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O rótulo não linear ou multilinear compreendia uma gama de propostas surgidas como

extensões do modelo gerativo clássico dentre as quais destacam-se a fonologia auto-segmental, a


métrica e a lexical, todas no âmbito da lingüística formal. A primeira baseia na concepção dos
traços como auto-segmentos (cf. Goldsmith, 1976) representados em diferentes planos (tiers) que
se organizam hierarquicamente em um esquema geométrico tridimensional (cf. Clements, 1985).
Quanto ao plano melódico, a teoria auto-segmental lida com o mesmo como se fora uma
sucessão de tons que se ligam à camada segmental, mediante processos de espalhamento,
governados por condições de boa formação e princípios de associação.
A revalorização da sílaba na fonologia a partir, principalmente, dos trabalhos de Kahn (1976)
e Hooper (1976) esta última sempre preferindo uma abordagem menos abstrata voltada para
restrições fonéticas de superfície antecedeu de imediato o surgimento da teoria métrica (cf.
Lieberman & Prince, 1977) marcada pela preocupação com o estudo de fenômenos prosódicos e
que trouxe à baila discussões acerca da existência ou não de uma estrutura interna na sílaba (cf.
Clements & Keyser, 1983 vs. Selkirk, 1984). A fonologia métrica propõe quer uma árvore, quer
uma grade como meio de representar o esquema acentual das línguas desde a sílaba até o nível
frasal, criando domínios prosódicos hierarquizados (cf. Selkirk, 1984 e Nespor & Vogel, 1986).
A fonologia lexical (cf. Kiparsky, 1982/1985 e Mohanan, 1982/1985), por sua vez, volta-se
para a interação entre a fonologia e os demais módulos da gramática, em especial entre a morfologia
e a fonologia, mediante a operação de regras cíclicas, aplicáveis em diferentes extratos no léxico,
cabendo ao último deles, alimentar o módulo sintático, no qual operariam regras pós-lexicais, não
cíclicas.
O mais recente de todos estes modelos formais é a teoria da otimalidade (cf. Prince &
Smolensky, 1993) que de início se propunha a ser um modelo não gerativo além de dar conta da
variação, propondo uma avaliação em paralelo de estruturas competitivas: a seleção do candidato
ótimo dependeria da escolha feita
pelos falantes da ordem prioritária de aplicação de um conjunto limitado de restrições universais.
Todas estas propostas constituem desdobramentos do modelo gerativo e não são excludentes.

FREITAS, Myrian. ROTEIRO LEF701


O modelo da fonologia lexical, desenvolvido inicialmente por Kiparsky (1982,1985) e Mohanan (1982,
1985), voltou-se para o estudo da interação entre a as regras fonológicas e a estrutura morfológica da palavra.
A motivação inicial para o desenvolvimento da teoria lexical foi um questionamento da posição
anteriormente assumida no SPE de que a função do componente fonológico era apenas de interpretar a saída do
componente sintático tendo acesso apenas à estruturação interna das palavras assinalada, mediante uso de
marcas de fronteira, à semelhança dos fonemas de juntura da tradição estruturalista, inseridas seguindo uma
motivação morfossintática e depois apagadas, segundo um procedimento ad hoc:

Exemplo: [s #[sn #[n #[adj # sincere #] [suf. ity ] #]] # [sv # [v # [v # prevail #] d # ]

O modelo da fonologia lexical, por outro lado, parte da concepção de um componente morfológico
independente que inclui um conjunto de regras de formação de palavras. Exemplo:
Regras de formação: V  N V (headhunt)
NNN (couve-flor)
V  Pref. V (refazer)
N  Adj Suf (lealdade)

As regras de formação podem ser encadeadas e operar de modo recursivo, cíclicas, sem que se possa
limitar a expansão máxima possível: constituir – constituição –constitucional – constitucionalidade -
constitucionalizar – constituicionalização, etc... Nem toda a seqüenciação, porém, é possível: há restrições à
combinação individual de morfemas, que depende da língua.
Cf. infeliz/desinfeliz mas não infelicidade/*desfelicidade, *desenfelicidade

Embora todas as regras que se aplicam no componente de formação de palavras sejam, por definição,
lexicais e sujeitas à ciclicidade, não estão previstas apenas regras deste tipo. Há regras que exigem referência ao
nível sintagmático: por exemplo, a regra de realização da vibrante em final de palavra no português seguida de
outra palavra iniciada por vogal (mar aberto). Estas regras aplicam-se após as palavras serem inseridas na
árvore sintática: ou seja, elas fazem referência à informação sintática e funcionam no módulo pós-lexical.
Portanto, todas as regras que se reportam à informação morfológica (rótulos categoriais, traços como [±
erudito] ou parentização interna) são lexicais, ao passo que as que se reportam à informação sobre estrutura
frasal são pós-lexicais. Assim, temos:

Modelo da Fonologia Lexical

Representações Subjacentes

Nível I Morfologia  Fonologia L


 É
Nível 2 Morfologia  Fonologia X
 I
Nível n Morfologia  Fonologia C
 O
Representação Lexical

Sintaxe  Fonologia pós-lexical


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O número de níveis lexicais não é universalmente fixo para todas as línguas. Para o inglês, Mohanan &
Halle (1985) e Mohanan (1985,1986) preferem admitir 4 níveis:

• Nível 1: derivação com afixos de classe 1 e flexão irregular


• Nível 2: derivação com afixos de classe 2
• Nível 3: composição
• Nível 4: flexão regular

As regras alofônicas situam-se todas no nível pós-lexical. Para explicar, por exemplo, as realizações do
/l/ que dependem de posição na sílaba, as informações sobre fronteiras silábicas sejam repassadas de um nível a
outro até a saída do nível 4; só então operariam as regras de ressilabação que, por sua vez, alimentariam a regra
de alofonia do segmento lateral.
Após aplicadas todas as regras fonológicas relevantes do último ciclo lexical, todas as fronteiras internas
são apagadas e produz-se uma representação lexical muito próxima da representação fonêmica clássica.
Estas representações são inseridas nas árvores sintáticas e só então aplicam-se as regras pós-lexicais,
recorrendo sempre que necessário às informações sintáticas. Assim sendo, toda a regra que se aplica a domínios
maiores do que a palavra (ou seja, que ultrapassa as suas fronteiras) é uma regra pós-lexical.

REGRA LEXICAL REGRA PÓS-LEXICAL

 pode referir-se à estrutura interna das palavras não se refere à estrutura interna das palavras

não pode se aplicar entre palavras pode aplicar-se entre palavras

pode ser cíclica não é cíclica

se for cíclica, então está sujeita à CCE é não-cíclica (logo, não está sujeita à CCE) 1

está sujeita ao PPE não é submetida ao PPE 2

 admite exceções não admite exceções

 precede as regras pós-lexicais é precedida por todas as regras lexicais

O maior problema para os fonólogos no que se refere ao módulo pós-lexical é a interação entre
informação sintática e prosódica. Muitas regras denominadas “sintáticas” podem ser, na realidade, prosódicas.
Muitos autores (cf. Nespor & Vogel, 1982, 1986) negam a relevância direta de informações sintáticas e
advogam que as regras pós-lexicais devem ser formuladas com referência a uma hierarquia prosódica que
pode incluir até 07 níveis, dependendo da proposta de análise: sílaba, pé, palavra fonológica, grupo clítico,
frase fonológica, frase entonacional e enunciado fonológico.
Embora seja possível regras de mapeamento entre a estrutura sintática e a prosódica, somente esta
última constitui um domínio relevante para a aplicação das regras fonológicas. É inegável, entretanto, o fato de
que tanto informações prosódicas como sintáticas são necessárias para explicar fenômenos tais como o da
liaison do francês. Há autores que adotam posições extremadas admitindo apenas acesso à hierarquia prosódica
ou acesso exclusivo à estruturação sintática. Na verdade, prosódia e sintaxe são independentes porém
interagem numa série de processos – quais os limites desta relação é ainda matéria de debates.

1
CCE = condição de ciclo estrito
2
PPE = princípio de preservação de estrutura (cf. grupos consonantais não admitidos no léxico, porque fogem aos padrões previstos
no sistema).
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A partir do final dos anos setenta, dados empíricos comprovaram a inadequação desta concepção linear
dos traços para lidar com os supra-segmentais dada a impossibilidade de traduzi-los por um só traço prosódico
binário, atributo de um único segmento vocálico (cf. Goldsmith).
Desenvolveram-se então diversas propostas de análise que, reunidas sob a denominação genérica de
modelos multilineares que, amparadas em comprovação empírica incorporaram à análise fonológica uma
hierarquia prosódica, uma teoria da sílaba e uma geometria de traços. O modelo auto-segmental baseia-se
na interação entre dois módulos (o segmental e o prosódico), duas representações (fonética e fonológica),
duas operações (espraiamento e desligamento) e dois princípios (PCL e PCO).
Os traços – a partir de então vistos como auto-segmentos, apresentam uma organização hierárquica
equivalente a uma estrutura geométrica, daí a denominação recebida de geometria de traços.
Esta geometria de traços exprime relações de dependência entre os traços, com base suas características
fonético-articulatórias e em seu funcionamento em processos fonológicos naturais. Foi proposta em primeiro
lugar por Clements (1985) e mais tarde revista por outros autores, dentre eles McCarthy (1988).
Clements concluiu que os traços deveriam, no nível representacional, apresentar uma organização
hierárquica, tanto em termos de sua ordenação seqüencial em unidades de nível superior, quanto em termos da
reunião dos traços simultâneos que atuam como conjuntos funcionalmente independentes em vários tipos de
processos fonológicos. Propõe, então, uma representação multilinear em diversas camadas (tiers) independentes
às quais seriam atribuídos os traços ou grupamentos de traços, que poderiam assim atuar como unidades
funcionais em relação a diversas regras.
Nesta organização hierárquica os traços se organizam em nós de classe, hierarquicamente dispostos e
sob o domínio de um nó de classe superior – o nó de raiz, diretamente ligado à camada CV. Neste modelo
multilinear, um segmento fonético é definido como qualquer elemento da camada CV mais os traços que o
caracterizam. Assim, o conteúdo fonético de um segmento está expresso tanto no tier dos traços, quanto no
correspondente às classes e à raiz. Os nós de classe, referentes a traços segmentais, são os seguintes: nó de raiz,
nó laríngeo, nó supralaríngeo, nó de ponto de articulação e nó de modo de articulação. Os traços [nasal] e
[contínuo] parecem funcionar de forma relativamente independente, levando a quer que esta categoria de traços
prende-se diretamente ao nó supralaríngeo e de cavidade oral, respectivamente.
A multilinearidade traduz noções de domínio (o nó do nível superior domina o do nível inferior),
constituição imediata e adjacência (dois nós adjacentes são constituintes imediatos daquele do nível superior
adjacente, sob cujo domínio se encontram). A linha associando constituintes de diferentes tiers é uma linha de
associação e o seu cruzamento é vedado.
A organização hierárquica dos traços, fixa e universal, por sua vez reduz as regras a operações simples
que decorrem da própria geometria estabelecida, afetando traços individuais ou classes de traços: a assimilação
constitui um espraiamento de traços e a redução, um desligamento de linhas de associação, como a passagem de
s a h – mera perda da articulação supraglótica.

O esquema organizacional teria o aspecto abaixo:

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X

Raiz

Laríngeo

[sonoro]
[espandido]
[constrito] Supralaríngeo

[nasal]
cavidade oral

[contínuo] ponto

[labial]
[coronal]
[dorsal]
[radical]
[labiodental]
[posterior]
[distribuído]

A assimilação, por exemplo, pode ser vista como um processo de espraiamento de um elemento de uma
camada para uma nova posição na camada adjacente:
X Y X Y

A B A

Numa assimilação total, dá-se o espraiamento do nó de raiz; numa assimilação parcial, dá-se o
espraiamento de um nó de classe; e há ainda casos em que apenas um traço espraia. As regras de espraiamento,
expressas por linhas de associação, cujo cruzamento é universalmente proibido.

O modelo permite, ainda, melhor explicar o comportamento de:


(a) segmentos longos vistos como uma unidade do ponto de vista qualitativo e como duas unidades do ponto
de vista quantitativo, podendo resultar de uma assimilação total, apresentando-se com um só nó de raiz preso a
duas posições CV;
(b) consoantes geminadas tautomorfêmicas que manifestam-se como um só segmento mas correspondem a
duas unidades de tempo na camada CV e assim sendo, bloqueiam por exemplo a epêntese, porque esta violaria
a proibição universal de cruzamento de linhas de associação;
(c) seqüências homorgânicas seriam equivalentes a geminadas com a diferença de que teriam, no caso, um
só nó de ponto de articulação.

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Outros processos comuns nas línguas humanas oferecem evidências adicionais em favor do modelo
multilinear. Na história da língua inglesa (Lass,1976), por exemplo, a redução das consoantes plenas em
posição final a [?] e [h] pode ser facilmente explicada pelo apagamento do conjunto de traços da cavidade oral,
restando apenas aqueles ligados ao mecanismo da glote.

Além de trabalhar apenas com estas duas operações – espraiamento e desligamento, o modelo
autossegmental atribui a boa formação das seqüências a duas únicas restrições: (i) a proibição do cruzamento de
linhas (doravante PCL) e (ii) o princípio do contorno obrigatório (doravante PCO), que proibe elementos
adjacentes idênticos, desencadeando processos de dissimilação, embora a universalidade desta última restrição
seja controversa assim como o domínio no qual opera.

Um espraiamento do nó de raiz implica todos os nós e traços sob seu domínio, ou seja, o segmento com
toda a sua especificação por traços. O desligamento do nó de raiz acarreta a redução do segmento a φ, ou seja,
seu apagamento, comumente acompanhado de um alongamento compensatório, situação que comprova a
validade do PCO.

Expressar estas oposições em termos n-ários implica em diferenças antes metodológicas do que
empíricas, mas as regras de caráter n-ário são bastante raras, exceto no que se refere a processos ligados ao grau
de elevação do corpo da língua com relação aos segmentos vocálicos. A geometria de traços é em sua essência
uma teoria de oposições multivalentes ligadas ao estado da glote e aos pontos de articulação.

O modelo auto-segmental extensivamente amparado em comprovação empírica prevê a interação entre


dois módulos (o segmental e o prosódico), duas representações (fonética e fonológica), duas operações
(espraiamento e desligamento) e dois princípios (PCL e PCO).

Embora opere com um sistema único de traços para consoantes e vogais, no que concerne aos traços de
ponto de articulação uma subcategorização se impõe entre (i) traços primários, como [labial], [coronal], [dorsal]
e [radical], em geral distintivos nas consoantes, e correspondendo aos quatro articuladores ativos que atuam em
sua produção, respectivamnte lábio inferior, lâmina, dorso e raiz da língua; e (ii) traços secundários, como
[alto], [posterior] e [arredondado], geralmente opositivos apenas para vogais. Embora segmentos vocálicos e
consonantais sejam sabidamente distintos do ponto de vista fonético, sua representação por um mesmo
conjunto de traços, pelo menos no que se refere ao grau de abertura e ao ponto de articulação, enfatiza o fato de
participarem freqüentemente da mesma classe natural.
Os traços de sonoridade, por sua vez, atribuem a cada segmento uma posição numa escala de sonoridade
ou abertura que vai das consoantes oclusivas até a vogal [a]:
O N L I E A onde:
- - - - - + baixo O =obstruinte
- - - - + + aberto N = oclusiva nasal
- - - + + + vocóide L = líquida
- - + + + + aproximante I = vocóide alto
- + + + + + soante E = vocóide médio
0 1 2 3 4 5 A = vocóide baixo

Este esquema sugere que o grau de abertura vocálica, assim como o de consoantes, desempenha um
papel na silabação. As regras de silabação são sensíveis à localização do segmento na escala acima e processos
de ditongação mostram-se sensíveis à posição do segmento vocálico na hierarquia de sonoridade.

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A Fonologia Gerativa Padrão não lidava com a sílaba, rejeitada por completo em razão
principalmente da dificuldade de conceituá-la, seja no nível fonológico, seja no nível fonético.

A sílaba é, de fato, unidade complexa. Sua estrutura caracteriza-se por um cume soante, vocálico,
onde se concentra a maior intensidade expiratória, tensão muscular, abertura e perceptibilidade acústica. A
sílaba pode compreender, ainda, elemento(s) pré-nuclear(es), explosivo(s), que crescem gradativamente em
força até o núcleo, e pós-nuclear(es), implosivo(s), que decrescem a partir do núcleo até o limite silábico. Os
fonemas pré-nucleares, crescentes, são fortes e os pós-nucleares, decrescentes, são fracos (cf. Straka). As
posições pré-nucleares, fortes, são mais resistentes a mudanças fonéticas do que as pós-nucleares. Há, pois,
na sílaba uma alternância rítmica de elevações e depressões, com função sinusoidal. A sílaba básica,
universal, compõem-se de dois elementos de oposição máxima, C + V, num esquema rítmico binário e
integra, como elemento primário, a cadeia fônica humana. A isto devemos a tendência a sílabas abertas: à
resistência segue-se a maior abertura possível (vogal), que pode ser refreada pela presença de uma
consoante implosiva, que dificulta a motricidade do ato. Daí, uma tendência à eliminação das codas.

Foi só com o surgimento das fonologias naturais preocupadas com as regras para seqüenciação
fonética (restrições de superfície) que a sílaba sob um prisma fonotático foi reincorporada às análises. O
tratamento destes modelos opta por restrições de superfície condicionadas por traços fonológicos com
conteúdo fonético e por fronteiras superficiais, dentre as quais a sílaba – unidade básica para expressar
restrições seqüenciais. Os segmentos passam a ser abordados como parte de um molde (frame) silábico
integrante de padrões sintagmáticos estruturados segundo princípios indispensáveis à compreensão de uma
série de regras fonológicas.
A sílaba, como unidade fonotática, é constituída por um ou mais segmentos e compreendendo um
núcleo obrigatório de natureza vocálica e margens opcionais consonânticas:
σ

(Ataque) Núcleo (Coda)

Mais tarde, este esquema silábico foi expandido para incorporar outro nível intermediário – a rima
silábica – cujos constituintes imediatos passaram a ser o núcleo e a coda:

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Goldsmith 1976

A contagem do número de sílabas em qualquer língua não se revela uma tarefa complexa, visto que
cada vogal coincide com uma sílaba. O problema maior reside em determinar as fronteiras entre as sílabas,
de vez que (i) o número de segmentos admissíveis nas margens, esquerda (ataque) ou direita (coda), varia de
língua para língua e (ii) ainda que duas línguas admitam o mesmo número de segmentos na margem podem
divergir quanto à natureza destes segmentos e sua seqüenciação.
Embora haja uma escala de sonoridade que traduz a tendência universal a um crescendo de
sonoridade em direção ao núcleo silábico, as línguas divergem bastante no que diz respeito às regras de
silabação que permitem inclusive, sob condições específicas, contrariar a referida tendência. Nesta escala, os
segmentos soantes (nasais, líquidas e glides), que evidenciam uma sonorização espontânea, ocorrem
preferencialmente mais próximos do núcleo do que os obstruintes (fricativos e oclusivos). Devemos a
Hooper (1975), a proposta de uma hierarquia universal de força pertinente aos segmentos integrantes da
sílaba. Segundo esta escala, é possível determinar os segmentos com maior probabilidade de ocupar o
núcleo, o ataque ou a coda silábicos, respectivamente:

MARGEM ESQUERDA NÚCLEO MARGEM DIREITA


obstruintes líquidas nasais glides vogais glides líquidas nasais obstruintes
(menos vocálico possível) (mais vocálico possível) (relativamente menos vocálico)
FORTE FRACO FRACO

A sílaba, portanto, entendida fonologicamente como uma seqüência de fonemas em termos dos quais
a fonotática da língua pode ser descrita e, ainda, como uma unidade de programação neurológica, compostas
por moras, constituintes menores que permitem distinguir sílabas breves ou leves (com uma mora) de sílabas
longas ou pesadas (com duas moras) reconquistou sua importância no desenvolvimento das teorias
fonológicas.

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Décadas de 70 e 80 – século XX

A proposta conhecida como teoria métrica, ofereceu uma alternativa ao tratamento dado em The
Sound Pattern of English (SPE) ao acento e a outros processos fonológicos a ele relacionados. Neste
trabalho, o acento, apesar de ser fenômeno relacional foi tratado em termos de valor absoluto, como um traço
n-ário atribuído a uma vogal, quando é impossível identificar um correlato acústico localizado para um dado
grau de acento. Esta visão do acento também não impõe limite máximo aos graus possíveis de acento
desconsiderando o fato de que o falante certamente não reconhece um número infinito deles. O modelo
métrico sugere uma análise mais adequada do acento, em termos de relações de proeminência entre
constituintes prosódicos hierarquicamente dispostos em camadas dentre as quais se inclui aquela referente à
sílaba.
Este novo modelo leva à construção de árvores métricas binárias com nós rotulados e que, até certo
ponto, refletem a constituição sintática. A atribuição de acento resulta da proeminência relativa entre
constituintes irmãos de cuja presença dependem os rótulos fraco (f) ou forte (F), ou seja, temos: F f ou f F.
Em cada par de constituintes irmãos será marcado como forte aquele que for o núcleo (head) do constituinte
que imediatamente os domina, sendo que o núcleo da árvore métrica não coincide necessariamente com o
núcleo (head) da árvore sintática. O elemento rotulado F é o mais proeminente da cadeia e denomina-se
elemento terminal designado – ETD

Objetivo: tratamento de supra-segmentos a partir de uma hierarquia de domínios prosódicos que incluem:

1 – sílaba
2 – pé = unidade menor do que a palavra, intermediária entre a sílaba e a palavra
3 – vocábulo ou palavra prosódica (não coincidente com a noção de palavra para a sintaxe)
4 – frase fonológica (ou sintagma fonológico) – delimitada por pausas na sentença
5 - frase entonacional (ou sintagma entonacional) – detentora de contorno melódico característico.
6 – enunciado fonológico.

Lieberman & Prince (1977)

Acento = marca de proeminência no limite direito de um domínio prosódico maior (palavra, frase)
No nível da palavra define-se como troqueu (cabeça à esquerda) ou iambo (cabeça à direita)
A atribuição de acento nas línguas faz-se obedecendo a uma tendência eurrítmica à isocronia (princípio de
alternância rítmica) que impede a ocorrência de colisões (clashes) e distanciamentos (lapses).
Em inglês, por exemplo, os autores propõem uma regra de inversão iâmbica que explica o
deslocamento de acento em “thirteen men” w s s  s w s para que não ocorram dois acentos fortes
adjacentes.
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A construção da grade métrica objetivaria estabelecer as condições exatas da inversão no nível do pé:

A inversão iâmbica pode ser apenas opcional no nível da palavra quando há uma sílaba fraca intercalada.
Assim, a colisão não obriga a inversão (Giergerich, 1984).

Se a grade métrica permite ler padrões de proeminência e o padrão de estruturação rítmica, a árvore
permitiria ler os padrões de proeminência acentual (Hayes (1983,1984).
Prince (1983) e Selkirk (1984) optam apenas pelo uso da grade com níveis correspondendo ás
categorias prosódicas e o problema passa a ser quantos seriam estes níveis. Selkirk propõe que cada sílaba
receba uma semi-batida rítmica e que a sílaba acentuada ganhe uma batida extra. Portanto, monossílabos
lexicais sofreriam acréscimo de uma batida rítmica (a razão para tanto não é, neste caso, prosódica).Estas
seriam batidas básicas não sujeitas a apagamento. As regras de eufonia permitiriam:
a) acréscimo de batidas (a direcionalidade como parâmetro definido pela língua);
b) movimento de batida (também sujeito à direcionalidade);
c) apagamento de batida; e
d) acréscimo de batidas silenciosas nas fronteiras de constituintes sintáticos para evitar colisões, seja:
• ao final da palavra (opcional);
• ao final de constituinte ramificado
• ao final de constituinte diretamente dominado por nó sentencial

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Giergerich optou pela árvore por ver na proposta da grade rotulada uma hierarquia disfarçada que
reflete informações morfossintáticas.
Segundo ele:
• A palavra ganha sua estrutura métrica no léxico, mas a árvore é construída a partir da estrutura de
superfície. Faz parte do componente métrico que transforma a forma fonológica para obtenção da
forma fonética.
Giergerich também introduz:
• a noção de sílaba desgarrada que são associadas ao pé precedente como em (good de)(tergentes)
• o acento silencioso para explicar os monossílabos lexicais (good ∅ ) e as pausas:

Hayes defende, por sua vez, o uso da árvore e da grade. Considera a árvore necessária porque a
estrutura métrica é diferente da sintática. Seu argumento mais forte é de que grades similares não explicam
porque uma adição de batida é vedada quando há ramificação à direita: overboiled (X) não pode sofrer adição
de batida em seu interior porque se refere em última instância a blues (ETD), o elemento terminal designado
em:

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