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1.No dt administrativo sancionatório as sanções assessórias nunca são automáticas


e a legalidade da sua aplicação deve obedecer aos princípios que conformam a
sanção principal. A competência para aplicação das sanções cabe aos órgãos da adm,
constituindo em primeira linha reserva da função adm, sendo o seu fundamento a
adopção de uma conduta que por acção ou omissão provoca uma infracção às leis e
regulamentos adm ou que se traduz no incumprimento de uma medida adm obrigatória.
Quanto ao seu conteúdo as sanções classificam-se em principais ou acessórias e o seu
controlo judicial da legalidade é atribuído aos tribunais adm, excepto no caso das contra
ordenações em que a competência pertence, em geral, aos Tjudiciais ou a jurisdições
especializadas.
As sanções acessórias nunca são de aplicação automática, pressupondo sempre
que haja uma sanção principal e um juízo autónomo da autoridade administrativa. Por
exemplo, nos termos da lei, o facto ilícito diz se contra ordenação por ser sancionado
com uma coima, e eventualmente com sanções acessórias. Pode também suceder que
um facto constitua uma contra ordenação e não ser sancionado com uma coima,
bastando para isso que o mesmo facto constitua simultaneamente crime, sendo o autor
punido com sanção criminal mas sem prejuízo da aplicação de sanções acessórias
previstas para a contra ordenação concretamente cometida. Ou seja, à sanção contra
ordenacional pode cumular-se sanções acessórias – a título de exemplo – a apreensão
dos objectos pertencentes ao agente que tenham sido utilizados na prática da infracção;
ou a privação do direito a subsídios outorgados por entidades ou serviços públicos (art.
99 RJUE. Mais exemplos que estão contemplados no art. 21 RGCO são a privação do
direito de participar em feiras ou mercados e o encerramento do estabelecimento cujo
funcionamento esteja sujeito a autorização ou licença de autoridade adm.
Estas sanções acessórias nunca se aplicam automaticamente, pois na aplicação
destas tem de se ter em conta um princípio fundamental que as rege: o P. da não
automaticidade, ficando sempre dependentes da gravidade da infracção e da culpa do
agente. Para além destes princípios estão também subjacentes às sanções acessórias
outros princípios como o P. da tipicidade (a criação de uma nova sanção acessória só
pode ser feita por AR ou por DL autorizado do governo); o P. da acessoriedade (a
sanção acessória está sempre dependente da aplicação de uma sanção principal) e ao P.
da proporcionalidade (a determinação concreta depende sempre da gravidade objectiva
do facto e do grau de culpa – dolo ou negligência do agente).
2. O princípio da legalidade assume uma dupla relevância no Dt. Administrativo
sancionatório – substantiva e procedimental. Diz-nos o art. 3 do CPA que «os órgãos
da administração pública devem actuar em obediência à lei e ao direito», sendo que o P.
da Legalidade é um dos principais corolários do Dt adm sancionatório. No ilícito contra
ordenacional por exemplo, vigora o P da legalidade no sentido que lhe pretende ser
conferido pelo art. 43 RGCO (- o processo das contra ordenações obedecerá ao P. da
Legalidade). Este P apresenta-se pois com diversas dimensões : a legalidade na vertente
substantiva – tipicidade das sanções e dos respectivos pressupostos; a legalidade na
vertente procedimental – conjunto de actos, formalidades e de fases cuja observância
depende a legalidade da aplicação da decisão sancionatória; e a legalidade na vertente
orgânica – competencial, vigorando neste aspecto o princípio regra da reserva das
competências das autoridades administrativas como resulta do art.33 RGCO.
Mas o âmbito e intensidade do P. da legalidade que vincula as autoridades adm
na fase adm de aplicação de sanções contra ordenacionais são bem mais amplos do que
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se possa pensar, nomeadamente no plano jurídico constitucional. Efectivamente o art.1


RGCO fornece uma noção legal/formal de contra ordenação mas será também
importante ressalvar, à luz do princípio da legalidade o que deverá entender-se por «tipo
legal» no dt contra ordenacional. A partir do art. 29 nº1 CRP e nº2 do RGCO
constatamos que cabe à lei a definição das contra ordenações e o estabelecimento das
respectivas sanções. Mas cabe perguntar se o P. da Legalidade tal como daqui resulta é
extensivo nesses exactos termos ao dt de mera ordenação social. É seguro dizer que tem
havido uma progressiva autonomização do dt de mera ordenação social relativamente so
dt penal e ao processo penal. Em primeiro lugar a constituição prevê uma disciplina
autónoma para o dt contra ordenacional, e por outro lado, o facto de não constituírem
sanções privativas da liberdade, permite compreender que a concreta tipificação de
contra ordenações e das respectivas coimas não estejam integradas na reserva relativa de
competência legislativa da AR. A CRP atribui competência legislativa concorrente à
AR, ao governo e às assembleias legislativas das regiões autónomas para a criação de
contra ordenações. A diferenciação do regime entre o princípio da legalidade na
vertente criminal e a vertente das meras contra ordenações sociais é explicada pelo TC
com fundamento numa distinção qualificativa entre os ilícitos e as sanções penais e
contra ordenacionais, através do critério da relevância ético social - « a contra
ordenação é um aliud que se diferencia qualitativamente do crime na medida em que o
respectivo ilícito e as reacções que lhe cabem não são directamente fundamentáveis
num plano ético jurídico, não estando portanto sujeitos aos princípios e corolários do dt
criminal».

3. O princípio da proporcionalidade conforma transversalmente o dt adm


sancionatório, nas suas dimensões substantivas e procedimentais. O P. da
proporcionalidade constitui o mais apurado parâmetro de controlo da actuação
administrativa ao abrigo da margem de decisão (art. 266/2, art.18/2 e art.19/4 CRP) e
tem 3 dimensões: adequação (proibindo a adopção de condutas administrativas inaptas
para a prossecução do fim que concretamente visam atingir); necessidade (proíbe a
adopção de condutas administrativas que não sejam indispensáveis para a prossecução
do fim de visem atingir); e a razoabilidade (proibindo que os custos da actuação
administrativa escolhida como meio de prosseguir um determinado fim seja
manifestamente superior aos benefícios que sejam de esperar da sua utilização). Perante
a preterição de uma destas dimensões não vale sequer a pena observar as demais pois
para que uma actuação adm não seja desproporcional ela não pode ser nem inadequada,
nem desnecessária nem desrazoável. Apesar do art.5/2 CPA configurar o P. da
proporcionalidade apenas com alcance subjectivo, deve entender se, por força do
art.266/2 CRP que ele assume igualmente uma dimensão objectiva, valendo assim para
todas as decisões adm, incluindo o dt adm sancionatório.
É sensato dizer que o dt. Administrativo sancionatório constitui uma progressiva
cisão entre o dt penal e o dt adm, tendo este características de um e de outro. A
necessidade e a proporcionalidade das penas já contida no art. 8 da declaração dos dts
do Homem e do cidadão de 1789 e no art. 8 da declaração universal do dts do Homem
traduzem se neste âmbito sancionados em critérios de graduação das sanções. A
adequação depende de factores como a intencionalidade, a reiteração, a prejudicialidade
ou prejuízos causados e danosidade, a reincidência e a necessidade de motivação das
decisões dentro de uma dosimetria legislativa fixada. A determinação da sanção
principal e das sanções acessórias aplicáveis ao caso em concreto faz se, nos termos do
art. 405º em função da ilicitude concreta do facto e da culpa do agente, dos benefícios
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obtidos e das exigências de prevenção, tendo ainda em conta a natureza singular ou


colectiva do agente e a situação económica e conduta anterior do agente.

4. Os direitos de audiência e de defesa do arguido constituem uma exigência


inderrogável em todos os procedimentos administrativos sancionatórios. Estes dois
direitos abordados pela questão são direitos inalienáveis de qualquer arguido e é a
própria constituição a estatuí-lo no art. 32/10, e ainda que esta protecção constitucional
não existisse, poderíamos extrair tal protecção das normas encarregues de reger a
impugnação jurisdicional de actos administrativos. Ao serem consideradas decisões
administrativas, as decisões sancionatórias já gozariam de uma ampla tutela
jurisdicional efectiva, decorrente do art.268/4 CRP. É de salientar que a protecção
constitucional decorrente da aplicação subsidiária das garantias da defesa em processo
penal não as abrange em toda a sua plenitude. No entanto, não se deve legitimar uma
interpretação demasiado restritiva do nº 10 do art.32 CRP, na qual se conclua que os
particulares apenas gozam de um direito de defesa e de um direito de audiência durante
a fase processual de impugnação de decisões sancionatórias. Ao invés disso, o modo
amplo como a CRP consagrou um dt fundamental à tutela jurisdicional efectiva
(art.268/4) não deixa de garantir um leque bem extensível de prerrogativas processuais
às quais o legislador não pode furtar-se.
Em processo de contra ordenação os direitos de audição e defesa são garantias
processuais, isto é, estão configurados como situações jurídicas merecedoras de tutela
constitucional traduzindo se no reconhecimento dos meios processuais adequados à
protecção de direitos do arguido. Na sua plenitude o processo de contra ordenação pode
contemplar entre nós duas grandes fases: uma primeira fase organicamente
administrativa obrigatória e uma segunda fase judicial facultativa. Esta primeira fase
comporta em regra três grandes momentos: da notícia da infracção até à defesa do
arguido; a instrução subsequente e a decisão final do processo. O direito de audição é
uma manifestação primária do direito de defesa, enquanto o dt de defesa por seu turno
constitui uma manifestação da dinâmica da eventual atribuição de responsabilidade.
O principio da audição e da defesa representam o equilíbrio entre o principio do
inquisitório e do contraditório. O direito de audição e defesa do arguido como «direitos
do arguido» ou do «estatuto do arguido» podem encontrar se no art. 50º RGCO - «não é
permitida a aplicação de uma coima ou de uma sanção acessória sem antes se ter
assegurado ao arguido a possibilidade de num prazo razoável se pronunciar sobre a
contra ordenação que lhe é imputada e sobre a sanção ou sanções em que incorre».
Confere-se assim ao participante no procedimento sancionatório o poder de influir,
através da sua audição e defesa, no decurso desse procedimento. É portanto um direito
que se desdobra em dois: no direito do arguido ser ouvido num certo momento ou numa
cerra fase da tramitação do procedimento de contra ordenação e o direito a defender-se
ante actos processuais determinados ou específicos, igualmente em função da
tramitação do procedimento de contra ordenação. Conforme referi supra, também a
CRP plasma estas garantias - «nos processos de contra ordenação bem como em
quaisquer processos sancionatórios, são assegurados aos arguidos os direitos de
audiência e defesa». Para os processos disciplinares da da função pública também estão
asseguradas estas garantias - « em processo disciplinar são garantidas ao arguido a sua
audiência e defesa» - art.269 CRP.
Não é apenas o arguido que tem o direito de ser ouvido, mas também o seu
defensor, como estipula o art.53 RGCO. A consequência da inobservância do P. da
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audição e da defesa é a nulidade da decisão sancionatória por força do art.161/2 CPA.


Em todo o caso esta é sanável segundo a jurisprudência do STJ e do TC com base na
aplicação do regime do CP.

5. O código de procedimento administrativo também é, ou pode ser, aplicável aos


procedimentos administrativos sancionatórios. Importa em primeiro lugar esclarecer
que nem o CPA de 1991 nem o novo CPA incluíram um capítulo onde se estabelece-se
um regime geral dedicado aos procedimentos administrativos sancionatórios, pelo
menos com um catálogo de princípios vocacionados para a actividade sancionatória da
administração. As razoes que estão por detrás disto têm contribuído cada vez mais para
uma autonomização do direito sancionatório da administração, em especial do dt de
mera ordenação social relativamente ao processo penal e ao st penal. Em primeiro lugar
a actividade sancionatória expressa hoje uma função normal e vasta da administração.
Em segundo lugar a decisão adm sancionatória é conceitualmente um acto
administrativo e em terceiro lugar a decisão sancionatória projecta, não raras vezes,
momentos que relevam da discricionariedade administrativa, a envolver inevitáveis
juízos de avaliação próprios da administração. Por estes motivos, na ausência de uma lei
geral sobre a actividade sancionatória da adm e constituindo o CPA o código geral da
actividade administrativa, justificava-se a inclusão de um capítulo autónomo dedicado à
actividade sancionatória da adm, em que, entre outros aspectos se estabelecessem
alguns princípios regra como a relevância do P. da legalidade em matéria sancionatória,
o estatuto dos sujeitos procedimentais, etc. Ainda que esta ausência seja profundamente
notada, a aplicação do CPA é relevante, ainda que a titulo subsidiário, a todos os
procedimentos da adm especialmente disciplinados, partindo da indicação normativa
prevista no nº5 do art. 2, ao determinar que « as disposições do presente código,
designadamente as garantias nele reconhecidas aos particulares, aplicam-se
subsidiariamente aos procedimentos adm especiais».
Assim sendo, na fase adm (e obrigatória) de aplicação de sanções adm, e
independentemente da natureza da sanção a aplicar, as garantias nele previstas serão
sempre (potencialmente) aplicáveis a toda e qualquer procedimento adm sancionatório.
mas as potencialidades de aplicação do regime do novo CPA aos procedimentos
sancionatórios vão ter de esgotar-se aos privilégios ou normas de garantia; pelo
contrário o seu âmbito de aplicação é – e tem de ser- necessariamente mais vasto,
mesmo que, por ventura, a disciplina sectorial se afigure tendencialmente esgotante na
relação que estabelecem. Equacionando a aplicação do regime do novo CPA à fase
administrativa de aplicação de sanções contra ordenacionais o nº1 do art. 41 RGCO
determina que o dt subsidiário da fase adm de aplicação deste tipo de sanções é o
previsto no CPP, ou seja, é o próprio RGCO a impor uma aplicação adaptada, não sendo
a sua aplicação automática. Ao vigorar o P. da legalidade e o P. da oficialidade, surge
neste contexto em primeira linha o art. 3/1 CPA dedicado ao P. da legalidade, bom
como os art.161/1/E e 163 CPA. Quanto à definição de competência das autoridades
administrativas e à delegação de poderes deve conjugar-se o RGCO com o CPA
(art.36/1 e 2). Assim a ilegalidade da decisão administrativa sancionatória por vícios de
incompetência deverá resultar do regime do CPA, bem como o regime de anulação
oficiosa administrativa de resultar também deste por força do art. 163 e ss. Sendo que o
procedimento adm tenha por objecto a aplicação de contra ordenações deve conferir-se
uma relevância autónoma ao P. do inquisitório que resulta directa ou subsidiariamente
do regime geral do CPA. Conforme demonstrado a aplicação do CPA mantém-se
extremamente relevante não só nos casos já mencionados, como em vários outros
aspectos, nomeadamente no P. da imparcialidade em sentido estrito (art.9 CPA),
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demonstrando que ainda que seja em conjugação com outros regimes, o CPA não pode
nem deve ser posto de parte.

6. No dt. Adm sancionatório vigora o P. da responsabilidade contra


ordenacional das pessoas colectivas. A corrente despenalizadora e de favor das
autoridades adm sectoriais tem mantido um dos grandes princípios penais de
individualização da sanção: o P. da pessoalidade e da culpa pelos ilícitos adm. A
aceitação da responsabilidade objectiva que sempre foi regra no dt adm, permitiu ainda
assim, aceitar com alguma tranquilidade a assunção da regra da resp das pessoas
colectivas (art.7 RGCO), princípio este aplicado desde 1991 ao direito sancionatório no
mercado de valores mobiliário e bancário – art.202º e 203º do regime das instituições
financeiras e 401º do CVMV. Foi precisamente no âmbito do dt económico e financeiro
que se tornou urgente estatuir a responsabilidade directa das pessoas colectivas, devido
à sua crescente dimensão e porque os ilícitos visam incrementar o património de uma
colectividade que utiliza um veículo societário com uma estrutura organizativa
totalmente opaca à pessoalidade individual dos actos. A admissibilidade da aplicação de
sanções adm a pessoas colectivas tb decorre de estas sanções não se encontrarem
ligadas a um juízo de censura ético jurídica.
Tal como no dt civil, pode haver mais do que um responsável pelo ilícito ou pelo
incumprimento para além do autor ou contraente, e assim se chega a um jogo de
imputação e co-responsabilidade organizatória. Assim, dissociando-se a resp da autoria
com a aceitação de um regime de solidariedade, comunhão ou subsidiariedade da resp
dos entes colectivos perante actos das pessoas singulares. A pessoa colectiva responde
solidariamente por acto do seu representante praticado no seu interesse ou para sua
vantagem… conforme o art.7/2RGCO e 401/2 e 406/1 CodVM. A pessoalidade
encontra-se reduzida em prol da eficiência que traduz a garantia da patrimonialidade da
sanção por um fundo comum. O actual Código também estatui no art.401/1 a resp das
pessoas colectivas. Um outro exemplo é o das contra ordenações ambientais, na qual os
administradores, gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto
funções de adm em pessoas colectivas, ainda que irregularmente constituídas, e outras
quaisquer entidades equiparadas são subsidiariamente responsáveis… (art.8 e art.11 da
lei das contra ordenações ambientais. A aplicação deste principio privatístico-comercial
da solidariedade é igualmente aceite pela generalidade dos ordenamentos. Concluímos
pois pela vigoração do princípio da resp contra ordenacional das pessoas colectivas do
dt adm sancionatório, ainda que estejam aqui subordinadas questões de oportunidade
dado que o pagamento extingue a responsabilidade.
7. O dt. Adm sancionatório abrange diversos tipos de ilícitos e diversos tipos
de sanções. A adm pública desenvolve uma missão de polícia e de ordenação social
visando proteger interesses gerais da colectividade. O bloco de fontes normativas que dá
pelo nome de dt sancionatório, em sentido bem amplo, tem de ser também qualificado
como dt público, ainda que este ramo do dt sancionatório seja considerado bastante
autónomo. Em suma, sempre que os poderes públicos actuam com vista a impor ónus,
encargos ou a exigir a sujeição de particulares a consequências jurídicas desfavoráveis,
decorrentes de comandos normativos públicos, com o intuito de sancionar uma prévia
conduta ilícita, podemos traçar uma linha com vários tipos de ilícitos e
consequentemente vários tipos de sanções.
Desta forma podemos dizer que há dois grandes tipos de ilícito: o ilícito adm em
sentido estrito e o ilícito contra ordenacional. A actividade sancionatória exercida no
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âmbito do sentido estrito pressupõe a violação de específicos deveres emergentes ou,


pelo menos, relacionados com uma relação jurídica adm constituída por acto adm ou por
contrato. Dentro da actividade sancionatória exercida no âmbito do ilícito
administrativo em sentido estrito encontramos o ilícito disciplinar, o ilícito contratual e
o ilícito por incumprimento de obrigações impostas por acto adm. Nos ilícitos
disciplinares está em geral em causa um conjunto de relações que envolve a observância
de deveres de disciplina inerentes às designadas relações especiais de dt. Adm. As
sanções para este tipo de ilícito são sanções disciplinares como a advertência, a multa, a
suspensão ou interdição profissional, aplicadas no âmbito do exercício de uma profissão
publica ou publicamente regulada (como é o caso dos trabalhadores em funções
públicas, profissionais regulados por associações públicas, etc) e do relacionamento
com um estabelecimento público (por exemplo alunos de uma escola pública). Em
relação ao ilícito contratual, este tem como objecto punir comportamentos de
particulares adoptados fora quer de um ambiente de direito disciplinar, quer do direito
de mera ordenação social. As medidas sancionatórias no âmbito de relações emergentes
de contrato adm traduzem se na aplicação de multas contratuais, sequestro de concessão
e na resolução sancionatória de contrato incluindo aqui o resgate de concessões. Por
fim, relativamente ao ilícito por incumprimento de obrigações impostas por acto adm
(ou resultantes directamente da lei, mas a pressupor a pratica de um acto adm) as
sanções impostas são a revogação sanção, e a caducidade sanção de autorizações adm, a
expropriação sanção e a venda forçada de bens, sendo que as duas primeiras nem
sempre são fáceis de distinguir.
Já no âmbito do ilícito adm contra ordenacional, este tem geralmente como
fundamento a violação de normas jurídicas que prescrevem imposições e proibições de
condutas a adoptar pelos particulares com o objectivo da prevenção e do controlo de
perigos ou que de qualquer modo determinam uma ordenação da vida em sociedade. As
sanções previstas para este tipo de ilícito são as sanções pecuniárias (sanção principal)
sob a forma de coima, que podem por sua vez vir acompanhadas de sanções acessórias
que nunca podem ser de aplicação automática. Um exemplo de uma sanção acessória
pode ser o encerramento de estabelecimento. O controlo judicial da legalidade dos actos
sancionatórios é atribuído aos Tribunais adm, excepto no caso das contra ordenações,
em que a competência cabe em geral aos TJudiciais ou a jurisdições especializadas.

1.O princípio da proibição da reformatio in pejus assume uma dimensão


estruturante de regime geral do dt adm sancionatório contra ordenacional, mas os
desvios a este principio são cada vez mais amplos. O P. da reformatio in pejus
(reforma para pior) é um P. administrativamente atenuado. Para além de outros
ordenamentos como Alemanha, Áustria e Espanha, em Portugal este P vigora e o juiz
não se pode, ou não deve, separar-se totalmente da decisão adm já proferida. Ainda
assim, modernamente tem vindo a ser defendida a possibilidade de o tribunal agravar as
decisões administrativas condenatórias em sede de recurso, sendo assim um desvio a um
princípio estruturante do dt adm sancionatório contra ordenacional e do dt adm em
geral. Afasta-se assim o princípio da reformatio in pejus das decisões condenatórias, das
garantias inerentes à tutela jurisdicional efectiva.
Esta tendência teve reflexos no direito de mera ordenação social cujo regime viu
ser lhe aditado um art.72 A, permitindo a reformatio in pejus de forma de forma
limitada para o caso da «melhor fortuna» - demonstrando que o arguido teve entretanto
uma melhoria da sua situação económica. Com a ideia pré feita de que a proibição da
reformatio in pejus convida ao recurso também o CodVM afasta no art.416/8 a
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proibição da reformatio in pejus. Outro desvio está previsto no art.75º ETAF - «não é
aplicável aos processos de contra ordenação instaurados e decididos nos termos desta lei
a proibição da reformatio in pejus, bem como também a autoridade da concorrência no
art.8 do seu regime estipula que «o T da concorrência, regulação e
supervisão......podendo reduzir ou agravar a coima». Em prol da reformatio no sector
financeiro afirma-se que no recurso judicial tem lugar um novo contraditório em que as
partes têm ocasião de se defender e de produzir prova que é livremente apreciada e
valorada pelo juiz, e a tutela judicial efectiva deve permitir ao tribunal um juízo directo
e completo. Mesmo o TC no acórdão 373/2015 concluiu que não havia razões jurídico-
constitucionais para sancionar com juízo de inconstitucionalidade a excepção ao P geral
da proibição da reformatio in pejus previsto no artigo referido supra.
O actual regime implica assim uma maior eficácia para as decisões da adm, mas
por outro lado uma diminuição das garantias da tutela jurisdicional efectiva. Alem disso
se este P visa evitar um prejuízo pessoal ou patrimonial de quem recorre das decisões,
ao permitir este tipo de desvios vai criar um risco acrescido no exercício do seu dt
fundamental à tutela jurisdicional efectiva – art.18 CRP.
2.Alguns regimes sancionatórios gozam do poder de transaccionar a aplicação de
sanções administrativas contra ordenacionais. O contrato de transacção encontra-se
previsto no cod civil no art.1248 como aquele contrato «pelo qual as partes previnem ou
terminam um litígio mediante recíprocas concessões». A transacção judicial encontra-se
expressamente prevista no CPTA como meio de extinção da instância. O contrato de
transacção extra judicial não se encontra expressamente previsto no CPA (art.178 e ss).
Ao ser um contrato/negócio em que as partes podem dispor de uma situação jurídica, a
sua aceitação nem sempre foi fácil. A sua delimitação é feita pelo P da legalidade e pelo
P da proporcionalidade, podendo dizer-se que não podem ser contrários à ordem
jurídica, à ordem pública e ao interesse publico. A possibilidade da transacção afasta-se
no caso de haver conflitos de interesses ou quando lese interesses ou dts de terceiros. A
crescente aceitação da possibilidade de transacção no âmbito do dt administrativo
sancionatório é um afloramento do P da oportunidade.
Encontramos vários exemplos em que o legislador possibilita que o
sancionamento dos supervisionados seja substituído por uma posterior conduta
regulatoriamente determinada. Por exemplo nos art.223 do regime das instituições
financeiras faculta se ao banco de Portugal a suspensão total ou parcial da execução de
uma sanção condicionada ao cumprimento de certas obrigações, designadamente as
consideradas necessárias para a regularização de situações ilegais, a reparação de danos
ou a prevenção de perigos. Podemos encontrar um regime idêntico relativamente à
ANACOM e à ERSE. Também a autoridade da concorrência permite este contrato,
tanto na fase de inquérito (art.22 da lei 19/2012) como na fase de instrução (art.27º) –
depois de receber a proposta de transacção do visado, a autoridade da concorrência
procedo à sua avaliação, podendo rejeitá-la por decisão não susceptível de recurso, ou
aceitá-la procedendo à minuta da transacção. Em suma a autoridade da concorrência
goza de habilitação legal para diversas alternativas decisórias, quer na fase de inquérito
quer na fase da instrução e assiste-se ao alargamento do âmbito normativo dos tipos
legais sancionatórios (art.68º - contra ordenações).
3.Os regimes do direito sancionatório da regulação das actividades económicas
confirmam que o efeito suspensivo resultante da impugnação judicial da decisão
administrativa de aplicação de sanções fica (praticamente) reduzido ao RGCO. As
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sanções regulatórias derivam em parte da liberalização e privatização da actividade


económica e dos antigos serviços públicos. A intenção é ter uma economia de mercado
regulada. Existem no nosso ordenamento varias entidades reguladoras como por
exemplo CMVM, a autoridade da concorrência, a ANACOM, a ERSE, etc (art.3/3 da
lei quadro das entidades reguladoras independentes). A lei quadro estabelece um regime
geral e harmonizador para as entidades reguladoras, mas é importante esclarecer que
não abrange todas as entidades reguladoras nacionais, ficando expressamente excluídas
duas delas – o banco de Portugal (com funções de regulação bancária) e a Entidade
reguladora para a comunicação social, que se regem por legislação própria. No seu art.
40, a lei quadro das entidades reguladoras independentes especifica que compete às
entidades reguladoras no exercício dos seus poderes….; ao passo que no art. 43 estipula
os seus poderes sancionatórios. As sanções regulatórias gozam de grande extensão e
intensidade, para as quais se criou uma jurisprudência especializada – o tribunal da
concorrência, regulação e supervisão.
Apesar do RGCO ser de aplicação subsidiaria, os diferentes regimes das
entidades de regulação fogem, em diversas vezes ao que é estipulado pelo RGCO,
nomeadamente no que respeita à impugnação judicial das decisões adm.
No caso do Banco de Portugal como entidade reguladora, apesar de este se reger
por legislação própria, também o RGCO é aplicado a título subsidiário, conforme
estipula o art 232º do Regime das instituições financeiras. Ora nos termos do art.55 do
RGCO as decisões administrativas são susceptíveis de impugnação judicial e nos termos
do artº 59 “a decisão da autoridade administrativa que aplica uma coima e susceptível
de impugnação judicial”. O que importa ressalvar e que neste caso o efeito da
impugnação e um desvio a regra geral do efeito suspensivo do RGCO, pois conforme o
artigo 228 A da lei supra referida, o recurso da impugnação de decisões proferidas pelo
banco de Portugal só tem efeito suspensivo…” enquanto que nos termos do artª408 Nª1
do código de processo penal que se aplica de forma subsidiaria, a impugnação das
decisões, das autoridades administrativas que apliquem sanções contra ordenacionais
tem efeito suspensivo. Praticamente nos mesmos termos, também a impugnação das
decisões sancionatórias da autoridade da concorrência tem um efeito meramente
devolutivo, fugindo também da regra geral dos efeitos suspensivos do RGCP (art.84/ 4
da lei da concorrência).

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