Você está na página 1de 8

AS PERSPETIVAS DE BASE PÓS-POSITIVISTA: A RETOMA DA DIMENSÃO CULTURAL E

DAS IDENTIDADES, O CONSTRUTIVISMO E A TEORIA NORMATIVA NAS RELAÇÕES


INTERNACIONAIS

O estudo sobre o papel das instituições internacionais no sistema internacional ao


longo dos anos 1990 saiu revigorado através do Paradigma Institucionalista, já que o
fim da Guerra Fria levou os especialistas da área a dedicar-se primordialmente à
análise da nova ordem internacional. Ora na nova estrutura do sistema internacional
era visível, não só o aparecimento de inúmeras novas organizações internacionais,
como a implementação consequente de normas internacionais, o que motivou os
especialistas de Relações Internacionais que se dedicavam ao estudo da ordem
internacional pós-Guerra Fria a centrar as suas análises, justamente, sobre a
implementação dessas normas internacionais e sobre o funcionamento e eficácia das
organizações internacionais, deslocando as análises de Relações Internacionais para
“as ações intencionais geradoras de uma ordem política”, recolocando a discussão em
termos de “governabilidade” (HERZ, 1997: 2).

É verdade que o estudo das normas, regras e procedimentos relacionados a temas


específicos, ou a regiões específicas, antigo já nas Relações Internacionais, não se
tornara obsoleto, porém a década de 1990 vem demonstrar uma preocupação central
em torno da forma como as instituições internacionais, designadamente as
organizações internacionais podem contribuir para gerar ordem na política
internacional. Assim, na década de 1990, a introdução do papel ordenador das
instituições internacionais na eterna dicotomia ordem-anarquia da disciplina é
acompanhada pela recuperação de temas idealistas quanto às funções das
organizações internacionais por parte do Institucionalismo, e pela importação de
temas da Sociologia e por novas abordagens às estruturas de autoridade e às novas
formas de exercício da cidadania, por parte do Construtivismo (HERZ, 1997: 3). Ao
mesmo tempo, assiste-se a um movimento em direção à reincorporação da cultura e
da identidade enquanto temas essenciais para a compreensão das relações
internacionais.

Na realidade, a dimensão cultural nas análises internacionalistas não era nova, porém
nenhuma abordagem anterior que introduzia os temas da cultura e da formação de
identidades havia gerado os frutos que gerariam estas novas abordagens dos anos
1990.

Com efeito, as abordagens dos anos 1960 que se preocupavam com a dimensão
cultural tiveram o mérito de introduzir o papel das variáveis cognitivas nas análises de
política externa, procurando evitar as distorções das informações e os problemas
gerados pela consideração dos Estados enquanto atores homogéneos, racionais e
unitários por parte dos realistas. Nos anos 1970, autores da Escola Inglesa como
Hedley Bull recuperaram um tema grociano ao repescar o conceito de sociedade
internacional, o qual pressupõe a existência de normas partilhadas internacionalmente
assentes numa cultura internacional. Já durante toda a década de 1980, as perspetivas
pós-modernas, pós-estruturalistas, feministas e críticas da Escola de Frankfurt e ainda
os construtivistas apresentaram um interesse permanente pelos fatores mais
subjetivos nas análises internacionalistas, designadamente a cultura e a formação das
identidades (HERZ, 1997: 4).

De facto, estas perspetivas observaram que a premissa da racionalidade instrumental


presente no comportamento dos Estados dos pontos de vista do Neorrealismo e do
Institucionalismo Neoliberal era frequentemente insuficiente para explicar os
fenómenos internacionais. Afinal, nem sempre a perceção dos interesses, mesmo por
parte dos Estados, é feita de modo tão linear e direto, surgindo por vezes percalços às
avaliações ditas racionais dos Estados, que lhes criam dificuldades (ROCHA, 2002: 233).

Se não raramente as decisões tomadas resultam de erros de interpretação das


informações sobre o ambiente internacional, o que pode conduzir a decisões
aparentemente irracionais do ponto de vista dos Estados, outras vezes há distorções
no processamento das informações resultantes de processos micros sociais existentes
no grupo decisor, com base em argumentos, não propriamente políticos, mas mais
psicológicos (ROCHA, 2002: 234).

Por isso, à racionalidade predominante nas teorias das Relações Internacionais,


assente em metateorias de caráter, primeiro positivista e, depois, neopositivista,
começou a contrapor-se a lógica mais político-social, psicológica e de personalidade
que desde os anos 1980 fundamenta as análises de base pós-positivista das
perspetivas que Robert Keohane, em 1988, aquando do seu discurso de tomada de
posse enquanto presidente da International Studies Association (ISA), já havia
designado como perspetivas reflexivistas, opostas às abordagens racionalistas de base
positivista (KEOHANE, 1988: 46).

A distinção de Keohane tornou-se clássica e ainda hoje demarca as análises


racionalistas das perspetivas reflexivistas interpretativistas que analisam os fenómenos
internacionais, em particular as instituições internacionais e a razão que leva os atores
a cooperar. Assim sendo, vale lembrar que, na base da distinção de Keohane está a
diferença entre a tradição clássica e a moderna teoria política no estudo da
cooperação internacional, sendo certo que a tradição clássica está na origem das
perspetivas pós-positivistas e a moderna teoria política está na origem do racionalismo
de base positivista e suas teses (MANSFIELD, 1994: 42).

A tradição clássica do estudo da cooperação internacional sublinha que a razão que


leva os Estados a cooperar é a natureza social da Humanidade. A cooperação
estabelece-se, assim, quando atores que partilham um objetivo comum que não pode
ser alcançado através da ação isolada de cada um desses atores os leva a estabelecer
uma ação conjunta para alcançar esse objetivo, surgindo a cooperação como resultado
de hábitos e práticas entre atores que partilham tradições e valores comuns,
particularmente dentro de uma mesma comunidade, no âmbito da qual a cooperação
é mais facilmente alcançável (MANSFIELD, 1994: 42).

A moderna teoria política, em lugar de acentuar o papel dos hábitos e das práticas
comuns que especialmente dentro de uma mesma comunidade conduz à cooperação,
acentuou sempre os interesses dos atores que estabelecem (ou não) essa cooperação.
Os interesses dos atores que perseguem estratégias destinadas a alcança-los é o que
forma o núcleo duro da moderna teoria política, que os considera como dados
adquiridos, não se preocupando, por conseguinte, em refletir sobre esses interesses e
sobre os objetivos dos atores. Considerando-os como dados existentes, o que interessa
à moderna tradição do estudo da cooperação internacional é explicar as escolhas dos
atores em termos de racionalidade estratégica e instrumental, resultado da utilização,
ou não, da força (MANSFIELD, 1994: 43).

Assim, no âmbito da moderna teoria política, tanto os realistas quanto os liberais,


embora partilhem o paradigma dos interesses e objetivos dos Estados, numa base
racional, chegam a conclusões muito diferentes. Enquanto os primeiros sustentam que
a anarquia é a razão pela qual a cooperação entre Estados é rara – já que, na ausência
de uma autoridade superior a eles próprios, os Estados, antes de se engajar em
comportamentos cooperativos, têm de se preocupar com a sua segurança – os liberais
assumem que a segurança não é sempre a preocupação dos Estados, que muitas vezes
pretendem a maximização racional dos ganhos através da cooperação, explorando as
condições sob as quais essa cooperação ocorre (MANSFIELD, 1994: 43).

Oposta a esta lógica racionalista de interpretação da cooperação internacional, seja


pelo viés realista, seja pelo liberal, está a perspetiva reflexivista de Keohane (1988: 46),
sendo estas duas grandes abordagens aquelas que demarcam o debate em torno da
cooperação internacional e muito além desta (KEOHANE, 1988: 47). Considerada hoje
uma distinção clássica, a verdade é que, ainda que sem esta designação, a demarcação
existe desde que as variáveis culturais e identitárias foram introduzidas nas análises
internacionalistas.

A grande questão é que os temas da cultura e da formação das identidades foram


sempre, quer nos 1960-1970, quer na década de 1980, marginalizados das análises das
Relações Internacionais. Nos anos 1960-1970 essa marginalização ocorreu em função
da falta de uma base empírica coerente por parte dos estudos que focavam as
variáveis cognitivas e, nos anos 1980, deu-se sobretudo em função da influência do
Neorrealismo, em particular através do trabalho de Kenneth Waltz (1979). Como
resultado, chega-se ao final da década de 1980 conferindo-se muito pouca atenção à
dimensão cultural nas análises internacionalistas (HERZ, 1997: 4).
John Kurt Jacobsen (1995) com Much Ado About Ideas: The Cognitive Factor in
Economic Policy, trabalhando no âmbito da Economia Política Internacional, Judith
Goldstein e Robert Keohane (1993) em Ideas and Foreign Policy: Beliefs, Institutions
and Political Change nas suas análises de política externa, e o próprio conservador
Samuel Huntington (1993), sob uma ótica distinta, em The Clash of Civilizations?,
retomam os papéis da cultura e da formação das identidades enquanto variáveis
fundamentais para o estabelecimento ou fragmentação da sociedade internacional
(HERZ, 1997: 4). Variáveis que podem ajudar a compreender o processo de
estruturação do conceito de sociedade internacional assente em ideais universais, ou
que podem problematizá-lo, apontando para os particularismos que se geram dentro
dos fenómenos de universalização e que, por conseguinte, geram a fragmentação.

A cultura internacional e a formação de identidades surgem, assim, nos anos 1990,


como variáveis relevantes a ser tidas em conta para a explicação dos fenómenos de
integração de comunidades, mas também dos fenómenos de fragmentação, das
possibilidades da cooperação internacional, mas também dos conflitos étnicos e
nacionais. De facto, enquanto os institucionalistas retomam o valor das ideias para
compreender os comportamentos (cooperativos) dos atores visando encontrar os elos
empíricos e S. Huntington reifica os agentes culturais, as novas abordagens dos anos
1990 vêm questionar as premissas racionalistas destas análises (HERZ, 1997: 4),
transformando as ideias – sejam elas identidades, normas, valores ou interesses,
enformados numa cultura internacional – em variáveis endógenas às análises
internacionalistas, considerando que os atores que compõem a sociedade
internacional crescentemente globalizada são atores reflexivos. Os atores passam, no
âmbito destas perspetivas, a ser considerados agentes não estáveis e imprevisíveis, ao
contrário das perspetivas racionalistas que os encaram enquanto agentes estáveis e
previsíveis como bolas de bilhar, pelo que a cultura e as identidades surgem como
sendo socialmente construídas e fragmentadas na visão de Yosef Lapid (LAPID, 1996).

Simultaneamente, as novas perspetivas da década de 1990 vêm reposicionar o debate


sobre ética, moral e democracia na agenda internacional, com a recuperação da
abordagem deontológica de Kant à relação entre ética e política e a recuperação da
abordagem utilitarista de Bentham à mesma relação (NARDIN & MAPEL, 1995).

Assim, seguindo a tendência dos anos 1980 – quando a epistemologia positivista


começava a ser criticada pelos pós-positivistas, porém sem grande repercussão – na
década de 1990, com o fim da Guerra Fria, assistiu-se também ao reposicionamento
dos temas éticos na agenda internacional. Seja como resultado das pressões do
movimento social transnacional, seja como forma de legitimação das políticas das
potências ocidentais baseadas em interesses económicos ou geoestratégicos, esse
reposicionamento ocorreu nos anos 1990, o que conduziu à retoma, em força, do
debate normativo nas Relações Internacionais (HERZ, 1997: 5).
Na verdade, ao longo dos anos 1980, as perspetivas pós-moderna, pós-estruturalista,
feminista, as teorias críticas da Escola de Frankfurt, o próprio Institucionalismo
Histórico e o Institucionalismo Sociológico e os construtivistas, teorias sociais por
natureza (WENDT, 1999: 1) tiveram pouca repercussão no debate teórico das Relações
Internacionais, mas tiveram o mérito de desmascarar a neutralidade científica dos
internacionalistas, discutindo o seu papel na produção e reprodução do sistema
internacional e introduzindo a distinção entre teorias que solucionam problemas e
teorias críticas (HERZ, 1997: 5).

Assim, estas perspetivas abriram caminho para que, na década de 1990, o papel do
Direito Internacional e das organizações internacionais, a universalização dos regimes
democráticos liberais e a relação entre a paz e o comércio internacional – temas
especificamente idealistas – fossem recuperados na base da importância concedida à
normatividade do Paradigma Idealista. Afinal, do ponto de vista das abordagens
reflexivistas, a complexidade do sistema internacional a partir do final da Guerra Fria
exige a compreensão da cooperação internacional através da tradição idealista, que
significa “a crença de que práticas e instituições podem ser modificadas, gerando a
reforma do sistema” (HERZ, 1997: 5), numa base normativa, que encara as ideias
enquanto variável explicativa dos fenómenos internacionais.

Neste sentido, os anos 1990 assumem-se como a década da crítica ao positivismo e ao


empiricismo, embora o Paradigma Realista/Neorrealista não deixe de continuar a ser
utilizado. Se os anos 1970 haviam assinalado o Realismo do pós-Guerra como incapaz
de explicar os fenómenos transnacionais e da interdependência por se basear em
premissas equivocadas, os institucionalistas neoliberais e os partidários das
perspetivas reflexivistas evidenciavam nos anos 1980 que a epistemologia pós-
positivista não era capaz de conviver com fenómenos como as instituições
internacionais. A verdade, porém, é que os institucionalistas neoliberais incorporaram
conceitos-chave do Neorrealismo, como poder e racionalidade, enquanto as
perspetivas reflexivistas foram marginalizadas (HERZ, 1997: 6).

Assim, na década de 1990 estrutura-se o segundo grande debate das Relações


Internacionais, entre neorrealistas e institucionalistas neoliberais, ainda num quadro
amplamente racionalista, embora as perspetivas não racionalistas ancoradas numa
metodologia de base crítica ao positivismo ganhassem dinâmica, vindo a organizar a
Teoria das Relações Internacionais para o século XXI, quando se assistiria à composição
do terceiro grande debate das Relações Internacionais, entre racionalistas e
abordagens reflexivistas.

De facto, a introdução, em força, do papel das ideias nos estudos internacionalistas


promoveu a estruturação do debate teórico entre racionalistas e partidários de
epistemologias interpretativas, sendo os racionalistas compostos por realistas,
neorrealistas, institucionalistas neoliberais e todas as outras teorias das Relações
Internacionais, enquanto as epistemologias interpretativas enquadram os pós-
modernos, pós-estruturalistas, teóricos críticos da Escola de Frankfurt,
institucionalistas históricos e sociológicos e os teóricos feministas (ADLER, 1999: 201-
202). Centrado sobre a natureza da realidade internacional e como esta deve ser
interpretada e explicada, o debate teórico entre racionalistas, de um lado, e
partidários de epistemologias interpretativas, de outro, ocorre, assim, num nível de
abstração muito mais elevado do que os dois debates anteriores, já que tanto realistas
e neorrealistas, quanto institucionalistas neoliberais e teóricos de outras Escolas de
Relações Internacionais passam todos a ser considerados, indiferentemente, como
racionalistas, uma vez que as suas premissas assumem sempre a lógica do
comportamento racional por parte dos agentes que estudam (ROCHA, 2002: 232). A
estes racionalistas contrapõem-se os partidários de epistemologias interpretativas,
que Robert Keohane (1988: 46) apelida de reflexivistas.

Segundo Emanuel Adler (1999: 204), realistas como Hans Morgenthau (1948) e Morton
Kaplan (1957) e neorrealistas como Kenneth Waltz (1979) e Robert Gilpin (1981),
assentes numa ontologia positivista, explicam as relações internacionais como
respostas comportamentais dos Estados no seio do sistema internacional. Do lado
oposto, os partidários da ontologia pós-positivista interpretativa ou reflexivista1,
assentes numa filosofia relativista da ciência, para a qual o mundo natural e as
evidências empíricas pouco ou nada constrangem as crenças do indivíduo (LAUDAN,
1990: viii), procuram explicar as relações internacionais através do estudo das relações
sociais, já que o que importa no sistema internacional são as relações sociais
internacionais e, para que estas possam ser interpretadas, é necessário estudar a única
variável relevante, as ideias (ADLER, 204). Se os primeiros adotam uma metodologia de
base positivista, dita neopositivista, os segundos seguem uma metodologia de base
pós-positivista.

Estas abordagens relativistas, ancoradas na Sociologia interpretativista que toma o


conhecimento como uma realização coletiva origina um dilema descrito como círculo
hermenêutico já que, de cada vez que uma explicação para uma determinada situação
social é tentada, basear-se-á sempre em leituras anteriores, fornecendo sempre não
mais do que uma interpretação que por sua vez é já uma interpretação de algo
produzido a priori. O dado empírico destas análises será sempre “mais uma
interpretação, aberta a questionamentos por outras interpretações ou leituras”
(ADLER, 1999: 204).

1
Os partidários de epistemologias interpretativas ou reflexivistas tanto são os teóricos pós-modernos e
pós-estruturalistas como Richard Ashley e Rob Walker (1990), James Der Darian e Michael Shapiro
(1989), quanto teóricos críticos como Robert Cox (1986), Stanley Hoffman (1987) e Andrew Linklater
(1989, 1996), quanto ainda teóricos feministas como Anne Sisson Runyan e Spike Peterson (1991) e J.
Ann Tickner (1992).
Para Emanuel Adler (1999: 205), os institucionalistas, centrados sobre os interesses
materiais e ideais que, mais do que as ideias, governam a conduta humana e, assim, as
relações internacionais, coincidem com os neorrealistas no fundamento das suas
análises, porém introduzem as ideias nas suas avaliações, fazendo uma concessão aos
interpretativistas reflexivistas. Afinal, Robert Keohane e Judith Goldstein (1993: 3)
consideram que as ideias, entendidas enquanto “crenças mantidas pelos indivíduos”
podem afetar as escolhas e os resultados políticos no processo de escolha racional
para processamento das informações.

Segundo Keohane (1988: 46), o reflexive approach ou abordagem reflexivista consiste,


desta forma, numa abordagem sociológica ao estudo das instituições internacionais
que enfatiza o papel das forças sociais impessoais e do impacto das práticas culturais,
normas e valores que não resultam do cálculo dos interesses. Esta abordagem enfatiza
a natureza reflexivista do homem que, por conseguinte, origina instituições
internacionais também reflexivistas, razão pela qual, em última análise, a própria
política internacional tem também uma natureza reflexivista (KEOHANE, 1988: 46).

Esta natureza reflexivista da política internacional significa que a atividade institucional


internacional tem significados intersubjetivos, de acordo com os quais os indivíduos, as
organizações e os Estados se desenvolvem no contexto mais abrangente das
instituições internacionais. Assim, não se pode dizer que estas instituições sejam
apenas o reflexo das preferências e do poder das unidades que as constituem. Na
verdade, as instituições moldam, ajudam a formar e influenciam essas preferências e
esse poder. Dito de outro modo, as preferências e o poder das unidades que compõem
as instituições internacionais são afetados pelas instituições internacionais
internamente e não são apenas resultado das forças exógenas (KEOHANE, 1988: 46).

Através desta introdução das ideias, os institucionalistas acreditam, segundo E. Adler


(1999: 205), conseguir estabelecer uma terceira via entre as abordagens racionalistas
de base neopositivista e as abordagens reflexivistas de base pós-positivista. Porém, a
verdadeira terceira via entre os dois opostos é constituída, segundo Adler (1999: 205)
pelo Construtivismo, uma teoria social “segundo a qual o modo pelo qual o mundo
material forma a, e é formado pela, ação e interação humana depende de
interpretações normativas e epistémicas dinâmicas do mundo material”, podendo
enquadrar-se, nesta abordagem das Relações Internacionais, para além do próprio
Emanuel Adler, Alexander Wendt (1995, 1999), Martha Finnemore (1996 a, 1996 b),
Friedrich Kratochwill (1989), John Ruggie (1983, 1993), Nicholas Onuf (1989), entre
outros académicos.

O meio termo do Construtivismo assenta na possibilidade, exposta por Alexander


Wendt (1999: 39-40) de se poder utilizar, em termos metodológicos, mesmo se sendo
um forte defensor das ontologias idealista e holista, sob as quais assenta o seu
Construtivismo, a metodologia positivista. Wendt afirma, expressamente (1999: 39)
que “no que toca à epistemologia da ciência social, eu acredito piamente na ciência –
uma ciência plural, para ser preciso, na qual se confere um papel relevante à
«compreensão», mas sendo ciência em todo o caso. Eu sou um «positivista» “. Wendt
tem consciência que esta «mistura» entre a ontologia idealista-holista do
Construtivismo com a metodologia positivista característica a priori dos racionalistas o
coloca no meio do Terceiro Debate das Relações Internacionais, embora seu objetivo
não seja criar uma epistemologia eclética. Simplesmente, a ontologia idealista-holista
não implica necessariamente, do seu ponto de vista, uma epistemologia pós-
positivista, contrariamente ao que consideram John Ruggie e Friedrich Kratochwill
(WENDT, 1999: 40).

É neste sentido que Wendt (1999: 40) procura, com o seu Construtivismo estreito
(WENDT, 1999: 2), criar uma via média através do Terceiro Debate das Relações
Internacionais, buscando reconciliar o que, para muitos académicos, é tido à partida
como posições epistemológicas e ontológicas incompatíveis. Afinal, o que realmente
importa é o que existe e não a forma como os teóricos o interpretam. Ademais, a
ciência deveria ser, em vez de método-orientada, questão-orientada, já que a
importância das questões constitutivas origina um papel central, nas Ciências Sociais,
para os métodos interpretativos. No entanto, os pós-positivistas dão demasiada ênfase
à epistemologia, enquanto os positivistas deveriam ter a mente mais aberta, tanto
para as questões, tanto para as novas metodologias. O esforço de Wendt vai assim no
sentido de tentar uma via média entre estas duas filosofias opostas, que têm
dificuldade em falar entre si, e mostrar que, se os pós-positivistas podem dar menos
ênfase à epistemologia, também os positivistas podem ser abertos a novas questões
de pesquisa e a novos de métodos de investigação (WENDT, 1999: 40).

Você também pode gostar