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5onetos

5onetos
(ítalo dantas)
“e disse jesus:

é preciso ter o caos


dentro de si”

josé juva
1.

entre o manto de tânatos e os braços


de eros, negros orbes vagueiam
postos à noite. caem aos espaços
infinitos — à lua cambaleiam .

meus olhos erguem-se ao espetáculo


divino. o hermetismo de toda a era,
uma gota de luz rasgando a esfera,
hemisférios de um mesmo receptáculo.

sobre a grama, embalado contra o vento


frio. deixar-se levar na imensidão
em percorrer o céu negro e irrestrito.

ser, verdadeiramente, como são


as estrelas, e por um só momento,
sentir que o corpo é o mantra do infinito.
2.

quando me vi na instância derradeira


ao horror de mil almas condenadas
(sobre meus olhos, duas mãos prostradas
fazendo arder de minha carne inteira)

veio a visão de trevas seculares


a qual nenhum abismo se negara
abrir de seus espaços singulares
na plenitude de uma chama rara

como num filme de meus desenganos


vi transmitido o sentido da vida
como fora um segundo muitos anos

mas não me fora nada revelado


exceto a imagem de um rosto quebrado
delirante em sua hora de partida
3.

no tilintar dos astros, vejo os dias


como garças velozes que atravessam
o incólume silêncio de meu sono.
um homem se debruça sobre as casas

enquanto longamente o observo, atento


a cada gesto. o homem busca o som
das árvores, o rumor de seus galhos,
a razão única da natureza

e aqui me vejo — homem sem orgulho —


a definhar nas horas mais sombrias
junto a este caçador dos desmotivos

o homem ri e me acena, então percebo


que a razão mesma que ele agora busca
é a que perdi um dia em meu passado
4.

a noite ulula como uma ave morta


destituída de canto e divindade;
seu corpo é um universo todo em transe
fulgurando a nudez da criatura

enquanto os homens curvam-se extasiados


ante a disforme vastidão do abismo.
isto tudo pertence a mim apenas
(esta noite de máquinas acesas)

eu, que sou o plenilúnio, o véu de sangue


o deicídio; a aberração dos tempos
— inquilino absoluto da desgraça

e qual um canto rouco, vibro no ar


de meu sonho e percorro a treva extensa
desejando as paisagens impossíveis
5. [a jonatas onofre]

aos que arriscam perder a voz sem medo


aos que engolem as lâminas por gosto
que não calam injúrias ou segredos
e dão à mão sedenta o próprio rosto

é no incêndio que enxergam uma luz


e buscam a beleza em tons de corte
não veem a bondade como um norte
ou como um brilho falso que seduz

somos irmãos na ideia, eu e tu,


que ceifamos a ordem ante o caos.
se vão ao norte, rumamos ao sul

pregando o desvairado desatino


desandando entre outros homens maus
como glauco, um podre feschenino
la bodeguita edições – maio de 2016
“kkkk... [inaudível]”
la bodeguita

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