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Texto de Apoio – Geometria Euclidiana

GEOMETRIA EUCLIDIANA

0. Introdução

Há cerca de 2000 anos a.C. já havia no mundo humano conhecimentos de Geometria, não como
ciência, mas como teorias matemáticas em aplicação, tais como, por exemplo: por dois pontos
passa uma recta; teorema de Pitágoras; o valor do pi   3,  3 (Bíblia: 1o Reis 7,23); etc.
Os conhecimentos da Geometria foram adquiridos na prática através da reflexão objectiva, pela
indução e ainda na dedução, ao longo dos tempos.
Os primeiros passos em que se desenvolveram conhecimentos geométricos deram-se em regiões
como Egipto, Babilónia, Grécia. Mais tarde surgiram escolas onde se ensinavam conhecimentos
vários, de entre eles a Geometria, como são os casos, por exemplo, da Escola Pitagórica (Escola de
Pitágoras, este que ficou conhecido como o dono do teorema com o seu nome, mas que na
realidade era já conhecido muito antes do seu tempo) e da Escola Platónica (escola de Platão) onde
frequentou Euclides. Foi Euclides que por volta do ano 300 a.C. veio sistematizar todos os
conhecimentos de Geometria até então existentes, contidos na sua famosa obra “Os Elementos”
dividido em treze volumes contemplando a Aritmética, a Geometria e a Álgebra. É daí onde nasce a
Geometria como ciência.
Portanto, na Matemática, a Geometria Euclidiana é a geometria, em duas e três dimensões,
baseada nos postulados de Euclides de Alexandria. O texto de "Os elementos" foi a primeira
discussão sistemática sobre a geometria e o primeiro texto a falar sobre teoria dos números. Foi
também um dos livros mais influentes na história, tanto pelo seu método quanto pelo seu conteúdo
matemático. O método consiste em assumir um pequeno conjunto de axiomas intuitivos e, então,
provar várias outras proposições (teoremas) a partir desses axiomas.
Como já foi acima referenciado, muitos dos resultados de Euclides já haviam sido afirmados por
matemáticos gregos anteriores, porém ele foi o primeiro a demonstrar como essas proposições
poderiam ser reunidas juntas em um abrangente sistema dedutivo. Vale a pena mencionar alguns
sábios da antiguidade como Pitágoras, Thales, Platão e outros tantos, que desenvolveram
conhecimentos matemáticos que se encontram sistematizados na obra “Os Elementos” de Euclides.
Em seguida apresento um pequeno quadro da estrutura dos 13 volumes da obra de Euclides e a
relação dos “cientistas” que já tinham anteriormente desenvolvido conhecimentos contidos nesses
volumes:

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Volumes Matemáticos que já tinham


esses conhecimentos

I a IV, VII e IX Hipócrates

VIII Archites

V, VI e XII Endoxw

X e XIII Theatchan

O objecto de estudo da Geometria Euclidiana é o estudo das propriedades dos objectos


caracterizados pela forma, grandeza e posição relativa. E tem como elementos principais o ponto,
a recta e o plano.

1. Noções elementares

Noção de ponto
A noção de ponto pode ser-nos dada intuitivamente pelo mais pequeno grão de areia desprovido de
espessura, ou então pela marca deixada no papel pelo toque de um lápis bem afiado. Um ponto não
tem dimensão e é usualmente representado por dois pequenos traços concorrentes, perpendiculares,
e identificado com uma letra latina maiúscula.
Exemplo: O ponto A
A

Noção de recta
Imagina que o teu lápis se prolonga infinitamente e é desprovido de espessura. Esta imagem
conduz-nos à noção de recta. Outras situações do dia-a-dia podem também levar-nos à noção de
recta, como por exemplo, um fio "infinitamente" grande e bem esticado ou os cabos da
electricidade. Uma recta é constituída por uma infinidade de pontos. Uma recta tem dimensão um,
isto é, apenas possui dimensão linear, o comprimento. É representada por uma "linha" e
identificada por uma letra latina minúscula.
r
Exemplo: A recta r:

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Na Geometria Euclidiana, o Axioma (I1) no rol dos axiomas apresentadas no ponto 3 mais a
diante, diz-nos que "dois pontos definem uma recta". Este termo "definem" significa que
determinam unicamente. Neste caso dizer que "dois pontos definem uma recta" significa dizer que
dados dois pontos há uma e uma só recta que os contém.
Três pontos dizem-se colineares se e só se existir uma recta que passe pelos três pontos. Note-se
que neste contexto, dizer que "uma recta passa por um ponto" é o mesmo que dizer que esse ponto
pertence á recta. Um ponto diz-se exterior a uma recta se não pertencer à recta, isto é, se a recta
não passar por ele. Por qualquer ponto passam infinitas rectas.

Noção de plano
Imagina, o tampo de uma mesa sem espessura e prolongado até ao infinito. A sala onde a mesa se
encontra, ficou dividida em dois e se pensarmos que o dito "tampo" se prolonga infinitamente,
pode-se até dizer que todo o universo se dividiu em dois. Intuitivamente esta noção de "tampo
infinito", induz-nos à definição de plano. Mas existem outras situações do quotidiano que nos
tornam possível descrever um plano, tais como, o chão de uma sala, o tecto, ou a superfície de um
lago. Qualquer deles nos ajuda a visualizar um plano pois são superfícies planas que podemos
imaginar desprovidas de espessura e prolongadas infinitamente.
Um plano tem dimensão dois isto é, possui comprimento e largura. É representado por um
paralelogramo e usualmente identificado por uma letra minúscula do alfabeto grego.
Exemplo: O plano 

α
Plano α.

Relembrando que três pontos dizem-se colineares se, e só se, uma recta contém os três pontos,
estamos em condições de falar na forma como Euclides definiu um plano.

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Na Geometria Euclideana, o Axioma (I4) que apresento mais a diante diz-nos que" três pontos não
colineares definem um plano". Repara então, na figura a seguir, na representação de um plano β
definido pelos pontos A, B e C distintos e não colineares.
Exemplo: O plano  ou plano ABC

Relações primitivas
Entre as noções primitivas (ponto, recta e plano), há três relações primitivas:
 Estar entre, uma relação ternária entre pontos;
 Estar contido, três relações binárias, uma ligando pontos e rectas, uma envolvendo pontos e
planos e outra entre rectas e planos;
 Ser congruente, duas relações binárias, uma entre segmentos de recta e outra entre ângulos,
ambas denotadas pelo sinal ≅.
Conceitos como segmento de recta, ângulo, e triângulo, cada um pode ser definido em termos de
pontos e rectas, usando as relações de “estar entre” e “estar contido”.
Esta é a estrutura da Geometria, desde "Elementos" de Euclides, escrito no século III a.C., onde
ele tentou definir os conceitos fundamentais.
Actualmente, a Geometria aceita por normas:
 Enunciar, sem definição, os conceitos fundamentais.
 Admitir, sem demonstração, certas propriedades que relacionam estes conceitos,
enunciando os axiomas correspondentes.
 Deduzir logicamente as propriedades restantes.

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A Geometria Euclidiana faz um estudo das propriedades específicas, que são aquelas onde em
qualquer transformação euclidiana se mantêm invariantes. São elas o ângulo e a distância. São
transformações euclidianas a rotação, a translação, a simetria (transformações isométricas) e a
semelhança.
Existem dois métodos de aquisição de verdades sobre a Geometria, que são:
→ Indução: que parte do particular para o geral, e
→ Dedução: que parte do geral para o particular.
A Geometria Euclidiana baseia-se fundamentalmente no método dedutivo:

Verdades fundamentais Lógica PRODUTO


Dedução

2. Construção axiomática da Geometria Euclidiana


O que são os axiomas?
São afirmações tantas vezes provadas na prática, que é muito pouco provável que alguém delas
duvide. Elas deverão ser em menor número possível.
As exigências ou critérios para um modelo axiomático são:
1. Não contrariedade: não deve haver contrariedade dentro do mesmo grupo de axiomas.
2. Independência: cada axioma não é consequência de nenhum outro, ou seja, não depende de
nenhum outro axioma.
3. Plenitude: cada conjunto de axiomas está completo, é pleno, não precisa de introdução de
novos axiomas.
Axiomas da Geometria Euclidiana
O sistema axiomático da Geometria Euclidiana (apresentado pela primeira vez por Euclides,
cerca de 300 a.C.) foi, nos fins do século XIX, no ano de 1899, reformulado pelo matemático
alemão David Hilbert (1862-1943). Todos os axiomas desta Geometria dividem-se em cinco
grupos, a saber:
i. Axiomas de incidência (8) iv. Axiomas de continuidade (2)
ii. Axiomas de ordem (4) v. Axioma de paralelismo (1)
iii. Axiomas de congruência (5)

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Axiomas de incidência
I1. Quaisquer que sejam os pontos A, B, existe uma recta r que passa par cada um dos pontos A, B.
I2. Quaisquer que sejam dois pontos distintos A, B, existe apenas uma recta que passa por cada um
dos pontos A, B.
I3. Em cada a recta há pelo menos dois pontos. Existem pelo menos três pontos que não pertencem
a uma mesma recta.
I4. Quaisquer que sejam três pontos A, B, C que não pertencem a uma mesma recta, existe um
plano que passa por cada um dos três pontos A, B, C. Em cada plano há pelo menos um ponto.
I5. Sejam quais forem três pontos A, B, C que não pertençam a uma mesma recta, existe
apenas um plano que passa a por cada um dos três pontos A, B, C.
I6. Se dois pontos diferentes A, B, da recta r pertencem ao plano α, cada ponto da recta r pertence
ao plano α.
I7. Se dois planos α e β têm um ponto comum A, têm ao menos outro ponto comum B.
I8. Existem pelo menos quatro pontos que não pertencem a um mesmo plano.

Axiomas de ordem
O1. Se o ponto B se encontra entre os pontos A e C, então A, B e C são pontos diferentes de
uma mesma recta, e B se encontra, assim mesmo entre C e A.
O2. Quaisquer que sejam os pontos A e C, existe pelo menos um ponto B sobre a recta AC tal
que C está entre A e B.
O3. Entre três pontos quaisquer de uma resta, apenas um deles pode encontrar-se entre outros
dois.
O4. (Axioma de Pasch). Sejam A, B, C três pontos que não pertencem a uma mesma recta, e
r, uma recta no plano ABC, que não contém nenhum dos pontos A,B,C. Então, se a recta r
passa por algum dos pontos do segmento AB, também passará ou por algum ponto do
segmento AC, ou por algum ponto do segmento BC.

Axiomas de congruência
C1. Se A, B são pontos sobre a recta r, e Ai é um ponto da mesma recta, ou de outra recta ri,
sempre se pode encontrar, a um lado pré-fechado de Ai sobre a recta ri, um ponto B, e somente
um, tal que o segmento AB é congruente a AiBi.
C2. Se os segmentos AiBi e AiiBii são congruentes ao mesmo segmento AB, então A iBi é

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congruente ao segmento AiiBii.


C3. Sejam AB e BC dois segmentos sobre a recta r, sem pontos interiores comuns e sejam AiBi
e BiCi dois segmentos sobre a mesma recta, ou sobre outra ri, que não possuem pontos
interiores comuns. Se AB = AiBi e BC = BiCi, então AC = AiCi.
C4. Sejam dados ângulo (h, k) no plano α, e uma recta ri neste mesmo plano, ou em outro, αi, e
suponhamos fechado um lado determinado do plano αi com respeito a recta ri. Seja hi uma semi-
recta da recta ai, com origem no ponto O. Então no plano αi existe uma semi-recta ki, e somente
uma, tal que o ângulo (h, k) é congruente com o ângulo (hi, ki) e todos os pontos interiores do
ângulo (hi, ki) se encontram no lado pré-fechado com respeito a recta ri.
Se (h, k)  (hi, ki), então (k, h)  (ki, hi).
C5. Sejam A,B,C três pontos não pertencentes a uma mesma recta e A i,Bi,Ci outros três,
também não pertencentes a uma mesma recta. Se AB = AiBi, AC = AiCi e BAC  BiAiCi,
então ABC  AiBiCi e ACB  AiCiBi.

Axiomas de continuidade
C1. (Axioma de Arquimedes) Sejam AB e CD segmentos arbitrários. Então sobre a recta AB
existe um numero finito de pontos A1 , A2 , A3 ,  An situados de maneira que A1 está entre A e

A2 , A2 está entre A1 e A3 , etc., tais que os segmentos AA1 , A1 A2 ,  An1 An , são congruentes ao

segmento CD e B está entre A e An .


C2. (Axioma de Cantor) Suponhamos que em uma recta arbitrária r se dá uma sucessão infinita de
segmentos A1 B1 , A2 B2 , …, dos quais cada um está no interior do precedente; suponhamos, ainda,
qualquer que seja um segmento pré-fechado existe um índice n para o qual An Bn é menor que este
segmento. Então existe sobre a recta r um ponto X que está no interior de todos os segmentos
A1 B1 , A2 B2 , etc.

Axioma de paralelismo
Seja r uma recta arbitrária e P, um ponto exterior à ela; então no plano determinado por P e r,
pode-se traçar uma recta que passa por P e não intersecta r.

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Os postulados de Euclides
Em matemática, linhas rectas ou planos permanecem sempre a uma distância fixa uns dos outros
independentemente do seu comprimento. Este é um princípio da Geometria Euclidiana. Algumas
geometrias não euclidianas, como a Geometria Elíptica e a Geometria Hiperbólica, no entanto,
rejeitam o axioma do paralelismo euclidiano.
O postulado é uma sentença que não é demonstrada, tornando-se por isso evidente ou consenso
inicial para a aceitação de uma determinada teoria.
Como se pode depreender, postulado não é necessariamente uma verdade muito clara. Trata-se de
uma expressão formal usada para deduzir algo, a fim de se obter um resultado mais elaborado. Daí
que se diz que o postulado é uma proposição que, apesar de não ser evidente, é considerada
verdadeira sem discussão.
Geralmente, o postulado é visto como axioma, pelo facto de ambos serem verdades aceites sem
prova. O que acontece é que tanto postulados como axiomas são usados como hipóteses iniciais
para a construção de uma ideia formal.

Os postulados de Euclides são:


1. Dados dois pontos distintos, há um único segmento de recta que os une.
2. Um segmento de recta pode ser prolongado indefinidamente para construir uma recta.
3. Dados um ponto qualquer e uma distância qualquer, pode-se construir uma circunferência de
centro naquele ponto e com raio igual à distância dada.
4. Todos os ângulos rectos são congruentes.
5. Se uma linha recta cortar duas outras linhas rectas de modo que a soma dos dois ângulos
interiores, de um mesmo lado, seja menor que dois ângulos rectos, então as duas outras
linhas rectas, quando suficientemente prolongadas, se encontram num ponto, no mesmo lado
da primeira linha recta em que se acham os dois ângulos.

O 5º postulado apresenta a noção de paralelismo de Euclides. "Há um ponto P e uma recta r não
incidentes tais que no plano que definem não há mais do que uma recta incidente com P e paralela
à recta r."
Foi na sequência deste último postulado que muitos matemáticos questionaram a axiomática de
Euclides, o que culminou com o surgimento de outras geometrias tidas como não euclidianas.

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3. Relações entre proposições

As proposições (ou teoremas) podem ser escritas na forma p  q, onde p e q são chamados de
hipótese e tese respectivamente.
Entre as proposições deduzidas (ou teoremas) podem ocorrer as seguintes relações:

a) Afirmação recíproca:
Uma afirmação diz-se recíproca da outra quando os seus antecedente e o consequente são,
respectivamente, o consequente e antecedente da outra.
Igualmente, um teorema se diz recíproco de outro quando a sua hipótese e tese são,
respectivamente, a tese e a hipótese do outro.

Exemplos:
Afirmação: Se dois lados de um triângulo são desiguais, então ao maior lado opõe-se o maior
ângulo
Afirmação recíproca: Se dois ângulos de um triângulo são desiguais, então ao maior ângulo opõe-
se o maior lado.
Observação: Nem todas as afirmações recíprocas são teoremas, isto é, nem todos os teoremas
recíprocos são verdadeiros.
Assim, por exemplo:
Afirmação: Todos os ângulos rectos são iguais.
Afirmação recíproca: Todos os ângulos iguais são rectos.

b) Afirmação contrária:
É a proposição obtida pela negação da hipótese e tese de uma afirmação.
Exemplos:
Afirmação: Todo ponto da bissectriz de um ângulo é equidistante dos lados.
Afirmação contrária: Todo ponto que não pertence à bissectriz de um ângulo não é equidistante dos
lados.
Observação: Uma afirmação contrária nem sempre é verdadeira, ou seja, nem sempre é um teorema.
Afirmação: Dois ângulos opostos pelo vértice são congruentes.
Afirmação contrária: Dois ângulos que não são opostos pelo vértice não são congruentes.

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4. Demonstração

O que é uma demonstração?


Podemos entender demosntração como um raciocínio (sucessão finita de argumentos restritos às
regras da lógica) cuja capacidade descritiva comprova a veracidade de uma teoria ou de uma
proposição.
A demonstração, no caso específico da Matemática, consiste num sistema de silogismos, por meio
dos quais a veracidade da afirmação é deduzida a partir dos axiomas e das verdades anteriormente
demonstradas.
O que é um silogismo?
O silogismo é uma reunião de três proposições: a maior, a menor e a conclusão.
Exemplos:
a) - Todos os homens são mortais.
- Eu sou homem.
- Logo, sou mortal.

b) A Terra é esférica. (Argumentação×fatos×dedução)


Verifica-se que, todos os corpos que, em diferentes posições, projectam sombra redonda, têm a forma
esférica. A Terra, durante os eclipses lunares, projecta sobre a lua sombra redonda.
Consequentemente, a Terra tem a forma de uma esfera.

Técnicas de demonstração
A demonstração de um teorema consiste em efectuar um conjunto de raciocínios dirigidos
exclusivamente para provar que é verdadeiro o facto afirmado pela proposição.
Para demonstrarmos proposições condicionais do tipo p  q podemos usar:

a) Forma Direta:
Admitimos como verdade (ou válida) a proposição p, chamada de hipótese, e através de definições,
propriedades, relações, etc, pré-estabelecidos, concluímos a validade da proposição q, chamada de
tese.

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b) Contra-positiva:
Neste caso, reescrevemos a proposição p  q na forma equivalente ~q  ~p e aplicamos a
forma direta na contra-positiva. Ou seja, partimos da negação da tese para concluirmos a
negação da hipótese.

c) Redução ao Absurdo (RAA):


A redução ao absurdo consiste em provar que a negação do condicional p  q é uma contradição.
Isto é, ~(p  q)  p  ~q  F. Ou seja, partimos da negação da tese e procuramos encontrar uma
contradição com a hipótese.
Observação: RAA é muito utilizado para provar unicidade.

Por que a demonstração?


Princípio da Razão Suficiente: Todas as afirmações deverão ser fundamentadas.
Através da experiência, observação, ou de raciocínios lógicos (silogismos).
Báskara no livro "Lilaváti" apresenta a demonstração de um teorema apenas com uma figura e a
palavra VÊ:

Para se compreender o que está "escrito", é necessário pensar, raciocinar, deduzir. Será que existem
afirmações suficientemente claras, que sejam evidentes?

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5. Noção de congruência
Definição: Duas figuras geométricas F1 e F2 são congruentes exactamente quando existe uma
isometria φ que transforma F1 em F2, isto é, F2 é imagem de F1. Denota-se: F1  F2.
Diz-se também que F2 é imagem de F1 → F2 = φF1
Numa linguagem mais simples, podemos dizer que duas figuras geométricas são congruentes
quando é possível fazê-las coincidir por sobreposição.
Das propriedades do grupo de isometrias segue-se que a congruência é uma relação de
equivalência.

Congruência de segmentos
Na Geometria, define-se o segmento de recta como parte dela, isto é, um conjunto limitado de
pontos da recta e o qual está delimitados por dois pontos designados extremos do segmento.
Exemplo: segmento AB
A
B

Basicamente, os segmentos de recta classificam-se em:


Segmentos consecutivos: aqueles que possuem um ponto extremo comum.
Exemplo: AB e BC são segmentos consecutivos
B C

Segmentos colineares: aqueles cujos pontos pertencem todos à mesma recta, ou seja, aos
segmentos contidos na mesma recta.
Exemplo: AB e CD são segmentos colineares

A B C D

Segmentos congruentes: aqueles que possuem a mesma medida.


Exemplo: AB  CD
B
A C D

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A relação de equivalência “congruência” subdivide o conjunto de todos os segmentos em classes


que se chamam comprimentos.
O comprimento de um segmento AB anotamos por AB ou por letras minúsculas latinas.
Definição: Dois segmentos AB e CD são congruentes quando existe uma isometria que transforma
AB em CD.
Exemplos:

a) Translação → congruência através duma translação τ do vector v :


v
B D AB  CD

CD =  v (AB)

A C

b) Rotação → congruência através da rotação ρ, a partir de um ângulo α e


 Um ponto fixo (A) do segmento

AB  CD

CD = ρ(AB)

α B CD = (A) (AB)
α D

A≡C
 Um ponto fixo (O) fora do segmento

AB  CD
α B D
C
CD = ( ,O ) (AB)
A

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c) Simetria → congruência através duma simetria


 Em relação a um eixo r (simetria axial)

B D AB  CD

CD =  r (AB)
A C

 Em relação a um centro P (simetria central)

B C
AB  CD
P
CD =  P (AB)
A D

Ponto médio de um segmento


No plano, um ponto M é ponto médio de um segmento AB quando M  r(AB) sendo r a recta
definida pelos pontos dados e é equidistante dos extremos A e B.
Portanto, sendo o ponto médio equidistante dos extremos do segmento, isto equivale a dizer que M
divide o segmento AB em dois segmentos AM e MB congruentes. Escreve-se MA  MB .
*
Cada segmento de recta AB tem exactamente um ponto médio M e verifica-se A M B (M está
entre A e B) conforme ilustra a figura a seguir.
O conceito do ponto médio do segmento nos remete ao conceito de Mediatriz do segmento, que é o
conjunto de todos os pontos do plano equidistantes de A e B.
Ou seja, a mediatriz é uma recta perpendicular do segmento dado passando pelo seu ponto médio.

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Medição de um segmento
Sobre medição de um segmento entende-se a correspondência  do conjunto de todos os
segmentos no conjunto dos números reais não negativos R 0 .

A imagem  (PQ) de um segmento PQ chama-se valor numérico do segmento. E esta


correspondência tem as seguintes propriedades:

(1) Invariância da isometria: De PQ  ST verifica-se que  (PQ) =  (ST), isto é, segmentos


que através de uma isometria se transformam em um outro, têm o mesmo valor numérico.
(2) Aditividade: Se C está entre P e Q, então verifica-se que  (PQ) =  (PC) +  (CQ) onde
*
P C Q→C  r(PQ), isto é, o valor numerico subdividido em segmentos parciais é igual à
soma dos valores numéricos desses segmentos parciais.
(3) Normatividade: Existe um segmento AB em que A≠B com  (AB) = 1, isto é, existe um
padrão.
O valor numérico  (PQ) de um segmento PQ depende da escolha do segmento unidade AB. Por
isso, pela escolha fixa de AB, o comprimento do segmento PQ é escrito como produto formal do
valor numérico e unidade: PQ   AB (λ  R). em que o número real λ é chamado valor numérico

do comprimento PQ e AB é chamado unidade.


A unidade é, portanto, o comprimento com valor numérico 1.

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Comensurabilidade e incomensurabilidade de segmentos


Definição: Dois segmentos com comprimentos AB e CD dizem-se comensuráveis exactamente

quando se verifica x AB  CD , onde x é um número racional. E incomensuráveis quando se


verificar x AB  CD , sendo x é um número irracional.
A existência de segmentos incomensuráveis implica na insuficiência dos sistemas numéricos
conhecidos (números naturais e racionais) para efectuar medidas dos objectos geométricos mais
simples, como o quadrado e o círculo.
A solução que se impôs, na época, e que levou séculos para ser adoptada, era a de ampliar o
conceito de número, introduzindo os chamados números irracionais, de tal modo que, fixando uma
unidade de comprimento arbitrária, qualquer segmento de recta pudesse ter uma medida numérica.
Quando o segmento considerado é comensurável com o segmento unitário correspondente à
unidade escolhida, sua medida é um número racional (inteiro ou fraccionário). Os números
irracionais representam medidas de segmentos que são incomensuráveis com a unidade. Número
irracional, portanto, é um número obtido das medidas de segmentos e que não pode ser expresso
como uma razão entre dois números inteiros.
Consideremos um quadrado ABCD onde a diagonal AC ( d ) e o lado AB (  ) são exemplo
evidente de segmentos incomensuráveis pois a razão é um número irracional.
AB   e AC  d
Pelo teorema de Pitágoras no ∆ABC:
d 2   2   2  2 2
D C
d  2 2

d d  2 

Isto é: AC  2  AB
AC
Ou seja:  2 número irracional
AB
A ℓ B
Portanto, AB e AC são incomensuráveis.

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6. Relação entre segmentos


1
Sejam dados dois segmentos PQ e ST com PQ  1  AB e ST  2  AB . O quociente dos
2
valores numéricos 1 e  2 de R+ sob mesma unidade de comprimento, chama-se relação dos
segmentos PQ e ST.
Pela intersecção de um feixe de semi-rectas (r, s, t) com rectas paralelas (a, b, c), surgem
segmentos de recta no feixe e segmentos de recta nas paralelas, entre os quais se pode obter
relações como, por exemplo, as que se seguem:
S

A D G a SA SD SA SG
 
AB DE AB GH
B E H b SA SD SA SG
 
SB SE SB SH
AB DE AB GH
 
C F I c BC EF AC GI

r s t

Teorema: Se um feixe de rectas (semi-rectas) é intersectado por rectas paralelas, então verifica-se:
Parte 1: Dois segmentos de recta numa semi-recta relacionam-se entre si como segmentos
correspondentes na outra semi-recta:
SA SD

AB DE

Parte 2: Dois segmentos de recta numa paralela relacionam-se entre si como segmentos
correspondentes na outra paralela:
AD BE

DG EH

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Parte 3: Dois segmentos de recta correspondentes nas paralelas relacionam-se entre si como
segmentos respectivos em uma mesma semi-recta:
AD SA

BE SB
Observação: Os teoremas devem ser demonstrados
Aplicação da relação entre segmentos
(1) Multiplicação de um segmento
a) Seja dado um segmento AB e um escalar qualquer k. Se k = 2, por exemplo, podemos
encontrar um ponto C tal que AC  k  AB (ou AC  2 AB ):
B

A
A B C

b) De acordo com as condições descritas na alínea anterior, vamos encontrar um ponto S tal
que AS  13  AB :

A S B

(2) Divisão de um segmento


AP 2
Consideremos um segmento de recta AB e vamos encontrar um ponto P tal que  :
PB 3

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a) Pela divisão interna


r AM  MN  BM '  M ' N '  , r//ri
Traça-se uma semi-recta qualquer r passando
N por A e divide-se essa semi-recta em partes
iguais com compasso, a partir de A. Em
M seguida traça-se outra semi-recta ri paralela a
r e que passe por B, também dividida em
A P B partes iguais, a partir de B. Depois une-se
Mi duas partes de r com três partes de ri e na
intersecção com AB obtém-se o ponto
Ni procurado: NOi  AB = P.
Oi
ri
b) Pela divisão externa

r
ri
Oi
r//ri
N Ni
NOi  AB = P
M M i

P A B

(3) Divisão harmónica

Consideremos as seguintes divisões do segmento AB:


x 2x
A M B MA x 1
 
MB 2 x 2
3x 3x
A NA 3x 1
N B  
NB 6 x 2

Verificamos que, dado um segmento AB e uma razão k  1 , é possível obter dois pontos que
dividem o segmento dado na mesma razão, sendo um na pela divisão interna e outro pela divisão

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Texto de Apoio – Geometria Euclidiana

1
externa. Assim, o segmento AB está dividido pelos pontos M e N na mesma razão k  e diz-se
2
que AB está dividido harmonicamente.
MA NA
Portanto, os pontos M e N dividem harmonicamente o segmento AB quando  :
MB NB

N A M B
Como os pontos M e N dividem o segmento AB na mesma razão (um interiormente e outro
exteriormente), estes pontos chamam-se conjugados harmónicos de AB na razão k.

Propriedades:
P1: Na divisão harmónica de um segmento AB na razão k são válidas as seguintes propriedades:
2 1 1 2 1 1
  para k  1 e   para k  1 .
AB AM AN AB AM AN

P2: Na divisão harmónica de um segmento AB na razão k são válidas as seguintes propriedades:


2
OA  OM  ON , sendo O o ponto médio de AB.

A O M B N

(4) Homotetia

Fala-se de homotetia φ de centro H e razão (factor) k. E anota-se φ = (H, k), sendo k  R+.
Tendo um segmento AB, podemos encontrar φ(AB), dado o centro H e a razão k. Após a
transformação, três casos podem ocorrer:
1o Caso: Se 0 <k <1 temos uma redução;
2o Caso: Se k = 1 temos a congruência; e
3o Caso: Se k> 1 temos uma ampliação do segmento dado.

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Texto de Apoio – Geometria Euclidiana

(5) Aplicação sucessiva de duas homotetias


Seja φ(AB) pela homotetia, por exemplo (H, 2). Portanto: φ = (H, 2). Teremos

H B
Bi

Ai

Seja φ = φ1oφ2 onde φ1 = (H1, k1) e φ2 = (H2, k2). Como encontrar φ = (H, k)? Isto é, como
determinar geometricamente os elementos H, k e φ desta homotetia? Investigue: Tome como
exemplo φ(AB) com φ1 = (H1, 1
2
) e φ2 = (H2, 3). Para obter φ (H, k) = φ1oφ2 verificará após as

transformações, que H  r(H1, H2) e que k = 3


2
= ( k1  k 2 ).
Nota: φ1oφ2 ≠ φ2oφ1

7. Construções geométricas
Em Geometria, a resolução de um problema de construção levanta fundamentalmente as seguintes
duas questões:
 Como se pode construir a figura que se pede?
 Quantas figuras (diferentes entre si) do tipo pedido existem?
A partir do século V a.C., os matemáticos gregos desenvolveram uma parte da Matemática,
intimamente ligada à Geometria, conhecida como Construções Geométricas com Régua e
Compasso. Os problemas de construções geométricas são muito interessantes e alguns deles devem
ser enfrentados por quem está interessado em Geometria.
Os três Problemas Clássico da Geometria Euclidiana
É bom saber que os gregos antigos propuseram e resolveram muitos problemas de construção
difíceis, mas não conseguiram resolver, ou melhor, não conseguiram provar que não tinham
solução os três problemas conhecidos como os três problemas clássicos da Geometria Euclidiana,
que são:

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Texto de Apoio – Geometria Euclidiana

(1) a trissecção de um ângulo: dividir um ângulo dado qualquer em três partes iguais (ou seja,
em três ângulos congruentes cuja soma é o ângulo dado)
(2) a duplicação de um cubo: construir o lado de um cubo, cujo volume é o dobro do volume
de um cubo cujo lado é dado
(3) a quadratura de um círculo: construir um quadrado cuja área é a mesma de um círculo
dado.
Todos eles consistindo em, usando apenas régua e compasso,
Esses problemas foram enfrentados com sucesso apenas no século XIX, com a ajuda da Álgebra.
Mas isto já é outra história.
O pensamento dos matemáticos gregos era dominado por três grandes problemas que, justamente
por se mostrarem insolúveis, estimulavam a inteligência e a ambição dos geómetras: a duplicação
do cubo, a trissecção do ângulo e a quadratura do círculo.
A duplicação do cubo consiste em encontrar o lado do cubo do qual o volume é o dobro do volume
de um cubo dado; trissecção do ângulo consiste em dividir um ângulo dado em três partes iguais e
a quadratura do círculo consiste em encontrar um quadrado de área igual à de um círculo dado.
A duplicação do cubo: consiste em construir um cubo com o dobro do volume de um dado cubo.

Ninguém sabe ao certo quando foi este desafio lançado pela primeira vez, mas a tradição histórica
situa-o na época dos pitagóricos, discípulos de Pitágoras (século VI a.C.).
Várias lendas são contadas sobre a origem deste problema. Uma bem conhecida refere-se a uma
epidemia entre os habitantes de Atenas, que teriam decidido enviar uma delegação para perguntar
ao oráculo da ilha de Delos o que tinham que fazer para apaziguar os deuses. Ao que aquele lhes
respondeu que deveriam construir um altar ao deus Apolo, em forma de cubo, e com o dobro do
volume de um outro existente na ilha. Tendo eles tentado resolver o problema construindo um
cubo cuja aresta fosse o dobro da do altar da ilha, verificaram com surpresa que o novo altar tinha
oito vezes o volume do primeiro! E a epidemia continuou...
Tudo leva a crer que rapidamente os geómetras se convenceram de que a construção geométrica
pedida não podia ser resolvida dentro das regras estritas da Geometria grega, que apenas

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Texto de Apoio – Geometria Euclidiana

autorizava a utilização, como instrumentos de construção, de um compasso e de uma régua não


graduada. Só no século XIX, 2400 anos mais tarde, foi finalmente demonstrada essa
impossibilidade.
O problema despertou enorme interesse entre os matemáticos gregos, o que é atestado pelo grande
número de soluções não ortodoxas encontradas. As fontes directas da história da Matemática grega
são praticamente inexistentes, e para a descrição de grande parte destas soluções é forçoso recorrer
a um texto muito posterior, um comentário sobre uma obra de Arquimedes, escrito já no século V
da nossa era por Eutócio, filósofo e matemático da Escola de Alexandria.

A trissecção do ângulo : Consiste em dividir um ângulo em três ângulos congruentes.

Apenas no século XIX esta questão ficou definitivamente resolvida e pela negativa: é impossível
encontrar um processo que, utilizando apenas um compasso e uma régua não graduada, permita
dividir qualquer ângulo em três partes iguais. Assim, o problema tem solução para 90o e para 45o,
por exemplo, mas é irresolúvel para os ângulos de 60o e 3o.
A quadratura do círculo: consiste em construir um quadrado com a mesma área de um dado
círculo.

Se designarmos por r o raio do círculo dado e por  a nossa incógnita, queremos determinar  tal

que  2    r 2 , ou seja,   .
r
O problema resume-se então a fazer a determinação de uma constante que é  .
Ora a impraticabilidade da quadratura do círculo, fazendo uso apenas de régua não graduada e
compasso, foi rigorosa e irrefutavelmente demonstrada.

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Texto de Apoio – Geometria Euclidiana

Para resolver problemas de construções geométricas, além de lápis e papel, utilizam-se dois
instrumentos para desenhar figuras: um compasso e uma régua (sem escala). O compasso será
utilizado para desenhar circunferências e a régua, para traçar rectas. Serão utilizadas apenas as
seguintes operações (que se justificam pelos axiomas da Geometria Euclidiana):
 Traçar uma recta por dois pontos conhecidos.
Na verdade, não podemos desenhar uma recta numa folha de papel. Nossas construções deverão
deixar claro se o que desenhamos é recta, semi-recta (tem uma origem) ou segmento de recta (um
segmento está limitado por dois pontos).
 Desenhar uma circunferência, dado o seu centro e o seu raio.
 Marcar os pontos, quando houver, de intersecção de duas linhas (duas rectas, duas
circunferências ou uma recta e uma circunferência).
Para simplificar as construções, é comum desenharmos arcos de circunferência em vez de
circunferências, além de segmentos de rectas e semi-rectas em vez de rectas. Entretanto, há
situações em que essa prática pode ocultar soluções válidas de um problema, sendo necessária a
devida atenção para evitar isso.
Uma construção geométrica consiste numa sequência finita de pelo menos uma dessas operações.
Iremos desenvolver um procedimento adequado para descrever os passos de uma construção
(como um programa de computação). Mas o mais importante são os conceitos, ideias e teoremas
geométricos envolvidos na resolução dos problemas. Por isso, iremos exercitar a actividade
fundamental característica da Matemática: a demonstração. O fato de exibirmos uma figura
desenhada não basta para afirmar que um problema foi resolvido: é preciso provar, com bases nas
leis da lógica e nos fatos já conhecidos (definições, axiomas ou teoremas), que tudo o que foi feito
é válido. Por isso, cada passo da construção deve ser justificado (isto é, demonstrado).
Dependendo do problema (maneira de apresentação dos elementos de determinação, as variáveis),
tendo em conta os meios de construção (instrumentos como régua, esquadro, compasso, etc.)
permitidos para a resolução, tem-se diferentes formas de resolver um problema de construção.
Para o nosso estudo vamos começar por apresentar a forma clássica de resolução completa de
problemas e construção, na qual se permite apenas o uso da régua não graduada e compasso para a
construção.

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Texto de Apoio – Geometria Euclidiana

Os desenhos construídos, usando apenas estes instrumentos, servem para visualizar e ajudar o
raciocínio mas de nenhum modo servem como demonstrações e são, do ponto de vista matemático,
supérfluos.
Essa forma de resolução de um problema de construção compreende quatro partes seguintes:

1. Análise: É suposto que existe uma figura, que verifica todas as exigências do problema
colocado. Com uso de uma figura plana, a figura por construir pode ser decomposta em figuras
parciais que, consecutivamente, com ajuda de princípios conhecidos, dão construídos a partir
dos elementos dados. A análise termina com a reflexão da seguinte afirmação: “Se existe uma
figura que cumpre todas as condições do problema, então ela pode ser construída da seguinte
maneira…”.
2. Construção: Na descrição da construção é dada uma sequência finita de passos que
possibilitam a obtenção da figura procurada. A realização da construção serve como
visualização e como suporte ao raciocínio. Não é dito que tal figura só pode ser construída da
maneira dada. Poderá haver ainda outras possibilidades de construção que, no entanto,
envolverão outra análise.
Na descrição de uma construção, há construções simples que são consideradas conhecidas, de
modo que a sua realização em particular não precisa ser descrita:
 Transporte de um segmento de um dado comprimento sobre uma recta, a partir de um
ponto, em uma dada direcção;
 Transporte de um ângulo de uma dada amplitude para uma recta em um dos seus pontos;
 Levantamento de uma perpendicular à uma recta a partir de um dado ponto;
 Construção de paralelas a uma dada recta através de um ponto ou a uma determinada
distancia;
 Construção da mediatriz de um segmento;
 Construção de uma circunferência (ou arco de circunferência) através de um ponto como
centro, com um dado raio;
 Construção de circunferenciais inscritas ou circunscritas a um dado triangulo;
 Partição de um segmento de recta de uma relação;
 Construção de uma tangente de um dado ponto a uma dada circunferência;
 Construção de um rectângulo dadas as medidas dos seus lados

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Texto de Apoio – Geometria Euclidiana

3. Demonstração: Deve-se formular uma afirmação recíproca àquela apresentada na análise, e


esta afirmação recíproca deve ser demonstrada. Deve-se, portanto, demonstrar: Se cada passo
dado na descrição da construção é realizável, então cada figura assim surgida verifica todas as
condições do problema e é, por conseguinte, solução do problema de construção.

4. Determinação: Na determinação é discutido:


 se existe uma solução, e
 se ela (até à congruência) é unicamente realizável.
Tem-se, portanto, duas partes:
(I) É investigado se com os elementos dados a construção pode ser realizada, isto é,
mostra-se em que casos cada passo dado na fase da construção é realizável e em que
casos cada passo não é realizável, Demonstração da existência.
(II) No caso de a construção ser realizável, todos os passos são investigados se eles podem
ser realizados unicamente, e quais as condições que se devem manter pelos elementos
dados. Demonstração da unicidade. Isto significa também mostrar quais as diferentes
possibilidades que existem na realização dos passos de construção e que sequencia se
dá para a construção de figuras geométricas. Quantas figuras finais não congruentes
surgem, quando a posição não é tomada em conta?

Lugar geométrico: Falar de lugar geométrico, de uma maneira geral, é falar dos pontos ou
conjunto dos pontos do plano que formam uma certa região na qual se acham os elementos
geométricos considerados.
Exemplos:
 Encontrar o lugar geométrico de todos os
pontos do plano que se encontram à mesma
distância de um ponto dado.
d
(Circunferência);
P
→ Trata-se de uma circunferência de centro
P e raio d:

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Texto de Apoio – Geometria Euclidiana

 Encontrar o lugar geométrico de todos os pontos equidistantes dos extremos de um


segmento AB. (Mediatriz)

Q AP  BP
AQ  QB
AM  MB
A M B
AR  RB

 Encontrar o lugar geométrico de todos os pontos que se encontram à mesma distância de


uma recta. (Duas rectas paralelas).

s
r
sl
d
s // r // sl

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Texto de Apoio – Geometria Euclidiana

8. Noção do ângulo

Considera-se ângulo à região de um plano determinada pela intersecção de duas semi-rectas que
têm a mesma origem. Trata-se de um dos conceitos fundamentais e objecto de estudo da
Geometria.

(1) Ângulo elementar


Chama-se ângulo elementar a um par não ordenado de semi-rectas p e q com ponto inicial O.
p
A Notação: (p, q)ou (q, p)
E ainda: (AOB) ou (BOA) onde A  p e
B q
O B q
O ponto O é o vértice e as semi-rectas p e q são os lados do ângulo.
Quando p ≡ q (p é idêntico a q) então o ângulo (p, q) é ângulo elementar nulo.
Quando p e q são semi-rectas opostamente orientadas, então (p, q) é um ângulo elementar raso.
Quando as duas semi-rectas são perpendiculares (p  q), então (p, q) é um ângulo elementar
recto.

(2) Ângulo elementar orientado


Assim se chama ao par ordenado de semi-rectas p e q com ponto inicial O.
p → primeira semi-recta A  p
q
q → segunda semi-recta B  q
B
O → vértice do ângulo
Indicação: (p, q) ou (AOB)
O A p
Nota: (p, q) ≠ (q, p)

(3) Ângulo (ângulo elementar + pontos do interior)


Todo o ângulo elementar divide o plano em dois subconjuntos C1 e C2 abertos. Cada um destes
subconjuntos chama-se interior do ângulo (área do ângulo). Se o interior é um conjunto vazio,
então o ângulo é nulo.

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Texto de Apoio – Geometria Euclidiana

α q
Exemplo:
O ponto M pertence ao subconjunto do ângulo B
C1
que delimita C1, e para indicar este ângulo C2
M
inclui-se o ponto M: (p, q, M).
O A p

(4) Ângulo orientado (ângulo elementar orientado+ pontos do interior)

q
P
(p, q, P)

O
p

(5) Ângulo generalizado (rotacional)


É o ângulo elementar orientado com um lado fixo p mais um lado móvel q, mais um número de
rotações completas.

(6) Medição de ângulos


Em analogia à medição de segmentos, entende-se por medição de ângulos à doação de uma
correspondência α do conjunto de todos os ângulos no conjunto dos números reais R.
A imagem  ( p, q) de um ângulo (p, q) chama-se valor numérico do ângulo. E essa
correspondência tem as seguintes propriedades:

UP- FCNM /DMat 29


Texto de Apoio – Geometria Euclidiana

(1) Invariância: O ângulo que através de uma isometria se transformam num outro, tem o
mesmo valor numérico.
(2) Aditividade: O valor numérico de um ângulo subdividido é igual à soma dos valores
numéricos desses ângulos parciais.
(3) Norma: Existe um ângulo (a, b) com a ≠ b cuja imagem é α( (a, b)) = 1.

O valor numérico  ( p, q) de um ângulo (p, q), depende da escolha de um ângulo unidade
(a, b). Pela escolha fixa de (a, b), a amplitude do ângulo (p, q) é escrito como produto
formal do valor numérico e unidade: ( p, q)   (a, b) , λ  R.

Relação entre ângulos


Dois ângulos quaisquer que se complementam um com o outro, formando um ângulo raso,
chamam-se ângulos suplementares.
Dois ângulos quaisquer que se complementam um com o outro, formando um ângulo recto,
chamam-se ângulos complementares.
Duas rectas r e s concorrentes num ponto O formam, no plano, pares de ângulos com o mesmo
vértice para os quais:

δ
α γ
O
β

 Dois ângulos com o mesmo vértice e cujos lados correspondentes estão na mesma recta, são
chamados ângulos verticalmente opostos. Exemplos: (α e γ); (β e δ).

 Dois ângulos quaisquer com o mesmo vértice e um lado comum entre eles, chamam-se
ângulos adjacentes. Exemplos: (α e β); (β e γ); (γ e δ); (α e δ).

Postulado (1): Ângulos verticalmente opostos são congruentes. Exemplos: (α  γ); (β  δ).

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Texto de Apoio – Geometria Euclidiana

Postulado (2): Ângulos adjacentes em duas rectas concorrentes são suplementares.


Exemplos: α+β=180o; α+δ=180o; β+γ=180o.

Quando um par de rectas r e s no plano é intersectado por uma outra recta t, formam-se nos pontos
de intersecção P e Q os seguintes pares de ângulos:

γ β
P α
δ

ρ θ s
Q ε
φ
t

 4 pares de ângulos opostos pelo vértice;


 8 pares de ângulos adjacentes;
 4 pares de ângulos correspondentes: (α e ε); (β e θ); (γ e ρ); (δ e φ).
 2 pares de ângulos alternos internos: (α e ρ); (δ e θ).
 2 pares de ângulos alternos externos: (γ e ε); (β e φ).
 2 pares de ângulos opostos internos: (α e θ); (δ e ρ).
 2 pares de ângulos opostos externos: (β e ε); (γ e φ).
Se o par considerado no caso anterior for de rectas paralelas (r//s) no plano, intersectado por uma
outra recta t, demonstram-se os teoremas a seguir apresentados:

γ β
P α
δ s

ρ θ
Q ε
φ
t

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Texto de Apoio – Geometria Euclidiana

Teorema (1): Dois ângulos correspondentes em rectas paralelas são congruentes.


Se α e ε são correspondentes e r//s, então α  ε.
Teorema Recíproco (1): Se α e ε são correspondentes e congruentes, então r//s.

Teorema (2): Dois ângulos alternos em rectas paralelas são congruentes.


Se δ e θ são alternos internos e r//s, então δ  θ. Ou:
Se β e φ são alternos externos e r//s, então β  φ.
Teorema Recíproco(2): Se δ e θ são ângulos alternos internos e congruentes, então r//s.

Teorema (3): Dois ângulos opostos em rectas paralelas são suplementares.


Se α e θ são ângulos opostos e r//s, então + =180o.
Teorema Recíproco (3): Se α e θ são ângulos opostos e suplementares, então r//s.

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