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Rudolf Steiner

A PRESENÇA DOS MORTOS NO CAMINHO


ESPIRITUAL

GA 154

Tradução livre: Lucinda Dias


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A Presença dos Mortos no Caminho Espiritual


RUDOLF STEINER

GA 154

Nestas palestras, Rudolf Steiner lida com as relações que as pessoas, como seres
espirituais que vivem no mundo físico, têm com aqueles que cruzaram o limiar e vivem
no mundo espiritual. Ele mostra como uma compreensão da nossa natureza espiritual
revela possibilidades de conhecer o mundo que são negadas pelo materialismo.

O tom dessas palestras, que tratam de exemplos retirados da própria experiência de


Steiner e das vidas daqueles que já morreram e que eram pessoalmente conhecidos por
ele - Robert Hamerling, Maria von Strauch-Spettini, Christian Morgenstern e Oda
Waller - é excepcionalmente calorosa e comovente.

CONTEÚDO

Palestra I: ENTENDENDO O MUNDO ESPIRITUAL (primeira parte)

18 de abril de 1914
A natureza do sonho.
Alucinação.
Substância etérica e aumento da força da alma.
O roteiro esotérico.
Pensamento comum e suprassensível.
Os antigos fundadores das religiões e da moderna Ciência Espiritual.
A natureza de Cristo.
Mais sobre o sonhar.
A natureza do corpo astral.
A imagem do Eu como foco de experiências no mundo espiritual.
Clarividência atávica e julgamento saudável.
Pensamento claro como pré-condição para a Ciência Espiritual.

Palestra II – ENTENDENDO O MUNDO ESPIRITUAL – (segunda parte)

12 de maio de 1914

A relação de Johann Gottlieb Fichte com o mundo espiritual e com seu ambiente
humano.
A distinção entre percepção física e espiritual.
O destino de uma amiga (Maria von Strauch-Spettini) e sua elevação ao espírito
guardião dos Dramas Misteriosos.
O falecido amigo e poeta (Christian Morgenstern) e sua natureza na vida após a
morte.
A representação do edifício Dornach na imprensa.
A formação do juízo com base na Ciência Espiritual.
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Palestra III – O DESPERTAR DE PENSAMENTOS DE ESPIRITUAIS

5 de Maio, 1914
Sobre o sono.
O contraste entre sangue e sistema nervoso durante o sono e o resto
do organismo durante o sono.
Germes e fantasmas.
A natureza dos germes.
Pensamentos espirituais como alimento para os mortos.
Superando o egoísmo em relação aos mortos.
Sobre a morte de um amigo (Christian Morgenstern): Os fundadores das religiões e
seu significado.
A humanidade moderna vem de antigamente.
O feito de Cristo.
A natureza do mundo físico.
A premissa subjacente ao edifício Dornach.
Desenvolver os processos de pensamento como a tarefa dos nossos tempos.
A expulsão de um membro e as razões para esta ação.

Palestra IV – A PRESENÇA DOS MORTOS EM NOSSA VIDA


25 de Maio, 1914

• Consciência e Sonhos clarividentes


• A Diferença entre a forma e a ação do falecido.
• Adquirindo novos conceitos, para entender o mundo espiritual.
• Um indivíduo falecido (Maria von Strauch-Spettini) como protetor das atuações do
Drama de Mistério.
• Joana D’Arc.
• Experienciando os Anjos (suavidade) e os Arcanjos (força).
• O personagem de um amigo e poeta após a morte. (Christian Morgenstern)
• A experiência do mundo espiritual.
• Anjos, Arcanjos, Lúcifer e Ahriman.
• A transformação de experiências no mundo físico e no espiritual.
• O enriquecimento do pensamento.
• O edifício de Dornach.
• A essência do movimento antroposófico.
• A inauguração do prédio.

Palestra V – A BÊNÇÃO DOS MORTOS


26 de Maio, 1914
• A Ciência Espiritual como “Química Espiritual”
• Concentração e Meditação.
• Percepção da palavra interna.
• Ilusão e autoconhecimento.
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• A Natureza dos encontros com o falecido.


• Inspiração do sentimento e vontade de Rudolf Steiner, através de uma
amiga falecida (Oda Waller).
• O pensar se torna independente.
• O aprimoramento do pensamento lógico, através
do conhecimento clarividente.
• A concordância entre inteligência e clarividência.
• O firmamento espacial e temporal.
• Giordano Bruno e a Ciência Espiritual rompem
esses firmamentos.
• Os limites do conhecimento e sua refutação.
• Ciência Espiritual como síntese da Ciência do
Intelecto e da pesquisa clarividente.

Palestra VI - FÉ E CONHECIMENTO (Praga, 17 de abril de 1914)

Palestra VII - ROBERT HAMERLING: POETA E PENSADOR


Berlim, 26 de abril de 1914

PALESTRAS I E II

Proferidas em Kassel, 09 e 10 de maio de 1914.

COMO O MUNDO ESPIRITUAL INTERPENETRA O FÍSICO


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PALESTRA I

ENTENDENDO O MUNDO ESPIRITUAL


(PRIMEIRA PARTE)

Berlim, 18 de abril de 1914

Quando vocês se lembram de um sonho, provavelmente será bem óbvio que,


durante o sonho, vocês apenas observaram as imagens tecendo, diante de suas
almas, sem terem uma clara consciência de si mesmos. A autoconsciência, então,
não é tão clara no sonho, quanto na consciência desperta. As imagens, tecidas
diante da alma, apresentam dois tipos de cenas. Há uma série de imagens
familiares ao sonhador, porque elas se relacionam a eventos recentes, ou não tão
recentes, ou cenas em que tais eventos são alterados de várias maneiras, alterados
de tal forma, que ocorrências específicas são irreconhecíveis e pensamos, que
estamos sonhando com algo completamente novo. Podemos, de fato, ter sonhos
que não estão ligados a nenhuma experiência que tivemos e, portanto, são
completamente novos. Mas, em cada caso, teremos a sensação de que um tipo de
vida foi revelado à alma, em imagens tecidas. É disso que nos lembramos, depois
de acordar. Alguns sonhos permanecem em nossa memória por mais tempo e
outros parecem desaparecer, tão logo tenhamos que lidar com os eventos do dia.
Então hoje, vamos examinar o que percebemos em tais sonhos tecidos.
Nós sabemos o que percebemos, quando estamos acordados neste mundo, que
chamamos de físico. Mas o que preenche nossa percepção, quando sonhamos, da
mesma forma como eventos e coisas materiais preenchem nossa experiência
diurna? É o que chamamos de mundo etérico, a substância etérica, que permeia
o mundo com seus processos internos e com tudo o que vive nele. Essa é a
essência, por assim dizer, de nossas percepções, quando sonhamos. Mas,
geralmente, percebemos, apenas, uma parte muito pequena do mundo etérico, ao
sonhar. O mundo etérico é inacessível para nós, quando estamos acordados e
percebemos o reino físico; não podemos perceber a substância etérica, ao nosso
redor, com nossos sentidos físicos. Da mesma forma, não podemos perceber tudo
isso em nossos sonhos comuns, mas apenas uma parte deles, a saber, nosso
próprio corpo etérico. Como vocês sabem, deixamos nossos corpos físico e etérico
para trás, no sono. Em nossos sonhos habituais, olhamos para trás, por assim
dizer, de dentro do nosso corpo astral e do que deixamos para trás, no sono.
No entanto, não estamos conscientes do nosso corpo físico e não usamos nossos
sentidos físicos. Ao invés disso, olhamos para trás, apenas para o nosso corpo
etérico. Fundamentalmente, portanto, processos em nosso corpo etérico se
revelam em certos lugares e os percebemos como sonhos. De fato, a maioria dos
sonhos nada mais é do que olhar para o nosso corpo etérico, durante o sono, e
tomar consciência de alguns de seus processos extremamente complexos. Nosso
corpo etérico é muito complexo e contém todas as nossas memórias, prontas para
se apresentarem à nós, quando as recordarmos. Mesmo aquelas coisas, que se
afundaram nas profundezas da alma, coisas das quais não estamos conscientes,
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na consciência desperta, estão contidas no corpo etérico, de alguma forma. Toda


a nossa vida nesta encarnação é retida no corpo etérico; está realmente presente
nele. Claro, isso é muito difícil de imaginar, mas é verdade, no entanto. Imaginem
que vocês falaram o dia todo, como algumas pessoas fazem, e tudo o que vocês
disseram, foi gravado em discos. Quando o primeiro disco está cheio, vocês
pegam um segundo, depois um terceiro e assim por diante. O número de discos
dependerá de quanto vocês falaram. Agora, se alguém colecionasse todos os
discos, tudo que vocês disseram, estaria bem preservado neles, no final do
dia. Então, se alguém gravou tudo o que vocês disseram durante o dia, poderia
ser ouvido novamente. De um modo semelhante, todas as nossas memórias são
retidas no corpo etérico. Sob as condições especiais do sono, uma parte do corpo
etérico aparece diante de nós, como se - para ficar com essa metáfora -
pegássemos um disco da coleção e o tocássemos; este é o tipo mais comum de
sonho. Assim, nossa consciência tece, em nosso próprio corpo etérico. O mesmo
se aplica às alucinações, que afetam nossa alma. Por via de regra, tais alucinações
surgem, porque a pessoa pode ver, com o Eu e o corpo astral, que ainda estão no
corpo físico, uma secção do corpo etérico, que se separou. Isso pode acontecer,
quando uma parte do seu corpo físico está doente, o Sistema Nervoso, por
exemplo. Seu corpo etérico é, então, incapaz de penetrar no físico, no ponto em
que o Sistema Nervoso está doente; é lançado lá fora, por assim dizer.
O próprio corpo etérico não está doente, mas foi separado do corpo físico, num
lugar específico. Se ele pudesse permanecer no corpo físico, nosso estado normal
de consciência prevaleceria e não estaríamos conscientes de que nosso corpo
físico está doente. Quando, a parte do nosso corpo etérico, que não consegue
penetrar, resplandece nessa substância etérica, a partir da qual os sonhos ou
alucinações se desenvolvem, o mundo todo nos envolve. E nosso próprio corpo
etérico é como uma secção, que foi cortada dessa substância etérica. Depois de
passar pela porta da morte e descartar nosso corpo físico, passamos por essa
substância etérica e nunca a deixamos, em nossa caminhada, entre a morte e um
novo nascimento. Está em toda parte e nós temos que passar por ela; nós estamos
nela. Algum tempo depois da morte, descartamos nosso corpo etérico, que se
dissolve nessa substância etérica circundante. Geralmente, não podemos
perceber essa substância etérica exterior. É por isso que não temos nada no
mundo etérico, que possa ser chamado de percepção, paralelo à percepção no
mundo físico. Nossas percepções do etérico, em nossos sonhos, dependem
completamente de nós. A verdadeira percepção do mundo etérico, após a morte
ou aqui na Terra, na imaginação clarividente, exige maior força do que
habitualmente temos, entre o nascimento e a morte. Precisamos de maior força
interior da alma. Nós não percebemos o mundo etérico ao nosso redor, durante a
vida terrena, porque nos falta suficiente força de alma. Para perceber o mundo
etérico, devemos nos tornar muito mais ativos, trabalhar muito mais do que na
vida cotidiana. Depois da morte, também, a alma deve ser preenchida com muito
mais força ativa, do que na vida cotidiana, para se relacionar com seu ambiente.
Caso contrário, não perceberemos o mundo etérico, assim como não
perceberíamos nada, se nos faltassem todos os sentidos no mundo físico.
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Assim, precisamos de uma força de alma mais ativa, para encontrar nosso
caminho após a morte e não ser surdos e cegos, figurativamente falando, para o
mundo em que entramos. Para termos uma ideia mais clara de como a alma
percebe, após a morte, ou depois de desenvolver as faculdades para a Imaginação,
vamos comparar essa faculdade da alma com a escrita. O que vocês escrevem,
expressa algo que está por trás de suas palavras; ainda assim, são vocês quem
colocam as letras. Vocês têm o poder de tornar verdadeiro o que vocês escrevem,
para corresponder a um estado objetivo de coisas. Se vocês quiserem informar
um amigo distante, sobre algo e escrever para ele, são vocês que formam as
palavras, que vão dizer ao amigo sobre o fato. Alguém pode objetar, que esse fato
não existe no mundo como um fato objetivo, mas é apenas o que alguém
escreveu. Isso é um absurdo, claro. É possível descrever um fato objetivo, com as
letras que vocês usaram para escrever. O mesmo se aplica à percepção
imaginativa no mundo suprassensível. Vocês têm que estar ativos. Vocês têm que
estabelecer os sinais, as letras que expressam os processos objetivos no mundo
espiritual, e vocês devem estar cientes, de que isto é o que vocês estão fazendo. Se
vocês podem fazer isso ou não, depende de se vocês têm a força necessária para
um relacionamento vivo com a realidade espiritual, se isso os inspira a estabelecer
a verdade e não as falsidades. Mas o fato permanece: vocês têm que saber o que
estão estabelecendo: se isso lhes inspira a estabelecer a verdade e não as
falsidades. Agora, vamos retornar aos sonhos. Quando sonhamos, geralmente
sentimos que as imagens dos sonhos “tecem” e simplesmente se desenrolam por
conta própria. Devemos pensar nesses sonhos, como imagens que flutuam pela
alma. Agora, suponham que vocês estivessem pensando, que vocês mesmos
colocariam as imagens dos sonhos no Espaço e no Tempo, da mesma forma que
colocavam as letras no papel. Não é isso que normalmente associamos a sonhos
ou a alucinações, mas é o tipo de consciência necessária, para o pensamento
imaginativo. Vocês devem estar cientes de que, vocês são o poder determinante
em seus sonhos. Vocês colocam uma coisa atrás da outra, assim como fazem,
quando escrevem alguma coisa no papel. Vocês mesmos estão no controle. O
mesmo poder está atrás de vocês, que faz com que o que vocês escrevem seja
verdadeiro. A grande diferença entre sonhos ou alucinações e a verdadeira
clarividência é que, nesta última, estamos cônscios de que somos escribas
esotéricos, por assim dizer. As coisas que vemos, são anotadas como um roteiro
esotérico. Nós inscrevemos no mundo, o que percebemos como expressão, como
revelação do mundo. Aqui, as pessoas poderiam objetar, que não precisamos
escrever essas coisas, porque elas são conhecidas, de antemão.
Mas isso não é válido, pois, neste caso, não somos nós que escrevemos, mas o Ser
da próxima Hierarquia Superior. Nós nos entregamos à esse Ser e isso se torna a
força, que nos governa. Em um processo interior da alma, registramos o que nos
influencia. Quando vocês olham para este roteiro esotérico, vocês lerão o que foi
revelado. É por isso, que tenho dito tantas vezes, em palestras públicas, que o
desenvolvimento da clarividência requer, que toda percepção se torne ativa e não
permaneça a abertura passiva no mundo, que é apropriada para entender nosso
ambiente físico. Gradualmente, então, compreenderemos o que chamamos de
"aprender a escrita esotérica", desde o início de nosso trabalho antroposófico.
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Eu descrevi isso, com mais detalhes, em O limiar do mundo espiritual.


Para escrever a escrita esotérica no espaço espiritual e no tempo espiritual, nossa
alma deve ser mais ativa e poderosa, do que precisa ser na vida
cotidiana. Precisamos dessa força maior, quando passamos pelo portão da
morte. Se vocês procuram a clarividência imaginativa, vocês conseguirão,
gradualmente, através da meditação. Vocês experimentarão e perceberão,
sabendo o tempo todo, que vocês estão num mundo, do qual nossos sonhos são,
apenas, um reflexo fraco. Vocês podem viver nesse mundo, de tal forma, que
possam controlar seus sonhos, assim como vocês estão no controle, quando
montam uma mesa ou colocam um sapato. Muitas pessoas objetam, que tentaram
meditar de todas as maneiras, mas ainda não estão se tornando
clarividentes. Essa falta de clarividência mostra, simplesmente, que elas não
querem realmente a atividade e a força, que acabei de descrever. Elas se
consideram afortunadas, porque não precisam delas. Elas não querem
desenvolver nenhuma força ativa da alma, mas querem se tornar clarividentes,
sem ter que adquirir essa força, primeiro. Elas querem, que o tableau, que
surgiria diante delas, através da clarividência, apareça por si mesmo. Mas isso
não seria nada além de alucinar ou sonhar. Para ser franco, um sonho é uma parte
do mundo etérico, que podemos tomar, com nossos sentidos etéricos e nos mover
de um lugar para outro. Isso não tem nada a ver com a verdadeira
clarividência. Ao experimentar a verdadeira segunda visão, somos tão ativos
quanto somos no mundo físico escrevendo no papel. A única diferença é que,
quando queremos escrever no mundo físico, precisamos saber primeiro, o que
queremos anotar - pelo menos, geralmente ajuda, se o fizermos. Em contraste, na
percepção espiritual, permitimos que os Seres das Hierarquias espirituais
escrevam e só então, enquanto escrevemos, aparecem as coisas, que devemos
perceber. A clarividência real não pode acontecer sem o nosso envolvimento
ativo, em todos os aspectos da nossa percepção. Também precisamos da força,
que nos capacita a escrever no mundo etérico, quando passamos pelo portão da
morte. O tipo de pensamento que nos serve bem no mundo físico, não serve para
a percepção, após a morte. Uma pessoa pode ser excessivamente esperta e
inteligente sobre as coisas do mundo físico, mas, depois da morte, essas
capacidades não ajudarão. Esse tipo de pensamento é muito fraco, para escrever
qualquer coisa no mundo etérico. Todas as ideias que desenvolvemos, relativas
às coisas físicas, têm sua origem neste pensamento fraco, que é inútil após a
morte. Precisamos de um tipo de pensamento mais forte, que seja interiormente
ativo por vontade própria. Precisamos pensar como formar pensamentos, que
não reflitam, apenas, o mundo dos sentidos externos. Precisamos desenvolver
essa capacidade interior para formar pensamentos, independentes de qualquer
coisa externa que surja, por assim dizer. Agora, vocês podem objetar, que nós
poderíamos apenas pensar em todos os tipos de coisas ou criar muitas fantasias,
que não refletem nada externo, e, então, estaríamos bem preparados para
desenvolver a força do pensamento, necessária após a morte. Pode ser que
alguém queira ter uma grande capacidade de raciocínio após a morte e, portanto,
imagine dragões alados, que não existem, feras terríveis e assim por diante. A
pessoa imagina todas essas coisas, de modo a não ficar presa aos fios de imagens
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exteriores e a poder desenvolver a força interior do pensamento, em preparação


para a vida após a morte. Não pode ser negado - as pessoas que fazem isso, terão
maiores faculdades no mundo após a morte, do que aquelas que não o fazem. No
entanto, elas só perceberiam imagens falsas, distorções, assim como as pessoas,
com visão prejudicada, veem uma imagem distorcida do mundo físico e aquelas
com audição danificada, têm uma falsa impressão de seus sons. As pessoas, que
seguem esse curso de ação, sentenciam-se a perceber nada além de coisas
grotescas no mundo etérico, ao invés do que realmente está enraizado ali. Em
períodos passados do desenvolvimento humano, sempre foi tomado cuidado para
assegurar, que os Seres humanos recebessem imagens mentais, não emprestadas
do mundo físico, nem criadas da maneira arbitrária e fantástica, que acabei de
descrever. De acordo com os métodos disponíveis para eles, os grandes
fundadores de nossas religiões, transmitiram imagens não baseadas no mundo
físico, mas no mundo espiritual. Assim, seguindo seus professores religiosos, as
pessoas foram capazes de desenvolver imagens mentais, que não estavam ligadas
ao mundo sensorial, mas mesmo assim eram verdadeiras, porque se originaram
no mundo espiritual. Esta é a grande educação da raça humana empreendida
pelos fundadores de nossas religiões. Eles se propuseram a tarefa de dar, aos
Seres humanos, imagens que os ajudassem a desenvolver um tipo de pensamento,
que os impedisse de chegar espiritualmente surdos e cegos no mundo espiritual,
após a morte. Os fundadores de nossas religiões queriam ter certeza, de que os
Seres humanos estavam totalmente vivos, plenamente conscientes e que sua
consciência não desapareceria ou definharia em sua hora de morte, ou se tornaria
uma falsa consciência. Como já disse muitas vezes, estamos vivendo, atualmente,
num estágio de evolução, no qual os Seres humanos têm a intenção de
amadurecer, por assim dizer. Os fundadores religiosos não aparecerão mais,
como fizeram anteriormente e apelarão para nossa fé. Esses tempos são passados,
embora, claro, eles ainda atinjam o nosso tempo. Atualmente, apenas algumas
pessoas estão começando a experimentar essa nova existência, por assim dizer. A
maioria ainda deseja se apegar às ideias tradicionais, dos antigos fundadores das
religiões. Mas a humanidade deve atingir a maioridade e o que os fundadores das
religiões proveram, para nossa fé, deve ser substituído pela contribuição da
Ciência Espiritual moderna. Pois esta Ciência do Espírito é, por natureza,
completamente diferente daqueles ensinamentos antigos. A fim de evitar mal-
entendidos, devemos enfatizar que, quando falamos dos antigos fundadores
religiosos, não estamos incluindo Cristo, entre eles. Eu tenho dito
frequentemente, que o significado de Cristo não está em seus ensinamentos, mas
no que aconteceu, através dele. Os antigos fundadores religiosos eram, em certo
sentido, professores, mas o principal ato de Cristo foi impregnar a humanidade
com o seu próprio Poder, através do Mistério do Gólgota. Até hoje, isso tem sido
extremamente difícil para muitas pessoas entenderem. É por isso que elas falam
de Cristo como um grande Mestre Cósmico. Para aqueles, que realmente
entendem o pleno significado de Cristo, isso é simplesmente um absurdo. A
humanidade está amadurecendo, através da nossa Ciência Espiritual moderna,
através dos conceitos, ideias e imagens, que estão ligados à nossa vida após a
morte e, portanto, com toda a nossa vida da alma. Pois a Ciência Espiritual pode
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ser entendida, por todas as pessoas que querem entender suas descobertas. Ela
se esforça para dar às pessoas, o que cada alma individual pode, realmente,
alcançar por si mesma, não seguindo os fundadores religiosos, como nos tempos
antigos. E, embora devam ser pesquisadores individuais, que disponibilizam os
resultados dessa Ciência do Espírito hoje, eles o fazem de uma forma, que podem
ser compreendidos, por todos que quiserem. Muitas vezes enfatizei, que é um
completo equívoco dizer, que a Ciência Espiritual também deve ser
acreditada. Quando as pessoas dizem isso, é porque elas estão tão apinhadas de
preconceitos materialistas, que não olham para o que a Ciência Espiritual
realmente tem a oferecer. Assim que é examinado, tudo se torna
compreensível. Não é preciso clarividência para isso; nossa compreensão comum
é suficiente, para realmente conhecer e compreender tudo isso gradualmente - é
claro que “gradualmente” será inconveniente para algumas pessoas. Em outras
palavras, a Ciência Espiritual apela ao nosso entendimento, fazendo uso do
princípio oposto ao usado pelos antigos fundadores religiosos. Suas ideias
doavam algo às almas humanas, que as despertavam espiritualmente e lhes
davam força para perceber dentro do mundo etérico e isso também significava,
levar uma vida consciente, após a morte. A assimilação da Ciência Espiritual
moderna, por sua vez, dará à nossa alma, a força para desenvolver o poder
necessário de pensar, após a morte, para perceber conscientemente seu ambiente
etérico. Ambas as pessoas, dos tempos antigos - que seguiram seus fundadores
religiosos - e pessoas modernas - que estão dispostas a entender a Ciência
Espiritual - serão capazes de encontrar o caminho, após a morte. Apenas um tipo
de pessoa terá dificuldade em encontrar seu caminho, após a morte. De fato, esse
tipo, frequentemente, nem mesmo experimenta uma vida após a morte, porque
se tornou tão entorpecido e obscuro. Esse tipo de pessoa é o materialista
empedernido, que se agarra às imagens do mundo físico e não quer desenvolver
nenhuma força, para perceber o mundo em que entramos, depois da morte. Em
termos do anímico-espiritual, ser materialista significa, na verdade, o mesmo que
querer destruir os próprios olhos e ouvidos no mundo físico, amortecendo os
sentidos gradualmente. Não é diferente do que alguém dizer: “Esses olhos - eles
não são confiáveis, fornecem apenas impressões de luz. Fora com eles! Esses
ouvidos - eles percebem apenas vibrações, não a única verdade. Livre-se
deles! Livre-se dos sentidos, um por um”! Ser um materialista, em relação ao
mundo espiritual, faz tanto sentido quanto essa atitude, em relação ao mundo
sensorial. É basicamente o mesmo - como será fácil ver, quando consideramos o
raciocínio apresentado pela Ciência Espiritual. Hoje eu tentei explicar, a partir
dessa perspectiva, o que significa estar no mundo espiritual. Eu quero continuar
a explicar um tipo de sonho, que todos nós reconheceremos, porque todos
provavelmente já experimentamos um sonho desse tipo. Estou falando de
sonhos, em que nos encontramos frente a frente conosco, por assim dizer. Como
descrevi anteriormente, geralmente o tecido do sonho se desenrola diante de nós,
por assim dizer, e não temos consciência clara de nós mesmos, naqueles
momentos. É só depois, que refletimos sobre o sonho, com autoconsciência. Há
também outros sonhos, em que nos enfrentamos objetivamente. E além de
simplesmente nos vermos, como às vezes acontece, também podemos ter o
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sonho, que nossos alunos costumam ter, de sentar na escola, tentando resolver
um problema de aritmética, mas incapazes de resolver a equação. Outra pessoa
vem e encontra a solução, facilmente. O aluno realmente sonha que isso
acontece. Bem, vocês entenderão, que foi ele mesmo quem veio e resolveu o
problema. Assim, também é possível que nos enfrentemos dessa maneira sem, no
entanto, nos reconhecermos. Mas isso não é o importante. Em tal situação, eu me
divido em dois, por assim dizer. Seria bom, não seria, se no mundo físico também,
o outro Eu aparecesse e imediatamente produzisse a resposta certa, quando não
sabemos algo. Bem, isso acontece em sonhos. Quando estamos sonhando,
estamos fora dos nossos corpos físico e etérico e estamos, apenas, no corpo astral
e no Eu. Enquanto o tipo de sonho, descrito anteriormente, nos dá um vislumbre
do corpo etérico, aquele em que nos enfrentamos, resulta do corpo astral
revelando uma parte de si mesmo para nós e nos confrontando. Nós percebemos
uma parte de nós mesmos, fora do corpo físico. Nós não percebemos o corpo
astral na vida cotidiana, mas podemos facilmente ver parte dele no sonho. Ele
contém coisas de que não estamos conscientes, quando estamos
acordados. Anteriormente, falei sobre a natureza do corpo etérico; ele contém
tudo o que experimentamos. Mas agora, tenho que lhes dizer uma coisa muito
estranha - o corpo astral contém até aquelas coisas, que não
experimentamos. Vocês veem, nosso corpo astral é uma estrutura bastante
complicada. É, em certo sentido, construído em nós, a partir do mundo espiritual
e contém, não apenas as coisas que já temos em nós agora, mas também aquelas
que aprenderemos no futuro! Elas já estão presentes lá, como uma
disposição. Este corpo astral é muito mais esperto do que nós. Portanto, quando
revela algo de si, em nossos sonhos, pode nos confrontar de uma forma que é
muito mais inteligente, do que nos tornamos, através da vida física. Se vocês
tiverem isso em mente - digo isto agora apenas como um aparte e não como parte
da palestra - isso lançará alguma luz, sobre a “esperteza” dos animais. Eles
também têm um corpo astral. Pode trazer coisas, que não surgem na vida comum
dos animais. Muitas coisas surpreendentes podem se revelar, lá.
Por exemplo, o corpo astral contém, acreditem ou não, toda a matemática, não
apenas até onde a conhecemos hoje, mas também tudo que ainda resta para ser
descoberto. No entanto, se quiséssemos ler a matemática contida ali e ler
conscientemente, teríamos que fazê-lo ativamente, adquirindo as faculdades
necessárias. Assim, é uma revelação de parte do nosso corpo astral, quando nos
vemos frente a frente, num sonho. E muitas das coisas que nos chegam, como
inspiração interior, provêm dessas revelações do corpo astral. Da mesma forma,
alucinações podem ocorrer, sob as circunstâncias que descrevi anteriormente. A
parte de nós, que é mais esperta do que normalmente somos pode, através de uma
disposição especial em nossa constituição, assumir uma voz própria.
Então, podemos ser inspirados, o que não aconteceria, se apenas usássemos
nosso julgamento comum em nosso corpo físico. Mas é perigoso nos entregarmos
a essas coisas, porque não podemos controlá-las, até que possamos penetrá-las
com nosso julgamento. E como não podemos controlá-los, Lúcifer tem acesso
fácil a todos esses desenvolvimentos e não podemos impedi-lo de direcioná-los,
de acordo com suas intenções. Quando desenvolvemos nossas forças internas,
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aprendemos a levar uma vida interior, que nos torna clarividentes no corpo
astral. Mas vocês verão, pelo que eu disse, que se tornar clarividente no corpo
astral requer, que estejamos sempre conscientes de encarar a nós mesmos, nosso
próprio Ser. Assim como não levaremos uma vida física saudável, se não
estivermos plenamente conscientes, também não levaremos uma vida saudável
da alma no mundo suprassensível, se não nos vermos a todo momento. No
mundo físico somos nós mesmos; no mundo espiritual mais elevado, temos o
mesmo relacionamento conosco, como temos aqui com um pensamento, que
representa um evento passado. Nós olhamos internamente para tal pensamento
e o tratamos como uma memória. Quando lidamos com um pensamento naquele
mundo espiritual, sabemos que estamos nos olhando e nos observando.
Nosso Eu deve estar sempre presente, quando experimentamos as coisas no
mundo espiritual. Basicamente, este é o único princípio que se aplica, também,
àquelas coisas sobre as quais não temos controle. De fato, no reino do espírito,
esse princípio nos permite dominar as coisas, tornarmo-nos o poder
controlador. Nosso próprio Ser é o centro de tudo. Nosso próprio Ser nos mostra
como agirmos no mundo espiritual, revelando a nós quem realmente somos no
mundo espiritual. Se estivermos no mundo espiritual e percebermos que algo está
incorreto, isso significa que estamos usando o script esotérico,
incorretamente. Bem, se usarmos o script esotérico incorretamente, mas
percebermos a nós mesmos como o centro de tudo o que acontece, nós
experimentaremos, em nosso próprio ser: você se parece com isso, porque você
fez algo errado; agora você tem que acertar! Podemos ver como agimos, pelo que
nos tornamos. Podemos comparar isso com o que vocês sentiriam aqui no mundo
físico, se vocês não estivessem dentro, mas fora de si mesmos. Por exemplo, se
vocês dissessem a alguém: “Já são onze e meia” - algo que não é verdade - e
olhassem para si mesmos, veriam como se vocês mostrassem a língua para si
mesmos. Vocês diriam: "Isto não é você!" E, então, vocês começariam a se corrigir
e dizer o que é verdade: "Agora são nove e vinte." Nesse momento, suas línguas
voltariam para dentro. Da mesma forma, vocês podem dizer se estão agindo
corretamente no mundo espiritual, olhando para si mesmos. Tais imagens
grotescas podem servir para caracterizar essas coisas, que devem ser levadas
muito mais a sério, do que tudo o que se diz sobre o mundo físico. O objetivo é
obter uma compreensão do reino suprassensível, através do poder do pensar, que
já possuímos no mundo físico. Dessa forma, libertamos nosso pensamento, que
de outra forma permaneceria ligado ao nosso ambiente físico. Nos tempos
antigos, as pessoas tinham uma clarividência básica e atávica. Era possível que
elas tivessem Imaginações, até mesmo Inspirações. Mas em contraste com esse
estágio anterior, chegamos agora a um estágio avançado e podemos formar ideias
sobre o mundo físico. Quando as pessoas ainda possuíam uma clarividência
atávica, não podiam pensar corretamente. Para que o pensamento adequado se
desenvolvesse, a força, usada anteriormente na clarividência, tinha que ser
aplicada ao pensamento. Algumas pessoas, hoje em dia, desenvolvem faculdades
clarividentes, em determinados momentos de sua vida, por métodos diferentes
daqueles descritos pela Ciência Espiritual. Isso ocorre porque elas herdaram
essas faculdades de épocas anteriores e ainda não alcançaram um julgamento
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sólido, naquelas áreas da vida em que são clarividentes. Em outras palavras,


quando as pessoas, hoje em dia, mostram certas habilidades psíquicas, uma certa
clarividência, sem ter feito exercícios sérios, sem ter estudado a Ciência Espiritual
- que, se aplicada da maneira certa, pode ser o melhor exercício para trazer a velha
clarividência - isso não significa que elas sejam mais avançadas do que todas as
outras, mas sim que estão ficando para trás. Ter habilidades atávicas hoje, não
significa que alguém tenha atingido o estágio de pensamento claro. A alma mais
avançada é claramente aquela, que escuta soar os julgamentos, a partir do seu
entendimento comum - e esse entendimento comum é completamente suficiente
para compreender a Ciência Espiritual, se alguém estiver livre de noções
preconcebidas. Estaremos cometendo um grande erro, se permitirmos que as
capacidades clarividentes atávicas nos impressionem. Estaremos no caminho
errado, se acreditarmos que a alma de tal pessoa é particularmente avançada. O
fato de essa alma demonstrar tais habilidades, significa que ela não conseguiu
passar por certas coisas, que precisavam ser experimentadas, na época da
clarividência. Portanto, essa alma, agora, está recuperando o que foi perdido
anteriormente. É muito grotesco, quando as pessoas envolvidas na Ciência
Espiritual acreditam que alguém, que exibe uma certa clarividência, sem ter
estudado Ciência Espiritual, deve ter sido alguém importante numa vida
anterior. Tal pessoa era, certamente, menos importante do que alguém, que
apresentasse um julgamento correto sobre as coisas. Agora, é muito importante
que nosso movimento tente construir um certo círculo de pessoas, que
enxerguem através dessas coisas, que verdadeira e completamente as entendam
e possam chegar à seguinte percepção: precisamos da Ciência Espiritual em nosso
tempo, porque somente entendendo isso, nós poderemos fazer progresso. Isto é
muito importante. Existem, é claro, doenças infantis em todas as áreas da vida e,
naturalmente, também nas correntes espirituais, que entram no mundo.
E pode-se entender facilmente e o suficiente do por que a Ciência Espiritual tem
doenças na infância, porque tenta dar aos Seres humanos os resultados, que
foram alcançados pela consciência clarividente. Mas vocês podem ver como
temos que descrever isso. Temos que dizer que, tornar-se clarividente, da
maneira como a humanidade precisa agora e no futuro, não atrai o amor ao
conforto e conveniência das pessoas. Exige muito mais do que apenas esperar,
que as coisas aconteçam. A participação em todos os momentos, o autocontrole e
a capacidade de auto-observação são necessários, para alcançar o mundo
espiritual. Isso deve ser amplamente entendido. É muito mais fácil esperar que a
clarividência se aproxime de nós como um sonho, fluindo para lá e para cá. As
pessoas querem experimentar o reino espiritual, da mesma maneira que
experimentam o mundo dos sentidos. Este é um remanescente de períodos
passados da nossa história. Na clarividência antiga, as coisas eram vivenciadas,
de tal maneira, que as pessoas não as “conheciam”. É provavelmente por isso, que
até hoje as pessoas querem experimentar o reino espiritual, de tal maneira, que
elas não o “conheçam”. Com certeza, nós não apreciamos adequadamente o que
sabemos. Quando fazemos aritmética, por exemplo, seguimos certos métodos
definidos, sem estarmos muito envolvidos no que estamos fazendo. Quando
somamos cinco e sete, não estamos realmente participando, no sentido
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mencionado aqui; nós não estamos totalmente presentes no que fazemos. É por
isso, que as pessoas não gostam, se outras pessoas desenvolverem sua própria
visão do mundo. Assim que vocês puderem mostrar às pessoas, algo que vocês
vieram a conhecer, sem essa participação interior, elas estarão felizes,
extremamente felizes! Mas, quando alguém demonstra conhecimento do mundo
espiritual e o conhece de tal maneira, que ele está envolvido, então as pessoas
dizem: “Oh, ele sabe disso! Esse é um processo completamente consciente e não
objetivo. Mas se alguém aparece e teve uma visão cuja origem ele não consegue
explicar, as pessoas dizem: “Isso é objetivo, completamente objetivo! Nós
podemos acreditar nessa pessoa”. O aspecto mais importante da nossa Ciência
Espiritual é desenvolver ideias claras. A Ciência Espiritual ainda é relativamente
nova; portanto, agora que o anseio das pessoas pelo mundo espiritual e o
conhecimento dele despertaram, elas querem se conectar com tudo que ainda
vem do velho mundo da clarividência. Elas reúnem todas essas coisas antigas e
acreditam, que estão fazendo algo muito especial, em preservá-las.
No entanto, nossa tarefa é ver claramente neste campo! Deve ficar claro para nós,
que não há nada inferior em dar conselhos, em plena consciência, sobre uma
questão de cura espiritual. Mas a maioria das pessoas apreciará as indicações
dadas por alguém "acima" da situação, que se entrega a sentimentos obscuros e
não "conhece" as coisas, muito mais porque suas declarações resultam no
sentimento sombrio e feliz: esse é o resultado de algo desconhecido! Em todos os
lugares ouvimos pessoas dizendo, que as coisas que elas podem entender, não são
de interesse para elas. Elas vieram pelo inexplicável - isso é supremo, divino!
Acreditem em mim, as verdades individuais da Ciência Espiritual devem entrar
em nossas almas, gradualmente e, ao mesmo tempo, devemos ter um sentido
claro e seguro, para as condições que acabei de mencionar. Eu falei sobre essas
condições, para mostrar, começando com a natureza dos sonhos, que a
verdadeira clarividência requer o tipo de trabalho ativo da alma, que podemos
comparar com a escrita. Eu escrevi O Limiar do Mundo Espiritual, com o
objetivo de esclarecer estas questões cada vez mais. Aqueles que entenderem meu
livro, compreenderão o nervo vital, a nota-chave de nosso movimento. Eu tenho
que enfatizar repetidamente - apesar de ter dito isso frequentemente ao longo dos
anos - porque muito depende disso: aqueles que realmente querem ter acesso à
Ciência Espiritual têm que adquirir um sentido saudável, para as coisas que
realmente pertencem a ela. Então, gradualmente, nos desenvolveremos em uma
Sociedade, que pode estabelecer a tarefa de ter um efeito genuinamente curativo,
sobre tudo que pertence à vida cultural.
Na próxima vez, continuaremos a falar sobre o que começamos hoje como uma
descrição do mundo dos sonhos, com certeza baseado no mundo espiritual.

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PALESTRA II

ENTENDENDO O MUNDO ESPIRITUAL


(SEGUNDA PARTE)

Berlim, 12 de maio de 1914

De sua convicção de que vivemos e sempre estamos cercados pelo mundo


espiritual, o filósofo alemão Johann Gottlieb Fichte disse: “Eu não preciso
esperar até que eu seja removido das coisas ao meu redor, no mundo físico, para
ganhar entrada no reino espiritual. Eu já existo e vivo no último, muito mais
verdadeiramente do que no primeiro. É minha única base firme e a vida eterna,
que tomei há muito tempo, é a única razão pela qual eu ainda desejo continuar
na Terra. O céu não está além do túmulo; já está aqui, penetrando toda a
Natureza e sua luz, em todos os corações puros”.
É bom chamar atenção para tal afirmação, pois em nosso tempo muitas pessoas
nos fazem acreditar, que apenas personagens estúpidos, supersticiosos ou pelo
menos aqueles inclinados à fantasia, falam do mundo espiritual e têm visões
sobre ele. Curiosamente, mesmo aquelas pessoas que querem nos fazer
acreditar, que é bobagem falar do mundo espiritual, falam constantemente de
Fichte e de outros como ele. Então, é bom que, pelo menos algumas pessoas
saibam, que aqueles com uma visão antroposófica são unânimes com todas as
pessoas, que levaram, através da História, um verdadeiro conhecimento e
compreensão do mundo espiritual em seus corações, ou pelo menos um esforço
- no mais alto e mais nobre sentido da palavra - para com estas coisas. E, quando
os materialistas mencionam Fichte e puxam esta ou aquela passagem de seus
escritos como lhes convém, é bom quando as almas, com inclinação
antroposófica, sabem de onde vem a confiança de Fichte na vida, sua coragem
de viver e sua crença na vida - elas têm sua origem em sua adesão leal à
convicção de que a alma humana vive no mundo espiritual e tem uma existência
espiritual. Quando vocês ouvem o que um homem, como Fichte, citou - como
vocês sabem, ele escreveu o Endereçado para a Nação Alemã, em tempos
difíceis - vocês devem sempre estar cientes, em seus corações, de que ele teve a
força para dizer o que disse, porque sabia: “a melhor parte de mim sempre vive
no mundo espiritual, mesmo enquanto eu estou vivendo em meu ambiente físico
- no corpo. O mundo espiritual me envolve em todos os lugares”. Isto é verdade
para os outros também; Fichte é apenas um exemplo. Pessoas, como Fichte,
sabiam que suas palavras estavam cheias de uma força, adquirida através do
conhecimento do mundo espiritual, que apoiava e trabalhava em suas almas. Há
outra razão pela qual é bom lembrar esses fatos, de tempos em tempos.
Depois que Fichte proferiu suas palestras para um pequeno grupo de pessoas, O
caminho em Direção à Vida Abençoada, que contém os ensinamentos de sua
vida, sua plateia pediu-lhe que as palestras fossem impressas. As palestras
causaram uma grande impressão nelas, e pediram-lhe para publicá-las, porque
mais pessoas deveriam ter acesso ao encorajamento de Fichte para viver, à sua
bela e nobre luta pelo conhecimento. E Fichte, forte, vigoroso, excitado com o
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mais alto entusiasmo pela sua causa, fez a seguinte observação interessante no
prefácio a essas palestras:

Eu diria: quase que eu fui persuadido a publicar essas palestras, a


pedido de amigos da plateia, que tinham uma opinião favorável sobre
elas. E por causa da maneira como eu trabalho, a maneira mais certa
de nunca as completar, seria revisá-las, mais uma vez, para
publicação. Que seja responsabilidade dos meus amigos, então, se elas
não forem recebidas como previsto. Eu, de minha parte, fico muito
confuso com o público em geral, quando vejo a confusão sem fim, que
saúda toda ideia poderosa e, também, os agradecimentos a todos os que
se esforçam para fazer o certo, mas não posso tomar uma decisão em
relação a isso. Não sei mais como falar com esse público, ou se vale a
pena envidar esforços por meio das impressoras.

Eu quero citar esta observação particularmente, porque mostra o quão só Fichte


se sentiu, então - 108 anos atrás - com suas notícias do mundo espiritual, em
vista das atitudes e espírito gerais daqueles tempos. E, no entanto, não podemos
deixar de sentir que a Antroposofia é o cumprimento daquilo, que as grandes
mentes da história humana ansiavam e procuravam, em seus
empreendimentos. Em vista da apatia e falta de julgamento da Ciência
Espiritual hoje, devemos evocar em nossas almas a harmonia, que podemos
alcançar com essas grandes mentes, através de nossa Ciência Espiritual para nos
encorajar e fortalecer. No entanto, pode levar muito tempo, até mesmo para
aqueles que são simpáticos à Ciência Espiritual, para encontrar a energia interna
correta, para desenvolver um sentimento pelo impulso que ela deve dar à nossa
cultura. É fácil entender por que a Ciência Espiritual encontra incompreensão,
ao tentar se estabelecer no mundo como um todo. Apenas tentem entender,
como cidadãos comuns, como um produto do pensamento moderno, que não
tenha realmente entrado em contato com algo espiritual, pode estar relacionado
à Ciência Espiritual. As pessoas ouviram declarações de um tipo ou de outro,
sobre o mundo espiritual. O que elas devem fazer? Bem, as pessoas não têm
escolha, a não ser tentar entender essas ideias, com base em seus próprios
conceitos. Entretanto, a pessoa comum, de nosso tempo, não possui nenhum
conceito que possa ajudá-la a compreender o que a verdadeira Ciência Espiritual
diz, sobre o reino do espírito. Para começar, ela não tem pensamentos, conceitos
e ideias para fazer isso. Ela tenta penetrar no que é dito, com suas ideias, que, é
claro, se originaram num nível bastante diferente. Como, então, ela deveria
evitar mal-entendido? Como podemos esperar que ela entenda? O ponto central
em nossa relação com a Ciência Espiritual é adquirir novos conceitos, novas
ideias, que não tivemos antes de nos encontrarmos com ela e que não podemos
trazer conosco de fora, mas temos que aprender gradualmente. Essa percepção
é fundamental, para uma atitude correta de alma, em relação a esse fluxo
espiritual. Considerem o fato básico, a saber, que a Ciência Espiritual está aí
para nos capacitar a entender o mundo espiritual, fora de nós.
17

No decorrer deste ano, ouvimos muitas descrições e todo tipo de informação


sobre o mundo espiritual. Nós sempre tentamos ampliar nossos conceitos e
ideias, para que possamos, realmente, compreender adequadamente o que está
acontecendo no reino do espírito. Por exemplo, falamos sobre Seres das
Hierarquias Superiores e vocês sabem o que dizemos sobre eles. Também
falamos das almas dos mortos, como elas existem, entre a morte e um novo
nascimento e vocês sabem o que dizemos sobre elas. No entanto, nunca
devemos esquecer que, ao falar sobre essas coisas, não podemos usar os
conceitos que aprendemos no mundo de hoje, pois vamos nos deparar com mal-
entendidos. Por isso, quero chamar a atenção para um conceito, sobre o qual
vocês já aprenderam, mas gostaria que o considerássemos em detalhes,
examinando quão essencial tem sido para as nossas várias conversas.
O mundo físico faz suas impressões em nossos sentidos e tentamos entender
este mundo, com ideias e conceitos ligados ao nosso Sistema Nervoso, ao nosso
cérebro. Quando olhamos para este processo, descobrimos que o elemento
central é que nós percebemos o mundo. Olhando para as coisas, percebemos o
reino humano, os seres humanos como seres físicos, os reinos animal, vegetal e
mineral, nuvens, montanhas, rios, oceanos, estrelas, Sol e Lua. Nós percebemos
essas coisas, na medida em que elas são entidades físicas. Nós olhamos para
elas, vemos suas cores, ouvimos seus sons, sentimos seu calor - em resumo, nós
as percebemos. Esta é uma descrição perfeitamente correta, do nosso
relacionamento com o mundo físico. Mas, assim que olhamos para o mundo do
espírito, devemos sentir a necessidade de uma outra expressão do que
“percebo, porque não é muito correto dizer “eu percebo os seres do mundo
espiritual”. Precisamos entender que, toda a assim chamada percepção do
mundo espiritual é bem diferente, daquela do plano físico.
À medida que avançamos para o reino do espírito e nos aproximamos dele,
temos a impressão de que somos percebidos. Aqui na Terra nós somos, em certo
sentido, os seres físicos mais elevados. Uma pedra, uma planta ou um animal
podem dizer, que são percebidos pelos seres humanos. E, em termos do nosso
corpo físico, podemos dizer que somos percebidos, por Seres de nossa própria
espécie. Nós também somos percebidos, a partir do momento, em que
crescemos no mundo espiritual. Os seres espirituais olham para nós e, em certo
sentido, nos tornamos objetos para eles. Realmente, é um primeiro sinal de ter
entrado no mundo espiritual, quando somos percebidos. Como eu disse na
minha última palestra, o caminho para ascender em direção aos Seres
Espirituais é crescer, até o nível das nossas capacidades, de modo que nosso Ser
seja percebido por Eles. É assim com as Hierarquias Superiores. Aprendemos a
nos ver crescer à um estado mental, que nos permite sentir, que somos
percebidos pelos Seres Superiores da Hierarquia dos Anjos.
Então, à medida que nos desenvolvemos, somos percebidos por aqueles da
Hierarquia dos Arcanjos e, assim por diante. Essa sensação de que somos
olhados, que a vontade de Seres espirituais está nos afetando, é o que quero
dizer, quando digo “Somos percebidos”. Temos que ser bem claros sobre isso e
não devemos pensar, que avançar no mundo espiritual é, apenas, uma
continuação do panorama que nos rodeia no mundo físico. Todo o humor da
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nossa alma muda, porque nos tornamos conscientes de que estamos vivendo no
mundo espiritual e que, o que vivenciamos, é a sensação de que os Seres das
Hierarquias superiores nos percebem. Essas coisas podem ser melhor
explicadas, com descrições específicas. Portanto, sem qualquer presunção -
deixe-me enfatizá-lo, novamente: sem qualquer presunção - e com toda a
modéstia, deixe-me apresentar o exemplo a seguir, para mostrar como é nosso
relacionamento com o mundo espiritual. Quando empreendemos algum
trabalho aqui, na Terra - seja inspirado espiritualmente ou não - precisamos de
forças, que nos chegam do reino físico. E essas forças estão fora da nossa
consciência comum, é claro. Nós não podemos entregá-las a nós mesmos; elas
não estão realmente sob nosso controle. Se vocês não acreditam nisso, podem ir
a Dornach, ao nosso prédio, e observar nossos amigos transformando, grandes
blocos de madeira em capitéis, para os pilares e usando sua força física para
isso. Então, vocês terão que admitir, que tais forças vêm puramente do mundo
físico. Por mim, eu admito abertamente, que às vezes eu gostaria de ter mais
dessa força física, para poder ajudar mais com o trabalho lá. Assim como a força
de nossos músculos das mãos e outras forças físicas estão envolvidas no que
fazemos fisicamente, as forças espirituais também podem entrar em nossas
ações, fluírem para nossas almas, a partir do mundo espiritual e agir de cima
para baixo, por assim dizer. Uma de nossas tarefas nos últimos anos foi
expressar, em nossas peças de Mistério o que flui, através de nossa visão, do
mundo espiritual. Fatos, espiritualmente percebidos, tiveram que ser
projetados em um estágio físico; para usar a expressão comum, eles precisavam
ser “encenados”. Tal produção exigia coisas novas, em comparação com as
produções convencionais de palco. Ao longo dos anos, tivemos que colocar essas
peças, com força cada vez maior, pode-se dizer. Mas o que quero dizer agora,
não se refere tanto às coisas externas, ao que acontece quando tudo já está lá,
mas ao aspecto espiritual da questão. Nos primeiros dias do nosso trabalho na
Ciência Espiritual, um certo indivíduo nos visitou. Essa pessoa, não apenas
desenvolveu um profundo e caloroso interesse por nossos ensinamentos, como
tivemos que apresentá-los, no início de nosso trabalho, mas ela também estava
imbuída de um espírito artístico maravilhoso, que se fundia completamente com
sua personalidade. (*) Pode-se dizer, no verdadeiro sentido da palavra, que ela
era uma pessoa objetivamente gentil. Ela rapidamente assimilou tudo o que
podíamos dizer, sobre o conteúdo da Ciência Espiritual naquela época.
Então, e isso foi nos primeiros anos do nosso trabalho aqui, ela deixou o mundo
físico. Nos anos que se seguiram, ela trabalhou nas profundezas subconscientes,
que nossas almas alcançam após a morte, e tentou integrar o que ela havia
aprendido, sobre nossa Ciência Espiritual, com sua sensibilidade artística. Um
corpo espiritual estava sendo construído, no qual essas duas forças estavam em
ação: as visões frutíferas da Ciência Espiritual e uma espécie de espírito artístico
enérgico e compreensivo. Muitos anos se passaram e, recentemente, quando
estávamos trabalhando em Munique, sempre que eu tinha que tomar decisões
sobre assuntos internos, das apresentações em Munique, eu sempre estava
ciente, de que essa individualidade estava olhando para tudo o que estava
acontecendo.
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É claro que não é verdade, que tal Ser nos diria como fazer as coisas.
Nós devemos ter nossas próprias habilidades para isso. Mas, através da bênção,
que flui para nós de tal individualidade, podemos nos sentir fortalecidos para a
tarefa que temos em mãos. Podemos sentir seu olho espiritual radiante e seu
interesse sincero e caloroso fluindo para as coisas, que temos que fazer.
Eu sempre estava ciente, de que essa individualidade estava olhando para baixo,
para tudo o que estava acontecendo. Coisas assim podem nos mostrar, que após
a morte, a alma gradualmente se transforma num Ser envolvido e ativo aqui no
plano físico. Uma vez que estejamos conscientes disso, sentiremos a presença
de tais Seres como Espíritos guardiões, nos apoiando nas tarefas, que temos que
fazer aqui, em conexão com o mundo espiritual. Então, podemos definir nossas
tarefas, sabendo que existe um Ser no mundo espiritual, que protege nosso
trabalho. Agora, vocês podem ter a percepção concreta, que deve permear nossa
vida, em relação ao mundo espiritual. Gradualmente, nós chegamos a saber, que
os mortos realmente não morrem, mas simplesmente se mudam para outro
lugar. Eles ainda participam do que fazemos. Essa percepção será mais do que
um sentimento vago para nós; gradualmente, nós aprenderemos a apontar para
as áreas onde eles estão ativos. Vamos aprender a senti-los conosco, quando
precisamos de forças, que não podemos encontrar no plano físico, quando
precisamos de apoio de regiões mais altas. Pois as almas, que passaram pela
morte, possuem forças diferentes das que estão no plano físico, porque levam
material para seu desenvolvimento, naquele estágio no outro mundo.
Podemos sentir o verdadeiro aprofundamento interno, que podemos obter,
adotando a Ciência Espiritual, não apenas na forma de teorias abstratas, mas na
compreensão viva de particularidades concretas. É claro, suponho que tais
explicações, num grupo como este, sejam tomadas com a reverência necessária,
pois é a única maneira pela qual podemos prosseguir, do abstrato para o
concreto. Vejamos o exemplo de outra pessoa, que deixou o mundo físico há
pouco tempo. (**) Este homem esteve conosco por cinco anos e, gradualmente,
uniu o melhor de seu ser ao conhecimento resultante da Ciência Espiritual.
Por muitos anos, ele esteve fisicamente doente e teve que lutar contra os ataques
de seu corpo doente. Ele realmente demonstrou o triunfo da mente sobre a
matéria, particularmente considerando a força que ele precisava, para criar seus
últimos poemas. Das amostras que vocês já ouviram, vocês já conhecem a
caracterização íntima e maravilhosamente poética do mundo espiritual, que
esse homem alcançou. As pessoas terão muitas ideias valiosas, quando seu
último volume de poemas aparecer, em poucas semanas. O autor deste volume
não poderá testemunhar sua publicação; ainda assim, nos mostrará quão
maravilhosamente sua vida espiritual triunfou sobre o corpo físico. Quando falei
sobre sua poesia, em Leipzig, no final do ano passado, usei uma expressão, de
maneira semelhante a uma pessoa, ou mesmo a uma criança, dizendo que "a
rosa é vermelha".

(*) – Trata-se da atriz Maria von Strauch Spettini – 1847 – 1904.


(**) - Trata-se do poeta Christian Morgenstern – 1871 – 1914
20

Tal afirmação pode ser bem correta, sem que ninguém precise “saber” que a rosa
é vermelha. Da mesma forma, soube então, em Leipzig, que eu poderia usar a
expressão que escolhi e que estava correta. De uma necessidade interior, eu
disse que sua poesia, não apenas revela uma maravilhosa expressão de nossa
visão do mundo, mas quase se pode dizer, que esses poemas têm uma
aura! Alguma coisa entrara na alma daquele homem e se apoderara de sua
personalidade, de modo que as palavras não fluíam apenas dele, mas também
continham algo semelhante a uma aura. Em suma, foi o que eu disse e o que
senti ser verdade. Só agora sei porque falei isso. Claro, só podemos saber após a
morte, o que o indivíduo, que escreveu esses poemas, pretendia fazer no mundo
espiritual, para o qual ele estava se preparando. Ele sofreu muito, porque seu
organismo físico estava se deteriorando. Mas enquanto seu corpo estava se
deteriorando, algo se desenvolvia na alma, muito além do corpo físico, algo que
se mostrou bem diferente do que ele inicialmente pensava que era.
Essa nova qualidade vivia nas profundezas de sua alma e sua luz se tornava cada
vez mais brilhante, quanto mais perto da destruição, seu corpo físico chegava. E
agora, podemos ver algo brilhando no mundo espiritual e que foi preparado aqui
na Terra. Deixe-me usar uma imagem, para explicar o que quero dizer.
A Natureza está em toda parte ao nosso redor, em toda sua beleza e glória.
Certamente, qualquer um sensível à beleza da Natureza, pensará que eu estava
justificando, quando, há algum tempo, eu disse aqui, que uma pessoa pode
visitar todas as galerias de arte da Itália, ir até as montanhas suíças, para ver o
nascer do Sol e depois ter a sensação de que os Seres espirituais, que pintam o
nascer do Sol, são pintores maiores ainda, do que aqueles que pintam na
tela. Mesmo que isso seja verdade, também devemos admitir que, embora
possamos admirar a beleza da Natureza, com completo abandono, achamos
infinitamente precioso, quando vemos como uma pintura de Raphael, Leonardo
da Vinci ou outro artista, apresenta o conteúdo da alma do artista, bem como a
beleza da Natureza. Na Arte, vemos uma expressão física do que a alma pode
nos dar, enriquecendo o que tomamos da Natureza. Eu quero usar essa analogia,
para preparar o coração de vocês, para entender o que eu quero dizer em
seguida. O indivíduo, que acabei de mencionar, está agora no mundo espiritual
e as formações espirituais, uma vez presas em seu corpo, estão agora livres
dele. Aqui na Terra, temos sua poesia maravilhosa, mas no mundo espiritual
encontramos iluminado, o que surgiu das Imaginações, que foram preparadas
aqui, durante sua longa enfermidade e que agora formam a base de seu corpo
espiritual. Uma esplêndida imagem cósmica! Nessas Imaginações vive um
elemento maravilhoso do Cosmos que é, para as percepções diretas da pesquisa
espiritual, o que é uma pintura maravilhosa, para com uma experiência direta
da beleza da Natureza. Quando o reino do espírito se apresenta para o olhar
interior, nas Imaginações de uma alma humana - e nós mesmos a percebemos
também - infinitamente nos será revelado. De fato, é quase como se o Cosmos
fosse percebido duas vezes; uma vez, aparece diretamente em nosso olhar
clarividente e, então, novamente como é revelado ao olhar clarividente, através
do que uma alma humana alcançou na Terra, através de muito sofrimento e
vigoroso esforço pelo conhecimento espiritual. Não preciso lembrar, que todas
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essas coisas devem ser entendidas como carma; nenhuma alma pode adquirir
qualquer coisa desse tipo, apenas pela força de vontade. Se tais coisas nos são
concedidas, reside na graça dos sábios poderes cósmicos. Durante o tempo que
passamos na Terra, nós e outros também, devemos ter o cuidado de permanecer
na Terra o máximo de tempo possível e em condições tão saudáveis, quanto
possível. Isso não deveria ser dito, mas essas coisas são tão facilmente mal
compreendidas. Ninguém deve tentar fazer algo, para causar sofrimento.
Isso não deve acontecer e, em qualquer caso, nada poderia ser alcançado dessa
maneira. Assim sendo, com esses exemplos específicos, quis apresentar duas
ideias. A primeira é que os Seres espirituais enviam seus poderes para nós,
através do olhar de seus olhos espirituais, como tentei mostrar com o exemplo
da alma guardiã de nosso trabalho artístico. A outra ideia, demonstra a
sabedoria interior dos poderes cósmicos, o que nos permite ver, no mundo
espiritual, o que uma individualidade extraiu de sua existência terrena. Isso
pode, então, enriquecer nossa percepção do mundo espiritual, assim como a
percepção artística enriquece nossa experiência do mundo físico. Eu poderia
dizer muito mais sobre as individualidades, que são abençoadas em carregar o
que absorveram da visão antroposófica de mundo, para o mundo espiritual.
No entanto, o tempo para isso ainda não chegou. Eu citei esses dois casos porque
acredito, que exemplos concretos e familiares, podem nos ajudar a entender
melhor os pensamentos e ideias, necessários para o acesso real ao mundo
espiritual. Devemos aderir a esses conceitos desde o início, se realmente
quisermos esse acesso. Afinal, nos reunimos em grupos menores para que
possamos, em certo sentido, falar a linguagem, que gradualmente
desenvolvemos para a descrição da vida espiritual. Através da Ciência
Espiritual, podemos progredir para onde não falamos mais, em termos gerais,
sobre o espírito ao nosso redor, assim como não falamos da Natureza ao nosso
redor, em termos gerais. Nós falamos, não só da Natureza, mas da grama nos
prados, do milho num campo, das árvores numa encosta, das nuvens e assim
por diante. Gradualmente, temos que aprender a falar do mundo espiritual, em
termos igualmente específicos. Portanto, eu gosto de falar do mundo espiritual
em termos concretos, discutindo sobre uma alma guardiã, como a que eu
mencionei hoje, em conexão com o nosso trabalho artístico, ou mencionando
uma alma, cuja forma após a morte, espelha as forças que emanam do próprio
Cosmo espiritual - força que esta alma reuniu, enquanto o corpo era
ultrapassado pela enfermidade, aqui na Terra. Essa alma nos ensina coisas, que
não aprenderíamos com facilidade. Pessoas, como esse amigo, que vocês
conheciam, tornam-se os melhores auxiliares, para ajudar a Ciência Espiritual a
cumprir sua tarefa no mundo. Como a Ciência Espiritual é recebida em muitos
lugares com mal-entendidos, desprezo e hostilidade, podemos sentir, que será
realmente muito difícil fazer qualquer progresso, para atingir seu verdadeiro
propósito. No entanto, os insights que discutimos hoje, evocam o pensamento
encorajador de que, aqueles que passaram pela porta da morte, se tornam
verdadeiras testemunhas da verdadeira natureza e propósito da Ciência
Espiritual. Eu gostaria que este pensamento falasse aos nossos corações e almas.
Com isto em mente, não podemos deixar de acreditar que, mesmo que demore
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mais do que a nossa vida, a Ciência Espiritual se tornará parte do progresso


espiritual da humanidade. Esse pensamento pode nos dar coragem para
enfrentar, o que nos confronta em certos setores; pode nos dar coragem em
nossa convicção, de que mais e mais pessoas perceberão a necessidade de
desenvolver novos conceitos, novas ideias, sentimentos e atitudes para uma
verdadeira compreensão do mundo espiritual. Espero que explicações como
estas, também forneçam um contexto apropriado para nosso papel, em nosso
movimento espiritual. Aceitemos, com reverência, exemplos como aqueles e
também tiremos deles o que é relevante para nossas convicções, de modo que
seremos fortes o suficiente, para suportar o impacto de ataques externos.
Pessoas, fora do nosso movimento, nos abordam, apenas, com os conceitos que
aprenderam no mundo e não deveríamos ficar terrivelmente surpresos, por eles
imporem esses conceitos, ao que eles descobrem sobre nós. Há grandes
problemas na relação entre a Ciência Espiritual e as declarações e julgamentos
do mundo externo a respeito dela. Como vocês sabem - e como um dos nossos
queridos membros lhes contou da última vez, com experiência em primeira mão
e um coração entusiasta - queremos começar uma real e verdadeira obra de arte
em Dornach, perto de Basiléia; uma obra de arte que é resultado da nossa visão
de mundo. Tudo depende de algumas pessoas no mundo, que realmente
entendem o que pretendemos fazer. É crucial que não deixemos, que apenas
essas pessoas julguem esse empreendimento, que queiram descrevê-lo em
termos derivados do mundo exterior. Não importa quão boas sejam as intenções
das pessoas: se elas abordarem nosso prédio com conceitos convencionais, elas
só terão uma descrição convencional. Por exemplo, podemos ver, agora, que os
jornais em todos os idiomas estão dizendo coisas sobre o edifício em Dornach,
que podem facilmente varrer, em pouco tempo, o que temos lutado por muitos
anos para alcançar - por não dizer ao público o que eles não entendem, de
qualquer maneira. Os jornais perguntaram: em que idade estamos
vivendo? Essa é ainda a Era do materialismo? Um enorme templo está sendo
construído - e assim por diante. E eles descreveram as colunas desse templo,
como supostamente ligadas por pentagramas e afins. Vendo isso, só podemos
nos perguntar onde levarão tais descrições das coisas, que devem se desenvolver
a partir de nossa corrente espiritual. Tais descrições estão circulando agora pela
mídia - é terrível! Nós não precisamos entrar em detalhes, mas o mais doloroso
é que o artigo original, que serviu de base para todos os outros, foi o trabalho de
uma alma bem-humorada, que queria nos entender e fazer um grande serviço
ao público ao nosso movimento, escrevendo sobre isso. Nós até o mostramos,
para evitar os piores excessos de reportagem. Nós mostramos a ele, por
exemplo, que não há, realmente, um pentagrama para ser visto, mas que em um
lugar a mente do buscador tem que sentir seu caminho cautelosa e sutilmente,
para a percepção de um pentagrama. Então descobrimos que, embora
tivéssemos pedido à essa pessoa para não escrever nada que cheirasse a
jornalismo, ela não poderia fazer mais nada, e não usou os conceitos e ideias
aprendidos de nós, mas apenas aqueles, que podem ser aprendidos nas ruas da
nossa cultura moderna!
23

É profundamente doloroso para mim ver, como nossas intenções e objetivos


originais são agora apresentados nos jornais. Os artigos e clichês são passados
de um papel para o outro e são traduzidos para todas as línguas e em cada
idioma, são acrescentadas outras distorções e mais estupidez. É claro que não é
difícil entender o que acontece, quando os objetivos de nossa Ciência Espiritual
séria e sincera, se chocam com o que o mundo exterior pode entender. Mas
quero mostrar-lhes como, solene e reverentemente, devemos nos aproximar de
nossa causa. É importante que tenhamos consciência, de quão profunda é nossa
compreensão para com as tarefas da Ciência Espiritual no mundo.
Vocês podem perguntar: por que não poderíamos continuar a trabalhar com
nossos conceitos, de maneira modesta e anônima, mesmo entre aqueles que não
podem nos entender, como fizemos antes? Nós começamos o prédio em
Dornach. Bem, as pessoas na idade atual, têm seus olhos focados no nível
físico. As coisas espirituais passam desapercebidas, mas a construção de um
edifício em Dornach não pode ser ignorada. Tais questões são, obviamente,
completamente improdutivas e também irrelevantes. O que importa é que
devemos ter uma apreciação adequada e compreensão de nossa causa, em
nossos corações. Não digo isso para acusar ou criticar ninguém, mas para
lembrá-los, mais uma vez, com que seriedade devemos tentar entender o novo,
que deve crescer em nós, para contrabalançar o que vem do mundo exterior,
particularmente nas opiniões de outras pessoas. O que vem de fora, não é parte
do que nossas almas realmente precisam e têm sede. Elas precisam de Ciência
Espiritual e anseiam por isso. Portanto, devemos colocar as tentações e a
sedução do pensamento materialista na perspectiva correta, particularmente
isso, devido à arrogância espiritual. Não devemos nos sentir cegos, quando nos
deparamos com tais pontos de vista e atitudes, em todo o mundo externo, mas
devemos encontrar a força, dentro de nós mesmos, para participar plenamente
neste mundo e buscar, em nós mesmos, o impulso para um relacionamento
adequado com o mundo ao nosso redor. Então, a Ciência Espiritual pode,
realmente, se tornar algo que nos aquece e fortalece interiormente. Pode nos dar
alicerces para nosso julgamento, para que não fiquemos cegos pelas influências
externas, que podem se nos aproximar com autoridade e poder e, portanto,
podem nos enganar de novo e de novo, sobre a capacidade de nossa época de
compreender a Ciência Espiritual. Isto é o que eu queria apresentar novamente
para suas almas hoje. Por hora, enquanto o Verão se aproxima e nossos
encontros se tornam menos frequentes, queremos estar certos de uma coisa: os
impulsos da Ciência Espiritual devem viver em nossas almas,
independentemente do tempo e do espaço. Eles devem estar vivos em nós,
independentemente de nos encontrarmos com mais frequência ou com menos
frequência. O importante é o caráter de nossas reuniões, que nós realmente as
trazemos à vida em nós. Isso é o que eu queria discutir com você hoje.

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PALESTRA III
O DESPERTAR DOS PENSAMENTOS ESPIRITUAIS
Basel, 5 de maio de 1914
Estou muito feliz por podermos nos encontrar aqui hoje e fazermos uma pausa,
por assim dizer, do trabalho em nosso novo prédio, em Dornach.
Mas eu pensei, que seria impossível nos reunir aqui, tão perto do nosso prédio,
sem discutir assuntos antroposóficos. Espero que possamos fazer isso com mais
frequência ao longo do ano; caso contrário, nossos amigos, que trabalham no
prédio, não terão tantas oportunidades de comparecer a tais reuniões, quando
não estiverem trabalhando em nosso prédio. Vamos começar com algumas
reflexões sobre a vida do espírito, que podem ser úteis ao considerarmos, que
significado a Ciência Espiritual e a vida antroposófica podem ter para nós, para
nossa alma. Pessoas novas no pensamento, sentimento e percepção
antroposóficos podem pensar, que não devemos nos preocupar com a vida do
espírito, sobre o mundo espiritual, já que entramos no mundo espiritual após a
morte (até mesmo um materialista poderia dizer isso) e, então, aprenderemos lá
e, portanto, não precisamos saber sobre isso agora. Por que simplesmente não
estaríamos satisfeitos, nesta vida entre o nascimento e a morte, por fazer o que é
necessário para a vida no mundo físico? Por que está errado, quando apenas
cumprimos nossos deveres no mundo físico e deixamos de lado as questões,
relativas ao mundo espiritual, num reino do incerto e indefinido? Pode-se ouvir
essas palavras com frequência, durante o tempo em que a maré do materialismo
envolveu o desenvolvimento humano, especialmente no último terço do século
XIX. E, de modo algum, as almas mais moralmente irrepreensíveis diriam:
Enquanto estivermos na Terra vamos nos concentrar em nossas tarefas aqui e
deixar o resto, para o mundo no qual entraremos após a morte.
Agora, vamos falar sobre algo que pode ser compreendido imediatamente, por
qualquer um que comece a se preocupar com - eu nem quero dizer Ciência
Espiritual - mas com um pensamento verdadeiramente lógico.
Realmente, nós gastamos apenas parte do nosso tempo, entre o nascimento e a
morte, no mundo físico, ou seja, nosso tempo de vigília.
E mesmo as pessoas que ainda não pensaram muito sobre o mundo espiritual,
mas que podem pensar logicamente, teriam que admitir que, com nossa mente
consciente, sabemos tão pouco sobre a vida, no sono, quanto sobre a vida, após a
morte. E certamente ninguém pode negar que continuamos a viver no sono - a
menos que tal pessoa estivesse preparada para aceitar que, realmente morremos
todas as noites e que somos criados de novo a cada manhã. Isso é improvável. O
fato de dormirmos regularmente deveria, pelo menos, fazer as pessoas
pensarem. E então, elas seriam motivadas a refletir, sobre o que a Ciência
Espiritual tem a oferecer. Em particular, as Ciências Naturais perceberão, cada
vez mais, que nossa alma não está presente em nosso corpo físico, quando
dormimos. De fato, elas chegarão a essa conclusão por conta própria, antes do
final deste século de desenvolvimento científico. Então, elas procurarão a Ciência
Espiritual, em busca de respostas para suas perguntas. Elas serão forçadas, por
suas próprias conclusões, a perceber que nosso Ser anímico-espiritual não está,
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realmente, conectado com nosso corpo físico, quando estamos dormindo. Então,
será cada vez mais importante, para as pessoas no século XX, saberem algo sobre
o sono. Portanto, vamos começar hoje a ter uma ideia do que as pessoas, em nosso
século, terão que saber sobre a natureza do sono. Sabemos, de nossos estudos na
Ciência Espiritual que, quando adormecemos, dois membros de nosso Ser, o Eu
e o corpo astral, deixam os corpos físico e etérico. Onde estão o Eu e o corpo astral,
quando estamos dormindo? Para começar, podemos dizer que eles estão no
mundo espiritual. Naturalmente, estamos sempre no reino espiritual, porque este
último, não está separado do mundo físico, mas nos envolve, como o ar nos
envolve em todos os lugares. Estamos sempre no mundo espiritual, mesmo
quando estamos acordados. No entanto, quando estamos dormindo, nós o
habitamos de uma maneira diferente, do que quando estamos acordados.
Agora, pode ser suficiente, para as necessidades imediatas da Ciência Espiritual,
descrever esta situação dizendo que, no sono, nosso Eu e corpo astral estão fora
de nossos corpos físico e etérico. Mas, na verdade, estaríamos contando, apenas,
a metade da verdade. É o mesmo que dizer, que o Sol se põe neste ponto à
noite; porque o Sol, na verdade, se manifesta assim, apenas para nós na
Europa. Sabemos que isso não se aplica a todos os habitantes da
Terra. Fundamentalmente, o Eu e o corpo astral deixam nossos corpos físico e
etérico apropriada e completamente, por assim dizer, somente após a morte. No
sono, eles realmente deixam, apenas, o sangue e o Sistema Nervoso. Mas, quando
o "sol" do nosso ser, ou seja, o Eu e o corpo astral, se coloca em relação ao nosso
sangue e sistema nervoso - que eles penetram durante o dia - nosso Eu e corpo
astral fazem exatamente o que faz o Sol - que brilha aqui durante o dia e, quando
se põe para nós, se eleva para as pessoas do outro lado da Terra. Quando o Eu e o
corpo astral se “fixam” no nosso sangue e sistema nervoso, eles se elevam para os
outros órgãos e estão mais fortemente ligados a eles. Esses outros órgãos, aos
quais nosso Eu e corpo astral estão conectados quando dormimos, foram
construídos a partir do Espírito, assim como tudo o mais no mundo. E o fato
notável é que, enquanto dormimos, influenciamos fortemente esses outros órgãos
do nosso corpo, com nosso Eu e corpo astral. Durante o dia, nosso Eu e corpo
astral trabalham fortemente em nosso sangue e Sistema Nervoso, mas eles
influenciam nossos outros órgãos, todos aqueles que não fazem parte do sangue
e do Sistema Nervoso, mas que afetam o sangue dos nervos quando estamos
adormecidos. De alguma forma, daí resulta que é assim, com o nosso Eu e corpo
astral, como entramos no sono. Os materialistas não se importarão muito com o
que acontece no sono ao seu Eu e corpo astral, que eles nunca mencionam, de
qualquer forma. Entretanto, aqueles que entendem essas coisas, saberão que os
órgãos, que não fazem parte do sangue e do sistema nervoso e não se manifestam
em nossa existência consciente, dependem dos aspectos do nosso Eu e do corpo
astral, que estão ativos no sono. Deixem-me ilustrar isso com um exemplo
óbvio. Como sabemos, as pessoas hoje são assombradas por um medo, que
podemos comparar com o medo medieval dos fantasmas.
É o medo dos germes. Objetivamente, ambos os estados de medo são os
mesmos. Ambos se encaixam em sua época: as pessoas da Idade Média tinham
uma certa crença no mundo espiritual; portanto, naturalmente, elas tinham
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medo de seres espirituais. A época moderna perdeu essa crença no mundo


espiritual; acredita em coisas materiais. Por isso, tem medo de seres materiais,
mesmo que eles sejam tão pequenos. Objetivamente falando, a maior diferença
que podemos encontrar entre os dois períodos é que, os fantasmas são, de alguma
forma, consideráveis e respeitáveis. Os pequenos germes, por outro lado, não são
muito para se descrever como seres assustadores. Agora, é claro, não pretendo
sugerir que devemos encorajar os germes e que é bom ter tantos quanto
possível. Isso certamente não é a implicação. Ainda assim, os germes certamente
existem e os fantasmas também existiam, especialmente no que diz respeito
àqueles que ainda mantêm uma crença real no mundo espiritual. Assim, eles nem
sequer diferem em termos de realidade. No entanto, o ponto importante, que
queremos trazer hoje é que os germes só podem se tornar perigosos, se puderem
florescer. Não se deve permitir que os germes floresçam. Mesmo os materialistas
concordarão com essa afirmação, mas não mais concordarão conosco se
prosseguirmos e, do ponto de vista da Ciência Espiritual adequada, falarmos
sobre as condições mais favoráveis para os germes. Os germes florescem mais
intensamente, quando levamos nada mais que pensamentos materialistas, para
dormir conosco. Não há melhor maneira de encorajá-los a florescer, do que
entrar no sono apenas com ideias materialistas, e depois, trabalhar a partir do
mundo espiritual, com o Eu e o corpo astral, naqueles órgãos, que não fazem parte
do sangue e do sistema nervoso. Além disso, outro método que é tão bom, é viver
no centro de uma doença epidêmica ou endêmica e pensar em nada além da
doença ao redor, preenchido, apenas, pelo medo de ficar doente. Isso seria
igualmente eficaz. Se o medo da doença é a única coisa criada em tal lugar e a
pessoa vai dormir à noite com esse pensamento, produz pós-imagens,
imaginações impregnadas de medo. Esse é um bom método de cultivar e nutrir
os germes. Se esse medo puder ser reduzido, mesmo um pouco, por exemplo, com
amor ativo e, enquanto se cuida dos doentes, se esquece, por um tempo, que
também se pode estar infectado, as condições são menos favoráveis aos
germes. Essas questões não são levantadas na Antroposofia, meramente para
apontar o egoísmo humano, mas para descrever os fatos do mundo
espiritual. Este caso concreto demonstra, que na vida real, não podemos evitar
lidar com o mundo espiritual, porque é a base para nossas ações entre o ir dormir
e o acordar. Se as pessoas recebessem pensamentos, que as afastassem do
materialismo e as levassem para o amor ativo do espírito, isso serviria melhor ao
futuro da humanidade. Então, um trabalho infinitamente mais produtivo poderia
ser alcançado, do que através de todos os preparativos, que estão sendo
desenvolvidos pela ciência materialista contra os germes. No decorrer deste
século, tem que se espalhar mais e mais amplamente, a noção de que o mundo
espiritual não é, de forma alguma, irrelevante para a nossa vida física, mas é de
importância essencial para ela, porque estamos no mundo espiritual, entre o
adormecer e acordar, e continua a afetar o corpo físico a partir daí. Mesmo que
isso não seja imediatamente óbvio, é verdade. Agora, nós teremos que nos
acostumar com o fato de que, os poderes diretos de cura, da Ciência Espiritual,
têm que atuar através da comunidade humana, se quisermos ver esses assuntos
sob a luz certa. O que significa que um indivíduo, aqui ou ali, ao dormir entre no
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mundo espiritual com pensamentos voltados para o reino do espírito, enquanto


todos os outros nutrem e alimentam o mundo germinativo, com seus
pensamentos materialistas, sentimentos materialistas e com medos, que estão
sempre ligados ao materialismo? Qual é a natureza real dos germes?
Bem, aqui chegamos a um assunto essencial para a vida humana.
Quando vemos o ar ao nosso redor, preenchido com diferentes espécies de
pássaros e a água cheia de peixes, quando observamos as formas de vida, que se
espalham ao longo da Terra e outras, brincando e se revelando aos nossos
sentidos, estamos olhando para seres que podemos descrever corretamente,
como criaturas da Divindade, em desenvolvimento de uma forma ou de outra,
mesmo que ocasionalmente sejam prejudiciais. Mas, no caso de criaturas
semelhantes a germes, residentes e ativas em outros seres vivos, em plantas,
animais ou humanos, estamos lidando com criações de Ahriman. Para entender
a existência de tais criaturas corretamente, devemos saber, que elas expressam
fatos espirituais, ou seja, a relação entre os seres humanos e Ahriman.
Esta relação é estabelecida, através de uma atitude materialista e estados
puramente egoístas de medo. Veremos corretamente as condições que permitem
a existência de tais seres parasitas, se percebermos que elas são um sintoma de
Ahriman, intervindo no mundo. Claramente, então, não é indiferente se levamos
ideias materialistas ou espirituais conosco para o mundo espiritual, quando
adormecemos. Assim que percebermos isso, não mais poderemos afirmar, que é
irrelevante se soubermos ou não do espírito, neste mundo. Nós temos que
começar num ponto específico, se realmente quisermos entender a grande
importância da pesquisa científico-espiritual para a nossa vida, entre o
nascimento e a morte. Será cada vez mais claro para nós, como essa vida terrena
está conectada com a vida espiritual. Contamos com a Natureza, que está num
nível inferior ao nosso, para nossa nutrição. Por algum tempo após a morte, os
mortos obtêm seu alimento, das ideias e das emoções inconscientes que nós, aqui
na Terra, levamos para dormir conosco. Aqueles que morreram, percebem uma
tremenda diferença entre pessoas que, em sua vida desperta, são preenchidas
apenas com sentimentos e ideias materialistas e também as levam, ao dormir e
outras, que estão totalmente cheias de ideias espirituais enquanto acordadas e
que continuam a ser preenchidas com elas, ao dormir. Os dois tipos de pessoas
são tão diferentes, em seus efeitos sobre os mortos, quanto uma região estéril,
onde nenhum alimento pode crescer, onde as pessoas passariam fome, e uma
área frutífera, que oferece alimento em abundância. Por muitos anos após a
morte, os mortos extraem uma vitalidade das almas que, aqui na Terra, dormem
cheias de conteúdo espiritual, uma vitalidade apenas transposta para o reino
espiritual, daquilo que atraímos, em nossa vida física, dos seres dos reinos da
Natureza, abaixo de nós. Nós literalmente nos transformamos em pastos
frutíferos para os mortos, quando nos preenchemos com as ideias da Ciência
Espiritual. E nos transformamos em terreno árido e matamos os mortos de fome,
se levarmos, apenas, ideias e atitudes materialistas, durante o sono.
Não é pelo entusiasmo, que leva ao estabelecimento de muitas outras Associações
e Sociedades, que nós falamos de Ciência Espiritual nestes tempos. Pelo
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contrário, o desejo de falar sobre isso, surge da necessidade e da sincera


compreensão de que, no século XX, as pessoas precisarão dela.
Independentemente das circunstâncias externas, aqueles que compreendem
totalmente o quanto o mundo precisa da Ciência Espiritual, não podem deixar de
falar sobre seus resultados e compartilhá-los, com seus semelhantes. O poder das
palavras à nossa disposição parece muito fraco, para atender a necessidade de
tornar a Ciência Espiritual cada vez mais disponível para aqueles que, de outra
forma, se afundariam, cada vez mais, no materialismo. Vamos pensar sobre a
natureza de nosso relacionamento com os mortos, com os quais nos relacionamos
na vida, a quem podemos visualizar claramente e de quem frequentemente
pensamos. Qual é o nosso relacionamento com aqueles que morreram, além de
oferecer-lhes nutrição espiritual, levando pensamentos espirituais ao sono?
Qual é o nosso relacionamento com os mortos na vida desperta?
Se os mortos se alimentam do conteúdo de nossas almas durante o sono, então,
todo pensamento, que entra no mundo espiritual e se preocupa com ele e seus
Seres, pode ser percebido pelos mortos. Por outro lado, se não cultivarmos tais
pensamentos, os mortos serão privados deles. Ideias, relacionadas apenas ao
mundo material, às coisas da Natureza, vivem em nossas almas de tal maneira,
que os mortos não podem percebê-las. Essas ideias, por mais acadêmicas ou
sábias, são insignificantes para os mortos. Assim que tivermos pensamentos
sobre o mundo espiritual, não apenas sobre o mundo dos vivos, mas também o
dos mortos, eles terão acesso imediato a eles. É por isso que muitas vezes
recomendamos, que nossos amigos leiam, em silêncio, para um indivíduo, com
quem eles estavam intimamente conectados e que passaram para o mundo
espiritual. Uma forma, uma imagem da pessoa e, em seguida, enquanto se pensa
sobre ele ou ela, lê-se sobre um assunto relacionado ao mundo espiritual.
Os mortos podem, então, participar do processo, o que é importante.
Embora os mortos estejam no mundo que conhecemos através da Ciência
Espiritual, pensamentos sobre o mundo espiritual devem ser produzidos na
Terra. Os mortos devem perceber mais do que o mundo espiritual ao seu
redor; eles precisam dos pensamentos daqueles que vivem na Terra,
pensamentos que para eles são como percepções. A coisa mais importante e mais
bela, que podemos dar aos mortos, é ler para eles, da maneira que acabei de
descrever. Podemos dar algo aos mortos, lendo sobre um assunto espiritual. E se
vocês duvidarem que isso é útil, uma vez que o falecido está no mundo espiritual,
pensem no fato de que nós podemos estar cercados por coisas e seres no mundo
físico, mas não podemos entendê-los. O entendimento tem que ser adquirido.
Assim, embora o falecido esteja no mundo espiritual, os pensamentos da Terra
têm que fluir para ele. Pensamentos iluminadores devem fluir para as regiões
onde os mortos moram, assim como a chuva cai das nuvens, como uma bênção
para o mundo físico. Todos esses exemplos mostram, que é infinitamente
importante, até mesmo para o mundo físico, experienciar o mundo espiritual, em
pensamento. Obviamente, não podemos esperar até depois da morte, por
conhecimento sobre o mundo espiritual. Na verdade, um estudo completo do
mundo espiritual nos mostra, que não estamos na Terra por nada; estamos aqui
para aprender algo que só pode ser aprendido na Terra - uma posse de grande
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valor, que os vivos podem dar aos mortos. A estreita conexão entre a nossa
existência terrena e a vida imediatamente após a morte, também se manifesta em
muitos outros aspectos, mas é difícil falar sobre essa conexão em termos
concretos, porque as palavras podem ser facilmente mal interpretadas. As
pessoas são muito inclinadas ao preconceito e sempre que um assunto, como o
mundo espiritual e seus Seres, é discutido, certos motivos do coração, provocam
mal-entendidos. Quando eu falo de um caso individual, em que existe essa ou
aquela conexão entre a vida de uma pessoa, aqui na Terra e depois da morte, as
pessoas facilmente saltam para as conclusões erradas, de um egocentrismo muito
compreensível, e aplicam a descrição de um caso particular para elas
mesmas. Elas são tentadas a pensar, que as coisas são bem diferentes, no caso
delas; portanto, elas não experimentarão algo tão belo, depois da morte.
Assim, não fazemos mais do que falar, em termos gerais apenas e, ao lidar com
casos específicos, devemos desenvolver a abnegação, para que possamos observar
o destino da outra pessoa, sem tirar conclusões sobre nossa própria vida. Então,
não nos preocuparemos se o mesmo não nos acontece e não estaremos perdendo
o que está sendo descrito. Estas e outras reações similares fornecem motivos para
mal-entendidos, que eu quero evitar. Pouco tempo atrás, um amigo muito
querido morreu e muitos de nós participaram de sua cremação.
Ele comemoraria seu 43º aniversário amanhã, em 6 de maio. Nos últimos anos
de sua vida, ele sofreu muito. Eu gostaria de contar aqui, por assim dizer, uma
história maravilhosa de seus últimos anos, como sua esposa contou para
mim. Durante seu grande sofrimento, nosso amigo não lutava contra admitir
para si mesmo que tinha que sofrer, mas lutava para dizer que estava doente. Ele
não estava doente, ele dizia. Ele sofreu, sim, mas não estava doente, e insistiu que
tal declaração não deveria ser interpretada como uma piada, mas como algo
significativo. Essa definição, “eu sofro, mas não estou doente”, surgiu da sua
consciência de que, o que ele carregava dentro dele como Ciência Espiritual, o que
o sustentava e o levava para dentro, derrotou todos os ataques da doença.
Ele estava ciente de que sofria, mas a saúde de sua alma era tão grande que,
quando ele comparou a sua condição física, ele não podia se considerar
doente. Essa definição é muito importante e adequada para permear nossa alma
como um sentimento. De qualquer forma, vimos como a pessoa, em questão,
passou seus últimos anos na Terra num corpo doente, num corpo sofrido. No
entanto, ele não se via como doente, mas apenas com sofrimento. Se
compararmos isso com a vida espiritual, que agora começou para nosso amigo,
teremos uma imagem digna, do que conecta nossa existência terrena com a vida
após a morte. É um fato do mundo espiritual, que uma série de Imaginações foi
preparada em seu corpo, um corpo que mostrava os sintomas da doença. Uma
série de imaginações, poderosas imaginações, vivia, por assim dizer, nos
membros doentes. Ele estava completamente preenchido com o conteúdo dos
mundos espirituais. Eles viviam nele de tal maneira, que trabalhavam em todos
os órgãos, dos quais normalmente não temos consciência - já que só somos
cônscios do nosso cérebro e sistema nervoso - ou seja, órgãos que
experimentamos num nível mais subconsciente. Essas poderosas imaginações
viviam nesses órgãos, quanto mais exteriormente perceptíveis esses órgãos se
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tornavam. Eles se prepararam e agora aparecem à alma do falecido, como um


poderoso quadro do mundo espiritual. Agora, ele está vivendo nas imagens que
ficaram presas em seus órgãos doentes, especialmente em seus últimos anos. Eles
se prepararam com tal intensidade, que agora o cercam como seu mundo
espiritual. É impossível ver mundos mais belos, ou ver o Cosmo Espiritual mais
perfeitamente e mais lindamente, do que aqueles que florescem e se desenvolvem
na arte espiritual, que não pode ser melhor observada em nenhum outro lugar,
do que através de tal situação. Aqui, no plano físico, um artista pode criar, em
beleza, um pedaço do mundo, de modo que a imagem na tela, ou no mármore,
nos permite ver mais do mundo, do que nós mesmos vemos. Tudo isso, no
entanto, empalidece em insignificância, em comparação com o mundo espiritual,
visto como é e também como surge e floresce, a partir da alma do falecido, que foi
preparada por seu carma, da maneira que descrevi. Como isso foi preparado
ficará claro em seus trabalhos poéticos, que agora estão sendo impressos e
aparecerão em breve. Sua poesia revela, que esse tipo de vida espiritual e a
passagem para o mundo espiritual, após a morte, estão intimamente relacionados
com o que, há muitos anos, temos chamado de impulso de Cristo. O impulso de
Cristo, no sentido em que fala a Ciência Espiritual, está maravilhosamente vivo
na poesia de nosso amigo. Neste contexto, quero acrescentar algo, que possa
realmente nos levar a sentir a relação entre o mundo de nossa vida terrena e
aquele que passamos, entre a morte e um novo nascimento. Não apresentarei
essa conexão com pensamentos abstratos, pois assim vocês poderão
compreender isso, no nível do sentimento. Vejam; alguém pode ser estúpido ou
esperto, aqui no plano físico; pode-se até mesmo ser um estudioso - na vida após
a morte é de pouca importância se alguém foi estúpido, esperto ou se aprendeu
muito, se todas essas qualidades se relacionarem, apenas, com as coisas do
mundo físico. Nossos pensamentos sobre o mundo material podem ser sempre
tão inteligentes; eles serão inúteis para nós, quando tivermos passado pelo portal
da morte. Então, eles não terão mais nenhum significado.
Depois da morte, precisamos de pensamentos, ideias e sentimentos que não se
relacionam com o mundo físico, porque somente esses têm significado, nessa
época. Agora, gostaria de colocar isso de uma maneira um tanto paradoxal e até
grotesca. Não desanimem com o paradoxo; o que eu quero dizer, ficará claro
imediatamente. Vamos supor, que alguém se recuse a ter pensamentos, que não
sejam despertados pela percepção sensorial. Tão logo qualquer coisa colida com
ele e os pensamentos comecem a se desenvolver, ele diz: “Eu não quero você. Eu
prossigo, apenas, com base no que meus olhos veem e meus ouvidos ouvem. Isso
é o que eu quero pensar. Pare de me incomodar com qualquer outra coisa; eu não
vou me incomodar com isso” ... Essa pessoa não acumulará nenhuma força, que
possa ser usada após a morte. Ela estará cega, quando entrar no mundo entre a
morte e o novo nascimento. Suponhamos, agora, que outra pessoa tenha uma
imaginação viva, mas não se incomode em abordar a Ciência Espiritual e
aprender as coisas devagar e gradualmente. Ela acha muito mais fácil desenvolver
ideias sobre o mundo espiritual, a partir de sua imaginação, fantasiar sobre o
mundo espiritual. Essa pessoa tem ideias relativas ao mundo dos sentidos, bem
como todos os tipos de fantasias, sobre o reino do espírito. Tal indivíduo não
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entrará no mundo espiritual como uma pessoa cega, mas terá forças da alma, que
lhe permitirão ver no mundo espiritual. No entanto, pessoas como essa, serão
como somos, quando nossa visão no mundo físico é prejudicada e vemos as coisas
imprecisas como resultado. Essa visão imprecisa é muito pior no mundo
espiritual, do que no plano físico, porque isso leva à confusão a cada passo.
O que eu acabei de dizer, mesmo que pareça grotesco a princípio, mostra-nos que
precisamos de ideias, que vão além da vida dos sentidos, se realmente quisermos
nos tornar cidadãos do mundo espiritual, da maneira como devemos. E a menos
que nos orientemos para além do mundo dos sentidos, viveremos no mundo
espiritual como um aleijado, assim como aqueles, que absorvem apenas ideias
relacionadas ao domínio sensorial e aqueles, que permitem que sua imaginação
corra livremente. Ao longo da história, surgiram vários fundadores de religiões,
para impedir que as pessoas tivessem pensamentos, desencadeados puramente
por objetos físicos ou por fantasias, sobre o mundo espiritual.
Se olharmos para essas personalidades e os ensinamentos que elas deram à
humanidade, descobriremos que, o objetivo de todos esses fundadores religiosos,
era oferecer, às pessoas, ideias sobre o mundo suprassensível, que lhes permitisse
entrar, saudáveis e inteiras, não aleijadas, no mundo espiritual. Os fundadores de
nossas religiões, forneceram ideias que atendiam às necessidades de seu tempo e
cultura específicos. Nossa época é diferente do passado e requer que cresçamos
como seres humanos maduros. Por favor, não tomem isto num sentido
superficial, meramente externo, mas num sentido profundamente interior.
Temos que alcançar a maturidade e encontrar o caminho para o mundo
espiritual, através de nossas almas. Os antigos fundadores de nossas religiões
falaram com uma humanidade, que ainda não estava madura.
Eles se dirigiram às pessoas que estavam num estágio, pelo qual todas as nossas
almas também passaram. Esses antigos líderes religiosos conheciam seus tempos
e também sabiam, que não podiam falar da mesma maneira, para uma
humanidade que se aproximava do futuro, para uma humanidade que devia se
desenvolver em direção à maturidade e à independência.
Se as pessoas dos tempos antigos se restringissem às impressões sensoriais ou
tivessem alcançado os produtos de sua imaginação, em ambos os casos teriam
entrado no mundo espiritual aleijadas ou, no mínimo, num estado confuso. Neste
ponto, apareceu um líder, trazendo verdadeiras ideias do mundo
espiritual. Então, as próprias pessoas diziam, que elas mesmas não tinham acesso
ao mundo espiritual, através da percepção sensorial ou do uso da imaginação,
mas sim através de Zaratustra, Buda ou Krishna, que estimulavam pensamentos
nelas, que lhes permitiam entrar no reino do espírito. Em nosso tempo, os Seres
humanos devem atingir a maioridade, independentemente de o Eu causar
confusão ou cegueira. O Mistério do Gólgota aconteceu, para que possamos
encontrar o caminho para o mundo espiritual, como seres independentes. Os
líderes religiosos não aparecem mais na História, como nos tempos antigos.
Aqueles que comparam Cristo aos antigos mestres religiosos, não entendem nada
sobre Ele. Em primeiro lugar, Cristo atuou através de uma ação, os antigos líderes
religiosos, através de seus ensinamentos. Descrevê-Lo meramente como um
professor da humanidade, significa não saber em absoluto quem é Cristo. A coisa
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essencial sobre Ele é a ação que ele realizou, que começou como uma
consequência de seu Batismo, por João e terminou com a crucificação no
Gólgota. O que foi feito lá pela humanidade é espiritualmente muito
importante. O que aconteceu lá é o que pode permear as almas humanas desde
então, ou seja, a experiência que São Paulo descreveu como, “Não eu, mas Cristo
em mim”. De fato, Cristo se tornou o caminho para o mundo espiritual, porque
Ele o trouxe para este mundo. Ele nos trouxe o mundo espiritual de que
precisamos, para não sermos aleijados ou cegos, após a morte. Hoje em dia, é bem
possível negar a Cristo e afirmar, que não há evidência de que Cristo tenha vivido
no mundo físico, no corpo de Jesus de Nazaré. De fato, as pessoas até produziram
evidências, mostrando que não havia Cristo histórico. Mas com isso, elas apenas
provam, que erraram o alvo. Se Cristo tivesse sido esculpido em uma rocha, para
todas as futuras gerações, "Eu estive aqui", então essas gerações futuras saberiam,
que Ele existiu do mundo sensorial, e eles não precisariam acreditar nisso. Seu
profundo significado, a possibilidade de redenção, é precisamente o de que não
era esse o caso, que não podemos compreendê-Lo através de nossos sentidos, mas
temos de aceitá-Lo com as forças do espírito. Visto nesta luz, encontramos Cristo
intimamente conectado com aquelas coisas, que mesmo aqui na Terra, elevam os
Seres humanos para além do mundo perceptível pelos sentidos, para o reino
espiritual. Nada disso existe para aqueles, que não podem se elevar ao mundo
espiritual, porque não podem escapar de suas dúvidas. Neste contexto, pode ser
um grande alívio, para alguém totalmente envolvido na Cultura moderna, na
Ciência e na Arte, encontrar uma visão de Cristo, que seja apropriada à nossa
civilização moderna, ou seja, a visão antroposófica de Cristo, apresentada na
Ciência Espiritual. Muito pode ser aprendido com isso, por exemplo, como ver o
mundo físico corretamente. Oh, o mundo físico - para onde está indo hoje em
dia? Eu sugeri algumas dessas coisas recentemente, em uma conferência pública,
mas agora posso ser mais explícito. É claro que temos que admirar a civilização
materialista e todas as conquistas da tecnologia, da indústria e assim por
diante. Uma imensa quantidade de energia intelectual fluiu para essas
coisas; elas absorveram uma grande quantidade de energia humana. Mas quem
se beneficia desses esforços intelectuais? Na medida em que satisfazem as
necessidades materiais da humanidade moderna, elas servem a Ahriman. Cristo
Jesus experimentou a tentação de Ahriman. Almas humanas comuns, certamente
não poderiam sobreviver ao choque repentino de tal experiência. Para nós, a
tentação tem que ser diluída. Mas como consequência dessa diluição da tentação,
Ahriman pode nos dizer: “Sim, pensem apenas com o poder de sua Ciência, com
todas essas coisas que vocês podem descobrir, através da ciência aplicada à
tecnologia, indústria e assim por diante. Usem somente essas coisas para o seu
pensamento e aplique-as a nada além da experiência física, que me serve bem. Se
vocês não puderem me ver, isso se ajusta bem aos meus objetivos, diz Ahriman.
Vocês podem muito bem menosprezar a razão e o conhecimento, as conquistas
supremas dos Seres humanos; assim vocês são absolutamente meus - pelo menos
enquanto vocês não me virem. Vou incutir, em vocês, o impulso para usar a razão
e o conhecimento, apenas para coisas terrenas”! Algo mais é necessário para
contrabalançar o serviço que prestamos a Ahriman. Por isso, é importante que
33

reunamos tudo o que a tecnologia moderna pode realizar, para construir algo com
ela, que não sirva à nossa existência exterior, mas apenas à nossa vida espiritual.
Nos tempos antigos, as pessoas apresentavam sacrifícios aos deuses, os primeiros
frutos do campo e do rebanho. Não pretendo falar sobre o significado do sacrifício
hoje, mas vocês podem ver o que isso poderia significar, apresentado de uma
forma apropriada aos tempos modernos. Quando os primeiros frutos foram
sacrificados aos deuses, o povo participou do restante. A Ciência Espiritual
certamente não é baseada em falso ascetismo. Não será culpada do absurdo de
reclamar e delirar contra a cultura moderna, com todas as suas bênçãos
materiais. Pelo contrário, reconhece seu valor. Mas se quisermos evitar servir
apenas a Ahriman, temos que sacrificar algo dos primeiros frutos desta cultura
material externa, aos deuses. Então, vocês veem, há um profundo pensamento
subjacente ao edifício, que está crescendo, no lado de fora da colina, em Dornach:
Nós queremos oferecer os primeiros frutos da civilização moderna aos
deuses. Agora tudo é diferente do modo como foi nos tempos, em que nossas
almas passaram em encarnações anteriores. E temos que entender a natureza da
nossa tarefa atual, assim como entendemos o que tínhamos que fazer, em nossas
encarnações anteriores, quando fomos guiados por luminares espirituais. Isso é
especialmente difícil agora, porque temos que levar em conta, não apenas a
natureza de nosso tempo, mas também nossas qualidades de alma. Além disso,
não podemos mais confiar na autoridade externa, que apoiou os fundadores das
religiões; temos que trabalhar com forças bem diferentes. Cristo era a Palavra!
Tais reflexões nos dão uma visão da conexão entre o mundo espiritual e nosso
mundo, aqui na Terra. E não importa onde começamos, vemos o Mistério do
Gólgota irradiando em direção a nós, como o coração e a alma de tais
reflexões. Mas não devemos esquecer, que temos que nos tornar maduros,
verdadeiramente maduros, para que possamos entender o que a Ciência
Espiritual deve ser. Nunca devemos esquecer, que ela deve existir, porque a
humanidade precisa atingir a maioridade. É completamente verdade, que a
humanidade descende de regiões espirituais mais elevadas e se afastou da velha
clarividência atávica, desenvolvendo uma visão de mundo, baseada na razão e no
pensamento sistemático. Temos que levar esse progresso da evolução a
sério. Precisamos perceber, que vivemos numa época em que é nossa missão
desenvolver nosso pensamento, avançar em nosso pensamento e aprender
através do estudo. A Ciência Espiritual é nossa base, nosso ponto de
partida. Temos que tentar nos imergir nessas ideias, para que elas estimulem,
dentro de nós, o que nossas almas precisam para o futuro. O que a Ciência
Espiritual oferece, pode ser entendido por todos. Aqueles que afirmam, que
alguém não pode entender o conteúdo da Ciência Espiritual, mas deve acreditar
nele, fala sem saber como essas coisas realmente são. Não devemos nos enganar,
quando encontramos pessoas, que não avançaram por meio da compreensão
intelectual, mas têm certas habilidades psíquicas, que parecem surgir
espontaneamente. Com base em nossa compreensão da missão da Ciência
Espiritual, sabemos que agora, as almas apenas podem pensar, porque a
clarividência de uma Era anterior foi suprimida. As pessoas com clarividência
natural, que não foram adquiridas por meio do esforço interior, devem ser vistas
34

como pessoas que permaneceram num estágio evolutivo anterior e que, portanto,
deveriam receber cuidados especiais em nossa Sociedade, ao invés de serem
consideradas particularmente avançadas. Seria um julgamento incorreto, se
considerássemos essas almas particularmente maduras, como tendo
experimentado encarnações particularmente elevadas. Pessoas com um dom
natural de clarividência, passaram por muito menos, do que aqueles que são
pensadores, hoje em dia. Essas coisas precisam ser entendidas adequadamente
em nossa Sociedade. Então, seria possível (e é meu dever dizer isto) que nossa
Sociedade seja um lugar onde tais almas, com poderes psíquicos, possam
encontrar cuidado e ser guiadas no caminho certo. Nossa Sociedade poderia dar
a elas o que não podem conseguir em outro lugar: ordem em suas almas. Mas
para tornar isso possível, a maioria dos membros da nossa Sociedade deve ter um
profundo conhecimento interno da missão da verdadeira Ciência Espiritual, no
presente. Se isso acontecesse, o caso que nos entristeceu, nos últimos dias, não
poderia voltar a ocorrer. Estou me referindo a um membro, que se juntou à crença
de que nossa Sociedade cuidaria de forças psíquicas clarividentes, mas depois
encontrou aqui uma audiência cativa e assumiu o papel de profeta. Tal evento
abre a porta para todas aquelas coisas que, se prevalecessem, teriam tornado
nossa Sociedade exatamente no oposto do que ela deveria ser, de acordo com as
intenções das forças espirituais, que a fundamentam. Infelizmente, tivemos que
sofrer o caso de ..., que veio de um País do Norte. Ele poderia ter se tornado um
bom membro, se tivesse trabalhado em silêncio no desenvolvimento de seus
poderes psíquicos. Ao invés disso, ele foi imediatamente cercado por uma espécie
de aura. Ele se apresentou em todos os lugares, como um curador, de uma
maneira que só podemos considerar lamentável. Tornou-se necessário anunciar
que ele não podia mais ser considerado membro de nossa Sociedade. Pois seria
transformado exatamente no oposto do que deveria ser, se deixássemos de
chamar atenção, cuidadosamente, para fenômenos psíquicos, que não estão
imbuídos do verdadeiro poder espiritual, que, afinal, é o verdadeiro poder de
Cristo. Cristo, não poderes psíquicos, deve atuar em nós. Essas circunstâncias
devem ser tratadas de modo a deixar claro, que nossa Sociedade não terá nada a
ver com isso. Não conhece outra sanção, além da usada nos últimos
dias. Infelizmente, um passo tinha que ser dado, para nos opormos, em princípio:
um membro tinha que ser expulso. Isso não pode ser separado de um conceito
sério e digno da missão da Sociedade Antroposófica. E certamente, vocês
entenderão que foi somente com grande tristeza, que se viveu ao longo dos
eventos, que tiveram que ser vividos aqui, nos últimos dias. A princípio, somos
contrários a todas as expulsões e, no entanto, não pudemos evitar expulsar
alguém, em tal caso. Isso acontecerá com cada vez menos frequência, se os nossos
queridos amigos continuarem a levar a sério as coisas que foram ditas, com tanta
frequência e que também foram objeto da palestra desta noite.
Com isso, concluirei minhas observações, meus queridos amigos, e as confiarei
às suas almas.

*************
35

PALESTRA IV

A PRESENÇA DOS MORTOS EM NOSSA VIDA

Paris, 25 de maio de 1914

Em primeiro lugar, meus queridos amigos, quero dizer que estou muito feliz,
por nos encontrarmos aqui neste ramo da Sociedade Antroposófica
hoje. Lembro-me, com grande prazer, do nosso encontro do ano passado e
minha saudação, no início desta palestra, é tão sincera quanto essa
lembrança. Hoje, quero falar sobre um assunto intimamente ligado ao
núcleo do nosso movimento antroposófico. Todos os resultados do nosso
movimento espiritual são baseados em pesquisas, que podem ser chamadas
de clarividentes. Embora muitas vezes tenha enfatizado, que nosso coração,
mente e sentimentos são afetados, principalmente pelas verdades
antroposóficas, não podemos ignorar, que essas verdades dependem da
pesquisa clarividente, que é uma expressão de uma condição anímica
diferente da vida cotidiana. Parecem nos afastar das coisas, que nos parecem
tão importantes na vida cotidiana, mas, na realidade, a pesquisa clarividente
nos leva diretamente ao coração da vida verdadeiramente humana.
Hoje, não quero falar sobre os caminhos da pesquisa clarividente, pois já os
descrevi em Conhecimento dos Mundos Superiores e Sua Aquisição . Ao
invés disso, gostaria de caracterizar a condição e a disposição da alma, que
se desenvolve como consequência dessa pesquisa. De fato, devemos ter em
mente que, se seguirmos os caminhos da pesquisa clarividente, nos
sentiremos completamente diferentes de nosso Eu habitual. O que acontece
à nossa alma quando se torna clarividente, pode ser comparado com nossos
sonhos, que são como clarividência substituta. Quando sonhamos, vivemos
em um mundo de imagens, que nada contém do que chamamos de “a
sensação de tocar um objeto fora de nós”. Em nossos sonhos, geralmente,
não há nada que possamos comparar com a consciência normal do Eu.
Se algum aspecto do nosso Eu aparece em nossos sonhos, parece estar
separado de nós, quase como outro Ser fora de nós. Nós encaramos nosso
Eu como uma entidade separada. Assim, podemos falar de uma duplicação
do Eu. No entanto, nos sonhos, percebemos, apenas, a parte de nós que se
separou, não o Eu subjetivo. As imagens da pesquisa clarividente se
assemelham a sonhos, porque tanto o sentido do tato, quanto o Eu subjetivo,
estão ausentes. Um clarividente, que relembra suas experiências, deve sentir
que a realidade clarividente é permeável e, ao contrário dos objetos físicos,
não oferece resistência ao toque. No mundo físico, temos consciência do Eu
porque sabemos: estou aqui, o objeto está fora de mim. Entretanto, na
percepção clarividente, estamos dentro do objeto, não separados do que
percebemos. Consequentemente, os objetos individuais não são fixos e
distintos como os físicos, mas estão em contínuo movimento e
transformação.
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Os objetos no mundo físico são fixos, porque podemos tocá-los e porque nos
oferecem limites, que os objetos da percepção clarividente não têm.
Vamos, primeiro, ver o que acontece quando, através de nossas faculdades
clarividentes, nos deparamos com uma pessoa que morreu.
Tal encontro pode acontecer, quando a figura do falecido se aproxima da
percepção clarividente, como uma imagem de sonho muito vívida,
parecendo ser tão lembrada, quanto a pessoa que olhamos na vida.
No entanto, este não é o tipo usual de tais encontros, mas uma exceção rara.
Outra possibilidade é que percebamos, clarividentemente, uma pessoa
morta, que assumiu a forma de um indivíduo vivo ou de outro morto e,
portanto, não aparece em sua própria forma. A aparência do falecido,
portanto, é de pouca relevância para identificá-lo. Talvez gostássemos,
particularmente, de outra pessoa morta ou de ter uma amizade
particularmente próxima com uma pessoa viva; o falecido, que se aproxima
de nós, pode, então, assumir a forma de qualquer um desses outros
indivíduos. Em outras palavras, nos faltam todos os meios usuais de
identificar o Eu e a aparência de uma pessoa no mundo físico.
Isso nos ajudará a encontrar o nosso caminho, para lembrar que a aparência
ou a forma não é de todo importante; um Ser está nos encontrando sob uma
forma ou outra, e precisamos observar, o que esse Ser faz. Se tomarmos
nosso tempo e observarmos cuidadosamente a imagem diante de nós,
perceberemos que, com base em tudo o que sabemos sobre o indivíduo em
questão, essa pessoa não poderia agir da maneira que ele faz, na esfera
clarividente; suas ações são totalmente fora do personagem.
Frequentemente, encontramos uma contradição entre a pessoa que nos
aparece e suas ações. Se permitirmos que nossos sentimentos acompanhem
essas ações, ignorando a aparência do indivíduo, teremos, nas profundezas
de nossa alma, um sentimento nos dizendo com o que estamos realmente
lidando. Deixe-me repetir, que somos guiados por um sentimento, que se
eleva das profundezas de nossa alma, pois isso é muito importante.
A aparência do indivíduo na esfera clarividente, parece assemelhar-se a uma
figura física, mas pode ser tão diferente do fato de estar realmente presente,
quanto os signos da palavra “casa” são da própria casa.
Como podemos ler, não nos concentramos nos signos, que compõem a
palavra “casa” e não descrevemos a forma das letras, mas, ao contrário, nos
encaminhamos para o conceito “casa”. Da mesma forma, aprendemos, na
clarividência verdadeira, nos mover, da figura que percebemos, para o Ser
real. É por isso que falamos de ler o roteiro oculto, no verdadeiro sentido da
palavra. Ou seja, nos movemos interior e ativamente, da visão para a
realidade que ela expressa, exatamente como as palavras escritas expressam
uma realidade. Como podemos desenvolver essa capacidade de ir além da
aparência, para a visão imediata? Fazemos isso, acima de tudo, examinando
novas ideias e conceitos que precisaremos, se quisermos entender a nova
esfera clarividente, isto é, em contraste com as ideias que usamos no mundo
físico. No mundo físico, olhamos para um objeto ou um Ser e dizemos, com
razão, que eu percebo esse Ser, esse objeto.
37

Percebemos os reinos vegetal, mineral e animal, o reino dos Seres humanos


físicos, bem como as nuvens, montanhas, rios, estrelas, Sol e Lua. O
sentimento, expresso nas palavras “eu percebo”, sofre uma transformação
quando entramos na esfera clarividente. Deixe-me tentar explicar isso com
uma analogia, embora possa parecer simplista. Se você fosse uma planta,
como você se relacionaria com as pessoas que percebem você? Se essa planta
tivesse consciência e pudesse falar, teria que dizer: as pessoas olham para
mim, sou percebida por elas. Claro, nós dizemos: Eu percebo a planta, mas
em seu nível de consciência, a planta teria que dizer que foi percebida pelos
Seres humanos. É este sentimento de ser percebido, de estar sendo olhado,
que devemos adquirir, em relação aos Seres da esfera clarividente. Por
exemplo, em relação aos Seres da terceira Hierarquia, os Anjos, devemos
estar cientes de que, estritamente falando, não é correto dizer “eu percebo
um Anjo”, mas temos que dizer “sinto um Anjo me percebendo”. Com base
em nossa visão de mundo copernicana, sabemos muito bem que o Sol não se
move. No entanto, dizemos que ele se eleva e se move pelo céu,
contradizendo assim, nosso melhor conhecimento. Da mesma forma, na
linguagem cotidiana, podemos dizer que vemos um Anjo. Mas isso não é a
verdade. Teríamos que dizer, que nos sentimos sendo vistos ou percebidos
por um Anjo. Se dissermos que experienciamos o Ser de um Anjo ou de uma
pessoa morta e pudemos senti-lo, falaríamos a verdade, do ponto de vista
clarividente. Talvez um exemplo da observação clarividente, ajude vocês a
entenderem isso. Há mais de dez anos, no início de nosso trabalho com a
Ciência Espiritual, um querido amigo nosso trabalhou conosco por um curto
período de tempo. Esse indivíduo possuía, não apenas entusiasmo pelo que
poderíamos dar a ele, nos primeiros estágios da Ciência Espiritual, mas
também uma profunda sensibilidade e compreensão artística. Não se podia
deixar de amar essa pessoa, um amor que pode ser descrito como objetivo,
por causa de suas qualidades. Tendo trabalhado conosco por um tempo
relativamente curto e tendo aprendido muito sobre os resultados da Ciência
Espiritual, ele deixou o mundo físico. Não há necessidade de ir para os
próximos quatro ou cinco anos após a sua morte; então deixe-me ir
diretamente para o que aconteceu, depois disso. Em 1909, apresentamos
nossos Dramas de Mistérios, em Munique, precedidas, para nosso grande
deleite, por Filhos de Lúcifer, por nosso respeitado amigo, Édouard Schuré.
Seja o que for que vocês pensem sobre a maneira como as peças foram
produzidas na época e depois, nós tivemos que apresentá-las da maneira que
fizemos. As circunstâncias em que tínhamos que trabalhar nas performances
eram tantas, que precisávamos de um impulso do mundo espiritual, um
impulso que também incluía o aspecto artístico, que queríamos
incorporar. Agora, posso assegurar-lhes que, mesmo naquela época, em
1909, e ainda mais nos anos posteriores, sempre senti um impulso espiritual
específico, enquanto trabalhava nos preparativos para as apresentações.
Vocês veem, quando temos trabalho a fazer no mundo físico, precisamos,
não apenas de intelecto e habilidades, mas também da força de nossos
músculos. Nossos músculos nos ajudam objetivamente; eles nos são dados
38

diferentemente das capacidades intelectuais, em que nós mesmos vivemos.


Agora, ao lidar com as questões do espírito, precisamos de forças do mundo
espiritual, para combinar com as nossas, assim como precisamos da força de
nossos músculos, para a ação física. No caso que mencionei, o impulso do
indivíduo, que deixou o mundo físico em 1904, entrou, cada vez mais, em
nosso trabalho artístico nas peças de Munique. Para descrever o que
aconteceu, eu teria que dizer que, os impulsos desse indivíduo desceram do
plano espiritual e fluíram para as minhas intenções, para o meu trabalho.
Ele era o patrono do nosso trabalho. Desenvolvemos os sentimentos corretos
em relação aos mortos, se nos conscientizarmos, de que seu olhar espiritual
- se é que posso usar essa expressão - e seus poderes, se concentram em
nós; eles olham para nós, agem em nós e aumentam nossa força. Para
experimentar tal fato espiritual da maneira correta, precisamos desenvolver
um tipo muito específico de abnegação e uma capacidade de amar. É por isso
que enfatizei, que alguém poderia amar essa pessoa, objetivamente, por
assim dizer, por causa de suas qualidades; era preciso amá-la porque ela era
como era. Um amor subjetivo, um amor que surge de necessidades pessoais,
pode facilmente ser egoísta e pode potencialmente nos impedir de encontrar
o relacionamento correto, com um indivíduo já morto.
A diferença entre o amor certo, o amor abnegado, que temos por tal pessoa
e o amor egoísta, torna-se perfeitamente óbvio na experiência clarividente.
Vamos supor, que essa pessoa gostaria de nos ajudar depois de sua morte,
mas não podemos desenvolver um verdadeiro amor altruísta por ela. Seu
olhar espiritual, sua vontade espiritual fluindo para nós seria, então, como
uma sensação de queimação, causando uma sensação penetrante e ardente
em nossa alma. Se pudermos sentir e manter um amor altruísta, essa
corrente - seu olhar espiritual - fluirá para nossa alma como uma sensação
de calorosa suavidade e se derramará em nossos pensamentos, na
imaginação, no sentimento e na disposição. É a partir desse sentimento, que
reconhecemos quem é a pessoa morta e não com base em sua aparência,
porque os mortos podem se manifestar sob a forma de uma pessoa com
quem nos sentimos próximos, no momento. A forma em que os Seres do
mundo superior nos aparecem - e depois da morte somos todos Seres de um
mundo espiritual superior - depende de nossa natureza subjetiva, sobre o
que habitualmente vemos, pensamos e sentimos. A realidade é o que
sentimos pelo Ser manifesto, diante de nós, como recebemos o que nos vem
deste Ser. Independentemente do que Joana d'Arc disse sobre a aparição dos
Seres superiores, em suas visões, o ocultista, que é capaz de investigar essas
coisas, sabe que, sempre foi o gênio da nação francesa, que estava por trás
delas. Eu descrevi como podemos sentir o olhar de Seres espirituais
repousando sobre nós e sua vontade fluindo em nossas almas.
Aprender isso é análogo a aprender a ler no plano físico. Aqueles, que
simplesmente querem descrever suas visões, seriam como pessoas
descrevendo a forma das letras numa página, ao invés de seu
significado. Isso mostra como é fácil ter noções preconcebidas sobre as
39

experiências no mundo espiritual. Naturalmente, parece mais óbvio atribuir


grande importância à descrição de como era a visão.
No entanto, o que realmente importa é o que está por trás do véu da
percepção e é expresso nas imagens da visão. Assim, no curso do
desenvolvimento oculto, a alma mergulha em estados de espírito e estados
interiores, diferentes daqueles da nossa vida cotidiana. Entramos no mundo
da Hierarquia dos Anjos e da hierarquia, poderíamos dizer também -
hierarquia dos mortos - assim que nossos exercícios ocultos nos levaram ao
estágio em que, o sentido do tato, característico do mundo físico, não existe
mais e onde a aparência de uma pessoa não é mais característica do Eu, em
questão. Então, nosso pensamento muda e não temos mais pensamentos, no
sentido de como os temos aqui, no mundo físico. Nesse mundo, todo
pensamento assume a forma de um Ser elementar; no mundo físico, nossos
pensamentos podem concordar ou contradizer um ao outro. Neste outro
mundo em que entramos, os pensamentos encontram outros pensamentos
como Seres reais, amando ou odiando uns aos outros. Começamos a nos
sentir num mundo de muitos Seres pensantes. E, naqueles Seres vivos do
pensamento, sentimos realmente o que geralmente chamamos de “vida”.
Aqui a vida e o pensamento estão unidos, enquanto que estão
completamente separados, no mundo físico. No plano físico, quando
falamos e contamos nossos pensamentos para alguém, temos a sensação de
que nossos pensamentos vêm de nossa alma, que temos que lembrá-los
nesse momento específico. Falando como um verdadeiro ocultista e não
como alguém, que apenas conta suas experiências de memória, sentimos que
nossos pensamentos surgem como seres vivos. Devemos ficar contentes, se
formos abençoados no momento certo, com a abordagem de um pensamento
como um ser real. Quando vocês expressam seus pensamentos no mundo
físico, por exemplo, como palestrante, será mais fácil falar pela trigésima
vez, do que na primeira vez. Se, no entanto, você fala como um ocultista, os
pensamentos sempre têm que se aproximar de você e depois partir
novamente. Assim como alguém que lhe pagou a trigésima visita, teve que
se dirigir a você trinta vezes, o pensamento vivo, que expressamos pela
trigésima vez, tem que chegar à nós trinta vezes, como aconteceu na primeira
vez; nossa memória é absolutamente inútil aqui. Se você expressa uma ideia
no nível físico e alguém está sentado em um canto pensando: "Eu não gosto
desse absurdo, eu odeio", você não será particularmente incomodado por
isso. Você preparou suas ideias e as apresentou, independentemente dos
pensamentos positivos ou negativos de alguém na plateia.
Mas se, como esoterista, você deixa os pensamentos se aproximarem de
você, eles podem ser atrasados e afastados por alguém, que os odeie ou que
odeie o orador. E as forças que bloqueiam esse pensamento devem ser
superadas, porque estamos lidando com seres vivos e não meramente com
ideias abstratas. Esses dois exemplos mostram que, assim que entramos na
esfera da clarividência, estamos imersos em pensamentos vívidos e
tecidos. É como se esses pensamentos não fossem mais subjetivos, é como
se você não estivesse mais dentro de você, como se estivesse vivendo no
40

mundo exterior. Quando você está neste mundo de pensamentos vívidos e


entrelaçados, você está no âmbito da Hierarquia dos Anjos. E, assim como o
nosso mundo físico está em toda parte cheio de ar, o mundo da Hierarquia
dos Anjos é preenchido com o calor ameno, do qual falei anteriormente, que
os Seres dessa Hierarquia derramam. Quando nosso desenvolvimento
interior nos levar ao estágio, em que podemos viver nessa atmosfera
espiritual de suavidade contínua, sentiremos os olhos espirituais da
Hierarquia dos Anjos, repousando sobre nossas almas. Em nossa vida
terrena, temos certos ideais e pensamos sobre eles, abstratamente. Quando
pensamos neles, nos sentimos obrigados a perseguir esses ideais. Na esfera
clarividente, no entanto, não há ideais abstratos. Há ideais que são Seres
vivos, da Hierarquia dos Anjos e fluem através do espaço espiritual, olhando
para nós, com calor. No mundo físico, podemos ter ideais, conhecê-los bem
e, no entanto, podemos não fazer nada para aplicá-los. Nossas emoções, e
talvez paixões, podem nos tentar a evitá-las. No entanto, se conscientemente
ignorarmos um ideal na esfera clarividente, sentiremos o olhar espiritual de
um Ser da Hierarquia dos Anjos dirigido à nós, com vergonha e essa
repreensão queima. Portanto, no mundo espiritual, ignorar um ideal é uma
realidade e um Ser da Hierarquia dos Anjos nos censura. Seu olhar nos faz
sentir a censura; é a reprovação que sentimos. Veja, aprender a desenvolver
um sentimento real pelos ideais, é uma maneira de entrar no mundo da
Hierarquia dos Anjos. Limitar nossa consciência ao plano físico, pode nos
levar a pensar que nada acontecerá, se estivermos com preguiça de agir, de
acordo com nossos ideais. No entanto, podemos aprender a sentir que, se
não agirmos de acordo com um ideal, então, independentemente de outras
consequências, o mundo se torna diferente do que teria sido, se tivéssemos
seguido nosso ideal. Quando começarmos a ver, que não agir de acordo com
nossos ideais é algo real e, quando pudermos transformar esse insight, num
sentimento genuíno, estaremos a caminho da Hierarquia dos
Anjos. Transformar e vitalizar nossos sentimentos, permite que nossas
almas cresçam nos mundos superiores. Através do contínuo treinamento
esotérico, podemos elevar-nos a um nível ainda mais alto, o da Hierarquia
dos Arcanjos. Se ignorarmos os Anjos, nos sentiremos reprovados. Com os
Arcanjos sentimos a reprovação, bem como um efeito real sobre o nosso
Ser. A força e o poder dos Arcanjos funcionam através do nosso Eu, quando
vivemos em seu mundo. Por exemplo, há alguns meses, perdemos um amigo
muito querido, quando ele saiu do plano físico. Um profundo poeta, ele
rapidamente encontrou seu caminho na visão antroposófica do mundo, nos
últimos cinco anos e os sentimentos que isso evocou nele são
maravilhosamente refletidos, em sua recente poesia. A partir do momento
em que ele se juntou a nós e mesmo antes disso, ele estava lutando com um
corpo enfermo e em deterioração. Quanto mais seu corpo se deteriorava,
mais sua alma se enchia de poesia, que refletia nossa visão de mundo. Pouco
tempo se passou desde a sua morte e, por isso, ainda não se pode dizer, que
exista nesse indivíduo uma consciência clara. No entanto, os primeiros
estágios de seu desenvolvimento na existência após a morte, podem ser
41

vistos. O corpo astral, agora separado do físico e vivendo no mundo


espiritual, revela os mais maravilhosos quadros do desenvolvimento
cósmico, como os entendemos na Ciência Espiritual. Tendo deixado o corpo
físico deteriorado, o corpo astral tornou-se tão iluminado,
comparativamente falando, que pode apresentar, ao observador
clarividente, um quadro completo da evolução cósmica. Deixe-me usar uma
analogia, para explicar o que quero dizer. Podemos amar a Natureza e
admirá-la, e ainda apreciar uma bela pintura, que recria o que vimos na
Natureza. Da mesma forma, podemos ser elevados, quando o que vimos na
esfera clarividente, se ilumina novamente, como uma pintura cósmica, por
assim dizer, num corpo astral de uma pessoa que morreu.
O corpo astral de nosso amigo falecido revela, depois da morte, o que ele
absorveu, a princípio inconscientemente, mas depois também
conscientemente, no curso de seu desenvolvimento antroposófico, quando
os Seres, da Hierarquia dos Arcanjos, trabalharam ativamente, na
transformação poética de seus pensamentos e ideias antroposóficas.
O progresso em nosso desenvolvimento esotérico pode ser chamado de
místico, porque é, inicialmente, o progresso interior da alma.
Transformamos nossa personalidade comum e gradualmente alcançamos
um novo estado. Este crescimento passo a passo da alma, é um progresso
místico, porque a princípio é experimentado interiormente. Assim que
percebermos a suavidade do mundo espiritual olhando para baixo,
estaremos objetivamente no mundo dos Anjos, que se revela a nós. E assim
que pudermos reconhecer, que forças reais e poder entram em nós,
estaremos no reino dos Arcanjos. Com cada estágio do progresso místico
interno, precisamos entrar em outro mundo. No entanto, se falharmos em
desenvolver o altruísmo e alcançarmos o estágio de viver no mundo dos
Anjos, permanecendo egoístas e sem amor, então levaremos o Eu, destinado
ao mundo físico, para aquele âmbito. Ao invés de sentirmos o olhar suave e
a vontade dos Anjos sobre nós, sentiremos que outras forças espirituais são
capazes de ascender em nós. Ao invés de olhar para nós de fora, elas foram
liberadas por nós de seu submundo, digamos, enquanto fomos elevados a
um mundo superior. Ao invés de sermos ofuscados, ou melhor, iluminados
pelo mundo dos Anjos, experimentaremos os Seres luciféricos, que emergem
de nós. Então, se alcançarmos o estágio de desenvolvimento místico, que nos
permite entrar no mundo dos Arcanjos - sem, no entanto, termos
desenvolvido, primeiro, o desejo de receber pela graça, as influências do
mundo espiritual, nós colocaremos nosso Eu em seu reino. Como resultado,
ao invés de sermos fortalecidos e preenchidos com o poder dos Arcanjos, os
Seres do mundo ahrimânico emergem de nós e nos cercam. À primeira vista,
a ideia de que o mundo de Lúcifer aparece no reino dos Anjos e o mundo de
Ahriman no dos Arcanjos, parece terrível. No entanto, não há nada de
horrível nisso. Lúcifer e Ahriman são, de qualquer modo, Seres superiores a
nós. Lúcifer pode ser descrito como um Arcanjo deixado para trás, num
estágio anterior de evolução. Ahriman como um Espírito da Personalidade,
também deixado para trás num estágio anterior.
42

O terrível não é que encontremos Lúcifer e Ahriman, mas que os


encontremos sem reconhecê-los por quem eles são. Encontrar Lúcifer no
mundo dos Anjos, significa realmente, encontrar o Espírito da beleza, o
Espírito da liberdade. Mas a coisa mais importante é que, reconheçamos
Lúcifer e seus anfitriões, assim que entrarmos no mundo dos Anjos. O
mesmo é verdade para Ahriman, no reino dos Arcanjos. Lúcifer e Ahriman,
soltos nos mundos superiores, só são terríveis se não os reconhecermos,
quando os libertarmos, porque então, eles nos controlam, sem o nosso
conhecimento. É importante que os enfrentemos conscientemente. Quando
tivermos avançado em nosso desenvolvimento místico, para o nível de viver
no mundo dos Anjos e quisermos continuar lá, com um ocultismo realmente
frutífero, teremos que procurar Lúcifer, tão logo esperamos que o olhar
espiritual dos Anjos descanse sobre nós. Lúcifer deve estar presente - e se
não pudermos encontrá-lo, ele estará dentro de nós. Mas é muito importante
que Lúcifer esteja fora de nós neste reino, para que possamos enfrentá-lo.
Esses fatos sobre Lúcifer e Ahriman, Anjos e Arcanjos, explicam a natureza
da revelação, nos mundos superiores. Do nosso ponto de vista no mundo
físico, somos facilmente levados a acreditar que Lúcifer e Ahriman são
poderes malignos. Mas quando entramos no mundo superior, isso não tem
mais significado. Na esfera clarividente, Lúcifer e Ahriman devem estar
presentes, tanto quanto os Anjos e os Arcanjos. No entanto, nós não os
percebemos da mesma maneira. Identificamos os Anjos e os Arcanjos, não
por sua aparência, mas conhecemos os Anjos pela brandura, que flui deles
para dentro de nós e reconhecemos os Arcanjos, permitindo que sua força e
poder fluam para nossos sentimentos e vontade. Lúcifer e Ahriman
aparecem para nós, como figuras meramente transpostas para o mundo
espiritual; nós não podemos tocá-los, mas podemos nos aproximar deles,
como projeções espirituais do mundo físico. É claramente importante que
aprendamos, em nosso desenvolvimento místico clarividente, a ver formas
no mundo superior e estarmos cientes de que somos vistos, que uma vontade
superior se concentra em nós. Vocês veem, o desenvolvimento superior não
consiste, apenas, em adquirir faculdades clarividentes, mas em desenvolver
um certo estado de alma, uma certa atitude ou relação com os Seres do
mundo superior. Essa nova atitude e estado de alma devem ser
desenvolvidos, de mãos dadas com o treinamento de nossas faculdades
clarividentes. Em outras palavras, devemos aprender, não apenas a ver no
mundo espiritual, mas também a ler nele. Leitura não significa aqui, em
sentido restrito, de um simples processo de aprendizado, mas como algo que
adquirimos, através da transformação de nossos sentimentos e sensações.
É importante ter em mente, que uma divisão de nossa personalidade ocorre,
quando a clarividência começa e chegamos a uma revelação dos mundos
superiores. Nossa personalidade terrena é deixada para trás e uma nova é
adquirida, ao ascendermos à um mundo superior. E, assim como os Seres
das Hierarquias superiores olham para nós no mundo superior, percebemos
nossa personalidade comum, de uma perspectiva mais elevada. Nosso Eu
superior descarta o inferior e o observa. Então, para fazer afirmações válidas
43

sobre os mundos superiores, é melhor esperarmos, até podermos dizer: é


você; a pessoa que você vê, em sua visão clarividente, é você mesmo. "Isso é
você" no nível superior corresponde a "isto sou eu", no físico.
Agora, lembre-se de quando você tinha oito ou treze ou quinze anos e tente
reconstruir, a partir de sua memória, uma pequena parte de sua vida,
naqueles momentos. Tente lembrar, o mais vividamente possível, o seu
pensamento nesses anos. Em seguida, concentre-se em seus sentimentos
atuais, sobre a menina ou o menino que você era aos oito, treze ou quinze
anos. Assim que nos movermos, do nível físico para o mundo superior, o
momento presente, no qual vivemos agora, se torna uma memória, do tipo
que acabamos de recordar. Nós olhamos para a nossa atual existência no
nível físico e naquilo em que ainda podemos nos tornar, durante o resto de
nossa vida física, da mesma maneira que você olha para suas experiências
aos oito, treze ou quinze anos, de seu ponto de vista, no momento presente.
Tudo o que consideramos parte de nós mesmos no nível físico, como nossos
sentimentos, pensamentos, ideias e ações, torna-se uma memória, assim que
entramos no mundo superior. Nós olhamos para o mundo físico e nos
tornamos uma memória para nós mesmos, quando vivemos no mundo
superior. Temos que manter nossas experiências nos mundos superiores
separadas daquelas do mundo físico, assim como distinguimos entre nossa
situação atual e uma anterior. Imagine uma pessoa que tem 40 anos e
lembra-se vividamente dos sentimentos e habilidades que tinha, quando
menino ou menina de oito anos. Por exemplo, a pessoa pode estar lendo um
livro agora, com a idade de quarenta anos e, de repente, ele ou ela começa a
se relacionar com o livro, como um menino de oito anos de idade faria. Isso
seria uma confusão das duas atitudes, os dois estados da alma e é análogo ao
que ocorre, quando nós confundimos nosso estado de alma, no plano físico,
com aquele que é necessário, nos mundos superiores. Claro, isso não tem
nada a ver com o fato de que, toda pessoa imparcial pode entender o que eu
digo sobre os mundos superiores; em outras palavras, não precisamos
acreditar nessas descrições, apenas, mas podemos entendê-las, se as
abordarmos sem ideias preconcebidas. As pessoas podem objetar, que não
podemos descrever os mundos superiores com conceitos, pensamentos e
ideias do mundo físico, porque os primeiros são completamente diferentes
do último. Essa objeção faz tanto sentido, quanto dizer, que não podemos
dar às pessoas uma ideia do que queremos dizer, ao escrever c-a-s-a,
que para elas entenderem esse conceito, temos que lhes trazer uma casa.
Falamos de fatos e objetos físicos, por meios totalmente independentes do
objeto ou fato. Assim, podemos também descrever fenômenos do mundo
espiritual, com o que entendemos no plano físico. No entanto, não podemos
entender os mundos superiores com nossos conceitos e ideias cotidianos,
mas precisamos adquirir outros e expandir nosso pensamento. Pessoas, que
honestamente nos dizem sobre o mundo superior, também devem ampliar
nossos conceitos, para além de nossa vida cotidiana; eles devem nos dar
conceitos novos e diferentes e, no entanto, compreensíveis no plano físico.
44

As pessoas acham difícil entender a genuína Ciência Espiritual e o


esoterismo sério, porque são tão relutantes em expandir seus conceitos. Elas
querem entender o mundo superior e suas revelações, com as ideias que já
têm e não querem criar novas. Quando as pessoas, em nossa era
materialista, ouvem palestras sobre o mundo espiritual, elas acreditam,
muito facilmente, que o mundo esotérico pode ser entendido, simplesmente
olhando para ele. Elas acham que as formas podem ser um pouco mais
delicadas e mais nebulosas, do que no mundo físico, mas, no entanto,
semelhantes. Pode parecer inconveniente para alguns, que o ocultista sério
deva fazer mais do que apenas seguir instruções sobre como ver os Anjos.
É necessária uma mudança de pensamento e, o conceito de “Anjo”, deve
incluir que somos percebidos por eles, que o olhar espiritual deles estão
focados em nós. O desenvolvimento místico, ou ascender aos mundos
superiores, não pode ser separado do enriquecimento dos sentimentos e
impulsos da alma, dando maior alcance às nossas ideias.
Para entender os mundos superiores, não devemos deixar, que nossa vida de
ideias permaneça tão empobrecida, quanto ela é no plano físico.
Para fornecer ajuda esotérica para este enriquecimento, estamos
construindo nosso modesto edifício, em Dornach, num estilo
completamente novo. Aquele prédio, é claro, não é nem de longe o ideal, mas
é um começo humilde. Afinal, temos, apenas, meios limitados à nossa
disposição, apesar do fato de nossos amigos terem feito tudo ao seu alcance,
para este projeto. Os impulsos espirituais por trás dos estilos da construção,
que foram desenvolvidos na terceira, na quarta e nesta atual quinta época
pós-atlante, incluía a tarefa de guiar a humanidade para o conhecimento do
mundo físico. A Arquitetura egípcia, por exemplo, iniciou seu
desenvolvimento com suas suscintas formas geométricas. A Arquitetura
greco-romana é como um casamento da alma e espírito com o corpo físico e
etérico. Aqui, a alma e o espírito, de um lado e o corpo etérico e o corpo físico,
de outro, estão conectados num estado de completo equilíbrio.
O surgimento dos arcos, característicos do estilo Gótico, é a primeira
tentativa de se elevar, novamente, do mundo físico, para o mundo espiritual.
Se a Antroposofia deve ser representada num prédio, o próximo passo deve
ser dar vida aos próprios padrões de pensamentos vivos e tecentes, fluindo e
jorrando para o Espaço. Então, veremos, em forma física, o que a
Imaginação e a Inspiração revelam diretamente do mundo espiritual.
É por isso, que as formas do edifício de Dornach são tais, que é inútil
perguntar, de maneira materialista, o que elas simbolizam e o que suas
formas representam. Elas devem ser tomadas por seus próprios méritos,
uma vez que nada mais são do que experiências espirituais imediatas,
derramadas em formas espaciais. Tentamos transformar tudo o que pode ser
visto e experimentado no espírito, em forma artística.
Então, se as pessoas perguntarem o que uma forma representa, elas
entenderam mal o prédio; pois toda forma significa apenas a si
mesma, assim como as nossas mãos ou a cabeça têm significado só para si
45

mesmas, e nada mais. Tal questão também indica uma completa


incompreensão de nossa posição, em relação ao ocultismo.
Teremos o maior prazer em deixar para trás, o antigo absurdo teosófico de
examinar cada conto de fadas, cada figura e cada mito, pelo que significa e
simboliza. Todas as nossas formas realmente existem no mundo espiritual
e, portanto, expressam apenas a si mesmas e nada mais. Elas não são
símbolos, mas realidades espirituais. Você não encontrará um único
pentagrama em todo o edifício, nenhuma forma de pentagrama, nada que
faça você imaginar o que esta ou aquela forma significa. No máximo, há um
lugar onde as formas sutis podem ser interpretadas como um pentagrama,
mas, também, todas as flores de cinco pétalas. As pessoas podem perguntar,
o que nossos quatorze pilares significam, que não são moldados como
pentagramas, mas são de cinco lados por razões estéticas. Elas podem se
perguntar o que significam os pilares, que sustentam as cúpulas, além de
representar relações espaciais perceptíveis no mundo espiritual. Em
resposta, podemos apenas apontar, quão materialista é a nossa época,
quando até mesmo as intenções espirituais devem ser vestidas em trajes
materialistas. Nosso prédio será entendido, se as pessoas pararem de
perguntar o que ele simboliza e, em vez disso, pensarem sobre o que ele
é. Elas entenderão nosso prédio, quando perceberem, que é melhor não usar
nenhum dos termos usuais e as velhas imagens verbais, para ajudar a nossa
Era materialista a compreendê-lo. A Ciência Espiritual pode, no máximo, ser
uma síntese de religiões; ao contrário das religiões antigas, não constrói
templos, mas sim uma estrutura, que expressa sua natureza mais íntima.
Este edifício só pode ser entendido gradualmente e somente se não
aplicarmos palavras antigas à esse novo desenvolvimento.
Sabemos muito bem, que só podemos realizar nossas intenções em Dornach,
da maneira mais modesta e rudimentar. Mas peço, apenas, que vocês façam
um esforço real, para entenderem esse começo humilde, a partir da
perspectiva e do significado de nossa Ciência Espiritual. Tentem entender o
que este simples começo, pago com sacrifícios consideráveis, visa. Qualquer
outra atitude seria muito desanimadora. Grandes palavras e muitas frases
pomposas foram usadas, no chamado Movimento ocultista. Tudo o que
queremos é que, mesmo que nossa maneira de expressar as coisas, não exista
mais daqui há cinquenta anos, as pessoas ainda dirão do nosso Movimento,
que ele se esforçou, com que todas as suas fibras, para ser totalmente sincero
e honesto. E quanto mais modesta e simples, mas talvez mais objetivamente
discutirmos o que desejamos fazer, melhor serviremos a nossa causa. Cada
palavra que é supérflua, ou o retorno aos velhos e convenientes conceitos,
causa um dano incalculável ao que estamos nos esforçando para alcançar
honestamente - por favor, desculpem-me por dizer isso. Se as pessoas nos
entenderem dessa maneira, talvez surja o clima de que precisamos, se
realmente, em Dezembro, inaugurarmos nosso modesto edifício, sem
pompa e confusão. O estado de ânimo que precisamos, estará lá, apenas, se
nos concentrarmos em nossos objetivos, mesmo que não criemos uma
46

agitação em nossa Era materialista. Por favor, aceitem no espírito, estas


palavras sobre as intenções sérias do nosso Movimento.
Elas devem preencher nossas almas, se esse impulso espiritual realmente se
enraizar em nossa época. Há uma necessidade real de um Movimento
espiritual honesto, que realmente promova a vida mística da alma e permita,
que as revelações dos mundos superiores fluam para esta Era
materialista. Somente quando nossos amigos entenderem este propósito e
atitude, de nosso Movimento espiritual, então e somente então, seremos
capazes de cumprir a tarefa, que nos foi dada pelas Individualidades sábias
e orientadoras, no mundo espiritual.
Com base no que tentei explicar hoje, falarei com vocês depois de amanhã,
sobre o progresso em nossa compreensão de Cristo, através dos séculos e
sobre a posição de nosso Movimento, em relação ao Cristo.

**************************************
47

PALESTRA V
A BÊNÇÃO DOS MORTOS

Paris, 26 de maio de 1914

Chegamos agora, a um estágio no desenvolvimento humano, onde o estudo


das questões espirituais deve basear-se nos mesmos fundamentos, que havia
no estudo da Natureza, três ou quatro séculos atrás. A Ciência Espiritual
pretende alcançar coisas semelhantes, para o conhecimento do espírito,
como Copérnico, Galileu e Giordano Bruno fizeram para a compreensão da
natureza física, em seu próprio tempo. Naturalmente, a exploração
sistemática do espírito, em nossa época, encontra o mesmo tipo de
resistência e hostilidade, que o estudo e os conceitos das Ciências Naturais
tiveram, então. A Ciência Espiritual será assimilada em nossa cultura, tão
lentamente e com tanta dificuldade, quanto as Ciências Naturais.
Vamos investigar o espírito com processos da mente humana, que ainda são
desconhecidos hoje, ou pelo menos impopulares, para a maioria das
pessoas. A pesquisa clarividente, como podemos chamar esses processos,
fornece a base para a Ciência Espiritual e hoje eu estou falando à vocês nessa
base. A pesquisa clarividente é desacreditada, pelos inúmeros preconceitos
que as pessoas têm contra ela e também, pelo mau uso difundido do termo
“investigação clarividente”. É por isso que eu quero dizer agora, que não
estou falando do ponto de vista do conhecimento oculto, tantas vezes
promovido por charlatães nos dias de hoje, mas baseado no tipo de
conhecimento clarividente e esotérico, que pode ser apoiado, até mesmo por
pessoas firmemente fundamentadas nas pesquisas sérias das Ciências
Naturais, que baseiam seus conhecimentos em fatos científicos genuínos.
Em termos de sua lógica interna, do seu modo de pensar, a Ciência Espiritual
pertence à corrente do pensamento moderno, que inclui as Ciências
Naturais. As duas diferem, apenas, quanto as áreas pesquisadas. As Ciências
Naturais examinam o mundo da Natureza, os fenômenos físicos que nos
rodeiam, enquanto a Ciência Espiritual estuda uma área, que deve
necessariamente permanecer oculta às Ciências Naturais, a saber, a
experiência espiritual e os Seres espirituais. É impossível investigar fatos
espirituais e Seres espirituais com as mesmas habilidades e métodos, que
permitiram às Ciências Naturais celebrar triunfos cada vez maiores, no
decorrer dos últimos séculos. Para investigar a Natureza, usamos, apenas, os
poderes mentais e habilidades que temos, por causa da maneira como somos
colocados neste mundo e porque outras pessoas os ensinaram para nós.
Essa combinação de habilidades inatas e adquiridas é totalmente suficiente
para as Ciências Naturais, mas não pode fornecer conhecimento do mundo
espiritual. Para isso, devemos usar faculdades que dormem, que estão
latentes, para usar um termo científico, nas profundezas de nossa alma,
durante nossa vida cotidiana.
48

Como pesquisadores espirituais, em nossas investigações nós não


aplicamos, imediatamente, os métodos e procedimentos usados para
explorar o mundo exterior. Ao invés disso, trabalhamos com eles nas
habilidades e forças, nas profundezas de nossa alma, para torná-las efetivas
no mundo espiritual. Essas capacidades somente nos ajudam a entender os
mundos superiores, quando elas são atraídas pelos esforços humanos
comuns. Por exemplo, na vida cotidiana e na Ciência convencional,
aprendemos sobre o mundo externo, através de ideias, que desenvolvemos
em nossa alma, mas como pesquisadores do espírito, primeiro temos que
trabalhar profundamente dentro de nós, com nosso pensamento, para
desenvolver habilidades, que são bem diferentes daquelas que normalmente
temos. A Ciência Espiritual está basicamente de acordo com as Ciências
Naturais, como podemos ver, em sua tentativa de entrar no mundo
espiritual, através da química espiritual. Não podemos dizer - pela primeira
vez - que a água pode ser dividida em hidrogênio e oxigênio. Embora a água
seja líquida e não queime, o hidrogênio é um gás combustível - algo
claramente diferente da água. Podemos usar isso como uma metáfora para
o processo espiritual, que estou prestes a explicar. As pessoas são uma
combinação de elementos anímico-espirituais e físico-materiais, assim
como a água é uma combinação de hidrogênio e oxigênio. Na "química
espiritual", devemos separar os elementos anímico-espirituais dos físico-
materiais, assim como a água pode ser separada em hidrogênio e
oxigênio. Claramente, apenas olhar para as pessoas, nos dirá pouco sobre a
natureza do elemento anímico-espiritual. Os métodos que usamos, para
separar o anímico-espiritual do físico-material, em nós - e essa experiência
de química espiritual só pode ser realizada dentro de nós - são a
concentração e a meditação. Meditação e concentração não são algum tipo
de desempenho mental miraculoso, mas o mais alto nível de processos
mentais, cujos níveis elementares inferiores encontramos, também, na
atenção, em nossa vida cotidiana. A meditação é uma devoção da alma,
elevada ao ilimitado, como podemos experimentar nos sentimentos
religiosos mais prazerosos. Concentração é atenção, elevada ao
ilimitado; nós a usamos num nível mais básico na vida cotidiana.
Por atenção na vida cotidiana, queremos dizer, não permitir que nossas
ideias e sentimentos passem, livremente, sobre qualquer coisa que chame
nossa atenção, mas adquirir o domínio de nós mesmos, para que nossa alma
concentre nosso interesse em algo específico, isolando-o em nosso campo de
percepção. Não há limites para o quanto esta atenção pode ser aumentada,
particularmente focando voluntariamente nossa alma em certos
pensamentos, fornecidos pela Ciência Espiritual.
Ignorando tudo o mais, todas as preocupações e transtornos, impressões
sensoriais, impulsos, sentimentos e pensamentos, podemos centrar
completamente nossas forças internas nesses pensamentos, por um
determinado período de tempo. O conteúdo no qual estamos concentrados,
não é tão importante quanto a atividade interna e o exercício de desenvolver
nossa atenção, nossos poderes de concentração. Focar, concentrando
49

completamente nossas forças anímicas dessa forma, é crucial. E o


treinamento regular, muitas vezes envolvendo meses, anos ou até décadas,
dependendo da predisposição individual, é necessário para que a alma se
torne forte o suficiente, para desenvolver forças internas. Qualidades, que de
outro modo meramente estão adormecidas na alma, são agora convocadas
por esse inesgotável aprimoramento da atenção, pela concentração. No
processo, devemos desenvolver a capacidade, em nossa alma, de sentir que,
por meio dessa atividade interna, a alma está cada vez mais apta a se afastar
do corpo físico. De fato, essa separação, a separação da alma e do espírito do
elemento físico-material, acontecerá cada vez mais, conforme continuarmos
as atividades que descrevi. No escopo limitado de uma palestra, posso
resumir brevemente esse princípio de concentração, mas vocês encontrarão
descrições mais detalhadas e exercícios individuais, no meu livro – Como
Adquirir o Conhecimento dos Mundos Superiores - traduzido para o francês
como L'Initiation. Através da prática desses métodos, aprenderemos a
entender o significado das sentenças - Eu me experimento como um ser
anímico-espiritual. Eu estou ativo em mim mesmo, sem usar meus sentidos
ou meus membros. Eu tenho experiências independentes do meu corpo.
Fizemos progressos, quando pudermos perceber nosso próprio corpo, com
todos os seus atributos físicos, como separado e independente de nossa alma
e espírito, assim como vemos uma mesa ou uma cadeira, na vida física. É
assim que podemos começar a separar a capacidade da alma de pensar e
formar ideias, a partir de suas ferramentas físicas, a saber, o Sistema
Nervoso e o cérebro. Assim, aprendemos a viver no pensamento e na
formação de ideias, plenamente conscientes de que estamos fora do Sistema
Nervoso e do cérebro, os instrumentos físicos, que normalmente usamos
para esses processos. Para colocar isso mais concretamente, deixem-me
acrescentar, que a nossa primeira experiência nesse autodesenvolvimento é
a percepção de que, pensando, vivemos como se estivéssemos fora de nossa
cabeça. Vivemos no tecer dos nossos pensamentos, como fazemos quando
usamos nosso cérebro, mas sabemos com certeza, que esses pensamentos
estão fora da nossa cabeça. A experiência de nos imergir novamente no
cérebro e no Sistema Nervoso, depois de ter estado fora da cabeça por algum
tempo, permanece indelevelmente conosco. Sentimos a resistência da
substância do cérebro e do Sistema Nervoso de tal forma, que o anímico-
espiritual, que emergiu desses órgãos físicos, precisa usar a força para
reentrar neles. Este é um momento inesquecível.
O método que descrevi, também nos permite liberar o sentimento e as
atividades da alma, o que é necessário para a verdadeira pesquisa
espiritual. Para conseguir isso, devemos elevar a devoção ao infinito.
Essa devoção aumentada, que também é chamada de meditação, é
semelhante ao que acontece quando dormimos.
Os órgãos dos sentidos são postos de lado, no sono; não há atividade dos
sentidos e os membros estão em repouso. Enquanto dormimos, somos
entregues ao curso geral do mundo, sem contribuir com nada para o curso
dos acontecimentos, por meio do nosso Eu, pensando, sentindo e
50

querendo. Nós estamos inconscientes no sono; nossa consciência se dissolve


na escuridão geral e na obscuridade. Na meditação, devemos criar,
voluntariamente, o estado que o sono causa, como necessidade natural. A
única diferença é que o sono leva à uma perda de consciência, mas a devoção
intensificada leva à uma consciência aprimorada. Como pesquisadores
espirituais, devemos ser capazes de silenciar nossos sentidos à vontade.
Devemos desviá-los de todas as impressões do mundo externo e suprimir a
atividade de nossos órgãos e membros, como fazemos no sono. Em relação
ao nosso corpo, temos que nos comportar como no sono. No entanto, no
sono mergulhamos na inconsciência, mas na devoção aumentada,
controlada pela nossa vontade, despertamos para o fluxo divino-espiritual
das forças cósmicas. Para esse nível de consciência que alcançamos, nossa
consciência cotidiana é, o que o sono é para o nosso estado comum de
consciência. Se perseverarmos e pacientemente treinarmos nossa alma,
seremos capazes de separar, através de uma espécie de química espiritual,
outra capacidade da alma, a saber, nosso pensamento, de modo que ele
continue somente na esfera anímico-espiritual. Da mesma forma, através da
devoção, podemos gradualmente separar o poder da alma, que usamos na
linguagem, no falar. No como estou falando com vocês agora, estou usando
uma força espiritual da alma, que flui para os meus nervos e órgãos da fala e
os usa. Através dos exercícios descritos acima, podemos desenvolver esse
mesmo poder, quando toda a fala e o Sistema Nervoso estiverem
completamente inativos. Deste modo, descobrimos, nas profundezas de
nossa alma, uma faculdade da qual nada sabemos em nossa vida cotidiana,
porque é empregada na fala e no uso de nossos órgãos da fala. Quando não
estamos usando essa faculdade, ela fica dormente no fundo da alma, mas na
pesquisa espiritual e pela química espiritual, ela é elaborada e separada, por
assim dizer, do nosso falar físico. Se aprendermos a viver nessa atividade
oculta e tecente da criação da linguagem, poderemos reconhecer o que
podemos chamar, talvez imprecisamente, de a percepção da palavra interior,
a palavra espiritual. Assim que pudermos controlar esse poder oculto,
poderemos, também, separar nosso pensamento e sentimento, da nossa
personalidade, deixar-nos para trás e entrar no mundo espiritual.
Então, poderemos perceber o sentimento e o querer, fora de nós mesmos,
como fizemos dentro de nós. Começaremos a conhecer Seres de vontade e
sentimento no mundo espiritual e poderemos perceber nossos próprios
desejos e sentimentos, apenas quando eles estiverem imersos nesses Seres.
A percepção clarividente começa com a emancipação do poder de nossos
pensamentos, do corpo físico e continua com a libertação de nossos
pensamentos e sentimentos. Claramente, então, poderemos conhecer e
realmente experimentar encontros com outros Seres espirituais, tão logo
deixemos nosso corpo e imergirmos nosso próprio sentimento e vontade, no
mundo espiritual. Em vista da ampla oposição à Ciência Espiritual em nosso
tempo, é arriscado dar exemplos concretos; ainda assim, é um risco que
estou disposto a aceitar. Tenho certeza de que vocês não se importarão, que
eles sejam exemplos da minha experiência pessoal.
51

Afinal, nossas próprias experiências são os exemplos que conhecemos


melhor, pois são os únicos em que estamos realmente presentes, em cada
detalhe. Algum tempo atrás eu tive que resolver um problema no meu
trabalho. Eu sabia muito bem, que as capacidades que posso desenvolver, de
acordo com a minha constituição nesta vida, não seriam suficientes para
realizar a tarefa, que era entender a mentalidade de um determinado período
histórico. Eu sabia exatamente quais perguntas eu tinha que responder, mas
também percebi, que não importava o quanto eu exercesse meu raciocínio,
meus pensamentos não eram fortes o suficiente, para entender melhor esse
problema. Era como querer levantar um peso, mas sem a força para fazê-lo.
Tentei definir a questão, da maneira mais clara possível e desenvolver a
vontade ativa de encontrar uma solução, de uma forma ou de outra.
Até onde pude, tentei sentir vividamente as qualidades particulares daquele
período. Tentei ter uma noção vívida de sua grandeza, sua cor e projetar-me
completamente nesse período. Depois que eu repeti essa atividade interior
da alma com bastante frequência, eu podia sentir um estranho sentimento e
uma estranha vontade, entrar em mim mesmo. Eu tinha tanta certeza de sua
presença, quanto tinha de que o objeto externo que vejo, não é criado pela
minha observação, mas existe independentemente de mim e me
impressiona. Do ponto de vista materialista, as pessoas podem facilmente
objetar, que isso não passava de uma ilusão, um engano, e que eu não sabia
que estava tirando, da minha própria alma, o que eu achava que eram
influências externas. Para evitar cair na ilusão, alucinação e fantasias neste
campo, precisamos do verdadeiro autoconhecimento. Então, começaremos
a saber o que podemos e não podemos fazer. O autoconhecimento,
particularmente para o pesquisador do espírito, significa conhecer os limites
de suas habilidades. Podemos nos treinar no autoconhecimento, da maneira
descrita em meu livro acima mencionado e, então, seremos capazes de
distinguir entre nosso próprio sentimento e vontade e o sentimento externo
e entraremos no mundo espiritual. Chegaremos ao estágio em que não
seremos capazes de distinguir, entre nossos próprios sentimentos e desejos
e que, de fora, parecerá tão absurdo, quanto não sermos capazes de
distinguir entre fome e pão. Todo mundo sabe onde a fome acaba e o pão
começa; assim como todo mundo sabe, que a fome, em si, não faz o pão
aparecer – porém, isso seria desejável, do ponto de vista social. O verdadeiro
autoconhecimento nos permite diferenciar, entre a fome do nosso próprio
sentimento e vontade e o que vem para encontrá-los do mundo espiritual
(assim como a fome é satisfeita com o pão). Uma vez que o sentimento e a
vontade exteriores tenham penetrado os nossos, os dois continuarão a existir
em nós, lado a lado. No meu caso, a estreita relação entre o meu sentimento
e vontade e o que eu reconheci, como sentimento e vontade externos,
fertilizaram meu pensamento. Como resultado, os pensamentos apareceram
em minha mente, como presentes do sentimento e vontade externos e
resolveram o problema original de investigar uma certa época histórica.
O que acontece lá, em nossa experiência espiritual, é contrário a um processo
similar, no mundo físico. Quando encontramos pessoas no mundo físico e
52

nos reunimos com elas, primeiro as vemos, depois falamos com elas e
trocamos ideias. O oposto acontece na experiência espiritual, que eu
descrevi; lá observamos pensamentos em nós mesmos e temos a sensação,
de que estão presentes um sentimento e uma vontade estranhos. Então
percebemos uma individualidade espiritual separada, como um Ser real
separado, mas que vive apenas no mundo espiritual. Então, gradualmente,
conhecemos essa individualidade, num processo inverso para encontrar
alguém, na vida física. Na esfera espiritual, nos aproximamos do indivíduo,
através do sentimento e vontade estranhos que encontramos dentro de nós,
e nos aproximamos da personalidade, ficando junto com ela. Descobri que,
no meu caso, o sentimento alheio e o desejo de nutrir meu próprio
pensamento, vinham de uma pessoa que eu conhecia bem e que havia sido
arrancada de nosso círculo de amigos pela morte dela, há pouco mais de um
ano. (*) Ela havia morrido numa idade relativamente precoce, em seus
melhores anos de meia-idade e levara energia vital não utilizada, para os
mundos espirituais. O sentimento e a vontade, que entraram nos meus,
originaram-se na intensidade dessa energia vital não utilizada.
Geralmente, as pessoas vivem até uma idade avançada e usam sua vitalidade
durante sua vida. No entanto, se elas morrem relativamente jovens, essa
força permanece como potencial não utilizado e está disponível para elas no
mundo espiritual. Essas forças da vida, que não foram usadas na curta vida
de nossa amiga, me permitiram, por causa de nossa amizade, resolver um
problema que exigia sua força. O que eu anteriormente chamava de “a
capacidade da palavra interior”, leva a tais revelações do mundo espiritual
como esta, de uma pessoa morta. Ao mesmo tempo, essa capacidade nos
permite olhar, para além da nossa vida entre o nascimento e a morte, ou
entre a concepção e a morte e obter insight da vida humana, estendendo-se
em infinitos períodos de tempo, através de repetidas vidas terrenas.
Então, podemos entender a vida daqueles a quem estamos muito próximos,
como eu fui da nossa amiga morta. Ao nos conhecermos, ou conhecer a outra
pessoa, através das faculdades da alma que descrevi, descobrimos, não
apenas a vida física entre o nascimento e a morte, mas o Ser humano
espiritual, que estrutura seu próprio corpo, vive em repetidas encarnações,
na Terra, e entre cada morte e novo nascimento, no mundo espiritual.
Agora vocês compreenderão facilmente, que eu poderia obter uma visão
mais profunda do ser anímico-espiritual da nossa amiga morta, porque ela
estava diante da minha alma, como um Ser espiritual. O processo de
conhecer outro Ser no mundo espiritual é o inverso, no mundo físico. A
princípio, aprendemos a estar espiritualmente juntos com o outro Ser, e,
então, passamos a conhecer o próprio Ser, como um Ser espiritual.

(*)
Steiner aqui se refere a Oda Waller, irmã de Mieta Pyle-Waller (que interpretou o papel de
Johannes Thomasius nas performances de Mystery Drama em Munique). Veja também sua
palestra de 9 de maio de 1914, em Unsere Toten. Oda Waller morreu em março de 1913.
53

E, então, entrar no mundo espiritual se torna uma realidade. Voltando ao


nosso exemplo, tornou-se claro que, durante uma encarnação anterior, nos
primeiros séculos cristãos, a amiga, que conhecíamos em sua curta vida aqui,
absorveu grande parte dessa cultura cristã. No entanto, ela não foi capaz de
digerir tudo, por causa das restrições do tempo e entrou, nesta vida, com o
material não digerido. Rompeu os limites desta encarnação, mas
permaneceu presente como energia vital. E agora, através da minha conexão
com ela, eu fui abençoado com a percepção do período, com o qual meu
trabalho estava relacionado, à época em que nossa amiga tinha vivido, numa
encarnação passada. Não importa que muitas pessoas, no nosso tempo,
zombem do que acabei de descrever e menosprezem uma atitude que nos
guia assim, para o mundo espiritual. Se vocês se desenvolveram ao longo
desses caminhos, vocês sabem que, quando vocês realizaram algo, que vocês
não poderiam ter feito sozinhos, foi porque os Seres espirituais específicos
ajudaram vocês. Além disso, a visão do mundo se expandirá, porque vocês
saberão, que não podem esperar que a fome produza pão e porque sabem
que, o poder dos Seres espirituais, entrou nas suas próprias habilidades. À
medida que nossa visão da esfera dos mortos se amplia, nossa percepção do
mundo espiritual também se aprofunda, através dos métodos que descrevi
e, finalmente, abrange eventos e seres concretos, que são tão reais, quanto o
mundo físico ao nosso redor. As pessoas não se importam em falar sobre o
mundo espiritual, em termos gerais; elas admitem que existe um reino
espiritual, por trás do sensorial. Mas elas são menos tolerantes, se falarmos
de Seres concretos no mundo espiritual, que percebemos como Seres dos
reinos mineral, vegetal, animal e humano. No entanto, se não nos
afastarmos do desenvolvimento de nossas forças anímicas adormecidas,
descobriremos que é tão errado falar sobre o espírito em termos gerais, ou
em termos vagos panteístas, quanto falar sobre a Natureza em termos
gerais. Por exemplo, se andássemos por um prado e olhássemos flores,
talvez alguns lírios aqui, violetas ali, e assim por diante, apontaríamos para
elas e não diríamos seus nomes, mas apenas “isso é Natureza, aquilo é
Natureza, e lá é Natureza; tudo é Natureza e mais Natureza ”- isso não é
diferente de falar sobre espírito, espírito, e mais espírito de uma forma
vagamente panteísta. Só podemos entender o mundo espiritual, se
realmente conhecermos os Seres individuais que vivem lá e o que acontece
entre eles. Em objeção à possibilidade de conhecer o mundo espiritual,
muitas vezes as pessoas afirmam, que abrigar tais fantasias sobre o reino do
espírito, simplesmente contraria o comportamento inteligente no mundo
físico. Embora esta conclusão pareça justificada, com base nas capacidades
da inteligência humana, ela pode ser sustentada, apenas, enquanto se
desconhece o extenso poder do intelecto, isto é, o poder do pensamento
humano, como podemos conhecê-lo através da pesquisa espiritual. Para
retornar ao nosso exemplo, imaginem que alguém tenha a tarefa de
desenvolver certas ideias, aqui na Terra. Ele aprende como encontrar um Ser
espiritual, neste caso, uma pessoa morta, que acrescenta seu pensamento -
54

agora modificado pelo mundo espiritual – numa vontade que pensa e num
pensar que sente - ao pensamento e sentimento do Ser humano.
As ideias inteligentes que o indivíduo morto quer produzir, emergem no ser
humano, na Terra. O falecido possui sentimento e vontade, assim como na
Terra, como também outras capacidades anímicas, não desenvolvidas na
Terra. Portanto, os mortos têm o desejo de conectar seus pensamentos e
sentimentos, com os pensamentos humanos. É por isso que eles se unem
com a pessoa na Terra. Quando o pensamento, o sentimento e a disposição
dos mortos penetram na pessoa viva, as ideias são estimuladas.
Assim, os mortos podem experimentar essas ideias, algo que eles não
poderiam fazer sozinhos. É por isso que eles se comunicam com os Seres
humanos na Terra. No entanto, essa comunicação e estimulação de ideias só
é possível, se nosso pensamento foi liberado do Sistema Nervoso e do
cérebro, isto é, se desenvolvemos o pensamento independente do cérebro.
Ao liberarmos nosso pensamento do corpo, sentimos como se nosso
pensamento fosse afastado de nós, como se ele se expandisse e se espalhasse
no Espaço e no Tempo. O pensamento, que normalmente dizemos, que
ocorre dentro de nós, une-se ao mundo espiritual circundante, flui para
dentro dele e alcança certa autonomia de nós, semelhante à relativa
independência dos olhos, que são fixados em suas órbitas, como órgãos mais
autônomos. Assim, embora nosso pensamento liberado esteja conectado
com nosso Eu superior, ele é tão independente, a ponto de agir como nosso
órgão espiritual de percepção para os pensamentos e sentimentos de outros
Seres espirituais. Assim, sua função é semelhante à dos nossos olhos.
Gradualmente, os processos de pensamento, normalmente limitados por
nossa inteligência, tornam-se independentes de nosso Ser, como órgãos
espirituais de percepção. Em outras palavras, o que experimentamos
subjetivamente, o que é abarcado por nossa inteligência, a saber, nosso
pensamento exterior, não é senão entidades sombrias, entidades de
pensamento, meras ideias refletindo coisas externas. Quando o pensamento
se torna clarividente e se separa do cérebro e do Sistema Nervoso, ele começa
a desenvolver atividade interior, uma vida própria e a transmitir, como nossa
própria experiência, para o mundo espiritual. De certo modo, enviamos os
tentáculos de nosso pensar clarividente, para dentro do mundo espiritual e,
à medida que se tornam imersos nesse mundo, eles percebem a “vontade que
sente” e sente a vontade dos outros Seres naquele reino. Depois do que
dissemos sobre o autoconhecimento, como uma necessidade no caminho do
desenvolvimento espiritual - e disto segue-se que a modéstia é uma
obrigação - permitam-me comentar o pensamento clarividente e, por favor,
não me julguem presunçoso por dizer isso. Quando estimulamos nosso
pensamento, através do desenvolvimento clarividente, ele se torna
independente e também uma ferramenta muito precisa e útil. A
clarividência verdadeira aumenta a precisão e poder lógico do nosso
pensamento. Como resultado, podemos usá-lo com mais exatidão e estreita
adaptação ao assunto; nossa inteligência se torna mais prática e mais
completamente estruturada. Portanto, o clarividente pode entender
55

facilmente o escopo da pesquisa científica comum, ao passo que a Ciência


convencional, requer trazer à mente ... [texto faltando].
É fácil ver, por que a Ciência Natural moderna não pode compreender as
descobertas da pesquisa clarividente, mas aqueles, que desenvolveram a
verdadeira clarividência, podem compreender o significado total das
realizações das Ciências Naturais. Portanto, não há dúvida de que a Ciência
Espiritual não se opõe à Ciência convencional; o contrário é mais
provável. Somente o desenvolvimento clarividente pode organizar o poder
da mente, tornando-a interiormente independente, viva e compreensível.
É por isso que o modo de pensar materialista, não pode penetrar na lógica,
que nos dá a certeza de que o conhecimento clarividente, realmente, leva à
percepção do mundo espiritual. O exemplo de minhas experiências
clarividentes com uma pessoa morta mostra, que inteligência e pensamento
são qualidades específicas de almas vivendo num corpo físico, de Seres
humanos na Terra. A falecida queria se conectar com um Ser humano, para
que o que vivia nela de um modo completamente diferente, de forma
suprassensível, pudesse tomar a forma de pensamentos inteligentes.
O indivíduo morto e a pessoa viva estavam pensando seus pensamentos
juntos, na cabeça da última, por assim dizer. Como qualidades
especificamente humanas, o intelecto e o pensamento só podem ser
desenvolvidos em Seres humanos na Terra, e eles permitem que, mesmo
pessoas que não são clarividentes, entendam os resultados da pesquisa
clarividente. Vocês veem, nosso pensamento independente torna-se o olho
espiritual, por assim dizer, para a percepção do mundo espiritual. Pesquisas
suprassensíveis, que usam esse olho espiritual para o pensamento
clarividente, descobriram que esse olho é ativo, que os sentidos espirituais
são colocados em todas as direções, mas nossos olhos físicos permitem,
apenas passivamente, que impressões cheguem até eles. Quando nós, como
pesquisadores espirituais, levamos as revelações do mundo suprassensível
ao nosso pensamento, elas continuam a viver em nossos pensamentos.
Então, podemos dizer às outras pessoas, sobre o que nos esforçamos para
introduzir em nossos processos de pensamento vivos.
Há uma espécie de linguagem interna na alma humana, que normalmente
permanece em silêncio. Mas quando os conceitos entram na alma, que o
pesquisador espiritual adquire ao permitir que sua vontade e sentimento
sejam estimulados pelo mundo espiritual e seus Seres, essa linguagem
responde imediatamente com um som ecoante. O estudo cuidadoso e
minucioso da Ciência Espiritual irá, gradualmente, silenciar a objeção de
que os relatos do pesquisador espiritual, pesquisador do reino do espírito, só
podem ser acreditados, porque eles não podem ser realmente
compreendidos. As pessoas verão, que a inteligência humana é realmente
capaz de entender as informações do mundo espiritual, mas somente se elas
forem o resultado de verdadeiras experiências espirituais e verdadeira
pesquisa espiritual. As pessoas perceberão, que é errado dizer, que a
inteligência humana não é suficiente para compreender as revelações do
mundo espiritual e que, portanto, elas devem ser aceitas com
56

autoridade. Elas virão a saber, que o único obstáculo para tal compreensão
é ter noções e preconceitos preconcebidos. Eventualmente, as pessoas
tratarão as informações do mundo espiritual à medida que tratam dos
insights de, digamos, Astronomia, Biologia, Física e Química.
Ou seja, mesmo que não sejam astrônomos, biólogos, físicos ou químicos,
elas aceitam as descobertas dos cientistas sobre o mundo físico, com base
num sentimento natural da verdade, que podemos chamar de - uma
linguagem silenciosa da alma. A harmonia entre a inteligência e a
clarividência se tornará muito mais óbvia e, então, as pessoas admitirão, que
a pesquisa clarividente aborda o mundo dos Seres e processos espirituais,
com a mesma atitude que também motiva as Ciências Naturais.
Em vista da considerável oposição à Ciência Espiritual, nos confortará saber,
que nossa cultura moderna acabará chegando ao ponto que Giordano Bruno
chegou. Olhando para a abóbada azul do céu, que as pessoas então
consideravam existir exatamente como a viam, Bruno declarou, que elas só
viam a cúpula azul do céu, porque isso era o mais longe que a visão delas
alcançava. De certo modo, elas mesmas impuseram esse limite; na
realidade, o Espaço se estende ao infinito. Os limites que as pessoas viam tão
claramente, baseadas na ilusão de seus sentidos, foram criados pela
limitação de sua visão. Vocês veem, o pesquisador espiritual terá, agora e no
futuro, que se levantar diante do mundo e dizer, que há também um
firmamento em relação ao Tempo, o tempo entre o nascimento e a morte.
Percebemos esse firmamento do Tempo, através da ilusão dos sentidos.
Na verdade, nós mesmos o criamos, porque nossa visão espiritual é limitada,
assim como em épocas anteriores as pessoas “criaram” o firmamento azul do
Espaço. O Espaço se estende infinitamente além da cúpula azul do céu e o
Tempo também continua infinitamente, além dos limites do nascimento e
da morte. Nossa infinita vida espiritual está embutida neste Tempo infinito,
junto com o resto da vida espiritual no mundo. Virá um tempo, em que as
pessoas perceberão, que a pesquisa clarividente fortalece e aprofunda nossa
inteligência, produzindo uma lógica mais sutil e refinada. Essa melhor
compreensão irá silenciar muitas opiniões atuais, aparentemente
justificadas, sobre a Ciência Espiritual, alegando que os escritos filosóficos
de vários autores provam, que nossas capacidades cognitivas e intelectuais
são limitadas. Afinal, não são as razões que esses filósofos apresentam, para
provar que os limites da cognição humana são convincentes?
Eles não são lógicos? Como os pesquisadores da Ciência Espiritual podem
refutar esses argumentos convincentes e lógicos, sobre os limites de nossa
capacidade de saber? Virá um tempo, em que as pessoas verão a falta de
substância e precisão em tal lógica, quando entenderão, que algo pode ser
irrefutavelmente correto, como argumento filosófico, e ainda assim, ser
completamente refutado pela vida. Afinal, antes da descoberta do
microscópio ou do telescópio, as pessoas poderiam muito bem ter provado
“irrefutavelmente”, que os olhos humanos nunca podem ver uma
célula. Ainda assim, a ingenuidade humana inventou o microscópio e o
telescópio, o que aumentou o poder de nossos olhos.
57

Da mesma forma, a vida superou a prova irrefutável dos filósofos.


A vida não precisa refutar os argumentos deste ou daquele filósofo.
Suas provas podem ser indiscutíveis, mas a realidade da vida deve progredir
além delas, fortalecendo nossa capacidade cognitiva e compreensão
espiritual, através de instrumentos espirituais. No presente estado de nossa
cultura, com sua crença prevalente na “indiscutibilidade” das provas dos
filósofos, essas coisas não são geralmente ou prontamente aceitas. No
entanto, à medida que nossa cultura continuar a se desenvolver, alcançará
uma lógica mais alta do que aquela, que sustenta essas provas da Filosofia
puramente externa. Essa lógica superior será a da vida, da vida do espírito,
das ideias baseadas na Ciência Espiritual. Chegará o tempo, em que as
pessoas, embora continuem respeitando as realizações e descobertas das
Ciências Naturais, tanto quanto nós agora, perceberão que, para nossa vida
interior, essas realizações maravilhosas trouxeram mais perguntas, do que
respostas. Se vocês estudarem Biologia, Astronomia e assim por diante,
verão que elas atingiram seus limites. Essas Ciências fornecem
respostas? Não, elas estão realmente apenas levantando questões.
As respostas, sobre o que está por trás do assunto das Ciências Naturais,
virão. As respostas virão das fontes da pesquisa clarividente.
Para resumir, deixem-me repetir, que o mundo se estende para além do
reino dos sentidos e por trás do mundo sensorial, encontramos o do
espírito. Na Ciência Espiritual, o espírito se revela à percepção clarividente
e é só então, que podemos ver a natureza divina do magnífico mundo
sensorial, ao nosso redor. O mundo é vasto e o espírito é o contrapeso
necessário ao mundo físico. Uma perspectiva adequada sobre nosso futuro
desenvolvimento cultural revela que, ao tentar compreender o mundo, em
sua totalidade, as pessoas se esforçarão, não por uma exploração unilateral
do mundo natural, como muitos agora supõem. Ao invés disso, as pessoas
procurarão unir a Ciência, o intelecto e a pesquisa clarividente.
Somente nessa união, as pessoas realmente entenderão a si mesmas e seu
próprio espírito. Só então, elas perceberão soluções para os futuros enigmas
do mundo, nunca resolvidos completamente e sentirão satisfação com esse
conhecimento. Aqueles, que tomaram a sério o verdadeiro impulso da
Ciência Espiritual, podem sentir, agora mesmo em nossa cultura, o anseio e
a necessidade latente em muitas almas, de ir além do imediato e sensorial na
Ciência. Através do uso e da assimilação interior das capacidades, que as
Ciências criaram nos últimos séculos, estas almas anseiam por serem
fortalecidas, para que possam viver nos mundos espirituais, de onde
somente pode vir a verdadeira satisfação para a alma humana.

**********
58

PALESTRA VI

FÉ E CONHECIMENTO

Notas de uma palestra proferida em Praga,


17 de abril de 1914

Dada a grande quantidade de literatura disponível, sempre é possível aprender


sobre as descobertas da Ciência Espiritual, principalmente quando grupos
antroposóficos trabalham juntos. Já que estamos juntos agora, gostaria de
discutir algumas ideias norteadoras de impulsos espirituais, ideias que
continuam, de uma maneira mais esotérica, o que falamos de forma mais geral
na palestra pública de ontem. [ Nota 1 ]
Muitas pessoas, hoje, ainda acreditam no contraste entre fé e conhecimento, fé e
cognição. Dizem que a Ciência pode nos falar sobre o mundo fora de nós, o único
que podemos conhecer com certeza. No entanto, em relação ao mundo espiritual,
devemos ter fé. Essa atitude parece contradizer a Ciência Espiritual, que se
esforça para nos dar um conhecimento real e uma visão do mundo espiritual.
Na verdade, tem que entrar nas almas em nosso tempo, exatamente desta forma,
como insight e conhecimento. Em encarnações anteriores, nossas almas estavam
numa condição completamente diferente de agora. Elas eram mais primitivas,
mas naquela época havia grandes indivíduos e muitas pessoas ligadas a
eles. Esses indivíduos transmitiam ideias do mundo espiritual, que ainda
podemos encontrar em certas tribos e povos e rastrear até indivíduos como
Hermes, Zaratustra, Moisés, Buda, [Nota 2 ]. Ideias espirituais tiveram que ser
derramadas nas almas das pessoas. No mundo físico, a vida não é apenas labuta
e trabalho, mas escravidão e trabalho enfadonho. A maior parte dessa labuta e
trabalho não é no sentido de “foi um dia difícil de trabalho”, mas no sentido de
ocorrências inconscientes, causadas por nosso pensamento - na verdade, por toda
a nossa vida da alma, conforme ela segue seu curso.
Somos todos muito mais parecidos, quando nascemos, do que pensamos. Não
nos parecemos em nossa aparência, mas em nossa estrutura. As forças que atuam
numa criança são ativas num nível inconsciente. O espírito toma conta do corpo
e estrutura-o. Só então começa a modelagem e a elaboração dos nervos.
Isso acontece independentemente de nossa mente, num momento em que ainda
não somos capazes de usá-lo. Então, nos tornamos conscientes de nós mesmos,
como um Eu. É quando a sabedoria dos deuses, que trouxemos conosco do
mundo espiritual, cessa.

1. Palestra de 16 de abril de 1914, intitulada “Wie findet die Menschenseele ihre wahre
Wesenheit?” (“Como pode a alma humana encontrar sua verdadeira essência?”).

2.Hermes, o arauto grego antigo e mensageiro dos deuses.


59

No primeiro período após o nascimento, temos, apenas, forças vitais, por assim
dizer; nossa vida, então, nada mais é do que uma continuação do mundo
espiritual. A morte na infância é devida a causas corporais externas e a alma da
criança, não participa delas. Então, começamos a esgotar nossos corpos físicos
com cada pensamento, cada sentimento. Devemos dormir, para compensar o que
esgotamos durante o dia. Se não destruíssemos nossa organização física,
teríamos uma vida florescente e florescente. Nosso corpo etérico sempre quer
brotar e brotar, mas o corpo astral precisa consumir o que o corpo etérico
acumula e, portanto, suprime-o. Quando estamos dormindo, a compensação pelo
que foi consumido e morto flui para nós do mundo espiritual, para restabelecer o
equilíbrio. A quantidade normal de sono substitui exatamente o que foi
esgotado. Se decidíssemos dormir mais, como fazem alguns aposentados,
dormiríamos demais. Claro, isso não é objeção a dormir muito. Visto que o
trabalho intelectual exige muito de nossa organização física, as pessoas que fazem
esse tipo de trabalho, precisam dormir muito. Mas se dormirmos demais,
teremos muitas forças vitais novas e estas começarão a proliferar; o ser humano
então abunda em forças vitais. Esse excedente de forças vitais leva à doença.
Portanto, se quisermos fazer mais do que simplesmente compensar, o que
esgotamos em nosso trabalho diário e avançar espiritualmente, teremos que,
conscientemente, tomar o que precisamos do mundo espiritual.
Os fundadores de nossas religiões acreditavam, que era a tarefa deles liderar seus
povos a usarem as forças vitais que, então, seriam compensadas. No entanto, o
que deve se desenvolver dentro de nós, para o progresso da humanidade, deve ser
conscientemente retirado do mundo espiritual, para que não morra em nossa
existência física. É por isso que os fundadores de nossas religiões forneciam
ideias, que recebiam do mundo espiritual. Esses pensamentos verdadeiramente
espirituais nutrem nossa alma e a mantêm. Seria a morte de nossa alma, se ela
sempre tivesse que viver em pensamentos tirados, apenas, do mundo
físico. Antigamente, as crenças religiosas eram os pensamentos espirituais, de
que as almas humanas precisavam. Essa fase de nosso desenvolvimento foi
concluída e vivemos, agora, numa época em que gradualmente perderemos a
capacidade de absorver o que fala, apenas, às nossas emoções, à nossa fé. Ainda
poderemos preservar essa fé por um tempo, galvanizando-a, por assim dizer, mas
não poderemos mantê-la para o futuro. O princípio "Eu acredito" deve ser
substituído por "Eu acredito no que sei". As pessoas começarão a sentir, que esse
novo princípio deve ser aplicado. Do contrário, negaremos, à nós mesmos,
qualquer possibilidade de saber algo sobre a vida entre a morte e um novo
nascimento. Então, retornaríamos em condições lamentáveis, em nossa próxima
encarnação. Entusiasmo por outros ideais, todos claramente justificados, é
certamente uma coisa boa e tem que existir. No entanto, em comparação com os
fundamentos da Ciência Espiritual, esses ideais não podem ser colocados em
prática, diretamente. Sem seu conhecimento, eles só podem ser precursores da
Ciência Espiritual. À medida que progredirmos em nossa pesquisa espiritual,
sentiremos a necessidade de permanecer em silêncio, ao invés de falar. Mesmo
assim, se falarmos, é porque não entendemos as condições necessárias para o
nosso tempo. Só o conhecimento nos tornará livres e é tarefa do futuro,
60

conquistar a liberdade da alma humana. Pensamentos, de grande poder


espiritual, vieram dos fundadores de nossas religiões. Eram pensamentos de fé,
que poderiam iluminar maravilhosamente a região além da morte. Essas ideias
foram transformadas em uma luz espiritual verdadeira, que revelava, para os
seres humanos, o ambiente além da morte. Mas chegará o tempo em que teremos
que viver em liberdade. E mesmo se os novos líderes religiosos ainda
proclamassem os velhos ensinamentos da fé com a voz e o poder dos deuses, não
os entenderíamos mais. Estamos experimentando isso. agora. As Ciências,
relacionadas com o mundo exterior, chegaram, como era necessário. Um grande
cientista contemporâneo, Max Müller, disse que, se um Anjo descesse e
proclamasse notícias do mundo espiritual, as pessoas não entenderiam, nem
acreditariam nele. [ Nota 3 ]
Esse é o desenvolvimento da humanidade. Parece levar, inevitavelmente, à perda
de nossa capacidade de nos imbuir de pensamentos, relacionados aos mundos
espirituais. Isso significaria que, após a morte, teríamos menos luz para iluminar
nosso ambiente espiritual, por nós mesmos. Afinal, nenhum sol brilhará de fora,
para o mundo ao nosso redor, então, a luz tem que vir de nós. Então, tomaremos
o lugar do sol e iluminamos nossos arredores, após a morte. Pessoas incapazes de
fazer isso, terão que retornar e repetir a vida na Terra, para assimilar
pensamentos e ideias, que são frutíferos para sua existência, após a morte.
Quando entendermos isso, mais do que o entusiasmo usual para divulgar a
Ciência Espiritual, irá afrouxar nossa língua e nos levar a falar. Acreditar no que
sabemos - essa será a necessidade da humanidade no futuro.
Na antiguidade, as ideias religiosas, os mitos e os contos de fadas davam, às
almas, luz para o mundo espiritual. É fácil dizer, que os mitos e contos de fadas
se desenvolveram nos estágios da infância da raça humana.
Claro, as pessoas não encontraram fisicamente os Anjos, de que falam os mitos e
contos de fadas. Mas o pensamento baseado na Filosofia será de pouca utilidade
no mundo espiritual, onde tal conhecimento não tem significado. É fácil dizer,
que os contos de fadas não são baseados na verdade. Pesquisadores espirituais
não são tão ingênuos e sabem, que dragões de fogo realmente não voam pelo ar.
No entanto, eles sempre souberam que era necessário formar a Imaginação do
dragão de fogo, pois quando ele vive na alma, ilumina o mundo espiritual.
Estas são Imaginações poderosas. Esse é o princípio, por trás de todos os
mitos; eles não se destinam a refletir a realidade externa, com precisão, mas nos
capacitam para viver no mundo espiritual.

3. Max Müller, 1823–1900, orientalista alemão, linguista e acadêmico religioso,


professor de filologia em Oxford.
Literalmente: “Uma mudança está para acontecer, uma transformação de tal
magnitude que mesmo que os anjos descessem e a anunciassem, entenderíamos
tão pouco, quanto uma criança entenderia o que contássemos sobre o mundo, em
nossa língua”, in Leben und Religion (“Life and Religion”), Stuttgart, NY.
61

Os materialistas dizem, que os mitos e contos de fadas se originaram na fase


infantil da raça humana. Mas em sua infância, a humanidade foi ensinada pelos
deuses. No processo de nossa evolução, os mitos e contos de fadas gradualmente
foram perdidos, mas as crianças não deveriam crescer sem eles. Faz uma enorme
diferença se as crianças podem ou não crescer com contos de fadas.
O poder das imagens dos contos de fadas, que dão asas à alma, só se torna
patente, em uma idade posterior. Crescer sem contos de fadas leva, mais tarde,
ao tédio, ao cansaço do mundo. Na verdade, pode até causar sintomas físicos; os
contos de fadas podem ajudar a prevenir doenças. As qualidades que se infiltram
em nossa alma, a partir dos contos de fadas, mais tarde surgem como um gosto
pela vida, entusiasmo por estar vivo e uma capacidade de enfrentar a vida e tudo
isso pode ser visto, mesmo na velhice. As crianças precisam experimentar o poder
do conteúdo dos contos de fadas, enquanto são jovens e ainda podem fazê-lo.
Pessoas, que não conseguem viver com ideias que não têm realidade no plano
físico, estarão mortas para o mundo espiritual. Filosofias, baseadas apenas no
mundo material, são a morte de nossa alma. A evolução física leva à morte do
mundo espiritual. Devemos alcançar uma visão do mundo, baseada não nas
aparências, mas apoiada solidamente em sua própria estrutura inerente.
Precisamos nos mover em direção ao princípio: acredito no que sei.
Precisamos aprender a prestar atenção aos sintomas de nossa vida cultural.
Por exemplo, uma vez eu dei uma palestra, numa cidade no sul da Alemanha, e
depois, dois padres católicos vieram até mim e disseram que eu estava falando,
apenas, para pessoas instruídas, enquanto eles falavam para que todos pudessem
entendê-los. Na realidade, é o oposto. A Antroposofia pode atingir a todos, desde
que encontremos o caminho para as pessoas simples e comuns.
O fazendeiro entenderia muito melhor do que a chamada pessoa culta, se o
caminho não fosse bloqueado pelas convenções sociais. Nessas questões,
devemos ser capazes de nos deixar completamente fora de cena e não perguntar,
o que achamos melhor. Ao invés disso, devemos perguntar o que as almas
humanas requerem, numa determinada Era. Então, respondi aos sacerdotes que,
embora seus sentimentos lhes digam que falam com todos, os fatos dirão que
não, porque nem todo mundo vem para ouvi-los. E é para aqueles que não vêm à
eles, que eu falo. Na Terra, adquirimos conhecimento e percepção por meio de
nossos corpos físico e etérico. Vamos examinar, cuidadosamente, quanto do que
está em nossa alma vem do mundo físico. A luz, por exemplo, chega até nós pelos
olhos. O processo de ver é um processo de deterioração nos olhos, desde o início.
A deterioração começa diretamente na retina. O processo se desprende da
vida. De manhã, depois de dormir, nossos olhos foram restaurados e estão cheios
de vida pura. No entanto, como percebemos, algo se forma no tecido vivo, que
não é mais vivo, mas apenas mineral. E percebemos o mundo externo, que se
reflete em nós, porque esse processo continua no tecido nervoso.
Assim, na medida em que o corpo físico é o portador desses processos, ele não
está vivo. O corpo etérico é o portador de pensamentos, que também são imagens
especulares. As pessoas poderiam descobrir facilmente, que nossos pensamentos
refletem o suprassensível. Os pensamentos nunca se prestam à inspeção ao
microscópio porque, na realidade, eles vivem no corpo etérico. Eles são formados
62

pelo nosso pensamento, que se reflete no corpo físico. Podemos ver, a partir disso,
que a compreensão e o conhecimento dependem dos corpos físico e etérico, que
são afetados, apenas, pelas impressões do mundo físico. Pensamentos
completamente diferentes devem tomar conta de nossa alma, de nosso corpo
astral e de todos os nossos sentimentos, vontades e pensamentos, não limitados
ao plano físico. Caso contrário, permaneceremos mortos por dentro.
Todos os pensamentos, que representam objetos são significativos, apenas no
plano físico. Isso está implícito na própria questão, “Os pensamentos, que não
representam objetos, são justificados?” Somente com os pensamentos vivendo
livremente no espírito, vivendo livremente no corpo astral e no Eu, é que
podemos obter insight, somente com esses pensamentos podemos viver.
Esses pensamentos, não apenas representam coisas, mas também são ativos e
vivos interiormente; eles criam algo a partir de si mesmos e de nós.
Na Arte moderna, o naturalismo predomina atualmente. Nos tempos antigos, a
alma era preenchida com imagens, que traziam, do corpo astral, atividade aos
pensamentos. Tudo o que representa apenas coisas externas, não têm sentido no
mundo espiritual. Devemos nos imbuir com novas imagens, que podem mais
uma vez permear significativamente nossa alma. Frequentemente, pegamos algo
que acreditamos existir apenas em nossa imaginação, ser apenas fantasia.
Frequentemente, é apenas uma lembrança de algo originado, no plano físico.
Podemos revitalizar aquilo que, de outra forma, morreria em nossa alma, apenas
avivando nossas imagens com pensamentos, que não se originam no nível físico
e não são criados por esse tipo de imaginação. Cada vez mais as pessoas abusam
da frase: Uma bela alma, num belo corpo, uma alma sadia, em um corpo são.
Esta frase era apropriada, para a compreensão dos tempos antigos. Infelizmente,
hoje é vista como uma declaração de causa; se alguém tem um corpo são, as
pessoas concluem que nele vive uma alma sã. Tudo o que torna o corpo saudável,
fará o mesmo pela alma. Se as pessoas não desenvolverem pensamentos, que
mantenham o corpo astral ágil interiormente, sofrerão de depósitos minerais
ainda na infância e, como resultado, ficarão doentes, mais tarde na vida.
E o mundo em que entram, após a morte, permanecerá escuro, porque elas
próprias não irradiam luz. Os raios do Sol atingem uma superfície e é assim que
vemos as coisas. Mas, no mundo espiritual, somos a fonte de luz; iluminamos os
arredores que devemos ver. As almas, que sentem a necessidade de buscar a
Ciência Espiritual, podem não estar cientes dessas circunstâncias, mas vivem nas
profundezas da alma. Assim como no mundo físico a luz do Sol vem de fora,
devemos nos tornar semelhantes ao Sol, no mundo espiritual. Temos que
acender, em nós mesmos, o combustível espiritual, a chama interna, para
iluminar o reino do espírito. Os físicos imaginam, que o vermelho de uma rosa
pode ser atribuído à oscilação, às variações, no comprimento de onda. As pessoas
dizem que, realmente, não há som, apenas vibrações de ar. Elas afirmam que, o
que ouvimos como som, existe apenas em nossos ouvidos. Bem, um experimento
simples pode nos ensinar o contrário, ou seja, se alguém nos acordar, batendo na
porta. Notaremos, que não estávamos conscientes, durante a noite, quando
dormíamos, mas ao acordar já estávamos vivendo nas batidas.
63

Nós mesmos temos que entrar no som das batidas. Usamos a outra pessoa para
bater, porque a nossa própria alma não consegue. Se decidíssemos acordar com
firmeza, poderíamos fazê-lo, mas desta forma, estamos apenas usando a outra
pessoa como ferramenta. Se as visões materialistas persistirem por mais várias
gerações, o vermelho das rosas realmente desaparecerá. As pessoas realmente
verão pequenos átomos cinzentos vibrando, como um redemoinho atômico, não
porque tenham que vê-los ou porque exista, mas porque terão se treinado para
vê-los. É por isso que é necessário divulgar a Ciência Espiritual, para evitar ter
que viver num futuro repleto de nada mais do que átomos físicos girando.
Não estamos falando do éter físico, mas daquele que é o pensamento
vivo. Devemos compreender, em primeiro lugar, que uma rosa não é uma massa
de átomos girando, mas que, por trás dela, existem seres elementais vivos e
entrelaçados. A teoria do mundo espiritual é secundária; o principal é concentrar
nosso sentimento, sentir-nos vivendo e tecendo, nossa nova percepção da
realidade do mundo espiritual. Esta é a ressurreição do mundo espiritual em
nossas almas, o evento verdadeiramente ecumênico da Páscoa.
Nossos ancestrais precisaram de um evento diferente, que foi conectado ao
momento em que o Sol atinge seu zênite. Quando tudo na Natureza estava
brotando e florescendo, eles experimentaram um êxtase, que reafirmava para
eles, a existência do mundo espiritual. O que eles experimentavam então, na
Maré de São João, nós agora temos que vivenciar na Primavera, na Páscoa.
Temos que ser capazes de celebrar o despertar da alma, a ressurreição da alma,
quando a Ciência Espiritual nos fala, não apenas como uma teoria, mas como um
conhecimento vivo.

*****************
64

PALESTRA VII

ROBERT HAMERLING: POETA E PENSADOR

Berlim, 26 de abril de 1914

Em 15 de julho de 1889, eu estava no cemitério St. Leonhard, perto de Graz, com


o escritor Rosegger e o escultor Hans Brandstetter, enquanto o corpo do poeta
austríaco Robert Hamerling era enterrado no túmulo. [Nota 1]
Robert Hamerling havia sido chamado do plano físico há alguns dias antes.
Ele morreu após décadas de sofrimento inexprimível que atingiu um nível
insuportável no final de sua vida. Antes do enterro, o corpo havia sido colocado
na bela Stifting House, nos arredores da cidade austro-stíria, de Graz. A forma
física deixada para trás por sua grande alma jazia ali, um reflexo maravilhoso de
uma vida de luta para alcançar os níveis mais elevados do espírito: tão expressiva,
tão eloquente era esta forma física. Também trazia a marca do sofrimento
indescritível, que este poeta teve de suportar em sua vida!
Naquela ocasião, uma menina de dez anos pode ser vista entre as pessoas de luto
mais próximas. Ela era tutelada de Robert Hamerling e iluminou e alegrou os
últimos anos do poeta com a promessa de seu caráter. Ela era a garota a quem
Robert Hamerling havia dedicado as linhas que revelam fundamentalmente seu
estado de espírito nos últimos anos de sua vida.
E porque eles nos permitem ver tão profundamente na alma de Hamerling, por
favor, permitam-me ler estas linhas:

Para a

Criança B (ertha) , como uma borboleta


Passando inofensivamente pelo inválido atormentado pela dor,
Ao me ver começar a jornada de volta para casa,
Na esteira do sofrimento.
Não pense em mim em sua juventude:
Um pensamento fugaz é tudo que você daria;
Nem quando feliz no amor, no casamento ou na maternidade:
sua memória seria apenas um pálido reflexo na agitação de sua vida.
Aos sessenta anos, por favor, pense em mim:
O pobre doente que você viu
Ano após ano estendido sobre um leito de sofrimento,
Que, torturado por dores incessantes,
Falava pouco, exceto gemidos laboriosos;
Nada era ele para você e nada poderia ele ser.
Aos sessenta anos de idade, criança, pense nele:
Então você meditará sobre ele, refletirá longamente,
E mais tarde, uma profunda compaixão surgirá em você
Para ele, então em repouso longo do sofrimento.
Uma lágrima enche seus olhos como oferta
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Por ele há muito empalideceu na morte,


Quem nada era para você e nada poderia ser.

Não é necessário descrever a situação de um poeta que poderia escrever versos,


que falam tão poderosamente de seu sofrimento, em quase toda a segunda
metade de sua vida. Havia muita fofoca, mesmo depois de Hamerling já ter ficado
confinado em sua cama por grande parte de sua vida, e alegações sobre a vida
sibarítica que o autor de “Ahasver” supostamente levava. Havia até rumores de
que ele morava numa casa suntuosa em Graz e que tinha um grande número de
garotas para seu prazer, que tinham que apresentar danças gregas, dia após dia,
e outras coisas semelhantes. Todas essas histórias foram contadas numa época
em que a doença o mantinha deitado, enquanto o Sol brilhava lá fora.
Ele foi forçado a ficar na cama em seu quartinho, sabendo que lá fora o Sol
brilhava nos prados, na Natureza gloriosa de que tanto desfrutara nos breves
períodos em que pôde deixar seu leito de doente.
E este mesmo Sol brilhante, brilhava gloriosamente quando acompanhamos o
falecido até seu último lugar de descanso, em 15 de julho de 1889.
Poucos, realmente, viveram sob tais restrições externas e ainda assim, foram
devotados com cada fibra de sua alma ao que é grande, belo, monumental,
magnífico e alegre do mundo. Lembro-me de uma vez, sentado com um jovem
músico, em Viena, que era um grande amigo de Hamerling. Esse jovem era
essencialmente um sujeito pobre, que logo sucumbiu a uma doença mental. Ele
era profundamente pessimista e nunca se cansava de reclamar da vida. E como
amava muito Hamerling, gostava de citar o poeta, em suas reclamações sobre a
vida. Nesta ocasião, o jovem músico quis mais uma vez citar Hamerling, como um
pessimista. Enquanto estávamos sentados juntos num café, consegui pedir um
jornal que continha um pequeno poema ocasional de Hamerling, intitulado
"Pedido pessoal". Eu mostrei para o jovem músico.

Pedido pessoal

Diga que eu escrevo versos ruins,


diga que roubo os talheres,
diga que sou um alemão podre
Porque minha dieta diz que não posso comer judeus
e eslavos no café da manhã;
Ou que traio a nossa Áustria
Porque canto os elogios a Bismarck.
Diga que estou abatido pela tristeza porque
tristemente faltam
louvores para mim, Caluniado sou vil às vezes -
Mas peço apenas uma coisa:
Não diga que sou um pessimista,
Que a última palavra em meu canto
Pertence ao blasé -moderno
Estúpido, enfadonho infelicidade de viver!
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O que? O poeta é pessimista


Porque faz barulho de reclamação?
Só porque o mundo é lindo
E a vida parece tão charmosa para ele
que se arrependeria dolorosamente
Se sua parte ele perdesse.
Se você chama de pessimista todas as pessoas
que reclamam, então pessimista
é o homem de quem um grito
escapa enquanto ele está no dentista!
Acredite em tudo que os críticos dizem,
exceto que sou um pessimista!
Eu odeio essa palavra. Para mim, cheira um
pouco como sua sílaba final.

Essas palavras caracterizam a atitude de Hamerling e mostram que ele viveu com
muita dor (ele escreveu o mesmo para Rosegger) no momento em que escreveu
este poema "Pedido Pessoal". Ele escreveu a Rosegger: “Não estou preocupado
em me tornar um pessimista, mas tenho medo de ficar louco ou de me tornar um
imbecil, pois às vezes consigo apenas alguns minutos de trégua da dor sem
fim!” O homem que começou sua carreira poética com palavras, que realmente
soavam como o programa de uma vida inteira, estava preocupado em
enlouquecer ou se tornar um imbecil, mas não em se tornar um pessimista.
Pois quando Robert Hamerling enviou seu primeiro poema importante, "Vênus
no Exílio", para o mundo, ele deu-lhe o lema:

Siga seu caminho, um mensageiro sagrado,


E cante em tons alegres
Do amanhecer,
Do reino da beleza por vir.

Essa foi sua atitude ao longo de sua vida. Devemos nos lembrar de uma cena
muito memorável, se quisermos compreender totalmente a natureza única de
Hamerling. Poucos meses ou semanas antes de sua morte, ele se mudou de seu
apartamento em Graz - onde morava, na rua então chamada de
Realschulstrasse; agora é Hamerlingstrasse - uma pequena casa de verão,
chamada Stifting House, situada numa área isolada nos arredores da cidade.
Dois criados tiveram que carregar o inválido; seu apartamento ficava três andares
acima. Várias vezes ele quase desmaiou. Mas de cada lado dele ele tinha um
pacote amarrado com uma fita larga, que ia em volta do pescoço como uma
estola; eles continham o manuscrito embrulhado de sua última obra, The
Atomistic Wil. Isso era característico da maneira como esse poeta vivia e do que
ele amava. Ele não queria que o manuscrito desta obra filosófica saísse de suas
mãos nem por um minuto! Ele estava tão doente que dois criados tiveram que
carregá-lo para baixo; ainda assim, ele teve que se agarrar ao que preenchia sua
vida. Então ele foi carregado para baixo e levado para Stifting House sob o mais
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lindo Sol, suspirando: “Oh, que prazer cavalgar assim; se eu estivesse menos
doente, menos doente”!
A alma e o espírito trabalhando sob essas condições físicas permaneceram
abertos a tudo que é grande e belo, tudo que está cheio de espírito no mundo.
Ele nasceu das fontes de grandeza, beleza e espiritualidade de tal forma, que não
podemos realmente ficar surpresos com sua atitude para com o pessimismo.
Não podemos nos surpreender ao ver, no espírito de Hamerling, uma evidência
cósmica viva de que as forças espirituais em nós podem triunfar, sobre as forças
materiais e naturais, por mais obstrutivas que sejam, em todas as situações.
Cinquenta e nove anos antes, ou seja, em 1830, Robert Hamerling nasceu na
Áustria, numa área chamada Waldviertel. Por causa de sua configuração natural
especial, essa região é eminentemente adequada - e provavelmente era mais
adequada então do que agora - quando é cortada por linhas férreas - para
concentrar a alma internamente, se ela estiver acordada e para aprofundar a
alma. A região de Waldviertel é basicamente um remanso da civilização, embora
alguém tenha nascido e vivido lá, na primeira metade do século XIX e também
fosse amplamente conhecido na Áustria, deste lado do rio Leitha.
Ele provavelmente já foi esquecido e, no máximo, continua a viver na memória
do povo de Waldviertel, em várias lendas folclóricas. Devo acrescentar, que
muitas vezes ouvi falar da fama dessa pessoa, porque meus pais eram da região
de Waldviertel. Assim, pude, pelo menos, ouvir falar dos resquícios de sua fama
peculiar, característica do clima de isolamento cultural daquela região.
Essa pessoa famosa era nada menos que um dos “mais famosos” ladrões e
assassinos da época, a saber, Grasel. Este Grasel era certamente mais famoso do
que qualquer outra pessoa, que veio da região de Waldviertel.
Em seus últimos anos, Hamerling escreveu sobre a área de Waldviertel e quero
ler para vocês apenas algumas linhas do que ele disse sobre sua região natal, onde
viveu durante os primeiros dez ou quinze anos de sua vida, porque acredito que
essas palavras podem lançar muito mais luz, sobre a natureza de Hamerling, do
que qualquer caracterização acadêmica. Ele escreve:

Não sei o quanto a construção de uma ferrovia, contornando a área de


Waldviertel afetou o isolamento desta, do mundo. Em 1867, a aparição de
um estranho ainda gerava comoção ali. Se tal pessoa viesse a pé ou de
carruagem, os bois que aravam os campos paravam e voltavam a cabeça,
para admirar a nova aparição. O fazendeiro fez uma ou duas tentativas
débeis para empurrá-los, com seu chicote - mas em vão e, finalmente, ele
fez o mesmo e o arado parou, até que o estranho desaparecesse atrás da
próxima colina ou floresta. Essa também é a imagem de uma atmosfera
idílica!

A vida e a personalidade de Hamerling são um exemplo de uma alma crescendo,


fora e além de seu ambiente, e de desenvolvimento de uma individualidade.
Ele era filho de um pobre tecelão. Como estavam completamente empobrecidos,
seus pais foram expulsos de sua casa, num momento em que Hamerling ainda
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não era capaz de dizer "eu". Seu pai foi forçado a viajar para o exterior, enquanto
sua mãe permaneceu na área de Waldviertel, em Schonau, com o menino.
Lá, a criança experimentou as belezas da região de Waldviertel. Uma cena
daquela época permaneceu sempre em sua memória, de uma experiência que ele
acreditava, realmente, ter dado a ele seu próprio ser. O menino de sete anos
estava descendo uma colina. Era noite e o Sol estava se pondo no Oeste.
Algo dourado veio em sua direção, do Sol dourado,

Entre as memórias mais significativas da minha infância, mas também as


mais difíceis de transmitir, estão os humores muitas vezes estranhos, que
passaram pela minha alma, quando eu era um menino errante.
Em parte, eles vieram de impressões vivas do momento e estimulação,
geralmente da Natureza ao meu redor, em parte eles foram sonhos
acordados e premonições. Falando sobre si mesmo, o místico Jakob
Böhme costumava dizer que o significado superior, a vida mística do
espírito foi despertada nele, milagrosamente, no momento em que ele
estava sonhadoramente absorvido em contemplar uma tigela de estanho
brilhando à luz do Sol. Talvez toda pessoa espiritual tenha uma tigela de
estanho, como a de Böhme, como a origem de seu verdadeiro despertar
interior. Lembro-me vividamente de uma certa noite, quando eu tinha
cerca de sete anos. Eu estava descendo uma colina e o pôr do Sol brilhou
na minha direção como um milagre, uma visão espiritual. Encheu-me o
coração de uma disposição inesquecivelmente estranha, de um
pressentimento que hoje me parece uma vocação, refletindo meu destino
futuro. Animado, corri para um destino desconhecido; mas, ao mesmo
tempo, minha alma se encheu de uma melancolia, que me deu vontade de
chorar. Se aquele momento pudesse ter sido explicado pelas
circunstâncias circundantes, se não tivesse sido tão completamente único,
certamente não teria permanecido tão indelevelmente em minha
memória.

Assim, no sétimo ano do poeta, a musa poética e espiritual se aproximava.


Naquela época, a semente para tudo o que mais tarde viria a ser desta alma foi
lançada nela, de fora, do Cosmos, por assim dizer.
O bom é que Hamerling atribui sua vocação poética a tal evento, como se fosse
um milagre que o próprio Cosmos realizou sobre ele.
Por causa da pobreza de seus pais, o menino teve que ser educado no mosteiro
cisterciense, de Zwettl. Em troca de suas aulas na escola, ele teve que cantar no
coro do Mosteiro. Naquela época, Hamerling tinha entre dez e quatorze
anos. Estabeleceu uma relação estreita com uma estranha personalidade do
Mosteiro, a saber, o Padre Hugo Traumihler, uma pessoa totalmente entregue à
contemplação mística e a uma vida estritamente ascética.
Naquela época, o menino já tinha uma sede pela beleza do Cosmos e uma vontade
de aprofundar sua alma. Vocês podem imaginar, que ele foi inspirado pelas
experiências internas que o Padre Traumihler descreveu, a partir de sua
contemplação interna dos segredos do coração e da alma. Ele era um místico de
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um tipo muito elementar e primitivo que, no entanto, causou uma profunda


impressão na alma de Hamerling.
Mas é impossível falar do poeta Hamerling, sem mencionar o que era uma parte
tão grande de seu anseio: o desejo de ser um grande ser humano.
Quando ele voltou de uma viagem para Waldviertel, muito depois de ter deixado
a área, as pessoas, que sabiam que ele vinha de lá, perguntaram o que ele queria
ser. Mas, embora já tivesse mais de vinte anos, Hamerling não havia pensado no
que queria ser. Essa percepção o fez perceber que, nessa idade, você não pode
evitar a pergunta "O que você quer fazer?" A única coisa que ele poderia dizer a si
mesmo era: “Bem, eu realmente não posso dizer a eles o que quero ser, porque
eles não entenderiam. Pois, quando me perguntam o que quero ser, quero
responder: quero me tornar um ser humano!”
Então, às vezes, ele dizia que queria ser um filólogo ou astrônomo ou algo
assim. As pessoas podiam entender isso. Mas eles não teriam entendido que
alguém que terminou seus estudos poderia ter a intenção de se tornar um ser
humano. Bem, muito se poderia dizer sobre o desenvolvimento de Hamerling
como poeta e, acima de tudo, sobre o desdobramento de três coisas em sua
alma. A primeira ele mais tarde descreveu em The Atomistic Will, dizendo que os
gregos chamavam o Universo de “Cosmos”, uma palavra ligada à beleza.
Isso, para ele, era característico do espírito grego, pois sua alma estava repleta da
beleza que ressoa por todo o Universo. E o desejo de seu coração era ver a
humanidade, por sua vez, permeada por essa beleza; era isso que ele queria
expressar de forma poética. Portanto, tudo nele se voltava para a beleza, para o
mundo dos gregos, repleto de beleza. No entanto, ele viu tantos aspectos da vida
que lançaram uma mortalha, sobre a beleza pretendida pela Natureza.
Para ele, a beleza era idêntica à espiritualidade. Frequentemente, ele pesquisava
tudo o que sabia sobre o helenismo e depois olhava, com tristeza, para a cultura
moderna, os leitores de sua poesia. Ele queria escrever poesia para esta cultura
moderna, a fim de preenchê-la com sons que encorajassem as pessoas a trazer
beleza e espiritualidade de volta à vida e, assim, devolver a felicidade à vida na
Terra. Hamerling achou impossível falar de uma discrepância, entre o mundo e a
beleza, na vida humana. Ele foi inspirado pela crença, de que a vida deve estar
repleta de beleza, que a beleza deve estar viva no mundo e desde sua juventude
ele teria preferido viver apenas para isso. Era como um instinto em sua alma.
Mas ele encontrou muitas coisas, que lhe mostraram que a Era moderna deve
enfrentar muitas coisas, que frustram nossos ideais de vida.
Hamerling era um estudante em 1848. Ele era um membro do Movimento de
Libertação e foi preso pela polícia, por este "grande crime" e recebeu uma punição
especial, como aconteceu com muitos, que haviam feito parte desse movimento
em Viena, naquela época. Se fossem além do que a polícia julgava permissível,
eram levados ao barbeiro, onde seus cabelos eram cortados, em sinal de que eram
“democratas”. Hoje em dia, vocês não correm mais o risco de cortar o cabelo, só
porque têm opiniões liberais - progresso, de fato!
A outra coisa não permitida na época, era o uso de chapéu de aba
larga. Novamente, isso era considerado um sinal de visão liberal.
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Era preciso usar o chamado “topper”, uma cartola, que tinha total aprovação
policial. Hamerling teve que aturar isso e muito mais.
Permitam-me apenas mencionar mais um evento, como uma pequena indicação,
de como o mundo tratou o grande poeta; eu acredito que leva a uma
caracterização muito melhor do que uma descrição abstrata. O evento a que me
refiro aconteceu, quando Hamerling havia concluído seus anos na Universidade
e estava prestes a fazer seu exame de ensino. Ele tinha boas notas em grego, latim
e matemática. Na verdade, ele recebeu notas excelentes em grego e latim.
Mas se lermos mais em seu boletim escolar, descobriremos que, embora
Hamerling afirmasse ter lido alguns livros de gramática, seu desempenho no
exame não indicava um estudo completo da língua alemã.
Isso foi dito do homem, que enriqueceu a língua alemã de forma incomensurável,
com seu estilo único! Gostaria de chamar a atenção para outra experiência que
Hamerling teve. Em 1851, ele conheceu uma família e uma noite foi convidado
para uma festa. Ele teria se juntado a eles de bom grado, mas não podia
ficar. Então, a filha da família mandou um copo de ponche para os aposentos dos
alunos. Quais foram seus sentimentos então? De repente, ele teve vontade de
pegar papel e lápis e se sentiu transportado para outro mundo.
No início, ele viu imagens da história mundial, apresentadas como se num grande
quadro. Então, essas imagens foram transformadas em um caos de flores,
podridão, sangue, salamandras, frutas douradas, olhos azuis, música de harpa,
destruição de vida, o trovão de canhões e pessoas brigando.
Cenas históricas alternadas com flores e salamandras. Então, como se
cristalizando do todo, uma pálida figura séria, com olhos penetrantes,
apareceu. Ao ver essa figura, Hamerling acordou.
Ele olhou para o pedaço de papel. O papel, em branco antes da visão, tinha escrito
nele o nome Ahasver e, abaixo, o esboço do poema “Ahasver”.
O interesse de Hamerling por tudo o que move a alma humana às suas alturas e
às profundezas era de rara profundidade e, combinado embriaguez com beleza,
por assim dizer. É por isso, que os dez anos que passou lecionando no colégio em
Trieste, no glorioso Adriático e tirando férias na vizinha Veneza, podem ser
descritos como um período feliz para ele. Conheceu Veneza tão bem, que anos
depois ainda conhecia todos os cantos, recantos e vielas por onde passara muitas
vezes em belas noites. Lá ele viu a Natureza radiante e a beleza do Sul, pelas quais
sua alma tanto ansiava. Esta beleza do Sul floresceu em "Saudação na música do
Adriático". Como suas primeiras obras, este poema mostra o talento
extraordinário de Hamerling. Foi seguido por "Vênus no Exílio".
Hamerling concebeu Vênus, não apenas como a personificação do amor
terreno, mas como portadora da beleza, que rege e domina o Cosmos, uma beleza
que está no exílio no que diz respeito à humanidade moderna.
O desejo de Robert Hamerling, como poeta, era libertar a beleza e o amor de seu
exílio. Daí o lema que li para vocês:

Siga seu caminho, mensageiro sagrado,


E cante em tons alegres
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Do amanhecer,
Do reino da beleza, por vir.

Mas a alma de Hamerling não poderia cantar sobre o “amanhecer / Do reino da


beleza por vir”, sem olhar para todos os recessos escuros da alma humana.
A visão de Ahasver mostra, o que Robert Hamerling viu nesses recessos.
Continuou diante de sua alma, até que ele encontrou a forma poética da
personalidade de Ahasver. Ahasver tornou-se o fio condutor da vida humana,
como a personificação de uma individualidade que deseja escapar da vida, mas
não pode. Essa individualidade é, então, contrastada com a de Nero, em Roma,
um homem sempre em busca da vida, mas incapaz de encontrá-la na saturação
sensual e, portanto, em uma busca eterna.
Podemos ver, como as contradições da vida confrontaram Hamerling. Isso se
torna ainda mais claro em seu poema “O Rei de Sion”, onde ele descreve uma
pessoa, que deseja trazer a salvação espiritual, de alturas elevadas, para seus
semelhantes, mas é vítima das fraquezas humanas, no processo da sensualidade
e assim por diante. Hamerling estava sempre refletindo, sobre a proximidade dos
opostos na vida e queria dar essa forma poética. A Grécia surgiu diante de sua
alma, na forma que ele queria restaurá-la. Em Aspásia, ele descreveu a Grécia de
sua imaginação, o País de seus anseios, o mundo da beleza, incluindo os aspectos
negativos que esse mundo de beleza também pode comportar.
Na forma de um romance de três partes, Aspásia tornou-se um poema
maravilhoso sobre a história cultural. Robert Hamerling não foi compreendido,
como descobri quando conheci um homem, em um lugar esquecido por Deus,
cujos olhos ardiam de ressentimento e cuja boca tinha uma expressão feia.
Não me refiro à feiura física, é claro; a feiura física pode realmente irradiar beleza,
do mais alto grau. Este homem foi um dos críticos mais cruéis de Aspásia.
Em comparação com o poeta cheio de beleza, aquele homem parecia um dos
homens mais feios e era claro por que sua alma amarga, não conseguia entender
Hamerling. Todos os esforços de Robert Hamerling foram dessa ordem.
Haveria muito a dizer, se eu contasse todo o seu progresso, ao longo da
história. Ele procurou lidar com Dante e Robespierre, terminando com
Homunculus, no qual desejava incorporar todo o grotesco da cultura
moderna. Também haveria muito a dizer, se eu descrevesse como a musa lírica
de Hamerling buscou encontrar os sons reflexivos, que permeiam suas obras, na
beleza e nas cores da Natureza e no espírito da Natureza.
Novamente, haveria muito a dizer, se eu quisesse dar à vocês, ao menos uma ideia
de como a poesia lírica, de Hamerling, está viva com tudo que pode confortar
nossas almas, em relação às pequenas e às grandes coisas, ou como seus poemas
podem nos dar a fé invencível, de que o reino da beleza triunfará na alma humana,
por mais que os demônios da discórdia e da feiura tentem estabelecer seu
domínio. A alma de Hamerling sofreu em vida; no entanto, em meio ao mais
profundo e doloroso sofrimento, sua alma podia encontrar alegria, na beleza da
atividade espiritual. Sua alma podia ver as discórdias do dia ao redor e, ainda
assim, mergulhar profundamente na beleza da noite, quando o céu estrelado se
erguia, acima das águas. Hamerling foi capaz de dar uma expressão significativa
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à esse humor. Eu queria descrever, brevemente, por meio de alguns episódios da


vida de Hamerling, uma imagem de Robert Hamerling como um poeta do final
do século XIX, que estava repleto de uma consciência invencível do futuro melhor
da humanidade, porque ele estava completamente imerso na verdade da beleza
do Universo. Ao mesmo tempo, ele foi um poeta, que poderia descrever como o
espírito pode ser vitorioso, em nós, sobre todos os obstáculos materiais e
empecilhos à nossa natureza espiritual. É impossível entender o poeta
Hamerling, sem referência ao seu esforço, ao longo da vida, para responder à
pergunta: Como posso me tornar um Ser humano?
Tudo o que ele criou tem grandeza humana, embora nem sempre excelência
poética, pois a estatura de Hamerling, como poeta, é consequência de sua
grandeza humana. Ao ver a desarmonia na vida, Hamerling sempre sentiu um
ímpeto invencível, em sua alma, de encontrar a harmonia correspondente, de
descobrir o modo como todas as coisas feias devem se dissolver em beleza,
quando as olhamos corretamente.
Para concluir, quero ler para vocês um pequeno e insignificante poema, típico de
Hamerling. Na concepção e pensamento pertence aos seus primeiros anos, mas
caracteriza o estado de espírito, ainda que na simplicidade poética primitiva, que
o acompanhou ao longo da sua vida:
O Leão e a Rosa

Em uma rosa vermelha profunda


O leão furioso pisou
Sua pata agarrou rapidamente o espinho
Deste delicado botão.
Sua pata inchou muito;
Com muita dor, ele morreu.
Refrescada, a rosa vermelha bebeu
O orvalho da manhã.
Seja o delicado, sempre tão delicado,
O áspero, sempre tão áspero,
Aquilo que é frágil, gentil, puro - A
beleza triunfa sobre tudo.
Esse humor - podemos ver em tudo o que ele escreveu - acompanhou Hamerling
por toda a sua vida:
Seja o delicado, sempre tão delicado,
O áspero, sempre tão áspero,
Aquilo que é frágil, gentil, puro - A
beleza triunfa sobre tudo.

Nota 1 – Peter Rosegger, 1843–1918, poeta e romancista austríaco. Hans


Brandstetter, 1854–1925, escultor austríaco.
Robert Hamerling, pseudônimo de Rupert Hammerling 1830–1889, poeta
austríaco. Mais conhecido por seus épicos Ahasverus em Rom 1865 e
Homunculus (1888).
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COMO O MUNDO ESPIRITUAL INTERPENETRA O FÍSICO

GA 154

PALESTRA I

Kassel, 9 de maio de 1914.

Uma das repetidas objeções à busca de conhecimento espiritual, no último terço


do século XIX, é esta: quando um homem atravessou os portões da morte, ele
verá a natureza da vida espiritual, como vivida sem o corpo físico, mas, enquanto
aqui no corpo físico, a atenção deve ser dada à vida terrena; aqui, o homem deve
viver como se a Terra fosse sua única esfera de atividade. Um estudo mais
profundo da Ciência Espiritual nos mostra, cada vez mais, que uma
compreensão superficial da vida espiritual, está contida em tal
declaração. Ensina-nos, que as coisas não são realmente como se a vida, num
corpo físico antes da morte, fosse totalmente separada da vida no mundo
espiritual, após a morte, como se uma não contatasse a outra. Ao contrário,
chegaremos a um entendimento comum para estudo, se considerarmos o que já
sabemos, da conexão da vida espiritual, com a vida física. Comecemos
lembrando-nos do que aprendemos na Ciência Espiritual, sobre a vida alternada
do homem, entre dormir e acordar.
Falamos disso corretamente, quando dizemos: O Eu e o corpo astral estão fora
do corpo físico, durante o sono. Essa é uma resposta suficiente, para a demanda
imediata por conhecimento, mas apenas um aspecto da verdade plena; é como
se disséssemos: o Sol nasce de manhã e se põe à noite, e não está lá no
intervalo. Sabemos que, para a Terra, esse não é o caso; sabemos que durante o
tempo em que o Sol não está brilhando para nós, está brilhando em outro lugar,
dando sua luz a outros habitantes da Terra, quando está escuro para nós. É o
mesmo com a vida do Eu e do corpo astral, em relação àquela dos corpos físico e
etérico, se tivermos uma visão ampla disso. É verdade que o Eu e o corpo astral
estão fora do corpo físico, durante o sono, mas apenas parcialmente estão fora
do sangue e do Sistema Nervoso. Quando todos dormimos, o Sol do nosso Eu e
do corpo astral, se ajusta, dessa maneira, para o sangue e o sistema nervoso; no
entanto, enquanto estamos dormindo, do lado de fora irradiam as forças do Eu
e do corpo astral, naqueles órgãos não conectados com o sangue e os nervos.
Nosso corpo vive em duas esferas. Vivemos em uma, quando estamos
acordados, quando somos animados pelo nosso Eu e corpo astral; e na outra,
quando dormimos, na esfera da qual, as radiações e a força do nosso Eu e do
corpo astral, fluem para as atividades do nosso corpo - com exceção das funções
ligadas ao sangue e aos nervos. Na verdade, durante o sono, estamos no mundo
espiritual, com nosso Eu e corpo astral - como foram inseridos nele - e apenas
aquelas forças do corpo astral e do Eu, das quais o homem é inconsciente na vida
humana normal, fluem para seus órgãos corporais, quando ele está adormecido.
Assim, vemos o enorme significado do sono, para uma vida humana saudável na
Terra. Deixarei isso claro, por um pequeno diagrama.
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Vamos tomar (a), para a esfera do mundo espiritual e (b) nosso corpo na
Terra. Então, vou sombrear a parte conectada com o sangue e nervos; a outra
parte contém, separados, os órgãos do sistema do sangue e dos nervos. Isso não
pode ser tão nitidamente dividido, pois, num certo sentido, os sistemas nervoso
e sanguíneo são, eles próprios, órgãos com atividades próprias, como os outros
órgãos; mas enquanto instrumentos para a vida anímica consciente, eles devem
ser considerados como permeados e inspirados pelo Eu e pelo corpo astral.

Este Eu e corpo astral são levados para a esfera da vida espiritual, durante a
noite, e daí irradiam suas forças, para os outros órgãos do corpo.
Assim, podemos dizer: em nosso corpo físico existe algo, que é fortalecido e
revivido por aquilo que nossa alma, em sua condição de sono, atrai a si mesma
do mundo espiritual e com o qual ela é permeada pelo mundo espiritual. O sol
do nosso Eu e do corpo astral relaciona os nervos e o sangue, na medida em que
o Eu está conectado com o sangue e o segundo não é meramente vida
corporal. Ele relaciona o sangue e os nervos, quando o ser humano dorme e
brilha nos outros órgãos, que estão funcionando em nosso corpo. Deste fato,
podemos facilmente entender, que o sono é um importante curandeiro e que o
sono insalubre pode ser considerado uma das causas mais profundas de
doença, especialmente em relação a certas funções internas de nossa vida
corporal. A Ciência Espiritual nos mostra, que a maneira pela qual o nosso Eu e
o corpo astral deixam o sangue e os Sistema Nervoso, durante o sono e entram
na vida espiritual, é uma questão de grande importância.
Tais coisas, que estou prestes a discutir, aparentemente podem ser facilmente
refutadas, pela chamada experiência externa, mas o Cientista Espiritual deve se
acostumar com o fato, de que essas refutações são apenas aparentes, e que o que
é realmente derivado das observações dos processos internos, é verdade. Se os
fatos externos parecem contraditórios, devemos procurar e ver até que ponto
eles são ilusórios. Agora, vou dar um exemplo concreto, verificado pela Ciência
Espiritual, que tem uma importante influência sobre este ponto.
A vida humana muda em relação a muitas coisas, mas certos fatos fundamentais
da vida permanecem constantes, por longos períodos.
Na Idade Média, existia um certo medo, o chamado medo dos espíritos, de todos
os tipos de seres elementais e fantasmas; isso agora, chamamos de superstição
medieval. Em nossos dias o objeto mudou, mas não o medo; pois, assim como as
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pessoas da Idade Média temiam fantasmas - as da atualidade têm medo de


bacilos e coisas semelhantes. Pode-se dizer, que os fantasmas são mais
respeitáveis e mais temíveis do que os bacilos. A mudança surgiu, pelo fato de
que, antigamente, as pessoas tinham uma disposição mais espiritual; elas
tinham medo dos Seres espirituais elementares; enquanto que agora, como a
disposição é mais materialista, os espíritos devem ser de natureza física.
Isso corresponde melhor à época do materialismo. O que eu queria dizer, no
entanto, é que a Ciência Oculta revela o fato de que, os bacilos são nutridos no
corpo humano, se quiserem prosperar. Os Seres humanos os cultivam. É claro
que todo mundo, no tempo presente, dirá que seria tolice criar bacilos. Esta não
é uma questão de princípio de qualquer tipo, mas de olhar para as coisas, do
ponto de vista correto. Não se pode negar que, como ensina a Ciência Espiritual,
o Eu e o corpo astral, que foram alimentados apenas com ideias materialistas e
rejeitaram todas as concepções espirituais e desejaram não ter nada a ver com
elas, quando deixam o corpo, durante o sono, injetam nos órgãos corporais,
forças das esferas espirituais, que são exatamente o que os bacilos
necessitam. Nada melhor pode ser feito, para a criação de bacilos, do que
transportar ideias materiais cruas, para a vida do sono; dessa forma, suscitam
forças ahrimânicas, que fluem para dentro do corpo e se tornam as cultivadoras
de bacilos. Para formar um julgamento adequado de tudo isso, devemos
entender claramente que, no momento em que nos voltamos para o estudo da
vida espiritual, devemos imediatamente considerar, o que é chamado de
comunhão humana. Pois, uma cooperação comum na comunhão é eficaz, numa
medida muito maior, quando se trabalha em assuntos espirituais, do que quando
se trata, apenas, do plano físico. Podemos dizer que, para não ter bacilos
prejudiciais em nossos corpos, é melhor aplicar o remédio de adormecer com
pensamentos espirituais em nossas mentes. Talvez isso pudesse se tornar um
remédio, se fosse clinicamente comprovado, de modo que, as pessoas mais
materialistas, nos tempos vindouros, permitissem que os pensamentos
espirituais fossem prescritos para elas; e algo que contribui para a vida
espiritual, poderia ser esperado, dessa maneira. Mas a questão não é tão
simples, pois a importância da vida comunitária realmente começa, quando
tocamos questões espirituais e lá podemos dizer: talvez não seja vantajoso, para
o indivíduo, nutrir ideias espirituais, se todos os que o cercam estão criando
bacilos, pelos seus pensamentos materialistas; aqui, um cria o outro.
Este é um fato importante e devemos ter isso em mente.
Portanto, devo novamente enfatizar o que eu já lhes disse, que a Ciência
Espiritual só pode ser frutífera, em seu serviço à humanidade, quando ela não
serve meramente ao indivíduo. Não é suficiente o indivíduo aceitá-la; a Ciência
Espiritual deve esperar, pacientemente, até que ela se torne um fator na
civilização, até que ela agarre o coração e a alma de muitos; então veremos o que
ela pode fazer pelo homem. No entanto, há algo que afeta igualmente os Seres
ahrimânicos nos bacilos, muito fortemente. Eu digo Seres ahrimânicos, pois
posso facilmente mostrar a diferença, entre os ahrimânicos e outros Seres - e
mesmo externamente, pode ser facilmente visto. Ao nosso redor, vemos a
Natureza, com suas muitas criaturas; tudo o que vive fora da Natureza, tira sua
76

vida dos Seres bons, sábios e progressistas. Tudo o que tem sua existência em
outros organismos e prefere prosperar neles, pertence às criaturas de ordem
luciférica ou ahrimânica. Todos os parasitas são de origem luciférica ou
ahrimânica; se nos lembrarmos disso, poderemos facilmente distinguir as
diferenças nos reinos da Natureza. Há algo, como eu disse, muito útil para as
criaturas ahrimânicas, quando elas infestam o corpo humano.
Suponham, que estamos vivendo na época de uma epidemia ou de peste.
Naturalmente, em tal momento devemos cuidar dos outros e uma forte
comunhão humana ou cooperação surge, pois as condições cármicas realmente
podem ser tais, que aquele que, em sua vida individual, parece menos propenso
a ter a doença, cai presa dela. No entanto - não devemos ser enganados pelas
aparências - o que eu vou dizer é geralmente verdade. Se estivermos vivendo
entre os doentes ou moribundos, e tivermos que absorver essas imagens, que
estão ao nosso redor e adormecermos com essas imagens em nossas mentes, e
se nada estiver ligado a elas, se não o medo egoísta, a imaginação que surge
dessas imagens na alma, durante o sono, fica cheia desse medo egoísta e isso
permite, que forças prejudiciais entrem no corpo humano.
As imaginações do medo são, realmente, as forças que estimulam os inimigos
ahrimânicos do homem. Quando uma disposição nobre está presente, para que
o medo egoísta se retire e a ajuda amorosa para os outros prevaleça, e passarmos
para a vida do sono, não com imaginação temerosa, mas com os efeitos
produzidos pela ajuda amorosa, isso significa destruição para os ahrimânicos
inimigos da humanidade. É bem verdade que, pelo encorajamento de tal atitude,
poderíamos pôr fim às epidemias, se nós regulássemos nossa conduta de acordo.
Aqui eu posso indicar como, algum dia, (mas ainda não pode ser) os resultados
do conhecimento da vida espiritual serão vistos na vida social da humanidade:
almas humanas tornar-se-ão fortes, através do conhecimento espiritual e
aqueles, cuja disposição é aceitar o conhecimento espiritual, trabalharão
curativamente na vida material, na Terra. Por isso, vemos quão injustificável é a
objeção de que, enquanto vivemos na Terra, não precisamos nos preocupar com
a vida espiritual. Muito depende do tipo de vida espiritual que levamos conosco
para dormir, enquanto estamos aqui na Terra, pois através dela, moldamos
nossas almas em bons ou maus instrumentos para o envio de forças do mundo
espiritual, para os órgãos do corpo, que não são usados como instrumentos pela
alma na consciência do dia, mas funcionam física e quimicamente abaixo do
limiar da consciência. Aquelas funções que não pertencem à atividade de nervos
e sangue no Ser humano, mas são simplesmente de uma natureza orgânica -
atividade física e química - essas não são funções da vida, tais como na planta e
reinos minerais, mas funções nas quais as forças do mundo espiritual fluem,
durante o sono. Portanto, vemos a importância de podermos levar o
conhecimento espiritual para a vida do sono e percebemos a atitude mental que
cria. Se ainda houver dúvida quanto à interação entre os mundos espiritual e
físico, poderemos, entre outras coisas, fazer as seguintes observações.
Imaginemos, que algum tipo de mudança climática corrompesse toda a Terra,
de modo que nada de bom para a comida, pudesse crescer nela; devemos, então,
descobrir, como é importante o reino mineral e vegetal da Terra, para o
77

homem. Se a Terra decaísse sob nossos pés, deveríamos perceber o quanto


precisamos dos reinos inferiores da Terra, pelos quais a vida humana pode ser
sustentada. Aquilo que o solo e os frutos são para a vida física que temos, assim,
também, somos, como seres vivos, com as atividades de nossas almas, para
aqueles que passaram pelas portas da morte. É um fato que os mortos, que vivem
em suas esferas, precisam de um terreno do qual possam colher frutos. A
ilustração a seguir dará uma ideia disso: vamos pensar numa multidão de
pessoas dormindo, todas cheias de concepções pertencentes, apenas, à vida
terrena, ideias materialistas. Este solo, que eles formam para os mortos, é tão
estéril para eles, quanto o desperdício e o solo corrompido seriam para nós. Os
mortos sentem isso, como uma região em que passam fome. Toda concepção
espiritual, que levamos para a alma e levamos para o sono, ajuda, enquanto
dormimos, a criar parte do solo necessário aos mortos, assim como os reinos
mineral e vegetal são necessários para nós. Em certo sentido, almas cheias de
ideias espirituais formam, durante o sono, a base espiritual frutífera para a
nutrição dos mortos; e nós tiramos o alimento, que os mortos precisam e que
deve ser reunido em nossa Terra, se permitirmos que nossas almas se tornem
desoladas, isto é, vazias de ideias e concepções espirituais. Aqui vemos, ainda
mais claramente, a importância do conhecimento espiritual cósmico e sua
fecundidade para o próprio mundo espiritual. Assim como nossas almas
adormecidas fornecem o solo, do qual os mortos extraem seu sustento, assim, se
conscientemente fizermos com que conceitos espirituais passem, através de
nossas almas, isso ajudará os mortos, em seu poder de percepção.
Por esta razão, tenho aconselhado aqueles que estão enlutados, a ler para seus
mortos. Se os tivermos na mente e lermos, em pensamento, algo da Ciência
Espiritual, ou fizermos com que outros pensamentos espirituais passem
silenciosamente, através de nossas almas, nossos mortos perceberão isso. Eles
nos observam e são nutridos pelos efeitos colaterais inconscientes, das ideias
espirituais. Suas próprias consciências são atualizadas ou revivificadas, por meio
do que foi lido para eles. Aqui, novamente, vemos as relações constantes, entre
os mundos físico e espiritual. Pode ser facilmente sugerido, que os mortos estão
no mundo espiritual e que esse método de leitura pode ser inútil para eles. Sim!
Eles estão no mundo espiritual, mas os conceitos da Ciência Espiritual têm que
ser formados na Terra e em nenhum lugar eles podem ser concebidos, exceto nas
mentes dos homens na Terra: os mortos estão, de fato, num mundo espiritual e
precisamente essas concepções, podem alcançá-los e sustentá-los e nós
aumentamos a consciência deles, se da Terra nós mandarmos essas concepções
para eles. Como existem as conexões mais íntimas, entre os mortos e aqueles
entre os quais eles viveram, as melhores pessoas para ler para eles são aquelas,
que eram amigas e ajudantes, antes de eles morrerem, ou que estavam
intimamente relacionados a eles. Se vocês cultivarem tais pensamentos, sobre as
conexões do mundo físico com o mundo espiritual, vocês realmente
experimentarão uma nova disposição, que verdadeiramente, no sentido mais
amplo da palavra, deve ser chamada de disposição religiosa do futuro. De tais
estudos científico-espirituais, que acabaram de ser dados, será desenvolvida a
disposição que, no mais alto sentido, merece ser chamada de religiosa, pois
78

aquele que assim admite o mundo espiritual, edificará sobre os fundamentos da


Sabedoria Divina, que flui do Cosmo. É tremendamente importante, que
adquiramos este sentimento da Sabedoria governante no Cosmos e que devamos
nos preencher com ela. Quando a humanidade for permeada por esse
sentimento, ela irá, com uma profunda e genuína confiança na Sabedoria do
Universo, aceitar seu destino e todos os golpes do destino, que são tão difíceis de
suportar. Quando observamos os mundos espirituais, nos quais os mortos
vivem, muitas vezes podemos ver como é mais fácil para os mortos, quando os
amigos, que eles deixaram para trás na Terra, são permeados com essa regente
Sabedoria do Universo. Chorar pelos mortos é, naturalmente, bastante
natural; mas se não pudermos pôr fim ao nosso choro, parece que duvidamos da
Sabedoria regente do Universo; e aquele, que pode olhar para mundos
espirituais sabe, que aqueles, que anseiam por seus mortos estarem aqui e não
no mundo espiritual, estão fazendo o maior mal a eles. Ajudamos muito os
mortos, em sua vida após a morte, se aceitarmos nosso destino e pensarmos nos
mortos, como tendo sido tirados de nós no momento certo, por uma boa
Sabedoria regente, porque eles eram necessários para outras esferas de
existência, além da Terra. No futuro, muito dependerá de as pessoas ajudarem
mais (não menos) em tudo o que toca as tristezas da humanidade, tendo um
claro conhecimento de que o destino está sempre em ação e que, se através do
carma a morte tenha atingido aqueles que pertencem à eles, teve que ser.
Isso não deve nos impedir, enquanto a pessoa estiver viva, de fazer tudo o que
for possível para ajudá-la, quando ela estiver doente, se ela for passível de
tratamento, mas como Seres humanos, não podemos presumir ir além do que é
permitido para nós, como tal. Devemos ter certeza de que a Sabedoria
governante do Universo é mais sábia do que nós. Isso tudo é comum e trivial,
mas é pouco falado, hoje em dia. Grande felicidade viria, tanto para os vivos,
como para os mortos, se esse conhecimento fosse mais geralmente divulgado; se
pudesse entrar como uma convicção nas almas dos homens, se eles pudessem
pensar nos mortos como vivos, como tendo experimentado uma transformação
da vida e não pensar neles como tendo sido tirados deles.
Se só observássemos um pouco dessa conexão, entre os mundos físico e
espiritual, veríamos as múltiplas maneiras pelas quais, um mundo está
intimamente ligado ao outro e que, os assuntos do mundo físico só se tornam
claros, quando observados à luz do mundo espiritual.
Se, com referência a qualquer coisa que nos aconteça no mundo físico,
quiséssemos apenas encontrar as causas espirituais, de algum golpe do destino
ou infortúnio, deveríamos olhar para além dele e entender que, o que parece
extremamente triste, pode ser entendido na fonte de Sabedoria
Cósmica. Devemos enfatizar isso repetidamente.
Isso não altera o fato de que muito sofrimento possa chegar até nós; mas altera
nossa atitude em relação a isso, não nos afundando nele e nos fechando
egoisticamente em nossa tristeza, ou nos afastando da vida do mundo, o que
certamente não deveríamos fazer. Muitas outras coisas estão igualmente ligadas
entre si e, precisamente esses incidentes significativos, nos ensinam a falsidade
da afirmação, de que não precisamos nos preocupar com a vida espiritual,
79

durante nossa vida física na Terra. Pois trazer ideias, sentimentos e convicções
espirituais para a vida terrena física é de grande importância.
Deixem-me adicionar agora, alguns exemplos ao que eu disse a vocês hoje.
Exemplos nos mostrarão claramente a verdade do que tenho dito.
Uma pessoa, bem conhecida de alguns dos membros da nossa Sociedade, morreu
antes de atingir a meia-idade. Se uma pessoa morre cedo na vida, por volta do
começo dos 30 anos, muitas vezes é perguntado: qual é o significado disso? Por
que uma pessoa deveria ser separada da vida terrena, no primeiro terço de sua
vida física na Terra? Quando acompanhamos essa pessoa para trás, para
descrever o que ela era como indivíduo, chegamos a uma encarnação anterior,
cerca do terceiro ou quarto século, depois de Cristo, na qual ela adquiriu certas
forças, das quais podemos dizer que, a civilização, sendo como era naquela
época, essas e outras capacidades semelhantes da alma, não pertenciam àquele
período. Não havia chegado o tempo em que, os talentos adquiridos pela alma
desse indivíduo, pudessem ser usados. Ele nasceu de novo, numa nova vida,
tornou-se um dos nossos membros e morreu, antes que a primeira metade de
sua vida, a parte ascendente, tivesse sido completada.
Nesse caso, podemos ver imediatamente, estudando toda a conexão entre o físico
e o espiritual, que essa pessoa era um dos mais importantes e significativos
trabalhadores entre nós, em todo o nosso trabalho cósmico.
O materialismo é galopante em nossos tempos; ele coloca sua marca na vida
terrena, mais do que imaginamos. Em nossos dias particularmente, o
materialismo é tão forte, que os Seres das Hierarquias superiores, cuja tarefa é
levar adiante o progresso da evolução Cósmica, na verdade, não podem resgatar
todas as almas, que hoje se tornaram materialistas.
Estas não devem ser deixadas para trás, elas devem ser salvas; contudo, sua
salvação só pode ser alcançada pela morte de certas almas em tenra idade, que
levam consigo, para o mundo espiritual, as forças que, de outra forma, teriam
sido usadas no curso de sua vida terrena e que elas então transmutam, para que
elas possam ajudar os Seres das Hierarquias superiores, que estão trabalhando
pela redenção das almas materialistas. Pessoas que morreram cedo na vida, são
uma ajuda maravilhosa para os Seres Superiores. Agora, no caso da alma a que
me refiro, algo especial resultou. Trouxe com ela, em sua última encarnação, os
poderes que não podiam ser plenamente usados em sua vida anterior, derramou-
os, por assim dizer, em seu corpo, que ficou fraco e doente, por causa da
penetração dessas forças. A alma era poderosa demais para o corpo; ela,
realmente, continha grandes poderes. Esta pessoa morreu na idade precoce,
acima mencionada, e com as forças que, ao invés de serem enfraquecidas pela
idade, permaneceram em sua força juvenil, ela passou pelos portões da morte,
para o mundo espiritual, ainda possuindo o fundo de forças, que teria servido
para uma longa vida, naquela encarnação, e preenchida até transbordar com a
força terrena, teria se derramado no corpo, de modo a trazer o mesmo, para o
relacionamento com o mundo externo. Ao invés disso, ela foi capaz de levar
ideias espirituais com entusiasmo e, assim, levar um grande suprimento para o
mundo espiritual. Quando rastreamos essa pessoa, que era querida por um
grande número de nossos amigos, pudemos aprender muito com ela.
80

O que vemos nela é que, num tempo definido (neste caso, no terceiro ou quarto
século d.C.), certas forças apareceram no caminho da evolução humana, que não
puderam ser realizadas então, e que o trabalho a ser feito, através dessas forças,
deveria ser retomado mais tarde; temos que olhar para trás, para o que pertence
a um período anterior e foi preservado, por certos indivíduos, para uma vida
posterior. Agora, quando procuramos por essa pessoa, durante sua vida após a
morte, observamos resultados diretos - vemos que os poderes, que ficaram
adormecidos por um tempo, reservados para um período vindouro, agora
explodiram e estão se preparando para o futuro da humanidade.
Assim, vemos como uma vida posterior deve estar ligada a uma anterior, quando
se fala de evolução humana. Não poderíamos saber certas coisas, das quais se
pode dizer, que o que existiu na terceira e quarta épocas, teve que ser revivido
no quinto período pós-atlântico, a menos que pudéssemos ver nos mundos
espirituais e dizer: 'Lá vemos uma individualidade que, por meio de uma curta
vida na Terra, adquiriu faculdades, que brilham como o renascimento de algo,
que foi perdido para a vida humana”. Um grande influxo de força chega, ao
investigador espiritual, ao observar tais indivíduos em sua vida após a morte. Se
o tempo da vida física na Terra fosse tão ruim, se tantos inimigos surgissem
contra a Ciência Espiritual, e se houvesse perigo ameaçando de todos os lados,
certamente seria uma perspectiva triste e desesperada; mas há uma coisa, que
pode sempre ser um consolo para o futuro da Antroposofia, isto é, que naqueles
que morreram, da maneira acima mencionada, temos os melhores ajudantes
para a nossa Terra, os mais poderosos companheiros. Este é um caso, em que
uma curta vida na Terra serviu para a reunião de forças, com as quais houve a
posse de certas forças frutíferas, necessárias para um período posterior, no
caminho da evolução humana. Os sábios poderes cósmicos dominantes
superam, em sabedoria, tudo o que nós, com nossa sabedoria meramente
terrena, podemos compreender. Naturalmente, esses frutos de uma vida terrena
curta, só podem resultar quando a vida é encurtada, de uma maneira puramente
natural. Nos círculos antroposóficos, não é necessário mencionar, que tais
resultados não ocorrem em casos de suicídio e seriam completamente
impossíveis. Agora, tendo dito tudo isso, eu lhes darei outro exemplo concreto,
em referência a um membro, que não há muito passou em nosso meio, que tinha
uma doença muito longa, que estava conectada, de maneira notável, com sua
condição de alma, uma pessoa de intelecto vivaz, um poeta de renome em sua
vida terrena e, como podemos ver claramente, um indivíduo muito mais
importante do que tínhamos considerado, enquanto observávamos sua vida na
Terra. Depois de uma vida vivida na doença do corpo e longos anos de
sofrimento, após um período relativamente curto após sua morte, quão
estranhamente se revelaram no mundo espiritual os frutos do seu sofrimento na
Terra; embora apenas no começo. Para que eu possa fazer vocês entenderem o
que eu quero dizer, gostaria de levar ao conceito certo, por meio de uma
comparação. Com um sentimento profundo, podemos admirar a Natureza - uma
cena na Natureza ou um grupo de pessoas - e por esse motivo, não perdemos
nada, quando um artista inteligente aparece e descreve a cena, como sua própria
alma a vê. Então, encontramos, na imagem criada pelo artista, algo que ele
81

colocou, ao lado da Natureza. Saberemos o que ganhamos, por ter visto a


Natureza através da alma de outra pessoa, se pudermos observar a Natureza,
estando lado a lado com ela. Por que eu digo isso? Para fazer uso de uma
ilustração: podemos entrar no mundo espiritual, podemos observar as coisas
ali; contudo, é de grande importância, observar outra coisa, além disso.
A pessoa, a quem estou me referindo, que morreu depois de uma vida de muito
sofrimento na Terra, durante sua longa doença formou, para si, um mundo de
imaginações Cósmicas, por assim dizer, elevando-as de um corpo doente, que
gradualmente aproximava-se da morte. Na medida em que o corpo ficou mais
doente e incapacitado, surgiu daí o mundo das Imaginações Cósmicas. Essa
pessoa, então, passou pelos portões da morte e sua imaginação está começando
a brilhar, numa beleza maravilhosa, de modo que, no mundo espiritual, ela pode
ser percebida como uma maravilhosa obra espiritual de arte, como se fosse
criada a partir do Cosmos. Essas imaginações tiveram sua origem no corpo
doente e foram levadas, do corpo doente, para o mundo espiritual; e, para
aqueles que são capazes de ver os mundos espirituais de outras maneiras, elas
fornecem um ganho muito mais rico em conhecimento espiritual, do que pode
ser adquirido, pela observação espiritual direta; como numa obra de arte, vemos
o mundo como uma outra alma o vê, lado a lado com o que nós mesmos vemos. A
pessoa acima mencionada, absorveu concepções espirituais com grande
devoção, e foi até capaz de colocar em seus poemas, muito daquilo que vem à
alma humana, quando apreende o Mistério do Gólgota, de uma maneira
verdadeiramente antroposófica, quando nos permitimos ser impregnados com o
pensamento do Cristo, que aprendemos a conhecer através da
Antroposofia. Pois, então, nós O reconhecemos em nossa natureza, que nós
realmente vivemos de acordo com as palavras de Paulo, dizendo: "Não eu, mas
Cristo em mim contempla o Universo". Esses verdadeiros pensamentos cristão-
rosacruzes fluíram, nos últimos poemas dessa personalidade. Enquanto sua vida
terrena consciente estava ocupada com tal poesia e criando esses poemas, seus
poderes subconscientes estavam moldando este mundo de imaginações
cósmicas, que realmente consumiam o corpo, pela força de sua vida interior,
pois, o que assim atuava para essa pessoa no mundo espiritual, provavelmente
era atribuído à uma tarefa, sobre a qual não vou falar mais, agora.
Em qualquer caso, deve ser dito que, por trás dessa vida consciente está outra,
que passa pelos portões da morte e assim manifesta - já sabemos - o que já foi
preparado, durante a vida terrena, através da disposição, que é o resultado da
Ciência Espiritual e que transformaram-se em belos quadros de Imaginações
Cósmicas, que irradiam para a exploração do investigador espiritual e que
explica muito daquilo que, de outra forma, não teria sido tão fácil descobrir e que
continuará a atuar na tarefa, que será atribuída á tal indivíduo. Devemos
considerar tais resultados da Ciência Espiritual com admiração e profunda
reverência. Pois, se em tempos passados, o senso religioso da alma tinha que ser
despertado, através do sentimento, nos tempos em que vivemos agora, a
espiritualidade deve ser acesa, mais e mais no homem, através da interação dos
mundos físico e espiritual, devemos nos tornar cada vez mais concretos, em
nossa vida espiritual.
82

No futuro, a humanidade não pode ser impedida de buscar o espiritual de


maneira concreta e de pensar, em como um indivíduo humano continua a
trabalhar, após a morte, com as forças que, como neste caso, foram preparadas
antes de ele ter passado pelos portões da morte. Que profundidades serão
encontradas na vida humana, quão nobres serão os sentimentos com os quais
um ser humano se confrontará com outro Eu. Eles, no verdadeiro sentido da
palavra, serão morais e cheios da essência Divina, que, então, estará tecendo e
atuando na vida humana, quando os pensamentos, que falam dos mortos, de
maneira tão concreta, como falamos agora dos vivos, encontrarem um lar nos
corações dos homens. Devemos pensar em tudo isso, para que possamos ganhar,
em nossos corações e almas, um senso adequado da missão e obra da
Antroposofia no futuro. Eu gostaria que vocês refletissem sobre as coisas que eu
disse na última parte desta palestra, considerando-as realmente originadas
daquela atitude, em relação à Ciência Espiritual, que só pode falar de tais
assuntos em modéstia sagrada e com profunda reverência e com este sentimento
eu gostaria de deixar, em suas almas, o que eu disse.
Amanhã falarei de outros fatos, para a estimulação da Ciência Espiritual em seus
corações.

*************
83

PALESTRA II

Kassel, 10 de maio de 1914.

Ontem, falamos da relação do mundo espiritual com o mundo físico,


conforme expresso pelos fatos reais que, em certo sentido, trabalham de um
mundo para o outro, na medida em que a relação entre eles significa algo
para a vida no mundo físico, na medida em que o preenchimento da alma
com sentimentos e emoções, adquiridos através do conhecimento espiritual,
é essencial e significativo para a vida humana. Algo, de natureza geral, deve
agora ser adicionado. Aqui no mundo físico, adquirimos nossas ideias,
através de nossas percepções sensoriais, através dos sentimentos e emoções,
experimentados quando os eventos da vida física nos tocam.
Nossa vida consciente, no mundo físico, surge de todas essas coisas e,
quando observamos essa vida no mundo físico, parece, à visão do
investigador espiritual que, em geral, quanto mais essa consciência serve ao
plano físico, menos são suas chances de experiências espirituais, no mundo
espiritual que nos rodeia. Podemos dizer: quanto mais o homem se limita à
sua vida de ideias e sentimentos, permitindo que estes sejam despertados,
apenas, pelo plano físico, menos força e poder interior ele possuirá, para
ganhar um relacionamento real com o mundo espiritual.
É claro que, a princípio, uma pessoa não percebe, que a confiança em ideias
meramente físicas é um obstáculo ao ganho de um relacionamento com o
mundo espiritual; mas ele é obrigado a notar isso, quando ele passa pelos
portões da morte; pois, se durante a vida terrena o homem não ganhou
concepções, além das excitações e exigências do plano físico, sua alma será
fraca demais, para se adaptar às experiências do mundo espiritual.
Isso pode ser facilmente percebido, quando nos lembramos de que, tudo o
que nos excita no plano físico, realmente nos assombra e nos aproxima, de
tal maneira, que nos permitimos ser cativados por ele.
Porque nos permitimos ser assim cativados, porque nos rendemos mais ou
menos à sua influência, desenvolvemos muito pouco poder, em nossas
almas, para o mundo espiritual significar mais para nós, do que um fraco
mundo sonhador, no qual não podemos nos mexer, nem nos movimentar.
Para podermos nos mover livremente nesse mundo, algo mais é necessário:
a alma deve estar interiormente viva, ter desenvolvido, dentro de si mesma,
por seus próprios esforços, forças para as quais não tinha sido incitada
externamente e para o que ela não permaneceu meramente passiva.
Das profundezas de nossas almas tais concepções, tais sentimentos devem
surgir, sem qualquer incitamento do mundo externo, - por mais bonito que
possamos considerar que o mundo seja. Eu posso dizer: Concepções e
sentimentos, que surgem livremente na alma podem, por si sós, torná-la
forte o suficiente, para estabelecer seu próprio relacionamento com o mundo
espiritual - uma relação que ela precisa. Para que vocês possam entender
isso corretamente, gostaria de me referir a algo que é correto, embora pareça
um paradoxo.
84

Pensem em uma pessoa cedendo inteiramente às seduções do plano físico.


Ela pensa e sente apenas aquilo que é despertado pelo plano físico.
Tal pessoa é fraca no mundo espiritual; quando ela entrar no mundo
espiritual, após a morte, ela poderá, através de seus próprios poderes, olhar
apenas, para a riqueza da vida espiritual ao seu redor, ela não poderá trazer
os Seres para perto dela, embora ela precise muito deles.
O intercurso espiritual com eles ilude-a. Não que o mundo espiritual esteja
ausente, mas ela não pode encontrar as pistas, que a levariam a um
relacionamento direto com ele. Falando paradoxalmente, uma pessoa, que
só desperta ideias e sentimentos fantásticos em sua alma, que, embora não
sejam despertados de fora, não se elevam acima do mundo dos sentidos -
essa pessoa, que imagina as ideias de uma forma fantasiosa, produz forças
em sua alma, que dão um desenvolvimento ascendente gratuito, e ela, em
certo sentido, acha a vida no mundo espiritual mais fácil, do que aquela que
não pensa, de forma alguma, sobre coisas espirituais.
É muito significativo que tenhamos que privilegiar aqueles visionários, que
formam concepções que nada têm a ver com as realidades exteriores dos
sentidos e são, apenas, fantasiosos; no entanto, eles permanecem mais
firmes no mundo espiritual, do que aqueles que nunca pensaram nele.
Naturalmente, tais ideias fantásticas, embora ajudem um homem a
permanecer firmemente no mundo espiritual, apenas o levam a estranhas
condições e relações espirituais, como um homem experimentaria no mundo
físico, se seus sentidos não estivessem funcionando adequadamente.
Todos os Seres inferiores grotescos, inúteis para a vida espiritual, chegariam
à pessoa, que formou tais conceitos fantásticos; enquanto tudo que é
progressista e útil na vida espiritual, apareceria, diante de sua alma, em
forma distorcida, se tivesse sido preparada para a vida espiritual por
concepções fantásticas. Antigamente, antes de o Mistério do Gólgota tomar
o seu lugar na evolução humana, as condições eram tais, que os Seres
humanos só podiam ter concepções despertadas neles, do plano físico; até
mesmo aquelas ideias, que apareceram como concepções clarividentes,
foram despertadas no corpo físico. Essa é a parte curiosa da antiga
clarividência da humanidade; essa clarividência, essas ideias plásticas
simbólicas, embora totalmente relacionadas ao mundo espiritual, foram
despertadas através das influências do plano físico. De modo que, se as
pessoas tivessem se dedicado, apenas, ao tipo de concepções, que
alcançaram o nível da clarividência antiga, elas estariam na posição de Seres
humanos, que olham para o mundo espiritual, por meio de concepções
fantásticas. Para que a humanidade pudesse ter uma visão saudável do
mundo espiritual e desenvolvesse as relações corretas com ele, os vários
fundadores das religiões apareceram, na antiguidade, Laotze, Zaratustra,
Krishna, Buda, etc. Estes foram grandes benfeitores da humanidade.
Eles apareceram para suas épocas e para os seus povos, falando-lhes destes
segredos dos mundos espirituais e, assim falando destes segredos, de uma
maneira inspirada por impulsos imediatos, que lhes vinham, como Iniciados
e fundadores da religião, do próprio mundo espiritual.
85

Através de suas poderosas autoridades, eles influenciaram os povos, aos


quais eles tinham uma missão espiritual. Assim, o povo não recebeu em suas
almas, apenas o que veio à ele e o moveu no plano físico, mas também o que
foi enviado, como uma mensagem, dos mundos espirituais. Esses povos
antigos tinham a capacidade de perceber e sentir, quando tais fundadores da
religião apareciam para eles - ou quando um de seus sucessores e discípulos
aparecia; eles percebiam o sopro da vida espiritual, que fluía através da alma
de tal fundador, fluindo das alturas espirituais para a evolução do povo e da
época. Assim, para os povos da antiguidade foram dados pensamentos e
sentimentos, que eram colocados em suas almas, pelos fundadores da
religião, mas que tinham que ser despertados, novamente, por cada Ser
humano (porque cada um estava sob a influência da autoridade do mestre),
cada um tinha que trazê-los para a vida ativa, em sua própria alma.
Dessa forma, surgiram condições e relacionamentos saudáveis para os Seres
humanos nos mundos espirituais e, também, a possibilidade de saber onde
eles estariam, depois de terem passado pelos portões da morte; de possuir
as forças que não podem ser encontradas no mundo físico externo, mas
devem ser despertadas na alma do próprio indivíduo; de possuir aquelas
forças, que permitem ao homem viver no mundo espiritual, assim como por
suas forças físicas, ele é capaz de viver no mundo físico.
Desde o Mistério do Gólgota, muitas mudanças ocorreram para a
humanidade, a esse respeito. Este é, precisamente, o significado do Mistério
do Gólgota; fechar a velha época da evolução humana e começar a nova.
Podemos dizer, que a velha evolução teve que ser baseada na autoridade,
como acabamos de descrever; sobre a autoridade dos fundadores das
religiões. Mas, porque essas almas (nossas próprias almas), em encarnações
anteriores, passaram pela escola da autoridade, elas se tornaram
responsáveis ou se tornaram maiores de idade, digamos; de modo que agora,
nas encarnações, que seguiram seu curso desde o Mistério do Gólgota, esses
impulsos, que anteriormente deviam ser recebidos por autoridade, são agora
recebidos internamente. Agora, não apenas as concepções são formadas
internamente, mas também nossos impulsos vêm de dentro.
É isso que as palavras de São Paulo significam: "Não eu, mas Cristo em
mim"; esse é o significado do Mistério do Gólgota.
O impulso de Cristo fluiu para a substância espiritual da Terra e vive em cada
alma. As almas humanas devem aprender a entender esse impulso de Cristo,
que deve ser encontrado nelas. A humanidade chegou "na maioridade".
Impulsos, que antes tinham que vir de fora, agora devem surgir dentro.
Por essa razão, Cristo veio à Terra. Maior e maior deve tornar-se nossa
compreensão deste Cristo. O que nós coletamos de nosso conhecimento
antroposófico, o que nós tentamos entender sobre a evolução do mundo e da
humanidade, sobre os mundos superiores e as Hierarquias desses mundos,
realmente nos leva, no fim, a entender mais e mais o Impulso-Cristo, que
está dentro de nós, mas que também pode permanecer oculto dentro de nós,
assim como muitas outras coisas, que não tentamos entender ou
experimentar.
86

Em certo sentido, a Ciência Espiritual é um meio de alcançar o que deve ser


alcançado - de realmente encontrar, em nossas almas, aquilo que é a Luz da
Vida, o calor interior da vida; aquela Luz e Calor, que conduzirão a
humanidade ao seu lar espiritual e que é revelado na alma.
Na evolução futura, as almas humanas gradualmente perceberão, que é
muito simples falar de uma ideia abstrata do "Deus interior", se a alma muito
for muito tranquila para se preocupar com a compreensão dos ensinamentos
da Ciência Espiritual. Como nós, hoje, consideramos o mundo espiritual em
sua realidade? Tudo o que tem sido escrito sobre a Ciência Espiritual, sobre
Saturno, Sol e Lua, as épocas evolutivas da Terra, sobre as Hierarquias
Celestiais e sobre tudo o que o investigador espiritual conhece e diz, sobre o
mundo espiritual, tudo isso ele finalmente percebe ser um presente para ele,
através do impulso de Cristo, que entrou na evolução da Terra.
Ele percebe esse Impulso de Cristo de tal maneira, que ele vê a verdade das
palavras de Cristo, "Eu estarei sempre com vocês, até o fim do período da
Terra." Não somente no início de nossa época Cristo disse isso; se nós,
abrirmos nossas almas para Ele, Ele estará dizendo agora, aqui, e em nossa
Ciência Espiritual, aquilo que devemos tentar espalhar por todo o mundo.
Portanto, é muito necessário, que as almas atuais entendam que a Ciência
Espiritual é, para o nosso tempo, o caminho adequado e o caminho certo,
para os mundos espirituais. A humanidade, tendo chegado "à maioridade"
deve desenvolver, conscientemente, pensamentos e sentimentos, deve
buscar, passo a passo, por seus próprios poderes e não por autoridade
externa, entrar nos mundos espirituais. Cristo veio ao mundo, para que a
humanidade possa fazer isso. Embora muitos afirmem hoje, que a Ciência
Espiritual deve ser acreditada porque é ensinada pelo investigador espiritual
- isso não é verdade. Se alguém acha que deve acreditar no que a Ciência
Espiritual diz, sem compreendê-la, pelos esforços de suas próprias
faculdades da alma, isso apenas mostra, que ele não pôs de lado os
preconceitos de seu pensamento materialista. Qualquer um que, com uma
mente verdadeiramente aberta, se aproxima dos mais ousados
ensinamentos da Antroposofia, pode compreendê-los e alcançá-los. As
almas não passaram por suas encarnações anteriores, em vão; elas podem
encontrar, dentro de si mesmas, a linguagem espiritual interior, com a qual
entendem o que os pesquisadores espirituais dizem. É claro que, se essas
almas permitirem que suas mentes se tornem nebulosas, como são hoje, não
por uma verdadeira Ciência Natural, mas por uma visão equivocada da
Natureza, se elas permitirem que, névoa sobre névoa se acumule diante de
seus olhos espirituais e digam: Nós não entendemos a Antroposofia,
devemos acreditar, apenas, em suas afirmações, isso não significa que a
Antroposofia não possa, realmente, ser entendida, pois acontece que, nesse
caso, as pessoas criam seus próprios obstáculos para ela. Vivemos numa
época, em que a maioria das pessoas nunca percebe, quantos obstáculos
existem e como esses obstáculos podem bloquear seu caminho; mas nós
também estamos vivendo em um Século que, inconscientemente, a partir de
sua força da alma ainda caótica, se ergue em revolta contra esses obstáculos,
87

quando surgem anseios nas almas dos homens, por uma compreensão dos
mundos espirituais. Realmente, é de grande importância o trabalho
realizado pela Ciência Natural, durante os últimos Séculos e nossos amigos
sabem, com que frequência eu enfatizo o grande significado dos triunfos da
Ciência Natural, e como eu comparo o presente e o futuro trabalho da
Antroposofia, com o que a Ciência Natural descobriu, especialmente durante
o século XIX; mas devemos ter em mente, que essa Ciência Natural se tornou
muito mais dogmática, que as antigas religiões. Hoje, as pessoas - e
principalmente aquelas que adotam a Ciência Natural como amadores -
aderem aos dogmas, com mais rigidez e seriedade do que nos velhos dogmas
religiosos. Verdadeiramente, as visões copernicanas representavam um
grande balanço do pêndulo; elas tinham que vir, eram um passo em direção
à verdade, como eu sempre disse; mas, elas também são, em muitos
aspectos, unilaterais e devem ser completadas por uma concepção espiritual
do Universo. Se elas forem mantidas dogmaticamente, como estão sendo
expressas, se for dito que elas são absolutamente verdadeiras, então elas
forçarão conceitos nas almas dos homens, o que os impedirá de
compreender e apreender a Ciência Espiritual. Até agora, podemos ver os
efeitos dessas asserções dogmáticas. Em nossa atual época de educação
compulsória, as crianças são ensinadas, desde os seus primeiros anos, a
imaginar o Sol, com a Terra girando em torno dele, também os Planetas,
assim como alguém forma uma imaginação, se estiver diante de um modelo.
Mas ninguém tem o direito de imaginá-lo assim, como se essas coisas fossem
certezas absolutas; como se alguém fosse capaz de colocar uma cadeira no
Espaço Cósmico, sentar-se e, a partir dele, observar os movimentos do Sol,
da Terra e Planetas, como se olha para um modelo que se configura na sala
de aula. Nas almas dessas crianças, é despertada a consciência, de que os
fatos realmente são assim. As pessoas ficam maravilhadas, quando falamos
desses assuntos. Outras coisas também são experimentadas hoje, que são
falsas, quando vistas sob outra luz. Durante os últimos dias, um homem,
aparentemente muito ambicioso, me enviou um panfleto.
Nada deve ser dito aqui sobre se seu conteúdo era certo ou errado, mas este
panfleto é uma prova, entre muitas outras, da maneira pela qual a alma
humana se revolta contra o dogmatismo da Ciência Natural do século
passado; pois este escritor tenta provar, matematicamente, que a Terra é
plana, não redonda. É claro que essa afirmação parece muito absurda em
nossa época, e naturalmente vocês dirão: 'Mas um homem pode facilmente
navegar pelo mundo, portanto, o homem, que diz que a Terra é plana e não
redonda, deve ser um tolo”. No entanto, o homem que escreveu o panfleto,
sabia disso. Não precisamos concordar com ele, mas ele sabia disso e de
muitas outras objeções válidas, asseguro-lhes. Por tudo isto, estou apenas
tentando mostrar, que em nossos dias, as almas já estão começando a se
levantar em revolta contra todas as coisas dogmáticas da Ciência Natural,
que foram empilhadas em suas almas, desde a mais tenra infância e que as
impedem de exercer o livre julgamento, que é necessário para o
reconhecimento de verdades antroposóficas.
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Quando a humanidade se libertar do dogma, então - sim, então, chegará o


tempo em que poderemos falar de conhecimento científico-espiritual e será
dito; eu vejo que não poderia ser de outra forma. Vocês veem, muito do que
é paradoxal deve ser dito agora, ao falar da relação da Ciência Espiritual com
a nossa Era. No entanto, a Ciência Espiritual, gradualmente, tem fluído para
as almas humanas, de modo que elas possam se tornar fatores, cada vez
maiores, na civilização espiritual da humanidade, à medida que ela progride
para o futuro. A própria Antroposofia poderá fortalecê-las, para que essas
almas sejam capazes de encontrar suas ligações com o mundo espiritual.
A Ciência Espiritual será bem acolhida pelos Seres humanos, será
gradualmente recebida pelos mais jovens e eles saberão: “Ao meu redor não
estão apenas montanhas, rios, nuvens, estrelas, Sol, Lua, Planetas, animais
e minerais, mas também Seres espirituais, Seres das Hierarquias superiores
e até mesmo eventos espirituais, - como nós temos, ao nosso redor, eventos
e processos físicos. Tenho relacionamento com processos espirituais e
físicos”. Deixem-me imaginar algumas coisas, que gradualmente serão mais
compreendidas pelas almas humanas, quando a Ciência Espiritual se tornar
um fator vivo na alma do homem. Ao falar dessas coisas, devemos começar
com fatos concretos da pesquisa espiritual, pois eles mostram melhor, a
relação do homem com o mundo espiritual. Conheço um homem que, no
vigésimo terceiro ou vigésimo quarto ano, teve uma espécie de visão.
Ele escreveu sobre essa visão de uma maneira desajeitada, podemos até
dizer, estupidamente. A visão era esta: ele colocou, numa espécie de cena,
muito desajeitadamente, os espíritos mais importantes do período
intelectual alemão, dos Séculos XVIII e XIX; ele não sabia por que organizou
tanto - tudo o que Goethe, Lessing, Schiller, Herder estavam fazendo - mas
estavam fazendo, depois que já tinham passado para o mundo, no qual um
Ser humano entra, após a morte. Assim, ele teve uma visão desses grandes
homens, que viviam no mundo espiritual; ele viu, em sua visão, o que eles
estavam fazendo, agora. Como Cientistas Espirituais, devemos perguntar: 'O
que tal visão significa? O que isso nos mostra? Mostra a alma como tendo
sido bastante permeada por certas influências do mundo espiritual, elas o
pressionam e se tornam, por assim dizer, um grande sonho, que se expressa
de tal maneira, que a alma enxerga, em visão, embora indistintamente, seus
próprios sentimentos e impressões interiores. Influências atuam na alma, a
partir do mundo espiritual. Como elas funcionam? Qual é a real relação da
alma humana com os Seres do mundo espiritual? - pois mesmo os mortos,
são Seres no mundo espiritual, durante o período entre a morte e um novo
nascimento. O que é esse relacionamento?
Bem, nós vemos um objeto no mundo físico, se olharmos para ele - essa é a
expressão correta a ser usada; eu vejo a rosa, vejo a mesa.
No entanto, não é correto falar da mesma maneira, quando se refere a Seres
espirituais. Não está correto. A expressão não é bem precisa, se dissermos:
vejo um Ser pertencente às fileiras dos Anjos ou Arcanjos.
A expressão não está correta; deve ser colocado de uma maneira diferente.
89

Assim que um Ser humano entra no mundo espiritual e lá tem sentimentos


e experiências, ao invés de ver os Seres lá, os Seres é que olham para ele; ele
está ciente deles. Ele sente a calma e suave influência de seus sentidos e
forças espirituais, que iluminam e ressoam em sua própria alma.
E, do mundo espiritual, devemos dizer realmente: 'Não sou eu que vejo ou
percebo, mas sei que sou visto, que sou percebido'.
Vocês podem sentir a mudança da experiência indicada aqui? Quando, ao
invés de usar as palavras como no mundo físico: "Eu percebo alguma coisa",
as outras palavras recebem um significado: "Colocado como estou no mundo
espiritual, que agora é minha vida, sou percebido por todos os lados".
O Eu sabe desse “sendo percebido”, desse “ser levado pelas experiências, que
outros Seres têm com ele”. Quando essa mudança acontece, vocês têm uma
noção da relação diferente, que a alma tem com o meio ambiente, quando se
eleva do mundo físico para o espiritual. Então, vocês perceberão, que a
experiência de uma alma é diferente, quando passa do mundo físico, para o
mundo espiritual. Uma parte da tarefa dada aos mortos é voltar seus olhares
para a Terra, em direção aos que ainda estão vivos; para que eles possam,
com suas forças espirituais, observá-los; que, aqueles que ainda vivem na
Terra possam ser percebidos, pelas almas dos mortos. A humanidade
aprenderá, através da Ciência Espiritual, o significado das palavras:
“Aqueles que passaram pelos portões da morte me veem; eles mandam suas
forças para mim”. Então, os Seres humanos aprenderão a falar dos mortos,
como vivos, como espiritualmente vivos. Aquele que teve a visão descrita,
percebeu essa relação, embora muito vagamente – pois, realmente, Lessing,
Goethe, Schiller, Herder não ficaram inativos após a morte; no espiritual,
eles se ocupam daqueles, que ainda estão na Terra; eles os observam,
percebem, estimulam, de acordo com a medida das forças, que recebem das
Hierarquias superiores. Assim, o homem, que teve essa visão, sentiu, sem
estar consciente do sentimento, que era vigiado pelos espíritos que haviam
sido enviados, para ajudar na evolução da humanidade.
Isto pode não ter sido claro, mas se expressou na visão que ele colocou,
então, em palavras estranhas, dizendo que Lessing "como um marechal, no
mundo espiritual, foi o primeiro", seguido por Goethe, Schiller e Herder,
liderando e guiando seus sucessores, que estavam vivendo na Terra.
Quando tal visão, surgindo de maneira caótica e como num sonho, se
apresenta claramente à alma, pode significar algo para o sonhador; pode
significar, por exemplo, que sua consciência seja diretamente despertada, do
mundo espiritual, para que ela possa elevar-se ao pensamento: "O que eu
digo e faço, vou dizer e fazer, para que eu possa suportar os mortos, olhando
para mim". Também pode acontecer, que uma pessoa que vive na Terra, que
é interiormente despertada por uma visão similar, sinta alguma tarefa diante
dela, seja pequena ou grande, e seu poder, coragem e energia serão
fortalecidos, sua consciência se tornará mais fácil, quando chegar à
conclusão certa e imaginar: "Os mortos estão me ajudando, observando-
me". Assim, os mortos podem ajudar os vivos?
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Através da Antroposofia aprendemos a sentir a responsabilidade de nossas


ações, em relação aos mortos e também podemos ter o sentimento feliz:
“Enquanto estou fazendo isto ou aquilo, meu amigo morto, com seu poder
ativo, está me observando e sua força é adicionada à minha.”
Não que ele nos dê a força - a qual nós mesmos devemos desenvolver; ele
não nos dá nossas faculdades, aquelas que já devemos possuir; mas ele é
uma ajuda real, como se estivesse de pé, atrás de nós. Ele realmente fica lá.
Darei um exemplo concreto: pois, depois de termos mantido, durante tanto
tempo, este trabalho antroposófico, poderemos apresentar tais
exemplos; talvez eles pareçam pessoais, mas querem ser bastante
impessoais, estabelecem apenas fatos e podem, por essa razão, ser
mencionados como exemplos. Em Munique, tentamos, por muitos anos,
apresentar os Dramas de Mistérios e, assim, organizar as cenas em que a
força espiritual poderia fluir, através delas, para esse lado do nosso
Movimento. Estou consciente de que, de qualquer forma, as coisas
realmente essenciais, que foram feitas, aquelas que realmente importavam,
estavam em completo acordo com o mundo espiritual. Repetidamente, fui
ao meu trabalho naqueles dias, quando as peças estavam sendo preparadas
para o palco, com uma consciência definida. No início de nossa atividade
antroposófica, quando éramos uma Sociedade muito pequena, havia uma
pessoa, entre nós, que estava muito entusiasmada com a Ciência
Espiritual; uma pessoa que, além de trabalhar com entusiasmo silencioso
em tudo o que poderia ser feito no início, no que diz respeito à Antroposofia,
introduziu, em toda a sua gestão, uma compreensão e interesse
maravilhosamente belos e artísticos. Ela era uma pessoa, que unia grande
gentileza de ação pessoal, com grande seriedade em suas visões espirituais.
Ela foi logo tirada de nós, do plano físico. Ela, não apenas permaneceu -
como geralmente é chamado - "para nunca ser esquecida" por nós, mas ela
se tornou o que um indivíduo humano pode se tornar, que, por força das
circunstâncias, só é capaz de concretizar no mundo espiritual, o que na vida
física foi tão bem preparado e começou aqui, com muitos poderes latentes,
os quais ela é capaz, agora, de desenvolver no mundo espiritual.
Muitos anos podem ser assim gastos e muitos anos se passaram neste caso,
até que foi desenvolvida a possibilidade, como se fosse de uma espécie de
condição de crisálida, para essa pessoa se ligar ao que estava germinando,
aqui no mundo físico. Como se através do destino, aconteceu que ela entrou
no mundo espiritual numa vida livre, uma vida que adquiriu esse
maravilhoso poder de trabalho, justamente quando tivemos que empreender
nossa encenação, quando o carma nos levou a esse ponto. É claro que
tivemos que trazer nossos próprios poderes e faculdades espirituais para o
trabalho, mas, não importa quão fortes sejam os poderes espirituais à nossa
disposição, devemos trazer nossas habilidades físicas para atuar, quando
temos tarefas físicas para realizar, de modo que, forças do mundo espiritual
intervêm, quando temos trabalho espiritual a fazer.
Ajuda espiritual, apoio espiritual deve vir para nós; ele vem, também, para
aqueles que não podem ver nos mundos espirituais, embora estejam
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inconscientes disso, pois sempre estamos sendo influenciados e ajudados


pelo mundo espiritual. No caso de que falo, é fato que sempre tive a
consciência de que a individualidade, à qual me refiro, estava vigiando e nos
ajudando. Sentimos esse olhar, como uma força de fortalecimento; como um
acendimento de calor em nossas almas, nos capacitando a realizar nossa
tarefa. Assim, devemos descrever a maneira pela qual os mundos espirituais
e os Seres, que neles vivem - entre os quais estão nossos mortos - trabalham
conosco no mundo físico e quão verdadeira é a declaração: “Somos
percebidos no mundo espiritual, por aqueles que desenvolveram conexões
conosco”. Chegará um momento, em que a vida humana será enriquecida,
através de eventos como indicamos, quando não possuirmos, em nossas
mentes, imagens meramente memorizadas dos nossos amigos mortos, mas
os sentirmos como verdadeiros ajudantes, em nossos empreendimentos.
As almas dos nossos mortos viverão, então, em nossa consciência, a
consciência do Ser humano na Terra; embora possa parecer, que a relação é
cortada pela morte. Podemos entender que agora isso é possível, apenas
para poucos e podemos entender o porquê. É porque o desenvolvimento
científico-espiritual está apenas no começo; ainda não produziu, nas almas,
as capacidades e poderes que podem agir livremente. O caminho para tais
concepções, como mencionei, pode ser o seguinte: certamente será assim
para muitas almas no futuro. Podemos pensar nos mortos, durante o nosso
trabalho diário, aqui na Terra. Nós podemos despertar em nossas almas,
todo o amor que temos por eles e, certamente um dia, chegará o momento,
não precisa ser uma visão - verdadeiramente não precisa ser uma visão – em
que teremos a impressão: “Sim, aquele que morreu está me ajudando, como
se estivesse trabalhando com minhas mãos e dedos, como se despertasse
meu ardor pelo trabalho. Eu sinto sua força dentro de mim”.
Esse sentimento claro, de que as influências espirituais operam dos mundos
espirituais é um fruto, um verdadeiro fruto vivo, que chega às almas, através
da Ciência Espiritual. Agora, vamos pensar no grande enriquecimento que
virá às vidas humanas, quando os Seres humanos não estiverem apenas
conscientes do que é revelado aos seus sentidos, mas também terão a
consciência impressa neles (não necessariamente em visão) em todos os seus
trabalhos e empreendimentos físicos: “Enquanto você está ocupado e
trabalhando, este ou aquele querido, que tinha sido seu ajudante ou seu
protetor na vida, protege você, ainda ajuda você, através de poderes, que ele
não possuía em sua vida física, mas para os quais ele só podia se preparar
aqui, para poder exercitá-los no mundo espiritual”.
Realmente, assim como nossa saúde física é renovada, quando inalamos o ar
fresco da manhã, assim as almas humanas se sentirão refrescadas para sua
vida espiritual, respirando na ajuda protetora e serão capazes de perceber e
sentir chegando o olhar dirigido à elas, pelos Seres dos mundos espirituais.
Estamos olhando para um futuro da humanidade, que deve ser preparado
pelo cultivo da Ciência Espiritual e que será muito mais rico, do que a vida
atual do homem.
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O homem, portanto, precisará desse enriquecimento do mundo espiritual -


pois não dissemos que a velha clarividência sonhadora da antiguidade foi
estimulada no corpo físico -, mas o corpo físico mudou. Agora, ele é apenas
adequado, para dar aos seres humanos, seus pensamentos físicos,
pensamentos despertados no plano físico. Precisamos adquirir pensamentos
sobre o mundo espiritual, através da Ciência Espiritual. Cada vez menos
haverá o conhecimento dos mundos espirituais, que podem ser obtidos pelo
homem a partir do plano físico, o corpo físico se tornará mais impotente; e
como tudo o que é físico se origina no espiritual, o anseio da alma, por uma
real conexão com o mundo espiritual, se tornará cada vez maior. Nos tempos
antigos, foi dado algo ao homem, pela sua natureza física, que brilhou em
sua alma, por assim dizer, pelo funcionamento de seu corpo físico, de modo
que ele se tornou clarividente. Agora, podemos dizer: chegou o tempo em
que os Seres humanos gradualmente conhecerão mais as coisas espirituais e
estas devem ser, cada vez, mais trazidas dos mundos espirituais, mas a
transição não deve passar despercebida. Devemos adquirir conhecimento do
caminho, que conduz ao mundo espiritual, através da Antroposofia.
Não devemos fugir das dificuldades e inconveniências, que uma alma pode
sentir, quando busca, passo a passo o conhecimento do que acontece nos
mundos espirituais. Talvez seja muito desconfortável sobrecarregar nosso
intelecto, nossos poderes de razão, nosso senso de verdade; mas devemos
enfrentar esse inconveniente. O Movimento antroposófico, ao qual
pertencemos, existe para isso. Gradualmente a Antroposofia deve nos levar
a ver: por suas repetidas vidas terrenas, as almas humanas estão avançando,
estão sendo transformadas; e estamos vivendo na Era, em que os Seres
humanos devem entrar nos mundos espirituais, com compreensão.
Não seria correto se, em nossa Sociedade, em particular, não houvesse uma
compreensão crescente do fato de que um homem que, sem ter
experimentado a Ciência Espiritual, ainda tem os velhos poderes
clarividentes, surgidos de seu corpo, não pode permanecer acima de alguém
que, com ideias intelectuais e compreensão, aprende o que pode ser
comunicado sobre os mundos espirituais. Os Seres humanos são tão
facilmente enganados, levados por seu senso de facilidade, para não tentar
exercer a atividade de sua alma, para não forçar seus poderes de percepção
e observação. Naturalmente, estes devem ser exercidos, se quisermos viver
no espírito da Antroposofia, mas a humanidade é tentada a não fazer esses
esforços. Portanto, as pessoas são gradualmente forçadas a valorizar mais as
forças mentais e psíquicas, que surgem como se fossem do corpo,
estimuladas pelas forças corporais ocultas. De fato, podemos realmente
ouvir as pessoas dizerem: “O que você está tentando tornar compreensível
sobre os mundos espirituais, não é o que realmente estamos procurando,
não estamos impressionados com isso; queremos experimentar o
incompreensível”. As pessoas estão muito mais inclinadas a aceitar o que
não pode ser entendido, do que a se esforçar para buscar, o que pode ser
compreendido espiritualmente.
93

Então, isso leva ao fato de que existe, o que podemos chamar de um completo
equívoco, da verdadeira tarefa espiritual do presente; se alguém se
apresentar possuindo poderes psíquicos naturais, sem treinamento
antroposófico, as pessoas dizem que ele é muito maravilhoso e elas colocam
um halo especial em volta de sua cabeça. Porque, elas dizem, nós não
sabemos de onde vêm seus poderes, porque ele não foi treinado através da
Ciência Espiritual e não fez esforços, portanto, seus poderes são muito
valiosos; outro mundo se torna evidente em nosso mundo, através dele.
Verdadeiramente, nosso Movimento não alcançaria seu objetivo, se não
superasse logo esse preconceito. Muitas vezes ouvimos dizer: Este ou aquele
homem deve ser a reencarnação de um grande indivíduo; ele deve ter sido
assim e assim, porque ele possui essas forças, essas forças psíquicas caóticas,
sem ter trabalhado por elas na vida presente, por meio da vida de uma alma
lutadora, realmente ativa. Ao invés disso, devemos ter certeza de que o
homem, que revela tais forças psíquicas, dentro de si mesmo, é uma alma
atrasada; alguém que permaneceu para trás, num estágio anterior de
evolução e que deve ser criado e nutrido na época atual, através da Ciência
Espiritual. Aqueles, que tiveram as encarnações mais importantes nos
tempos antigos, parecem hoje, mais como um dos quais estaremos falando
amanhã, no aniversário da morte de Christian Morgenstern, como tendo
poderes que, infelizmente, são menos valorizados por muitos, do que o são
os de um tipo de psiquismo caótico, pois que são frutos de forças espirituais
muito mais elevadas, ainda que hoje sejam representadas como de pouco
valor, porque não são compreendidas. Nestas duas palestras, tentei, em
parte, a partir de fatos concretos, colocar diante de vocês uma imagem da
interpenetração do mundo espiritual no físico e o funcionamento do mundo
físico, no espiritual. Eu tentei mostrar para vocês, como é injustificável as
pessoas dizerem, que é inútil se preocupar com o mundo espiritual,
enquanto viverem no plano físico. Eu tentei mostrar, que a razão pela qual
nossa vida física não pode ser entendida, consiste em que não estamos
conscientes da interação concreta do mundo espiritual, em nosso mundo
físico. Não que recebamos nosso conhecimento apenas do mundo espiritual
- esse não é o ponto; este conhecimento tem que estar lá, devemos torná-lo
nosso, porque é a verdade revelada a nós, a partir dos mundos espirituais e
é a chave para a compreensão e a experiência do mundo.
Esse conhecimento deve, no entanto, levar-nos a um estado interior, a um
sentimento interior, a uma espécie de “conhecer-se dentro do mundo
espiritual”. Então, através da nova Ciência Espiritual, entrará em nossas
almas o que um espírito tão importante como Fichte disse e que mencionei
numa conferência pública e repetirei aqui. Nas nossas almas entra aquilo
que Fichte não podia fazer mais do que sugerir. Sei que falo no mesmo
sentido que ele fez, quando acrescento algumas palavras às suas, para a
compreensão do que ele ainda trabalha, dos mundos espirituais.
Assim disse o grande filósofo Johann Gottlieb Fichte, durante sua vida
terrena: “O supraterrestre não virá à mim somente quando eu tenha perdido
minha conexão com a vida terrena. Mesmo agora, eu vivo no mundo
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suprassensível, nele vivo uma vida mais verdadeira do que no mundo dos
sentidos, é o meu único ponto de vista firme; e porque possuo o mundo
suprassensível, eu possuo aquilo pelo qual eu gostaria de continuar minha
vida na Terra”. "O que vocês chamam de Paraíso", diz Fichte, "não fica
apenas do outro lado do túmulo. Está em toda parte à nossa volta na
Natureza e surge em todo coração amoroso”.
“Agora”, nós entendemos o que Fichte quer dizer, quando ele nos fala do
mundo espiritual. A Antroposofia, como floresce nesta época e se tornará um
germe dentro da humanidade, será a luz, que fortalecerá os sentimentos e
emoções para a vida espiritual, que brotará em todo coração amoroso.
O coração amoroso irá gerar, cada vez mais, anseios pelo mundo espiritual,
e a Antroposofia terá, cada vez mais, que exigir essa luz do mundo espiritual
para sua própria posse. Ao dizer isso, certamente estamos falando de acordo
com aqueles que morreram antes de nós, que ansiavam pelo mundo
espiritual. Enquanto nos elevamos a esse mundo, estamos verdadeiramente
em harmonia com a Sabedoria Cósmica, que governa a evolução humana, na
medida em que podemos entendê-la e reconhecê-la com nossos poderes
humanos.

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