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Moda: (Pre)texto descartável

Valquíria M. S. Santana – Aluna do Curso de Especialização em Artes Visuais: cultura e criação SENAC-
SE e:mail: val_mar_san@hotmail.com

A cada dia quando saímos de casa, passamos por vitrines e podemos ver o
quanto a moda é multi – ela cria, modifica, se reescreve. A moda está virando cada vez
mais uma imagem, um conceito, e a roupa propriamente dita é um artigo descartável,
não apenas pela pouca durabilidade, mas também pelas constantes mudanças de
tendências.
E algo que hoje é a ultima moda, daqui a um curto espaço de tempo já foi
ultrapassada. Então a moda é descartável?
Hoje existe inúmeros matérias na composição de um tecido para as roupas,
podendo ser naturais que incluem pele, couro ou os fios naturais como algodão, lã, seda,
juta, cânhamo, linho e sisal. Materiais sintéticos (matérias primas oriundas na maior
parte das vezes do petróleo) como poliéster, poliamida, acrílico, como o nylon, e a
lycran. E materiais artificiais das fibras celulósicas como o acetato, viscose etc e
proteínicas, procedentes de matérias como o milho, óleos vegetais... Combinam bem
com fibras de origem vegetal ou natural.
Mas na década de 60 nos Estados Unidos, surgiram vestidos feitos de papel. Isso
mesmo PAPEL. Tudo começou com a papelaria Scoot Paper Company, que queria
divulgar um novo tipo de papel, então teve a idéia de criar roupas desse material.
Vendidas a U$1, as peças fizeram um maior sucesso, Meio milhão de unidades
foram vendidas em oito meses, mas a tendência durou pouco tempo, pois os vestidos
rasgavam com facilidade e eram inflamáveis. Mas é partir daí, a inspiração rola solta
entre artistas e estilistas consagrados ou desconhecidos.
De todas as criações feitas com esse material (o papel), podemos destacar o
estilista brasileiro Jum Nakao no dia 17 de junho de 2004, 16h, sala 1 do prédio da
Bienal lança sua coleção “A costura do invisível”, as modelos (colocadas sobre uma
malha preta e uma peruca de bonecos Playmobil) desfilam na passarela do São Paulo
Fashion Week vestindo roupas feitas de papel vegetal, que são rasgadas no fim do
desfile.

1º vestido feito de papel pela Scoot Company (1966) (a cima a


esquerda)
Vestido feito por Jum Nakao, coleção costura do invisível (2004) (a cima a direita)

Mais de 700 horas de trabalho, desaparece aos olhos incrédulos dos presentes e
provoca um grande rebuliço. Alguns choram, outros debocham, enquanto a passarela é
invadida pelo público, que passa a recolher pedaços de papel que minutos antes se
configuraram como roupa. Ninguém acreditava que aquelas preciosidades só existiram
naquele momento e nunca mais. O que resta são imagens e, somente, imagens.
A polêmica instaura-se logo após seu término. Mas não se tratava de um desfile
de moda, e sim sobre a moda. O desfile coloca em xeque toda uma estrutura imensa e
dispendiosa montada em torno da roupa e do mercado que ela movimenta. Seria um
manifesto?  Alguns jornalistas questionaram se não seria melhor se esse trabalho fosse
apresentado em uma galeria de arte e não em um evento de moda.
O desfile faz tanto sucesso, que Jum é convidado a expor as peças na Galeria
Lafayette, como parte das comemorações do ano do Brasil na França.
A preocupação com o meio ambiente faz com que as marcas tenham mais
critérios ao escolher o tipo de papel a ser utilizado, é o que acontece com a marca nova-
iorquina House-Wear, da artista Laura Sansone, que faz suas peças com Tyvek, um tipo
de papel usado em envelopes e é fácil de ser reciclado.
Laura teve esta idéia de usá-lo na coleção, pois queria uma matéria-prima que
fosse ecológica e leve para transportar. Outro fator que contribuiu para o
desenvolvimento das peças foi o custo barato que a artista conseguiu na produção de
maneira sustentável.
Estes vestidos feitos de papel têm sido capazes de chegar às passarelas ao redor
do mundo, por isso não é difícil vê-los em desfiles de moda. Eles também têm sido uma
fonte de inspiração no momento das competições, uma vez que alcançar tal vestido é
um grande feito.
A moda sofre influências que vão do gosto pessoal às necessidades de mercado
e, talvez por isso, nem sempre seja encarada com seriedade. Assim como a arte, a moda
é linguagem, expressão que, muito embora seja de caráter coletivo e de larga escala,
acena com promessas de individualidade. Em tempos de pós-modernismo, novos
criadores jogam no corpo de modelos cheias de atitude suas idéias, seus sofrimentos e
suas percepções do mundo, buscando o único no meio de um mundo onde peças em
série comandam o mercado.

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