Você está na página 1de 5

Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso

PJe - Processo Judicial Eletrônico

10/03/2022

Número: 0011106-94.2016.8.11.0040
Classe: EMBARGOS À EXECUÇÃO
Órgão julgador: 3ª VARA CÍVEL DE SORRISO
Última distribuição : 09/12/2016
Processo referência: 00111069420168110040
Assuntos: Espécies de Contratos
Segredo de justiça? NÃO
Justiça gratuita? NÃO
Pedido de liminar ou antecipação de tutela? NÃO
Partes Procurador/Terceiro vinculado
CARMO KLASENER (AUTOR(A)) JARBAS LINDOMAR ROSA (ADVOGADO(A))
KARINA KASSIEEN SUZIN (ADVOGADO(A))
ARMINDO SCHRADER (REU) MARCELO FRAGA DE MELLO (ADVOGADO(A))
ROGERIO FERREIRA DA SILVA (ADVOGADO(A))
MÁRCIA RODRIGUES MELO FERREIRA (ADVOGADO(A))
MARCIA BEATRIZ SCHRADER (REU) MÁRCIA RODRIGUES MELO FERREIRA (ADVOGADO(A))
ROGERIO FERREIRA DA SILVA (ADVOGADO(A))
Documentos
Id. Data da Documento Tipo
Assinatura
75295 11/02/2022 14:57 Sentença Sentença
156
ESTADO DE MATO GROSSO
PODER JUDICIÁRIO
3ª VARA CÍVEL DE SORRISO

SENTENÇA

Processo: 0011106-94.2016.8.11.0040.

AUTOR(A): CARMO KLASENER

REU: ARMINDO SCHRADER, MARCIA BEATRIZ SCHRADER

VISTOS.

CARMO KLASENER ajuizou EMBARGOS À EXECUÇÃO em face de ARMINDO


SCHRADER, sucedido por MARCIA BEATRIZ SCHRADER, todos qualificados nos autos,
alegando que não adimpliu as duas últimas parcelas do contrato objeto da execução em razão do
descumprimento, por parte do embargado, de obrigações assumidas no contrato, uma vez que a
parte embargada não outorgou as escrituras públicas de posse e de compra e venda que
deveriam ter-lhe sido outorgadas em 30/12/2001 e 30/07/2004, respectivamente, nos termos das
cláusulas quarta e quinta do contrato, pelo que aduz a ocorrência de exceção de contrato não
cumprido. Aduz que a oitava parcela do contrato foi atingida pela prescrição, uma vez que a
execução foi ajuizada em 31/03/2010 e o vencimento da obrigação se deu em 30/03/2005.
Requer, ao fim, a procedência.

Os embargos foram recebidos no efeito devolutivo (Id 56764946 – págs. 57/61).


Impugnação aos embargos em Id 56764946 (págs. 72/84).
Réplica à impugnação em Id 56764946 (págs. 91/101).

Instadas a especificarem as provas que pretendiam produzir, o embargante pugnou pela

Assinado eletronicamente por: JORGE HASSIB IBRAHIM - 11/02/2022 14:57:23 Num. 75295156 - Pág. 1
https://pje.tjmt.jus.br:443/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=22031017505740500000000000000
produção de prova testemunhal (Id 56764946 – pág. 102) e a parte embargada pugnou pela
prova testemunhal e depoimento pessoal (Id 56764946 – págs. 103/104).
Decisão de saneamento em Id 56764946 (pág. 105).

Em audiência de instrução realizada em 23/11/2018, foi colhido o depoimento pessoal do


embargante e ouvida a testemunha Sadi Tirloni Id 56764946 (págs. 120/121). A testemunha Ivo
foi ouvida através de carta precatória (Id 56764946 – pág. 150).

Alegações finais do embargante em Id 56764946, reiterando os termos iniciais (pág.


153/165).

Instada, a parte embargada não apresentou alegações finais.


Os autos foram migrados para o PJE no dia 27/05/2021 (Id 56718401).
O embargante manifestou-se em Id 57354137 e Id 70890350, reiterando o pedido de
julgamento procedente.

Vieram-me os autos conclusos.

É O RELATÓRIO. DECIDO.
I – PRELIMIANAR – PRESCRIÇÃO.

Inicialmente, em que pese realizado o saneamento do feito em momento anterior,


observo que resta pendente de análise a preliminar de prescrição suscitada pelo embargante.

Sem delongas, não prospera a alegação de prescrição da oitava parcela do contrato


particular de compromisso de compra e venda objeto da execução. Isso porque a execução foi
ajuizada no dia 30/03/2005, conforme comprovante de protocolo da inicial executiva extraído da
pág. 2 do Id 56874863 (autos 0001495-30.2010.8.11.0040).

Isto é, a execução foi proposta no dia do vencimento da oitava parcela, de modo que,
restando ainda outras parcelas em aberto, não há que falar em prescrição de uma parcela única,
sendo cediço que o termo inicial da prescrição para a execução de contrato com prestações
sucessivas é a data do vencimento da última parcela, a qual, no presente caso, estava prevista
para o dia 30/07/2005. Nesse sentido:

“AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - EMBARGOS À


EXECUÇÃO - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO.
INSURGÊNCIA DA PARTE EMBARGANTE. 1. Não há falar em ofensa ao art. 1.022 do
CPC/15 quando o Tribunal a quo soluciona a controvérsia tal como lhe fora apresentada,
com fundamentação adequada, embora de forma contrária aos interesses da parte. 2. O
vencimento antecipado da dívida, haja vista o inadimplemento do devedor, não
altera o termo inicial para contagem do prazo prescricional que, no caso, é o dia do
vencimento da última parcela. Incidência da Súmula 83/STJ. 3. Agravo interno
desprovido”. (AgInt no AREsp 1515218/DF, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA
TURMA, julgado em 21/11/2019, DJe 27/11/2019)

Assim, rejeito a preliminar de prescrição.


II – MÉRITO.
De início, registro que é incontroverso nos autos o inadimplemento do contrato objeto da
execução, tendo a própria parte embargante confessado estar inadimplente na inicial.
Para justificar o inadimplemento, o embargante suscita a exceção de contrato não
cumprido (exceptio non adimpleti contractus), ao argumento de que deixou de pagar as últimas
parcelas do contrato em razão de a parte embargada não ter outorgado as escrituras públicas de
posse e de compra e venda previstas para lhe serem outorgadas em 30/12/2001 e 30/07/2004,
respectivamente.
De sua vez, a parte embargada alega que o inadimplemento do embargante não pode ser

Assinado eletronicamente por: JORGE HASSIB IBRAHIM - 11/02/2022 14:57:23 Num. 75295156 - Pág. 2
https://pje.tjmt.jus.br:443/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=22031017505740500000000000000
amparado pela exceção de contrato não cumprido, eis que tal previsão legal somente pode incidir
quando as obrigações contratuais são recíprocas e quando há nexo de causalidade, aduzindo
que no contrato exequendo não restou estipulado que o pagamento das parcelas seria
condicionado à outorga das escrituras.

Isto é, a parte embargada não nega que detinha a obrigação contratual de outorgar as
escrituras públicas de posse e de compra e venda ao embargante.
Assim, apesar de alegar que há independência entre as obrigações assumidas entre as
partes, resta cristalino nos autos o descumprimento das obrigações assumidas pelo embargado
em momento anterior ao vencimento das parcelas oitava e nona do contrato, o que atrai a
incidência da exceção de contrato não cumprido, pois o embargando forçou o cumprimento das
parcelas vencidas sem antes, contudo, ter adimplido com sua parte do contrato, qual seja, a
outorga das escrituras públicas, conforme cláusulas quarta e quinta que assim dispõe,
respectivamente:
“CLÁUSULA QUARTA – Os PROMITENTES VENDEDORES outorgarão a escritura
pública de posse ao PROMOTINTE COMPRADOR ou quem este indicar até a data do dia 30 de
dezembro de 2001”.

“CLÁUSULA QUINTA – A escritura pública de venda e compra será outorgada pelos


PROMITENTES VENDEDORES ao PROMITENTE COMPRADOR ou a quem este indicar até a
data do dia 30.07.2004. (...)”.

Nesse cenário, observo que o embargado forçou o cumprimento da obrigação com


relação às parcelas oitava e nona incontroversamente inadimplidas pelo embargante, todavia,
sem adimplir as cláusulas quarta e quinta de sua obrigação. Logo, em se tratando de obrigações
mútuas, é aplicável o art. 476 do Código Civil, in verbis:

“Art. 476. Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua
obrigação, pode exigir o implemento da do outro”.

A hipótese encerrada no dispositivo legal acima institui a exceção de contrato não


cumprido, consistente numa maneira de assegurar que as obrigações recíprocas se mantenham
parelhas, de maneira que uma das partes só pode exigir o que lhe cabe se também cumprir o que
lhe compete.
O caso dos autos, porém, se assemelha mais a uma subespécie dessa exceção, que é a
exceptio non rite adimpleti contractus, aplicável a situações em que o descumprimento da
obrigação por uma das partes é apenas parcial, dando ensejo que a outra também se recuse a
cumprir in totum sua prestação.
Os institutos em questão tutelam apenas e tão somente a possibilidade de oposição ao
cumprimento total do contrato por uma das partes e na exata medida do que a parte adversa o
deixou de adimplir.
Com efeito, a exceção aqui analisada deve ser exercida, de maneira que, se o
embargante adimpliu 7 (sete) das 9 (nove) parcelas avençadas, tendo a oitava parcela vencido no
dia 30/03/2005 e a nona dia 30/07/2005, ou seja, depois da incontroversa inadimplência
perpetrada pela parte embargada, e se o embargado deixou de outorgar as escrituras públicas de
posse e de compra em venda previstas, respectivamente, para os dias 30/12/2001 e 30/07/2004
(cláusulas quarta e quinta), não fará jus o embargado ao adimplemento total do contrato.

Embora o embargado alegue a existência de independência entre as obrigações


assumidas pelas partes, em verdade há nexo de causalidade entre as cláusulas pactuadas e o
inadimplemento, pois este se deu por ambas as partes na medida de suas obrigações, ou seja,
há estrito elo entre o descumprimento contratual por parte do embargado e o inadimplemento
posterior por parte do embargante, que contava com o integral cumprimento do pactuado pelo
embargado.
Outrossim, não se pode deixar de levar em consideração os princípios da boa-fé objetiva
e da função social dos contratos, de modo que todos os contratantes devem velar por honrarem
seus compromissos sem perder de vista a necessidade de se manter aplainada as desigualdades
substanciais, o que não se revelou no caso em apreço, já que a parte embargada deveria ter

Assinado eletronicamente por: JORGE HASSIB IBRAHIM - 11/02/2022 14:57:23 Num. 75295156 - Pág. 3
https://pje.tjmt.jus.br:443/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=22031017505740500000000000000
outorgado as escrituras públicas de posse e de compra e venda anteriormente ao pagamento das
últimas parcelas por parte do embargante, sendo tais documentos viabilizadores de validade e
segurança ao negócio jurídico.
Nesse sentido:

“EXCEÇÃO DE CONTRATO NÃO CUMPRIDO. TEORIA APLICÁVEL. ART. 476 DO CC.


CONTRATOS BILATERAIS COM PRESTAÇÕES RECÍPROCAS. LAUDO DE
INSPEÇÃO, PORÉM, PRODUZIDO UNILATERALMENTE PELA AUTORA-
RECONVINTE LISTANDO DIVERSOS DEFEITOS CONSTATADOS NO IMÓVEL.
DOCUMENTO PRODUZIDO SEM O CRIVO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA
DEFESA. AUSÊNCIA DE OUTRA PROVA PARA COMPROVAR O ALEGADO.
DISPENSA, POR ELA, DA PERÍCIA. TESE AFASTADA. COBRANÇA DEVIDA.
SENTENÇA MANTIDA. Para possibilitar a arguição da exceção do contrato não
cumprido é necessário que o objeto da discussão seja um contrato bilateral com
obrigações recíprocas entre as partes, o que revela a necessidade de haverem
entre demandante e demandada prestações e contraprestações, com
inadimplemento anterior daquela contra quem é arguida tal teoria. Ausente a prova
da inexecução do contrato pelos demandantes, uma vez que não há como considerar o
laudo de inspeção produzido unilateralmente, já que foi produzido sem o crivo do
contraditório, assim, deve ser afastada a tese do contrato não cumprido e dos pedidos
formulados em reconvenção pela demandada”. (TJSC, Apelação Cível n. 0004781-
55.2011.8.24.0028, de Içara, rel. Gilberto Gomes de Oliveira, Terceira Câmara de Direito
Civil, j. 11-10-2016).

Portanto, concluo pelo reconhecimento da exceção de contrato não cumprido prevista no


art. 476 do Código Civil, pelo que a procedência dos embargos é medida que se impõe.

III – DISPOSITIVO.

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os presentes embargos à execução, com


resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil e, por
consequência, JULGO EXTINTA a execução 0001495-30.2010.8.11.0040.
Condeno a parte embargada ao pagamento de custas processuais e honorários
advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do
art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil.

Traslade-se cópia desta sentença para o feito principal (0001495-30.2010.8.11.0040).

Interposto recurso de apelação, dê-se vista à(s) parte(s) recorrida(s) para contrarrazões.
Após, independentemente de juízo de admissibilidade, REMETAM-SE os autos ao E. Tribunal de
Justiça, nos termos do art. 1.010, § 3º, do Código de Processo Civil.

Com o trânsito em julgado, aguarde-se a manifestação das partes pelo prazo de 15


(quinze) dias e, sem a qual, determino que sejam os autos remetidos ao ARQUIVO, com as
baixas e anotações necessárias.
PUBLIQUE-SE. INTIMEM-SE. CUMPRA-SE, expedindo o necessário.

Jorge Hassib Ibrahim


Juiz de Direito

Assinado eletronicamente por: JORGE HASSIB IBRAHIM - 11/02/2022 14:57:23 Num. 75295156 - Pág. 4
https://pje.tjmt.jus.br:443/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?x=22031017505740500000000000000

Você também pode gostar