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V. 1 - 2007 ISBN 978-85-88505-65-0


Vera Pacheco Comissão Organizadora do III SPEL-SPADis
Edvania Gomes da Silva Coordenação Geral do Evento
Nirvana Ferraz Sampaio Vera Pacheco
Maria da Conceição Fonseca-Silva Edvania Gomes da Silva
Nilton Milanez Comissão Científica
(Organizadores) Maria da Conceição Fonseca-Silva
Nirvana Ferraz Santos Sampaio
Nilton Milanez

Copyright © 2007 by Edições Uesb


Todos os direitos desta edição reservados ao Grupo de Pesquisa em Estudos Lingüísticos (CNPq/Uesb) e
ao Grupo de Pesquisa em Análise de Discurso (CNPq/Uesb)
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9.610/98)

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Catalogação na publicação: Biblioteca Central da Uesb


Se52a III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e do III Seminário de Pesquisa em
Análise de Discurso (3. 2007: Vitória da Conquista, BA: Edições Uesb, 2007). Anais do
III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e do III Seminário de Pesquisa em
Análise do Discurso / Organização: Vera Pacheco, Edvania Gomes da Silva; Nirvana Ferraz
Santos Sampaio, Maria da Conceição Fonseca-Silva; Nílton Milanez.
Vitória da Conquista - 03 a 05 de outubro de 2007
496 p.
1 v.
ISBN 978-85-88505-65-0

1. Lingüística. 2. Língua e linguagem. 3. Análise do discurso. I. Universidade Estadual


do Sudoeste da Bahia. II. Pacheco, Vera. III. Silva, Edvania Gomes da. IV. Sampaio,
Nirvana Ferraz. V. Fonseca-Silva, Maria da Conceição VI. Milanez, Nílton. VII. Título.
CDD: 410

Ficha técnica

Editoração e normalização técnica


Maria da Conceição Fonseca-Silva
Marcos Sampaio e Renato Almeida
Grupo de Pesquisa em Estudos Lingüísticos (GPEL)
Revisão de linguagem
Grupo de Pesquisa em Análise de Discurso (GPADis) Cândida Mara Britto Leite
Edvania Gomes da Silva
Nirvana Ferraz Santos Sampaio
Vera Pacheco

Revisão técnica
Maria da Conceição Fonseca-Silva

Vitória da Conquista – Bahia


2007
SUMÁRIO EVIDÊNCIAS DA INTERFERÊNCIA DO CONHECIMENTO FONOLÓGICO NA AQUISIÇÃO DA
LÍNGUA ESCRITA
Kelly de Souza Nogueira
Vera Pacheco ...................................................................................................................................... 71

INVENTÁRIO DE PALAVRAS COM DITONGO E MONOTONGAÇÃO DE [aj]; [ej] e [ow]


APRESENTAÇÃO ............................................................................................................................... 13 Ivete de Oliveira Santos
Vera Pacheco
FONÉTICA/FONOLOGIA Valéria Viana Sousa ............................................................................................................................. 77

ANÁLISE DAS REGRAS DE EURRITMIA NA REALIZAÇÃO DE VOGAIS MÉDIAS EM VITÓRIA DA INVESTIGAÇÃO ON LINE DA PERCEPÇÃO DAS VOGAIS MÉDIAS PRETÔNICA: DADOS
CONQUISTA/BA PRELIMINARES
Audinéia Ferreira da Silva Cirlene de Jesus Alves
Vera Pacheco....................................................................................................................................... 17 Vera Pacheco ...................................................................................................................................... 83

AVALIAÇÃO COMPARATIVA ENTRE O PADRÃO FORMÂNTICO DAS VOGAIS MÉDIAS DE NOVAS EVIDÊNCIAS FONÉTICO-EXPERIMENTAIS PARA A NATUREZA BIFONÊMICA DA VOGAL
SÍLABA TÔNICA EM PALAVRAS PRIMITIVA E DERIVADA E DE SÍLABA ÁTONA EM PALAVRAS NASAL DO PORTUGUÊS BRASILEIRO
SUFIXADAS Luiz Carlos da Silva Souza
Priscila de Jesus Ribeiro Vera Pacheco ...................................................................................................................................... 89
Vera Pacheco ..................................................................................................................................... 23
O ACENTO NA LÍNGUA TAUREPANG (FAMÍLIA KARÍB)
AVALIAÇÃO ACÚSTICA DAS VOGAIS MÉDIAS ANTERIORES: ESTUDO COM DOIS Katia Nepomuceno Pessoa ................................................................................................................... 95
INFORMANTES
Marian dos Santos Oliveira .................................................................................................................. 29 REFLEXÕES ACERCA DOS PROCESSOS DE ENCADEAMENTO, VOCALIZAÇÃO E EPÊNTESE DO
/R/ NO DIALETO PAULISTA
AVALIAÇÃO DE OUTIVA DA QUALIDADE VOCÁLICA EM PALAVRAS DERIVADAS POR Cândida Mara Britto Leite ..................................................................................................................... 99
SUFIXAÇÃO
Vera Pacheco ...................................................................................................................................... 35 UM ESTUDO DO PROCESSO DE APAGAMENTO DE /R/ EM FUNÇÃO DE FATORES DE ORDEM
ESTRUTURAL-CONTEXTUAL
AVALIAÇÃO DO TEMPO DE RESPOSTA E DURAÇÃO DO VOT NA PERCEPÇÃO DE OCLUSIVAS Renato Abreu Soares
SURDAS E SONORAS Cândida Mara Britto Leite ..................................................................................................................... 105
Michael Douglas Silva Dias
Vera Pacheco ...................................................................................................................................... 41 AQUISIÇÃO E SINTAXE

AVALIAÇÃO DOS PROCESSOS FONOLÓGICOS EM REESCRITAS DE CRIANÇAS E ADULTOS A AQUISIÇÃO DE SUJEITO NULO NO PORTUGUÊS BRASILEIRO (PB): UM ESTUDO
Gisele Pires Caires COMPARATIVO
Vera Pacheco ...................................................................................................................................... Samile Santos Pinto
47 Telma Moreira Vianna Magalhães ......................................................................................................... 113

AVALIAÇÃO INSTRUMENTAL DOS CORRELATOS ACÚSTICOS DE TONICIDADE DAS VOGAIS A ORDEM DE AQUISIÇÃO DOS PRONOMES SUJEITO E OBJETO: UM ESTUDO COMPARATIVO
MÉDIAS BAIXAS EM POSIÇÃO PRETÔNICA E TÔNICA Tatiane Macedo Costa
Juscélia Silva Novais Oliveira Telma Moreira Vianna Magalhães ......................................................................................................... 119
Marian dos Santos Oliveira
Vera Pacheco ...................................................................................................................................... 53 AQUISIÇÃO DAS RELATIVAS PADRÃO EM PB DURANTE A ESCOLARIZAÇÃO
Letícia Souza Araújo
ESTUDO CONTRASTIVO DOS AMBIENTES FONOLÓGICOS PROPICIADORES DO ALÇAMENTO Adriana S. C. Lessa-de-Oliveira............................................................................................................. 125
DE /E/ > /I/ E /O/ > /U/
Jucélia Pereira Bomfim Matos AQUISIÇÃO DE CLÍTICOS E ESCOLARIZAÇÃO
Vera Pacheco Marcelle Teixeira Silva
Cândida Mara Britto Leite ..................................................................................................................... 59 Adriana S. C. Lessa-de-Oiveira ............................................................................................................. 129

ESTUDO FONÉTICO-EXPERIMENTAL DA INFLUÊNCIA DA PAUSA NA DURAÇÃO DE VOGAIS CONCORDÂNCIA NOMINAL DE NÚMERO NO PORTUGUÊS BRASILEIRO: O PAPEL DAS
ACOMPANHADAS DE OCLUSIVAS SURDAS E SONORAS VARIANTES NA CONSTRUÇÃO DE UMA GRAMÁTICA PARTICULAR.
Francisco Meneses Maria Bethânia Gomes Paes
Vera Pacheco ...................................................................................................................................... 65 Telma Moreira Vianna Magalhães ......................................................................................................... 137
CONTEXTOS DE NÃO-CONCORDÂNCIA NOS DADOS DE AQUISIÇÃO DO PORTUGUÊS O /S/ EM CODA SILÁBICA NO NORDESTE, A PARTIR DOS INQUÉRITOS DO PROJETO ATLAS
BRASILEIRO LINGÜÍSTICO DO BRASIL (ALIB)
Ingridd Michelle Lopes Pereira Cláudia Santos de Jesus
Telma Moreira Vianna Magalhães ......................................................................................................... 143 Jacyra Andrade Mota ......................................................................................................................... 211

ESTRATÉGIAS DE RELATIVIZAÇÃO NA FALA E NA ESCRITA: OS PRONOMES PESSOAIS-SUJEITO NO PORTUGUÊS A PARTIR DOS DADOS DO PROJETO
ANÁLISE EM TEXTOS DE ESTUDANTES DA SÉRIE FINAL DO ENSINO MÉDIO ATLAS LINGÜÍSTICO DO BRASIL
Sinval Araújo de Medeiros Jr. Isamar Neiva de Santana
Telma Moreira Vianna Magalhães ......................................................................................................... 149 Suzana Alice Marcelino da Silva Cardoso .............................................................................................. 217

O OBJETO DIRETO ANAFÓRICO E SUAS MÚLTIPLAS REALIZAÇÕES NO PORTUGUÊS OS PRONOMES PESSOAIS-SUJEITO NO PORTUGUÊS DO BRASIL: NÓS E A GENTE SEGUNDO
BRASILEIRO OS DADOS DO PROJETO ATLAS LINGÜÍSTICO DO BRASIL
Daiane Gomes Amorim Viviane de Jesus Ferreira
Telma Moreira Vianna Magalhães ......................................................................................................... 155 Suzana Alice Marcelino da Silva Cardoso .............................................................................................. 223

O OBJETO NULO NO DIALETO DE VITÓRIA DA CONQUISTA: UM ESTUDO COMPARATIVO PALATALIZAÇÃO DAS CONSOANTES OCLUSIVAS DENTO-ALVEOLARES EM INQUÉRITOS DO
Manoel Bomfim Pereira PROJETO ATLAS LINGÜÍSTICO DO BRASIL
Telma Magalhães ................................................................................................................................ 161 Milena Pereira de Souza.
Jacyra Andrade Mota ......................................................................................................................... 229
SINTAXE E SOCIOLINGÜÍSTICA
PARA UMA ABORDAGEM DIALETOLÓGICA “ESTRUTURALISTA” DO LATIM VULGAR:
A REALIZAÇÃO DO SUJEITO PRONOMINAL DE REFERÊNCIA ARBITRÁRIA NA COMUNIDADE VÄNÄÄNEN E O MÉTODO COMPARATISTA
LINGUÍSTICA DE VITÓRIA DA CONQUISTA Carlos Renato Rosário de Jesus .......................................................................................................... 235
Daiane Gomes Bahia
Elisângela Gonçalves NEUROLINGÜÍSTICA
Paula Barreto Silva .............................................................................................................................. 169
A LINGUAGEM E A MEMÓRIA NO ESTUDO DO CASO JFS: CONSIDERAÇÕES SOBRE A DOENÇA
ESTARÁ O PORTUGUÊS BRASILEIRO DEIXANDO DE SER LÍNGUA DE SUJEITO-PREDICADO? DE ALZHEIMER
Elisângela Gonçalves ........................................................................................................................... 175 Milena Pereira Silva
Silvana Fernandes de Andrade
FATORES CONDICIONADORES DO TÓPICO EM DESLOCAMENTO À ESQUERDA E Nirvana Ferraz Santos Sampaio ......................................................................................................... 241
TOPICALIZAÇÃO
Paula Barreto Silva ANOXIA NEONATAL E SUAS IMPLICAÇÕES NA LINGUAGEM ESCRITA
Elisângela Gonçalves Eliane Bomfim Lacerda
Daiane Gomes Bahia ........................................................................................................................... 181 Nirvana Ferraz Santos Sampaio ......................................................................................................... 247

O SUJEITO PRONOMINAL NULO E PLENO EM TEXTOS DE ESTUDANTES DO ENSINO MÉDIO AVALIAÇÃO DE LINGUAGEM E MEMÓRIA NAS FASES INICIAIS DA DOENÇA DE ALZHEIMER:
Iana Ferraz de Oliveira O PONTO DE VISTA DA NEUROLINGÜÍSTICA DISCURSIVA
Elisângela Gonçalves ........................................................................................................................... 187 Helen Lopes de Sousa
Milca Cerqueira Etinger Silva
DIALECTOLOGIA Nirvana Ferraz Santos Sampaio .......................................................................................................... 253

A EXPRESSÃO DE MODALIDADES “TÍPICAS” DO SUBJUNTIVO EM COMPLETIVAS, CONSTITUIÇÃO DA SIGNIFICAÇÃO NA AFASIA: PROCESSOS VERBAIS E NÃO-VERBAIS
ADVERBIAIS E RELATIVAS DE DUCUMENTO DO PORTUGUÊS DO SÉCULO XVI Nirvana Ferraz Santos Sampaio .......................................................................................................... 259
Rosana Ferreira Alves ........................................................................................................................ 195
ANÁLISE DE DISCURSO, LINGÜÍSTICA DE TEXTO E RETÓRICA
A VARIAÇÃO DIASTRÁTICA NO PORTUGUÊS DO BRASIL: PALATALIZAÇÃO DAS OCLUSIVAS
DENTO-ALVEOLARES EM INQUÉRITOS DO PROJETO ATLAS LINGÜÍSTICO DO BRASIL (ALIB) A ANÁLISE DO DISCURSO DE PÓS-POSSE (100 DIAS) DO PREFEITO JOÃO HENRIQUE
Andréa Mafra Oliveira dos Santos CARNEIRO: UM DIÁLOGO BAKHTINIANO
Jacyra Andrade Mota ......................................................................................................................... 201 Terezinha de Fátima de Matos Silva
Jaciara Ornélia Nogueira de Oliveira ................................................................................................... 267
AS VARIANTES DO FONEMA LATERAL PALATAL EM INQUÉRITOS DO PROJETO ATLAS
LINGÜÍSTICO DO BRASIL (ALiB A CONSTITUIÇÃO DAS MODALIDADES ENUNCIATIVAS EM O NASCIMENTO DA CLÍNICA
Dijeane de Almeida Lima de Oliveira Noélia Nascimento Ferraz
Jacyra Andrade Mota ......................................................................................................................... 205 Edvania Gomes da Silva
Maria da Conceição Fonseca-Silva ...................................................................................................... 273
A FORMAÇÃO IMAGINÁRIA EM SHREK: UMA NECESSIDADE DE (RE)AFIRMAÇÃO DA MEMÓRIA DISCURSIVA DO FEMININO NA PUBLICIDADE DE LINGERIES
CULTURA AMERICANA Daiane Rodrigues de Oliveira
Miriam Ramos dos Santos ................................................................................................................. 279 Maria da Conceição Fonseca-Silva
Edvania Gomes da Silva ..................................................................................................................... 361
A HETEROGENEIDADE TEXTUAL NA CANÇÃO EDUARDO E MÔNICA
Robson Batista de Lima ..................................................................................................................... 285 MEMÓRIA E ARQUIVO: FUNCIONAMENTO DISCURSIVO EM FOUCAULT E PÊCHEUX
Francisca Adriana Ferreira do Nascimento
A IDENTIDADE FEMININA NA FOTOGRAFIA PUBLICITÁRIA DA MODA Maria da Conceição Fonseca-Silva
Gesiel Prado Santos Edvania Gomes da Silva ..................................................................................................................... 367
Cláudia Rejanne Pinheiro Grangeiro .................................................................................................... 289
MEMÓRIA E INTERICONICIDADE NA CONSTRUÇÃO DO SUJEITO FEMININO POLÍTICO NA
A IMAGEM DO SANTO E O ÉTHOS DO PREGADOR: COMUNHÃO E CONTRADIÇÃO XILOGRAVURA DO CORDEL
Jaciara Ornélia Nogueira de Oliveira ................................................................................................... 295 Cláudia Rejanne Pinheiro Grangeiro .................................................................................................... 373

ANÁLISE DE DISCURSO E INTERPRETAÇÃO: A CONSTITUIÇÃO DOS EFEITOS DE SENTIDO MULHER E CONSUMO: DISCURSIVIDADE NA PUBLICIDADE DA PRIMEIRA METADE DO
Celma Oliveira Prado SÉCULO XX
Maria da Conceição Fonseca-Silva Beatriz Rocha de Oliveira
Edvania Gomes da Silva ..................................................................................................................... 301 Maria da Conceição Fonseca-Silva
Edvania Gomes da Silva ..................................................................................................................... 379
ANÁLISE DE UMA NOTÍCIA DE JORNAL: IMPLÍCITOS E NÃO-DITOS
Marília Flores Seixas de Oliveira .......................................................................................................... 307 O “MEDO” NA OBRA CRIME E CASTIGO DE DOSTOIÉVSKI: UM PRINCÍPIO DE ANÁLISE EM
BAKHTIN
ANÁLISE DISCURSIVA DAS LOGOMARCAS DAS ÚLTIMAS GESTÕES DO GOVERNO DO Wagner Ribeiro de Carvalho ............................................................................................................... 385
ESTADO DA BAHIA
André Silva Nascimento O BLOG JORNALÍSTICO EM QUESTÃO: UM SUPORTE PARA GÊNEROS DO JORNAL?
Luzimare Almeida Piloto ..................................................................................................................... 313 Mara Silva Ferraz
Nirvana Ferraz Santos Sampaio .......................................................................................................... 391
APONTAMENTOS SOBRE A CONSTITUIÇÃO DA AUTORIA EM RESENHAS ACADÊMICAS
Carla da Silva Lima ……………………………………………………………………………………………………………………….. 317 O DIÁLOGO ENTRE A PARAPLÉGICA E A SEXUALIDADE: MEMÓRIAS E SILÊNCIOS
Maria do Socorro Correia Lima ........................................................................................................... 395
CONSIDERAÇÕES SOBRE A CENA ENUNCIATIVA: A CONSTRUÇÃO DO ETHOS NOS BLOGS
Palmira Heine ................................................................................................................................... 323 O DISCURSO DO GOVERNO: PROPAGANDA INSTITUCIONAL OU PROPAGANDA POLÍTICO-
ELEITORAL?
CORPO E DISCURSO: A BUSCA PELA VISIBILIDADE NAS PAGINAS DO ORKUT Sidnay Fernandes dos Santos.............................................................................................................. 401
Gracielly Bittencourt Machado
Nilton Milanez ……………………………………………………………………………………………………………………………….. 329 O ETHOS NOS FESTIVAIS DO CIRCUITO BAIANO DA VIOLA
Andréa Betânia da Silva ..................................................................................................................... 407
DESIGUAIS EM IGUALDADE: UMA ANÁLISE DOS DISCURSOS NOS MANIFESTOS CONTRA E A
FAVOR DO PROJETO DE LEI Nº 73/99 (LEI DE COTAS) O QUE HÁ DE TÃO PERIGOSO E PODEROSO NO FATO DE AS PESSOAS RIREM E DE SEU RISO
Fábio Soares Gomes .......................................................................................................................... 335 PROLIFERAR INDEFINIDAMENTE?
Rosely Costa Silva Gomes .................................................................................................................. 411
ELEMENTOS CONSTITUINTES DO DISCURSO: UMA ANÁLISE EM REDAÇÕES ESCOLARES
Jamires Nobre Menezes de Oliveira .................................................................................................... 341 OLHARES AMEAÇADORES CONTRA O DESEJO DE SER O QUE SE É: DISCURSO E CORPO
Luara Vieira
ETHOS E POLÊMICA NA IGREJA CATÓLICA Nilton Milanez ................................................................................................................................... 417
Edvania Gomes da Silva ..................................................................................................................... 345
PALAVRA DITA, IMAGENS EM MOVIMENTO
EU SOU NORMAL? DISCURSO E CORPO NA REVISTA VEJA. Érica Karine Ramos Queiroz ............................................................................................................... 423
Cássia Dias do Carmo.
Nilton Milanez ................................................................................................................................... 351 PROPAGANDAS EM BAKHTIN
Aurea Virginia Nogueira Ferreira ........................................................................................................ 429
HUMOR E SEXO: FUNCIONAMENTO DISCURSIVO DE PIADAS
Liliana de Almeida Nascimento PUBLICIDADE E AULA DE PORTUGUÊS: COMO ESTUDAR EM SALA O DISCURSO DAS
Edvania Gomes da Silva PROPAGANDAS?
Maria da Conceição Fonseca-Silva …………………………………………………………………………………………………… 357 Urbano Cavalcante da Silva Filho ........................................................................................................ 435
QUESTÕES EPISTEMOLÓGICAS SOBRE OBJETOS DE DISCURSO E CONCEITOS
Leandro Chagas Barbosa
Maria da Conceição Fonseca-Silva
Edvania Gomes da Silva ..................................................................................................................... 441

RELEVÂNCIA DA REFERENCIAÇÃO PARA DIREÇÃO ARGUMENTATIVA


Maria Gorette da Silva Ferreira Sampaio ............................................................................................. 447

RETRATO DE FAMÍLIA IMAGENS E MEMÓRIAS DO SUJEITO NA MÍDIA


Nilton Milanez .................................................................................................................................. 451

SENTIDO E MEMÓRIA: AS DESIGNAÇÕES QUE REFEREM O PAPA BENTO XVI


Essiane Lemos Leal Sena
Edvania Gomes da Silva
Maria da Conceição Fonseca-Silva ...................................................................................................... 457

SOBRE A CONSTITUIÇÃO DO ETHOS PETISTA


Luis Cláudio Aguiar Gonçalves
Edvania Gomes da Silva
Maria da Conceição Fonseca-Silva ...................................................................................................... 461

SOBRE A PROBLEMÁTICA DE PÔR AS EMOÇÕES COMO OBJETO DE DISCURSO


Marinalva Vieira Barbosa ................................................................................................................... 467

UM TOM FEMININO: A CONSTRUÇÃO DO ETHOS NO EDITORIAL DA REVISTA ATREVIDA


Harlle Silva Costa .............................................................................................................................. 443

LINGÜÍSTICA APLICADA AO ENSINO DE L2

A AUTONOMIA DO APRENDIZ DE LÍNGUA INGLESA NO CENTRO DE APRENDIZAGEM


AUTÔNOMA DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS
Giêdra Ferreira da Cruz
Karine Patrícia Dias Cardoso .............................................................................................................. 481

CRENÇAS DE PROFESSORES DE ESCOLAS PÚBLICAS SOBRE OENSINO DE LEITURA EM


LÍNGUA INGLESA
Valméria Brito Almeida Vilela Ferreira ................................................................................................. 487

POR ONDE CAMINHAM A PERCEPÇÃO E A PRODUÇÃO DISTINTIVA DE SONS DO INGLÊS?


Joceli Rocha Lima .............................................................................................................................. 491
13

APRESENTAÇÃO

É com satisfação que apresentamos os Anais do III Seminário de


Pesquisa em Estudos Lingüísticos e o III Seminário de Pesquisa em
Análise do Discurso, realizados pelo Grupo de Pesquisa em Estudos
Lingüísticos (GPEL/CNPq/Uesb) e pelo Grupo de Pesquisa em Análise de
Discurso (GPADis/CNPq/Uesb), na Universidade Estadual do Sudoeste da
Bahia, campus de Vitória Conquista, no período de 03 a 05 de outubro de
2007.
Nos anais, constam os trabalhos que, submetidos à avaliação, foram
aprovados pela Comissão Científica para apresentação no III Spel-Spadis.
São 81 trabalhos que apresentam resultados de pesquisas em andamento e
de pesquisas concluídas, distribuídos da seguinte forma: 16 da área de
Fonética e Fonologia; 9 das áreas de Aquisição da Linguagem e Sintaxe; 4
das áreas de Sintaxe e Sociolingüística; 7 da área de Dialectologia; 4 da área
de Neurolingüística; 38 das áreas de Análise do Discurso, Lingüística do
Texto e Retórica; e 3 da área de Lingüística Aplicada ao Ensino de Línguas
Estrangeiras.
O volume dos anais contém ficha catalográfica, sumário com
nomes dos trabalhos em ordem alfabética, volume completo em PDF e
arquivos dos trabalhos em PDF disponibilizados para download .
Esperamos que a publicação por meio eletrônico possibilite maior
acesso e divulgação dos resultados de pesquisas desenvolvidas em diversas
universidades brasileiras.

Maria da Conceição Fonseca-Silva


Outubro de 2007.
FONÉTICA E FONOLOGIA
17 18
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

em sílaba pretônica em Vitória da Conquista/BA decorrente de regras de


ANÁLISE DO PADRÃO RÍTMICO ENVOLVIDO NA REALIZAÇÃO DE
eurritmia e da preferência pelo pé espondeu (seqüência de duas sílabas
VOGAIS MÉDIAS EM VITÓRIA DA CONQUISTA/BA∗
longas), como detectado por Oliveira e Pacheco (2006).
Audinéia Ferreira da Silva** Partindo dos achados de Oliveira e Pacheco (2006), Silva e Pacheco
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
audineia.ferreira@gmail.com (2007) avaliam a ocorrência dessas vogais em condição de Harmonia Vocálica

Vera Pacheco*** e mostram que a harmonização observada é fortemente determinada pelas


Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
vera.pacheco@gmail.com regras de eurritmia.
Com base nos achados de Oliveira e Pacheco (2006) e de Silva e
Pacheco (2007), o objetivo do presente trabalho é determinar as regras de
RESUMO
Partindo da análise realizada por Oliveira e Pacheco (2006) de que as vogais médias baixas eurritmia da comunidade lingüística de Vitória da Conquista, identificando o
realizadas em Vitória da Conquista/BA carregam uma certa tonicidade e por isso constituem
sílabas longas, o objetivo desse trabalho é inventariar os pés métricos envolvidos na realização das número permitido de sílabas átonas que ocorre entre duas sílabas tônicas,
vogais médias baixas em posição pretônica. Os resultados encontrados mostram que o ritmo da
fala dessa comunidade lingüística se caracteriza por pés métricos caracterizados por seqüências de bem como identificar outros pés métricos.
sílabas longas.

PALAVRAS-CHAVE: Pés métricos. Vogais médias baixas. Sílaba pretônica


MATERIAL E MÉTODOS

Para a realização deste trabalho foi utilizado o corpus coletado por


INTRODUÇÃO Oliveira e Pacheco (2006). Esse corpus é constituído de entrevistas naturais,
realizadas com três informantes de Vitória da Conquista, sendo duas (2)
O ritmo se refere a uma regularidade percebida nas unidades mulheres e um (1) homem. Cada entrevista tem aproximadamente 30 min.
proeminentes na fala (CRYSTAL, 2000). de duração.
Cagliari e Abaurre (1986) afirmam que o ritmo pode influenciar Além das entrevistas, foram gravadas três seções do telejornal local,
processos fonológicos segmentais, como o abaixamento vocálico que ocorre com média de duração de 17 minutos. Essas gravações foram feitas por um
Software denominado Sound forge (cf. OLIVEIRA; PACHECO, 2006).
Para a análise dos dados foi feita transcrição ortográfica das entrevistas
e do telejornal. Em seguida foram selecionadas palavras que possuíam vogal

Trabalho vinculado ao projeto de pesquisa “Investigação fonético-fonológica das vogais médias abertas em posição pretônica na fala de Vitória média tanto em sílaba tônica quanto pretônica, depois essas palavras foram
da Conquista/BA”, coordenado pela Profa. Dra. Vera Pacheco.
** Bolsista Fapesb. Aluna regular do curso de Letras, IV semestre. UESB – Campus de Vitória da Conquista
***Orientadora. Doutora em Lingüística.

______________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 17-21.. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
19 20
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

transcritas foneticamente. Foram geradas, por meio de oitiva, as pautas Espondéu. Assim, a ocorrência dessa vogal em sílaba pretônica caracteriza
acentuais de palavras isoladas, determinando o tipo de pé métrico. uma sílaba longa.
Além do pé espondeu, outros tipos métricos podem ser identificados
RESULTADOS E DISCUSSÕES em função da ocorrência da vogal média baixa em posição pretônica (Quadro
1).
Do ponto de vista fonético, segundo Cagliari (1991), duração ou mora
fonética e mora fonológica constituem dois atributos silábicos diferentes. As Quadro 1 – Exemplos de pauta acentual de palavras com
vogais médias baixas em posição pretônica
moras fonéticas se referem às durações relativas das sílabas que podem ser
átona ou tônica, enquanto as moras fonológicas se referem ao peso silábico e
podem sem longas ou breves.
A alternância entre as sílabas longas e breves estabelece o pé fonético
que, a depender do tipo de alternância dessas sílabas, pode ser de diferentes
tipos, como estabelece a métrica Latina: espondeu = duas longas, troqueu
ou coreu = uma longa e uma breve; dátilo = uma longa e duas breves,
iambo = uma breve e uma longa; pirríquio = duas breves; anapesto ou
antidátilo = duas breves e uma longa; tríbaco = três breves; molosso = três
De acordo com as pautas acentuais apresentadas no quadro 1, verifica-
longas; coriambo = uma longa duas breves e uma longa; proceleusmático =
se que as ocorrências de a e d constituem o pé métrico malosso,
quatro breves; Antibáquio ou Palimbáquio: duas sílabas longas e uma breve
caracterizado por três sílabas longas. As ocorrências de b, c, e e h
(CAGLARI, 2002, p. 35, entre outros).
apresentam padrão de duração silábico típico do pé antibáquio, qual seja,
Considerando-se os diferentes tipos de pés métricos, verifica-se que a
três sílabas longas e uma breve. As ocorrências de f e g apresentam a
emergência da vogal média baixa em posição pretônica estabelece o pé
composição de um troque, uma sílaba breve e uma longa, e um antibáquio,
espondeu, como em [ ] (OLIVEIRA, PACHECO, 2006; SILVA, PACHECO,
duas longas e uma breve e, finalmente, a ocorrência em i se caracteriza pela
2007), à semelhança do que ocorre em [ ], em que, verifica-se,
composição de um espondeu, duas longas, e um troqueu, uma longa e uma
segundo Wetzels (1992), um processo de neutralização das vogais médias
breve.
em proveito das médias baixas. Segundo esse autor, essa neutralização é
decorrente do condicionamento prosódico caracterizado como Abaixamento

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
21 22
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

CONCLUSÕES

Considerando a caracterização métrica das palavras nas quais se


observa o baixamento pretônico, verifica-se uma predominância considerável
dos pés métricos que se caracterizam pela presença de sílabas longas:
malosso e espondéu, preferência, portanto, dessa comunidade lingüística por
sílabas mais longas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CAGLIARI, L. C.; Dossiê Prosódia. 2002 (ms).


CRYSTAL, D. Dicionário de Lingüística e Fonética. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor,
2000. 275.
OLIVEIRA, J. N.; PACHECO, V. Investigação da realização das vogais médias em
Vitória da Conquista. Vitória da Conquista: UESB, 2006. (Relatório de pesquisa)
SILVA, A. F.; PACHECO, V. A relação entre harmonia vocálica e condicionamento prosódico
na realização das vogais médias no dialeto de Vitória da Conquista – BA. In: __ Anais do
II Seminário de pesquisa e Extensão em Letras (SEPEXLE), UESC, 2007.
WETZELS, W. L. Harmonização vocálica, truncamento, abaixamento e neutralização no
sistema verbal do Português. Cadernos de Estudos Lingüísticos, Campinas, n. 21, p.
25-58, 1992.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
23 24
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delimitando diferenças dialetais e partindo dos achados de Oliveira e Pacheco


AVALIAÇÃO ACÚSTICA DAS VOGAIS MÉDIAS ANTERIORES:
(2006), neste trabalho comparamos as características acústicas de vogais
ESTUDO COM DOIS INFORMANTES
médias realizadas em posição tônica e pretônica por dois informantes: um da
Marian dos Santos Oliveira* localidade de Vitória da Conquista – Bahia – e outro, da localidade de
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
marian_oliveira2004@yahoo.com.br Bragança Paulista – São Paulo, a fim de determinar possíveis diferenças na
configuração formântica das vogais médias abertas realizadas em posição

RESUMO tônica e pretônica, considerando que os dois dialetos em questão apresentam


Considerando que o sistema fonológico geral de uma língua apresenta organizações diferenciadas
em diferentes comunidades lingüísticas, delimitando diferenças dialetais, neste trabalho
características fonéticas distintas na realização desses sons, a saber: no
comparamos o padrão formântico da vogal média anterior realizada em posição tônica e pretônica,
por um informante baiano e outro paulista, a fim de determinar possíveis diferenças na
dialeto paulista só ocorrem vogais médias abertas em posição tônica,
configuração formântica dessas vogais, uma vez que esses dialetos apresentam características enquanto que no dialeto conquistense as médias abertas ocorrem tanto em
fonéticas distintas na realização desses sons. No dialeto paulista ocorrem, auditivamente, vogais
médias abertas em posição tônica, enquanto no dialeto conquistense, as médias abertas ocorrem posição tônica quanto em posição pretônica.
tanto em posição tônica quanto em posição pretônica.
Diante disso, o presente trabalho busca investigar o padrão acústico da
PALAVRAS-CHAVE: Acústica. Fonética. Vogais.
vogal média anterior realizada por falantes naturais de São Paula e da Bahia
com vistas a fornecer pistas acústicas que endossem a diferença auditiva
encontrada nesses dois dialetos.
INTRODUÇÃO

MATERIAL E MÉTODOS
As línguas naturais possuem uma organização geral interna de seu sistema
fonológico. Essa organização geral pode apresentar uma reorganização em
Para as gravações foram utilizados uma placa de som AMAudio modelo
função de particularidades idiossincráticas de determinadas comunidades
MobilePreUSB inserida a um microcomputador portátil Dell modelo
lingüísticas. Assim, considerando que o sistema fonológico geral de uma 1
Latitude110L, e microfone, de cabeça, modelo C420 .
língua, neste caso particular, o Português do Brasil (PB), apresenta
A gravação do corpus, realizada em cabine acusticamente tratada,
organizações diferenciadas em diferentes comunidades lingüísticas
partiu da frase veículo Digo ___________ baixinho, cujo espaço foi
preenchido com logatomas trissílabos paroxítonos com a consoante oclusiva
bilabial surda /p/ montados, considerando as quatro vogais médias, quais

1Todos esses equipamentos foram disponibilizados pelo LAFAPE - Laboratório de Fonética e Psicolingüística do IEL/Unicamp, coordenado pela
Profa. Drª. Eleonora Albano.
*Professora do Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários. Doutoranda em Lingüística na Universidade Estadual de Campinas – Unicamp.

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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 23-28. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
25 26
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sejam: as abertas /, / e as fechadas /e, o/ e as posições tônicas e

pretônica. Cada frase foi repetida cinco vezes por cada um dos informantes.
Partindo da existência dessas vogais, bem como da posição que elas ocupam,
foram criadas quatro frases veículo que foram repetidas cinco vezes pelos
dois informantes investigados. As palavras que resultaram desse processo de
elaboração foram:
Para poder nos certificar das diferenças entre as produções vocálicas Diferentemente do que foi verificado para as vogais médias altas em
dos informantes, os parâmetros acústicos analisados foram F1, F2 e F3 com posição tônica, o padrão formântico das vogais médias baixas nessa posição,
auxílio do software Praat. Para análise, foi utilizada a estatística descritiva, tende a ser diferente entre falantes paulista e baiano. O valor de p para F1
além do teste estatístico Anova-um critério. O Software usado para rodar o (p=0.01, tabela 1) indica que esse formante possui maior freqüência
teste estatístico foi o Bioestat v. 3.0. Foi considerada diferença significativa significativa na vogal produzida por um baiano.
quando p < 0,05. O F1 de um padrão formântico vocálico constitui um parâmetro acústico
Os informantes aqui investigados, duas mulheres de cerca de trinta associado ao grau da abertura da mandíbula (FANT, 1960). Vogais que são
anos de idade, serão identificados como M, o informante baiano e como L, o produzidas com pouca abertura mandibular tendem a apresentar valores de
informante paulista. F1 baixos, e vogais com valores de F1 mais altos se caracterizam por serem
produzidas por maior abertura da mandíbula. Nesse sentido, o maior valor
RESULTADOS E DISCUSSÃO significativo de F1 encontrada para a vogal média baixa anterior produzidas
por um falante da Bahia é uma evidência acústica de que essa vogal tende a
Considerando os valores de p (>0.05) apresentados na tabela 1, ser mais aberta.
verifica-se que, em posição tônica, falantes paulista e baiano tendem a
realizar uma vogal média anterior com um padrão formântico que não
apresenta diferença significativa nos valores médios de freqüências de F1 e
F2. Dessa forma, os dados acústicos endossam as evidências auditivas de
que, em se tratando das vogais médias anteriores, em posição tônica, não se
observa qualquer diferença entre o falar de uma pessoa nascida no estado de
São Paulo e outra nascida no estado da Bahia.

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Diferença estatística também foi encontrada para os valores de F1 de OLIVEIRA, J. S. N; PACHECO, V. Investigação fonético-fonológica das vogais
médias abertas em posição pretônica na fala de Vitória da Conquista/BA.
vogais médias anteriores de sílaba pretônica produzidas por um paulista e Relatório Semestral CNPq, 2006.
por um baiano (tabela 3).

O maior valor significativo de F1 para M indica que, na posição


pretônica, tem-se uma vogal média anterior que se comparada com a
produzida por L é mais baixa.

CONCLUSÕES

Os resultados obtidos são evidências acústicas de que: a) as vogais


médias baixas anteriores produzidas pelos informantes M e L são diferentes
na posição tônica, tendendo a ser mais baixa na fala de falantes baianos; b)
em posição pretônica, as vogais médias anteriores produzidas pelos falantes
investigados são diferentes, corroborando a constatação auditiva de que os
falantes baianos têm vogal baixa em posição pretônica, enquanto falantes
paulista não o tem.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CÂMARA JR., J. M. [1970]. Estrutura da língua portuguesa. 21a ed. Vozes, Petrópolis,
1992. Edição original: 1970.
FANT, G. Theory of Speech Production.The Hague: Mouton, 1960

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29 30
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defende a idéia de que a língua é organizada em estratos, os quais são


AVALIAÇÃO COMPARATIVA ENTRE O PADRÃO FORMÂNTICO DAS
VOGAIS MÉDIAS DE SÍLABA TÔNICA EM PALAVRAS PRIMITIVA E domínios tanto para regras fonológicas quanto para regras morfológicas. Na
DERIVADA E DE SÍLABA ÁTONA EM PALAVRAS SUFIXADAS* parte mais profunda do léxico estão às raízes da língua, as quais são
potenciais candidatas ao recebimento de afixos, que funcionam como
Priscila de Jesus Ribeiro**
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia modificadoras do radical a que se agregam. Os afixos que se antepõem ao
priscribeiro@bol.com.br
radical são os prefixos e aqueles que se pospõem são os sufixos.
Vera Pacheco***
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia Uma das regras fonológicas que pode ocorrer no processo de formação
vera.pacheco@gmail.com
de palavras é a mudança do acento, que pode passar de primário para

secundário, como em [s ] e [ ]. Além do deslocamento do


RESUMO
Este trabalho tem o objetivo de investigar se as vogais médias do dialeto de Vitória da acento e a emergência de um acento secundário, o processo de formação de
Conquista/BA sofrem algum tipo de alteração vocálica com a mudança do acento no processo de
formação de palavras. Para isso, foram realizadas gravações de frases veículos. Em seguida, os palavras acarreta mudança na qualidade vocálica da vogal da sílaba tônica
três primeiros formantes das vogais em questão foram medidos e submetidos ao teste Anova-um
critério. Os resultados indicam que a vogais médias [ ] de palavras prefixadas são mais baixas do da raiz, a exemplo do que acontece com [b la] e [beleza] em que se
que as vogais de palavras primitivas e sufixadas, e que as vogais médias [ ] de sílaba sufixada e
prefixada são acusticamente distintas. verifica a mudança de uma média baixa para uma média alta,
PALAVRAS-CHAVE: Acento. Formantes. Prefixo. Sufixo. Vogais médias. restabelecendo a neutralização entre as vogais médias em posição pretônica
que ocorre em muitos dialetos.
Considerando que existem dialetos, como o de Vitória da Conquista,
que vogais médias baixas ocorrem em posição pretônica, neste trabalho
INTRODUÇÃO
propõe-se investigar acusticamente as vogais médias pretônicas de palavras
derivadas por prefixação e sufixação cujas palavras primitivas apresentam
A fonologia lexical é um modelo teórico, (KIPARSKY; MOHANAN, 1982
vogais médias baixas na sílaba tônica.
apud HERNANDORENA, 1996) que tem como objeto de estudo a relação
entre os processos fonológicos e morfológicos de uma língua. Esse modelo
MATERIAL E MÉTODO

Para alcançar o objetivo proposto, palavras primitivas e suas derivadas


foram inseridas na frase veículo “digo______baixinho”. Sendo assim, foram
*Trabalho vinculado ao projeto de pesquisa “Investigação fonético-fonológica das vogais médias abertas em posição pretônica na fala de Vitória da
Conquista/BA” coordenado pela Profa. Dra. Vera Pacheco.
** Iniciação Científica Voluntária. Aluna regular do curso de Letras. UESB – Campus de Vitória da Conquista.
***Orientadora. Doutora em Lingüística.

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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 29-33.
31 32
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analisadas palavras do tipo, delicado, indelicado, delicadamente, produzir, prelo) para a vogal [ ], em posição pretônica, que varia de 630 a 660 Hz.
reproduzir, produzido, dentre outras. Assim, apesar da diferença atestada, o padrão formântico encontrado para
Cada frase foi lida pelo informante por três vezes e gravadas através essa vogal não indica ter havido mudança de qualidade vocálica no processo
de um aparelho digital. Foram medidos os três primeiros formantes por meio de prefixação.
do software Praat. Em seguida, as medidas foram submetidas ao teste
Anova-um critério com vistas a certificar se as médias dos três primeiros
formantes das vogais diferiam nas sílabas tônica e átona da palavra primitiva
e das prefixadas.
Assim, analisaram-se as seguintes vogais:

--Vogal Média Baixa (VMB) de sílaba tônica em palavras primitivas,


prefixadas
--Vogal Média Baixa (VMB) de sílaba átona em palavras sufixadas
A mesma tendência é observada para a vogal média baixa posterior,

RESULTADOS E DISCUSSÃO [ ], que mostrou ser igual tanto em sílaba tônica, no caso das palavras
primitivas, quanto em sílaba postônica, no caso das palavras sufixadas

Os dados apresentados na tabela 1 mostram que, apesar do (tabela 2). Para essa vogal, o deslocamento de acento também não alterou a

deslocamento do acento, as palavras sufixadas apresentam padrão sua qualidade vocálica.

formântico semelhante ao da palavra primitiva. Isso significa que, ao perder No caso das palavras prefixadas, o valor de F1, como acontece na vogal

a tonicidade com a sufixação, a vogal de núcleo silábico não mudou a [ ], é diferente estatisticamente do F1 da vogal na palavra primitiva e da

qualidade vocálica, apresentado um padrão fomântico típico de uma vogal palavra sufixada. Mas, diferentemente daquela vogal, o F1 encontrado para

média baixa em posição tônica. [ ] (680 Hz), na palavra prefixada, é bem distante dos valores encontrados

O padrão formântico da vogal da sílaba pretônica na palavra prefixada por Ribeiro e Pacheco (2007) para essa vogal, nessa posição, que tem o

apresenta uma média diferente da vogal na palavra primitiva e sufixada. primeiro formante em torno 731 Hz. Assim, para a vogal [ ], a operação

Apesar da diferença, o valor do primeiro formante encontrado para essa morfológica de prefixação, pode estar provocando mudança na qualidade

vogal (642 Hz) é próximo ao do valor encontrado por Ribeiro e Pacheco (no vocálica.

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33 34
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CONCLUSÕES

O deslocamento de acento nas palavras sufixadas não muda na


qualidade vocálica das vogais [ ],[ ]. A palavra prefixada tende a
apresentar uma vogal com F1 relativamente menor, o que não implica em
mudança na qualidade vocálica para [ ]. Para [ ], contudo, há indícios de
mudança na qualidade vocálica: o F1 da prefixada apresenta valores
distantes daqueles encontrados para a vogal em posição pretônica. Para
maior solidez dos resultados aqui obtidos, experimentos mais robustos
devem ser conduzidos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

HERNANDORENA, C. L. M. Introdução à Teoria Fonológica In: BISOL, L. (org)


Introdução a Estudos de Fonologia do Português Brasileiro, Porto Alegre:
EDIPUCRS, 1996.
RIBEIRO, P. J.; PACHECO, V. Avaliação contrastiva do padrão formântico de vogais
médias baixa em posição pretônica e tônica na fala de falantes naturais de
Vitória da Conquista/BA. [no prelo].

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35 36
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média aberta que ocupava o núcleo da sílaba tônica da palavra primitiva.


AVALIAÇÃO DE OUTIVA DA QUALIDADE VOCÁLICA EM PALAVRAS
Muito embora o processo de derivação acarrete mudança da sílaba tônica,
DERIVADAS POR SUFIXAÇÃO
em alguns casos, a qualidade vocálica do núcleo da sílaba tônica da palavra
Vera Pacheco primitiva permanece, apesar da perda da tonicidade, como ocorre em
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia*
vera.pacheco@gmail.com

Nesse sentido, há ocorrência de vogais médias abertas em uma posição


que não a tônica. A manutenção da qualidade vocálica, contudo, não ocorre
RESUMO
Este trabalho objetiva avaliar, auditivamente, se a adição dos sufixos diminutivo e aumentativo para todos os tipos de sufixos adicionados à base, como por exemplo, em
altera a altura de uma vogal média baixa de sílaba tônica presente na palavra primitiva. Busca-se
verificar se a perda de tonicidade leva uma vogal média baixa a tornar-se média alta. Foi montado .
um corpus composto por palavras primitivas com vogal média baixa em sílaba tônica e suas
respectivas derivações por sufixação. Foram realizadas gravações dessas frases e transcrições Considerando: a) a realização atípica, em palavras sufixadas, das vogais
fonéticas das mesmas. Os resultados obtidos mostram que a perda de tonicidade da vogal média
baixa pode ou não acarretar mudança na qualidade vocálica em contexto de derivação. médias abertas em posição átona; b) que essa realização não ocorre com
PALAVRAS-CHAVE: Fonética. Vogal média. todos os sufixos adicionados à base, o presente trabalho propõe uma
investigação de outiva da qualidade vocálica do núcleo da sílaba que é tônica
na palavra primitiva e pretônica na palavra sufixada.

INTRODUÇÃO
MATERIAL E MÉTODOS

Segundo a proposta de Câmara Jr. (1970), com base no dialeto carioca,


o quadro vocálico do PB é composto por sete vogais na posição tônica e cinco Para a realização desta pesquisa, foi montado um corpus composto por

vogais na posição pretônica, o que se deve ao processo de neutralização 20 palavras (Quadro 1) (substantivo ou adjetivo) primitivas com vogais

entre as vogais médias abertas e fechadas em proveito dessa última. Assim, médias abertas (10 médias arredondadas e 10 médias não arredondadas)

vogais médias abertas ocorrem predominantemente nas sílabas tônicas. ocupando o núcleo da sílaba tônica. Todas as palavras são dissílabos,

Câmara Jr. (1970) mostra, contudo, um ambiente não tônico de paroxítonos ou oxítonas, com estrutura silábica CV.CV.

ocorrência dessas vogais. Segundo o lingüista, em alguns casos de derivação


sufixal, a palavra derivada tende a manter, na sílaba não tônica, a vogal

* Doutora em Lingüística pela Unicamp.

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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 35-40. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
37 38
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Quadro 1 – Relação das palavras primitivas e suas respectivas pretônica, não altera a sua altura. Nesses casos, a adição do diminutivo não
palavras derivadas por sufixo de diminutivo e aumentativo
VOGAL MÉDIA ANTERIOR VOGAL MÉDIA POSTERIOR implica em mudança da altura vocálica.
Bela  belinha Bela  belona Bola  bolinha Bola bolão
Café  cafezinho Café  cafezão Cola colinha Cola colão
Cela  celinha Cela celona copacopinha copacopão
Chalé  chalezinho Chalé  chalezão foca foquinha foca focão
Fera ferinha Feraferona lojalojinha lojalojão/lojona
Pelé  pelezinho Pelé  pelezão molamolinha molamolão/molona
Pele  pelinha Pele pelona potepotinho potepotão
Tela  telinha Tela telona roda rodinha roda rodão/rodona
Tema  teminha Tema temão toca toquinha toca tocão/tocona
Vela  velinha Vela velona tora torinha tora torão/torona
Palavras derivadas pela adição do aumentativo –ão, também não
apresentam mudança na qualidade vocálica do núcleo que preenchia a sílaba
A partir das palavras primitivas, foram formadas palavras sufixadas por
tônica da palavra primitiva. A perda de acento, nesses casos, não leva a
sufixo de diminutivo e de aumentativo. Essas palavras foram inseridas na
mudança de uma vogal média baixa para uma vogal média alta (Quadro 3).
frase veículo “Digo___baixinho” para fins de homogeneização do ambiente
fonético. As palavras alvo inseridas nas frases veículos foram gravadas por Quadro 3 - Exemplos de palavras derivadas com aumentativo
–ão/ona em que não ocorre a mudança da qualidade vocálica da
falantes da região da Zona da Mata mineira, cujo quadro vocálico é sílaba tônica da palavra primitiva após a sufixação
semelhante ao do Rio de Janeiro, descrito por Câmara Jr.
As gravações foram realizadas com gravador digital, a uma taxa de
amostragem de 22 kHz com microfone headphone.

RESULTADOS E DISCUSSÕES Nos casos de manutenção da altura vocálica original do núcleo tônico
da palavra primitiva, a sensação auditiva é a de que essas sílabas pretônicas
Conforme os dados apresentados no quadro 2, as palavras derivadas da são tão acentuadas quanto às sílabas tônicas. Cagliari (1999, pág. 33) afirma
adição do sufixo diminutivo –inha podem manter a qualidade da vogal da que:
sílaba tônica da palavra primitiva. Assim, apesar de perder a tonicidade, a
vogal média baixa, que na palavra derivada, é núcleo de uma sílaba

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A realização fonética da tonicidade, produzindo sílabas tônicas e átonas depende Nos casos de mudança da qualidade vocálica, não se tem a sensação
da configuração silábica lexical, isto é, do fato de uma sílaba ser intrinsecamente
auditiva de tonicidade dessas sílabas pretônicas como se tem para os casos
tônica (acento primário) ou átona, no léxico, da atribuição de acentos
secundários provenientes da derivação morfológica e da atribuição de tonicidade
de manutenção da qualidade vocálica.
a alguma sílaba por envolvimento da palavra com processos prosódicos.

CONCLUSÕES
Dessa forma, a sensação auditiva de sílaba forte que se tem para as
sílabas com a vogal média baixa em posição pretônica decorre de um acento As análises de oitivas realizadas mostram que a vogal média baixa da
secundário que essas palavras carregam decorrente de um processo sílaba tônica da palavra primitiva, após a sufixação, e conseqüente perda do
morfofonológico. Trata-se de uma sílaba átona atípica (CAGLIARI, 2002). acento primário, pode mudar ou não a qualidade de baixa para alta. Para os
A manutenção da qualidade vocálica não é, contudo, um fenômeno que casos em que se observou, na palavra derivada, a manutenção da qualidade
se repete categoricamente com a adição dos sufixos –inha e –ão/ona vocálica da sílaba tônica da primitiva, tem-se a sensação auditiva de uma
(Quadros 4 e 5). sílaba forte, evidenciando a existência de um acento secundário.

Quadro 4 - Exemplos de palavras derivadas com diminutivo –inha


em que ocorre a mudança da qualidade vocálica da sílaba tônica REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
da palavra primitiva após a sufixação
CAGLIARI, L.C. Acento em Português. Coleção Espiral, n. 4. Edição do
Autor, Campinas, 1999
______. Análise Fonológica. Introdução e Prática. Mercado de Letras,
Campinas, 2002.
CÂMARA JR., J. M. Problemas de Lingüística Descritiva. 21a ed. Vozes,
Petrópolis, 1992. Edição original: 1970.
Quadro 5 - Exemplos de palavras derivadas com
aumentativo –ao/ona em que ocorre a mudança da qualidade
vocálica da sílaba tônica da palavra primitiva após a sufixação

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
41 42
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como o inglês, por exemplo, o VOT é uma propriedade importantíssima para


AVALIAÇÃO DO TEMPO DE RESPOSTA E DURAÇÃO DO VOT NA
os ouvintes na percepção de oclusivas surdas ou sonoras. Se o valor do VOT
PERCEPÇÃO DE OCLUSIVAS SURDAS E SONORAS∗
for relativamente baixo, os ouvintes ouvirão uma oclusiva sonora, se for

Michael Douglas Silva Dias** relativamente alto, ouvirão uma oclusiva surda.
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
maicondsilva@hotmail.com Para o Português do Brasil (PB), resultados obtidos por Souza e
Vera Pacheco*** Pacheco (2005) mostram diferença duracional em oclusivas de monossílabos.
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
vera.pacheco@gmail.com Diferentemente de outras línguas, no PB, nesse ambiente, as oclusivas
sonoras têm VOT maior que as surdas.
Em outros contextos, contudo, a diferença de duração no VOT de
RESUMO:
Neste trabalho, objetiva-se investigar, a partir do tempo de resposta, a influência da duração do surdas e sonoras encontradas por Souza e Pacheco (2005) desaparece.
VOT no processo de percepção de oclusivas surdas e sonoras. Foram usados três sinais acústicos
diferentes: VOT sem manipulação, VOT dobrado e VOT dividido. O ouvinte deveria ouvir um sinal Meneses e Pacheco (2006) verificam que em contextos sentenciais de
acústico e identificar a consoante desse sinal. Mediu-se o tempo gasto pelo ouvinte para dar a
resposta. Foram avaliadas estaticamente as diferenças entre as médias de tempo gasto na proximidade e distância de pausa e em posição de pré, pós e de ênfase as
percepção das oclusivas surdas e sonoras. O tempo gasto na percepção das oclusivas surdas e
sonoras não é diferente para VOT com a mesma duração. oclusivas surdas e sonoras não apresentam diferença duracional no VOT.
PALAVRAS-CHAVE: Duração segmental. Oclusivas. Percepção. VOT Se, em termos de produção, a diferença de duração no VOT das
oclusivas é influenciada pelo ambiente fonético de produção, em termos de
percepção diferenças na duração do VOT levam a um processo de percepção
entre surdas e sonoras diferenciado?
INTRODUÇÃO:

MATERIAL E MÉTODOS:
Lisker e Abramson (1964) definem o VOT (voice onset time) como um
parâmetro acústico que permite estabelecer a diferença entre as consoantes
Para realizarmos essa pesquisa, foi composto um corpus com palavras
oclusivas surdas e sonoras. Segundo os autores, o VOT se refere ao intervalo
monossílabas com a estrutura CV, com as vogais /a/, /i/ e /u/ ocupando a
entre a liberação da exploração (geralmente determinada acusticamente por
posição de núcleo silábico; foram escolhidas somente essas vogais porque
uma explosão) e o momento de vibração das pregas vocais. Para línguas
elas contemplam os graus máximo e mínimo de abertura e de alturas
vocálicas e são, também, menos propícias a sofrerem processos de
*Trabalho inserido no projeto de pesquisa “Estudo fonético-experimental e perceptual das durações vocálicas e consonantais no Português do
Brasil e suas implicações fonético-fonológicas.” Coordenadora: Dra. Vera Pacheco.
**Iniciação Científica voluntário. Aluno do curso de Letras Modernas. UESB – Campus de Vitória da Conquista.
*** Orientadora. Doutora em Lingüística.

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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 41-46 Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
43 44
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

neutralização. A posição de ataque foi composta pelas oclusivas bilabiais /p- diferença entre o tempo de resposta e a duração do VOT na identificação de
b/, alveolares /t-d/ e velares /k-g/. surdas e sonoras. Dessa forma, buscou-se responder se a duração do VOT
Depois disso, as durações segmentais das gravações-estímulo das tem implicações na percepção de surdas e sonoras para o PB. Foi
consoantes oclusivas em monossílabos CV foram manipuladas por meio de considerada diferença significativa para p> 0,05, com α=0,05.
software Praat, desenvolvido por Boersma e Weenink (2002). A manipulação
consistiu na alteração das durações dos segmentos, ora dobrando-se o RESULTADOS E DISCUSSÃO
2
tamanho do VOT das oclusivas, ora dividindo-o pela metade.
As palavras-alvo das gravações-estímulo, com e sem manipulação, De acordo com os resultados obtidos, na identificação de oclusivas
foram apresentadas a seis informantes para que os mesmos identificassem o surdas e sonoras com VOT sem manipulação (tabela 1), o tempo gasto não é
segmento consonantal que estavam ouvindo, mensurando-se o tempo de diferente, o que se era esperado, uma vez que o sinal acústico apresenta um
resposta gasto na identificação das oclusivas dado para cada som que lhes VOT prototípico de oclusivas surdas e sonoras.
era apresentado.
A mensuração do tempo de resposta é um procedimento eficaz no
fornecimento de pistas sobre o processo de percepção. O maior ou menor
tempo gasto ao se responder uma pergunta traz evidências indiretas de
como o ouvinte está recebendo a informação que lhe chega ao ouvido e
como a mesma está efetivamente sendo processada.
Partindo dessa consideração, o tempo gasto pelo informante na correta
percepção de consoantes surdas e sonoras com VOT com durações diferentes
- duração normal, dobrada e dividida - foi considerado neste trabalho. Dessa
forma, propôs-se verificar se a duração do VOT é uma informação
significativa na percepção de oclusivas surdas e sonoras por falantes do PB Mas, para os VOTs dobrado e divido, esperar-se-iam diferenças no
sendo, nesse sentido, uma informação com implicações fonológicas. tempo de detecção das oclusivas: durações de VOTs dobrada ou dividida
Os valores de tempo de resposta obtidos foram submetidos ao teste de poderiam aproximar o sinal acústico dessas oclusiva. Os resultados
comparação de médias Anova-um critério com vistas a certificar se havia encontrados, contudo, não apontam nessa direção.

2 Para maior naturalidade do sinal acústico manipulado foi necessário incluir o silêncio antes da explosão.

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Os resultados encontrados evidenciam que o aumento do VOT (tabela CONCLUSÕES


2) não leva o ouvinte a gastar mais ou menos tempo na detecção de uma ou
outra consoante, não favorecendo ou desfavorecendo a percepção de Os resultados encontrados mostram que nos casos de percepção
oclusivas surdas e sonoras. correta das oclusivas surdas e sonoras, o processo de percepção tende a ser
indiferente à duração do VOT do sinal acústico.
Esses resultados são fortes evidências para a hipótese de que a
duração do VOT não constitui uma informação com implicações para a
distintividade de sonoridade que caracteriza as consoantes do PB,
corroborando os resultados de produção.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BOERSMA, P.; WEENINK, D. Praat software. Versão 4.0. The Netherlands, Amsterdam,
2002.
LISKER, L.; AMBRAMSON, A. A cross-languages study of voicing in initial stop. Word 20,
A percepção de oclusivas surdas e sonoras também não é afetada pela 1964, p. 384-422.
MENESES, F. O.; PACHECO, V. A relação duração segmental e a posição de ênfase na
diminuição do VOT (tabela 3), à semelhança do que ocorre quando o VOT é
sentença: o caso das oclusivas. In: I Seminário Interno de Iniciação Científica em Estudos
dobrado. da Língua(gem), 2006, Vitória da Conquista. Anais do I Seminário Interno de
Iniciação Científica em Estudos da Língua(gem), 2006. v. 1. p. 13-14.
_____. Pausa e duração segmental: o caso das oclusivas. In: 59° Reunião da SBPC, 2007.
Anais da 59° Reunião da SBPC, Belém, 2007.
MORAES, J. A., WETZELS, W. L. Sobre a duração dos segmentos vocálicos nasais e
nasalizados em Português. Um exercício de Fonologia Experimental. Cadernos de
Estudos Lingüísticos, 23, 1992, p. 153-166
PACHECO, V. Micro-prosódia segmental e estrutura silábica: o caso das oclusivas – dados
preliminares. Inventário: v. 3, p. 1-11, 2004. <http://www.inventario.ufba.br/>. Acesso
em 10/01/2005.
SOUZA, L. C.; PACHECO, V. Duração vocálica e consonantal em monossílabos abertos no
PB: informação fonética ou fonológica? In: CONPEX, IX. Anais do IX CONPEX, Jequié ,
2005.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
47 48
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Enquanto a fonética estuda os sons produzidos por cada falante, a


AVALIAÇÃO DOS PROCESSOS
FONOLÓGICOS EM REESCRITAS DE CRIANÇAS E ADULTOS fonologia procura investigar como os sons de cada língua se organizam.
Assim, importa-lhe o que é geral, uniforme, comum a todos os falantes,
Gisele Pires Caires∗ preocupação que também tomará para si um importante elemento da escrita:
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
gisele.caires@gmail.com a ortografia (CAGLIARI, 2002).
Vera Pacheco∗∗ Partindo desta relação entre escrita e Fonética/Fonologia, podemos
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
vera.pacheco@gmail.com elaborar as seguintes questões: se um dado texto for reescrito, os processos
fonológicos que surgirem na primeira versão, permanecerão nas versões
posteriores? Se os aprendizes da escrita forem pessoas de idades diferentes,
RESUMO
Este estudo busca investigar se os processos fonológicos que surgem na primeira versão de um uma criança e um adulto, os processos fonológicos aparecerão,
texto escrito por alunos da 5ª série do Ensino Fundamental (EJA e Ensino Regular) permanecem
nas suas versões posteriores, bem como investigar se ocorre o aparecimento indistinto do indistintamente, na reescrita de ambos?
processo fonológico na reescrita tanto do adulto quanto da criança. Os resultados encontrados
indicam que a continuidade de um número pequeno de processos fonológicos depois da reescrita Buscando responder a estas perguntas, este estudo parte da hipótese
e mostram que esses mesmos processos surgem durante a Aquisição da Escrita por crianças ou
adultos. de que mesmo sendo a reescrita um processo consciente, alguns processos
PALAVRAS-CHAVE: Aquisição da escrita. Processos fonológicos. Reescrita. fonológicos permanecem nos textos mesmo com a reflexão da criança/adulto
sobre o material escrito.

MATERIAL E MÉTODOS
INTRODUÇÃO

O presente estudo foi desenvolvido a partir da coleta, seleção e


Em sociedades como a nossa, apropriar-se da escrita é condição
identificação de dados relativos aos processos fonológicos em reescritas de
fundamental para circularmos nos espaços das práticas letradas (ABAURRE;
textos por alunos de duas Instituições Escolares, uma pública e outra
FIAD; MARINK-SABINSON). Esse interessante sistema é uma representação
privada, do município de Barra da Estiva: 5ª série da Educação de Jovens e
da oralidade e tem a finalidade de proporcionar a leitura. Por estabelecer
Adultos – EJA; 5ª série do Ensino Fundamental Regular. Os textos usados na
essa estreita ligação com a língua oral, a escrita sofre a influência de um
análise foram obtidos como atividade desenvolvida exclusivamente para esta
aspecto importante do Sistema: a fonologia.
pesquisa.


Aluna do Curso de Especialização em Lingüística.
∗∗
Orientadora Doutora em Lingüística pela Unicamp.

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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 45-51. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
49 50
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Nas duas escolas, após a escrita da primeira versão, a professora fazia Investigando a natureza das ocorrências divergentes da ortografia
uma correção individual. Utilizando um marcador de texto, ela apontava para oficial encontradas na primeira versão, temos o Alteamento Vocálico, a
o aluno a ocorrência e perguntava-lhe qual a divergência que ali havia. Não Vocalização, o Sândi, a Eliminação de Sílaba Átona, a Inserção da Nasal, a
emitindo nenhum julgamento sobre a resposta do aluno, a professora o Segmentação, a Eliminação de Consoante, a Eliminação de Vogal, a
encaminhava para reescrever, sozinho, o texto. Até que se chegasse a uma Generalização, os Traços Distintivos envolvendo: a) Traço de Nasalidade e b)
versão final, o número de reescritas variou de aluno para aluno. A quantidade Traço de Sonoridade, a Eliminação de Consoante Nasal, a Eliminação de
mínima analisada foram duas reescritas e a máxima quatro. Consoantes, a Comutação (Permuta) e a Troca de Letras.
Como resultado da prática de textualização, foi obtido no total, Quanto à avaliação das ocorrências divergentes encontradas nas
somando a primeira versão e as reescritas que variaram de duas a quatro, 32 reescritas, as crianças da pesquisa conseguem reescrever 79,5% das
textos de alunos da 5ª série da EJA e do Ensino Regular, os quais foram ocorrências de acordo com a forma ortográfica consagrada pela norma, e os
analisados para os fins dessa pesquisa. adultos 70,6%. Esse fato prova a atitude e reflexividade desses alunos diante
do material escrito. No entanto, houve vocábulos que mesmo depois de
RESULTADOS E DISCUSSÃO reescritos continuaram distantes das formas congeladas pela ortografia. Os
processos fonológicos que aconteceram nestes vocábulos continuaram na
No que se refere à ocorrência de processos fonológicos em reescrita de maioria das ocorrências reescritas, poucas foram aquelas que, depois de
crianças e adultos, ao analisarmos os dados constatamos que, do total de reformuladas, sofreram novas alterações de processos fonológicos. Contudo,
111 ocorrências na escrita infantil, 23 apareceram somente na primeira esses dados que não chegaram às formas privilegiadas, apesar de
versão, restando, portanto, 88 reformulações para serem analisadas. Deste divergentes quanto à norma, não divergiram da lógica da língua.
número, a criança conseguiu reescrever 70 vocábulos de acordo com a forma
cristalizada pela ortografia, permanecendo 18 formas divergentes. CONCLUSÕES
Do total de 82 ocorrências na escrita adulta, 07 apareceram somente
na primeira versão, restando, portanto, 75 reformulações para serem A análise das reformulações que emergiram nas reescritas dos sujeitos
analisadas. Deste número, o adulto conseguiu reescrever 53 vocábulos de desta pesquisa mostra a presença de processos fonológicos em formas
acordo com a forma cristalizada pela ortografia, permanecendo 22 formas divergentes da ortografia oficial.
divergentes.

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Considerando que, neste estudo, os aprendizes da escrita estavam em


fases distintas, infância e vida adulta, foi verificado que essa diferença não
alterou a capacidade de apropriação do objeto escrito.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABAURRE, M. B. M.; FIAD, R. S.; MARINK-SABINSON, M. L. Cenas de


Aquisição da Escrita: o sujeito e o trabalho com o texto. Campinas,
SP: Mercado de Letras, 1997.
CAGLIARI, L. C. Análise Fonológica: introdução à teoria e à prática,
com especial destaque para o modelo fonêmico. Processos
Fonológicos. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2002.

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53 54
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altas. Em cidades do estado da Bahia, como mostram os trabalhos de Silva


AVALIAÇÃO INSTRUMENTAL DOS
CORRELATOS ACÚSTICOS DE TONICIDADE DAS (1995) e Oliveira e Pacheco (2006), observam-se, nessa posição, ocorrências
VOGAIS MÉDIAS BAIXAS EM POSIÇÃO PRETÔNICA E TÔNICA* das vogais médias, mas não em relação de oposição. Essas autoras
encontram alta taxa de ocorrência de VMB em PP nas comunidades
Juscélia Silva Novais Oliveira**
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia lingüísticas de Salvador e Vitória da Conquista, respectivamente.
juscelyaoliveira@gmail.com
Nos dialetos em que não ocorrem VMB em posição pretônica, podem
Marian dos Santos Oliveira***
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia ocorrer, excepcionalmente, VMBs em sílaba átona. Isso ocorre em processo
mdossoliveira@gmail.com
de sufixação, em particular, nos casos de palavras formadas pelo advérbio –
Vera Pacheco****
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia mente (CÂMARA JR., 1970), quando há um deslocamento do acento tônico.
vera.pacheco@gmail.com
De acordo com a pauta acentual proposta por Câmara Jr. (1970), essas
sílabas terão grau de tonicidade intermediário entre as tônicas, que possuem
RESUMO
Vogais tônicas tendem a apresentar valores de F0, intensidade e duração maiores que os das
grau 3 e as postônicas, que terão grau 1.
átonas. Diante disso, este trabalho objetiva analisar esses parâmetros acústicos da vogal média
baixa realizada nas posições tônicas e pretônicas na fala de baiano, com vistas a avaliar diferenças
Para Cagliari (2002), nesses casos, a nova palavra formada mantém a
desses parâmetros. Foi montado um corpus de logatomas com [ , ] em sílabas tônica e átona. qualidade vocálica original. Segundo o autor, pode-se dizer que essa sílaba
Foi realizada gravação, com baiano, desses logatomas inseridos em frases veículos. Foram
avaliadas as diferenças entre as médias das variáveis (teste t). Os resultados mostram que vogais átona traz consigo um acento secundário e que, portanto, não se trata de
avaliadas não apresentam diferença significativa do padrão de tonicidade nas posições
investigadas. uma sílaba átona típica. As VMBs em posições não tônicas possuem,
PALAVRAS-CHAVE: Vogais médias. Intensidade. Duração portanto, uma tonicidade especial.
Partindo dessas considerações, este trabalho propõe analisar,
experimentalmente, os parâmetros acústicos de tonicidade das VMBs que
ocorrem em PP na fala de um baiano, com vistas a avaliar a tonicidade
INTRODUÇÃO
dessas vogais.

No Português do Brasil (PB), vogais médias baixas (VMB) podem ocorrer ou


não em posição pretônica (PP). Segundo Câmara Jr. (1970), no dialeto
carioca, essas vogais, nessa posição, neutralizam-se em proveito das médias

*Trabalho vinculado ao projeto de pesquisa “Investigação fonético-fonológica das vogais médias abertas em posição pretônica na fala de Vitória da
Conquista/BA” coordenado pela Profa Dra Vera Pacheco.
** Iniciação voluntária. Aluna regular do curso de Letras.
***Doutoranda na Unicamp.
**** Orientadora. Doutora em Lingüística pela Unicamp

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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 53-58.
55 56
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MATERIAL E MÉTODOS mais proeminente que as demais, característica das sílabas tônicas
(CRYSTAL, 2000).
Buscando alcançar os objetivos deste trabalho, foi montado um corpus Em termos acústicos, o acento se caracteriza por maiores valores de
de logatomas3 trissílabos com a consoante oclusiva bilabial surda /p/ mais as F0, intensidade e duração.

vogais médias baixas [ , ] e altas /e, o/ em sílabas tônicas e pretônicas, A F0 é um dos fatores essenciais para a definição do acento, sua
medida é dada em Hertz (Hz). A intensidade, medida da pressão acústica do
como segue:
sinal, também é um importante fator para definir o acento, sua unidade é
Os logatomas foram inseridos na frase Digo ___________ baixinho e
decibel (dB). A duração está relacionada ao fator temporal do segmento,
gravados por uma falante natural do estado da Bahia, no Laboratório de
medida em segundo (seg). Na maioria das línguas, uma mesma vogal tem
Fonética Acústica e Psicolingüística Experimental (LAFAPE/Unicamp),
maior F0, intensidade e duração em posição acentuada do que em posição
utilizando-se placa de som AMAudio modelo MobilePreUSB inserida a um
inacentuada. (MARTINS, 1998).
Microcomputador Portátil Dell modelo Latitude110L, e microfone, de cabeça,
Se as sílabas tônicas tendem a possuir maior F0, maior intensidade e
modelo C420. Cada frase veículo foi realizada 5 vezes.
duração, espera-se, então, que as VMBs que ocupam o núcleo de uma sílaba
Foram obtidas medidas de Intensidade, Freqüência Fundamental (F0)
tônica tendem a apresentar, no sinal sonoro, maiores valores destes
das VMB, bem como foram obtidas medidas da duração relativa, que foi
parâmetros acústicos se comparados com essas mesmas vogais em sílaba
calculada pela divisão da duração da sílaba pela duração da palavra
pretônica.
multiplicado por 100. Essas medidas foram obtidas pelo software Praat.
Ao contrastar os valores médios de F0, intensidade e duração das VMBs
As medidas foram submetidas ao teste t de comparação com vistas a
em posição pretônica e tônica, contudo, o que se verifica são valores
verificar se as diferenças entre as médias das variáveis eram significativas
estatisticamente iguais, como apresentado nas tabelas 1 e 2.
para α = 0,05. As diferenças entre as médias foram consideradas
Os valores de p apresentados na tabela 1 (>0.05) mostram que a vogal
significativas para p<0.05.
[ ] possui valores de intensidade iguais tanto em sílaba pretônica quanto em
sílaba tônica.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Igualmente não foi registrada diferença significativa para F0 e duração
das sílabas pretônicas e tônicas.
O acento é uma referência ao grau de força ou de intensidade com que
uma sílaba é produzida. A sílaba que é produzida com mais intensidade é

3 Logatomas são palavras criadas que não existem na língua, mas que seguem o padrão silábico e a fonotaxe da mesma.

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também, ser consideradas átonas típicas, pois possuem proeminência


acústica similar à da vogal do acento primário. Nesse sentido, é plausível se
pensar que essas vogais carreguem um outro acento, do tipo secundário, o
que deve ser investigado em dados de fala natural.

CONCLUSÕES

A igualdade dos traços prosódicos encontrados para a vogal [ ] em


As VMB que ocorrem nas comunidades lingüísticas, Salvador e Vitória
posição pretônica e tônica também foi verificada para a vogal [ ], como
da Conquista - BA, em posição pretônica, carregam uma tonicidade especial.
apresentado na tabela 2.
Uma vez que essas vogais apresentam, tanto em posição tônica como na
A vogal [ ] não apresenta diferença significativa de F0, intensidade e
átona, parâmetros acústicos coincidentes. Ou seja, as vogais [ ] e [ ],
duração quando ocupa sílabas pretônica e tônica, sendo obtido p>0.05 para
realizadas em sílaba tônica e átona, não apresentaram diferenças
os três parâmetros acústicos.
significativas de F0, intensidade e duração.
Assim, é aceitável a hipótese de um acento secundário.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CÂMARA JR., J. M. Estrutura da língua portuguesa. Rio de Janeiro:


Petrópolis, 1970. p.124
CRYSTAL, D. Dicionário de Lingüística e Fonética. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 2000. 275.
OLIVEIRA, J. N; PACHECO, V. Investigação das Vogais Médias em posição
Considerando os resultados obtidos e considerando as condições
pretônica no Dialeto de Vitória da Conquista – BA. In: Anais do Seminário
experimentais deste trabalho, pode-se afirmar que as VMBs realizadas por de Iniciação Científica – PIBIC/CNPQ. Vitória da Conquista – BA, 2006.
falantes naturais do estado da Bahia apresentam o mesmo padrão acústico SILVA, M.B. Variação geográfica: Repensando estratégias descritivas. In: ___
Estudos lingüísticos e Literários. Salvador, n. 17, p. 87-91. 1995.
de tonicidade tanto em sílaba tônica quanto em sílaba pretônica.
MARTINS, M. R. D. Prosódia. In: Ouvir falar. Introdução à Fonética do
Dessa forma, os resultados encontrados acenam para a hipótese de Português. Lisboa: Editora Caminho, 1998.
que essas vogais, em posição pretônica, apesar de não poderem ser
consideradas tônicas por não carregarem o acento primário, não podem,

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59 60
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caracteriza-se pelo alçamento das vogais médias /e/ e /o/ à condição de


ESTUDO CONTRASTIVO DOS AMBIENTES FONOLÓGICOS
PROPICIADORES DO ALÇAMENTO DE /E/ > /I/ E /O/ > /U/* vogais altas /i/ e /u/, respectivamente, por efeito de harmonia vocálica ou
não. Trabalhos mostram que a regra de alçamento se explica pelo efeito de
Jucélia Pereira Bomfim Matos** harmonia vocálica (BISOL, 1991, SCHWINDT, 2002; MATOS, PACHECO; LEITE,
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
juceliapb@ig.com.br 2007); processo no qual uma vogal assimila o timbre de outra vogal contígua
Vera Pacheco*** ou vizinha, podendo atingir uma ouvárias vogais de uma mesma palavra
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
vera.pacheco@gmail.com (DUBOIS, et.al 1973). Assim, parte da regra explica-se pelo efeito de
****
Cândida Mara Britto Leite harmonização vocálica: m[e]nino/m[i]nino, s[e]guinte/s[i]guinte; parte não,
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
candidamara@gmail.com
visto ocorrer em vocábulos que não possuem vogal alta: g[u]verno, [i]scolha,
c[u]t[u]velo, m[i]lhor, etc, o que tem sido atribuído a certo condicionamento

RESUMO fonético-articulatório.
Este estudo descreve os ambientes fonológicos propiciadores do alçamento vocálico, fenômeno
pelo qual as vogais médias pretônicas /e/ e /o/ tendem a se realizar como /i/ e /u/,
Este último grupo constitui o foco da presente análise, na tentativa de
respectivamente. Com base nos dados da cidade de Planalto (BA), dialeto em que o processo é
bastante produtivo entre falantes adultos e crianças em fase de aquisição da língua, este artigo
descrever as particularidades de ambientes fonológicos propiciadores do
mostra que: (i) o alçamento de /e/  /i/ apresenta mais ambientes favorecedores quando em alçamento das duas vogais, frente à produtividade de cada uma para a regra.
harmonia vocálica; (ii) o alçamento de /o/  /u/ apresenta mais ambientes favorecedores quando
não se tem harmonia vocálica.

PALAVRAS-CHAVE: Alçamento vocálico. Fonologia. Variação. Vogais pretônicas mediais. MATERIAL E MÉTODOS

O corpus analisado insere-se na pesquisa já mencionada e foi composto


de dados de 18 informantes adultos, (19 e 89 anos), coletados mediante
INTRODUÇÃO
entrevistas com duração média de 30 minutos por falantes e de 10 crianças
(2 a 5 anos), com base na metodologia de Yavas; Hernandorena; Lamprecht
Recorrente noutros dialetos do português brasileiro: em Minas Gerais
(1992).
(VIEGAS, 1987), na Bahia (SILVA, 1989) e no Rio Grande do Sul (BISOL, 1981;
O estudo compreendeu 471 palavras alvo na fala do adulto, dentre as
SCHWINDT, 2002) etc., o processo fonológico denominado alçamento vocálico
quais, 371 com alçamento vocálico, por harmonia vocálica ou não e, na fala
da criança, uma lista de 25 palavras selecionadas, dados nos quais houve
* Trabalho vinculado à monografia apresentada ao Curso de Especialização em Lingüística, da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia,
campus de Vitória da Conquista, realizada sob a orientação das Profªs. Ms. Cândida Mara Britto Leite e Dra Vera Pacheco. registro de alteamento das duas vogais: /e/ e /o/.
** Aluna do curso de Especialização em Lingüística da UESB. Campus de Vitória da Conquista.
*** Doutora em Lingüística pela Unicamp.
**** Mestre em Lingüística. Doutoranda em Lingüística na Unicamp.

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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p.. 59-64. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
61 62
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RESULTADOS E DISCUSSÃO Gráfico 2 – Contextos seguintes favorecedores de alteamento


vocálico de [e] e [o] em Harmonia vocálica

- Contextos seguintes
Os dados revelam que entre os casos típicos de harmonização vocálica, favorecedores de
alteamento exclusivos
que têm como fator desencadeador a presença de vogal alta seguinte, não para [e]

- Contextos seguintes
há diferença tão relevante de ambiente fonológico entre as duas vogais, favorecedores de
alteamento exclusivos para
conforme os Gráficos 1 e 2, a seguir.

Gráfico 1 – Contextos antecedentes favorecedores de


Entretanto, contrariam essa tendência os resultados da vogal posterior
alteamento vocálico de [e] e [o] em Harmonia vocálica /o/, diante dos casos de alçamento vocálico propriamente dito, isto é,
- Contextos
antecedentes aqueles que ocorrem sem a presença de vogal alta seguinte (harmonia
favorecedores de
alteamento exclusivos
para [e]
vocálica), mesmo sendo quantitativamente menos expressivo do que /e/ na
- Contextos
antecedentes totalidade dos dados. Essa diferença pode ser visualizada no Gráfico 3.
favorecedores de

Gráfico 3 – Contextos antecedentes favorecedores de


alteamento vocálico de [e] e [o] sem Harmonia vocálica
O Gráfico 1 indica que houve um número considerável de coincidência
- Contextos
de contextos fonológicos antecedentes para /e/ e /o/: /d, k, p, m, r, s, v/. As antecedentes favorecedores
de alteamento exclusivos
diferenças indicadas na legenda parecem justificar o que têm revelado as para [e]

- Contextos antecedentes
pesquisas sobre a maior sensibilidade de /e/ diante do processo de favorecedores de

alçamento vocálico. Ou seja, em maior número do que para /o/, os


ambientes fonológicos diante dos quais /e/ > /i/ parecem sinalizar essa
Como é possível observar, há inversão do comportamento das duas
proporção, sugerindo que, quanto maior o número de contextos
vogais no contexto antecedente. Enquanto a sensibilidade de /e/ resume-se
propiciadores (ou não bloqueadores) da regra, maior é a sensibilidade da
basicamente a: contexto inicial absoluto, prefixo des- (ou palavra primitiva
vogal e, conseqüentemente, maior produtividade diante do processo.
iniciada pela mesma estrutura) e poucos exemplos com bilabial ou sibilante:
Como o contexto antecedente, o seguinte mostrou-se mais abrangente
m[i]lhor, p[i]quena, s[i]nhora, /o/ torna-se sensível ao processo diante de:
para /e/: /p, b, t, d, k, g, m, n, s, z, r, v/, comparado ao de /o/: /b, m, s, z,
/p, b, t, d, m, n, f, k, g, s, z/.
t, v, l/, confirmando, assim, a mesma tendência, conforme indica o gráfico 2.
Do mesmo modo, no contexto seguinte a vogal /o/ mantém a mesma
tendência, conforme indica o Gráfico 4 .

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63 64
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Gráfico 4 – Contextos seguintes favorecedores de REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


alteamento vocálico de [e] e [o] sem Harmonia vocálica
CÂMARA JR., J. M. (1953). Para o estudo da fonêmica portuguesa. Rio
- Contextos seguintes
favorecedores de de Janeiro: Padrão, 1977.
alteamento exclusivos
para [e] DUBOIS, J. et. al. Dicionário de Lingüística. São Paulo: Cultrix, 1973.
- Contextos seguintes MATOS, J. B, PACHECO, V. LEITE, C. M. B. Investigação da relação entre o
favorecedores de
alteamento exclusivos para processo de alçamento de vogais médias pretônicas e o nível de
escolaridade. In.; Anais do XI CONPEX, UESB, 2007 (no prelo).
PEREIRA, R. C. M. A harmonização vocálica e a variação das médias
No contexto seguinte, enquanto /e/ alça diante de: contexto inicial pretônicas. In: DA HORA, D. (org). Estudos Sociolingüísticos: Perfil de
Uma Comunidade, 2004, p. 111 – 128.
absoluto (com nasais: __m, __n e fricativas: __s, __z), /k/, /ʎ/, /s/, a vogal
SCHWINDT, L. C. A regra variável de harmonização vocálica no RS. In: Bisol,
L. e Brescancini, C. (org.). Fonologia e Variação: Recortes do Português
/o/ alça diante de variado contexto: /b, t, d, n, l, ʎ, v, k, g, s, z/. Assim, os Brasileiro. Porto Alegre: EDILPUCRS, 2002. p. 161-182.
gráficos 3 e 4 sugerem que não basta olhar para os dados apenas do ponto SILVA, M. B. da. Um traço regional da fala culta de Salvador. (1981). In:
Organom, 18. p. 79-89, 1991.
de vista quantitativo, pois, mesmo os resultados desta e de outras pesquisas
TARALLO, F. A pesquisa sociolingüística. 5 ed., São Paulo: Ática, 1997.
revelando maiores índices para a vogal /e/, em termos de variedade de
VIEGAS. M. C. O Alçamento de vogais médias pretônicas e os itens
ambiente fonológico, a vogal /o/ se destaca. lexicais. [Tese de Doutorado em Lingüística], Universidade Federal de Minas
Gerais, 2001.
YAVAS, M. HERNANDORENA; C. L. M.; LAMPRECHT, R. R. Avaliação
CONCLUSÕES Fonológica da Criança. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992.

As análises mostraram que os ambientes fonológicos diante dos quais


ocorre o alçamento de /e/ > /i/ e /o/ > /u/ são semelhantes para a duas
vogais, nos casos de harmonia vocálica e diferentes para os casos de
alçamento propriamente dito. No primeiro caso, /e/ é sensível a contexto
mais amplo do que /o/; no segundo, a situação se inverte: a vogal posterior
/o/ alça diante de variado contexto, mesmo não representando maior
produtividade da regra.

_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
65 66
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

A duração das vogais, mais especificamente, pode ser influenciada pela


ESTUDO FONÉTICO-EXPERIMENTAL DA INFLUÊNCIA DA PAUSA NA
altura, taxa de elocução, vozeamento da consoante precedente, além de
DURAÇÃO DE VOGAIS ACOMPANHADAS DE OCLUSIVAS SURDAS E
SONORAS* fatores sintáticos e semânticos (KENT; READ, 1992).
Vogais curtas e longas apresentam diferenças duracionais de até 40%
Francisco Meneses ∗∗
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
devido as suas características inerentes (KENT; READ; 1992). Segundo House
chico.meneses@gmail.com
e Fairbanks (1953), a duração vocálica no Inglês varia de acordo com o
Vera Pacheco ∗∗∗
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia número e a natureza das consoantes adjacentes. As vogais tendem a ser
vera.pacheco@gmail.com
mais longas seguidas de consoantes sonoras em relação às sucedidas de
consoantes surdas. Além disso, as vogais são mais curtas quando seguidas
RESUMO de múltiplas consoantes, do que quando são seguidas por apenas um
A duração das vogais pode ser influenciada por fatores diversos, tais como taxa de elocução,
vozeamento da consoante precedente, etc. As vogais curtas e longas apresentam diferenças segmento consonântico (JONG, 1991).
duracionais de 40% devido às suas características inerentes (KENT; READ, 1992). Considerando
que as vogais podem sofrer alteração em sua duração em função do vozeamento da consoante Para o Português do Brasil (PB), Pacheco (2004) mostra que a duração
precedente e do contexto sentencial, este trabalho investiga a influência da pausa na duração das
vogais precedidas por oclusivas surdas e sonoras. Os resultados encontrados mostram que as intrínseca dos segmentos não é aleatória. Em contextos sentenciais, as
vogais precedidas de oclusivas surdas e sonoras não alteram sua duração tanto distantes quanto
próximas de pausa. fricativas mostram ser indiferentes à pausa, apresentando mesma duração

PALAVRAS – CHAVE: Fonética. Duração. Pausa. Vogais.


quando próximas e distantes da pausa (OLIVEIRA; PACHECO, 2005). Sabe-se
que as pausas são unidades rítmicas que podem ocorrer dentro de um
enunciado em diferentes posições, tendo sua ocorrência obrigatória em
determinados casos, pois servem para diferenciar significados (CAGLIARI,
INTRODUÇÃO
1982). A presença de uma pausa pode acarretar mudanças segmentais, tais
como aumento ou diminuição de duração (CAGLIARI, 1999). Considerando a
Vogais e consoantes co-articuladas estabelecem o fluxo da fala e suas
importância da pausa na organização rítmica do enunciado, pretende-se,
características fonéticas e alteram-se a depender do contexto em que estão
neste trabalho, investigar a relação entre a pausa e os segmentos vocálicos
inseridas. A duração segmental é, entre outras características, influenciada
acompanhadas por consoantes surdas e sonoras. Objetiva-se, assim,
por fatores diversos.
investigar qual a influência do contexto de pausa na duração das vogais.
Busca-se identificar a confluência de fatores micro e macro-prosódicos na
*Trabalho inserido no projeto de pesquisa “Estudo fonético-experimental e perceptual das durações vocálicas e consonantais no Português do
Brasil e suas implicações fonético-fonológicas.” Coordenadora: Dra Vera Pacheco.
∗∗
duração das vogais.
Bolsista de Iniciação Científica Fapesb. Graduando do curso de Letras Vernáculas da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB.
∗∗∗
Orientadora. Doutora em Lingüística.

______________________________________________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa _____________________________________________________________________________
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p.. 65-70.
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
67 68
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

MATERIAIS E MÉTODOS RESULTADOS E DISCUSSÕES

Para realização da pesquisa, foi montado um corpus composto por Os resultados obtidos permitem afirmar que o ambiente de pausa não
monossílabos (Pa, Pi, Pu, Ba, Bi, Bu, Ga, Gui, Gu, Ca, Qui, Cu, Ta, Tu, Da, altera a duração das vogais adjacentes às consoantes surdas e sonoras.
Du) tendo no onset oclusivas surdas e sonoras e no núcleo as vogais /a, i, u/. As vogais, no PB, não apresentam diferenças significativas quando são
A influência da pausa foi investigada a partir do design precedidas por oclusivas surdas e sonoras em posição de pausa sentencial
pergunta/resposta por meio do qual foi possível colocar as palavras-alvo (Tabela 1).
tanto próximo de pausa quanto longe.
Cada par pergunta/resposta foi gravada três vezes com um intervalo de
tempo indeterminado entre as gravações. As gravações foram realizadas
através do aparelho Digital Olympus com uma informante do sexo feminino.
Uma vez que a taxa de locução do informante não foi controlada na
gravação dos monossílabos, a medida de duração dos segmentos usada nas
análises foi obtida a partir do resultado da razão entre a duração do
segmento e a duração total da palavra em que esse segmento estava
inserido. Assim, foi possível contornar o problema das diferenças de taxa de
elocução das três repetições de cada palavra e, com isso, evitar o valor
absoluto da duração intrínseca dos segmentos. A ausência de diferença significativa de duração das vogais em
As medidas de duração das vogais foram obtidas através do programa adjacência às oclusivas surdas e sonoras quando estão sob o efeito de pausa
Praat, identificadas por meio de formas de ondas sincronizadas aos seus é também detectada quando esses segmentos encontram-se distantes da
respectivos espectrogramas. pausa (tabela 2).
Os dados foram submetidos ao teste estatístico Anova-um critério para Assim, as vogais não apresentam diferença de duração quando
certificar se as médias de duração vocálica nos contextos investigados acompanhadas de oclusivas surdas e sonoras quer próxima ou distante de
apresentavam diferenças significativas entre si. As médias foram pausa.
consideradas diferentes para p<0,05.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
69 70
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CAGLIARI, L.C. Elementos de Fonética do Português Brasileiro.


Campinas, UNICAMP, 1982. 192 f. Tese (Livre Docência) – Universidade
Estadual de Campinas, Campinas.
CAGLIARI, L. C. Acento em português. Campinas: Espiral, v. 4, 1999.
HOUSE, A.; FAIRBANKS, G. The influence of Consonant Environment upon
the Secondary Acoustical Characteristics of Vowels. The Journal of the
Acoustical Society of America, 25: 105-113, 1953.
JONG, K. An Articulatory Study of Consonant-Induced Vowel Duration
Changes in English. In: Auditory Evoked Magnetic Fields and Electric
Potentials. Editoração de M. Hoke, F. Grandori e G. L. Romani.
Estados Unidos: Karger, v. 6, 1991. p. 1-17.
A partir dos resultados obtidos, pode-se afirmar, então, que as vogais KENT, R. D.; READ, C. Acoustic Analyses of Speech. San Diego: Singular
PublishingGroup, 1992, 238 p.
acompanhadas por oclusivas surdas não apresentam diferenças duracionais
OLIVEIRA, P. F.; PACHECO, V. A relação entre posição de ênfase
das vogais acompanhadas por oclusivas sonoras, quer próxima ou distante de
sentencial/proximidade de pausa e duração segmental no PB: o caso das
pausa. fricativas. In: Seminário Nacional de Pesquisa em Estudos
Lingüísticos e Seminário Nacional de Pesquisa em Análise de
Discurso, II, Vitória da Conquista, 2005, Vitória da Conquista. Pesquisa em
CONCLUSÕES Estudos da Linguagem II. 2005. v. II.
PACHECO, V. Micro-prosódia segmental e estrutura silábica: o caso das
oclusivas – dados preliminares. Inventário: v. 3, p. 1-11, 2004.
Os resultados encontrados para as vogais, precedidas de consoantes <http://www.inventario.ufba.br/>. Acesso em 10/01/2005.
surdas e sonoras, evidenciam que as vogais, em contextos de pausa, não
alteram sua duração. Esses resultados assemelham-se aos encontrados por
Oliveira e Pacheco (2005) para as fricativas do PB, confirmando, assim, que a
duração segmental é uma característica de ordem fonética e não fonológica,
como acontece em outras línguas.

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71 72
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pretende (CAGLIARI, 2000). Dessa forma, no processo de aquisição da língua


EVIDÊNCIAS DA INTERFERÊNCIA DO
escrita materna, a criança necessita, apenas, de aprender as regras
CONHECIMENTO FONOLÓGICO NA AQUISIÇÃO DA LÍNGUA ESCRITA
ortográficas, que podem ser um resgate da organização interna do sistema
Kelly de Souza Nogueira∗ fonológico, como, também, não ter nenhuma relação com o mesmo.
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
kellydsn@gmail.com Considerando, então, que a criança ao aprender a língua materna escrita
Vera Pacheco∗∗ conhece o funcionamento do sistema fonológico de sua língua materna
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
vera.pacheco@gmail.com falada, objetivamos responder, neste trabalho, as seguintes questões: Em
que medida o conhecimento do sistema fonológico pode interferir na
aquisição da língua escrita? Esse conhecimento é desenvolvido ao longo da
RESUMO
Esta pesquisa tem por objetivo investigar em que medida o conhecimento da organização do aquisição como admitem alguns teóricos (MALUF, M. R.; BARRERA, S. D.,
sistema fonológico da língua materna oral que a criança possui interfere na aquisição da língua
escrita. Foram coletados 40 textos escritos espontaneamente para compor o nosso corpus de 1997), ou ele já está pronto quando dessa aquisição?
análise. Os resultados mostram que o processo de aquisição da língua escrita é altamente
influenciado pela organização do sistema fonológico da língua materna oral. A escrita é, para a A hipótese central deste trabalho é a de que a criança, no processo de
criança, o registro de sua fala, e, por isso, ela se pauta no sistema fonológico da língua. Nesse
sentido, a criança ao escrever é guiada pela consciência fonológica. aquisição da língua escrita, é guiada por esse conhecimento plenamente
PALAVRAS-CHAVE: Consciência Fonológica. Língua Escrita. Língua Oral. Sistema Fonológico. pronto, entendido como consciência fonológica. Hipotetizamos, ainda, que
Processos Fonéticos/Fonológicos.
nesse processo ocorrem processos fonológicos e ortográficos, a exemplo dos
vocábulos dissi, porqe, previsíveis no sistema.

INTRODUÇÃO MATERIAL E MÉTODOS

Ao ter contato com a escrita, a criança, na sua grande maioria das vezes, Para compor o corpus de análise da nossa pesquisa foram coletados 40
está inserida em uma comunidade lingüística, tendo, portanto, contato prévio textos de crianças, alunos da 1ª a 4ª séries do Ensino Fundamental I,
com o sistema fonológico de sua língua. atualmente denominado Ciclo I Inicial, Ciclo I Final, Ciclo II Inicial e Ciclo II
A criança, mesmo antes de aprender a ler e a escrever, já é capaz de Final, respectivamente.
entender e falar a sua língua materna com precisão. Quando não sabe utilizar Essa coleta foi realizada numa escola do município de Vitória da
determinado vocábulo, ela faz usos de circunlocuções para dizer o que Conquista, nos dias 18 e 19/04, das 13h30min às 17h.
Devido à nova organização do Ensino Fundamental Seriado em Ciclos,

Aluna do curso de pós-graduação em Lingüística.
cuja organização se dá por faixa etária e não por nível de aprendizado,
∗∗
Doutora em Lingüística.

______________________________________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p.. 71-76.
73 74
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

resolvemos que, os próprios professores dos Ciclos escolheriam as crianças registrados na ortografia oficial, são constantemente encontrados em textos
que teriam condições de escrever textos. infantis escritos nessa fase.
No primeiro dia, a atividade foi aplicada com crianças do Ciclo I Inicial e Como a escrita é, para a criança, uma forma de registro da fala,
Ciclo I Final e, no segundo dia, foi repetida a mesma atividade com crianças encontramos inúmeras palavras, de naturezas diversas, escritas pelas
do Ciclo II Inicial e Ciclo II Final. crianças que constituem registros fiéis de sua fala, tais como:
Para a elaboração da redação, foi projetado para as crianças o filme “A
Fantástica Fábrica de Chocolate” de Roald Dahl, com produção de Brad Grey 1 “MUNDU” para “mundo” - Realizações de vogais altas em posição átona final.
2 “INTERAS” para “inteiras” – Monotongação.
e Richard Zanuck. Após o filme, foi solicitada às crianças, a escrita de um
3 “MEIS” para “mês” – Ditongação.
texto que contasse a história que elas haviam acabado de ver. 4 “CHEI” para “cheia” – Apócope.
Para realizar a catalogação dos dados, separamos, inicialmente, os textos 5 “PIDIU” para “pediu” - Assimilação de Vogal por outra Vogal.
6. “De + chocolate = DECHOCOLATE” – Juntura Vocabular (Sândi).
por Ciclos e os enumeramos. Após a separação e a enumeração dos textos,
8 “Trabalhava = TRA BALHAVA” – Divisão de Palavras.
lemos cada texto separadamente para que pudéssemos selecionar as formas
9 “CONHECR” para “conhecer” – Princípio Acrofônico.
escritas divergentes que expressassem de certa forma processos de natureza
fonético/fonológica. Outras formas divergentes encontradas na escrita da criança não
Em alguns casos, realizamos regras de formalizações, com base no constituem um registro fiel da fala e são, por vezes, formas muito estranhas
Modelo Gerativa Padrão. que não possuem correspondência na língua oral. Essas formas altamente
divergentes, contudo, não constituem erros simplesmente, mas são
RESULTADOS E DISCUSSÃO ocorrências que recuperam, de certa forma, a organização do sistema
fonológico e, portanto, não violam as leis fonológicas de sua língua, como
Na análise dos textos que compõem o nosso corpus, encontramos em:
formas divergentes que constituem verdadeiros vocábulos inovadores e
perfeitamente compreensíveis se se considerarmos o funcionamento da 10“CONVINTE” para “convite” – Inserção de Consoante (Epêntese).
11 “FRABICA” para “fábrica” – Permutação (Metátese).
língua e a realização oral do falante. Durante a fase inicial da aquisição da
12 “MASCA” para “mascar” – Eliminação de Consoante.
língua materna escrita, que é um período em que somente algumas regras
13 “ABRIL” para “abriu”; “CAIO” para “caiu”; “DERETO” para “direto” – Overextension4.
ortográficas são dominadas pela criança, muitos processos fonológicos
naturais de sua língua e realizações particulares da fala, que não são
4Overextension é a aplicação generalizada de uma regra. Nesse caso, a criança estende o uso da regra ortográfica que diz que se deve grafar
com a letra l onde falamos [u], com letra o onde falamos [u] e com a letra e onde falamos [i]. A criança aplica essas regras a contextos em elas não
se aplicam.

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75 76
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Nos textos de crianças em fase de aquisição da língua materna escrita, MALUF, Maria Regina; BARRERA, Sylvia Domingos. “Consciência Fonológica e
Linguagem Escrita em Pré-escolares”. In: Psicologia: Reflexão e Crítica,
encontramos também, ao lado de formas divergentes que evidenciam que o
v. 10, n. 1. Porto Alegre, 1997.
conhecimento fonológico está atuando na escrita; formas escritas não SCHANE, Sanford A. “Processos Fonológicos”. In: Fonologia Gerativa.
divergentes que constituem fortes evidências para a hipótese de que, ao Jorge Zahar Editor. Rio de Janeiro: 1975.
escrever, a criança é guiada pela consciência fonológica. Assim, a criança
registra precisamente sons que são distintivos na língua, que possuem
símbolos gráficos específicos, tais como:

14 “Bolo”; “Bala” - Registro de sons vocálicos distintivos.


15 “Torta”; “Porta” - Registro de sons consonantais distintivos.

CONCLUSÕES

Considerando as análises, pode-se dizer que a consciência fonológica e a


aquisição da língua escrita possuem uma relação muito estreita. A criança, na
fase inicial do processo de aquisição, é guiada pela fala devido ao
conhecimento prévio do sistema fonológico.
A consciência fonológica vai permitir que a criança tenha um acesso
consciente ao nível fonológico da fala e, por meio desse acesso, fazer
associações entre grafemas e fonemas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CAGLIARI, Luiz Carlos. “A realidade Lingüística da Criança”; “O certo, o


errado e diferente”. In: Alfabetização & Lingüística. São Paulo: Scipione,
2000.
______. “A decifração da Escrita”. In: Alfabetizando sem BÁ – BÉ– BI –
BÓ – BU. São Paulo: Scipione, 1998.

_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
77 78
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Qualquer modificação segmental que ocorre no contínuo da fala, quer


INVENTÁRIO DE PALAVRAS COM DITONGO E
por motivações morfológicas ou não, são consideradas processos fonológicos.
MONOTONGAÇÃO DE [aj]; [ej] e [ow]
Assim, qualquer mudança segmental observada na língua e/ou na fala são
Ivete de Oliveira Santos* processos fonológicos.
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
ivabiroliveira@yahoo.com.br Os processos fonológicos são de diferentes tipos e podem mudar
**
Vera Pacheco foneticamente um segmento, como nos caso das assimilações; podem mudar
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
vera.pacheco@gmail.com
a estrutura silábica, como no caso das inserções e quedas, entre outros
***
Valéria Viana Sousa
valeriavianasouza@gmail.com
(SCHANE, 1975).
A monotongação é um processo fonológico muito comum nas línguas e
RESUMO consiste na mudança da estrutura silábica já que, nesse processo, há a queda
Este trabalho tem por objetivo inventariar palavras nas quais se verificam a ocorrência de
monotongação, bem como palavras em ocorre a manutenção do ditongo. A análise realizada do glide que compõe o ditongo tornando a vogal combinada ao glide uma
mostrou que o processo de queda do glide, transformando o ditongo em uma vogal simples, pode
ocorrer tanto para o glide [j] quanto para o glide [w]. Ambientes fonéticos que favorecem a vogal simples. Assim, uma sílaba pesada torna-se leve.
monotongação, bem como ambientes que favorecem a manutenção do ditongo devem ser
avaliados, o que será objeto de pesquisas futuras A monotongação é um processo que não é categórico, ou seja, um

PALAVRAS-CHAVE: Ditongo. Monotongação. Processos fonológicos mesmo ditongo pode sofrer ou não a monotongação. Assim, um ditongo
como [ej] pode se monotongar freqüentemente em [ ], mas, com
menos freqüência em [ ]. Dessa forma, este trabalho propõe
inventariar as palavras nas quais se observa uma tendência à monotongação
INTRODUÇÃO
e as palavras nas quais não se observam esse processo.

Nas línguas naturais, modificações segmentais podem ocorrer em


MATERIAL E MÉTODO
função de operações morfológicas, quando morfemas são adicionados e, uma
vez justapostos, podem sofrer modificações. Modificações segmentais
Para a realização deste trabalho foi utilizado o corpus disponibilizado
também podem ocorrer sem nenhuma motivação morfológica (SCHANE,
pela professora Elisângela Gonçalves, composto de 48 (quarenta e oito)
1975).
entrevistas. Essas entrevistas foram realizadas por discentes do Curso de
Letras, na disciplina Língua Portuguesa, com falantes de Vitória da
* Aluna do curso de especialização em Lingüística.
** Co-orientadora. Doutora em Lingüística pela Unicamp. Conquista/BA. Na presente pesquisa, no entanto, foram utilizadas apenas 16
*** Orientadora. Doutoranda em Letras e Lingüística pela UFPB

(dezesseis) entrevistas dentre as 48 (quarenta e oito).


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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p.. 77-82. _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
79 80
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Foi realizada escuta cautelosa dessas gravações com vistas a identificar De acordo com as análises realizadas, os glides [j] e [w] tanto podem
as palavras que ocorriam e que não ocorriam a monotongação. Para esse sofrer ditongação, como podem manter-se inalterados na posição silábica,
trabalho, foram selecionados os ditongos [aj], [ej] e [ow]. mantendo o ditongo, como exemplos apresentados na figura 2.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

De acordo com as análises de oitiva realizadas, foram encontradas


palavras nas quais se verificava a queda do glide, um contexto de
monotongação, portanto, como também, palavras nas quais se verificava a
manutenção desse glide, um contexto de ditongo.
Como apresentado na figura 1, a monotongação pode ocorrer nos três
ditongos aqui investigados. Dessa forma, verifica-se um processo fonológico A manutenção dos ditongos observados nas ocorrências apresentadas

que pode ser expresso nos seguintes termos: em 2 mostrou-se categórica nos ditongos [aj] e [ej], ou seja, são palavras
que sempre ocorrem ditongadas. Para o ditongo [ow], contudo, não se

G Ø/ V[___] observa essa manutenção categórica, podendo ser observada tanto a


manutenção do ditongo quanto a queda do glide, e, portanto, a
monotongação. Assim, é possível a ocorrência de

, mas muito mais raras ocorrências do tipo

CONCLUSÕES

Os exemplos apresentados na figura 1 evidenciam que ocorre a queda


Considerando a análise realizada, pode-se concluir que a) a
do glide que forma o ditongo decrescente com a vogal que lhe antecede. Os
monotongação não é um processo fonológico categórico, ora ocorrendo, ora
dados mostram que essa queda pode ocorrer tanto para o glide [j] quanto
não; b) há ocorrências de flutuação de monotongo e ditongo. Diante desses
para o [w], precedido de vogais baixa e média.
resultados, pesquisas futuras devem ser realizadas com o intuito de
investigar os ambientes fonéticos que propiciam o monotongo e aqueles que
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
81 82
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propiciam a manutenção do ditongo e das flutuações entre monotongo e


ditongo, buscando uma explicação para esse processo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

SCHANE, S. A. “Processos Fonológicos”. In: Fonologia Gerativa. Jorge


Zahar Editor. Rio de Janeiro: 1975

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
83 84
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processos, a audição e a percepção. Segundo Martins (1998), ao ouvir um


INVESTIGAÇÃO ON LINE DA PERCEPÇÃO DAS VOGAIS MÉDIAS
som o ouvido humano é capaz de responder à vibração mecânica das ondas
PRETÔNICA: DADOS PRELIMINARES*
sonoras do ar por meio de propagação das ondas. Pela audição, a informação
Cirlene de Jesus Alves** auditiva é transmitida ao cérebro, o que permite a sua compreensão, ou seja,
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
alves.cirlene@gmail.com a percepção. No intuito de entender como esse sinal de fala é percebido,
Vera Pacheco*** nesta pesquisa, utiliza-se um método que, segundo Derwing e Almeida
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
vera.pacheco@gmail.com (2004) é bastante utilizado em estudos de teorias e modelos de
representação e processamento lingüístico, o cronométrico (usualmente
também chamado de on-line).
RESUMO
Este trabalho objetiva uma investigação do tipo on-line da percepção das vogais médias baixas Por meio do método cronométrico, o presente trabalho propõe
pretônicas típicas de falantes de Vitória da Conquista, BA. Propõe-se avaliar o tempo gasto nas
respostas que resgatam e não resgatam a vogal do sinal acústico, além de avaliar a relação entre investigar o processo de percepção das vogais médias baixas em posição
o tempo e o tipo de resposta. Foi mensurado o tempo de resposta gasto no teste de percepção.
Os resultados obtidos (i) não atestam diferença significativa entre o tempo de resposta gasto pretônica que ocorrem no dialeto de Vitória da Conquista/BA. Pretende-se
quando se recupera e não recupera as vogais dos sinais acústicos, e, (ii) não atesta dependência
entre tempo e tipo de resposta. investigar se há relação entre o tempo gasto nas respostas dadas no teste de
PALAVRAS-CHAVE: Percepção. Pretônica. Tempo. Vogais médias. percepção e o tipo de resposta.

MATERIAL E MÉTODOS

INTRODUÇÃO
Previamente, para esta pesquisa, foram gravadas, em frases-veículo,
palavras que apresentam vogais médias pretônica. Dentre estas foram
A fala humana, conforme Gleason (1988), é um sinal acústico complexo
selecionados pares de palavras, em cujo contexto as vogais médias abertas e
e contínuo. Entretanto, sabe-se que esse sinal pode ser percebido em termos
fechadas eram correspondentes. Nestes pares de palavras, com o auxílio do
de unidades discretas, como os segmentos fonéticos, e que, a partir da
software Praat, realizou-se a permuta de vogais médias abertas e fechadas.
decodificação desses segmentos, este sinal pode ser compreendido. Essa
Deste modo, obtiveram-se realizações diferenciadas de uma mesma
compreensão em significado lingüístico é possibilitada basicamente por dois
palavra, ou seja, de cada palavra “original”, sem modificação, obteve-se uma
nova realização “modificada”. Às gravações originais e modificadas foram
somadas palavras distratoras, como, por exemplo, tramela, uniforme e
*Trabalho vinculado ao projeto de pesquisa “Investigação fonético-fonológica das vogais médias abertas em posição pretônica na fala de Vitória da
Conquista/BA” coordenado pela Profa Dra Vera Pacheco.
** Bolsista PIBIC/CNPq. Aluna regular do curso de Letras, IV semestre. UESB - Campus de Vitória da Conquista.
cabelo. Essas gravações, “originais” e “modificadas”, foram tocadas por três
***Orientadora. Doutora em Lingüística.

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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 83-87.
85 86
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vezes, em ordem aleatória, aos informantes naturais de Vitória da


Conquista/BA de forma individual num teste de percepção. A cada um deles
solicitou-se que, à escuta dessas palavras, indicassem oralmente a que vogal
correspondia o sinal ouvido na posição em questão. Neste momento, então,
foi cronometrado o tempo gasto em cada uma das respostas, para sinal
acústico modificado e para sinal acústico sem modificação.
Objetivando verificar se as diferenças entre as porcentagens médias do
A relação entre o tipo de resposta dado (recuperação ou não da vogal
tempo gasto nas respostas que resgatavam e que não resgatavam a vogal do
presente no sinal acústico) e o tempo gasto nessas respostas também foi
sinal acústico, foi usado o teste t de comparação de médias. As diferenças
avaliado. Os resultados encontrados (tabela 2) indicam que não há qualquer
entre as médias foram consideradas significativas para p<0.05, com nível de
relação entre o tipo de resposta dado e o tempo gasto pelo ouvinte para dar
significância igual a 0.05.
essa resposta.
Além disso, foi realizado o teste de regressão linear simples com vistas
Dessa forma, pode-se afirmar que o tempo de resposta gasto
a verificar se havia dependência entre tipo de resposta dada (resgate ou não
independe do tipo de resposta dado. Assim, o tempo gasto em uma resposta
da informação contida no sinal acústico) e o tempo gasto nessas respostas.
que resgate a vogal que está no sinal acústico não tem qualquer relação com
essa resposta dada, como também o tempo gasto em uma resposta que não
RESULTADOS E DISCUSSÕES
resgate essa vogal do sinal acústico não está atrelado a essa resposta.

De acordo com os resultados obtidos, as porcentagens médias do


tempo gasto para as respostas que resgatavam as vogais do sinal acústico e
as que não resgatavam as vogais desse sinal são estatisticamente iguais
(tabela 1).
Esses resultados são evidências de que o processo de identificação da
qualidade vocálica do sinal acústico não difere do processo no qual a
recuperação da vogal média está fora desse sinal. Resgatar ou não a
CONCLUSÕES
informação do sinal acústico não requer mais ou menos tempo de
processamento.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
87 88
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Neste trabalho são encontradas fortes evidências de que o tempo gasto


em respostas que recuperam as vogais médias baixas que estão no sinal
acústico não difere do tempo gasto nas respostas que não recuperam tais
vogais. Além disso, o tempo gasto nas respostas independe do tipo de
resposta dado.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CAMARA JR., J. M. Estrutura da Língua Portuguesa. Petrópolis: Editora


Vozes, 1997.
DERWING,B.L.; ALMEIDA, R. G de. Métodos Experimentais em Lingüística.
In: MAIA, M. & FINGER, I. (Eds.) Processamento da Linguagem. Porto
Alegre: Educart, 2004.
GLEASON, J.; B.; RATNE, N. B. (eds). Psycholinguistics. 2ª ed.
Philadelphia: Harcourt Brace College Publishers, 1998.
MARTINS, M.R. O. Ouvir falar: Introdução à Fonética do Português.
Lisboa: Caminho, 1998.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
89 90
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Hoje, a duração segmental, dentre outras características acústicas dos


NOVAS EVIDÊNCIAS FONÉTICO-EXPERIMENTAIS PARA A
segmentos, passou a ser considerada como objeto de estudo. Assim, Moraes
NATUREZA BIFONÊMICA DA VOGAL NASAL DO PORTUGUÊS
BRASILEIRO e Wetzels (1992) analisaram a duração dos segmentos vocálicos nasais e
nasalizados e encontraram que as vogais nasais são mais longas que as
Luiz Carlos da Silva Souza*
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
orais, o que ratifica que a vogal nasal seja formada por dois segmentos
luizcarlossil@gmail.com
(V+N). Pacheco (2004) buscou analisar a duração das vogais travadas pelas
Vera Pacheco**
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia consoantes /N/, /R/ e /S/ em palavras com a estrutura CVC.CV, com oclusiva
vera.pacheco@gmail.com
na segunda sílaba. Os resultados indicaram que a soma das vogais com
qualquer uma dessas consoantes em coda silábica é que o valor da vogal em
RESUMO sílaba aberta. Esses dados dão uma maior evidência de que as vogais
As vogais nasais despertam o interesse dos fonólogos e foneticistas há muito tempo. Câmara Jr.
(1970) afirmou que elas apresentam comportamento de vogais travadas por consoantes. Moraes e “nasais” caracterizam-se por serem uma vogal travada por uma consoante
Wetzels (1992), utilizando a fonética experimental, analisaram a duração dos segmentos vocálicos
nasais e nasalizados e encontraram que as vogais nasais são mais longas que as orais, o que nasal, da mesma forma que o são pelas consoantes /R/ e /S/.
ratifica que a vogal nasal seja formada por V+N. Neste trabalho, foram encontradas evidências
para ratificar a hipótese de que as vogais nasais são bifonemas, ou seja, vogais em sílabas O presente trabalho propõe uma investigação experimental da duração
fechadas pela consoante /N/ da mesma forma que pelas consoantes /R/ e /S/.
segmental que busque fornecer dados para a discussão sobre a natureza
PALAVRAS-CHAVE: Vogais nasais. Duração. Consoantes.
mono ou bifonêmica das vogais nasais.

MATERIAL E MÉTODOS

INTRODUÇÃO
Há muito tempo que as vogais nasais do Português Brasileiro (PB), Compôs-se um corpus com palavras monossílabas e dissílabas. Os

aquelas que podem ser chamadas de fonemas, como em “canta”, distintas monossílabos são formados pela estrutura CVC e CV, com as vogais /a/, /i/ e

das nasalizadas, em “cama”, tem despertado o interesse dos lingüistas. /u/ ocupando a posição de núcleo silábico. A posição das consoantes em

Câmara Jr. (1970), desde a década de 60, já tratava da natureza das nasais onset é ocupada pelas oclusivas /p/, /b/, /t/, /d/ e /k/, /g/ e pelas fricativas

do PB, afirmando que elas comportam-se como vogais travadas por /f/, /v/, /s/ e /z/; as consoantes em coda silábica são /N/, /R/ e /S/. Têm-se,

consoante. assim, palavras como “pam”, “bis”, “dar”, “fam”, “vir”, “zás”, dentre outras.
As palavras dissílabas apresentam as estruturas CV.CV, CVC.CV., das quais
resultam palavras como “canta”, “cama”, “carta”, “casta” e “cata”. A partir
*Aluno voluntário de Iniciação Científica do Curso de Letras, Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB, campus de Vitória da
Conquista – BA
** Orientadora. Doutora em Lingüística
delas, pôde-se verificar a diferença duracional entre vogais nasais,
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 89-93. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
91 92
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nasalizadas, orais em sílaba fechada e aberta. As palavras foram inseridas na Entretanto, nos mesmos dados encontra-se que V=VC. Nesse caso,
frase-veículo “Digo ____ baixinho”. dizer que as vogais nasais (VN) são monofonemas (V) é afirmar que vogal
As frases foram impressas individualmente em papéis brancos e oral+consoante de coda, /R/ ou /S/, também o são; VN=VC=V excluiria a
apresentadas a um informante de forma aleatória com um intervalo de tempo hipótese de vogais nasais como bifonemas e apresentaria uma outra que
indeterminado entre uma frase e outra. insere VC no quadro dos monofonemas.
As gravações foram efetuadas num estúdio através do aparelho Quanto à analise dos segmentos em palavras dissílabas, observou-se
Olympus Digital Wave Player em alta qualidade. Cada frase foi gravada três que as vogais orais em sílaba aberta antes de oclusivas surdas apresentam
vezes em taxa de elocução normal. O informante é do sexo feminino, com duração maior que as vogais nasalizadas; mas, quando aquelas antecedem
perfeita dicção, da cidade de Vitória da Conquista - BA. oclusivas sonoras, não possuem diferença de duração em relação às vogais
As medidas foram feitas no programa Praat. Os dados foram nasalizadas.
submetidos ao teste estatístico Anova-um critério, para certificar se as Na comparação entre vogais nasais e nasalizadas, encontrou-se que as
médias das três medidas de cada um dos segmentos apresentavam vogais nasais apresentam maior duração, assim como foi constatado por
diferenças significativas entre si. As médias foram consideradas diferentes Moraes e Wetzels (1992). Comparando-se a duração das vogais orais em
para p<0,05. sílaba aberta com a duração das vogais nasais, observou-se uma maior
duração para as vogais orais em sílaba aberta, o que difere dos dados com os
RESULTADOS E DISCUSSÃO monossílabos; no entanto, não houve diferença entre a duração dessas
vogais, quando as orais antecediam oclusivas sonoras.
Analisando as vogais nasais e orais em palavras monossílabas, Em relação à duração das vogais orais em sílaba aberta e em sílaba
observou-se que as vogais nasais apresentaram valor duracional igual à soma fechada por /R/ e /S/ seguidas por oclusivas surdas e sonoras, observou-se
da duração das vogais orais em sílaba fechada com a duração das uma maior duração para as vogais em sílaba aberta independentemente da
5
consoantes de coda /R/ e /S/, ou seja, VN=VC , evidências para a natureza sonoridade das consoantes seguintes, indo ao encontro dos resultados
bifonêmica das vogais nasais. Porém, as vogais nasais também mostraram obtidos por Souza e Pacheco (2005). Assim, vê-se que as vogais nasais e as
comportamento duracional igual ao das vogais orais em sílaba aberta vogais orais adjacentes às consoantes de coda, /R/ e /S/, apresentam
(VN=V), valores que podem ser utilizados para confirmar a hipótese de que comportamento semelhante, dando indícios de que as vogais nasais são
elas sejam monofonemas. também vogais travadas por uma consoante de coda (/N/), como defendeu
Câmara Jr. (1970).

5 C representa as consoantes /R/ e /S/.

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93 94
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Em relação às outras comparações, os dados indicaram haver intrínseca


relação entre a qualidade das consoantes que seguiam as sílabas nas quais
os segmentos em questão estavam inseridos e a duração desses; sendo,
portanto, necessária uma investigação mais apurada a fim de se tecer
objetivas informações.

CONCLUSÕES

Pode-se concluir, portanto, que os resultados obtidos neste trabalho


com palavras monossílabas e dissílabas constituem evidências fonético-
experimentais que corroboram a hipótese da natureza bifonêmica das vogais
nasais do PB, o que corresponde à organização do sistema fonológico dessa
língua.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BOERSMA, P.; WEENINK, D. Praat software. Versão 4.0. The Netherlands,


Amsterdam: 2002.
CÂMARA JR., J. M. Estrutura da língua portuguesa. Petrópolis: Vozes,
1980. 124. p. Edição original: 1970.
MORAES, J. A.; WETZELS, W. L. Sobre a duração dos segmentos vocálicos
nasais e nasalizados em português. Um exercício de fonologia experimental.
Cadernos de estudos lingüísticos, Campinas: n. 23, p. 153-166, 1992.
PACHECO, V. Micro-prosódia segmental e estrutura silábica: o caso das
oclusivas – dados preliminares. Inventário: http://www.inventario.ufba.br/,
v. 3, p. 1-11, 2004.
SOUZA, L. C. S.; PACHECO, Vera. Relação entre a estrutura silábica e a
duração segmental em monossílabos CVC no PB ?. In: Resumos do IX
CONPEX/IX Seminário de Iniciação Científica. 2005 (no prelo).

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95 96
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aprofundados sobre a prosódia desta e de outras línguas da família Karíb são


O ACENTO NA LÍNGUA TAUREPANG (FAMÍLIA KARÍB)
necessários para que se possa melhor compreender suas particularidades
fonológicas e gramaticais e o grau de parentesco com as outras línguas da
Katia Nepomuceno Pessoa∗
Instituto de Estudos da Linguagem – Universidade Estadual de Campinas mesma família. O objetivo principal desta pesquisa é descrever o acento da
knpessoa@hotmail.com
língua Taurepang.

RESUMO
O Taurepang é uma língua indígena pertencente à Família Karíb, falada em Roraima. Estudos
MATERIAL E MÉTODOS
sobre a prosódia são necessários para se compreender melhor as particularidades desta língua.
Buscou-se descrever o acento da língua Taurepang, através da Teoria métrica do Acento (Hayes,
1995). Os dados foram coletados na aldeia Boca da Mata (Roraima) e as análises acústicas feitas Os dados foram coletados na aldeia Boca da Mata, em Roraima, entre os
pelo programa CECIL. A análise revelou a existência do padrão rítmico iâmbico, já observado em
línguas aparentadas ao Taurepang (Pemon, Macuxi) e em outras línguas da família Karíb. meses de março/abril de 2006. Para o presente estudo, fez-se uso de
Perceberam-se também curiosidades em relação ao comportamento do acento em palavras
dissilábicas. pressupostos da Fonologia Moderna, mais em particular, da Teoria Métrica do
PALAVRAS-CHAVE: Fonologia. Acento. Línguas indígenas Acento (Hayes, 1995). As análises acústicas foram realizadas através do uso
do programa de análise acústica computacional CECIL (Computerized
Extraction of Components of Intonation in Language).

INTRODUÇÃO
RESULTADOS E DISCUSSÃO

Estima-se que no Brasil ainda são faladas cerca de 180 línguas


A análise dos dados evidenciou os seguintes aspectos importantes: em
indígenas, que se distribuem principalmente entre as regiões Amazônica e
nível suprassegmental, a análise do acento em Taurepang revela a existência
Centro-Oeste, nos estados do Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima, Acre,
do padrão rítmico iâmbico. Este padrão é observado em línguas com maior
Maranhão, Mato Grosso do Sul, Goiás e Tocantins e, em menor número, em
grau de parentesco com o Taurepang, como é o caso do Pemon, do Ingarikó,
outros estados do Brasil, sendo algumas das línguas faladas em regiões de
do Macuxi, além de ocorrer também em outras línguas da família Karíb que
fronteiras com outros países (SEKI, 1999). O Taurepang é uma língua
apresentam menor grau de parentesco, como o Tyriyó e o Hixkaryana. Outra
indígena pertencente à Família Lingüística Karíb, falada no extremo norte de
característica observada no padrão acentual desta língua se refere à
Roraima, por cerca de 500 pessoas. Segundo Gildea (2003), mais estudos
sensibilidade ao peso, uma vez que a língua Taurepang apresenta sílabas do
tipo (C)VC e vogais subjacentementes longas, que contribuem para a

Doutoranda em Lingüística. atribuição do acento. Por outro lado, as diferenças observadas
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa _____________________________________________________________________________
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 95-98.
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
97 98
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comparativamente a outros sistemas lingüísticos (como o Tiriyó, Hixkaryana, CRUZ, Maria Odileiz Sousa. A fonologia Taurepang: a língua da família
Karib falada em Roraima. 125 p [Dissertação de Mestrado].Universidade
Macuxi, Ingarikó e Pemón) referem-se principalmente ao papel da última
Federal de Pernambuco, Programa de Pós-Graduação em Letras e Lingüística,
sílaba dentro da palavra, que, por vezes, é considerado como extramétrico e, Recife,1995.
outras vezes, como pé degenerado. Pode-se ainda verificar um aspecto CRUZ, Maria Odileiz Sousa. Fonologia e gramática Ingarikó Ka pon.
464 p. [Tese de Doutorado]. Vrije Universiteit Amsterdam, Amsterdam,
curioso quanto ao comportamento acentual desta língua e ao mesmo tempo 2005.
intrigante para a teoria métrica do acento proposta por Hayes (1995): DERBYSHIRE, Desmond C. Carib. The Amazonian Languages.
observaram-se algumas peculiaridades quanto ao acento em palavras Cambridge: Cambridge University Pree, 1999.
EDWARDS, Walter, F. Preliminary sketch of Arekuna (Carib)
dissilábicas, o que difere do comportamento observado nas outras línguas da
phonology. Internacional Journal of American Linguistics, v.44, n. 3, p.223-
mesma família. O acento em Taurepang apresenta, dessa forma, segundo a 227, 1978.
observação dos parâmetros propostos por Hayes (1995), as seguintes GILDEA, Spike. Proposing a new branch for the Cariban language
family. Ameridia, v. 28, p. 7-32, 2003.
características: a) direção: da esquerda para a direita; b) padrão rítmico:
HAYES, Bruce. Metrical stress theory: principles and case studies.
iâmbico; c) sensibilidade ao peso silábico; d) ocorrência de pés degenerados; Chicago: University of Chicago Press, 1995.
e e) proibição de extrametricidade. MEIRA, Sergio. Rhytmic stress in Tiriyó (Cariban). International Journal
of American Linguistics. v. 64, n. 4, p. 352-378, 1998.
SEKI, L. A Lingüística Indígena no Brasil. DELTA, v.15, nº esp. p. 257-
CONCLUSÕES
290, 1999.

Pode-se concluir, então, até onde os dados permitem, que de maneira


geral o padrão iâmbico atua sobre as palavras em Taurepang, tornando
previsível a posição das sílabas acentuadas tanto em nível lexical como frasal.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ÁLVAREZ, José. Un estudio preliminary de la duración y la cantidad vocálicas


en el Pemón Tarepán (Karíb). Lingua Americana, v. 1, p. 1-28, 1997.
CARSON, Neusa. Phonology and morphosyntax of Macuxi (Carib).
[Ph.D dissertation]. University of Kansas, 1981.
CLEMENTS, George, Hume, Elizabeth. The internal organization of speech
sounds. In: Goldsmith, J. (ed.). The hand book of phonological
theory. Oxford: Blackwell, 1995. p. 245-306. 1995.

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99 100
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Considerando que o encadeamento do /r/ é um processo bastante produtivo


REFLEXÕES ACERCA DOS PROCESSOS DE ENCADEAMENTO,
no Português do Brasil (doravante PB) e que, tanto os dialetos do inglês
VOCALIZAÇÃO E EPÊNTESE DO /R/ NO DIALETO PAULISTA
quanto o dialeto paulista caracterizam-se pela ocorrência do /r/ retroflexo na
Cândida Mara Britto Leite* coda silábica, pergunta-se: (i) o fato de o dialeto paulista ter em coda silábica
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
candidamara@gmail.com o /r/ retroflexo, à semelhança do inglês, é condição para que haja a
emergência dos processos de vocalização e de epêntese de /r/?

RESUMO
Neste texto, são apresentados os primeiros resultados de um estudo que objetiva investigar a MATERIAL E MÉTODOS
relação entre os processos fonológicos de encadeamento, vocalização e epêntese, todos
relacionados aos róticos no Português do Brasil (PB). Esses processos fonológicos são bastante
produtivos em alguns dialetos do inglês, conforme atesta o estudo realizado por Gick (1999),
dentre outros. Por fim, são apresentadas algumas hipóteses acerca da relação entre os referidos O corpus deste trabalho constitui-se de dados coletados junto a um
processos para os dados do dialeto paulista até então analisados.
informante, aqui denominado como NM, falante do PB, com dicção normal,
PALAVRAS CHAVE: Português do Brasil. Processos fonológicos. Róticos.
sexo masculino, 40 anos de idade e natural de Itatiba (SP)6.
Para a coleta dos dados, foi montado um design experimental
composto por sentenças e narrativas curtas nas quais eram inseridas as

INTRODUÇÃO construções-alvo. As sentenças e narrativas foram lidas em velocidade de fala


normal e rápida. Esses dados foram gravados em um aparelho portátil Sony

Processos fonológicos relacionados ao /r/ como a epêntese (intrusive MZNH1 Minidisc Player/Recorder, utilizando um microfone handset

r), vocalização e encadeamento (linking /r/) são encontrados em dialetos do Plantronics, modelo audio 50. Em seguida, esses dados foram transcritos,

Norte da Alemanha e do inglês (dialeto que caracteriza a pronúncia recebida segmentados manualmente e analisados através do software Praat7.

do sul britânico – denominado RP – e do dialeto do leste de Massachusetts),


conforme descreve Gick (1999). Segundo este autor, todos os dialetos em RESULTADOS E DISCUSSÃO

que é possível detectar o processo de epêntese de /r/, parece também


requerer os outros dois processos citados acima, quais sejam: a vocalização e A vocalização do /r/ que ocorre em dialetos do inglês é apresentada por

o encadeamento /r/. Gick (1999) como redução ou completa queda desse segmento em posição
de coda silábica. Segundo Gick (1999), no dialeto RP, quando o /r/ é

*
Mestre em Lingüística. Doutoranda em Lingüística na Unicamp. Professora do Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários – 6Itatiba é um dos onze municípios da microrregião de Bragança Paulista que, por sua vez, pertence à mesorregião Macro Metropolitana Paulista.
UESB. Campus de Vitória da Conquista. 7 Software gratuito, desenvolvido por Paul Boersma and David Weenink, disponível no seguinte endereço eletrônico:
http://www.fon.hum.uva.nl/praat/.
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa _____________________________________________________________________________
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 99-103.
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
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precedido pelas vogais [a, ´, ѐ], apresenta-se, aparentemente, fundido a Além desses processos, há, ainda, o processo descrito como intrusive r,

essas vogais. Por outro lado, quando é precedido por vogais altas ou glides, o já descrito por outros pesquisadores, e aqui designado apenas como

/r/ final realiza-se como um schwa8. epêntese. Segundo Dubois (1973), a epêntese é o fenômeno que consiste em

Nas análises dos dados de informantes naturais da cidade de São José intercalar numa palavra ou grupo de palavras um fonema não-etimológico

do Rio Preto, verificam-se realizações que, auditivamente, indicam que há por motivos de eufonia, de comodidade articulatória, por analogia, etc. O

uma vocalização do /r/ que ocorre em coda silábica medial. Assim como nos processo descrito por Gick (1999) como intrusive r caracteriza-se pela

dados dos dialetos do inglês, é possível encontrar casos em que há a redução presença de uma consoante não etimológica – o /r/ – presente entre duas

do rótico ou mesmo a completa vocalização desse segmento que se realiza vogais heterossilábicas. Os processos de epêntese e de encadeamento

sob a forma de um glide [j]. A inspeção acústica parece confirmar essa apresentam a mesma realização fonética. A distinção entre esses processos

percepção auditiva, uma vez que são notórias as características formânticas deve-se ao fato de, no processo de epêntese (intrusive r), não existir o

que delineiam o glide. Dessa forma, foi possível identificar realizações como fonema /r/ em posição final nos vocábulos em que o processo incide.

[baj´ziNU], para “barzinho”. Conforme Gick (1999), esse processo só ocorre em dialetos em que há
vocalização e encadeamento.
Gick (1999) afirma que em dialetos em que há o processo de
Os dados do informante NM foram analisados com o intuito de checar a
vocalização, há também o processo de encadeamento, embora a ocorrência
veracidade da assertiva de Gick (1999), descrita acima. O resultado dessa
daquele processo não implique na realização deste. O encadeamento ocorre
análise mostrou que o processo de encadeamento ocorreu sempre que houve
sempre que há a realização do /r/ final quando este segmento é seguido por
contexto favorecedor a esse processo, como em: [po‫ש‬a´bѐlå] no cesto de
vogal na sílaba seguinte. Como resultado desse processo, há uma
ressilabação, de forma que o rótico que antes ocupava a coda passa a ocupar papel; [nesto’‫ש‬E] funcionário do governo; O [ma’‫ש‬E] a coisa mais bonita do
a posição de onset da sílaba seguinte. Para o inglês, esse processo ocorre mundo; [‘tѐ‫ש‬E] o deus do trovão da mitologia nórdica. No entanto, não houve
quando o /r/ está diante das seguintes vogais: /a/, /ѐ/ e /´/ , resultando em vocalização do /r/ em coda, tanto medial qunto final.
formas como [´ma:®iz], para “mar is”; [´lѐ:®iz], para “lore is” e [´kod´®iz], O processo de epêntese também não foi realizado pelo informante em

para “coder is”. No dialeto paulista, assim como em outros dialetos do PB, nenhum dos ambientes favorecedores da regra, ou seja, aqueles que
parecem seguir por razo~es de analogia ou de similaridade fonética os
esse processo resulta em construções como [po‫ש‬u´kaxu], para “pôr o carro”,
ambientes propiciadores do processo de encadeamento, quais sejam: “pô em
dentre outras.
contraponto a pôr”, “má” em contraponto a “mar”; “Thor” em contraponto a
8 Quanto a esse processo, Gick (1999) apresenta a interpretação de Giegerich (1997), o qual argumenta que o /r/ realiza-se foneticamente como schwa, mesmo quando precedido pelas vogais [a, ´, ѐ], resultando em “Tó”, dentre outros. Vale observar que em sentenças como “A pessoa má é
formas fonéticas como [a´] e [ѐ´].

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respeitada pela sociedade”, assim como nas demais, a inserção do /r/ seria
pertinente segundo as exigências da estrutura silábica do PB, resultando em
construções como “A pessoa [ma’‫ש‬E] respeitada pela sociedade” e, no

entanto, não foram encontradas evidências de realização desse processo.

CONCLUSÕES

As análises mostraram que há a realização do processo de


encadeamento, mas não há vocalização e nem o processo de epêntese nos
dados analisados. Esses resultados, embora preliminares, reforçam a
generalização postulada por Gick (1999), pois, se não há vocalização,
condição necessária para a ocorrência do /r/ intrusivo, não ocorrerá
epêntese. Diante dessas primeiras deduções, torna-se necessário: (i)
investigar, através de dados mais robustos, a abrangência e vitalidade do
processo de vocalização no dialeto paulista, tarefa que será realizada em
trabalhos futuros, e (ii) verificar se a hipótese de Gick (1999) se confirma
para dialetos do PB em que há a vocalização.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DUBOIS, J. et. al. Dicionário de Lingüística. São Paulo: Cultrix, 1973.


GICK, B. A gesture-based account of intrusive consonants in English.
Phonology, Cambridge University Press, n. 16, p. 29-54, 1999.
LEITE, C. M. B. Atitudes Lingüísticas: A Variante Retroflexa em Foco.
150 p. [Dissertação de Mestrado em Lingüística]. Instituto de Estudos da
Linguagem da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP, 2004.
_____. Caracterização acústica da vocalização do /r/ no dialeto
paulista. Texto inédito.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
105 106
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

por muito tempo o processo foi considerado uma maneira do falar inculto de
UM ESTUDO DO PROCESSO DE APAGAMENTO DE /R/ EM FUNÇÃO
pessoas desprestigiadas socialmente. Porém, hoje há um consenso de que a
DE FATORES DE ORDEM ESTRUTURAL-CONTEXTUAL*
não-realização do /r/ é algo que está presente em todos os extratos sociais e
Renato Abreu Soares** na maioria dos dialetos do Brasil, o que leva a crer que estamos diante de
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
renatoabreusoares@hotmail.com uma mudança em progresso. Dentre os fatores lingüísticos envolvidos no
***
Cândida Mara Britto Leite processo de apagamento, a classe morfológica é um dos fatores que mais
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
candidamara@gmail.com
influencia no fenômeno (MONARETTO, 2000). No que se refere ao PE, além da
classe morfológica, outro fator que condiciona o apagamento do /r/ é,

RESUMO segundo Mateus (2003), o caráter contextual seguinte ao segmento em


Este trabalho investiga o processo de apagamento dos róticos em posição de coda em final de
palavra junto a um dialeto do interior paulista. Nesta etapa da investigação, objetiva-se averiguar
questão (se vogal, consoante vozeada/ não-vozeada ou pausa), o qual é
a importância que diferentes fatores lingüísticos exercem na aplicação desse processo. Além de
fatores como classe morfológica, dimensão da palavra e função do /r/, já apontados como
levado também em consideração neste trabalho.
condicionadores importantes na aplicação do referido processo no Português do Brasil (PB),
analisaremos a influência que o segmento inicial da palavra que se segue ao rótico exerce no
apagamento do /r/ final. Os resultados serão contrapostos àqueles encontrados por Mateus MATERIAL E MÉTODOS
(2003), para o Português Europeu (PE).

PALAVRAS-CHAVE: Português do Brasil. Processo de Apagamento. Róticos.


O corpus deste trabalho constitui-se de dados coletados mediante
entrevista junto a oito informantes (quatro do sexo feminino e quatro do
sexo masculino), falantes do PB, com dicção normal, com idades que
INTRODUÇÃO variavam entre 19 a 25 anos e de mesma naturalidade, São José do Rio
Preto. Os dados coletados foram gravados em uma sala acusticamente
O apagamento do /r/ em posição de coda final é um fenômeno antigo e tratada9, em seguida foram transcritos e catalogados segundo os seguintes
muitos lingüistas têm se dedicado a compreender os fatores que o fatores: classe morfológica (verbos e não verbos), função do /r/ (morfema ou
condicionam. Callou et al. (1998) afirmam que este processo era usado por não-morfema), dimensão da palavra (monossílabo, dissílabo, trissílabo ou
Gil Vicente para singularizar a fala dos escravos em suas peças, sendo que polissílabo), contexto precedente (vogal anterior, central e posterior), gênero
(feminino e masculino) e contexto seguinte (vogal anterior, central ou

* Trabalho ligado ao projeto de pesquisa “Para a Descrição Fonético-Acústica dos Sons de /r/ em Posição de coda Silábica”, financiado pela
posterior, oclusiva, fricativa, nasal, lateral ou pausa), uma vez que tais
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia e coordenado pela Profª. Ms. Cândida Mara Britto Leite.
** Bolsista de IC voluntário – UESB
*** Mestre em Lingüística. Doutoranda em Lingüística na Unicamp. Professora do Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários – UESB.

Campus de Vitória da Conquista. 9Esse procedimento justifica-se porque é objetivo desta pesquisa, em uma etapa posterior, realizar uma investigação fonético-acústica com os
dados dos oito informantes.
______________________________________________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa _____________________________________________________________________________
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 105-109.
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
107 108
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

fatores mostraram-se significativos na aplicação, ou não, da regra de Em se tratando do contexto seguinte, o /r/ final tem uma maior
apagamento de /r/ em pesquisas como a de Monaretto (2000) e Mateus tendência a ser suprimido quando é seguido por uma consoante oclusiva na
(2003). sílaba seguinte (18,2%). Depois das oclusivas, os contextos, em ordem
decrescente, que mais propiciam o apagamento do /r/ final são: nasais e
RESULTADOS E DISCUSSÃO vogais anteriores (9,7%), vogais posteriores (8,8%), vogais centrais (8,2%),
o contexto de pausa (6,8%), fricativas (5,2%) e laterais (0,50%), como
O /r/ em coda final pode ser totalmente suprimido, fato que pode ser podem ser visualizados no gráfico abaixo:
constatado tanto no PB (CALLOU et al. 1998, 2002), quanto no PE (MATEUS,
2003). Essa supressão é fortemente influenciada por fatores lingüísticos e, GRÁFICO 1 - Apagame nto do /r/ em função do conte xto
seguinte
dentre os fatores que corroboram para a aplicação da regra de apagamento,
destaca-se o fator classe morfológica. Os dados analisados compõem-se de Vogais anteriores
20 18,2
599 vocábulos, dentre os quais 402 (67,1 %) são de não realizações do /r/, Vogais centrais
15
enquanto que em 197 vocábulos (32,9%) o segmento em questão realiza-se. Vogais posteriores

Porcentagem
9,7 9,7
8,8
8,2
O maior número de apagamento do /r/ deve-se aos verbos (96,3%), fato que 10
6,8 oclusivas
5,2
fricativas
mostra o quanto esse processo está relacionado à classe morfológica. Nos
5 nasais
0,5
dados do PE analisados por Mateus (2003), a sensibilidade a esse fator não
laterais
se mostrou tão categórica, mas apenas ligeiramente superior nos verbos. 0
Fatores pausa
Quanto ao contexto adjacente, foram checadas as influências do
contexto precedente (vogal anterior, central ou posterior) e do contexto
referente ao segmento inicial da palavra que se segue ao /r/ final – se vogal
O resultado que é apresentado no gráfico apresenta certa similaridade
(anterior, central e posterior), consoante (oclusiva, fricativa, nasal, lateral) ou
com aquele encontrado por Mateus (2003) para o PE, visto que o contexto
pausa.
seguinte que mais condiciona o processo de apagamento do /r/ em final de
No que se refere ao contexto precedente, não há uma margem muito
palavra para os dados apresentados neste trabalho é o das oclusivas,
dispare entre os ambientes selecionados, mas o maior percentual de
enquanto que para o PE, as oclusivas desempenham um papel tão
apagamento ocorre quando há uma vogal anterior precedendo o rótico, o
significativo nesse processo quanto àquele desempenhado pelas fricativas,
que corresponde a 96,3%.
com porcentagens iguais, correspondendo a 29% da amostra.

_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
109 110
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

CONCLUSÃO

As análises mostraram que os fatores estruturais/contextuais exercem


um papel significativo no que diz respeito ao processo de apagamento de /r/
em final de palavra. Além da classe morfológica, a análise do contexto
seguinte ao rótico revela pistas importantes na tarefa de descrição, bem
como de futuras interpretações que poderão vir a ser formuladas na tentativa
de estabelecer generalizações acerca do processo aqui descrito.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CALLOU, D. MORAES, J. A. LEITE, Y. Apagamento do R final no dialeto


carioca: um estudo em tempo aparente e em tempo real. DELTA. v. 14. São
Paulo. 1998.
_____. Processo (s) de Enfraquecimento Consonantal no Português do Brasil.
In.: ABAURRE, M. B. M. e RODRIGUES, A. C. S. (Org). Gramática do
Português Falado, v. VIII: Novos Estudos Descritivos. Campinas, SP:
Ed. da UNICAMP/FAPESP, 2002.
MATEUS, M. H. M. e RODRIGUES, C. (2003). A vibrante em coda no
português europeu. Disponível em www.iltec.pt/pdf/wpapers/2003-
mhmateus-vibrante_em_coda.pdf. Acesso em: 30 jun. 2007.
MONARETTO, V. N. de O. O apagamento da vibrante posvocálica nas capitais
do sul do Brasil. Letras de Hoje. Porto Alegre. V. 35, nº. 1. p. 275-284,
março de 2000.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM
E SINTAXE
113 114
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

No que diz respeito ao estudo dos Parâmetros, um dos fenômenos mais


A AQUISIÇÃO DE SUJEITO NULO NO
estudados é a capacidade de algumas línguas licenciarem o sujeito nulo. É
PORTUGUÊS BRASILEIRO (PB): UM ESTUDO COMPARATIVO1
essa capacidade que diferencia línguas como, por exemplo, o Espanhol, que
Samile Santos Pinto* permite o apagamento do sujeito, de línguas como o Francês, que não o
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
samile_pinto@hotmail.com admite:
Telma Moreira Vianna Magalhães*
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
telma.magalhães@cnpq.br (1) Llovió ayer. (Esp)
(2) Il a plu hier. (Fr.)

RESUMO O famoso Parâmetro do Sujeito Nulo (Chomsky, 1981) tem sua


Este trabalho é um estudo comparativo acerca da aquisição de sujeito nulo em duas crianças
nascidas em Vitória da Conquista-BA e Campinas-SP. Objetiva-se verificar se entre esses dialetos propriedade básica definida em termos das propriedades flexionais das
do PB há alguma distinção quanto à ocorrência desses sujeitos. A análise dos dados aponta para
um alto índice de sujeitos nulos para ambas as crianças, assim como um licenciamento maior de línguas: línguas em que o sistema flexional permite a recuperação do sujeito
nulos de terceira pessoa. Como no PB a terceira pessoa não possui morfema flexional que licencie
uma cv na posição de sujeito, supõe-se que exista alguma outra estratégia usada pela língua para omitido são chamadas de línguas “pro-drop”. Estas se distinguem das línguas
licenciar tal categoria (cf. Magalhães, 2006).
“não-pro-drop”, as quais o sistema flexional não permite a omissão do
PALAVRAS - CHAVE: Morfema Flexional. Português Brasileiro. Sujeito Nulo.
sujeito.
É sabido que, entre as línguas, existem variações em todos os níveis
gramaticais. Ao levar em conta os níveis morfológico e sintático, percebe-se
INTRODUÇÃO que estas distinções são mais visíveis nos sistemas flexional e pronominal.
Dessa forma, a redução na ocorrência de sujeito nulo no PB, segundo Duarte
Quando Chomsky propôs, em 1981, o modelo de gramática baseado (1993), é devido à simplificação do seu paradigma flexional: de 6 para 3
em Princípios – rígidos e invariáveis entre as línguas naturais – e Parâmetros formas distintas.
– codificadores das propriedades variáveis entre as mesmas –, os estudos
lingüísticos, no âmbito da Teoria Gerativa, tomaram novos rumos. MATERIAL E MÉTODOS

1
Pesquisa financiada pelo CNPQ (Edital Universal – 2006, processo nº. 479082/ 2006-5) e pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia,
como parte do projeto “Os Pronomes Sujeito e Objeto na aquisição do Português Brasileiro (PB) e do Português Europeu (PE)”, coordenado pela
O corpus deste trabalho é composto por gravações de duas crianças
profª. Drª. Telma Magalhães.
* Aluna regular do curso de Letras Modernas da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia e bolsista voluntária de iniciação científica. brasileiras, uma natural de Vitória da Conquista-BA (VC-BA) e outra de
* Professora Assistente do Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários da Universidade Estadual do Estado da Bahia (Estrada do Bem

Querer, km 4, 45083-900, Vitória da Conquista, BA). Campinas-SP (C-SP), com idade compreendida entre 2;0.0 e 3;5.0 anos:

______________________________________________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa _____________________________________________________________________________
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 113-118.
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
115 116
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

RESULTADOS E DISCUSSÃO
TABELA 1. Dados de aquisição do PB
Criança Idade Nº. de arquivos
Sobre o uso do sujeito nulo no PB, é possível perceber que essa língua
João 2;1.11 – 3;2.29 5
Ana 2;4.11 – 2;10.29 9 vem perdendo a capacidade de licenciar sujeito nulo de referência definida e
que este apresenta restrições quanto ao seu uso. Isso se dá devido ao fato
O método de coleta utilizado nas amostras é o de observação do PB ter sofrido um empobrecimento flexional. Dessa forma, o PB deixa de
espontânea, naturalista longitudinal. As gravações foram feitas, apresentar flexão rica, assim como o Português Europeu e o Espanhol, e
quinzenalmente, em ambiente familiar à criança (normalmente em casa), em passa a apresentar um paradigma flexional reduzido. Atribui-se a referida
situação de interação livre com um familiar (a mãe ou pai) e o investigador, o redução à perda da segunda pessoa (cf. Galves, 1990 [2001] e Duarte,
qual também era uma pessoa próxima ou mesmo da família, durante a 1993), a priori, e da primeira pessoa do plural, por conseguinte.
realização de tarefas rotineiras. Utilizou-se para estas gravações um gravador Os dados analisados nesta pesquisa encontram-se ainda em fase de
digital. coleta. Contudo, é possível perceber que as crianças apresentam uma
O material gravado está sendo transcrito com recursos do sistema percentagem significativa de sujeitos nulos, principalmente nulos de terceira
CHILDES (MacWhinney, 2000), que possibilita, a partir de uma transcrição pessoa do singular. Simões (1997) afirma que crianças adquirindo o inglês
codificada, a análise computacional dos dados. Será realizada também a apresentam altos índices de sujeito nulo no estágio inicial, sendo os dados do
correção minuciosa de todo o material transcrito para que se garanta a PB semelhantes nessa fase. Contudo, o índice cai para aproximadamente
confiabilidade do corpus. Cada arquivo corresponde à transcrição de uma 10% no estágio final da aquisição do Inglês, o que não acontece com o PB,
sessão que varia entre 30 e 60 minutos de gravação. que mantêm uma média de aproximadamente 30%. É possível observar, no
Posteriormente, estes dados serão comparados aos dados de outras gráfico a seguir, que a porcentagem de sujeito nulo de terceira pessoa chega
duas crianças do dialeto de VC-BA, que estão sendo coletados pelos demais a quase 60% em ambas as amostras2:
integrantes do projeto. Pretende-se, ainda, utilizar outros dados disponíveis
em Simões (1997) e Magalhães (2006) para a comparação com os dialetos
de Porto Alegre e Campinas (SP), respectivamente.

2
Os valores percentuais de ANA são provenientes de uma média calculada a partir dos dados encontrados em Magalhães (2006).

_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
117 118
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Percentagem de Sujeito Nulo de JOA(BA) e ANA


Todavia, os resultados não são definitivos, pois o corpus de VC-BA
(SP)
ainda é muito restrito para se fazer qualquer afirmação.
100
90
80
70 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
60
JOA
50
ANA CHOMSKY, N. Lectures on government and binding. Dordrecht, Foris,
40
30 1981.
20
10 CHOMSKY, N. The knowledge of language: its nature, origin and use.
0 Praeger: New York, 1986.
1sg 2sg 3sg 1pl ind
CHOMSKY, N. The minimalist program. Cambridge, Mass.: Mit Press,
1995.
DUARTE, Mª. E. Do pronome nulo ao pronome pleno: a trajetória do sujeito
Assim, pode-se perceber que, em PB, as crianças exibem resultados no Português do Brasil. In: I. Roberts & M. A. Kato (orgs), Português
comparáveis aos encontrados para os adultos de Duarte (1995): dos sujeitos brasileiro: uma viagem diacrônica (Homenagem a Fernando Tarallo),
107-128. Campinas: Editora da UNICAMP, 1993.
de referência definida, 29% apresentaram o sujeito nulo. Segundo a autora,
_____. A Perda do Princípio “Evite Pronome” no Português Brasileiro.
a presença de sujeito nulo de terceira pessoa é devido ao fato de pro, nesse [Tese de doutorado em Lingüística]. Instituto de Estudos da Linguagem da
Universidade Estadual de Campinas, 1995.
caso, poder ser reforçado por um elemento externo que torna sua
MACWHINNEY, B. The CHILDES Project: Tolls for Analyzing Talk. Third
identificação possível (cf. Magalhães, 2000). Edition. Mahwah, New Jersey: Lawrence Erlbaun Associates, 2000.
MAGALHÃES, T. M. V. Aprendendo o sujeito nulo na escola. [Dissertação
CONCLUSÕES de Mestrado]. Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual
de Campinas, 2000.
MAGALHÃES, T. M. V. O sistema pronominal sujeito e objeto na
A literatura específica da área afirma que crianças adquirindo PB aquisição do português europeu e do português brasileiro. [Tese de
doutorado em Lingüística]. Instituto de Estudos da Linguagem da
apresentam um alto índice de sujeitos nulos. Os dados de VC-BA não
Universidade Estadual de Campinas, 2006.
destoam dessa literatura. Observe o exemplo a seguir: SIMÕES, L. Sujeito nulo na aquisição do português do brasileiro: um
estudo de caso. [Tese de doutorado em Lingüística]. Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul, 1997.
(1) J1 – 160 *JOA: Foi na festa. (2;1.11)
(2) J3 – 45 *JOA: tantou [: cantou] parabéns. (2;2.23)
(3) J4 – 250 *JOA: Já boto(u) tudo. (2; 3.17)

_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
119 120
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Chomsky, os humanos são seres dotados de um conhecimento lingüístico


A ORDEM DE AQUISIÇÃO DOS PRONOMES
SUJEITO E OBJETO: UM ESTUDO COMPARATIVO10 rico, estruturado e inato (a Gramática Universal (GU)) que guia a criança no
processo de aquisição de uma língua. Esta, por sua vez, é composta por
Tatiane Macedo Costa* Princípios e Parâmetros, de modo que os princípios regem as propriedades
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia invariantes das línguas e os Parâmetros são responsáveis pelas possíveis
tatianemc18@gmail.com
variações entre elas.
Telma Moreira Vianna Magalhães∗∗
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia Considerando os pressupostos desta teoria e o fato de que, entre as
telma.magalhães@cnpq.br
línguas, existem variações em todos os níveis gramaticais, a presente
pesquisa visa desenvolver um estudo que verifique como se dá a aquisição
RESUMO
Várias pesquisas têm investigado o uso dos diferentes pronomes por meio do exame da sua ordem pronominal no Português Brasileiro e qual é a relação existente entre
de aquisição e compreensão. Conforme apontam os dados de aquisição do inglês e do francês, o
uso inicial de pronomes pessoais de primeira pessoa parece ser universal, no entanto, não há
emergência e compreensão pronominal.
consenso quanto à ocorrência das demais pessoas do discurso. Dessa maneira, objetiva-se
desenvolver um estudo que verifique se, no Português Brasileiro, também encontramos variação
A literatura vem mostrando que a ocorrência primária do pronome de
na aquisição pronominal. Objetiva-se, ainda, verificar a relação existente entre compreensão e primeira pessoa parece ser universalmente aceita, no entanto, no que se
produção dos pronomes nas referidas línguas, visto que nem sempre elas se dão
simultaneamente. refere às demais pessoas do discurso, tal semelhança não é categórica.
PALAVRAS - CHAVE: Objeto. Pronomes. Sujeito. Variação. Segundo Chiat (1986), para o inglês, a emergência de pronomes de segunda
e terceira pessoas se dá quase que simultaneamente, resultados semelhantes
aqueles encontrados no Francês (cf. GIROUARD, RICARD E DÉCARIE, 1996) e
no Português Brasileiro (cf. MAGALHÃES, 2006).
INTRODUÇÃO

MATERIAL E MÉTODOS
A presente pesquisa faz parte do projeto Os pronomes sujeito e objeto
na aquisição do Português Brasileiro (PB) e do Português Europeu (PE), e
O corpus deste estudo é composto por gravações de duas crianças
insere-se no quadro da Teoria Gerativa, mais especificamente, nos modelos
brasileiras, naturais de Vitória da Conquista (em fase de coleta, transcrição e
de Princípios e Parâmetros (CHOMSKY, 1981 e seguintes). Segundo Chomsky
análise) e Campinas (MAGALHÃES, 2006), na faixa etária compreendida entre
1;8.0 a 3;0.0 anos. A coleta de dados utilizada é feita com base no método
10 Esta pesquisa é parte do projeto Os pronomes sujeito e objeto na aquisição do Português Brasileiro (PB) e do Português Europeu (PE),
coordenado por Telma Magalhães e é financiada pelo CNPq (Edital Universal -2006, processo nº 479082/2006-5) e pela Universidade Estadual do naturalístico, longitudinal. A gravação dos dados está sendo realizada com
Sudoeste da Bahia – UESB.
* Aluna de graduação em Letras Modernas da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia e bolsista FAPESB de iniciação científica.
∗∗
Professora Assistente do Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários da Universidade Estadual do Estado da Bahia. Doutorado em
um gravador digtal de voz e a transcrição está sendo feita com recursos do
Lingüística pela UNICAMP.

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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 119-124.
121 122
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sistema CHILDES (MACWHINNEY, 2000), que possibilita, a partir de uma adquiridos em uma correspondência direta entre a semântica/pragmática e a
transcrição codificada, a análise computacional dos dados, que são corrigidos fonologia, os fracos são aprendidos a partir da distribuição morfo-sintática.
minunciosamente para que se garanta a confiabilidade do corpus. Na fala, por exemplo, quando o referente é o próprio falante ou o
Estão sendo feitas gravações quinzenais da criança e os dados serão interlocutor, ou inclui um dos dois, há a tendência da referência de pessoa
coletados pelo período mínimo de um ano, resultando num total de 24 ser feita por meio de pronomes, o que justifica o fato da primeira pessoa ser
sessões de gravação. A duração das gravaões é de aproximadamente 60 a primeira a aparecer. No entanto, no que concerne às outras pessoas do
minutos. discurso, parece haver uma dificuldade para a fixação de referência por parte
A análise que será realizada a partir deste estudo visa comparar a da criança e, por isso, há uma freqüente troca pronominal.
aquisição de pronomes em diferentes dialetos do PB para verificar se a Segundo Magalhães (2006), para as crianças brasileiras, analisadas em
emergência dos pronomes no Português Brasileiro segue uma mesma ordem. sua pesquisa, o pronome de primeira pessoa do singular é o primeiro a
Além disso, considerando que pronomes possuem referentes variáveis, visa- aparecer e os pronomes de segunda e terceira pessoas do singular aparecem
se analisar a relação entre emergência e compreensão pronominais. simultaneamente, resultados semelhantes aqueles encontrados no dialeto de
Vitória da Conquista.
RESULTADOS E DISCUSSÃO Quanto à produção e compreensão dos pronomes, percebe-se que nem
sempre elas se dão simultaneamente. No inglês, por exemplo, a
A aquisição de pronomes é um tópico que abarca distinções tanto de compreensão de segunda pessoa do singular aparece antes do seu uso
níveis pragmático e semântico, quanto morfológico e sintático. No estagio efetivo. No PB, podemos encontrar trocas pronominais nos dados, ou seja,
inicial da aquisição, segundo Kato (2001), a criança faz referência a pessoa quando se espera a concordância de primeira pessoa, há a concordância de
do discurso utilizando o nome próprio e quando cedo o pronome começa a terceira pessoa do singular, como no exemplo (1) a seguir:
ser usado, ele aparece na forma forte. Quando a criança começa a adquirir a
*TAY: JOÃO fez o que?
concordância, os pronomes fracos livres, os clíticos e os elementos nulos
*JOA: Lavo(u) a mão. (2; 1. 11)
começam a aparecer.
No quadro dos pronomes pessoais, pronomes fortes são associados
Quanto ao uso de pronomes na posição de objeto, verifica-se uma
com referencialidade e pronomes fracos com referencialidade deficiente. Por
baixa ocorrência de pronomes plenos e clíticos, resultados semelhantes
exemplo, eu e você são inerentemente humanos, portanto, os mais altos na
àqueles encontrados por Magalhães (op.cit.). Nos casos em que se verificam
hierarquia referencial. Os pronomes de terceira pessoa são, por sua vez, os
pronomes plenos na posição de objeto, há predominância do uso de pronome
mais baixos na escala. Assim, enquanto os pronomes fortes podem ser
tônico de primeira pessoa.
_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
123 124
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

CONCLUSÕES MACWHINNEY, B. The CHILDES Project: Tolls for Analyzing Talk. Third
Edition. Mahwah, New Jersey: Lawrence Erlbaun Associates. 2000.
MAGALHÃES, T. M. V. O sistema pronominal sujeito e objeto na
Trabalhos de diversas línguas como o inglês e o francês mostram haver aquisição do português europeu e do português brasileiro.
uma ordem para a aquisição de pronomes. Quanto ao Português Brasileiro, UNICAMP: Tese de Doutorado. 2006.
os dados apontam para o uso inicial de pronomes de primeira pessoa seguido MENUZZI, Sérgio e CREUS, Susana. 2004 Sobre o papel do gênero
semântico na alternância entre objetos nulos e pronomes plenos em
da aquisição quase concomitante da segunda e terceira pessoas do singular. Português Brasileiro.PUCRS.
No entanto, para as outras pessoas do discurso, não é possível estabelecer SIMÕES, L. Sujeito nulo na aquisição do português do brasileiro: um
estudo de caso. PUCRS: Tese de Doutorado. 1997.
uma ordem, visto que esta aquisição ocorre de forma bastante variada.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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in first language development. Fletcher, Paul and Garman, Michael
(eds.). Cambridge University Press, 1986.
CHOMSKY, N. Lectures on government and binding. Dordrecht, Foris.
1981.
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____. The minimalist program. Cambridge, Mass.: Mit Press. 1995.
DUARTE, Mª. E. Clítico acusativo, pronome lexical e categoria vazia no
português do Brasil. In: F. Tarallo (org), Fotografias sociolingüísticas, 19-
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DUARTE, Mª E. Do pronome nulo ao pronome pleno: a trajetória do sujeito
no Português do Brasil. In: I. Roberts & M. A. Kato (orgs), Português
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107-128. Campinas: Editora da UNICAMP. 1993.
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LOPES, R. The production of subject in brazilian portuguese by a young child.
PROBUS 15. 123-146. 2003.
_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
125 126
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comum à escrita ─ a estratégia padrão (ex.: Estamos vivendo em uma época


AQUISIÇÃO DAS RELATIVAS PADRÃO EM PB
em que até as crianças usam e/ou traficam drogas. (2º ano/E.M.)). A
DURANTE A ESCOLARIZAÇÃO
relativa cortadora seria, segundo Tarallo (1983), uma estratégia inovadora no
Letícia Souza Araújo * PB, que surgiu na segunda metade doséculo XIX para as posições de objeto
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
lettyletras@hotmail.com indireto, objeto oblíquo e genitivo12. Já a estratégia resumptiva seria mais
Adriana S. C. Lessa-de-Oliveira** antiga no PB e mais utilizada em muitas línguas apenas como último recurso.
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
adriana.lessa.de@uol.com.br De acordo com a proposta de Kato (1993), a diferença entre as
estratégias resumptiva e cortadora, de um lado, e a padrão, de outro, está
relacionada à posição da variável (categoria vazia), que está fora do IP, em
RESUMO
Esta pesquisa focaliza a aquisição da estratégia de relativização padrão em português brasileiro posição de LD (Left Deslocation, comumente referido como tópico)13, no caso
(PB) e objetiva investigar a influência da escola na aquisição da relativa padrão. Para tanto,
apresentamos uma análise de um corpus de narrativas escritas, produzidas por estudantes do das primeiras, e dentro, no caso da última. Essa proposta é assumida por
Ensino Fundamental (5º a 8ª série) e Médio de Vitória da Conquista - Bahia. Os dados
investigados confirmam nossa hipótese de que as crianças aprendem a estratégia de relativização Corrêa (1998) para explicar a grande dificuldade na aquisição da estratégia
padrão durante os anos escolares, através do ensino formal, fato que caracteriza como efetiva a
função da escola no processo de aquisição da relativa padrão em PB escrito. padrão em PB contemporâneo.
PALAVRAS – CHAVE: Aquisição da linguagem. Cláusulas relativas. Hipótese inatista. Linguagem Neste estudo, procuramos investigar a aquisição da relativa padrão,
escrita. Português brasileiro.
partindo da hipótese de que o aprendiz internaliza a estratégia padrão
durante os anos escolares, através do contato com a escrita.

INTRODUÇÃO
MATERIAL E MÉTODOS

Tarallo (1983) constatou a existência de três formas de relativização em


Utilizamos como corpus de investigação narrativas escritas,
português brasileiro (PB): a) uma estratégia vernacular, comum à linguagem
espontâneas, produzidas por alunos da 5ª à 8ª série do Ensino Fundamental
oral, que se subdivide em duas ─ resumptiva (Ex.: Era um velho que todos
e alunos do Ensino Médio. Para observarmos o grau de interferência da
gostavam dele. (E.F. 5ª série)11) e cortadora (Ex.: Respeitar ... cada pedaço
escola na aquisição da estratégia padrão, fez-se necessária uma coleta de
da escola que estamos estudando (7ª série/E.F.)); e b) uma estratégia
dados por série, que foi realizada de forma transversal (e não longitudinal). É
importante salientar que os informantes investigados são alunos da rede
*Graduada em Letras pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia.
**Professora do Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB). Mestre e Doutoranda
12 As relativas de sujeito e objeto direto do PB oral foram classificadas por Tarallo (1983) como variante gap-leaving (relativa com lacuna), mas são
pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).
11 Exemplos retirados do corpus em análise, constituído de dados escritos de alunos do Ensino Fundamental (E.F.) e do Ensino Médio (E.M.). ambíguas quanto à identificação de sua estrutura subjacente como padrão ou gap-leaving.
13 Cf. Ross (1967) para verificar diferença entre tópico e Left Deslocation (deslocamento à esquerda)

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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 125-130. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
127 128
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pública de ensino. Muitos são filhos de pais com baixa escolaridade e têm, do E.M; e e) a estratégia resumptiva apareceu apenas uma vez (0,6%) na 5ª
geralmente, pouco contato com livros (apenas livros didáticos). série do E.F.
Não houve durante a coleta dos dados indução de emprego de nenhum Quanto ao emprego dos constituintes relativos em que e onde, a
tipo de relativa. Os textos foram produzidos sempre como uma proposta tabulação dos dados mostrou que: a) até a 7ª série o emprego de onde foi
solicitada pelo professor, tratando-se, portanto, do emprego de método absolutamente predominante; b) em que mostrou-se praticamente
naturalístico na construção do corpus. inexistente até a 7ª série, aparecendo apenas na 6ª série em 2 ocorrências
Para a análise dos dados, foi necessário delimitarmos a quantidade de (contra 3 ocorrências de onde nessa série); c) as ocorrências de em que se
relativas coletadas por série, a fim de apoiarmos a investigação na igualaram às de onde na 8ª série do E.F. e no 1º ano do E.M.; e c) no 2º e
comparação entre as séries. Obtivemos o total de 175 relativas, sendo 25 por 3º anos de E.M. o emprego de em que suplantou o de onde, chegando ao
série. Procuramos verificar: o surgimento e aumento da freqüência da índice de 86% no 3º ano.
estratégia padrão, fazendo comparação com a freqüência das demais Esses resultados nos levam a considerar que o uso mais freqüente da
estratégias; e a ocorrência de alteração no emprego dos constituintes cortadora e a ocorrência da única resumptiva nas séries iniciais podem
relativos em que e onde, que podem se alternar como elemento de justificar-se pela relação que o aluno ainda faz com a fala ao executar a
introdução de um mesmo tipo de relativa, mas que, de acordo com a escrita. Os dados acima nos levam a constatar, assim como constatou Corrêa
prescrição normativa, apresentam peculiaridades quanto aos seus empregos (1998), a influência da escola na aquisição da estratégia de relativização
com referência ou não a “lugar” pelo termo relativizado. padrão, cujas ocorrências aumentam gradualmente, suplantando as da
cortadora no E.M.
RESULTADOS E DISCUSSÃO Analisamos que o principal fator a contribuir para a aquisição da
estratégia de relativização padrão pelos alunos investigados foi a aquisição de
A tabulação dos dados por estratégias nos permitiu observar o certo item lexical que introduz algumas relativas de Oblíquo ─ a locução em
seguinte: a) verificamos ocorrência da estratégia padrão em todas as séries que.14 Tanto onde quanto em que são constituintes relativos peculiares à
pesquisadas, desde a 5ª; b) a estratégia padrão apresentou-se como a estratégia padrão. A diferença entre eles está no fato de a preposição
estratégia mais freqüente em todo o E.M.; c) nas 6ª e 8ª séries do E.F. a aparecer explicita no último15. Avaliamos que uma preposição abertamente
freqüência da estratégia padrão foi igual a da cortadora; d) à medida que foi realizada pode funcionar como dado robusto16 no input, contribuindo para
aumentando o nível de escolaridade, a estratégia cortadora foi cedendo lugar
à padrão na escrita, até chegar à completa ausência desta última no 3º ano 14 De acordo com Guasti e Cardinaletti (2003), que investigam aquisição de estratégias de relativização em italiano e em francês, a aquisição de
relativas padrão preposicionadas envolve um material lexical a ser adquirido.
15 Segundo Móia (1992), os pronomes relativos onde, como e quando são expressões intrinsecamente preposicionadas.
16 De acordo com Lightfoot (1991), um dado de aquisição se caracteriza como robusto pela sua ação como gatilho (trigger), desencadeando a

marcação paramétrica. Essa robustez se define, para esse autor, em função da saliência e da freqüência do dado no input.
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
129 130
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aquisição do processo de pied-piping preposicional17, essencial à aquisição da KATO, M. A. Recontando a História das Relativas em uma Perspectiva
Paramétrica, In: Português Brasileiro. Uma Viagem Diacrônica,
estratégia padrão.
Campinas: Editora da Unicamp. 1996. pp. 223-451 Edição original 1993.
Os dados deste estudo diferem dos estudados por Corrêa (1998), com LIGHTFOOT, D. How to set parameters: arguments from language
base nos quais a autora concluiu que seriam necessários 11 anos de change. Cambridge: MIT Press. 1991.
escolaridade aproximadamente para a realização produtiva da estratégia MÓIA, T. A Sintaxe das Orações Relativas sem Antecedente Expresso
do Português. 163 p. [Dissertação de Mestrado em Lingüística Portuguesa
padrão. Já nesta pesquisa, verificamos a presença da relativa padrão com Descritiva. Área de Concentração: Sintaxe] – Faculdade de Letras da
apenas 5 anos de escolaridade aproximadamente. Universidade de Lisboa,1992.
TARALLO, F. Relativization Strategies in Brazilian Portuguese. 273 p.
[Tese de Doutorado em Filosofia. Área de Concentração: Lingüística) –
CONCLUSÕES University of Pennsylvania, 1983.

Os resultados acima mostram que a hipótese de Corrêa (1998),


segundo a qual o aprendiz precisa passar da estratégia vernacular18 à
padrão19 para adquirir a última, é uma alternativa plausível de explicação
para o fenômeno de aquisição tardia das relativas padrão em PB. Mas, diante
da constatação de que a escola tem papel efetivo na aquisição dessas
relativas, precisamos ainda descobrir o que funciona como input para
aquisição das relativas padrão.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CORRÊA. Oração relativa: o que se fala e o que se aprende no


português do Brasil. 164 p. [Tese de Doutorado em Lingüística. Área de
Concentração: Aquisição da Linguagem]. Instituto de Estudos da Linguagem.
Unicamp, Campinas. 1998.
GUASTI, M. T. & CARDINALETTI, A. Relative clause formation in Romance
child's production. Probus. v 15-1, pp.48-89. 2003.

17
Elevação da preposição para a CP juntamente como o constituinte relativizado.
18 Com a construção de LD como estrutura subjacente.
19 Com a estratégia de movimento-wh partindo de IP como estrutura subjacente.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
131 132
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com o traço [±humano]. Este fato teve como conseqüência o esvaziamento


AQUISIÇÃO DE CLÍTICOS E ESCOLARIZAÇÃO
do clítico de 3ª pessoa, levando o PB a adquirir um objeto nulo referencial,
que se alterna com a forma pronominal do caso reto. Tais mudanças levaram
Marcelle Teixeira Silva*
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia o PB a um distanciamento do PE, perdendo, segundo GALVES (1997), os
marcele.t@bol.com.br ; marcelle.teixeira@hotmail.com

Adriana S. C. Lessa-de-Oiveira**
pronomes clíticos no seu sistema oral e apresentando tendência ao uso da
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
adriana.lessa.de@uol.com.br
próclise21.
Objetivamos investigar o surgimento dos pronomes clíticos na escrita
de alunos do E.F. e E.M., verificando até que ponto a escolarização é
RESUMO
Este estudo investiga o processo de aquisição dos pronomes clíticos na escrita de alunos do determinante no uso dos referidos pronomes. Nossa análise irá se
município de Vitória da Conquista – Bahia. Buscando analisar a influência da escola neste
processo, investigamos um corpus composto de textos escritos por alunos de 5ª a 8ª série do fundamentar na proposta de Kato (2005), segundo a qual o conhecimento
Ensino Fundamental (E.F.) e do 1º ao 3º ano do Ensino Médio (E.M). Os dados investigados
confirmam nossa hipótese de acordo com a qual o valor paramétrico de clíticos adquirido através
lingüístico do letrado brasileiro se distingue tanto da gramática da fala quanto
de ensino formal não corresponde ao que é prescrito pela Gramática Tradicional (GT).
da gramática ensinada na escola. No início da aquisição da escrita, o
PALAVRAS-CHAVE: Aquisição da linguagem. Hipótese inatista. Língua escrita. Português indivíduo é guiado pelos parâmetros de uma gramática nuclear (G1). Com a
brasileiro. Pronomes clíticos.
escolarização, adquirem-se os parâmetros da periferia (G2)22, em competição
com os da G1. Assim o letrado possui tanto os parâmetros da G1 como os da
G2, utilizando-os conforme a situação.
INTRODUÇÃO

MATERIAL E MÉTODOS
Pesquisas sobre o sistema pronominal do português brasileiro (PB) mostram
que há nessa língua uma tendência a substituição do clítico acusativo de 3ª Compomos um corpus com textos produzidos por alunos da 5ª a 8ª
pessoa por: pronome reto, SNs anafóricos ou categoria vazia. Segundo Kato série do E.F. e do 1ª ao 3ª ano do E.M. da rede pública. Depois de coletados,
20
(2002), na mudança do sistema pronominal , o PB perdeu a oposição foram selecionados 5 textos de cada série, totalizando 35. Esse material foi
morfológica ele – o, que define caso pronominal. Isto levou a uma alteração obtido mediante solicitação da professora, para que os alunos não notassem
do pronome reto de 3ª pessoa, que passou a ocorrer em posição de objeto que estavam sendo investigados, garantindo a característica de naturalidade
aos dados coletados.
* Graduada em Letras pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia.
**Professora do Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB). Mestre e Doutoranda
21Enquanto no PE continua havendo uma inclinação à ênclise.
pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).
20Processo também observado por TARALLO (1983), CYRINO (1993) e outros. 22Essa periferia, para Chomsky (1981), pode abrigar fenômenos de empréstimos, resíduos de mudança, invenções, podendo os indivíduos de
uma mesma comunidade apresentar ou não esses fenômenos de forma marginal.
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 131-136. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
133 134
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Para análise, levaremos em conta as estratégias de preenchimento do suplantado nas três séries do E.M. pelos do clítico. Tais resultados mostram
objeto direto, a saber: a) preenchimento com o mesmo SN (O rapaz negro que os clíticos vão substituindo os nulos e os retos com a escolarização (ver
disse que o jovem de 23 anos provocou Ø e então ele acabou matando o gráfico).
jovem. – 8ª Série); b) preenchimento com outro SN (Carlos, ele bagunça
na sala vive fazenu piada com os professores e os professores fica irritado e ESTRATÉGIAS DE PREENCHIMENTO DO OBJETO DIRETO
MESMO SN
ponha ele pra fora e aí a secretária ispulsa o cara. – 6ª série); c) 100%
OUTRO SN
80%
preenchimento com pronome reto (Por isso que quando qualquer pessoa ver
60% PRONOME
RETO
outra pessoa discriminando uma velhinha, não deixe discriminar ela. – 5ª 40%
CLÍTICO
20% ACUSATIVO
série); d) preenchimento com clítico acusativo (Não significa que por que é CATEGORIA
0%
VAZIA
menor não vamos puni-lo. – 2º ano); e) categoria vazia ou objeto nulo (Eu 5ª série 6ª série 7ª série 8ª série 1º ano 2º ano 3º ano

pedi que Joana pegasse Ø mas ela não pegou Ø. – 7ª série).


Outro fator analisado é a posição dos clíticos, que são classificados de Quanto à colocação dos clíticos, observamos que, embora a ocorrência
acordo com sua colocação relativamente ao verbo em: a) próclise (Os idosos de ênclise aumente com a escolarização, a próclise se mantém mais
nos ensinam coisas boas.– 5ª série); b) ênclise (Lembro-me que aos seis freqüente em todas as séries, apresentando como menor freqüência o índice
anos vi meu irmão. – 3º ano); e c) mesóclise (Falar-te-ei coisas boas.)23 de 68,5%, no 3º ano do E.M. E a mesóclise é inexistente nesse corpus. Isto
nos leva a avaliar que o sistema que está sendo adquirido não é exatamente
RESULTADOS E DISCUSSÃO o sistema que vigorava em PB, quando o clítico usado na língua oral, nem é o
sistema do PE. Essa tímida aquisição da ênclise, que contraria o que a GT
Os dados mostram que o preenchimento com pronome reto e com preconiza25, reflete uma dificuldade de aquisição desse parâmetro, verificada
mesmo SN vai diminuindo à medida que a escolaridade vai aumentando (cai também nos exemplos: meu pai a ajuda ela... (5ª série); ...para se cadastrá-
respectivamente de 50% para 7,7% e de 26,6% para 7,7% das séries iniciais los (1º ano); desejo lhe abraçá-lo...(3º ano)
para as finais), assim como o preenchimento com o clítico acusativo cresce O que se verificou nos dados pode ser explicado com base na hipótese
com o aumento da escolaridade (vai de 8,3% para 84,6%), indício de que o de Kato (2005), ou seja, os alunos estão adquirindo parâmetros da G2 –
24
aluno vai internalizando outro sistema pronominal com a escolarização. clíticos e ênclise–, em competição com os da G1 – pronomes retos e
Quanto ao objeto nulo, embora este não apresente grande variação de categorias vazias como objetos e próclise (se for clítico).
índices das séries iniciais para as finais, seu percentual de ocorrência foi

23 Com exceção da mesóclise, os exemplos apresentados nesta seção foram retirados do corpus em estudo.
24 Corrêa (1991) chega a resultado semelhante. 25 Segundo Cunha e Cintra (1985, p. 300) Sendo o pronome átono objeto direto ou indireto do verbo, a sua posição lógica, normal, é a ênclise.
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135 136
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Assim, a atuação da escola nesse resultado não pode ser atribuída ao CYRINO, S. M. L. Observações sobre a mudança diacrônica no Português do
Brasil: objeto nulo e clíticos. In: Português Brasileiro: uma viagem
ensino das normas da GT. O que, de fato, funciona como input nesse
diacrônica (Homenagem a Fernando Tarallo). Campinas: Editora da
processo é a língua escrita “viva”26. Como os alunos, no início, têm pouco UNICAMP, 1996. p. 163 – 185. Edição original 1993.
contato com textos escritos, os dados das séries iniciais apresentam valor GALVES C. A sintaxe pronominal do português brasileiro e a tipologia dos
pronomes. In: Ensaios sobre as gramáticas do português. Campinas:
paramétrico próximo ao da fala. Com a escolarização, eles vão tendo contato Editora da Unicamp, 2001. pp. 153-176. Edição original 1997.
com a escrita, passando a marcar outros parâmetros. Esta experiência os KATO, Mary Aizawa. Pronomes fortes e fracos na sintaxe do português
leva a utilizar os clíticos, a diminuir o uso do pronome reto como objeto e a brasileiro. Revista Portuguesa de Filosofia. Coimbra, Portugal, v. XXIV,
p.101-121, 2002,
utilizar a ênclise, mesmo que a próclise ainda continue sendo a posição mais
_____. A Gramática do Letrado: Questões para a Teoria Gramatical. In:
freqüente em seus textos. Ciências da Linguagem: trinta anos de investigação e ensino. Braga,
CEHUM (U. do Minho). 2005.
TARALLO, F. Relativization Strategies in Brazilian Portuguese. 273f.
CONCLUSÕES Tese (Doutorado em Lingüística) – University of Pennsylvania. 1983.

Concluímos que a aquisição de clíticos dá-se via processo em que o


aluno, possuidor de uma G1 vai marcando outros parâmetros, formando uma
G2. Assim, o input que ele recebe, de uma língua escrita em uso, aciona
indiretamente a GU. Dessa maneira, o sistema de clíticos que o aluno adquire
não é aquele preconizado pela GT, mas o que ele encontra nos textos, que
funcionam como dados positivos através dos quais os parâmetros são
fixados.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CORRÊA, V. R. Objeto direto nulo no português do Brasil. Dissertação


(Mestrado em Lingüistica). Campinas: UNICAMP, 1991.
CHOMSKY, N . Lectures on government and bindin. Dordrecht: Foris.
1981.
CUNHA, C.; CINTRA, L. Nova Gramática do Português Contemporâneo.
Rio de Janeiro: Nova fronteira, 1985.

26 A língua presente nos textos jornalísticos, científicos, literários contemporâneos, etc.


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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
137 138
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proceder a análise dos dados, foram observados os 61 DPs plurais e suas


CONCORDÂNCIA NOMINAL DE NÚMERO NO PORTUGUÊS
variações encontrados na fala das crianças.
BRASILEIRO: O PAPEL DAS VARIANTES NA CONSTRUÇÃO DE UMA
GRAMÁTICA PARTICULAR. Este trabalho insere-se numa perspectiva gerativista, a qual se propõe
a explicar as manifestações da aquisição da linguagem considerando que a
Maria Bethânia Gomes Paes*
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
linguagem é inata ao ser humano. Para Chomsky, a criança possui um
bethapaes@yahoo.com.br
mecanismo que lhe permite adquirir a linguagem, chamado de Dispositivo de
Telma Moreira Vianna Magalhães**
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia Aquisição da Linguagem (DAL), o qual é parte da herança genética de sua
telma.magalhaes@pq.cnpq.br
espécie e que esse é acionado pelo input ao qual a criança tem acesso. O
fato de a criança fazer realizações que não constam no input ao qual tem
RESUMO acesso traz questões intrigantes para a assunção gerativista, segundo a qual
Este trabalho observa a variação de DP quanto à concordância de número em dados das crianças
monolíngues, falantes do PB. Há na estrutura do DP do PB, além das variações presentes na a Gramática Universal associada ao input a que o indivíduo tem acesso
gramática do adulto, uma variação que não consta no input da criança, mas recorrente nos dados
que produz, caracterizada pela presença do morfema de plural –s nos nomes. Analisando o corpus resulta na língua final, a gramática particular.
deste trabalho e trabalhos sobre aquisição de concordância nominal, argumento que a realização
de DPs com afixo –s nos nomes é resultante da quantidade de variantes de concordância de
número em DP presente no PB.
MATERIAL E MÉTODOS
PALAVRAS- CHAVE: Aquisição da Linguagem. Concordância Nominal de Número. Programa
Minimalista.
Neste trabalho foram considerados 61 DPs plurais, observando também
as variações de concordância nominal de DP. Os dados que compõem o
corpus do trabalho são provenientes da produção espontânea das crianças
INTRODUÇÃO
monolingües A e R de faixa etária entre 2; 1. 16 e 3; 0. 15 de idade, nascidas
em Campinas, São Paulo, Brasil. O método de coleta utilizado nas amostras é
O presente trabalho tem como objetivo observar como ocorre a
o de observação espontânea, naturalista, longitudinal. As gravações foram
aquisição de número no sintagma determinante (DP) na fala de crianças sob
feitas em ambiente familiar à criança (normalmente em casa), em situação
uma perspectiva gerativista. Serão analisados dados de produção espontânea
de interação livre com um familiar (a mãe ou pai) e o investigador que
das crianças A e R de faixa etária entre 2; 1. 16 e 3; 0. 15 de idade. Para
também era uma pessoa próxima ou mesmo da família, durante a realização
de tarefas rotineiras (brincadeiras, banho, refeição). Será usada aqui parte da
*Aluna do curso de Especialização em Lingüística da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB.
**
nomenclatura encontrada em CASTRO & FERRARI NETO (2006) para ilustrar
Doutora em Lingüística pela Universidade Estadual de Campinas.Professora Assistente do Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários –
DELL da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB.
cada condição observada nos dados analisados neste trabalho, a saber:

______________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p.. 137-141. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
139 140
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

nomes devido ao número restrito de variantes de DP contidas no input da


a) Gramatical Padrão - G PAD- Determinante plural e Nome plural criança e por isso não há variantes de DP do tipo que ocorrem no PB (Cf.
Exemplos: (4) a. É os olhos (A. 2;10.29)
SIMIONI, 2007).
b) Gramatical Não Padrão - G NPAD- Determinante plural e Nome singular
Considerando o corpus deste trabalho, as hipóteses de Magalhães
Exemplos: (5) a. Dos [*] brinquedos de Ana. (A. 2; 8.4)
c) Não Gramatical - NG - Determinante singular e Nome plural
(2003; 2004) e Castro e Ferrari-Neto (2006) parecem mais adequadas para

Exemplos: (6) a. No (s) [*] dedinhos do pé (A. 2; 6.3) responder a questão aqui abordada. Magalhães (2003; 2004) afirma que o
d) Não Gramatical com Infixo - NG INF- Determinante singular e presença do –s na traço de número é interpretável em Det. e não interpretável em N. A autora
estrutura da palavra como um infixo ainda recorre a Abney (1987), o qual afirma que Det é argumento de N,
Exemplo: (7) os [*] gastinho(s)
selecionando-o, portanto. Castro e Ferrari-Neto (2006) buscam que elemento
da estrutura de DP traz informação relevante para a interpretação da
RESULTADOS E DISCUSSÃO
referência plural por parte das crianças e constatam em testes de
compreensão que desenvolveram que tanto as crianças do PB quanto as
Os dados das crianças A e R apresentam características diferentes entre
crianças do PE extraem a informação relevante de Det para a interpretação
si quanto à estrutura de DP. A criança A apresenta um total de ocorrências
de referência plural.
de 26 DPs plurais, sendo que há predominância da condição NG. Os dados da
Essas duas propostas associadas entre si melhor se adequam à
criança R demonstraram um total de ocorrências de 35 DPs plurais,
hipótese levantada neste trabalho, de que realmente está em Det o traço
predominando a condição GPAD. Não há, portanto, estágios na produção de
interpretável de número, interpretáveis como plural pelas crianças.
DPs plurais por parte das crianças, pois todos os tipos de DPs aqui
considerados coexistem na fala infantil.
CONCLUSÃO
No entanto, o que se pretende neste trabalho não é analisar as
diferenças entre os dados de cada criança, mas quais são as variações de DP
Após a análise do corpus do presente trabalho, associada ao estudo de
plural presentes nos dados como um todo e o porquê de realizações que não
trabalhos que tratam da aquisição de concordância nominal de número no
constam no input da criança serem recorrentes na fala infantil. A hipótese
PB, observou-se que a criança não interpreta a marcação –s nos nomes como
deste trabalho é de que a variação que se nota nos dados da criança com
informação de plural, o que atesta a hipótese aqui considerada de que a
relação à marcação de concordância de número no DP, inclusive a existência
marcação de concordância de número no DP inicia-se em Det.
de uma forma não atestada no input, resulta da variação existente no PB
com relação à marcação de número. Em outras línguas como o Inglês,
Italiano e Português Europeu, não ocorre a marcação de plural apenas em
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CASTRO, A.; FERRARI-NETO, J. Um estudo contrastivo do PE e do PB


com relação à identificação de informação de número no DP. Texto
apresentado no 7º Encontro Nacional sobre Aquisição da Linguagem. Porto
Alegre: PUCRS, 2006.
LOPES, R. E. V. Estágios no processo de número no DP do Português
Brasileiro. Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 39, n. 3, p. 157-171, 2004.
MAGALHÃES, T. M. V. Valorando Traços de Concordância dentro do
DP. Trabalho de Qualificação na Área de Gramática, Campinas: UNICAMP,
2003.
______. A valoração de traços de concordância dentro do DP. DELTA, São
Paulo, v. 20, n. 1, p. 149-170, 2004
SIMIONI, L. A aquisição da concordância nominal de número: um parâmetro
estudo de caso. Revista de Estudos Linguísticos. Belo Horizonte, v. 14, n.
2, p. 539-570, 2006.
______. A Aquisição da Concordância Nominal de Número no
Português Brasileiro: um parâmetro para a concordância nominal.
171 p. [Dissertação de Mestrado em Lingüística]. Universidade Federal de
Santa Catarina, 2007.

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143 144
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Essa teoria defende que os seres humanos são dotados inatamente de


CONTEXTOS DE NÃO-CONCORDÂNCIA NOS DADOS DE AQUISIÇÃO
DO PORTUGUÊS BRASILEIRO27 um conhecimento lingüístico rico e estruturado que guia a criança no
processo de aquisição de uma língua.
Ingridd Michelle Lopes Pereira* Segundo Chomsky, a Gramática Gerativa tem como ponto de referência
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia aspectos da forma e significado de uma língua que são determinados pela
inddlopes@gmail.com
Faculdade da Linguagem (FL), entendida como um componente particular da
Telma Moreira Vianna Magalhães*
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia mente humana. A natureza desta faculdade é a preocupação central de
telma.magalhães@cnpq.br
uma teoria geral acerca da estrutura da linguagem que objetiva descobrir o
conjunto de princípios e de elementos comuns às línguas humanas possíveis.
RESUMO
Neste trabalho, apresento resultados preliminares de um estudo da aquisição da concordância
Essa teoria recebe o nome de Gramática Universal (GU). A GU é constituída
verbal nos dados de uma criança com idade compreendida entre 1;8.0 e 3;0.0 anos, nascida em de Princípios rígidos, invariáveis entre as línguas e de Parâmetros que
Vitória da Conquista (BA). Para tanto, observo contextos de ausência de concordância e,
considerando que estudos atestam que com a inconsistência do input a criança pode demorar a codificam as propriedades que variam de uma língua para outra.
fixar determinado parâmetro, analiso as possíveis variações no input ao qual a criança é exposta.
Posteriormente, comparo os meus resultados com aqueles encontrados por Magalhães (2006), Os Princípios e os Parâmetros são inatos, porque ambos são dados pela
observando possíveis diferenças na aquisição dos pronomes em questão entre os dialetos do
Português Brasileiro analisados neste projeto. GU. No entanto, como os Parâmetros são propriedades subespecificadas, a
PALAVRAS–CHAVE: Flexão Verbal. Português Brasileiro. Pronomes. Variação Lingüística. tarefa da criança é marcar o valor apropriado do Parâmetro tendo por base
os dados positivos da língua a que está sendo exposta.

INTRODUÇÃO
MATERIAL E MÉTODOS

Esta pesquisa insere-se no quadro da Teoria Gerativa, mais


O corpus deste estudo é composto por gravações de três crianças
especificamente, nos modelos de Princípios e Parâmetros (Chomsky, 1981 e
brasileiras, João, natural de Vitória da Conquista, e Raquel e Ana, naturais de
seguintes).
Campinas, na faixa etária compreendida entre 1;8.0 a 3;0.0 anos.
.
O método de coleta utilizado nas amostras é o de observação
espontânea, naturalista longitudinal. As gravações foram feitas
27 Este trabalho é parte do projeto “Os pronomes sujeito e objeto na aquisição do Português Brasileiro e do Português Europeu”, coordenado por
Telma Magalhães. A pesquisa é financiada pelo CNPq (Edital Universal – 2006; processo nº. 479082/ 2006-5) e pela Universidade Estadual do quinzenalmente, em ambiente familiar à criança (normalmente em casa), em
Sudoeste da Bahia.
* Aluna regular do curso de Letras Modernas da Universidade Estadual do sudoeste da Bahia e bolsista de iniciação científica da Fundação de
situação de interação livre com um familiar (a mãe ou pai) e o investigador
Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia.
* Orientadora da Pesquisa. Professora Assistente do DELL/ UESB (Estrada do Bem Querer, km 4, 45083-900, Vitória da Conquista, BA). Doutora

em Lingüística pela UNICAMP.


que também era uma pessoa próxima ou mesmo da família, durante a
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 143-148. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
145 146
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realização de tarefas rotineiras (brincadeiras, banho, refeição). Utilizou-se No que diz respeito à concordância sujeito/ verbo, Magalhães (op. cit)
para estas gravações um gravador digital. afirma que sua criança não tem uma percentagem significante de ausência
O material gravado está sendo transcrito com recursos do sistema de concordância entre o sujeito e a morfologia singular. Há poucos casos,
CHILDES (MacWhinney 2000), que possibilita, a partir de uma transcrição todos eles envolvem o verbo “querer” e são casos de primeira pessoa usada
codificada, a análise computacional dos dados. Será realizada também a com a flexão de segunda ou terceira pessoa do singular.
correção minunciosa de todo o material transcrito para que se garanta a Os dados da criança que analiso neste trabalho apresentam resultados
confiabilidade do Corpus. Cada arquivo corresponde à transcrição de uma semelhantes àqueles encontrados por Magalhães (op. cit.), a saber: a
sessão que varia entre 30 e 60 minutos de gravação; o intervalo entre cada primeira pessoa é usada com a flexão de terceira do singular, conforme
sessão transcrita é de aproximadamente um mês. Posteriormente, estes exemplos:
dados serão comparados aos dados de outras quatro crianças do mesmo
dialeto, que estão sendo coletados pelos demais integrantes do projeto. (1) *TEL: (vo)cê não pode ter esquecido.
*ANA: (es) queceu.
Pretende-se, ainda, utilizar os dados disponíveis em Simões (1997) e
%com: ANA esqueceu o nome da sua avó. (Magalhães, 2006)
Magalhães (op. cit.) para a comparação com o dialeto de Porto Alegre e
Campinas, respectivamente. (2) *ING: não foi pra Igreja não? # foi?
*ING: fez o que lá?
*JOA: tantou [: cantou] parabéns. (Pereira, em prep.)
RESULTADOS E DISCUSSÕES

Kato (2001) propõe que quando o sistema verbal da criança passa a ser
Segundo observou Miller e Schmit (a sair), o input ao qual a criança é
pluripessoal, as gramáticas, cuja distinção entre as pessoas gramaticais é
exposta vai variar de acordo com a variação dos falantes. Devido a estas
codificada através dos afixos de concordância (caso do PE), exibem afixos
variações, existem casos em que a gramática da criança não é semelhante à
verbais correspondentes a cada pessoa gramatical. Aquelas cuja distinção
adulta. A instabilidade no uso do sujeito nulo observada no Português
entre essas pessoas já não é mais possível através desses afixos (caso do
Brasileiro (PB) vs a estabilidade encontrada no Português Europeu (PE)
PB), exibem pronomes fracos livres, conforme exemplo (4).
reflete as diferenças gramaticais destas duas variedades do Português, como
observou Magalhães (op. cit.). A criança brasileira, além de lidar com essas (4) *ING: papai Chal vai muito p(a)ra Minas né [: não é]?
diferenças, precisa lidar com um input que se apresenta “caótico” no que *JOA: né # eu fui onte(m) pra Minas. (Pereira, em prep.)

tange à produção de sujeitos.

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147 148
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Estudos atestam que no PB é com a concordância verbal que os brasileiro: uma viagem diacrônica (Homenagem a Fernando
Tarallo). Campinas: Editora da UNICAMP. 1993. p. 107-128.
pronomes começam a aparecer. No entanto, nos dados que analiso observa-
KATO, M. Nomes e pronomes. Letras de Hoje. Porto Alegre, v. 36, . 3, p.
se a ausência de concordância em contextos de verbos como saber e querer, 101-112, 2001.
mesmo com a presença de pronomes, o que pode ocorrer devido à LOPES, R. The production of subject in brazilian portuguese by a young child.
variabilidade do input, já que, segundo observa Miller e Schmit, com a PROBUS, v. 15. p. 123-146, 2003.
MACWHINNEY, B. The CHILDES Project: Tolls for Analyzing Talk. Third
inconstância do input, a criança pode demorar a fixar determinado
Edition. Mahwah, New Jersey: Lawrence Erlbaun Associates, 2006.
parâmetro, conforme exemplo (5). MAGALHÃES, T. M. V. O sistema pronominal sujeito e objeto na
aquisição do português europeu e do português brasileiro. Tese de
(5) * TAY: o que você fez ontem João? # fala pra mim. Doutorado. (Lingüística). UNICAMP, 2006.
*JOA: eu não sabe. (Pereira, em prep.) Miller, K. & C. Schmitt (submitted) Variable vs. Consistent Input:
Comprehension of Plural Morphology and Verbal Agreement in
Children. http://www.calvin.edu/~klm26/Agreement.pdf.
CONCLUSÕES
SIMÕES, L. Sujeito nulo na aquisição do português do brasileiro: um
estudo de caso. Tese de Doutorado. (Lingüistica). PUCRS, 2007.
Os resultados iniciais desta pesquisa estão de acordo com a literatura
sobre aquisição de concordância, que afirma que a criança adquire a
morfologia do singular e só então a do plural. Contudo, não é possível
estabelecer, ainda, as diferenças entre os dialetos observados, já que a
inconstância do input pode determinar a fixação de um valor diferente da
gramática do adulto por parte da criança, ou até mesmo pela coexistência de
dois parâmetros.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

CHOMSKY, N. Lectures on government and binding. Dordrecht: Foris,


1981.
____. The minimalist program. Cambridge, Mass.: Mit Press, 1995.
____. The knowledge of language: its nature, origin and use. New
York: Praeger, 1986.
DUARTE, Mª E. Do pronome nulo ao pronome pleno: a trajetória do sujeito
no Português do Brasil. In: I. Roberts & M. A. Kato (Org), Português
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149 150
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Essa afirmativa revela-se extremamente pertinente ao considerar-se


ESTRATÉGIAS DE RELATIVIZAÇÃO
NA FALA E NA ESCRITA:ANÁLISE EM TEXTOS que o Português Brasileiro (PB) possui, conforme têm apontado as mais
DE ESTUDANTES DA SÉRIE FINAL DO ENSINO MÉDIO diversas pesquisas lingüísticas, características bastante peculiares que o
distinguem da modalidade falada em Portugal. Além disso, o PB apresenta
Sinval Araújo de Medeiros Jr.28
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia aspectos que apontam para a existência de modalidades distintas, associadas
egojr@uol.com.br
tanto a fatores puramente intralingüísticos quanto a extralingüísticos. Por
Telma Moreira Vianna Magalhães**
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia isso, nas escolas, a diversidade de natureza lingüística é significativamente
telma.magalhaes@pq.cnpq.br
manifesta: estudantes com dialetos sociais e geográficos distintos convivem
com um ensino que, apesar do que estipula a legislação educacional, requer
RESUMO: Nas escolas brasileiras, confrontam-se as modalidades lingüísticas dos estudantes e a orientação que eles tenham que comunicar-se, acessar o conhecimento e exercer a
das gramáticas normativas. Entre os aspectos que distinguem essas variedades, estão as construções
relativas. Neste artigo, contrapõem-se tais estruturas na prescrição dos manuais tradicionais, nas descrições cidadania por meio de um código lingüístico cuja estrutura não reflete seus
do português brasileiro que as pesquisas lingüísticas têm feito e no uso de estudantes de ensino médio de
uma escola particular de Vitória da Conquista. Apesar das diferenças entre a língua dos alunos e a prescrição
gramatical – mormente na fala –, verifica-se certa interferência da escolarização (principalmente, nas
usos, já que
situações de produção escrita), que pode recuperar algumas estruturas.

PALAVRAS-CHAVE: Construções relativas. Ensino de português. Gramática. a Escola tem tomado como padrão para o ensino do português a Gramática
Normativa, que, neste século, se deslusitanizou, mas que está longe de
refletir o padrão nacional falado, e mantém muitas divergências do padrão
brasileiro escrito (SILVA, 1994, p. 77).

INTRODUÇÃO Dentre as várias estruturas lingüísticas em que se verifica um


distanciamento expressivo entre os usos do PB e a orientação das gramáticas

Uma breve consulta à legislação educacional brasileira revela que, para tradicionais normativas (GT), estão as construções relativas (ou, como

o Ensino Médio, as diretrizes dos Parâmetros Curriculares Nacionais denomina a GT, as orações subordinadas adjetivas), tema desenvolvido no

preconizam que “o respeito à diversidade é o principal eixo” a ser seguido presente estudo.

(BRASIL, 1999, p. 123). No ambiente escolar, tal diversidade torna-se


especialmente perceptível quando se trata do ensino de língua portuguesa, METODOLOGIA

cujo papel “como instrumento de comunicação, acesso ao conhecimento e


exercício da cidadania” deve ser destacado (BRASIL, 1999, p. 46). Neste trabalho, analisam-se as estratégias de relativização encontradas
em textos orais e escritos de estudantes da terceira série do Ensino Médio de
28 Aluno do Curso de Especialização em Lingüística da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB. uma escola particular, em Vitória da Conquista/BA, visando a detectar como
** Orientadora. Doutora em Lingüística pela Unicamp.

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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 149-154 Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
151 152
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são articuladas as construções relativas na fala e na escrita, o elenco dos anafórico. Há discordância no elenco desses pronomes e, também, na
pronomes relativos empregados nessas construções, a existência de possibilidade de haver oração adjetiva sem antecedente para o relativo, além
diferentes estratégias de relativização de acordo com a modalidade de uso da de serem raros os comentários sobre o PB contemporâneo.
língua e a percepção dos alunos às diferentes estratégias de relativização As pesquisas lingüísticas, por sua vez, têm demonstrado que os
constatadas no PB. Optou-se por coletarem-se dados de alunos do autor falantes do PB nem sempre seguem as orientações da GT. Silva (1995, p. 79)
desta pesquisa, a fim de tornar-se a interação – e conseqüente produção destaca o fato de que “os professores que assumem a tarefa de literalizar o
lingüística – menos sujeita à introversão. país, hoje, na sua grande maioria” são oriundos de classes sociais cujos
Inicialmente, os dados da fala foram registrados em entrevistas dialetos não são, necessariamente, reconhecidos como cultos. Além disso,
individuais, sendo solicitado aos estudantes que fizessem relatos acerca de “hoje há um número significativo de professores que, certamente, não
viagens, de experiências em que eles ou alguém próximo houvessem sido dominam o padrão preconizado pela escola” (SILVA, 1995, p. 53). Verifica-se,
vítimas de violência e/ou criminalidade e do conteúdo de livros e/ou filmes de no PB, a existência de estratégias distintas para a relativização: a relativa
que tenham gostado. Em seguida, pediu-se-lhes que fizessem, por escrito, padrão, as construções cortadora e com resumptivo (cf. TARALLO, 1996,
uma narrativa da experiência pessoal e outra do conteúdo de obra. Em outro KATO, 1996, PERRONI 2001, CORRÊA 1999a e 1999b). Tarallo (1996) propõe
momento, foi-lhes apresentado um grupo de sentenças, a maioria produzida ainda que, devido à ambigüidade da estrutura das relativas de sujeito e
por eles mesmos, contendo orações relativas construídas tanto de acordo objeto direto, haveria, para essas posições, uma relativa com lacuna, similar
com a GT quanto por ela condenadas, a fim de verificar o nível de à relativa padrão.
aceitabilidade das diferentes construções e, quando não aceitas, os Nas orações em que o elemento relativizado é um sintagma
comentários e sugestões feitos. preposicionado, a relativa padrão corresponde a 35,2% das construções
(19,7% na fala; 66,7% na escrita), a estratégia cortadora corresponde a
RESULTADOS E DISCUSSÕES 62,6% do total (78,1% na fala; 33,3% na escrita), e a com resumptivo a
2,2% (somente na fala). Nas relativas em que o elemento relativizado não é
As construções relativas, na GT, são abordadas tanto nas seções preposicionado, a estratégia com resumptivo apareceu em 3% das
destinadas a tratar dos pronomes relativos quanto naquelas em que se ocorrências, todas na fala; as demais construções coincidem com a relativa
apresentam as orações subordinadas adjetivas. Nas treze gramáticas padrão.
consultadas, são unânimes as afirmações de que orações adjetivas têm valor O pronome relativo majoritariamente empregado é QUE: 97% das
de adjetivo (por isso, funcionam como adjunto adnominal) e de que os construções relativas no texto oral e 82% no texto escrito são feitas com
pronomes relativos desempenham uma função sintática, além de terem papel esse pronome, tanto na estratégia padrão de relativização quanto nas

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estratégias não-padrão. O relativo ONDE também é encontrado na fala e na KATO, M.A. Recontando a história das relativas em uma perspectiva
paramétrica. In: ROBERTS, I.; KATO, M.A. (Org.). Português brasileiro:
escrita, e os relativos COMO e CUJO são verificados na escrita.
uma viagem diacrônica. 2 ed. Campinas: Editora da Unicamp, 1996. p.
A atividade metalingüística revelou que, se por um lado, relativas 223-261.
construídas com a estratégia padrão em estruturas mais complexas nem PERRONI, M.C. As relativas que são fáceis na aquisição do português
brasileiro. D.E.L.T.A., 17:1, p. 59-79, 2001.
sempre são consideradas boas pelos alunos, por outro, estruturas com
SILVA, M.B. A escola, a gramática e a norma. Revista Internacional de
relativas sem antecedente e com preposição órfã são, muitas vezes, bem Língua Portuguesa, Lisboa, 12, p. 75-81, 1994.
aceitas. Construções com resumptivo normalmente não são bem recebidas. SILVA, R.V.M. Contradições no ensino de português. A língua que se
fala X a língua que se ensina. São Paulo: Contexto; Salvador: Edufba,
As relativas cortadoras parecem ser as mais instáveis quanto à aceitabilidade.
1995.
TARALLO, Fernando. Diagnosticando uma gramática brasileira: o português
CONCLUSÕES d’aquém e d’além-mar ao final do século XIX. In: ROBERTS, Ian; KATO, Mary
A. (orgs.). In: ROBERTS, I.; KATO, M.A. (Org.). Português brasileiro: uma
viagem diacrônica. 2 ed. Campinas: Editora da Unicamp, 1996. p. 69-105.
O “embate” entre as modalidades de língua ao qual estão submetidos
os estudantes, no Brasil, acaba por fornecer dados interessantes a respeito
da influência de uma modalidade sobre a outra e, principalmente, do papel
da escolarização. Por um lado, verificam-se, na escrita, estratégias de
relativização que espelham a fala. Por outro, a escrita acaba por influenciar a
produção oral de falantes escolarizados, ainda que não espelhe uma fala
inconsciente decorrente do processo natural de aquisição da língua. Ambos
as situações foram verificadas nos dados analisados.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL, Ministério da Educação, Secretaria de Educação Média e


Tecnológica. Parâmetros curriculares nacionais: ensino médio. Brasília:
Ministério da Educação, 1999.
CORRÊA, V.R. Aprendendo a relativa padrão na escola. Caderno de
Estudos Lingüísticos, Campinas, 36, p. 71-83, 1999a.
CORRÊA, V.R. Oração relativa: o que se fala e o que se aprende no
português do Brasil. Sínteses – Revista dos Cursos de Pós-Graduação,
4, p. 87-100, 1999b.
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
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compreender se tal fenômeno evidencia ou não uma mudança paramétrica


O OBJETO DIRETO ANAFÓRICO E SUAS do Português Brasileiro.
MÚLTIPLAS REALIZAÇÕES NO PORTUGUÊS BRASILEIRO Partindo dos pressupostos da Teoria Gerativa (Cf. Chomsky, 1986), o
presente trabalho investiga, a partir de textos escritos de alunos do Ensino
Daiane Gomes Amorim29
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia Fundamental, as diversas estratégias de preenchimento de objeto direto
daianepajarita@yahoo.com.br
anafórico, com referente de 3ª pessoa, analisando a influência dos traços
Telma Moreira Vianna Magalhães**
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia semânticos [±animado], [± específico] e [± gênero semântico] do
telma.magalhaes@pq.cnpq.br
antecedente a que este se refere.
Considerando a hipótese de Corrêa (1991), segundo a qual a criança,
RESUMO
O presente trabalho apresenta um estudo sincrônico acerca da realização do objeto direto
antes de iniciar o processo de aprendizagem escolar, utiliza grande
anafórico, com referente de 3ª pessoa, investigando: a) a influência da escola na recuperação e quantidade de construções com objeto nulo e, à medida que vai sendo
manutenção dos clíticos acusativos no português brasileiro; b) a importância dos traços
semânticos animacidade e especificidade na realização fonológica do objeto direto anafórico e c) a submetida ao processo da aprendizagem da escrita e do português culto,
importância do traço gênero semântico na alternância entre objetos nulos e pronomes plenos na
posição de objeto direto anafórico. A análise tem como ponto de partida textos produzidos por adquire o uso do objeto preenchido, esse trabalho analisa o papel da escola
alunos do Ensino Fundamental de escolas públicas da cidade de Barra do Choça – Bahia.
na recuperação e manutenção dos clíticos que não fazem mais parte da
PALAVRAS-CHAVE: Animacidade. Especificidade. Gênero semântico. Objeto nulo. Português
brasileiro. Pronome pleno. gramática nuclear do Português Brasileiro atual.

MATERIAL E MÉTODOS

INTRODUÇÃO
O corpus deste trabalho é composto de textos escritos de alunos das
séries 3ª, 4ª, 5ª, 6ª, 7ª e 8ª do Ensino Fundamental, de escolas públicas da
Nos últimos anos, o estudo do objeto nulo (doravante ON) tem
cidade de Barra do Choça, Bahia. Inicialmente, as produções foram feitas de
aguçado a curiosidade de vários pesquisadores (Cf. Duarte, 1989;
forma espontânea, sem que fosse exigida dos alunos alguma tipologia textual
Corrêa,1991, Cyrino, 1996; Averbug, 2000; Casagrande, 2007, entre outros).
específica, porém, nesse tipo de produção, não foi possível obter os dados
No decurso das últimas décadas, diversos estudos sincrônicos e diacrônicos
necessários à análise proposta, visto que os informantes produziram textos
ocuparam-se em verificar como se dá a ocorrência do ON objetivando
curtos, o que inviabilizou o aparecimento dos dados a serem estudados,
fazendo-se necessária uma mudança na estratégia para a coleta de dados.
29 Aluna do curso de Especialização em Lingüística da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB.
** Professora Assistente do Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários – DELL da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB.

_____________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 155-160. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
157 158
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A produção textual passou a ser direcionada por uma atividade Dentre as várias estratégias de preenchimento do objeto direto
contendo apenas o início de um texto narrativo, cabendo aos alunos anafórico, observou-se que o uso de PrPls ocorre timidamente nas séries
completá-lo segundo a sua imaginação. Essa estratégia originou ótimos iniciais (3ª e 4ª), atingindo seu ápice na 6ª série e apresentando percentual
resultados, pois, ao darem continuidade à história narrada, os informantes reduzido na última série do Ensino Fundamental. Esta oscilação pode estar
conseguiram escrever textos maiores e coerentes, conforme era esperado. relacionada ao fato de os professores identificarem mais facilmente o uso dos
Os dados foram coletados de 57 textos, totalizando 99 ocorrências de objetos PrPls na posição de objeto direto como sendo erro segundo a GT,
diretos anafóricos, com referente de 3ª pessoa. procedendo, portanto, à devida correção gramatical a fim de cumprir o seu
Os dados pertinentes ao presente estudo são aqueles que apresentam papel enquanto transmissor da norma culta padrão, prevista nas ditas
a ocorrência do objeto direto anafórico de 3ª pessoa, podendo este estar gramáticas tradicionais. Em contrapartida, o uso de SN lexical cresce à
representado pelas seguintes formas: objeto direto nulo (ON), Pronome medida que a escolaridade aumenta, o que parece ser resultado de correções
Pleno (PrPl), SN lexical ou ainda pelos clíticos. Para a análise dos objetos realizadas por professores que têm dificuldade de identificar o SN lexical na
anafóricos, considerou-se a natureza semântica dos seus antecedentes, mais posição de objeto como sendo, no mínimo, algo que não obedece às normas
especificamente os traços [±animado], [± específico] e [± gênero prescritas pela GT.
semântico]. Quanto à importância do traço de animacidade do antecedente como
fator condicionante da alternância entre ON e PrPl, os dados evidenciaram
RESULTADOS E DISCUSSÃO que o traço [+a] favorece a ocorrência do PrPl na posição de do objeto direto
anafórico enquanto o traço [-a] favorece a ocorrência de ON. O traço [±
Os dados analisados revelam que as crianças das séries iniciais usam gênero semântico] não se mostrou relevante na alternância entre PrPls e
ON em grande quantidade, o que pode ser considerado natural visto que ONs.
essa estrutura faz parte de sua gramática. Porém, ao serem submetidas ao Com base nos resultados apresentados por antecedentes do tipo [+a,
processo de aquisição da escrita, as crianças são expostas a situações de +e, +gs], pode-se supor que o traço de especificidade atrelado ao traço de
comunicação em que predomina o uso da norma culta, prevista pela animacidade, embora não atuem de forma decisiva, exercem forte influência
Gramática Tradicional. Assim, os dados demonstraram que à medida que os na escolha de PrPls e ONs. O impedimento para a confirmação dessa
alunos adquirem os clíticos por meio da aprendizagem escolar, o uso do ON proposição está nos antecedentes [+a, +e, -gs], uma vez que nesta pesquisa
diminui de forma considerável, comprovando, portanto, a influência da escola foi verificada apenas uma ocorrência com este tipo de antecedente.
na recuperação e manutenção dos clíticos por meio da modalidade escrita.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
159 160
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CONCLUSÃO ______. O objeto nulo no português do Brasil - um estudo sintático-


diacrônico. Londrina: Editora UEL, 1997. [Publicada em 1997 pela Ed. da
Universidade Estadual de Londrina, Londrina PR.]
O estudo realizado comprova que, por meio da aquisição da escrita, a MAGALHÃES, T. M. V. O sistema pronominal sujeito e objeto na
escola consegue recuperar, até certo ponto, o uso dos clíticos. Ficou aquisição do Português Europeu e do Português Brasileiro. 175 p.
[Tese de Doutorado em Lingüística]. Instituto de Estudos da Linguagem da
evidenciado que o traço [+animado] do antecedente favorece o Universidade Estadual de Campinas, 2006.
preenchimento da posição de objeto direto enquanto o traço [-animado]
favorece a ocorrência de ON. Os dados não apresentaram polarização que
atribuísse ao traço gênero semântico o papel de fator condicionante para a
alternância entre ON e PrPl.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AVERBUG, M. C. G. Objeto direto anafórico e sujeito pronominal na


escrita de estudantes. 141 p. [Dissertação de Mestrado em Língua
Portuguesa]. Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2000.
CASAGRANDE, S. A aquisição do objeto anafórico em português
brasileiro. 197 p. [Dissertação de Mestrado em Lingüística]. Universidade
Federal de Santa Catarina, 2007.
CHOMSKY, N. Knowledge of language: its nature, origin and use. New York:
Praeger, 1986. [tradução portuguesa: Anabela Gonçalves e Ana Teresa Alves.
O conhecimento da linguagem: sua natureza, origem e uso. Lisboa:
Caminho, 1994].
CORRÊA, V. R. Objeto direto nulo no português do Brasil. 99 p.
[Dissertação de Mestrado em Lingüística]. Instituto de Estudos da Linguagem
da Universidade Estadual de Campinas, 1991.
CREUS, S.; MENUZZI, S. M. Sobre o papel do gênero semântico na
alternância entre objetos nulos e pronomes plenos em português brasileiro.
Revista da ABRALIN, Florianópolis, v. 3, n. 1-2, p. 149-176, 2004.
CYRINO, S. M. L. Observações sobre a mudança diacrônica no Português do
Brasil: objeto nulo e clíticos. In: KATO, M. A.; ROBERTS, I. (org.).
Português Brasileiro: uma viagem diacrônica (Homenagem a
Fernando Tarallo). 2ª.ed. Campinas: Editora da UNICAMP, 1996. p. 163 –
185.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
161 162
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(GU), que guia a criança no processo de aquisição de uma língua. A referida


O OBJETO NULO NO DIALETO DE VITÓRIA DA CONQUISTA: aquisição se dá com a exposição da criança a dados positivos de uma língua,
UM ESTUDO COMPARATIVO30
durante seus primeiros anos de vida.

Manoel Bomfim Pereira
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
A GU é constituída de Princípios invariáveis entre as línguas e de
uesb2006@gmail.com
Parâmetros que são responsáveis por possíveis variações. Assim, o estado
Telma Magalhães∗∗
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia inicial já restringe: (i) o que é invariante nas línguas naturais e (ii) as opções
tel2111@yahoo.com.br
abertas a serem definidas pela experiência lingüística a que a criança é
exposta.
RESUMO Neste trabalho, verificarei se a hipótese levantada por Creus e Menuzzi
O português brasileiro, como se afirma na literatura lingüística, é uma língua que favorece mais o
apagamento do objeto que do sujeito. Creus e Menuzzi (2005) propõem que o gênero semântico (2005) se aplica aos dados que aqui analiso. Ou seja, se o gênero semântico
do antecedente condiciona o preenchimento da posição do objeto. Neste trabalho, realizo um
estudo comparativo dos objetos nulos identificados, nos dados de João e Mariana, duas crianças do antecedente exerce alguma influência na realização dos objetos.
de Vitória da Conquista com idade compreendida entre 1;8.0 a 3;0.0 anos, objetivando verificar se
a hipótese destes autores se aplica a este corpus. A conclusão preliminar a que se chega é que o
traço [-animado] favorece a ocorrência de objetos nulos.
MATERIAL E MÉTODOS
PALAVRAS-CHAVE: Animacidade. Gênero semântico. Objeto nulo.

O corpus deste trabalho é composto por gravações de duas crianças


brasileiras, naturais de Vitória da Conquista, na faixa etária compreendida

INTRODUÇÃO entre 1;8.0 a 3;0.0 anos. Conforme quadro (1):

Esta pesquisa insere-se no quadro da Teoria Gerativa, mais Quadro 1. Dados de Aquisição do PB
Criança Idade Nº. de arquivos
especificamente nos modelos de Princípios e Parâmetros (CHOMSKY, 1981 e
João 2; 0.0 – 2; 8.0 5
seguintes).
Mariana 2; 0.0 – 2; 8.0 5
De acordo com esta teoria os seres humanos são dotados inatamente
de um conhecimento lingüístico rico e estruturado, a Gramática Universal
A coleta de dados utilizada é feita com base no método naturalístico,
longitudinal. A gravação dos dados está sendo realizada com um gravador
30 Esta pesquisa faz parte do Projeto “Os pronomes sujeito e objeto na aquisição do português brasileiro (PB) e do português europeu (PE)” coordenado por Telma
Magalhães, financiado pelo CNPq (Edital Universal -2006, processo nº 479082/2006-5) e pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB. digital de voz.

Aluno de graduação em Letras Vernáculas da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia e voluntário de iniciação científica IC – UESB.
∗∗
Orientadora da Pesquisa. Professora Assistente do DELL/UESB (Estrada do Bem Querer, KM 04, 45083-900, Vitória da Conquista, Bahia). Doutora em Lingüística
pela Unicamp.
A transcrição está sendo feita com recursos do sistema CHILDES
(MacWhinney 2000), que possibilita, a partir de uma transcrição codificada, a
______________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 161-165. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
163 164
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

análise computacional dos dados que são corrigidas minunciosamente para Neste trabalho, assumo a hipótese apresentada por Creus e Menuzzi
que se garanta a confiabilidade do corpus. (op. cit), aquela que atribui ao gênero semântico o papel para licenciar a
Os dados adquiridos a partir deste trabalho serão comparados, ocorrência ou não de objetos nulos. Analisando alguns dados obtidos de João
posteriormente, com os dados de 2 crianças portuguesas e outras 5 e Mariana, pode-se constatar a ocorrência de 55 objetos, sendo que destes
brasileiras (2 de Campinas (Magalhães, 2006) e 3 de Vitória da Conquista, 80% são nulos e [-animados]. João não realizou nenhum objeto preenchido
em fase de coleta, na mesma faixa etária dos informantes em questão. Os por pronome pleno de terceira pessoa. Houve dois casos em que ele trocou o
dados para a comparação com o dialeto de Porto Alegre são aqueles pronome objeto [me] pelo pronome sujeito [eu], ocorrência comum nesta
disponíveis em Simões (1997). fase. Observa-se, aqui, que, mesmo realizando esta troca, João ainda
A análise que será realizada a partir deste estudo visa identificar quais respeita o critério do gênero semântico, pois os pronomes dos quais faz uso
são os fatores que favorecem a ocorrência do objeto nulo neste dialeto e possuem referente mais animado.
verificar se a hipótese levantada por Creus e Menuzzi (2005) se aplica aos
dados levantados para este trabalho. (1) *JOA: Leva eu Tata.
*JOA: Por favor Tata # leva eu.

RESULTADOS E DISCUSSÃO Como proposto por Creus e Menuzzi (op. cit), o gênero semântico, ou
melhor, sua ausência também parece ter influenciado, aqui, uma maior
Sabe-se que, no Português Brasileiro, a categoria vazia é menos restrita ocorrência de objetos nulos que fonologicamente preenchidos por pronomes.
na posição de objeto que de sujeito. Duarte (1989) e Cyrino (1994; 1997) Com isto, os dados aqui analisados comprovam, em parte, a hipótese desses
apud Creus & Menuzzi (2005), consideram que o traço semântico de autores. A ausência de gênero semântico favoreceu o apagamento do objeto,
animacidade possui um papel crucial para a realização destes objetos. pois os substantivos retomados por eles não possuíam este gênero, e podem,
Creus e Menuzzi (2005), considerando esta hipótese, trazem para sua portanto, ser classificados como sendo inanimados. Logo, vê-se aí a
discussão a noção de “gênero semântico”. Para eles, será a existência ou não relevância do que propôs Duarte (1989) e Cyrino (1994; 1997).
do gênero semântico que licenciará ou não a realização do objeto nulo.
Conforme estes autores, gênero semântico faz correlação com a noção CONCLUSÕES
de “sexo natural”. Esse gênero se refere a nomes que denotam indivíduos
animados ou a uma classe destes, cujo sexo natural pode ser facilmente Neste trabalho, não se tem a pretensão de fazer conclusões definitivas.
identificado. Analisam-se os dados e explica-se o que eles mostram. Logo, pode-se

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
165 166
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

afirmar, preliminarmente, que o gênero semântico é relevante para explicar o


percentual de nulos realizados por João e Mariana até presente momento.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CHOMSKY, N. Lectures on government and binding. Dordrecht: Foris,


1981
CHOMSKY, N. The knowledge of language: its nature, origin and use.
New York: Praeger, 1986.
CHOMSKY, N. The minimalist program. Cambridge, Mass.: Mit Press,
1995.
CREUS, S. & MENUZZI, S. Sobre o Papel do Gênero Semântico na
Alternância entre Objetos Nulos e Pronomes Plenos em Português
Brasileiro. CELSUL, 2004.
MACWHINNEY, B. The CHILDES Project: Tolls for Analyzing Talk. Third
Edition. Mahwah, New Jersey: Lawrence Erlbaun Associates, 2000.
DUARTE, Mª E. A perda do princípio "Evite Pronome" no português
brasileiro. [Tese de Doutorado em Lingüística]. Instituto de Estudos da
Linguagem da Universidade Estadual de Campinas, 1995.
GALVES, C. O Enfraquecimento da concordância no português brasileiro. In:
KATO, M. A; ROBERTS, I. (Org.). Português Brasileiro: uma viagem
diacrônica (Homenagem a Fernando Tarallo). 2ª.ed. Campinas: Editora
da UNICAMP, 1996. p. 387-408.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
SOCIOLINGÜÍSTICA
E SINTAXE
169 170
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Não obstante, estudos recentes, como os de Duarte (1995), têm


A REALIZAÇÃO DO SUJEITO PRONOMINAL DE
atribuído ao enfraquecimento no sistema flexional do português brasileiro o
REFERÊNCIA ARBITRÁRIA NA COMUNIDADE LINGUÍSTICA
DE VITÓRIA DA CONQUISTA* preenchimento do sujeito pronominal. Segundo a autora, a mudança em

Daiane Gomes Bahia** curso no PB em relação à expressão do sujeito pronominal está intimamente
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
daianegb@hotmail.com ligada à redução dos paradigmas flexionais, passando de seis formas
Elisângela Gonçalves*** distintivas para um paradigma com não mais que três formas.
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
angellsilva@hotmail.com De modo a confirmar a sua tese, Duarte apresenta, em um capítulo à
Paula Barreto Silva**** parte, a análise de construções de tópico denominadas Deslocamento à
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
paulinhabarreto2005@yahoo.com.br Esquerda (DE), por ela chamadas de Duplo Sujeito, tendo em vista que,
“numa língua pro-drop, retomar por um pronome um sujeito que acaba de

RESUMO ser mencionado seria no mínimo negar o papel da flexão ‘rica’” (Idem, p.
Com base em hipóteses sobre o parâmetro pro-drop, especialmente a que o correlaciona à
ausência de morfologia verbal, desenvolvemos esta pesquisa, a fim de investigar em dados de fala
101). Vasco (1999, p. 61-62) também destaca que o fato de o PB apresentar
da comunidade lingüística de Vitória da Conquista, Bahia, ocorrências de preenchimento do sujeito
pronominal e a conseqüente diminuição do uso do sujeito nulo no português brasileiro (PB)
uma morfologia pobre o aproxima de línguas como o chinês, língua que,
contemporâneo. Os resultados a que as análises variacionistas nos permitiram chegar revelam a embora permita sujeito nulo, não apresenta morfologia de concordância. O
penetração do sujeito pronominal pleno de referência arbitrária em estruturas de uma língua pro-
drop, em cujos moldes a tradição gramatical ainda inclui o PB. autor afirma, ainda, a partir de pesquisa empírica, que a mudança na
PALAVRAS-CHAVE: Morfologia. Parâmetro do Sujeito Nulo. Português Brasileiro Falado. representação do sistema pronominal, favorecendo o preenchimento do
Sociolingüística Variacionista.
sujeito, também estaria relacionada com o surgimento desse tipo de
construção (DE) na língua.

INTRODUÇÃO MATERIAL E MÉTODOS

A identificação do sujeito no português brasileiro é atribuída à A pesquisa aqui apresentada foi realizada com base na metodologia da
desinência verbal e, em seguida, à presença próxima do sujeito nominal. O Sociolingüística Quantitativa (LABOV, 1972) e conforme alguns pressupostos
argumento da flexão do verbo é o mais evocado por todos os autores como do Modelo de Princípios e Parâmetros, da Teoria Gerativa (CHOMSKY, 1981).
justificativa para a omissão do sujeito. Para a constituição do corpus que serviu de base para a análise, foi

* O projeto de pesquisa de que se originou este trabalho tem financiamento interno da UESB.
necessário realizarmos os seguintes procedimentos: 1) inicialmente foi
** Bolsista de Iniciação Cientifica (UESB/Fapesb). Discente do curso de Letras/UESB, campus de Vitória da Conquista.
*** Mestre em Letras e Lingüística, pela Universidade Federal da Bahia (UFBA).
**** Bolsista de Iniciação Cientifica (IC-UESB). Discente do curso de Letras/UESB, campus de Vitória da Conquista.
aplicado um questionário para a seleção dos informantes; 2) 18 informantes
______________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 169-174. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
171 172
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

distribuídos igualmente por gênero (feminino e masculino), escolaridade


(fundamental, médio e superior) e faixa etária (1- 15 a 25 anos, 2- 35 a 45 (1) você tivesse realmente alguma coisa pra proteger ... (M2s)5

anos e 3- 50 anos em diante) foram selecionados; 3) foi feita com cada (2) a gente vê também que, cada dia que passa, vai ...(M1m)

informante uma entrevista com duração de aproximadamente 60 minutos,


Os dados mostram o percentual de 81% para a forma zero, assim, a
com questões voltadas para o cotidiano, assim como 4) a transcrição
ambigüidade na morfologia enfraquece a afirmação de que o PB pode
grafemática dos dados das entrevistas; 5) por fim, os dados foram
prescindir de pronome sujeito por já ter a indicação expressa na desinência
quantificados em programas computacionais do VARBRUL, de modo a
número pessoa. O fator faixa-etária revela que os falantes da faixa
fazermos a análise. As variáveis dependentes “sujeito nulo” vs. “sujeito
intermediária e os mais velhos favorecem o emprego de sujeito preenchido.
pleno” foram analisadas com base nos fatores lingüísticos: (1) pessoa e
Comparando esse resultado com o de Duarte (1995), vimos uma situação
número gramaticais; (2) tempo e formas verbais; (3) flexão verbal; e
inversa. Segundo a autora, há uma evolução gradual e constante, liderada
extralingüísticos: (4) gênero; (5) faixa etária; (6) escolaridade.
pelos jovens e mulheres, em direção ao sujeito lexical. A explicação possível
para essa divergência é o fato de informantes dessas faixas etárias (em
RESULTADOS E DISCUSSÃO
nossos dados) produzirem respostas mais longas, favorecendo orações
encaixadas, ao contrário dos jovens.
Os resultados da análise revelam a ocorrência do sujeito pronominal
Outra prova de mudança no sistema é a implementação de construções
pleno no sistema (79%). Os falantes utilizam mais construções em que o
de Deslocamento à Esquerda (DE). Em outro estudo, desenvolvido por este
preenchimento acontece com as formas você (0.76) em detrimento de tu e
grupo de pesquisa, que busca identificar as ocorrências de estratégias de
a gente (0.81) concorrendo com nós. A preferência pelo uso da forma plena
tópico nos dados dessa mesma comunidade lingüística, os resultados revelam
é vista até mesmo em contexto de resistência do sujeito nulo. São dignas de
que, em 469 sentenças de construções de tópico, 63% são construções do
nota as numerosas ocorrências dos pronomes de terceira pessoa: 160 no
tipo DE, entre as quais, destacamos construções de DE Sujeito, em que o
plural e 254 singular. Os tempos verbais presente e pretérito imperfeito do
tópico é retomado por um pronome pessoal. Isso reforça a afirmação da
Subjuntivo e futuro do presente do Indicativo obtiveram maior peso relativo
perda do Princípio Evite Pronome e o conseqüente estado de mudança na
no favorecimento do sujeito pleno (0.82, 0.79, 0.60, respectivamente), o que
representação do sistema pronominal, favorecendo o preenchimento do
já era esperado, tendo em vista a neutralização entre 1ª e 3ª pessoas cuja
sujeito (ver DUARTE, 1995).
desinência é a mesma. Entretanto, chamamos a atenção para o fato de estar
ocorrendo também a neutralização nas demais pessoas, com a 5 Para a identificação dos informantes, foram utilizadas seqüências de letras e números, em que o primeiro indica o gênero do informante (M/F), o
segundo representa a faixa etária (1 – 15 a 25 anos), (2 – 35 a 45 anos), (3 - mais de 50 anos), e o terceiro, seu nível de escolarização (f –
implementação no sistema das formas de desinência zero. fundamental, m – médio, s- superior), conforme o exemplo seguinte: M2f indica que o falante pertence ao gênero masculino, à faixa etária 2, e
nível fundamental de escolarização, respectivamente.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
173 174
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

CONCLUSÕES

Diante dos resultados, podemos concluir que, de fato, o português


brasileiro passa por um processo de mudança em relação ao licenciamento
do sujeito nulo. A omissão do sujeito deixa de ser obrigatória para ser
opcional, não havendo mais uma relação entre flexão distintiva e sujeito nulo.
Ressaltamos, contudo, que se trata de uma mudança ainda em progresso,
pois o sistema pronominal do PB ainda convive com as duas formas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CHOMSKY, N. Principles and Parameters in syntactic theory. In: HORNSTEIN,


N.; LIGHFOOT, D. (Ed.). Explanations in Linguistics. New York: Longman,
1981.DUARTE, M. Eugênia. A Perda do Princípio "Evite Pronome" no
Português Brasileiro. 151f. Tese de Doutorado. Campinas: UNICAMP,
1995,
LABOV, W . Sociolinguistic patterns. Philadelphia: University of
Pennsylvania Press, 1972.
VASCO, S. L. Construções de tópico no português: as falas brasileira e
portuguesa. 128f. Dissertação de Mestrado. Rio de Janeiro: UFRJ, 1999,

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
175 176
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

tópico, (c) línguas com proeminência de tópico e de sujeito e (d) línguas sem
ESTARÁ O PORTUGUÊS BRASILEIRO
DEIXANDO DE SER LÍNGUA DE SUJEITO-PREDICADO?* proeminência de tópico e de sujeito.
O português é tido como uma língua do primeiro grupo, porém estudos
Elisângela Gonçalves** lingüísticos, como os de Pontes (1987), Callou et al (1996), Vasco (1999),
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
angellsilva@hotmail.com Orsini (2003), têm demonstrado a tendência cada vez mais crescente de este
Daiane Gomes Bahia*** apresentar CTs, como as encontradas no chinês.
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
daianegb@hotmail.com Para Chafe (1976), Li e Thompson (1976.), o tópico é caracterizado em
****
Paula Barreto Silva línguas como o chinês como o elemento que cria um quadro de referência
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
paulinhabarreto2005@yahoo.com.br
para a declaração seguinte (o comentário), constituída por uma sentença
completa, formada por sujeito e predicado, como em “A professora, ela fez

RESUMO um exercício muito interessante”.


Este trabalho consiste em um recorte das pesquisas realizadas no Projeto de Pesquisa Construções
de tópico no português falado pela comunidade lingüística de Vitória da Conquista-BA e objetivou Para verificarmos em que medida o PB tem se aproximado de línguas
verificar se o português falado por essa comunidade apresenta características que a configurem
como uma língua com proeminência de tópico e de sujeito, seguindo a tipologia das línguas
como o chinês, observaremos a tendência nos dados das características das
estabelecida por Li e Thompson (1976), hipótese confirmada com os resultados obtidos. As CTs línguas de tópico propostas por Li e Thompson32: codificação superficial;
consideradas são “Duplo Sujeito” (Anacoluto) Deslocamento à Esquerda (DE), Topicalização (Top)
e Tópico-Sujeito (TSuj). marginalidade da construção passiva; ausência de sujeitos vazios;
PALAVRAS-CHAVE: comunidade lingüística de Vitória da Conquista, Bahia; construções de tópico proeminência de construções de “duplo sujeito” (embora autores, como
(CTs); português brasileiro falado; Modelo de Princípios e Parâmetros; Sociolingüística
Variacionista. Duarte (1996), não a considerem decisiva para tal); controle da co-referência
pelo tópico; não restrição quanto ao que pode ser tópico; CTs como
sentenças básicas.

INTRODUÇÃO
MATERIAL E MÉTODOS

A partir das relações de tópico-comentário ou de sujeito-predicado


O número de informantes do município de Vitória da Conquista que
predominantes nas línguas, Li e Thompson (1976) classificam-nas como: (a)
compõem a amostragem da população é de 18, distribuídos da seguinte
línguas com proeminência de sujeito, (b) línguas com proeminência de
forma:
* Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia/Proex (entidade financiadora); Projeto de Pesquisa Construções de tópico no português falado pela
comunidade lingüística de Vitória da Conquista-BA, coordenadora do Projeto: Profª. M.Sc. Elisângela Gonçalves da Silva de Andrade.
** Mestre em Letras e Lingüística, pela Universidade Federal da Bahia (UFBA).
*** Bolsista de Iniciação Cientifica (UESB/Fapesb). Discente do curso de Letras/UESB, campus de Vitória da Conquista, CEP: 45.083-900.
32
**** Bolsista de Iniciação Cientifica (IC-UESB). Discente do curso de Letras/UESB, campus de Vitória da Conquista, CEP: 45.083-900. Deixamos de fora deste estudo a propriedade que caracteriza as línguas de tópico como línguas com verbo em
posição final por ser esta questionável, já que não é encontrada na maioria dos exemplos apresentados pelos autores.
______________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 175-180. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
177 178
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

1- Gênero: Na análise dos dados que constituem o corpus desta pesquisa, após
Masculino: 09 informantes sua transcrição grafemática e sua codificação, foram utilizados programas
Feminino: 09 informantes computacionais do VARBRUL.
2- Faixa etária:
15 a 25 anos: 06 informantes
RESULTADOS E DISCUSSÃO
35 a 45 anos: 06 informantes
de 50 anos em diante: 06 informantes
Primeiramente, observou-se a predominância de sentenças com sujeito-
3 - Nível de escolarização:
predicado, com 2647 ocorrências contra 617 de CTs. Porém o percentual de
Fundamental: 06 informantes
CTs de 19% não pode ser desprezado numa língua que é dita de sujeito-
Médio: 06 informantes
Superior: 06 informantes predicado.
Quanto ao fato de, em línguas de tópico, haver uma codificação

Objetivando selecionar esses informantes, utilizou-se a técnica de superficial para o reconhecimento deste, por meio de posição inicial de

amostra aleatória por área. Inicialmente, sortearam-se 5 bairros, e, depois, sentença ou de marcadores morfológicos, no PB, verifica-se que o tópico é

duas ruas por bairro, onde foram aplicados 300 questionários. Por fim, marcado sempre na primeira posição da sentença (ver antitópico).

através da técnica de amostra aleatória simples, foram selecionados os 18 Das 1512 sentenças com sujeito definido, apenas 30 estão na voz

informantes que compõem a amostragem final. passiva, daí atestar-se a marginalidade de construções passivas, tanto que os

Na escolha dos informantes, foram observados os seguintes requisitos: informantes preferem o uso de sujeitos arbitrários (genéricos) – 1865

(a) ser natural de Vitória da Conquista ou morar neste município desde os ocorrências – ao da voz passiva, como em “Cê pode isolar uma prisão e o

cinco anos de idade; (b) nunca ter passado mais do que dois anos celular não funciona né”, em vez de “Pode-se isolar uma prisão...”.

consecutivos fora desse município. Ainda percebe-se a supremacia de sujeitos plenos em relação aos

Na execução deste projeto, foram consideradas duas fases: (1) censo: nulos, tanto definidos (das 1462, 1147 apresentam sujeitos plenos, 78%, e

coleta, transcrição e armazenamento de dados; (2) análises propostas, 315, nulos, 22%) quanto arbitrários (875 das 1120 sentenças possuem

referentes à variável dependente, nos moldes da Sociolingüística Quantitativa sujeito pleno, 78%, e 245, nulos, 22%). Porém, como conclui Vasco (1999,

(LABOV, 1972) e em alguns pressupostos do Modelo de Princípios e p. 122), embora seja marginal o emprego de sujeitos expletivos no PB, a

Parâmetros, da Teoria Gerativa (CHOMSKY, 1981). existência de construções de Tsuj “favorece a realização de advérbios em
posição de sujeito” e a tendência ao preenchimento dessa posição (mesmo
sem papel semântico) aproxima-o de línguas de sujeito.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
179 180
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Aceitando-se a premissa de que o “duplo sujeito” é típico das línguas de REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
tópico, afirmamos que, se os 17% dessas construções podem não ser o
bastante para caracterizar o PB como língua de tópico, demonstram que este CALLOU, D et all. Topicalização e deslocamento à esquerda: sintaxe e
parece mais orientado para o tópico do que o português europeu, conforme prosódia. In: CASTILHO,A. T. de, BASÍLIO,M (Org.). Gramática do
Português Falado. Campinas SP: Editora da UNICAMP, 1996.
estudos comparativos entre as duas variedades (ver VASCO, 1999).
CHAFE, W. Giveness, Contrastiveness, Definiteness, Subject and Point of
Em todas as construções em que há co-referência entre o elemento View. In: LI, C. N. Subject and Topic, New York, Academic Press, 1976.
externo à sentença e o que se encontra no interior do comentário (em DE e CHOMSKY, N. Principles and Parameters in syntactic theory. In: HORNSTEIN,
N.; LIGHFOOT, D. (Ed.). Explanations in Linguistics. New York: Longman,
Top), o controle da co-referência é estabelecido pelo tópico, não pelo sujeito:
1981.
“A prisão perpétuai eu acho que essai deveria valer em todos os países33”. DUARTE, I. A topicalização em português europeu: uma análise comparativa.
Ao observarmos elementos com diferentes funções sintáticas na In: DUARTE, I.; LEIRIA, I. (Org.). Congresso Internacional sobre o
Português, Actas. Lisboa: Colibri, 1996.
sentença-comentário a que o tópico está indexado, atestamos que não há
LABOV, W. Sociolinguistic patterns. Philadelphia: University of
restrição quanto ao elemento que pode ser tópico. Pennsylvania Press, 1972.
Quanto à existência de CTs como sentenças básicas, não derivadas de LI, C.; THOMPSON, S. Subject and Topic: A New Typology of Language. In:
qualquer outro tipo de sentença, verificam-se construções com D.E. (50%) e LI, C. (Ed.). Subject and Topic, New York: Academic Press, 1976.
ORSINI, M. T. As construções de tópico no português do Brasil: uma
Top. (29%), que não se enquadram nessa descrição, mas, por outro lado, a
análise sintático-discursiva e prosódica. 205f. Tese de Doutorado, 2003.
ocorrência de anacoluto (17%) e Tsuj (4%) que se enquadram. PONTES, E. O Tópico no Português do Brasil, Campinas: Pontes, 1987.
VASCO, S. L. Construções de tópico no português: as falas brasileira e
CONCLUSÕES portuguesa. 128f. Dissertação de Mestrado. Rio de Janeiro: UFRJ, 1999.

Logo, os dados aqui analisados apontam que sentenças SV(O) continuam


sendo mais freqüentes na oralidade do que CTs. Contudo, a freqüência e as
características por estas apresentadas, inclusive a construção de Tsuj, em
que ocorre a reanálise do tópico como sujeito (levando-se, conforme Vasco
(1999), a uma fusão entre as duas categorias), indicam uma tendência do PB
em direção ao grupo de línguas com proeminência de tópico e de sujeito.

33 O índice “i” indica que o pronome essa encontra-se co-referente ao tópico “A prisão perpétua”, sendo, assim, chamado de pronome cópia.
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
181 182
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anterior à sentença sobre o qual se faz um comentário por meio de uma


FATORES CONDICIONADORES DO TÓPICO
EM DESLOCAMENTO À ESQUERDA E TOPICALIZAÇÃO* proposição, geralmente com sujeito e predicado. Como estratégias de
construção de tópico destacam-se o Deslocamento à Esquerda e a
Paula Barreto Silva**
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia Topicalização, sendo que, no primeiro caso, o elemento topicalizado vincula-
paulinhabarreto2005@yahoo.com.br
se a um outro elemento da sentença comentário, como em “os EUA ele quer
Elisângela Gonçalves***
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
angellsilva@hotmail.com
dominar o mundo” e, no segundo caso, o tópico está vinculado a uma

Daiane Gomes Bahia****


categoria vazia (cv) como, por exemplo, “o estudo hoje muitos não tão
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
daianegb@hotmail.com levando cv a sério”. A caracterização dessas estratégias pode ser feita
também a partir da função sintática, quando vemos se o tópico está indexado
no interior da sentença comentário à função de sujeito, objeto direto, oblíquo
RESUMO
A caracterização das construções de Deslocamento à Esquerda (DE) e da Topicalização (Top) tem nuclear, oblíquo não-nuclear ou complemento de SN; da configuração
sido determinada por fatores sintáticos e semânticos, objetivo deste trabalho, que buscamos
alcançar com base em alguns pressupostos teóricos da Teoria Gerativa (CHOMSKY, 1981) e na sintática, quando verificamos se o tópico ocorre em contexto raiz, contexto
metodologia da Sociolingüística Quantitativa (LABOV, 1972), analisando dados de fala de 18
informantes da comunidade lingüística de Vitória da Conquista, Bahia. Verifica-se que os encaixado, ilha fraca ou ilha forte34 e do traço de humanidade, em que
resultados obtidos são efeito das mudanças que vêm ocorrendo no Português do Brasil e, de certa
forma, esperados.
vemos se o tópico caracteriza-se como [+humano] ou [-humano]. Tudo isso

PALAVRAS-CHAVE: Construções de tópico. Português Brasileiro. Sociolingüística Variacionista.


se constitui como grupos de fatores relevantes na análise da ocorrência
Teoria Gerativa. dessas estratégias.

MATERIAL E MÉTODOS

INTRODUÇÃO
Os dados que compõem o corpus desta pesquisa foram obtidos por
meio de entrevistas gravadas durante aproximadamente 60 minutos. Essas
A pluralidade conceitual do que vem a ser tópico nos permite falar em
entrevistas foram realizadas com 18 informantes da comunidade lingüística
tópico não-marcado, que corresponde ao sujeito gramatical na posição inicial
de Vitória da Conquista, Bahia, distribuídos por gênero (masculino e
da sentença, e em tópico marcado, que se caracteriza como o elemento
feminino), faixa etária (15-25 anos, 34-45 anos e de 50 anos em diante) e
escolaridade (níveis fundamental, médio e superior). Os dados coletados
* O projeto de pesquisa de que se originou este trabalho tem financiamento interno da UESB.
** Bolsista de Iniciação Cientifica (IC-UESB). Discente do curso de Letras/UESB, campus de Vitória da Conquista, CEP: 45.083-900. 34 A ilha fraca se caracteriza pela construção com uma conjunção integrante (O Linha Direta eu acho assim que tem coisa cv que é pesado) e a
*** Mestre em Letras e Lingüística, pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). ilha forte se caracteriza por exibir um contexto em que há orações subordinadas completivas nominais, adjetivas, subjetivas e adverbiais (Esse
**** Bolsista de Iniciação Cientifica (UESB/Fapesb). Discente do curso de Letras/UESB, campus de Vitória da Conquista, CEP: 45.083-900. preso deveria ser dado condições de ele trabalhar).

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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 181-185. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
183 184
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foram codificados e submetidos aos programas computacionais do pacote que delas 81% são de DE enquanto 19% são de TOP, logo, a maioria das
VARBRUL. Após a quantificação, foi feita a análise com base na metodologia sentenças em que o tópico tem a função de sujeito ocorrem em DE. Assim,
da Sociolingüística Quantitativa (LABOV, 1972) e conforme alguns podemos dizer que a função sintática de sujeito é a mais freqüente nas
pressupostos teóricos do Modelo de Princípios e Parâmetros, da Teoria construções de tópico, no entanto, é mais caracterizadora das construções de
Gerativa (CHOMSKY, 1981). DE. Esses resultados se assemelham aos trabalho de Callou et all (1996),
Foram observados alguns grupos de fatores que poderiam condicionar Vasco (1999) e Orsini (2003), autores que afirmam ser isso um efeito da
as variáveis independentes estudadas neste trabalho. Assim, como fatores mudança por que passa o PB em relação ao parâmetro pro-drop. Dessa
sintáticos, temos a estrutura do tópico; a função sintática a que o tópico está forma, DE e TOP estão em distribuição complementar no sistema, já que o
indexado no interior da sentença-comentário; a configuração sintática da papel sintático de sujeito favorece DE e de complemento, TOP. Esse fator
estrutura em que ocorre o tópico; a estrutura do elemento co-indexado; e a também está relacionado ao enfraquecimento do sistema flexional e à
existência de elemento entre o co-referente e o elemento topicalizado. Os necessidade de preencher a posição de sujeito com pronome lexical.
fatores semânticos foram as marcas formais de definitude; a especificitude; a As construções de tópico ocorrem, em sua maioria, em contexto raiz,
animacidade; o traço de humanidade; e o status informacional do tópico. 81,4% dos casos para DE e 68,2% para topicalização, no entanto, elas não
Como fatores extralingüísticos, observa-se a faixa etária; o gênero; e a são sensíveis a restrições de ilha, como diz Orsini (2003), e podem ocorrer
escolaridade. Destacamos, então, os fatores que cabem a discussão proposta em contexto encaixado, como afirma Pontes (1987).
neste trabalho. Quanto ao traço de humanidade, Orsini (2003) afirma que DE privilegia
o traço [+humano]. Isso pode ser confirmado em nossos dados, já que há
RESULTADOS E DISCUSSÃO uma ocorrência de 65% de DE [+humano], enquanto que, para TOP, 73%,
os elementos topicalizados correspondem ao traço [-humano].
Os resultados mais gerais mostram 469 sentenças com os tipos de Fatores extralingüísticos não foram significativos na análise realizada.
construções de tópico tratadas neste trabalho, das quais 297 (63%) ocorrem Isso pode ser um reflexo de que o tópico já se tornou uma propriedade do
com Deslocamento à Esquerda e 172 (37%) com Topicalização. Português do Brasil e não de um certo grupo social. Diante disto, vemos a
Verifica-se que é mais característica das construções de DE a função necessidade de se verificar a ocorrência dessas e de outras estratégias de
sintática de sujeito (83,5%) e das de TOP a função de complemento (34%). construção de tópico em outros dialetos para uma melhor caracterização do
Embora tenha também ocorrido uma quantidade de 34% de TOPsuj., dentre nosso sistema lingüístico.
as construções de topicalização, sabemos que isso não é significativo se
compararmos somente sentenças em que o tópico tem a função de sujeito, já

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
185 186
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CONCLUSÕES

A relevância de alguns fatores lingüísticos para a ocorrência de


construções de DE e TOP se devem às mudanças por que passa o Português
Brasileiro, que se afasta dos grupos de línguas que têm a propriedade
paramétrica de sujeito nulo, bem como se afasta do grupo das línguas com
proeminência de sujeito-predicado.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CALLOU, D et all. Topicalização e deslocamento à esquerda: sintaxe e


prosódia. In: CASTILHO, A. T. de, BASÍLIO,M (Org). Gramática do
Português Falado. Campinas SP: Editora da UNICAMP, 1996. p.315-359.
CHOMSKYN. Principles and Parameters in syntactic theory. In: HORNSTEIN,
N.; LIGHFOOT, D. (Ed.). Explanations in Linguistics. New York: Longman,
1981.LABOV, W. Sociolinguistic patterns. Philadelphia: University of
Pennsylvania Press, 1972.

ORSINI, M. T. As construções de tópico no português do Brasil. Uma


análise sintático-discursiva e prosódica. 205 p. [Tese de doutorado],
Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2003
PONTES, E. O Tópico no Português do Brasil. Campinas: Pontes, 1987.
VASCO, S. L. Construções de tópico no português. As falas brasileira e
portuguesa. 128 p. [Dissertação de mestrado]. Universidade Federal do Rio
de Janeiro, 1999.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
187 188
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influencie a escrita dos alunos com maior incidência de sujeitos nulos. Tal
O SUJEITO PRONOMINAL NULO E PLENO pesquisa objetiva verificar a ocorrência de sujeito pleno na escrita e quais os
EM TEXTOS DE ESTUDANTES DO ENSINO MÉDIO
contextos que o favorecem; observar a atuação da escola no emprego do

Iana Ferraz de Oliveira∗


sujeito pleno na escrita dos alunos. Conforme Duarte (1993; 1995), o
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
ioliveira2003@hotmail.com
paradigma flexional do PB simplificou-se devido à redução do sistema

Elisângela Gonçalves∗∗ pronominal a partir da substituição da segunda pessoa tu e vós por você(s),
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
angellsilva@hotmail.com e de nós por a gente, o que justifica o crescente preenchimento do sujeito
pronominal. Outros lingüistas, como Bravin (2000), Lira (1982; 1988),
Paredes Silva (1988; 1993), Averbug (2000), em quem se pauta esta análise,
RESUMO
Esta pesquisa objetivou verificar como se dá a realização do sujeito pronominal de referência têm estudado tal fenômeno, na oralidade e na escrita.
definida em textos escritos por vinte e seis alunos da 3ª série do Ensino Médio. As amostras foram
recolhidas em uma instituição da rede pública estadual, situada na cidade de Belo Campo, Bahia.
Desse modo, a análise foi feita com base em dados colhidos em situações em que não prevalece o
caráter espontâneo da comunicação. A teoria utilizada para a realização da pesquisa é a MATERIAL E MÉTODOS
Sociolingüística Variacionista. Os resultados da pesquisa apontam que o uso do sujeito nulo é
maior do que o do sujeito pleno.

PALAVRAS-CHAVE: Comunidade lingüística. Belo Campo/BA. Língua portuguesa. Sociolingüística


Um corpus constituído de cartas, textos narrativos e dissertativos foi
variacionista.
produzido por alunos da terceira série do Ensino Médio de uma escola pública
estadual do município de Belo Campo, no interior da Bahia. A própria
pesquisadora, professora de Língua Portuguesa da turma, aplicou o trabalho

INTRODUÇÃO para os alunos. Foram considerados os seguintes grupos de fatores


condicionadores morfossintáticos: a) número e pessoa do discurso (primeira,
segunda e terceira pessoas do singular e do plural); b) flexão verbal (-o, -
Para esta pesquisa, que foca o sujeito pronominal na escrita de alunos
mos, -m e -zero); c) forma verbal (simples e complexa); d) tempos verbais
do Ensino Médio, levantaram-se os seguintes questionamentos: “Qual a
(presente, pretérito e futuro); e) modo verbal (indicativo e subjuntivo); f)
incidência de sujeitos plenos nos textos analisados?”; “A tendência ao
tipos de orações (independente, principal anteposta e posposta, subordinada
preenchimento do sujeito no português brasileiro (PB), observada em
substantiva, adverbial anteposta e posposta, e adjetiva); fatores ligados à
referenciação (manutenção ou não do referente); o fator semântico: a


animacidade do sujeito – observando-se o traço [+ animado] e o traço [-
Aluna do Curso de Especialização em Lingüística, Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), Departamento de Estudos Lingüísticos
e Literários (DELL).
∗∗
Mestre em Letras e Lingüística. Professora Assistente do Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários (DELL), Universidade Estadual do
animado]; e o grupo relacionado aos tipos de texto (narrativo, dissertativo e
Sudoeste da Bahia (UESB). Orientadora da monografia.

______________________________________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p.. 187-191.
189 190
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

cartas). Alguns contextos ficaram de fora da análise, visto que, geralmente, relativas e adverbiais antepostas à principal, o preenchimento do sujeito é
apresentam sujeito evidente. São eles: a segunda coordenada em diante com favorecido significativamente com o peso relativo de 0.67 e 0.64,
sujeito correferente; relativas, como “A moça que mora na esquina...”; respectivamente. Percebe-se um comportamento parecido com o observado
respostas curtas que se constroem com a retomada do verbo da pergunta; por Duarte (1993; 1995), que verificou a preferência pelo preenchimento nas
verbos no imperativo. relativas. O grupo elemento interveniente entre sujeito e verbo apresenta
diferenças significativas entre os pesos relativos encontrados: de um lado, os
RESULTADOS E DISCUSSÃO advérbios aspectuais apresentam o mais elevado, 0.74, de outro, a opção
nenhum elemento apresenta o mais reduzido, 0.47. No grupo de fatores
Com base na quantificação e interpretação dos dados, verifica-se que a semânticos, quanto à animacidade do sujeito, encontramos o traço [-
quantidade de sujeitos nulos não é tão significativa, partindo-se do fato de animado] ocupando o peso relativo 0.57 e [+animado] apresentando o peso
que das 435 ocorrências, 197 apresentam sujeito pleno (45%) e 238 relativo 0.50, não sendo, portanto, significativo, ao contrário do resultado
apresentam sujeito nulo (55%), sendo expressivo o preenchimento do encontrado por Santos, em que o traço [+animado] aparece com o peso
sujeito, sobretudo considerando-se que se trata da escrita e da situação não- relativo maior, favorecendo a realização plena do sujeito.
espontânea em que os alunos produziram seus textos. Entre os fatores Esta pesquisa indica que o português brasileiro escrito demonstra um
lingüísticos que mais favorecem o uso do sujeito pronominal pleno estão: a) alto índice de ocorrências de sujeito pronominal pleno, com input (peso
número e pessoa do discurso: o sujeito pleno tem maior ocorrência na relativo de sujeitos plenos no total de ocorrências) de 0.47.
segunda pessoa do singular, atingindo o peso relativo de 0.83: “você tem
que parar de fumar”; e b) o modo verbal: nesse caso, o modo subjuntivo, CONCLUSÃO
com o peso relativo de 0.70: “o que você realmente, quer é que eu pari
(pare) de trabalhar na fábrica”. Os trabalhos examinados, com referência à
A partir do índice significativo de sujeitos plenos nos dados, conclui-se
segunda pessoa do singular, apresentaram percentual acima de 50%, na
que os alunos podem estar cada vez menos expostos a estruturas com
escrita e na fala. Já o modo verbal contraria o resultado do trabalho de
sujeito nulo e que os professores podem estar exigindo menos deles a
Santos (2000), que apresentou pesos relativos insignificantes. Quanto a
presença de sujeito nulo em suas construções. Isso pode estar relacionado
outros fatores analisados: no que se refere à flexão verbal, observa-se que a
ao fato de o preenchimento ou esvaziamento do sujeito não ser alvo de
desinência –m favorece o preenchimento do sujeito, com peso relativo de
estigmatização pela comunidade lingüística, daí não ser alvo de atenção dos
0.85, condizendo com o resultado verificado na pesquisa de Santos (2000).
professores.
Em relação ao tipo sintático de oração, nota-se que, onde há orações

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
191 192
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

AVERBUG, M. C. G. Objeto direto anafórico e sujeito pronominal na


escrita de estudantes. Dissertação de Mestrado em Língua Portuguesa. Rio
de Janeiro: UFRJ/FL, 2000, 143f.
DUARTE, M. E. L. Do pronome nulo ao pronome pleno: a trajetória do sujeito
no português do Brasil. In ROBERTS, I., KATO, M. A. Português brasileiro:
uma viagem diacrônica. Campinas : Editora da Unicamp, 1993, p. 107-128.
______. A perda do princípio “evite pronome” no português do
Brasil. Tese de Doutorado. Campinas: UNICAMP, 1995, 151f.
LIRA, S. A. Nominal, pronominal and zero subject in Brazilian
Portuguese. Tese de doutorado, University of Pennsylvania. 1982.
. O sujeito pronominal no português falado e escrito. In : Ilha do
Desterro, vol. 20. 31-43. 1988.
PAREDES, V. L. S. Cartas cariocas: A variação do sujeito na escrita
informal. Tese de doutorado, UFRJ, 1988.
______. Subject omission and functional compensation: Evidence from
written Brazilian Portuguese. In: Language Variation and Change, 1993,
5, 35-49.
SANTOS, A. M. B. O sujeito pronominal em contexto de mudança
paramétrica: a escrita de alunos do ensino médio. Dissertação de Mestrado
em Letras Vernáculas. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, 2000, 116f.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
SOCIOLINGÜISTICA
E DIALECTOLOGIA
195 196
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de expressão do valor semântico, dentre estes trabalhos são


A EXPRESSÃO DE MODALIDADES “TÍPICAS”
DO SUBJUNTIVO EM COMPLETIVAS, ADVERBIAIS considerados Câmara Jr. (1976); Perini (1995); Barra Rocha (1992); 3) um
E RELATIVAS DE DOCUMENTO DO PORTUGUÊS DO SÉCULO XVI caso de variação lingüística, como abordam Bianchet (1996); Rocha
(1997); Alves Neta (2000). O estudo do uso variável do subjuntivo também
Rosana Ferreira Alves∗
Universidade Estadual de Campinas tem sido investigado com base na hipótese da transmissão lingüística
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia∗ irregular (doravante, TLI)35, a exemplo de Meira (2006).
Alzana70@yahoo.com.br
Estudo desenvolvido por Alves (2006), diferentemente dos citados até
então, aventa e testa a hipótese inovadora de que, na língua portuguesa,
RESUMO
Tendo como base evidências expostas em Alves (2006), propõe-se que o fenômeno variável concorre com o
expressão de modalidades “típicas” do subjuntivo esteja ocorrendo mediante a realização de três
variantes lingüísticas, a saber: formas do presente do subjuntivo, formas do presente do indicativo
uso do presente do subjuntivo (cf. exemplo 1a) não apenas a variante forma
e estruturas alternativas. Procura-se verificar a atuação de fatores estruturais (tipo de sentença,
modalidade e tipo de conjunção) na realização das variáveis, buscando, assim, respaldo para que
do presente do indicativo (cf. 1c), mas também o uso da variante estrutura
se entenda, um pouco mais, a respeito do uso variável do presente do subjuntivo na língua alternativa à expressão de modalidades “típicas” do subjuntivo (cf. 1b):
portuguesa.

PALAVRAS-CHAVE: Variantes. Modalidades subjuntivas. Presente do subjuntivo. Presente do


indicativo. Estrutura alternativa. (1) (a) Eu pedi que você compre o carro. (presente do subjuntivo)
(b) Eu pedi para você comprar o carro. (estrutura alternativa)
*(c) Eu pedi que você compra o carro. (presente do indicativo)

MATERIAL E MÉTODO
INTRODUÇÃO

São assumidos, neste trabalho, os pressupostos teóricos e os


Após estudar um pouco a literatura lingüística procurando compreender procedimentos metodológicos da Sociolingüística Quantitativa conforme
como o uso do presente do subjuntivo vem sendo considerado no português, Labov (1972). Essa teoria concebe a língua como um sistema heterogêneo do
pode-se concluir que não são poucas as abordagens desse assunto. Em tais qual a variação é parte inerente. O corpus em estudo é intitulado “História da
abordagens, o uso variável de formas do presente do subjuntivo pode ser província Santa Cruz a que vulgarmente chamamos Brasil”, dedicada a D.
entendido como: 1) um caso de violação do valor semântico, sob esta Leonis Pereira. Esse texto constitui-se uma descrição de aspectos da fauna e
perspectiva está o trabalho de Fávero (1982); 2) uma forma alternativa flora, bem como de características físicas, psicológicas e culturais de nativos
(indígenas), datada de 1556, que Pero Magalhães Gândavo desenvolveu da
35 BAXTER (1997), ao discorrer a respeito de alguns aspectos fundamentais do chamado debate sobre a hipótese da crioulização prévia (HPC),

apresenta evidencias da “hipótese de que, no passado, a transmissão lingüística irregular em populações rurais tenha dado lugar a tendências
∗ estruturais divergentes visíveis nos dialetos rurais hoje em dia, e que encontram paralelos tipológicos nas línguas crioulas”, (p.97).
Estudante de Doutorado em Lingüística na UNICAMP; Professora de Lingüística do DCHL-UESB

Projeto financiado pela FAPESB (Fundação de Apoio à Pesquisa da Bahia) _____________________________________________________________________________
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 195-200.
197 198
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então província de Santa Cruz, ou seja, do Brasil recém colonizado. A 35%), como o exemplo em (2) e, secundariamente, em sentenças do tipo
utilização de documento dessa fase do português como objeto de adverbial (16%), conforme o exemplo em (3); (b) a variante estrutura
investigação lingüística é muito útil por diversos motivos. Eis alguns desses: alternativa ocorreu predominantemente, isto é, em 75%, em sentenças com
(i) por ser justamente a partir dessa fase que o processo de normativização forma verbal no infinitivo, conforme o exemplo em (4):
gramatical passa a exercer possíveis influências nos textos escritos, conforme
evidencia Matos e Silva (2006, p.17): tanto gramáticas do português como (2) variante indicativo em relativas de modalidade existência possível
[g_008_s_301] Há uns ruivos não muito grandes que derramam de si um cheiro
“português língua de escola” só entram na cena da nossa história no século
muito suave a toda pessoa que a eles se chega , e se os tratam com as mãos, ....
XVI; (ii) porque um olhar ao passado da língua possivelmente nos forneça (2) variante indicativo em sentenças adverbiais que expressam
subsídio para que mais profundamente sejam entendidos os aspectos que (3) idéia de concessão
[g_008_s_275] Outros animais há nesta província muito feros, ...; aos quais
estão envolvidos em um dado fenômeno lingüístico, conforme também
chamam Tigres, ainda que na terra a mais da gente os nomeia por Onças: mas
evidencia Matos e Silva (2006, p.16): variações do presente, heranças do
algumas pessoas que os conhecem e os viram em outras partes, afirmam que são
passado. Tigres .
(4) estrutura alternativa de infinitivo expressando modalidade
possibilidade
RESULTADOS E DISCUSSÕES
a.[g_008_s_98] Terá este rio sete léguas de boca, pela qual entra tanta abundância
de água salgada ,..., é nem mais nem menos como um braço de mar, até onde se
Após a análise das 282 ocorrências, as quais são contextos em que são pode navegar por entre as ilhas sem nenhum impedimento.

expressas as modalidades “típicas” do subjuntivo/presente, foram a’. ... até onde é possível que se navegue ...

encontrados resultados que corroboram as hipóteses aventadas, isto é: (1) a


Em se tratando do fator estrutural modalidade ou tipo de conjunção,
expressão de modalidades “típicas” do subjuntivo/presente ocorreu mediante
registrou-se que: (a) a variante padrão ocorreu categoricamente em
a realização das variantes: forma do presente do subjuntivo (em 41% dos
ambientes que expressaram idéia de conseqüência e modalidade de volição;
casos); forma do presente do indicativo (em 13% dos casos); estrutura
(b) a variante inovadora ocorreu apenas em contexto de modalidades
alternativa (em 45% das ocorrências); (2) as freqüências das variantes
existência possível (32%), de idéias de temporalidade (26%) e de concessão
analisadas mostraram-se sensíveis à atuação dos fatores estruturais
(22%); (c) a variante estrutura alternativa exibiu, exclusivamente, as
considerados.
ocorrências da modalidade possibilidade/necessidade; quase que
Assim, em relação ao fator estrutural tipo de sentença, detectou-se
exclusivamente com a idéia de condição e, predominantemente, a idéia de
que: (a) a variante inovadora forma do presente do indicativo foi,
finalidade (68%) e de causa (52%).
predominantemente, realizada em sentenças do tipo relativa (freqüência de
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
199 200
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CONCLUSÕES GANDAVO, P. M. (1556): História da Província de Santa Cruz. Edição


Eletrônica: http://www.ime.usp.br/ ~tycho/corpus/textsxml/g008.xml.
LABOV, W. Sociolinguistic Patterns. Philadelphia: University of
As ocorrências, conforme os números anteriormente apresentados, Pennsylvania, Press, Philadelphia, 1972.
possibilitam as seguintes afirmações: (I) o alto uso de estruturas alternativas MEIRA, V. O uso do subjuntivo em orações relativas e completivas no
no português falado contemporâneo não pode ser entendido como um português afro-brasileiro. Dissertação de Mestrado, UFBA, 2006.
PERINI, M. A.: A Gramática Descritiva do Português. São Paulo: Ática,
fenômeno novo no PB; (II) a co-ocorrência das variantes subjuntivo e
1995.
indicativo em sentenças adverbiais e relativas não se constitui um fenômeno ROCHA, R. C. F. A Alternância Indicativo/Subjuntivo nas Orações
que caracteriza o português afro-brasileiro, como defendem adeptos à Subordinadas Substantivas em Português. Brasília. Dissertação de
Mestrado, Universidade de Brasília, 1997.
hipótese da TRL, a exemplo de Meira (2006).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALVES, R. F. A expressão de modalidades “típicas” do subjuntivo no


português do Brasil. In: 54º SEMINÀRIO DO GEL, 1996. Anais do 54º
Seminário do Gel . Araraquara, UNIP, 2006.
ALVES NETA, A. O uso de formas do indicativo por formas do
subjuntivo no português brasileiro. Dissertação de Mestrado, UFMG,
Belo Horizonte, 2000.
BARRA ROCHA, M. M. O Modo Subjuntivo em Português – um estudo
contrastivo com o Italiano. Dissertação de Mestrado, UFMG, Belo
Horizonte, 1992.
BAXTER, A.; LUCCHESI, D.. Um paso a más hacia La definición Del
pasado criollo Del dialecto afro-brasilleño Del Helvécia (Bahia).
Comunicação ao 2ª Colóquio Internacional de Lenguas criollas de base
española portuguesa. Berlin (memeo), 1997.
BIANCHET, S. M. G. B. Indicativo e/ou Subjuntivo em Orações
Completivas Objetivas Diretas do Português: uma volta ao latim.
Dissertação de Mestrado, UFMG, Belo Horizonte, 1998.
CÂMARA JR, J. M. Estrutura da Língua Portuguesa. Petrópolis: Padrão,
1992.
FÁVERO, L. L. O modo Verbal da Oração Completiva. In: Revista Brasileira
de Lingüística. Vol.6, nº 1. São Paulo: Livraria das Cidades, 1982.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
201 202
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A pesquisa foi feita a partir dos inquéritos do Projeto ALiB, apoiando-se,


A VARIAÇÃO DIASTRÁTICA NO PORTUGUÊS DO BRASIL:
PALATALIZAÇÃO DAS OCLUSIVAS DENTO-ALVEOLARES EM do ponto de vista teórico, na Dialectologia, na Geolingüística e na
INQUÉRITOS DO PROJETO ATLAS LINGÜÍSTICO DO BRASIL (ALIB) 36 Sociolingüística Variacionista Laboviana.
O ALiB é um projeto de cunho nacional e tem por objetivo a realização
Andréa Mafra Oliveira dos Santos∗∗
Universidade Federal da Bahia de um atlas lingüístico geral do Brasil. Pretende descrever a realidade
mafra.andrea@bol.com.br
lingüística do Brasil no que se refere à língua portuguesa, considerando as
Jacyra Andrade Mota∗∗∗
Universidade Federal da Bahia variações diatópicas, diastráticas, diagenéricas e diageracionais nos diversos
jacyra.mota@pesquisador.cnpq.br
níveis da fala: fônico, semântico-lexical e morfossintático.

RESUMO MATERIAL E MÉTODOS


O trabalho visa a analisar a palatalização das consoantes oclusivas dento-alveolares, quando
precedidas da semivogal anterior alta, a partir dos dados do Projeto ALiB. O corpus constitui-se de
24 inquéritos, distribuídos pelas cidades de Salvador, Maceió e Aracaju. A escolha dos informantes
seguiu a metodologia aplicada no Projeto AliB. Analisaram-se 1.339 ocorrências que, após Na realização desta pesquisa, foram selecionados 24 inquéritos do
codificadas, foram submetidas ao Pacote de Programas VARBRUL para a sua quantificação e
análise estatística. Como resultado destaca-se a maior utilização da variante palatalizada na cidade Projeto Atlas Lingüístico do Brasil, realizados em três capitais brasileiras,
de Maceió, e, conseqüentemente, da variante dento-alveolar nas cidades de Aracaju e de
Salvador. sendo 08 em Aracaju ,08 em Maceió e 08 em Salvador.
Os informantes, de acordo com a metodologia do Projeto AliB, estão
Palavras- chave: Dialectologia. Geolingüística e Variação Lingüística
distribuídos em duas faixas etárias, a primeira de 18 a 30 anos e a segunda
de 50 a 65 anos, divididos igualmente entre os dois sexos, e em dois níveis
de escolaridade (fundamental e universitário).
INTRODUÇÃO Foram analisados os questionários do Projeto ALiB (2001): (i) Fonético-
Fonológico (QFF); (ii) Semântico- Lexical (QSL); (iii) Morfossintático (QMS); e
O presente estudo tem como objetivo analisar a palatalização das Temas para Discurso Semidirigido.
consoantes oclusivas dento-alveolares quando precedidas da semivogal O levantamento dos dados se deu a partir da audição dos inquéritos
palatal alta (nos decursos -it- e -id-) em ocorrências como dodjo (= doido), gravados em fita cassete e da transcrição grafemática e fonética do
muntcho (= muito)37, etc. Essas consoantes são, normalmente, conhecidas fenômeno em questão. Tendo em vista que a variação lingüística não é
como africadas baianas. aleatória, foi fundamental apontar grupos de fatores lingüísticos e sociais que
*O presente trabalho é financiado pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica- PIBIC – CNPq-UFBA. Está vinculado ao Projeto Atlas Lingüístico do favorecessem ou não o uso das variantes palatais ou dento-alveolares. Foram
Brasil (ALiB) e tem por orientadora a Profa. Dra. Jacyra Andrade Mota.
∗∗
∗∗∗
Graduanda em Letras Vernáculas com Língua Estrangeira-UFBA. Bolsista de Iniciação Científica CNPq.
Professora Doutora titulada na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Bolsista CNPq.
analisados 09 grupos de fatores lingüísticos (vozeamento da consoante,
37 Para evitar dificuldade na impressão do resumo, preferiu-se utilizar aqui os símbolos alfabéticos tch, dj, em lugar do alfabeto fonético internacional.

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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de
Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 201- Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
204
203 204
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tonicidade da sílaba em que se encontra a variante, vogal da sílaba universitário não apresentam diferenças de comportamento, mostrando
antecedente, número de sílabas e classe morfológica do vocábulo, presença assim que o caráter estrático não é aí relevante. Por outro lado, em Aracaju e
ou ausência da semivogal antecedente, tipo de oração, tipo de questionário e Salvador, os informantes de nível fundamental apresentaram mais variantes
tipo de discurso) e 04 fatores sociolingüísticos (diatopia, escolaridade, gênero palatalizadas, embora os pesos relativos tenham sido baixos (0,50 e 0,36,
e faixa etária do informante). Esses dados foram, posteriormente, respectivamente).
submetidos ao pacote de Programas VARBRUL. Quanto aos fatores lingüísticos, apenas o tipo de oração foi
selecionado. Esse grupo foi subdividido em dois fatores: oração não
RESULTADOS E DISCUSSÃO exclamativa e oração exclamativa, como nos exemplos: ”Ele saiu muntcho
cedo”, “Eitcha, você está dodjo!”, respectivamente, tendo-se percebido maior
Os resultados aqui apresentados se referem aos fatores lingüísticos e freqüência e probabilidade de variantes palatalizadas nas exclamativas, fato
sociolingüísticos selecionados pelo VARBRUL. esse apresentado pelo VARBRUL com o percentual de 88% e o peso relativo
Quanto ao fator diatópico, o maior número de ocorrências e peso de 0,95.
relativo mais elevado verificam-se na cidade de Maceió, com 63% e 0,76 de
peso relativo. Em relação à variável faixa etária, os informantes da 2ª faixa CONCLUSÕES
etária preferem a forma palatalizada, enquanto a faixa I tende a manter a
variante dental. Os resultados apontam para a aplicação do fenômeno nas cidades
Reunindo em um único grupo os fatores variação diatópica e faixa estudadas, necessitando de um estudo mais aprofundado, em relação aos
etária percebe-se que, em Maceió e Aracaju, a segunda faixa etária têm fatores lingüísticos.
preferência pela forma palatalizada, enquanto que em Salvador ocorre o Com relação à informação diatópica está prevista a ampliação do
contrário. corpus, com a inclusão das outras capitais brasileiras, cujos dados deverão
É interessante notar que em Maceió começa haver uma mudança, já constituir o 1º. volume do Atlas Lingüístico do Brasil.
que a primeira faixa etária apresenta apenas 28% de ocorrência e peso
relativo 0,26 e a segunda 81% e 0,90 de peso relativo. Analisando variação REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
diatópica e gênero percebe-se que, nas três cidades analisadas, não se CARDOSO, S.; MOTA, J.; AGUILERA, V.; KOCK, W.; ARAGÃO, M. S.; ZÁGARI,
observam diferenças entre os informantes do gênero masculino e feminino. M. Atlas Lingüístico do Brasil. Questionários 2001. Londrina: UEL,
2001.
Em relação à variação diatópica e escolaridade, pode ser observado
que, em Maceió, os informantes de nível fundamental e os de nível

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
205 206
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Projeto Atlas Lingüístico do Brasil (ALiB), em exemplos como mulher, mulé,


AS VARIANTES DO FONEMA LATERAL PALATAL EM INQUÉRITOS DO
muié, grelha, gréa. Assim, foi analisada a manutenção do fonema lateral
PROJETO ATLAS LINGÜÍSTICO DO BRASIL (ALiB)∗.
palatal, ao lado dos fenômenos: despalatalização, iotização e apagamento
Dijeane de Almeida Lima de Oliveira∗∗ fonético. Para a análise dos dados, levaram-se em consideração fatores de
Universidade Federal da Bahia
dijeanelima@gmail.com natureza lingüística, geolingüística e sociolingüística
Jacyra Andrade Mota∗∗∗ Com base no corpus analisado, constatou-se: i) a predominância da
Universidade Federal da Bahia
jacyra.mota@pesquisador.cnpq.br manutenção da lateral palatal, pois a iotização, a despalatalização e o
apagamento ocorreram de forma pouco expressiva; ii) a preferência pela

RESUMO manutenção da variante [lh], fato revelado principalmente na fala das


Este trabalho objetiva analisar as distintas realizações fônicas do fonema lateral palatal, /lh/38, a
partir de inquéritos do Projeto Atlas Lingüístico do Brasil, em exemplos como mulher, mulé, muié,
mulheres; iii) a relevância dos fatores sociolingüísticos para os fenômenos em
grelha, gréa. Assim, foi analisada a manutenção do fonema lateral palatal, ao lado dos fenômenos:
análise.
despalatalização, iotização e apagamento fonético, com base nos pressupostos da Geolingüística e
da Sociolingüística Variacionista e levando em consideração fatores de natureza lingüística,
geolingüística e sociolingüística.
MATERIAIS E MÉTODOS
Palavras-chave: Dialectologia. Sociolingüística. Diversidade lingüística.

Para o desenvolvimento desta pesquisa, foram selecionados inquéritos


de seis capitais nordestinas: Aracaju-SE , João Pessoa-PB, Maceió-AL, Recife-
INTRODUÇÃO PE, Salvador-BA e Teresina-PI, totalizando quarenta e oito inquéritos (oito
por localidade). O corpus desta pesquisa é constituído por informantes de
O presente trabalho estuda as distintas realizações fônicas do fonema
ambos os sexos, distribuídos por duas faixas etárias (faixa 1, de 18 a 30
lateral palatal, /lh/, a partir dos questionários fonético-fonológico, semântico-
anos, e faixa 2, de 50 a 65 anos) e em dois níveis de escolaridade
lexical, morfossintático e temas para discursos semidirigidos de inquéritos do
(fundamental e universitário).
.
Foram analisadas as entrevistas obtidas através do Atlas Lingüístico
do Brasil. Questionários 2001, as partes estudadas neste questionário

O Presente trabalho é financiado pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC - CNPq. Está vinculado ao Projeto Atlas
Lingüístico do Brasil (ALiB) e tem por orientadora a Profª Drª Jacyra Andrade Mota.
∗∗
foram as seguintes: (i) fonético-fonológico, (ii) semântico-lexical, (iii)
Graduanda em Letras Vernáculas com Língua Estrangeira-UFBA. Bolsista de Iniciação Científica CNPq.
∗∗∗
Professora Doutora titulada na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Bolsista CNPq.
38 Com o objetivo de facilitar a impressão, deixa-se de utilizar, aqui, a fonte SIL DOULOS IPA, com os símbolos do alfabeto fonético internacional. morfossintático e temas para discursos semidirigidos. Após a transcrição dos
Utilizam-se, em vez disso, os os símbolos alfabéticos lh, l, j, Ø para as variantes palatal, alveolar, iode e zero, respectivamente.

O Presente trabalho é financiado pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC - CNPq. Está vinculado ao Projeto Atlas mesmos, os dados obtidos foram organizados de forma que fosse possível
Lingüístico do Brasil (ALiB) e tem por orientadora a Profª Drª Jacyra Andrade Mota.
∗∗
∗∗∗
Graduanda do curso de Letras Vernáculas - UFBA. Bolsista de Iniciação Científica CNPq. observar as variantes fonéticas selecionadas para o estudo – [lh], [j], [l], [Ø]
Professora Doutora titulada na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Bolsista CNPq.
_______________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 205-209. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
207 208
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(variante palatal, iode, alveolar e zero) —, considerando-se a sua relação A variação diatópica mostrou-se relevante, pois a variante
com fatores de ordem lingüística e extralingüística. despalatalizada é favorecida em Maceió, com peso de 0,73, Recife, com 0,69,
A análise quantitativa dos dados foi realizada a partir dos resultados Salvador, com 0,55. A variante iotizada é favorecida em Aracaju, com peso
estatísticos produzidos pelo conjunto de programas VARBRUL que mostra a de 0,86, e Teresina, com 0,63. O apagamento da variante da lateral palatal é
probabilidade de ocorrência das variantes. favorecido em Teresina, com peso de 0,84, Aracaju, com 0,69, e Maceió, com
0,63. E a manutenção do fonema lateral palatal é favorecida em Salvador,
RESULTADOS E DISCUSSÃO com peso de 0,67, Recife, com 0,61, e João Pessoa, com 0,64. Assim, o
apagamento é favorecido em Aracaju, Maceió e Teresina; a iotização em
A análise dos dados das seis capitais selecionadas, teve como resultado Aracaju e Teresina; a despalatalização em Maceió, Recife e Salvador; e a
um total de 2.249 ocorrências, sendo apenas 48 ocorrências de manutenção do fonema lateral palatal em João Pessoa, Recife e Salvador.
despalatalização ([l]), ou seja, apenas 2% do total analisado, 51 ocorrências Quanto ao gênero e a faixa etária, a variante iotizada é favorecida entre
de apagamento (2%), 109 ocorrências da iotização (5%) e a manutenção da falantes do gênero masculino tanto da faixa 1 quanto da faixa 2, com pesos
variante [lh] em 2.041 ocorrências (91%). relativos de 0,65 e 0,62, respectivamente. Por outro lado, esse favorecimento
O nível de escolaridade dos informantes teve uma grande influência não ocorre com o gênero feminino que mostra pesos de 0,46 (faixa 1) e 0,33
para a ocorrência das variantes em estudo, pois a iotização, a (faixa 2). Já o apagamento é favorecido na fala de homens de faixa etária 1,
despalatalização e o apagamento são favorecidos pelo nível fundamental, com peso relativo de 0,70, apresenta uma neutralidade na fala de mulheres
enquanto a manutenção da lateral palatal é favorecida pelo nível da mesma faixa (0,54 de peso relativo) e é desfavorecido na faixa 2, tanto na
universitário. A manutenção da palatal apresenta um peso relativo de 0,72 no fala de homens quanto de mulheres.
registro de informantes de nível universitário ao passo que no nível
fundamental o peso foi de 0,26. A iotização é favorecida pelo nível CONCLUSÕES
fundamental com peso relativo 0,77, em contraste com o nível universitário
que mostra o valor de 0,25. O nível fundamental também favorece o Constatou-se que a despalatalização, a iotização e o apagamento estão
apagamento, com o peso de 0,76, em contraste com o nível universitário, relacionados a fatores lingüísticos, sociolingüísticos, geolingüísticos e,
com peso de apenas 0,27. E, da mesma forma, a despalatalização é provavelmente, a vocábulos que foram recorrentes no corpus.
favorecida na fala de informantes de nível fundamental, com peso de 0,61, e Como em Soares (2003), notou-se que as mulheres mostram uma
desfavorecida no nível universitário, com 0,40. maior consciência lingüística das variantes em uso, nesta pesquisa,

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
209 210
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especialmente, as da faixa 2, pois preservam a variante mais prestigiada,


utilizando pouco as outras variantes.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AGUILERA, V; ARAGÃO, M. S.; CARDOSO, S.; KOCK, W.; MOTA, J.; ZÁGARI,
M. Atlas Lingüístico do Brasil. Questionários 2001. Londrina: UEL,
2001.
SOARES, E. A realização do fonema palatal /lh/: no falar de Marabá-PA. In:
RAZKY, A. (Org.). Estudos Geo-Sociolingüísticos no Estado do Pará.
Belém: Gráfica e Editora Grafia, 2003. p.127-142.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
211 212
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mêZde) ou das alveolares surda (escola, tres) ou sonora (dezde, mêz de


O /S/ EM CODA SILÁBICA NO NORDESTE, A PARTIR DOS
...)39, especificamente em posição diante de consoante e final de vocábulo.
INQUÉRITOS DO PROJETO ATLAS LINGÜÍSTICO DO BRASIL (ALIB).∗
Foram escolhidas cinco capitais do Nordeste: Aracaju, João Pessoa, Maceió,
Cláudia Santos de Jesus∗∗ Recife e Salvador
Universidade Federal da Bahia
kaujesus@gmail.com Intenta-se, com isso, colaborar com as análises fonéticas que servirão
Jacyra Andrade Mota∗∗∗ de base para a elaboração de cartas lingüísticas que comporão o Volume I do
Universidade Federal da Bahia
jacyra.mota@pesquisador.cnpq.br Atlas Lingüístico do Brasil, contribuindo, assim, de forma direta para a
descrição da realidade lingüística do português do Brasil.
O Projeto Atlas Lingüístico do Brasil (ALiB) é um projeto de âmbito
RESUMO
A presente pesquisa estuda a variação fonética do /S/ em coda silábica, em cinco capitais do nacional que visa a descrever a realidade lingüística do Português do Brasil e,
Nordeste. Fundamenta-se teoricamente na Dialectologia Pluridimensional e na Geolingüística. Para
a constituição do corpus, utilizaram-se quarenta inquéritos, sendo oito de cada capital analisada, e a partir desta, produzir um atlas lingüístico nacional. Observa e identifica, sob
da metodologia do Projeto Atlas Lingüístico do Brasil quanto à escolha dos informantes. A análise
quantitativa dos dados fez-se mediante o pacote de programas VARBRUL. Observou-se que as a perspectiva da Geolingüística Pluridimensional Contemporânea, as
variantes oclusiva alveolar e africada surda, [t] e [tS], em contexto subseqüente, favoreceram
fortemente a palatalização. Preferiram a palatalização: os homens, os universitários e as diferenças diatópicas, diastráticas, diagenéricas e diageracionais, a partir dos
localidades de Recife e Salvador.
diferentes níveis de análise da língua.
Palavras-chave: Dialetologia. Geolingüística. Variação fonética.

MATERIAIS E MÉTODOS

INTRODUÇÃO Para a constituição do corpus, foram selecionados quarenta inquéritos,


sendo oito de cada capital selecionada (Aracaju, João Pessoa, Maceió, Recife
O presente trabalho estuda a consoante constritiva /S/ em coda e Salvador). Os informantes são de ambos os sexos, distribuídos em duas
silábica, analisando suas diferentes realizações fônicas, observadas a partir faixas etárias (18 a 30 e 50 a 65 anos) e em dois níveis de escolaridade
de inquéritos do Projeto Atlas Lingüístico do Brasil. Tem por objetivo observar (fundamental e universitário). Os dados foram obtidos a partir das repostas
as interferências lingüísticas e extralingüísticas que possam vir a favorecer a dos informantes ao Questionário ALiB (2001) e após a transcrição fonética,
ocorrência das variantes africadas surda (eScola, treS) ou sonora (deZde, . foram organizados de forma que fosse possível observar as variantes


O Presente trabalho é financiado pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC - CNPq. Está vinculado ao Projeto Atlas
Lingüístico do Brasil (ALiB) e tem por orientadora a Profª Drª Jacyra Andrade Mota.
∗∗ 39
Graduanda em Letras Vernáculas - UFBA. Bolsista de Iniciação Científica Com o objetivo de facilitar a impressão, deixa-se de utilizar, aqui, a fonte SIL DOULOS IPA, com os símbolos do alfabeto fonético internacional.
∗∗∗
Professora Doutora titulada na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Bolsista CNPq. Utilizam-se, em vez disso, os símbolos alfabéticos S, Z, s, z para as variantes palatais e alveolares, surdas e sonoras, respectivamente. E,
quando necessário, [tS] e [dZ] para as africadas palatais que seguem o /S/ em coda.
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 211-215. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
213 214
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fonéticas selecionadas para estudo – alveolares e palatais - em coda silábica i) Homens e mulheres demonstraram comportamento distinto. No contexto das

interna e final de vocábulo. ocorrências diante de consoante, nas localidades de Salvador, Aracaju e Maceió, os
homens preferiram a palatalização. Em Recife, as mulheres optaram mais pelas
Após a constituição do corpus, iniciou-se a delimitação das variáveis
palatais do que os homens. Em João Pessoa, a distinção entre homens e mulheres
lingüísticas e extralingüísticas com as quais se trabalharia e a codificação dos
não foi muito significativa. No que concerne à posição final diante de pausa em
dados. Codificados, os dados foram lançados no programa VARBRUL que todas as localidades os homens foram os que mais optaram pelas variantes
realizou análises quantitativas. palatais.
Na análise dos dados, consideraram-se os fatores de natureza ii) No contexto diante de consoante não se observam diferenças significativas entre

lingüístico-estrutural: a posição da sílaba na palavra, a acentuação da sílaba as faixas etárias em todas as localidades. Em final diante de pausa, os informantes
da faixa I de Recife se destacam com 0,85 de p.r.. Em Salvador e em Maceió, são
em que se encontra a variante, a dimensão do vocábulo, os contextos
os informantes da faixa II que apresentam os pesos relativos mais elevados, com
precedentes — vogal quanto aos traços de nasalidade e de zona de
0,90 e 0,54, respectivamente.
articulação —, os contextos subseqüentes — consoante quanto aos traços e
modos de articulação, zona de articulação e de sonoridade —, a classe iii) Em ambos os contextos e em todas as localidades observaram-se diferenças de
morfológica e o valor morfológico do vocábulo; extralingüística e lingüístico- comportamento entre os informantes do nível fundamental e universitário.

discursiva: sexo, faixa etária e escolaridade dos informantes, a diatopia e o Analisando as ocorrências diante de consoante, chama-se atenção para Recife e
Maceió, nas quais os informantes de nível universitário foram os que mais
tipo de questionário.
palatalizaram, com 0,91 e 0,54 de p.r., respectivamente. Em João Pessoa, os
universitários palatalizaram mais do que os de nível fundamental, sem, contudo, um
RESULTADOS E DISCUSSÃO valor tão expressivo quanto o das localidades supracitadas, (0,21 de p.r.). Em
Aracaju, destacam-se os informantes de nível fundamental, com valor acima de
A presença das variantes surdas em contexto subseqüente ao /S/ em 0,50, 0,51 de p.r.. Em Salvador, neste contexto, não houve distinção entre os níveis

coda, oclusiva alveolar [t], com 0,94 de peso relativo (p.r.), e africada [tS], de escolaridade, pois os valores são bastante semelhantes. Quanto às finais diante
de pausa, observa-se que em Salvador os informantes de ambos níveís,
com 0,83 de p.r., favoreceram fortemente a ocorrência da variante
universitário e fundamental, apresentam altos índices de palatalização, com 0,77 e
palatalizada.
0,91 de p.r., respectivamente. Em Recife, são os universitários que demonstram os
Comprovou-se a variação diatópica, pois Recife e Salvador se destacam, maiores índices, embora ambos os níveis de escolaridade optem pelas palatais. Em
preferindo as palatais nos contextos diante de consoante e final diante de João Pessoa, há uma distinção entre os de nível fundamental e os universitários,
pausa. apesar de ambos apresentarem baixos índices de palatalização.

Quanto aos fatores geo-sociolingüísticos:

_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
215 216
_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________________________

CONCLUSÕES

De um modo geral, com base nos dados analisados, observou-se a


presença da variação fônica do /S/ em coda silábica e que esta abrange tanto
os fatores lingüísticos quanto os extralingüísticos. As variantes consonânticas
oclusiva alveolar e africada surda, [t] e [tS], em contexto subseqüente,
apresentaram-se como favorecedoras da palatalização. Optaram pelas
palatais: os homens e os universitários e as cidades de Recife e Salvador.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AGUILERA, Vanderci; ARAGÃO, Maria do Socorro; CARDOSO, Suzana; MOTA,
Jacyra; KOCK, Walter; ZÁGARI, Mário. Atlas Lingüístico do Brasil.
Questionários 2001. Londrina: UEL, 2001.

_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
217 218
_____________________________________________________________________________________________________________________________________

morfossintáticas que apresentam, as situações em que ocorrem, as variáveis


OS PRONOMES PESSOAIS-SUJEITO NO PORTUGUÊS A PARTIR DOS
sociais que possam condicionar a seleção de uso, e as áreas geográficas de
DADOS DO PROJETO ATLAS LINGÜÍSTICO DO BRASIL∗
sua distribuição, a fim de responder às perguntas o que, como, quando e a
Isamar Neiva de Santana∗∗ quem se aplica o uso de cada uma delas.
Universidade Federal da Bahia
isa_neiva@yahoo.com.br O trabalho insere-se, no conjunto de trabalhos destinados à análise dos
Suzana Alice Marcelino da Silva Cardoso∗∗∗ materiais do Projeto ALiB programados para subsidiar a elaboração de cartas
Universidade Federal da Bahia
suzalice@ufba.br morfossintáticas que constituirão um dos fascículos do Volume I do referido
Atlas e informarão sobre as alterações encontradas no paradigma pronominal
do Português Brasileiro, como a co-ocorrência do você com o tu.
RESUMO
A partir dos dados e da metodologia do Projeto Atlas Lingüístico do Brasil, o presente trabalho Pretende-se, assim, possibilitar um conhecimento maior do uso dos
objetiva analisar as formas pronominais tu / você, referentes à identificação do interlocutor em
posição de sujeito e às características morfossintáticas que apresentam. Foram examinados, para pronomes-sujeito no português brasileiro, e auxiliar a suprir uma necessidade
tanto, 16 inquéritos realizados nas capitais João Pessoa e Teresina. Obtiveram-se como resultados:
i) similaridade entre as duas capitais; ii) prevalência de uso de você em relação ao tu nas de descrição do português do Brasil sentida por qualquer pesquisador que
diferentes situações analisadas; iii) coexistência dos pronomes tu, você, o/a senhor/a, a depender
do contexto; iv) uso categórico de tu com a terceira pessoa verbal. direcione seus estudos na área da linguagem.
Palavras-chave: Dialectologia. Geolingüística. Variação Morfossintática.

MATERIAIS E MÉTODOS

O corpus constitui-se de inquéritos do Projeto Atlas Lingüístico do


INTRODUÇÃO
Brasil. A pesquisa desenvolveu-se a partir da audição e transcrição
grafemática de 16 inquéritos realizados nas capitais João Pessoa e Teresina,
A partir do estudo da realidade lingüística e do conhecimento de língua
nas quais se registrou a fala de informantes de ambos os sexos, dispostos em
como instrumento social e sujeita a variações e mudanças, o trabalho Os
duas faixas etárias — 18 a 30 e 50 a 65 anos — e em dois níveis de
pronomes pessoais-sujeito no português a partir dos dados do Projeto Atlas
escolaridade — fundamental e universitário.
Lingüístico do Brasil (Projeto ALiB) se propõe a uma reflexão e análise sobre
Examinou-se, assim, a totalidade dos questionários aplicados — os
as formas pronominais tu / você referentes à identificação do interlocutor em
Questionários Fonético-Fonológico, Semântico-Lexical e Morfossintático, as
posição de sujeito, nos eventos de fala, examinando as características
Questões de Pragmática, os Temas para Discursos Semi-dirigidos e as

O presente trabalho é financiado pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica — PIBIC- UFBA-CNPq — e está vinculado ao
Perguntas Metalingüísticas.
Projeto Atlas Lingüístico do Brasil (Projeto ALiB). O trabalho foi orientado pela Profa. Dra. Suzana Alice Marcelino Cardoso.
∗∗
Graduanda do Curso de Letras da Universidade Federal da Bahia e Bolsista de Iniciação Cientifica PIBIC - CNPq.
∗∗∗
Professora Doutora titulada na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Bolsista de produtividade do CNPq.
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 217-221. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
219 220
_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________________________

Observou-se, ainda, o uso dos pronomes também em elipse – sujeito Verificou-se que em contexto assimétrico — relação com o inquiridor —
nulo –, a partir do pressuposto de que a conjugação verbal, de certa não se tem registro do tu nas capitais analisadas — João Pessoa e Teresina.
maneira, auxilia a identificação. Contudo, em casos de não-concordância Conforme os dados, a realização mais freqüente é a de você — 32 das 40
sujeito-verbo, a identificação das formas pronominais foi feita a partir do ocorrências, que equivale a 80% do total, nesse contexto. Dessas, 30
registro de maior freqüência de uso do pronome em questão. realizações se compatibilizam com a terceira pessoa verbal, nos modos
Tornou-se indispensável, para obtenção dos dados, além da observação Indicativo e Imperativo. Foram registradas apenas duas realizações com a
lingüístico-estrutural — concordância sujeito-verbo — e dos fatores segunda pessoa no modo Imperativo, ambas, em Teresina, por jovens de
extralingüísticos, a identificação de como ocorrem as formas pronominais no nível fundamental.
tratamento para com o receptor com função de sujeito, considerando-se a Foi possível perceber, ainda, que os informantes com grau de
natureza da interlocução. Para tanto, foram estabelecidas três principais escolaridade fundamental tendem a usar a forma de tratamento a senhora e
situações: i) Contexto assimétrico; ii) Situação de intimidade; iii) Situação de dona, em referência ao inquiridor. Pode-se atribuir a este fato não apenas
distanciamento. implicações de ordem comportamental, mas também social – no que se
refere à variável escolaridade.
RESULTADOS E DISCUSSÃO A realização do tu se deu, acentuadamente, em contexto íntimo. Das
53 realizações de formas pronominais, nesse contexto, foram registradas 14
Partindo do pressuposto de que todo enunciado implica determinadas das 15 ocorrências de tu e 39 das 93 ocorrências de você, respectivamente
situações que são condicionadas pelo contexto de interação social em que o 26% e 74% do total, nesse contexto. Evidencia-se, por conseguinte, que a
ato de fala ocorre, os pronomes tu / você em posição de sujeito foram coexistência desses pronomes no português do Brasil se dá, prioritariamente,
examinados em três perspectivas: i) Contexto assimétrico; ii) Situação de no âmbito informal e íntimo.
intimidade; iii) Situação de distanciamento. Percebeu-se, ainda, que a compatibilização do tu com a terceira pessoa
Os dados resultantes da análise revelaram o predomínio de uso do verbal foi categórica. Esse dado é compatível com a hipótese de que o
você, e a coexistência desta forma com o tu e com o/a senhor/a. desuso da forma flexional em segunda pessoa resulta do desequilíbrio
A análise revelou que 22 das 23 ocorrências de formas pronominais em provocado pela inserção do você no paradigma pronominal do português
situação de distanciamento, o que equivale a 96% do total, referem-se ao brasileiro e está associado à provável mudança em direção à forma não-
uso do você. Assim, é possível atestar que a realização de você é padrão que, por conseguinte, se articula com a variação no quadro dos
praticamente categórica, nesse contexto. possessivos e oblíquos.

_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
221 222
_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________________________

CONCLUSÕES

Atesta-se, que, nas capitais analisadas, embora o sistema de


tratamento do interlocutor seja ternário — tu, você, o/a senhor/a —
sobressai o uso de você como sujeito em relação ao tu, cuja freqüência é
baixa, mas não irrelevante, sobretudo pela redução no paradigma flexional e
pelo contexto em que ocorre — íntimo. A ampliação do corpus possibilitará
uma descrição mais detalhada desse aspecto na realidade lingüística do
Brasil.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CARDOSO, S.; MOTA, J; AGUILERA, V.; KOCK, W.; ARAGÃO, M. S.; ZÁGARI,
M. Atlas Lingüístico do Brasil. Questionários 2001. Londrina: UEL,
2001.

_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
223 224
_____________________________________________________________________________________________________________________________________

morfossintáticas que informarão sobre as alterações encontradas no


OS PRONOMES PESSOAIS-SUJEITO NO PORTUGUÊS DO BRASIL:
paradigma pronominal do Português Brasileiro, sobretudo, com a introdução
NÓS E A GENTE SEGUNDO OS DADOS DO PROJETO ATLAS
LINGÜÍSTICO DO BRASIL∗ de novas formas, como a gente, em co-ocorrência com nós.
O trabalho objetiva analisar, na perspectiva morfossintática, a variação
Viviane de Jesus Ferreira∗∗
Universidade Federal da Bahia
no uso dos pronomes pessoais-sujeito nós e a gente no português do Brasil,
vivianejferreira@hotmail.com
a partirde inquéritos do Projeto ALiB, examinando-se as características
Suzana Alice Marcelino da Silva Cardoso∗∗∗
Universidade Federal da Bahia morfossintáticas que apresentam, as áreas geográficas de sua distribuição e
suzalice@ufba.br
as variáveis sociais que possam incidir sobre a seleção de usos por parte do
falante.
RESUMO Percebeu-se, com a análise, a variação de uso das formas pronominais
Este trabalho objetiva analisar a variação no uso dos pronomes pessoais-sujeito nós e a gente, a
partir dos dados do Projeto Atlas Lingüístico do Brasil. Os resultados obtidos revelaram: i) variação nós e a gente para referência à primeira pessoa do discurso no plural e que
de uso das formas pronominais nós e a gente para referência à primeira pessoa do discurso no
plural; ii) maior índice no uso de a gente, se comparado ao registrado para nós, mesmo no apesar de ser amplamente empregada na linguagem coloquial, a expressão a
discurso de falantes de nível superior, dos quais se esperava um domínio maior da norma culta; ii)
a freqüência elevada do nós implícito com utilização da forma verbal P4 (-mos), que apresenta gente dificilmente tem sido objeto de análises e descrições gramaticais.
variação mórfica.

Palavras-chave: Dialectologia. Geolingüística. Variação Morfossintática.


MATERIAIS E MÉTODOS

O corpus constitui-se de inquéritos do Projeto Atlas Lingüístico do

INTRODUÇÃO Brasil. Os dados foram recolhidos nos diferentes tipos de questionários


aplicados — Fonético-Fonológico, Semântico-Lexical, Morfossintático, nas

La lengua es variable y se manifiesta de modo variable. (FERNÁNDEZ, Questões de Pragmática e Metalingüísticas e nos Temas para Discursos Semi-

1998). dirigidos. O resultado da aplicação desses questionários permitiu que se

O trabalho Os pronomes pessoais-sujeito no português do Brasil: nós e pudesse observar a variação morfossintática dos pronomes pessoais-sujeito

a gente segundo os dados do projeto Atlas Lingüístico do Brasil (Projeto ALiB) nós e a gente no discurso dos falantes, considerando-se a sua relação com as
insere-se no conjunto de trabalhos referentes à análise dos materiais do variáveis diafásica, diastrática, diagenárica, diageracional e diatópica. Foram

Projeto ALiB programados para subsidiar a elaboração das cartas . analisados, para a presente pesquisa, 16 inquéritos referentes a João Pessoa

O presente trabalho é financiado pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica — PIBIC- UFBA e está vinculado ao Projeto Atlas
e a Teresina. Os informantes são de ambos os sexos, distribuídos em duas
Lingüístico do Brasil — Projeto ALiB. O trabalho foi orientado pela Profa. Dra. Suzana Alice Marcelino da Silva Cardoso.
∗∗
Graduanda do Curso de Letras da Universidade Federal da Bahia e Bolsista de Iniciação Cientifica PIBIC - CNPq.
∗∗∗
Professora Doutora titulada na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Bolsista de produtividade do CNPq.
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 223-227. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
225 226
_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________________________

faixas etárias (18 a 35 anos e 50 65 anos) e em dois níveis de escolaridade Quanto ao contexto lingüístico em que as variantes ocorrem, pode-se
(fundamental e universitário). constatar que João Pessoa e Teresina se diferenciam quanto ao uso do nós
Para o desenvolvimento dessa pesquisa, também foram analisados implícito. Este fator é mais recorrente em João Pessoa, com 54% das
livros didáticos e gramáticas normativas, com o intuito de observar como os ocorrências. Já com relação ao uso do a gente explícito, as cidades se
pronomes pessoais estão sendo retratados pela norma padrão. Nos materiais aproximam, uma vez que ambas apresentam um alto índice de ocorrência.
consultados, exceto a Gramática Escolar da Língua Portuguesa de Bechara Comparando as ocorrências de indeterminação do sujeito nas capitais
(2004), não foi constatada nenhuma referência à forma coloquial a gente, estudadas, percebe-se uma ligeira diferença no uso. Em João Pessoa a forma
como uma alternativa para realização do pronome de primeira pessoa do a gente foi a que apresentou o maior número de ocorrências, com um
plural, apesar da sua intensa presença na fala dos brasileiros. percentual de 89%. Em Teresina este fato muda, pois em cerca de 63% das
Vale destacar que a identificação dos pronomes, quando implícitos, foi ocorrências de indeterminação do sujeito documenta-se a presença do
feita a partir do registro de maior freqüência de uso dos pronomes em pronome nós.
questão.
2. Fatores Extralingüísticos
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Apesar de se localizarem na mesma região, Nordeste, as capitais João
No português do Brasil, a alternância nós/a gente como forma de Pessoa e Teresina apresentam uma ligeira diferença com relação ao uso dos
representação do sujeito na primeira pessoa do plural é um fato cada vez pronomes pessoais nós e a gente, enquanto em João Pessoa a variante
mais recorrente na fala dos indivíduos. Os dados resultantes da análise inovadora a gente predomina com 83% das ocorrências. Em Teresina, esta
constataram a maior ocorrência da variante inovadora a gente nas duas mesma variante se apresenta numericamente de modo equilibrado com a
capitais analisadas: Teresina e João Pessoa. variante conservadora nós, com 46% das ocorrências.
Tanto em João Pessoa quanto em Teresina os dados referentes à
1.Fatores Lingüísticos variável diageracional indicaram preferência sensível da faixa etária II pelo
uso de nós. Em João Pessoa, no tocante ao uso de a gente, houve um
Para este trabalho foram selecionados três contextos lingüísticos nos equilíbrio entre as faixas etárias. Em Teresina este fato se modifica,
quais foram observadas as ocorrências das formas pronominais nós e a gente apresentado cerca de 70% do uso do a gente na faixa I.
na função de sujeito: pronome implícito, pronome explícito, sujeito De acordo com o nível de escolaridade, os dados das cidades
indeterminado. apresentam-se díspares. Enquanto em Teresina a forma a gente predominou
_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
227 228
_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________________________

no nível fundamental, em João Pessoa foi mais utilizada nos dois níveis —
fundamental e universitário — com 76% e 87%, respectivamente.
Observando a variável diagenérica não é possível afirmar de forma
categórica que as formas nós e a gente sejam preferíveis nos discursos de
homens e mulheres.

CONCLUSÕES

Está presente nas gramáticas normativas um paradigma pronominal


referente a seis pessoas (eu, tu, nós, vós, eles), porém a realidade lingüística
brasileira revela a coexistência de formas de primeira pessoa de plural — nós
e a gente. O presente trabalho atesta a grande freqüência da variante
inovadora a gente na fala dos brasileiros, inclusive na dos considerados
cultos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BECHARA, E. Gramática escolar da língua portuguesa. Rio de Janeiro:


Lucerna, 2004.
FERNÁNDEZ, F. M. Princípios de sociolingüística y sociología del
lenguaje. Barcelona: Editoral Ariel, 1998. p. 17.

_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
229 230
_____________________________________________________________________________________________________________________________________

Os dados analisados pertencem ao banco de dados do Projeto ALiB. O


PALATALIZAÇÃO DAS CONSOANTES
OCLUSIVAS DENTO-ALVEOLARES EM INQUÉRITOS DO PROJETO Projeto ALiB é um Projeto que objetiva realizar um Atlas Lingüístico do Brasil
ATLAS LINGÜÍSTICO DO BRASIL∗ referente à língua portuguesa. Para essa descrição, o projeto ALiB, utiliza
alguns aspectos salientes como as variações geográficas, diageracionais,
Milena Pereira de Souza∗∗
milenapsouza@yahoo.com.br diagenéricas e diastráticas sobre fatos fônicos, léxico-semânticos e

Jacyra Andrade Mota∗∗∗ morfossintáticos.


Universidade Federal da Bahia
jacyra.mota@pesquisador.cnpq.br Este trabalho é significante, pois apresenta um dos aspectos
importantes para a comprovação da diversidade lingüística existente no Brasil
e para a distinção das áreas lingüísticas brasileiras observadas pelo Projeto
RESUMO
Este trabalho estuda a palatalização das consoantes oclusivas dento-alveolares /t, d/ diante da ALiB.
vogal alta /i/. Utilizaram-se como corpus dados de três questionários do Projeto Atlas Lingüístico
do Brasil (Projeto ALiB). Os questionários foram aplicados em cinco capitais — Salvador, Recife,
Maceió, Aracaju e Teresina. Os informantes corresponderam à metodologia do Projeto ALiB. A
análise foi condicionada a fatores lingüísticos, geolingüísticos e sociolingüísticos. Os resultados MATERIAL E MÉTODOS
obtidos indicam o uso da variante palatal categórico em Salvador e predominante em Teresina. Em
Aracaju e Recife as duas variantes convivem. Em Maceió, no entanto, a dental é a forma mais
utilizada.
1. Constituição do corpus
PALAVRAS-CHAVE: Dialectologia. Geolingüística. Diversidade Lingüística.

Foram selecionados quarenta inquéritos definitivos do Projeto ALiB


realizados em cinco capitais do Brasil — Aracaju, Maceió, Recife, Salvador e
Teresina.
INTRODUÇÃO
Os participantes das entrevistas em cada capital apresentam as
seguintes características sociais: são de ambos os sexos, com escolarização
O trabalho analisa a palatalização das consoantes oclusivas dento-
fundamental e universitária, com faixa etária de 18 a 30 anos (faixa I) e 50 a
alveolares /t, d/ diante da vogal /i/, como em tia e dia.
65 anos (faixa II).
O corpus é constituído de oito inquéritos em cada capital brasileira
Analisou-se a fala dos informantes nos questionários fonético-
estudada — Salvador, Recife, Maceió, Aracaju e Teresina. Os questionários
fonológico, semântico-lexical e temas para discursos semidirigidos, inclusos
utilizados foram: o questionário fonético-fonológico, o semântico-lexical e os
no questionário do Projeto ALiB (2001).
temas para discursos semidirigidos.

O Presente trabalho é financiado pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica – PIBIC - CNPq. Está vinculado ao Projeto Atlas
Lingüístico do Brasil (ALiB) e tem por orientadora a Profª Drª Jacyra Andrade Mota.
∗∗
Graduanda em Letras Vernáculas com Língua Estrangeira-UFBA. Bolsista de Iniciação Científica CNPq.
∗∗∗
Professora Doutora titulada na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Bolsista CNPq.
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III
Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 229-234. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
231 232
_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________________________

2. Levantamento dos dados Variação Diatópica


Após a seleção do corpus iniciou-se o levantamento dos dados. Para 19% 8%
21% 100%
isso, fez-se necessário a audição e posteriormente a transcrição fonética das Salvador
Teresina
partes relevantes para o trabalho, em cada questionário. Além de fatores Aracaju
Recife
exclusivamente lingüísticos — vozeamento da consoante, posição na sílaba, Maceió

vogal antecedente, tonicidade —, analisaram-se fatores sociais 89%

influenciadores dos resultados, — as diferentes gerações, as diferenças


geográficas, os dois gêneros analisados e as diferenças quanto à Podemos observar que em Salvador o resultado foi 100% de

escolaridade. Foi também analisada a variação diafásica, referente ao nível palatalização, irrelevante para o VARBRUL, pois não houve nenhuma

de formalidade, verificado a partir das respostas aos diferentes questionários variação.

utilizados. Em Teresina observa-se um valor relevante, com 89% de palatalização.

Após levantamento e codificação dos dados, utilizou-se o pacote de Em Aracaju temos 21%, em Recife 19% e em Maceió um resultado muito

Programas VARBRUL, com o objetivo de apresentar dados estatísticos que baixo (apenas 8%).

mostrem os principais fatores influenciadores na variação estudada.


Variação Diatópica e Vozeamento da Consoante:

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Em Teresina documenta-se 0,97 de peso relativo para a desvozeada /t/

Nesse trabalho foram analisados os fatores lingüísticos e e 0,94 para a vozeada, /d/. Em Recife, a desvozeada aparece com mais

sociolingüísticos juntamente com a variação diatópica. frequência do que a vozeada, com 0,43 de peso relativo. Em Aracaju, os

O primeiro fator analisado é a variação diatópica separadamente. resultados são semelhantes, 0,39 de peso relativo para a desvozeada e 0,32

Observamos os resultados no gráfico abaixo: para a vozeada.


Em Maceió, a consoante desvozeada apresenta 0,24 de peso relativo e
a vozeada, apenas 0,06.

_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
233 234
_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________________________

Variação Diatópica e Tipo de Questionário: universitários de Aracaju, com 0,55, e os de Recife, com 0,35 de peso
relativo. Em Maceió, os resultados são irrelevantes.
A palatalização ocorreu mais no Questionário Fonético Fonológico (QFF)
do que nos demais.Temos 0,97 de peso relativo em Teresina, 0,51 em CONCLUSÕES
Recife, 0,40 em Aracaju, e, em Maceió, apenas 0,31.
Este trabalho nos possibilitou observar que, além de Salvador, temos
Variação Diatópica e Diagenérica: Teresina com grande utilização da palatal, diferente de Maceió que apresenta
um grau de palatalização muito baixo.
Nessa junção, verificamos que em Teresina e em Aracaju as mulheres Os dados de Aracaju apontam para um processo de mudança em
utilizaram mais a palatal, com 0,97 e 0,54 de peso relativo, respectivamente. andamento. Em Recife, os dados, não nos dão segurança para observações
Em Recife, os homens preferiram mais a palatal, com 0,40 de peso relativo. especiais.
Em Maceió, embora com resultados muito baixos, os homens utilizaram mais É necessário estudar outras localidades para que possamos entender
a palatal que as mulheres. como se apresenta tal variante em todo Brasil.

Variação Diatópica e Diageracional: REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AGUILERA, V.; ARAGÃO, M. S.; CARDOSO, S.; MOTA, J.; KOCK, W.; ZÁGARI,
Nesse aspecto, analisamos os dados da variação geográfica junto com M. Atlas Lingüístico do Brasil. Questionários 2001. Londrina: UEL,
a faixa etária dos informantes. Os resultados apontam que em Teresina a 2001.

faixa II utiliza mais a palatal, com 0,97 de peso relativo. Em Aracaju, o maior
resultado foi 0,52, na faixa I, em Recife foi 0,38, na faixa II e em Maceió
houve valores não significativos, 0,15 na faixa I e 0,14 na faixa II.

Variação Diatópica e Diastrática:

Analisamos aqui o fator variação geográfica e escolaridade. Assim,


observamos que em Teresina os universitários são os falantes que mais
utilizam a palatal, com 0,99 de peso relativo. Em seguida, temos os
_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
235 236
_____________________________________________________________________________________________________________________________________

Ao contrário de uma perspectiva teleológica que assume as línguas românicas


PARA UMA ABORDAGEM DIALETOLÓGICA “ESTRUTURALISTA” DO
como o ponto de chegada do latim vulgar, preferimos seguir uma linha, a
LATIM VULGAR: VÄNÄÄNEN E O MÉTODO COMPARATISTA40
nosso ver, mais completa, por considerar todo o conjundo dialetológico do
Carlos Renato Rosário de Jesus* fenômeno lingüístico do latim desde o período pré-clássico.
Instituto de Estudos da Linguagem – Universiade Estadual de campinas
carlosrenator@yahoo.com.br

MATERIAL E MÉTODOS

RESUMO
Nosso trabalho consiste em fazer uma breve análise crítica do método comparatista utilizado por O desenvolvimento do estudo acerca do latim vulgar e sua dialetologia
diversos autores no estudo entre as relações das línguas românicas e o latim vulgar. Partindo das
variações dialetológicas da língua latina ao longo de seu período de utilização, procuraremos previu, além das leituras do material de fundamentação teórica, a seleção de
mostrar a necessidade de um método que se preocupe em abarcar os fenômenos lingüísticos do
latim pós-clássico que, eventualmente, recrudesçam nos romances, mas que também leve em um corpus que pudesse demonstrar as propostas discutidas no trabalho. Para
conta os fatos do latim vulgar anteriores ao chamado latim clássico. Para isso, as idéias de
Vänäänen ser-nos-ão bastante esclarecedoras. isso, no que tange à primeira etapa, firmamos nossa leitura nas idéias sobre

PALAVRAS-CHAVE: Comparatistas. Latim vulgar. Dialetologia mudança lingüística nos trabalhos de Weinreich, Labov e Herzog (1968), cuja
preocupação consiste em estabelecer uma estratégia para um estudo da
mudança lingüística que se alicerce sobre os fundamentos de um
determinado modelo de estrutura lingüística, a qual resida no problema da
INTRODUÇÃO
variabilidade dentro do sistema. Além desses autores, a leitura atenta de
Vänäänen (1982) foi de extrema importância para encontrar argumentos que
O fio condutor deste trabalho é a necessidade de compreender o latim
justificassem a validade do sistema do latim vulgar como condensador das
vulgar como um sistema constituído de subsistemas, ou seja, como um
variáveis lingüísticas que conduzem tanto ao assim chamado latim clássico
conjundo de dialetos que conviveram simultaneamente durante centenas de
quanto ao também assim chamado proto-romance. Daí a necessidade de um
anos, envolvidos num processo de mudança lingüística constante, guiado por
corpus que propiciasse a exemplificação das idéias de Vänäänen em
motivos sociais e também internos e estruturais. Com isso, esperamos
contraposição ao método comparatista na abordagem do latim vulgar.
encontrar argumentos para justificar a validade do sistema do latim vulgar
como condensador das variáveis lingüísticas que conduzem tanto ao assim
RESULTADOS E DISCUSSÃO
chamado latim clássico quanto ao também assim chamado proto-romance.

40
O problema dialetológico que a variabilidade do latim vulgar ofereceu,
Pesquisa desenvolvida com o auxílio da FAPEAM (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas), na forma de bolsa de mestrado
oferecida por essa agência.
* Mestrando em Lingüística. durante toda a sua existência, por assim dizer, diz que se há várias formas ou
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 235-238. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
237 238
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variantes lingüísticas, não parece profícuo explicar como uma variante origina clássico. O método comparativo pode levar a crer que as variantes
outra. Se são sincronicamente pertinentes, não há como fazer isso. Então, encontradas no latim vulgar pós-clássico advêm ou são formas divergentes
pode-se perceber que é impossível (para o que aqui se pretende) partir de do latim clássico, quando, na verdade, é o latim clássico que é uma
“um único” latim vulgar, ou antes – como propõe o método comparatista – adaptação literária, culta e estadardizada advinda do vulgar.
partir das línguas românicas para se chegar ao latim vulgar, e sim da noção
de diversos dialetos (ou subsistemas se assim preferirmos), que originaram REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
diferentes formas de romances. Por isso, optamos pela perspectiva de
BASSETTO, Bruno Pregni. Elementos de Filologia Românica: História
Väänänaen, que compreende o latim vulgar desde o período arcaico, externa das línguas. 2°. ed. São Paulo: Editora da Universidade de São
passando pelo latim clássico, até os primeiros textos em romance, sem Paulo, 2005.
CARDOSO, Zélia de Almeida. A literatura latina. 2° ed. São Paulo: Martins
excluir as variações sociais nem regionais. Ou seja, parte de onde termina a
Fontes, 2003.
abordagem comparatista. De fato, Väänänen acredita que as formas obtidas ILARI, Rodolfo. Lingüística românica. São Paulo: Ática, 1992.
pelo método comparativo não possuem outro valor que de hipótese, até que LYONS, John. Linguagem e lingüística. Rio de Janeiro: Guanabara
sejam atestadas nos textos antigos. Não se pode pretender reconstruir tudo Koogan, 1987.

o latim vulgar com o comparatismo, pois existem certos elementos populares MAURER JR., Theodore Henrique. O problema do latim vulgar. Rio de
Janeiro: Livraria Acadêmica, 1962
que, por uma razão ou por outra, não foram transmitidas às línguas dos
NETO, Serafim da Silva. História do latim vulgar. Rio de Janeiro: Livraria
romances, como por exemplo a forma do genitivo singular em -aes, -ēs (no Acadêmica, 1967.
lugar de ae) atestada epigraficamente: Benni-aes Sabin-aes; Januari-aes; SAUSSURE, Ferdinand. Corso di linguistica generale. Introduzione,
traduzione e commento di Tulio De Mauro. Roma: Editori Laterza, 1995.
Rom-es, Secund-es, etc. Em outras palavras, se nos restringirmos ao método
THOMSON, Sarah Grey, KAUFMAN, Terrence. Language contact,
comparativo, deixaremos de fora fatores lingüísticos indubitavelmente creolization, and genetic linguistics. Berkeley, Los Angeles, London:
presentes no latim vulgar, mas que não encontram forma (ou possível forma) University of California Press, 1988.
TRASK, R.L. Dicionário de linguagem e lingüística. São Paulo: Contexto,
na reconstituição do proto-romance, somente pela comparação das línguas
2004.
românicas. VÄÄNÄNEN, Veikko. Introduzione al latino volgare. Traduzione di
Annamilla G. Silvestri. 3a. ed., Bologna: Pàtron Editore, 1982.
CONCLUSÕES WEINREICH, Uriel et alii.(1968) Fundamentos empíricos para uma
teoria da mudança lingüística. São Paulo: Parábola Editorial, 2006.

Os fenômenos lingüísticos encontrados nas línguas românicas, em


alguns casos, são os mesmos tanto no latim vulgar pré quanto no pós-
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
NEUROLINGÜÍSTICA
241 242
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ficha clínica/prontuário fornecida pelo Centro municipal de Atendimento


A LINGUAGEM E A MEMÓRIA NO ESTUDO DO CASO JFS:
CONSIDERAÇÕES SOBRE A DOENÇA DE ALZHEIMER Especializado (CEMAE) de Vitória da Conquista. A partir de então, os déficits
de memória se tornaram crescentes, afetando a realização de atividades

Milena Pereira Silva* corriqueiras e acentuando o esquecimento dos nomes próprios, a chamada
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
milena_psilva@yahoo.com.br disnomia. Diante desse fato, questionamos: Qual seria o comprometimento
Silvana Fernandes de Andrade** cognitivo de JFS em relação à memória e à linguagem? Quais os tipos de
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
silvanandrad@gmail.com alterações de linguagem que JFS apresenta? Frente a essas perguntas,
Nirvana Ferraz Santos Sampaio*** consideramos que as alterações de memória por ele apresentadas estão
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
nirvanafs@terra.com.br relacionadas às alterações de linguagem e vice-versa, sendo que as
alterações semânticas que repercutem em dificuldades pragmático-conceitual
RESUMO seriam as principais alterações de linguagem.
O objetivo desta pesquisa é investigar e descrever as alterações de linguagem e de memória que
ocorrem no caso JFS.

PALAVRAS-CHAVE: Linguagem. Memória. Doença de Alzheimer. Neurolingüística. MATERIAIS E MÉTODO

Para analisar as alterações de linguagem e memória presentes no caso


JFS, nos encontramos com ele em situações comunicativas que suscitassem
INTRODUÇÃO
narrações de fatos de sua vida, bem como recordações de eventos
particulares que ocorreram em sua juventude, visando à coleta de dados que
Neste trabalho, apresentamos os resultados parciais do estudo do caso
atestassem em que nível encontra-se o comprometimento de suas funções
JFS. JFS é um senhor de 84 anos, viúvo, profissões: motorista, mecânico e
cognitivas. Para tanto, foi utilizado dispositivo digital para a gravação dos
balconista. Não passou pela educação formal, mas sabe ler e escrever.
dados (MP3 Player), os episódios foram transcritos o que possibilitou a
Segundo relato dos familiares, desde mais ou menos 2002, JFS se perde na
discussão do próximo item.
rua, apresenta distúrbios de comportamento, irritabilidade, esquecimento dos
nomes dos filhos, desorientação topográfica, o que, em 2003, foi
RESULTADOS E DISCUSSÃO
diagnosticado como doença de Alzheimer, conforme pode ser constatado na

A DA é uma enfermidade progressiva-degenerativa do cérebro e está


* Discente do curso Letras Modernas da UESB, voluntária na Iniciação Científica. intimamente associada à atrofia e à neurofibrilação cerebral. O quadro clínico
** Discente do curso de Letras Modernas da UESB, voluntária na Iniciação Científica.
***** Orientadora do trabalho. Docente do DELL/UESB - doutora em Lingüística pela UNICAMP.
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 241-246.
243 244
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desta doença mostra, além do exposto acima, um comprometimento raciocínio. Como pôde ser observado nas situações comunicativas, JFS, ao
irreversível da linguagem e das funções cognitivas do paciente cérebro- ser questionado sobre o nome de alguns objetos, não consegue evocar a sua
lesado, levando-o a apresentar lapsos graduais de memória e crescente designação, mas consegue expor por meio de gestos, com certa precisão, a
demência, como pode ser observado no caso JFS. utilização da ferramenta. Ema uma das entrevistas, a investigadora mostra
Tanto o grau do comprometimento cerebral, quanto o desenvolvimento uma chave de roda e pergunta o nome do objeto, ele diz que não se lembra,
avassalador da doença dependem (necessariamente) do metabolismo de ela pergunta se é um martelo, ele diz que não é porque é perigoso trocar um
cada paciente, visto que o que são considerados “estágios-padrão” da doença pneu com um martelo porque o pneu volta e pode bater na pessoa. Como
de Alzheimer são apenas uma forma generalizada de encarar os fatos. Como conseqüência da doença de Alzheimer, JFS está perdendo progressivamente
exemplo, tem-se o caso supracitado, em que o paciente apresenta aspectos a “memória de longo prazo” e só é capaz de se lembrar de “flashes” de fatos
característicos, em sua maioria, dos graus “um” e “dois”, apesar de já antigos, sem muitos detalhes.
conviver com a doença há cerca de quatro anos. Não há registros que Observamos, também, que JFS rompe com o desenvolvimento do tema
comprovem a etiologia da doença de que acomete JFS. As possibilidades vão em muitas situações comunicativas, como no episódio abaixo:
desde a genética (considerando o Alzheimer como uma doença crônica, já
que há registros anteriores na família) até uma questão sentimental, uma vez Episódio 1.
Tópico: profissão ≠ acidente envolvendo carro e pedestre = carro = profissão
que algum tempo antes de demonstrar os primeiros sintomas, o paciente Inv. O senhor trabalhava em quê?
JFS Não, não adianta a mulher ( ) o carro, o sonho da
sofreu grande desgaste emocional com a perda de um ente querido. Os pessoa, a vaidade, aí o carro vem de lá pra
atravessar e a moça vai de cá pra atravessar fala um pouco alto
primeiros lapsos de memória de JFS, segundo familiares, foram simbólicos. A também todos dois num sentido só to:: SAI DAÍ
menino é menino é:: é pior não grite porque ela
partir de então, a incidência de falhas foi crescente, hoje, ele esquece-se de vai olhar e o outro que vem não tá olhando, é...
Inv. E o senhor trabalhava em quê?
palavras que antes faziam parte do seu convívio diário, como por exemplo: JFS Hum?
Inv. O senhor...
os nomes das ferramentas com as quais trabalhava em sua oficina, o que
JFS Eu trabalhava em carro, trabalho até hoje.
ultrapassa a disnomia, ou seja, o esquecimento do nome de familiares e da Inv Em carro?
JFS Não, (hoje) eu não trabalho no meu carro ... de
sua relação para com estes, de locais que costumava freqüentar e, verdade, é a idade
Inv Quantos anos o senhor tem?
principalmente, de fatos recentes, já que como se sabe, é o que JFS Acho que até esqueci. Quantos anos Li? Perguntando para a
filha. Procura o
corriqueiramente acontece aos sujeitos cérebro-lesados. Isso está imbricado documento de
identidade na
à linguagem, JFS apresenta, dessa forma, alterações léxico-semânticas e carteira.
Inv O senhor vai fazer oitenta e quatro anos? oitenta
distúrbios de funções simbólicas. Esquece-se com facilidade de nomes de e quatro anos, né?
JFS É.
pessoas e de palavras que deveriam ser evocadas para completar o seu
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245 246
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No episódio 1, há uma ruptura na formulação e, como continuidade da até o momento, verificamos que, de fato, as alterações estão relacionadas a
conversação JFS, em seu turno, perpetra uma temática que não é relevante questões semânticas como dificuldade de evocar palavras (lexical: nomes
para o tópico conversacional em questão, ele confabula a respeito de um próprios e palavras relacionadas às experiências profissionais) e ao fenômeno
acidente envolvendo pedestre e carro. A confabulação é um item semiológico da confabulação apontando assim para alterações semânticas que se
das síndromes afásicas, amnésicas, demenciais. Acompanhando a literatura repercutem em dificuldades pragmático-conceituais.
sobre esse fenômeno, observa-se que suas causas e mecanismos cognitivos
ainda não foram devidamente elucidados, considera-se que esteja em REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
conexão com as alterações de memória e de consciência. Em um sentido CRUZ, F. M. Uma perspectiva enunciativa das relações entre
lato, é um fenômeno definido como produção de falsa informação sem linguagem e memória no campo da neurolingüística.[Dissertação de
Mestrado], Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de
intenção de iludir (BERLYNE, 1972). Muitos estudiosos do assunto (dentre eles, Campinas. Campinas/S.P. 2004
BARBIZET, 1963; BERLYNE, 1972) assumem a idéia que a confabulação ajuda BERLYNE, N.Confabulation. In: British Journal of Psychiatry, v.120, p. 31-
preencher as aberturas da memória que se levantam na amnésia. Entretanto, 39, 1972.
BARBIZET, J. Defect of memorizing of hippocampal–mammillary origin: A
nem sempre a amnésia é a condição suficiente para a confabulação
review. In: Journal of Neurology, Neurosurgery, and Psychiatry, 26,
(JOHNSON,1991). Uma outra possibilidade seria conceber a confabulação como 127–135. 1963
déficit na discriminação temporal por meio do que as memórias se tornam JOHNSON, M. K. 1991. Reality monitoring: Evidence from confabulation in
organic brain disease patients. In: G. P. Prigatano & D. L. Schacter (Eds.),
destacadas de seus contextos temporais apropriados (TALLAND, 1965). Diante Awareness of deficit after brain injury: Clinical and theoretical
do episódio 1, verificamos que a confabulação pode estar associada ao issues. New York: Oxford Univ. Press. Pp. 176–197.
problema na capacidade racional de evocar e conferir seletivamente e com NITRINI, R. et al. Linguagem e cognição na Doença de Alzheimer In:
Psicologia: Reflexão e crítica. 18(3), p.300-307, 2005.
precisão as informações, mas, na situação comunicativa, observa-se que o
MÁRMORA, C. H. C. Uma hipótese funcional para (a)praxia no curso da
equívoco, ao confabular o acidente, está associado às suas profissões: doença de Alzheimer. In: Sínteses: Revista dos Cursos de Pós-
motorista e mecânico, no ponto de intersecção carro, essas alterações Graduação. Vol.11, p.347-360 2006
NOGUSHI, M.S. (1998). A Linguagem na doença de Alzheimer:
semânticas repercutem em dificuldades pragmático-conceituais.
Considerações sobre um modelo de funcionamento Lingüístico. Dissertação
de mestrado. UNICAMP.
CONCLUSÃO TALLAND, G. A. Confabulation in the Wernicke–Korsakoff syndrome. In:
Journal of Nervous

Assim, tendo recorrido aos estudos de Noguchi (1997), Cruz (2004),


Nitrini et al (2005), Mármora (2006), Beilki (2007) para analisar o caso JFS,
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
247 248
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Considerando a gravidade do que ocorreu com EL ao nascer, a


ANOXIA NEONATAL E SUAS
condição de analfabeto imposta por um órgão público, o percurso escolar do
IMPLICAÇÕES NA LINGUAGEM ESCRITA
mesmo, questionamos:

Eliane Bomfim Lacerda*


Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
elbomfim@ig.com.br • O que a falta de oxigenação (anoxia) provocou no cérebro de EL, ou
Nirvana Ferraz Santos Sampaio** seja, quais as alterações que EL apresenta?
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
nirvanafs@terra.com.br • Há desordens relacionadas à aquisição da linguagem escrita que
poderiam de fato favorecer o rótulo de analfabeto?

RESUMO
Este trabalho apresenta um estudo sobre o caso de um jovem (EL) que sofreu anoxia neonatal, A hipótese que levantamos é que EL apresenta alterações que variam
deixando como seqüela a perda parcial de sua coordenação motora. Para a Secretaria de
Segurança Pública da Bahia (SSP/BA), EL é analfabeto, mesmo na 5ª série. Algumas pessoas desde a incoordenação motora, mas que a faculdade intelectual de EL não foi
pressupõem que, devido a sua inabilidade motora, EL seja portador de distúrbios mentais. Por
isso, questionamos sobre o que a anoxia provocou no cérebro de EL, e se de fato há desordens atingida com a anoxia, sendo assim, apesar da dificuldade motora que
relacionadas à aquisição da linguagem escrita que poderiam favorecer o rótulo de analfabeto.
interfere na caligrafia, EL não apresenta distúrbios na aquisição da língua
PALAVRAS-CHAVE: Anoxia neonatal. Aquisição da escrita. Transcrição fonética.
escrita, embora seja possível encontrar, em seus textos, desvios cuja
motivação está, principalmente, na ordem da transição entre oralidade e
escrita.
Para responder essas indagações e comprovar a nossa hipótese,
INTRODUÇÃO
tomamos como base os trabalhos desenvolvidos pela Neurolingüística e
outras áreas de conhecimento da Lingüística. Assim, no decorrer deste
Este trabalho apresenta o estudo do caso de um jovem (EL) de classe
trabalho, apresentaremos e analisaremos dados-achados a partir de
baixa de Cândido Sales BA, com 18 anos de idade que sofreu de anoxia
produções textuais de EL e da comparação desses dados com os de dois
neonatal. EL nasceu de parto normal com fórceps, sianótico, apresentando
informantes que não são rotulados de analfabetos.
anoxia perinatal.
Algumas pessoas pressupõem que, devido a sua dificuldade motora, EL
MATERIAL E MÉTODO
tenha problemas mentais e incapacidade de aquisição da linguagem escrita.

Para realização desta pesquisa, levamos em consideração o modelo


* Discente do curso de Especialização Lato Sensu em Lingüística da UESB. epistemológico pautado no singular, no detalhe, que guarda relação com
** Orientadora do trabalho. Docente do DELL/UESB - doutora em Lingüística pela UNICAMP.
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 247-.251. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
249 250
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aquilo que o investigador se propõe a compreender do ponto de vista teórico, incapacidade de aquisição da linguagem escrita, utilizamos a metodologia
o paradigma indiciário. Explicitado pelo historiador Carlo Ginzburg (1986) no aqui descrita no item material e método.
escopo das Ciências Humanas. Esse modelo baseado no singular apareceu no Comparamos os textos de EL, com os dos demais informantes,
final do século XIX. O paradigma indiciário define algumas questões constatamos que EL, assim como o aluno 3, demonstram ter uma boa
metodológicas importantes. Em primeiro lugar, em relação aos critérios de memória, ambos colocaram no texto o nome de todas as escolas onde
identificação e seleção dos dados. Em segundo; em relação ao que se toma estudaram. Já o aluno 2, não menciona as escolas que estudou.
com “rigor metodológico”, um “rigor flexível”, em que contam outros fatores, Os textos de EL, assim como os do aluno 2 e 3, demonstram raciocínio
como a intuição do investigador para observar o singular e a sua habilidade lógico. Têm introdução, desenvolvimento e conclusão. O raciocínio de EL
para formular hipóteses teóricas explicativas a respeito do flagrado. assemelha-se com o do aluno 3 que tem idade aproximada. Ambos detalham
Os dados foram retirados de quatro textos (texto 1: a vida escolar; suas experiências passadas e falam do futuro.
texto 2: narração “Agradeça a Deus o que você tem”; texto 3: a importância A grande ocorrência de erros ortográficos nos textos de EL deve-se ao
da família e o texto 4: planos para o futuro) de três informantes: EL (aluno fato de não conseguir escrever muito, por conta de esforço que faz para
1); um aluno na mesma série dele, 8ª série, com 14 anos de idade (aluno 2) controlar os movimentos. Quando EL escreve tem que colocar muita força no
e um aluno com idade aproximada a de EL, 17 anos (aluno 3), que cursa o caderno. Outro grande transtorno é um problema de visão. Assim sendo,
2º ano do ensino médio. Posteriormente fizemos comparações dos textos. compreendemos que EL encontra-se no processo de aquisição da escrita.
Encontramos nos textos de EL e dos dois informantes erros de
RESULTADOS E DISCUSSÃO transcrição fonética; uso indevido de letras; hipercorreção; modificação da
estrutural segmental das palavras; juntura intervocabular e segmentação;
A partir dos estudos de Luria (1978) e Coudry e Freire (2005), forma mórfica diferente; uso indevido de letras maiúsculas e minúsculas,
cogitamos que o cérebro de EL foi afetado mais intensamente no acentos gráficos, sinais de pontuação e problemas sintáticos. O tipo de
funcionamento da zona terciária, da segunda unidade funcional, que é desvio que apresentou maior número de casos nos textos de EL foi o de
responsável para realizar uma resposta motora consciente ou ao transcrição fonética da própria fala.
núcleo/glânglio da base para a realização de um ato motor automático. Observamos que os desvios cometidos por EL são comuns aos alunos
Verificamos que a área gnóstica não foi afetada, ele tem boa memória, que estão adquirindo a escrita e, até mesmo, na escrita de alunos que estão
percepção e raciocínio intelectual normal. cursando a 8ª série sem nenhuma patologia. EL opta por algumas
Para analisarmos o caso EL, e desmistificarmos o fato apontado por escolhas/hipóteses que não fazem parte da ortografia oficial, mas que estão
muitos do lugar onde ele vive, a saber: EL tem problemas mentais e perfeitamente de acordo com as possibilidades de uso do sistema da escrita.
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
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Verificando os textos dos alunos, inclusive o de EL, é fácil perceber que


há mais acertos do que erros. Desta comparação, fica claro que os erros não
são dificuldades insuperáveis ou falta de capacidade dos sujeitos e nem os
acertos são obras do acaso. Tudo pertence a um processo de aprendizagem
da escrita e revela a reflexão que os sujeitos/informantes põem na sua tarefa
e na forma de interpretar o fenômeno que estuda.

CONCLUSÃO

A dificuldade que tem para controlar os movimentos coreiformes ao


escrever levou EL a sofrer muitas discriminações. Entretanto, respondendo a
pergunta “O que a falta de oxigenação (anoxia) provocou no cérebro de EL?”,
observamos que as alterações de EL estão para a incoordenação motora,
mas sua faculdade intelectual não foi atingida. Apesar da dificuldade motora
que interfere na caligrafia, EL não apresenta distúrbio na aquisição da língua
escrita. O que responde também a pergunta: “Há desordens relacionadas à
aquisição da linguagem escrita que poderiam de fato favorecer o rótulo de
analfabeto?”

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

COUDRY, M. I. H. e FREIRE,F. M. P. O Trabalho do cérebro e da linguagem.


In: A vida em sala de aula. Campinas: Cefieiel/IEL/ Unicamp.2005.
GUINZBURG, C. Sinais: Raízes de um paradigma indiciário. In: _____.
Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história. São Paulo: Companhia das
Letras, 1989.p. 143-180.
LURIA, A. R. (1978) Fundamentos de Neuropsicologia. Trad. de Juarez
Aranha Ricardo, Rio de Janeiro: LTC; São Paulo: Ed. Da Universidade de São
Paulo, 1984.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
253 254
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acerca dos testes-padrão (Mini Mental State Examination e o Exame Luria-


AVALIAÇÃO DE LINGUAGEM E MEMÓRIA NAS FASES Nebraska), utilizados para investigar a memória e alterações das funções
INICIAIS DA DOENÇA DE ALZHEIMER: O PONTO DE VISTA DA
cognitivas humanas. Esses testes baseiam-se na análise quantitativa dos
NEUROLINGÜÍSTICA DISCURSIVA
resultados, avaliados segundo uma estrutura dualizada entre o que é

Helen Lopes de Sousa* comportamento padrão e o que foge a este comportamento, a ser
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
helenlops@hotmail.com diagnosticado como demência ou outros distúrbios psíquicos ou mnemônicos.
Milca Cerqueira Etinger Silva** Partindo da concepção de linguagem em que não se separa língua(gem),
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
kinhacerqueira@hotmail.com cultura e sociedade, surge a seguinte questão: os testes-padrão, baseados
Nirvana Ferraz Santos Sampaio ***
em análise quantitativa, dão conta de verificar a linguagem em
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
nirvanafs@terra.com.br funcionamento e as alterações lingüísticas na doença de Alzheimer (DA)? As
múltiplas alterações cognitivas na DA que são analisadas isoladamente
poderiam ser observadas valorizando a relação existente entre os diferentes
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo comparar e discutir a avaliação da linguagem e da memória na processos cognitivos? Neste estudo, enfocaremos a Neurolingüística
Doença de Alzheimer baseada em testes-padrão contrapondo-a com uma perspectiva de análise
baseada na linguagem em funcionamento. Discursiva, como base teórica para responder essas questões. De antemão,
PALAVRAS-CHAVE: Testes-padrão. Linguagem. Memória. Doença de Alzheimer. consideramos que há uma relação entre os processos cognitivos e que as
alterações de linguagem e memória na DA repercutem-se mutuamente,
assim sendo, os testes-padrão não dão conta de observar essas alterações,
pois fazem uma intervenção isolada desses aspectos.
INTRODUÇÃO

MATERIAIS E MÉTODO
Constantemente, os seres humanos são submetidos a situações de
testes em seu cotidiano, o objetivo desses testes é a avaliação contínua de
Para a realização deste trabalho, analisamos primeiramente o Exame
suas aptidões e faculdades mentais. Os estudos sobre as alterações da
Neuropsicológico Luria-Nebraska e o Mini Mental State Examination (MMSE) à
linguagem e da memória na Doença de Alzheimer (DA) não são exceção
luz da Neurolingüística Discursiva. Em um segundo momento, elaboramos um
nesse contexto. Este trabalho tem por objetivo promover uma análise crítica
roteiro para entrevistar um sujeito com DA em situações contextualizadas no
* Discente do Curso de Letras Modernas da UESB, voluntária na Iniciação Científica. convívio familiar, o sujeito cérebro-lesado JFS. Os tópicos conversacionais se
** Discente do Curso de Letras Modernas da UESB, voluntária na Iniciação Científica.
*** Orientadora do trabalho. Docente do DELL/UESB - Doutora em Lingüística pela UNICAMP.
pautaram em momentos importantes e significativos da existência do sujeito
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 253-258. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
255 256
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em questão, exemplificadas por hábitos inerentes à sua vida, bem como à e o que foge a este comportamento a ser diagnosticado como demência ou
sua família e ao seu dia-a-dia, evocando lembranças de situações rotineiras outros distúrbios psíquicos ou mnemônicos. Porém, uma análise atenta
que faziam parte de sua vida antes da descoberta da patologia. destes testes permite detectar várias lacunas em sua aplicação. O Exame
Concomitantemente a essas situações comunicativas com JFS, conversamos Neuropsicológico Luria-Nebraska é constituído de etapas que se constituem
com um de seus familiares VSC que foi submetido a questionamentos de provas que são aplicadas no intuito de apontar aspectos mentais do
pertinentes ao caso JFS, a saber: identificação, as principais queixas, o paciente e de fazer uma investigação mais detalhada sobre o grupo dos
histórico do distúrbio neurológico de JFS, informações relacionadas ao processos mentais lesados detectados nessas tarefas baseadas em questões
ambiente familiar, às atividades ocupacionais e de lazer, à linguagem, ao que têm por objetivo explorar as formas complexas de atividade em que a
sono, enurese diurna/noturna, controle do esfíncter, crise de riso e/ou choro execução pode apresentar-se afetada de modo diverso para as diferentes
inexplicáveis, crises agressivas, sinais de desorganização espaço-temporal, funções. Dessa forma, são examinadas a fala, a escrita, a leitura, a
muitos dos dados foram importantes para o conhecimento do grau da DA e compreensão de textos e a resolução de problemas. O MMSE é organizado a
outros para a manutenção dos turnos e tópicos conversacionais no decorrer partir dos seguintes tópicos: orientação espacial, retenção, atenção e cálculo,
das situações comunicativas com JFS. Todas as situações comunicativas evocação, linguagem, habilidade construtiva, com o valor 1,0 para cada um
foram gravadas em dispositivo digital (aparelho de MP3) e transcritas, dos itens pertencentes a esses tópicos, considera-se com defeito cognitivo:
utilizando o modelo de registro de dados do Banco de Dados em analfabetos ≤ 15 pontos, 1 a 11 anos de escolaridade ≤ 22; com
Neurolingüística do IEL/UNICAMP, para facilitar a análise posterior dos dados escolaridade superior a 11 anos ≤ 27. Esses testes abrem espaço para uma
do sujeito. reflexão acerca do que é de fato certo ou errado sobre as concepções de
memória e linguagem: Uma pessoa que apresente uma perturbação de suas
RESULTADOS E DISCUSSÃO funções cognitivas, submetida a situações de pergunta-resposta, está sendo
apenas avaliada quanto a sua capacidade de obedecer a comandos verbais
Os testes-padrão constituem-se de uma séria de provas fundamentadas (repetição) e memorizar algumas seqüências curtas de palavras (memória de
nos esquemas pergunta-resposta/ordem-comando, aplicadas a pacientes que curto-prazo); estas avaliações deixam de lado sua memória permanente, os
apresentem perturbações neuropsicológicas ou suspeita de demência. Tais fatos presentes em seu cotidiano, o que lhe é habitual no presente e o que
testes baseiam-se na análise quantitativa dos resultados, as avaliações são lhe foi marcante no passado. Por outro lado, quando se observa os
fundamentadas a partir do que se considera como comportamento padrão fenômenos anátomo-orgânicos da DA associados aos fatores sociais, culturais
(baseado na média dos resultados de um grupo controle, em condições e históricos que são inseparáveis da vida do sujeito, neste caso JFS, pode-se,
neurobiológicas e neuropsicológicas muito diferentes dos pacientes testados) além de verificar o curso da doença, focalizar o imbricamento da memória e
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257 258
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da linguagem, isto posto, pode-se afirmar que o resgate da memória NOGUCHI, M. S. A Linguagem na Doença de Alzheimer: Considerações sobre
a função cognitiva da linguagem. In: Cadernos de Estudos Lingüísticos,
individual e coletiva, por meio da história pessoal e social, quando se verifica
Campinas, v. 32, p. 95-107. Jan/Jun. 1998.
a linguagem em funcionamento, instaura uma nova forma de olhar para o
curso demencial.

CONCLUSÃO

Ao analisar os testes-padrão, observamos as inadequações das tarefas


de linguagem propostas, pois o acompanhamento é pautado em situações
descontextualizadas, sem observar a linguagem em seu funcionamento. A
partir de situações contextualizadas pode-se avaliar tanto a linguagem em
seu funcionamento como a sua relação com a memória, dentre outros
processos cognitivos.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

CHRISTENSEN, A. El diagnóstico neuropsicológico de Luria, Buenos


Aires: Visor. (1987)
COUDRY, M. I. H. (1986) Diário de Narciso: discurso e afasia. São Paulo:
Martins Fontes. 1988.
CRUZ, F. M. Uma perspectiva enunciativa das relações entre
linguagem e memória no campo da neurolingüística. 204 p.
[Dissertação de Mestrado]. Instituto de Estudos da Linguagem da
Universidade Estadual de Campinas, Campinas/SP. 2004.
FOLSTEIN, M. F. et al. Minimental State: a practical method for grading the
cognitive state of patients for the clinician. Journal of Psychiatric
Research. 12 : 3 (1975) 189-198.
MÁRMORA, C. H. C. Uma hipótese funcional para (a)praxia no curso da
doença de Alzheimer. In: Sínteses: Revista dos Cursos de Pós-Graduação.
Vol. 11, p. 347-360 2006

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
259 260
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Central, em virtude de acidentes vasculares cerebrais (AVC), traumatismo


CONSTITUIÇÃO DA SIGNIFICAÇÃO NA AFASIA:
crânio-encefálico ou tumores), os processos alternativos de significação
PROCESSOS VERBAIS E NÃO-VERBAIS
(verbal e não-verbal) que se valem os sujeitos afetados por patologias

Nirvana Ferraz Santos Sampaio* cerebrais, cognitivas ou sensoriais, dentre outras perspectivas de pesquisa
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
nirvanafs@terra.com.br em Neurolingüística.
Neste trabalho, a partir do caso DN, que se apresenta afásica após um
AVC Isquêmico, refletimos, a partir da Neurolingüística, sobre os processos
RESUMO
Neste estudo, investigamos, enfocando as sessões semanais do grupo II do Centro de Convivência de significação verbal e não-verbal e o controle do sentido que esse sujeito
de afásicos, os processos verbais e não-verbais de significação na afasia a partir de um estudo de
caso. lança mão para interagir, comunicar e significar, nas sessões do grupo II do

PALAVRAS-CHAVE: Afasia. Linguagem verbal. Linguagem não-verbal. Processos de significação.


Centro de Convivência de Afásicos.

MATERIAL E MÉTODO

INTRODUÇÃO O material empírico da pesquisa foi construído a partir das sessões


gravadas em VHS do grupo II, entre 2002 e 2004, em um acompanhamento
A Neurolingüística, área que se constitui na fronteira entre as longitudinal, observamos a inserção e as situações comunicativas em que DN
neurociências e a lingüística, é um dos ramos mais recentes da lingüística e estava presente. DN é uma senhora que em 03/2001, aos 51 anos, casada,
por isso tanto as definições quanto as descrições dessa área estão dispersas não alfabetizada, do lar, protestante, sofreu um AVC isquêmico na arteria
nas literaturas produzidas nessas ciências, o que mostra que as fronteiras cerebral média (ACM) esquerda, ficando sem falar e andar, recuperando, a
que delimitam seu objeto não são algo sólido. hemiparesia de membro inferir direito e persistindo a hemiparesia, a seqüela
Os estudos neurolingüísticos levam em conta os processos de avaliação mais importante é a que está relacionada à expressividade verbal. Segundo o
e diagnósticos das patologias de linguagem (como, por exemplo, a afasia que relato do marido, em casa, DN fala apenas o nome de uma filha – “Quel”– e
é uma perturbação da linguagem em que ocorrem alterações de mecanismo a palavra “não”.
lingüístico em todos os níveis, tanto em seu aspecto produtivo, quanto Neste trabalho, selecionamos as sessões de 09/09/2002, 11/11/2002,
interpretativo, em decorrência de lesão adquirida no Sistema Nervoso 25/11/2002, 23/06/2003, 30/06/2003, 16/03/2004, 27/04/2004. Para
a apreciação desse material empírico, valemo-nos do trabalho de transcrição
* Doutora em Lingüística pela UNICAMP. Professora do DELL/UESB. Líder do Grupo de Pesquisa e Estudos em Neurolingüística das fitas, a partir do roteiro utilizado pelo Banco de Dados em
(Gpen/CNPq/Uesb) e membro do Grupo de Pesquisa em Estudos Lingüísticos (Gpel/CNPq/Uesb).
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 259-263. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
261 262
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Neurolingüística do Laboratório de Neurolingüística do Instituto da Linguagem tona, uma que vez essas regras de convivência organizam socialmente o
da UNICAMP, a partir de um quadro contendo: sigla do interlocutor, comportamento dos presentes na situação. Apesar do comprometimento do
transcrição, observação sobre as condições de produção de processos de verbal, às vezes, hesitando ela consegue falar “Não”, “Ele tá lá oh”, “Eh:: não
significação verbais, observação sobre as condições de produção de lá”, “Há nã-o:: eh eh”. A hesitação não é vista como uma simples disfunção
processos de significação não-verbais, o que foi importante para as possíveis da fala, mas tem o papel de organizar o dizer e pode indicar um
leituras de indícios que se constituíram em dados para a análise do caso. processamento em curso. Os gestos, por sua vez, propiciam estados de
Olhando para os dados, levamos em consideração o paradigma indiciário conversas, no lugar do ou acompanhando o verbal, o que mantém as
proposto por Ginzburg (1989), modelo epistemológico pautado no singular, situações comunicativas em funcionamento. Considerando a afasia de DN, as
no episódico, no detalhe, que guarda relação com aquilo que o investigador perguntas são elaboradas, no evento comunicativo diálogo, sempre
se propõe a compreender do ponto de vista teórico. direcionando para uma resposta categórica sim, ou não. Os investigadores
ajudam-na e o Não ou Sim não ficam só como uma sentença isolada, em
RESULTADO E DISCUSSÃO meio a uma escolha binária (sim/não), mas alcançam um sentido relevante
por ocorrer dentro de um ambiente que foi construído pelo trabalho prévio
Identifica-se em DN uma falta de iniciativa verbal que não dos interlocutores. Verificamos que onde há pausas, há também a atuação de
necessariamente está relacionada à afasia, dado que sua religião impede que modo integrado de gestos, hesitações ou mesmo a verbalização de “sim” e
ela se insira em várias práticas sociais. Baseando na classificação de Luria, “não”, ultrapassando a condição inicial descrita pela família: “Ele tá lá oh”,
pensamos a afasia de DN como da ordem da desintegração da organização “Eh não lá”.
em série de melodias cinéticas envolvidas nos gestos articulatórios, associada Assim, o verbal, o não verbal, a pausa, as hesitações estão presentes
à lesão nas partes inferiores da área pré-motora esquerda, ou seja, a afasia nas situações comunicativas enquanto processo de significação o que mostra
motora eferente descrita por Luria. que há linguagem e sujeito na afasia (COUDRY, 2000). Dramatizando cenas
Em 09/09/2002, DN foi apresentada ao grupo. Ela, apesar das possíveis na vida cotidiana, como a cena em que DN vende coxinha na praia,
limitações que impossibilitam uma expressão fluente, a partir dos gestos, verifica-se que, inicialmente, ela repete o que a investigadora propõe:
consegue interagir na interlocução. DN negocia o sentido e sustenta a “coxinha fresquinha”, mas, em seguida, atua como vendedora de coxinha,
interlocução utilizando a percepção e os gestos. DN balança a cabeça andando pela sala oferecendo “coxinha fresquinha” aos demais participantes
(afirmando ou negando), estala os dedos, alisa a cabeça demonstrando da situação, estabelecendo a significação de seus enunciados através do
aflição. Na vivência de situações de uso sociocultural da linguagem, ela sabe trânsito entre a linguagem verbal e o gesto.
que as regras culturais estabelecem que a resposta à pergunta deva vir à
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
263 264
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CONCLUSÕES

A relação entre linguagem verbal e não-verbal em DN não foi afetada


e, apesar do comprometimento da linguagem verbal, podemos verificar os
processos de significação verbal e não-verbal e a sua circulação na afasia por
meio do estudo desse caso. Assim, os sinais com a cabeça (afirmando e
negando), os gestos de apontar com o dedo, sinais não-verbais, ajudam a
conduzir a comunicação sem a fala, estabelecendo um papel importante
porque se inserem no lugar da linguagem verbal e mantém a interação. A
confluência entre os sistemas verbais e não-verbais é possibilitada pelas
práticas significativas - interativas - que os participantes do grupo II do CCA
produzem juntos, “justamente onde pode se dar um mar de palavras, uma pá
de imagens, uma cesta de gestos, uma nuvem de cheiros, uma lua de
canções, etc.” (COUDRY, 2002b), isso é o que o acompanhamento
longitudinal de DN revela sobre os processos de significação verbal e não-
verbal na afasia.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

COUDRY, M.I.H. Linguagem e Afasia: Uma abordagem discursiva da


Neurolingüística In: Cadernos de Estudos Lingüísticos, 42, Campinas,
IEL, UNICAMP, 99-129. 2002.
GINZBURG. C. Sinais; raízes de um paradigma indiciário. In: Mitos,
Emblemas, Sinais: Morfologia e História. São Paulo: Companhia das Letras,
1989.
SAMPAIO, N.F.S. Uma abordagem sociolingüística da afasia: o Centro
de Convivência de Afásicos (UNICAMP) como uma comunidade de
fala [Tese de doutorado em Lingüística] 193 p. Instituto de Estudos da
Linguagem da Universidade Estadual de Campinas.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
ANÁLISE DO DISCURSO
LINGÜÍSTICA DE TEXTO
RETÓRICA
267 268
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em Estudo de Linguagens da Universidade do Estado da Bahia. Para realizar


A ANÁLISE DO DISCURSO DE PÓS-POSSE
a análise procedemos ao estudo do sexto capítulo “A INTERAÇÃO VERBAL”,
(100 DIAS) DO PREFEITO JOÃO HENRIQUE CARNEIRO:
UM DIÁLOGO BAKHTINIANO da Obra Marxismo e Filosofia da Linguagem de Mikhail Bakhtin (2006, p. 114
- 132), pois o citado capítulo apresenta uma discussão sobre interação
41
Terezinha de Fátima de Matos Silva verbal, a partir das noções de: enunciação, subjetivismo individualista,
Universidade do Estado da Bahia
tfmsilva@ufba.br
auditório social (locutor-receptor-interlocutor), consciência e ideologia.
Jaciara Ornélia Nogueira de Oliveira∗∗
Universidade do Estado da Bahia
O objetivo do trabalho é identificar como a interação verbal se dá
jaciaraoliveira@oi.com.br
no discurso do prefeito, através dos seus interlocutores: locutor e receptor.
Esta análise se justifica pela abordagem do discurso de uma figura

RESUMO
representativa do cenário político da comunidade baiana; o atual prefeito da
O objetivo deste trabalho é identificar como a interação verbal de Mikhail Bakhtin dialoga com o
discurso de “100 dias” do prefeito João Henrique Carneiro. Esta análise se justifica pela
Cidade de Salvador – Ba.
abordagem do discurso de uma figura representativa de peso na política, o atual prefeito da Os Enunciados serão exemplificados: Ea (enunciado a) Eb (enunciado
cidade de Salvador-Ba. Foram utilizados vários enunciados do corpus “Gosto de enfrentar os
poderosos”, para o desenvolvimento da análise, a partir das noções de: enunciação, subjetivismo b), e assim sucessivamente, reiniciando, quando necessário com Eaa, Ebb e
individualista, auditório social (locutor-receptor-interlocutor), consciência e ideologia. O discurso é
bastante persuasivo, enaltecedor do “ego”, intelectualizado, agregador, predominantemente na 1ª etc. Os tópicos destacados são: Subjetivismo individualista, que
pessoa do plural, bem como no possessivo plural, marcado pela ideologia.
compreende a enunciação; o Auditório social, que apresenta, de fato, a
PALAVRAS-CHAVE: Interação. Enunciação. Subjetividade. Ideologia.
enunciação; a Consciência, que pontua as atividades mentais, “do eu” e “do
nós” e a Ideologia do Cotidiano, que salienta a “resposta”, a “refutação”,
a “confirmação”, a “antecipação “ e o “apoio”, que integram a discussão
INTRODUÇÃO ideológica.

Este artigo apresenta uma breve análise, de natureza qualitativa, do MATERIAL E MÉTODOS
corpus “Gosto de enfrentar os poderosos”, entrevista concedida ao jornal A
Tarde pelo atual prefeito da Cidade de Salvador-Ba. É também foco de Inicialmente, fez-se a leitura do corpus ”Gosto de enfrentar os
análise da Dissertação de Mestrado que está sendo desenvolvida no Mestrado poderosos” (CARNEIRO, 2005, p.24), extraído do jornal A Tarde.
Posteriormente, a leitura do sexto capítulo “INTERAÇÃO VERBAL” da Obra
Marxismo e Filosofia da Linguagem (BAKHTIN, 2006, p.114-132), para
41 Aluna do Mestrado em Estudo de Linguagens, da Uneb.
∗∗
Doutora em Letras e Lingüística pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Professora da Universidade Católica de Salvador (UCSAL) e entender as noções: enunciação, subjetivismo individualista, auditório social
Professora Adjunta da Universidade do Estado da Bahia (UESB), campus de Salvador. Membro do Núcleo de Estudos em Análise de Discurso
(NEAD). _____________________________________________________________________________
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. 267-271.
269 270
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(locutor-receptor-interlocutor), consciência e ideologia. Na releitura do Municipal de Intermediação de Mão-de-Obra, o Simm,...” e em “Ainda


corpus, a seleção das amostras ocorreu, concomitantemente, à aplicação da precisamos, melhorar os salários dos nossos médicos”.“Assim, o discurso
teoria e à análise qualitativa dos dados. escrito “é (....) parte integrante de uma discussão ideológica (...) escala: ele
responde alguma coisa, refuta, confirma, antecipa as respostas e objeções
RESULTADOS E DISCUSSÃO potenciais, procura apoio”. (BAKHTIN, 2006, p. 128). 4. A ideologia do
cotidiano evidencia-se no questionamento do prefeito: “Tinha um prefeito
Para a análise dos dados, o recorte dos enunciados possibilitou um sentado aqui?”, é como se o próprio prefeito quisesse dar a resposta: Se não
diálogo com a teoria de M. Bakhtin. Vejamos, a seguir, como se deu este tinha, agora, tem. A refutação: “Este assunto nem veio a debate no período
diálogo: 1. A marca da subjetividade individualista presente no uso do eleitoral”. A confirmação: “Estamos ganhando” e em “O povo está
estrangeirismo é uma forma de dizer que está atualizado, interagindo com o ganhando.” A antecipação: “Estamos realizando trabalhos que não são
mundo, a exemplo de “Temos o know-how de enfrentar Shopping compromissos de campanha”. O apoio: “Aliás, ele tem atuado como um
Center”.(Grifo meu). É perceptível, também, um gosto antigo do político, embaixador entre a prefeitura e o governo federal” e em “Temos hoje
quando ele diz: “Eu gosto de brigas com os poderosos”, ou seja, contra o excelente relação com o Presidente Valdenor”. Além disso, pro meio da
Bradesco e o Itaú, e enfatiza ”Sempre gostei”. 2. A Enunciação se apresenta, expressão “Fico indignado”, o locutor marca a sua ideologia centro-esquerda
quando o prefeito invoca o auditório social. Nesse caso, o locutor dirige a e chama o povo que o elegeu a uma reflexão: “Tinha um prefeito sentado
palavra a alguém (interlocutor). O sujeito fala para um grupo: “Estamos aqui?”, que representa um forte argumento, o do convencimento.
ganhando” e para o mundo: “O povo está ganhando”. 3. Pensado sobre a
consciência, Bakthin (2006, p.118) tomou a palavra “fome”, para explicar o CONCLUSÕES
contexto. Sobre como lidar com a burocracia em relação ao metrô, o
prefeito respondeu que “Com diálogo, busca de entendimento e pressão O estudo da língua distancia-se de uma “ordem metodológica”, pois
política” e sobre se as obras do metrô que estão paradas, respondeu: “Não”. mudam, a língua e as pessoas, a depender do contexto. Os interlocutores
“Seguem em ritmo lento”. O discurso do prefeito centra-se na “atividade podem dar à palavra o tom que quiserem. Segundo Bakhtin, a palavra não
mental do eu”, nos enunciados “Eu sugeri ao presidente Valdenor Cardoso tem início e fim. O enaltecimento do “ego” está presente no discurso do
que fosse lá para ajudar.” e “Eu sempre fui legislador”. Já, a “atividade prefeito, contudo predominam a 1ª pessoa do plural e o possessivo plural,
mental do nós”, que “permite ...diferentes tipos de modelagem ideológica” aproximando-o do seu “auditório” (o povo), o que faz diferença no discurso e
(BAKHTIN, 2006), é destacada nos seguintes trechos: “Estamos realizando mantém a interação social.
trabalhos que não são compromissos de campanha”; “Instalamos o Serviço
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
271 272
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAKHTIN, M. A interação verbal. In: BAKHTIN, M.M.( Mikhail Mikhailovitch ).


Marxismo e filosofia da linguagem. 12 ed. São Paulo: Hucitec. 2006.
p.114-132.
CARNEIRO, João Henrique. Gosto de enfrentar os poderosos. A Tarde.
Salvador, 10 abril, 2005. Folha Política, Caderno 1. p. 24.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
273 274
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INTRODUÇÃO
A CONSTITUIÇÃO DAS MODALIDADES ENUNCIATIVAS EM O
NASCIMENTO DA CLÍNICA∗
Esta pesquisa é parte do subprojeto “O problema das vulgatas nos

Noélia Nascimento Ferraz∗∗ trabalhos sobre discurso: estudo de casos”, vinculado ao projeto maior
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
noelia_letras@yahoo.com.br intitulado “Análise de Discurso: Foucault e Pêcheux, o diálogo teórico-
Edvania Gomes da Silva∗∗∗ metodológico e as repercussões na França e no Brasil”, coordenado pela
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
edvania_g@yahoo.com.br Profª Drª Maria da Conceição Fonseca-Silva. Neste trabalho, buscamos
Maria da Conceição Fonseca-Silva∗∗∗∗ compreender como se dá a formação de modalidades enunciativas, segundo
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia a proposta de Michel Foucault. Para tanto, analisamos o livro “A arqueologia
con.fonseca@gmail.com
do saber,” que serviu como base teórica, e alguns textos do livro
“Nascimento da Clínica”, que, neste caso, funcionaram como corpus da
RESUMO pesquisa, a fim de identificar quais as leis que regem as regras de formação
Este trabalho analisa o processo de formação das modalidades enunciativas de acordo com os
trabalhos de Michel Foucault. Para tanto, procedemos à leitura do livro A Arqueologia do Saber e, dos diferentes modos de enunciação.
em seguida, refletimos sobre as leis que regem a formação dos diferentes modos de enunciação, a
partir da análise de O nascimento da clínica. A análise mostrou que, em relação à formação das
modalidades enunciativas na constituição da clínica médica, não há um desenvolvimento histórico
contínuo, mas uma história de acontecimentos e de relações que se dão em meio a rupturas e MATERIAL E MÉTODOS
descontinuidades.

PALAVRAS CHAVE: Discurso. Modalidades enunciativas. Clínica médica


Para realização deste trabalho, primeiramente, procedemos ao estudo
de textos da primeira e da segunda parte do livro “A arqueologia do saber”,
de Michel Focault, os quais foram discutidos e resenhados. De acordo com o
autor, esse livro apresenta uma discussão teórico-metodológica acerca de
seu trabalho enquanto filósofo e pesquisador. Assim, nas discussões com a
orientadora, procurou-se esclarecer dúvidas acerca deste quadro teórico
inaugurado por Foucault, tendo em vista uma melhor compreensão acerca do

Trabalho ligado ao subprojeto de pesquisa “O problema das vulgatas nos trabalhos sobre discurso: estudo de casos”, financiado pela UESB,
referido quadro e a posterior elaboração de textos ligados ao tema do
vinculado ao projeto maior “Análise de Discurso: Foucault e Pêcheux, o diálogo teórico-metodológico e as repercussões na França e no Brasil”.
∗∗
Bolsista de IC – UESB. Membro do grupo de pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB) e aluna do curso de Letras da UESB. subprojeto de pesquisa. Em um segundo momento, fizemos a análise de
Campus de Vitória da Conquista.
∗∗∗
Doutora em Lingüística. Membro da equipe do projeto de pesquisa e orientadora do subprojeto. Membro do Grupo de Pesquisa em Estudos alguns textos do livro O nascimento da Clínica, a fim de identificar, nesses
Lingüísticos (GPEL/CNPq/UESB) e do Grupo de Pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB). Professora do Departamento de
Estudos Lingüísticos e Literários da Uesb - Campus de Vitória da Conquista.
∗∗∗∗
Doutora em Lingüística. Coordenadora do projeto de pesquisa e co-orientadora do subprojeto. Líder do Grupo de Pesquisa em Estudos textos, o funcionamento do quadro teórico-metodológico apresentado
Lingüísticos (GPEL/CNPq/Uesb) e do grupo de pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB). Professora do Departamento de Estudos
Lingüísticos e Literários da Uesb - campus de Vitória da Conquista. _____________________________________________________________________________
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .273-277.
275 276
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n’Arqueologia do saber. Com isso, procuramos compreender o funcionamento através da observação e não por meio de um saber externo, adquirido
dos conceitos operacionais desenvolvidos pela arqueogenealogia anteriormente. Neste caso, segundo Foucault, a clínica constitui-se como
foucaultiana. lugar de encontro entre o médico e o doente. O médico, no século XIX, é o
cientista que analisa, observa, disseca. Em relação às modalidades de
RESULTADOS E DISCUSSÃO enunciação, não se trata mais de ensinar, de ver no corpo doente um lugar
de experimentação de um saber previamente adquirido. Trata-se, agora, da
Os resultados obtidos relacionam-se ao funcionamento das regras de descrição minuciosa daquilo que se vê.
formação das modalidades enunciativas, conforme postulado por Foucault. Em suma, no século XVIII, a clínica é lugar de comprovação e, no
Segundo o autor, a existência de diferentes formas de enunciação é o século XIX, ela é lugar de descoberta. Entretanto, e esse é o grande
resultado da relação entre o 1) o status do enunciador; 2) o lugar diferencial das análises foucaultianas, o que há não é uma evolução na
institucional de onde fala; e 3) a posição de sujeito que ocupa no momento constituição dos objetos, dos conceitos, das estratégias ou dos modos de
da enunciação. enunciação. O que se modificam são as relações entre esses aspectos do
Foucault busca compreender, a partir das análises feitas no livro O discurso da clínica médica. Não se trata, portanto, de um desenvolvimento
nascimento da clínica, qual é o status dos sujeitos que têm o direito histórico contínuo ou da evolução de uma história que é constituída por
regulamentar ou tradicional de proferir o discurso médico nos séculos XVIII e acúmulos. Trata-se de uma história de acontecimentos e de relações que se
XIX. Para tanto, o autor observa, entre outras coisas, as relações existentes dão em meio a rupturas e descontinuidades.
entre o médico e o doente.
No século XVIII, a clínica segue em uma única direção: “do saber Conclusões
constituído à ignorância” (FOUCAULT, 1963, p. 68). Nesse caso, o médico,
possuidor de um conhecimento externo, descobre a doença oculta por meio As análises mostraram que os modos de enunciação se definem a partir
da observação de um corpo que é próprio da doença, e que não é o doente de um jogo de relações. A existência de diferentes modalidades enunciativas
em si, mas o lugar de manifestação da doença. Pode-se dizer, então, que o na história de constituição da clínica médica confirma a dispersão das
corpo é um texto dado à leitura por alguém que possui um certo diversas posições de sujeito que são, na verdade, um indício para corroborar
conhecimento adquirido em um outro lugar. a tese, explicitada em “A arqueologia do saber”, de que o discurso é um
Já, no século XIX, observa-se na clínica um “olhar puro”, higienizado, campo de regularidade para diversas posições de subjetividade.
anterior a qualquer teoria, sólido, pois não se deixa contaminar pelo que vem
de fora. Para essa perspectiva, a verdade deveria ser constituída no corpo,
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
277 278
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FONSECA-SILVA. Foucault e a arqueogenealogia do sujeito. In: Sujeito,


identidade e memória. Uberlândia: EDUFU, 2004.
FONSECA-SILVA, M. C; SILVA, E. G. Entre o dentro e o fora: no limite
dos objetos e dos conceitos em AD. Texto inédito, 2007.
FOUCAULT, M. O nascimento da clínica. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 1977. Edição original: 1963.
______. A arqueologia do saber. Petrópolis: Vozes, Lisboa: Centro do
Livro Brasileiro, 1972. Edição original: 1969.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
279 280
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MATERIAIS E MÉTODOS
A FORMAÇÃO IMAGINÁRIA EM SHREK: UMA NECESSIDADE DE
(RE)AFIRMAÇÃO DA CULTURA AMERICANA.∗
Essa pesquisa é essencialmente de cunho bibliográfico e utilizará a
Análise de discurso de linha francesa com Pêcheux e Orlandi, conceitos da
Miriam Ramos dos Santos∗
Universidade do Estado da Bahia Literatura infanto-juvenil referentes a conto de fadas e estudos culturais na
miriamramos@bol.com.br
pós-modernidade com Stuart Hall. Os instrumentos utilizados serão fontes
bibliográficas, eletrônicas e fílmicas.
RESUMO O procedimento será organizado da seguinte maneira: a princípio far-
Este trabalho visa analisar no discurso fílmico Shrek, adaptado do conto Shrek de Steig pela
Dreamworks, marcas de (re)afirmação da cultura americana contemporânea, focalizando a se-á uma breve pesquisa teórica acerca das condições de produção,
imagem que os produtores de Shrek – e por extensão os americanos - fazem de sua cultura e a
imagem que pretendem passar acerca da mesma. Nesse estudo, utilizar-se-á os conceitos de enfocando as formações imaginárias, na narrativa fílmica Shrek. Nas
formação imaginária na Análise de Discurso de linha francesa, em especial com os autores
Pêcheux e Orlandi, a fim de observar no referido filme as marcas discursivas de cunho cultural, formações imaginárias, analisar-se-á as imagens antecipatórias do destinador
perceptíveis na trilha sonora, na estética e no comportamento dos personagens.
no que diz respeito a questões culturais e ideológicas.
PALAVRAS-CHAVES: Formação imaginária. Análise de discurso. Cultura norte-americana. Pós-
modernidade. Conto de fadas.
O método mais adequado à finalidade dessa análise e adotado na
mesma é o dedutivo de Descartes, o qual a partir de premissas pretende-se
chegar a conhecimentos novos.
Por trata-se de uma pesquisa embasada na Análise de discurso, parte-
INTRODUÇÃO se do princípio de que não será uma interpretação, pois o discurso não é
transparente, e sim uma análise na qual o analista, com base na questão que
A ampla divulgação do cinema americano em muito tem contribuído formula, na natureza do corpus e na finalidade da análise, constrói um
para o discurso de auto-afirmação da cultura americana. Nos filmes dispositivo de análise.
hollywoodianos a imagem que os americanos pensam que os outros povos
têm deles e a que querem que tenham deles é bastante explorada, sobretudo RESULTADOS E DISCUSSÃO
porque esses outros povos abrem suas salas para que os americanos possam
persuadi-los acerca de suas ideologias, já que todo discurso é ideológico. Em Shrek, o comportamento dos personagens, em especial do ogro e
da princesa em muito difere do padrão medieval e aproximam-se mais do
americano atual. As marcas dessa americanização no conto de fadas

FAPESB, Projeto de mestrado “Formações imaginárias e discursivas da cultura americana em Shrek”, sob orientação do Prof. Dr. João Antônio
de Santana Neto.

contemporâneo Shrek, são perceptíveis nas condições de produção.
Mestranda em Estudos de Linguagens pela UNEB – Campus I.
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .279-283. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
281 282
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Com relação às condições de produção, Pechêux (GADET et al, 1990, sempre o ogro quando julgado sob a ótica de uma cultura dominante – ou
p.79) afirmou que não se pode analisar um discurso como um texto, ou seja, que tem pretensão de assim ser – em especial quando esse outro não se
uma seqüência fechada em si mesma. Para analisar o discurso é rende aos encantos de quem quer dominar, quando o dominador não
imprescindível referi-lo ao conjunto de discursos possíveis investigados com consegue introjetar nesse outro o que pensa em relação a ele: a ideologia de
base nas condições de produções. inferioridade estética e intelectual.
Isso porque, reitera Orlandi (2005, p. 71), não há um fechamento no
discurso, ele representa um processo em curso. Um discurso nunca é a CONCLUSÕES
origem dos discursos, pois está sempre remetendo a outros discursos
anteriores e possibilitando futuros discursos e por isso a necessidade de se As marcas da cultura americana em Shrek mostram ter estreita relação
analisar as condições de produção de um discurso, no caso proposto, do com as imagens pretendidas pelos produtores do filme sobre a cultura
discurso fímico Shrek. americana contemporânea, uma forma de afirmação dessa cultura,
Dentro das condições de produção, Pêcheux (GADET et al, 1990, p. 79- impregnada de ideologias como: os americanos são desprovidos de
82) destaca que todo processo discursivo supõe haver formações preconceitos, aceitam a cultura alheia, enfim é uma nação que está
imaginárias, as quais designam as imagens que destinador (A) e destinatário “antenada” com as mudanças de relacionamentos e estimulam a felicidade e
(B) atribuem a si e ao outro, as imagens que eles fazem do seu próprio lugar liberdade sentimental.
e do lugar do outro, formando regras de projeção capazes de “estabelecer
relações entre as situações (objetivamente definíveis) e as posições REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
(representações dessas situações)”. Nesse processo de formações
HALL, S. A identidade cultural na pós-modernidade. Trad. Tomaz da
imaginárias, A antecipa o modo como B atribuirá sentido ao seu discurso e B Silva e Guacira Lopes Louro. 9ª. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2004.
antecipa o modo como A proferirá o discurso. KHÉDE, S. S. Personagens da Literatura infanto-juvenil. 2ª. ed. São
Paulo: Ática, 1990.
A presença marcante da cultura americana em Shrek pode ser notada a
ORLANDI, E. Análise de discurso: princípios e procedimentos. 6ª. ed.,
partir da escolha da trilha sonora, visto que o estilo musical pauta-se no Campinas: Pontes, 2005.
rock’n’roll, como na música All Star do grupo Smash Mouth, na música PÊCHEUX, M. Análise Automática do discurso (AAD-69). In. GADET, F; HAK,
country, como I’m on my way do grupo The proclaimers, além de outros T. (orgs.) Por uma análise Automática do discurso: Uma introdução à
obra de Michel Pêcheux. Campinas, SP: UNICAMP, 1990.
estilos contemporâneos.
SHREK. Direção: Andrew Adamson& Vick Jenson. Produção: Aron Warner,
Outro ponto crucial em relação à cultura norte-americana nessa John H. Willians & Jeffrey Katzemberg. Roteiro: Ted Elliot, Terry Rossio, Joe
narrativa fílmica é a dificuldade em aceitar a cultura desconhecida. O outro é Stillman & roger S. H. Shulman. Dreamworks Pictures, 2001. 1 DVD (93
min.). Baseado no livro de William Steig
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
283 284
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STEIG, W. Shrek: a história que inspirou o filme. Trad. Eduardo Brandão.


São Paulo: Companhia das Letrinhas, 2001.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
285 286
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MATERIAL E MÉTODOS
A HETEROGENEIDADE TEXTUAL NA CANÇÃO EDUARDO E MÔNICA

Robson Batista de Lima∗ Jean-Michel Adam (1990) propõe cinco tipos de seqüência tipológica, a
Universidade do Estado da Bahia
rblima@uneb.br
saber: descritiva, narrativa, argumentativa, explicativa e dialogal. Para esse
autor, a inserção e a dominante seqüencial são as duas maneiras que o texto
utiliza para articular esses tipos de seqüência. No primeiro caso, trata-se de
RESUMO
Neste artigo, investigo a heterogeneidade textual na canção Eduardo e Mônica, do compositor uma relação elementar de inclusão de um tipo de seqüência num outro. No
Renato Russo. Para tanto, lanço mão dos pressupostos teóricos da Lingüística Textual, mais
precisamente da tipologia cognitiva de Jean-Michel Adam. segundo caso, tem-se uma relação mais complexa, uma espécie de mistura
PALAVRAS-CHAVE: Heterogeneidade textual. Gênero discursivo. Seqüência tipológica. de seqüências.
Utilizo a proposta tipológica de Adam para analisar a heterogeneidade
textual na canção Eduardo e Mônica. Para tanto, faço a segmentação das
seqüências observadas no texto e investigo como essas seqüências se
INTRODUÇÃO
relacionam entre si, a fim de detectar o tipo de seqüência dominante.

O texto é uma realidade heterogênea, uma vez que se constitui de uma


RESULTADOS E DISCUSSÃO
série de seqüências tipológicas. É evidente que a maneira como essas
seqüências articulam-se num determinado texto varia de acordo com o
A canção Eduardo e Mônica é um bom exemplo da heterogeneidade
gênero discursivo a que pertence.
textual, já que é composta de diversas seqüências tipológicas. Tais
Neste artigo, investigo o fenômeno da heterogeneidade textual no
seqüências inscrevem-se de uma maneira própria ao gênero canção. O texto
gênero canção. Levando-se em conta que “os gêneros são uma espécie de
começa com uma seqüência argumentativa na qual se insere uma longa
armadura comunicativa geral preenchida por seqüências tipológicas de base
seqüência narrativa que apresenta, por sua vez, a inserção de seqüências
que podem ser heterogêneas entre si” (MARCUSCHI, 2002, p. 27), pergunto-
dialogais e descritivas. Curiosamente, a canção termina com uma seqüência
me: Como se articulam as seqüências na canção Eduardo e Mônica? E qual
argumentativa idêntica àquela que a iniciou. Observando a organização do
delas predomina sobre as demais?
texto em análise, pude constatar que, apesar de a seqüência narrativa ser a
mais extensa, a seqüência que “domina” as demais é a argumentativa.
Portanto, o texto simplesmente não narra a história de amor de Eduardo e

Mestre em Lingüística pela Universidade Federal da Bahia. Mônica, mas antes a utiliza como argumento e exemplo para sustentar a tese
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .285-287. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
287 288
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de que “existe e, ao mesmo tempo, não existe razão para as coisas do


coração”.

CONCLUSÕES

Muitas vezes ouvimos a letra de uma canção, mas não “escutamos” o


que está em suas entrelinhas. Uma leitura apressada da canção Eduardo e
Mônica, por exemplo, levaria um leitor incauto a classificá-la como um texto
narrativo. Tal leitura, no entanto, revela-se superficial e reducionista, pois
não consegue dar conta de certas sutilezas que só uma leitura mais atenta é
capaz de revelar, como, por exemplo, a forma brilhante como Renato Russo
articulou as diversas seqüências que compõem a canção, tornando-a
poeticamente persuasiva. Assim, concordo com afirmação de Costa (2002, p.
121): “O trabalho com a canção é igualmente vasto e fascinante. O professor
não precisa ser ele mesmo um compositor ou cantor, mas, é claro, precisa ter
ele mesmo a sensibilidade e a visão crítica que lhe cabe incutir”.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ADAM, J.-M. Élements de linguistique textuelle. Liège, Mardaga, 1990.


COSTA, N. As letras e a letra: o gênero canção na mídia literária. In:
DIONISIO, A., MACHADO, A., BEZERRA, M. (org.). Gêneros textuais &
ensino. Rio de Janeiro: Lucerna, 2002.
MARCUSCHI, L. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In: DIONISIO,
A., MACHADO, A., BEZERRA, M. (org.). Gêneros textuais & ensino. Rio de
Janeiro: Lucerna, 2002.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
289 290
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identidade feminina contemporânea. Na segunda metade do séc. XIV,


A IDENTIDADE FEMININA NA FOTOGRAFIA quando desaponta para regras de exibição social, a moda se mostra mais
PUBLICITÁRIA DA MODA42
voltada para universo fálico das exibições e ostentação de riqueza. Com a
alteração de uma sociedade estamental para uma sociedade de classes, a
Gesiel Prado Santos∗∗
Universidade Regional do Cariri moda do século XIX fixa suas estruturas no orbe feminino, pois com a
gesielprados@yahoo.com.br
ausência do homem nos assuntos da moda, as mulheres passam a ser
Cláudia Rejanne Pinheiro Grangeiro∗∗∗
Universidade Regional do Cariri “vitrine” da exibição da riqueza e do poder econômico do homem burguês
claudiarejannep@yahoo.com.br
(LYPOVETSKY, 1989). Mesmo com a tentativa da inserção do homem na moda,
essa representação masculina não corresponde à grande força que esta
representa para as mulheres, basta perceber as várias revistas de moda
RESUMO feminina, a importância dada às carreiras das tops models, e, sobretudo, as
O presente artigo propõe discutir a construção da identidade feminina pelos discursos publicitários
da moda contemporânea. Para tanto, tomaremos como corpus duas fotografias selecionadas do fotografias publicitárias que se intercalam entre as reportagens nas revistas,
ensaio, Absolutas: o auge e a derrocada da realeza presentes no Caderno Top Jardins, edição de
dezembro de 2006. Amparado pelo conceito de discurso da Escola de Analise do Discurso e se agigantam diante dos nossos olhos nas vias urbanas. E diante de uma
Francesa, para qual os sentidos se dão na relação língua/história, observaremos que a retomada
da imagem da Rainha Maria Antonieta, na fotografia, traz em seu cerne uma série de discursos transformação social importante, a inclusão das forças femininas no mercado
que recaem sobre a identidade da mulher contemporânea.
de trabalho, a moda contemporânea tem a sua frente não mais uma mulher
PALAVRAS-CHAVE: Moda. Publicidade. Discurso. Identidade. Feminino.
apresentada como “vitrine” do poder econômico masculino, eis que
atualmente ela tem diante de si novos conceitos femininos de liberdade e de
conquista. Tais conceitos são produtos de uma série de movimentos sociais

INTRODUÇÃO que vão se fortalecendo e culminam na década de 60. Porém, ao mesmo


tempo em que os discursos feministas propõem a quebra dos preceitos que

Efeito particular de determinadas sociedades, principalmente naquelas tolhem as mulheres, e as reduzem aos aspectos sexuais, a moda, por outra

onde as relações sociais são pautadas na lógica do mercado de consumo, a vez, reproduz discursos contrários ao estampar corpos femininos através da

moda vista por debaixo dos tecidos, cores e formas, acaba por revelar uma imagem publicitária, configurando uma mulher frágil, submetida ao

gama de discursos que contribuem para o processo de construção da escravismo da beleza e submissa aos desejos sexuais masculinos.

42 Projeto de Pesquisa Discurso, Cultura e Memória, coordenadora Prof. Drª. Cláudia Rejanne Pinheiro Grangeiro.
∗∗
Graduando em Letras pela Universidade Regional do Cariri (URCA)
∗∗∗
Doutora em Lingüística e Língua Portuguesa pela UNESP/FCLAR. Professora da Universidade Regional do Cariri (URCA).

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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .289-294. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
291 292
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MATERIAL E MÉTODOS sentido de comportamento vistoso, e ainda associar a imagem de uma


mulher fútil, ligada aos dispêndios. No ensaio, a Rainha Maria Antonieta é
Tendo em vista o universo que consiste a publicidade da moda, recriada para valorizar os aspectos da moda indumentária luxuosa. A
tomaremos como corpus duas fotografias do ensaio, Absoluta: o auge e a fotografia que abre o ensaio mostra uma modelo em um cenário que lembra
derrocada da realeza, presentes no caderno Top Jardins, edição de dezembro uma época vitoriana. Porém, a associação do sentido da imagem com a
de 2006. Para análise destes discursos, materializados na fotografia rainha se dá por um pequeno texto, situado abaixo do título do ensaio: “Não
publicitária da moda, será adotado o método de Análise de Discurso me descomponha” Nem em sua última ordem – já na guilhotina –
Francesa, para qual o sentido é produzido pela relação Língua/História, deste Maria Antonieta perdeu a pose. Aqui, aparece decomposta e, mesmo
modo, o sentido é “regulado no tempo e espaço da prática humana” assim, bela. A partir desse enunciado o leitor é levado, através da memória
(ORLANDI, 2005). A reprodução discursiva é feita não por um sujeito-empírico, discursiva, a associar a imagem aos discursos criados em torno dos
porém, por um sujeito-ideológico, inserido num contexto social e marcado escândalos realizados por Maria Antonieta durante seu conturbado reinado.
dentro de uma conjuntura histórica. Assim, ao analisarmos as fotografias Como a publicidade da moda se “alimenta de espetáculos” (LYPOVETSKY,
publicitárias, perceberemos que através da retomada da figura da Rainha 1989), o episódio da execução da Rainha na guilhotina é o ponto central na
Maria Antonieta no ensaio, a primeira vista no intento de valorizar as outra imagem, (re)aparecendo na fotografia através de indícios que levam o
indumentárias, acabam por reproduzir um discurso divergente do feminismo, leitor a essa associação. Nesta imagem, a ausência da cabeça da modelo no
pois, a ocorrência de Maria Antonieta acaba por trazer no seu cerne uma enquadramento da fotografia, assim como no canto esquerdo superior a
série de discursos “já ditos” e que reaparecem na moda e repõem sobre a presença de uma coroa atuam diretamente sobre o sentido, (re)criando o
figura feminina os mesmos conceitos da moda no século XIX. episódio da execução da Rainha. As fotografias propõem, através da
recorrência dos comportamentos de Maria Antonieta, uma visão de uma
RESULTADOS E DISCUSSÃO mulher ligada aos dispêndios luxuosos. A ultima ordem da Rainha, expressa
no enunciado: “Não me descomponham”, evidencia uma preocupação
O sentido de um texto nunca é totalmente fechado, sempre está feminina, na moda, voltada para sua aparência estética. Distanciando-se do
dialogando com outros textos. No texto não-verbal essa abertura de sentido, conceito feminino dos movimentos que sob manifestações, utilizando-se da
feita pela leitura visual, é decorrente do processo da memória discursiva, que voz, clamam por seus direitos de reconhecimento, conseqüentemente por
é “a existência histórica do enunciado no interior de práticas discursivas uma mulher atuante na sociedade. O elemento beleza, citado no texto que
regradas por aparelhos ideológicos” (COURTINE apud. MILANEZ, 2006, p. 77). A abre a série de ensaios do caderno Top Jardins, atua nos discursos da moda
presença de Maria Antonieta nos textos não-verbais leva o leitor a atribuir um como fator preponderante para as conquistas, através da velha idéia da
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
293 294
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sedução e atração física que foi criada em torno da mulher, sendo contestada
pelo discurso feminista. Esse discurso demonstra, para uma sociedade com
padrões masculinos, que as competências das mulheres vão além dos seus
corpos, pois estas são capazes de efetuar qualquer tarefa. A mulher
contemporânea para moda é aquela que também possui o poder de
conquista, mas essa conquista se dá através da valorização do corpo, e seu
poder reserva-se para a sedução do outro.

CONCLUSÕES

Sendo a moda um assunto direcionado para mulheres, os discursos


materializados nas fotografias publicitárias recaem sobre a construção da
identidade dessa nova mulher contemporânea, que por um lado briga,
questiona, atua na luta pelos seus espaços, e por outro se estampa em
imagens reduzida aos aspectos do luxo obsoleto, tolhida a uma visão de
objeto sexual.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CADERNO TOP JARDINS. Edição 96, dezembro de 2006.


LYPOVETSKY, G. O Império do Efêmero: a moda e seus destinos nas
sociedades modernas. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
MILANEZ, N. As Aventuras do Corpo: dos modos de subjetivação às
memórias de si em revista impressa. 210 p. [Tese de Doutorado em
Lingüística e Língua Portuguesa]. Universidade Estadual Paulista, Faculdade
de Ciências e letras, 2007.
ORLANDI, E. P. Michel Pêcheux e a Análise de Discurso. Estudos da
Língua(em). Vitória da Conquista, n. 01, p.9-13, 2005.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
295 296
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considera-se, também, as relações do pregador com o seu auditório no


A IMAGEM DO SANTO E O ÉTHOS DO PREGADOR: despertar de emoções (pathós), visando à comunhão dos espíritos.
COMUNHÃO E CONTRADIÇÃO∗

MATERIAIS E MÉTODOS
Jaciara Ornélia Nogueira de Oliveira∗∗
Universidade Estadual da Bahia
jaciaraoliveira@oi.com.br
O corpus escolhido para essa pesquisa são os sermões In laudibus
Virginis Matris, escritos em torno de 1123 e considerados por Thomas Merton
RESUMO: como uma das mais belas páginas saídas da pena de Bernardo. Utiliza-se a
A partir de reflexões sobre o que se diz de Bernardo de Claraval, santo, padre e doutor da Igreja,
e do que nos seus sermões se detecta, busca-se comparar a imagem do santo com o éthos do versão em latim constante da edição bilíngüe (latim/espanhol) das Obras
pregador, observando-se os pontos de comunhão e de contradição. Considera-se, também, as
relações do pregador com o seu auditório no despertar de emoções (pathós), visando a comunhão Completas de São Bernardo editada pela BAC em 1983 e a sua respectiva
dos espíritos. Conclui-se que Bernardo foi, deveras, o equilíbrio entre dois extremos pendulares
entre os quais oscila o sentido da vida: a ação e a contemplação. tradução para a língua portuguesa, feita por Ary Pintarelli e editada por Vozes

PALAVRAS-CHAVE: Éthos. Retórica. em 1999 sob o título Sermões para as festas de Nossa Senhora. Os sermões
de Bernardo de Claraval, que escolhemos como corpus para esse trabalho, na
verdade, não devem a nenhuma festa litúrgica e nunca foram pronunciados,
mas apenas escritos. Colocar sobre a forma de homilia, com estilo oral,
INTRODUÇÃO exortações morais e um ensinamento doutrinal com base no comentário do
Evangelho de Lucas é um artifício literário, um exercício da argumentação.
Este trabalho, vinculado a um projeto de pesquisa maior, cujo objetivo
é desenvolver estudos sobre a argumentação em textos religiosos, RESULTADOS E DISCUSSÃO
especificamente a partir da obra de Bernardo de Claraval, procura, a partir de
reflexões sobre o que se diz de Bernardo de Claraval, comparar a imagem do As análises mostraram que Bernardo de Claraval construiu um éthos
santo com o éthos do pregador, ambos presentes neste padre e doutor da que oscilava entre o devoto cheio de fé em Deus e na Virgem Maria e o
Igreja, observando-se os pontos de comunhão e de contradição. Para tanto, pregador convicto e preparado, que exerce sobre seu auditório uma certa
dominação.
Por causa da fluidez do seu discurso foi consagrado Doctor Melifluus e

Trabalho vinculado a um projeto de pesquisa sobre a argumentação já em desenvolvimento e que inclui alunos de iniciação cientifica Doctor Marianus por sua devoção a Maria. Bernardo foi explicitamente e com
∗∗
Doutora em Letras e Lingüística pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Professora da Universidade Católica de Salvador (UCSAL) e
Professora Adjunta da Universidade do Estado da Bahia (UESB), campus de Salvador. Membro do Núcleo de Estudos em Análise de Discurso sucesso, nos diz Oliveira (2004, p 35), um grande mestre espiritual, pois não
(NEAD).
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .295-299. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
297 298
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se limitou ao testemunho silencioso, mas falou, pregou, escreveu. Os CONCLUSÕES


sermões constituem quase a metade da sua obra. Não obstante monge,
voltado para a meditação e o recolhimento, Bernardo ultrapassando o plano
Bernardo com seus sermões soube retomar, argumentar e repropor
espiritual, penetra no âmbito político e participa ativamente das controvérsias
tudo o que a tradição patrística havia ensinado. Para tanto, o pregador
de sua época. Com traços muito antagônicos, Bernardo é muitas vezes
constrói, para seu auditório, a imagem do homem devoto, cheio de fé,
censurado; chega até a mostrar-se dominador.
contemplativo, mas também estudioso, conhecedor da palavra de Deus.
Sabemos que o discurso religioso é, por si só, um discurso autoritário:
Conclui-se, portanto, que Bernardo foi, deveras, o equilíbrio entre dois
comenta e/ou desenvolve verdades inquestionáveis cujo locutor único é
extremos pendulares entre os quais oscila o sentido da vida: a ação e a
Deus, logo, de acordo com a crença, imortal, eterno, infalível, infinito e
contemplação e a imagem de si que ele passa no seu discurso (éthos),
Todo-Poderoso. Os homens, pregadores, são os seus locutores interpelados,
embora muitas vezes contradizendo a sua atuação real, concilia-se com o
os seus espelhos, os seus reflexos. Desse modo, a voz do padre, do
phátos conseguindo criar entre o orador e seu auditório uma relação de
pregador ou qualquer representante seu é a voz de Deus. Bernardo aparece,
cumplicidade.
pois, como “um porta-voz autorizado”. Ele só pode agir sobre seu auditório
pelas palavras porque sua fala concentra o capital simbólico acumulado pelo
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
grupo de quem ele é o superior e do qual ele é o fiel representante e
BERNARD DE CLAIRVAUX. A la louange de la Vierge Mère. Sources
intercessor diante de Deus. Esse porta-voz autorizado é, portanto, aquele
Chrétiennes n. 0390. Introduction traduction et index par Marie-Imelda
que “fala” ao grupo, cuja perfeição é preciso que ele busque. Huille; Joel Regnard. Paris: Du Cerf, 1993.
Nos sermões de Bernardo, o recurso à autoridade está latente, não só BERNARDO DE CLARAVAL, (São). Sermões para as festas de Nossa
Senhora. Introdução traduçãio e notas de Frey Ary Pintarelli. Petópolis:
pelas próprias características inerentes ao texto religioso como também pela Vozes, 1999.
intertextualidade com a Bíblia. O padre transfere continuamente, nesses LIMA, A. A. I. In: MERTON, T. Bernardo de Claraval: o último dos
sermões, imagens afloradas no Evangelho para a figura de Maria e de sua padres da igreja e a encíclica “Doctor Melifluus”. Petrópolis: Vozes,
1958.
missão no mistério da encarnação. Desse modo, as inumeráveis citações
MERTON, T. Bernardo de Claraval: o último dos padres da Igreja e a
que Bernardo faz dos livros da Bíblia e as incontáveis comparações com seus encíclica “Doctor Melifluus”. Petópolis: Vozes, 1958.
evangelistas reforçam e ratificam, sem dúvida, a imagem de um pregador OLIVEIRA, J. O. N. de. Bernardo e Maria: autoridade, argumentação e
fé. Trabalho apresentado em Mesa Redonda no II seminário de pesquisa em
que conhece a palavra de Deus.
análise do Discurso Vitória da Conquista, 2005.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
299 300
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OLIVEIRA, J. O. N. de. Enlaces e desenlaces entre particípios e


gerúndios. 2004. TESE (Doutorado em Letras e Lingüística) Instituto de
Letras. Universidade Federal da Bahia: Salvador.
PERELMAN, C. O império retórico: retórica e argumentação. Tradução
de Fernando Trindade e Rui Alexandre Grácio. Lisboa: Asa, 1999.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
301 302
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INTRODUÇÃO
ANÁLISE DE DISCURSO, INTERPRETAÇÃO E EFEITO DE SENTIDO∗

A questão que colocamos neste trabalho está ligada ao trabalho que


Celma Oliveira Prado∗∗
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia desenvolvemos em Prado e Fonseca-Silva (2005), onde refletimos sobre o
celmaprado@hotmail.com
enunciado e a questão da interpretação nos postulados de Foucault e de
Maria da Conceição Fonseca-Silva∗∗∗
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia Pêcheux, mostrando as diferenças nos dois quadros teóricos. Interessou-nos
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia
con.fonseca@gmail.com aqui aprofundar a discussão sobre a interpretação no quadro da Análise de
∗∗∗∗
Edvania Gomes da Silva Discurso (AD), iniciada por Pêcheux.
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
edvania_g@yahoo.com.br
Nos postulados do quadro teórico da AD, verificamos que a noção de
interpretação difere da forma como é concebida pelo senso comum e em
outros campos dos estudos da linguagem, como, por exemplo, a Filologia, a
RESUMO
No presente trabalho, discute-se a noção de interpretação utilizada na Análise de Conteúdo e Hermenêutica e a Análise de Conteúdo.
como se exerce o processo de interpretação no campo da Análise de Discurso de linha francesa.
Para efeito de exemplificação da interpretação em Análise de Discurso, analisou-se um texto Geralmente, quando se pensa em interpretar um texto, as questões
veiculado na mídia. O resultado da análise mostrou a interpretação como um processo em que os
sentidos são historicamente determinados e em que os sujeitos, como posição, participam da postas são do tipo: “O que o autor disse?”, “O que o autor quis dizer?” ou,
constituição dos sentidos.
ainda, “Quais são as possibilidades de interpretação para este texto?”, De
PALAVRAS-CHAVE: Análise de Discurso. Interpretação. Efeitos de sentido.
que trata esse texto? etc.
Isto posto, levantamos a seguinte questão: Como se dá o processo de
interpretação na perspectiva da AD? A análise feita teve como objetivo
explicitar como a emergência de um texto pode trazer à tona sentidos já
existentes no âmbito do interdiscurso e como se exerce o processo de
interpretação na Análise de Discurso.

MATERIAL E MÉTODOS

Trabalho apresentado como conclusão do curso de Especialização em Lingüística e vinculado ao projeto de pesquisa temático “Análise de
Discurso: Foucault e Pêcheux, o diálogo teórico-metodológico e as repercussões na França e no Brasil”, financiado pela Uesb.
∗∗
Aluna do Curso de Especialização em Lingüística, vinculado ao Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários, da Universidade Estadual do
Sudoeste da Bahia.
∗∗∗
Para tentar dar uma primeira resposta a questão apresentada acima,
Doutora em Lingüística. Coordenadora do projeto de pesquisa e orientadora, líder do Grupo de Pesquisa em Estudos Lingüísticos
(GPEL/CNPq/Uesb) e do Grupo de Pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB). Professora do Departamento de Estudos
Lingüísticos e Literários da Uesb - campus de Vitória da Conquista. fazemos uma breve e parcial retrospectiva a respeito da constituição do
∗∗∗∗
Doutora em Lingüística. Membro da equipe do projeto de pesquisa. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa em Estudos Lingüísticos
(GPEL/CNPq/UESB) e do Grupo de Pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB). Professora do Departamento de Estudos campo da Análise de Discurso como uma das disciplinas de interpretação,
Lingüísticos e Literários da Uesb - Campus de Vitória da Conquista.
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .301-306. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
303 304
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mobilizando Henry (1969) Orlandi (1996), Pêcheux (1975; 1983); Prado e respondeu: “Relaxa e goza porque você esquece todos os transtornos”. O
Fonseca-Silva (2005), Rodríguez (1998). enunciado será, aqui, denominado Enunciado 1 (E1), para efeitos de análise.
Em seguida, descrevemos/interpretamos o enunciado “Relaxa e goza O E1 demanda o reconhecimento das condições de produção em que
porque você esquece todos os transtornos”, pronunciado pela ministra do foi produzido. Isso torna possível compreender que o enunciado em questão
Turismo Marta Suplicy em uma entrevista durante o lançamento do Plano faz ressoar um discurso-outro, presente no interdiscurso e que funciona
Nacional de Turismo, em treze de junho de 2007. Essa entrevista foi como um pré-construído que faz eco nos sentidos que o E1 possibilita
veiculada na mídia. produzir. Fazemos referência aqui a um outro enunciado, denominado
Foram utilizadas como fontes, também, a propaganda da Peugeot, que Enunciado 2 (E2), um dito popular que circula no senso comum: E2 - Se o
circulou na mídia após a entrevista da ministra no período de junho-julho de estupro é inevitável, relaxa e goza.
2007; o programa Casseta & Planeta nas edições seguintes à entrevista, No adágio (E2), o enunciado relaxa e goza refere-se a uma situação de
especificamente, a edição de dezenove de junho de 2007; e o painel do leitor estupro em que não se pode fazer nada, ou seja, em que se é obrigado a
da Folha de São Paulo, em 14 de junho de 2007, na aceitar a situação. Já no E1, a frase “relaxa e goza", acrescida da oração
http://www1.folha.uol.com.br/folha/paineldoleitor/. “porque você esquece todos os transtornos” é mobilizada, não para tratar de
um estupro, mas da crise aérea no Brasil. As condições de produção são
RESULTADOS E DISCUSSÃO outras. Mas como o sentido na AD é lingüístico-histórico, o enunciado deve
ser interpretado considerando seus pré-construídos, o que possibilita a
A noção de interpretação para Análise de Conteúdo pode ser igualada à seguinte leitura: para os passageiros que dependem do transporte aéreo
compreensão de texto. Já na Análise de Discurso, iniciada por Pêcheux, brasileiro, os transtornos nos aeroportos, assim como o estupro em certos
encontramos uma concepção diferente de interpretação. Na perspectiva da casos, são inevitáveis, ou seja, as “vítimas” da crise aérea no Brasil não têm
AD, interpretar não consiste em um ato individual ou ligado às intenções de alternativa.
um indivíduo. Para interpretar, os sujeitos devem estar inscritos na história. É O enunciado em questão também possibilita trazer à tona o discurso no
que podemos contatar na análise apresentada a seguir. qual o “descaso” e o “desrespeito” da ministra com a população é atribuído
O texto analisado corresponde a uma frase, pronunciada pela ministra não somente a ela, mas ao governo petista. Para explicitar isso, entre vários
do Turismo Marta Suplicy durante o lançamento do Plano Nacional de outros exemplos, citamos um enunciado de um leitor da Folha de São Paulo:
Turismo, em 13 de junho de 2007. Ao ser questionada sobre que incentivo O governo do PT atingiu o cume da gozação.
tem o brasileiro para viajar com o caos nos aeroportos, a referida ministra

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
305 306
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O enunciado proferido pela ministra Marta Suplicy, ao longo dos PRADO, C. O.; FONSECA-SILVA, M. C.. O enunciado e a questão da
interpretação em Foucault e Pêcheux. In: NETO, J. A. de S. Neto; BARREIRO,
próximos anos, não cessará de produzir efeitos, tornando possíveis vários
J. M. de; ROCHA, M. J. C. (Org.). Discursos em Análise. Salvador: UCSal,
outros enunciados. 2005. p. 334-352.
RODRÍGUEZ, C. Sentido, Interpretação e História. In: ORLANDI, E. P. (Org.).
A Leitura e os Leitores. Campinas: Pontes, 1998. p. 47-58.
CONCLUSÕES

A concepção de interpretação na prática de compreensão de texto


tradicional ou Análise de Conteúdo está relacionada ao objetivo do produtor
do texto e busca, portanto, extrair os sentidos conferidos por ele no ato de
produção, buscando o verdadeiro significado. A interpretação na Análise de
Discurso, ao contrário, é concebida como construção de sentidos que não
depende da vontade de um indivíduo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

HENRY, P. Os fundamentos teóricos da “análise automática do discurso” de


Michel Pêcheux (1969). In: GADET, Françoise e HAK, Tony. Por uma
análise automática do discurso: uma introdução à obra de Michel
Pêcheux. Campinas, Editora da UNICAMP, 1990, p. 13-36.
ORLANDI, E. P. Interpretação; autoria, leitura e efeitos do trabalho
simbólico. Petrópolis, RJ: Vozes, 1996.
ORLANDI, E. P. Análise de Discurso: princípios e procedimentos.
Campinas, SP: Pontes, 1999.
PÊCHEUX, M. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio.
Campinas: Editora da UNICAMP, 1988. Edição original: 1975.
PÊCHEUX, M. Análise automática do discurso (AAD-69). In: GADET Françoise
e HAK Tony. Por uma análise automática do discurso: uma introdução
à obra de Michel Pêcheux. Campinas: Editora da UNICAMP, 1990.
PÊCHEUX M. O discurso: estrutura ou acontecimento. Campinas:
Pontes, 1997. Edição original: 1983.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
307 308
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elementos significativos explícitos e implícitos, com intenções nem sempre


ANÁLISE DE UMA NOTÍCIA DE JORNAL:
confessas e em textos nem sempre claros, com seus conteúdos ideológicos
IMPLÍCITOS E NÃO-DITOS
expressos de forma subliminar, nos interstícios e não-ditos. Este trabalho
Marília Flores Seixas de Oliveira∗
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia analisa uma notícia veiculada em jornal, tomando por base o trabalho de
mariliaflores@terra.com.br
Ducrot (1977) sobre implícitos e não-ditos, tentando compreender as
mensagens subliminares presentes no texto.
RESUMO Quando se trata de textos jornalísticos, há um mito que confere à
Na vida moderna, uma profusão de signos invade a existência humana, repletos de conteúdos
ideológicos, expressos nem sempre às claras, antes, de maneira subliminar, operando nos notícia certo grau – infundado - de imparcialidade e de objetividade, a partir
interstícios do texto, a partir de um jogo semântico que incorpora importantes elementos
significativos veiculados indiretamente. Este trabalho analisa uma notícia veiculada em jornal, da ilusão de que a notícia jornalística é, a priori, “verdade”. Entretanto, há
tomando por base os trabalhos de Oswald Ducrot (1977) e de Michel Pêcheux (1983) sobre
implícitos e não-ditos, tentando compreender as mensagens subliminares presentes no texto e muitas mediações entre os fatos e a tradução jornalística dos mesmos: o
tornar mais claros os conteúdos ocultos, mas traduzíveis e passíveis de reconstituição pela análise
discursiva dos elementos textuais. lugar discursivo da empresa noticiadora, a agenda interna dos jornais e os

PALAVRAS-CHAVE: Análise do Discurso. Implícitos. Não-ditos. Discurso jornalístico.


pontos de vista dos jornalistas envolvidos, por exemplo, são elementos que
comprometem os resultados textuais finais, impregnando as notícias
veiculadas de conteúdo ideológico, de forma direta ou indireta, alterando até
mesmo os fatos a partir desta “transcrição” discursiva.
INTRODUÇÃO

MATERIAL E MÉTODOS
Na contemporaneidade, imagens, notícias, símbolos e signos nos
invadem a todo instante, estabelecendo uma existência contaminada pelo O texto selecionado para análise é uma matéria do Jornal Folha de S.
excesso de mensagens de conteúdo ideológico, que buscam conduzir as Paulo, jornal de circulação nacional que goza de certo conceito de
pessoas - de maneira nebulosa e ilusória - à condição precária de submissão “progressista”, ou de “pouco comprometido ideologicamente com as forças
inconsciente ao sistema e ao consumo, apertando-as, ajustando-as e conservadoras”.
formatando-as pelas mós dos “moinhos satânicos” do mercado (POLANYI, A partir da sistematização da notícia analisada, foi montado um quadro
2000). Tais mensagens operam nos planos conscientes e inconscientes, por resumo das vozes presentes no texto, identificando as vozes presentes e os
tipos, a partir de duas categorias - locutor ou enunciador - (segundo Ducrot),
apontando-se os fragmentos textuais correspondentes. A análise buscou

Doutoranda em Política e Gestão Ambiental pelo Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília (CDS/UnB), Mestre em
Desenvolvimento Sustentável pelo CDS/UnB, Especialista em Leitura: Teoria e Prática e graduada em Letras com Inglês pela UESB. Professora identificar também as condições de produção do texto. Na elaboração do
de Cultura Brasileira do DFCH/UESB.
_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .307-311. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
309 310
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Quadro Resumo das Vozes presentes no Texto (BAKHTIN, 1929), levamos em ações dos sem-teto e sem-vagas, utilizam expressões como protestaram,
conta os fundamentos de DUCROT (1977) - na perspectiva da Semântica da ameaçaram, reclamam de, que concordam com o campo semântico esboçado
Enunciação – que contesta a idéia de unicidade do sujeito falante, trabalha desde o título, dando idéia de contestação, transgressão e desordem. No
com conceitos de locutor(es) (responsáveis pelo enunciado / “ser do entanto, ao se referir às ações dos representantes do governo, escolhem
discurso”) e enunciador(es) (personagens da história) e propõe uma versão expressões cujo conteúdo semântico liga-se ao bom senso e ao equilíbrio.
polifônica da enunciação. As condições de produção do texto estão ligadas à Entre as vozes presentes está a da Polícia Militar, em discurso de oposição ao
redação do jornal, que noticia (6/02/98), em reportagem de Marina Avancini dos manifestantes: enquanto o MTST contabilizou 500 participantes do
(da Folha Campinas), uma manifestação de pais e crianças do MTST movimento, a polícia contabilizou 200. Pode-se perceber de forma implícita a
(Movimento dos Trabalhadores sem Teto) por vagas na rede escolar, ocorrida dicotomia ordem (polícia/delegados de ensino/políticos/governo) X desordem
em 5/2/98 em Campinas. (sem-teto e sem-vaga/invasão/ protesto/ameaça/causadores de
problemas/fora da ordem). O fato de podermos inferir, além da clara

RESULTADOS E DISCUSSÃO dicotomia estabelecida pela própria luta de classes, a colocação implícita dos
manifestantes como estando do lado oposto à “ordem”, nos leva a pensar

A análise do texto começa pelo título: Sem-teto e sem-vaga invadem que os responsáveis pela enunciação (locutores) se situam em posição

delegacia. O título não diz que a delegacia “invadida” é de ensino, deixando discursiva contrária à dos sem-teto/sem-vaga/MTST. Outra questão é o fato

margem para a associação imediata com delegacias de polícia, filiação de de que a não concessão de vagas para as crianças sem-vagas estaria ligada à

sentido mais freqüente para a palavra delegacia, deixando-a, assim, se ligar a impossibilidade dos pais comprovarem a moradia, uma vez que são sem-

um campo semântico de contravenção, ilegalidade e perturbação da ordem. tetos. Estando este problema colocado desde o início pelo próprio jornal (no

Sentido que é reforçado pela associação do verbo invadir, de forte conteúdo texto acima do título) não é, contudo, abordado com clareza ao longo da

pejorativo, utilizado no título como forma de caracterizar implicitamente o reportagem, sequer é esclarecida a relação entre a não confirmação de

sujeito (os sem-teto e sem-vaga) como invasores/transgressores. A utilização residência e a impossibilidade de matrícula das crianças. Estes não-ditos

reiterada de invadir/invasão no texto evidencia a posição discursiva e também podem ser lidos, e nos fazem pensar nos motivos pelos quais os

ideológica dos locutores (jornal/jornalista) quando confrontada com vozes locutores omitem maiores explicações sobre as ocupações, as dificuldades

que se encontram em outro lugar discursivo, os sem-teto e sem-vaga, que encontradas pelos pais em sua relação com os processos burocráticos do

utilizam como equivalente a expressão ocupação, sem a carga semântica sistema formal de ensino - que impedem o acesso das crianças do MTST à

negativa encontrada em invasão. Outras evidências desta posição discursiva escola - e o ponto de vista dos sem-teto frente ao problema gerador da

oposta aos sem-teto são encontradas quando os locutores, ao se referirem às manifestação.


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311 312
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CONCLUSÕES

Ao noticiar a manifestação contra falta de vagas nas escolas públicas, a


reportagem privilegiou as vozes oriundas do lugar discursivo ideologicamente
comprometido com o poder, impregnando de sentidos pejorativos os
conteúdos dos textos referentes aos manifestantes. Na análise, foi possível
verificar como operam os conteúdos nos discursos e nos enunciados deste
texto jornalístico. Tais conteúdos traduzem-se em ideologia que resulta na
exposição dos leitores aos vazios (implícitos, pressupostos, subentendidos) e
a seus teores não-ditos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAKHTIN, M. Marxismo e Filosofia da Linguagem. São Paulo: Hucitec,


1986. Edição original: 1929.
DUCROT, O. Princípios de semântica lingüística (dizer e não dizer).
São Paulo: Cultrix, 1977.
PÊCHEUX, M. A análise do discurso: três épocas. In: GADET, F. e HAK, T.
(orgs.). Por uma análise automática do discurso: uma introdução à
obra de Pêcheux. Campinas: Unicamp, 1983.
POLANYI, K. A Grande transformação: as origens da nossa época. 2ª
ed. Rio de Janeiro: Campus, 2000.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
313 314
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representados graficamente através de recursos estéticos visuais, tais como


ANÁLISE DISCURSIVA DAS LOGOMARCAS logotipos, logomarcas e slogans. Esses símbolos são sinais visuais utilizados
DAS ÚLTIMAS GESTÕES DO GOVERNO DO ESTADO DA BAHIA
como um instrumento de persuasão, no jogo publicitário e ideológico das
instituições comerciais e também do poder público.
André Silva Nascimento*
Universidade do Estado da Bahia Sobre o uso das logomarcas, as empresas as usam para fins lucrativos.
andnasc2005@bol.com.br
A sua utilização dá ao público consumidor uma autenticidade sobre o produto
Luzimare Almeida Piloto**
Universidade do Estado da Bahia comercializado, passando assim a distinguir uma empresa da outra e seu
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
luzimareap@yahoo.com.br grau de funcionalidade. Acerca da análise desse recurso ideológico da
publicidade, não poderíamos deixar de lado, a sua importância na esfera
política. Analisaremos, portanto, uma mudança de logomarca do governo
RESUMO
Os textos publicitários são importante meio de persuasão, que utilizam de diferentes formas simbólicas para
atingir a um ou a vários públicos. As logomarcas constituem parte importante desta cadeia simbólica, que
Jacques Wagner e Paulo Souto, mostrando as mudanças discursivas e
está presente também na esfera política. Este trabalho tem como objetivo fazer uma análise discursiva dos
slogans presentes nas logomarcas, que circularam nos últimos governos do Estado da Bahia, fazendo um
ideológicas no cenário estadual, conjunto de temas e de figuras que
paralelo entre as ideologias que estabelecem uma relação entre a linguagem e a construção da identidade
baiana, vez que houve uma ruptura no poder político nas últimas eleições. interferem na construção do sujeito.

PALAVRAS-CHAVE: Identidade. Marketing. Propaganda. Slogan. Ideologia.

MATERIAL E MÉTODOS

O corpus do trabalho foi constituído dos Slogans encontrados nas


INTRODUÇÃO logomarcas utilizadas nas últimas gestões do governo do Estado da Bahia,
correspondente ao período entre 2003 e 2007. Material divulgado em todos
Conforme Gonçalves (2006, p. 14), a linguagem publicitária, como uma os documentos oficiais e propagandas dos órgãos públicos, ligados ao
das linguagens sociais, utilizando elementos característicos da sociedade, da governo. Os textos utilizados para análise foram: GOVERNO DA BAHIA.
época e do meio, também recorta a realidade e enfatiza aspectos que TERRA DE TODOS NÓS, correspondente ao atual governo, que assumiu o
revelam o mundo que se quer “vender” ou o ponto de vista que se deseja Estado este ano; e GOVERNO DO ESTADO DA BAHIA TRABALHANDO PRA
construir. Para tanto, esses textos publicitários são muitas vezes VOCÊ VIVER MELHOR, correspondente ao governo anterior, do ex-
governador Paulo Souto. Assim, foi feito um estudo comparativo dos dois
slogans, objetivando verificar as marcas ideológicas presentes nos dois
* Graduando do 4º semestre do Curso de Letras- Uneb, campus XX- Brumado.
** Professora do Curso Letras da Uneb, Campus XX- Brumado; Uesb, Campus de Itapetinga. Especialista em Lingüística Aplicada ao Ensino do textos.
Português. Especialista em Alfabetização. Orientadora do trabalho.
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .313-316. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
315 316
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RESULTADOS E DISCUSSÃO histórico em que palavras, expressões, proposições são produzidas ”.

Após análises, verificamos que na logomarca do atual governo do REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


Estado da Bahia, existe uma relação próxima com o slogan do governo
BRANDÃO, H. H. N. Introdução à Análise do Discurso. 2. ed. rev.
federal, BRASIL UM PAÍS DE TODOS NÓS. Há associação ideológica ao Campinas: Editora da Unicamp, 2004.
discurso do governo Jacques Wagner, governo liderado por um ex- GONÇALVES, E. M. Propaganda e Linguagem: análise e evolução. São
Bernardo do Campo: Universidade Metodista de São Paulo, 2006.
sindicalista, visão política de “esquerda” e cuja temática objetiva ser voltada
ORLANDI, E. P. Análise de discurso: princípios e procedimentos. 4. ed.
para área social. Contrasta-se-se com a outra temática do governo
Campinas: Pontes, 2002.
antecessor de Paulo Souto, político de “direita”, visão considerada PÊCHEUX, M. Semântica e Discurso: uma crítica à afirmação do óbvio.
“neoliberal” vertente histórica centralizada na concentração de renda através Trad. Eni Orlandi et al. Campinas: Editora da Unicamp, 1988 (título original:
Lês vérites de la Palice, 1975).
da indústria, comércio, turismo, agricultura, pecuária e pesca. Conforme
Orlandi (2002, p.42) as palavras mudam de sentido segundo as posições
daqueles que a empregam. Nos slogans tanto do governo Jaques Wagner
quanto do governo Paulo Souto, verificamos posições distintas do sujeito:
enquanto no primeiro se concentra no plural (nós); o segundo focaliza o “eu”
como agente principal para beneficiar o “tu” ou “vós. Assim, como afirma
Pêcheux (apud Brandão, 2004, p. 79) “Os indivíduos são interpelados em
sujeito falantes pelas formações discursivas que representam, na linguagem,
as formações ideológicas que lhe correspondem”. No caso dos slogans
analisados, foi possível verificar como as formações ideológicas governam as
formações discursivas.

CONCLUSÕES

Finalizamos com palavras de Pêcheux (1975, p. 144): “o sentido de


uma palavra, expressão, proposição, não existe em si mesmo [...] mas é
determinada pelas posições ideológicas colocadas em jogo no processo sócio-
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
317 318
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resenha? Para tanto, optamos pelas resenhas acadêmicas publicadas em


APONTAMENTOS SOBRE A CONSTITUIÇÃO
periódicos científicos da área de Lingüística (QUALIS A), especificamente as
DA AUTORIA EM RESENHAS ACADÊMICAS∗
resenhas publicadas na revista D.E.L.T.A. na versão digital. A opção justifica-

Carla da Silva Lima∗∗ se pelo fato de esses periódicos serem apontados como referência para o
Universidade Federal de Uberlândia
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia debate científico na área da Lingüística, e a escolha do gênero justifica-se por
carla.shine@gmail.com
se tratar de uma instância discursiva interessante para se observar formas de
constituição do sujeito-autor no campo acadêmico. Esse recorte temático

RESUMO apontou para a necessidade de trabalharmos a noção de gênero de discurso


Inscrito no campo teórico da Análise do Discurso francesa, o objetivo deste trabalho é defender a
hipótese de estudar a autoria mesmo em outros tipos de textos, para os quais não há apoiados em uma perspectiva discursiva. Em decorrência, nos filiamos à
necessariamente um autor, no sentido foucaultiano, mas apenas alguém que trabalha com e sobre
a linguagem. Para tanto, analisamos o processo de constituição da autoria no gênero de discurso
proposta formulada por Maingueneau (1984, 1987, 2006), o qual efetua um
resenha acadêmica considerando, como referência teórica para essa discussão, não só as reflexões
deslocamento interessante da categoria de gênero, ao menos para os
de Foucault (1969, 1971), mas também as de Possenti (2001, 2002), que defende uma concepção
de autoria como alternativa para análise de textos escolares. propósitos deste trabalho. Partimos, assim, da noção de cena de enunciação,
PALAVRAS-CHAVE: Autor. Autoria. Gênero de discurso. tal como proposta pelo autor, particularmente do que ele define como quadro
cênico do discurso – a cena englobante e a cena genérica - como referência
para a análise da categoria de gênero e de suas coerções sobre os processos
de constituição da autoria.

INTRODUÇÃO
MATERIAL E MÉTODOS

Neste trabalho, partimos do desafio de pensar que autor é esse, que


não é foucaultiano (por não ser autor de obra e/ou fundador de Possenti formula sua proposta a partir do paradigma indiciário, pois
discursividade) e nem de textos escolares, como propõe Possenti, para considera que a autoria se encontra por meio de marcas que funcionam
refletirmos sobre a seguinte questão: como um sujeito se constitui sujeito- como indícios do trabalho do sujeito com a linguagem. Os pressupostos
autor no campo acadêmico, por meio da inscrição no gênero de discurso teórico-metodológicos do paradigma indiciário de investigação, apresentado
por Ginzburg (1986) no texto “Sinais: raízes de um paradigma indiciário”,
lançam as bases de um modelo epistemológico que trata da reconstituição de

Este trabalho está vinculado ao projeto de pesquisa Processos de constituição de identidade na arte, na mídia e na educação, coordenado pela
Profª Drª Fernanda Mussalim, junto ao Instituto de Letras e Lingüística da Universidade Federal de Uberlândia/UFU.
∗∗
um gesto muito antigo de decifrar pistas, relacionando indícios. Através
Mestranda do programa de pós-graduação em Lingüística da Universidade Federal de Uberlândia/UFU. Professora do Dept° de Ciências
Humanas e Letras da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - UESB/Campus de Jequié.
_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .317-322.. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
319 320
_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________________________

desses pressupostos, Possenti visualiza a possibilidade de examinar, via posicionamento que se materializa nos textos, dentre outras maneiras, no
pistas, sinais, o processo de constituição da autoria e suas marcas. A modo como as formas lingüísticas são agenciadas na cena genérica
concepção de autoria apresentada por Possenti, bem como a metodologia de (resenha), a partir de condicionamentos históricos. No momento,
análise adotada pelo autor, parece-nos bastante apropriada para os fins investigamos a existência de marcas que estejam funcionando como indícios
desse trabalho, uma vez que a tarefa do analista do discurso se caracteriza de autoria nas resenhas, analisando o funcionamento de categorias
basicamente pela descrição de indícios que tornam possíveis relacionar um discursivas que permitem identificar uma posição enunciativa do sujeito.
texto a um certo discurso. Desta maneira, o presente trabalho sustenta-se, a Partimos do trabalho de Jaqueline Authier-Revuz (1990; 1998; 2004) sobre
partir da análise da superfície discursiva, na busca de indícios que permitam as heterogeneidades enunciativas, do qual selecionamos a categoria do
relacionar os textos analisados a uma prática discursiva. Isso implica em discurso relatado e as aspas de conotação autonímica como lugar privilegiado
assumir a idéia de que as marcas de heterogeneidade encontradas no fio do de onde pode se verificar modos de posicionamento do sujeito discursivo em
discurso – como se dá voz ao outro nas resenhas -, podem ser interpretadas relação ao Outro (outros posicionamentos) e, nesse sentido, aspectos da
como possíveis indícios de constituição de autoria, na medida em que constituição desse sujeito enquanto sujeito-autor no interior do gênero. A
apontam para o modo como o sujeito enunciador de uma resenha se análise feita até o momento aponta para o fato de que aquele que relata a
inscreve, toma posição para enunciar. fala de outro assume um posicionamento em nome do qual está enunciando.
Portanto, a interpretação, implícita ou explícita, presente no sintagma

RESULTADOS E DISCUSSÃO introdutor do discurso relatado, através da variedade lexical dos verbos
dicendi, das “descrições definidas” pelas quais um indivíduo pode ser
nomeado e dos elementos adverbiais suscetíveis de serem adjuntos do verbo
Com base nesse recorte teórico, passamos a refletir sobre a hipótese de
dicendi deve ser entendida, nos exemplos analisados, como condicionada
que a autoria é condicionada, regulada pelo que Maingueneau considera a
pelo posicionamento do sujeito que se inscreve no campo acadêmico para
cena de enunciação, particularmente pelo quadro cênico do discurso. O que
enunciar. Acreditamos que o que evidenciamos na análise até o momento
estamos assumindo é que o sujeito se inscreve na cena englobante
pode ser estendido ao restante do corpus, já que encontramos uma
acadêmica, mas somente se constitui na função-autor no interior de uma
regularidade no funcionamento do DR nos demais textos.
cena genérica. Acreditamos que, embora sofra coerções sócio-históricas, o
sujeito do discurso se inscreve de diferentes maneiras na cena englobante
acadêmica e estas inscrições produzem efeito de autoria a partir do CONCLUSÕES

posicionamento que o resenhista assume em relação ao outro,

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
321 322
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Pode-se dizer que o exercício da função-autor é condicionado pelo POSSENTI, S. Enunciação, autoria e estilo. Revista da FAEEBA, Salvador,
v. 10, n. 15, p. 15-21, 2001.
funcionamento do quadro cênico, já que o sujeito-autor de resenhas se
______. Indícios de autoria. Perspectiva – Revista do Centro de Ciências
inscreve nesse quadro para enunciar e constrói o seu posicionamento da Educação. Florianópolis, v. 20, n.1. p. 105-124, jan./jun.2002.
enquanto autor a partir das relações que estabelece com o Outro. A análise
inicial indicia que o modo como as citações são agenciadas nas resenhas
configura-se como um caminho possível para se definir traços que constituem
a autoria neste gênero.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AUTHIER, J. Heterogeneidade(s) enunciativa(s). In: Cadernos de estudos


lingüísticos, Campinas, n. 19, jul./dez. 1990.
______. Palavras incertas – As não-coincidências do dizer. Campinas:
Editora da UNICAMP, 1998.
______. Heterogeneidade mostrada e heterogeneidade constitutiva:
elementos para uma abordagem do outro no discurso. In: _____. Entre a
transparência e a opacidade: um estudo enunciativo do sentido.
Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004.
______. Palavras mantidas a distância. In:_____. Entre a transparência e
a opacidade: um estudo enunciativo do sentido. Porto Alegre:
EDIPUCRS, 2004.
FOUCAULT, M. O que é um autor? ? Lisboa: Veja Passagens,1971. Edição
original: 1969.
______. A ordem do discurso. Tradução de Laura Fraga de Almeida.
Sampaio. São Paulo: Edições Loyola, 1996. Edição original: 1971.
GINZBURG, C. Sinais – Raízes de um paradigma indiciário. In: _____. Mitos
Emblemas Sinais: Morfologia e História. Tradução de F. Carotti. São
Paulo: Companhia das Letras, 1986.
MAINGUENEAU, D. Gênese dos discursos. Curitiba: Criar Edições, 2005.
Edição original: 1984.
______. Novas tendências em Análise do Discurso. 3 ed. Campinas, SP:
Pontes, 1997. Edição original: 1987.
______. Discurso literário. São Paulo: Contexto, 2006.
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
323 324
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mundo, seu conhecimento acerca de determinados assuntos, dentre outros,


CONSIDERAÇÕES SOBRE A CENA ENUNCIATIVA:
permitirão aos ouvintes construírem a imagem do enunciador.
A CONSTRUÇÃO DO ETHOS NOS BLOGS∗
Na Análise do Discurso, a terminologia ethos diz respeito a textos orais

Palmira Heine∗∗ e escritos, nos quais os enunciadores reivindicam uma certa imagem de si.
Universidade Federal da Bahia
pheine@ig.com.br Para discorrer sobre o ethos é imprescindível retomar a tradição proveniente
da Grécia, focalizando principalmente a teoria de Aristóteles, que foi o
responsável por sistematizar a Retórica como a arte da persuasão.
RESUMO
O resumo expandido ora apresentado pretende tecer algumas considerações acerca da construção A Análise do Discurso, tendo como principal expoente nos estudos do
do ethos em blogs, na Internet, tendo como ponto de partida as conclusões obtidas na dissertação
de mestrado intitulada O ethos e a intimidade regulada: especificidades da construção do ethos no
ethos (MAINGUENEAU, 2005), vai retomar o conceito aristotélico de ethos
processo de revelação da intimidade em blogs na Internet. Para isso, utilizam-se alguns
quando afirma que este é a imagem de si no discurso. No entanto, vai além
pressupostos teóricos da Análise do Discurso, tendo como base a concepção de ethos postulada
por Maingueneau (2005). Tomam-se também emprestadas algumas noções postuladas pela dos estudos elaborados pela Retórica, pois pretende analisar as imagens
Retórica, uma vez que o conceito de ethos não pode estar totalmente desvinculado dos estudos
retóricos. Objetiva-se, portanto, estabelecer uma discussão acerca do modo que o ethos é criadas pelos enunciadores no discurso, baseando-se não apenas em
construído num veículo público (a Internet), dentro de um gênero discursivo de caráter intimista -
o blog, observando suas especificidades e características. situações de eloqüência judiciária ou em enunciados orais, mas se
PALAVRAS-CHAVE: Ethos. Blog. Internet. estendendo a todo e qualquer discurso.

MATERIAL E MÉTODOS

INTRODUÇÃO
O corpus da pesquisa circunscreveu dois blogs de adolescentes. O blog
é uma espécie de diário virtual público onde as pessoas escrevem sobre si.
Todo discurso pressupõe a construção de uma imagem daqueles que
Assemelha-se aos diários privados por expressar também facetas da vida
estão envolvidos no processo comunicativo. Segundo Amossy (2005, p. 9),
pessoal, mas diferencia-se destes pelo caráter aberto e público já que é
“todo ato de tomar a palavra implica a construção de uma imagem de si”.
veiculado na Internet. A fim de perceber a forma como o ethos se constituiu
Para construir tal imagem, não é necessário que o enunciador fale sobre si ou
nos blogs, aplicou-se o esquema proposto por Maingueneau (2005) citado a
apresente para os ouvintes suas características, pois, no momento do
seguir:
discurso, lançam-se pistas acerca desta imagem: seu estilo, sua visão de


Financiamento FAPESB.
∗∗
Doutoranda em Lingüística pela Universidade Federal da Bahia - UFBA.
_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .323-327. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
325 326
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Ethos das categorias apresentadas no esquema supracitado, como um elemento


que envolve a corporalidade, o caráter do enunciador e a representação de
um fiador, categorias inerentes à cena enunciativa na qual o ethos é
Ethos pré-discursivo Ethos discursivo
encenado.
Pode-se afirmar, portanto, que no blog há a revelação de uma
Ethos dito Ethos mostrado
(referências diretas intimidade restrita, regulada pelo olhar do outro, regulada pela possibilidade
ao enunciador, cenas validadas)
dos escritos irem parar nas mãos de pessoas desconhecidas, uma vez que a
Internet é um espaço público.
Diferentemente dos diários tradicionais, que eram escritos para que não
Estereótipos
fossem lidos pelo “outro”, ou para que se mantivessem em esconderijos
Segundo tal esquema, o ethos compõe-se de duas partes: o ethos pré- secretos, os blogs são escritos para serem lidos. As mensagens ali postadas
discursivo e o ethos discursivo. Este último engloba as noções de ethos dito e destinam-se ao “outro” conhecido. Portanto, falar das atitudes cotidianas e
ethos mostrado. O ethos dito seria aquele criado através das referências não de problemas realmente particulares é a tônica desse gênero discursivo,
diretas ao enunciador, enquanto o ethos mostrado estaria no domínio do não que não pode ser considerado como a reedição do diário tradicional no meio
explícito, da imagem que não está diretamente representada no texto, mas digital.
que pode ser construída através de pistas seguidas pelo auditório. Na base Assim, não se pode afirmar que os blogs representam apenas a
do esquema, estão os estereótipos que são representações culturais fixas de transposição do diário íntimo escrito para o meio digital. Eles representam
modelos pré-construídos, usados para atribuir algumas características e não sim uma nova forma de escrita da intimidade que pressupõe a aceitação do
outras ao enunciador. “outro”, a adequação do discurso ao olhar de um outro conhecido ou
anônimo, gestado no seio do hipertexto.
RESULTADOS E DISCUSSÃO Enquanto o diário tradicional era escrito para que ninguém o lesse43, e,
portanto, permitia um maior grau de revelação da intimidade, o blog é
A concepção de ethos para a Análise do Discurso, conforme esquema compartilhado com centenas ou milhares de internautas que navegam
de Maingueneau (2005), não está ligada apenas ao enunciador, mas se cotidianamente no ambiente hipertextual, regulando o discurso dos
apresenta como uma categoria interativa, uma vez que a imagem dos
43Vale ressaltar que o fato de o diário tradicional ser escrito com o objetivo de ser secreto, não significa que o discurso do mesmo não seja
enunciadores se adequam às expectativas de um auditório particular, que permeado pelo outro. Bakhtin (1997) considera que toda a enunciação é socialmente dirigida. Segundo ele (1997, p. 113) “a situação social mais
imediata e o meio social mais amplo determinam completamente e, por assim dizer, a partir do seu próprio interior, a estrutura da enunciação”.
Assim, toda a enunciação é social, mesmo um monólogo representará uma carga interativa do “eu” discursivo com o “outro”, representado pelo
direciona e dirige o discurso dos primeiros. O ethos efetivo constitui-se, além desdobramento do eu.

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327 328
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escreventes, contribuindo para a criação do ethos dos blogueiros. Este será


também sempre permeado pelo “outro”, que interagirá com o enunciador na
formação da sua auto-imagem.

CONCLUSÕES

O blog é uma nova forma de revelação da intimidade já que revela uma


intimidade restrita, guiada pelas expectativas de um auditório que direciona o
discurso bloguístico.
Não é pretensão deste trabalho, esgotar a análise do ethos nos blogs.
Objetiva-se aqui lançar bases para a reflexão sobre essa questão que se
relaciona com as novas formas de relações sociais surgidas com o advento da
Internet.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMOSSY, Ruth. O ethos na análise do discurso de Dominique Maingueneau.


In: _______. Imagens de si no discurso: a construção do ethos. São
Paulo: Contexto, 2005. p. 16-17.
BAKHTIN, M. Marxismo e filosofia da linguagem. Tradução de Michel
Lahud e Yara Frateschi Vieira. São Paulo: Hucitec, 1997. Edição original:
1929.
MAINGUENEAU, Dominique. Ethos, cenografia e incorporação. In: AMOSSY,
Ruth. Imagens de si no discurso: a construção do ethos. São Paulo:
Contexto, 2005. p. 68-92.

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329 330
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por meio dos estudos de Jean-Jacques Courtine, professor na Sorbonne


CORPO E DISCURSO: A BUSCA PELA
Nouvelle, Paris III, pesquisador expoente no interior da Análise do Discurso.
VISIBILIDADE NAS PAGINAS DO ORKUT∗
Neste estudo, buscamos, inicialmente, centrarmo-nos numa
∗∗
Gracielly Bittencourt Machado comunidade do Orkut intitulada EU ME AMO E SOU CORRESPONDIDO. Assim,
Universidade estadual do Sudoeste da Bahia
Gracielly87@hotmail.com
observaremos como, dentro de uma determinada comunidade virtual, se
∗∗∗
Nilton Milanez
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
produzem as bases que firmam os deslocamentos da vida privada para a
niltonmilanez@hotmail.com
pública, calcados sobre a idéia de uma sexualização das imagens
apresentadas pelos participantes em seus perfis. Essas imagens e textos

Resumo compõem uma rede de discursos e constituirão enunciados.


Este trabalho visa à investigação e discussão das imagens utilizadas pelos usuários do sítio de
relacionamentos, Orkut. Para tanto, focalizaremos a publicização das intimidades dos corpos
Conceito fundamental para o método arqueológico de Foucault, o
veiculados em fotos virtuais. O corpo, então, tomado como discurso nos reenvia à fala e aos
enunciado é a unidade elementar do discurso. É justamente por sua função
gestos que configuram a posição de um sujeito que se articula entre seu desejo e as normas
sociais. Assim, corpo e identidade se formatam no interior de uma rede discursiva que nos enunciativa, o fato dele ter sido produzido por um sujeito em um lugar
arremessa a corpos virtuais numa busca incessante para alcançar visibilidade e firmar suas
posições como sujeitos em uma sociedade que abarca identidades múltiplas. institucional determinado por regras sócio-históricas, que se pode definir as
PALAVRAS CHAVES: Corpo. Discurso. Identidade. Imagem. Orkut. Sexualidade. formações discursivas presentes no Orkut.

MATERIAL E METODOS

INTRODUÇÃO
O Orkut é uma ferramenta que possibilita a construção de uma rede de
amigos virtuais, objetivando visibilidade e expressão pública de idéias.
O presente trabalho se insere na Análise do Discurso de orientação
Entrelaçando discursos produzidos nas relações entre língua, imagens, sujeito
francesa, fundamentada sob os postulados de Michael Foucault. Este estudo
e história, as materialidades ali produzidas fornecem material substancioso
desenvolvido na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB) conta
para a compreensão das identidades a partir da maneira como as fotos de
com a colaboração de pesquisadores em universidades brasileiras como a
corpos sexualizados se constituem e gerenciam gestos, posturas e atitudes
UNESP, UFU, UEM e UFSCAR e se vincula a uma pesquisa ainda mais ampla,
no interior dessa rede discursiva.
Para Fernandes (2007, p. 21) analisar o discurso implica interpretar os

Trabalho vinculado ao projeto “Corpo e Discurso: lugares de memória das identidades brasileiras na mídia e na literatura”, coordenado pelo
professor Dr. Nilton Milanez. sujeitos falando, tendo a produção de sentido como parte integrante de suas
∗∗
Graduanda do curso de Comunicação Social /Jornal ismo da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. Discente
voluntária no projeto de pesquisa supracitado.
∗∗∗
atividades sociais. Outro conceito fundamental para entender a formação dos
Doutor em lingüística /Análise do discurso. Professor do Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários da UESB.
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .329-333. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
331 332
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sujeitos, bem como, sua posição diante das diferentes vozes que o possível encontrar uma similaridade entre as imagens expostas no orkut e as
permeiam, é o conceito de enunciado. Foucault diferencia o enunciado das imagens veiculadas nos meios de comunicação, especialmente nas revista de
frases, da proposição e dos atos de linguagem e conceitua que o que celebridades. Na revista Caras, por exemplo, nas quais essa idéia da piscina
constitui um enunciado é justamente sua função enunciativa. ou da praia está atrelada à liberdade, à riqueza, a ser famoso. Vemos, então,
É importante distinguir também as noções de sujeito e enunciado. pessoas comuns, em suas páginas do orkut, querendo ser vistas como
Parafraseando Fernandes (2007, p. 109), o sujeito é constituído na interação celebridades.
social, não é o centro do seu dizer, em sua voz um conjunto de outras vozes Outro aspecto interessante é a significação dada à palavra amor no
heterogêneas se manifestam. Para que o enunciado exista, é necessário que título da comunidade. De acordo com o Novo dicionário Aurélio, o amor é um
haja uma instância produtora, um autor, mas essa função pode ser exercida sentimento de dedicação a algum ser ou a alguma coisa. Entretanto, as
por diferentes sujeitos. Assim, descrever uma função como enunciado palavras podem ter sentidos diferentes a depender dos contextos, em
consiste em determinar qual a posição que pode e deve ocupar todo decorrência dos diferentes lugares socioideológicos ocupados pelo sujeito.
indivíduo para ser sujeito. Nesse caso, o amor não é dedicado ao outro, mas, a si mesmo. Essa
concepção suscita a lenda grega de Narciso, rapaz muito bonito e indiferente
RESULTADOS E DISCUSSÃO ao amor que, ao debruçar-se numa fonte de água, viu seu rosto e apaixonou-
se pela própria imagem. Permanceu nessa posição até morrer. No local de
A comunidade EU ME AMO E SOU CORRESPONDIDO com 139.266 sua morte, nasceu uma flor de beleza singular. Essa posição dos sujeitos
membros é descrita numa só frase: “O que podemos fazer se somos integrantes da comunidade evoca o que poderíamos chamar de uma
maravilhosos!”. Os membros desta comunidade, em geral, são pessoas concepção ‘narcisista’ do amor.
jovens de ambos os sexos. Nas páginas iniciais de muitos participantes, há O discurso do corpo no orkut é um discurso polifônico. Por trás das
fotos performáticas. Nos álbuns, entre as fotos de amigos, da família, de vozes desses sujeitos estão sobrepostas diversas outras vozes presentes no
viagens, há uma grande incidência de fotos em praias e piscinas. A partir interior das sociedades modernas, discursos que remontam outros. Através
dessas imagens, é possível analisar como esses sujeitos constroem suas das imagens expostas no orkut falam o discurso das sexualização dos corpos,
identidades a partir do corpo que mostram. Pode-se notar que as pessoas da midiaticidade, do padrão de beleza vigente. Esse discurso do corpo
que veiculam essas fotos fazem parte do padrão de beleza de nossa época. perfeito e sexuado se insere e se constrói na história reforçado pela imprensa
Tanto que, quem é gordo ou velho não veicula uma foto desse tipo. Isso e pela publicidade.
reforça um ideário de beleza e, mais do que isso, compõe sujeitos marcados
por uma determinada sexualidade mostrada. Se observarmos melhor, é
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CONCLUSÃO

Ao entrarmos em contato com essa rede discursiva em torno das


imagens apresentadas no Orkut refletimos sobre as posições do sujeito em
nossa sociedade. Compreender a maneira como o discurso do corpo perfeito
e da sexualização se fazem presentes nas páginas deste site é perceber como
a construção dos discursos e das identidades dos sujeitos é marcada por
aspectos históricos sociais e culturais.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FERNANDES, C. A. Análise do discurso: Reflexões introdutórias. São


Carlos: Claraluz, 2007.
FERREIRA, A. B. de H. Novo dicionário Aurélio da lingua portuguesa. 3
ed rev atual. Curitiba: Positivo, 2004
FOUCAULT, M. Arqueologia do Saber. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 2000.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
335 336
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cotas em universidades aparecem como um dos mecanismos de respostas


DESIGUAIS EM IGUALDADE:
dado para a questão da desigualdade racial e social. A cobrança e a pressão
UMA ANÁLISE DOS DISCURSOS NOS MANIFESTOS CONTRA E A
FAVOR DO PROJETO DE LEI Nº 73/99 (LEI DE COTAS)∗ exercida pela sociedade civil fazem a tramitação da passagem da questão de
mera situação subjetiva estampada nos discursos dos atores sociais a uma
∗∗
Fábio Soares Gomes situação objetivamente considerada, na medida em que o Estado passa a se
Universidade Católica do Salvador
soaresgomes@web.de manifestar em nível de políticas públicas para dar respostas ao problema. A
grande questão é que a sociedade brasileira não tem uma visão única em
relação às cotas. Eis que dois manifestos, um contra e outro a favor, foram
RESUMO
O presente texto propõe-se a analisar como o conceito e a noção de igualdade são articulados nos assinados por personalidades dos mais variados setores da sociedade
discursos, ou melhor, nos manifestos que foram publicados e endereçados ao congresso nacional,
aos deputados e senadores, a fim de validar, como é o caso do manifesto em favor das cotas, e brasileira e endereçados ao Congresso Nacional: um, pedindo a votação e
negar, como é o caso do manifesto contra as cotas, a adoção da discriminação positiva a partir do
critério racial na República Federativa do Brasil. aprovação do Projeto de Lei de Cotas, e o outro, abominando a tal iniciativa.
PALAVRAS-CHAVE: Análise do Discurso. Manifestos. Cotas. Igualdade. Interessante é que ambos os discursos justificam seus argumentos a partir
da igualdade.

MATERIAL E MÉTODOS
INTRODUÇÃO

Para desenvolvermos nossas análises, atentaremos à orientação


Reza nossa Constituição, em seu Artigo 5º: “Todos são iguais perante a
funcional que a noção de igualdade possui nos manifestos contra e a favor da
lei, sem distinção de qualquer natureza”. Em verdade, não significa que todos
Lei de Cotas. Atentaremos, sobretudo, ao objetivo que os discursos almejam
sejam iguais, intelectual ou fisicamente. Diz, porém, que há certos direitos
conseguir. Para que tal tentativa seja bem sucedida, teremos como
básicos comuns a todos os “cidadãos”, independentemente de sua “raça” ou
parâmetro as orientações sinalizadas por Gill (2002) e Orlandi (2003).
capacidade intelectual. Como a questão da desigualdade se tornou relevante
Destarte, perscrutaremos com bastante atenção ao sentido que é atribuído à
e cada vez mais prioritária no debate político nacional, emergiu a necessidade
“igualdade” buscando notificar as identidades e diferenças entre os discursos.
de o Estado dar respostas em nível de políticas públicas. Por ser um debate
Por outro lado, levando em consideração que os discursos não estão
que garantiu lugar na agenda política brasileira e de muitos dos Estados, as
ocorrendo em um vácuo social, e sim num momento em que a emoção serve

Pesquisa realizada com recursos concedidos pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia, FAPESB, mediante bolsa de mestrado.
Sob a orientação da Dra. Mary Garcia Castro e desenvolvida no NPEJI, Núcleo de Pesquisa e Estudos Sobre Juventude, Identidade e Cidadania, também de fundamentação, é válido enfatizar que ambos, tanto o manifesto
da Universidade Católica do Salvador.
∗∗
Bacharel em Filosofia (UCSal), Licenciado em Ciências Sociais (UFBA) e Mestrando em Políticas Sociais (UCSal). contra como o a favor têm uma dimensão de prática social e política as quais
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .335-340. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
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procuraremos explicitar mediante análise de fragmentos de ambos os intuitos. Para o manifesto anti-cotas, a igualdade já é dada e existente no
discursos. contexto brasileiro, ainda que em um sentido meramente formal. É, pois, por
não se deter ao aspecto meramente formal da igualdade que o manifesto
RESULTADOS E DISCUSSÃO pró-cotas tem uma conotação distinta do manifesto anti-cotas. A igualdade
tem o sentido de fundamento nos dois manifestos. O mesmo é dizer: os dois
Em linhas gerais, podemos dizer, de modo antecipado, que há uma discursos têm como meta a igualdade. A questão que nos interessa é: como
desigualdade no conteúdo e na forma em que o conceito de igualdade é pode a igualdade ser o fundamento primordial em ambos os discursos se eles
trabalhado pelos discursos expressos nos manifestos, tanto a favor como vão de encontro um ao outro, principalmente em torno da questão da
contra as cotas. Segundo o manifesto em favor das cotas, a igualdade tem a igualdade? Como podem ser opostos e terem como fundamento de suas
possibilidade de uma concretização e proveniência essencial a partir da premissas e posicionamento ideológico o mesmo conceito? Será que em
implementação das cotas, posto que a mesma apareça enquanto um algum dos manifestos está havendo uma aplicação inadequada da noção de
mecanismo de “igualação”. Por outro lado, no manifesto contrário, as cotas igualdade? Como se estruturam tais discursos?
não só não igualam como desigualam os cidadãos, tornando-os desiguais O manifesto a favor das cotas se posiciona, podemos dizer, de forma
entre si. De acordo com os autores do manifesto contrário às cotas, intitulado progressista em relação ao fenômeno da desigualdade e ativista em relação
“Todos têm direitos iguais na República Democrática” (2006, p. 1), o princípio aos mecanismos de igualação, uma vez que tem a igualdade enquanto objeto
da igualdade a que nos referimos anteriormente em que dita que todos nós a ser alcançado e se propõe a obtê-la mediante mecanismos objetivos, a
somos iguais perante a lei, encontra-se “ameaçado de extinção” em virtude saber, as ações afirmativas, baseadas na discriminação positiva daqueles que
dos diversos dispositivos que se encontram presentes nos projetos de Lei de foram lesados pelos processos históricos. Por outro lado, de vez que almeja a
Cotas (PL 73/1999) e do Estatuto da Igualdade Racial (PL 3.198/2000), os mera manutenção do sentido abstrato da igualdade, isto é, a igualdade
quais se encontram em tramitação no Congresso Nacional. De acordo com formal, o discurso anti-cotas expresso no manifesto contra as cotas tem uma
este manifesto, o perigo da extinção da igualdade nasce das reservas de configuração reacionária, pois se posiciona em relação à igualdade como já
vagas, as cotas, nas instituições federais de ensino de modo compulsório dada e efetivada, necessitando apenas de um maior desdobramento em sua
para indígenas e negros, de um lado, e dos benefícios pré-sinalizados aos plenitude material. Mas, como alcançar essa tal igualdade material? Eis uma
negros no Estatuto da Igualdade Racial, de outro. das fontes da desigualdade da igualdade presente nos discursos, isto é, nos
É possível afirmarmos que, para o manifesto pró-cotas, a igualdade é manifestos contra e a favor das cotas.
um direito a ser adquirido e alcançado, ainda. Daí a necessidade das cotas, O princípio da igualdade tão defendido pelo movimento anti-cotas é o
pois estas se apresentam como uma forma viável de concretização desses mesmo que acompanha a história republicana brasileira, desde a sua gênese
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com a Constituição de 1889, a qual, de acordo com o manifesto pró-cotas ORLANDI, E. Análise de discurso: princípios & procedimentos.
Campinas: Pontes, 2003.
(2006, p. 1), “facilitou a reprodução do racismo ao decretar uma igualdade
GILL, R. Análise de discurso. In: GASKELL, G.; BAUER, M. (Org). Pesquisa
puramente formal entre todos os cidadãos”, onde os negros, com o fim da qualitativa com texto, imagem e som. Petrópolis: Vozes, 2002, p. 244-
escravidão, foram colocados numa situação de extrema exclusão no que diz 270.
respeito à terra, à renda e ao conjunto de direitos sociais que são definidos
até hoje como sendo direito de todos. Para o manifesto pró-cotas tanto as
reservas de vagas como o Estatuto da Igualdade Racial querem transformar
em ação concreta os valores de igualdade plasmados na Constituição de
1988.

CONCLUSÕES

Em ambos os manifestos a igualdade é tanto o clamor como o recurso


primordial nas fundamentações. No discurso contrário a igualdade é exposta
em situação de risco, na medida em que é sinalizado que este tipo de política
social tende conduzir a um apartheid no interior da sociedade, já para o
manifesto pró-cotas isto é falácia, pois a igualdade meramente formal é uma
igualdade inexistente posto que o apartheid já está instituído.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Manifesto em favor da lei de cotas e do estatuto da igualdade racial.


Disponível em: http://www.lpp-uerj.net/olped/documentos/1745.pdf,
consultado em 16/08/2006.
Todos têm direitos iguais na República Democrática. Disponível em:
http://www.geocities.com/cartapublica2006/, consultado em 16/08/2006.
CONSTITUIÇÃO da República Federativa do Brasil: promulgada em 5
de outubro de 1988, atualizada até a Emenda Constitucional nº 39 de 19 de
dezembro de 2002. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2003.

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341 342
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MATERIAL E MÉTODOS
ELEMENTOS CONSTITUINTES DO DISCURSO:
UMA ANÁLISE EM REDAÇÕES ESCOLARES
O material analisado foram 120 textos escritos por alunos da 7ª série do

Jamires Nobre Menezes de Oliveira44 Ensino Fundamental, pertencentes a faixas etárias diferentes (entre 12 e 15
Universidade Estadual da Bahia
Jamiresnobre@gmail.com
anos), numa sala de aula de uma escola pública de Salvador-Bahia, no turno
matutino. O texto selecionado para exemplificação no presente trabalho
pertence a um aluno de 13 anos. A redação foi pedida pelo professor sem um
RESUMO tema específico, todavia deveria pertencer ao gênero instrucional, pois seria
Este trabalho apresenta os elementos constituintes do discurso estabelecidos entre o locutor e o
alocutário. Esses tópicos fazem parte dos pressupostos teóricos da Análise do Discurso francesa, atribuída uma nota àquela atividade. Os alunos tiveram cem minutos para
derivada da linha de Michel Pêcheux. Em seu trabalho de análise do discurso, estabeleceu que as
condições de produção do discurso, a partir da ação das regras e normas que os interlocutores concluir o exercício solicitado pelo docente.
estabelecem entre si e dos lugares que ocupam na estrutura de uma formação social,
estabelecem, a priori, as formações discursivas. Chegou-se à conclusão que a identificação dos
elementos indispensáveis ao discurso são importantes para a compreensão do texto produzido
pelo aluno em sala de aula. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Palavras-chave: Interlocutores. Discurso. Redação.

Nos textos que serviram de análise, escritos pelos alunos, percebeu-se


que em todo ato de comunicação, como nos informa Pêcheux, há os
elementos indispensáveis do discurso e que esses elementos estarão sempre
INTRODUÇÃO
imbricados no jogo de imagens estabelecido pelos interlocutores no ato de
enunciação. A linguagem passa a ser entendida como a intermediária entre o
O presente trabalho, embora incipiente, teve por objetivo identificar os
homem e a realidade natural e social. Essa intermediação é o discurso. O
elementos indispensáveis presentes nos textos produzidos por alunos do
discurso desempenha o papel de possibilitar a significação e a resignificação
Ensino Fundamental. Para tanto, utilizaram-se especificamente os
do homem no mundo. O homem é compreendido dentro das relações
pressupostos teóricos da Análise do Discurso francesa, derivada da linha de
estabelecidas através da linguagem: as condições de produção e seu
Michel Pêcheux, para encontrar, nas redações, formulações que remetam às
contexto histórico-social. Não deve haver dissociação entre esses elementos.
condições de produção vivenciadas pelos adolescentes. Além dos trabalhos
O discurso constitui o indivíduo que por sua vez reflete uma ideologia
de Pêcheux (1989; 1990), recorremos também aos textos de Orlandi (1999)
materializada na linguagem. A linguagem é o elo estruturante do indivíduo.
e Gregolin (2005).

44 Mestranda em Estudo de Linguagens.

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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .341-343. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
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CONCLUSÕES

No texto do aluno, é possível perceber que o conhecimento não está


somente no meio externo, mas é construído pela interação. O interior
influencia o exterior e vice-versa. O estudante ciente da sua posição em
relação ao professor e à escola escreve aquilo que, segundo ele, atenderá ao
“acordo prévio” estabelecido entre ele e o docente a fim de atingir um
objetivo específico: uma nota para aprovação.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

GREGOLIN, R. Foucault e Pêcheux na análise do discurso: diálogos e


duelos. São Carlos: Claraluz, 2005.
ORLANDI, E. Análise de Discurso: princípios e procedimentos.
Campinas: Pontes, 1999.
PÊCHEUX, M. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio.
Campinas: UNICAMP, 1988.
PÊCHEUX, M. "A análise de discurso: três épocas", reproduzido In: Por uma
análise automática do discurso - uma introdução à obra de Michel
Pêcheux, Campinas: UNICAMP, 1990.

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que cada um dos posicionamentos analisados insere-se em uma comunidade


ETHOS E POLÊMICA NA IGREJA CATÓLICA∗
discursiva que, por meio de diferentes práticas, materializa a imagem de um
fiador. Assim, o modo de enunciação e o estatuto do enunciador são indícios
Edvania Gomes da Silva ∗∗
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia que apontam para o funcionamento semântico dos discursos da TL e da RCC.
edvania_g@yahoo.com.br

MATERIAL E MÉTODOS
RESUMO
Este trabalho apresenta algumas considerações sobre o ethos de dois movimentos da Igreja
Católica: Teologia da Libertação (TL) e Renovação Carismática Católica (RCC). Trata-se de verificar Para realização desta pesquisa, procedemos à análise de materiais
em que medida o tom e a corporalidade dos discursos materializados nos textos desses dois
posicionamentos estão relacionados às suas respectivas semânticas globais e, conseqüentemente, produzidos no âmbito dos dois movimentos analisados. Para análise da ethos
à polêmica estabelecida entre ambos. As análises mostraram que, no discurso da TL, há a
materialização de um ethos intelectual e professoral. Já, o discurso da RCC materializa um ethos da TL, utilizamos os seguintes textos: 1) um editorial, publicado no jornal
profético, segundo o qual o enunciador é um mensageiro de Deus.
semanal O Lutador; e 2) um artigo publicado no Texto-base do XI Encontro
PALAVRAS CHAVE: Discurso. Ethos. Polêmica. Semântica Global.
Intereclesial das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs). No caso do ethos
carismático, procedemos à análise de: 1) um artigo de opinião, publicado na
revista Renovação; e 2) um texto publicado no Plano de Ação da RCC para o
ano de 2004. Esta seleção dos textos que compuseram o corpus deveu-se ao
INTRODUÇÃO
fato de se tratar de textos que foram publicados em meios de comunicação
que atingem, prioritariamente, pessoas ligadas aos dois movimentos
Neste trabalho, verificamos a constituição do ethos discursivo em dois
analisados.
movimentos da Igreja Católica surgidos no século XX: Teologia da Libertação
e Renovação Carismática Católica. Para tanto, analisamos textos escritos
RESULTADOS E DISCUSSÃO
produzidos pela coordenação desses dois movimentos. Com base na noção
de semântica global45, proposta por Maingueneau, partimos da hipótese de
Em relação ao discurso da Teologia da Libertação, verificamos a
existência de um ethos intelectual e também professoral. O tom é, ao mesmo
tempo, sapiencial e didático. Esse tom supõe a imagem de um fiador sábio,

Este trabalho foi elaborado com base em um dos capítulos da minha tese de doutorado, cujo título é “Os (des)encontros da fé: análise inteligente e também preocupado com a instrução dos menos favorecidos.
interdiscursiva de dois movimentos da Igreja Católica”, defendida no Programa de Pós-graduação em Lingüística do IEL/UNICAMP.
∗∗
Doutora em Lingüística pela UNICAMP. Membro do Grupo de Pesquisa em Estudos Lingüísticos (GPEL/CNPq/UESB) e do Grupo de Pesquisa
em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB). Professora do Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários da Uesb - Campus de Vitória da Trata-se da materialização da imagem do intelectual cristão, ou mesmo do
Conquista.
45 Segundo essa hipótese, todos os planos do discurso estão integrados e contribuem para a constituição de um corpo discursivo.
intelectual de esquerda: culto, equilibrado, engajado e disposto a formar
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .345-349. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
347 348
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outros companheiros de caminhada. É o que podemos verificar no exemplo


abaixo: O primeiro parágrafo do exemplo é uma espécie de vocativo, por meio
do qual o fiador do texto saúda seu leitor. Além disso, o enunciado “Louvado
Exemplo 1 seja o nome de nosso Senhor Jesus Cristo!” revela a imagem de um fiador
Jesus de Nazaré é, pois, o protótipo que o Pai nos ofereceu e em quem todos nós,
cristãos, devemos espelhar-nos para responder aos desafios de nossa fé, nas fervoroso na fé e disposto a “proclamar a glória de Deus” (cf. ABIB, 1995). O
circunstâncias concretas do dia-a-dia.
ponto de exclamação confere ao enunciado um tom exaltado. Além disso, os
Aqui, os termos protótipo, espelhar-nos e pautar-se são exemplos de enunciados curtos reforçam o tom categórico do texto, pois supõem uma
uma escrita formal. Além disso, nota-se o uso de intercaladas que também enunciação clara, direta e sem rodeios.
conferem ao texto um tom de maior elaboração. Dessa forma, o texto
apresenta um tipo de construção que se repete: por meio de orações CONCLUSÕES
encaixadas, apostos e adjuntos, o fiador apresenta-se como um professor
que vai mostrando/explicando ao seu co-enunciador como este deve agir se Os indícios textuais encontrados nos exemplos analisados apontam para
quiser ser um “verdadeiro cristão”. Para tanto, esse fiador assume um caráter um modo de enunciação característico do discurso da Teologia e para um
intelectualizado e escreve em tom instrutivo. outro, constitutivo do discurso carismático. Essas duas “formas” de habitar o
Por outro lado, o discurso da RCC confere ao seu fiador a imagem de espaço discursivo são, pela sua própria constituição semântica, polêmicas.
um homem de Deus. Esse fiador é, acima de tudo, um evangelizador. Por Afinal, ambas partilham de um mesmo espaço discursivo e, por isso,
isso, ele se dirige ao seu co-enunciador em tom convicto, direto e, algumas disputam o direito de habitá-lo.
vezes, exaltado. Esse tom remete a um caráter sangüíneo e a um corpo de
postura firme. Trata-se de um ethos profético, pois o enunciador assume a REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
imagem de um mensageiro de Deus. A linguagem materializada nos textos ABIB, J. Aspirai aos dons espirituais. São Paulo: Loyola, 1995.
da RCC prima pela simplicidade. Frases diretas e períodos curtos, quase sem COMBLIN, J.; LIBÂNIO, J. B.; CAVALCANTI, R. Correntes de espiritualidade –
valores e limitações. In: Texto Base do XI Intereclesial. Belo Horizonte: O
subordinações. Construções sintáticas que muito se aproximam dos textos
Lutador, 2004, pp. 13-29.
orais. É o que podemos verificar no seguinte exemplo: JORNAL O LUTADOR. Editorial – Seguir Jesus no compromisso com os
excluídos. Belo Horizonte: O Lutador. 21-31 de jul. 2005.
Exemplo 2 MAINGUENEAU, D. Gênese dos discursos. Trad. Sírio Possenti. Curitiba,
Prezados irmãos e irmãs, louvado seja nosso Senhor Jesus Cristo! Criar, 2005. Edição original: 1984.
A Renovação Carismática ao anunciar e viver a Palavra de Deus, se insere na missão
que Jesus deu à sua Igreja, evangelizar.
No Brasil, a RCC está completando 35 anos.

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349 350
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______. Ethos, cenografia e incorporação. In: Amossy, R. (org.). Imagens


de si no discurso. Trad. Dilson F. da Cruz; Fabiana Komesu e Sírio Possenti.
São Paulo: Contexto, 2005. Edição original: 1999.
PLANO DE AÇÃO DA RCC. Levanta-te Brasil, de joelhos! São Paulo:
Renovação Carismática Católica – BR, 2004.
REVISTA RENOVAÇÃO. Palavra do Presidente – Celebrando a Unidade.
Sorocaba, SP. Editada pelo Escritório Nacional da RCC do Brasil, n. 34, ano 6,
set./out. de 2005.

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351 352
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tempo a mídia tem definido e problematizado a questão da identidade do


EU SOU NORMAL? homem. O jogo discursivo, portanto, que permeia a relação do corpo com a
DISCURSO E CORPO NA REVISTA VEJA∗
revista, por exemplo, marca nossa constituição enquanto leitores e homens
contemporâneos.
Cássia Dias do Carmo∗∗
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia Este trabalho pretende pensar a maneira como a revista Veja trabalha
cassiad16@yahoo.com.br
na construção de sujeitos e suas identidades em nossa sociedade. Discutirei,
Nilton Milanez∗∗∗
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia portanto, a questão da (a)normalidade e sua inscrição nos sujeitos envolvidos
niltonmilanez@hotmail.com
no discurso midiático, discurso esse que influi na configuração dos modos de
ser/pensar/agir dos sujeitos leitores e de seus corpos. A fundamentação
RESUMO teórica reside na teoria da Análise do Discurso, de origem francesa e
Este estudo mostra a construção de sujeitos que se constituem a partir de técnicas de
remodelagem do corpo no interior das clínicas médicas. O corpus é a revista Veja, que propõe em desenvolvida no Brasil. Partindo também das propostas de Michel Foucault
seu discurso a construção de sentidos a respeito da constituição do sujeito histórico e seu corpo.
Destacamos, assim, que o corpo ocupa um domínio de memória que pode ser recuperado são usados os conceitos de enunciado, efeitos de sentido, discurso e sujeito
historicamente por meio das revistas e na inter-relação entre seus elementos constitutivos,
remetendo-nos a reinvenção de identidades. Analisaremos a forma de transmissão desse discurso para compreender as representações e encadeamentos de sentidos presentes
(no caso, a reportagem), que traduz e até mesmo reformula o discurso da clínica.
na narrativa da revista Veja. O objetivo primordial é analisar a maneira como
PALAVRAS-CHAVE: Corpo. Discurso clínico. Mídia. (A)normalidade.
a revista apresenta as questões da (a)normalidade e da construção da
identidade e suas inscrições nos corpos dos sujeitos envolvidos no discurso
midiático; esse discurso entendido como participante na configuração dos

INTRODUÇÃO modos de ser/pensar/agir dos sujeitos leitores e de seus corpos.

O corpo tem assumido centralidade na forma dos indivíduos se MATERIAL E MÉTODOS

relacionarem com o mundo: o ser humano adquiriu uma forte tendência de


se auto-exaltar e valorizar exageradamente seu próprio corpo buscando A discursividade dos corpos é apresentada na mídia impressa que os

várias formas de reestruturação deste para torná-lo belo, perfeito. Ao mesmo faz assumir caráter e identidade em suas páginas. Para o exercício da
observação dessa prática, tomo como exemplo a revista Veja, uma revista
brasileira de periodicidade semanal - que traz em seu corpo discursos e

Trabalho vinculado ao Projeto de Pesquisa “Corpo e discurso: lugares de memória das identidades brasileiras na mídia e na literatura”,
coordenado pelo professor Dr. Nilton Milanez. práticas de linguagem que carregam consigo elementos sociais e ideológicos,
∗∗
Aluno do Curso de Comunicação Social/Jornalismo, 4º semestre. Discente voluntária no projeto de pesquisa supracitado.
∗∗∗
Doutor em Lingüística/Análise do Discurso. Professor do Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários da UESB. exteriores à língua, porém dependentes dela para sua existência material,
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .351-356. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
353 354
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que concernem à política, economia, sociedade, saúde, ciência entre outros. uma experiência de alteridade para os leitores”. Dessa forma, podemos
Focalizarei aqui a reportagem veiculada na revista em 29-05-2002, na afirmar que o discurso de Veja representa uma espécie de troca discursiva
editoria Geral/Beleza, edição 1753, intitulada: “Faça o que eu faço”. O com o sujeito leitor e introduz em sua vivência novos conceitos. Sujeito,
subtítulo da reportagem é “Médicos da área estética são vitrines dos como explica Foucault, é resultado da história.
tratamentos que receitam a seus pacientes”, ou seja, há um convite a ser Para assinalar a posição do sujeito discursivo nessa matéria jornalística
igual ao médico, tão perfeito quanto ele. devemos levar em consideração duas “espécies” deste: aquele que pronuncia
O discurso, como aponta Foucault (2002), é composto de vários o enunciado e aquele que é interlocutor da enunciação. Ambos “têm
enunciados. À existência do enunciado por sua vez, está inerente a existência existência em um espaço social e ideológico em um dado momento da
de um sujeito – que não é necessariamente quem o pronuncia – mas que história. [...] cuja voz é constituída de um conjunto de vozes sociais”
ocupa uma posição no discurso. (FERNANDES, 2007). Assim, fala através da reportagem jornalística não o
Enunciados são categorias de expressão que não se reduzem à língua; repórter, tampouco a revista como meio de comunicação, mas a instituição
fazem parte de um conjunto de enunciados, “desempenhando um papel no clínica em si, caracterizada pela figura dos médicos. Recebe a informação,
meio dos outros, neles se apoiando e neles se distinguindo”. São ligados a não um sujeito individualizado, mas um que está inserido numa conjuntura
atos de formulação pelos quais os enunciados têm existência sempre com sócio-histórico-ideológica.
“margens povoadas de outros enunciados” (FOUCAULT, 2002). No discurso O texto da reportagem mostra: “Mais além da pura vaidade, a testa
dessa reportagem, os corpos de médicos esteticistas são apresentados como sem uma linhazinha sequer e os lábios explosivos funcionam nos médicos
modelos a serem seguidos; sua reconstrução que os tornaram corpos como vitrines para atrair clientes, num país onde a vaidade tem enorme
perfeitos e objetos de desejo é moldada pelos bisturis que eles mesmos poder de fogo”. Esse é um enunciado permeado pelos interesses do sujeito
podem manipular também em outros corpos. A relação sujeito, leitor e “clínica” - criar a ilusão de doença para aqueles que não obtêm o corpo
discurso midiático estabelece um processo de troca onde o leitor adquire as perfeito parecido com o dos médicos esteticistas que usam os seus próprios
percepções de corpo engendradas pelo discurso – da revista - e este por sua corpos como promoção de sua prática. A criação da patologia, como explica
vez é construído pelas visões de mundo das pessoas. Foucault, tratando de clínicas psiquiátricas, se deu por muito tempo
condicionada aos próprios médicos: eles mesmos produziam a loucura. A
RESULTADOS E DISCUSSÃO anormalidade, prefigurada no corpo não perfeito (fora da norma), é nessa
reportagem de certa forma produzida pelo poder do médico - sustentado
Para Milanez (2004), a revista é “um dispositivo de construção de aqui pelo discurso da revista. O indivíduo considera sua situação como
identidades, porque ela serve à recriação de uma identidade que caracteriza patológica em determinado sentido por estar fora do nível da normalidade. O
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indivíduo é capaz de perceber e atentar-se para uma “anormalidade” REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


preexistente, no entanto virtual, que antes não configurava incômodo, mas FERNANDES, C. A. Análise do Discurso: reflexões introdutórias. São
Carlos: Claraluz, 2007
no entrelaçamento com o discurso midiático pode passar a adquirir
FOUCAULT, M. A Arqueologia do Saber. Rio de Janeiro: Forense
concepções diversas. O discurso produz o efeito de sentido que é Universitária, 2002.
necessariamente marcado pelo lugar socioideológico do sujeito que emprega MILANEZ, N. A disciplinaridade dos corpos: o sentido em revista. In:
SARGENTINI, Vanice & NAVARRO-BARBOSA, Pedro (Org.). M. Foucault e os
a palavra. Afinal, os efeitos de sentido são “produzidos face aos lugares
domínios da linguagem : discurso, poder subjetividades. São Carlos:
ocupados pelos sujeitos em interlocução” (FERNANDES 2007). Claraluz, 2004.
Puttini (2007) explica que Canguilhem define o “uso ambíguo que se PUTINNI, R. O Normal e o Patológico e a epistemologia das ciências
da vida e da saúde em Georges Canguilhem: uma opção
faz do termo normal, geralmente dedutível para o uso do conceito de transdisciplinar? Disponível em:
patológico, ambos conceitos comprometidos numa falácia, usada ora como <http://www.redebrasileiradetransdisciplinaridade.net/file.php/1/Artigos_dos
atividade técnica, ora como atividade científica na medicina”. Assim, a clínica _membros_da_Rede/Trabalhos_apresentados_no_II_Congresso_Mundial/Arti
go_Rodolfo_Puttin>doc Acesso em: 28/08/2007.
é apresentada em Veja como um recurso infalível para a cura dessa
anormalidade arquitetada. Dessa forma, como aponta Milanez (2004), “a
revista suscita a constituição de corpos modelares e de objetos desejáveis,
uma verdadeira máquina imperial sobre a qual pensamos a maneira e as
forças que produzem tanto a realidade social quanto suas subjetividades”.

CONCLUSÕES

O discurso (feito de enunciados e produzido por sujeitos) da revista


Veja pondera uma criação de doença e anormalidade, e as apresenta como
perfeitamente “curáveis” pela clínica. O sujeito prefigurado na imagem do
médico é exemplo de perfeição/normalidade e ao mesmo tempo método de
alcance dessa mesma perfeição. O enunciado da reportagem, através do qual
a clínica pronuncia seus saberes técnicos e científicos, fornece as bases para
sua auto-afirmação e para expansão de uma falácia patológica.

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357 358
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INTRODUÇÃO
HUMOR E SEXO:
FUNCIONAMENTO DISCURSIVO DE PIADAS∗
Neste trabalho, com base na Análise de Discurso, analisamos um

Liliana de Almeida Nascimento∗∗ conjunto de piadas sobre sexo, a fim de dar conta de alguns níveis de
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
liliananascimento@msn.com intelecção, ou seja, de alguns mecanismos lingüísticos e discursivos
Edvania Gomes da Silva∗∗∗ presentes nesse gênero. Pretende-se abordar as piadas tendo a língua como
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
edvania_g@yahoo.com.br interesse mais direto, entendendo que o grau de complexidade apresentado
Maria da Conceição Fonseca-Silva∗∗∗∗ neste gênero permite compreender, pelo menos em parte, como esta
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia funciona (Possenti, 1998, apud CONDE, 2005).
con.fonseca@uol.com.br
Nesse sentido, o objetivo deste trabalho é estudar algumas piadas
sobre sexo, partindo da hipótese de que o discurso humorístico, presente
RESUMO nesse gênero, traz as marcas sócio-históricas – as diversas manifestações
Com base na Análise de Discurso, analisamos um determinado corpus composto por um conjunto
de piadas sobre sexo, entendendo que o discurso humorístico, assim como qualquer outro, traz as culturais e ideológicas, que tornam tal estudo relevante. Mesmo
marcas sócio-históricas – as diversas manifestações culturais e ideológicas, valores arraigados que
nele se manifestam e, por isso, aquilo que se diz nas piadas não pode gratuitamente ser deixado apresentando o aspecto lúdico, esses textos, de certa maneira, operam com
de lado. A articulação entre corpus, teorias do discurso e lingüística busca dar conta dos vários
níveis de intelecção emaranhados numa piada. As análises mostram que o discurso das piadas estereótipos que contribuem para a manutenção de conceitos e de
sobre sexo opera principalmente com estereótipos que contribuem para a manutenção de
conceitos e preconceitos que marcaram/marcam as relações no contexto sexual. preconceitos.

PALAVRAS CHAVE: Discurso. Piadas. Sexo.


MATERIAL E MÉTODOS

O corpus analisado foi coletado no site Humor Tadela, encontrado no


portal da Universo Online (UOL). No referido site, as piadas são organizadas
por temas, como loiras, casais, bichas, bêbados, políticos etc., apresentando
também uma sessão dedicada às piadas sobre sexo, o que facilitou o

Este trabalho apresenta os resultados finais da monografia apresentada ao Curso de Especialização em Lingüística, realizada entre julho de
2006 e agosto de 2007, na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, campus de Vitória da Conquista. O referido curso de especialização foi
processo de seleção das piadas.
uma iniciativa do Grupo de Pesquisa em Estudos Lingüísticos (GPEL) e do Grupo de Pesquisa em Análise de Discurso (GPADis).
∗∗
Aluna do curso de Especialização em Lingüística (UESB). Membro do grupo de pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB) e Após o levantamento do corpus, partimos para o estudo dos principais
aluna do curso de Especialização em Lingüística da UESB. Campus de Vitória da Conquista
∗∗∗
Doutora em Lingüística (Análise do discurso). Orientadora da monografia. Membro do Grupo de Pesquisa em Estudos Lingüísticos
(GPEL/CNPq/UESB) e do Grupo de Pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB). Professora do Departamento de Estudos teóricos que tomaram a piada, ou melhor, o humor como objeto de estudo, a
Lingüísticos e Literários – UESB. Campus de Vitória da Conquista.
∗∗∗∗
Doutora em Lingüística (Análise do discurso). Co-orientadora. Líder do Grupo de Pesquisa em Estudos Lingüísticos (GPEL/CNPq/UESB) e do partir dos trabalhos de Folkis (2004) e Conde (2005), dos quais fizemos uma
Grupo de Pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB). Professora do Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários – UESB.
Campus de Vitória da Conquista

_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .357-360. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
359 360
_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________________________

releitura. Em seguida, com base no dispositivo teórico-metodológico da Podemos notar que o gatilho da piada se encontra na expressão pai
Análise de Discurso, procedemos à análise das piadas. dos nossos filhos que revela que o marido foi traído outras vezes. Tal
expressão muito utilizada pelas mulheres ao se referirem aos seus maridos,
RESULTADOS E DISCUSSÃO figura, nesse texto, como uma referência ao amante. Notamos, então, que
essa piada trabalha com uma inversão daquilo que a sociedade coloca como
As piadas fazem referência a várias questões relacionadas ao sexo, sendo papel normal da mulher e materializa o discurso de que as mulheres
como a anatomia feminina, o orgasmo, as posições sexuais, o desempenho traem. A expressão pai de nossos filhos ainda ridiculariza a reação do homem
sexual, traição, etc.conforme vemos nas piadas analisadas abaixo: que quis matar o amante, atitude que é, por sinal, um comportamento
machista no desejo do marido de “resgatar sua honra”.

No teatro, o marido não parava de gargalhar. A mulher pergunta o que estava


acontecendo.
- Estou pensando em que reação teria o público se de repente eu saltasse lá no CONCLUSÕES
palco e transasse com uma das bailarinas
Dali à pouco a mulher começa a rir e ele quer saber por quê.
- Pensei no que você faria se o público gostasse e pedisse bis.
As análises mostraram que as piadas sobre sexo materializam discursos
que giram em torno do desempenho sexual, sexo no casamento, traição,
Um lugar-comum nas piadas sobre sexo é a relação marido/mulher e o
anatomia feminina e masculina e prostituição. Tais textos operam com
desempenho sexual de ambos. No jogo discursivo materializado na piada,
discursos que não podem ou não devem circular em situações normais, mas
notamos que está em questão o fato de as esposas não estarem contentes
que, nas piadas, emergem sem qualquer restrição.
com o desempenho dos maridos, ou seja, está funcionando aqui o discurso
de que os maridos não satisfazem as esposas sexualmente, o que leva as
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
esposas a reclamarem como notamos implicitamente na piada.
As piadas sobre sexo também tematizam constantemente a traição, CONDE, G. Piadas Regionais: o caso dos gaúchos. Campinas:
IEL/Unicamp. Dissertação de Mestrado, inédita. 2005.
principalmente a feminina como vemos na piada que se segue:
FOLKIS, G. M. B. Análise do Discurso Humorístico: as relações marido
e mulher nas piadas de casamento. Campinas: IEL/Unicamp. Tese de
Doutorado, inédita. 2004.
O cara chega em casa mais cedo e pega a mulher no flagra, transando com o
amante. Puto da vida, ele pega o revólver aponta para o indivíduo e diz: FONSECA-SILVA. M. da C. Questões de Linguagem, Gramática, texto e
- Vou te matar, desgraçado. discurso. Vitória da Conquista, BA: Edições Uesb, 2001.
No mesmo instante, a mulher se enfia na frente da arma, desesperada e diz:
- Pelo amor de Deus, não mate o pai dos nossos filhos.

_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
361 362
_____________________________________________________________________________________________________________________________________

INTRODUÇÃO
MEMÓRIA DISCURSIVA
DO FEMININO NA PUBLICIDADE DE LINGERIES∗
Os estudos de Fonseca-Silva (1999; 2005; 2007) mostram que a análise
Daiane Rodrigues de Oliveira∗∗
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia de anúncios publicitários abre a possibilidade da compreensão dos elementos
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia
dainerodri@gmail.com visuais como operadores de discurso; e que a análise da imagem como lugar
Maria da Conceição Fonseca-Silva*** de materialização de discurso aponta para o funcionamento dos discursos
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia sobre a imagem. Nesse sentido, as peças publicitárias funcionam como lugar
con.fonseca@gmail.com
de interpretação e tanto a materialidade verbal quanto a materialidade não-
Edvania Gomes da Silva****
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
edvania_g@yahoo.com.br
verbal, que os compõem, não produzem o visível. Ao contrário, tornam-se
visíveis por meio da interpretação e do efeito de sentido que é permitido pela
ordem do simbólico.
RESUMO
A partir destas considerações, neste trabalho, vinculado ao projeto
Neste trabalho, analisamos o papel da mulher no imaginário de anúncios publicitários de lingeries
na segunda metade do século XX e início do século XXI no Brasil. Para tanto, descrevemos cinco temático “Memória discursiva e publicidade nas revistas do Brasil”,
anúncios com base na Escola de Análise do Discurso Francesa e nos conceitos operacionais
foucaultianos. Com a pesquisa, constamos que a figura da mulher, nos anúncios de lingerie, põe coordenado pela Profª Drª Maria da Conceição Fonseca-Silva, analisamos o
em jogo diferentes posições de sujeito, ora associadas à satisfação da consumidora, ora ligadas à
sedução do outro. Essas diferentes posições formam um domínio de memória, onde o elemento funcionamento discursivo do elemento mulher no imaginário de anúncios
mulher funciona sempre como meio de impulsionar o consumo.
publicitários de lingerie veiculados em revistas femininas brasileiras na
PALAVRAS-CHAVE: Discurso. Memória. Mídia. Publicidade
segunda metade do século XX e início do século XXI, a fim de mostrar como
se dá a articulação entre elementos visuais e formulações lingüísticas no
funcionamento discursivo dos referidos anúncios e, conseqüentemente, no
funcionamento da memória discursiva sobre a mulher no imaginário de peças
publicitárias.

MATERIAL E MÉTODOS

Trabalho ligado ao subprojeto de pesquisa vinculado ao projeto temático “Memória discursiva e publicidade nas revistas do Brasil”.
∗∗
Bolsista de IC – FAPESB/Uesb, membro do grupo de pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/Uesb) e aluna do curso de Letras da
Uesb - campus de Vitória da Conquista.
*** Doutora em Lingüística (Análise do discurso). Coordenadora do projeto de pesquisa e orientadora. Líder do Grupo de Pesquisa em Estudos
Para a constituição deste trabalho, primeiramente, selecionamos do
Lingüísticos (GPEL/CNPq/Uesb) e do Grupo de Pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB). Professora do Departamento de
Estudos Lingüísticos e Literários da Uesb - campus de Vitória da Conquista.
**** Doutora em Lingüística (Análise do discurso). Membro da equipe do projeto de pesquisa. Pembro do Grupo de Pesquisa em Estudos corpus constituído de anúncios publicitários que circularam em revistas
Lingüísticos (GPEL/CNPq/UESB) e do Grupo de Pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB) Professora do Departamento de
Estudos Lingüísticos e Literários da Uesb - Campus de Vitória da Conquista. femininas brasileiras, cinco peças publicitárias nas quais aparecem imagens
_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .361-365. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
363 364
_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________________________

de mulheres vestidas de lingerie. As peças que selecionamos foram conjunto DeMillus. No fundo da imagem, aparece outra modelo, vestida de
veiculadas em revistas nos anos de 1971, 1991, 1995 e 2006 por diferentes sutiã.
marcas de lingerie. Após a seleção dos anúncios, realizamos o estudo do Em 1991, a Darling lingerie divulgou o seguinte anúncio: na parte
referencial teórico, que é composto de escritos publicados que compõem as superior, aparece a formulação Janela indiscreta, abaixo, uma modelo vestida
obras de Michel Foucault, de Michel Pêcheux e de autores cujos trabalhos de lingerie, olha para um frasco de perfume em suas mãos e sorri. No fundo
estão ligados à Análise de Discurso de linha francesa e que tratam do tema da imagem, uma janela de vidro, e na parte inferior a formulação: Calcinhas
da representação da mulher em anúncios publicitários. Este estudo levou aos e Soutiens Darling. Deixam todo mundo doido. Neste anúncio, verificamos
lugares e ao(s) momento(s) da interpretação em relação ao(s) momento(s) em funcionamento uma posição de sujeito diferente das anteriores. Ele é
da descrição dos anúncios publicitários selecionados. Após o estudo do sustentado por um enunciado, no qual a mulher vestida de lingerie funciona
aparato teórico, descrevemos as peças publicitárias segundo a proposta de como elemento de sedução e fetiche.
análise de dados desenvolvida por Fonseca-Silva. Em seguida, realizamos a Esta é a mesma posição está em funcionamento no anúncio veiculado
identificação das posições de sujeito em funcionamento em cada um dos em 1995 pela mesma empresa, no qual aparece a figura de um homem
anúncios e a divisão destes em dois grupos, de acordo com a posição sentado em uma cadeira, olhando para o corpo de uma mulher vestida de
encontrada. E, finalmente, procedemos à análise dos anúncios publicitários lingerie em pé ao seu lado e as formulações: Faz por você o que nenhuma
selecionados. outra faz e Garoto estudando geografia.
Em 2006, a DuLoren veiculou o seguinte anúncio: na página do lado
RESULTADOS E DISCUSSÃO esquerdo, aparece a imagem de uma mulher dentro de um carro olhando
para um homem em pé ao lado do carro, vestido com uniforme de policial,
A marca Poesi divulgou em 1971 o seguinte anúncio: no alto, a com quepe e algemas penduradas na cintura; no meio da página, a
formulação: Goste de você; abaixo, a figura de um espelho e uma mulher formulação “O tira”. Na página do lado direito, é apresentado o casal dentro
vestida de lingerie, observando seu reflexo e sorrindo. A análise deste do carro: a mulher vestida de lingerie, usando quepe e puxando a corrente
anúncio mostra que nele está em funcionamento uma posição de sujeito na da algema, é mostrada em cima do homem, sem camisa e algemado; no
qual a lingerie é associada ao conforto e ao bem-estar próprios. meio da página, a formulação “O põe”. Abaixo, a formulação “Mulher de
Esta mesma posição está materializada em um anúncio da DeMillus, verdade quer homem de verdade”. Este anúncio também é sustentado pela
veiculado no mesmo ano, no qual aparece uma modelo vestida de lingerie e mesma posição de sujeito dos dois anúncios anteriores. No entanto, para a
ao lado dela, as formulações: Pule, corra, dance, faça o que quiser! Tudinho sua composição, foram mobilizados outros objetos de fetiche, além da
de Lycra flexível, macia para dar conforto à alegria da sua vida! Novo
_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
365 366
_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________________________

lingerie: o uniforme de policial e seus acessórios são elementos que estão em


funcionamento no mundo do fetichismo.

CONCLUSÕES

Com a pesquisa, constatamos que, no imaginário dos anúncios


analisados, a figura da mulher põe em jogo diferentes posições de sujeitos,
as quais formam um domínio de memória no qual o elemento lingerie
funciona ora como uma roupa comum, isto é, a consumidora deve comprar o
produto pensando em seu bem-estar e conforto, ora como elemento de
fetiche, assim, a mulher vestida de lingerie é objeto de desejo e sujeito de
sedução do outro.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FONSECA-SILVA, M. da C. Os discursos do cuidado de si e da


sexualidade em Claudia, Nova e Playboy. 2003, 378 págs. Tese
(Doutorado em Lingüística). Instituto de Estudos da Linguagem da
Universidade de Campinas, Campinas, 2003. Inédita.
FONSECA-SILVA, M. da C. Imagem e Publicidade em revistas femininas: a
mulher na propaganda de lingeries. O Olho da História, n. 7, 2005.
FONSECA-SILVA, M. da C. Memória discursiva e publicidade nas
revistas do Brasil. Projeto de Pesquisa, 2006.
FOUCAULT, M. A arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 1995. Edição original: 1969.
PÊCHEUX, M. Papel da Memória. In: ACHARD, P. et al (Org). Papel da
Memória. Tradução e Introdução de José Horta Nunes. Campinas: Pontes,
1999. Edição original: 1983.

_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
367 368
_____________________________________________________________________________________________________________________________________

INTRODUÇÃO
MEMÓRIA E ARQUIVO:
FUNCIONAMENTO DISCURSIVO EM FOUCAULT E PÊCHEUX∗
Este trabalho está ligado ao subprojeto “Pontos de encontro e pontos

Francisca Adriana Ferreira do Nascimento∗∗ de deriva em Foucault e Pêcheux: estudo de caso”, vinculado ao projeto
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia temático intitulado “Análise de Discurso: Michel Foucault e Pêcheux, o diálogo
drianascimento@gmail.com
teórico-metodológico e as repercussões na França e no Brasil”, coordenado
Maria da Conceição Fonseca-Silva∗∗∗
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia pela Profª Drª Maria da Conceição Fonseca-Silva. Aqui, apresentamos os
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia
con.fonseca@gmail.com resultados da investigação do funcionamento dos conceitos de memória e de
∗∗∗∗
Edvania Gomes da Silva arquivo no quadro teórico-metodológico fundado por Michel Foucault e no
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
Edvania_g@yahoo.com.br quadro teórico-metodológico da Escola Francesa de Análise de Discurso (AD),
fundada por Michel Pêcheux, apontando os pontos de convergências e de
divergências epistemológicas.
RESUMO
Neste trabalho, são apresentados os resultados da investigação do funcionamento dos conceitos
de memória e de arquivo no quadro teórico-metodológico proposto por Foucault e no quadro
teórico-metodológico da Escola Francesa de Análise de Discurso (AD), inaugurada por Pêcheux. Os MATERIAL E MÉTODOS
resultados das análises dos escritos estudados indicaram que estes conceitos têm estatutos
distintos nos quadros, mas que existem diferenças e semelhanças. Indicaram também que as
diferenças de funcionamento dos conceitos investigados estão ligadas às formas como os dois
lugares teóricos concebem e fazem funcionar o conceito de enunciado e ao fato de se constituírem Para realizar este trabalho, procedemos ao estudo e análise de escritos
a partir de diferentes bases epistemológicas.
que constituem o corpus da pesquisa e à identificação, catalogação e análise

PALAVRAS CHAVE: Análise de discurso. Epistemologia. Memória. Arquivo. de conceitos operacionais que permeiam os escritos de Michel Foucault, os
de Michel Pêcheux e os de pesquisadores brasileiros filiados ao quadro
epistemológico da Escola francesa de Análise de Discurso, conhecida por AD,
fundada por Pêcheux.
O levantamento bibliográfico dos escritos foi realizado pela
coordenadora do projeto e teve como fontes: o seu acervo particular, as

Trabalho vinculado ao projeto de pesquisa temático “Análise de Discurso: Foucault e Pêcheux, o diálogo teórico-metodológico e as repercussões Bibliotecas do IEL e do IFCH da Unicamp, o Centre National de Recherche
na França e no Brasil”, financiado pela Uesb.
∗∗
∗∗∗
Bolsista de IC – FAPESB/Uesb e graduanda em Letras na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, campus de Vitória da Conquista. Scientifique (CNRS), a Université Paris-XII, o Centre Michel Foucault, a
Doutora em Lingüística (Análise do discurso). Coordenadora do projeto de pesquisa e orientadora. Líder do Grupo de Pesquisa em Estudos
Lingüísticos (GPEL/CNPq/Uesb) e do Grupo de Pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB). Professora do Departamento de
Estudos Lingüísticos e Literários da Uesb - campus de Vitória da Conquista. Société Internacionale dês Estudes sur Michel Foucault.
∗∗∗∗
Doutora em Lingüística (Análise do discurso). Membro da equipe do projeto de pesquisa, membro do Grupo de Pesquisa em Estudos
Lingüísticos (GPEL/CNPq/UESB) e do Grupo de Pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB). Professora do Departamento de
Estudos Lingüísticos e Literários da Uesb - Campus de Vitória da Conquista.
_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .367-371. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
369 370
_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________________________

O acervo foi catalogado sob orientação da coordenadora do projeto de Nos dois quadros teóricos, entretanto, a memória é um campo
pesquisa, por Celma Oliveira Prado, bolsista de iniciação científica do CNPq, modificável segundo regras específicas. Assim, se para Foucault, os
que trabalhou na pesquisa no período de agosto de 2004 a julho de 2006, e enunciados emergem em um domínio de memória em detrimento de outros e
contou com a ajuda de Shirley Guedes, bolsista de iniciação científica da se acumulam segundo regras próprias; para a AD, os enunciados também
FAPESB, que trabalhou na pesquisa no período de maio de 2005 a abril de não se inscrevem aleatoriamente no campo de memória, pois têm regras
2006. Conforme Fonseca-Silva e Prado (2006), o acervo que constitui o próprias.
corpus consta, atualmente, com 698 escritos catalogados. Em se tratando do conceito de arquivo, no quadro teórico
foucaultiano, arquivo compreende todas as práticas discursivas que
RESULTADOS E DISCUSSÃO instauram os enunciados como acontecimentos singulares e como coisas
semelhantes às que manipulamos, porém distintas destas; é a lei ou condição
Os resultados da investigação indicam que os conceitos de memória e de possibilidade do que pode ser dito (foi, é e será dito); e é indescritível em
de arquivo não têm o mesmo estatuto no quadro teórico postulado por sua totalidade e atualidade, pois só pode ser totalmente analisado e descrito,
Foucault e no quadro teórico da AD, iniciada por Pêcheux, mas que existem a partir do momento em que os discursos deixam de ser postos em prática e
pontos de encontro e de deriva. de circular. Diferentemente, no quadro da AD, um acontecimento discursivo
No que diz respeito ao conceito de memória, em Foucault, o campo da se inscreve no campo da memória e na história por meio da língua. Nesse
memória comporta séries enunciativas, constituídas de enunciados distintos e sentido, o arquivo é definido como um campo de documentos pertinentes e
singulares e que, em sua emergência, reatualizam a organização do campo disponíveis sobre uma determinada questão, comporta todas as formulações
enunciativo, o qual compreende formas de sucessão e de coexistência de lingüísticas (documentos) de um acontecimento discursivo a outro e está
enunciados, referentes a um objeto de discurso e que se correlacionam relacionado a interesses históricos e político-culturais, que o formaram, e à
segundo regras específicas. memória. Por isso, pode ser manipulado por órgãos de poder que visam ao
Na AD, a memória é constituída por séries de repetições literais ou controle e à modificação da memória de uma sociedade.
parafrásticas e de textos documentais de uma sociedade; ela resulta de
efeitos político-culturais que permitem a legibilidade de enunciados CONCLUSÕES
(lingüísticos). E é definida como “um espaço móvel de divisões, de
disjunções, de deslocamentos e de retomadas, de conflitos de Concluímos que o funcionamento dos conceitos operacionais de
regularização... Um espaço de desdobramentos, réplicas, polêmicas e contra- memória e de arquivo, nos dois quadros teóricos estudados, implica pontos
discursos” (PÊCHEUX, 1983, p. 56). de encontro e pontos de derivas. Eles estão relacionados, como indicam
_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
371 372
_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________________________

Fonseca-Silva e Silva (2007), às formas como esses dois lugares teóricos


concebem e fazem funcionar o conceito de enunciado, mas, e principalmente,
ao fato de os dois quadros se constituírem a partir de bases epistemológicas
diferentes.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

PRADO, C. O.; FONSECA-SILVA, M. da C. Relatório Final de Subprojeto


de Pesquisa – PIBIC/CNPq. Vitória da Conquista: Uesb, 2006.
FONSECA-SILVA. M. da. C. Foucault e a arqueogenealogia do sujeito. In:
Sujeito, identidade e memória. Uberlândia: EDUFU, 2004.
FONSECA-SILVA, M. C. Reflexões sobre alguns conceitos em Foucault
e em Pêcheux. Texto inédito, 2005.
FONSECA-SILVA, M. C; SILVA, E. G. Entre o dentro e o fora: no limite
dos objetos e dos conceitos em AD. Texto inédito, 2007.
FOUCAULT, M. O enunciado e o arquivo. In: ___. A arqueologia do saber.
Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002, p. 87-151. Edição original: 1969.
GUILHAUMOU, J.; MALDIDIER, D. Efeitos do arquivo. ORLANDI, E. P. (Org.).
Gestos de leitura: da história no discurso. Campinas: Editora da
Unicamp, 1997. p. 163-185.
PÊCHEUX, M. Ler o arquivo hoje. In: ORLANDI, E. P. (Org.). Gestos de
leitura: da história no discurso. Campinas: Editora da Unicamp, 1997, p.
55-66.
PÊCHEUX, M. Papel da memória. In: ACHARD, P. et al (Org.). Papel da
memória. Campinas: Pontes, 1999, p. 49-57.
ORLANDI, E. P. Análise do discurso: princípios e procedimentos.
Campinas, SP: Pontes, 1999.

_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
373 374
_____________________________________________________________________________________________________________________________________

fundamentais nessa “sociedade do espetáculo” (DEBORD, 1997), é, sem


MEMÓRIA E INTERICONICIDADE NA CONSTRUÇÃO DO SUJEITO dúvida, a imagem, em suas mais diversas manifestações: fotografia, pintura
FEMININO POLÍTICO NA XILOGRAVURA DO CORDEL∗
e, certamente, a xilogravura, a qual é uma das maiores contribuições do
Brasil no campo das artes plásticas. A xilogravura objeto da nossa análise foi
Cláudia Rejanne Pinheiro Grangeiro∗∗
Universidade Regional do Cariri veiculada na capa do folheto de cordel de Abraão Batista: “Engana-me que
claudiarejannep@yahoo.com.br
eu Gosto 2”, o qual circulou na cidade de Juazeiro do Norte, por ocasião das
eleições municipais dessa cidade no ano 2000, trazendo uma construção
RESUMO bastante particular do sujeito político feminino, em alusão à então candidata
Com fulcro nos pressupostos teóricos da Análise do Discurso Francesa, em uma de suas
dimensões contemporâneas, a leitura de imagens, discutimos os mecanismos de construção pelo a prefeita do Partido dos Trabalhadores Maria Íris Tavares, que disputava a
discurso do sujeito político feminino, a partir da análise da xilogravura da capa do folheto de
cordel: “Engana-me que eu gosto 2”, mobilizando, para tanto, os conceitos de memória discursiva eleição com o candidato do PFL Carlos Alberto da Cruz (GRANGEIRO, 2007).
(COURTINE, 1981) e intericonicidade (COURTINE, 2006).

PALAVRAS-CHAVE: Análise do Discurso. Discurso Político. Sujeito. Memória Discursiva


Intericonicidade. MATERIAL E MÉTODO

Os procedimentos teórico-metodológicos utilizados para a análise da


xilogravura em tela foram os da Análise do Discurso francesa, conjugando as
INTRODUÇÃO teorias de Pêcheux (1997) sobre discurso, sujeito e identidade com as de
Foucault (1997, 2000), também Courtine (1981, 2006), com base nas quais
A Análise do Discurso francesa vem se constituindo como um campo de analisamos os elementos que constituem o sujeito político feminino.
estudos cada vez mais profícuo no escopo das ciências humanas. Do auge Considerando, ainda, que o discurso tem um suporte material, sendo, este
dos grandes debates ideológicos da década de 60, onde a teoria nasceu e se também, parte constitutiva do sentido, temos a xilogravura como suporte
constituiu, a princípio, analisando os discursos políticos de esquerda, até os material do discurso político. Xilogravura significa gravura em madeira. A
discursos políticos contemporâneos, os quais são constantemente técnica é antiga, remota da antiga China e “consta em talhar um desenho em
atravessados pelas “línguas de vento” dos discursos midiáticos, publicitários, pedaços de madeira (tacos) e depois transpô-lo para o papel, após embebê-
a AD vem refinando os seus métodos de análise no sentido de dar conta da lo em tinta, como no sistema do carimbo.” (GRANGEIRO, 2002, p. 138). No
linguagem em suas diversas expressões materiais. Uma dessas expressões entanto, a xilogravura popular nasceu no Nordeste brasileiro, mais
precisamente na Região do Cariri cearense, com Inocêncio da Costa Nick

∗∗
Projeto Discurso, Cultura e Memória, coordenado pela Profa. Dra. Cláudia Rejanne Pinheiro Grangeiro. (Mestre Noza), Antônio Relojoeiro, dentre outros, e até hoje é um traço forte
Doutora em Lingüística e Língua Portuguesa pela UNESP/FCLAR.
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .373-377. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
375 376
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da cultura dessa região, sendo muito utilizada como ilustração dos folhetos discurso da candidata representada pela figura em duas perspectivas: a) pelo
de Literatura de Cordel. gênero: o caldeirão e a colher mobilizam a memória de dois discursos
atribuídos à figura feminina: a bruxa, biblicamente definida como
RESULTADOS E DISCUSSÃO personificação do Mal, queimada nas chamas da Inquisição Medieval, a
astuta, manipuladora, e o campo semântico da cozinha, do espaço
De acordo com Foucault (1997; 2000), não existe um sujeito a priori, doméstico. Tendo em vista que, no referido contexto, a mulher preteria um
origem do seu discurso, os sujeitos são constituídos no e pelo discurso, no cargo público, este não lhe seria adequado, devido ao seu gênero e b) Pelo
jogo intersticial entre a língua e a história. Assim como o sujeito, o discurso posicionamento político de esquerda, visto que a candidata era membro do
também não é homogêneo, constituindo-se, pois, numa teia ininterrupta de Partido dos Trabalhadores, a figura mobiliza os símbolos do comunismo de
discursos outros, que o atravessam, o entrecortam, o sedimentam. Tal teia é forma pejorativa, à medida que, ao mesmo tempo, representa a candidata
denominada de interdiscurso (PÊCHEUX, 1997). Ou seja, para se constituir, o por meio da metáfora da lagarta, a qual, no âmbito da agricultura é aquela
discurso articula necessariamente uma memória (COURTINE, 1981), memória que destrói as plantações. Desta forma, o sentido desliza de uma “região do
móvel, lacunar, mobilizada para resignificar o “já-lá”, o já dito, responsável dizer” (PÊCHEUX, 1997) a outra, fazendo outros sentidos. No âmbito do
pelo dito de novo que, pelo simples fato de ter sido dito de novo em outro discurso político, a imagem construída da mulher “comunista” seria a
momento, em outro lugar, já é um outro dito. É assim que, de acordo com a destruição de algo já sólido, instituído, na “lavoura política” da cidade.
Análise do Discurso, processa-se a construção dos sentidos. Na esteira da
noção de interdiscurso, Courtine (1996) vai cunhar a noção de CONCLUSÃO
intericonicidade, segundo a qual: “da mesma forma que existem palavras sob
as palavras, existem imagens sob as imagens”, ou seja, as imagens dialogam Ativando a memória discursiva e por meio de referências intericônicas,
polemicamente ou não com outras imagens, no processo de significação. a imagem constrói um sujeito político feminino de esquerda, desqualificando
Nessa perspectiva, analisamos os mecanismos de constituição da seu discurso, em duas perspectivas: a) pelo gênero da candidata, quando
subjetividade política feminina na xilogravura de cordel “Engana-me que eu mobiliza, por meio de ícones como o caldeirão e a colher dizeres outros que
gosto 2”. A imagem dialoga, portanto, com outras imagens, num processo de circulam na sociedade que desqualificam o gênero feminino para cargos
intericonicidade: a princípio, com a imagem do primeiro folheto: “Engana-me públicos, visto que “lugar de mulher é na cozinha” e b) pelo seu
que eu gosto”, a partir da disposição das pernas abertas da figura, além dos posicionamento de esquerda, representado pela foice e o martelo, símbolos
símbolos, verdadeiros ícones da cultura ocidental: uma bandeira com a foice do comunismo, trazendo, pois à tona, um discurso sexista e anti-comunista.
e o martelo e o caldeirão e a colher, procedendo a desqualificação do
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377 378
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

COURTINE, J-J. Discursos sólidos, discursos líquidos: a mutação das


discursividades contemporâneas. (texto pronunciado no I CIAD –
Congresso Internacional de Analise do Discurso, realizado na UFSCAR em
outubro de 2006) [no prelo pela Editora Claraluz].
COURTINE, J-J. Analyse du discours politique: le discours communiste
adressé aux chrétiens. Languages, Paris, Larousse, n. 62, 1981.
DEBORD, G. A sociedade do espetáculo. Rio de Janeiro: Contraponto,
1997.
FOUCAULT, M. A ordem do discurso. São Paulo: Edições Loyola, 2000.
FOUCAULT, M. Arqueologia do Saber. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 1997.
GRANGEIRO, C. R. P. O discurso religioso na literatura de cordel de
Juazeiro do Norte. Crato: A Província Edições, 2002.
GRANGEIRO, C. R. P. Discurso político no folheto de cordel: a besta-
fera, o Padre Cícero e o Juazeiro. Tese de Doutorado. UNESP/FCLAR,
2007.
PÊCHEUX, M. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio.
3 ed. Campinas: Editora da UNICAMP, 1997.

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379 380
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INTRODUÇÃO
MULHER E CONSUMO: DISCURSIVIDADE NA
PUBLICIDADE DA PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XX∗
Neste trabalho, apresentamos o resultado das análises de anúncios

Beatriz Rocha de Oliveira∗∗ publicitários em que aparece a figura da mulher, veiculados nas revistas do
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
beatrizrocha02@gmail.com Brasil na primeira metade do século XX. A pesquisa teve como objetivo
Maria da Conceição Fonseca-Silva∗∗∗ identificar os enunciados que estão materializados nos anúncios e, a partir de
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
con.fonseca@gmail.com tal identificação, descrever o funcionamento da memória discursiva sobre a
Edvania Gomes da Silva∗∗∗∗ mulher no material analisado. Para tanto, tomamos por base os trabalhos de
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
edvania_g@yahoo.com.br Michel Foucault e os estudos desenvolvidos no âmbito da Escola Francesa de
Análise de Discurso, iniciada por Pêcheux. Na análise, recorremos ao modelo
de descrição-interpretação proposto por Fonseca-Silva (1999; 2005).
RESUMO
O presente trabalho analisa o funcionamento da memória discursiva sobre a mulher em anúncios
publicitários, veiculados em revistas nacionais na primeira metade do século XX. Para esta
pesquisa, selecionamos, dentre o corpus, cinco peças publicitárias que foram descritas e MATERIAL E MÉTODOS
analisadas com base no modelo de descrição-interpretação de Fonseca-Silva (1999; 2005) e nos
postulados teóricos de Foucault e de Pêcheux. Os resultados indicam que os discursos
materializados nos anúncios apresentam a mulher como objeto de desejo, de sedução e de
consumo. O corpus da pesquisa é constituído de anúncios publicitários que

PALAVRAS-CHAVE: Discurso. Memória. Mídia. Mulher. representam a mulher, publicados nas revistas brasileiras na primeira metade
do século XX. Para este trabalho, tomamos como objeto de análise cinco dos
anúncios. As peças publicitárias selecionadas foram veiculadas nas revistas
brasileiras nos anos de 1907, 1911, 1919 e 1928. O primeiro passo para a
realização dessa investigação foi identificar e selecionar esses anúncios nas
revistas. Em seguida, fizemos a catalogação e selecionamos os anúncios por
tipo. Além disso, fizemos o estudo do referencial teórico que fundamentou a
descrição e análise dos anúncios. Esse referencial, como dito, é composto por

∗∗
Trabalho vinculado ao projeto temático “Memória discursiva e publicidade nas revistas do Brasil”. escritos de Michel Foucault e de Michel Pêcheux e por trabalhos de autores
Bolsista de IC-Uesb, membro do grupo de pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/Uesb) e aluna do curso de Letras da Uesb -
campus de Vitória da Conquista
∗∗∗ ligados à Análise de Discurso de linha francesa. Após este estudo,
Doutora em Lingüística (Análise do discurso). Coordenadora do projeto de pesquisa e orientadora, líder do Grupo de Pesquisa em Estudos
Lingüísticos (GPEL/CNPq/Uesb) e do grupo de pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB). Professora do Departamento de Estudos
Lingüísticos e Literários da Uesb - campus de Vitória da Conquista. descrevemos e analisamos os anúncios. Nas análises, identificamos,
∗∗∗∗
Doutora em Lingüística (Análise do discurso). Membro da equipe do projeto de pesquisa, membro do Grupo de Pesquisa em Estudos
Lingüísticos (GPEL/CNPq/UESB) e do Grupo de Pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB). Professora do Departamento de inicialmente, as posições de sujeito que sustentam cada um dos enunciados
Estudos Lingüísticos e Literários da Uesb - campus de Vitória da Conquista.
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .379-383. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
381 382
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materializados nos anúncios e, em seguida, confrontamos essas posições, O anúncio veiculado pela revista Eu Sei Tudo (1919) apresenta, na
observando quais enunciados são repetidos, modificados ou retomados, parte superior da propaganda, o nome do cigarro “La Reine Veado” e, na
buscando compreender como se dá o funcionamento da memória discursiva parte inferior, a seguinte formulação “O cigarro Chic!”. Entre o nome do
sobre a mulher nessas peças publicitárias. cigarro e a formulação está a figura de uma mulher sentada com as pernas
cruzadas, usando encharpe, chapéu vermelho e vestido longo vermelho. Em
RESULTADOS E DISCUSSÃO uma das mãos ela segura um guarda-chuva e na outra um cigarro aceso.
Aqui, associa-se a imagem da mulher ao consumo de cigarro. As
As análises indicam o funcionamento, nas diferentes materialidades que materialidades verbal e não-verbal permitem identificar uma posição de
compõem os anúncios analisados, do discurso da sensualidade feminina sujeito que relaciona mulher, cigarro, charme e sedução.
associado ao consumo.
A peça publicitária publicada pela revista FON-FON! (1911) apresenta, CONCLUSÕES
na parte superior, o nome do estabelecimento “MARCENARIA BRASILEIRA”.
No centro da página, há uma imagem de uma mulher, sorridente, vestida As análises mostraram que os anúncios publicitários materializam
com um vestido longo aberto até a coxa; em pé, em cima de um móvel de enunciados em que a mulher é associada a produtos de consumo, objeto de
madeira, com uma perna mais elevada que a outra, deixando à vista a nudez desejo. Tais enunciados apontam para um certo domínio de memória, que
da perna, e segurando uma peça de madeira com uma das mãos. Nesse sustenta e mantém o imaginário sobre o feminino.
anúncio, o corpo feminino é apresentado como elemento instaurador de
desejos de consumo. Mais que o produto divulgado, chama a atenção a REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
figura provocante da mulher, que é objeto de desejo. FONSECA-SILVA, M. da C. Discurso de gênero em revistas femininas: o
O anúncio de um produto de beleza publicado pela revista Careta caso CLAUDIA. 1999, 154 f. Dissertação (Mestrado em Lingüística).
Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas,
(1911) apresenta, na parte superior, o nome “LINDACUTIS”. Além disso, há, Campinas, 1999.
no canto direito da página, a figura de uma mulher trajada com um vestido FONSECA-SILVA, M. da C. Imagem e Publicidade em revistas femininas: a
longo e beijada por um homem que a segura pelas mãos. No canto mulher na propaganda de lingeries. O Olho da História, n. 7, 2005.
FONSECA-SILVA, M. da C. Memória discursiva e publicidade nas
esquerdo, a formulação “LINDACUTIS ou ”O THESOURO DA BELLEZA”. O
revistas do Brasil. Projeto de Pesquisa, 2006.
anúncio apresenta o funcionamento de uma posição de sujeito em que a FOUCAULT, M. A arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense
mulher precisa mulher ficar bela usando produtos de beleza para seduzir o Universitária, 1995. Edição original: 1969.
homem.
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
383 384
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PÊCHEUX, M. Papel da memória. In: ACHARD, P. et. (Org). Papel da


Memória. Tradução e introdução de José Horta Nunes. Campinas: Pontes,
1999.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
385 386
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evolução do cotidiano social. É desta forma, percebida como um fenômeno


O “MEDO” NA OBRA CRIME E CASTIGO DE DOSTOIÉVSKI: sócio- histórico, constatada nas interações verbais e concretizada em um ou
UM PRINCÍPIO DE ANÁLISE EM BAKHTIN∗
mais enunciados que podem ser compostos por uma ou mais palavras em
∗∗
Wagner Ribeiro de Carvalho
Universidade do Estado da Bahia
forma de texto.
wrcarvalhoba@gmail.com
A linguagem é ideológica e resulta da organização social do trabalho e
da luta de classes, confirmando assim, de maneira bakhtiniana, o modo
dialógico da linguagem (BRAIT, 1997). Como o fluxo de informações é
RESUMO intenso, requer, de forma geral, de todo locutor/interlocutor um
Este estudo tem como objetivo apresentar através de uma análise dialógica a constituição de
sentidos no discurso do medo. O referencial adotado está de acordo com o conceito de diálogo de acompanhamento do processo evolutivo dos signos, suas novas construções
Bakhtin (1981; 1992), como sendo o elemento constitutivo da linguagem. Procuramos
compreender o que embasa a construção de sentidos na enunciação do discurso do medo, na realização dos enunciados em uso nas manifestações discursivas. Dessa
percebendo a importância de expor alguns conceitos com vistas à compreensão das concepções
de linguagem, língua e enunciado, como também, verificar que nesse processo, o sentido vai se forma, é bastante comum encontrarmos enunciados em que algumas
construindo a partir da dialogia entre interlocutores e os textos entre si.
palavras que figuram em nosso conhecimento de mundo com um
PALAVRAS-CHAVE: Dialogia. Medo. Sentido. Ideologia. Linguagem.
determinado sentido serem empregadas em novos contextos, com novas
significações, o que nos leva a uma análise mais apurada da constituição de
sentido quanto às formas e uso do discurso do medo.

INTRODUÇÃO
MATERIAIS E MÉTODOS

Debruçar-se sobre o estudo do medo é antes de tudo uma postura de


O objetivo deste trabalho é analisar a constituição de sentido do medo.
coragem. Os caminhos e descaminhos são inúmeros, haja vista que é um
No percurso da análise, situaremos teoricamente de maneira breve o método
campo de estudo complexo e, ao mesmo tempo, frágil para o analista do
analítico proposto pelo Círculo de Bakhtin46 para os estudos da linguagem,
discurso. Neste trabalho, analisamos a constituição de sentido do discurso do
com contribuições de outros estudiosos como Brait e Souza; para então,
medo e tomamos por base a teoria bakhtiniana. Assim, considerando o
expor no corpus proposto a aplicabilidade desta teoria. Quanto ao corpus da
desenvolvimento conceitual de linguagem, Bakhtin afirma que ela é dinâmica,
mutante, em constante desenvolvimento, um eterno vir a ser, garantindo a
46 O círculo de Bakhtin era uma escola contemporânea de pensamento russo que se concentrou nos trabalhos de Mikhail Mikhailovich Bakhtin
(1895-1975). O círculo tratou de assuntos sociais e culturais, enfocando questões de significado na criação da vida social em geral e artística em
particular. A abordagem essencial do círculo prevê que a produção lingüística é essencialmente dialógica, formada no processo de interação

A análise é parte integrante do projeto de pesquisa – O Discurso do medo: as formas e os modos de constituição dos sentidos, do Programa de social e que isto leva a interação de valores sociais distintos sendo registrado em termos de re-significação do discurso de outros. Os membros
Pós-Graduação em Estudo de Linguagens da UNEB, orientado pela Profª. Drª. Rosa Helena Blanco Machado. do círculo incluíam Matvei Isaevich Kagan (1889-1937); Pavel Nikolaevich Medvedev (1891-1938); Lev Vasilievich Pumpianskii (1891-1940);
∗∗ Ivan Ivanovich Sollertinskii (1902-1944); Valentin Nikolaevich Voloshinov (1895-1936), entre outros.
Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Estudo de Linguagens – UNEB. Professor do Curso de Letras da Faculdade de Ciências
Educacionais – FACE.
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .385-389. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
387 388
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pesquisa, trata-se de fragmentos da obra “Crime e Castigo”, de Dostoiévski, interiorização se dá entre o signo internamente circulante e o externo (...) os
selecionados após uma análise qualificativa para que fossem identificadas as novos significados devem ser compreendidos pelo interlocutor”. O
referidas características e aspectos do medo no discurso destes textos. personagem Raskonikof encarna o arquétipo do homem como pecador
A análise utilizada baseia-se na perspectiva do método sociológico dos angustiado, assassino com remorso e amedrontado perante a lei de Deus e a
estudos da linguagem, presente nas obras de lei dos homens. A polifonia dos discursos tramada pelo escritor russo,
Bakhtin/Volochinov/Medvedved. Conforme afirma Souza (2002), tal método desnudando a dimensão intra-psíquica, o monólogo interior e a pluralidade
apresenta as seguintes tarefas: de vozes, na enunciação de “Crime e Castigo”, apresentam as pistas para
entendermos as ramificações do medo no dorso da cultura. Esse
a) transcrever o acontecimento ético no seu aspecto social, já vivido e avaliado entendimento decorre de como o medo é trabalhado no discurso pelo
empaticamente na contemplação estética; b) sair dos limites do objeto e introduzir
o acontecimento em ligações sociais e históricas mais amplas; e c) ultrapassar os locutor, ou seja, o sentido participando de um ato consciente.
limites da análise propriamente estética.
Os postulados de Bakhtin residem na visão do diálogo como elemento
constitutivo da linguagem e da consciência ideológica. Sua ênfase está na
Nesta ótica, o discurso demonstra marcas na organização da
importância da linguagem como fenômeno sócio-ideológico, apreendida
enunciação e na escolha do vocabulário usado, em que o locutor espera uma
dialogicamente no fluxo da história. Bakhtin introduz em sua visão do diálogo
resposta de seu interlocutor, portanto, a constituição de sentido do medo
algo como integrante do funcionamento concreto da linguagem e da
possuirá manifestações discursivas que não podem ser vistas apenas na
consciência. Em nossa análise crítica, tudo que chega à consciência
materialidade do discurso. A partir desta concepção procurou-se analisar a
enunciativa vem do mundo exterior, carregado de entonação, tonalidade,
alternância dos sujeitos vista do interior – o acabamento.
emoção e valoração.
Desta forma, o medo em Dostoiévski é aquele mesmo exposto em
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Cervantes: "O medo tem muitos olhos e vê coisas no subsolo". Assim, a
consciência do medo está envolvida na consciência do outro, nos
No discurso presente em Dostoiévski é incisiva a construção imaginária
interlocutores. As reflexões que foram feitas a respeito da significação do
da culpa e do medo, na obra “Crime e Castigo” (1866): nela encontramos os
medo demonstram isto, embora seu significado não seja muito diferente
melindres de uma anatomia do sujeito, no poço profundo de suas emoções e
daqueles já culturalmente conhecidos, pois o sentido e as particularidades
sentimentos mais extremos; a possibilidade de interiorização relaciona-se
vão sendo construídos ao longo do conjunto da obra em consonância com o
com o discurso do medo, enquanto signo ideológico, entre o sistema de
contexto sócio-histórico na Rússia de 1866, época vivenciada pelo autor.
sentidos dado pelo locutor. Segundo Barros (1997), “o processo de

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389 390
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CONCLUSÕES

Concluímos que a compreensão do medo no cotidiano, nos lugares e


tempos, vivenciados pelo personagem, viabiliza-se por meio de uma relação
dialógica, ou seja, com seus interlocutores; não como supostamente sempre
foram atribuídos determinados sentidos, mas como são atribuídos por esta
interlocução. A significação do medo na obra analisada se refere à realidade
efetiva nas condições reais de comunicação verbal do contexto da época
supracitada.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAKHTIN, M. Marxismo e filosofia da linguagem. 2ª ed. São Paulo:


Hucitec. 1981.
BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes. 1992.
BARROS, D. L. P. de. Contribuições de Bakhtin às teorias do discurso. In:
BRAIT, B. (Org). Bakhtin, dialogismo e construção do sentido.
Campinas, São Paulo: Editora da Unicamp. 1997.
BRAIT, B. (Org.). Bakhtin, dialogismo e construção do sentido.
Campinas, São Paulo: Editora da Unicamp. 1997.
BRAIT, B. (Org.). Bakhtin: conceitos-chave. São Paulo: Contexto, 2005.
DOSTOIEVSKI, F. M. Crime e Castigo. 1ª ed. São Paulo: Martin Claret,
2002 (Coleção A Obra-Prima de Cada Autor - Série Ouro 12).
SOUZA, G. T. Introdução à Teoria do Enunciado Concreto. São Paulo:
Humanitas/FFLCH/USP, 2002.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
391 392
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maior, ou seja, a internet. Dessa forma, buscando os estudos realizados pela


O BLOG JORNALÍSTICO EM QUESTÃO:
Lingüística Textual sobre como se categoriza e classifica tipo textual, gênero
UM SUPORTE PARA GÊNEROS DO JORNAL?
textual e suporte, surgem algumas questões: O blog jornalístico seria de fato

Mara Silva Ferraz∗ um gênero? Em se tratando de um gênero, qual seria o seu suporte? A
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
marasferraz@hotmail.com internet? Ou a internet seria um serviço que engloba vários suportes? Em se
Nirvana Ferraz Santos Sampaio∗∗ tratando de um suporte, ele se comportaria como um jornal digital com
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
nirvanafs@terra.com.br diversos gêneros? A hipótese que levantamos é que o blog jornalístico se
constitui como um suporte para diversos gêneros que são encontrados
também nos jornais online, e impressos, com diferenças quanto à
RESUMO
Este trabalho examina as noções de gênero textual e suporte para tentar determinar como ambas organização.
têm sido aplicadas no plano teórico a respeito dos blogs, abalizando-os enquanto suporte.

PALAVRAS-CHAVES: Blog. Diário virtual. Gênero. Suporte


MATERIAL E MÉTODOS

Para a concretização deste trabalho, fizemos um levantamento da


literatura pertinente à tradição relativa ao jornal na área de Comunicação,
INTRODUÇÃO
verificando as diversas classificações dos gêneros para este campo e
contrastando-as com os estudos sobre gênero na Lingüística; em seguida,
O blog é uma abreviação do termo Weblog (web – recurso
fizemos um levantamento da estrutura e dos gêneros inseridos no jornal
disponibilizado na internet; blog - diário de bordo), surge em meados da
online, estabelecendo uma comparação com os blogs.
década de 90, e, no Brasil, ele ganha espaço no início de 2000, com função
Dessa forma, para responder as questões, aqui, propostas, foram
inicial de um diário virtual, no qual o autor exprime suas idéias e opiniões
observados 200 blogs com diversas temáticas, ressaltando sua estrutura e
sobre determinado assunto. Aos poucos, foi assumindo outra dimensão,
sua performance perante as características apresentadas. Em seguida, 100
sobretudo a exposição de matérias jornalísticas produzidas por autor ou
blogs jornalísticos foram selecionados e analisados de acordo com os
autores do blog. Surge aí a inserção do blog na esfera pública midiática.
conceitos de tipo textual, gênero e suporte à luz dos estudos lingüísticos. Os
Partindo dessa premissa, analisando então a estrutura do blog, há quem o
100 blogs foram catalogados e comparados entre eles e com o JB online, a
defina como um gênero jornalístico, fazendo parte então de uma organização
Folha online, O Globo online e o Estadão online.


Graduanda do Curso de Comunicação Social/Jornalismo
∗∗
Doutora em Lingüística. Professora do DELL/UESB. Orientadora do trabalho. _____________________________________________________________________________
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .391-394.
393 394
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RESULTADOS E DISCUSSÃO O suporte blog jornalístico possui uma diagramação diferente da


encontrada nos jornais online e semelhantes aos blogs de fórum íntimo, ou
Verificamos que a noção de gênero na literatura da área de seja, com uma estrutura flexível. Em alguns, encontra-se a presença de
comunicação é pouco precisa, havendo uma grande divergência nas vídeos complementando o assunto postado, assim como nos jornais onlines.
designações dos gêneros específicos do jornal. Melo (1985), um teórico muito
lido nos Cursos de Comunicação, classifica os gêneros do jornal em a) CONCLUSÃO
jornalismo informativo: nota, notícia, reportagem, entrevista; b) jornalismo
opinativo: editorial, comentário, artigo, resenha, coluna, crônica, caricatura, Este trabalho representa uma análise parcial sobre a constituição dos
carta; e apresenta, em seu livro, a seguinte classificação de Beltrão: a) blogs jornalísticos, através de comparações, como um suporte, visto que
jornalismo informativo: notícia, reportagem, história de interesse humano, neles observamos a capacidade de agregar e apresentar textos que se
informação pela imagem; b) jornalismo interpretativo, reportagem em constituem em diversos gêneros que pertencem também ao jornal online.
profundidade; c) jornalismo opinativo: editorial, artigo, crônica, opinião
ilustrada, opinião do leitor. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
A partir dos estudos lingüísticos, chega-se à noção de tipo textual como
MELO, J. M. A opinião no jornalismo brasileiro. Petrópolis: Vozes, 1985.
construto teórico que compreende mais ou menos meia dúzia de categorias
MARCUSCHI, L. A. Letramento e oralidade no contexto das práticas sociais e
(narração, argumentação, exposição, descrição, injunção); quanto aos eventos comunicativos In: SIGNORINI, I. (org.) Investigando a relação
oral/escrito e as teorias do letramento. Campinas, SP: Mercado das
gêneros, chega-se à noção de forma textual realizada concretamente e
Letras. 2001.
encontrada como texto empírico materializado (MARCUSCHI, 2001); quanto ao ____. A questão do suporte dos gêneros textuais. Versão provisória
suporte, chega-se à noção de portador de texto, ou seja, um locus no qual o 18/05/2003.
texto se fixa, podendo ser físico ou virtual, com formato específico SILVA, J. Q. G. Gênero discursivo e tipo textual. SCRIPTA, Belo Horizonte,
v.2. n.4 p. 87-106, 1999.
(MARCUSCHI, 2003).
Com a análise da amostra, verificamos que o blog jornalístico se
identifica como um suporte de vários gêneros, quais sejam: a notícia
jornalística, a reportagem jornalística, publicidade, editorial, carta do leitor,
charge. Esses gêneros no blog não recebem a denominação, mas têm o
mesmo funcionamento.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
395 396
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sobre um tapete de ouriços, haja vista que os discursos produzidos no


O DIÁLOGO ENTRE A PARAPLÉGICA E A SEXUALIDADE:
transcorrer da história internalizaram preconceitos e valores – barreiras
MEMÓRIAS E SILÊNCIOS
difíceis de serem transpostas – pois propiciam categorias de pensamento que

Maria do Socorro Correia Lima* não se podem modificar de uma hora para outra.
Universidade Estadual de Campinas
socorrolima19@yahoo.com.br O ponto de vista apresentado aqui defende a idéia de que muitos (as)
deficientes enfrentam, sim, problemas na esfera sexual, que não são os
mesmos enfrentados por pessoas ditas normais. Daí não ser possível
RESUMO
Ancorado nos pressupostos teórico-metodológicos da Análise de Discurso Francesa, este trabalho restringir as dificuldades apenas aos homens e às mulheres deficientes. Há
visa a investigar os depoimentos de algumas mulheres paraplégicas que residem no Distrito
Federal (DF), tendo por base seus movimentos discursivos sobre sexualidade e deficiência. outras incapacidades não-físicas que podem vir a afetar, temporária ou
Participaram desta pesquisa 10 paraplégicas residentes no DF, com idades entre 25 e 45 anos. Os
depoimentos foram coletados por meio de entrevistas semi-estruturadas. As respostas foram
permanentemente, a sexualidade de cada um.
gravadas em áudio e posteriormente analisadas. A análise propiciou verificar que atravessadas
pelos discursos é que as mulheres paraplégicas constroem suas representações não apenas de
sexualidade, mas também de deficiência, exclusão social e mulher deficiente. MATERIAL E MÉTODOS
PALAVRAS-CHAVE: Sexualidade. Deficiência. Exclusão Social. Mulher Deficiente. Discurso.

Participaram desta pesquisa, de cunho etnográfico, dez paraplégicas


residentes no DF, com idades entre 25 e 45 anos, oriundas de camadas
econômicas populares. Os depoimentos foram coletados por meio de
INTRODUÇÃO
entrevistas semi-estruturadas. As respostas foram gravadas em áudio e
ulteriormente transcritas e analisadas.
Ciente do estado atual em que se encontra o conhecimento produzido e
Cabe-me ressaltar que para a elaboração deste estudo, analisarei
veiculado na área da sexualidade do lesado medular, o qual se tem limitado
alguns recortes das entrevistas gravadas e transcritas de apenas cinco
ao campo subjetivo das especulações e do imaginário, procuro um conjunto
mulheres paraplégicas que, de certa forma, ajudam a compreender o cenário
de informações concernentes à esfera sexual, com o intuito de minimizar a
da diversidade que norteia tanto a sexualidade quanto a deficiência. As
visão desarticulada que tanto a sociedade como as deficientes têm da
observações e anotações realizadas em campo são utilizadas somente como
sexualidade.
suportes secundários de informação.
Falar a respeito da sexualidade de pessoas com deficiência e, mais
Apesar de as questões enfocarem a esfera da sexualidade, outros
precisamente, da mulher paraplégica é uma tarefa comparada ao caminhar
tópicos como deficiência, discriminação, inclusão social e normalidade

*
Doutora em Lingüística Aplicada – IEL/UNICAMP
_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .395-399. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
397 398
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também foram focalizadas durante a entrevista com todas as participantes do A pessoa... quando a deficiência física, no meu caso, por exemplo, que sou
paraplégica é... é um pouquinho assustador principalmente pra quem já adquiriu
estudo. depois. Aí tinha uma vida sexual antes, aí adquiriu depois. Então acho que gera um
pouco de receio, um pouco de medo, de perder, perder a sexualidade, perder
A transcrição das respostas gravadas em áudio permitiu verificar a (Drica47).

presença de ressonâncias discursivas nas respostas das paraplégicas,


O fato de a vida sexual ativa constituir-se num objeto de preocupação
sobretudo, no que tange às questões concernentes à sexualidade e à
para a mulher paraplégica está relacionado com a crença de que deficiência e
deficiência. Ressonâncias atreladas ao corpo, à exclusão social e ao
sexualidade são incompatíveis. A maioria crê que a deficiente física é
preconceito das pessoas ditas normais também tiveram lugar nos discursos
assexuada, não tem desejo e que a sexualidade não lhe deve fazer falta.
das mulheres paraplégicas.
Em diferentes momentos das entrevistas percebi também que o prazer
As discussões serão ancoradas por meio dos conceitos de memória
apontado pelas mulheres entrevistadas quase sempre não está atrelado
discursiva, interdiscurso e formações discursivas. O debate propiciará
somente ao ato sexual (leia-se coito). A título de ilustração, temos o
corroborar que tecidas pela malha discursiva de si e do (a) outro (a) é que as
depoimento de Beth falando sobre sexo e orgasmo:
mulheres paraplégicas constroem suas representações de sexualidade, de
deficiência, de exclusão social e de normalidade.
“Tem outras maneiras de sentir, existe outras formas de sentir, e eu vou ressaltar
sempre: depende muito do parceiro, depende de como o parceiro vai conduzir,
como ele vai fazer. Pra MIM, o parceiro é... funciona como se é... estivesse
RESULTADOS E DISCUSSÃO descrevendo o que tá acontecendo ali, entendeu?” (Beth).

Tal como no homem paraplégico e tetraplégico, a libido em


Os trabalhos relativos às alterações da função sexual no lesado medular
paraplégicas encontra-se preservada. O desejo sexual não desaparece após a
são bastante incompletos. No que tange à mulher paraplégica, quase todos
lesão medular. Também não devemos esquecer idéias falsas que defendem
se restringem a um parágrafo e, em geral, consideram que a mulher tem
que: 1. as mulheres teriam mais dificuldades para atingir o prazer e o
menos problemas nessa esfera. (DE FIGUEIREDO CARVALHO; COELHO DAMASCENO,
orgasmo em relacionamentos sexuais; e, 2. as mulheres teriam menos
2003; SHARMA ET AL, 2006; SUAID, 2007).
necessidade de sexo do que o homem. Tais mitos são não somente aceitos
Analisar o discurso da mulher paraplégica implica interpretar sua fala,
como “verdades hegemônicas” e construídos socialmente, mas também
tendo como ponto de partida o lugar sócio-histórico-ideológico (condições de
difundidos e naturalizados pelas próprias mulheres (deficientes ou não).
produção) de onde ela a/enuncia. A título de ilustração, vejamos o
depoimento de Drica se referindo à sexualidade da pessoa com deficiência
física:

47
Por motivos éticos, os nomes dos sujeitos entrevistados foram modificados.
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399 400
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CONCLUSÕES

Refletir sobre a sexualidade da paraplégica há algumas décadas atrás


era considerado algo bastante ofensivo, pois havia a tendência de negar-se
ou mascarar-se a relevância da atividade sexual para a mulher deficiente. A
idéia de que a deficiência, sobretudo a física, aprisiona o corpo e faz dele
vítima e verdugo de sua própria história encontra-se ainda bastante arraigada
no imaginário das pessoas ditas normais e das deficientes.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DE FIGUEIREDO CARVALHO, Z. M.; COELHO DAMASCENO, M. M. Aplicación


de la teoría del cuidado transpersonal en pacientes parapléjicos
hospitalizados: relato de experiencia. Cienc. Enferm, v.9, n.2, p. 77-94,
2003.
SALIMENE, A. C. M. Sexo: caminho para a reabilitação. São Paulo:
Cortez, 1995.
SHARMA, S. C.; SINGH, R.; DOGRA, R; GUPTA, S. S. Assessment of sexual
functions after spinal cord injury in Indian patients. International Lournal
of Rehabilitation Research., v. 29, n.1, p. 17-25, march, 2006.
SUAID, H. J. et al . Management of sexuality of patients with spinal trauma
by the urologist. Acta Cir. Bras. São Paulo, 2007.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
401 402
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sócio-histórico e ideológico não só influencia o processo discursivo, mas


O DISCURSO DO GOVERNO: PROPAGANDA
encontra-se demarcado e re-significado na textualização.
INSTITUCIONAL OU PROPAGANDA POLÍTICO-ELEITORAL?
Uma vez que as condições de produção incluem basicamente os

Sidnay Fernandes dos Santos∗ sujeitos e a situação, para nortear esta leitura, elegemos alguns conceitos
Uiversidade do Estado da Bahia
sfsantos@uneb.br básicos da Análise de Discurso, intricados às condições de produção:
contexto imediato, contexto sócio-histórico e ideológico, posição sujeito e
interdiscurso.
RESUMO
Nesta pesquisa, propomos analisar as condições de produção de propagandas do Governo da Assim, buscamos aplicar conceitos da Análise de Discurso à leitura das
Bahia, veiculadas na revista Veja. Na análise, consideramos os contextos imediato e sócio-
histórico, ideológico, os sujeitos e a memória discursiva, focalizando os sentidos atribuídos aos
propagandas de Governo do Estado da Bahia. Para esta análise,
Projetos e ao Governo, a partir da materialização de formações discursivas. Assim, questionamos
os fatores que motivaram o governo a divulgar projetos da Bahia na mídia nacional. Como suporte
selecionamos uma propaganda específica: a que divulga o Programa Viva
teórico, recorremos a Pêcheux, Charaudeau, Soulages, Orlandi e Mussalim. Nordeste, veiculada na revista Veja, de 10 de agosto de 2005.
PALAVRAS-CHAVE: Condições de produção. Sujeitos. Interdiscurso. Publicidade. Os dispositivos teóricos que mobilizamos suscitam, portanto, estes
questionamentos: Quem fala no discurso da propaganda? Por que ações do
Governo da Bahia são divulgadas na mídia nacional? Que sentidos são
atribuídos ao Programa e ao Governo?
INTRODUÇÃO

MATERIAL E MÉTODOS
A Análise de Discurso, sustentada por dispositivos teóricos e analíticos,
possibilita novas maneiras de ler, visto que focaliza o modo como os sentidos Esta pesquisa, a partir dos dispositivos da Análise de Discurso de
são produzidos e o modo como são constituídas as posições sujeito na tradição francesa, considera a vertente metodológica qualitativa. Nessa linha,
relação do simbólico com o político. Estudar as condições de produção do a análise já se inicia a partir da constituição do corpus e este se organiza
discurso é primordial para analisar os processos de formulação, circulação e tendo em vista a natureza do material e a pergunta do analista. Para
interpretação dos sentidos em uma dada sociedade e, portanto, para refletir Charaudeau e Maingueneau (2004), em Análise do Discurso, geralmente, é o
sobre a relação das práticas discursivas com a exterioridade, pois o contexto corpus que, de fato, define o objeto de pesquisa.
Nesta investigação, o corpus constitui-se de textos publicitários do
Governo da Bahia, veiculados na mídia nacional – Revista Veja. A opção por
∗ tais textos justifica-se pelo fato de percebermos a intencionalidade camuflada
Professora Especialista da Universidade do Estado da Bahia – UNEB/DCH – Campus VI, Pesquisadora do Grupo de Pesquisa Cultura, Sociedade e Linguagem

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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .401-405 Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
403 404
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do sujeito institucional. A escolha do suporte midiático pelo sujeito do sujeito institucional construir, através da mídia nacional, uma imagem
institucional já é questionável e, ao trabalhar o material discursivo, positiva do governo para conseguir continuidade no poder administrativo do
detectamos elementos que podem validar nossas hipóteses. Estado, poder este legitimado através de eleições diretas.
A metodologia que norteia tal análise perpassa pelas etapas que, Na propaganda selecionada, o sujeito que fala assume duas posições,
segundo Orlandi (1999), devem conduzir o analista de discurso, as quais embora de forma escamoteada, pois só lhe é permitido, institucionalmente e
passam do texto ao discurso. Na primeira etapa, há a passagem da superfície considerando o pacto de comunicação publicitária de governo, posicionar-se
lingüística ao objeto discursivo; o analista procura ver no texto sua como governador (e sua equipe), representante do povo e do Estado.
discursividade e constrói um objeto discursivo. Na segunda etapa, Acontece que o sujeito enunciador assume também a posição de candidato,
estabelecem-se relações das distintas formações discursivas com a formação representante de um partido político.
ideológica que rege tais relações. Nesse momento, atinge-se a constituição O sujeito institucional representa, assim, a posição de sujeito que não
dos processos discursivos responsáveis pelos efeitos de sentidos produzidos consegue singularizar-se, que não consegue (ou não pretende) discernir, na
naquele material simbólico, de cuja formulação o analista partiu. prática discursiva, a função de governador e da função de candidato. Essa
posição sujeito manifesta a formação ideológica que governa as formações
RESULTADOS E DISCUSSÃO discursivas identificadas na propaganda em pauta, pois a posição de sujeito
que comunga, em um mesmo espaço discursivo e social, duas funções,
Na cena enunciativa, o sujeito publicitário utiliza estratégias textuais já
revela que a formação ideológica que conduz o discurso é o saber discursivo
cristalizadas no discurso da publicidade. Destacamos, em linhas gerais, que
sobre a administração pública brasileira. E o não discernimento, na
na mídia de massa, os receptores estão afastados, são anônimos, o que
administração pública, do espaço institucional, público e coletivo, do espaço
exige do discurso publicitário falar de outra coisa além do produto e pôr em
pessoal, privado e individual não é atual e não se limita aos horizontes do
cena uma série de representações do mundo e de seus seres. Neste caso, as
estado baiano.
mensagens publicitárias são, não apenas fictícias, mas ainda reconstituições
Assim, a posição ideológica assumida pelo sujeito que fala materializa-
de cenas da vida cotidiana, da vida social, ou então criações de alegorias
se no texto a partir das formações discursivas, cujos discursos dominantes
puramente imaginárias, mas cuja fonte é um acervo cultural compartilhado
povoam o interdiscurso sobre a ação político-eleitoral.
(SOULAGES, 1996).
Na época de circulação da propaganda, faltando um pouco mais de um
ano para nova eleição, o Governo da Bahia enfrentava greves em vários
setores do funcionalismo público do estado. Percebemos, pois, a necessidade

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
405 406
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CONCLUSÕES

Nas interfaces da propaganda institucional e da propaganda político-


eleitoral, o Governo da Bahia produz seu discurso e, portanto, os sentidos
que tentamos interpretar. Assim, como o discurso é um objeto de uma
incessante busca, este estudo representa apenas uma possibilidade de
análise, um singelo gesto de interpretação, pois sabemos que os sentidos -
que buscamos construir - caracteriza-se pela incompletude.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CHARAUDEAU, P.; MAINGUENEAU, D. Dicionário de análise do discurso.


São Paulo: Contexto, 2004.
ORLANDI, E. P. Análise de discurso: princípios e procedimentos.
Campinas: Pontes, 1999.
REVISTA VEJA. Edição 1919 – ano 38 – n. 32, Editora Abril.
SOULAGES, J-C. Discurso e mensagens publicitárias. In: CARNEIRO,
Agostinho Dias (Org.). O discurso da mídia. Rio de Janeiro: Oficina do
Autor, 1996.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
407 408
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Enquanto os princípios aristotélicos abordavam a construção da imagem


O ETHOS NOS FESTIVAIS DO CIRCUITO BAIANO DA VIOLA
do orador apenas a partir do que este dizia num dado contexto, os estudos
de haddadinos defendem a existência de imagens prévias sobre o orador,
Andréa Betânia da Silva∗
Universidade do Estado da Bahia sendo essas testadas ao longo da performance de cada um. Aqui passa a ter
andreabetania@gmail.com
lugar o conceito de performance apresentado por Zumthor (2000, p. 59),
para quem esta é a indissociável relação entre produtor e receptor, no exato
RESUMO momento em que a recepção acontece, pois, é um “[...] termo antropológico
O objetivo deste trabalho é apresentar a análise de um repente produzido num dos festivais
realizados pelo Circuito Baiano da Viola. Os eventos promovidos pelo citado circuito apresentam a e não histórico, relativo, por um lado, às condições de expressão, e da
produção de repentes que carregam um tom desafiador, através de um ethos notadamente
vaidoso, auto-suficiente, presente numa cenografia que exige interlocutores que se coloquem na percepção, por outro, a performance designa um ato de comunicação como
posição de defensores de valores importantes para o auditório, como a coragem, a lealdade, a
família, o trabalho, além de demonstrarem completo domínio sobre a arte de versejar. tal; refere-se a um momento tomado como presente”.

PALAVRAS-CHAVE: Repentes. Ethos. Cenografia.


MATERIAL E MÉTODOS

A coleta de dados se deu a partir da gravação do XVIII Festival de


INTRODUÇÃO Serrinha, destacando-se aqui o repente produzido pela dupla Miguelzinho e
Leandro Tranquilino a partir do mote Cantador que me enfrenta morre em
Este trabalho busca apresentar a análise de um repente produzido num menos de uma hora, cujo gênero é Mote de sete. Procedeu-se, então, à
dos festivais realizados pelo Circuito Baiano da Viola, de modo a perceber transcrição do repente, buscando manter todas as características da
qual o ethos e qual a cenografia presentes conforme as condições de produção in loco. Uma vez identificado o gênero em questão, teve início a
produção de uma dada situação discursiva. A partir dos pressupostos de análise, que buscou destacar os trechos em que o ethos se fazia presente,
Maingueneau (1997, 2001, 2005, 2006) pretende-se verificar a presença do fosse discursivo ou pré-discursivo.
ethos no discurso literário não apenas como uma estratégia persuasiva, mas
principalmente como um elemento constituinte da cena enunciativa. Embora RESULTADOS E DISCUSSÃO
apenas o ethos discursivo fosse enfocado por Aristóteles, aqui tratar-se-á
também da abordagem destinada ao ethos prévio por Haddad (2005). Os resultados parciais da análise indicam a presença do ethos pré-
discursivo, através de referências a conhecimentos anteriores à cena

Aluna do Mestrado em Letras e Lingüística da Universidade Federal da Bahia e Professora Auxiliar da Universidade do Estado da Bahia, campus enunciativa, trazendo as possíveis imagens pré-construídas sobre os
XXIV.
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .407-410. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
409 410
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interlocutores, e do discursivo, através das construções que se referem ao _____. Ethos, cenografia e incorporação. In: AMOSSY, Ruth. Imagens de si
no discurso: a construção do ethos. São Paulo: Contexto, 2005.
momento de enunciação. As imagens construídas em torno da figura do
______. Análise de textos de comunicação. Tradução Cecília P. de Souza
orador trazem à tona um tom desafiador endossado pela presença de um e Silva e Décio Rocha. São Paulo: Cortez, 2001.
ethos auto-suficiente, que utiliza sua experiência em festivais passados, ______. Novas tendências em análise do discurso. Tradução Freda
vencendo companheiros renomados, para garantir sua permanência entre Indursky. 3. ed. Campinas: Editora da UNICAMP, 1997.
ONG, W. Oralidade e cultura escrita: a tecnologização da palavra.
aqueles que figuram como dignos de respeito, como grandes repentistas. Em
Tradução Enid Abreu Dobranszky. Campinas, SP: Papirus, 1998.
alguns momentos, o auditório é citado no texto e chamado para reforçar a PERELMAN, C.; OLBRECHTS-TYTECA, L. Tratado da argumentação: a
construção requerida por cada um dos interlocutores. Como elemento nova Retórica. Tradução de Maria Ermantina Galvão G. Pereira. São Paulo:
Martins Fontes, 1996.
persuasivo, recorre-se à posição adotada pelos ouvintes para fortalecer a
ZUMTHOR, P. Performance, recepção , leitura. Tradução Jerusa Pires
imagem do locutor e denegrir a imagem do interlocutor apresentado como Ferreira, Suely Fenerich. São Paulo: EDUC, 2000.
incapaz de manter a atenção dos presentes e de construir versos que
desfaçam as imagens criadas a seu respeito.

CONCLUSÕES

Uma vez que a pesquisa ainda se encontra em andamento, apresenta


conclusões ainda parciais, evidenciando que a presença do ethos mostra-se
fundamental para o desenvolvimento da cena enunciativa. Os discursos
construídos visam à adesão do auditório à imagem de um fiador que precisa
corresponder aos estereótipos criados a seu respeito como zelador da moral
e dos bons costumes, capaz de vencer seus adversários através das lutas que
se travavam no campo discursivo por meio do embate poético.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

MAINGUENEAU, D. Discurso Literário. Tradução Adail Sobral. São Paulo:


Contexto, 2006.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
411 412
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ser deixado para os cômicos (MINOIS, 2003, p.15). Assim, circunscritos no


O QUE HÁ DE TÃO PERIGOSO E PODEROSO NO FATO DE AS
campo da Análise de Discurso (AD) de linha francesa, pretendemos discutir o
PESSOAS RIREM E DE SEU RISO PROLIFERAR INDEFINIDAMENTE?∗
riso como prática ideológica. Ressalte-se, contudo, que não o abordaremos

Rosely Costa Silva Gomes∗∗ em todas as suas manifestações e formas. Por ser este um fenômeno de
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
rosecosta@uesb.br múltiplas faces e de muitos efeitos, optamos por analisá-lo, considerando-se
a exterioridade que permite o seu acontecimento, sob a forma discursivizada.
Nesse sentido, o riso é tomado como uma prática capaz de estabelecer,
RESUMO
O presente estudo, que integra o projeto de pesquisa intitulado Discurso, história e memória na manter e/ou transformar as relações de poder. Trabalhamos, portanto, sob o
produção cultural contemporânea, tem como objetivo principal discutir o riso como prática
ideológica. Circunscritos no campo da Análise de Discurso (AD) de linha francesa, defendemos a
seguinte questionamento: de que forma o riso, sob a forma discursivizada,
idéia de que o riso, em suas manifestações discursivizadas, se manifesta como forma de
pode contribuir para a manutenção ou reconfiguração de grupos de poder já
legitimação, conservação e/ou transformação de uma dada representação do Real. Sua
manifestação ocorre como uma força capaz de intervir no avanço de forças opostas ou de instituídos e socialmente bem aceitos, como também para o estabelecimento
transformar/reconfigurar estereótipos, representações.
de grupos de poder emergentes? Ou, ainda, parodiando Foucault (2002): O
PALAVRAS-CHAVE: Riso. Ideologia. Discurso. Sujeito.
que há de tão perigoso e poderoso no fato de as pessoas rirem e de seu riso
proliferar indefinidamente?

INTRODUÇÃO MATERIAL E MÉTODOS

Da Antiguidade aos estudiosos da pós-modernidade, inúmeros foram Considerando-se a natureza do objeto tomado para estudo – o riso em
aqueles que se dedicaram ao estudo do riso, o qual, segundo Aristóteles, suas manifestações discursivas – e dos objetivos que traçamos, recorremos à
constitui-se numa marca distintivamente humana. Para muitos, entretanto, Análise de Discurso Francesa (AD) como solo epistemológico, terreno propício
mais interessante que teorizar sobre o riso é simplesmente rir. Rir do caso e às discussões em que se investiga a articulação entre o lingüístico e o social,
do acaso, do alheio, de si mesmo. Apesar de não ser esta uma tarefa que buscando as relações que vinculam a linguagem à ideologia. Nesse sentido, a
caia nas graças de um grande número de pessoas, correremos o risco de Análise do Discurso considera em seus estudos outras dimensões, que não
tentar teorizar sobre o riso por considerá-lo como um caso muito sério para apenas a lingüística, tais como o quadro das instituições em que os discursos
são produzidos, os embates históricos, sociais, etc. que se cristalizam nos

Trabalho vinculado ao projeto de pesquisa: Discurso, História e Memória na Produção Literária Contemporânea, coordenado pelo prof. Dr.
Cleudemar Alves Fernandes. discursos; o espaço próprio que cada discurso configura para si no interior de
∗∗
Professora da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, campus de Jequié. Especialista em Comunicação e Semiótica e em Literatura
Brasileira, com mestrado em Lingüística (ênfase em Análise do Discurso) pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). um interdiscurso (MAINGUENEAU,1997, p.13-14) e toma as condições em que
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .411-416. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
413 414
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os discursos são produzidos como parte constitutiva do sentido. Partindo do Angeli, na qual se encontra um diálogo entre dois personagens. Na análise,
princípio de que só há prática através de e sob uma ideologia; e que só há Mussalim destaca a ambigüidade produzida pela última frase da tira. E,
ideologia pelo sujeito e para o sujeito (ALTHUSSER, 1985, p. 93), discutimos lançando mão da questão por que lemos essa tira como um discurso de
sobre como se dá o processo de interpelação ideológica, e, humor, explicará que as condições de produção do discurso serão
consequentemente, a constituição do sujeito; e como o riso pode interferir na responsáveis pelo humor. A análise da tira apresentada por Mussalim reforça
reconfiguração/transformação incessante desse sujeito. a nossa tese de que o riso é governado pelas formações ideológicas que
constituem o sujeito, fato que o transforma num poderoso instrumento de
RESULTADOS E DISCUSSÃO luta ideológica.

Dois princípios básicos fundamentam essa análise: o caráter ideológico CONCLUSÕES


não é uma especialidade do riso; toda prática do sujeito é uma prática
ideológica, pois todo sujeito se constitui na/pela ideologia. Ou, conforme A análise desenvolvida permitiu-nos a seguinte constatação: longe de
Althusser (1985, p. 93): a) só há prática através de e sob uma ideologia; b) ser um ato desinteressado, o riso está sempre relacionado a posições-sujeito.
só há ideologia pelo sujeito e para o sujeito. Neste sentido, o sujeito, na Ele se manifesta como forma de legitimação, conservação e/ou
perspectiva da AD, funciona a partir de uma relação imaginária com suas transformação de uma dada representação do real. Sua manifestação ocorre
reais condições de existência e não tem controle do seu dizer e do seu fazer. como uma força capaz de intervir no avanço de forças opostas ou de
Ao assumir determinada forma sujeito, os indivíduos recebem como evidente transformar, reconfigurar estereótipos, representações.
o sentido do que ouvem e dizem, lêem ou escrevem (PÊCHEUX, 1997, p.157) e
também do que riem. Como as demais práticas do sujeito, também o seu riso REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
é governado pelas formações ideológicas que o constituem sujeito. Isso se
ALTHUSSER, L. Aparelhos Ideológicos de Estado: nota sobre os
torna claro se pensarmos que não rimos de tudo, nem de todos. Não rimos aparelhos ideológicos de Estado (AIE). Trad. de Walter José Evangelista e
das mesmas coisas em todas as épocas. Os temas risíveis em certo período, Maria Laura Viveiros de Castro: introdução crítica de José Augusto Guilhon
Albuquerque. 2. ed. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1985.
em certa cultura, não o serão em outro/outra. O seu riso é, assim como os
FOUCAULT, M. A ordem do discurso. Tradução: Laura Fraga de Almeida
seus dizeres, um recorte das representações de um tempo histórico e de um Sampaio. 8.ed. São Paulo: Edições Loyola, 2002.
espaço social: o sujeito ri a partir de um determinado lugar e de um MAINGUENEAU, D. Novas tendências em análise do discurso. 3.ed.
Trad. Freda Indursky; revisão dos originais da tradução Solange Maria Ledda
determinado tempo. Para melhor ilustrar essa discussão, utilizamos uma Gallo, Maria da Glória de Deus Vieira de Moraes. Campinas, SP: Pontes:
breve análise realizada por Mussalim (2003), a respeito de uma tira de Editora da Universidade Estadual de Campinas, 1997.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
415 416
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MINOIS, G. História do riso e do escárnio. Trad. Maria Elena O. Ortiz


Assumpção. São Paulo: Editora UNESP, 2003.
MUSSALIM, F. Análise do Discurso. In: MUSSALIM, F.; BENTES, A. C.
Introdução à lingüística: domínios e fronteiras. São Paulo: Cortez, 2003.
p. 101-142.
PÊCHEUX, M. Semântica e Discurso: uma crítica à afirmação do óbvio. 3.
ed. Trad. E. P. Orlandi et al. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1997.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
417 418
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estético-corporal, o ideal de beleza por ela exibido é ser magro. Dessa forma,
OLHARES AMEAÇADORES CONTRA O DESEJO DE SER O QUE SE É:
os anúncios desenvolvem necessidades e desejos nas pessoas e/ou
DISCURSO E CORPO∗
satisfazem os já existentes. Eles contam com a ajuda de inúmeras estratégias

Luara Vieira∗∗ para chegar ao cliente. Trabalham com técnicas de controle, que promovem
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
luarapvieira@yahoo.com.br uma determinada submissão do leitor (telespectador).
Nilton Milanez∗∗∗ Este trabalho pretende estudar o discurso propagandístico impresso em
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
niltonmilanez@hotmail.com revistas, investigando seus procedimentos de controle e mapeando os
desejos e as necessidades criados pelas revistas impressas em suas
reportagens e propagandas. Além disso, procura-se discutir o sujeito, assim
RESUMO
Este trabalho visa a investigar e discutir o corpo como acontecimento discursivo em torno dos como os efeitos de sentido nos enunciados acerca do gordo e do magro.
lugares de memória e constituição de identidades brasileiras, problematizando o sujeito e a
história, no interior da Análise do Discurso a partir dos postulados de Michel Foucault. Dessa A discussão do trabalho será fundamentada nos postulados de Michel
forma, busca-se investigar os procedimentos do discurso utilizados na construção de propagandas.
Nesse sentindo, observaremos as leis internas ao discurso sobre o corpo na propaganda, Foucault no interior da Análise do Discurso de linha francesa. O método
evidenciando os padrões de normalidade e de beleza na primeira década do século XXI. Em
seguida, analisaremos a construção do sujeito-leitor a partir das propagandas e os mecanismos
utilizado na teoria do discurso é o apresentado por Foucault em a
usados para o agenciamento do desejo dos leitores.
Arqueologia do Saber, livro no qual o filósofo desenvolve a questão do
PALAVRAS–CHAVE: Análise do Discurso. Corpo. Discurso. Propaganda. Formação do sujeito. enunciado e da função enunciativa.

MATERIAL E MÉTODOS

INTRODUÇÃO
O corpus do trabalho é a propaganda da revista “Contigo” de 07 de
dezembro de 2006, edição nº. 1629, páginas 48 e 49, editora Abril; e a tela
Na contemporaneidade, convive-se muito com a sobrevalorização do
“Vênus de Urbino”, pintada por Tiziano Vecellio, em 1538.
corpo. As pessoas são impulsionadas a mudarem cada vez mais as suas
O discurso é uma construção social, que só pode ser analisada
formas para serem aceitas e bem vistas pela sociedade.
considerando o seu contexto histórico-social. Ele não é língua, mas é por
A propaganda é uma ferramenta do marketing que visa persuadir as
meio dela que ele adquire sua materialidade. Os sujeitos sempre estão se
pessoas a aderirem determinado produto ou idéia. Quando a questão é
comunicando, seja com posições semelhantes ou antagônicas e tais

Projeto de Pesquisa “Corpo e Discurso: lugares de memórias das identidades brasileiras na mídia e na literatura” coordenado pelo
professor Dr. Nilton Milanez.
∗∗
pronunciamentos se constituem ideologicamente.
Graduanda do IV semestre de comunicação Social na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia.
∗∗∗
Professor Doutor em Lingüística/Análise do Discurso. Professor do Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários da UESB.

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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .417-421. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
419 420
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Segundo Fernandes (2007, p. 19), no discurso encontra-se os efeitos afirmando o papel de uma mulher sedutora e vendendo a imagem idealizada
de sentido; as palavras vão além de seus significados. Os pronunciamentos do corpo feminino.
são conforme a realidade que o envolve, englobando as posições que Em contrapartida, “há um século, nos países ocidentais desenvolvidos,
influenciam diferentes opiniões. Isso confirma que os sentidos não são postos os gordos eram amados; hoje nos mesmos paises, amam-se nos magros”
e as palavras não possuem um sentido único. (FISCHILER apud. CASTRO, 2003). Por isso, a comparação com a tela de Tiziano
Nesse sentido, as palavras são meros elementos gramaticais, mas, para Vecellio, na qual vemos uma mulher despida em uma cama. A diferença é
Foucault (1986, p. 90), elas se inserem em um “domínio geral de todos os que a beleza na época renascentista era a mulher robusta e de quadris
enunciados”, “grupo individualizado de enunciados”. O enunciado deve ser largos.
entendido como um acontecimento de um determinado tempo e lugar. É Na formação das modalidades enunciativas, conforme Foucault (2004),
imprescindível atenção para reconhecê-lo e isso só se torna possível quando remete-nos a três perguntas, que embasam esta análise e são discutidas a
se interroga a linguagem e descobre-se o que determina sua existência, já seguir: Quem fala? Qual a instituição? Quais as posições do sujeito?
que o enunciado não é totalmente visível ou oculto. Ele é constituído por um O ser falante da propaganda é a indústria capitalista, que tenta por
conjunto de signos que se compõem por quatro elementos: refente, sujeito, meios persuasivos atingir o consumidor e fazê-lo adquirir os seus produtos.
campo associado e materialidade específica. Um discurso voltado às mulheres independentes economicamente. O meio
utilizado pela empresa de lingerie para fazer a sua publicidade é destinado ao
RESULTADOS E DISCUSSÃO público feminino, de classe alta. A Contigo é uma revista de celebridades,
custa R$ 6,90 e não são todas as mulheres que têm acesso a ela. Podemos
A propaganda da revista Contigo traz uma modelo na cama usando encontrá-la, principalmente, em salões de beleza.
uma lingerie. A formação discursiva é semelhante em todos os anúncios da A mídia é que se encontra por trás dessa indústria, porque é ela que
marca Marcyn. Apresentam características subjetivas e um discurso direto de constrói um padrão de beleza. Uma imposição de um modelo que limita a
como suas consumidoras devem ser. liberdade de expressão da mulher e a maneira como ela se comporta
Os vocábulos são contraditórios. Os sujeitos podem achar que por socialmente; dizendo que ela deve ser magra, ter cabelos lisos, pernas
serem decididos ou por se parecerem com a modelo são Marcyn. O sujeito longas, corpo torneado, gerando perda de valores e identidade.
fica confuso, porque o discurso o induz a ser decidido ou ter um corpo O sujeito cria a imagem de que é diferente, por não corresponder ao
esbelto. Há a exibição de um padrão de beleza magro. O anúncio valoriza a padrão. Por isso, corre em busca do corpo perfeito, apropriando-se de todos
mulher, suas formas, a pele, o olhar, os cabelos, ou seja, todo o seu corpo, os mecanismos, sobretudo das dietas, para continuar interagindo
socialmente. Sente-se vigiado e se não for como os outros é tomado pelo
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
421 422
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sentimento de culpa. Acredita que sexualidade e sensualidade estão


intrinsecamente ligadas à aparência física.

CONCLUSÃO

O modelo de beleza atual é estreito e socialmente construído. Na


verdade, criam-se formas de controlar o comportamento social e sexual da
mulher, impondo como ela deve ser e não como ela quer ser. As pessoas,
freqüentemente, se perguntam “porque me olham assim?”, uma vez que se
sentem obrigadas a ter o corpo perfeito. O medo acaba colocando em risco a
saúde, devido ao desejo da perfeição.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FOUCAULT, M. A arqueologia do saber. Tradução de Luiz Felipe baeta


neves. 7ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004.
______. História da sexualidade 2: o uso dos prazeres. Tradução de
Maria tereza da Costa Alburquerque; revisão técnica de José Augusto Guilhon
Alburquerque. 6ª ed. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1984.
FERNANDES, C. A. Análise do Discurso: reflexões introdutórias. 2ª ed.
São Carlos: Claraluz, 2007.
CASTRO A. L. Culto ao corpo e sociedade: mídia, estilos de vida e
cultura de consumo. São Paulo: Annablume: Fapesp, 2003.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
423 424
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partir de uma textualização lacunar que produz sentidos de visibilidade,


PALAVRA DITA, IMAGENS EM MOVIMENTO
transparência, testemunha dos fatos representados.

Érica Karine Ramos Queiroz∗ No cinema, o gesto do espectador de busca de prazer (lúdico) é mais
Universidade Estadual de Campinas
ericafaria2002@yahoo.com.br significante do que o gesto de busca de informação preponderante no
telespectador do telejornalismo, e isso produz efeitos de sentidos outros uma
vez que a “perda de vigilância do espectador do cinema inclina-o a
RESUMO
A questão principal que ocupa os analistas de discurso é a compreensão da relação do simbólico simpatizar, por identificação, com qualquer personagem, contanto que a
com o político, dado que estes entendem o sentido como dividido, não de qualquer maneira, mas
na relação com a língua. Nesta perspectiva, é de suma relevância a análise da materialidade estrutura narrativa o conduza para isso” (AUMONT, 1995, p. 266).
áudio-visual constitutiva da textualização lacunar da notícia telejornalística e por isso propomos
algumas considerações teóricas e analíticas sobre o funcionamento da imagem na materialidade Já no telejornalismo temos um fechamento de sentidos estruturado
multimodal de telejornais veiculados no horário nobre da televisão brasileira.
pela sua própria materialidade, narratividade, pelo seu caráter autoritário de
PALAVRAS CHAVE: Análise de Discurso. Mídia. Imagem. Multimodalidade.
impor uma única verdade, o que produz um efeito de vigilância no
telespectador. Nesta perspectiva, a imagem produz um efeito de evidência e
romper com este efeito, permite observar que a imagem tem
enquadramento, foco, planos, etc, o que possibilita desnaturalizar (duvidar) o
INTRODUÇÃO efeito de veracidade, de transparência, creditado pelos telejornais a partir de
narrativas verbais e não verbais, de suportes tecnológicos.

Diferentemente do cinema, no telejornalismo, de maneira geral, a


imagem é "casada" com o texto de modo a produzir efeito de realidade pela MATERIAL E MÉTODOS

visibilidade. Fecé (1998) trata da força que a imagem na mídia televisiva tem
ao produzir efeitos de sentido de realidade e não de realismo. O efeito de Esta pesquisa foi desenvolvida no âmbito da teoria da Análise do
realismo se dá porque mesmo diante de um filme realista, o autor sabe que Discurso (AD) francesa e brasileira e tem como principal objetivo definir a
está vendo um filme e o efeito de realidade se dá porque o telespectador tem noção de textualização lacunar em funcionamento no discurso
a ilusão de que entre o representado e a representação não existe um ponto telejornalístico. As três notícias analisadas foram recortadas com base na
de vista. Visto isso, o discurso televisivo produz este efeito de realidade a relação temática entre MST e reforma agrária, sendo a primeira sobre a
ocupação dos pedágios no Paraná pelo MST; a segunda sobre o dizer do

Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Lingüística, do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL), da UNICAMP. presidente Luís Inácio Lula da Silva de que só Deus o impedirá de fazer as
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .423-427. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
425 426
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reformas que este país precisa; e a terceira sobre a liberação da verba de editoração produz uma nova “cara” (versões) para o fato noticiado de
PRONAF pelo governo federal. Estas notícias foram veiculadas entre os dias modo que as notícias são produzidas para serem eficientes ao limitar a
24 e 27-06-03, por cinco telejornais brasileiros: Jornal da Record (Rede circulação de sentidos. Daí a eficácia da textualização lacunar a partir da
Record), Jornal Nacional (Rede Globo), Jornal da TV (Rede Cultura), Jornal sintaxe que organiza as notícias telejornalísticas através do diálogo das
da Band (Rede Bandeirantes) e Jornal do SBT (Rede SBT). imagens com o áudio, sendo que a imagem siginifica-se, freqüentemente,
Para proceder a tal análise, fez-se necessário compreender a noção de como cenário da narrativa verbal.
multimodalidade dentro do campo teórico da análise do discurso. Logo, A partir destas premissas, compreendemos que a própria organização do
ancorada nos pressupostos teóricos desta teoria, compreendemos a telejornal não permite ao telespectador formar sua opinião a respeito do que é
materialidade multimodal a partir da noção de forma material da qual trata noticiado, já que, dada a homogeneização dos telejornais em que,
Orlandi (2000). Ou seja, a materialidade multimodal não é suporte empírico regularmente, noticiam os mesmos fatos, dado o efeito de naturalidade
sobre o qual o texto se inscreve, se materializa. A linguagem multimodal é produzido pelos apresentadores âncoras, o telespectador não tem opção de
forma abstrata mais conteúdo que referem a língua à história de modo que se escolher as informações e se vê impactado pelo poder das imagens. Mas, o
significa a partir de sua forma material histórica, ideológica, social. rompimento com uma onipotência narrativa no controle da informação
noticiada possibilita observar, interpretar que os enquadramentos significam,

RESULTADOS E DISCUSSÃO materializam os sentidos no plano da formulação de modo a reatualizar,


cristalizar ou romper com sentidos determinados ideologicamente,
historicamente no plano da constituição dos sentidos. Visto isso, as
Ancoramos nossa reflexão no texto de Pêcheux (1990) Discurso:
encenações do saber na mídia parecem responder a uma representação
Estrutura ou Acontecimento, onde o autor analisa enunciado "on a gangé", estereotipada da didatização mais do que a uma vontade de informar. Nesta
explicitando a opacidade deste enunciando nas condições de produção da
medida, a mídia se constitui mais do que como lugar de transmissão de
narração da vitória do presidenciável Mitterand, em 1981. Nesta análise,
conhecimento, ela se constitui como lugar de espetáculo para contemplação
Pêcheux explicita o modo como a mídia televisiva apaga o acontecimento em
passiva, como lugar de representação da realidade, como lugar onde o político
si, reduzindo diferentes eventos a um só, no caso a vitória não só de
divide os sentidos.
Mitterand, como também do socialismo. Logo, temos na mídia diferentes
versões para um mesmo fato, o que nos permite pensar a textualização da
notícia enquanto espaço de atualização/reatualização de fatos. Além deste
aspecto, observamos na análise das imagens telejornalísticas como o trabalho

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
427 428
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CONCLUSÕES

As formas de didaticidade: planos, esquemas, mapas, aspas, itálicos,


negritos, entonações, pausas, gestos, olhares, reformulações, definições para
explicações, exemplificações, são traços de orientação de leitura que
funcionam através da eficácia ideológica dos telejornais dado a sua
materialidade específica e o meio tecnológico de legitimação e veiculação do
saber que apaga a estruturação ideológica da subjetividade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AUMONT, J. A estética do filme. São Paulo: Ofício de arte e forma, 1995.


CENTRAL GLOBO DE JORNALISMO. Manual de telejornalismo. Rio de
Janeiro, Ed. TV Globo Ltda. 1985.
DAVALLON, J. A Imagem, uma Arte de Memória. In: ACHARD, P. et al. Papel
da Memória. Campinas, São Paulo, 1999.
FECÉ, J. L. Do realismo à visibilidade. Efeitos de realidade e ficção na
representação audiovisual. Contracampo, Niterói: Universidade Federal
Fluminense, 1998.
ORLANDI, E. P. Análise do Discurso: Princípios e Procedimentos.
Campinas: Pontes, 1999.
PÊCHEUX, M. O Discurso: estrutura ou acontecimento. Trad. Eni P.
orlandi. 4ª ed. Campinas, São Paulo: Pontes Editores, 2006. Edição original:
1983.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
429 430
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Nessa perspectiva, o produto ideológico faz parte de uma realidade


PROPAGANDAS EM BAKHTIN
social, refletindo uma outra realidade que lhe é exterior, já que tudo que é
ideológico é signo. Então, compreender um signo consiste em aproximá-lo de
Aurea Virginia Nogueira Ferreira48
Universidade Estadual de Campinas outros signos já conhecidos. Seu lugar é social e é meio de comunicação
percursovivo@yahoo.com.br
entre indivíduos socialmente organizados. Outrossim, é fundamental que
locutor e auditório formem uma unidade social, logo, a consciência individual
RESUMO deve ser um fato socioideológico e a consciência subjetiva do locutor atribua
Com base em referenciais teóricos de Mikhail Bakhtin (1929), perpassando superficialmente pelos
campos teóricos da retórica, da Análise do Discurso (Pêcheux, 1983; Orlandi, 1999; entre outros) e significação às formas normativas numa dada enunciação, determinada pelos
da publicidade (Carvalho, 2003), o artigo pretende fazer uma abordagem das implicações da
linguagem dentro do exercício social, observando duas propagandas institucionais bancárias, elementos extralingüísticos que interpelam a situação. Essa significação pode
sendo uma do Banco da Lavoura (atual Banco Real S/A), datada de dezembro de 1962 e a outra
do Banco Real S/A, datada de maio de 2005, estas compondo momentos históricos diferenciados, ser analisada em um conjunto de significações ligadas aos elementos
viabilizando o intercruzamento de tais discursos, remetendo, desta forma, à compreensão de que
a enunciação não é individual, e sim, possuidora de uma natureza social. lingüísticos que a compõem. Assim, há uma a multiplicidadade de

PALAVRAS-CHAVE: Linguagem. Exercício social. Discurso. Compreensão. Enunciação.


significações, às quais são inseparáveis das situações concretas em que se
realizam.

MATERIAL E MÉTODO
INTRODUÇÃO

Para uma abordagem das implicações da linguagem dentro do exercício


Apesar da pluralidade, Bakhtin revela a unidade em suas obras através social, utiliza-se neste trabalho como aporte, os referenciais teóricos de
da abordagem sobre a linguagem. Esta como representação do exercício Mikhail Bakhtin, perpassando superficialmente pelos campos teóricos da
social, reportando o intercruzamento dos discursos com outros, o qual retórica, da Análise do Discurso e da publicidade, já que para tal trabalho
comporta duas faces: uma de que a palavra procede de alguém e a outra de foram selecionadas duas peças publicitárias institucionais bancárias, sendo
que a palavra se dirige para alguém. Nessa conjuntura, compreende-se que a uma do Banco da Lavoura (atual Banco Real S/A), datada de dezembro de
palavra é mediadora entre o social e o individual, ela se dirige a um 1962 (propaganda A) e a outra do Banco Real S/A, datada de maio de 2005
interlocutor, variando de acordo com o grupo social a que pertence ou ao (propaganda B). Para tanto, o enfoque Bakhtiniano é bastante pertinente
qual se dirige. É, portanto, fenômeno ideológico. para compreensão de que a enunciação é possuidora de uma natureza social,
e que nessa perspectiva há a possibilidade de um intercruzamento entre os
48 Graduada em Letras Vernáculas – UCSal; Mestranda do Curso Estudos em Linguagens da Universidade do Estado
discursos apresentados; assim, a utilização de tal corpus, exigiu um breve
da Bahia – UNEB.
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .429-433. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
431 432
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perpassar pela publicidade e, por entender que publicidade é linguagem e de qualidade, gerando sustentabilidade, contribuindo para a evolução da
discurso, foi necessário também filiar tal abordagem a algumas noções sociedade.
pertinentes à argumentação e ao interdiscurso. Nessa perspectiva, a propaganda “B”, do Banco Real, que enfoca a
terceira idade, demarca uma trajetória de indiferença e descaso, à qual o
RESULTADOS E DISCUSSÃO idoso era associado a estereótipos negativos como doenças, inatividade e
improdutividade, sempre ligado a produtos farmacêuticos ou sempre
As duas propagandas evidenciam que o signo pode ser convertido em exercendo papéis de avós. Hoje, o idoso é encarado como consumidor
signo socioideológico, adquirindo um sentido que ultrapassa suas potencial, adquirindo produtos modernos e serviços bancários, considerado,
particularidades, a exemplo da propaganda “A”, na qual formatura representa um segmento do mercado com poder econômico. Então, o Banco Real,
oportunidade, momento de alegria, de realização, de valorização do estudo, evidencia na propaganda o Concurso Talentos da Maturidade, o qual estimula
de ascensão social. Assim como, na propaganda “B”, na qual maturidade e a participação de pessoas a partir de 60 anos, incentivando, que este retome
liberdade representam produtividade, tempo para realizar feitos, de produzir os estudos, aspecto a ser resgatado nesse período, representando uma
e descobrir o (s) talento(s) anteriormente não despertado(s). instituição que possibilita inclusão e valoriza a terceira idade, por meio de
Quanto à significação ser inseparável da situação concreta em que se valores como respeito e igualdade de oportunidade, posicionando-se de
realiza, podendo apresentar significação diferente a cada vez, de acordo com maneira “diferenciada”, rejeitando o passado de preconceito, e de educação
a situação, toma-se, por exemplo, a peça “A”, que remete a um contexto deficitária conhecido por todos.
passado, ao qual a formatura era algo quase inatingível, justificando o
oferecimento de um empréstimo para tal fim. Assim, a temática abordada CONCLUSÕES
(formatura), pela propaganda “A”, ao mesmo tempo que anuncia a
valorização à educação, facilitando a sua conclusão, estabelece um laço O discurso escrito é integrante de uma discussão ideológica, ele
afetivo com seu auditório ao propor um empréstimo denominado familiar. responde às objeções potenciais. A enunciação constitui uma fração de uma
Portanto, ao enfocar um contexto dos anos 60, demarca um período de corrente de comunicação verbal ininterrupta, é como uma ilha emergindo de
mobilizações populares em favor de reformas sociais, repercutindo, na um oceano sem limites. Assim, uma inscrição é produzida para ser
educação. Talvez seja esse o posicionamento do Banco da Lavoura ao compreendida, é orientada para uma leitura no contexto da realidade literária
enfocar o tema, no intuito de propor ser uma instituição atualizada, estando do momento, isto é, no contexto do processo socioideológico do qual ela é
sempre ao lado do povo, vinculando a missão de prestar serviços financeiros parte integrante.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
433 434
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAKHTIN, M. M. Marxismo e filosofia da linguagem: problemas


fundamentais do método sociológico da linguagem. Trad. Michel
Lahud e Yara Frateschi Vieira.São Paulo: Hucitec, 2006. 203 p. Edição
original: 1929.
CARVALHO, N. Publicidade: a linguagem da sedução. São Paulo: Ática,
2003.
ORLANDI, E. P. Análise do discurso: princípios e procedimentos. 3. ed.
Campinas, São Paulo: Pontes, 2001.
PÊCHEUX, M. O Discurso: estrutura ou acontecimento. Trad. Eni P.
orlandi. 4ª ed. Campinas, São Paulo: Pontes Editores, 2006. Edição original:
1983.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
435 436
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trabalho com gêneros discursivos na escola é uma excelente oportunidade de


PUBLICIDADE E AULA DE PORTUGUÊS: se lidar com a língua nos seus mais variados usos no dia-a-dia, pois nada do
COMO ESTUDAR EM SALA O DISCURSO DAS PROPAGANDAS?
que fazemos lingüisticamente está fora de ser um gênero.
Nessa perspectiva, é papel da escola oferecer aos alunos o contato com
Urbano Cavalcante da Silva Filho∗
Universidade Estadual de Santa Cruz os mais variados gêneros textuais ou discursivos, pois eles constituem ações
urbanocavalcante@yahoo.com.br
sócio-discursivas para agir sobre o mundo e dizer o mundo, constituindo-o de
algum modo.
RESUMO Portanto, este trabalho, originado na pós-graduação lato sensu em
O objetivo desta comunicação é apresentar uma proposta de reflexão e trabalho didático-
pedagógico com o texto publicitário nas aulas de Língua Materna. Nessa proposta de trabalho, Leitura e Produção Textual, tem o intuito de provocar uma discussão de
tomaremos, para ler e analisar o discurso materializado no texto publicitário, o arcabouço teórico
da Análise do Discurso (AD) de orientação francesa, pelo fato de esta corrente ser ancorada no caráter teórico, e apresentar uma proposta de reflexão e trabalho didático-
materialismo histórico e na ideologia e não perceber o discurso como um fenômeno lingüístico
independente e isolado das condições sociais de produção. pedagógico com o texto publicitário nas aulas de língua materna, a partir do

PALAVRAS-CHAVE: Texto publicitário. Aula de português. Análise do discurso. aparato teórico da Análise do Discurso, de filiação francesa. Para tal
discussão aportamo-nos principalmente nos estudos de Marcuschi (2006),
Kleiman (2005), Bezerra (2005), Fiorin (2005), Foucault (1995), Maingueneau
(2000), Orlandi (2001) e Pêcheux (1997).
INTRODUÇÃO

MATERIAL E MÉTODOS
Toda a discussão atual em torno da redefinição do objeto de ensino e
estudo da Língua Portuguesa (LP) tem permitido surgir documentos A proposta para leitura e análise do discurso publicitário nas aulas de
orientativos oficiais, a exemplo dos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN língua materna ganha realce nos pressupostos defendidos pela Análise de
(BRASIL, 1997), que apresentam orientações teórico-metodológicas para o Discurso (AD), de orientação francesa, visando “a compreensão de como um
ensino da LP. O cerne das idéias dos PCN fundamenta-se na teoria dos objeto simbólico produz sentidos, como ele está investido de significância
gêneros do discurso (BAKHTIN, 1997) sejam eles orais ou escritos, permitindo para e por sujeitos” (ORLANDI, 2001, p. 26). A escolha por esta corrente da
um maior esclarecimento do seu funcionamento, o que é extremamente AD se deve a sua ênfase no materialismo histórico e na ideologia.
importante tanto para sua produção quanto para sua compreensão. O Trazer o gênero discursivo propagandístico para sala de aula de língua
materna, significa poder, ao lermos e analisarmos o discurso nele

Graduado em Letras pela Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), Discente da Pós-graduação Lato Sensu em Leitura e Produção Textual
(UESC) e Mestrando em Cultura e Turismo (UESC). materializado, verificar os delineamentos sociais que levaram à construção
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .435-439 Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
437 438
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dos sentidos discursivos, ou seja, verificarmos como as práticas discursivas se CONCLUSÕES


processam numa dinâmica interacional, na qual os sentidos se constroem
pela negociação entre os sujeitos e como esses têm suas ações motivadas Concordamos com Bezerra (2005) quando afirma reconhecer que a
ideologicamente. escola sempre trabalhou com gêneros, até porque, na década de 80, com a
divulgação de algumas teorias lingüísticas privilegiando o estudo do texto, os
RESULTADOS E DISCUSSÃO livros didáticos diversificaram e ampliaram ainda mais a sua seleção textual,
destacando-se a presença de textos jornalísticos (notícias, reportagens,
A presente pesquisa, ainda em estágio de desenvolvimento, permite entrevistas, propagandas etc.). No entanto, tais ensinamentos eram restritos
que se encare o discurso publicitário como uma construção social, não à observação e análise de aspectos estruturais ou formais dos textos. Ou
individual, que deve ser lido e analisado considerando seu contexto histórico– seja, os textos eram usados como pretexto para o estudo da metalinguagem
social, suas condições de produção, além de perceber que esse discurso e classificação gramatical (identificação de verbos, retirada de adjetivos,
reflete uma visão de mundo determinada, vinculada à do (s) autor (es) e à categorização dos substantivos e pronomes etc.).
sociedade em que vive (m). Assim, com essa proposta de trabalho nas aulas
de língua materna, os alunos poderão realizar uma leitura crítica dos textos REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
publicitários, descobrindo e desvencilhando-se das sedutoras armadilhas que
BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes,
esses textos apresentam e impõe-lhes. Com isso, esperamos poder auxiliar os 1997.
professores na reorientação do seu modus operandi na escola, BEZERRA, M. A. Ensino de língua e contextos teórico-metodológicos. In:
DIONISIO, A. P.; M., A. R.; BEZERRA, M. A. (Org). Gêneros textuais &
especificamente nas aulas de língua materna. Passa de longe a pretensão de
ensino. 4. ed. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005. p. 37-46.
apresentar aqui receitas metodológicas, mas acreditamos poder contribuir BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Parâmetros Curriculares
com o pensar em alternativas mais significativas de trabalho com a língua, já Nacionais – Língua Portuguesa – 3º e 4º ciclos. Brasília: 1997.
que quando ensinamos a operar com gêneros, ensinamos um modo de FIORIN, J. L. Linguagem e ideologia. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Ática,
2005. (Série Princípios).
atuação sócio-discursiva numa cultura e não um simples modo de leitura e
FOUCAULT, M. A arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense
produção textual. Universitária, 1995.
KLEIMAN, A. B. Apresentação. In: DIONISIO, A. P.; MACHADO, A. R.;
BEZERRA, M. A. (Org). Gêneros textuais & ensino. 4. ed. Rio de Janeiro:
Lucerna, 2005.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
439 440
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MAINGUENEAU, D. Termos-chave da análise do discurso. Tradução de


Márcio Venicio Barbosa, Maria Emilia Amarante Torres Lima. Belo Horizonte:
UFMG, 2000.
MARCUSCHI, L. A. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In:
KARWOSKI, A. M.; GAYDECZKA, B.; BRITO, K. S. (Org). Gêneros textuais:
reflexões e ensino. 2. ed. rev. e ampliada. Rio de Janeiro: Lucerna, 2006. p.
145-163.
ORLANDI, E. P. Análise do Discurso: princípios e procedimentos. 3. ed. São
Paulo: Pontes, 2001.
PÊCHEUX, Michel. Semântica e discurso: uma crítica à afirmação do óbvio.
Tradução de Eni Pulcinelli Orlandi et al. 2. ed. Campinas: Unicamp, 1997.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
441 442
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INTRODUÇÃO
QUESTÕES EPISTEMOLÓGICAS
SOBRE OBJETOS DE DISCURSO E CONCEITOS∗
Considerando que os estudos epistemológicos são fundamentais no
fazer da ciência, este trabalho, ligado ao subprojeto “A formação de
Leandro Chagas Barbosa∗∗
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia conceitos na Arqueogenealogia do Sujeito e na Escola Francesa de Análise de
chagasbarbosa@gmail.com
Discurso”, vinculado ao projeto temático de pesquisa “Análise de Discurso:
Maria da Conceição Fonseca-Silva∗∗∗
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia Foucault e Pêcheux, o diálogo teórico-metodológico e as repercussões na
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia
con.fonseca@gmail.com França e no Brasil”, tem como objetivo apresentar o resultado da
∗∗∗∗
Edvania Gomes da Silva investigação que procurou responder como se dá o funcionamento das regras
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
edvania_g@yahoo.com.br
de formação de objetos de discurso e de formação de conceitos. Para tanto,
procedemos ao estudo e à análise de escritos de Foucault e de escritos de
outros autores ligados à Análise de Discurso de linha francesa, que fazem
RESUMO
Neste trabalho, apresentamos o resultado da investigação de como se dá o funcionamento das parte do corpus da pesquisa, bem como à identificação e à análise de alguns
regras de formação de objetos de discurso e de formação de conceitos. Para tanto, analisamos
postulados de Michel Foucault e de outros autores ligados à Análise de Discurso de linha francesa. dos principais conceitos operacionais estabelecidos por Foucault.
Os resultados das análises indicaram que, na perspectiva foucaultiana, tanto no plano dos objetos
quanto no plano dos conceitos, é preciso considerar as regras de formação que possibilitaram seu
aparecimento e sua transformação.
MATERIAIS E MÉTODOS
PALAVRAS-CHAVE: Objeto de discurso. Conceitos. Posição de sujeito

O corpus da pesquisa à qual está vinculado este trabalho conta,


atualmente, com seiscentos e noventa e oito escritos que dizem respeito a
Foucault, a Pêcheux e a seu grupo, a pesquisadores brasileiros filiados ao
quadro epistemológico da AD e a pesquisadores que fazem uso de vulgatas
da AD. Os escritos foram catalogados sob orientação da coordenadora do
projeto, pela bolsista de iniciação científica do CNPq Celma O. Prado, e

Trabalho ligado ao subprojeto “A formação de conceitos na Arqueogenealogia do Sujeito e na Escola Francesa de Análise de Discurso”,
vinculado ao projeto de pesquisa maior “Análise de Discurso: Foucault e Pêcheux, o diálogo teórico-metodológico e as repercussões na França e contou com a ajuda da bolsista de iniciação científica da FAPESB Shirley
no Brasil”, financiado pela Uesb.
∗∗
∗∗∗
Bolsista de IC – PIBIC/CNPq e graduando em Letras na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, campus de Vitória da Conquista.
Doutora em Lingüística. Coordenadora do projeto de pesquisa e orientadora; líder do Grupo de Pesquisa em Estudos Lingüísticos
Guedes. O levantamento bibliográfico teve como fontes: no Brasil, o acervo
(GPEL/CNPq/Uesb) e do Grupo de Pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB). Professora do Departamento de Estudos
Lingüísticos e Literários da Uesb - campus de Vitória da Conquista. bibliográfico particular da coordenadora do projeto, as Bibliotecas do Instituto
∗∗∗∗
Doutora em Lingüística. Membro da equipe do projeto de pesquisa,. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa em Estudos Lingüísticos
(GPEL/CNPq/UESB) e do Grupo de Pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB). Professora do Departamento de Estudos dos Estudos da Linguagem (IEL) e do Instituto de Filosofia e Ciências
Lingüísticos e Literários da Uesb - Campus de Vitória da Conquista.
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .441-.445. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
443 444
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Humanas (IFCH) da Unicamp; na França, o Centre National de Recherche de comportamento dos indivíduos e o quadro dos sintomas patológicos e das
Scientifique (CNRS); na Université Paris-XII; o Centre Michel Foucault; a doenças de que eles (sintomas) são os sinais; entre a restrição punitiva, na
Société Internationale des Etudes sur Michel Foucault. prisão, e a restrição terapêutica no meio hospitalar. Portanto, não é a
Foram Identificados e analisados os conceitos operacionais contidos unidade do objeto loucura que constitui a unidade da psicopatologia, mas a
nesses escritos. Com base em Foucault (1961, 1963, 1969, 1999); Fonseca- loucura que foi construída pelo que se disse a seu respeito.
Silva (2005), Prado; Fonseca-Silva (2006), chegamos aos resultados - Um conceito aparece numa dispersão, só aparentemente, em
apresentados, a seguir. desordem. A formação do conceito de anormal, por exemplo, implica três
categorias que se imbricaram: o monstro humano, o incorrigível e o onanista.
RESULTADOS E DISCUSSÃO Esses elementos comportavam noções morais que, ao estabelecerem uma
relação de reciprocidade, fundaram a categoria do anormal. Têm histórias e
Os resultados indicaram que: trajetórias autônomas, mas as suas especificidades modificaram-se,
- O tema as regras de formação dos objetos de discurso e de formação confundiram-se e mesclaram-se em convergências e deslizamentos,
dos conceitos está ligado à noção de unidade discursiva. É preciso pensar as estabelecendo uma rede regular de saber-poder, que possibilita a genealogia
descontinuidades, os processos de ruptura na construção dos saberes e as dos anormais. A formação da rede que sustenta o conceito de anormal
condições de possibilidade de existência de uma verdade. implica novos contextos de referência social, científica e cultural, a partir do
- Um objeto de discurso existe sob as condições positivas de um feixe final século XIX, como a teoria geral da degeneração, a criação de uma rede
de relações que são estabelecidas entre instituições, processos econômicos e institucional-social complexa médico-jurídica e a problematização da
sociais, formas de comportamentos, sistemas de normas, técnicas, tipos de sexualidade infantil.
classificação, modos de caracterização.
- Os objetos de discurso são distintos nas diferentes épocas e nas CONCLUSÕES
diferentes instâncias: o objeto de discurso “loucura” não é o mesmo nos
séculos XVI, XVII e XIX; nem é o mesmo para o sistema judicial e para a As análises mostraram que a descrição da formação de um objeto de
psiquiatria no século XIX. No século XIX, o jogo das relações do objeto discurso e de um conceito implica identificação das relações que caracterizam
“loucura” se dá: a) entre os planos de especificação (categorias penais) e o uma prática discursiva; implica consideração das regras de formação que
plano psicológico; b) entre a instância judiciária e a instância de decisão possibilitaram seu aparecimento e sua transformação, pois, na análise dos
médica; entre o filtro constituído por todo aparelho de informação jurídica e o discursos, os laços entre as palavras e as coisas, que aparentemente se
filtro constituído por todo aparelho de informação médica; entre as normas mostram fortes, desaparecem.
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
445 446
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FONSECA-SILVA, M. C. Reflexões sobre alguns conceitos em Foucault


e em Pêcheux. Texto inédito, 2005.
FOUCAULT, M. A arqueologia do saber. Petrópolis: Vozes, Lisboa: Centro
do Livro Brasileiro, 1972. Edição original: 1969.
FOUCAULT, M. História da Loucura. São Paulo: Perspectiva, 1978. Edição
original: 1961.
FOUCAULT, M. O nascimento da clínica. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 1977. Edição original: 1963.
FOUCAULT, M. Os anormais. Curso no Collège de France (1974 -
1975). São Paulo: Martins Fontes, 2001. Edição original: 1999.
PRADO, C. O.; FONSECA-SILVA, M. da C. Relatório Final de subprojeto
de Pesquisa. Vitória da Conquista: Uesb, 2006.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
447 448
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do primeiro, e “caos” ou “falha técnica” ou “sabotagem”, no caso do segundo


RELEVÂNCIA
exemplo.
DA REFERENCIAÇÃO PARA DIREÇÃO ARGUMENTATIVA
A forma como referir os fatos constitui uma das escolhas do sujeito,

Maria Gorette da Silva Ferreira Sampaio∗ inserido nas práticas sociais cotidianas. E é uma escolha que direciona os
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
Universidade Estadual de Campinas – PG seus interlocutores para o seu projeto de dizer, ou seja, mais do que informar
goretteferreira@yahoo.com.br
o que se pretende é a participação do meu projeto de dizer, visando à
adesão do outro.

RESUMO Este trabalho, então, tem o objetivo de analisar, de forma bastante


No presente trabalho, a partir dos postulados de Marcuschi (2001) e Koch (2004; 2005),
defensores da referenciação como atividade discursiva, analisaremos, sucintamente, como os sucinta, como os produtores referiram os fatos em um documento, tentando
produtores referem os fatos em um documento, discutindo como esse processo é constitutivo do
encadeamento argumentativo do texto. A análise do texto nos permite afirmar que os seus
discutir como esse processo é constitutivo do encadeamento argumentativo
produtores realizaram escolhas lexicais compatíveis com a posição assumida e com o gênero
selecionado para essa prática comunicativa. As escolhas seguem uma linha argumentativa
do texto.
compatível com o projeto de dizer. Concluímos, portanto, que só podemos discutir a referenciação
dentro das práticas comunicativas, tendo em vista o seu caráter sócio-interativo.
MATERIAL E MÉTODOS
PALAVRAS-CHAVE: Referenciação. Argumentação. Objetos-do-discurso. Lingüística Textual.
Práticas sociais.

Constituiu corpus deste trabalho um texto, inserido no gênero carta


aberta, intitulado Reitor manda despejar estudantes, que circulou na cidade
de Vitória da Conquista - BA, no mês de fevereiro de 2005, quando houve um
INTRODUÇÃO
embate/conflito acerca da ocupação/invasão de um dos prédios da
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB.
Não são poucas as vezes que nos deparamos com situações nas quais
Baseando-nos nos pressupostos da Lingüística Textual, utilizamos como
as pessoas questionam a pertinência do uso de algum termo, a pertinência
referencial teórico para análise proposta discussões realizadas sobre
de representação de algum fato ocorrido, a exemplo dos últimos
referenciação, detendo-nos mais especificamente em estudos de Koch (2004;
acontecimentos políticos e/ou do transporte aéreo ocorridos no Brasil.
2005) e Marcuschi (2001).
Solicitadas a ajudarem a encontrar um termo para os acontecimentos,
Tendo como intuito verificar como os produtores do texto constroem o
algumas pessoas diriam “roubo” ou “acordo político” ou “corrupção”, no caso
seu projeto de dizer sobre o embate/conflito acerca da ocupação/invasão de
um dos prédios da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB e


qual o papel da referenciação nessa construção, comentamos sobre alguns
Mestranda em Lingüística na Unicamp.
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .447-350. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
449 450
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referentes que consideramos interessantes e, em seguida, abordamos a • Os produtores do texto utilizam a rotulação, em que se focaliza a
maneira como os referentes que significam os participantes da cena e os própria atividade enunciativa, qualificando o segmento como
referentes que significam o que é “disputado” foram construídos no texto determinado tipo de ação ou atividade metadiscursiva.
analisado. • As expressões referenciais não têm como função apenas referir, elas
ajudam na elaboração do sentido, indicando pontos de vista,
RESULTADOS E DISCUSSÃO assinalando direções argumentativas.

Como resultados da análise, apontamos que: CONCLUSÕES


• O uso das expressões nominais, que constitui uma escolha -daí a sua
relevância para a análise da linha argumentativa do texto- desempenha As expressões referenciais decorrem de um trabalho enunciativo,
um importante papel no projeto de dizer dos produtores do documento. cognitivo, histórico, social e não podem ser vistas como objetos do mundo,
• As aspas têm diferentes funções no texto. Além de retomarem porque, se assim fossem, não representariam escolhas de falar sobre o real,
explicitamente algumas falas, constituem exemplo de polifonia. que, nessa perspectiva, é construído discursivamente a partir de acordos
• A construção dos referentes, mesmo com certa alternância, é feita com entre os interlocutores envolvidos num projeto de dizer. As escolhas
uma certa estabilidade, tendo em vista a linha argumentativa do texto. realizadas no texto analisado seguem uma linha argumentativa compatível
• As expressões anafóricas referenciais fazem funcionar a com esse projeto.
recategorização dos objetos de discurso. Essas expressões, escolhidas
em meio a tantas outras, cumprem o papel de imprimir ao texto uma REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
força argumentativa que não seria a mesma, caso as expressões KOCH, I. G. V. Introdução à lingüística textual. São Paulo: Martins
fossem outras. Fontes, 2004.

• O real vai sendo elaborado, construído a partir da intenção de cada um ______. Referenciação e orientação argumentativa. In: ______ et al (Org.).
Referenciação e discurso. São Paulo: Contexto, 2005. p. 33-52.
dos interessados. As expressões referenciais, então, constituem-se
MARCUSCHI, L. A Atos de referenciação na interação face a face. In: KOCH,
como objeto de discurso, uma vez que vão sendo construídas I. G. V. & MORATO, E. M. (Org.). Caderno de Estudos Lingüísticos,
Campinas, n. 41, p. 37-54, 2001.
discursivamente em favor de um projeto de dizer.
• O léxico, importante na produção do sentido, tem uma acentuada
carga avaliativa e, portanto, claramente persuasiva, que marca a
posição assumida pelos produtores do texto.
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
451 452
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sujeito se constitua por meio de uma rede discursiva, por meio da qual se
RETRATO DE FAMÍLIA
enuncia e produz visibilidade. Percorrendo domínios díspares, o sujeito se dá
IMAGENS E MEMÓRIAS DO SUJEITO NA MÍDIA
a ver pelos lugares de memória que percorre (NORA, 1993) ao mesmo tempo

Nilton Milanez∗ em que constitui domínios de memória (FOUCAULT, 2000). Essa movência do
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
niltonmilanez@hotmail.com sujeito será, portanto, analisada no interior de uma pequena genealogia de
imagens que circulam na mídia, partindo de uma retrato de família, no qual
podemos ver uma mãe carregando no colo seu filho e, ao lado, o pai. Essa
RESUMO
Este trabalho discute a emergência do sujeito por meio de imagens evocadas a partir de um imagem nos ecoa outras imagens, ou seja, a intericonicidade (COURTINE
retrato de família, que se estenderá por imagens veiculadas pela mídia, tomando como base os
fundamentos da Análise de Discurso desenvolvida no Brasil, em torno dos trabalhos de Michel
apud MILANEZ, 2006), que estabelece um fio regular entre elas conta sobre
Foucault. Busco, portanto, compreender os mecanismos imagético-discursivos que constituem o
sujeito, evidenciando as marcas singulares e, por vezes, antagônicas dos domínios de memória
uma história coletiva, uma vez que toda imagem se inscreve em uma cultura
que determinam lugares e posições do homem contemporâneo. Para tanto, usarei como visual e supõe a existência de uma memória visual para o indivíduo. Assim, a
ferramenta o postulado foucaultianos sobre enunciado, intrinsecamente, atrelado ao conceito de
arquivo, problematizados em A arqueologia do Saber. Nessa linha, refletirei sobre a noção de imagem inicial se increverá em uma série de imagens, impressões visuais que
intericonicidade - extensão do conceito de memória discursiva que fundamentou os trabalhos de
Jean-Jacques Courtine sobre o discurso político –, delineando os contornos de uma teoria do não- farão surgir outras imagens, criando um arquivo histórico de imagens. Esses
verbal na Análise do Discurso. Dessa maneira, teremos em destaque o sujeito e sua relação com a
atualidade, respondendo à pergunta “Em que mundo vivemos?”, colocada por Foucault, ao mesmo múltiplos sujeitos opacizados pelas imagens produzirão saberes, poderes e
tempo em que vemos deflagrar uma série enunciativa, produzindo saberes e sustentando relações
de poder/resistência. resistências nos domínios da religião, da sexualidade, da exclusão, da arte,
PALAVRAS-CHAVE: Mídia. Sujeito. Enunciado. Arquivo. Intericonicidade. compreendendo uma história da iconicidade e empreendendo a busca pela
formatação e compreensão das identidades que constituem esse sujeito.

MATERIAL E MÉTODOS
INTRODUÇÃO

A imagem que recebi de uma amiga pela internet, na qual ela segura
Nos trabalhos de Foucault (1995, 2001), fica claro que o sujeito é o
seu filho no colo ao lado do marido, fará emergir um encadeamento de
centro de seus trabalhos. O poder que o sujeito exerce será descrito tanto
enunciados marcados por imagens, suscitando lembranças e memórias de
em suas relações institucionais quanto interindividuais. Isso faz com que o
impressões visuais. Evidencio, portanto, que trabalho sobre dois eixos: um
discursivo, no que se refere à refratação de enunciados, pois para Foucault
(2000) “um enunciado tem sempre a margem povoada de outros

Doutor em Lingüística/Análise do Discurso. Professor do Departamento de Estudos Lingüisticos e Literários da Universidade Estadual do
Sudoeste da Bahia. Coordenador do projeto “Corpo e Discurso: lugares de memória das identidades brasileiras na mídia e na enunciados”; outro antropológico (BELTING, 2004), pois a noção de imagem
literatura”. Pesquisador do Grupo de Pesquisa em Anál ise de Discurso (GPADi s/ CNPq/Uesb).
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .451-457.
453 454
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sobre qual me baseio apresenta um sentido duplo, uma vez que compreende branca, que carrega um bebê, negro, evidenciam-se relações inter-racias,
imagens interiores e exteriores, envolvendo o próprio sujeito analista, contrapondo-se aos indícios excludentes de Pixote, compondo o quadro da
relevando a simbolização pessoal e coletiva do arquivo imagético. O aceitação das alteridades, sem deixar de transparecer os sentidos de uma
enunciado do retrato de família fará, então, surgir, outros enunciados como, história do politicamente correto. Enfim, essa série histórica de imagens
o mais imediato, o da Pietà, de Michelangelo. Traz, ainda, outras domínios revela modos de subjetivação e aponta para técnicas e procedimentos de
imagéticos díspares, como a imagem veiculada insistentemente pela mídia da visibilidade da composição do sujeito. Retratos de uma revelação de si,
cena do filme Pixote, no qual uma prostituta, interpretada por Marilia Pêra, apresentando dois lados de uma mesma moeda: de um lado, as coerções
amamenta Pixote. Em função enunciativa, a série se amplia a uma capa da totalizantes disciplinares pela qual passa a o sujeito, reivindicado em seus
revista francesa Citizen k, na qual vemos a atriz italiana Mônica Belluci múltiplos comportamentos e atitudes de vida, de outro, a sua individuação
carregando no colo um menino negro, passando por uma foto de um livro no liberal (MICHAUD, 2000). Indícios constitutivos ao sujeito, essa série de
qual um homem entrelaça seus braços ao corpo de outro que está a sua imagens formata e diagnostica um presente histórico, interroga os sentidos e
frente. Dessa maneira, essas imagens se inserem em uma rede de a singularidade que corresponde ao pertencimento de um “nós”, fazendo
formulação de enunciados (FOUCAULT, 2000), à medida que produz um emergir possibilidades de ruptura e mudança para o sujeito.
arquivo histórico de imagens.
CONCLUSÕES
RESULTADOS E DISCUSSÃO
As imagens partilhadas coletivamente, sejam aquelas oriundas
Essa rede imagética discursiva me permite lançar olhares sobre os diretamente da mídia sejam aquelas que compõem o quadro de nossas
diferentes domínios que constituem as identidades dos sujeitos. Do ambiente lembranças, constituem um arquivo que conta a história dos traços, indícios e
doméstico, no interior da instituição familiar, representando ao mesmo tempo marcas de nossas vidas como sujeitos. Enunciados singulares se
um instante íntimo e privado, verifico a intericonicidade com o discurso transformam, assim, em acontecimentos, introduzindo uma diferença entre o
religioso, presença e traços das imagens que circulam e povoam a história do hoje e o ontem. Esses deslocamentos conduzem às similitudes e diferenças,
nosso povo ocidental, evidenciando paixão e dor nas relações entre o homem poderes e resistências, elementos que produzem saberes e constroem a
e a humanidade. Nesse ínterim, ao retomar a cena de Pixote, entramos em história das ciências e da vida.
contato com a resistência do sujeito face às autoridades policiais no interior
das prisões, relevando a busca pela liberdade a qualquer preço, fugindo às
repressões institucionais, sem escapar das exclusões sociais. Na foto da atriz,
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
455 456
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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FOUCAULT, M. O sujeito e o poder. In: DREYFUS, Hubert; RABINOW, Paul.
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estruturalismo e da hermenêutica. Rio de Janeiro: Forense Universitária,
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______. Qu’est-ce que les lumières? In: Dits et Écrits II (1976-1988).Paris:
Quarto-Gallimard, 2001.
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2000.
MICHAUD, Y. Des modes de subjectivation aux techniques de soi : Foucault
et les identités de notre temps. In : Revue Cités n°. 2. Michel Foucault: de
la guerre des races au biopouvoir. Paris: PUF, 2000
MILANEZ, N. O corpo é um arquipélago: memória, intericonicidade e
identidade. In: NAVARRO, Pedro (org.) Estudos do texto e do Discurso.
Mapeando Conceitos e Métodos. São Carlos: Claraluz, 2006. p. 153-179
NORA, P. Entre Memória e História: a problemática dos lugares. Projeto
História. São Paulo: PUC, n. 10, p. 07-28, 1993.

_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
457 458
_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________________________

INTRODUÇÃO
SENTIDO E MEMÓRIA:
AS DESIGNAÇÕES QUE REFEREM O PAPA BENTO XVI∗
O objetivo deste estudo é analisar a designação como processo de
identificação social, verificando como se dá o processo de constituição de
Essiane Lemos Leal Sena∗∗
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia sentido. Trata-se, mais precisamente, de analisar as designações que referem
essianesena@yahoo.com.br
o papa Bento XVI, quando este foi eleito como tal pelo conclave da Igreja
Edvania Gomes da Silva∗∗∗
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia Católica no final de abril de 2005. Para tanto, adotaremos como base teórica
edvania_g@yahoo.com.br
a Semântica do Acontecimento, postulada por Eduardo Guimarães (1995,
Maria da Conceição Fonseca-Silva∗∗∗∗
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia 1996, 2005) e conceitos da Análise do Discurso de linha francesa, já que,
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia
com.fonseca@gmail.com.br
como afirma Guimarães (2005, p. 8), a Semântica do Acontecimento “(...)
mantém também um diálogo decisivo com a Análise do Discurso tal como a
praticada no Brasil”. A fim de distinguir designação de referência,
RESUMO
Este trabalho estuda a designação como processo de identificação social, com base nos mobilizamos os conceitos de acontecimento e temporalidade, já que temos
pressupostos teóricos da Semântica do Acontecimento. Para tanto, analisam-se as designações
que referem o papa Bento XVI, quando este foi eleito pelo conclave da Igreja Católica no final de em vista uma concepção histórica de sujeito e de real.
abril de 2005. As análises mostraram que as designações, ao funcionarem no presente do
acontecimento, recortam um memorável, mobilizando dizeres e sentidos outros e,
conseqüentemente, identificam e referem uma pessoa em um determinado acontecimento,
particularizando-o como sujeito. MATERIAL E MÉTODOS
PALAVRAS CHAVE: Acontecimento. Semântica. Temporalidade.

O corpus do trabalho é composto por oito seqüências de recortes de


reportagens veiculadas pelas revistas Veja e Isto É, do final de abril de 2005,
época em que Joseph Ratzinger foi eleito Papa da Igreja Católica, passando a
chamar-se Bento XVI. Esse corpus foi escolhido por se tratar de revistas de
circulação nacional, que, ao lado de outras revistas, veiculam sentidos

Este trabalho apresenta os resultados finais da monografia apresentada ao Curso de Especialização em Lingüística, realizada entre julho de diversos. Além disso, dentre as revistas que circulam no Brasil, as duas
2006 de outubro de 2007, na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, campus de Vitória da Conquista. O referido curso de especialização foi
uma iniciativa do Grupo de Pesquisa em Estudos Lingüísticos (GPEL) e do Grupo de Pesquisa em Análise de Discurso (GPADis).
∗∗
selecionadas deram bastante destaque ao tema do conclave e a escolha do
Aluna do curso de Especialização em Lingüística da UESB. Campus de Vitória da Conquista.
∗∗∗
Doutora em Lingüística (Análise do Discurso). Orientadora. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa em Estudos Lingüísticos (GPEL/CNPq/UESB)
e do Grupo de Pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB). Professora do Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários –
novo papa. As seqüências serão analisadas como um texto, e os modos de
UESB. Campus de Vitória da Conquista.
∗∗∗∗
Doutora em Lingüística (Análise do Discurso). Co-orientadora. Líder do Grupo de Pesquisa em Estudos Lingüísticos (GPEL/CNPq/UESB) e do referir o Papa como integrantes do texto.
Grupo de Pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB). Professora do Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários – UESB.
Campus de Vitória da Conquista.

________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .457-460. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
459 460
_____________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________________________________________

RESULTADOS E DISCUSSÃO representa a divisão hierarquizada de poder, construída por meio da


mobilização de um memorável que estabelece que um modo de referir é mais
As análises mostraram que as designações que referem o papa Bento importante que outro para designar o papa.
XVI recortam um memorável. Este memorável reescreve o nome próprio no
presente do acontecimento, além de identificar socialmente o sujeito. CONCLUSÕES
Através do conceito de temporalidade do acontecimento, vimos que,
quando se reescrevia mobilizando a memória, o nome próprio de Bento XVI As análises mostraram que as designações, ao funcionarem no presente
era a diferença que ficava ressaltada. Além disso, também uma futuridade, do acontecimento, recortam um memorável, mobilizando dizeres e sentidos
através do fazer significar, construía-se para fazer funcionar no presente outros e identificam e referem uma pessoa em um determinado
essas identificações. Verificamos ainda que, na reescritura, o sentido se faz acontecimento, particularizando-o como sujeito. Constatou-se ainda que a
como diferença, já que um modo de referir é único, ou seja, mobiliza significação de uma expressão referencial é construída no confronto de
memórias de sentido que um outro não faz. dizeres e sentidos diversos.
É importante notar que os modos de referir não só identificam o papa
Bento XVI socialmente, mas mobilizam, sobretudo, a sua trajetória de vida REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
social e profissional que é refeita a cada designação. Isso fica evidente na FONSECA-SILVA. M. da C. Questões de Linguagem, Gramática, texto e
revista Veja. Por outro lado, na Isto É, a memória de sentido que se destaca discurso. Vitória da Conquista, BA: Edições Uesb, 2001.
é a de Bento XVI como cardeal duro, pulso forte, ortodoxo, decano, ou seja, GUIMARÃES, E. “Os Sentidos de Cidadão no Império e na República no
Brasil”. In: Língua e Cidadania: O Português no Brasil. GUIMARÃES, E.
conservador, mas não um conservador que traz para o enunciado uma carga & ORLANDI, E. P. (orgs). Campinas, SP: Pontes, 1996.
semântica negativa, como a expressada pelas seqüências da revista Veja, _____. Os Limites do Sentido. Campinas, SP: Pontes, 1995.
pois o que se nota nos excertos da revista Isto É é que o texto, em que a _____. Semântica do acontecimento: um estudo enunciativo da
designação. Campinas SP: Pontes, 2005.
maioria das seqüências está inserida, confere uma carga semântica positiva
NASCIMENTO, C. N. Designação e referência: a identificação social em
ao enunciado. Além disso, nessas seqüências, o uso do morfema “-ex-“ expressões que referem o presidente Lula. Dissertação de Mestrado.
coloca sempre o sujeito rememorado no passado. Entretanto, as designações IEL/UNICAMP. Campinas, SP, 2004.

mobilizam memórias de dizeres da condição passada e as transferem para o


presente do acontecimento inserindo-as em um jogo temporal que traz, ao
mesmo tempo, para a enunciação, o passado, o presente e o futuro. Vimos
ainda que a relação de hierarquia se materializa no uso das designações e
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
461 462
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INTRODUÇÃO
SOBRE A CONSTITUIÇÃO DO ETHOS PETISTA49
O objetivo deste trabalho é entender o funcionamento do modo de

Luis Cláudio Aguiar Gonçalves
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
enunciação petista. Trata-se, portanto, de verificar como o tom, o caráter e a
luislawyer10@yahoo.com.br
corporalidade materializados nas formulações do PT contribuem para o
Edvania Gomes da Silva∗∗
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia estabelecimento de um certo ethos. Para tanto, partimos da noção de ethos
edvania_g@yahoo.com.br

Maria da Conceição Fonseca-Silva∗∗∗


desenvolvida nos trabalho de Maingueneau, para quem a referida noção
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia insere-se em uma concepção interdiscursiva da discursividade. Além disso,
con.fonseca@gmail.com
para Maingueneau, o ethos implica um controle tácito do corpo, apreendido
por meio de um comportamento global. Com base nesses pressupostos
teóricos, examinamos algumas formulações veiculadas pela mídia.
RESUMO
Com base nos pressupostos teóricos da Análise de Discurso, principalmente nos trabalhos
desenvolvidos por Dominique Maingueneau sobre interdiscursividade e semântica global, MATERIAL E MÉTODOS
examinamos um corpus formado por formulações do Presidente da República, Luis Inácio Lula da
Silva, e por campanhas publicitárias veiculadas pelo Partido dos Trabalhadores. Na análise,
buscamos compreender o modo de enunciação do discurso petista, bem como a forma como este
constitui seu fiador: conferindo-lhe caráter e corporalidade. Os resultados indicam que, apesar das O corpus do trabalho foi coletado, durante o mês de agosto, em dois
supostas mudanças no “discurso petista”, o Partido dos Trabalhadores ainda busca legitimar seu
representante político identificando-o com a imagem de “homem do povo”.
veículos de comunicação: a televisão e a imprensa escrita. No primeiro,
observamos algumas das campanhas publicitárias ou propagandas utilizadas
PALAVRAS-CHAVE: Análise de Discurso. Ethos. Discurso político.
pelo Partido dos Trabalhadores, no segundo, mas precisamente na Revista
Veja, colhemos alguns excertos relacionados ao Partido dos Trabalhadores,
destacando aquelas formulações atribuídas a membros do referido partido.
Concomitantemente a coleta dos dados, realizamos leituras e resenhas
de alguns textos de Maingueneau (1997; 2005), bem como de outros textos

49 Trabalho ligado ao subprojeto de pesquisa: “O ethos petista na materialização da polêmica discursiva”, vinculado ao projeto: “A materialização
vinculados à Análise do Discurso. Por fim, procedemos à análise dos
da polêmica discursiva nas eleições presidenciais de 2006”, coordenado pela Profa. Dra. Edvania Gomes da Silva.

Bolsista de IC – FAPESB. Membro do grupo de pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB). Graduando do curso de Direito da primeiros dados. Vale salientar que este trabalho é fruto de uma pesquisa
UESB, campus de Vitória da Conquista.
∗∗
Doutora em Lingüística (Análise do Discurso). Orientadora. Pesquisadora Grupo de Pesquisa em Estudos Lingüísticos (GPEL/CNPq/UESB) e que se encontra ainda em fase inicial.
do Grupo de Pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB). Professora do Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários – UESB.
Campus de Vitória da Conquista.
∗∗∗
Doutora em Lingüística (Análise do Discurso). Co-orientadora. Líder do Grupo de Pesquisa em Estudos Lingüísticos (GPEL/CNPq/UESB) e do
Grupo de Pesquisa em Análise de Discurso (GPADis/CNPq/UESB). Professora do Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários – UESB.
Campus de Vitória da Conquista.

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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .461-.465. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
463 464
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RESULTADOS E DISCUSSÃO Nessa passagem, o enunciador petista apresenta-se como alguém


“medroso”, alguém que sofre das mesmas angústias dos milhares de
As análises mostraram que o Partido dos Trabalhadores continua a brasileiros que têm medo de voar. Dessa forma, o governo petista defende-
buscar sua legitimação, enquanto partido político, por meio da imagem de se dos ataques que o responsabilizavam pela crise área no país. Assim, pela
representante do povo simples. Dessa forma, o referido partido busca, na construção de um ethos de “medroso” e sensível, o enunciador do texto
identificação com seus representados, ser um diferencial em relação aos apresenta-se como alguém que também é prejudicado pelo medo de voar.
demais partidos políticos. É isso que é possível verificar na seguinte peça Entretanto, esse medo é apresentado como algo pessoal e não como uma
publicitária, veiculada nas emissoras de televisão do país: conseqüência da crise aérea. Dessa forma, o co-enunciador que incorpora o
discurso petista passa a acreditar que seu medo de voar é uma questão sua
O PT é nosso, e não um problema gerado pela insegurança instaurada durante a crise.
O PT é do povo,
Essa história quem faz é você!

Conclusões
O mesmo enunciado encontra-se materializado no slogan do governo
federal: Brasil, um país de todos.
As análises indicam que, mesmo após haver chegado a Presidência da
Em um outro momento político, mais precisamente nas campanhas
República, o Partido dos Trabalhadores continua se afirmando com a imagem
eleitorais de 1994 e 1998, conforme apresentado em Miqueletti (2002), para
do representante político identificado com os representados, o representante
mostrar a competência do seu candidato, de seu representante político - o
das massas. Tal imagem é, também, uma forma de polemizar com seus
representante das massas, o Partido dos Trabalhadores se utilizava da
opositores, que reivindicam um representante intelectualizado.
imagem do representante político legítimo, aquele que se identifica com os
representados, ou seja, que é o seu igual, um dos seus. Hoje, a mesma
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
imagem de representante do povo encontra-se materializada nas formulações
de membros do PT. Tais formulações são utilizadas não só para legitimar a
MAINGUENEAU, D. Gênese dos discursos. Trad. Sírio Possenti. Curitiba,
atuação do governo, mas também para eximá-lo de suas supostas culpas em
Criar Edições, 2005.
momentos de crise: _____. Ethos, cenografia e incorporação. In: AMOSSY, R. (Org.). Imagens
de si no discurso. Trad. Dilson F. da Cruz; Fabiana Komesu e Sírio Possenti.
São Paulo, Contexto, 2005.
Sou um medroso para andar de avião. Cada vez que o avião fecha a porta eu
entrego minha sorte a Deus (Presidente Lula, na posse de Nelson Jobim no MIQUELETTI, F. Discurso, tom e caráter: uma análise do ethos
Ministério da Defesa) (Revista Veja de 1º de agosto de 2007, Edição 2019, Seção tucano. (Dissertação de Mestrado). Campinas, Unicamp, 2002.
Veja essa).

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
465 466
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SILVA, E. G. da. A materialização da polêmica discursiva nas


eleições presidenciais de 2006. Projeto de Pesquisa inscrito na
Pró-reitoria da Pesquisa da Universidade Estadual do Sudoeste da
Bahia (UESB), agosto/2006.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
467 468
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a meu ver, são questões essenciais para se pôr as emoções como objeto de
SOBRE A PROBLEMÁTICA DE discurso. A base teórica deste estudo é derivada das concepções de sujeito e
PÔR AS EMOÇÕES COMO OBJETO DE DISCURSO50
linguagem defendidas por Bakhtin (1976; 2003) e dos estudos desenvolvidos
por Plantin (2000; 2003; 2004). Por essa perspectiva, as emoções nascem e
Marinalva Vieira Barbosa51
Instituto de Estudos da Linguagem da Unicamp ganham materialidade na linguagem pela pressão difusa exercida pelo grupo
marinalvav@gmail.com
social médio em que o sujeito está inserido. É um sistema aberto e sempre
em mutação, embora mantenha certa coerência e estabilidade pela mediação
RESUMO do contexto. As emoções concebidas a partir dessa concepção emergem da
Neste trabalho, analisarei a questão da categorização do universo “pathemico” e da circunscrição
dos traços lingüísticos das emoções (e os seus possíveis efeitos de sentidos). A base teórica deste experiência histórica e cultural em contextos específicos.
estudo é derivada das concepções de sujeito e linguagem defendidas por Bakhtin (1976; 2003) e
dos estudos desenvolvidos por Plantin (2000; 2003; 2004). Os resultados parciais mostram que as
emoções, concebidas a partir dessa concepção de sujeito, emergem da experiência histórica e
cultural em contextos específicos. MATERIAIS E MÉTODOS

PALAVRAS-CHAVES: Discurso. Emoção. Interação.


Para desenvolver as análises, tomo como base discursos produzidos por
alunos e professores nas interações em sala de aula. O que defino como
“discurso de emoção” é o resultado dos esforços empreendidos por ambos
INTRODUÇÃO para se contraporem aos temas e posicionamentos de seus interlocutores
imediatos nas interações. Antecipo que as análises não focarão a presença da
As emoções podem ser objeto de discurso? Por vias teóricas diferentes, alteridade no discurso, mas, sim, a própria inscrição deste no discurso, por
acompanho Charaudeau (2000) na resposta afirmativa para esta questão. meio da enunciação das emoções, face ao diálogo com a alteridade. A
Ainda o acompanho na defesa de que essa resposta precisa ser seleção do corpus para estudo é baseada na concepção de paradigma
acompanhada de um quadro teórico que descreva as condições em que elas indiciário proposta Ginzburg (1999). A adoção dessa concepção se justifica
podem aparecer como elemento linguageiro. Porém, nesta comunicação o porque permite, no trabalho com os atos de linguagem, conceber sujeitos
objetivo não será apresentar uma resposta global à questão, mas, sim, cujo discurso não se perde ou se explica por meio da eleição de traços
enfocar alguns aspectos dessa problemática. Especificamente, focalizarei a generalizantes de pertencimento a uma comunidade (neste caso, a
questão da categorização do universo “pathemico” e da circunscrição dos comunidade de professor ou de aluno), mas também não são atos
traços lingüísticos das emoções (e os seus possíveis efeitos de sentidos), que, absolutamente singulares e, por isso, sem nenhuma relação com outros
50 Esta pesquisa conta com o apoio da FAPESP - Fundação de Amparo a pesquisa do Estado de São Paulo. discursos. A definição do corpus indiciário depende da inter-relação entre
51 Doutoranda em Lingüística no Instituto de Estudos da Linguagem da Unicamp.
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .467-.471. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
469 470
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pequenos acontecimentos: que não é a proposta inversa de acúmulo ou da enumerados por causa da preocupação em fazer o locutor compreender o
repetição do insignificante para se chegar a uma verdade universalizada e que estava sendo nomeado, mas, sim, visando fazê-lo compreender a
inquestionável,mas para que se deduza mais do que é insignificante. dimensão da força das suas (re)ações. Ou a dimensão do como elas estavam
sendo recebidas. Tanto que há simetria crescente entre estou surpresa (.)
RESULTADO E DISCUSSÕES não/ perplexa MESMO e a afirmação seguinte:to::do dia: têm uma história
nova pra não ficar na aula de português. A surpresa mudou para
Pelas concepções teóricas assumidas, a estruturação do discurso e perplexidade na medida em que as estratégias dos interlocutores se
emoção responde às exigências e controles do contexto em que se dá a sua renovaram para atingir sempre o mesmo objetivo: não assistir à aula de
produção. Isso pode ser exemplificado pelo uso dos termos “surpresa” e língua portuguesa.
“perplexa” no discurso de uma professora. Vejamos: não/ eu preciso admitir
que estou surpresa (.) não/ perplexa MESMO(.) to::do dia: têm uma CONCLUSÕES
história nova pra não ficar na aula de português (.). Nas definições
dicionarizadas e nos estudos que se voltam para necessidade de construir Tendo em vista que este estudo está centrado no aspecto verbal das
uma gramática das emoções, os termos “surpresa” e “perplexa são dados emoções, as análises apontam para o fato que o sentido “pathémico” pode
como sinônimos. Isto é, qualificam o mesmo estado de uma pessoa diante de ser obtido pelo emprego de termos lingüísticos específicos (que remetem ao
um acontecimento inesperado. Por essa indiferenciação, o uso de um ou de campo semântico das paixões), mas também pelo uso de termos que não
outro seria simples paráfrase já que não há distinção entre as duas palavras têm relação direta com referido campo semântico. Isso porque a
no plano conceitual. Entretanto, quando consideramos o discurso citado discursivização das emoções não se confunde com a pura ação biológica (o
acima, a enumeração, que pode ser vista como necessidade de reafirmar os dado per se), ainda que possa englobá-las. É o dado postulado pelo sujeito
sentidos do primeiro termo, é um importante indício de que a distinção da enunciação: a dor, a tristeza ou a alegria tais como são definidas por ele
remete à preocupação do locutor em precisar para o interlocutor a dimensão por meio da linguagem e no contexto de interação com um outro. Isso
crescente das interpretações de suas ações deste. Desse modo, a impossibilita (objetivos caros aos estudos filosóficos e psicológicos e também
necessidade de configurar o grau de força, de progressão do sentimento para os que propõem a construção de uma gramática das emoções) uma
enunciado é o elemento que não permite pôr os dois termos como sinônimos delimitação precisa da face lingüística desse discurso e também do universo
perfeitos. Trata-se de um discurso que segue o movimento imposto pelo grau “pathémico”.
de inventividade dos interlocutores, daí o enunciado irônico de que não dá
pra negar que vocês são criativos. Surpresa e perplexa não foram
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
471 472
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REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS

BAKHTIN, M. Pour une philosohie de l’acte. Trad. Ghislaine Capagna


Bardet. Paris : Editions l’age d’homme, 2003. Edição original de 1916.
______. Discurso na vida e discurso na arte. Trad. Inédita de Cristovão
Tezza do artigo Discourse in Life and Discourse in Art, publicado como
apêndice in: Voloshinov, V.N. Freudianism: a marxist critique. New York:
Academic Press, 1976. Edição original: 1976.
CHARAUDEAU, P. Une problématisation discursive de l’émotion. In: Christian
Plantin. Et al. Les emotions dans les interactions. Paris, 2000.
GINZBURG, C. Mitos emblemas sinais: morfologia e história. São Paulo:
Companhia das Letras, 1999.
PLANTIN, C. Sans démonstrer ni (s)émouvoir. In: Michel Meyer.
Perelman: le renouveau de la rhétorique. Paris: PUF, 2004.
______. Structures verbales de l’émotion parlée et de laparole émue. In:
Jean-Marc Colletta; Anna Tcherkassof. Les émotions : cognition,
languege et developpement. Paris: Mardaga, 2003.
______.et. al. Les émotions dans les interactions. Lyon: PUF, 2000.

_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
473 474
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o qual o texto se destina, é possível prever de que lugar fala o enunciador e

UM TOM FEMININO: determinar previamente sua representação física e psicológica; e o ethos


A CONSTRUÇÃO DO ETHOS NO EDITORIAL DA discursivo, que se divide em dito e mostrado, o primeiro diz respeito ao
REVISTA ATREVIDA
próprio discurso e o segundo aos elementos extralingüísticos, que no
momento da enunciação (fala) evidenciam as verdadeiras intenções do
Harlle Silva Costa∗
Universidade do Estado da Bahia enunciador. (MAINGUENEAU, 2005, p. 16)
harllecosta@hotmail.com.br
Será de nosso interesse o ethos pré-discursivo, o qual permite ao leitor
estabelecer uma representação do “corpo” do enunciador, perceber o tom
RESUMO que dá autoridade ao que é dito. E também analisaremos o ethos discursivo
A partir dos pressupostos da Análise do Discurso, especificamente dos estudos desenvolvidos por
Dominique Maingueneau, e com uma pequena incursão na forma de apresentação do ethos dito, a fim de identificar os elementos que denunciam o comportamento e o
discursivo da Retórica Aristotélica, pretende-se, neste trabalho, analisar a construção do ethos em
um editorial da Revista Atrevida, considerando as marcas lingüísticas de subjetividade e a cena modo de dizer do sujeito enunciador.
enunciativa. Concluiu-se que o enunciador incorpora um fiador, o qual assume um papel
dicotômico, ora de uma adolescente ora de alguém mais experiente, manifestando as três formas
de apresentação do ethos.
MATERIAL E MÉTODOS
PALAVRAS-CHAVE: Ethos discursivo. Discurso. Cena enunciativa.

O corpus escolhido para a análise é o editorial da Revista Atrevida, ano


XIII, nº 144, de agosto de 2006, na qual a temática principal é o Dia dos

INTRODUÇÃO Pais. Por ser um veículo produzido para o público feminino adolescente e por
apresentar temáticas relacionadas à forma de ser adolescente na

Enquanto que Aristóteles sugere um ethos oral, Maingueneau (2001) contemporaneidade, necessário se faz compreeender os mecanismos e as

avança para um tom manifesto no texto escrito, um ethos escritural. estratégias de que o enunciador lança mão ao apresentar-se e ao mesmo

Segundo o autor, o ethos diz respeito ao caráter do orador, que deve ser tempo representar uma voz coletiva. Interessa também saber qual o tom

apropriado a cada tipo de discurso que visa projetar, para engendrar no utilizado a fim de conduzir o público alvo a uma perfeita identificação.

público uma disposição em relação à imagem construída. Para esta abordagem, inicialmente, se situará o discurso numa das

Distingue, dessa forma, dois tipos de ethos, o pré-discursivo, para o formas de representar o ethos, na perspectiva aristotélica, seguida de uma

qual o público já possui uma representação do ethos do locutor; no caso de discussão sobre o ethos como constitutivo de uma cena enunciativa,

textos da mídia impressa, a depender do veículo, da seção ou do público para referendada na visão teórica de Maingueneau e descrição das marcas


Mestranda em Estudos de Linguagens pela UNEB.
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .473-477. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
475 476
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discursivas que evidenciam a subjetividade do orador, a propósito da Análise conhecê-la melhor”(l 07) e do assunto em discussão, “Aposto que ele ia
de Discurso. gostar mais de tentar entendê-la”(l 1). Neste último enunciado, o fiador
retoma a terceira pessoa e assume uma voz mais experiente que
RESULTADOS E DISCUSSÃO compreende os motivos dos pais, embora não esteja submetido a tal
situação.
Evidenciam-se no editorial alguns aspectos que remetem ao caráter do Além disso, a revista associa a figura do enunciador ao mundo da fama.
orador e ao processo de construção do ethos; dentre estes, merecem A começar pela atriz e cantora Marjorie Estiano, garota de capa, que é um
destaque: 1) opção pela 1ª pessoa do plural “é a nossa garota de capa” (l ícone de referência para as meninas adolescentes, desde sua atuação na
01), “que os nossos pais poderiam ter falado” (l 10), “eu e você não novela Malhação, exibida pela Rede Globo, e em destaque como talento
estaríamos batendo este papo” (l 14), assim, a revista, ao mesmo tempo em musical, alguém que sugere autoridade para falar de assuntos que
que se enuncia em nome da empresa, dos redatores, inclui-se no mesmo interessam ao co-enunciador, beleza e autenticidade; seguida de uma alusão
mundo do sujeito destinatário, os quais compartilham de gostos e idéias a pais famosos que têm filhas adolescentes, certamente também famosas.
semelhantes; 2) marcas características da linguagem de uma “galera” jovem,
“descolada”, assim como se pretende a revista, “não perde tempo fazendo CONCLUSÕES
tipo” (l 02), “famosos que a gente curte”, “os caras disseram coisas”; 3)
formatação não justificada que fortalece o caráter de uma conversa menos Destaca-se no corpus em análise o ethos pré-discursivo, para o qual o
formalizada, períodos curtos e perguntas retóricas “você já presenteou o seu leitor já possui uma representação do caráter do locutor e com o qual se
com um papo?” (l 14), “Já pensou nisso?”, o que também intensifica a identifica. Como constitutivo de uma cena enunciativa, o ethos evoca no
qualidade da conversa. texto uma cenografia de uma conversação entre amigas, em alguns
Com a função de legitimar a sua maneira de dizer, o ethos faz surgir no enunciados; um momento de aconselhamento sobre assuntos que se referem
momento da leitura uma instância subjetiva, o fiador, o qual remete a traços tanto à cena de origem da enunciação, quanto à que deve ser construída na
psicológicos e à corporalidade. No texto referência desse estudo, os indícios interação com o texto.
textuais reportam para uma imagem de um enunciador, mais possivelmente,
uma enunciadora jovem, como sugerem alguns enunciados: “fazendo tipo”, REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
“os caras”, “a gente curte”; porém experiente, “vou convidar você a refletir” MAINGUENEAU, D. Análise de textos de comunicação. São Paulo: Cortez,
(l 12), confiável “e depois me conte”(l 04), de bem com vida “gostei muito” (l 2001.
06), “me deixou feliz”(l 08), conhecedora de gente famosa, “gostei de
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477 478
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______, Ethos, cenografia, incorporação. In: AMOSSY, Ruth. Imagens de si


no discurso: a construção do ethos. São Paulo: Contexto, 2005.
TREVISAN, R. Cá entre nós. Atrevida, São Paulo, n. 144, p. 11, 2006.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
480

LINGÜISTICA APLICADA AO
ENSINO/APRENDIZAGEM DE
LÍNGUA ESTRANGEIRA
481 482
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processo de aprendizagem. Esta pesquisa tem como objetivo geral investigar

A AUTONOMIA DO APRENDIZ DE LÍNGUA INGLESA NO CENTRO DE o nível de autonomia dos alunos ao ingressarem no curso de Letras, em
APRENDIZAGEM AUTÔNOMA DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS∗ relação a sua aprendizagem de línguas estrangeiras. Como objetivos
específicos têm-se: (1) encorajar o aluno a desenvolver sua autonomia,
Giêdra Ferreira da Cruz∗∗
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia visando o aprimoramento na língua-alvo; bem como (2) verificar até que
giedra@uesb.br
ponto a freqüência ao CAALE ajuda no desenvolvimento da autonomia dos
Karine Patrícia Dias Cardoso∗∗∗
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia aprendizes de língua estrangeira (LE).
karinedias@uesb.br
Definir autonomia não é uma tarefa simples, uma vez que muitas são
as dimensões, os conceitos e as aplicações atribuídas ao termo. De acordo
RESUMO
Este trabalho visa apresentar resultados de um estudo realizado com alunos do curso de Letras com Paiva (2006, p. 88 - 89):
com habilitação em Língua Inglesa da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. O objetivo
consistiu em investigar o nível de autonomia em relação à aprendizagem de língua inglesa,
apresentado pelo discente ao ingressar no Curso de Letras. Assim, esta pesquisa é proposta
dentro da perspectiva de que o aluno precisa aprender a aprender, e de que, para tal, necessita se Autonomia é um sistema sócio-cognitivo complexo, sujeito a restrições internas e
responsabilizar pelo seu processo de aprendizagem. externas. Ela se manifesta em diferentes graus de independência e controle sobre o
próprio processo de aprendizagem, envolvendo capacidades, habilidades, atitudes,
PALAVRAS-CHAVE: Autonomia. Ensino e aprendizagem de línguas estrangeiras. desejos, tomadas de decisão, escolhas, e avaliação tanto como aprendiz de língua
ou como seu usuário, dentro ou fora da sala de aula.

MATERIAL E MÉTODOS

INTRODUÇÃO
Decidiu-se por uma pesquisa de natureza etnográfica, por ser mais
adequada à natureza subjetiva do seu objeto de estudo. Assim sendo, para
Por ter o aluno como meta principal desta pesquisa e para tentar
que a investigação ocorresse traçou-se uma proposta metodológica, na qual
fornecer um estudo de qualidade, no qual amenize deficiências anteriores e
diferentes instrumentos foram utilizados, como o uso de questionários,
se tente ajudar no desenvolvimento do aluno de língua estrangeira, a
registros de freqüência ao CAALE e notas de campo da pesquisadora. Os
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB) implementou um Centro
informantes/sujeitos da pesquisa foram alunos do primeiro semestre de
de Aprendizagem Autônoma de Línguas Estrangeiras (CAALE), com o intuito
língua inglesa do curso de Letras da Universidade Estadual do Sudoeste da
de propiciar recursos para que o aluno saiba como se ajudar ao longo do seu
Bahia (UESB), Campus de Vitória da Conquista, Bahia, Brasil. O período de

Financiado pela UESB e vinculado ao projeto de pesquisa “A autonomia do aprendiz de língua estrangeira: um processo em desenvolvimento”, coleta dos dados foi de março de 2004 até março de 2006. O ambiente da
coordenado pela professora M.Sc. Giêdra Ferreira da Cruz.
∗∗
Mestre em Letras.
∗∗∗
Especialista em Inglês como Língua Estrangeira

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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .481-485. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
483 484
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coleta de dados foi o Centro de Aprendizagem Autônoma de Línguas língua-alvo; na verdade, eles demonstravam dependência da professora de
Estrangeiras (CAALE/ UESB). inglês, apresentando, de fato, uma postura de passividade.
Para Benson (1997), não existe autonomia sem orientações
pedagógicas de como implementá-la. Esta orientação foi traduzida na O uso de pôsteres
idealização dos Centros de Aprendizagem Autônoma de Línguas. Assim, o
CAALE é um espaço especialmente criado, pelos professores da área de É importante ressaltar que todos os informantes tinham consciência da
Línguas Estrangeiras e Literaturas (ALEL) da Universidade Estadual do importância do Centro para o aprimoramento da língua inglesa, como pôde
Sudoeste da Bahia, com o objetivo de ajudar no desenvolvimento da ser percebido nas respostas dadas à pergunta “qual é o objetivo de
autonomia do aprendiz na aprendizagem de línguas estrangeiras. freqüentar o CAALE?”. No entanto, eles só freqüentavam tal espaço quando
Dessa forma, nesta pesquisa, autonomia na aprendizagem de língua solicitados pelos professores, o que leva a concluir que saber somente o
estrangeira é proposta dentro da perspectiva de que o aluno precisa objetivo do Centro não é suficiente para que o aluno o utilize de maneira
aprender a aprender, e de que, para tal, tem de se responsabilizar pelo seu eficaz. Desta forma, objetivando encorajar os alunos a freqüentarem e a
processo de aprendizagem para que consiga avançar nos seus estudos. utilizarem os recursos do CAALE foi colocado, no mural de entrada, um
pôster com sugestões de atividades para serem desenvolvidas por eles
RESULTADOS E DISCUSSÃO mesmos. Os pôsteres continham atividades para serem trabalhadas com as
quatro habilidades básicas. Com o uso dos pôsteres, nota-se certa mudança
Ao se investigar sobre o nível de autonomia dos alunos que no comportamento dos estudantes que passaram a procurar o Centro para
ingressaram no curso de Letras, em relação a sua aprendizagem de línguas realizar atividades mais direcionadas por eles mesmos.
estrangeiras, mais especificamente língua inglesa, verificou-se que não Os resultados parciais desta pesquisa não pretenderam limitar autonomia
houve registro de comportamento autônomo por parte dos discentes na a “aprender a aprender”. Enfatizou-se aqui “aprender a aprender”
realização de atividades no CAALE, uma vez que os alunos estiveram no significando conhecer os próprios estilos e estratégias de aprendizagem, bem
Centro por orientação dos professores para o cumprimento de atividades como “o uso consciente de estratégias metacognitivas – apontando para
preparadas pelos docentes. Contudo, foi imperativo investigar, caminhos que precisam ser trilhados, na medida em que encoraja a reflexão
cautelosamente, o comportamento e as ações dos alunos dentro do Centro. sobre o processo de aprendizagem enquanto ele está acontecendo” (CRUZ,
Assim, ao se investigar quais as atividades que os sujeitos realmente 2005, p.108). Então, faz-se necessário aprender a se conhecer, como
desenvolviam de forma autônoma, verificou-se que eles não realizavam primeiro passo, nesta longa caminhada para o desenvolvimento da
nenhuma atividade por eles mesmos, as quais os ajudariam a avançar na autonomia do aprendiz de LE para depois procurar novas alternativas.
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485 486
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CONCLUSÕES

Os dados investigados da pesquisa sustentam:


a) a necessidade de ajudar o aluno a se tornar consciente da sua
capacidade para ser autônomo;
b) a importância de se propiciar estratégias e recursos ao aluno para que
ele saiba como se ajudar ao longo do processo de aprendizagem
(HOLEC, 1981, p. 3).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BENSON, P. The Philosophy and Politics of Learner Autonomy. In:


Autonomy and Independence in Language Learning. London and New
York: Longman, 1997. p.18-34.
CRUZ, G. F. A Contribuição das estratégias metacognitivas para o
desenvolvimento da autonomia do aprendiz. 160 f. Dissertação.
Mestrado em Lingüística e Letras. Instituto de Letras da Universidade Federal
da Bahia, Salvador, 2005.
HOLEC. H. Autonomy in foreign language learning. Oxford: Pergamon,
1981.
PAIVA, V. L. M. O. Autonomia e complexidade. Linguagem & Ensino,
Pelotas, v. 9, n. 1, p. 77- 127, 2006.

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487 488
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crenças dos professores com respeito às propostas encontradas nos


CRENÇAS DE PROFESSORES DE ESCOLAS PÚBLICAS SOBRE
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). A escolha desse tema se deve ao
OENSINO DE LEITURA EM LÍNGUA INGLESA
fato de que, atualmente, há uma tendência entre alguns lingüistas aplicados

Valméria Brito Almeida Vilela Ferreira∗ e professores de LE em defender a ênfase na habilidade de leitura no ensino
Universidade do Estado da Bahia
valmeriabavf@yahoo.com.br de línguas nas escolas públicas do Brasil. Dessa forma, surge a necessidade
de conhecer as práticas dos docentes no ensino dessa habilidade. A hipótese
levantada neste trabalho é a de que os professores usam seu conhecimento
RESUMO
Este trabalho discute a teoria e a prática do ensino de leitura em língua inglesa. Buscou-se implícito para aplicar atividades de leitura. Para testar essa hipótese, foram
investigar as crenças dos professores no processo de ensino e aprendizagem de leitura em inglês
nas escolas públicas. A pesquisa foi realizada na UNEB (campus XX) e teve a participação de dez
reunidas algumas informações sobre a prática pedagógica de dez professores
professores. Os resultados da pesquisa demonstram que a atividade de leitura mais desenvolvida
pelos professores está relacionada com a prática de tradução de textos com o uso do dicionário.
do Ensino Fundamental e Médio colhidas em um projeto de extensão
Os resultados da pesquisa apresentam uma discussão sobre as crenças e práticas dos professores realizado pela professora-pesquisadora na Universidade do Estado da Bahia
no ensino de leitura em língua inglesa.
(UNEB, campus XX) no período de novembro de 2005 a janeiro de 2006.
PALAVRAS-CHAVE: Ensino de Leitura. Abordagem de Professores. Estratégias de Leitura.

MATERIAL E MÉTODOS

INTRODUÇÃO A coleta de dados foi realizada na Universidade do Estado da Bahia,


campus XX, em um projeto de extensão intitulado “Inglês para professores:
Segundo Almeida Filho (1993), todo professor de Língua Estrangeira como desenvolver atividades de leitura em LI?” Participaram desse projeto
(LE) constrói um processo de ensinar com base em uma abordagem que nove professores de inglês do Ensino Fundamental e um professor de inglês
varia entre o seu conhecimento implícito (constituído de intuições, crenças e do Ensino Médio. Os objetivos que nortearam o projeto foram: 1) Oferecer ao
experiências) e o conhecimento explícito ou teórico. Sob essa ótica, o professor a oportunidade de discussão teórica e ampliação de seu
objetivo deste trabalho é investigar as crenças de professores de escolas conhecimento explícito sobre o tema; 2) Desenvolver atividades de leitura em
públicas no ensino de leitura em Língua Inglesa (LI). Além das práticas que os professores utilizassem estratégias metacognitivas; 3) Fomentar nos
pedagógicas, serão abordados alguns aspectos da política educacional professores uma consciência reflexiva sobre sua prática pedagógica. A análise
relacionada ao ensino de leitura em LI, investigando o conhecimento e as dos dados dessa pesquisa foi guiada por algumas perguntas: 1) Qual/ quais
as atividades mais desenvolvidas nas aulas de LI dos professores-sujeitos? 2)


Como se dão o planejamento e a escolha do material didático? 3) Nas
Especialista em Inglês como Língua Estrangeira
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .487-.490. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
489 490
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atividades de leitura, quais as estratégias mais utilizadas? 4) Qual/quais os textos em LI. Com respeito às fases de leitura, observou-se que as atividades
principais objetivos que guiam as atividades de leitura? 5) Que tipo de de pré-leitura são resumidas em informações sobre o texto. Já as atividades
atividades de pré-leitura e pós-leitura são desenvolvidas? 6) Os professores de pós-leitura, usadas para avaliar a compreensão do texto, são: 1) a
do Ensino Fundamental e Médio conhecem as propostas dos PCNs para o tradução do texto, 2) respostas de perguntas sobre o texto, 3) desenhos e
ensino de língua estrangeira? Para responder a essas perguntas, foram dramatizações sobre o conteúdo do texto. Quanto aos PCNs, os professores
utilizados os dados coletados através de um questionário, das notas de demonstraram que não possuíam conhecimento do conteúdo do documento
campo do professor e da transcrição de trechos das aulas do projeto. relacionado às propostas sobre o desenvolvimento das habilidades
lingüísticas no ensino de LE. Os depoimentos dos docentes (em sua maioria,
RESULTADOS E DISCUSSÃO professores de 5ª a 8ª séries) contrariam as propostas dos parâmetros para
o Ensino Fundamental, pois, em suas aulas, eles buscam desenvolver as
Depois da análise dos dados, constatou-se que 80% dos professores quatro habilidades lingüísticas (entender, falar, ler e escrever) e não
exploram, com maior freqüência em suas aulas, os exercícios de gramática. enfatizam as atividades de leitura.
Apenas 20% relataram que sempre utilizam textos variados para o
desenvolvimento da atividade de leitura e compreensão. De acordo com os CONCLUSÕES
depoimentos dos professores-sujeitos, o planejamento do curso de língua
inglesa das escolas municipais e estaduais que lecionam não está baseado Neste trabalho, constatou-se que as atividades de leitura, desenvolvidas
nem em diretrizes externas (PCNs, por exemplo), nem em internas (plano de pelos professores, privilegiam o processo de leitura
curso da escola). Observou-se que tais escolas não possuem uma ascendente/decodificadora em que se usa o texto como pretexto para o
coordenação pedagógica na área de LI. Sendo assim, os professores são os ensino de vocabulário e gramática. Observou-se, também, que os docentes
únicos responsáveis pelo planejamento de suas atividades e pela escolha do utilizam apenas o seu conhecimento implícito para desenvolver as atividades
material utilizado que, em sua maioria, se constituem de livros didáticos e de de leitura nas aulas de língua inglesa.
xérox de textos e exercícios de diversos livros. Com relação às estratégias de
leitura, o uso do dicionário foi apontado como a estratégia mais utilizada. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Questionados sobre os objetivos que os levavam a desenvolver atividades de ALMEIDA FILHO, J. C. P. Dimensões comunicativas no ensino de
leitura, alguns professores reafirmaram a visão estruturalista da língua línguas. Campinas: Pontes, 1993.
observada anteriormente. 70% dos professores apontam o ensino de
gramática e vocabulário como o principal objetivo das atividades de leitura de
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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
491 492
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alunos/sujeitos passarem a produzir distintamente vogais anteriores do inglês


POR ONDE CAMINHAM A PERCEPÇÃO
não pertencentes ao Português do Brasil - PB, o seu nível de percepção ainda
E A PRODUÇÃO DISTINTIVA DE SONS DO INGLÊS?
é baixo, a percepção distintiva das vogais pelos sujeitos não acompanha a

Joceli Rocha Lima* mudança no padrão de produção distintiva.


Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
joceli@uesb.br O estudo pautou a discussão sobre as relações entre a pronúncia da
Língua Inglesa - LI e do PB em questionamentos levantados por Brown
(1994; 1995). Assim, o aprendiz aqui é falante nativo da Língua Portuguesa,
RESUMO
Este trabalho traz uma mostra do processo de percepção e produção de sons vocálicos do inglês logo, detentor de um sistema sonoro distinto do da LI; sons vocálicos não
por estudantes do curso de Letras da UESB. Esses dados foram selecionados do corpo da análise
da pesquisa de Mestrado, realizada na instituição, e objetiva mostrar o descompasso entre a presentes no PB foram estudados levando-se em consideração suas
tentativa de produção distintiva de vogais do inglês e, ao mesmo tempo, a percepção distintiva
dessas vogais. Através de exercícios de produção e percepção auditiva pode-se constatar que a
características articulatórias e as implicações de sua produção para o aluno
percepção distintiva das vogais pelos sujeitos não acompanha a mudança no seu padrão de estrangeiro; o aprendizado se dá numa situação formal de intervenção, por
produção.
falantes adultos que comungam do mesmo objetivo proposto neste estudo:
PALAVRAS-CHAVE: Distintividade. Percepção vocálica. Produção vocálica.
eliminar problemas de pronúncia que comprometam a sua comunicação.

MATERIAL E MÉTODOS
INTRODUÇÃO
Durante a coleta, três sujeitos (S1, S2 e S3) realizaram exercícios orais
Este trabalho traz uma mostra da análise do processo de percepção e e escritos para a percepção e produção das quatro vogais estudadas. Foram
produção de quatro sons vocálicos anteriores do inglês, /i/, /I/, /E/ e /æ/ por utilizados exercícios de pares mínimos, bingo de palavras e identificação de
estudantes do curso de Letras da Universidade Estadual do Sudoeste da frases. Esses exercícios foram organizados em três grupos: Pronunciation
Bahia - UESB. Esses dados foram selecionados do corpo da análise da Drill; Pronunciation Bingo e Sentence Practice. Alguns exercícios trabalham as
pesquisa de Mestrado realizada com alunos da instituição e objetivou mostrar vogais \i\ e \I\, outros as vogais \E\ e \œ\, e outros as quatro ao mesmo
o descompasso entre a tentativa de produção distintiva de vogais do inglês e, tempo. Também foram realizadas gravações de três Situações de Diálogo
ao mesmo tempo, a percepção distintiva dessas vogais. Através de exercícios (SD). As SDs serviram como recurso para se observar, na fala espontânea, as
de produção e percepção auditiva pôde-se constatar que apesar de os realizações adequadas que foram registradas nos exercícios. A SD 1 foi
gravada após as primeiras 10h de atividade; a SD 2 após 20h de atividade e

*
a SD 3 após 30h de atividade. Cada SD teve aproximadamente 30 min de
Mestre.
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In: III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso, 1, 2007. Anais do III Seminário de Pesquisa
em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso. Vitória da Conquista: Edições Uesb, 2007. p. .491-496. Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso
493 494
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duração, sendo que na primeira somente os três sujeitos (Ss) participaram; gas. S2 fez várias distinções de in e S3 demonstrou ter controle articulatório
na segunda, a pesquisadora (P) se juntou aos sujeitos no diálogo, e na para manter a distinção de at e had no início de frases ou quando
terceira, o diálogo foi gravado entre a pesquisadora e cada sujeito pronunciadas isoladamente, contudo, não ocorre distinção quando essas
individualmente. Após intervalos de tempo os sujeitos ouviram suas próprias palavras aparecem no meio da frase, intercaladas por outras palavras. Na
gravações para fazerem uma auto-avaliação. Nesse momento, cada um SD2 houve menor produção devido à presença da pesquisadora. Na SD3 a
recebeu uma ficha de controle onde deveriam registrar quantas vezes a fala de todos os sujeitos revela oscilação na distinção das vogais, mas neste
perfeita distinção das vogais não havia sido feita. O objetivo aqui foi avaliar o momento o número de distinções é superior ao de não distinções. No
grau de consciência dos sujeitos acerca de suas pronúncias. Esse controle foi cômputo geral de distinções estão as palavras: and, mystic, river, half, back,
feito também pela pesquisadora para efeito de comparação. thing(s), value, bill, am, live, him, been, had, can, aunt, finished, things, had,
can, in, is, since, am, access, has, sad, finish e six. Dentre os vocábulos que
RESULTADOS E DISCUSSÃO em determinados momentos foram distintos e em outros não, estão: with,
this, in, it have, this, and, didn’t, difficult, give, think e thing. A oscilação na
Objetivando investigar percepção e produção dos sujeitos realizou-se, pronúncia é marcante na fala dos três Ss, principalmente nos dez primeiros
primeiramente, os exercícios Pronunciation Drill e Pronunciation Bingo. minutos de gravação; após esse período as distinções deixam de ocorrer.
Aqui foram registrados equívocos na percepção e produção distintiva de /i/ e Em todas as SDs o registro de incorreções feito pela pesquisadora foi
/I/ e de /E/ e /œ/. Alguns pares registrados como erro foram: send/sand, sempre maior do que no controle feito pelos Ss; chegando a ser mais de 10
head/had, men/man, ten/tan, dead/dad, bend/band, guess/gas, said/sad, vezes maior em uma SD ou outra.
lend/land, beg/bag. Apesar dos equívocos e dificuldades observados houve
momentos de 100% de produção distintiva por alguns sujeitos. Ao final CONCLUSÕES
desses exercícios a distinção entre /E/ e /œ/ começou a se mostrar menos
complexa. Com o Sentence Practice, frases idênticas contendo pares Após os exercícios, a percepção de /I/ e /œ/ como /i/ e /E/ confirma a
mínimos foram lidas pela pesquisadora e pelos Ss, para registro de percepção assertiva de que falantes estrangeiros ouvem com ouvido de estrangeiro (ver
pelos demais Ss. Após repetições do exercício nenhum erro de identificação AVERY; EHRLICH, 1992; BURNS, 1992). Os registros de correções imediatas pelos
das frases foi cometido. sujeitos, após erros na pronúncia, levam à conclusão de que apesar de já
O controle das Situações de Diálogo (SDs) vem mostrar de que conhecerem as quatro vogais, os sujeitos não alcançaram ainda o controle
forma os sujeitos percebem sua pronúncia. Na SD1, no cômputo das falas articulatório suficiente para manter sua distinção em todas as ocorrências.
dos três sujeitos há registros de distinção de it, and, have, bad, in, at, had e
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AVERY, P.; EHRLICH, S. Teaching American English Pronunciation. 9th


impression (2002). Oxford: Oxford University Press, 1992.
BROWN, H. D. Principals of language learning and teaching. 3.ed. USA,
New Jersey: Prentice Hall Regents, 1994.
______. Teaching by principals: An Interactive Approach to Language
Pedagogy. USA, CA: San Francisco State University, 1995.
BURNS, I. M. Pronunciation-based Listening Exercises. In: AVERY, P.;
EHRLICH, S. Teaching American English Pronunciation. 9th impression
(2002). Oxford: Oxford University Press, 1992. chap.12, p. 197-206.

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Anais do III Seminário de Pesquisa em Estudos Lingüísticos e III Seminário de Pesquisa de Análise de Discurso

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