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Economia Política – Escolas de Pensamento

Na história do pensamento econômico, uma escola de pensamento econômico é um


grupo de pensadores econômicos que compartilham uma perspetiva comum sobre o
funcionamento das economias. Embora os economistas nem sempre se encaixem em
escolas particulares, particularmente nos tempos modernos, classificar economistas em
escolas de pensamento é comum. O pensamento econômico pode ser dividido em três
fases: pré-moderno (greco-romano , indiano, persa, islâmico e imperial chinês), início
moderno (mercantilista, fisiocratas) e moderno (começando com Adam Smith e a
economia clássica no final do século XVIII). A teoria econômica sistemática foi
desenvolvida principalmente desde o início do que é chamado de era moderna.

 Antiguidade e Idade Média

A nível económico, na antiguidade (Grécia antiga) tinha-se a ideia de que o trabalho era
indigno, porque era praticado por escravos e tirava tempo á política, para alem de ser
uma economia assente numa agricultura de subsistência e no comercio da troca de
excedentes. Com o Império Romano, observam-se algumas mudanças, com uma
economia de troca mais intensa, pela extensão do território romano, associado a um
desenvolvimento e construção de obras publicas que permitiu a dinamização do
comércio.
Em 476 d.C., com a queda do grande Império Romano, a imperalidade romana vai ser
transferida para a Cristandade (Igreja), continuando a observar-se uma economia muito
fragmentada, orientada pela matiz cristã em que o trabalho é digno e há uma grande
importância do comércio local com a realização de feiras (Flandres, champagne), onde
compareciam várias pessoas de diversos cantos do mundo. Vão surgir ideias, como com
São Tomás de Aquino, seguindo a matriz cristã, que irá valorizar a propriedade privada
para o uso e bem comum. É na idade \Média que se encontra as sementes da mudança
tecnológica, institucional, relações de poder, etc daquilo que vem a ser o Capitalismo.

 A idade da razão (Mundo Moderno e pensamento científico)

Com a transição para o século XVI, com o fim da Idade Média e o início da
Modernidade, observa-se uma época de grandes transformações, aliado ao:
- Renascimento: expansão ultramarina;
- Desenvolvimento de novas rotas comerciais;
- Reforma Protestante: individualismo; prosperidade; mérito;
- Mudanças políticas: enfraquecimento dos feudos e formação de uma economia
integrada;
- Política económica centralizada;
- Reforço do espírito científico.

A partir da Revolução Industrial vamos ter uma transição de uma economia feudal
(Antigo Regime) para uma mais integrada, e posteriormente no século XVIII o
Capitalismo. No entanto até essa altura observamos a prática/ política económica
centrada e centralizada, o Mercantilismo, assente no enriquecimento dos Estados
através afluxo de metais preciosos.

Princípios básicos do mercantilismo


 Forte intervenção do Estado na atividade económica;

 A riqueza é tanto maior quanto as reservas de metais preciosos (muitos países

proíbem a exportação de ouro e prata).

 Riqueza estática: a acumulação de riqueza e de poder são jogos de soma nula.


 Importância das manufaturas: maior valor acrescentado que o comercio de
matérias-primas; termos de troca (Colbert); Tratado de Methuen (1703):
 Objetivos da política económica: exportações superiores (subsidiadas pelo
Estado) às importações (desencorajadas mediante instrumentos protecionistas
como as tarifas), para permitir alcançar uma balança comercial favorável e o
respetivo enriquecimento.

 Política comercial restritiva: restrições às importações e pactos coloniais


(Navigation Acts de Inglaterra; colónias só́ deveriam realizar comércio com as
respetivas metrópoles; proibição de exportação de matérias-primas).

 • Política industrial: selecção dos sectores a desenvolver, com apoios públicos


(Colbert em França; Leis Pragmáticas em Portugal, 1677).

 • Políticas demográficas: controlo salarial (teoria do valor trabalho, manter


salários baixos para garantir a competitividade dos produtos) e crescimento
populacional.

 • Grandes limitações: tendência para gerar conflitos entre os Estados (Guerras


Anglo-Holandesas e Franco-Holandesa).

Embora partilhando as características de base, é possível distinguir três modelos


diferentes de Mercantilismo:

 – “o Bulionismo, praticado essencialmente por Portugal e Espanha, assentava na


acumulação de metais preciosos trazidos pelos navegadores dos territórios da
América do Sul e de Africa;

 – O Colbertismo ou industrialismo, praticado em França, que não explorava


diretamente os metais, mas apostava no desenvolvimento do sector industrial
como forma de acumular esses metais, por via da manutenção de uma balança
comercial forte e excedentária;

 – O Mercantilismo Comercial e Marítimo, por acção britânica, que se tornou


na base da industrialização britânica, assente no desenvolvimento das trocas
comerciais e no domínio das rotas marítimas.”

É a partir desta transição do Mercantilismo para o Capitalismo que vão resultar as


diversas escolas da economia política clássica, A Escola Clássica Liberal (Adam Smith
e dos Iluministas Escoceses), Escola do Nacionalismo Economico e Escola Marxista.
Estas são as principais escolas de economia política até á fragmentação no final do
século XIX, com a Escola Neoclássica, onde se foca apenas no funcionamento dos
mercados.
¶ A Escola Clássica

Principais pensadores: Adam Smith; David Ricardo; Thomas Malthus; Jean-


Baptiste Say; Jonh Stuart Mill

Adam Smith antes de escrever uma das suas obras mais célebres(A riqueza das nações),
realizou uma viagem pela Europa (França), onde teve contacto com vários autores
fisiocratas.

Fisiocracia – corrente onde a agricultura era a base da economia e fonte de riqueza.


Critica o comercio e serviços como sendo uma classe estéril, algo diferente e contra o
liberalismo.

Estes autores consideram que, a economia devia de funcionar como a “corrente


sanguínea” no nosso corpo, ou seja, sem entraves, pelo que vao enunciar um princípio
laissez-faire, laisse passer, base do liberalismo económico, e acabando por influenciar
Adam Smith.

- A escola clássica: o contexto do Iluminismo Escocês

A Escócia torna-se, no seculo XVIII, o epicentro do pensamento económico (absorve as


ideias fisiocratas). No Iluminismo Escocês pontificaram Francis Hutcheson, David
Hume, Bernard Mandeville, Adam Ferguson e Adam Smith. A principal preocupação
destes autores prendia-se com a formulação dos princípios liberais ancorada numa
extensa compreensão do desenvolvimento social e da natureza humana, e não apenas
em generalizações históricas.

São estes autores que vão desenvolver um estudo abrangente e sistemático do


liberalismo, vão dar corpo ao liberalismo que encontramos de forma ainda esboçada,
prendendo-se a sua maior preocupação com a formulação dos princípios liberais
ancorados na compreensão do desenvolvimento social e da natureza humana, isto é, o
que é que leva as nações a prosperarem mais que outras

Grande questão do Iluminismo Escocês

Este iluminismo foi um movimento intelectual que procurou fazer uma síntese entre
diversas dicotomias, ao mesmo tempo que aprofundou uma distinção entre a esfera
publica e privada, entre outros, algo que durante a Antiguidade Clássica não se fazia.

Hoje me dia, o entendimento que se tem sobre sociedade civil, é que é tudo o que não é
o Estado, sendo aceite por alguns, e por outros aceitam que tudo é sociedade civil. Ora,
para os gregos a ideia de sociedade civil significava o mesmo que sociedade política,
não havia uma separação entre a economia, política e vida doméstica (o público e o
privado), pensamento que durou vários séculos. Foi com os iluministas escoceses que
essa distinção veio a ser concretizada, para estes não era apenas o aquilo não é Estado
nem política, mas também o fundamento das sociedades que historicamente tem
determinadas trajetórias e aquelas que são sociedades modernas e que se desenvolvem
através da indústria, do comercio, etc, essas tornam-se também sociedades civis, mas
também civilizadora. O próprio comércio é entendido como uma atividade que civiliza
os seres humanos, que nos leva a entrar em trocas, e, portanto, é no mercado que nos
temos um espaço de interação voluntaria.

O Iluminismo Escocês opera a distinção entre as esferas pública e privada que é


constitutiva da moderna ideia de sociedade civil. O conceito de sociedade civil é
desenvolvido como uma tentativa de realizar “uma síntese entre um número de
oposições em desenvolvimento que se faziam sentir cada vez mais na vida social,”
nomeadamente entre “o indivíduo e o social, o privado e o público, o egoísmo e o
altruísmo, bem como entre uma vida governada pela razão e uma governada pelas
paixões, que de facto se tornaram constitutivas da nossa existência no mundo moderno”

Fundamentando a ideia de sociedade civil nas “afeições morais e simpatia natural” dos
indivíduos, o Iluminismo Escocês sublinha a propensão humana para o reconhecimento
mútuo e para a troca, que está no cerne do mercado livre. Ou seja, a sociedade civil é
perspectivada como um “espaço de interacção humana” cujos “atributos morais derivam
do próprio homem,” e não de uma “realidade transcendente.” Partindo desta
perspectiva, por um lado, Mandeville sustenta que num determinado contexto
institucional dirigido por estadistas sagazes os vícios privados podem ser transformados
em benefícios públicos, ao passo que Smith teoriza a mão invisível.

 Objectivo: estudar as causas do desenvolvimento dos países e de como a riqueza


se distribuía entre os indivíduos.

 Liberalismo e individualismo (racionalidade): crítica ao mercantilismo.

 Elemento central: teoria do valor trabalho (que retém do mercantilismo).

 Baseia-se no conceito de concorrência perfeita como estrutura preferencial de


mercado.

 O papel do Estado: criar o ambiente para os agentes económicos


desenvolverem de forma eficiente a sua actividade (condições de concorrência
equitativas); proteger os direitos de propriedade; investir na educação; obras
públicas; emissão de moeda, defesa; justiça; segurança.

 Adam Smith
Filósofo moral, considerado pai da economia moderna e do liberalismo económico.

 Teoria dos Sentimentos Morais (1759). Maltez (1991 II, 220-2): “o equilíbrio
da ordem é marcado pelo princípio da simpatia, que ele considerava como
aquele onde o indivíduo só se conhece a si mesmo por intermédio do
julgamento que faz do outro e daquele que o outro faz dele, base do sentido
social e da própria divisão do trabalho e das trocas. Segundo Adam Smith, a
simpatia leva os homens a tentar obter a aprovação de outros homens,
residindo aí a origem das normas objectivas e das regras jurídicas.”

Adam Smith desenvolve a ideai do Espetador Imparcial, que corresponde à ideia de


que temos uma voz interior que nos diz o que está certo e o que está errado. Isto é
relevante porque nas relações humanas e económicas, haja formas de algo ser
considerado moralmente errado, e isto surge como forma de corretor dos nossos
comportamentos.

Para Adam Smith existiram quatro períodos da evolução humana: a caça, a pecuária, a
agricultura e o comércio. E este último é que teria gerado uma sociedade civil ou
comercial, produto de uma espécie de revolução silenciosa que teria ocorrido na Europa
e que minou as anteriores instituições sociais.

- “Cabe, com efeito, a Adam Smith a elaboração de um pensamento económico


estruturalmente concorrencial, marcado por uma concepção de ordem natural que
assume um nítido carácter psicológico: «o esforço uniforme, constante e ininterrupto
de cada homem para melhorar a sua condição», o que seria «frequentemente
bastante poderoso para manter o progresso natural das coisas [...], mau grado as
extravagâncias dos governos e os maiores erros da administração.»”

Esta ideia de sociedade civil que se vem a desenvolver de forma natural à milhares de
anos, pela interação voluntaria de indivíduos, empresas, consumidores, comerciantes,etc
é uma ideia central do Liberalismo que emana o conceito de Ordem Espontanea.

Ordem social onde os seus elementos se organizam e cooperam de forma


voluntaria e espontâneo sem coesão por parte do Estado. Diz respeito à
manutenção de 3 coisas: Integridade física; Cumprimento de
acordos/contratos7promessas; Prosseguimento, por parte dos indivíduos,
dos seus objetivos;

 Maltez (1991 II, 220-2): “Nestes termos considera a espontaneidade das


relações económicas, onde a oferta se adapta naturalmente à procura. A
ordem natural teria, pois, como base psicológica, o interesse individual:
«afastando completamente todos os sistemas de preferência ou de restrição,
estabelece-se por si mesmo o sistema evidente e simples da liberdade natural.
Cada homem, desde que não transgrida as leis da justiça, tem absoluta
liberdade para seguir o seu interesse da maneira como lhe convier e pôr o
seu trabalho e o seu capital em concorrência com os de qualquer homem ou
de qualquer classe de homens».
 “Para além deste princípio, Smith salientava cinco condicionantes à conduta
humana: amor próprio, ânsia de liberdade, instinto de propriedade, hábito
de trabalho e propensão para a troca.”

 Maltez (1991 II, 220-2): “Daí considerar que o Estado não deve intervir na
vida económica, concluindo que «não há dois caracteres que pareçam mais
opostos do que os do comerciante e do governo».
Intervir ≠ Regular

Para Adam Smith o Estado não deve intervir mas sim regular a atividade económica, a
não ser e caso de crise ou catástrofe.

 “Em Jurisprudence or Notes from the Lectures on Justice, Police, Revenue


and Arms, lições de 1766, proferidas em Glasgow, atribuía ao Estado quatro
funções: justiça, defesa, receitas públicas (fiscalidade) e polícia, entendendo
por esta última «a regulação das partes inferiores do Governo, isto é, a higiene, a
segurança, o mercado ou a abundância dos géneros». (...).

 “Considera também que a intervenção económica do Estado, porque obtida


através de regulamentos, contraria a opulência pública quando devia ser marcada
pela divisão do trabalho e pelo self-interest. Assim, defende a separação do
económico e do político baseando-se na autonomia do económico.”

 Maltez (1991 II, 220-2): “Já em An Inquiry into the Nature and Causes of the
Wealth of Nations, de 1776, atribui três deveres ao Estado: o dever de defesa
(«proteger a nação contra a violência e a invasão de outras nações
independentes»), o dever de justiça («proteger tanto quanto possível todos os
membros da nação contra os ataques mesmo legais de todos outros, ou seja,
manter uma legislação imparcial») e um terceiro dever, até então não
referido: «criar e manter certas obras ou estabelecimentos públicos de que
uma sociedade retira imensas vantagens, mas que são, contudo, de tal
natureza que não podem ser construídos ou conservados por um ou vários
particulares, sabendo que, para estes, o lucro nunca lhes reembolsaria as
despesas».”

 Maltez (1991 II, 220-2): “O sistema smithiano de «liberdade natural e de justiça


perfeita» constitui, assim, uma forma de liberalismo ético ou deontológico,
marcado por um efectivo modelo normativo, que não deixa de exigir um Estado
interventor nos domínios da educação.

 “Para Smith, o Estado como deve ser é o Estado «trazido pelo curso natural das
coisas», um Estado que apenas tem que se preocupar em estabelecer «paz,
impostos leves e uma administração razoável da justiça», um curso natural
das coisas onde «a difusão geral da riqueza pelas classes mais baixas» é
igual a uma «difusão da liberdade e da felicidade».”

 Carla Guapo Costa (2010, 97): Smith “procurou demonstrar que a riqueza das
nações resultava da actuação dos indivíduos que, movidos pelo seu interesse
próprio (self interest), promoviam o crescimento económico e a inovação
tecnológica, com benefícios para toda a sociedade. A ‘mão invisível’ acabava
por gerar o bem-estar social.
 “Smith acreditava que a iniciativa privada deveria agir livremente, com
pouca ou nenhuma intervenção governamental; a competição livre entre os
diversos fornecedores levaria, inevitavelmente, à queda do preço das
mercadorias, mas também a constantes inovações tecnológicas, no afã de
baixar os custos de produção e vencer os concorrentes. Neste contexto, e como
retém a premissa mercantilista de que o valor do bem era conferido pela
quantidade de trabalho nele incorporada, a divisão do trabalho, na senda da
especialização, deveria constituir uma forma primordial de
desenvolvimento económico.”

A Mão invisível

 O conceito da mão invisível de Smith é referido três vezes em todos os seus


escritos, apenas uma vez em A Riqueza das Nações, e não foi aprofundado por
Smith.

 É uma metáfora para descrever como o interesse próprio contribui para o


benefício de terceiros e expressa uma ideia comum aos Iluministas Escoceses.

 Bernard Mandeville: vícios privados, virtudes públicas.

 Adam Ferguson: “[as] nações deparam-se com instituições que são de facto o
resultado da acção humana mas não da execução de qualquer plano humano.”
(Friedrich Hayek popularizou esta expressão, ordem espontânea.)

 Smith: cada indivíduo esforça-se por aplicar o seu capital e o seu trabalho de
modo que a sua produção tenha o valor máximo. Geralmente, não pretende
promover o interesse público, nem sabe quanto o está a promover. É, assim,
levado a “promover um fim que não era parte da sua intenção” e que, como
Smith assinala, “Nem sempre é pior para a sociedade que esse fim não fosse
parte desta [intenção]. Ao promover o seu próprio interesse ele promove
frequentemente o da sociedade mais eficazmente do que quando pretende
realmente promovê-lo.”

 Segundo esta ideia, o livre funcionamento do mercado, assente num sistema de


preços que determina as quantidades a serem procuradas e oferecidas, gera
automaticamente o equilíbrio económico.

Adam Smith – Especialização, acumulação de capital e crescimento económico

 Smith sublinha a importância da especialização (divisão do trabalho) e da


formação (antecedente da teoria do capital humano) e a acumulação de capital
como fontes do crescimento económico.
 Smith apresenta o famoso exemplo da produção de alfinetes: se uma fábrica
dispuser de 10 trabalhadores, eles conseguem produzir até 48000 alfinetes por
dia, se a especialização no fabrico dos mesmos se dispersar por 18 tarefas. Ou
seja, teremos uma produtividade média de 4800 alfinetes/trabalhador/dia. Sem a
divisão do trabalho, pode chegar-se ao extremo de um trabalhador produzir um
alfinete por dia.

 A formação: aprendizagens mais complexas devem ser compensadas por


salários mais elevados.

Síntese do Mecanismo Económico:


Adam Smith – Teoria das vantagens absolutas

 Carla Guapo Costa (2010, 99): “Adam Smith vai procurar demonstrar as
vantagens da livre troca ao observar que a abertura ao exterior conduz a um
ganho importante para os dois parceiros (embora podendo não ser
equitativo), e, portanto, também para a economia mundial, originando um
aumento global da riqueza. Por conseguinte, ao contrário da lógica
mercantilista, Adam Smith considera que o comércio internacional tem
ganhos positivos para todos os países intervenientes. Para tal, basta que os
países se especializem de acordo com as suas vantagens absolutas: cada país
deve especializar-se (completamente, afectando todos os recursos disponíveis) à
produção do(s) bem(ns) em que evidencia vantagem(ns) absoluta(s) em termos
de custos de produção (ou de produtividade), ou seja, em que o número de horas
requeridas para a sua produção é menor.

 “Na prática, os países não devem produzir de tudo, em simultâneo, mas apenas
produzir, e exportar, os produtos em que apresentam maior produtividade
e eficiência, e comprar (importar) aqueles em que os seus parceiros são
mais eficientes que eles.”

 Problema: se o mesmo país possuir vantagem absoluta na produção dos dois


bens – custos unitários mais reduzidos – de acordo com esta teoria não existe
vantagem na realização de trocas comerciais. Ricardo resolverá este paradoxo.

 David Ricardo
 Descendente de judeus portugueses; negociante em títulos da dívida pública.
 Principal obra: Principles of Political Economy and Taxation (1817).

 Eleito para o Parlamento britânico em 1819: especializou-se nas questões


monetárias e comerciais: Abolição das Corn Laws, autor da famosa Lei das
Vantagens Comparativas no Comércio Internacional (Portugal e
Inglaterra, Tratado de Methuen), da repartição do rendimento pelos
factores de produção e da lei dos rendimentos marginais decrescentes.

 Discorda da visão de Adam Smith quanto a uma ordem social harmoniosa,


mesmo que com classes sociais, assente no capitalismo: testemunha as
consequências da Revolução Industrial ao nível da estratificação social, com
antagonismos entre as classes que serão posteriormente aprofundados por Karl
Marx.

 Carla Guapo Costa (2010, 97): Ricardo defendia a “distribuição do produto


gerado pelo trabalho numa sociedade. Segundo Ricardo, a aplicação conjunta de
trabalho, máquinas e capital gera um produto, que se divide entre três classes
sociais: os proprietários da terra (que recebem as rendas), os trabalhadores
assalariados (que recebem os salários) e os capitalistas (que recebem os
lucros). O papel da ciência económica seria assim determinar as leis naturais
que orientam essa distribuição, sem perder a preocupação com o crescimento a
longo prazo.”

 Rendimentos marginais decrescentes: as rendas resultam da escassez e da


fertilidade da terra. O crescimento populacional leva ao aumento das rendas
(terras menos férteis vão sendo cultivadas). O custo de produção aumenta:
terras menos férteis e salários mais elevados. Os lucros diminuem: estado
estacionário (atenuado pelo progresso técnico e o comércio internacional).
Tendência da queda das taxas de lucros.

 Ricardo tinha em mente como prejudicados os empreendedores industriais que


eram afectados por políticas proteccionistas como as Corn Laws. Mais tarde,
Marx aprofundará a perspectiva de Ricardo para argumentar contra a exploração
dos trabalhadores.
 Teoria das vantagens comparativas: refinou a teoria de Smith sobre o
comércio internacional, demonstrando por que razão dois Estados devem
realizar trocas comerciais mesmo quando um deles é mais eficiente na produção
de todos os bens do que o outro. Usando o exemplo do Tratado de Methuen
(1703) entre Portugal e Inglaterra, a respeito do vinho e do tecido, Ricardo
mostrou que, embora Portugal fosse mais eficiente na produção de ambos os
bens, compensaria especializar-se no vinho e importar tecidos de Inlgaterra,
pois era mais eficiente a produzir vinho do que tecido. Isto complementou as
ideias smithianas da mão invisível e internacionalizou a defesa do liberalismo
económico, do mercado livre, sendo a base actual da defesa do comércio
internacional (Clift 2014, 54).

 Carla Guapo Costa (2010, 98): “Ricardo defendia que nem a quantidade de
dinheiro existente num país, nem o valor monetário desse dinheiro eram os
determinantes fundamentais para a riqueza duma nação, mas sim a abundância
de mercadorias que contribuíam para a satisfação e o bem estar dos seus
habitantes”.

 Com base nestas ideias, Ricardo defendeu a abolição das Corn Laws. Estas
eram barreiras comerciais (taxas alfandegárias) erigidas durante as Guerras
Napoleónicas que restringiam a importação de cereais, o que mantinha o preço
dos cereais produzidos domesticamente elevado. Isto protegia os proprietários
das terras à custa tanto dos trabalhadores como dos industriais e
comerciantes. Ricardo defendeu que a abolição das barreiras levaria a uma
queda dos preços e ao aumento dos lucros dos industriais, dadas as vantagens
comparativas de Inglaterra na produção industrial (Clift 2014, 55).

 O livre comércio teria como resultado o aumento dos lucros dos industriais, o
que aumentaria o investimento industrial e permitiria à Inglaterra aprofundar a
especialização nas áreas em que tinha vantagens comparativas. Os beneficiários
seriam os industriais, não os proprietários de terras, mas a sociedade sairia
globalmente beneficiada com o crescimento económico. As Corn Laws foram
abolidas em 1946 e a partir daí o Império Britânico passou a promover a
liberalização económica e o comércio internacional na sua política externa.
(Clift 2014, 56)

 Thomas Malthus: Essay on the Principle of Population. O crescimento


demográfico exerce um efeito negativo sobre a economia. Um aumento na
produção alimentar melhora o bem-estar mas só temporariamente, pois leva ao
crescimento demográfico. Propensão para o crescimento populacional em vez da
manutenção de padrões de vida elevados (catástrofe ou armadilha malthusiana).

 Jean-Baptiste Say: Lei de Say, a oferta cria a procura, ou mais adequadamente, a


oferta de um produto cria a procura de outros.

 Nacionalismo Económico

 Protecção das indústrias nascentes nos EUA e na Alemanha em face do


liberalismo e comércio livre da Grã-Bretanha industrializada. (Alexander
Hamilton; Friedrich List);

 Alexander Hamilton: um dos Founding Fathers dos EUA, autor de 51 dos 85


The Federalist Papers, primeiro Secretário do Tesouro, fundador do Partido
Federalista.

 Report on the Subject of Manufactures, submetido ao Congresso dos EUA em


Dezembro de 1791.

 Hamilton argumentou que “os Estados Unidos apenas poderiam preservar a sua
independência e segurança ao promoverem o desenvolvimento económico
por via da industrialização, intervenção governamental e proteccionismo”
(Theodore Cohn 2016, 58).

 A independência e segurança de um país pareciam estar materialmente ligadas


à prosperidade das manufacturas.

 “Hamilton viu a intervenção do governo dos EUA como necessária para


promover a industrialização, porque a Grã-Bretanha como a única potência
industrializada desencorajava a produção de manufacturas nas suas
colónias. Para contrariar as vantagens da Grã-Bretanha, o governo dos EUA
teria de promover o uso de tecnologia estrangeira, capital e mão-de-obra
qualificada e adoptar políticas proteccionistas, como tarifas e quotas para
impulsionar as suas indústrias nascentes” (Cohn 2016, 58).

 Friedrich List: alemão, viveu alguns anos nos EUA, onde tomou contacto com
a obra de Hamilton. Predecessor da Escola Histórica Alemã de economia
política. Conhecido pela defesa da construção do sistema ferroviário e da
importância da unidade nacional (Alemanha ainda não unificada).

 The National System of Political Economy (1841).

 Categoria de análise: a nação, em vez do Estado (mercantilismo) e do indivíduo


(liberalismo).

 A capacidade produtiva de uma nação, que determina o seu poder e influência


na economia mundial, depende das condições sociais e políticas. O mercado
não é ‘natural’. A economia nacional, o Estado e as suas políticas e instituições
encontram-se socialmente incorporados num amplo projecto nacional e
conjuntos de condições históricas, sociais e culturais.

 As nações podem ter diferentes caminhos para o desenvolvimento, o que


contrasta com a visão linear do mercantilismo (acumulação de metais).

 List acolhe críticas de Adam Smith ao mercantilismo, partilhando desde logo


a ideia de que a riqueza de uma nação resulta da actividade económica, não da
acumulação de metais.

 Mas diverge na defesa do liberalismo, embora tenha caricaturado e distorcido


alguns argumentos de Smith.

 Para List a riqueza é um fenómeno nacional, não individual. A criação de


riqueza resulta de um esforço colectivo enquadrado por um projecto nacional,
não da auto-suficiência individual.

 List rejeita o individualismo metodológico do liberalismo e adopta um


nacionalismo metodológico.
 Os interesses privados têm de ser subordinados ao interesse público, naquilo
que chama uma “economia social da nação.” A capacidade produtiva desta
depende do desenvolvimento e refinamento do intelecto, das capacidades e
do ‘capital mental’. A qualidade da educação é central como fonte de riqueza.
Há uma divisão entre trabalho intelectual e trabalho material que condiciona
a capacidade produtiva e a prosperidade.

 List: “Aqueles que produzem gaitas-de-foles ou comprimidos, são de facto


produtivos; mas os instrutores da juventude e dos homens, músicos, virtuosos,
médicos, juízes e estadistas são produtivos num grau muito mais elevado. Os
primeiros produzem valores que podem ser trocados; os segundos produzem
poder.”

 O nacionalismo económico baseia-se na identidade nacional, nas tradições,


ideias e instituições especificamente nacionais, ou seja, um propósito nacional.
Os indivíduos são socialmente incorporados. As suas capacidades podem ser
aproveitadas para diversas trajectórias de desenvolvimento nacional. Isto
contrasta com o individualismo metodológico liberal que tende a não
compreender diferenciações nacionais das cosmovisões dos indivíduos,
falhando em entender a natureza social do trabalho, crucial para aumentar
o poder produtivo.

 As nações, para garantirem a sua preservação, estão sempre à procura do


seu próprio desenvolvimento e reforço no contexto da economia mundial.
Para alcançar estes objectivos, é necessária a intervenção política e moldar os
resultados dos mercados, o que é parte inextricável do capitalismo.

 Esta inevitabilidade significa que toda a actividade económica é moldada e até


talvez subordinada às relações de poder políticas e às instituições como o
Estado. Disto decorre também que não existe “livre comércio” e “competição
irrestrita.”

 Para demonstrar esta ideia, List observa a Grã-Bretanha no século XIX: embora
proclamasse defender o liberalismo económico, o Império Britânico tinha como
elementos centrais uma indústria próspera, uma marinha considerável e
vasto comércio externo, que só podem ser adquiridos com a intervenção e
ajuda do governo.

 Apesar das múltiplas intervenções estatais ao longo de séculos, os britânicos


apresentavam-se hipocritamente como defensores do livre comércio. Por detrás
da fachada intelectual do compromisso com a doutrina económica liberal estava
a crua prossecução do interesse nacional à custa dos emergentes
concorrentes económicos e militares.
 • Para List, a visão liberal de uma ordem económica internacional harmoniosa
ignorava a importância das nações como intermediários entre os indivíduos e
a humanidade e, logo, subestimava que as relações económicas internacionais
envolvem competição e lutas pelo poder entre nações.
 • A visão de Smith/Ricardo só poderia funcionar entre nações com níveis de
desenvolvimento idênticos. Até lá, as hierarquias e as desigualdades nas
relações de poder distorcem o funcionamento do sistema capitalista, impedindo
os cenários win-win teorizados por Smith e assentes nas vantagens comparativas
de Ricardo.
 • List argumentava que a visão ‘cosmopolita’ de Smith não podia ainda ser
aplicada devido a estas desigualdades entre as nações. Por isso defendeu que as
nações menos desenvolvidas que a Inglaterra deveriam pautar o seu
desenvolvimento pela aplicação de meios artificiais que lhes permitissem
atingir o mesmo nível de Inglaterra. A partir desse momento é que poderiam
competir livremente, deixar o livre comércio operar.

 Partindo da evidência do intervencionismo estatal no mercado e da


inevitabilidade de desiguais relações de poder entre nações com diferentes níveis
de desenvolvimento económico, List defendeu então um sistema protector da
economia nacional, em particular das indústrias nascentes alemãs, assente em
taxas alfandegárias, regulamentações comerciais e intervenção do estado
com projectos nacionais

 Este sistema era o ‘degrau’ que Smith e os britânicos tinham afastado do


liberalismo económico, mas pelo qual a Grã-Bretanha passou. Visão diacrónica,
evolutiva, das economias como sistemas complexos e dinâmicos.

 As indústrias nascentes, sem protecção, não conseguem competir com as


indústrias consolidadas de nações mais desenvolvidas. Esta ideia encontra-se
em John Stuart Mill e tem ecos em Smith, que concordava com restrições
temporárias em casos de necessidade. Para os liberais eram medidas temporárias
e um mal necessário, mas para List eram medidas legítimas, de médio-prazo, e
importantes instrumentos para o desenvolvimento das nações. Só após
passarem por este estágio, poderiam então tomar o seu lugar no quadro do
capitalismo internacional, o que Alemanha e EUA deveriam fazer.

 Marxismo (Karl Marx e Friedrich Engels)


 Nasceu em Trier, Alemanha. Estudou Direito, História e Filosofia. Foi jornalista
e esteve emigrado ou exilado em Paris, Bruxelas e Londres, onde trabalhou com
Engels, com quem fez parte da “Liga dos Justos”, posteriormente rebaptizada
“Liga Comunista”, para a qual escreveram o célebre Manifesto do Partido
Comunista (1848).

 Entre as principais obras: A Ideologia Alemã (1846), Contribuição para a


Crítica da Economia Política (1859), O Capital (1867).

 Associado a regimes autoritários e totalitários com economias planificadas no


século XX, o que não afecta o seu contributo enquanto crítico do capitalismo,
tendo fornecido um arsenal de ferramentas para o analisar, ainda que se deva
salientar o seu viés normativo anti-capitalista.

 Parte dos trabalhos de Smith e Ricardo para chegar a conclusões diferentes


e críticas (ignoraram o papel das classes sociais).
 Materialismo dialéctico: base do pensamento marxista. Materialista porque
assume o primado da matéria sobre as ideias. É a primeira que condiciona as
segundas, ao contrário do que defendeu Hegel. A este último Marx vai buscar a
dialéctica, a evolução por oposições sucessivas (tese, antítese, síntese), mas
revendo-a, passando da primazia do idealismo para a do materialismo. Serve a
Marx para “estudar a matéria no seu movimento perpétuo através de
antagonismos sucessivos, de que tenciona descobrir as leis. (...). Apresenta-se
como uma ciência que estuda as leis da evolução do mundo objectivo e o seu
reflexo na consciência humana” (Prélot e Lescuyer 2001 II, 249).

 Materialismo histórico ou concepção materialista da história: análise da


evolução histórica pela aplicação do materialismo dialéctico, observando as
condições materiais que enformam os modos de produção e visando
“descobrir a lógica interna dos acontecimentos históricos e explicá-los de
maneira a compreender o passado e o presente, mas também a prever o futuro”
(Prélot e Lescuyer 2001 II, 250).

 Modo de produção: modo específico de produção económica que resulta da


combinação das forças produtivas e das relações de produção.

 Meios de produção: também chamados bens de capital, são as matérias-primas,


infraestruturas, máquinas e ferramentas.

 Forças produtivas: combinação dos meios de produção com a força de


trabalho.

 Relações de produção: são as relações que se estabelecem entre as pessoas com


diversos posicionamentos no processo produtivo e que determinam as classes
sociais.

 Infraestrutura e superestrutura: o modo de produção determina todo o


processo social e político e constitui a infraestrutura económica sobre a qual
se ergue a superestrutura, que é composta por instituições jurídicas e políticas,
ideologias e filosofias (Raymond Aron 2004, 151). Mudanças no modo de
produção provocam mudanças na superestrutura.

 Capitalismo: modo de produção composto por dois elementos, capital e


trabalho assalariado. O capital não é estático, está em contínua circulação (M-C-
M).

 Classes sociais do capitalismo: capitalistas ou burgueses (classe


dominante/opressores) e trabalhadores/proletariado (classe
dominada/oprimidos).

 Marx também adopta a teoria do valor trabalho para argumentar que a classe
trabalhadora depende da venda da sua capacidade de trabalho no mercado de
trabalho (comodificação do trabalho). Os salários que recebe apenas remuneram
a sua capacidade de trabalho, não o valor que esta cria, ou seja, a mais valia
(diferença entre o preço a que um bem é vendido e o custo da sua produção), que
é o lucro do capitalista.
 Luta de classes: as relações entre as duas classes, relações de produção, são
antagónicas e conflituais. A dependência é desequilibrada em favor dos
capitalistas, visto que os trabalhadores não têm controlo sobre o seu próprio
trabalho e os capitalistas exploram-nos ao expropriá-los das mais valias.
Apropriam-se dos produtos do trabalho enquanto pagam aos trabalhadores
menos do que o seu trabalho vale. Exploram parasiticamente os
trabalhadores.

 Aos trabalhadores é pago apenas um salário que lhes permita subsistir de forma
a continuarem a produzir bens e o aumento do número de desempregados
permite continuar a explorar os trabalhadores. Além disto, a divisão do
trabalho provoca a alienação dos trabalhadores, o desligamento do
significado do que produzem.

 A exploração é uma dinâmica inerente ao capitalismo. A mais valia criada pelo


trabalho mas apropriada pelo capitalista sob a forma de lucros gerados pela
venda de bens é a fonte da riqueza no capitalismo, pelo que os capitalistas são
impelidos a aprofundar a exploração para aumentarem os lucros e
acumularem capital que leva ao aumento dos meios de produção. A
exploração conduz à sobreproduçao, manutenção de salários baixos leva ao
subconsumo e com o crescimento demográfico aumenta o desemprego –
contradição na origem das crises do capitalismo.

 Isto fomenta o antagonismo entre as classes sociais que leva a mudanças e


transformações históricas. Marx e Engels: “O que a burguesia produz,
portanto, acima de tudo, são os seus próprios coveiros. A sua queda e a
vitória do proletariado são igualmente inevitáveis.”

 A luta de classes é o motor da História. As sociedades evoluem desde as


primitivas, passando pelas antigas (escravatura), feudais (servidão), e, no tempo
de Marx, pelas capitalistas (salariato), a que sucedem as socialistas, até se chegar
a uma sociedade comunista, sem classes, sem Estado, sem propriedade privada e
à escala mundial.

 A subordinação dos escravos, servos e assalariados, ou seja, sistemas antigo,


feudal e burguês/capitalista, são três modos distintos de exploração do homem
pelo homem, modos de produção assentes no antagonismo entre os
subordinados e uma classe que detém a propriedade dos meios de produção e o
poder político (Aron 2004, 152-153).

 As contradições do capitalismo são “a mola do movimento histórico” (Aron


2004, 151). Contradição entre as forças e as relações de produção, entre o
aumento dos meios de produção pelos capitalistas e o aumento simultâneo do
número de proletários e a sua miséria, ou seja, entre o crescimento dos meios de
produção e o duplo processo de proletarização e pauperização (Aron 2004, 147).
 • As revoluções não são acidentes políticos, mas o resultado do
desenvolvimento das relações de produção. Desenvolvimento das relações de
produção capitalistas no seio das sociedades feudais (Revolução Industrial)
levou à Revolução Francesa. Relações de produção socialistas no seio da
sociedade capitalista deverão levar à revolução socialista (Aron 2004, 152).
 Marx e Engels não desenvolveram uma teoria do Estado consistente e unificada.
Em algumas obras (A Ideologia Alemã; Manifesto do Partido Comunista)
teorizam o Estado como uma forma de organização da burguesia para
assegurar os seus interesses. É a sua principal visão, instrumentalista, do
Estado, posteriormente desenvolvida por Lenine e outros.

 Noutras obras (O 18 de Brumário de Luís Bonaparte), desenvolvem uma visão


secundária, em que o Estado tem um maior grau de autonomia em relação
ao sistema de classes e, consequentemente, à burguesia, mas uma autonomia
relativa, em que apesar de Napoleão III se afirmar representante do
campesinato, numa sociedade de classes o Estado acaba sempre por defender os
interesses da classe dominante.

 Lenine segue a visão principal, em que o Estado é um instrumento de


dominação, de opressão, por parte da classe dominante, ou seja, o aparelho
repressivo da burguesia.

 É o Estado burguês, capitalista, que deve ser destruído por uma revolução
violenta que o substitua por uma ditadura do proletariado. A revolução
abole o Estado burguês.

 O Estado proletário colectiviza os meios de produção e acaba com as


desigualdades e antagonismos de classe, chegando-se a uma sociedade sem
classes em que o próprio Estado proletário se extingue, é superado, pois não
há classe a oprimir, deixa de ser necessário como instrumento de repressão
(Sousa Lara 2005, 206-7).

Vladimir Ilyich Ulyanov (Lenine) – Imperialismo (Cravinho 2006, 176-177)

• “(...) o fenómeno do imperialismo, um aspecto tão marcante das últimas décadas do


século XIX e das primeiras do século XX, era consequência directa da concentração
de capital num pequeno número de bancos que se tinham tornado dominantes nos
mais avançados países europeus. Procurando extrair lucros e outras vantagens
económicas das colónias, os bancos provocaram uma corrida entre as grandes
potências que acabou por resultar na Primeira Guerra Mundial. Para Lenine, o
imperialismo era “a última fase do capitalismo” (subtítulo da sua obra sobre o
assunto) porque a expansão física do capital tinha um limite e a guerra era a prova de
que estava a chegar-se ao ponto de saturação, tal como Marx tinha previsto. Assim,
tanto o imperialismo como a guerra eram retratados como consequências naturais
do capitalismo.”

“O imperialismo acontece porque existe uma dinâmica que determina a sua


inevitabilidade e essa dinâmica reside na própria estrutura do capitalismo
internacional. A concorrência entre grupos capitalistas organizados em Estados é um
fenómeno inevitável do capitalismo e, portanto, a questão da inevitabilidade ou não da
guerra tinha para Lenine uma resposta simples. Enquanto houvesse Estados
capitalistas haveria guerra, e a única forma de acabar com a guerra era acabar com a
divisão do mundo entre Estados capitalistas. No Manifesto Comunista Marx e Engels
consideraram que o fim da luta de classes entre os homens significaria também o
fim dos conflitos entre as nações, pois desapareceriam as causas estruturais da
guerra. (...) a solução para as dificuldades do capitalismo é uma revolução a nível
mundial, algo que era inevitável, dadas as dinâmicas que se haviam identificado, e que
era desejável, formando, portanto, a base de trabalho dos partidos comunistas.”

• Antonio Gramsci rompe com a análise económica marxista e ao procurar


explicar o domínio do Estado capitalista desenvolve o conceito de hegemonia.

 A hegemonia é a prática não coercitiva da classe dominante que visa


persuadir a classe dominada para os seus valores morais, políticos e
culturais elaborando uma ficção de um interesse geral. É a hegemonia
ideológica, exercida através de instrumentos de dominação (como o Estado),
mas não pela força ou repressão (Maltez 2014, 200-1).

 É uma abordagem de cariz ideológico e cultural, que não nega a importância da


repressão exercida pelo Estado, mas salienta a capacidade de a classe
dominante influenciar e moldar as percepções das classes dominadas,
convencendo-as da legitimidade do sistema existente ou da futilidade da
resistência.

Sobre a economia política clássica

 Ben Clift (2014, 72-3): Smith, Marx e List estiveram no centro de um campo de
estudos sobre a sociedade, política e economia que já não vemos na academia
moderna. Esta abordagem foi marginalizada em favor de abordagens com focos
mais restritos.

 A análise holística e a compreensão do funcionamento da economia e das suas


implicações sociais e políticas é uma tarefa extremamente difícil, hercúlea.

 Os três defenderam, à sua maneira, uma interpretação dos processos da


economia política situada nos respectivos contextos históricos. Debruçaram-se
sobre as relações entre o Estado e o mercado e o posicionamento dos indivíduos,
bem como sobre o contexto internacional e as ramificações da actividade
económica neste.

 Escola neoclássica: o marginalismo (Clift 2014, 84-5)


 A utilidade: Jeremy Bentham (1748-1832) e John Stuart Mill (1806-1873). A
utilidade é a propriedade de um objecto que tende a aumentar o prazer,
bem-estar ou felicidade (satisfação de uma necessidade) e a evitar a dor ou a
infelicidade.

 A revolução marginalista: William Stanley Jevons (1835-1882), Inglaterra.


Léon Walras (1834-1910), Suíça. Carl Menger (1840-1921), Áustria. Autores
contemporâneos, mas que trabalharam de forma independente. Acabaram por
chegar a resultados idênticos, com o contributo central da teoria da utilidade
marginal.

 Os marginalistas pretendiam tornar a análise económica mais rigorosa,


escapando às análises holísticas e abrangentes de Marx, List e Smith e
evitando as complexidades da economia política clássica sobrecarregada de
factores, variáveis, contextualização histórica e densas descrições. Isto levou- os
a erigir barreiras disciplinares e a definir um foco mais restrito de questões
de investigação.

 O problema central da economia passa a ser o da alocação de recursos escassos


para a satisfação de necessidades, ou seja, para a maximização da utilidade.
Ficam excluídas da análise económica questões como a evolução dinâmica do
capitalismo ou a análise das relações sociais de produção. Em termos
disciplinares, a economia separa-se da política, deixa de ser economia política,
informada por preocupações éticas e sociais, e passa a ser apenas economia,
uma ciência supostamente livre de valores.

 Os factores históricos, políticos, sociais e institucionais ficam fora da análise,


sendo considerados constantes: ceteris paribus. É uma assunção irrealista, mas
que permite aumentar a especialização técnica da análise, conseguindo
atingir-se maior generalidade ao responder a questões mais simples.

 Abordagem microeconómica, com o indivíduo e a empresa no centro da


análise, e com ênfase na procura (a abordagem clássica enfatizava a oferta).

 Methodenstreit: Escola Histórica Alemã (Gustav von Schmoller) vs.


marginalismo, especialmente Menger.

 Teoria subjectiva do valor: os bens valem pela utilidade, não pelo trabalho
incoporado.

 Jevons: a economia é um “cálculo do prazer e da dor”. Os indivíduos,


enquanto consumidores, estão constantemente a tomar decisões sobre que
bens comprar com base no grau de utilidade que derivam das aquisições.
“O valor depende inteiramente da utilidade.”

 Isto leva a que sejam ignoradas as condições sociais prevalecentes e se retirem


da discussão quaisquer considerações políticas e éticas sobre o valor, que passa
a depender apenas de uma concepção de subjectividade humana.
 Menger e Jevons desenvolveram a análise marginal que se tornou central na
escola neoclássica, i.e, a noção de que a a decisão de produzir/consumir vai
depender do custo/benefício da última unidade produzida/consumida (custo
marginal e utilidade marginal).

 “A satisfação do consumidor depende dos seus gostos e preferências e é


medida pela utilidade."

 Utilidade total: “traduz a satisfação total que um consumidor obtém com o


consumo de um determinado bem.”

 Utilidade marginal: “representa a satisfação adicional que um consumidor


obtém com o consumo de uma unidade adicional de um determinado bem.”

 Lei da utilidade marginal decrescente: “à medida que se consomem unidades


adicionais de um mesmo bem, num determinado período de tempo, a satisfação
adicional que se obtém com cada uma das unidades do bem vai diminuindo,
coeteris paribus.”

 Exemplo da utilidade marginal decrescente: “quando temos sede, o primeiro


copo de água que bebemos tem uma grande utilidade, dá uma grande satisfação;
à medida que vamos saciando a sede, a satisfação adicional que obtemos com o
consumo de unidades adicionais de copos de água vai diminuindo.”

 “De facto, em geral, quando temos uma necessidade ou um desejo, a primeira


unidade do bem que consumimos para satisfazer essa necessidade/desejo
tem uma utilidade elevada, no entanto, à medida que saciamos essa
necessidade/desejo, a satisfação adicional obtida com consumo de unidades
adicionais do bem vai diminuindo.”
 Este tipo de análise é ‘marginalista’ devido à ênfase sobre pequenos
ajustamentos subjectivos (na margem) como base da tomada de decisão, das
escolhas efectuadas.

 Torna-se central a análise dos ajustamentos subjectivos que os consumidores


realizam quando decidem sobre que combinação de bens maximiza a utilidade
(um pouco mais disto e um pouco menos daquilo). O incrementalismo
subjacente à tomada de decisão individual é, para os marginalistas, a essência
da compreensão da economia. Individualismo metodológico, i.e., o indivíduo
como a única unidade de análise.
 Parte-se da assunção de que o indivíduo é um ser atomístico (associal) e
racional que calcula como maximizar a utilidade estando em posse de
informação perfeita: o homo economicus. É outra assunção irrealista,
porque não nos comportamos consistentemente desta forma nem possuímos
informação perfeita.

 O foco no marginalismo e o individualismo metodológico levaram a opções que


seriam influentes na metodologia das ciências sociais.

 Para Jevons e Walras, a economia, para ser considerada científica, tinha de ser
uma ciência matemática.

 Menger, com a ênfase da Escola Austríaca – de que foi o fundador – na incerteza


quanto aos assuntos humanos, não acolheu a formalização matemática.

 Os que acolheram a modelização matemática tiveram de partir de modelos


altamente simplificados da economia baseados nas assunções já mencionadas e
também na assunção de concorrência perfeita como estrutura dos mercados.
São estas assunções simplificadoras que permitem formular leis que podem ser
generalizadas para todas as épocas e lugares.

 Alfred Marshall (1842-1924): sintetizou e aprofundou as ideias dos


marginalistas. Fundador da Escola de Cambridge. O seu Principles of
Economics (1890) dominou a ciência económica durante as décadas seguintes.
Nele utilizou a matemática e diagramas para ilustrar processos económicos, mas
acreditava que aquela deveria apenas auxiliar a expressão das ideias económicas
numa escrita clara.

 Alfred Marshall: “Focou-se na agregação da oferta e na sua interacção com


a procura no mercado, pavimentando o caminho para a moderna
microeconomia. As preferências dos consumidores individuais e dos produtores,
concebidas como escolhas individuais no lugar de outras, agregam-se para
moldar as forças tanto da oferta como da procura.

 ”A curva da oferta é construída pela interacção de indivíduos dispostos a


fornecer bens e serviços ao mercado baseados nas considerações individuais
sobre o custo de oportunidade, i.e o custo da alternativa não escolhida para o
uso do tempo, trabalho e energia.

 “Similarmente, as preferências individuais da procura acumulam-se para moldar


a curva da procura, mas estas preferências podem ser muito específicas devido
aos gostos dos indivíduos e não podem simplesmente ser assumidas como
crescendo em função do crescimento populacional, como os economistas
clássicos sugeriram.”

Alfred Marshall: Rejeitou o conceito marxista de mais valia e a ideia de exploração


dos trabalhadores assente na teoria do valor trabalho. O lucro é percebido como
resultando do investimento, que está sujeito a flutuações severas devido a alterações
na procura.
 Marshall não era ingénuo sobre as falhas da economia de mercado, tendo
percebido que através do estabelecimento de economias de escala e as
consequentes vantagens ao nível da redução dos custos de produção, poderiam
emergir grandes empresas que não seriam constrangidas da mesma forma que
as pequenas.

 Assumiu que a natureza volátil das preferências dos consumidores impediria


comportamentos monopolísticos abusivos – no que já foi um pouco ingénuo.

Equilíbrio de mercado: “Da interacção entre a procura e a oferta, num mercado em


concorrência perfeita, resulta um preço de equilíbrio e uma quantidade de equilíbrio.
Este equilíbrio dá-se quando para um determinado preço a quantidade procurada
iguala a quantidade oferecida."

 Equilíbrio de mercado: “a assunção de que os mercados tendem para um


equilíbrio estável é fundamental para o marginalismo e a economia, mas é uma
asserção ideológica, não fundamentada numa base empírica.” Depende de
assunções como a concorrência perfeita e informação perfeitamente distribuída.

 Mas os marginalistas não defenderam que os seus modelos reflectiam


acertadamente o funcionamento dos mercados na prática. Eram apenas
ferramentas para tornar a análise económica mais científica, o que levou à
separação entre a economia e a economia política, ou seja, a despolitização
da economia política, com a economia assente nos princípios liberais.
 Esta despolitização não teve um carácter político. Tanto Jevons como Walras
eram reformadores sociais e Walras considerava-se socialista. Ambos estariam à
esquerda no espectro político, não à direita. Mas o que a história e a ciência
económica retiveram foi uma lição conservadora: o mercado deve ser deixado
por sua própria conta e a interferência política deve ser reduzida ao
mínimo (laissez faire). A partir disto, os economistas construíram modelos
que assumem a propensão para o equilíbrio como inerente aos mercados
livres.

Estrutura de mercado

Concorrência Concorrência oligopólio monopólio


perfeita monopolista
Numero de muitas Muitas poucas uma
empresas
Tipo de bem homogéneo diferenciado Homogéneo ou Único sem
diferenciado substituto
próximo
Procura Tomadora de Procura elástica, Procura menos elástica A procura
dirigida a cada preços: procura mas não do que a dirigida às dirigida a
empresa perfeitamente perfeitamente empresas em empresa e a
elástica elástica concorrência procura de
monopolística mercado
Condições de Não existem Existem barreiras Existem barreias
entrada e saída barreiras significativas significativas

Não existem
barreiras
Exemplos Trigo, sementes Escovas de Automóveis, cigarros Medicamentos
de soja dentes, roupa protegidos pela
patente

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