ecossistema, tal como definido por Odum (1985, p.18)

“representa a interação indissociável e inter-relacionada entre seres vivos e o

seu ambiente não vivo”.

O socioecossistema urbano é do ponto de vista biológico, um sistema

aberto cujas propriedades globais de funcionamento (fluxo de energia e

ciclagem de matéria) e auto-regulação (controle) derivam das relações entre


54

todos os seus componentes, tanto pertencentes aos sistemas naturais, quanto

os criados ou modificados pelo homem (HURTUBIA, 1980; DIAS, 2002).

Contudo, ainda sob esta ótica, os socioecossistemas urbanos exibem

uma baixíssima capacidade produtiva, um elevado apetite por energia e uma

grande fragilidade e instabilidade ambiental e social, o que faz deles

extremamente dependentes de outros sistemas, já que não são capazes de

produzir os insumos que necessitam para sustentar suas atividades,

consumindo um volume de recursos muito superior à sua área fisica (REES,

1996; GIRARDET, 1996).

Devido a sua incapacidade de processar e reintroduzir no ciclo

sistêmico, as sobras energéticas e de material, os socioecossistemas geram

residuos e produzem poluentes que são lançados no ecossistema natural mais

próximo a eles, exercendo uma enorme pressão sobre estes sistemas naturais

(HARWOOD, 1998, CHAMEIDES, 1999).

Entretanto, a característica mais singular dos socioecossistemas

urbanos é seu humanismo, com todos os aspectos intangíveis inerentes à

população humana, os quais são difíceis de qualificar e quantificar, mas que, a

eles estão atrelados a alta produtividade de informações, conhecimento,

tecnologia e desenvolvimento industrial e que, quando são negligenciados

incorrem em erros sérios de planejamento e manejo do sistema (UNESCO,

1996).
55

Com base na Figura 5, pode-se constatar que as áreas de manguezal

são frequentemente consideradas locais estratégicos para assentamentos

humanos densos, portanto, sujeitas a uma alta pressão populacional

(MACINTOSH; ASHTON, 2005). Entretanto, durante grande parte da história, a

sociedade considerou os manguezais áreas funcionalmente inúteis, assim

estes sistemas foram degradados ou convertidos em áreas para agricultura,

aquicultura, indústria ou expansão urbana.

Figura 5 – Distribuição mundial da população na faixa costeira


Fonte: Burke e colaboradores (2001)

Os dados da Tabela 1 mostram as principais formas de intervenção

humana em áreas costeiras pelo mundo.


56

Tabela 1 – Degradação costeira devido à ação humana. () comum e


importante causa de degradação, (+) presente, mas não a maior causa, ()
ausente ou excepcional.
Causa da degradação Estuários Manguezais mar aberto

Drenagem para agricultura, desmatamento e


controle de doenças (mosquito)
 + 

Dragagem e canalização para navegação e proteção


  
contra inundações

Área para disposição de resíduos sólidos,


construção de estradas e desenvolvimento   +
comercial, industrial ou residencial

Conversão para aquaculture   

Construção de diques, represas e quebra-mar para


controle de inundações e furacões, como   

suprimento de água e irrigação

Descarga de pesticidas, herbicidas, resíduos


  
industriais e domésticos, deposição de sedimentos

Mineração das áreas úmidas para extração de


turfa, carvão, cascalho fosfato e outros materiais
+  +

Aterramento e alterações para implantação de


cultivos
+  

Queimadas + + 

Desvio de sedimentos para represamento,


  
afundamento de canais e outras estruturas

Alterações hidrológicas para, afundamento de


  
canais, construção de estradas e outras estruturas

Rebaixamento devido à extração de água de lençol


freático, óleo, gás e outros minerais
  +

Fonte: Adaptado de UNEP (2006)


57

A escala do impacto humano sobre estes ecossistemas aumentou

dramaticamente nos últimos anos, causando a muitos países, perdas de 50% a

80% ou mais no volume vegetal dos bosques, em comparação com a cobertura

florestal existente 50 anos antes.

Nas Filipinas, por exemplo, a perda foi da ordem de 75% da área de

manguezal em relação à existente na década de 1950 (PRIMAVERA, 2000).

Como conseqüência, muitas comunidades locais costeiras tiveram seus meios

de vida, dependentes deste ecossistema, comprometidos ou totalmente

perdidos.

A supressão de manguezais para implantação de variados

empreendimentos em diversas regiões do globo terrestre ao longo da história

humana é bem documentada (Figura 6). Para exemplificar estas perdas, no

decorrer dos anos, podem ser apontadas diversas intervenções humanas entre

as décadas de 1960 e 2000.

No período de 1967 a 1990, ocorreu a supressão de 185.000 hectares

na Tailândia, a derrubada de 269.000 ha na Indonésia, o desmatamento de

170.000 ha entre 1967 e 1976 nas Filipinas. A derrubada de 74.000 ha, desde

1975, em Bangladesh e 95.000 ha entre 1965 e 1984 na Guatemala e, por fim,

de 1980 e 1990, a Malásia, que implantou agricultura e carcinocultura em áreas

de manguezal (OIMT/ISME, 1997; SATHIRATHAI, 1998; GOSS; SKLADANY;

MIDDENDORF, 2001).
58

Figura 6 - Supressão de manguezais no mundo entre 1980 e 2005.


Fonte: UNEP (2009)

Outras atividades humanas altamente impactantes para alguns

manguezais do mundo foram os conflitos bélicos, tais como o travado no

Vietnam. Ali o uso de desfolhantes como armas químicas pelas tropas

americanas suprimiu 170.000 hectares de bosques entre 1960 e 1974

(OIMT/ISME, 1997). Vale lembrar que a utilização de produtos químicos em

áreas de mangue também ocorreu no Brasil para atender ao mercado

imobiliário na região de Angra dos Reis (BOTELHO; VALLEJO, 2001).

Contudo, não foram apenas demandas por espaço e produtos os únicos

motivos do descaso e degradação dos manguezais. No Brasil, as expedições

realizadas ao interior do país, desde fins do século XIX por médicos-cientistas,

como Oswaldo Cruz, Belizário Penna, Carlos Chagas e outros, resultaram na

divulgação do quadro de enfermidades em que se encontravam, tanto as


59

populações sertanejas, quanto às litorâneas. Esta situação ocorria, segundo os

citados expedicionários, em função da existência de ambientes alagadiços que

produziam vetores transmissores das doenças que assolavam as populações.

A partir dos resultados destas incursões, o higienismo sanitarista

estabeleceu o combate aos vetores das doenças endêmicas como meta

primordial. Para atingir seus objetivos o modelo propunha drenar, dessecar e

aterrar as áreas alagadiças, corrigir as imperfeições da natureza por meio de

instrumentos e técnicas adequadas, e assim resolver o maior problema da

época: o saneamento (CUNHA, 2002). Esse modelo, fruto da „revolução

pasteuriana‟7 (BENCHIMOL, 2000), significava, antes de tudo, a proposição de

um projeto político de viabilidade e integração do Estado-Nação.

As endemias que, de acordo com o paradigma do higienismo sanitarista

eram geradas pela falta de saneamento das regiões alagadiças e pantanosas

eram consideradas entraves ao desenvolvimento do país. Sob esta ótica as

ações, tais como aterramentos que visassem suprimir o ambiente dos vetores,

eram consideradas benéficas à população (MELLO; VOGEL, 2004).

3.6 CONSERVAÇÃO DOS MANGUEZAIS NO BRASIL

Ao longo dos 7.408 km de costa brasileira, os manguezais perfazem

cerca de 25.000 km, estendendo-se desde a latitude norte de 2º, na foz do rio

Oiapoque, Estado do Amapá, até a latitude sul de 29º, na foz do rio Araranguá,

em São Francisco do Sul, Estado de Santa Catarina (LAMBERTI, 1969).

7
Mudanças nos conhecimentos e práticas médicas e alterações na abordagem dos problemas
relacionados à saúde graças às investigações do químico francês Louis Pasteur sobre o papel
dos microorganismos como causadores de diversas doenças. (INSTITUTO ADOLPH LUTZ,
[s.d.])
60

O primeiro Código Florestal Brasileiro de 1934 (Decreto no 23.793 de

23/01/1934) não fazia referência direta aos manguezais, referindo-se apenas

indiretamente como „florestas protetoras‟ (Art. 3º) que, por sua localização,

serviriam para conservar o regime das águas e evitar a erosão das terras pela

ação dos agentes naturais (Art. 4º, itens a e b).

Foi através do Novo Código Florestal (Lei 4.771 de 1965, Art 2º, item f),

que os manguezais passaram, objetivamente, a ser considerados como Áreas

de Preservação Permanente (APPs). Na referida Lei as estruturas florestais

são descritas segundo sua localização geográfica e proximidade de recursos

vitais, tais como fontes de água e de acordo com suas funções ecológicas.

Vale apontar também a menção, no parágrafo único do art.1º, sobre a

obediência ao disposto nos planos diretores e leis de uso do solo em se

tratando destes ecossistemas em áreas urbanas. Mais tarde com a instituição

do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (Lei 9.985 de

2000), os espaços naturais protegidos e suas normas de uso ficaram melhor

definidos determinando-se que qualquer atividade e alteração só poderá

ocorrer após elaboração de estudos e obtenção de autorizações dos órgãos

fiscalizadores sem os quais serão aplicadas sanções sempre voltadas à

prevenção e reparação do dano ambiental.

O tratamento legal dispensado aos manguezais no Brasil é

padronizado, apesar das diferenças existentes e do grau e tipo de pressões

antrópicas exercidas sobre eles (LACERDA, 2002). Cabe destacar que os

maiores impactos ambientais ocorrem precisamente nas regiões onde os

manguezais são mais frágeis e escassos em virtude da elevada densidade

demográfica. Entretanto, segundo Martin e Lana (1994), a exagerada


61

importância e fragilidade conferidas aos manguezais são as bases de uma

legislação ambiental extremamente restritiva e não é surpreendente que todo o

aparato legal existente tenha tão pouca eficiência, pois se dissocia do tecido

social do qual deveria fazer parte, afastando-se da realidade física e ecológica

do ecossistema sobre o qual se normativa.

A partir da década de 1980, o modelo de exclusão da população parecia

sepultado, passando a vigorar, mesmo dentro das agências responsáveis pela

criação e gestão de áreas de conservação, a idéia de que o sucesso da

conservação dependeria diretamente da criação de alternativas (LIMA, 2001).

Nesse período, nenhum documento oficial, de entidade ambientalista ou de

instituição financeira internacional autorizava a utilização de meios visando a

expulsão sumária das populações de áreas específicas como condição para

criação de Unidades de Conservação (RIOS, 2001).

Karina Brandon e Kent Redford, co-editores de dois livros

paradigmáticos sobre o uso sustentável da biodiversidade em áreas prioritárias

para conservação, vieram a público com a coletânea “Parks in peril: people,

politics and protected area”, que promove o diálogo entre as ciências sociais e

as naturais, sob abordagens em diversas escalas de parâmetros políticos,

ecológicos e sociais e é resultado do Programa de Conservação da ONG

americana The Nature Conservancy (TNC), que envolve nove parques na

América Latina e Caribe.

A tese amplamente sustentada na coletânea acima citada pode ser

resumida na ideia de que, as áreas protegidas são o substrato da conservação

adequada da biodiversidade e não podem ser responsabilizadas pelo


62

refreamanto do desenvolvimento sustentável, ou em outras palavras a

manutenção da biodiversidade exige seu isolamento da espécie humana.

Ainda segundo Brandon e colaboradores (1998), os usos sustentáveis

dos recursos naturais devem ser incentivados e implementados no entorno de

parques e reservas e nos corredores que compõem as redes de UCs, mas

espécies protegidas devem ser mantidas a salvo em áreas onde a interferência

humana sobre os processos naturais seja altamente controlada e vise

preferencialmente sua conservação e não o bem-estar social dos povos que

nelas habitam.

Fortificam-se novamente os adeptos do modelo de conservação em

mosaico (IBAMA, 2002; GARAY; DIAS, 2001; MACNEELY, 1995; HUSTON,

1994; ROUGHGARDEN; MAY; LEVIN, 1989), segundo o qual áreas

estritamente protegidas são interligadas por espaços com uso controlado como

florestas nacionais, reservas extrativistas e de desenvolvimento sustentável ou

projetos agroflorestais (JANZEN, 1994; OLMOS et al, 2001).

Para Cunha e Almeida (2000; 2001), o conservacionismo não se resume

a um conjunto de práticas, mas é também uma ideologia; embasados neste

conceito os autores apontam que existem muitos grupos sociais que mantêm

regras de restrições de usos de recursos por razões práticas, e outros agregam

a estas, razões ideológicas fortalecidas por valores e tabus reproduzidos por

rituais costumeiros. Os autores também ressaltam que o termo tradicional pode


63

ser utilizado como categoria analítica, distintiva de sujeitos políticos, capazes

de se comprometer com práticas associadas à noção de sustentabilidade8.

Operacionalmente, isso significa uma motivação desses grupos a aderir

a uma organização local associada a tradições de uso sustentável dos

recursos, habilitando-os à negociação pela permanência em áreas protegidas e

às técnicas de baixo impacto para a manutenção da biodiversidade.

4. A URBANIZAÇÃO EM DIFERENTES ESCALAS

4.1 BREVE HISTORICO GLOBAL DA URBANIZAÇÃO

O aparecimento das primeiras cidades na Mesopotâmia a cerca de 5.500

anos, impulsionadas pelo crescimento populacional marca o nascimento da

civilização e o início do emprego da tração animal para auxiliar a urbanização

(TAKÁCS-SÁNTA, 2004). Neste período a escolha do local para

estabelecimento das cidades estava fortemente condicionada a fatores do

ambiente natural (LE BOURLEGAT, 1997), exigindo que os agrupamentos

humanos desenvolvessem técnicas para exploração e controle dos recursos à

sua volta.

Portanto, populações assentadas às margens de corpos hídricos, como

no Rio Amarelo na China, por exemplo, tiveram que desenvolver métodos para

controlar enchentes. Já nas regiões costeiras era comum o aprimoramento de

técnicas de pesca e de construção de embarcações. Como resultado das

diversas técnicas desenvolvidas pelas populações para sobreviver às

condições impostas pela natureza, foi montada uma rede comercial que

8
Conceito criado no começo da década de 1980 por Lester Brown, que definiu a sociedade
sustentável como aquela que é capaz de satisfazer suas necessidades sem comprometer as
chances de sobrevivência das gerações futuras (CAPRA, 2002).
64

estreitava as relações entre povos próximos, tal como entre egeus e fenícios,

que permitia uma divisão social do trabalho. A expropriação do excedente

produtivo destinava-se aos grupos dominantes.

Desta forma na antiguidade, a sobrevivência da cidade dependia de seu

papel funcional político (LEFEBVRE, 1991), por meio do qual organizava,

controlava, protegia, administrava e explorava um território com seus

camponeses, aldeões, pastores etc.

Na idade media, diferentemente do que acontecia na antiguidade a

sociedade estava concentrada em pequenos espaços e em locais onde a

produção e o escambo entrelaçavam-se nutridos por uma economia monetária

(LE GOFF, 1988). Tal peculiaridade econômica, segundo o autor, estreitou a

similaridade entre as cidades da idade média e as cidades modernas,

proporcionando nas primeiras, o desenvolvimento e características de um

sistema dominante que culminou no capitalismo.

Após estes períodos houve uma aceleração da urbanização, causada por

três grandes eventos ocorridos de forma conjugada na segunda metade do

século XVIII de acordo com White Jr. (1967). O primeiro deles foi o

desenvolvimento da ciência na Europa seguido de um crescimento acumulativo

da tecnologia e por fim a descoberta dos combustíveis fósseis. Este processo

estendeu-se até a metade do século seguinte quando as pesquisas científicas

propiciaram o suporte tecnológico para a atual economia.

Entretanto, McNeill (2000) postula que apenas a partir da explosão

tecnológica no século XX, que demandou grande quantidade de mão de obra

nas cidades e estimulou um acentuado êxodo de populações rurais para áreas


65

urbanas foram registrados crescentes níveis de urbanização mundial. Estudos

estatísticos do crescimento urbano nos últimos anos do citado século,

realizados pela United Nations Environment Programme, corroboram a

assertiva de McNeill (2000) quanto ao período de ocorrência do “boom” da

urbanização mundial, ao indicarem que o crescimento registrado neste recorte

temporal supera qualquer outro indicador demográfico (UNEP, 2002). Estes

estudos mostraram ainda que a proporção da população mundial de habitantes

citadinos aumentou de 29% em 1950 para 47% em 1998, permitindo projetar

um percentual de 55% até 2015.

Os dados produzidos pelo citado estudo apontam também que, embora

dois terços dos moradores de áreas urbanas vivam em cidades com menos de

1 milhão de pessoas, megalópoles com uma população superior a 10 milhões

de pessoas são as que estão crescendo mais e se multiplicando; e completam

estimando que na velocidade em que se encontra o crescimento numérico das

megalopolis, as atuais 15 atingirão a quantidade de 26 até 2015.

4.2 HISTÓRICO NACIONAL DO CRESCIMENTO URBANO

Segundo dados divulgados pelo Instituto de Pesquisa Econômica

Aplicada (IPEA), durante 400 anos a rede urbana ou sistema de cidades

brasileiras somente existia em função de sua relação com o exterior,

assumindo um caráter colonial de exploração econômica (LODDER, 1977).

O espaço citadino foi construído para atender às demandas de ocupação,

domínio e extração máxima dos recursos disponíveis da área colonizada.

Neste contexto, a rede urbana foi estruturada sob a égide de dois fatores

principais; a localização do poder político-administrativo com centralização dos


66

agentes ou atravessadores que repassavam os bens e a localização das

atividades econômicas (SANTOS, 1967).

De meados do século XIX estendendo-se até o primeiro terço do século

XX, o rumo da estruturação do sistema urbano foi influenciado por diversos

eventos, dentre os quais podem ser destacados: o aumento acelerado da

população total do país, os efeitos induzidos e reflexos da Revolução Industrial

enquanto processo, e o incipiente crescimento industrial no país (BAERR;

GEIGER, 1976). Estes eventos ocasionaram a reorganização estrutural dos

sistemas político e econômico e a consequente reorganização estrutural da

rede urbana caracterizada por sua interiorização e sua hierarquização.

No plano político as mais sensíveis alterações ocorreram no âmbito

ideológico e nas bases de sustentação do regime até aquele momento no

poder, afirma Sader (2000). O sistema político sustentava-se em três

elementos: o latifúndio, em geral de produção cafeeira; a chamada economia

primário-exportadora alicerçada nas atividades econômicas voltadas para

produção, comercialização e exportação de alguns produtos primários, em

geral também o café; e por fim, o controle do poder político pela oligarquia

rural.

Com as transformações em curso estes elementos tiveram sua

composição estrutural e sua relação com os demais níveis de poder alterados.

Assim, Furtado (2006) indica como razão direta para tais mudanças, sob o

prisma estritamente econômico, a continuidade da procura interna por bens e

serviços, enquanto a procura externa mantinha-se incipiente como resultado da

Grande Guerra de 1914. Desta maneira, continua o autor, já no setor

econômico produtivo que atendia ao mercado interno, preponderantemente


67

urbano e manufatureiro, passou a oferecer melhores oportunidades de

investimentos que o setor primário-exportador, predominantemente

agropecuário levando a emergência da burguesia industrial e comercial, e ao

crescimento do mercado urbano de bens e serviços os quais exerciam

influência sobre a urbanização.

Em 1920, o Brasil contabilizava uma população de 27.500.000 pessoas e

contava com 74 cidades maiores do que 20 mil habitantes, nas quais residiam

4.552.069, ou seja, 17,0% do total da população (VILELA; SUZIGAN, 1973).

Contudo, a população urbana se mantinha bastante concentrada, já que 58,3%

destas cidades estavam na região Sudeste, em São Paulo, Minas Gerais, Rio

de Janeiro e no Distrito Federal.

Foi a partir dos anos de 1930 e 1940 que a urbanização incorporou-se às

profundas transformações estruturais, conduzidas pelo processo de

centralização de decisões políticas, pelas quais passavam a sociedade e a

economia brasileira (LODDER, 1977). Desta forma, o grau de centralização

político-administrativa do Estado relacionava-se de maneira direta com o modo

de atuação do setor público nas esferas econômica e social afetando o

processo de desenvolvimento e consequentemente o sistema urbano em áreas

a ele associadas.

O sistema urbano no Brasil pós 1930, em função da configuração

centralizadora do Estado de forças políticas e sociais, concentrou em uma

única cidade: o Rio de Janeiro, nesta época então metrópole nacional, uma

série de funções e atividades urbanas. Lodder (1977) afirma ainda que esta

ação possibilitaria executar o exercício de controle da distribuição do poder

entre grupos em que se decompunha a coalizão do poder na época, entretanto,


68

o processo de industrialização em curso manteve a dinâmica do processo

urbano apesar da estagnação política imposta pelo Estado.

Apesar da vocação industrial da cidade de São Paulo, a dualidade

hierárquica funcional em duas cidades apresentava-se como um contra-senso

(SMOLKA; LODDER, 1975), contudo, a ênfase cada vez mais marcante na

industrialização da economia como saída para o subdesenvolvimento

brasileiro, associada a uma recomposição entre grupos do poder político,

provocou outra reestruturação do sistema urbano no país, definindo-se então

uma nova metrópole nacional.

Assim, a cidade do Rio de Janeiro, segundo os autores supracitados,

deteve a função político-administrativa, permanecendo a função industrial com

São Paulo. Esta dualidade manteve-se até a década de 1960, quando foi

criada a cidade de Brasília, que ascendeu ao longo da mesma década como

centro político-administrativo nacional recompondo o sistema urbano e

consolidando a cidade de São Paulo como única metrópole nacional.

Além do acelerado processo de urbanização do território, também a

sociedade brasileira torna-se cada vez mais urbana. Este “grande ciclo de

expansão da urbanização” que se iniciava, coincidia com o “grande ciclo de

expansão das migrações internas”. Estas migrações cristalizavam o elo maior

entre as mudanças estruturais pelas quais passavam a sociedade, a economia

brasileira e a aceleração do processo de urbanização.

No Brasil, a intensificação da urbanização se deu de forma mais

acentuada a partir da década de 1950, principalmente com o advento da

indústria nacional que serviu de atrativo para o estabelecimento de um grande


69

contingente populacional nas cidades em busca de trabalho e melhores

condições de vida. Em meio século, o Brasil sofreu um dos mais rápidos

processos de urbanização do mundo; a taxa de urbanização, que em 1940 era

de apenas 26,35%, atingiu o patamar de 77,13% em 1991. De acordo com

Santos (1996) a evolução da população brasileira, principalmente urbana,

ocorreu significativamente nos últimos 60 anos do século XX.

Ainda, entre o período de 1940 a 1980 a população total do país triplica

(de 41.326.000 para 119.099.000 habitantes) ao passo que a população

urbana multiplica-se por sete vezes, variando de 10.891.000 para 82.013.000

habitantes (FRANÇA, 1997). A partir da década de setenta, houve um

acentuado declínio do ritmo de crescimento da população urbana, que foi

suavizado nos anos noventa. A expansão urbana atingiu seu limite no início

dos anos oitenta, associado tanto a redução das taxas de fecundidade urbana

como a uma evidente diminuição da migração rural-urbana.

O aumento da população urbana a partir de meados do último século foi

fruto de modificações sócio-econômicas que ocorreram ao longo do período,

resultantes de uma série de políticas econômicas e tornaram as cidades pólos

de serviços, comércio e informações, um espaço passível de territorialização e

oportunidades para o homem do campo. Contudo, estes projetos, sobretudo

aqueles voltados à industrialização em larga escala, geraram também

desigualdades sócio-econômicas e elevados custos sócio-ambientais.


70

4.3 PROBLEMAS GERAIS DO CRESCIMENTO URBANO NO BRASIL

No caso brasileiro, o intenso processo de urbanização e o crescimento

espontâneo das cidades têm gerado consequências desastrosas para o meio

ambiente (SOUZA, 2003). Este problema decorre, fundamentalmente, da

omissão do poder público em promover um planejamento e gestão municipais

democráticos e comprometidos com a melhoria da qualidade de vida nas

cidades, que limitem os exageros cometidos no exercício da relação de

propriedade em benefício dos interesses sociais, dentre os quais figura a

promoção da conservação dos ecossistemas naturais.

O crescimento intensivo das cidades brasileiras, desde a década de

1930, vem provocando mudanças fundamentais na ordem socioeconômica

brasileira, bem como importantes consequências culturais e ambientais

(FERNANDES, 2001). O autor comenta que, embora a legislação urbanística e

ambiental tenha avançado significativamente desde então, até a promulgação

da Constituição Federal de 1988 tal avanço se deu de forma pouco sistemática

em meio a controvérsias de várias ordens.

Entretanto, com mais de 80% da população vivendo atualmente em

cidades, a necessidade de se pensar o marco jurídico-teórico aplicável ao

processo de desenvolvimento urbano é urgente.

Até a promulgação da constituição de 1988, não havia um tratamento

constitucional adequado às questões urbana e ambiental, por esta razão as

cidades brasileiras cresceram sem um marco jurídico apropriado que

permitisse o controle do processo de desenvolvimento urbano (MUKAI, 1988).


71

Mesmo que tecnicamente presente desde 1934 em todos os textos

constitucionais brasileiros, pode-se dizer que o princípio da função social da

propriedade apenas foi consolidado, como marco jurídico, na Constituição de

1988. O autor supracitado aponta ainda que o crescimento urbano, no período

entre as décadas de 1930 e de 1980, ocorreu sob inúmeras controvérsias

jurídicas acerca da possibilidade de intervenção estatal no domínio dos direitos

individuais de propriedade e, especialmente, quanto à competência dos

municípios para agir em matérias urbanísticas e ambientais, já que, na visão

dominante, somente uma lei federal poderia regulamentar os direitos de

propriedade privada diferentemente do Código Civil.

Além disso, enquanto as cidades cresciam em ritmo acelerado, gerando

todo o tipo de problemas sociais, os poucos juristas que se ocuparam da

questão se deixaram envolver em uma longa discussão estéril acerca da

própria existência ou autonomia do Direito Urbanístico.

Em um contexto de planejamento municipal fortemente influenciado

pelas forças do mercado imobiliário e total ausência de políticas públicas e

habitacionais voltadas à diminuição da exclusão social, o crescimento das

cidades acontece em parte dentro da ilegalidade (FRANCO, 2001). Tal

ilegalidade está estruturada de acordo com os interesses deste mercado e, em

parte de forma informal; caracterizada pela construção de habitações precárias

e sem condições mínimas de infraestrutura de saneamento em lugares

ambientalmente inadequados (ARANTES; VAINER; MARICATO, 2002;

FRANCO, 2001).
72

4.4 URBANIZAÇÃO DO TERRITÓRIO NO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO

Durante o período compreendido entre 1850 e 1960, o café determinou,

de maneira quase plena, a vida sócio-econômica do Espírito Santo, os

movimentos demográficos e a infraestrutura (DERENZI, 1975). Contudo, a

cafeicultura no Estado não chegou a estruturar-se sob a forma de “complexo”,

limitando-se a prática no interior da pequena produção familiar, deixando

espaço para que o estado de São Paulo se tornasse o “complexo cafeeiro

capitalista” brasileiro (CANO, 1985).

No contexto do Espírito Santo, a atividade cafeeira não produziu uma

economia urbana e industrial, mas foi capaz de levar a ocupação de território,

gerar correntes migratórias e formar e desenvolver núcleos urbanos, estes

reduzidos e poucos complexos, porém, contendo uma nítida hierarquia. O

esgotamento do café e sua substituição parcial pela pecuária no sul do estado,

além da apropriação capitalista de parte da fronteira norte, inicialmente para

exploração madeireira, seguida pela criação extensiva de gado de corte,

impuseram nova dinâmica à apropriação e uso do solo.

Nas décadas de 1940 e 1950, iniciou-se uma reversão nos movimentos

demográficos vigentes desde o século XIX (Figura 7). Neste período registra-se

uma aceleração na taxa de crescimento da população urbana e um saldo

migratório negativo como resultado de um intenso êxodo rumo a outras

unidades da federação (FERREIRA, 1987). Para o autor esta situação tem

como principais razões o esgotamento de terras, o fechamento da fronteira e a

crise do café no estado, que impuseram obstáculos intransponíveis à

continuada reprodução da produção familiar.


73

Figura 7 - Evolução demográfica do Estado do ES (1872 – 2009)


Fonte: Adaptado de http://pt.wikipedia.org/wiki/Demografia_do_Esp%C3%ADrito_Santo

Na década de 1950, a melhora no preço do café e o aumento da área

plantada, o desenvolvimento da extração madeireira e o cultivo de cacau,

somados ao desenvolvimento da indústria e das atividades portuárias em

Vitória foram fatores que contribuíram para redução da evasão demográfica no

período. No mesmo periodo elevou-se significativamente a taxa de

urbanização, o número de núcleos, cidades e vilas emancipados e o tamanho

médio dos núcleos urbanos (CAMPOS JR, 1998).

A taxa de crescimento das cidades foi maior que a das vilas, o que aponta

para uma acentuação da evasão do campo, porém, com retenção do fluxo

rural-urbano nas principais cidades do estado com uma taxa média entre 1960

e 2000 de 1,27% (Figura 8) (RIOS, 1966; I. S. J. N. 1985a, 1985b).

Essa urbanização satelitizou e incorporou núcleos próximos aos principais

centros urbanos, tais como Cachoeiro de Itapemirim e Colatina, contudo

ocorreu de forma mais intensa nos arredores da Capital em centros como

Cariacica. (RIOS, 1966) Esta forma de urbanização, na opinião do autor,


74

ocorreu desequilibradamente sem originar uma rede harmônica de centros

urbanos onde deveria haver um escalonamento de recursos.

Inicia-se, na visão de Siqueira (2001), um novo padrão urbano onde o

contingente residente urbano perde proporcionalidade direta com as atividades

produtivas urbanas localmente desenvolvidas. O autor comenta ainda que as

atividades urbanas limitavam-se ao comércio dinamizado pelas atividades

cafeeiras, inexistindo uma dinâmica regional que permitisse a expansão do

capital face às antigas relações de produção no campo e a frágil estrutura

industrial. No Espírito Santo o processo de industrialização já se fazia presente

desde os engenhos de açúcar em 1535, porém, o acelerado avanço industrial

só veio acontecer a partir de meados da década de 1970 (KILL, 2002).

Após a crise econômica da indústria do café, o estado estruturou-se e

voltou sua economia para o setor de exportação, utilizando-se de sua vocação

portuária e inaugurando grandes projetos industriais (Figuras 8 e 9) tais como a

implantação do porto de Tubarão, em 1966, a instalação do Centro Industrial

de Grande Vitória (CIVIT) em 1975, e a instalação das usinas de pelotização,

entre 1969 e 1979 da Cia. Vale do Rio Doce em Vitória; além de uma usina de

pelotização da Samarco em Anchieta, em 1977 e no ano seguinte (1978) a

inauguração da Aracruz Celulose; mais tarde, em 1983, a inauguração da

Companhia Siderúrgica de Tubarão no município de Serra.


75

Aracruz Celulose

Siderúrgica Tubarão

Vitória

Porto de Vitória CVRD - Porto de Praia Mole

Samarco

Figura 8 - Principais indústrias da microrregião de Vitória e municípios vizinhos


Fontes: http://www.revistafator.com.br/ver_noticia.php?not=78114,
http://wwwhttp://www.brasil-turismo.com/espirito-santo/mapas/mapa-politico.htm
http://www.arcelormittal.com/br/tubarao/
http://www.sefaz.es.gov.br/painel/econo01.htm
76

Figura 9 - Mapa das Indústrias da microrregião de Vitória e municípios vizinhos


Fonte: Kill (2002)
77

4.5 URBANIZAÇÃO DA CIDADE DE VITÓRIA

O estabelecimento das condições de urbanização da metrópole não se

deu a partir de um processo recente, ele é fruto de meio século de crescimento

desorganizado das cidades, desarticulado de um planejamento urbano eficaz e

complementado pela migração maciça do campo para a cidade, políticas

públicas ineficientes, distribuição desigual de riqueza, entre outros fatores e

pode ser caracterizado pela configuração de duas cidades distintas. A “cidade

legal”, caracterizada pela implementação de parcelamentos oficiais localizados,

em geral, em áreas mais centrais, destinados à moradia das classes médias e

altas; e a “cidade ilegal”, destinada à moradia das classes de baixa renda,

caracterizada pela implantação de loteamentos ilegais ou irregulares nas

porções periféricas dos municípios e pela consolidação de favelas em diversas

áreas das regiões mais centrais (SILVA, 2000; MARICATO, 2001).

Similarmente a outras capitais litorâneas, a cidade de Vitória teve sua

trajetória de urbanização impulsionada pela expansão da navegação e da

colonização portuguesa (BITTENCOURT, 1987). Em termos de espaço para

ocupação, o sitio físico da ilha no final do século XIX, apresentava limitações

geomorfológicas que dificultavam a urbanização. Com objetivo de determinar

uma área adequada à expansão da cidade o governo Muniz Freire, em 1895,

criou a Comissão de Melhoramentos da Capital, encarregando como

responsável o engenheiro sanitarista Saturnino de Brito, responsável por

projetos de saneamento e expansão urbana em diversas cidades do Brasil

(MENDONÇA, 2000).

Neste período o projeto Novo Arrabalde (Figura 10) propunha a

expansão do território ocupável, em uma dimensão variável entre cinco e seis


78

vezes o tamanho do núcleo original, projetando-se para a orla nordeste

composta por manguezais. A ocupação urbana estabelecida no projeto do

Novo Arrabalde ocorreu sobre o terreno plano existente e aterrado

considerando os elementos naturais. Entretanto, em função do pequeno

volume de fluxo migratório da época as expectativas em relação ao projeto não

foram atendidas e a parcela noroeste só veio a ser ocupada a partir da década

de 1960 (CAMPOS JR, 2002).

A cidade de Vitória, até os anos de 1960, esteve apoiada na economia

agroexportadora da monocultura cafeeira e se apresentava como uma região

periférica e subdesenvolvida, com pouca integração ao mercado nacional

(SIQUEIRA, 1987). Contudo, a partir de 1942, com o início das operações da

Companhia Vale do Rio Doce, a estrada de ferro Vitória-Minas (Figura 11) foi

ampliada e renovada e o porto aparelhado, conferindo então à cidade, o status

de importante hinterlândia de distribuição do minério de ferro


79

Escala 1:16.000
área drenada e aterrada (estimativa)

ma
ng
ue

Figura 10 – Adaptação da planta do Projeto Novo Arrabalde.


Fonte: Campos Jr. (1996)

Figura 11 - Traçado da estrada de ferro Vitória-Minas.


Fonte: Cia Vale do Rio Doce
80

Ainda, segundo Siqueira (1987), as consequências do binômio ferrovia-

porto para a urbanização da cidade foram evidentes. Na década de 1950 estes

processos combinados capacitaram a cidade de Vitória a monopolizar

determinadas funções urbanas necessárias à expansão da cafeicultura por

todo o Estado, tornando-se importante no contexto das exportações de café

efetuadas pelo Brasil (Figuras 12 e 13).

Figura 12 - Mapa Ferroviário Brasileiro.


Fonte: Ministério dos Transportes (1999)
81

Figura 13 - Embarque de carvão no Porto de Vitória na década de 1950.


Fonte: Acervo do Instituto Jones dos Santos Neves.

Entretanto, a desagregação da economia primário-exportadora do

estado do Espírito Santo, cristalizada no processo de crise do café e a

implantação de grandes indústrias produtoras de bens de capital abriram um

enorme mercado de trabalho na cidade e trouxeram para Vitória milhares de

pessoas desempregadas (BITTENCOURT, 1987).

Nesse contexto, o poder público estadual fez-se presente através da

criação do Instituto do Bem-Estar Social do Espírito Santo (IBES) visando

implantar uma política social no campo imobiliário, ao iniciar a construção de

habitações populares para o estabelecimento de um proletariado urbano. Outra

ação representativa da presença do Estado neste período foi a transferência de

propriedade de terrenos urbanos, pelo mecanismo de aforamento, a qualquer

um que se interessasse (CAMPOS JR., 2002).


82

As transformações estruturais que conferiram à Vitória o status de

metrópole, pautaram-se nos objetivos da política econômica e territorial do

Governo Federal vigente em 1975, ao inserir o Espírito Santo no chamado

desenvolvimento nacional com a implementação de quatro grandes grupos de

projetos: o complexo siderúrgico, o complexo naval, o complexo paraquímico e

o complexo portuário, denominados Grandes Projetos (ABE, 1999).

Estes processos dirigiram os fluxos migratórios para as cidades,

especialmente para a Grande Vitória, estimulados pelas perspectivas da

industrialização. Somados a estes eventos é importante lembrar que, na fase

de erradicação do café entre 1962 e 1966, foi injetado na economia local um

total de Cr$ 70.254.000,00 (ROCHA; MORANDI, 1991) referentes ao

pagamento pelos cafezais erradicados, equivalente a 100,38% da receita bruta

do Estado em 1967.

Como 180 mil pessoas deixaram o campo a partir deste período

(BUFFON, 1992), dirigindo-se para a Grande Vitória em conseqüência da

adesão dos produtores locais a essa política, os autores supracitados

postularam que esses recursos tenham sido direcionados prioritariamente,

também, para a Grande Vitória. A região metropolitana da Grande Vitória

apresentou destacado crescimento demográfico entre 1970, período em que

moravam na região 133.019 habitantes, e 1980 com uma taxa de crescimento

demográfico da ordem de 4,6% no período, evoluindo para 207.747 habitantes.

Nas duas décadas seguintes houve aumento populacional de 84.557

habitantes com uma taxa de evolução de 10,5% no período (Figura 14),

decorrente da evolução dos processos produtivos com ênfase na redução dos

custos de produção e de transporte criando desta forma, a necessidade de


83

postos de trabalho para atender a modernização de seus sistemas

tecnológicos, sobretudo da indústria portuária gerando um dinamismo

demográfico e econômico diferenciado (STROHAECKER, 2008).

Outra ação do Governo Estadual como estímulo à migração em direção

a região metropolitana, foi o investimento de 56,7% de um montante de U$

165.384.102,60, na Grande Vitória, entre as décadas de 1970 e 1980,

provenientes do Fundo de Recuperação Econômica do Espírito Santo (Funres).

Este recurso originou-se de parte do imposto de renda devido por pessoas

físicas e empresas, cedido pela União como compensação à desigualdade de

condições existentes entre os estados do Sudeste.

Estes fatos indicam uma ampla expansão da malha urbana, constatada

inicialmente no volume de licenças de construção emitidas pela Prefeitura

Municipal de Vitória entre 1971 e 1975 autorizando um total de 846.473 m 2 de

obras (IBGE, 1985) e ao considerar o privilégio tributário de isenção do imposto

de renda, ao qual gozavam as incorporações durante este período até o ano de

1977 (CAMPOS JR., 1998).

A construção, durante a década de 1970 foi, além dos fatores acima,

fundamentalmente impulsionada pelas iniciativas do Instituto de Orientação às

Cooperativas Habitacionais no Espírito Santo (Inocoop-ES) e da Companhia de

Habitação e Urbanização do Estado do Espírito Santo (Cohab-ES) (CAMPOS

JR; SANTOS NEVES, 1998). Neste período foi significativa a promoção pública

de moradias para atender as demandas ocasionadas pela instalação dos

grandes projetos nos limites da metrópole, naquela época em formação.


84

Figura 14 - Evolução demográfica de Vitória/ES no período de 1872 a 2009.


Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/vitória_(espírito_santo)#demografia
85

5. OS MANGUEZAIS EM VITÓRIA (ES) E SUA CONSERVAÇÃO LEGAL

5.1 OS MANGUEZAIS DA BAÍA DE VITÓRIA

No Espírito Santo os manguezais se distribuem ao longo de quase toda

a costa, encontrados nos municípios de Itaúnas, Conceição da Barra, São

Mateus, Aracruz, Nova Almeida, Serra, Vitória, Cariacica, Vila Velha,

Guarapari, Piúma, Anchieta, Itapemirim e Presidente Kennedy (SILVA;

BERNINI; CARMO, 2005).

Ao todo, o litoral capixaba possui 30 mil hectares de manguezais

distribuídos desde Itaúnas, ao norte, até Presidente Kennedy, no sul do Estado.

No limite com Linhares está o município de São Mateus, que possui a segunda

maior área de mangue do Estado, estimada em 11,85 km², sendo que a maior

área, de 15,8 km², encontra-se no município de Aracruz, na bacia do rio

Piraquê-Açu.

Considerando a dimensão dos manguezais, o ecossistema da região

noroeste do município de Vitória ocupa o 3º lugar. O mangue da região

Noroeste possui uma área de 8.918.350 m² e é o mais importante da baía de

Vitória (Figura 15), onde desembocam os rios Santa Maria de Vitória, Bubu,

Marinho e Aribiri.
86

Área de estudo

Figura 15 - A região Noroeste da Baía de Vitória insere-se na malha urbana de


dois municípios, Vitória (delimitado pela linha vermelha) e o município de Serra
(ao norte). Destacam-se os bairros da grande São Pedro (na porção inferior) e
ao centro a área do manguezal exposto aos impactos urbanos.

O Estuário da foz do Rio Santa Maria de Vitória (Figuras 16 e 17) forma

um delta, com 25 ilhotas cobertas de mangue que, além de manter o equilíbrio

de assoreamento na Baía de Vitória, fornece água ao município, atendendo

conjuntamente com o Rio Jucu a uma população aproximada de 1.300.000

habitantes (GUZZO, 1996).


87

Figura 16 - Bacia do rio Santa Maria de Vitória.


Fonte: IEMA (2010)

Figura 17 - Foz do rio Santa Maria de Vitória


Fonte: Imagem adaptada do Programa Google Earth Pro (2009)

As terras emersas ao longo da Baía de Vitória são ricas em contrastes e

já foram divididas por diversos autores em Afloramentos9 Cristalinos,

9
Surgimento de rocha-mãe à superfície da Terra após ter sofrido algum processo erosivo,
facilitando o estudo e mapeamento geológico. (WICANDER; MONROE, 2009)
88

Tabuleiros10 pouco elevados de sedimentos terciários e planícies costeiras11

resultantes de depósitos quaternários de origem marinha ou flúvio-marinha

(FERREIRA, 1989). Cada conjunto destes três compartimentos fisiográficos,

associados à aspectos da cobertura vegetal e às peculiaridades climato-

hidrológicas compõe um geossistema.

Segundo a classificação geossistêmica adotada pela autora supracitada

a área é dividida em três tipos: Geossistema de Escarpas, Geossistema de

Tabuleiros e Geossistema de Planície Costeira Sul, onde enquadram-se os

manguezais encontrados a oeste e à leste da Baía de Vitória. No Geossistema

de Planície Costeira Sul, descrito conforme classificação da vegetação do

Espírito Santo de Ruschi (1950) podem ser observados três geofaceis

diferentes: Geofaceis de Mata Pantanosa Litorânea, Geofaceis de Restinga e

Geofaceis de Mata Pantanosa Marinha ou manguezal.

O Geofaceis de Mata Pantanosa Litorânea corresponde ao trecho de

ocorrência de um tipo de mata entre a restinga e a Mata de Tabuleiros,

tipicamente alagável. Grande parte da Baía de Vitória, que era dominada pelo

Geofaceis de Mata de Restinga, foi quase totalmente urbanizada, restando

como testemunho da existência desta vegetação, pequenas áreas como na Ilha

do Lameirão, a mata de restinga preservada próximo à praia de Camburi e de

outras áreas dispersas, de cobertura insignificante.

Por fim o Geofaceis de Mata Pantanosa Marinha interliga-se aos demais

Geossistemas e geofaceis, e ocorre nas desembocaduras dos rios Aribiri, Bubu

10
Forma de relevo constituída por pequenos platôs, de altitude em geral modesta, limitados por
escarpas abruptas, denominadas barreiras. (AB‟SABER, 1979)
11
Grande área geográfica com leve ou nenhum tipo de variação de altitude. (WICANDER;
MONROE, 2009)
89

e Santa Maria, ao longo dos Canais dos Escravos, da Passagem e do

Lameirão.

Os manguezais da região apresentam-se, em alguns setores, vigorosos

e em bom estado de conservação (Figuras 18 e 19), constituindo assim a área

mais representativa da Baía, contudo, a região noroeste está severamente

antropizada à semelhança dos dois geossistemas anteriores.

Figura 18 - Área intensamente urbanizada em Resistência, com destaque para


a exuberante vegetação do manguezal em seu entorno.
Fonte: Fotos do Autor (2009)

A ocupação humana no manguezal não é o único impacto sobre este

ecossistema, a ação antrópica nos Geossistemas de Tabuleiros e de Escarpas

também acarreta impactos ao manguezal. No caso do Geossistema de

Tabuleiros o impacto ocorre por desmatamento, erosão e consequente

deposição de sedimentos transportados pelos rios e córregos até a área de

planície. Além disso, o manguezal da porção noroeste funciona como receptor


90

da poluição industrial proveniente de pólos industriais e agroecossistemas

instalados ao longo da bacia hidrográfica do rio Santa Maria.

Figura 19 – Manguezais em frente à ilha das Caieiras, porção noroeste,


preservados.
Fonte: Fotos do Autor (2009)

Apesar de toda a interferência antrópica sobre as áreas naturais, ao

longo do processo de urbanização da Baía de Vitória, 23% do território do

município contêm 68 Unidades de Conservação (Anexo A), constituídas de

floresta atlântica e ecossistemas associados ao manguezal e a restinga; dentre

as quais seis adjacentes aos bairros da Grande São Pedro (Figura 20) (VALE;

FERREIRA, 1998).
91

Figura 20 - Unidades de Conservação existentes no município de Vitória. Destaque para o Manguezal da UFES (3), a Ilha do
Campinho (9), a Ilha do Crisógono (29), Estação Ecológica Ilha do Lameirão (54), Parque Nat. Mun. Vale do Mulembá-Conquista
(56) e Parque Dom Luis Gonzaga Fernandes (Baía Noroeste) (61); todos em interface direta com a Grande São Pedro.
Fonte: Núcleo de Informação e Geoprocessamento da Secretaria de Meio Ambiente de Vitória (SEMMAM) (2009)
92

5.2 INSTRUMENTOS LEGAIS DE CONSERVAÇÃO DOS MANGUEZAIS EM VITÓRIA

Ao longo da história do Brasil os manguezais foram considerados

ambientes insalubres e pouco importantes, a ponto de sofrerem extensa

supressão para atender às demandas públicas de diversas esferas, tais como a

implantação de projetos regionais de pavimentação de estradas interestaduais

e projetos sanitaristas urbanos. Os manguezais foram objetos de vasta

legislação que por diversas razões regulamentavam seu corte e supressão.

Embora os manguezais já estejam protegidos no Brasil pela legislação

como Áreas de Proteção Permanente (APPs), conforme determinação da Lei

federal 4.771/65, por serem constantemente expostos às pressões do aumento

populacional em áreas urbanas a eles adjacentes, faz-se necessária a

regulamentação de normas que disciplinem a expansão urbana e minimizem

suas consequências sobre estes ecossistemas (SANTOS, 1993).

Na esfera da legislação ambiental, tanto Estadual como de Vitória, em

1986 criou-se uma Política de Meio Ambiente para o Estado do Espírito Santo

e o Município de Vitória, com legislação específica e órgãos competentes, tais

como o Instituto Estadual de Meio Ambiente (IEMA) e a Secretaria Municipal de

Meio Ambiente (SEMMAM). Esses órgãos, além do IBAMA e da Policia

Ambiental, passaram a atuar de forma contundente no espaço urbano e nas

reservas naturais declaradas áreas de proteção permanente, como é o caso

dos manguezais (DINIZ, 2006).

As atribuições da SEMMAM promulgadas através da Lei nº 3315/86,

contemplavam a proteção, conservação, recuperação, controle e fiscalização

dos recursos naturais de Vitória. A preservação da forma atual dos contornos


93

do Município e suas ilhas foi determinada pela Lei nº 3338/86 (Anexo B), uma

das mais importantes do município na área da preservação dos manguezais,

praias, baías e enseadas, pois a partir dela os contornos municipais não mais

puderam ser alterados por aterros.

Embora a lei supracitada visasse a proteção de recursos naturais do

município, outros setores do poder público continuavam de forma contraditória

a estimular a urbanização em áreas de proteção permanente, já que também

no ano de 1986 foram sancionadas duas Leis, 3.333 e 3.336 (Anexos C e D),

autorizando o poder executivo a abrir, por meio de decretos, crédito especial

adicional para atender as obras de aterro hidráulico no bairro São Pedro com

recursos oriundos do Ministério de Desenvolvimento Urbano e de Meio

Ambiente, no contexto do Programa de Infraestrutura e Habitação – Prioridades

Sociais.

Os destinos urbanísticos da cidade passaram a contar com a análise e

poder de voto da SEMMAM, a partir de sua inclusão no Conselho Municipal do

Plano Diretor Urbano (CMPDU), pelo Decreto nº 7317/86 (Anexo E), garantindo

maior proteção aos recursos naturais do município (DINIZ, 2006; P. M. V.,

1997), principalmente no que se referiu ao zoneamento e normas de uso da

porção costeira nordeste.

O controle sobre estas áreas foi definido já em 1985 pela Lei 3267

(Anexo F) discriminando as áreas da praia de Camburi, do aterro da enseada

do Suá e aterro da enseada do Frade como zonas balneares de lazer do

município; mais tarde, a delimitação deste zoneamento foi acurada com a

alteração da redação da Lei 3267/85 pela Lei nº 3312/86.


94

De acordo com Ferreira (1989) o estuário do Rio Santa Maria e Vitória

foi transformado em Reserva Biológia12 Municipal com a publicação da Lei nº

3326 de 1986 (Anexo G) tendo sua categoria de manejo modificada pela Lei nº

3377 no mesmo ano (Anexo H) para Estação Ecológica13 Municipal Ilha do

Lameirão (EEMIL). Ao ter sua categoria de manejo modificada de Reserva

Biológica para Estação Ecológica Municipal (EEMIL), pela Lei 3377/86, a Ilha

do Lameirão passou a ser administrada e fiscalizada pela Prefeitura Municipal

de Vitória.

Num contexto mais amplo, foi promulgada em 1988 a Lei Estadual nº

4.119 (Anexo I) que instituiu a preservação permanente dos manguezais

remanescentes do Espírito Santo. Esta Lei foi de grande importância porque

com base nela, foram criadas seis Unidades de Conservação de manguezais

(Figura 21), sendo quatro Estações Ecológicas Municipais, uma Reserva

Ecológica e ainda uma Área de Proteção Ambiental (APA).

Estas Estações Ecológicas estão localizadas nos municípios de Anchieta

(Estação Ecológica do Papagaio), de Guarapari (Estação Ecológica Concha

D‟Ostra), de Vitória (Estação Ecológica Ilha do Lameirão) e de São Mateus

(Estação Ecológica de Barra Nova). A única Reserva Ecológica pertence ao

município de Aracruz (Reserva Ecológica de Piraquê-Açu e Piraquê-Mirim) e a

APA encontra-se na área de Conceição da Barra.

12
Tem como objetivo a preservação integral da biota e demais atributos naturais existentes em
seus limites, sem interferência humana direta ou modificações ambientais, excetuando-se as
medidas de recuperação de seus ecossistemas alterados e as ações de manejo necessárias
para recuperar e preservar o equilíbrio natural, a diversidade biológica e os processos
ecológicos. (BRASIL, 2000)
13
Tem como objetivo a preservação da natureza e a realização de pesquisas científicas. É
proibida a visitação pública, exceto com objetivo educacional e a pesquisa científica depende
de autorização prévia do órgão responsável. (BRASIL, 2000)
95

Atualmente existem 16 Unidades de Conservação no Estado, contudo,

as criadas sob a égide da Lei 4.119, visam a proteção de mangues e restingas.

Entretanto, nenhuma delas possui Plano de Manejo, ou qualquer outro

documento técnico que estabeleça o zoneamento e suas normas de uso,

segundo os objetivos para os quais a UC foi criada.

Figura 21 - Unidades de Conservação do Espírito Santo


Fonte: Adaptado de Século Diário (2005)
96

A Lei Estadual nº 4.119, de 22 de julho de 1988 assegurou a

preservação dos mangues da Baía de Vitória como um todo, obrigando os

municípios vizinhos de Vitória (Serra e Cariacica) a protegerem todo o mangue,

embora a maior porção da Grande São Pedro já estivesse aterrada. (Figura 22)

Figura 22 - Grande São Pedro em 1988.


Fonte: Acervo da Prefeitura Municipal de Vitória

A implementação da EEMIL conduziu a novas relações de força entre os

órgãos responsáveis pela fiscalização e os catadores de caranguejo, uma vez

que o poder público estabelecia „em gabinetes‟, as regras da extração dos

recursos naturais e convocava os grupos para informar-lhes das decisões,

desconsiderando o direito não-escrito das populações tradicionais que, apesar


97

de presente em suas práticas sociais, foi desconsiderado na efetivação ou

criação da política ambiental aplicada na área. Esta prática resultou em uma

primeira ruptura do cotidiano desse grupo social, pois uma nova forma de gerir

os recursos naturais lhes foi imposta por uma instância heterônoma, dentro de

seu território de trabalho costumeiro (DINIZ, 2006).

Em 1989 o município, por meio do Decreto nº 8.060, declarou proibida a

pesca de arrastão nos canais da baía de Vitória e baía de Camburi, reprimindo

a pesca predatória prejudicíal ao desenvolvimento da fauna, presente tanto no

estuário como no mar, nos limites da jurisdição municipal.

Em 1990 foi promulgada a Lei Orgânica do Município de Vitória, com um

capítulo dedicado à conservação e ao controle do meio ambiente. No ano

subsequente, por Ato Constitutivo do COMDEMA (Conselho Municipal de

Defesa do Meio Ambiente de Vitória) foram estabelecidos critérios e padrões

para o controle da poluição dos recursos hídricos do município de Vitória

através da Resolução nº 02, de 05 de janeiro de 1991.

Nos anos 90, os espaços urbanos de Vitória foram redefinidos segundo

o novo Plano Diretor Urbano instituído pela Lei nº 4.167, através de diversos

projetos, visando proporcionar à cidade melhor infraestrutura para o

desenvolvimento sustentável do turismo. Neste contexto espaços capazes de

agregar valores paisagísticos, de tradição e culinários, representativos de

símbolos de preservação, como a Ilha das Caieiras, localizada na região

noroeste da baía de Vitória, detentora de uma história de formação vinculada

às atividades pesqueiras (ZIPPINOTTI, 1985; TURNER, 2005) tornaram-se de

grande importância para a prefeitura municipal. Desse modo, áreas com


98

vocação para a preservação de valores culturais tradicionais foram inseridas no

projeto de modernização turística da Prefeitura de Vitória e neles foram criados

novos espaços sociais, tais como cooperativas, e edificadas estruturas

arquitetônicas, como o píer e pavimentação para melhoria do acesso de

turistas à contemplação paisagística da natureza (Figura 23) (SILVA, 2003).

Figura 23 - Pier na Ilha das Caieiras, com restaurantes (abaixo à direita) e


passeio público (abaixo à esquerda) para contemplação da natureza.
Fonte: Fotos do autor (2009)

Embora estivesse ocorrendo um despertar para a importância de valores

complementares à qualidade dos recursos ambientais, os ecossistemas

naturais associados à malha urbana continuavam sofrendo consequências de

um modo de vida consumista associado ao aumento populacional, lembrando

que segundo a Lei, manguezais já eram ecossistemas protegidos e deviam ser


99

preservados (BRASIL, 1965, 1979), independentemente dos benefícios que os

usos da área pudessem proporcionar.

Em um contexto mais geral, buscando determinar os estágios de

regeneração da Mata Atlântica de maneira a controlar a exploração de seus

recursos, a Superintendência do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos

Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) em decisão conjunta com a Secretaria

para Assuntos de Meio Ambiente do Espírito Santo (SEAMA) e o Instituto de

Terras Cartografia e Florestas (ITCF) implementou a Resolução Conama nº 29

em 1994, proibindo o corte, exploração e supressão de vegetação secundária

no domínio de Mata Atlântica no Estado.

Já em um plano de manejo ambiental urbano, durante a década de 1990

foi proposta uma nova agenda pública no Brasil, visando à adequação de

políticas públicas ao “desenvolvimento sustentável” centrado no paradigma

ecológico-social voltado para as demandas locais, a Agenda 21 (P.M.V., 1996).

A Prefeitura Municipal de Vitória, em consonância com os objetivos da

Agenda, propôs o Plano Estratégico da Cidade: Vitória do Futuro 1996-2010,

esse desdobrava-se em diversos subprojetos, tais como o „Projeto Terra‟14,

„Projeto Rota Manguezal‟15, „Projeto Caranguejo‟ e o „Projeto Mangue Vivo‟ 16

14
O objetivo mais abrangente do Projeto Terra é o de incorporar ao tecido urbano da cidade as
áreas ocupadas por população de baixa renda, dotando-as de infraestrutura e serviços e
assegurando aos seus moradores adequada qualidade de vida e garantia da cidadania pelo
pleno direito à cidade
15
Tem como objetivo promover o ecoturismo na baía noroeste de Vitória, preservando e
conservando o manguezal, os valores históricos, culturais e humanos da região, além de
promover o desenvolvimento social das comunidades, visando a geração de emprego e renda,
fortalecimento das comunidades locais, diminuição da poluição da baía e ordenamento das
atividades pesqueiras.
16
Os objetivos propostos pelo projeto são a mobilização e sensibilização da comunidade em
geral para a problemática do lixo no ecossistema manguezal, avaliando seus impactos
negativos nesse ecossistema com relação afauna e flora. Intensificando o trabalho já realizado
pelo Departamento de Educação Ambiental (DEA) ações educativas para alunos das escolas
do entorno dos manguezais no Parque Municipal Baía Noroeste.
100

visando, entre outros objetivos, a gestão racional do uso dos espaços da

cidade de Vitória, incluindo as áreas de mangue.

Ao final da década de 1990, em um cenário de apelo à conservação dos

espaços naturais do município de Vitória, em particular da região noroeste da

baía, dois instrumentos surgiram para sedimentar a proteção aos manguezais e

definir a interelação entre poder público e instituições privadas no que concerne

a preservação, conservação, defesa, melhoria, recuperação e controle do meio

ambiente ecologicamente equilibrado, bem como de uso comum do povo e

essencial à sadia qualidade de vida.

Estes instrumentos foram, respectivamente, o Código Municipal de Meio

Ambiente, instituído pela Lei nº 4438/97, um dos primeiros do Brasil, e mais

tarde a criação por meio do Decreto nº 10179/98, do Parque Municipal Don

Luiz Gonzaga Fernandes na Baía Noroeste de Vitória (Figura 24), com área de

638.858m². A criação deste Parque Municipal veio agregar numa Unidade de

Conservação os manguezais que não estavam delimitados como parte da

Estação Ecológica Municipal Ilha do Lameirão (DINIZ, 2006).


101

Figura 24 - Parque Municipal Baia Noroeste de Vitória.


Fonte: Foto do autor (2009)

Contudo, tanto as alterações na legislação, quanto as representações e

práticas relacionadas à gestão do território do mangue, agora centradas na sua

conservação, ainda se depararam com os limites presentes na legislação

brasileira.

A legislação brasileira, no período de 1998, inspirava-se na concepção

norte-americana de uma natureza intocada (DIEGUES, 2004), na qual o

homem é caracterizado como agente eminentemente destruidor. Perspectiva

oposta àquela dos naturalistas de fins do século XIX, que viam no homem um

ser perdido na imensidão do ambiente natural. Neste sentido, as normas em


102

vigor no Brasil priorizavam o „interesse da natureza‟ à custa de uma atenção

secundária aos seres humanos.

A maioria das políticas voltadas à conservação das áreas naturais da

região, foi parcialmente implementada. Muitas das áreas protegidas foram

delimitadas com a instalação de cercas, mas os órgãos não investiram em

ações administrativas e práticas necessárias à proteção integral ou

sustentabilidade dos recursos existentes.

A maioria das áreas protegidas não contempla a legislação vigente no

que se refere às suas potencilaidades e fragilidades, pois não têm Plano de

Manejo17 ou qualquer outro instrumento norteador das atividades a serem

conduzidas ou coibidas. Existem apenas alguns estudos paralelos

individualizados, porém inconclusivos, de atendimento dos objetivos de um

plano de manejo.

Como parte do processo de criação de áreas de proteção ambiental é

necessária a elaboração e execução de estudos prévios como Estudo de

Impacto Ambiental (EIA) e de estudos de controle e monitoramento dos

processos naturais e antrópicos já existentes e de implantação de novos

processos no âmbito de lei. No caso da região de São Pedro em Vitória, ES, os

processos de uso e ocupação das áreas e seus recursos ocorreram de maneira

árbitrária em relação à legislação ambiental e, só tardiamente, as

determinações legais foram observadas e consideradas, na maioria das vezes

17
Documento técnico mediante o qual, com fundamentos nos objetivos gerais de uma unidade
de conservação, se estabeleceseu zoneamento e as normas que devem presidir o uso da área
e o manejo dos recursos naturais, inclusive a implantação de estruturas físicas necessárias à
gestão da unidade. (BRASIL, 2000)
103

como resultado de ações mal conduzidas que culminaram no esgotamento ou

na degradação de recursos e após a ocupação já estar totalmente estruturada.

Além disto, os órgãos responsáveis pela gestão e monitoramento

demonstram dificuldades em demandar esforços na manutenção das parcelas

legalmente protegidas, seja pela falta de efetivo técnico destinado à área, ou

pela ineficiência em sensibilizar a população ou ainda pelo desequilíbrio destes

aspectos associado à imposição da legislação aos grupos que se utilizam dos

recursos sem oferecer uma opção substitutiva ou complementar à proibição da

extração dos recursos.


104

6. CONFLITOS ENTRE CRESCIMENTO URBANO E A CONSERVAÇÃO DOS


MANGUEZAIS EM VITÓRIA

6.1 DESTRUIÇÃO E DEGRADAÇÃO DOS MANGUEZAIS EM VITÓRIA

Nas vilas do Espírito Santo, entre as décadas de 1940 e 1960, a

territorialização do espaço sofreu alterações de sua forma fundiária que passou

por descentralização e fragmentação das grandes propriedades cafeeiras no

sul do Estado em função do esgotamento do café (BUFFON, 1992). Com a

diminuição da atividade cafeeira no Estado houve um intenso movimento

migratório para a capital impondo uma nova dinâmica à apropriação e uso da

terra e à absorção de mão-de-obra (ZANOTELLI, 2000).

Desta forma, segundo os autores supracitados, a partir da década de

1960, estendendo-se pela década subsequente, Vitória tornou-se o centro

polarizador das atividades econômicas e políticas do Estado. Contudo,

acomodar o contingente populacional imigratório no espaço do município, de

reduzida extensão, sem suporte para grande contingente habitacional, foi um

problema.

A industrialização de grande porte, enquanto principal atividade

econômica na década de 1970 serviu de base para a apropriação da renda

através da terra (CAMPOS, 2004), já que foi um processo catalisador da

imigração populacional para a cidade; porém, esta apropriação ocorreu de

forma desigual se comparadas às regiões nordeste e noroeste do município.

Enquanto a região nordeste da baía, principalmente a orla (Figuras 25 e 26),

sofria intensa verticalização, a porção noroeste era relegada à segundo


105

plano sob o aspecto da infraestrutura urbana necessária ao desenvolvimento

imobiliário.

Figura 25 - Praia do Canto no início da década de 1970


Fonte: Acervo da Biblioteca do Centro de Artes da Ufes

Figura 26 - Av Cesar Hilal, bairro Praia do Canto ao final da década de 1980


Fonte: Acervo do Jornal A Gazeta
106

Os projetos industriais implantados após 1970 foram implementados de

forma muito brusca e promoveram rapidamente a decadência das atividades

econômicas tradicionais, descaracterizando, por conseguinte, os traços rurais

da região urbana de Vitória (ROCHA; MORANDI, 1991). Além disso, os

projetos industriais atraíram para a cidade tanto a população rural capixaba que

ficou desempregada depois da erradicação dos cafezais improdutivos quanto

um formidável contingente de migrantes de outras localidades do país, o que

contribuiu para agravar ainda mais o quadro caótico que se instalara em Vitória

e na Grande Vitória (SIQUEIRA, 2001).

A década de 1970 foi também o período no qual as desigualdades

espaciais existentes no município de Vitória cristalizavam-se na individualidade

de cada prédio, racionalizadoras do espaço produzido de acordo com

interesses de grupos dominantes historicamente definidos que conferiam valor

à natureza agora escassa (MENDONÇA, 1999). Bairros localizados nas

regiões insular e continental, tais como Praia do Canto e Jardim da Penha

foram os primeiros a apresentar uma representativa verticalização. Isto ocorreu

porque tais áreas consideradas nobres possuíam grandes residências, ruas

arborizadas e infraestrutura instalada, as condições consideradas propícias

para o citado processo (CASER; CONDE, 1994).

A intensificação da verticalização ocorreu na década de 80 graças à

criação do Plano Diretor Urbano de Vitória em 1984 (ABE, 1999). Neste

sentido, pode-se afirmar que os Planos Diretores de Vitória, no período, foram

grandes aliados dos grupos empresariais ao ignorar a natureza determinando

índices construtivos que permitiram a edificação de projetos verticais em áreas

inadequadas.
107

Assim, com a contínua valorização do espaço na orla, as áreas de

manguezal na face noroeste tornaram-se o destino dos imigrantes em busca de

melhores condições de vida na capital. Enquanto o mercado imobiliário era

intensamente promovido na porção nordeste, a apropriação do espaço da baía

noroeste de Vitória ocorreu de forma desordenada (Figura 27).

Figura 27 - Inicio da ocupação da Grande São Pedro (1985).


Fonte: Acervo da Prefeitura Municipal de Vitória

Concomitantemente, o esforço de ordenação espacial urbana de outras

áreas da cidade por parte dos órgãos públicos, tais como aquela destinada a

implantação do terminal rodoviário da cidade (Figura 28), exigiu o

remanejamento de famílias que, sem opções dirigiram-se aos mesmos espaços

de pouca valorização que os imigrantes.


108

Figura 28 - Estação Rodoviária recém construída


Fonte: Acervo do Instituto Jones dos Santos Neves

Todo este contingente populacional passou a utilizar-se do espaço para

moradia, lançando mão dos recursos naturais disponíveis para construção de

barracos e palafitas (Figura 29) podendo facilmente enquadrar-se no modelo

de „cidade ilegal‟ proposto por Silva (2000) e Maricato (2001). A exemplo de

grande parte do Brasil, em Vitória, o poder público transfere renda na forma de

investimentos para o mercado imobiliário de alto padrão em áreas selecionadas

e pouco ocupadas, priorizando-as em detrimento de áreas intensamente

ocupadas e com carências básicas.


109

Figura 29 – Condições de moradia no inicio da ocupação em São Pedro (1985)


Fonte: Acervo da Prefeitura Municipal de Vitória

Assim, os esforços para atender às demandas da ordenação urbana das

áreas mais valorizadas da cidade, associados à falta de infraestrutura e

planejamento fizeram com que a porção noroeste, depósito de lixo do

município desde 1970 (Figura 30) tivesse aumento do volume de resíduos e

passasse por novo processo de territorialização. Já que o direito ao material

despejado passou a ser disputado, como recurso financeiro, pela população

residente (DINIZ, 2006).


110

Figura 30 - Uso do bairro São Pedro como lixão municipal na década de 1970.
Fonte: Acervo do Jornal Gazeta On Line

O poder público instaurado na cidade no fim dos anos 70 e durante parte

da década de 1980 sempre respondeu de forma clientelista e pontual, por um

lado, e por outro, através da repressão policial, sem que fossem gestadas

políticas para aquela realidade de degradação humana e ambiental. Esse

quadro, onde o mangue era palco de disputas, seja como espaço de moradia,

seja como espaço para o exercício da atividade extrativista, originou a

destruição de muitas riquezas oriundas deste ecossistema, afetando

principalmente a pesca, levando à extinção de algumas árvores nativas e na

perda de extensa área vegetacional.

Nos anos seguintes, com a intervenção do estado na tentativa de

urbanizar a área através da implantação de projetos de desenvolvimento

urbano, ocorreu acelerado aumento populacional associado a uma intensa

territorialização onde diversos atores, tais como associações de classe e

lideranças comunitárias faziam-se presentes e ativas. Neste contexto, a região

foi tomada por especulação imobiliária que ocasionou uma reestruturação no

uso do solo (DIGRAZIA, 1997), fazendo com que recursos naturais disponíveis
111

ficassem inacessíveis, à partir da ocupação da área por construções que

levaram à diminuição dos recursos do mangue e à graves limitações de suas

atividades tradicionais contribuindo para a emergência de conflitos entre os

diversos atores.

A intervenção pública sobre estas áreas ocorreu inicialmente de

maneira arbitrária, ignorando, na maioria das vezes, os diferentes grupos que

ali viviam, transformando o território que utilizavam para seu sustento em áreas

naturais protegidas, mantendo-os, em geral, alienados do processo, isto

quando não são usurpados de seus direitos

A história de formação dos bairros da Grande São Pedro, vinculada às

atividades pesqueiras e extrativistas, agrega valores paisagísticos e de tradição

à localidade. Assim a área se tornou importante para a prefeitura municipal de

Vitória, que direcionou, ao longo das décadas de 1980 e 1990, uma série de

investimentos no local, tratado como reduto do desenvolvimento e da

manutenção da „tradição‟ (SILVA, 2003).

Neste cenário, a região da baía noroeste tornou-se palco de disputas e

de conflitos envolvendo o poder público e os grupos que têm sua história de

vida vinculada a esses espaços, colocando em jogo as identidades criadas a

partir das atividades tradicionais associadas ao ecossistema do manguezal,

tais como os catadores, os pescadores artesanais, as desfiadeiras de siri e os

baloeiros18.

18
O termo baloeiros faz referência aos pescadores integrantes de barcos de arraste,
equipados com “rede de balão”, direcionados à captura de camarões. Os barcos fazem uso de
tangones, estruturas de madeira que se mantêm presas nos dois lados da popa da
embarcação, possibilitando a operação de pesca com duas redes em simultâneo, além do uso
de correntes espantadeiras, que vão batendo no fundo para espantar os camarões e tornar a
captura mais eficiente. (nota do autor)
112

6.2 URBANIZAÇÃO DO MANGUEZAL DA REGIÃO NOROESTE

Enquanto ocorria o boom imobiliário na região nordeste, a parcela

noroeste era palco de alterações de ordem física e social, cristalizadas na

degradação estrutural de seus sistemas natural e humano. O maciço Central

situado no centro da Ilha faz o papel de barreira natural física que comprime o

centro histórico, limitando a expansão da parte noroeste, enfatizando

contrastes e dividindo geograficamente o município.

Associado a este cenário vale lembrar que o mangue foi desconsiderado

ao longo dos sucessivos planos de urbanização, sobretudo pela política

sanitarista, que o considerava área insalubre e foco de doenças. Este

posicionamento desvalorizador, simbólico e material por parte da sociedade e

do poder público ocasionou grande devastação deste ecossistema na cidade

de Vitória.

O manguezal, em contraste com o mar, até recentemente não era

considerado objeto de valorização e atenção imediata para qualquer dos atores

sociais envolvidos na expansão da malha urbana em Vitória, fossem eles a

sociedade em geral ou empreendedores, contudo o manguezal é um

ecossistema facilmente eliminável para atender às demandas da sociedade.

No caso da cidade de Vitória as áreas planas próximas à baia foram preferidas

para implantação de loteamentos e infraestrutura urbana (CAMPOS JR;

SANTOS NEVES, 1998), enquanto o manguezal existente na porção noroeste

da baía teve suas maiores parcelas aterradas nas décadas de 1970 e 1980.
113

Nos últimos anos da década de 1970 até meados da década seguinte, a

área do manguezal da região noroeste, utilizada como depósito do lixo urbano

produzido na metrópole (P. M. V., 2009), originalmente ocupada por uma

colônia de pescadores, foi intensamente ocupada por famílias de baixa renda,

inicialmente 500, oriundas de regiões rurais e excluídas socialmente sob o

aspecto habitacional (Figura 31). Estas famílias tinham no lixo, constantemente

despejado para aterro da área, sua fonte de renda e alimento (Figura 32)

(NUNES, 1998).

Figura 31 - Lixão de São Pedro (1986)


Fonte: Nunes (1998)
114

Figura 32 - Lixão como fonte de renda em São Pedro


Fonte: A Gazeta (1978)

Este início de ocupação do manguezal em resposta a uma ação popular

de demanda por moradias foi um processo consentido pelo poder público, mas

sem apoio, já que omitiu-se à propor alternativas de ocupação da área

(ANDREATTA, 1987). Na ocasião havia um conjunto de posições divergentes

entre diferentes atores locais e o poder publico a respeito da questão

ambiental, envolvendo posseiros de terras devolutas, ambientalistas e a

Capitania dos Portos de Vitória (P. M. V., 1989).

Quando o poder público fracassou em retomar a área de manguezal de

São Pedro dos posseiros estabelecidos, intensificou o uso da área como

depósito de lixo como uma solução que afastasse os ocupantes ilegais. Porém,

esta ação só serviu de estímulo para que esses permanecessem na área. Esta

ação da prefeitura começou a ser apontada como „de risco‟ pela Capitania dos

Portos do Espírito Santo e por ambientalistas que alertavam que o lixo poderia

ser arrastado para dentro dos mangues pelas águas da maré cheia e durante a

vazante, levado pelo canal da baía de Vitória e principalmente ao longo do


115

estuário do rio Santa Maria, provocando o assoreamento do seu leito (A

GAZETA, 1980).

Vale lembrar que, desde 1967 a União proíbe por meio da Lei 5.357, o

lançamento de resíduos e óleo em águas brasileiras, incluindo aí no âmbito de

seu Artigo 1º, todo o litoral brasileiro, ou nos rios, lagoas e outros tratos de

água. A fiscalização desta Lei fica a cargo da Diretoria de Portos e Costas do

Ministério da Marinha, em estreita cooperação com os diversos órgãos federais

ou estaduais interessados. Embora o problema da destinação do lixo urbano

estivesse sendo destaque desde 1978, como assunto em pauta discutido

durante reunião da Comissão Nacional das Regiões Metropolitanas e Política

Urbana (CNPU) em Brasília, o problema era desconsiderado no município, que

produzia e depositava uma média diária de 90 toneladas de lixo, na área do

atual bairro Maria Ortiz nos últimos anos da década de 1970 (P. M. V., 2001).

Importante enfatizar que somente depois de 12 anos utilizando a área como

destino final do lixo do município é que o mangue, já totalmente aterrado com

lixo, foi coberto com terra (Figuras 33 e 34) (BANCH, 1998).


116

Figura 33 - Caminhões levando terra destinada a cobrir o lixo em São Pedro


(1989)
Fonte: Foto de Vitor Nogueira (NUNES, 1998)

Figura 34 - Caminhão aterrando o lixão sobre o manguezal em São Pedro.


Fonte: Foto de Vitor Nogueira (NUNES, 1998)
117

Uma das consequências da reunião da CNPU foi a aplicação de multas

a quem implantasse lixões e isso ocorreria através da Capitania dos Portos

(DINIZ, 2006). Também foi defendida a construção de uma usina de

beneficiamento de lixo, proposta sem apoio político ou popular, mas apenas

técnico. É importante destacar que, no período, prevalecia o regime militar

contrapondo-se ao surgimento de projetos nacionais populistas e ao

fortalecimento das oposições nos centros urbanos desde as eleições de 1974

(NUNES, 1998).

Na região de São Pedro a igreja católica, através de seus

representantes da Comissão de Justiça e Paz, foi um instrumento eficiente da

conscientização popular. A demanda por habitação levou à descentralização

das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) para facilitar a atuação dos grupos

de ação social, ocasionando o surgimento de organizações religioso-sociais

(MENDONÇA, 1985; MARTINS, 1993), tais como o Conselho de Mulheres da

Igreja de São Pedro que ajudou a formar a associação de classe MUSP

(Mulheres Unidas de São Pedro), a Pastoral da Criança e a Paróquia Santo

Antônio, que dentre vários objetivos auxiliava o desenvolvimento e a gestão da

Fábrica Escola de Alimentos, destinada à produção e venda de salgados e

doces.

A partir da ocupação em larga escala da região da Grande São Pedro

(Figura 35) o poder público, representado na ocasião pela ARENA 19, se

mobilizou frente às pressões da sociedade e comunidades locais organizadas e

iniciou a implementação de projetos de urbanização com o Programa Nacional

19
Aliança Renovadora Nacional (ARENA) foi um partido político brasileiro criado em 1965
com a finalidade de dar sustentação política ao governo militar instituído a partir do Golpe
Militar de 1964. (nota do autor)
118

de Erradicação de Subhabitações (PROMORAR) na área, atraindo diversas

pessoas pela nova possibilidade de moradia (MENDONÇA, 1999).

Este processo desencadeou ações de apropriação ilícita de terrenos

acrescidos da Marinha, devido à valorização da área e conflitos entre

proprietários e invasores de áreas adjacentes (P. M. V., 2009).

O PROMORAR atuou sobre a primeira ocupação durante a formação de

São Pedro I, mas de maneira contraditória a um de seus princípios, já que não

permitiu a participação popular no processo de implementação (DI GRAZIA,

1997). O programa foi politicamente organizado e tecnicamente elaborado por

engenheiros, arquitetos e assistentes sociais do governo, sendo implementado

de forma padrão segundo diretrizes determinadas por Brasília.

Figura 35 - Grande São Pedro (1986)


Fonte: Acervo da Prefeitura Municipal de Vitória
119

O primeiro passo para implementação foi a contratação de uma empresa

para organizar o cadastramento da área delimitada pelo projeto. Esta ação

gerou desconfiança e boatos de um novo zoneamento, expansão da área, e

não atendimento às famílias, o que ocasionou novas ocupações irregulares em

áreas fora do limite previsto no projeto, entretanto os boatos não se

concretizaram (ANDREATTA, 1987).

A proposta de urbanização pautava-se na definição de largura de ruas,

criação de novas vias e apontamento da localização de pontos de instalação de

equipamentos urbanos, medidas que implicavam remanejamento de famílias e

controle do número e tamanho dos lotes, portanto, desagradáveis à população

(P. M. V., 1996).

A infraestrutura existente na área era composta de luz, canos

assentados que eventualmente traziam água, ruas abertas e inicio de

drenagem e pavimentação (VILAS NOVAS, 2003). A reordenação urbana

prevista não ocorreu de forma plena porém, ações arbitrárias, como a tomada

unilateral de decisões e a derrubada dos barracos, levaram à realização pela

população local de protestos que atraíram a atenção da mídia. O

descontentamento com a condução do programa PROMORAR pelo poder

público, deu início a uma discussão que culminou na elaboração de um projeto

alternativo (P. M. V., 2009). Assim, a população, apoiada pelo Instituto dos

Arquitetos, criou Comissões de Rua e o Movimento Comunitário e desta forma

organizada conseguiu modificar o programa PROMORAR amplamente, antes

deste ser parcialmente implantado em São Pedro I.

Antes da ocupação da área equivalente ao bairro São Pedro II, que

aconteceu em dezembro de 1980 (Figura 36), a população solicitou ao poder


120

público municipal que adquirisse a área para a criação do bairro. Em resposta,

o legislador municipal sugeriu a invasão e declarou que efetuaria a aquisição

caso o proprietário se apresentasse (ANDREATTA, 1987).

Figura 36 - Ocupação inicial do manguezal em São Pedro (1980)


Fonte:Acervo da Prefeitura Municipal de Vitória

A autora descreve o início da ocupação e formação de São Pedro III,

como um processo que ocorreu de forma organizada e dirigida pelos

representantes do Movimento Comunitário. Estes demarcaram 90 lotes em

uma área de 150.000m2, porém, o processo foi divulgado pela mídia na época,

e, diferentemente das 90 famílias previstas, surgiram entre 300 e 500 (VILAS

NOVAS, 2003).
121

Ao chegarem ao manguezal os grupos demarcavam a área e, no dia

seguinte, caminhões transportando madeira para os barracos a serem

montados, eram descarregados. Este processo desencadeou a ocupação de

outras áreas de manguezal originando quatro novos bairros: Santo André, São

José e Redenção (São Pedro III) e Conquista (Figura 37).

Redenção
São José

Conquista

Figura 37 – Área aproximada (em laranja) dos atuais limites dos bairros São
Pedro III e Conquista
Fonte: Imagem adaptada do Programa Google Earth Pro mapas (2011)

Outra ação da administração municipal em 1980 foi o deslocamento do

lixão para Carapina, no município da Serra, local proposto pela administração

para construção de um aterro sanitário (ZECHINELLI, 2000). Assim que

executada esta ação, completa a autora, uma empresa imobiliária local,

autodenominando-se proprietária da área de manguezal, solicitou apoio policial


122

para proibir a entrada de catadores oriundos de São Pedro, que se deslocavam

acompanhando o trajeto do lixo, gerando nova ação judicial por parte destes.

Paralelamente ao processo judicial movido pelos catadores, a prefeitura

municipal de Serra protestou judicialmente contra a instalação do lixão no seu

município e este retorna a São Pedro III. O lixo como produto comercializável

pela população carente dos bairros da Grande São Pedro foi uma realidade

sempre presente durante todo o processo de ocupação. O lixo, principal fonte

de renda para grande parte da população local, era motivo constante de

conflitos, sobretudo em razão das diversas ações públicas tomadas sobre ele

(DINIZ, 2006). No ano de 1982 o lixo tornou-se uma vez mais, objeto de

protesto, pois o poder público determinou que as atividades comerciais a ele

ligadas, cessassem.

Houve intenso embate, chegando mesmo ao confronto corporal. Na

esfera judicial a população abriu um processo contra a Prefeitura, pleiteando

indenização por nove meses de paralisação de suas atividades de catação

(ANDREATTA, 1987; ZECHINELLI, 2000). Como resultado, a justiça entendeu

que a reinvidicação da população era procedente e determinou a posse do lixo

ao povo.

Mais tarde, ainda em 1982, em função do acelerado processo de

degradação do lixo causado por chuvas intensas, houve diminução do preço do

produto pelos atravessadores, o que acarretou como retaliação, por parte dos

catadores, o início de uma greve. Neste contexto é então criada a Associação

Cooperativa dos Catadores de Vitória Homero Mafra (ACCATAV) visando

representar os catadores legalmente (GURGEL; PESSALI, 2004).


123

Em 1986, o lixo passa a ser um problema inicialmente sob o aspecto

estético, já que ao ser enfardado e empilhado para ser transportado por

caminhões da prefeitura municipal, as pilhas ultrapassam a altura dos barracos

em função de seu volume (BARBOSA, 2004). Contudo, o problema adquire

dimensões sanitarias porque a matéria orgânica contida nos fardos, exposta ao

calor e à umidade da chuva sofria fermentação e aceleração em seu processo

de degradação, exigindo ações imediatas.

Diante deste quadro a construção da usina de beneficiamento de lixo

(Figura 38), a ser viabilizada com recursos do BNDES, torna-se prioridade para

a prefeitura, embora ainda sendo repudiada pelos moradores que tinham no

lixo sua fonte de renda (ZECHINELLI, 2000).

Tendo em vista a urgência em suprir necessidades básicas da

população, a defesa do manguezal sempre foi ignorada, desta maneira a

conquista do espaço, no contexto do processo de urbanização da Grande São

Pedro, sob a ótica social, tem sido considerada como processo positivo, ainda

que através do aterramento de manguezal, considerado crime em lei como já

mencionado (VANNUCCI, 2003; WAINER, 1999).


124

Figura 38 - Usina de tratamento de Lixo, São Pedro (1991)


Fonte:Acervo da Prefeitura Municipal de Vitória

No ano de 1987 foi iniciada a urbanização nos bairros São Pedro I,

Santo André e Lixão, atual São Pedro III, com obras provenientes de recursos

de empréstimos à Prefeitura Municipal de Vitória disponibilizados pela Caixa

Econômica Federal. Os bairros, Nova Palestina e Resistência, não foram

beneficiados devido à suspensão da verba e então passaram a receber o lixo e

a população de catadores que invadiram novas áreas de mangue

(ANDREATTA, 1987; ZECHINELLI, 2000).

Até 1989, a atuação do poder público ocorria apenas emergencialmente,

em resposta à mobilização popular que preocupava-se em produzir espaço

urbano às custas da destruição do manguezal, e em sobreviver através do

comércio do lixo, embora a criação da Unidade de Conservação Municipal Ilha

do Lameirão tenha ocorrido em 1986. A partir do ano de 1989 o poder público

do municipio passa a atuar de forma integrada buscando solucionar problemas


125

que envolviam vários aspectos e questões, utilizando-se de uma estratégia co-

participativa em consonância com as demandas da população (Figura 39)

(SOARES, 1998).

O autor supracitado enfatiza ainda que através destas ações a

prefeitura, neste primeiro período de gestão, produziu uma política pública co-

gestada, pautada em diversos encontros com a comunidade representada

pelas associações de moradores, pelo movimento de mulheres e por outros

atores para definir as metas básicas do projeto a ser implantado.

Figura 39 - Inicio da urbanização em Resistência (1991).


Fonte: Acervo da Prefeitura Municipal de Vitória

A administração pública do município no período de 1993 a 1996,

completa Soares (1998), deu seguimento ao estabelecido pela gestão anterior

realizando a integração de políticas e rotinas, gerais e localizadas dos setores

da prefeitura. Também promoveu a integração destas políticas e rotinas à

atuação dos conselhos de participação temáticos, tais como o Conselho do

PDU, Conselho de Meio Ambiente de Vitória (COMDEMA), o Conselho


126

Municipal de Tributos Imobiliários, o Conselho Municipal de Habitação, entre

outros que proporcionam o debate e deliberação acerca de várias questões

envolvendo as políticas públicas municipais, em função da concepção social do

projeto.

A citada administração, também procurando afinar-se com as

preocupações ambientais destacadas no evento ECO92 realizado no Rio de

Janeiro, em destaque naquele momento, anunciou a implantação de um projeto

de delimitação e preservação da área não devastada de manguezal e da

urbanização dos locais já ocupados, o Projeto São Pedro (DIGRAZIA, 1997).

Ainda, segundo a autora, estavam previstas obras de aterramento,

abertura de ruas, calçamento, instalação de sistema de esgoto, água e luz,

construção de creches e de áreas de lazer bem como sua extensão a outros

cinco bairros. A primeira ação foi a orientação dos moradores sobre a

importância da preservação e sobre os benefícios do projeto para a qualidade

de vida da comunidade.

Após a delimitação da área de preservação, verificou-se que 450

famílias estavam dentro da área demarcada e precisavam ser removidas. Em

conjunto com as lideranças comunitárias locais decidiu-se pela permanência de

todas as famílias nos bairros beneficiados pelo Projeto São Pedro que, no

entanto, já estava com todo espaço ocupado (Figura 40) (ZECHINELLI, 2000).

A remoção só foi possível a partir de uma proposta para parcelamento

do solo, com adoção de critérios tais como limitações no tamanho dos lotes e

indenização de benfeitorias (Figura 41). Desta forma o Projeto incorporou


127

também as áreas dos bairros Estrelinha, Inhanguetá, Grande Vitória e

Resistência.

Figura 40 - Invasão anterior à delimitação da área de Preservação (1988)


Fonte:Foto de David Protti (NUNES, 1998)

Figura 41 - Retomada da área pelo bosque de mangue após remoção das


casas e delimitação da área a ser preservada (1997).
Fonte:Nunes (1998)
128

Atualmente a Administração Regional de São Pedro (Região VII) é

composta pelos bairros São Pedro, Ilha das Caieiras, Redenção, Nova

Palestina, Resistência, Condusa, São José e Santos Reis (Figuras 42 e 43). Os

bairros Estrelinha, Inhanguetá e Grande Vitória, apesar de terem sido palco do

processo de ocupação do manguezal e de integrarem o Projeto São Pedro,

constituem a Administração Regional de Santo Antonio (Região II) (Figura 42)

devido a sua identidade e descontinuidade territorial.

Figura 42 - Bairros formadores da Grande Sâo Pedro.


Fonte: Imagem adaptada do Programa Google Earth Pro (2011)

Figura 43 - Cartograma atual do município de Vitória dividido em regionais.


Fonte: Prefeitura Municipal de Vitoria [s.d]
129

Na análise de diGrazia (1997, p.9) o Projeto São Pedro “reúne

qualidades que faltam a uma grande parte dos projetos urbanos e ambientais”.

Sua implementação só foi possível face sua realização em duas

administrações, ambas priorizadoras de políticas sociais que, de maneira geral,

visavam o desenvolvimento e realização de campanhas de educação ambiental

e sanitária, de utilização adequada das redes de água e esgoto e de fixação da

população no local, a implantação de programas de geração de emprego e

renda, e implantação do programa família cidadã, visando a contribuir na renda

mínima; e também àqueles voltadas à urbanização, tais como estabelecimento

de critérios para uso do solo, conclusão da construção da Usina de Lixo, e dos

direitos de cidadania, permitindo articular políticas públicas20 sob a égide da

gestão participativa.

O trabalho social proposto neste cenário buscava promover a mudança

de entendimento cultural e de comportamentos como suporte às necessidades

da população local e com seu apoio, estimulando sua compreensão e

valorização de sua trajetória dentro de um novo contexto na sociedade. O

resultado direto desta ação pode ser observado com a multiplicação das

associações de moradores e outros movimentos que participam intensamente

das políticas sociais da região. Assim, a autora postula que o Projeto São

Pedro potencializou processos de construção de políticas públicas

propriamente ditas e neutralizou a compartimentação e desarticulação da

estrutura administrativa.

20
No caso de São Pedro, políticas sociais educacionais, de saúde pública, de esporte e lazer,
de assistência social, de geração de trabalho e renda e de transporte.
130

Foram realizadas políticas sociais substanciais que contribuíram para a

construção da cidadania da população em geral e dos atores sociais, em

função da metodologia de atuação aplicada na região favorecendo a

multiplicação de atores no âmbito urbano.

O Projeto São Pedro também apresentou deficiências ao não destacar a

regularização fundiária entre suas prioridades, vulnerabilizando a população

local aos processos especulativos, já que a regularização da propriedade das

áreas para os moradores não foi realizada, embora já pertencessem ao

domínio municipal.

Atualmente o complexo urbano Grande São Pedro está intensamente

ocupado, a ponto de não ser possível registrar imagens panorâmicas atuais de

pontos anteriormente fotografados pelos órgãos urbanos com a finalidade de

registrar o processo de urbanização.

Segundo informações divulgadas pela prefeitura municipal (P. M. V.,

2010) a região administrativa VII, Grande São Pedro, continha uma população

de 28.718 habitantes domiciliados em 7.525 imóveis, perfazendo 3,82

habitantes/m2. As informações indicam ainda que 99% destes domicílios são

abastecidos com água tratada, 92,8% tem seu esgoto coletado (condição

referente estatísticamente aos domicílios ligados ao sistema com esgoto

tratado ou não) e 98,9% tem seu lixo coletado. Em termos de equipamentos de

saúde a região contém 12 unidades, desde módulos de Serviço de Orientação

ao Exercício (SOE), Farmácia Popular, até Centro de Controle de Zoonoses.

Em entrevista cedida em 16/07/2009, o gerente da Regional VII, Sr A. F.

B. R., apontou as melhorias urbanas realizadas até aquele momento na região,


131

dentre as quais destacou várias obras de drenagem e pavimentação de ruas,

construção de escadarias e praças e pavimentação de galeiras a céu aberto.

Indicou a existência de sete escolas de ensino fundamental e seis de educação

infantil, além da presença da FAESA (Faculdades Integradas São Pedro) e de

tres instituições de geração de renda, a Cooperativa das Desfiadeiras de Siri, a

Fábrica de Alimentos de São Pedro e a Peixaria Comunitária. No contexto de

saneamento apontou a melhoria quanto à coleta de lixo urbano, destacando

que a população foi beneficiada com a desativação da usina de lixo que criava

transtornos, tais como a presença de urubus e o mau cheiro constante. Já em

relação ao saneamento de esgoto indicou a presença de duas estações de

tratamento, uma em Resistência e outra em Nova Palestina.

Ainda segundo a Prefeitura Municipal de Vitória (2010), desde maio de

2008 está em funcionamento a Unidade de Transbordo, que recebe os

resíduos coletados na cidade de Vitória e pelos caminhões compactadores

diretamente para carretas basculantes, de 50 toneladas, que fazem o

transporte do material para o aterro sanitário. Ainda, segundo a prefeitura, no

local foram realizadas obras de captação do chorume, drenagem superficial e

pavimentação com asfalto, além de paisagismo e proteção, com replantio de

plantas nos taludes e enriquecimento da cortina vegetal, eliminando o forte

odor e os urubus, que incomodavam a comunidade do entorno da área.

Contudo, diversos depoimentos demonstram a insatisfação da

comunidade com o processo de desativação da Usina. Para o Sr. E. D., de 52

anos de idade, natural de Linhares, morador de São Pedro desde 1978 e Vice-

presidente do Movimento Comunitário do bairro Resistência, a desativação da

Usina não foi realizada com o planejamento necessário para atender a


132

demanda da população e preservar a qualidade ambiental da área. Durante a

entrevista por ele cedida em 14/01/2011, apontou que houve uma reunião no

período da implantação da Unidade de Transbordo, na qual questionou aos

dirigentes da Usina e ao representante do IBAMA, a eficiência da metodologia

de tratamento do lixo depositado, principalmente no que se referia à drenagem

do chorume. Na oportunidade, os representantes presentes questionaram seu

conhecimento acerca do assunto e não permitiram a continuidade da discussão

sobre o tema. Segundo ele, o lixo depositado na caçamba de 50 toneladas

para ser transportado fica a céu aberto e produz chorume que drena

naturalmente para o solo sem nenhum tipo de filtragem.

No âmbito da produção, destinação final e manejo de lixo na região,

pelos diversos atores cabem estudos complementares que objetivem

compreender a dinâmica das diversas ações públicas, suas conseqüências e

desdobramentos no âmbito da saúde pública e sócio-economico-ambiental

sobre os moradores da região.

Ele lembra que as ações do poder público sempre foram contraditórias e

aponta a visita do Papa João Paulo II em função do documentário “Local de

toda pobreza” como exemplo. Na época da realização do documentário o

manguezal estava aterrado com lixo do município e o tema abordado na

vídeoprodução era o uso deste lixo como meio de vida. Foi exatamente esta

situação que trouxe o Papa à Vitória, porém, quando o poder público soube da

vinda do pontíficie correu para cobrir o lixo com terra; e quando o papa chegou

à área, a condição apresentada e que atraiu sua atenção não existia mais.
133

De toda forma E. D., tal como todos os demais entrevistados,

confirmaram que hoje há coleta de lixo domiciliar de segunda a sábado nos

bairros, porém desconhecem o destino do lixo depositado nas grandes

caçambas dentro da Usina. As modificações na destinação final do lixo do

município não foram inteiramente benéficas para a população, de acordo com

F. de 45 anos de idade e morador há 2 anos no bairro. Para ele, desde o

fechamento da usina muitas pessoas ficaram desempregadas. Conversando

sobre este assunto, na entrevista cedida em 18/01/2011, declarou que a

desativação da usina foi uma perda para o bairro e que o lixo é uma ótima fonte

de renda. Apontou também que o lixo que se vê na orla é apenas resultado do

mau comportamento da população que, no momento de deposição nas caixas

de coleta, jogam os sacos e mesmo que no durante a coleta normal este

material não seja apanhado, a prefeitura realiza coleta manual na orla ao

menos uma vez ao mês.

Entretanto, quando abordados sobre o problema de lançamento

inadequado de lixo no mangue, os pescadores deixaram claro que a

preocupação principal não é com o lixo lançado na orla. Para A. S., pescador

de 33 anos de idade e morador do bairro há 25 anos, o problema reside no lixo

levado pela „maré‟ para o interior do bosque, pois este não é coletado e

„apodrece dentro dos canais‟. Quando questionados, em 18/01/2011 sobre o

que, para eles, é maior problema para o mangue e seus recursos, diversos

pescadores, além de A. S., apontaram o lançamento de esgoto „in natura‟ como

maior problema urbano, seguido da falta de sensibilização para com o

ambiente e desrespeito às leis de preservação por parte de alguns pescadores.


134

Em todas as entrevistas realizadas21 percebeu-se um consenso geral

sobre a poluição gerada pelos efluentes da Estação de Tratamento da Cesan

(pós-tratamento), bem como de sua Elevatória. Ambas estão localizadas na

entrada do bairro Resistência e os efluentes são lançados diretamente no

mangue e das águas provenientes da lavagem de caminhões de coleta de lixo

das empresas de saneamento. Seu aspecto leitoso e o mau cheiro denunciam

o que foi colocado pelos entrevistados (Figuras 44 e 45). F. complementa, em

concordância com A. S., que estas águas alcançam pontos distantes dentro do

manguezal e causam danos à pesca, principalmente em período de lua

minguante, quando a maré estabiliza por até seis dias e o mau cheiro

permanece.

21
Entrevistas cedidas por pescadores de Resistência e Ilha das Caieiras em 18/01/2011.
135

Figura 44 - Manilhas de saída dos efluentes da Elevatória de Água Tratada da


Cesan, em Resistência (Vitória/ES)
Fonte: Fotos do Autor (2011)

Figura 45 – Efluentes oriundos da Elevatória lançados no manguezal


Fonte: Foto do Autor (2011)
136

O comentário sobre a alteração da condição sanitária do mangue

cristalizada em seu aspecto leitoso e mau cheiro vai ao encontro das

declarações de E. D. e do Sr M. A. F. de 56 anos de idade, morador do bairro

há dez anos, também pescador, que reside em frente à estação de tratamento.

Ele contou, em entrevista no dia 14/01/2011, que a água do mangue na maré

cheia, fica leitosa e na maré vazante pode-se ver o sedimento branco pela nata

lançada pela ETE. Apesar das informações oficiais, todos os entrevistados

foram enfáticos ao declararem que, na verdade, apenas um cano de coleta de

esgoto passa pelo bairro e não uma „rede de esgoto‟; logo, não é possível que

todos os moradores se conectem a ele, por isto a maioria lança seus esgotos

diretamente no mangue ou na galeria pluvial que deságua entre os bairros da

Ilha das Caieiras e Nova Palestina (Figura 46). Esta ação permite sugerir que

estudos com objetivos de compreender as interelações fisico-químicas entre os

elementos lançados no manguezal e seus impactos devam ser realizados para

uma melhor compreensão dos processos que estão ocorrendo nesta área e

possibilitem apontar medidas a serem tomadas.

A. lembra que „pisar‟ na água despejada no mangue por estas fontes,

causa coceira imediata (certamente micose), porém a cobrança pelo

fornecimento de água tratada chega normalmente, e a população por

desconfiança da qualidade da água fornecida, só consome água mineral

comprada.

Ainda de acordo com A. S., que já trabalhou na Empresa de saneamento

Ambiental “Corpus” foram elaborados documentos destinados a empresa e à

Cesan pelos pescadores, solicitando medidas de controle e reparação das

águas lançadas no manguezal. Porém, esta solicitação não foi atendida.


137

Segundo A. a parte do bairro urbanizada referindo-se sobre a parcela com

pavimentação está totalmente poluído (Figura 46), embora a empresa de

saneamento alegue que o bairro tem todo seu esgoto tratado.


138

Figura 46 - Drenagem do esgoto dos bairros Ilha das Caieiras, Nova Palestina e adjacentes e seu lançamento no mangue.
Fontes: Fotos do Autor (2011)
Imagem adaptada do Google Earth Pro (2011)
139

Quanto à presença e ao papel do poder público no contexto do uso dos

recursos do manguezal e mesmo das ações nos bairros, todos os entrevistados

demonstraram a mesma percepção, de que os órgãos atuam apenas de forma

punitiva, sem se preocuparem com o desenvolvimento de políticas

educacionais ou de orientação à população quanto às ações que afetam o

meio urbano e o manguezal. Estas ações por parte dos órgãos fiscalizadores

remetem a um período em que o poder público considerava os „usuários‟ dos

recursos do manguezal como potenciais depredadores do meio ambiente, o

que pode vir a provocar a invocação de direitos e valores distintos criando uma

situação de reinicio de um processo de acusações mútuas por direitos e

identidades.

Neste aspecto E. D. fez questão de frisar o fato de que na prefeitura

existem profissionais de diversas áreas. Ele sugeriu que o poder público

deveria desenvolver um programa que orientasse a população ou mesmo as

lideranças dos movimentos comunitários para que estas se tornassem

multiplicadoras, indicando “o que pode ser feito, o que é proibido e porquê, o

que deve ser conservado” e não apenas multassem quando percebem

comportamentos incorretos da população.

Segundo os entrevistados, o grande problema da pesca é o desrespeito

à legislação e apontaram como grandes „vilões‟ os baloeiros, barcos de arraste

que capturam camarões. Além disto, denunciaram que os órgãos fiscalizadores

fazem “vista grossa” à sua presença. Em depoimento A. S. lembrou que já viu,

numa madrugada 27 destes barcos e que são provenientes da Ilha das

Caieiras. Segundo A., outra ameaça é a presença dos desempregados,


140

extraindo os recursos sem respeitar qualquer norma estabelecida, ou a biologia

dos animais.

De acordo com estes pescadores o IBAMA está pretendendo proibir a

pesca na área pelo menos temporariamente para que os estoques possam ser

restabelecidos. Eles apontaram também a „produção‟ de pesqueiros em braços

do manguezal que tem grande profundidade (6 metros) onde só é possível a

pesca de linha devido a presença do material formador do pesqueiro. Não é

possível „produzir‟ pesqueiros, onde circulam os barcos de arraste, o que seria

uma forma de proteger a fauna e flora destes locais. W. lembrou que houve

época em que após uma „tarrafada‟ o volume de manjuba capturada lotava o

barco. Segundo ele “poderia ser capturado um cardume fechado, depois da

pesca de arraste com baloeiro não há mais peixes disponíveis”.

Por fim, todos os entrevistados também concordam que não há

possibilidade de crescimento do bairro já que não é mais possível ocupar áreas

preservadas do manguezal, todavia existe grande especulação imobiliária no

bairro. Em conversa com J. M., um aposentado de 65 anos de idade, morador

há vinte anos; ele apontou que um imóvel de 2 andares atualmente tem um

valor venal superior a R$ 200.000,00 e um terreno de 150 m 2 não sai por

menos de R$ 40.000,00, valores segundo ele, exorbitantes se comparados a

dez anos atrás. A. S. concorda com J. M. quando aponta que a dificuldade de

vida é grande, mas “se o cidadão consegue uma casa por aqui ele quer mais é

saber de vender bem rápido, só fica no bairro se amar o mangue”.

As razões alegadas pelos entrevistados na ocupação das áreas

confluem principalmente para a facilidade de conseguir moradia, em função do


141

baixo valor dos terrenos durante alguns anos atrás. Contudo, eles alegaram

que parte da população veio em busca de emprego e acabou por instalar-se na

área por falta de dinheiro.

6.3 A QUESTÃO SOCIAL E OS MANGUEZAIS

A ocupação da região noroeste da baía de Vitória causou alterações na

estrutura social dos grupos já residentes na área. A população que inicia a

nova ocupação é formada por um contingente de mão de obra vindo do interior

do Estado para trabalhar na instalação dos grandes projetos industriais e, após

a conclusão das obras, grande parte deste contingente estava desempregado e

sem moradia.

Os novos residentes nada sabiam sobre este ambiente que começaram

a ocupar e só o viam “como um pedaço de terra, lama ou lixo onde podiam

iniciar vida nova na capital” (NUNES, 1998). Entretanto, para os já residentes

este ambiente representava uma fonte de renda à mão, considerando que a

coleta do caranguejo era realizada a poucos metros “de casa” e sem

concorrência, já que poucas eram as famílias que sobreviviam da cata do

caranguejo.

Com o aterramento e expansão dos bairros, os caranguejeiros

precisaram deslocar-se cada vez mais para longe em busca de áreas

biologicamente ricas e agora sofriam concorrência dos novos moradores que

frequentemente estavam desempregados e viam na cata do caranguejo uma

fonte de renda alternativa (PEREIRA FILHO; ALVES, 1999).


142

Além disso, o conhecimento e uso de técnicas tradicionais de coleta

demanda tempo e, para estes novos e despreparados atores, tornou-se tarefa

difícil. Em situações como esta, em geral, acabam sendo empregados métodos

mais simples, porém, extremamente predatórios (DINIZ, 2006; NUNES, 1998).

No caso da coleta de caranguejos, a introdução do método da “redinha”22 em

São Pedro foi a mola propulsora para diminuição deste recurso e abandono da

atividade por parte, principalmente dos catadores mais antigos (NUNES, 1998).

Entre os impactos gerados pelo emprego deste método de captura,

constam: a não seleção das presas, capturando fêmeas ovadas e "caranguejos

de leite" (quando realizam a muda), pois, quando o catador usa o braço ou o

tampão, não retira da lama essas formas de caranguejo, enquanto a redinha

não seleciona as presas; e a poluição provocada pelas redinhas não

recolhidas, visto que os catadores chegam a espalhar por dia mais de 100 e,

nem sempre, têm tempo de voltar a todas elas, e os caranguejos presos na

armadilha acabam devorados pelos predadores naturais, lontras, guaxinins e

gaviões, e os emaranhados de fios ficam no ambiente por muito tempo

(AVESUI, 2008).

O movimento popular do bairro São Pedro surgiu juntamente com o

próprio bairro em 1977. Naquele período com apenas 5 barracos iniciou-se a

ocupação e logo foram necessários mutirões para organização estrutural e

social do bairro. Foi necessária a formação de comissões, visitações nas casas

22
Método da “redinha” – trata-se de um emaranhado de fios desfiados de saco de polipropileno
que é colocado na entrada da toca do caranguejo, de forma que o animal fique preso quando
subir em busca de oxigênio e alimento. Esse método, embora proibido na região Sudeste-sul
do país (Portaria nº 52, de 30 de setembro de 2003 do IBAMA), vem sendo utilizado com
bastante frequência em mangues pelo Brasil.
143

que se erguiam e realização de reuniões semanais para lutar contra a ameaça

de expulsão pelos fiscais da prefeitura e pela polícia (PINTO, 2007).

No entanto, a evolução dos grupos de pressão exigindo a urbanização

dos novos bairros não se registrou apenas entre a população carente. Segundo

Rabelo (2002), em Vitória, em função do tipo de industrialização ocorrida nos

anos 1960-70, o processo de formação dos líderes populares se deu “através

de critérios muito mais rigorosos que em outros espaços”. Vários dos novos

coordenadores dos movimentos pertenciam a um quadro técnico altamente

qualificado e "renovaram a vida da cidade com a sua chegada". Assim, para

esse autor, a história da capital capixaba registra um "constante exercício da

vida democrática”.

Ainda no ano de 1977 foram obtidos sucessos ao atendimento de

reinvidicações. Foram instalados postes, iluminação pública, caminhões

carregados com canos e madeira para construção de uma escola, além de

aterramento e inicio de arruamento. No ano seguinte foi iniciada a ocupação

em larga escala e uma assembléia formada pelo movimento popular decidiu,

após divisão da área, quais famílias iriam ocupá-la (Figuras 47 e 48).

Os moradores do bairro São Pedro eram muito unidos, o que facilitou a

coalizão e formação de representações que demandavam em favor das

necessidades locais. Quando surgiu o Programa de Erradicação da Sub-

Habitação (PROMORAR) os lideres, em conjunto com os participantes do

movimento, decidiram administrar o Programa (HERKENHOFF, 1994).


144

Figura 47 - Demarcação de lotes em área subjacente ao manguezal (1977)


Fonte: Acervo da Prefeitura Municipal de Vitória

Figura 48- Demarcação de lotes no manguezal (1986)


Fonte: Acervo da Prefeitura Municipal de Vitória
145

Durante a discussão que levou a esta tomada de decisão no contexto de

um seminário que durou cinco dias e onde reuniram-se participantes do

movimento e representantes de entidades governamentais, comenta

Herkenhoff (1994), foram negociadas e atendidas uma série de reinvidicações.

Dentre elas, continua o autor, a legalização de lotes, a construção dos

banheiros das casas, a construção de uma escola maior do que a prevista

originalmente, a construção da sede do movimento comunitário, a implantação

de destacamento militar no local e a garantia de que 75% da mão-de-obra

utilizada nas obras seria local.

Até 1983, São Pedro possuía vinte e duas comissões formadas e o

movimento comunitário possuía 1.000 sócios, um bairro com uma associação

de Catadores de Lixo em vias de legalização e o primeiro setor já bastante

urbanizado (PINTO, 2007). Contudo, naquele ano o poder público organizou

uma estratégia para desarticular as lideranças, extinguir a cooperativa dos

catadores de lixo e propôs uma escola alternativa administrada pela

comunidade.

A administração pública do período entre 1986 e 1988 percebendo o

crescimento das entidades de classe, tais como o movimento de bairro de São

Pedro e tantos outros, apoiados pelas Comunidades Eclesiais de Base e pelo

Partido dos Trabalhadores que atuavam com objetivo da formação política

induzindo práticas anticlientelistas e orientando a construção de uma unidade e

memória local que estabeleceriam a identidade dos movimentos, também

buscou desestabilizar estes movimentos induzindo a criação de associações de

bairros sob sua influência (ZORZAL E SILVA et al., 2004); na tentativa de

influenciar as entidades pré-existentes com verbas, ofertas de obras e cargos


146

municipais às lideranças (RÉGIS, 1995; COSTA, 1997). Neste período, a

cidade de Vitória já possuía uma representação popular centralizadora das

ações dos movimentos de bairro, o Conselho Popular de Vitória (CPV).

Em resposta a estas atitudes denominadas „estratégias de subordinação

e dependência‟ o CPV orientou as lideranças a conduzirem suas ações através

de abaixo-assinados, ofícios e passeatas. Na análise de Pinto (2007) tratou-se,

portanto, de uma luta pelo espaço, e o perigo do denominado

„desenraizamento cultural‟ existiu, mas justamente pelas intervenções

baseadas unicamente em critérios técnicos e racionais, que desqualificam as

identidades e buscam reorganizar pertencimentos culturais.

Exemplo deste processo ocorreu com a implementação da EEMIL, em

1987, a partir do que a Secretaria de Meio Ambiente da Prefeitura Municipal de

Vitória assumiu a função de gestora da porção do manguezal denominada

Lameirão para assegurar a preservação integral e permanente deste

ecossistema, atribuição dividida, com outros órgãos ambientais, como o IBAMA

e a Policia Ambiental (P.M.V., 1997).

Cabe lembrar que a efetivação da EEMIL se deu por uma imposição de

normas e regras criadas por técnicos do Estado, sem considerar o fato de que

em torno desse estuário haviam pessoas que, por gerações, vinham

legitimamente, fazendo uso dos recursos ali existentes. Eram os moradores da

Ilha das Caieiras (Figuras 49, 50 e 51), que no inicio da década de 1980

sofreram com a ocupação do manguezal em São Pedro, implicando no

aterramento de grandes áreas no entorno da Ilha. Com a criação da EEMIL,

eles foram enquadrados por uma nova legislação, que os via como invasores e
147

potenciais depredadores da natureza, tendo que responder aos órgãos

ambientais fiscalizadores, especialmente a Prefeitura Municipal.

Figura 49 - Ilha das Caieiras em 1970 (área elevada à esquerda)


Fonte: Acervo do Instituto Jones dos Santos Neves

Figura 50 - Ilha das Caieiras em 1980 (dimensão aproximada da área atual,


delimitada em preto)
Fonte: Acervo do Instituto Jones dos Santos Neves
148

Figura 51 - Ilha das Caieiras em 2009 (delimitada em laranja)


Fonte: Imagem adaptada do Programa Google Earth Pro (2009)

Esta ação resultou na concessão aos catadores do uso do espaço do

mangue, ficando obrigados ao cumprimento de uma série de regras, normas no

uso dos recursos, outrora de livre acesso, mas sob a tutela do poder público

(NUNES; SAMAIN, 2004).

No caso do cenário existente durante a implementação da EEMIL, a

natureza foi apropriada de acordo com práticas baseadas numa racionalidade

técnica, especificamente moderna, que, nesta condição, desconsidera tudo que

precede a lei escrita. O direito não-escrito das populações ditas tradicionais,

apesar de estar presente em suas práticas sociais, muitas vezes não é

contemplado quando há a efetivação ou criação de uma política ambiental

(MAUSS, 1972).

Segundo Nunes e Samain (2004) a política pública formulada, a partir de

então consistiu na criação de projetos em que os catadores tornaram-se


149

beneficiários da distribuição de cestas básicas e de dois salários mínimos

pagos pelo Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador

(CODEFAT) a título de seguro-defeso, além dos dois salários que recebiam da

Delegacia Regional do Trabalho (DRT).

Em contrapartida, os catadores deveriam participar de reuniões com

vistas à elaboração de um cadastro, processo repetido anualmente para a

liberação do seguro e ficavam obrigados à participarem de palestras de

educação ambiental e da limpeza do mangue. Por outro lado, esses catadores

se comprometeram com as condições que lhes eram impostas e que geravam

desconforto, insegurança, desrespeito e „falta de consideração‟.

O resultado foi uma relação de dependência similar ao que viviam outros

grupos sociais no município, limitados por sua função econômico-social restrita

a área geográfica do manguezal, porém temporariamente impossibilitada de

ser executada em função de uma legislação imposta pelo poder público

estabelecendo no contexto social “espaços de dependência” (COX, 1998).

No estudo realizado por Diniz (2006) fica claro o conflito entre estes

grupos sociais e o poder público ao descrever a violência entre fiscais e

catadores no período de defeso, na forma de acusações mútuas. A autora

conclui no que diz respeito ao conflito em pauta que, enquanto a posição dos

órgãos fiscalizadores e executores é clara e aberta, a ação por parte do poder

público é ambígua, posicionando-se de maneira catalisadora. A prefeitura

estabelece uma relação de tutela onde busca atenuar os conflitos, instaurando

políticas públicas compensatórias, de promessas, em que os catadores


150

aparecem como beneficiários de suas ações; e paralelamente age de modo

clientelista com os catadores, criando uma situação de dependência do grupo.

Ao final da década de 1980 as entidades de bairro de Vitória, em sua

maioria, caracterizavam-se por movimentos populares desarticulados,

dependentes em grande parte do apoio e das ações do poder público e das

lideranças comunitárias (CARLOS, 2006). Este cenário se modifica a partir da

gestão administrativa de 1989, do Partido dos Trabalhadores (PT), quando o

CPV, composto em sua maioria por petistas, aproxima-se do poder público e

obtêm sucesso na negociação de suas demandas.

7. AS GRANDES CONTRADIÇÕES ENTRE A URBANIZAÇÃO E A CONSERVAÇÃO


DO MANGUEZAL NA GRANDE SÃO PEDRO

Ao longo do período analisado, diversas normas legais e processos

sócio-políticos ocorreram como consequencia das ações de diversas

instituições governamentais e atores sociais. Entretanto, foram produzidas

inúmeras contradições e conflitos sócio-espaciais. Através do Quadro 1

procuramos proporcionar uma visão mais ampla de tudo que ocorreu e

contribuiu, direta e indiretamente, para conservação e/ou degradação das

áreas de manguezal na Grande Vitória/ES a partir da década de 1950.


151

Quadro 1 – Síntese das contradições entre conservação e ocupação/degradação dos manguezais na Grande Vitória/ES
(instrumentos políticos e processos).
Período Conservação do manguezal Ocupação/degradação do manguezal

Leis Municipais: 180/1950, 406, 464 e 466/1955, 940/1960 – Concedendo


isenção fiscal para empresas já existentes e para as que desejassem se
1940-60
instalar no município desde que comprometendo-se em ampliar em
50%/ano sua capacidade produtiva.

Lei (F) 4.771/65 – definiu as áreas de manguezais como APPs instituindo o Novo Lei (M) 1.397/65 – abertura da concorrência e isenção às propostas de
Código Florestal, descrevendo a importância das formas vegetacionais e definindo industrialização do lixo municipal coletado.
direitos de propriedade e limitações dos habitantes neste âmbito.
1960/69 Lei (M) 4.444/66 – regulamentou a venda e o aforamento de terrenos
Lei (F) 5.357/67 – estabeleceu penalidades para embarcações e terminais marítimos pertencentes ao patrimônio municipal.
ou fluviais que lançassem detritos ou óleo em águas brasileiras, e deu outras
Intensificação dos movimentos migratórios para a capital
providências

Lei (E) 2.508/70 – criou junto ao Conselho de Desenvolvimento


Econômico do Estado (CODEC), um fundo especial denominado Fundo
para o Desenvolvimento das Atividades Portuárias (FUNDAP), cujos
recursos serão destinados a promover o incremento das exportações e
importações através do Porto de Vitória.
Lei (E) 2.960/74 – autorizou a Superintendência dos Projetos de
Polarização Industrial - SUPPIN, a contrair empréstimo com o Banco
1970/79 Nacional de Desenvolvimento Econômico - BNDE até o montante de Cr$
90.000.000.00 (noventa milhões de cruzeiros) para aplicação em
investimentos necessários à expansão do Centro Industrial de Grande
Vitória – CIVIT

Formação do depósito de lixo municipal (porção noroeste)

Início das ocupações em áreas de mangues e aproveitamento do lixo


pelos moradores

continua.....
152

Quadro 1 – Síntese das contradições entre conservação e ocupação/degradação dos manguezais na Grande Vitória/ES
(instrumentos políticos e processos). .....continuação
Período Conservação do manguezal Ocupação/degradação do manguezal
Lei (F) 6902/81 – dispõe sobre as Estações Ecológicas e Áreas de Proteção Ambiental. Lei 2.899/81 – autorizou o poder executivo a realizar operação de crédito
destinada às despesas de execução do programa de Lotes Urbanizados do
Lei (F) 6.938/81 – estabeleceu a Política Nacional de Meio Ambiente e criou, o
bairro São Pedro
SISNAMA, Sistema Nacional de Meio Ambiente, estabelecendo responsabilidades e
punições aos poluidores do meio ambiente. Lei 2.847/81 – dispõe sobre a coleta de lixo na cidade de Vitoria e deu
Resolução nº 4/85, do CONAMA (F) – considera os manguezais como Reserva outras providencias.
Ecológica de preservação permanente Leis (M) 3.333 e 3.336 de 1986 – autorizaram o poder executivo a abrir,
Lei (M) 3.267/85 – definiu as zonas balneáreas de lazer praiais urbanas do município por decreto, créditos adicionais especiais, para atender as obras
do aterro hidráulico, infra-estrutura em geral e complementares no bairro
Lei (M) 3.312/86 – alterou a redação da Lei 3.267/85 redefinindo as delimitações das São Pedro
Zonas Balneárias do município
Urbanização desigual
1980/89 Lei (M) 3.315/86 – criou a Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SEMMAM) com
atribuições de proteção, conservação, recuperação, controle e fiscalização dos Intensa verticalização no município e valorização da porção nordeste
recursos naturais de Vitória. Ocupação de espaços menos valorizados pelos imigrantes na porção
Lei (M) 3.502/87 – permitiu que a SEMMAM operacionalizasse suas funções previstas noroeste
na lei de sua criação
Decreto (M) 7.317/86 – incluiu a Secretaria Municipal de Meio Ambiente na
formação do Conselho Municipal do Plano Diretor Urbano
Lei (M) 3.326/86 – criou a Reserva Biológica Municipal da Ilha do Lameirão
Lei (M) 3.337/86 – transformou a Reserva Biológica Municipal da Ilha do Lameirão
em Estação Ecológica Municipal da Ilha do Lameirão
Lei (M) 3.338/86 – identificou e garantiu a preservação da forma atual e contornos
do município e suas ilhas, proibindo a alteração dos contornos por aterramento.
continua.....
153

Quadro 1 – Síntese das contradições entre conservação e ocupação/degradação dos manguezais na Grande Vitória/ES
(instrumentos políticos e processos). .....continuação
Período Conservação do manguezal Ocupação/degradação do manguezal

Nova Constituição Brasileira de 1988 – significou grande avanço na área ambiental, em


virtude do destaque que deu à proteção dos ecossistemas brasileiros, dedicando um
capitulo (capítulo VI) exclusivamente ao meio ambiente
Lei (F) 7661/88 (Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (PNGC)) – priorizou a
conservação e proteção, em caso de zoneamento, entre outros, aos manguezais,
prevendo, inclusive, sanções [...]
1980/89 Lei (E) Ordinária 4.126/88 – Dispõe sobre a Política estadual de proteção, conservação
e melhoria do meio ambiente. Cria a política estadual de proteção, conservação e
melhoria do meio ambiente implantada pelo Sistema Estadual do Meio Ambiente e
inclui na estrutura organizacional do Poder Executivo, a Secretaria de Estado para
Assuntos do Meio Ambiente – SEAMA
Lei (E) 4.119/88 – enquadrou os manguezais como áreas de preservação permanente.
Decreto (M) 8.060/89 – “proibe a pesca com uso de rede de arrasto em barcos a motor
ou de modo manual” nos canais da Baía de Vitória e baía de Camburi.
Lei Orgânica do Município de Vitória/1990 – veio assegurar o bem-estar de todo
cidadão mediante a participação do povo no processo político, econômico e social do
Município e determina, no contexto das Diretrizes da Política Urbana, a elaboração de
projetos sobre o macrozoneamento, o parcelamento do solo, seu uso e sua ocupação,
as construções e edificações, a proteção ao meio ambiente, o licenciamento, a Investimentos públicos nos bairros da Grande São Pedro
fiscalização e os parâmetros urbanísticos básicos [...] e dedica um capítulo (II) aponta
Programa PROMORAR
os direitos ambientais dos citadinos [...] e o dever do Poder Público Municipal, de
defendê-lo e preservá-lo em benefício das gerações atuais e futuras.
1990/2000
Resolução (M) nº 02 de 05/06/1991– CONDEMA estabelece critérios e padrões para o
controle da poluição dos recursos hídricos no município de Vitória.

Plano Diretor Urbano (M) Lei 4.167/94 – visa realizar o pleno desenvolvimento das
funções sociais da cidade e da propriedade e o uso socialmente justo e ecologicamente
equilibrado de seu território [...] garantindo a participação popular no processo de
planejamento

continua....
154

Quadro 1 – Síntese das contradições entre conservação e ocupação/degradação dos manguezais na Grande Vitória/ES
(instrumentos políticos e processos). .....continuação
Período Conservação do manguezal Ocupação/degradação do manguezal
Resolução (F) CONAMA nº 29/94 – definiu a vegetação primária e secundária nos
estágios inicial, médio e avançado de regeneração da Mata Atlântica. Estabeleceu o
corte, a exploração e a supressão da vegetação secundária no estágio inicial de
regeneração da Mata Atlântica no Estado do Espírito Santo

Lei (E) 4.886/1994 – criou o Instituto Estadual de Meio Ambiente (IEMA) com
competência sobre a execução da política estadual do meio ambiente através de
estudos, controle, fiscalização, licenciamento e monitoramento dos recursos hídricos,
atmosféricos, minerais e naturais, e a condução das atividades relativas ao
zoneamento e educação ambiental.

Código Municipal de Meio Ambiente, instituído pela Lei nº 4.438/97 – regulamentou o


Licenciamento Ambiental, a Avaliação de Impactos Ambientais e o Cadastro Ambiental.
1990/2000
Decreto nº 10.179/98 – criou o Parque Municipal da Baía Noroeste de Vitória, com
área de 638.858.90 m² e perímetro de 9.727.91m, em área de propriedade do
Município e da União; inserido nos Bairros Resistência, Nova Palestina e Redenção,
Município de Vitória, delimitado pela poligonal [...]

Portaria (F) nº 70/2000 do IBAMA – regulamenta o transporte e a comercialização do


caranguejo e do goiamum, mas como não atendia o período de reprodução, que
ocorre a partir de janeiro até abril, foi substituída pela Portaria nº 52/2003,
estendendo o período do defeso para os dias da ‘andada’
Plano Estratégico da Cidade: Vitória do Futuro 1996-2010 desdobramento em sub-
projetos, tais como o ‘Projeto Terra’ (Programa Integrado de Desenvolvimento Urbano
e Preservação Ambiental nas Áreas Ocupadas por População de Baixa Renda), o
‘Projeto Rota Manguezal’, o ‘Projeto Caranguejo’ e o ‘Projeto Mangue Vivo’

Legenda: F = Federal, E = Estadual, M = Municipal


155

Percebe-se que, desde a década de 1950, houve um intenso estímulo à

industrialização no município, fato consolidado na década de 1970 pelas ações

políticas estatais que contribuíram com a fixação das indústrias na região.

Neste recorte temporal a preservação do ambiente era garantida apenas de

forma indireta e incipiente por instrumentos legais federais. A partir da segunda

metade da década de 1980, estendendo-se até a década de 2000, a

promulgação de leis de proteção ambiental foi massificada pelo município,

embora o poder público estimulasse, paralelamente, a ocupação e uso do solo

em áreas consideradas protegidas.

Também, neste período, vários projetos de urbanização foram

implantados gerando uma gama considerável de conflitos entre os diversos

grupos atuantes na região noroeste e o poder público que lhe impunha normas

reguladoras de suas atividades. Muitos dos instrumentos políticos instituídos

não foram aplicados na prática, embora os processos sócio-políticos tenham

acontecido, ocasionando uma série de contradições sócio-espaciais e

contribuição para a degradação e supressão do mangue.


156

8. CONCLUSÕES

Embora os manguezais da região noroeste do município apresentem-se

ainda, em alguns setores, vigorosos e em bom estado de conservação,

constituindo a área mais representativa da Baía, a região como um todo

encontra-se severamente antropizada e recebendo contínuamente descargas

de materiais poluentes em suas águas. Uma situação que tende a manter-se

inalterada visto que a estrutura de saneamento assentada é sub-dimensionada

para a demanda populacional existente.

A área de manguezal deste setor, inicialmente utilizada como único local

de destinação final do lixo domiciliar da cidade continuou sofrendo descaso em

relação à sua importância ambiental por parte do poder público até que o

problema se tornasse de saúde pública e a construção da usina de

beneficiamento de lixo se tornasse prioridade. O uso da área como depósito de

lixo não foi, inicialmente uma barreira à ocupação já que, a população instalada

fazia do lixo uma fonte de renda e era favorável à continuidade do lançamento

dos residuos do municipio na área.

Este cenário só foi alterado recentemente com a substituição da Usina

pela Unidade de Transbordo, porém esta mudança funcional trouxe o

desemprego para a região e foi ineficiente no que tange a preservação do

manguezal já que, de acordo com os depoimentos colhidos, não foram

tomadas medidas eficientes para a proteção do manguezal no contexto

operacional da Unidade de Tratamento.

Como um grande contingente populacional tinha como fonte de renda o

trabalho na Usina de Lixo, provavelmente pessoas que antes atuavam como


157

catadores de lixo, o fechamento da Usina de Lixo teve como conseqüência

lógica previsível, o aumento do desemprego na região. A desativação de uma

atividade tão importante para a população local deveria ter sido acompanhada

de propostas de ações mitigadoras, que viabilizassem a oferta de emprego e

garantia de renda à parcela de população que sobrevivia desta atividade.

Neste contexto, os grupos que sobrevivem diretamente dos recursos

provenientes do mangue também sofrem com a contaminação ambiental e

consequente diminuição de tais recursos. Neste caso, existem alguns grupos

organizados em associações e cooperativas que conseguem sobreviver graças

a uma estrutura já estabelecida como é o caso das desfiadeiras de siri.

Entretanto, os depoimentos de alguns pescadores assinalaram a falta de

conhecimento acerca da existência de projetos de construção de um

entreposto para o beneficiamento do pescado que, por razões não

esclarecidas, ainda não foi implementado.

A ocupação humana direta no manguezal é uma ação efetiva, mas não a

única. Os processos de desmatamento e erosão, causados por

empreendimentos imobiliários nos municípios circunvizinhos e o lançamento de

efluentes industriais e agrícolas de áreas subjacentes são também

responsáveis por severos impactos na área. Apesar da urbanização da Grande

São Pedro ter causado intensas alterações no manguezal da porção noroeste

da Baía de Vitória, essas alterações intensificaram-se em função da

desconsideração deste ecossistema quando da implementação de políticas

públicas durante o processo de urbanização.


158

A ocupação do manguezal ocorreu em resposta a ações populares de

demanda por moradias em um processo sem apoio do poder público que

omitiu-se de propor alternativas à ocupação da área. Este cenário levou ao

surgimento de diversas organizações de classe durante o processo de

ocupação e urbanização para atender as necessidades prementes da

população em contextos diversos e estas funcionaram como catalizadoras do

processo como um todo.

Além disso, o processo de ocupação da porção noroeste da baía

ocorreu em meio a disputas e conflitos envolvendo o poder público e os grupos

que têm sua história de vida vinculada a este espaço. Tais conflitos sociais

foram consequencias das ações arbitrárias por parte do poder púbico que, de

forma geral, buscou implementar projetos de urbanização mas que

fracassaram devido, muitas vezes, à ingerência ou à arbitrariedade das ações.

A elaboração de um tecido urbano adequado é uma tarefa

extremamente complexa e não pode ser executada a partir de uma visão de

„gabinete‟. O ordenamento tem que emergir do processo, com a co-participação

comunitária ao contrário do ocorrido no início do movimento de ocupação na

região, período em que as ações eram tomadas por imposição de uma

regulação arbitrária. Para que a ocupação tenha sucesso de forma „sustentada‟

a intervenção do tipo de-cima-para-baixo tem que ser orientada para facilitar a

colaboração, permitindo que a comunidade exerça sua territorialidade de uma

maneira positiva.

As ações do poder público geraram também conflitos internos nos

grupos já estabelecidos ao estabelecer normas para a extração e


159

comercialização dos recursos do mangue como produtos, a exemplo dos

catadores de caranguejo e desfiadeiras de siri que sofreram desagregação em

seus grupos como resultado de uma imposição do poder público baseada

únicamente na preservação de espécies naturais, desconsiderando questões

mais amplas, como o desemprego e a falta de moradia.

Dentre os diversos projetos de urbanização implantados o mais

conhecido e de sucesso foi o Projeto São Pedro, que só tornou-se viável

graças à continuidade de sua implementação ao longo de duas administrações

consecutivas que priorizaram políticas sociais e de direitos de cidadania

articulando políticas públicas. Neste período foram observadas mudanças na

aplicação das políticas públicas que, nos primeiros anos de ocupação,

respondiam de forma clientelista e pontual e passaram a atuar na década de

1990, de forma integrada e co-participativa, em consonância com as demandas

da população, demonstrando uma evolução das práticas de políticas públicas

no município.

Entretanto, o Projeto São Pedro também apresentou deficiências, ao não

priorizar a regularização fundiária, vulnerabilizando a população local aos

processos especulativos, até hoje presentes.

Quanto à proteção das áreas naturais do município, diversos

intrumentos legais foram instituídos ao longo da ocupação da Grande São

Pedro visando a preservação do ambiente natural, embora o poder público

tenha eventualmente estimulado, ao mesmo tempo que criou instrumentos

protetivos, o aterramento de áreas de manguezal em nome da urbanização e

do bem-estar público. Contudo, as Unidades de Conservação existentes na


160

área do manguezal da porção noroeste da Baía de Vitória não possuem ainda

qualquer instrumento implementado que estabeleça seu zoneamento e normas

de uso cristalizando o controle público sobre este espaço físico.

Este mosaico de informações permite concluir que o poder público

sempre tentou organizar a ocupação já em curso, após passar por mudanças,

as ações públicas culminaram em políticas co-participativas, em conjunto com

as lideranças locais, que obtiveram sucesso na manutenção do bosque

remanescente. Contudo, a presença do poder público também estimulou, ao

menos temporariamente, o avanço da ocupação. Desta forma, o poder público

foi, ao menos em parte, responsável pela supressão do bosque logo no início

da ocupação.

Ficou claro ao longo da história de ocupação de São Pedro que os

governos criaram diversas entidades voltadas às práticas assistencialistas,

patrocinando candidaturas de lideranças e instrumentalizando-as para serem

porta-vozes de programas governamentais. As associações de moradores e

movimentos comunitários permaneceram atrelados ao Estado até a década de

1970, e apenas ao seu final surgiram movimentos novos independentes do

poder público, porém organizados e com eles articulados. A presença do poder

público gerou tanto lideranças com um perfil de subordinação às práticas

clientelistas quanto àquelas imbuídas de propósitos e atitudes democráticos.

Por fim, foram produzidos diversos movimentos populares pluralistas abertos à

manifestação de diferentes grupos identitários, concorrentes do mesmo espaço

e território que os órgãos públicos.


161

A ocupação da região, de acordo com os registros, iniciou-se no ápice

do processo de industrialização da cidade o que foi o grande atrativo tanto para

os moradores de áreas rurais que sofriam com a decadência do café, bem

como de imigrantes de outros estados. Ocorreram diversas contradições sócio-

espaciais durante a expansão socio-econômica do município de Vitória que

estimularam a ocupação da porção noroeste. Fica evidente que, de forma

geral, as ações do poder público, tais como a criação do Plano Diretor Urbano

de Vitória em 1984, visaram apoiar investimentos na urbanização ordenada da

face nordeste enquanto as necessidades da população e o cuidado com os

recursos da face noroeste eram, não só ignorados, como sobrexplorados.

A degradação das áreas naturais da região da Grande São Pedro,

cristalizada, em um primeiro momento, na supressão de áreas de manguezal

convertidas em malha urbana, teve como causa principal a ocupação

desordenada e ainda tem o uso inadequado dos recursos, representado,

principalmente, pelo lançamento de efluentes “in natura”, como fator mais

importante.

O poder público foi inicialmente um agente catalisador da supressão do

manguezal na região noroeste da Baía de Vitória, estimulando a ocupação,

porém de forma indireta com a implantação dos grandes projetos que atraíram

uma população imigrante para o município. No começo do processo de

ocupação suas ações de tentativa de ordenação desse processo foram falhas e

agravaram o problema. Mais tarde o poder público foi mais incisivo em suas

ações, porém sua presença acabou sendo um estímulo à ocupação. Logo, é

possível concluir que o poder público foi o principal responsável pela supressão

da vegetação de mangue anteriormente existente na área.


162

O poder público de Vitória voltou-se para a proteção das áreas naturais

do município, embora de forma incipiente, já que apesar de criar Unidades de

Conservação, estas não possuem elementos fundamentais para um

gerenciamento mais amplo dos recursos existentes, tais como Plano de Manejo

que delimitaria o uso de tais recursos, além de observar as demandas da

população local. A gestão destas áreas pauta-se na fiscalização e punição de

infratores que queixam-se da falta de informação, orientação, de propostas ou

projetos e ações que substituam a exploração dos recursos nos períodos de

proibição.

Por fim, o quadro já tradicional, de degradação e de descaso para

com os manguezais, além da manipulação de leis para atender a necessidade

de grupos específicos, não se restringe ao município de Vitória ou a qualquer

outro do país ou do mundo. Assim é possível concluir que o mesmo modelo

contraditório de expansão urbana, considerado como um dos processos

responsáveis pela degradação de espaços naturais, de fato ocorreu na região

Noroeste da Baía de Vitória/ES em relação aos manguezais.

Contudo, este é um panorama global que demonstra que, apesar das

iniciativas para a preservação deste fundamental ecossistema, é de extrema

importância a mobilização conjunta e participativa dos diversos setores da

sociedade, principalmente no que tange ao planejamento do crescimento das

cidades costeiras e à gestão de seus processos produtivos e ambientais.


163

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179

ANEXOS
180

ANEXO A - Espaços Protegidos no Município de Vitória/ES

Área
Nº Denominação / Enquadramento Instr. Legal de Criação
(ha)
1 Manguezal da Foz do Rio Bubu (PI) Lei Mun. nº 4438/97 11,58
2 Mang. Canal da Passagem (PI) Lei Mun. nº 4438/97 0,80
3 Manguezal da Ufes (PI) Lei Mun.nº 4438/97 94,10
4 Ilha Rasa (PI) Res. CMPDU nº 26/87 0,54
5 Ilha do Fato (PI) Lei Mun. nº 4167/94 1,40
6 Ilha do Pato (PI) Res. CMPDU nº 25/87 0,10
7 Ilha Maria Catoré (PI) Lei Mun. nº 4167/94 0,25
8 Ilha da Pólvora (PI) Res. CMPDU nº 13/87 1,41
9 Ilha do Campinho (PI) Lei Mun. nº 4438/97 26,64
10 Ilha do Bode (área acrescida de marinha) (PI) Lei Mun. nº 4167/94 1,43
11 Ilha da Baleia (PI) Res. CMPDU nº 15/87 13,44
12 Ilha da Fumaça (PI) Lei Mun. nº 4167/94 5,74
13 Ilha dos Práticos (PI) Lei Mun. nº 4167/94 3,86
14 Ilha das Tendas (PI) Lei Mun. nº 4167/94 0,02
15 Ilha Dr. Américo de Oliveira (PI) Res. CMPDU nº 12/87 6,42
16 Ilha da Baleia (PI) Res. CMPDU nº 15/87 0,01
17 Ilha dos índios (PI) Lei Mun. nº 4167/94 0,18
18 Ilha das Pombas ou do Araça (PI) Res. CMPDU nº 34/87 1,97
19 Ilha dos Itaitis (PI) Lei Mun. nº 4167/94 0,90
20 Ilha do Urubu (PI) Res. CMPDU nº 14/87 0,17
21 Manguezal de Estrelinha (PI) Lei Mun. nº 4438/97 10,79
22 Ilha das Cobras (PI) Res. CMPDU nº 15/87 5,38
23 Cortume Capixaba (PI) Decreto Mun. nº 9017/93 0,25
24 Ilha do Sururu (área acrescida de marinha) (PI) Lei Mun. nº 4167/94 0,91
25 Ilhas das Andorinhas (PI) Lei Mun. nº 4167/94 0,11
26 Ilha do Socó (PI) Res. CMPDU nº 27/87 0,48
27 Ilha do Igarapé (PI) Lei Mun. nº 4167/94 0,28
28 Ilha Galheta de Fora (PI) Lei Mun. nº 4167/94 1,78
29 Ilha do Crisógono (PI) Res. CMPDU nº 15/87 22,15
30 Ilha Galheta de Dentro (PI) Lei Mun. nº 4167/94 2,43
31 Área Verde Especial Morro do Suá (PI) Decreto Mun. nº10024/97 1,72
32 Área Verde Especial de Jucutuquara*** (PI) Decreto Mun nº 13380/07 7,01
33 Área Verde Especial de Santa Lúcia (PI) Decreto Mun. nº 13379/07 0,83
34 Área Verde Especial Morro do Romão* (PI) Decreto Mun. N 10024/97 4,26
35 Área Verde Especial Morro do Cruzamento* (PI) Decreto Mun. nº 10024/97 4,33
36 Área Verde Especial do Morro Bento Ferreira (PI) Decreto Mun. nº 10024/97 2,70
37 Parque da Fazendinha (PI) Decreto Mun. nº11896/04 2,29
38 Parque ítalo Batan Régis(Pedra da Cebola) (PI) Decreto Est. nº 4179/97 10,01
39 Parque Barão de Monjardim (PI) Decreto Mun. 13378/07 7,97
40 Parque Morro da Gamela (PI) Decreto Mun. nº 13376/07 9,68
Continua.......
181

.........continuação
Área
Nº Denominação / Enquadramento Instr. Legal de Criação
(ha)
41 Parque Municipal São Benedito (PI) Decreto Mun. nº 10025/97 9,58
42 Parque de Barreiros (PI) Decreto Mun. nº 10180/98 4,61
43 Parque Padre Afonso Pastore (Mata da Praia) (PI) Decreto Mun. nº 10027/97 4,49
44 Parque Horto de Maruípe (PI) Decreto Mun. nº 9758/95 6,40
45 Parque Municipal de Fradinhos* (PI) Decreto Munic. Nº 13688/08 1,72
46 Parque Tancredo de Almeida Neves (PI) Lei Mun. nº 6267/04 5,65
47 Parque Atlântico (PI) Decreto Mun nº 13377/07 13,19
48 Parque Moscoso (PI) Implantação 09/12 2,41
49 Parque Mangue Seco (PI) Decreto Munic. nº11881/04 2,01
50 Parque Municipal da Ilha do Papagaio (PI) Decreto Munic. Nº 13689/08 1,53
51 APA do Maciço Central (US) Decreto Mun. nº 8911/92 666,55
52 APA de Praia Mole** (US) Decreto Est. nº 99274/90 14,65
53 APA da Ilha do Frade (US) Lei Mun. nº 4167/94 35,32
54 Estação Ecológica Ilha do Lameirão (PI) Lei Mun. nº 3377/86 871,92
55 Parque Municipal Tabuazeiro* (PI) Decreto Mun. nº 9073/95 4,66
56 Parque Nat. Mun. Vale do Mulembá-Conquista* (PI) Decreto Mun. nº 11505/02 114,21
57 Parque Von Schilgen (PI) Decreto Mun. nº 12137/04 7,13
58 Parque Estadual Fonte Grande* (PI) Lei Est. nº 3875/86 217,18
59 Parque Pedra dos Olhos* (PI) Decreto Mun. nº11824/03 27,96
60 Parque Gruta da Onça* (PI) Lei Mun. nº 3564/88 6,67
61 Parque Dom Luis Gonzaga Fernande (Baía Noroeste) (PI) Decreto Mun. nº 10179/98 63,89
62 Reserva Ecológica Munic. Morro do Itapenambi (PI) Decreto Mun. nº 8906/92 13,27
63 Reserva Ecológica Munic. Mata Paludosa (PI) Decreto Mun. nº 10028/97 12,35
64 Reserva Ecológica Munic. Mata de Goiabeiras (PI) Decreto Mun. nº 10029/97 5,07
65 Reserva Ecológica Munic. São José* (PI) Decreto Mun. nº 10029/97 2,36
66 Reserva Ecológica Munic. Restinga de Camburi (PI) Lei Mun. nº 3566/89 12,98
67 Reserva Ecológica Munic. Pedra dos Olhos* (PI) Decreto Mun. nº 7767/88 0,66
68 Res. Eco. Munic. das Ilhas Oceânicas de Trindade e Dec. Munic. N° 8054/89 1178
Arquipélago de Martin Vaz (PI)

Obs: * Espaços Legalmente Protegidos situados dentro da APA do Maciço


Central
** Refere-se apenas a área/perímetro no município de Vitória.
*** Altera o Decreto 10024/97

Enquadramento: Proteção Integral (PI); Uso Sustentável (US)


182

ANEXO B - Lei nº 3338/86


183

ANEXO C – Lei 3.333/86


184

ANEXO D – Lei 3.336/86


185

ANEXO E – Lei 7.317/86


186

ANEXO F – Lei nº 3.267/86


187
188

ANEXO G – Lei nº 3326/86


189
190

ANEXO H – 3377/86
191

ANEXO I – Lei nº 4.119/88

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