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FACULDADE INTEGRAL CANTAREIRA

CAROLINE FRANCISCO DE SOUSA

BAGATELLE PARA TROMPA E PIANO DE HERMANN


NEULING: ESTUDO INTERPRETATIVO ATRAVÉS DA
FERRAMENTA DE NOTE GROUPING

São Paulo
2018
CAROLINE FRANCISCO DE SOUSA

Bagatelle para Trompa e Piano de Hermann Neuling: Estudo


interpretativo através da ferramenta de Note Grouping

Monografia apresentada ao Curso de Graduação em


Música da Faculdade Integral Cantareira, em cumprimento
parcial às exigências para obtenção do título de Bacharel
em Música (Trompa).
Orientador: Prof. Dr. Lucca Zambonini Soares

São Paulo
2018
Dedico este trabalho a Deus e minha família,
Cida, Orlando e Fernanda.
AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus, por todos os dons que me concedeu.

Agradeço à minha mãe, meu pai e minha irmã que ao longo desses treze anos me

ajudaram sem hesitar na busca de objetivos em minha vida.

Ao meu eterno professor, Edison Ferreira, por todos os ensinamentos e apoio desde o

início de meus estudos musicais na Associação Músicos do Futuro.

Ao meu orientador e professor de trompa, Lucca Zambonini Soares, que me inspira a

ser uma musicista melhor, cheia de possibilidades e sonhos.


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 12
1 BAGATELLE DE HERMANN NEULING: CONTEXTUALIZAÇÃO ............................... 13
1.1 Métodos e Obras de Hermann Neuling ....................................................................... 16
2 NOTE GROUPING ............................................................................................................... 22
2.1 Arsis e Thesis ............................................................................................................... 23
2.2 Barra de Compasso ...................................................................................................... 24
2.3 Anacruse ...................................................................................................................... 25
2.4 Teoria Fundamental ..................................................................................................... 26
2.5 Padrões Naturais e Artificiais ...................................................................................... 27
2.6 Aplicação e Uso do Note Grouping ............................................................................ 28

A-) Aplicação em Ritmo Binário e Quaternário................................................................ 28


B-) Aplicação em ritmo quaternário com anacruse...........................................................18
C-) Aplicação em Ritmo Ternário ..................................................................................... 30
D-) Aplicação em Tercinas ................................................................................................ 31
E-) Aplicação em Quiálteras de 4 e 5. ............................................................................... 32
F-) Aplicação na ausência da Thesis ................................................................................. 32
G-) Aplicação em escalas .................................................................................................. 33
H-) Aplicação em arpejos .................................................................................................. 33

3 NOTE GROUPING APLICADO NA BAGATELLE ............................................................. 34

3.1 Aplicação na Bagatelle ................................................................................................ 35

A-) Seção 1 ........................................................................................................................ 35


B-) Seção 2 ........................................................................................................................ 36
C-) Seção 3 ........................................................................................................................ 37
D-) Seção 4........................................................................................................................27
E-) Seção 5 ........................................................................................................................ 39
F-) Seção 6 ......................................................................................................................... 40
G-) Seção 7 ........................................................................................................................ 41
H-) Seção 8 ........................................................................................................................ 42
I-) Seção 9 ......................................................................................................................... 43

CONCLUSÃO .......................................................................................................................... 44
REFERÊNCIAS ....................................................................................................................... 45
PARTITURAS ......................................................................................................................... 46
SITES ....................................................................................................................................... 46
ANEXO .................................................................................................................................... 47
LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Hermann Neuling..................................................................................................... 13

Figura 2 - Hermann Neuling..................................................................................................... 14

Figura 3 - Hermann Neuling..................................................................................................... 16

Figura 4 - Hermann Neuling: 30 estudos para trompa grave (capa) ........................................ 17

Figura 5 - Hermann Neuling: 18 estudos especiais para trompa grave (capa) ......................... 17

Figura 6 – Hermann Neuling: 15 estudos especiais para trompa aguda (capa) ........................ 18

Figura 7 – Hermann Neuling: método de lições elementares em 2 volumes (capas) ............... 18

Figura 8 - Hermann Neuling: Quartetos para trompa (capa) .................................................... 19

Figura 9 - Hermann Neuling: Trios para trompa (capa) ........................................................... 19

Figura 10 – Indicação de Arsis e Thesis na teoria do Note Grouping ...................................... 24

Figura 11 - Escrita/grafia musical indicando acentuação na primeira nota de cada grupo ...... 25

Figura 12 - Arsis na anacruse ................................................................................................... 26

Figura 13 - Respiração em ritmo binário .................................................................................. 27

Figura 14 - Respiração em ritmo ternário ................................................................................. 27

Figura 15 - Padrão Thesis/Arsis em ritmo binário .................................................................... 28

Figura 16 - Padrão Thesis/Arsis em ritmo quaternário............................................................. 29

Figura 17 - Arsis/Thesis em ritmo anacruse ............................................................................. 30

Figura 18 - Thesis/Arsis/Arsis em compasso ternário .............................................................. 30

Figura 19 - Thesis/Arsis/Arsis em compasso ternário .............................................................. 31

Figura 20 - Thesis/Arsis/Arsis em tercinas ............................................................................... 31

Figura 21 - Padrão Thesis/Arsis em quiálteras de 4 e 5 ............................................................ 32


Figura 22 - Modelo para aplicação na ausência da Thesis ....................................................... 32

Figura 23 - Aplicação em escalas ............................................................................................. 33

Figura 24 - Modelo proposto para as sequências de arpejos .................................................... 33

Figura 25 – Aplicação na seção 1 (c. 1-13) .............................................................................. 35

Figura 26 – Aplicação na seção 2 (c. 14-27) ............................................................................ 36

Figura 27 – Aplicação na seção 3 (c. 27-41) ............................................................................ 37

Figura 28 – Aplicação na seção 4 (c. 42-57) ............................................................................ 38

Figura 29 – Aplicação na seção 5 (c. 57-64) ............................................................................ 39

Figura 30 – Aplicação na seção 6 (c. 57-64) ............................................................................ 40

Figura 31 – Aplicação na seção 7 (c. 75-86) ............................................................................ 41

Figura 32 – Aplicação na seção 8 (c. 86-92) ............................................................................ 42

Figura 33 – Aplicação na seção 9 (c. 93-111) .......................................................................... 43


LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Neuling, Bagatelle, divisão em seções .................................................................... 34


RESUMO

Este trabalho tem como objetivo sugerir possibilidades de interpretação para a parte da
trompa na obra Bagatelle para Trompa e Piano do compositor Hermann Neuling. A escolha
dessa obra ocorreu por sua relevância no repertório para trompa, sendo uma das peças mais
tocadas e requisitadas em recitais e audições para trompa grave no mundo. Como ferramenta
interpretativa, será feita a sugestão interpretativa por meio da aplicação do conceito
interpretativo Note Grouping, metodologia criada por James Thurmond e apresentada em seu
livro Note Grouping: A Method for Achieving Expression And Style in Musical Performance.

Palavras-chave: Trompa; Bagatelle; Note Grouping


ABSTRACT

This work aims to suggest possibilities of interpretation for the part of the horn in the
work Bagatelle for Horn and Piano of the composer Hermann Neuling. The choice of this
work occurred because of its relevance in the repertoire for French horn, being one of the
most played and requested pieces in recitals and auditions for low horn in the world. As an
interpretive tool, the analysis will be applied through the application of the interpretive
concept, Note Grouping, methodology created by James Thurmond and presented in his book
Note Grouping: A Method for Achieving Expression and Style in Musical Performance.

Keywords: French Horn; Bagatelle; Note Grouping


12

INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como proposta explorar a aplicabilidade da ferramenta de


interpretação Note Grouping de James Thurmond na peça Bagatelle para Trompa e Piano de
Hermann Neuling, a fim de auxiliar na performance do músico trompista.

A escolha deste tema adveio da necessidade de buscar formas para melhor


entendimento de técnicas que visam o auxílio na expressividade musical, ou seja, como
transmitir ao ouvinte algo bom, mas somente no que se refere ao fator técnico.

Os materiais utilizados consistem em livros, tratados, dissertações de mestrado e teses


de doutorado, que abordam sobre Note Grouping e outros conceitos semelhantes a esta
metodologia. Como fonte principal de pesquisa, foi usado o livro de James Thurmond, no
qual o autor teve como base sua própria dissertação de mestrado “Note Grouping: A method
for Achieving Expression and Style in Musical Performance”.

O trabalho está dividido em três capítulos: o primeiro capítulo traz a contextualização


da obra, discorre sobre o compositor e suas contribuições de métodos e composições para
trompa; o segundo capítulo aborda a metodologia do Note Grouping, de forma a explicar seus
fundamentos e suas ferramentas de aplicabilidade; o terceiro capítulo demonstra como o
músico deve utilizar-se destas ferramentas especificamente na parte da trompa da obra
Bagatelle.
13

1 BAGATELLE DE HERMANN NEULING: CONTEXTUALIZAÇÃO

Hermann Neuling, trompista e compositor, nasceu em 17 de junho de 1897, em


Buchhorst – distrito de Lauenburg – estado de Schleswig-Holstein, Alemanha, e faleceu em
29 de janeiro de 1967 em Brühl – distrito de Rhein-Erft-Kreis – estado da Renânia,
Alemanha. Filho de Hermann e Dorothea Neuling, o jovem Hermann começou a aprender
violino, trompete e trompa com um professor local chamado Kaufman. A Figura 1 mostra
uma foto rara de Hermann Neuling, enviada por correspondência privada por sua filha
Brunhilde Leonore Neuling, de 95 anos, que vive no Canadá atualmente.

Figura 1 - Hermann Neuling

Fonte: Brunhilde Leonore Neuling, acervo particular.


14

Em 1911 juntou-se a Stadtpfeifer Oebisfelde, realizando apresentações em eventos e


festividades da igreja nas redondezas, sob a direção de seu professor. Durante a Primeira
Guerra Mundial serviu no corpo médico, enquanto continuava com a música sempre que
possível. Mais tarde frequentou a Hochschule für Musik und Theater Felix Mendelssohn
Bartholdy em Leipizig.

Hermann Neuling casou-se com Maria Winkler e, em 1921, enquanto trabalhava no


Theater Münster Opera, o casal comemorou o nascimento de sua primeira filha, Brunhilde
Leonore Neuling. Em 1933 nasceu sua segunda filha, Sieghild, que mais tarde se tornou uma
soprano e uma adepta da ópera.

No ano de 1924 foram abertas audições para vaga de trompa grave na Staatsoper Unter
den Linden. Neuling conseguiu a vaga – onde tocou com o compositor e trompista Bernhard
Krol – permanecendo no posto até se aposentar, em 1961. Enquanto ocupava o cargo de
trompista, o famoso maestro russo Serge Koussevitzky (1874-1951) aproximou-se de
Hermann Neuling para persuadi-lo a integrar a Orquestra Sinfônica de Boston, no entanto a
esposa de Neuling não concordou. Em Berlim, Neuling ensinou no Hochschule für Musik
Hanns Eisler, além de viajar diversas vezes com a Berliner Philharmoniker para diversos
países.

Na Figura 2 pode-se ver outra foto rara de Hermann Neuling tocando trompa, enviada
por correspondência privada por sua filha Brunhilde Leonore Neuling.

Figura 2 - Hermann Neuling


15

Fonte: Brunhilde Leonore Neuling, acervo particular.

Entre 1933 e 1965 Hermann Neuling foi convidado regularmente para tocar no The
Bayreuth Festival, apresentando-se ao lado dos principais trompistas da Alemanha e com
muitos maestros famosos, dentre os quais Wilhelm Furtwängler, Herbert von Karajan e
Rudolf Kempe.

Após a sua aposentadoria da Staatsoper Unter den Linden, Hermann foi convidado a
ensinar no Izmir’s Conservatory, a terceira maior cidade da Turquia. Lecionou na escola de
1963 a 1966, pois acreditava que o Mar Egeu somado aos longos verões secos e quentes
seriam benéficos à sua saúde. No entanto, a saúde debilitada fez com que ele retornasse à
Alemanha, onde faleceu em 1967.
16

1.1 Métodos e Obras de Hermann Neuling

Hermann Neuling, além de ter sido um trompista de renome, deixou suas


contribuições para os trompistas, não só compondo uma das obras mais famosas para trompa
grave, mas também diversos métodos para o instrumento com diferentes objetivos. A despeito
de ter sido um compositor famoso, é amplamente conhecido no universo dos trompistas.

Neuling compunha durante o dia para manter-se ocupado antes das performances da
ópera noturna. Nesse período, compôs métodos e estudos que seriam publicados e utilizados
no mundo todo. Note a Figura 3.

Figura 3 - Hermann Neuling

Fonte: Brunhilde Leonore Neuling, acervo particular.

Além da obra Bagatelle, compôs 30 estudos para trompa grave em 2 volumes (Figura
4), 18 estudos especiais para trompa grave (Figura 5), 15 estudos especiais para trompa aguda
(Figura 6), método de lições elementares em 2 volumes (Figura7), Quartetos para trompa
(Figura 8) e Trios para Trompa (Figura 9).
17

Figura 4 - Hermann Neuling: 30 estudos para trompa grave (capa)

Fonte: <https://www.stretta-music.com/en/hermann-30-spezial-etueden-nr-104900.html>

Figura 5 - Hermann Neuling: 18 estudos especiais para trompa grave (capa)

Fonte: <http://poperepair.com/neuling-hermann-18-low-horn-studies/>
18
Figura 6 – Hermann Neuling: 15 estudos especiais para trompa aguda (capa)

Fonte: <http://poperepair.com/neuling-hermann-15-high-horn-studies/>

Figura 7 – Hermann Neuling: método de lições elementares em 2 volumes (capas)

Fonte:<https://www.zvab.com/servlet/BookDetailsPL?bi=21635106587&searchurl=hl%3Don
%26tn%3Dgrosse%2Bf%2Bund%26sortby%3D20%26an%3Dneuling>
19
Figura 8 - Hermann Neuling: Quartetos para trompa (capa)

Fonte: <https://www.music-station.eu/neuling-hermann-jagd-quartett-ueber-deutsche-202130.html>

Figura 9 - Hermann Neuling: Trios para trompa (capa)

Fonte: <https://shop.musikhaus-laimer.at/Trios-Neuling-Hermann-BLECHPRESSE6006-385797.html>
20

Bagatelle para Trompa Grave e Piano

Bagatelle para Trompa Grave e Piano de Hermann Neuling, é uma das obras mais
famosas e conhecidas para trompa grave no mundo. Foi publicada em 1956 pela Editora Pro
Musica Verlag Leipzig e permaneceu indisponível e desconhecida na Alemanha Ocidental até
novembro 1984, quando Manfred Klier1 sugerir seu uso como o solo requerido para trompa
grave na audição realizada pela Berliner Philharmoniker. A essa época, a partitura
encontrava-se esgotada, razão pela qual uma fotocópia da parte original de trompa de
Manfred Klier foi preparada e enviada aos candidatos, resultando o tempo de preparação da
peça em uma única semana, sem a parte de piano ou qualquer ideia de como a peça poderia
realmente soar.

Após sua utilização como o solo estabelecido para a audição realizada pela Berliner
Philharmoniker (1984), Bagatelle se tornou a peça padrão requisitada em audições para
trompa grave na Alemanha, Europa e posteriormente em diversas orquestras no mundo todo.2

A obra tem duração de cinco minutos, com a peculiaridade da utilização majoritária do


registro extremo grave da trompa, situação pouco comum em obras solo escritas para este
instrumento.

Em sua composição Neuling usou ideias românticas constantemente interrompidas por


trechos técnicos desafiadores, como amplos intervalos, bem como arpejos e escalas rápidas.
Embora escrita em linguagem harmônica moderna, os saltos rápidos em torno do registro e as
corridas de arpejo são certamente uma reminiscência da escrita tradicional da trompa natural.

Um dos grandes desafios musicais desta obra está na interpretação. Para fins de
audição/prova, o rigor no tempo e a uniformidade das notas em termos de dinâmica, tom e

1
Manfred Klier (1935- 2015). Trompista, pianista de jazz, compositor e arranjador de música popular. Atuou na
Orquestra Sinfônica Alemã (Berlim) e na Orquestra Filarmônica de Berlim. Foi membro regular do Bayreuth
Festival de 1968 até 1990.
2
Disponível em: https://www.berliner-philharmoniker.de/en/academy/application-and-vacancies/. Acesso em
27/09/2017.
21

articulação são cruciais, criando o efeito de uma marcha bastante disciplinada. Musicalmente,
a peça transmite a sensação de contradição, pois se quer tocar com rubatos românticos, mas
não se pode, por conta de sua rigidez rítmica.

Esclarece-se que até hoje não foram encontrados registros de peças de igual importância
para trompa grave em audições pelo mundo. Dessa forma, justifica-se a importância em se
apresentar uma ferramenta de interpretação aplicada a essa obra.

Para a sugestão interpretativa de Bagatelle foi escolhida a metodologia Note Grouping,


uma ferramenta indicada para aprimorar a performance musical, possibilitando ao músico
desenvolver sua musicalidade e interpretação de uma obra.
22

2 NOTE GROUPING

James Morgan Thurmond, desenvolvedor da metodologia Note Grouping, nasceu em


Dallas nos Estados Unidos em 1909, e faleceu em Junho de 1998 em Silver Spring, Maryland,
após um acidente vascular cerebral.

Formou-se no Curtis Institute of Music na Filadélfia e na Universidade Americana.


Ingressou na instituição Líbano Valley College e posteriormente na Banda da Marinha no
início da década de 1930. Poucos anos depois, ajudou a organizar e dirigir a escola de música
da marinha em Washington – onde serviu por 19 anos, retirando-se em 1951 – que mais tarde
se tornaria a Escola de Música das Forças Armadas.

Durante a Segunda Guerra Mundial, estava no comando da escola e de todas as bandas


da frota no setor da música da Marinha.

Lecionou na Messiah College, Gettysburg College e na Temple University, além de ter


sido diretor associado da Harrisburg Symphony Orchestra, na Pensilvânia. Foi professor
emérito de música do Líbano Valley College em Annville, Pensilvânia, onde havia ensinado
desde 1954 até se aposentar em 1979. Membro da Music Educators National Conference,
Retired Officers Association, Military Order of the World Wars and the International Horn
Society.

Na área acadêmica, concluiu seu mestrado em música na Catholic University of


America em Washington D.C., após apresentar seu trabalho de conclusão com o título “Note
Grouping: A method for Achieving Expression and Style in Musical Performance”, em 1961.
Mais tarde, o método para alcançar expressividade na performance musical se tornou um
livro, tendo sua primeira publicação em 1982.

Ao longo dos anos, muitos professores e músicos foram tomando conhecimento,


fazendo com que a metodologia Note Grouping ganhasse magnitude no meio musical,
23

tornando-se uma grande ferramenta de interpretação. Para se compreender essa metodologia,


exemplifica-se, abaixo, de forma resumida e breve, seus principais aspectos e conceitos.

2.1 Arsis e Thesis

A metodologia usa como base dois termos originados do drama grego, chamados Arsis
e Thesis. O livro exemplifica, com base na definição do dicionário Grove (2001), que Arsis é
o tempo durante o qual o pé é levantado ao se dar um passo e Thesis é o tempo que o pé
permanece no chão.

Posto isso, pode-se classificar Arsis como o tempo forte e nota curta e Thesis como
tempo fraco e nota longa. De acordo com Thurmond, a Arsis é quem cria a sensação de
movimento e a impulsão na música, por isso é necessário que seja tocada devidamente.
Porém, a maioria dos músicos, quando tocam, dão importância para a Thesis, criando uma
música sem direcionamento, que pode até soar bem tecnicamente, no entanto sem
expressividade alguma.

O primeiro exemplo prático da teoria Note Grouping menciona que “a base desta teoria
é que a Arsis ou nota fraca do motivo ou compasso é mais expressiva musicalmente que a
Thesis, e acentuando a Arsis ligeiramente, a interpretação pode resultar mais agradável e
musical”. (THURMOND, 1999, p.16). Observe a Figura 10.
24

Figura 10 – Indicação de Arsis e Thesis na teoria do Note Grouping

Fonte: Thurmond, 1999, p. 17.

2.2 Barra de Compasso

Antes da barra compasso, que surgiu em meados de 1.600, as divisões nas partituras
eram sinalizadas pelo repouso do final das semifrases e frases. Ou seja, até aquela época
nenhuma linha vertical separava as linhas melódicas, o que facilitava tocar ou cantar a ideia
musical ou frase, e não o compasso. Ao enfatizar erroneamente o compasso, gera-se uma
acentuação exagerada do primeiro tempo do compasso (Thesis), simplesmente por ela ser a
primeira dentro do compasso, que é a origem da interpretação musical inexpressiva.

Outro fator que contribui para prática de acentuar embaixo é o método desenvolvido
para escrita/grafia musical das notas. Este tipo de impressão na partitura contribui para
acentuar o início de cada batida, incentivando o músico a ideia de que essa nota tética é
importante. Conforme apontado na Figura 11, essa forma de escrita está exemplificada no
primeiro pentagrama. No segundo pentagrama, é dado o exemplo de como o músico deve
imaginar a grafia musical na hora de tocar.
25

Figura 11 - Escrita/grafia musical indicando acentuação na primeira nota de cada grupo

Fonte: Thurmond, 1999, p. 25.

2.3 Anacruse

Para compreender a metodologia, é necessário entender a importância da anacruse e da


arsis. Em seu livro, ele expõe diversos trechos de obras de grandes compositores, que provam
que a anacruse é, de fato, o elemento gerador base do movimento em uma frase musical. Em
seu livro, ele usa a afirmação de um famoso teórico da escola francesa, que diz:

Enquanto a teoria moderna reconhece somente compassos téticos,


começando com a batida embaixo e incluída sem as duas barras, escritores
antigos também admitiram compassos anacrúsicos começando com levare.
Eles ainda costumavam dizer que esta última combinação parecia-lhes a
mais regular; de fato, eles sempre falavam que a arsis antes da thesis, que, de
um ponto de vista, é muito lógico, toda batida deveria estar necessariamente
precedida de um levare. (GEVAERT, apud Thurmond, 1999, p. 27).

Thurmond, em seu livro, demonstra a importância de se reconhecer a Arsis na música


com diversos exemplos musicais, para que as notas certas sejam impulsionadas com
direcionamento. Um dos exemplos, é a sinfonia 1 de Beethoven, em que a Arsis está na
anacruse e não no tempo tético do início do compasso. Note a Figura 12.
26

Figura 12 - Arsis na anacruse

Fonte: Thurmond, 1999, p. 30.

2.4 Teoria Fundamental

Mathis Lussy3 (1903) afirma que o fator que gera o sentimento e a musicalidade na
interpretação é a anacruse. A partir disto, traça um paralelo com o nosso mecanismo de
respiração, colocando que existem dois momentos: inspiração e expiração. A inspiração pode
ser vista como um momento de ação e a expiração como repouso. O primeiro simboliza a
anacruse e o segundo o tempo forte. O autor explica em seu tratado L’Anacrouse dans la
Musique Moderne que a primeira coisa que acontece ao se vir ao mundo é a inspiração, tomar
ar, e a última é expirar, o último suspiro, o supremo repouso. Através destas relações com a
respiração, Lussy acredita que esta é a chave da origem dos ritmos binários e ternários.
Quando a pessoa esta acordada e em movimento, a respiração é em ritmo binário, como
mostra a Figura 13.4

3
Mathis Lussy (1828-1910). Musicólogo suíço-francês, famoso pelos seus tratados, entre eles, Histoire de la
notation musicale (1882) e Traité de I’expression musicale (1873), entre outros. Foi professor de música em
Paris, onde recebeu o prêmio da academia de Paris junto de Ernest David.
27

Figura 13 - Respiração em ritmo binário (RC = Respiração Completa; I = Inspirar; E = Expirar)

Fonte: Thurmond, 1999, p. 35.

Quando a pessoa está dormindo, a respiração é em ritmo ternário, pois a expiração é


aproximadamente o dobro que a o ato da inspiração do ar. Veja a Figura 14.

Figura 14 - Respiração em ritmo ternário (RC = Respiração Completa; I = Inspirar; E = Expirar)

Fonte: Thurmond, 1999, p. 35.

2.5 Padrões Naturais e Artificiais

Depois de terem sido compreendidos os conceitos de Arsis e Thesis e como classificá-


los nos motivos, temas, frases, etc, o autor criou padrões para a junção de Arsis e Thesis,
porém de diferentes formas em compassos simples e compostos. (binário e ternário).
28

O primeiro é chamado de Padrão Natural por ter divisões naturais, ou seja, ritmos
simples binários e ternários, que são unidos da seguinte forma: Thesis-Arsis (T-A). Já os
Padrões Artificiais compreendem os ritmos compostos binários e ternários – notas pontuadas
– e são classificadas da seguinte forma: Thesis-Arsis-Arsis (T-A-A). Para divisões com mais
de três notas, a primeira é Thesis e as notas restantes Arsis.

2.6 Aplicação e Uso do Note Grouping

Neste segmento serão expostos somente os padrões necessários para interpretação da


obra Bagatelle. Esclarece-se que para ter conhecimento de como aplicar todos os padrões em
outras situações musicais, é necessário consultar o próprio livro. Cada padrão será designado
nos exemplos como P, Thesis como T e Arsis como A.

A-) Aplicação em Ritmo Binário e Quaternário

A Figura 15 exemplifica o padrão Thesis/Arsis em ritmo binário, enquanto a Figura 16


expõe o mesmo padrão em ritmo quaternário.

Figura 15 - Padrão Thesis/Arsis em ritmo binário

Fonte: Thurmond, 1999, p. 37.


29

Figura 16 - Padrão Thesis/Arsis em ritmo quaternário

Fonte: Thurmond, 1999, p. 37.

B-) Aplicação em ritmo quaternário com anacruse

Na Figura 17 nota-se o padrão Arsis/Thesis em ritmo anacrúsico.


30

Figura 17 - Arsis/Thesis em ritmo anacruse

Fonte: Thurmond, 1999, p. 44.

C-) Aplicação em Ritmo Ternário

A aplicação do padrão Thesis/Arsis/Arsis em ritmo ternário é exemplificada nas

Figuras 18 e 19.

Figura 18 - Thesis/Arsis/Arsis em compasso ternário

Fonte: Thurmond, 1999, p. 38.


31

Figura 19 - Thesis/Arsis/Arsis em compasso ternário

Fonte: Thurmond, 1999, p. 38.

D-) Aplicação em Tercinas

Na Figura 20 vê-se o padrão Thesis/Arsis/Arsis aplicado em tercinas.

Figura 20 - Thesis/Arsis/Arsis em tercinas

Fonte: Thurmond, 1999, p. 40


32

E-) Aplicação em Quiálteras de 4 e 5.

Na Figura 21 exemplifica-se o padrão Thesis/Arsis/Arsis/Arsis em quiálteras de 4 e o


padrão Thesis/Arsis/Arsis/Arsis/Arsis em quiálteras de 5.

Figura 21 - Padrão Thesis/Arsis em quiálteras de 4 e 5

Fonte: Thurmond, 1999, p. 40.

F-) Aplicação na ausência da Thesis

Nos casos de ausência da Thesis, indica-se o modelo apresentado na Figura 22.

Figura 22 - Modelo para aplicação na ausência da Thesis

Fonte: Thurmond, 1999, p. 57.


33

G-) Aplicação em escalas

No caso de escalas, Thurmond (1999) propõe o modelo Arsis/Thesis apontado na


Figura 23.

Figura 23 - Aplicação em escalas

Fonte: Thurmond, 1999, p. 66.

H-) Aplicação em arpejos

Nas sequências de arpejos indica-se o padrão exemplificado na Figura 24.

Figura 24 - Modelo proposto para as sequências de arpejos

Fonte: Thurmond, 1999, p. 67.


34

3 NOTE GROUPING APLICADO NA BAGATELLE

Esta seção apresenta a aplicação da ferramenta do Note Grouping na parte da trompa


de Bagatelle. Para que haja uma compreensão clara deste estudo, dividiu-se a parte da trompa
em 9 seções, destacando-se em cada uma delas a aplicabilidade das ferramentas propostas por
Thurmond na obra. Os colchetes servem apenas para facilitar a visualização dos padrões,
ressaltando-se que as notas que devem ser impulsionadas são as Arsis com repouso nas
Thesis. A Tabela 1 mostra a divisão da peça em seções.

Tabela 1 - Neuling, Bagatelle, divisão em seções

Seção 1 2 3 4 5 6 7 8 9

Compassos 1-13 14-27 28-41 42-57 57-64 65-74 75-86 86-92 93-111

Organizada pela pesquisadora


35

3.1 Aplicação na Bagatelle

A-) Seção 1

A seção 1 vai dos compassos 1 a 13, e para esta seção indica-se o modelo Arsis/Thesis
indicado na Figura 25.

Figura 25 – Aplicação da seção 1 (c. 1-13)

Neuling, Bagatelle, seção 1 – aplicação


36

B-) Seção 2

Na seção 2 (compassos 14 a 27) propõe-se o modelo apontado na Figura 26.

Figura 26 - Aplicação da seção 2 (c. 14-27)

Neuling, Bagatelle, seção 2 – aplicação


37

C-) Seção 3

Para a performance da seção 3, que abrange os compassos 28 a 41, adota-se o modelo


apresentado na Figura 27.

Figura 27 - Aplicação da seção 3 (c. 27-41)

Neuling, Bagatelle, seção 3 – aplicação


38

D-) Seção 4

A seção 4 (compassos 42 a 57) deve seguir o modelo apontado na Figura 28.

Figura 28 - Aplicação da seção 4 (c. 42-57)

Neuling, Bagatelle, seção 4 – apliação


39

E-) Seção 5

A aplicação na seção 5 (compassos 57 a 64) é apresentada na Figura 29.

Figura 29 - Aplicação da seção 5 (c. 57-64)

Neuling, Bagatelle, seção 5 – aplicação


40

F-) Seção 6

Para a seção 6 (compassos 65 a 74) indica-se o modelo Thesis/Arsis apontado na


Figura 30.

Figura 30 - Aplicação da seção 6 (c. 57-64)

Neuling, Bagatelle, seção 6 – aplicação


41

G-) Seção 7

A seção 7, que vai dos compassos 75 a 86, deve seguir o modelo Thesis/Arsis indicado
na Figura 31.

Figura 31 - Aplicação da seção 7 (c. 75-86)

Neuling, Bagatelle, seção 7 – aplicação


42

H-) Seção 8

A seção 8 compreende os compassos 86 a 92, devendo orientar-se pelo modelo


proposta na Figura 32.

Figura 32 - Aplicação da seção 8 (c. 86-92)

Neuling, Bagatelle, seção 8 – aplicação


43

I-) Seção 9

Para a seção 9 (compassos 93 a 111) deve-se orientar pelo modelo mostrado na Figura
33.

Figura 33 - Aplicação da seção 9 (c. 93-111)

Neuling, Bagatelle, seção 9 – aplicação

Desta forma conclui-se a aplicação da Bagatelle, atestando a contribuição da


metodologia Note Grouping ao intérprete no que se refere ao aprimoramento da performance.
44

CONCLUSÃO

O presente trabalho teve como proposta expor os benefícios que o interprete obterá
fazendo uso da metodologia Note Grouping, não somente nesse repertório em específico
analisado, mas em todas performances e estudos, independentemente do instrumento que toca,
alcançando assim, interpretações mais interessantes para o ouvinte.

Apresentar esta metodologia teve como finalidade uma possível contribuição para o
músico acerca da expressividade musical, contudo sem a pretensão de encerrar o assunto, uma
vez que existem diversas sugestões de interpretações musicais com uso do Note Grouping e
também outras ferramentas com o mesmo intuito, que podem ser experimentadas, a fim de
auxiliar o músico em aprimorar sua performance.

Este estudo apontou que o conceito de agrupar as notas, sempre levando em consideração
que a Arsis é a criadora dos impulsos, e sendo levemente acentuada, cria maior expressão e
musicalidade em todas as frases musicais. Não se pode olvidar que é necessário um tempo de
maturação para internalizar o conceito de James Thurmond, já que é um processo que pode levar
alguns meses, tendo em vista que durante toda vida de estudos o músico pode ter criado o hábito
de acentuar ou dar ênfase às notas erradas, no caso, às Thesis. Depois dessa fase de
compreensão, acabam-se tornando naturais as ênfases e intenções dadas ao Arsis (anacruse) e,
como consequência, no repouso do Thesis (tético) da nota ou tempo seguinte.

Vale ressaltar que no final do livro, Thurmond também evidencia trechos musicais e
gravações disponibilizadas via Youtube ou CDs, grandes intérpretes empregando o Note Grouping
em suas performances. Elucida-se que, mesmo intérpretes que não tenham conhecimento da
metodologia em si, realizam grandes performances de música erudita chamando a atenção dos
ouvintes, exatamente por impulsionar as frases nas Arsis, gerando a musicalidade que todos nós
ouvimos, mas não sabemos como recriar.

Desta forma corrobora-se a relevância desta metodologia nos estudos de performance.


45

REFERÊNCIAS

AMADO, Paulo Vinícius. A expressividade no Choro: um estudo de Ingênuo de Pixinguinha


sob a ótica da teoria do Note Grouping de James M. Thurmond. ABRAPEM – Universidade
Estadual de Campinas. Campinas, 2016

CORDÃO, Cícero. Note Grouping: Uma Ferramenta Interpretativa Como Facilitadora do


Aspecto Técnico do Trompete no Concerto de Edmundo Villani-Côrtes.Dissertação de
Mestrado. Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2010.

LIMA, Sonia Albano. Uma metodologia de interpretação musical. São Paulo: Musa, 2005.

LUSSY, Mathis. Traité de L’expression musicale (Lussy, Mathis). Paris: Hengel, 1874.

LUSSY, Mathis. L’Anacrouse dans la Musique Moderne, Paris: Hengel,, 1903.

MOURA JUNIOR, Nivaldo Camargo de. Agrupamento de notas: aplicação do conceito


interpretativo no estudo para trompete em Dó, de Camargo Guarnieri. 2017. 39 f. Dissertação
de Mestrado. Universidade Federal de Goiás. Goiânia, 2017.

SADIE, Stanley (2 Ed.). The New Grove Dictionary of Music and Musicians. London:
McMillan, 2001.)

STONESTREET, Robert. Correspondência Privada.

THURMOND, James Morgan. Note Grouping: A Method for Achieving Expression and Style
in Musical Performance. Del Ray Beach: Meredith Music Publications, 2000.

THURMOND, James Morgan. Note Grouping: A Method for Achieving Expression and Style
in Musical Performance.Meredith Music Publications, 2000. Trad. Gustavo Nápoli.
Dissertação de Mestrado. Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 1999.

THURMOND, J. M. Note Grouping. A method for achieving expression and style. In:
Musical Performance. Galesville: Meredith Music Publications, 1991.
46

PARTITURAS

NEULING, Hermann. Bagatelle für Horn und Piano (1897).

______. 30 Spezial-Etüden für Tiefes Horn. <https://www.stretta-


music.com/en/hermann-30-spezial-etueden-nr-104900.html>. Acesso em 27/09/2017.

______. 18 Studien. <http://poperepair.com/neuling-hermann-18-low-horn-studies/>.


Acesso em 27/09/2017.

______. 15 Technische Etüden für Hohes Horn. <http://poperepair.com/neuling-


hermann-15-high-horn-studies/>. Acesso em 27/09/2017.

______. Grosse F und B Hornschule. Heft I und II.


:<https://www.zvab.com/servlet/BookDetailsPL?bi=21635106587&searchurl=hl%3Don%26t
n%3Dgrosse%2Bf%2Bund%26sortby%3D20%26an%3Dneuling>. Acesso em 27/09/2017.

______. Jagd-Quartett. <https://www.music-station.eu/neuling-hermann-jagd-quartett-


ueber-deutsche-202130.html>. Acesso em 27/09/2017.

______. Trios für Drei Hörnet. <https://shop.musikhaus-laimer.at/Trios-Neuling-


Hermann-BLECHPRESSE6006-385797.html>. Acesso em 27/09/2017.

SITES

Arlington National Cemetery Website. Disponível em:


<http://www.arlingtoncemetery.net/thurmond.htm.>. Acesso em 17/08/2017.

Last Row Music - Online Resources for Brass Musician. Disponível em


<www.lastrowmusic.com/horn/auditions/>. Acesso em: 04/09/2017.

Musikalien Petroll. Disponível em:


<http://www.notenpetroll.de/de/produkte/neuling-hermann-trios?page=1>. Acesso em
09/09/2017.
47

ANEXO

Bagatelle de Hermann Neuling - Parte da Trompa


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