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O cálculo e conceitos relacionados

11.1 Introdução
Já vimos que o século XVII foi extremamente produtivo para o desenvolvimento da
matemática, graças, em grande parte, às novas e vastas áreas de pesquisa que nela se
abriram. Indubitavelmente, porém, a realização matemática mais notável do período
foi a invenção do cálculo, perto do final do século, por Isaac Newton e Gottfried
W ilhelm Leibniz. Com essa invenção a matemática criativa passou a um plano su­
perior e a história da matemática elementar essencialmente terminou. Este capítulo
se dedica a relatar brevemente as origens e desenvolvimentos dos conceitos principais
do cálculo. Esses conceitos têm tanto alcance e tantas implicações no mundo moder­
no que talvez seja correto dizer que sem algum conhecimento deles dificilmente hoje
uma pessoa poderia considerar-se culta.
É curioso que o desenvolvimento histórico do cálculo seguiu a ordem contrária à
daquela dos textos e cursos básicos atuais sobre o assunto: ou seja, primeiro surgiu o
cálculo integral e só muito tempo depois o cálculo diferencial. A ideia de integração
teve origem em processos somatórios ligados ao cálculo de certas áreas e certos volumes
e comprimentos. A diferenciação, criada bem mais tarde, resultou de problemas sobre
tangentes a curvas e de questões sobre máximos e mínimos. Mais tarde ainda, verifi­
cou-se que a integração e a diferenciação estão relacionadas entre si, sendo cada uma
delas operação inversa da outra.
Embora a maior parte de nossa história se situe no século XVII devemos retornar,
de início, à Grécia do século V a.C.

11.2 Paradoxos de Zenão


É válido admitir-se que uma grandeza pode ser subdividida indefinidamente ou que
é formada de um número muito grande de partes atômicas indivisíveis? A primeira
suposição parece mais razoável, mas a segunda é tão útil em termos de descobertas que
isso faz com que perca sua aparente absurdidade. H á evidências de que na Grécia
antiga se desenvolveram escolas de raciocínio matemático que abraçaram uma ou
outra dessas premissas.
418 HOWARD EVES

O filósofo Zenão de Eleia (c. 450 a.C.) chamou a atenção, de maneira candente,
para as dificuldades lógicas ocultas em cada uma dessas suposições, através de alguns
paradoxos que engendrou com essa finalidade. Esses paradoxos, que tiveram influên­
cia profunda na matemática, garantem que, admitindo-se qualquer das suposições
consideradas, o movimento é impossível. Para ilustrar sua natureza, vejamos dois
desses paradoxos.
A Dicotomia: Se um segmento de reta pode ser subdividido indefinidamente,
então o movimento é impossível pois, para percorrê-lo, é preciso antes alcançar seu
ponto médio, antes ainda alcançar o ponto que estabelece a marca de um quarto do
segmento, e assim por diante, adinfinitum. Segue-se, então, que o movimento jamais
começará.
A Flecha: Se o tempo é formado de instantes atômicos indivisíveis, então uma flecha
em movimento está sempre parada, posto que em cada instante ela está numa posição
fixa. Sendo isso verdadeiro em cada instante, segue-se que a flecha jamais se move.
Já se deram muitas explicações para os paradoxos de Zenão. Por outro lado, não é
difícil mostrar que eles desafiam as seguintes crenças da intuição comum: de que a soma
de um número infinito de quantidades positivas é infinitamente grande, mesmo que
cada uma delas seja extremamente pequena 5 >,='
e de que a soma de um número
finito ou infinito de quantidade de dimensão
v '=
zero é zero (n x 0 = 0 e ^ x 0 = 0). Qual­
1

quer que tenha sido a motivação dos paradoxos, o fato é que eles excluíram os infinité­
simos da geometria demonstrativa grega1.

11.3 O método de exaustão de Eudoxo


Os primeiros problemas da história do cálculo diziam respeito ao cálculo de áreas,
volumes e comprimentos de arcos. Em sua abordagem encontram-se indícios das duas
suposições consideradas na Seção 11-2 a respeito de divisão de grandezas.
Uma das contribuições importantes mais antigas ao problema da quadratura do
círculo foi dada por Antífon, o Sofista (c. 430 a.C.), um contemporâneo de Sócrates.
Consta que Antífon teria antecipado a ideia de que, por sucessivas duplicações do
número de lados de um polígono regular inscrito num círculo, a diferença entre o cír­
culo e o polígono ao fim exaurir-se-ia. E como se pode construir um quadrado de área
igual à de qualquer polígono, seria então possível construir um quadrado de área igual
à do círculo. A crítica que imediatamente se levantou contra esse argumento susten­
tava-se no princípio de que uma grandeza pode ser subdividida indefinidamente e que,
assim, o processo de Antífon jamais esgotaria a área do círculo. Não obstante, a cora­
josa abordagem de Antífon continha o germe do famoso método de exaustão grego.
Para um tratamento histórico informativo dos paradoxos de Zenão, ver Florian Cajori, “ H istory o f Zeno’s arguments on
motion”, TheAmerican Mathematical Monthly,, no 22, 19 15 , pp. 1-6, 39-47, 77-82, 10 9 -15 , 145-9, 179-86, 2 15-2 0 , 2 5 3­
8 , 292-7.

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