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A PRODUÇÃO TEXTUAL

E O ENSINO
Editora da Universidade Estadual de Maringá

Reitor Prof. Dr. Décio Sperandio


Vice-Reitor Prof. Dr. Mário Luiz Neves de Azevedo
Diretor da Eduem Prof. Dr. Ivanor Nunes do Prado
Editor-Chefe da Eduem Prof. Dr. Alessandro de Lucca e Braccini

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Equipe Técnica

Projeto Gráfico e Design Marcos Kazuyoshi Sassaka


Fluxo Editorial Edneire Franciscon Jacob
Mônica Tanamati Hundzinski
Vania Cristina Scomparin
Edilson Damasio
Artes Gráficas Luciano Wilian da Silva
Marcos Roberto Andreussi
Marketing Marcos Cipriano da Silva
Comercialização Norberto Pereira da Silva
Paulo Bento da Silva
Solange Marly Oshima
Formação de Professores em Letras - EAD

Annie Rose dos Santos


Eliana Alves Greco
Tânia Braga Guimarães
(ORGANIZADORAS)

A produção
textual e o ensino

6
Maringá
2010
Coleção Formação de Professores em Letras - EAD

Apoio técnico: Rosane Gomes Carpanese


Normalização e catalogação: Ivani Baptista CRB - 9/331
Revisão Gramatical: Manoel Messias Alves da Silva
Edição, Produção Editorial e Capa: Carlos Alexandre Venancio
Júnior Bianchi
Eliane Arruda

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

A produção textual e o ensino / Annie Rose dos Santos, Eliana Alves Greco,
P964 Tânia Braga Guimarães, organizadoras.-- Maringá : Eduem, 2010.
132p. 21cm. (Formação de Professores em Letras – EAD; n. 6)

ISBN 978-85-7628-272-3

1. Produção textual. 2. Textos – Estudo e ensino. 3. Textos – Resumos e


resenhas. 4. Língua portuguesa – Produção textual. I. Santos, Annie Rose dos, org.
II. Greco, Eliana Alves. III. Guimarães, Tânia Braga, org.

CDD 21. ed. 372.623

Copyright © 2010 para o autor


Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo
mecânico, eletrônico, reprográfico etc., sem a autorização, por escrito, do autor. Todos os direitos
reservados desta edição 2010 para Eduem.

Endereço para correspondência:

Eduem - Editora da Universidade Estadual de Maringá


Av. Colombo, 5790 - Bloco 40 - Campus Universitário
87020-900 - Maringá - Paraná
Fone: (0xx44) 3011-4103 / Fax: (0xx44) 3011-1392
http://www.eduem.uem.br / eduem@uem.br
S umário

Sobre os autores > 5

Apresentação da coleção > 7


Apresentação do livro > 9

Capítulo 1
Gêneros discursivos e tipologias textuais > 11
Eliana Alves Greco

Capítulo 2
Noções sobre a elaboração de resumo
Andrea Lourdes Ribeiro / Annie Rose dos Santos
> 29
Capítulo 3
Gênero textual resenha: da sociedade para a universidade
Tânia Braga Guimarães
> 49
Capítulo 4
O processo de produção textual
Renilson José Menegassi
> 75
Capítulo 5
Coesão-coerência-contexto: tripé da produção textual
Marilurdes Zanini > 103
Capítulo 6
O parágrafo na construção textual
Maria Aparecida Leite Mendes Cota > 115
3
S obre os autores
ANDRÉA LOURDES RIBEIRO
Graduada em Letras pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Mestre em

Língua Portuguesa pela PUC/MG. Doutora em Estudos Linguísticos pela Universidade

Federal de Minas Gerais (UFMG). Docente da Faminas/BH.

ANNIE ROSE DOS SANTOS


Graduada em Letras pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Mestre em Letras

pela Unesp/Assis. Docente da Universidade Estadual de Maringá (UEM).

ELIANA ALVES GRECO


Graduada em Letras pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Mestre em Letras

pela Unesp/Assis. Doutora em Letras pela USP. Docente da Universidade Estadual de

Maringá (UEM).

MARIA APARECIDA LEITE MENDES COTA


Graduada em Letras pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Mestre em

Estudos Linguísticos pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Docente da

Faminas/BH.

MARILURDES ZANINI
Graduada em Letras Português pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de

Paranavaí (Fafipa). Doutora em Letras pela Universidade Estadual Paulista (Unesp/Assis).

Pós-Doutora em Linguística Textual pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Docente da Universidade Estadual de Maringá (UEM).

RENILSON JOSE MENEGASSI


Graduado em Letras (UEM). Mestre em Linguística (UFSC). Doutor em Letras (Unesp/

Assis). Docente da Universidade Estadual de Maringá (UEM).

TÂNIA BRAGA GUIMARÃES


Graduada em Letras (UEM). Mestre em Letras (UEM). Doutora em Estudos da Linguagem

(UEL). Docente da Universidade Estadual de Maringá (UEM).

5
A presentação da Coleção
Os 54 títulos que compõem a coleção Formação de Professores em Letras fazem
parte do material didático utilizado pelos alunos matriculados no Curso de Licencia-
tura em Letras, habilitação dupla Português-Inglês, na Modalidade a Distância, da Uni-
versidade Estadual de Maringá (UEM). O curso está vinculado à Universidade Aberta
do Brasil (UAB) que, por seu turno, faz parte das ações da Diretoria de Educação a
Distância (DED) da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior
(Capes).
A UEM, na condição de Instituição de Ensino Superior (IES) proponente do curso,
assumiu a responsabilidade da produção dos 54 livros, dentre os quais 51 títulos fica-
ram a cargo do Departamento de Letras (DLE), 2 do Departamento de Teoria e Prática
da Educação (DTP) e 1 do Departamento de Fundamentos da Educação (DFE). O pro-
cesso de elaboração da coleção teve início no ano de 2009, e sua conclusão, seguindo
o cronograma de recursos e os trâmites gerais do Fundo Nacional de Desenvolvimento
da Educação (FNDE), está prevista até 2013. É importante ressaltar que, visando a
atender às necessidades e à demanda dos alunos ingressantes no Curso de Graduação
em Letras-Português/Inglês a Distância da UEM, no âmbito da UAB, nos diferentes po-
los, serão impressos 338 exemplares de cada livro.
A coleção, não obstante a necessária organicidade que aproxima e estabelece a
comunicação entre diferentes áreas, busca contemplar especificidades que tornam o
curso de Letras uma interessante frente profissional e de estudos. Neste sentido, as
três principais instâncias que compõem o curso de Letras na modalidade a distância
(Língua Portuguesa, Teoria da Literatura e Literaturas de Língua Portuguesa e
Língua Inglesa e Literaturas Correspondentes) são contempladas com livros orga-
nizados tendo em vista a construção do saber de cada área. Semelhante construção
não apenas trabalha conteúdos necessários de modo rigoroso, tal como seria de se
esperar de um curso universitário, como também atua decisivamente no sentido de
proporcionar ao aluno da Educação a Distância a autonomia e a posse do discurso,
de maneira a realizar uma caminhada plenamente satisfatória tanto em sua jornada
acadêmica quanto em sua posterior vida profissional. Isso só é possível graças à com-
petência e do comprometimento dos organizadores e autores dos livros desta coleção,
em sua maior parte ligados aos departamentos da Universidade Estadual de Maringá
envolvidos neste curso, além de convidados que enriqueceram a produção dos livros
com sua contribuição. A excelência e a destacada contribuição científica e acadêmica

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A PRODUÇÃO desses autores e organizadores são outros elementos que garantem a seriedade do
TEXTUAL
E O ENSINO material e reforçam a oportunidade que se abre ao aluno da Educação a Distância.
Além disso, o material produzido poderá ser utilizado por outras instituições ligadas
à Universidade Aberta do Brasil, abrindo uma perspectiva nacional para os livros do
curso de Letras a Distância.
Além do trabalho desses profissionais, esta coleção não seria possível sem a contri-
buição da Reitoria da UEM e de suas Pró-Reitorias, do Centro de Ciências Humanas,
Letras e Artes da UEM e seus respectivos representantes e departamentos, da Diretoria
de Educação a Distância (DED), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do
Ensino Superior (Capes), e do Ministério da Educação (MEC). Todas essas esferas, de
acordo com suas atribuições, foram de suma importância em todas as etapas do tra-
balho. Diante disso, é imperativo expressarmos, aqui, nosso agradecimento especial.
Por último, mas não menos importante, registramos nosso agradecimento especial
à equipe do NEAD-UEM: Pró-Reitoria de Ensino, Coordenação Pedagógica e equipe
técnica, pela dedicação e empenho, sem os quais esta empreitada teria sido muito mais
difícil, se não impossível.

Rosângela Aparecida Alves Basso


Organizadora da coleção.

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A presentação do livro
Este livro, como o título antecipa, apresenta conceitos atuais, com base em diver-
sos estudiosos do tema, acerca da produção textual e o ensino de Língua Portuguesa,
isto é, procura subsidiar o ensino da produção textual, uma vez que esta última é um
eixo programático da disciplina de língua materna nas escolas de nível fundamental e
médio.
Para tanto, o livro é dividido em seis capítulos. No primeiro, intitulado ‘Gêneros
discursivos e tipologias textuais’, sua autora, Eliana Alves Greco, define e caracteriza
os gêneros discursivos partindo da noção de esferas de atividades humanas. Aborda a
importância dos gêneros para as trocas comunicacionais, bem como diferencia gêne-
ros do discurso primário e secundário. Além disso, apresenta a distinção entre gêneros
do discurso e tipologias textuais, mostrando como o suporte é importante na criação
e na caracterização dos gêneros, discorrendo sobre a intertextualidade inter-gêneros.
No segundo capítulo, ‘Noções de elaboração de resumos’, as autoras Andréia Lour-
des Ribeiro e Annie Rose dos Santos apresentam a definição desse gênero discursivo
centrando-se na produção do resumo acadêmico. Com exemplos práticos e didáticos,
as autoras assinalam que a prática de resumir está presente em nosso dia-a-dia, e que
é uma atividade bastante solicitada nos meios escolar e acadêmico, citando os passos
necessários para se produzir um resumo científico adequado ao que se pretende.
No terceiro capítulo, denominado ‘Gênero textual resenha: da sociedade para a
universidade’, a autora, Tânia Braga Guimarães, discute por qual razão lemos esses
textos, as esferas de circulação, exemplos, definições, espaço privilegiado e estrutura
básica; além disso, simula uma situação de pesquisa para discutir a função das rese-
nhas. O objetivo é apresentar em que se constitui o gênero em questão a partir de
exemplos práticos relevantes, assim como as etapas necessárias para seu desenvolvi-
mento, pois dominar os passos de elaboração de uma boa resenha é tarefa fundamen-
tal para o crescimento acadêmico.
No quarto capítulo, ‘O processo de produção textual’, Renilson José Menegassi, o
autor com muita propriedade apresenta as concepções de escrita vigentes no sistema
escolar brasileiro a partir da noção de escrita como trabalho. Nessa perspectiva, carac-
teriza as condições de produção dos textos, estabelecendo, segundo a literatura, as
diferenças teórico-metodológicas entre redação e produção de texto. Ademais, define

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A PRODUÇÃO o processo de produção textual a partir das etapas de planejamento, execução, revisão
TEXTUAL
E O ENSINO e reescrita, mostrando, através de um exemplo prático e bastante didático, como todos
os conceitos contemplados no capítulo são estudados em uma produção escrita.
No quinto capítulo, ‘Coesão-coerência-contexto: tripé da produção textual’, sua
autora, Marilurdes Zanini, discute a coesão, a coerência e o contexto social como o
tripé da produção escrita. Com exemplos, a autora procura mostrar que o texto é
organizado coesa e coerentemente, objetivando levar o leitor a construir sentidos os
mais próximos possíveis daqueles que o autor deseja atingir, o que reforça o entendi-
mento de que os sentidos do texto são construídos pela inter-ação entre os sujeitos
da atividade comunicativa – autor, texto, leitor. Importante ainda é a assertiva de que
nos processos de produção e de leitura de um texto são instituídas ações linguísticas,
cognitivas e sociais, tornando possível o seu funcionamento na sociedade.
No sexto e último capítulo, ‘O parágrafo na construção textual’, a autora, Maria
Aparecida Leite Mendes Cota, conceitua o parágrafo, e didaticamente, dá exemplos
minuciosos sobre como produzi-los.
A escrita como um todo, como você perceberá após ler e estudar este livro, não é
produzida em um passe de mágica, mas necessita de muito esforço, muita dedicação e
muito trabalho, não apenas para colocar as ideias no papel, mas também e principal-
mente para avaliarmos os textos que produzimos. Esperamos que este livro, redigido
a tantas mãos e com tanto carinho, leve você, caro aluno-professor, a produzir bem
e melhor os seus resumos, as suas resenhas, os seus parágrafos, tendo em vista que
todos se configuram como gêneros discursivos, que objetivam a interação entre você,
produtor, e o leitor de seus textos, seja este o tutor ou o professor.

Annie Rose dos Santos


Eliana Alves Greco
Tânia Braga Guimarães
Organizadoras

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1 Gêneros discursivos
e tipologias textuais

Eliana Alves Greco

O interesse pelo estudo do gênero no Brasil iniciou-se no final da década de 90


do século passado, principalmente com a publicação dos Parâmetros Curriculares Na-
cionais (PCNs), que preconizam o trabalho com gêneros na sala de aula. Entretanto, a
preocupação do homem pelo gênero não é nova, mas vem desde a Antiguidade, uma
vez que Platão e Aristóteles já haviam classificado o gênero no campo dos estudos
literários e retóricos.
No decorrer do tempo, muitos estudiosos continuaram a se interessar pela ques-
tão do gênero, seja no campo literário, linguístico ou discursivo, e diferentes propos-
tas foram apresentadas. Hoje, há inúmeros trabalhos com o gênero, principalmente
na perspectiva discursiva, existindo também várias correntes, sendo muitas delas in-
fluenciadas pela noção de gêneros proposta por Bakhtin (1992). Há, portanto, uma
diversidade de pontos de vista sobre a questão dos gêneros, inclusive em relação às
denominações, visto que alguns teóricos falam em gêneros de discurso e outros em gê-
neros de textos. Considerando que trabalharemos na perspectiva teórica de Bakhtin,
utilizaremos aqui a denominação gêneros do discurso.
Neste capítulo, temos como objetivo abordar a noção de gêneros do discurso pro-
posta Bakhtin, bem como apresentar a diferença entre gêneros discursivos e tipologias
textuais.

1 GÊNEROS DISCURSIVOS: DEFINIÇÃO E CARACTERÍSTICAS


O ser humano age em determinadas esferas de atividades humanas, como a da igre-
ja, da escola, do trabalho, da política, do jornal, das relações de amizade. Essas esferas
de atividades implicam a utilização da língua­ em forma de enunciados, concretos e
únicos, que se estabilizam e se modificam em função de alterações na própria esfera.
Os enunciados são produzidos somente dentro das esferas, sendo determinados pe-
las condições e pelas finalidades de cada uma delas. Isso significa que cada esfera de
atividades elabora tipos relativamente estáveis de enunciados. Esses enunciados se
concretizam em textos socialmente construídos, que são os gêneros discursivos, ou

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A PRODUÇÃO seja, no interior de uma determinada esfera de atividade nos comunicamos por meio
TEXTUAL
E O ENSINO de gêneros.
Neste sentido, cada esfera da atividade comporta um repertório de gêneros, que
se diferencia e se amplia à medida que a própria esfera se desenvolve e se torna mais
complexa. Assim, por exemplo, na esfera jornalística, temos os gêneros carta do leitor,
editorial, reportagem; na política, os gêneros debate, pronunciamento, reunião; na
jurídica, encontramos a petição, a sentença, o des­pacho; na religiosa, há os gêneros
sermão, oração, fórmula sa­cramental, encíclica. Considerando que as esferas de utili-
zação da língua são heterogêneas, os gêneros também apresentam heterogeneidade.
Os gêneros se caracterizam pelo conteúdo temático (dimensão temática), por estilo
verbal (dimensão linguística) e pela construção composicional (dimensão textual).
O conteúdo temático não é o assunto do qual trata o texto, mas é um domínio de
sentido de que se ocupa o gênero:

Assim, as cartas de amor apresentam o conteúdo temático das relações amo­


rosas. Cada uma das cartas trata de um assunto específico (por exem­plo, o
rompimento de X e Y, por causa de uma traição) dentro do mesmo conteúdo
temático. As aulas versam sobre um ensinamento de um programa de curso. As
sentenças têm como conteúdo temá­tico uma decisão judicial (FIORIN, 2008,
p. 62).

O estilo verbal é uma seleção dos recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais da


língua, em função da imagem do interlocutor e do gênero:

Há, assim, um estilo oficial, que usa formas respeitosas, como nos requerimen-
tos, discur­sos parlamentares, etc.; um estilo objetivo-neutro, em que há uma
identificação entre o locutor e seu interlocutor, como nas exposições cientí-
ficas, em que se usa um jargão marcado por uma “objetivida­de” e uma “neu-
tralidade”; um estilo familiar, em que se vê o inter­locutor fora do âmbito das
hierarquias e das convenções sociais, como nas brincadeiras com os amigos,
marcadas por uma atitude pessoal e uma informalidade com relação à lingua-
gem; um estilo íntimo, em que há uma espécie de fusão entre os parceiros da
comunica­ção, como nas cartas de amor, de onde emerge todo um modo de
tratamento do domínio daquilo que é mais privado (FIORIN, 2008, p. 62-63).

A construção composicional é a estrutura composicional, ou seja, o modo de orga-


nizar o texto. Todo gênero tem uma organização estrutural de acordo com as condi-
ções específicas e a finalidade. Por exemplo, como a carta será lida posteriormente a
sua produção, será necessário situar o leitor no tempo, no espaço e na interlocução,
para que seja possível a compreensão dos dêiticos presentes. Assim, a carta deve con-
ter, em sua organização, o local e a data em que foi escrita, bem como os nomes do
remetente e do destinatário.

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Os três elementos – conteúdo temático, estilo verbal e construção composicional Gêneros discursivos
e tipologias textuais
– se fundem indissoluvelmente no todo do enunciado, sendo marcados pela especifi-
cidade de uma esfera da comunicação. Diante dessas considerações, Bakhtin apresenta
sua noção de gêneros de discurso como tipos relativamente estáveis de enunciados,
elaborados pelas mais diversas esferas de utilização da língua.
Os gêneros do discurso são de grande importância para o entendimento das trocas
comunicacionais, uma vez que

Aprendemos a moldar nossa fala às formas do gênero e, ao ouvir a fala do ou-


tro, sabemos de imediato, bem nas primeiras palavras, pressentir-lhe o gênero,
adivinhar-lhe o volume (a extensão aproximada do todo discursivo), a dada
estrutura composicional, prever-lhe o fim, ou seja, desde o começo, somos
sensíveis ao todo discursivo que, em seguida, no processo da fala, evidenciará
suas diferenciações. Se não existissem os gêneros de discurso e se não o ado-
tássemos, se tivéssemos de criá-los pela primeira vez no processo da fala, se
tivéssemos de construir cada um de nossos enunciados, a comunicação verbal
seria quase impossível (BAKHTIN, 1992, p. 302).

Todos os membros de uma coletividade possuem uma competência genérica, isto


é, o domínio de gêneros de discurso que garante a comunicação verbal:

Graças ao nosso conhecimento dos gêneros do discurso, não precisamos


prestar uma atenção constante a todos os detalhes de todos os enunciados
que ocorrem à nossa volta. Em um instante somos capazes de identificar um
dado enunciado como sendo um folheto publicitário ou como uma fatura e,
então, podemos nos concentrar apenas em um número reduzido de elementos
(MAINGUENEAU, 2001, p. 64).

Neste sentido, Brandão (2004) afirma que, quando uma pessoa fala/escreve ou
ouve/lê um texto, já tem uma visão do texto como um “todo acabado”, pelo fato de
possuir um conhecimento prévio dos gêneros a que teve acesso na sua história escolar
ou de leitura. Muitas vezes, o indivíduo especifica, durante a sua fala, o gênero do
discurso que está produzindo ou se referindo, como:

- o telefonema de ontem
- a palestra de hoje
- a entrevista de fulano,
- a piada do dia,
- a reportagem de ontem
- o noticiário desta noite etc. (BRANDÃO, 2004, p. 99).

O falante tem conhecimento do gênero com o qual está tendo contato, especial-
mente porque os gêneros, muitas vezes, possuem marcas linguísticas mais ou menos
fixas, as quais apontam o gênero em que estão inseridas. Assim, a expressão “era uma

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A PRODUÇÃO vez” indica tratar-se do gênero conto de fadas; “prezado amigo” mostra ser a abertura
TEXTUAL
E O ENSINO do gênero carta e “alô, quem é?” aponta para o gênero telefonema (BRANDÃO, 2004).
Para Bakhtin (1992), os gêneros do discurso são introduzidos em nossa experiência
e em nossa consciência simultaneamente às formas da língua:
Esses gêneros do discurso nos são dados quase como nos é dada a língua materna,
que dominamos com facilidade antes mesmo que lhe estudemos a gramática. A língua
materna – a composição de seu léxico e sua estrutura gramatical –, não a aprendemos
nos dicionários e nas gramáticas, nós a adquirimos mediante enunciados concretos
que ouvimos e reproduzimos durante a comunicação verbal viva que se efetua com os
indivíduos que nos rodeiam (BAKHTIN, 1992, p. 301).
Os gêneros do discurso organizam nossa fala do mesmo modo que as formas da
língua a organizam; entretanto as formas do gênero se diferenciam daquelas pela pers-
pectiva de sua estabilidade e de suas leis normativas para o locutor. As formas do gêne-
ro são mais fáceis de combinar porque são mais dinâmicas, mais plásticas e mais livres
que as formas da língua, além de apresentar maior variedade.
Contudo, mesmo assim os gêneros possuem um valor normativo, porque eles não
são criados pelo locutor, mas são dados a ele. Nesse âmbito, o enunciado, embora
tenha uma individualidade e uma criatividade, não pode ser considerado uma combi-
nação absolutamente livre das formas da língua.
A definição de gêneros discursivos proposta, por apresentar um valor normativo e
estar ligada à especificidade de uma esfera de comunicação, poderia supor que os fa-
lantes estariam impossibilitados de criar ou modificar um gênero, uma vez que o tema,
a estrutura composicional e o estilo seriam características de um determinado gênero.
No entanto, o enunciado é individual, ou seja, tem um estilo individual, podendo re-
fletir a individualidade daquele que fala ou escreve, mesmo que nem todos os gêneros
sejam propícios ao estilo individual. Os gêneros mais propícios ao estilo individual são
os literários, e os menos propícios são os gêneros do discurso, que requerem uma for-
ma padronizada, como a formulação do documento oficial, da ordem militar, da cor-
respondência comercial, da lista telefônica, da receita médica, etc. (BAKHTIN, 1992).

2 GÊNEROS PRIMÁRIOS E SECUNDÁRIOS


Considerando que os gêneros se ampliam de acordo com o desenvolvimento e
a complexidade da esfera da atividade humana, Bakhtin (1992) distingue gênero do
discurso primário (simples) e gênero do discurso secundário (complexo).
Os gêneros primários são mais simples que os secundários, sendo predominan­
temente, mas não exclusivamente, orais. São os gêneros da vida cotidiana e que man-
têm relação imediata com as situações em que são produzidos, como, por exemplo,

14
o diálogo cotidiano, a carta pessoal, o bate-papo, a conversa telefônica, o bilhete, o Gêneros discursivos
e tipologias textuais
e-mail.
Já os secundários aparecem em circunstâncias de uma comunicação cultural, mais
complexa e mais evoluída, essencialmente escrita, mas não unicamente. São exemplos
de gêneros secundários o romance, o teatro, o editorial, o discurso parlamentar, o ar-
tigo científico. A escrita não é a principal característica dos gêneros secundários, visto
que há gêneros secundários orais, como a palestra. Em seu processo de formação, os
gêneros secundários absorvem e modificam os gêneros primários, os quais perdem
sua relação imediata com a realidade existente.
Essa distinção tem grande importância teórica, pois a inter-relação entre os dois
tipos de gêneros e o processo histórico de formação dos gêneros secundários esclare-
cem a natureza do enunciado.

3 O SUPORTE NA CRIAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DOS GÊNEROS


Os gêneros caracterizam-se mais pelos aspectos sociocomunicativos e funcionais
que pelas particularidades linguísticas e estruturais; todavia, a forma não deve ser
desprezada. Além disso, em alguns casos, os gêneros podem ser determinados pela
função, em outros pela forma, mas em outros casos, ainda, pelo suporte em que os
textos aparecem.
Marcuschi (2008) define suporte como um lugar, físico ou virtual, como a Internet,
que possui formato específico e tem a função de fixar e mostrar o texto. Desse modo,
podem servir de suporte para os gêneros o livro, o jornal, a revista (semana ou men-
sal), a revista científica, o rádio, a televisão, o parachoque de caminhão, o outdoor, as
roupas, as embalagens, os muros, entre outros (MARCUSCHI, 2005).
Levando em conta que o suporte em que o texto está veiculado pode determinar o
gênero, um único texto pode apresentar gêneros diferentes, dependendo do suporte.
Assim, um texto publicado em uma revista acadêmica, por exemplo, será classificado
como artigo científico, porém esse mesmo texto publicado em um jornal diário será
considerado um artigo de divulgação científica.
Para ilustrar a importância do suporte na distinção do gênero, observemos a ima-
gem a seguir:

15
A PRODUÇÃO
TEXTUAL
E O ENSINO

http://www.webcomarte.com.br/img/site_cartao/outdoor_img_bxa.jpg

O texto “Meu coração tum tum tum tum tum tum tum tum tum tum tum tum tum
tum tum tum tum!! Te amo mais do que as palavras possam traduzir. Aninha” está
comunicado no suporte outdoor e, devido a isso, pode ser considerado o gênero
declaração de amor. Entretanto, se o mesmo texto for enviado pelo correio, em for-
mulário próprio, será um telegrama; se estiver escrito em um papel e colocado sobre
a mesa de uma pessoa, será um bilhete. Esse texto poderá ainda estar veiculado em su-
portes virtuais: se estiver no Orkut, será um bilhete virtual, mas se estiver no correio-
eletrônico, será um e-mail. Como foi possível percebermos, o conteúdo textual não
se modifica, porém o gênero será identificado pelo suporte em que o texto aparece.
Marcuschi (2005, p. 19) salienta a importância dos suportes tecnológicos na criação
e na classificação dos gêneros. Neste sentido, embora os gêneros sejam entidades so-
ciodiscursivas, com alto poder preditivo e interpretativo das ações humanas, “não são
instrumentos estanques e enrijecedores da ação criativa”, porque surgem atrelados a
necessidades e atividades socioculturais e na relação com inovações tecnológicas.
Podemos constatar que, nos últimos dois séculos, as novas tecnologias, principal-
mente às ligadas à área de comunicação, como a televisão, o jornal, a revista, o rádio
e a Internet, proporcionaram o surgimento de novos gêneros. A importância das ino-
vações tecnológicas para o surgimento dos gêneros pode ser verificada pelo advento
da Internet, que colaborou para o surgimento de vários gêneros, como e-mail, scrap,
MSN, blog, chat. No entanto, como assinala Marcuschi (2005), não são as tecnologias
por si mesmas que originam os gêneros, mas a intensidade dos usos dessas tecnologias
e suas interferências nas atividades comunicativas diárias.

16
Como já expusemos, os grandes suportes tecnológicos propiciam e abrigam gê- Gêneros discursivos
e tipologias textuais
neros novos bem característicos, no entanto conforme Marcuschi (2005), os novos
gêneros não são inovações absolutas, criações totalmente inovadoras, mas possuem
ancoragem em gêneros anteriormente existentes. Como exemplos dessa ancoragem,
podemos citar a conversação face a face, que gerou o gênero telefonema e, posterior-
mente, o chat; as cartas e bilhetes, que deram origem ao e-mail, com o surgimento da
Internet; o gênero aula, que deu ancoragem ao gênero vídeo-aula na modalidade de
educação a distância.
Para compreender a importância do suporte tecnológico na criação de novos gêne-
ros, Maingueneau (2001) utiliza como exemplo a forma de como o discurso político
de campanha se modificou através do tempo. No século XIX, na França, uma reunião
eleitoral se realizava em um salão de festas, na sala de um café ou na praça de um
vilarejo. Os ouvintes eram voluntários, moradores na mesma cidade do candidato ou
possuíam ideologias próximas. Como não havia microfone, o candidatado era um ora-
dor, que deveria falar em voz alta.
Algumas décadas depois, o político passou a fazer sua campanha pelo rádio, po-
dendo utilizar uma voz suave, amigável e se dirigir individualmente a cada ouvinte. O
rádio permitiu que a fala se introduzisse na casa de qualquer pessoa, seja amiga ou
inimiga, que não precisava mais se deslocar para ouvi-lo. O público passou a ser cons-
tituído “[...] por ouvintes dispersos e sem rosto, em relação aos quais já não é possível
apresentar-se como ‘orador’. O discurso tende a tornar-se uma fala de indivíduo a
indivíduo” (MAINGUENEAU, 2001, p. 73).
Com o surgimento da televisão, houve uma nova transformação no exercício do
discurso político, reduzindo a importância da exposição de ideias e privilegiando os
debates, nos quais importa, acima de tudo, conquistar a simpatia dos telespectadores.

4 DISTINÇÃO ENTRE GÊNEROS DISCURSIVOS E TIPOLOGIAS TEXTUAIS


Os gêneros discursivos devem ser distinguidos das tipologias textuais. Destarte,
como salienta Marcuschi (2008), não existe uma dicotomia entre gênero e tipo textual,
mas há, entre os dois, uma relação de complementaridade e integração.
Os gêneros são “os textos materializados que encontramos em nossa vida diá-
ria e que apresentam características sócio-comunicativas definidas por conteúdos,
propriedades funcionais, estilo e composição característica” (MARCUSCHI, 2005, p.
22-23). Embora os gêneros sejam eventos linguísticos, não são definidos pelas caracte-
rísticas linguísticas, mas enquanto atividades sociodiscursivas.
Já a expressão tipo textual é utilizada para denominar uma sequência definida pela
natureza linguística de sua composição, em que são observados aspectos lexicais,

17
A PRODUÇÃO sintáticos, tempos verbais e relações lógicas. Os tipos textuais, portanto, são sequên-
TEXTUAL
E O ENSINO cias linguísticas, ou seja, são as palavras, as frases e os parágrafos que organizam inter-
namente o gênero discursivo.
Enquanto os gêneros discursivos são inúmeros, os tipos textuais compreendem
seis categorias: narração, argumentação, exposição, descrição e injunção.
Apresentamos, abaixo, um quadro elaborado por Marcuschi (2005, p. 23), no qual
é realizado um paralelo entre os gêneros e os tipos textuais:

TIPOS TEXTUAIS GÊNEROS TEXTUAIS

1)  constructos teóricos definidos por pro- 1) realizações linguísticas concretas defini-
priedades linguísticas intrínsecas; das por propriedades sociocomunicativas;

2)  constituem sequências linguísticas ou 2) constituem textos empiricamente cum-


sequências de enunciados no interior dos prindo funções em situações comunicati-
gêneros e não são textos empíricos; vas;

3) sua nomeação abrange um conjunto lim- 3) sua nomeação abrange um conjunto


itado de categorias teóricas determinadas aberto e praticamente ilimitado de desig-
por aspectos lexicais, sintáticos, relações nações concretas determinadas pelo canal,
lógicas, tempo verbal; estilo, conteúdo, composição e função;

4) designações teóricas dos tipos: narra- 4) exemplos de gêneros: telefonema, ser-


ção, argumentação, descrição, injunção e mão, carta comercial, carta pessoal, ro-
exposição. mance, bilhete, reportagem jornalística,
aula expositiva, notícia jornalística reunião
de condomínio, cardápio, instruções,
horóscopo, receita culinária, bula de remé-
dio, lista de compras, cartão de instruções
de uso, outdoor, inquérito policial, resenha,
edital de concurso, piada, conversação es-
pontânea, conferência, carta eletrônica,
bate-papo virtual, aulas virtuais, etc.

Os tipos textuais são constituídos por critérios internos (linguísticos e formais),


e os gêneros discursivos são instituídos por critérios externos (sociocomunicativos e
discursivos).
Marcuschi apresenta uma matriz de critérios que servirá de base para os tipos tex-
tuais, proposta por Werlich (1973 apud MARCUSCHI, 2005), a qual reproduzimos na
sequência:

18
Quadro 2 - Tipos textuais conforme Werlich (1973). Gêneros discursivos
e tipologias textuais

Tipos textuais segundo Werlich (1973)


Bases temáticas Exemplos Traços linguísticos
Descritiva “Sobre a mesa Esse tipo de enunciado textual tem uma
havia milhares de estrutura simples com um verbo estático no
vidros.” presente ou imperfeito, um complemento e
uma indicação circunstancial de lugar
Narrativa “Os passageiros Esse tipo de enunciado textual tem um verbo
aterrissaram em de mudança no passado, um circunstancial
Nova York no de tempo e lugar. Por sua referência
meio da noite.” temporal e local, esse enunciado é designado
como enunciado indicativo de ação.
Expositiva “Uma parte Em (a), temos uma base textual denominada
do cérebro é o exposição sintética pelo processo da
córtex.” composição. Aparece um sujeito, um
“O cérebro tem predicado (no presente) e um complemento
10 milhões de com um grupo nominal. Trata-se de um
neurônios.” enunciado de identificação de fenômenos.
Em (b), temos uma base textual
denominada exposição analítica pelo
processo de decomposição. Também é
uma estrutura com um sujeito, um verbo
da família do verbo ter (ou verbos como:
"contém'', “consiste”, “compreende”) e um
complemento que estabelece com o sujeito
uma relação parte-todo. Trata-se de um
enunciado de ligação de fenômenos.
Argumentativa “A obsessão Temos aqui uma forma verbal com o verbo
com a ser no presente e um complemento (que
durabilidade de no caso é um adjetivo). Trata-se de um
nas Artes não é enunciado de atribuição de qualidade.
permanente.”
Injuntiva “pare!”, Vem representada por um verbo no
“seja razoável!” imperativo. Esses são os enunci­ados
incitadores à ação. Estes textos podem sofrer
certas modificações significativas na forma
e assumir, por exemplo, a configuração
mais longa, onde o imperativo é substituído
por um "deve". Por exem­plo: "Todos os
brasileiros na idade de 18 anos do sexo
masculino de­vem comparecer ao exército
para alistarem-se."
(MARCUSCHI, 2005, p. 26-27).

De acordo com o Quadro 2, os textos descritivos se caracterizam pelo predomínio


de sequências de loca­lização, que possuem uma estrutura simples, com um verbo
estático no presente ou imperfeito, um complemento e uma indicação de lugar. Os
textos narrativos apresentam como traços linguísticos predominantes enunciados

19
A PRODUÇÃO estruturados com um verbo de mudança no passado e indicadores de tempo e lugar.
TEXTUAL
E O ENSINO Já os textos expositivos se constituem pelo predomínio de sequências formadas
por um sujeito, um verbo no presente e um complemento com um grupo nominal ou
ainda por um sujeito, um verbo da família do verbo ter (contém, consiste, compreen-
de) e um complemento que estabelece com o sujeito uma relação parte-todo. Os tipos
textuais argumentativos são estruturados pelo predomínio de sequências formadas
pelo verbo ser no presente e um adjetivo. E os textos injun­tivos apresentam o predo-
mínio de sequências imperativas.
Como pudemos perceber, para a noção de gênero textual há o predomínio de
“critérios de ação prática, circulação sócio-histórica, funcionalidade, conteúdo te-
mático, estilo e composicionalidade” (MARCUSCHI, 2005, p. 24), enquanto que, para
a noção de tipo textual, há o predomínio da identificação de sequências linguísticas
típicas, ou seja, os tipos textuais são definidos por seus traços linguísticos predomi-
nantes. Isso porque um gênero pode ser constituído por duas ou mais sequências
textuais, porém uma delas irá predominar, e é essa sequência predominante que de-
finirá a tipologia textual. Assim, podemos afirmar que os gêneros discursivos são uma
espécie de armadura comunicativa preenchida por sequências tipológicas, que podem
ser heterogêneas e relacionadas entre si (MARCUSCHI, 2005).
Vejamos, por exemplo, o gênero discursivo fábula, que foi criado, na Antiguidade,
com a função social de ensinar e aconselhar o ser humano. Embora atualmente a fá-
bula seja um gênero escrito, teve sua origem e circulação na tradição oral. Toda fábula
possui uma ideologia, que perpassa pela história protagonizada por animais com com-
portamentos e características humanas. Nesse âmbito, sempre há uma disputa entre os
bons e os maus, os fortes e fracos, os gananciosos e os humildes, etc.
O gênero fábula geralmente é classificado pela tipologia textual narrativa; não obs-
tante, além de sequências discursivas narrativas, também há, em sua organização in-
terna, sequências discursivas descritivas ou expositivas, como podemos verificar nas
fábulas abaixo:

A raposa e as uvas
Versão de La Fontaine

Certa raposa astuta, normanda ou gascã,


Quase morta de fome, sem eira nem beira,
Andando à caça, de manhã,
Passou por uma alta parreira,
Carregada de cachos de uvas bem maduras.
Altas demais – não houve impasse:
“Estão verdes... já vi que são azedas, duras...”
Adiantaria se chorasse?
(LA FONTAINE, 1992, p. 211).

20
Os bois e o eixo Gêneros discursivos
Esopo e tipologias textuais

Enquanto os bois puxavam a carroça, o eixo rangia. Então, eles se voltaram e


lhe disseram assim: “Ei, meu caro, nós carregamos todo o peso e você é que
fica reclamando?”
Assim, também certos homens, enquanto outros fazem forca, fingem que são
eles próprios que estão se fatigando.
(DEZOTTI, 2003, p. 38-9).

A fábula “A raposa e as uvas” apresenta sequências discursivas descritivas quando


descreve a raposa, e depois, no meio do texto, ao descrever a parreira; entretanto as
sequências narrativas predominam no texto. Já a fábula “Os bois e o eixo” é constituída
por sequências narrativas, mas é finalizada com sequências argumentativas: “Assim,
também certos homens, enquanto outros fazem forca, fingem que são eles próprios
que estão se fatigando.” Os dois textos são considerados tipos narrativos, por predo-
minarem, em seu interior, sequências narrativas.
A Associação dos Municípios do Oeste do Paraná – Amop (2007, p. 15) demonstra
a relação entre esfera social, gêneros e tipologias com os gêneros da esfera jornalística,
que reproduzimos na íntegra:

Quadro 3: Relação entre esfera social, gêneros e tipologias


com os gêneros da esfera jornalística
Tipos de Textos
Esfera Social Gêneros Discursivos
(sequências discursivas)
Narrativa*
Descritiva
Reportagem
Argumentativa
Expositiva
Expositiva
Horóscopo Injuntiva*
Argumentativa
Argumentativa*
Jornalística
Texto publicitário Injuntiva
Descritiva
Expositiva
Notícia Descritiva
Narrativa*
Argumentativa*
Editorial Expositiva
Injuntiva
* Sequências discursivas predominantes nesses gêneros.

No Quadro 3, os gêneros da esfera jornalística possuem três ou quatro sequências


discursivas, mas sempre há o predomínio de uma delas. No gênero reportagem, por

21
A PRODUÇÃO exemplo, embora haja sequências descritiva, argumentativa e expositiva, há o predo-
TEXTUAL
E O ENSINO mínio da narrativa, o que faz com que o texto seja considerado de tipo narrativo. Já no
Editorial, a sequência argumentativa predomina sobre as demais, sendo considerado
um tipo textual narrativo.

5 INTERTEXTUALIDADE INTERGÊNEROS
A intertextualidade intergêneros, em conformidade com Marcuschi (2005), é a hi-
bridização ou mescla de gêneros na qual um gênero assume a função e/ou a forma de
outro. O resultado é uma mistura de funções e formas de gêneros diferentes em um
determinado gênero. Os gêneros híbridos podem confundir o leitor, porém o gênero
deve ser definido pela função e não pela forma, visto que a função supera a forma na
determinação do gênero.
Para explicar o hibridismo entre gêneros, Marcuschi (2005) expõe o texto abaixo,
publicado na Folha de São Paulo:

Quadro 4: Texto “Um novo José”

Um novo José
Josias de Souza
– São Paulo – Diga: ora, Drummond, Agora FMI.

Calma José.  Se você gritasse, 


A festa não começou,  se você gemesse, 
a luz não acendeu,  se você dormisse, 
a noite não esquentou,  se você cansasse, 
o Malan não amoleceu,  se você morresse... 
mas se voltar a pergunta:  O Malan nada faria, 
e agora José?  mas já há quem faça. 
Diga: ora Drummond, 
agora Camdessus.  Ainda só, no escuro, 
Continua sem mulher,  qual bicho-do-mato 
continua sem discurso,  ainda sem teogonia, 
continua sem carinho,  ainda sem parede nua, 
ainda não pode beber,  para se encostar, 
ainda não pode fumar,  ainda sem cavalo preto, 
cuspir ainda não pode,  Que fuja a galope, 
a noite ainda é fria,  você ainda marcha, José! 
o dia ainda não veio,  Se voltar a pergunta: 
o riso ainda não veio,  José, para onde? 
não veio ainda a utopia,  Diga: ora Drummond, 
o Malan tem miopia,  por que tanta dúvida? 
mas nem tudo acabou,  Elementar, elementar, 
nem tudo fugiu,  sigo pra Washington 
nem tudo mofou. e, por favor, poeta, 
Se voltar a pergunta: não me chame de José. 
E agora José? Me chame Joseph.
Fonte: FOLHA DE S. PAULO, Caderno 1, página 2 – OPINIÃO, 04/10/1999 (apud MARCUSCHI, 2005, p. 30).

22
O texto “Um novo José”, de Josias de Souza define a intertextualidade com o poe- Gêneros discursivos
e tipologias textuais
ma “José”, de Carlos Drummond de Andrade:

Quadro 5: Texto “José”

José
Carlos Drummond de Andrade

E agora, José?   sua lavra de ouro,  


A festa acabou,   seu terno de vidro,  
a luz apagou,   sua incoerência,  
o povo sumiu,   seu ódio – e agora?
a noite esfriou,  
e agora, José?   Com a chave na mão  
e agora, você?   quer abrir a porta,  
você que é sem nome,   não existe porta;  
que zomba dos outros,   quer morrer no mar,  
você que faz versos,   mas o mar secou;  
que ama, protesta?   quer ir para Minas,  
e agora, José?   Minas não há mais.  
  José, e agora?  
Está sem mulher,    
está sem discurso,   Se você gritasse,  
está sem carinho,   se você gemesse,  
já não pode beber,   se você tocasse  
já não pode fumar,   a valsa vienense,  
cuspir já não pode,   se você dormisse,  
a noite esfriou,   se você cansasse,  
o dia não veio,   se você morresse...  
o bonde não veio,    
o riso não veio   Mas você não morre,  
não veio a utopia   você é duro, José!  
e tudo acabou    
e tudo fugiu   Sozinho no escuro  
e tudo mofou,   qual bicho-do-mato,  
e agora, José?   sem teogonia,  
  sem parede nua  
E agora, José?   para se encostar,  
Sua doce palavra,   sem cavalo preto  
seu instante de febre,   que fuja a galope,  
sua gula e jejum,   você marcha, José!  
sua biblioteca, José, para onde?

Fonte: ANDRADE (2003, p. 106-107).

23
A PRODUÇÃO Tanto o poema de Drummond (Quadro 5) quanto o texto de Josias de Souza (Quadro
TEXTUAL
E O ENSINO 4) estão relacionados com os acontecimentos políticos da época em que foram escritos.
O poema “José” foi publicado pela primeira vez em 1942, época marcada pela atuação
do Estado Novo no Brasil, que gerou vários acontecimentos políticos e econômicos na
sociedade, aumentando a situação de miséria da população e a desigualdade social. O
personagem José é a representação de um problema coletivo: o brasileiro que resiste e
continua vivendo. Inclusive o nome José, por ter um caráter genérico, transmite a ideia
de indiferença, uma vez que José poderia ser somente mais uma pessoa na multidão
(LONDERO, 2002).
Já o texto “Um novo José” (Quadro 4) foi publicado em 1999, no jornal Folha de
São Paulo. A década de 1990, marcada por duas eleições diretas para a presidência da
República, representa a consolidação da democracia no Brasil. Todavia também foi
uma época marcada por escândalos políticos, privatizações, concentração de renda,
desigualdade social. Assim José, ou seja, o povo brasileiro continua pobre, carente e
sendo tratado com indiferença, como no tempo de Drummond.
Além de conter uma relação intertextual com o poema de Drummond, o texto “Um
novo José” (Quadro 4) se configura como uma estrutura intergêneros, porque tem a
forma de um poema, mas exerce a função de um artigo de opinião. Como a função
sobrepõe à forma na determinação do gênero, devemos considerar esse texto um ar-
tigo de opinião e não um poema. Temos que considerar também o suporte em que
os dois textos foram veiculados: “José” foi publicado em um livro de poesias, e “Um
novo José” está inserido no Caderno Opinião do jornal Folha de São Paulo. Jornais
de circulação diária também podem trazer o gênero poesia, mas em outras seções do
jornal, como, por exemplo, no caderno cultural.
O hibridismo entre gêneros também é levantado por Fiorin (2008), que exemplifi-
ca com um texto extraído de um folheto publicitário do Cartão Nacional Visa, em que
a publicidade se estrutura como se fos­se um anúncio de correio sentimental:

6 meses de experiência
Jovem, poliglota, de excelente reputação e prestígio, bem recebido no Brasil
inteiro e em mais de 200 países, procura, para relacionamento experimental de
6 meses e futuro compromisso, pessoas acima de 21 anos, que adorem viver
bem, gostem de viajar, ir a restaurantes, shoppings, teatros, supermercados,
fazer compras e muitas outras coisas boas da vida. Rio de Janeiro: 080021-0080.
Cartão Nacional Visa. 6 meses sem anuidade para você conhecer e aprovar.
Entre em contato com a gente hoje mesmo e associe-se ao Nacional Visa. Você
tem 6 meses para testar e aprovar todos os seus benefícios e serviços exclusivos
(FIORIN, 2008, p. 71).

Diante da intertextualidade intergêneros, Brandão (2004, p. 108) acredita que é


necessário considerar, no ensino de leitura e produção textual, que,

24
enquanto conjunto de traços marcados pela regularidade, pela repetibilidade, Gêneros discursivos
o gênero é relativamente estável, mas essa estabilidade é constantemente ame- e tipologias textuais
açada por pontos de fuga, por forças que atuam sobre as coerções genéricas.

Essas forças são de caráter social, cultural e individual que podem determinar mu-
danças em um gênero, o seu apagamento ou seu ressurgimento.
A tensão entre estabilidade e variabilidade é marcada, de modo mais intenso, em
certos gêneros, que passam a deter grandes diferenças do gênero original, diferente-
mente de outros que sofrem pouca ou nenhuma variação. Assim,

• as cartas comerciais, requerimentos, lista telefônica, textos cartoriais e admi-


nistrativos são fórmulas e esquemas composicionais preestabelecidos sobre os
quais há forte controle, sendo, portanto, pouco ou nada sujeitos a variações;
• um jornal televisionado, uma reportagem, um guia de viagem, seguem tam-
bém esquemas pré-estabelecidos, mas toleram desvios, permitindo recurso
a estratégias mais originais, a inflexões mais particulares. Um guia de viagem
pode desviar-se das rotinas do gênero e apresentar-se por meio de uma narrati-
va de aventuras ou um diálogo entre amigos;
• certos tipos de anúncios publicitários, letras de música, textos literários
constituem gêneros que incitam à inovação, provocam rupturas em relação ao
esperado, revelando-se inusitados em relação ao gênero original (BRANDÃO,
2004, p. 108).

O gênero detém, de acordo com a autora, uma dupla face: “forças de concentração
atuando ao lado de forças de expansão”. A força de concentração irá garantir, nas tro-
cas comunicativas, a economia e a intercompreensão entre os falantes, porém a força
de expansão proporcionará a mudança do sistema, com a inovação e a inscrição do
sujeito na linguagem com seu estilo. Diante disso, devemos estar atentos àquilo que
compõe a genericidade, ou seja, o estilo coletivo, de uma atividade de fala em uma
determinada esfera, e ao que constitui o estilo individual do autor.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo deste capítulo foi abordar a noção de gêneros do discurso, tendo em
vista que o conhecimento da definição e das características dos gêneros é muito im-
portante para a leitura e a produção de textos. Os gêneros, definidos como tipos rela-
tivamente estáveis de enunciados, elaborados por diferentes esferas de utilização da
língua são sociais, o que permite a garantia da comunicação verbal.
É importante também saber distinguir gêneros discursivos e tipologias textuais,
lembrando que não há uma dicotomia entre os dois, mas uma relação de complemen-
taridade e integração, haja vista que os gêneros são uma espécie de armadura comuni-
cativa preenchida por sequências tipológicas.
Esperamos que este capítulo possa servir de embasamento teórico para o estudo e

25
A PRODUÇÃO a produção de diferentes gêneros como resumos, resenhas, cartas, artigos de opinião e
TEXTUAL
E O ENSINO inúmeros outros gêneros pertencentes as mais diversas esferas de atividades humanas.
Ademais, esperamos também que, como futuro professor de Língua Portugue-
sa, esse conhecimento possibilite fundamentar a elaboração de atividades de leitura
e produção textual para seus alunos, de modo a realizar um trabalho adequado e
significativo.

Referências

ASSOCIAÇÃO DOS MUNICÍPIOS DO OESTE DO PARANÁ - AMOP. Seqüência


Didática: uma proposta de ensino de Língua Portuguesa para as séries iniciais.
Organização de Carmem Terezinha Baumgärtner; Terezinha da Conceição Costa-
Hübes. Cascavel: Assoeste, 2007. Caderno pedagógico, n.1.

ANDRADE, C. D. de. Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguiar, 2003. p. 106-
107.

BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. In: ______. Estética da criação verbal. São


Paulo: Martins Fontes, 1992.

BRANDÃO, H. H. N. Gêneros do discurso: unidade e diversidade. Polifonia, Cuiabá,


v. 8, p. 95-112, 2004.

DEZOTTI, M. C. C. (Org.). A tradição da fábula: de Esopo a La Fontaine. Brasília,


DF: Nacional; São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2003.

FIORIN, J. L. Introdução ao pensamento de Bakhtin. São Paulo: Ática, 2008.

LA FONTAINE, J. de. Fábulas de La Fontaine. Belo Horizonte, Itatiaia, 1992.

LONDERO. M. I. Texto literário e contexto social: o entrecruzar de fronteiras, na obra


Rosa do Povo, de Carlos Drummond de Andrade. In: UMBACH. R. S. K.; CALEGARI,
L. C. (Org.). Revista Literatura e Autoritarismo: a Voz dos Oprimidos, Santa
Maria, n. 3, 2002. Disponível em: <http://w3.ufsm.br/grpesqla/revista/num3/ass07/
pag01.html>. Acesso em: 5 maio 2010.

26
MAINGUENEAU, Dominique. Análise de textos de comunicação. São Paulo: Cortez, Gêneros discursivos
e tipologias textuais
2001.

MARSCUSCHI, L. A. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In: DIONÍSIO, A.


P.; MACHADO, A. R.; BEZERRA, M. A. (Org.). Gêneros textuais e ensino. 4. ed. Rio
de Janeiro: Lucerna, 2005.

______. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São Paulo:


Parábola, 2008.

PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Diretrizes curriculares da Educação


básica do Paraná. Curitiba: SEED, 2008.

Proposta de Atividade

1) Selecione, em um jornal de circulação diária, os seguintes textos:


a) uma notícia;
b) um artigo de opinião;
c) uma carta do leitor.

2) Analise os textos escolhidos, observando:


a) as condições de produção e de circulação do gênero (Quem escreve? Para quem? Com
que finalidade? Onde? Quando? Como?);
b)  o conteúdo temático desenvolvido pelo gênero;
c)  as características linguísticas e de estilo do gênero (nível de formalidade do texto, vo-
cabulário, construções frasais, etc);
d)  a estrutura composicional do gênero, ou seja, os elementos verbais e não-verbais que
organizam o texto (título, subtítulo, parágrafos, fotos, ilustrações, gráficos, etc.);
e)  as sequências tipológicas predominantes.

27
A PRODUÇÃO
TEXTUAL
E O ENSINO
Anotações

28
2 Noções sobre a
elaboração de resumo

Andréa Lourdes Ribeiro / Annie Rose dos Santos

1 O QUE É RESUMO?
A prática de resumir está presente em nosso cotidiano das mais diferentes maneiras
quando relatamos para alguém um filme assistido, as últimas notícias da família, um
livro lido, etc. Em nossa sociedade, circulam igualmente inúmeros tipos de textos, que
apresentam informações destacadas e resumidas de outros textos. Da mesma forma no
meio escolar, e principalmente no acadêmico, resumir é uma atividade muito solicita-
da por professores que têm com essa tarefa objetivos didático-pedagógicos bem defi-
nidos. É importante ressaltar que as diferentes situações de comunicação conferem a
cada um desses resumos características específicas.
Para exemplificar, apresentamos alguns resumos e especificamos suas funções.

Texto 1
SINOPSE

Após uma desilusão amorosa, Pedro (Selton Mello), um romântico


incurável, acredita ter encontrado a mulher ideal: Amanda (Luana
Piovani), sua bela, amiga e dedicada vizinha. Ao mesmo tempo,
seu amigo Carlos (Vladimir Brichita), pragmático, não acredita em
amor e o desencoraja a investir numa relação com uma mulher que
ninguém conhece. Mas Pedro está, definitivamente, apaixonado...
E ela é maravilhosa. Pelo menos até Pedro começar a desconfiar de
que ela tem um único, mas terrível defeito – Amanda não existe!

Fonte:
http://epipoca.uol.com.br/filmes_detalhes.php?idf=19149

Verificamos que, no texto 1, a sinopse escrita por um comentarista especializado


em cinema constitui-se em um resumo que tem como objetivo dar informações sucin-
tas sobre o filme, despertando a atenção e a curiosidade de um possível espectador.

29
A PRODUÇÃO Texto 2
TEXTUAL
E O ENSINO
RESUMO: Este é um estudo de textos da publicidade publicados em revistas nacionais,
com o propósito de analisar as identidades de gênero, que são construções discursivas
sustentadas por ideologias hegemônicas de feminilidade e masculinidade nas práticas
socioculturais. Um poderoso discurso da pós-modernidade que promove uma cultura
consumista a publicidade constrói discursivamente estilos de ser e representações iden-
titárias. O artigo discute as bases lingüísticas da teoria crítica do discurso, adotando a
abordagem da análise de discurso textualmente orientada (ADTO). Nessa perspectiva
teórico-metodológica, é analisado o gênero discursivo publicitário: os aspectos semióti-
cos, o vocabulário, a coesão, a modalidade, a intertextualidade e a interdiscursividade.
O resultado do estudo indica que o gênero discursivo produz identidades híbridas.

Fonte: MAGALHÃES (2005, p. 231).

Da mesma forma que o texto 1, o texto 2 apresenta um resumo, porém com dife-
rentes características, uma vez que foi escrito pela própria autora com o objetivo de
apresentar ao leitor uma síntese da pesquisa desenvolvida por ela no artigo escrito e
publicado em revista científica.
Já no contexto acadêmico dos diversos cursos de graduação, o resumo, que se
constitui como uma atividade didática de cunho acadêmico-científico, possui ainda
outro formato, por ter como destinatário um professor que almeja verificar o que o
aluno entendeu do texto lido. Por isso, para a sua produção é imprescindível uma
leitura atenta e cuidadosa, bem como a análise do texto a ser sintetizado.

2 DEFINIÇÃO DE RESUMO
Devido aos diferentes conceitos de resumo que circulam, é comum haver desen-
contros entre o que o docente solicita e o que o acadêmico de fato produz, sem con-
tar as dúvidas de ambos os lados quanto à definição e ao processo de produção do
resumo no meio acadêmico (RIBEIRO, 2006); por esse motivo, torna-se necessário
refletirmos um pouco sobre esse gênero textual.
Na definição do Dicionário Aurélio (FERREIRA, 2004, p. 1743), resumo significa:

1. ato ou efeito de resumir; 2. exposição abreviada de uma sucessão de aconte-


cimentos, das características gerais de alguma coisa, etc., tendente a favorecer
sua visão global; síntese, sumário, epítome, sinopse; 3. apresentação concisa do
conteúdo de um artigo, livro, etc., a qual, precedida de sua referência bibliográ-
fica, visa a esclarecer o leitor sobre a conveniência de consultar o texto integral.
Ao contrário da sinopse, o resumo aparece em publicação à parte e é redigido
por outra pessoa que não o autor do trabalho resumido; 4. recapitulação em
poucas palavras; sumário; 5. compêndio.

Pensando o resumo como prática escolar, Severino (2002) o conceitua como um


trabalho de extração de ideias, um exercício de leitura com grande utilidade didática e

30
“significativo interesse científico”. Na visão do autor, o resumo do texto é “uma síntese Noções sobre a
elaboração de resumo
das ideias e não das palavras do texto”, não se tratando, por conseguinte, “de uma
‘miniaturização’ do texto. Resumindo um texto com as próprias palavras, o estudante
mantém-se fiel às idéias do autor sintetizado” (SEVERINO, 2002, p. 131).
A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), na versão de 2003, norma
NBR 6028, “[...] estabelece os requisitos para redação e apresentação de resumos” e
conceitua resumo como “Apresentação concisa dos pontos relevantes de um docu-
mento”, classificando-o em três tipos: 1) Resumo Crítico, “[...] redigido por especia-
listas com análise crítica de um documento, também chamado de resenha. Quando
analisa apenas uma determinada edição entre várias, denomina-se recensão”; 2) Re-
sumo Indicativo, que “[...] indica apenas os pontos principais do documento, não
apresentando dados qualitativos, quantitativos etc. De modo geral, não dispensa a
consulta ao original”; e 3) Resumo Informativo, o qual “[...] informa ao leitor fina-
lidades, metodologia, resultados e conclusões do documento, de tal forma que este
possa, inclusive, dispensar a consulta ao original” (grifos nossos).
A partir dessas definições, verificamos que o resumo consiste na exposição abre-
viada da compreensão global do texto, mas fidedigna das ideias do autor ou de fatos
essenciais de um texto, comumente elaborado com palavras do leitor na ordem em
que elas são apresentadas e obedecendo à articulação lógica do texto. Todavia, o aca-
dêmico pode indagar: como resumir uma obra? Qual a utilidade prática do resumo?
Para responder a essas questões, é necessário observarmos o tipo de resumo que
pretendemos desenvolver. Assim, o resumo pode se apresentar de várias formas, con-
forme o objetivo a que se destina. Há resumos que são elaborados tendo em vista
fazer referência a publicações, os quais são regulamentados pela NRB 6028 (ABNT,
2003). Outros resumos, ainda, integram artigos, monografias, dissertações, teses, etc.
Nesses casos, podem seguir as normas estabelecidas pela editoras de revistas ou ins-
tituições aos quais são submetidos. E outros resumos, enfim, são especificamente
acadêmicos, quando se constituem em atividades de aprendizagem nas mais diversas
disciplinas na academia. Aqui eles necessitam de adaptação aos objetivos pretendidos
na disciplina, podendo ser mais sintéticos ou mais extensos ou sofrer variantes na
estrutura.
Destacamos que o objetivo maior do resumo é a apresentar uma compreensão
global, ou seja, das ideias centrais do texto lido. Neste sentido, o acadêmico

[...] deve apresentar a idéia central com suas próprias palavras, evitando obser-
vações ou colocações subjetivas. As palavras são de quem está elaborando o re-
sumo, mas a idéia é do autor; nem mais nem menos. Não se trata de transcrever
ou citar o texto consultado (SANTOS; PARRA FILHO, 1998, p. 147).

31
A PRODUÇÃO 3 COMO ELABORAR UM RESUMO?
TEXTUAL
E O ENSINO Como vimos, a elaboração do resumo deve levar em conta as condições de produ-
ção, ou seja, o autor, o objetivo, o destinatário e o local de circulação. A produção do
resumo no contexto acadêmico já define previamente todos esses fatores: o aluno é
ou autor, que tem como objetivo apresentar com suas palavras ao professor a compre-
ensão global do texto.
A produção de um resumo consiste em dois momentos: um de leitura e outro de
escrita. Quando lemos um texto com objetivo de estudo, é preciso que dediquemos
a ele uma atenção maior. Sugerimos que as atividades de leitura com finalidade de
estudo devem constar das seguintes etapas: (SEVERINO, 2002):
1 Delimitação da unidade de leitura: primeiro, é preciso identificar a situacio-
nalidade do texto através da identificação do autor, a data da publicação, a fonte. Da
mesma maneira, é importante detectar a porção de texto que será lida: trata-se de
um texto completo, um capítulo, alguns parágrafos? Em caso de partes do texto, é
fundamental analisar, ainda que brevemente, os trechos que não foram indicados para
leitura, pois muitas informações necessárias à compreensão do texto lido podem estar
nessas partes.
2 Análise textual: corra os olhos no texto todo, procurando responder:
• do que ele trata? (veja título, subtítulos, capa, orelhas, resumos, bibliografia);
• o que você sabe sobre o assunto?;
• qual o objetivo do texto?
Mediante a leitura do título e do(s) subtítulo(s), tente formular hipóteses sobre o
assunto do texto e, se possível, acerca da tese defendida pelo autor. Também a observa-
ção de ilustrações ou fotos, gráficos, tabelas etc., contribuem para realizar as previsões
sobre o texto. A análise do titulo é especialmente importante, uma vez que no âmbito
acadêmico-científico os títulos são específicos, ou seja, refletem o tema do texto e
muitas vezes também a discussão empreendida pelo autor.
3 Análise temática: a análise textual constitui-se em uma primeira leitura seguida
e completa do texto na busca de uma visão panorâmica do raciocínio do autor para
definir o tema ou assunto abordado. Durante esse contato, o leitor deverá fazer o
levantamento de vocabulário, de fatos e conceitos necessários, ou seja, de seleção
e autocorreção das previsões geradas no início da leitura. Esses esclarecimentos são
encontrados em dicionários, textos de história, outros textos científicos, obras de re-
ferência de várias especialidades. É importante observar as palavras que indicam as
relações entre as ideias, isto é, os conectivos. Verifique se eles indicam contraste entre
as ideias ou introduzem conclusões, argumentos, justificativas, causas, etc.
4 Análise interpretativa: essa abordagem tem por finalidade identificar as relações

32
variadas entre as várias ideias que compõem o texto e selecionar as mais relevantes de Noções sobre a
elaboração de resumo
cada parágrafo. Para acompanhar e registrar a leitura, é importante sublinhá-las em
cada parágrafo e em seguida sintetizar o conteúdo com uma frase ou expressão que
reflita sua compreensão. Nessa etapa, a estratégia de inferência é amplamente utilizada
para reunir partes do texto e formular uma compreensão global. A análise textual re-
sulta em um esquema, ou seja, em um mapa que registra a organização global do texto
com as relações entre as ideias nele expressas.
5 Diálogo com o texto: essa última leitura do texto tem como objetivo levar o
leitor a uma tomada de posição a respeito das ideias enunciadas, ou seja, estabelecer
um diálogo com o autor. A análise interpretativa consiste em situar o pensamento de-
senvolvido no texto na esfera mais ampla do pensamento teórico, verificando como as
teorias se relacionam. Pode-se estabelecer também uma aproximação das ideias expos-
tas com outras que tenham recebido diferentes enfoques ou colocações. Por consistir
na avaliação teórica do texto lido, a análise interpretativa exige conhecimento prévio
do assunto e maturidade intelectual do leitor.
Assim, após a leitura atenta e minuciosa do texto, passamos então para a fase de
escrita do resumo. Em primeiro lugar, é preciso contextualizar o texto lido, ou seja,
identificar, com base nas normas da ABNT, o texto que será resumido. Para tanto,
é fundamental, ao iniciar o resumo acadêmico, apresentar a referência bibliográfica
completa do texto. Em seguida, de posse das sinalizações realizadas no texto e do
esquema criado no momento da leitura, é necessário que o resumidor comece a re-
gistrar com suas próprias palavras as ideias mais relevantes do texto. Nesse momento,
utilizamos também um processo mental imprescindível para a produção de resumos:
a sumarização.
Machado (2007, p. 26) afirma que o processo de sumarização consiste em focar as
informações principais do texto, excluindo:
• os conteúdos facilmente deduzíveis a partir do conhecimento do leitor;
• as sequências de expressões que indicam sinônimos ou explicações;
• os exemplos;
• as justificativas de uma afirmação;
• os argumentos contra a posição do autor;
• a reformulação das informações por meio de termos mais genéricos.

Como o resumo é um texto que resulta de outro, é importante que frequentemente


o produtor mencione o autor do texto, atribuindo, assim, a ele as ideias e as informa-
ções escritas. Para tal, é preciso empregar verbos adequados para apontar as ações
realizadas pelo autor do texto, as quais indiquem (MACHADO, 2007, p. 49):

33
A PRODUÇÃO a) a posição do autor sobre o que é dito: afirma, nega, acredita, duvida;
TEXTUAL
E O ENSINO b) a indicação do conteúdo geral: aborda, trata de;
c) a organização das ideias do texto: define, classifica, enumera, argumenta;
d) a indicação de relevância de uma ideia do texto: enfatiza, ressalta;
e) a ação do autor em relação ao leitor: incita, busca levar a.

4 O RESUMO ACADÊMICO
O resumo acadêmico tem especificidades próprias. O resumo do trabalho científico
objetiva passar ao leitor uma ideia completa do teor do documento analisado, forne-
cendo, além dos dados bibliográficos da dissertação, da tese, do livro ou do artigo,
todas as informações necessárias para que o leitor possa empreender uma primeira
avaliação do texto lido e tomar ciência de suas contribuições, justificando, dessa for-
ma, a consulta ao texto integral (SEVERINO, 2002).
O texto do resumo acadêmico deve ser composto de um único parágrafo, com uma
extensão entre 200 a 250 palavras, isto é, de 1400 a 1700 caracteres, computando-se
todos os seus elementos. Ainda de acordo com Severino (2002), deve-se limitar a ex-
por de modo objetivo o conteúdo do texto (dissertações de mestrado, teses de douto-
rado, livros, artigos científicos, entre outros textos do gênero), o qual não deve conter
opiniões do resumidor tampouco suas observações avaliativas, nem conter maiores
explicações deste sobre o assunto do texto. “O resumo acadêmico inicia-se com a
referenciação bibliográfica do documento e se encerra com a indicação dos cinco uni-
termos temáticos mais significativos do texto” (SEVERINO, 2002, p. 173). Dependendo
a revista ou instituição, os unitermos solicitados são três. Por unitermos entendamos
as palavras-chave, situadas ao final do resumo, as quais devem abordar as principais
temáticas veiculadas no texto que foi resumido.
No resumo acadêmico, devem constar a informação da natureza do trabalho, o
objeto ali tratado, os objetivos esperados, as referências teóricas de apoio (fontes bi-
bliográficas), a metodologia utilizada e as conclusões e ou resultados a que se chegou
no texto. Segundo Severino (2002, p. 173), o resumo acadêmico deve responder às
seguintes questões:
- de que natureza é o trabalho analisado (pesquisa empírica, pesquisa teórica, le-
vantamento documental, pesquisa histórica etc.)?
- qual o objeto pesquisado/estudado?
- o que se pretendeu demonstrar ou constatar?
- em que referências teóricas se apoiou o desenvolvimento do raciocínio?
- quais procedimentos metodológicos e técnico-operacionais foram utilizados?
- quais os resultados alcançados?

34
A seguir, reproduzimos um resumo científico. Noções sobre a
elaboração de resumo

Exemplo de resumo científico

FRANZOI, Rafaela de Cássia. Manifestações do interlocutor nas produções textuais es-


critas no ensino fundamental. 2009. Dissertação (Mestrado em Letras)-Universidade
Estadual de Maringá, Maringá, 2009.

A dissertação teve como objetivo verificar as manifestações do interlocutor na produção


textual escrita, em sala de aula de Ensino Fundamental, delimitando o grau de impor-
tância desse elemento, que é considerado por Bakhtin (2003) o responsável pela com-
preensão responsiva ativa e um dos eventos essenciais para a realização de produção
textual. Franzoi (2009) propôs a seguinte pergunta de pesquisa e as suas subdivisões:
Como ocorrem as manifestações do interlocutor na produção textual escrita escolar?;
a) Quais os elementos que demarcam a influência do interlocutor na produção textual
escrita em sala de aula?; b) Como a ausência do interlocutor no comando de produção
textual se manifesta nos textos dos alunos?; c) As noções de interlocutor real e virtual
interferem e se manifestam nos textos dos educandos? Para buscar as respostas, a pes-
quisa constitui-se a partir da perspectiva sócio-histórica de estudo sobre a linguagem,
subsidiada nos pressupostos de Bakhtin/Volochinov (1995), Bakhtin (2003) e Vygotsky
(1988), expondo reflexões teóricas sobre a linguagem, especificamente a escrita, sua
constituição e disponibilidade na formação do discurso, ao considerá-la como produto
sócio-histórico em interação social, por meio das enunciações. A pesquisa investigou os
textos escritos por educandos da 7ª. série de um colégio de rede privada do município
de Marialva, Paraná. A metodologia empreendida foi a coleta de materiais produzidos
por nove estudantes, dentre os quais três alunos foram escolhidos como mostra repre-
sentativa. De acordo com a pesquisadora, os resultados demonstraram que há influên-
cia dos interlocutores por meio do uso de elementos linguísticos. Ao não se delimitar
o interlocutor nos comandos de produção textual, os educandos demarcaram vários
outros participantes em um mesmo enunciado. Além disso, a omissão da imagem do
outro propiciou que os alunos definissem a professora da sala de aula como interlo-
cutor/real com função de avaliadora, comprometendo a continuidade de um processo
dialógico e a compreensão responsiva ativa. Ao ser exposta a finalidade e o interlocutor,
em que se teve a mediação e a explicação da necessidade de delimitar os elementos que
condicionam a produção textual, detectou-se uma preocupação em como produzir a
crônica, gênero discursivo escolhido para o trabalho, em que os educandos se atenta-
ram à delimitação do seu interlocutor para qual era encaminhada a sua palavra escrita,
adequando-a segundo a imagem desse outro. Usufruíram de discursos alheios, que fo-
ram assimilados, reelaborados, reacentuados para serem destinados ao participante do
processo dialógico. Os educandos demonstraram que possuem internalizada a neces-
sidade de estabelecer um processo dialógico com o outro por meio da palavra escrita.

Palavras-chave: interlocutor, produção textual, interação, mediação, Ensino Fundamental.

Observemos que no resumo científico a estrutura é diferenciada (um só parágrafo),


e nele estão presentes o objetivo, as perguntas de pesquisa, a fundamentação teórica
a ser apresentada na dissertação, a metodologia de trabalho, dados do estudo e as
conclusões ou resultados a que a pesquisa chegou. Verifique ainda que a referência bi-
bliográfica, bem como o nome do autor e as informações sobre o estudo e a instituição

35
A PRODUÇÃO aparecem em primeiro plano, conforme as normas da ABNT de 2003, NBR 6028.
TEXTUAL
E O ENSINO
5 PRODUZINDO UM RESUMO

1 Dê uma olhada geral no texto 1, transcrito abaixo, procurando identificar as in-


formações que preenchem o quadro a seguir:

Título

Autor

Tema

Gênero do texto

Meio de circulação

Data de publicação

Texto 1

EDUCACÃO CONTEMPORÂNEA: ATO POLÍTICO OU ECONÔMICO?*


Lenir Rosa André Prada**
Pós-Graduação lato sensu em Psicopedagogia

1 INTRODUÇÃO
Em se tratando de Educação Brasileira, muitas são as interfaces que ne-
cessitam ser analisadas para que se fundamente uma discussão da educação
contemporânea de nossa população. Parte-se, portanto, do princípio de que a
realidade atual sofre consequências do tempo histórico, permeado por interfe-
rências políticas, econômicas e sociais desse percurso.
Uma breve retrospectiva histórica contribuirá para uma análise dos proble-
mas colocados hoje na educação: o espaço da escola, ou mais, o fazer concreto
educacional tem sido o implementador de ações sociais em favor do desen-
volvimento do homem como um todo? Ou este tem sido um fomentador da
continuidade da elite e de exclusão da classe trabalhadora?
No campo da política educacional, as pautas governamentais têm um peso
muito significativo. Suas propostas e ideologias chegam à Instituição Escola
com fortes traços de obrigatoriedade de efetivação. Essa relação de transmissão
de valores e políticas por parte da Escola se caracteriza pelo fato dessa Institui-
ção ser considerada a “formadora” da população.
Discutir as políticas educacionais e o papel da Escola como seu agente apli-
cador é, sem dúvida, compreender a função da Escola na contemporaneidade.
Pretende-se aqui indagar a função da Escola e levantar o questionamento
das históricas conquistas e perdas educacionais, além, é claro, de investir na
análise da educação no Brasil enquanto um ato político social ou um ato emi-
nentemente político econômico.

2 BREVE HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO NO BRASIL


No início do século XIX, influenciada pelo desenvolvimento da mão-de-obra,

36
Noções sobre a
a população vai à luta por escolas, principalmente aqueles oriundos da camada elaboração de resumo
social que não tinha terras, estes, então, apelavam para o título a fim de lhes
assegurar o status de elite.
A constituição de 1891 reservou à União o direito de criar instituições de
ensino secundário e superior nos Estados. Aos Estados foi outorgado o dever
e a competência com o ensino primário. Embora houvesse grandes tentativas
de maiores investimentos gerais, como uma política única de educação por
parte de intelectuais da educação, o quadro não se alterou até a década de 30
do século XX.
Várias reformas foram planejadas a fim de dar cabo do ensino humanístico
e literário da Colônia, mas não resultaram em modificações. Pelo contrário,
“a educação do sistema e a vitória dos princípios Federalistas fez com que o
governo federal não interferisse nos direitos de autonomia dos Estados, isto ge-
rou uma total desorganização na construção do sistema educacional brasileiro”
(ROMANELLI, l998, p. 31).
Os mesmos anos 30 citados anteriormente foram chaves no processo de
expansão do ensino público a partir da modernização do processo produtivo e
da economia. Surgem, assim, novos anseios educativos. Abre-se o mercado, há
implantação de indústrias. O Brasil está em pleno desenvolvimento. A educação
precisa dar conta dessa realidade. Nessa perspectiva, há uma expansão da esco-
la para a preparação de mão-de-obra.
É claro que das relações de produção dessa ordem social emergem as lutas
de classe. A luta por escolas e por educação é influenciada por essa realidade
econômica e social. De um lado a elite, pretendendo controlar o ensino, o fazia,
limitando o número de escolas e editando leis “elitizantes”. De outro, havia a
pressão social por uma educação mais democratizada. O que resultou inclusive,
no Manifesto dos Pioneiros da Educação em 1932.
Desse período até hoje, várias lutas foram travadas por educadores que
resistiram e resistem à educação elitista e buscam travar discussões e ações que
correspondam aos anseios da população brasileira que há muito almeja ensino
democrático, gratuito e de qualidade.
Percebe-se, até aqui, que o Ensino, a Escola e a Educação Pública no país
até então têm servido a uma minoria da população e não contribuem para o
favorecimento de uma sociedade que corresponda aos ideais da cidadania. Pelo
contrário, o ensino brasileiro prima pela divisão do trabalho manual e trabalho
intelectual, estabelecendo, assim, a divisão de classe, sendo definitivamente
excludente.
Pode-se, portanto, afirmar que o caráter da formação do homem enquanto
um transformador da sociedade, em prol da busca da igualdade de direitos e
do respeito mútuo, foi relegado a segundo plano. A educação brasileira, ao
contrário, difundiu os ideais economicistas da ordem capitalistas.

3 EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA NO BRASIL: UM ATO POLÍTICO SOCIAL


OU POLÍTICO ECONÔMICO?
Como foi brevemente relatado, no Brasil a Escola tem estado, até nossos
dias, a serviço de uma camada da sociedade que tenta perpetuar seu poder, e
mais, procura definir os meios econômicos da população. Observa-se claramen-
te que há uma continuidade da Instituição Escola em servir, juntamente com os
setores econômicos da sociedade, a uma pequena parcela da sociedade.
O projeto para a educação, assim, apresenta-se como econômico, porque
visa à preparação de mão-de-obra para o trabalho. Esse projeto tem sido con-
siderado por teóricos, como Pablo Gentili, hegemônico do ponto de vista dos
bens de produção e individuais do ponto de vista social e de acessos a tais bens.
Educadores fazem uma análise da escola e de seus condicionantes que nos
levam a questionar as ações por parte do Estado nas últimas décadas:

37
A PRODUÇÃO A história da educação no Brasil tem sido uma história de perdas, de ex-
TEXTUAL clusão e de manutenção dos privilégios de minorias. A herança que crianças e
E O ENSINO
os jovens, hoje a maioria da população, recebem dessa história caracteriza-se
pela carência, pelo descrédito e ausência de perspectiva, pela perplexidade.
(...) a crise da educação atinge níveis intoleráveis. A política de desobrigação
do Estado com a educação pública, gratuita e de qualidade cada vez mais vem
excluindo crianças, jovens e adultos da escola e aprofundando as desigualdades
sociais (CONED, 1998, p. 7).
A análise que o Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública faz, no III
Coned, alerta para algumas discussões, dentre elas o fato de procurar compre-
ender por qual viés tem passado a educação. Afinal, o Estado tem priorizado o
político social ou o econômico em se tratando de política educacional?
Por certo, as ações por parte do Estado, que se direcionam à educação,
têm sido elaboradas de forma intencional e objetiva. Os interesses das políticas
educacionais são pontuais, desde a perpetuação do poder do Império até os
enfoques mercantilistas e economicistas da atualidade. A educação tem sido
uma “arma” do Estado contra as forças opositoras ao poder estabelecido.
O movimento popular no Brasil há muito vem denunciando essas condi-
ções da educação e o caráter economista que os governos têm atribuído a ela.
Nereide Saviani vai além, afirma que muito mais que impor seus interesses, a
elite prepara ideologicamente os que vão mantê-la no poder:
A educação brasileira limitou-se, ao longo de sua história, a atender aos in-
teresses das elites, visando formar, entre elas, os dirigentes, e tendo-se voltado
para o povo apenas nos limites da formação de mão-de-obra e de inculcação
ideológica para direcionar a escolha dos governantes (SAVIANI, 1997, p. 56).
Atualmente, o quadro não tem sido diferente. Os dilemas e impasses do se-
tor educacional são, inicialmente, um problema relacionado à crise da própria
proposta político- pedagógica para a formação da população brasileira.
Historicamente, a escola vem relatando e defendendo que seu papel é o de
formar os indivíduos para a sociedade. Essa mesma sociedade da forma como
está estruturada não comporta os homens e mulheres com saberes e entendi-
mento da vida que na escola aprendem.
O problema está fundamentado em um sistema econômico ideológico que,
ironicamente, a própria escola contribui para se propagar. Seu projeto pedagó-
gico não tem uma análise social do homem na sociedade em que vive, mas sim
a ação humana sobre ou sob a sociedade produtiva.
A educação na atualidade vive problemas de ordem ideológica estrutural,
que perpassam o sistema econômico vigente. Influenciada por esses ideários,
a Escola encontra-se em um verdadeiro “beco sem saída”. E reproduz a chama-
da ideologia dominante neoliberal. Um bom exemplo disso são os chamados
controles escolares sugeridos pelo MEC. O Provão tem sido preconizado nas
escolas superiores como um instrumento que define o bom profissional para
o mercado de trabalho, através das notas obtidas. Há cursos e escolas que pre-
param aulas e cursinhos específicos para os alunos se saírem “bem no provão”.
Na Educação Básica não é diferente, o governo se utiliza de avaliações para
provar que o ensino é ruim e os educadores compactuam com isso. Não se trata
aqui de negar completamente o sistema avaliativo da educação, e sim de argu-
mentar que os profissionais da educação o executam sem ao menos analisarem
e estabeleceram discussões sobre o que está por detrás dos ideários do Estado
em ser flexível no processo (na LDB tudo pode) e controlador na saída (SAEB,
Provão, Enem). Já pensou no que o governo pretende fazer com os resultados
dessas avaliações ou o que já vem fazendo?
Já pensou que o que o Estado quer é avalizar a forma como vem desobrigan-
do-se de suas responsabilidades com a educação nas últimas décadas? Será que
os resultados desse “controle” têm servido para transformar qualitativamente o

38
ensino ou para o reformar segundo os ideários neoliberais? Noções sobre a
A Instituição Escola se corporifica através de seus profissionais, que carecem elaboração de resumo
de tomar a frente do projeto político da Escola e não permitir o uso ideológico
que vem se perpetuando ao longo da história do Brasil. Faz-se necessário, como
postula Demerval Saviani, “impor uma resistência ativa”. Homens e mulheres
trabalhadores na Escola precisam acreditar nessa instituição e mudá-la a partir
de suas ações politizadas em nome de um povo mais consciente.
A resistência ativa é uma arma na luta pela transformação da deficiente es-
trutura educacional brasileira. Enquanto prevalecer na política educacional a
orientação de caráter neoliberal, a estratégia da resistência ativa será a nossa
arma de luta. Com ela nos empenharemos em construir uma nova relação hege-
mônica que viabilize as transformações indispensáveis para adequar a educação
às necessidades e aspirações da população brasileira (DEMERVAL, 1997).
Não se pode continuar com a dívida histórica da formação do povo brasilei-
ro. Se até a república o ensino foi dogmático, o ensino contemporâneo não é
diferente. A Escola continua ainda a defender o interesse de minorias, relegan-
do para segundo plano o social e priorizando o setor econômico da sociedade.

4 CONCLUSÃO
Para concluir, vale lembrar que a tarefa de todos em relação à educa-
ção diz respeito à luta por: “Educação direito de todos, dever do Estado...”
(CONST.1988). Fazem-se necessárias a garra e a resistência contra uma educa-
ção que não vise aos direitos e à valorização cultural do povo brasileiro. Contra
a Instituição Escola que vem trazendo para o seu bojo uma política e um fazer
de cunho economicista. Contra uma escola e um projeto do Estado que tentam
individualizar os problemas que são da ordem macro da política social.
Os profissionais da educação precisam contribuir na implementação da
política social, contrapondo-se ao econômico nas ações da Escola, tanto do
ponto de vista geral como pedagógico. É mister lembrar que os discursos teó-
ricos há muito têm-se mostrado ineficazes. É preciso colocar o conhecimento
acumulado, inclusive nas lutas e resistências, em favor da realidade. A prática, a
realidade concreta apresenta contradição e esta provoca o enfrentamento, que
consequentemente promove mudanças.
Mudança significa construção. E é isso que a escola pode promover no seu
pedagógico. É através da sua proposta político-pedagógica consciente da reali-
dade e das lutas necessárias que a população brasileira terá acesso ao mundo
da crítica, da reflexão, da análise, do enfrentamento tão necessário à supera-
ção da ideologia dominante historicamente perpetuada na educação do povo
brasileiro.
O Estado e a nação brasileira não podem mais deixar de cumprir a tarefa do
século XXI: Educação Pública Nacional e Democrática.

5 REFERÊNCIAS
CONED: Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, 1., 1997, Belo Hori-
zonte. Relatório com as Diretrizes do I Congresso Nacional de Educação.
Belo Horizonte: [s.n.], 1997.
CONED: Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, 3.,1999. Relatório III
Coned: Plano Nacional de Educação. Porto Alegre: [s.n.], 1999. p. 7-19.
GENTILLI, A. A.; SILVA, Tomaz Tadeu. Neoliberalismo, qualidade total e
Educação. Petrópolis: Vozes, 1994. p. 113-117.
ROMANELLI, Otaíza de Oliveira. História da Educação no Brasil: 1930/1973.
Petrópolis: Vozes, 1978. p. 33-46.

39
A PRODUÇÃO
TEXTUAL SEVERINO, Antonio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. SP: Cor-
E O ENSINO tez, 23 ed, 2002.
SAVIANI, Dermeval. A resistência ativa contra a nova lei de diretrizes e bases da
educação nacional. Revista Princípios, São Paulo, 1997, p. 66-72.
SAVIANI, Nereide. PCN: o que dispõe para o ensino fundamental. Caderno
Pedagógico, Curitiba, n. 2, p. 21-29, 1999.
_____________________
* Adaptação do artigo publicado no 3º. número da Revista Eletrônica Ressigni-
ficando a educação da UEMG em 2003.
** A autora possui graduação em Pedagogia pelo Instituto de Ensino Superior
e Pesquisa (1996), Pós-graduação em Educação a Distância pelo SENAC/MG
e Mestrado em Educação pela Universidade Vale do Rio Verde (2004). Atu-
almente é professora titular da Universidade do Estado de Minas Gerais e
tutora do curso Pós-Graduação em Educação a Distância SENAC/MG. Tem
experiência na área de Educação, com ênfase na formação de professores
da Educação Infantil ao Ensino Superior. Atualmente, vem dedicando seus
estudos à Educação a Distância, inclusive na formação de tutores on-line.

2) Antes de ler o texto 1 na íntegra, observe-o atentamente como um todo. Conside-


rando o título, a formação da autora, a referência bibliográfica utilizada para a pro-
dução do texto e seus conhecimentos sobre o assunto, responda: qual o objetivo
do texto?

3) Leia o texto 1 atentamente seguindo as etapas de leitura sugeridas anteriormente.


Busque compreender o vocabulário do texto, grife as ideias mais relevantes do
autor, realize anotações pessoais em cada parágrafo e verifique se suas hipóteses
iniciais se confirmam ou não ao final da leitura.

4) Na introdução, concentram-se informações que serão detalhadas, explicadas,

40
pontuadas, etc., ao longo do texto. Releia atentamente a “Introdução” do texto 1 Noções sobre a
elaboração de resumo
e responda:

a. Qual é o fato constatado pela autora?

b. A partir da constatação desse fato, qual é a discussão central do texto?

5) Releia o item “Breve histórico da educação no Brasil” e descreva com suas próprias
palavras: Qual a contribuição que a escola contemporânea dá à sociedade? Que
ideais a educação brasileira reflete?

6) No item “Educação contemporânea no Brasil: um ato político social ou político


econômico?”, a autora apresenta três argumentos que sustentam a afirmação que
fecha o item 2 do texto. Resuma com suas próprias palavras cada um deles.

7) Agora releia a “Conclusão” e reformule com suas próprias palavras a conclusão a

41
A PRODUÇÃO que a autora chega sobre a educação brasileira.
TEXTUAL
E O ENSINO

8) Tendo como base suas anotações dos exercícios 4 ao 7, complete o esquema a se-
guir que registra sua compreensão global do texto 1:

Fato

Discussão central do texto

Posição da autora

Argumento Argumento Argumento

Conclusão

42
9) Como o resumo é um gênero que resulta de um outro texto que possui um outro Noções sobre a
elaboração de resumo
autor, é de suma importância que o resumidor mencione o autor do texto resu-
mido, para que o leitor não tome como suas as ideias que são de outro. Como
iniciamos o resumo com a referência completa do texto de acordo com as normas
da ABNT, ao longo do texto podemos nos referir ao autor utilizando o sobrenome,
pronomes, sua profissão, a expressão “autor”, dentre outros. Complete o trecho
a seguir empregando os diferentes recursos para fazer menção ao autor do texto
resumido.

A língua de Eulália: novela sociolinguística, de Marcos Bagno (Edi-


tora Contexto; 215p.). Nossa tradição educacional sempre negou a
existência de uma pluralidade de normas linguísticas dentro do uni-
verso da língua portuguesa, reconhecendo a norma padrão culta como
única e rejeitando de forma intolerante qualquer manifestação diversa.
Dentro desse contexto, ___________ argumenta que falar diferente
não é falar errado e o que pode parecer erro no português não-padrão
tem uma explicação lógica, científica (linguística, histórica, socioló-
gica, psicológica).
Para explicar essa problemática, o ___________ reúne então em A
língua de Eulália a história de três universitárias que vão passar férias
na chácara da professora Irene que transforma as férias dessas futu-
ras professoras em uma espécie de atualização de seus conhecimentos
linguísticos. Por meio de diálogos e situações deliciosamente informa-
tivos, ___________ apresenta ao leitor uma nova maneira de encarar
as variedades não-padrão, tratando a sociolinguística com seriedade,
mas sem sisudez.

10) No resumo, é comum sinalizarmos os diferentes atos realizados pelo autor do tex-
to que não estão verbalmente explicitados no original e que inferidos pelo leitor.
Por isso ao redigir o resumo é preciso que o resumidor empregue um verbo ade-
quado para atribuir atos ao autor do texto resumido. Observe os verbos destacados
no exemplo, os quais que indicam a ação realizada pelo autor do texto resumido.
Em seguida, leia cada um dos trechos e complete os espaços dos resumos corres-
pondentes com um dos verbos apresentados no quadro a seguir:

apresentar – definir – descrever – ressaltar – confrontar – comparar


– criticar – acreditar – afirmar – exemplificar – questionar – negar –
abordar – defender – comprovar – esclarecer – argumentar – relatar
– concluir – mostrar – tratar de – sugerir – deduzir – iniciar – explicar
– reforçar – introduzir – classificar

43
A PRODUÇÃO
TEXTUAL Exemplo
E O ENSINO
Os textos têm sido objeto de estudo e de preocupação há séculos. Quando ainda não
eram objeto escolar, democrático e popular, os textos eram riqueza, espólio, herança,
memória. Para os poetas declamadores e para os arautos, o texto era a memória
histórica, a notícia importante, o boato, a revolução. No entanto, os suportes eram
os corpos e a voz. Com o passar do tempo, a humanidade desenvolveu meios para
novas apresentações do texto, inclusive separando-o da voz e do corpo. Escrever em
uma tábua de argila ou em um pedaço de papiro dispensava a voz do escritor ou do
declamador. E deixava, de certa forma, o leitor “livre” para uma relação não-mediada
com o texto. Ou mediada apenas pelo papiro. Numa longa história de ações entre
autores, textos e leitores, o computador é um desses meios de realizar textos.

RIBEIRO, Ana Elisa. Kd o prof? Tb foi navegar. In: ARAÚJO, Júlio César. Internet e ensino:
novos gêneros, outros desafios. Rio de Janeiro: Lucerna, 2007. p. 223.

Resumo
Em seu texto, “Kd o prof? Tb foi navegar”, Ribeiro (2007) apresenta brevemente a
história do texto, descrevendo-o desde a época em que este objeto era produzido
em tábua de argila até a sua apresentação nos dias de hoje na tela do computador.
O objetivo da autora é abordar o computador como um novo instrumento social de
produção de textos.

Trecho 1
As questões relativas à leitura na Internet precisam ser direcionadas para o contexto
mais amplo da sociedade brasileira, onde transformações, para melhor, de várias
estruturas apresentam-se como urgentes e necessárias. As reflexões e discussões
devem mirar um projeto de cidadania com pelo menos dois componentes básicos: (1) o
acesso à informação e à produção do saber, aqui assumidos como instrumentos básicos
de trabalho, de desenvolvimento social e de participação política; e (2) o domínio, pelos
cidadãos, de competências capazes de possibilitar práticas de leitura e de letramento
contínuo, aqui entendidas como atividades estruturantes do pensamento-linguagem,
do conhecimento e da cultura.

SILVA, Ezequiel Theodoro da (Coord.). A leitura nos oceanos da Internet. São Paulo:
Cortez, 2008. p.13.

Resumo do trecho 1
O autor (__________) a importância da inserção da sociedade nas questões que focam a
leitura na Internet, (__________) a construção de um projeto de cidadania que leve em
conta: (1) o acesso à informação e à produção de saber; (2) o domínio de competências
que promovam as práticas de leitura e de letramento contínuos.

44
Noções sobre a
Trecho 2 elaboração de resumo

Do ponto de vista do leitor, se definirmos um hipertexto como um espaço de percurso


para leituras possíveis, um texto aparece como uma leitura particular de um hipertexto.
O navegador participa, portanto, da redação do texto que lê. Tudo se dá como se o autor
de um hipertexto constituísse uma matriz de textos potenciais, o papel dos navegantes
sendo o de realizar alguns desses textos, colocando em jogo, cada qual à sua maneira,
a combinatória entre os nós.

LÉVY, Pierre. O digital e a virtualização do saber: Cibercultura. São Paulo: Ed. 34, 1999.
p. 57.

Resumo do trecho 2
Lévy (_________) que o hipertexto possibilita leituras diferentes, uma vez que o
navegador é quem define o caminho que quer seguir. Neste contexto, Lévy (__________)
que o navegador também é autor do texto, na medida em que constrói por meio de sua
leitura hipertextual um novo texto.

Trecho 3
O uso da Internet como meio de pesquisa e produção de conhecimento possibilita ao
aluno participar, intervir, usar conceitos de bidirecionalidade (contidos nos hiperlinks),
usar uma multiplicidade de conexões (hipertextos) aprender através de simulações, ter
autonomia na organização dos conteúdos, ter acesso a conteúdos em diversos formatos
(som, texto, imagens, vídeo, etc.), traçar seu próprio caminho que não será igual a de
nenhum outro colega de sala e nem igual aos dos autores que acessou. Entretanto,
quando não direcionada, a pesquisa na Internet pode não passar de um copia/cola
indesejado. E aí que entra o professor, que deverá determinar as competências e
habilidades que deseja ver desenvolvidas, tornando a pesquisa um instrumento
desencadeador de aprendizagens de fato significativas.

SANTOS, Else Martins dos. Pesquisa na Internet: copia/cola???.In: ARAÚJO, Júlio César.
Internet e ensino: novos gêneros, outros desafios. Rio de Janeiro: Lucerna. 2007. p.
275.

Resumo do trecho 3
A autora (_________) a Internet como um importante veículo de pesquisa desde que
usado adequadamente. Ela (________) o perigo da pesquisa não direcionada que
pode levar os alunos a usar a Internet para localizar e para destacar informações, num
processo indesejado de copia/cola.

11) Tendo como base as atividades realizadas acima, produza agora


um resumo para o texto “Educação contemporânea: ato político ou
econômico?

45
A PRODUÇÃO 6 ADEQUAÇÃO DO RESUMO: AUTOAVALIAÇÃO
TEXTUAL
E O ENSINO Ao final da produção do resumo, é importante avaliar seu texto para veri-
ficar se todos os passos foram seguidos. Para essa verificação, utilize a ficha
de autoavaliação baseada na proposta de Machado (2005, p. 57), reproduzi-
da a seguir:

Ficha de autoavaliação
1) O resumo está adequado ao objetivo de um resumo acadêmico/escolar?
2) O resumo está adequado ao seu destinatário, ou seja, seu professor?
3) O resumo transmite adequadamente a imagem de quem leu e compreendeu
adequadamente o texto lido?
4) As informações relevantes do texto original, tais como fato, discussão empreendida,
posição do autor e seus argumentos, estão registradas no resumo?
5) Antes de iniciar o resumo, há uma referência bibliográfica completa do texto lido? A
referência está de acordo com as normas da ANBT?
6) Está claro no resumo de quem são as ideias resumidas, por meio da menção do
autor de diferentes formas?
7) O resumo pode ser compreendido em si mesmo por um leitor que não conhece o
texto original?
8) Verifique se o resumo não apresenta problemas de paragrafação, pontuação, frases
incompletas ou incompreensíveis, erros de ortografia, problemas de concordância
verbal ou nominal.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como vimos, a produção do resumo exige que o acadêmico siga determinados pas-
sos, para que seu texto fique adequado a essa modalidade de gênero. Esperamos que
este capítulo o auxilie nessa empreitada, de modo que saiba diferenciar a elaboração
de resumos de textos diversos da elaboração de resumos científicos, respeitando as
particularidades de cada tipo de resumo.
Para maiores informações sobre a confecção de resumos, indicamos os sites:
http://www.ucb.br/prg/comsocial/cceh/normas_organinfo_resumo.htm
http://www.filologia.org.br/ixcnlf/12/15.htm
http://mestrado.brazcubas.br/wp-content/uploads/2009/03/nbr6028_resumo1.pdf

46
Noções sobre a
elaboração de resumo

Referências

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). NBR 6022: Informação


e Documentação. Artigo em publicação periódica científica impressa. Apresentação.
São Paulo: ABNT, 2003. Disponível em: <www.abnt.org.br>. Acesso em: 20 ago.
2009.

______. NBR 6023: Informação e documentação. Referências. Elaboração. São


Paulo: ABNT, 2002. Disponível em: <www.abnt.org.br>. Acesso em: 20 ago. 2009.

______. NBR 6028: Informação e documentação. Resumo. Apresentação. São


Paulo: ABNT, 2003. Disponível em: <www.abnt.org.br>. Acesso em: 17 ago. 2009.

______. NBR 10520: Informação e Documentação. Citações em documentos.


Apresentação. São Paulo: ABNT, 2002. Disponível em: <www.abnt.org.br>. Acesso
em: 17 ago. 2008.

______. NBR 14724: Informação e documentação. Trabalhos acadêmicos.


Apresentação. São Paulo: ABNT, 2005. Disponível em: <www.abnt.org.br>. Acesso
em: 18 ago. 2008.

FERREIRA, Aurélio Buarque Holanda. Novo dicionário Aurélio da Língua


Portuguesa. 3. ed. Curitiba: Positivo, 2004.

FREIRE, Paulo. Considerações em torno do ato de estudar. In: ______. Ação


cultural para a liberdade e outros escritos. 5. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981.
p. 9-12.

MACHADO, Anna Rachel. Revisitando o conceito de resumos. In: DIONÍSIO, A. P.;


MACHADO, A. R.; BEZERRA, M. A. (Org.). Gêneros textuais e ensino. 5. ed. Rio de
Janeiro: Lucerna, 2007.

MAGALHÃES, Izabel. Análise do discurso publicitário. Revista da ABRALIN, Belo


Horizonte, v. 4, n. 1-2, p. 231, dez. 2005.

47
A PRODUÇÃO MAGALHÃES, Luzia Eliana Reis; ORQUIZA, Liliam Maria. Metodologia do trabalho
TEXTUAL
E O ENSINO científico: elaboração de trabalhos. Curitiba: FESP; ICSP, 2002.

MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Fundamentos da metodologia


científica. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2003.

MEDEIROS, João Bosco. Redação científica: a prática de fichamentos, resumos,


resenhas. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2004.

PRADA, Lenir Rosa André. Educação contemporânea: ato político ou econômico?.


Exoyn: Ressignificando a Educação, Belo Horizonte, fev. 2003. Disponível em:
<http://www.divinopolis.uemg.br/revista/revista-eletronica3/artigo8-3.htm>. Acesso
em: 1 ago. 2009.

RIBEIRO, A. L. Resumo acadêmico: uma tentativa de definição. Revista Científica da


FAMINAS, Muriaé, v. 2, p. 67-77, 2006.

SANTOS, João Almeida; PARRA FILHO, Domingos. Metodologia científica. São


Paulo: Futura, 1998.

SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. 22. ed. revista e


ampliada de acordo com a ABNT. São Paulo: Cortez, 2003.

Anotações

48
3 Gênero textual resenha:
da sociedade para
a universidade
Tânia Braga Guimarães

Ao longo de qualquer curso universitário, é comum a solicitação, por parte dos


docentes, de leituras de resenhas como forma de estudo, e da escrita delas como
forma de avaliação da capacidade de compreensão e de síntese de uma obra por
parte do discente. Essa é uma praxe constante das metodologias de pesquisa. Em
nossa realidade do curso de Letras, esse gênero textual está sempre presente, na
graduação e também na pós-graduação.
Apesar de cobrados particularmente nessas duas esferas específicas (graduação e
pós-graduação), é imprescindível que você, caro (a) aluno (a), tenha em mente que
esses textos são facilmente encontrados em circulação na sociedade, em jornais,
revistas (acadêmicas ou não) e sites.
Neste capítulo, nosso objetivo é o de apresentar definições do que se constitui
o gênero resenha e exemplos práticos relevantes para nosso estudo. Pretendemos
discutir aspectos que irão instrumentalizá-lo, apontando as etapas necessárias para
o desenvolvimento desse texto, pois dominar os passos de elaboração de uma boa
resenha será fundamental para seu crescimento acadêmico.

1 PORQUE LEMOS RESENHAS – SUA ORIGEM E AS ESFERAS


DE CIRCULAÇÃO SOCIAL
Nossa discussão começa pelas resenhas que circulam socialmente para chegar
aos modelos de resenhas que nos interessam na esfera acadêmica. Dessa forma,
antes de abordarmos as questões mais técnicas que envolvem a sua elaboração,
vamos refletir um pouco sobre como esse gênero se faz presente na sociedade,
perguntando-nos: por qual razão lemos esse tipo de texto?
Solé (1998) enuncia que lemos textos motivados por diversas finalidades, tais
como: 1) obter uma informação precisa; 2) seguir instruções; 3) obter uma infor-
mação de caráter geral; 4) aprender; 5) revisar um escrito próprio; 6) prazer; 7)
comunicar um texto a um auditório; 8) praticar a leitura em voz alta. Dentre esses
objetivos de leitura, podemos postular que lemos resenhas pelos motivos descritos

49
A PRODUÇÃO nos itens 1, 3, 4, 6. Se decidirmos escrevê-la, podemos incluir ainda o item 5, que
TEXTUAL
E O ENSINO seria a leitura de uma resenha de nossa autoria quando estamos no processo de
finalização e revisão.
Em nossa prática com os textos, justificamos o trabalho em sala de aula com os
gêneros da ordem do narrar, lembrando ao aluno o quanto é antigo o hábito de o
homem contar histórias. Suspeitamos que avaliar tudo a nossa volta seja um hábito
tão antigo quanto compartilhar histórias, o que vem a justificar a atenção que de-
vemos conferir às resenhas. Em nossas conversas informais, sempre dividimos com
familiares e amigos as impressões sobre filmes, livros, obras de teatro, novelas, mú-
sicas, dentre outros bens culturais aos quais temos acesso. Mais formais, os textos
escritos com o mesmo propósito de compartilhamento certamente estão presentes
em nosso meio por tempo suficiente para que possamos afirmar que esse gênero
circula e tem função bem marcada na sociedade. Tudo aquilo que é produzido cul-
turalmente é passível de análise e, portanto, de ser avaliado e compartilhado.
As resenhas de menor extensão e sem trechos avaliativos desempenham uma
função similar à do rótulo de produtos, ou seja, permite saber sobre a obra – livro,
filme, peça teatral – assim como o rótulo possibilita conhecer a composição de um
produto. Na resenha, buscamos na história se ela interessa suficientemente a ponto
de tirar o carro da garagem, enfrentar engarrafamento, estacionamento, entre ou-
tras surpresas do percurso, para assistir no cinema. No rótulo, a motivação é saber
se os elementos componentes da fórmula não vão causar uma alergia ou qualquer
outra reação adversa. Essas resenhas de menor extensão são também comumente
chamadas de sinopses, termos tomados como sinônimos pelo uso do senso comum.
Ao buscar textos em circulação social que apresentam função avaliativa quanto à
área do turismo, encontramos, por exemplo, esse texto do Guia Brasil:

Mês sim, mês não, a equipe de reportagem do Guia Quatro Rodas bota o pé
na estrada para pesquisar, testar e classificar milhares de hotéis, restaurantes
e atrações em todo o Brasil. Na volta, todo mundo tem um montão de histó-
rias pra contar – e muitas indicações pra você curtir ao máximo suas viagens
pelo país.
Fonte: http://viajeaqui.abril.com.br/blog/guia-brasil/

Fica evidente a função de orientar o leitor a fim de que esteja preparado para
tudo aquilo que encontrará no destino de viagem. São informados os serviços que
estarão disponíveis, os que não constam na região, assim como a qualidade deles.
Desse modo, o leitor tem a oportunidade de planejar sua viagem tentando diminuir
os imprevistos desagradáveis. Antes de viajar, ele pode saber sobre aeroportos, em-
baixadas estrangeiras, locadoras de carro, rodoviárias, companhias aéreas, polícia

50
rodoviária, cartões de crédito, seguro saúde, fuso horário e outras informações per- Gênero textual resenha:
da sociedade para
tinentes à localidade e às necessidades do turista. a universidade

Vamos supor, então, que no próximo fim de semana você queira assistir a um
filme. Ao olhar no site do cinema, são disponibilizadas as seguintes informações a
respeito da película: nome, diretor, elenco, sinopse (aqui o enredo), gênero e dura-
ção. Caso goste do gênero romance, a resenha irá orientá-lo quanto a esse critério
de escolha. Se você gosta de romance, mas rompeu um relacionamento há pouco
tempo, pode ser que prefira conferir se está em cartaz alguma comédia, suspense ou
filme de terror. Essas resenhas, feitas para o público que busca orientação quanto
à qualidade de um filme, costumam apresentar indicações iconográficas (estrelas,
pontos ou carinhas) que representam visualmente a avaliação do resenhista.

Naturalmente, o resenhador não vai escrever um resumo exaustivo de um li-


vro ou filme. Trata-se antes de selecionar alguns aspectos de maior interesse,
tendo em vista um leitor específico. Uma resenha de um filme destinada ao
público em geral provavelmente conterá comentários sobre a história (um
pequeno resumo) a atuação dos atores e do diretor. Entretanto, se a resenha
se destina a estudantes universitários de cinema, talvez os aspectos técnicos
da produção sejam mais relevantes (MOYSÉS, 2008, p.169).

Escolhemos como título deste capítulo – Gênero textual resenha: da sociedade


para a universidade – justamente por ilustrar bem a recorrência desse gênero textu-
al em diversos campos de atuação. O jornalismo, por exemplo, apresenta resenhas
nas esferas: 1) literária; 2) artística; 3) cinematográfica; 4) musical; 5) teatral; 6)
televisiva; 7) gastronômica.
Segundo o Manual Escolar de Redação da Folha de São Paulo (1994, p. 83):

a classificação tradicional divide os gêneros jornalísticos em quatro grandes


grupos: a) informativo: suas preocupações centrais são a objetividade e a
imparcialidade; b) interpretativo: além de informar, procura interpretar os
fatos; c) opinativo: expressa um ponto de vista a respeito de um fato; ocorre
basicamente nos editoriais; d) de entretenimento: são as matérias recreativas,
destinadas à distração do leitor.

E o mesmo Manual define resenha como “tipo de texto que consiste na caracteri-
zação e análise de determinado objeto. Pode ser crítica ou simplesmente descritiva.
Veja crítica; resumo” (p. 151). Quando consultamos o verbete crítica, ainda na mes-
ma obra, encontramos a seguinte explicação:

texto de caráter opinativo que analisa e avalia trabalho intelectual ou de-


sempenho: artes, espetáculos, livros, competição esportiva, discurso político,
projeto ou gestão de administração pública. É bastante freqüente em jornais,
mas há também críticas produzidas para serem publicadas em livros. A crítica

51
A PRODUÇÃO deve ser fundamentada em argumentos claros e ser sempre assinada. Quando
TEXTUAL escrita por especialista e dirigida a público leigo, deve apresentar linguagem
E O ENSINO
clara e acessível. Não deve conter acusação de ordem pessoal. Lembre-se:
o objeto da crítica é a obra ou desempenho, e não a pessoa. Veja resenha
(MANUAL, 1994, p. 53).

Fica evidente, assim, que o Manual toma os termos “crítica” e “resenha” como si-
nônimos. É interessante notar que a esfera jornalística, produtora de tantas resenhas,
não traz mais recomendações para a sua elaboração.
No Manual da redação posterior (2001), o grupo Folha aborda as duas definições
submetidas ao verbete “gêneros jornalísticos” com pequenas variações. Para crítica traz
“avalia trabalho artístico, acadêmico ou desempenho esportivo e é sempre assinada”
(p. 71) e para resenha “faz o resumo crítico de um livro e é sempre assinada” (p.71).
Portanto, além da variação, traz um caráter mais específico à resenha, restringindo-a
aos livros.

1.1 Resenhas em diversas esferas


A fim de fixar o caráter avaliativo presente nos textos denominados resenhas, con-
vém a leitura dessas duas resenhas da área culinária, porque mostram a visão de duas
amigas quanto à mesma comida, dita thailandesa, em experiência no mesmo dia em
um determinado restaurante. Ambos os textos pertencem aos blogs das autoras. É
digno de nota que a primeira resenhista teve o cuidado de não ler a resenha da colega
antes de escrever seu texto para não sofrer influência, procedimento que também
devemos adotar:

O badalado restaurante Marakuthai, em São Paulo: decepção, por Alexandra Forbes


em 10/03/2010 às 19h02min.
Não tinha como resistir à piadinha: se há um restaurante em São Paulo que se en-
caixa como uma luva na definição de “bonitinho mas ordinário”, é o Marakuthai.
Comecemos pelo bonitinho. Espaço bacana, banhado de luz, paredes brancas e ba-
dulaques descombinados, e muitos detalhes turquesa e vinho. Lembra um pouco o
Maní, não só pelo colorido aplicado ao fundo branco como pela frequência – quan-
tas moças bonitas! A apresentação dos pratos é bonita também. Feminina, capricha-
da, colorida. Uma festa para os olhos. E até a chef é bonita. Linda, até, de chamar
a atenção e fazer qualquer marmanjo suspirar. Estava na cozinha, de faixa rosa na
cabeça: via-se da mesa, através da boqueta. “Bom sinal”, pensei. Por isso tudo, fiquei
muito desapontada com a comida. Queria, de verdade, achar bom. Mas… não deu.
Primeiro, estranhei muito o garçom nos dizer que não tinha couvert. “Só aos sába-
dos”, disse. Hãn? As entradas foram o ponto alto do almoço. Estava ótima a salada de
macarrão de arroz (acima) e lagostins caramelados (a capa de açúcar bem crocante),
apesar do excesso de castanhas de caju. Gostei também dos bolinhos de camarão,
embora sentisse falta de… pedaços de camarão. Estava mais para bolinho de bobó.

52
E o “presunto” de pato (air-dried), apesar de lindo, deixou a desejar por simples falta Gênero textual resenha:
de tempero. O queijo de cabra salpicado por cima da carne, em mini cubinhos, não da sociedade para
a universidade
tinha gosto de nada. Os molhinhos servidos ao lado, em colheres chinesas, eram
apenas ok.
Mal sabíamos nós que daquele ponto em diante a coisa só iria degringolar… O
peixe da C. estava bem ruinzinho: o purê do acompanhamento, além de elástico,
era tão pesadamente “temperado” com óleo de trufas que acabava sendo incomível
de tão enjoativo.
Minha costela com purê de milho e quiabo – bem mais pra Minas Gerais do que
Tailândia – era um tijolão. Muita gordura, muito pesado. Fiapos de couve frita por
cima do conjunto, o óleo reluzindo. O único elemento mais fresco e crocante eram
as pimentas biquinho.
(E pra quem vier me dizer que não tem problema usar quiabo ou purê de milho
porque o restaurante, apesar do “thai” no nome é contemporâneo, e não tailandês,
eu respondo o seguinte: se um cara chama o restaurante dele de Adegão do Manuel,
você vai esperar comer o quê? Bacalhau, óbvio!)
Provei ainda os pratos da L. e do C. – o curry dela melhor do que a avestruz passada
do ponto e afogada em molho excessivo dele (isso mesmo, avestruz!).
Se as entradas eram boazinhas e os pratos principais passáveis, as sobremesas desce-
ram outros dois pontos na escala.
Pedimos a pior crème brulée que já tive o desprazer de provar, com um farelo de
coco por cima, parecendo um mingau morno. E um tal de “pequi gâteau” metido a
engraçadinho que perdia feio para a versão original, de chocolate.
Melhorzinha estava a pannacotta, embora tivesse grumos, e o “molho” ralo estava
mais pra suco de laranja do que calda.
Apesar da ótima companhia e das boas risadas, saí de lá chateada. Comer mal…
ninguém merece.
PS: minha amiga Constance Escobar, que era uma das que estavam à mesa co-
migo, também escreveu sobre a experiência. Achei melhor não ler o relato dela
até postar o meu. Agora, vou lá ver se as opiniões dela batem com as minhas.
Marakuthai: Alameda Itu, 1618, Jardins, São Paulo, tel: (xx) xxxx-xxxx
Alexandra Forbes é jornalista e crítica gastronômica. Autora dos livros Isabella Su-
plicy: Arte em Açúcar e Jantares de Mesa e Cama, mudou-se para o Canadá há cinco
anos e viaja pelo mundo comendo e bebendo. Adora foie gras e trufas, mas sente
saudades mesmo é da leitoa com farofa e feijão que comia nas férias de infância
passadas na fazenda.
Fonte:
http://viajeaqui.abril.com.br/blog/boa-vida/o-badalado-restaurante-marakuthai-em-
sao-paulo-decepcao/

O título atribuído pela autora já nos permite inferir a opinião mais geral sobre o
estabelecimento comercial: “O badalado restaurante Marakuthai, em São Paulo: de-
cepção”. A autora faz uso de adjetivo ao intitular e, ao longo do texto, percebemos
a utilização de várias outras adjetivações. Vamos sistematizar a adjetivação utilizada
pela autora a fim de explicitar o momento de degustação no restaurante objetivando
evidenciar as passagens avaliativas:
53
A PRODUÇÃO
TEXTUAL Negativo - restaurante – “bonitinho, mas ordinário” (referência à obra de Nelson
E O ENSINO Rodrigues)

Positivo
- espaço – bacana, banhado de luz, paredes brancas e badulaques descombinados, e
muitos detalhes turquesa e vinho;
- apresentação dos pratos – bonita, feminina, caprichada, colorida, festa para os olhos;
- chef – bonita;

Negativo – desapontada com a comida;


- couvert. “Só aos sábados”;

Positivo – as entradas;
- ótima a salada de macarrão de arroz e lagostins caramelados, apesar do excesso de
castanhas de caju;
- bolinhos de camarão, embora sentisse falta de… pedaços de camarão;

Negativo
- “presunto” de pato (air-dried), apesar de lindo, deixou a desejar por simples falta de
tempero;
- queijo de cabra - gosto de nada;
- molhinhos - apenas ok;

Mais Negativo – quando começa a degringolar


- peixe ruinzinho;
- purê elástico e pesadamente “temperado” com óleo de trufas incomível de tão
enjoativo;
- costela com purê de milho e quiabo – tijolão;
- fiapos de couve frita – óleo reluzindo;
- elemento mais fresco e crocante – pimentas biquinho;
- avestruz passada do ponto e afogada em molho excessivo;

Marca de avaliação com retomada de tudo que foi dito, para mostrar que ainda
piorou: “Se as entradas eram boazinhas e os pratos principais passáveis, as sobremesas
desceram outros dois pontos na escala”.

Muito negativo
- crème brulée – desprazer de provar;
- farelo de coco – parecendo um mingau morno;
- “pequi gâteau” – perdia feio para a versão original, de chocolate;
- pannacotta – melhorzinha;
- molho ralo – mais pra suco que calda de laranja;

No início do texto, a autora alterna aspectos negativos com positivos, até o mo-
mento em que se concentra nos negativos, criando uma gradação de negatividade
que passa a percorrer o texto até o seu final. Após a resenha, temos a apresentação da
resenhista, que é jornalista e crítica gastronômica. A menção à autoria de livros confe-
re mais credibilidade a sua resenha, assim como o tempo de experiência degustando
alimentos pelo mundo. Para efeito de comparação, vamos ler a resenha da amiga da
primeira resenhista:

54
Gênero textual resenha:
MARAKUTHAI: (MAIS) UM THAI QUE NÃO É THAI - da sociedade para
a universidade
FEVEREIRO/2010 por Constance Escobar
Antes de começar a falar do Marakuthai, gostaria de deixar claro que detesto sentar
diante do computador pra “falar” mal de um restaurante. Muitas vezes, inclusive, acabo
optando pelo silêncio. O que gosto mesmo é de poder compartilhar as boas experiên-
cias. Portanto, estejam certos de que não me tornei mais ranzinza com o acúmulo de
refeições. Ao contrário, a esperança de encontrar o melhor nas mesas por onde ando é
o que me governa a cada vez que visito um restaurante. Nem sempre isso é possível. E
nem sempre a gente consegue calar. Dito isto, vamos ao que interessa.
Boa parte dos brasileiros que afirmam gostar de comida tailandesa jamais teve, de fato,
contato com a autêntica cozinha thai. Até porque, em terra brasilis, a maior parte dos
restaurantes que se dizem de comida tailandesa, em verdade, não são. Eu afirmo de
peito aberto que pouco ou nada sei sobre o receituário tailandês. Mas, não é preciso
saber pra concluir que o Marakuthai não entrega o que promete. Meu recente almoço
na casa deixou isso bastante claro pra mim.
Embora a casa se identifique como uma mistura de cozinhas de procedências diferentes
(entre elas, supostamente, Brasil e França), o mote do restaurante, que inclusive fica
evidente no seu nome, seria a inspiração na cozinha thai. Como eu disse, seria...
Começamos com uma boa salada de papaya verde com camarões caramelizados. Gostei
também das lâminas de pato defumado (que é comprado; não é feito lá) com cubinhos
de queijo de cabra e uma deliciosa compota de figo e balsâmico. Os bolinhos de cama-
rão não chegaram a me conquistar. Até aí, tudo bem.
Com os principais é que a coisa começou a ficar feia... A costelinha com quiabo e purê
de milho, saborosa, mas um tanto salgada, talvez pudesse estar em Tiradentes, mas na
Tailândia... não sei não.
Meu peixe empanado em farinha de milho, absolutamente sem graça, vinha acompa-
nhado de um purê de batata doce completamente destruído por um azeite de trufas
brancas que o deixava enjoativo e artificial. Não deu pra comer. Acho difícil encarar
aquele azeite, seja aqui ou na Tailândia.
De tudo o que passou por nossa mesa, o melhor dos pratos e, talvez, o mais afinado
com a inspiração da casa foi o curry de mignon, com arroz jasmim e uma farofinha de
banana (esta doce demais).
E a perplexidade continuaria com as sobremesas. Havia, na carta, uma taça de sorvete
de creme com Nutella e bombons Ferrero Rocher. Fiquei na dúvida se estávamos no
Piemonte ou na Tailândia... Melhor driblar esta e ir direto à versão de uma famosa com-
binação asiática: creme brulê de coco com geléia de manga, que logo descobriríamos
que de creme brulê nada tinha... Mais parecia um mingau.
Corajosos, persistimos. O petit gâteau de pequi (o pequi gâteau – gostei do nome) lhe
era fiel no sabor, que acho bastante interessante, mas não era, de fato, um petit gâteau;
massa e recheio eram perfeitamente dissociáveis. Acompanhando o bolinho, o famige-
rado e onipresente sorvete de creme.
Enfim, aos quarenta e cinco do segundo tempo, o que nos garantiu alguns sorrisos de
satisfação foi o brigadeiro de colher. Mas brigadeiro eu não preciso ir à Tailândia pra
comer, certo?
Marakuthai – Alameda Itu 1618. Cerqueira César – SP.

Fonte: http://www.praquemquisermevisitar.com/brasiladentro_marakuthai.asp

55
A PRODUÇÃO A primeira resenhista é mais direta em seus comentários, avaliando de forma nega-
TEXTUAL
E O ENSINO tiva e sem meias palavras a comida servida. Já a segunda, antes de tecer sua opinião,
pondera que não gosta de criticar os espaços que visita. Apesar da justificativa, também
avalia negativamente o restaurante.
O segundo texto começa com maior neutralidade, uma vez que Mais um thai que
não é thai pode indicar que de fato não se trata de um cardápio de comida thailande-
sa, mas ainda não aponta para uma avaliação positiva ou negativa. Vamos sistematizar
também nesse texto as apreciações positivas ou negativas:

- boa salada – papaya verde com camarões caramelizados;

- gostei – lâminas de pato defumado;

- deliciosa – compota de figo e balsâmico;

- bolinhos de camarão – não chegaram a me conquistar;

- com os principais – a coisa começou a ficar feia;

- a costelinha com quiabo e purê de milho – saborosa, mas um tanto salgada;

- meu peixe empanado – absolutamente sem graça;

- purê de batata doce – completamente destruído por um azeite de trufas brancas que o
deixava enjoativo e artificial;

- melhor dos pratos – curry de mignon, com arroz jasmim e uma farofinha de banana -
doce demais;

- perplexidade – com as sobremesas;

- creme brulê de coco com geleia de manga – de creme brulê nada tinha... parecia um
mingau;

- o petit gâteau de pequi – interessante, mas não era, de fato, um petit gâteau;

- famigerado e onipresente – sorvete de creme;

- garantiu alguns sorrisos de satisfação – brigadeiro de colher;

56
Essa resenha apresenta uma estrutura bastante diferente. A autora elabora três pa- Gênero textual resenha:
da sociedade para
rágrafos de considerações iniciais antes de começar a avaliar a comida propriamente a universidade

dita. Essa abordagem inicial, de explicações, mostra alguns dos critérios que ela cos-
tuma utilizar, como não gostar de falar negativamente de um estabelecimento, que
muitas vezes prefere o silêncio. Embora ambas as resenhistas tenham contado a expe-
riência gastronômica cronologicamente, à medida que os pratos lhes foram trazidos,
a primeira ordena mais nitidamente os aspectos positivos e os negativos. A segunda
autora, além dos adjetivos, fez usos de advérbios terminados em -mente para dar ênfa-
se as suas impressões e aos pratos.
Na sociedade, circulam inúmeras resenhas, com várias finalidades comunicativas e,
consequentemente, lançando mão de diversos recursos. Vimos um exemplo do propó-
sito das resenhas na área do turismo e duas resenhas acerca da temática culinária. Dis-
cutiremos, agora, a outra face de alguns desses textos que se denominam “resenhas”
e que circulam na Internet. Há uma profusão de textos elaborados de última hora por
estudantes para compartilhar com outros estudantes a leitura de um livro. Por diversas
razões: pressa, preguiça de ler o livro por completo, tentativa de enganar o professor,
fiam-se na leitura alheia. Aproveitamos a menção a esse problema para lembrar que
tais textos, geralmente, apresentam uma incompletude estrutural e de análise da obra
que pode comprometer o eventual leitor, ou seja, são chamados de resenhas, mas não
apresentam os elementos essenciais desse gênero textual. Importante mesmo é entrar
em contato com a obra e, a partir de reflexão própria, produzir o seu texto.
Apesar dessa face negativa, de textos que não chegam a ser resenhas, há na Internet
espaços democráticos (páginas de empresas, blogs, entre outros), em que qualquer
pessoa que fez a compra e o uso de um produto pode entrar e deixar seu comentário
sobre as ofertas em questão.
Quanto às resenhas na esfera empresarial, foi publicado no blog Ikeda, que dis-
cute questões comerciais, um texto chamado “Como lidar com resenhas negativas no
comércio eletrônico”. O texto não apresenta assinatura, mas é provável que seja de
autoria do responsável pelo blog, o renomado autor Roberto Camacho.
Nesse texto, é explicado que uma das principais lojas de comércio eletrônico do
mundo foi a pioneira na difusão mundial do conceito de “Resenhas de clientes”. Essa
empresa, no lugar de fazer uso de marketing tradicional, optou por ceder espaço para
a opinião de consumidores, para ajudar outros consumidores a comprar. Essa inova-
ção foi copiada por lojas virtuais de todo o globo, mas que nem todas lidam bem com
as resenhas negativas, como a primeira empresa consegue fazer. Consequentemente,
há diferença de procedimento na publicação das resenhas: enquanto na pioneira a
divulgação dá-se instantaneamente, com avaliação positiva ou negativa, no Brasil, os

57
A PRODUÇÃO sites que copiaram o conceito de ‘’Resenhas de clientes” submetem-nas a um prazo de
TEXTUAL
E O ENSINO 7 dias para a publicação, por medo do feedback negativo. No texto, é lembrado que as
possíveis resenhas negativas podem ser uma forma de aperfeiçoamento de serviços e
que permiti-las possibilitaria a construção de uma imagem transparente para empresa.
Por meio desses exemplos, parece ser possível assinalar que lemos resenhas, prin-
cipalmente, para nos situarmos no mundo diante de tantas possibilidades de lazer,
de compras e de referências para pesquisa. É por meio desses textos avaliativos que
decidimos pela escolha de um filme, pela compra de livros, de carros, de pacotes de
viagens, dentre tantos outros serviços. Enfim, tais textos circulam em sociedade por-
que cumprem a função de nos situar diante do que poderemos encontrar.

1.2 Definições de resenha


Após a discussão da função da resenha na sociedade, e depois de trazermos exem-
plos de resenhas em diversas esferas, convém agora cumprirmos outra etapa relevante
na compreensão de um gênero ou tipologia textual: conceituá-la, pois é a partir da sua
conceituação que podemos melhor compreender as características essenciais do texto
que pretendemos elaborar. Para que possamos chamar um texto de resenha, primeira-
mente indagamos: O que é resenha?
Na definição do dicionário Aurélio (FERREIRA, 2004, p.1742), encontramos: “1. Ato
ou efeito de resenhar. 2. Descrição pormenorizada. 3. Contagem, conferência. 4. No-
tícia que abarca certo número de nomes ou fatos similares. 5. Recensão”. Sobre o ato
de resenhar, ainda no Aurélio (FERREIRA, 2004, p. 1742), encontramos: “fazer resenha
de; relatar minuciosamente. 2. Enumerar por partes”.
O dicionário Houaiss (2009, p. 1650) define resenha como:

Ato ou efeito de resenhar. 1. descrição feita com detalhes com pormenores


2. contagem, conferência, verificação 3. tipo de resumo de texto de extensão
maior que a da sinopse 4. Análise crítica ou informativa de um livro; recensão 5.
Notícia jornalística que desce a detalhes e da ocorrência e a analisa por diversos
ângulos 6. sinopse geral do que de fundamental ocorreu em determinado pe-
ríodo, em matéria de noticiário. Sinônimos: descrição, enumeração, exposição,
levantamento, narração, notícia, panorama, recensão, relação, relato, revista.

Precisamos, diante de tantas definições, esclarecer os principais aspectos para a


elaboração de nossa resenha.
Na esfera acadêmica, a resenha se configura como um tipo de redação técnica que
inclui variadas modalidades de texto: descrição, narração e dissertação. Para Andrade
(1995, p. 60), resenha é um tipo de trabalho que “exige conhecimento do assunto,
para estabelecer comparação com outras obras da mesma área e maturidade intelectual

58
para fazer avaliação e emitir juízo de valor”. A mesma autora conceitua resenha como: Gênero textual resenha:
da sociedade para
a universidade
tipo de resumo crítico, contudo mais abrangente: permite comentários e opi-
niões, inclui julgamentos de valor, comparações com outras obras da mesma
área e avaliação da relevância da obra em relação às outras do mesmo gênero
(ANDRADE, 1995, p. 61).

Por isso, informa ser a resenha tarefa de professores e especialistas no assunto da


obra, acrescentando que a resenha costuma ser solicitada em cursos de pós-graduação
como exercício para a realização de trabalhos complexos (monografias). Todavia, sa-
bemos que, na sociedade, quem escreve esse tipo de texto pode desempenhar as mais
diversas funções profissionais. A resenha pode ser escrita por um jornalista ou profis-
sional especializado na área em questão, por um estudante leitor de alguma obra ou
até mesmo por um cliente de uma empresa, que decide colaborar com outros leitores-
consumidores. Interessa-nos, portanto, a definição de resenha como um relato minu-
cioso das propriedades de uma obra e suas partes constitutivas.

1.3 Espaço privilegiado da resenha: revistas científicas


Quanto à dimensão e circulação de um gênero na sociedade, é interessante ob-
servarmos que no período em que Othon Garcia escreveu sua obra (ano de 1967 da
primeira edição), referência nos cursos de Letras, as resenhas pareciam não gozar do
mesmo prestígio que atualmente:

Na categoria das chamadas ‘dissertações científicas’ precipuamente destinadas


a publicação em periódicos especializados, inclui-se uma grande variedade de
trabalhos, com freqüência, genérica e sumariamente designados ‘artigos’ (às
vezes, ‘estudos’, às vezes, ‘ensaios’). Ultimamente, entretanto, em conseqüên-
cia sobretudo da nossa ‘explosão universitária’ vêm-se generalizando entre
nós denominações mais específicas para esses tipos de trabalhos que não se
corporificam em alentados volumes de centenas de páginas. Além das já longa-
mente consagradas ‘memória’, ‘monografia’, ‘tese’ (esta, quando universitária,
não necessariamente destinada a publicação em periódicos) e de outros gêne-
ros menores (‘recensão’, ‘resenha’, ‘resumo’ ‘sinopse’), tornaram-se também
freqüentes denominações tais como ‘memória científica’, ‘informe científico’
e ‘relatório de pesquisa’, para citar apenas as duas espécies mais importantes
(GARCIA, 2000, p. 405).

É digno de nota que resenha e resumo estão entre os “gêneros menores” e ambos
sofreram uma virada considerável em sua importância, sendo cobrados em sala de
aula, cada vez mais, como atividades por meio das quais o aluno mostra sua capaci-
dade de compreensão. Hoje, chamar tais gêneros de “menores” não mais se justifica.
Existe um espaço privilegiado que Marcuschi chama de “suporte dos gêneros
textuais”:

59
A PRODUÇÃO Seguramente, as revistas científicas, os anais de congresso e os boletins de asso-
TEXTUAL ciações científicas, por exemplo, são suportes de gêneros bastante específicos
E O ENSINO
e ligados a um domínio discursivo (o científico, acadêmico ou instrucional). Ali
encontramos artigos científicos, resenhas, resumos, comunicações, bibliogra-
fias, debates científicos, programação de congressos, programas de cursos e
outros dessa natureza. São suportes hoje tradicionais e que se especializam de
maneira muito clara. Pelo fato de serem considerados científicos, há inclusive
um status dos gêneros por eles veiculados que é diferente dos textos similares
que aparecem em jornais diários ou em revistas semanais de divulgação ou
noticiosas (MARCUSCHI, 2008, p. 180).

Por conseguinte, a resenha que encontraremos nas revistas científicas e nos espaços
acadêmicos será diferente das que encontraremos no caderno cultural de um jornal.

1.4 Simulando uma situação de pesquisa: percebendo a função da


resenha acadêmica
O objetivo da resenha acadêmica que você entrega para o professor é o de mostrar
que você: 1) leu a obra; 2) compreendeu a obra e apreendeu as principais ideias; 3)
sabe resumir as ideias.
Façamos agora um exercício. Imaginemos que precisamos fazer uma pesquisa e
escolhemos o livro ‘Navegar no ciberespaço: o perfil cognitivo do leitor imersivo’, de
autoria de Lucia Santaella (2004). Temos muitos livros para ler para a monografia que
precisamos desenvolver e a decisão se o material a ser lido vale ou não a pena repre-
senta uma economia de tempo e dinheiro. Esse processo de escolha de obra exige que
lancemos mão de recursos que nos orientem. A contracapa foi lida na livraria, mas
como não temos verba sobrando para a compra de livros, as obras a serem escolhidos
devem ser os essenciais.
Na contracapa, encontramos:

O cibernauta coloca em ação habilidades de leitura não muito distintas daquelas


que são empregadas pelo leitor de um texto impresso como o livro. Por outro
lado, são habilidades também distintas daquelas empregadas pelo receptor de
imagens ou espectador de cinema e televisão. Conectando na tela, por meio de
movimentos e comandos de um mouse, os nexos eletrônicos dessas infovias, o
leitor vai unindo, de modo a-seqüencial, fragmento de informação de naturezas
diversas, criando e experimentando, na sua interação com o potencial dialógico
da hipermídia, um tipo de comunicação multilinear e labiríntica. Por meio de
saltos receptivos, esse leitor é livre para estabelecer sozinho a ordem textual
ou para se perder na desordem de fragmentos, pois no lugar de um volume
encadernado com páginas em que as frases e/ou imagens se apresentam em
uma ordenação sintático-textual previamente prescrita, surge um ordenação
associativa que só pode ser estabelecida no e mediante o ato de leitura. Que ha-
bilidades perceptivas e cognitivas estão por trás desse modo remarcavelmente
novo de comunicação? Que operações mentais, perceptivas e sensórias guiam
os comandos do leitor quando movimenta e ‘clica’ o mouse? (SANTELLA, 2004).

60
Esse texto nos informa o conteúdo do livro: a forma como o internauta lê, as habi- Gênero textual resenha:
da sociedade para
lidades leitoras, a perguntas de pesquisa feitas do percurso de escrita da obra. Não há a universidade

qualquer parte no livro, na capa, orelha ou contracapa, que traga uma avaliação da
obra. Logo, precisamos de mais ferramentas para nos decidir se esse livro vale a pena
ser lido ou não. O que podemos saber da autoridade da autora?

Texto de apresentação na orelha do livro


Lucia Santaella é professora titular no programa de pós-graduação em Co-
municação e Semiótica da PUC-SP. Doutora em Teoria Literária pela PUC-SP e
livre-docente em Ciências da Comunicação pela USP. É presidente honorária
da Federação Latino-Americana de Semiótica e diretora do Cimi, Centro de In-
vestigação em Mídias Digitais da PUC-SP. É a autora de Corpo e comunicação e
Culturas e artes do pós-humano, publicados pela Paulus (SANTAELLA, 2004).

Informações sobre os autores conferem pistas da medida da importância da leitura


dessas obras, ou seja, da competência e autoridade adquirida pelos autores ao trazer
sua trajetória profissional e reflexiva, como vemos nesse texto de apresentação e nas
informações que acompanham as resenhas de culinária.
Após a leitura da contracapa e das referências da autora do livro ‘Navegar no ci-
berespaço: o perfil cognitivo do leitor imersivo’, continuamos manuseando a obra
para podemos nos decidir se esse livro será usado na pesquisa ou não. Vamos ler esse
trecho para discussão:

Partindo da motivação primeira, despertada em mim pela curiosidade com a


presteza perceptiva e cognitiva exibida pelos usuários do ciberespaço, dei iní-
cio a um estudo sobre as distinções entre alguns tipos de leitores, tendo em
vista uma primeira caracterização panorâmica, estabelecida pela diferença, dos
traços específicos que caracterizam o leitor que navega através das arquiteturas
líquidas do ciberespaço. Esse estudo está apresentado no capítulo 1.
Falar em ciberespaço implica defini-lo, caracterizar seus traços constituintes,
muito especialmente a nova linguagem que está à espera daqueles que nele
navegam: a hipermídia. Essa é a tarefa que o capítulo 2 leva à frente.
No capítulo 3, como já foi mencionado, encontra-se o relato da pesquisa de
campo, enquanto o capítulo 4 está dedicado ao levantamento teórico das ciên-
cias cognitivas, para nelas buscar os conceitos mais sintonizados com o proble-
ma colocado pela pesquisa.
Nos capítulos 5, 6 e 7, proponho que há três níveis de inferências lógicas, que
guiam os passos do leitor imersivo ou navegador. Esses passos se mesclam na
constituição do seu perfil cognitivo. Os níveis são o do navegador errante, o do
navegador detetive e do navegador previdente.
No capítulo 8, a metáfora da mente que se separa do corpo, a mente que avança
para dentro do cibermundo, deixando o corpo carnal, biológico para trás, é
discutida por meio do filme Matrix, principal responsável pela disseminação
dessa metáfora ou outras similares.
No capítulo 9, o estudo do funcionamento os sentidos perceptivos humanos,
especialmente o sentido do tato, nos serve para desconstruir as ilusões da metá-
fora tão difundida de Matrix. Não há separação entre mente e corpo, quando se
navega no ciberespaço. Ao contrário, embora o corpo pareça imóvel, enquanto

61
A PRODUÇÃO a mente viaja, os sentidos internos do corpo estão em tal nível de atividade, que
TEXTUAL o corpo, que dá suporte às inferências mentais de quem navega, é um corpo
E O ENSINO
sensorialmente febril, internamente agitado. Essa é a tese que esse livro irá de-
fender. Por trás do instantâneo movimento nervoso do mouse e do hipnotismo
ocular, processam-se inferências lógicas sintonizadas com processos percepti-
vos complexos, numa junção inconsútil das atividades mentais com atividades
perceptivo-corporais. É a combinação instantânea de ambos que possibilita a
leitura imersiva.
Não poderia haver interatividade, sem tal integração entre corpo e mente, entre
os sentidos que auscultam e a mente que pensa em sincronia com o corpo que
age. As negociações interativas não prescindem dessa sintonia. O capítulo 10
está voltado para o estado da arte e o estudo detalhado da interatividade à luz
do dialogismo que se transforma, no ciberespaço, em heterologismo.
No capítulo 11, o perfil do leitor imersivo, com base em todas as discussões
precedentes, é, por fim, delineado. Para desenhar esse perfil cognitivo, é pre-
ciso não apenas caracterizar os processos inferenciais, processos mentais que
guiam as escolhas de cibernauta, mas também explicar de onde vem a agilidade
perceptiva e a prontidão de respostas que esse leitor ou receptor exibe na in-
teração com o fluxo incessante de signos que se apresentam nas interfaces da
hipermídia. Em suma, a polissensorialidade e prontidão perceptiva do leitor
imersivo parece se sustentar em processos mentais e sensório-perceptivo-cor-
porais que precisam ser examinados. Este livro apresenta os resultados desse
exame (SANTAELLA, 2004, p. 13-14).

Uma leitura atenta desse texto permite-nos propalar que se trata de um texto es-
sencialmente descritivo e sua descrição contempla minuciosamente as partes da obra
em questão: o tema da obra, como a pesquisa foi realizada, as etapas, os conceitos e a
abordagem de cada capítulo.
Constatamos facilmente que é um texto que contém várias das características de
uma resenha. Mas, por que não podemos considerá-lo uma resenha? Porque, apesar
da parte descritiva, similar à da resenha, não há momentos de avaliações e, embora
seja um texto de apresentação, não é a apresentação um texto de autoria de um lei-
tor para a leitura de outro leitor. O texto em questão foi escrito pela própria autora,
Santaella (2004), na introdução de sua obra, para mostrar ao seu leitor o que ele vai
encontrar nas páginas de seu livro. Portanto, se o mesmo texto fosse de nossa autoria
e se houvesse o acréscimo de trechos nos quais opinássemos “boa organização”, “lin-
guagem acessível”, “pesquisa relevante”, o texto deixaria de ser uma apresentação para
constitui-se em uma resenha.
Apesar desse texto não poder ser considerado uma resenha, pelos motivos discu-
tidos, é um ótimo modelo de estrutura e de abordagem do conteúdo de uma obra,
uma vez que esse gênero textual é descritivo e costuma contemplar a descrição por
capítulos, como feito por Santaella. Faltou para resenha apenas a parte dissertativa, ou
seja, aquela que traz as apreciações.
Nesse exercício de leitura de textos relacionados à obra, para possível aquisição

62
com finalidade de pesquisa, lemos a contracapa, a apresentação da autora na orelha do Gênero textual resenha:
da sociedade para
livro e a introdução da autora, na qual descreve sua abordagem. Sendo assim, fizemos a universidade

a leitura de três textos com a função de nos orientarmos quanto à obra em questão. Ve-
jamos, nas palavras de Carvalho (2005), em sua pesquisa acerca da resenha acadêmica,
a justificativa para a leitura desse gênero textual:

As resenhas de livros cumprem pelo menos dois papéis: podem ser lidas como
o conjunto das reações à publicação de um livro em determinada época, ser-
vindo como registro importante para vários pesquisadores; podem também
ser utilizadas como guias de leitura e aquisição de publicações. Configuram-
se, em geral, como textos não muito longos avaliando e descrevendo um livro
recentemente publicado ou traduzido; são elaboradas por especialistas na
área do conhecimento e direcionadas a leitores também especialistas.
No atual cenário acadêmico, aqueles que desejam manter-se atualizados em
seu campo de estudos precisam dar conta de uma carga de leitura gigantesca.
No entanto, bem sabemos que essa tarefa é praticamente impossível por falta
de tempo e de recursos para a aquisição de todas as publicações dignas de
inspeção. Para lidar, ao mesmo tempo, com a necessidade de atualização e
com a carência de tempo e meios, professores e pesquisadores recorrer a
resenhas de livros, na tentativa de selecionar que leituras são realmente fun-
damentais dentre os lançamentos em sua área de especialização.
Além da questão do grande número de publicações em cada área, também se
coloca para o pesquisador de hoje a leitura de obras impressas em diferen-
tes línguas estrangeiras, principalmente, em língua inglesa. Segundo Crystal
(1995, p. 106), em The Cambridge Encyclopedia of the English Language, “a
maior parte das informações científicas, tecnológicas e acadêmicas no mundo
é expressa em inglês, e mais de 80% de toda a informação armazenada em
sistemas de dados está em inglês”. Este dado, mesmo que o coloquemos sob
suspeita em função da fonte onde se encontra, é estarrecedor: um pesquisa-
dor se vê obrigado a ler em inglês para se manter atualizado. Para nós, bra-
sileiros essa demanda se traduz em gastarmos o triplo com livros publicados
em língua inglesa, em função do valor ascendente do dólar. Eis mais uma
razão para a consulta de livros da internet, como, por exemplo, o da livraria
virtual amazon.com: avaliar se o título que a princípio parece interessante de
fato merece tanto o investimento intelectual como o financeiro (CARVALHO,
2005, p. 138).

Enfim, todos os textos em torno da obra, de apresentação, de introdução, a capa,


a contracapa, a orelha, o prefácio, entre outros, servem como parâmetros para nossa
avaliação e decisão pela compra do livro.

1.5 Estrutura básica da resenha acadêmica


Escrever uma resenha exige paciência do resenhista, uma vez que é um tipo de
texto que exige uma leitura minuciosa da obra e uma visão de seu todo, ou seja, um
texto que apresente a obra de uma forma completa, informando:
• Qual é a obra?;
• Quem é o autor?;

63
A PRODUÇÃO • Quais recursos foram usados?;
TEXTUAL
E O ENSINO • Qual linguagem o autor elegeu para expressar suas ideias na obra?;
• Qual é o público alvo?

Enfim, a resenha é um texto que tem uma forte característica de apresentação. Ela
não pode ser confundida com resumo, porque o resumo é a essência da obra contada
com as suas palavras, e a resenha traz em si o resumo inserido em um contexto dis-
cursivo, no qual as expressões linguísticas do tipo “a autora faz”, “o autor escolhe”,
“a obra é organizada”, sejam recorrentes. Temos, assim, escolhas vocabulares que se
referem constantemente à obra escolhida para ser resenhada.
O resenhista, acadêmico, que fará o texto entrará em contato com o objeto a ser
analisado e redigirá a valoração desse objeto. Deve evitar uma avaliação puramente
subjetiva, sendo importante apresentar a descrição de aspectos objetivos que susten-
tem seus argumentos, com o propósito de informar o leitor sob uma perspectiva não
só descritiva, mas também de avaliação.
A resenha apresenta uma estrutura prevista, ou seja, elementos que devem apa-
recer no texto. Nem sempre os autores que abordam o assunto vão esgotar todas as
possibilidades, mas alguns elementos são essenciais.
Quanto à estrutura, Coscarelli e Mitre (2007) trazem uma espécie de roteiro dos
elementos que devem ser levantados do texto, os quais “normalmente” aparecem em
uma resenha, ou seja, os autores preconizam que uma resenha deve atender a um
detalhamento que contemple as seguintes informações:
Primeiramente as referências, ou seja, logo após o título, colocar a referência com-
pleta da obra para que o leitor possa adquiri-la ou emprestá-la.
Quando estivermos fazendo a apresentação do texto, devemos responder a ques-
tões como: qual é o texto? Quem é o autor?; Com que propósito foi escrito; Que tipo
de texto é esse?; Para que leitor foi escrito? Dessa forma, situamos o leitor quanto a
informações gerais e quanto às condições de produção.
O resumo é a parte que faz uma exposição sucinta das ideias que consideramos
serem as mais relevantes do texto.
A crítica é quando trazemos as frases de cunho avaliativo, ao informar se, por exem-
plo, o autor atingiu ou não seus objetivos, quais sim ou não, sempre justificando.
Nessa parte entra a análise tanto da forma quanto do significado.
Para a etapa final da resenha, devemos elaborar conselhos para o leitor, situando
quem deve ler ou não a obra e por quê. Pelo que podemos observar, dificilmente ela-
boramos uma boa resenha com uma leitura superficial da obra.

64
1.6 Avaliação expressa na resenha Gênero textual resenha:
da sociedade para
Se a resenha for apenas informativa, as marcas de avaliação do autor estarão ausen- a universidade

tes. Se for uma resenha crítica, é certo que a avaliação poderá ser positiva, negativa ou
ponderar entre os aspectos positivos e negativos.
Uma pergunta que os acadêmicos sempre fazem quando vão produzir suas rese-
nhas é: os comentários do autor-resenhista devem constar ao longo de todo o texto, ou
apenas no último parágrafo? Embora a resenha tenha uma estrutura prevista, as críticas
à obra (entendidas aqui não apenas no sentido negativo, mas como uma avaliação em
que tudo é pesado) podem aparecer ao longo do texto ou ficarem reservadas para o
final, após o resumo da obra; ou seja, primeiro se descreve e depois se opina.

1.7 Resenha acadêmica: exemplo


A resenha abaixo foi publicada em uma revista acadêmica on-line chamada Espaço
Acadêmico. Façamos a leitura e vejamos a sua estrutura e conteúdo:

DIÁLOGOS IMPERDÍVEIS, por Tânia Braga Guimarães


O livro Conversa com lingüistas, virtudes e controvérsias, organizado por An-
tonio Carlos Xavier e Suzana Cortez, e lançado pela editora Parábola, é com-
posto por uma série de entrevistas com lingüistas de diferentes linhas teóricas.
A primeira exigência feita, quando da seleção dos entrevistados, foi a de que
aceitassem conceder a entrevista oralmente. Essa exigência foi no intento de
captar, segundo os organizadores, as reais convicções sobre os tópicos aborda-
dos, ou seja, para que não fosse permitido um tempo maior de elaboração da
resposta.
Os escolhidos deveriam ter ainda mais de vinte anos de experiência como pro-
fessores e pesquisadores. Não há detalhamento na explicação desse critério,
certamente pensado a fim de que as respostas trouxessem uma visão mais am-
pla dessa ciência que, sabemos, ainda é muito nova. Ou ciência-bebê, como a
denominou um dos entrevistados.
O resultado dessa seleção e das respostas é fascinante por permitir ao leitor
um passeio por divergentes formas de encarar um mesmo fenômeno devido à
diferentes linhas de pesquisa.
Foram selecionados pesquisadores de vários centros universitários, sem pri-
vilegiar uma ou outra região. Os escolhidos deveriam gozar de prestígio pe-
rante seus pares e indicar quem seria o próximo a ser entrevistado. São eles:
Maria Bernadete Marques Abaurre; Eleonora Cavalcanti Albano; José Borges
Neto; Ataliba de Castilho; Carlos Alberto Faraco; José Luiz Fiorin; João Wander-
ley Geraldi; Francisco C. Gomes de Matos; Rodolfo Ilari; Mary Kato; Ingedore
Grunfeld Villaça Koch; Luiz Antonio Marcuschi; Maria Cecília Mollica; Diana Luz
Pessoa de Barros; Sírio Possenti; Kanavilill Rajagopalan; Maria Martins Margari-
da Salomão e Carlos Vogt.
Foram feitas dez perguntas: Que é língua?; Qual a relação entre língua, lingua-
gem e sociedade?; Há vínculos necessários entre língua, pensamento e cultura?;
A linguagem tem sujeito?; Que é lingüística?; A lingüística é ciência?; Para que
serve a lingüística?; A lingüística teria algum compromisso necessário com a
educação?; Como a lingüística se insere na pós-modernidade?; Quais os desa-
fios para a lingüística no século XXI?

65
A PRODUÇÃO Não se trata de uma espécie de introdução à lingüística. Os textos apresen-
TEXTUAL tam um grau de complexidade que certamente será melhor apreendido por
E O ENSINO
pessoas já apresentadas aos estudos lingüisticos e aos seus objetos, métodos
e resultados. A teoria de Chomsky, a pós-modernidade, semiótica, lingüística
textual, análise do discurso. Enfim, quem não tiver uma noção sobre cada cam-
po poderá não perceber a importância do somatório resultante da fala de cada
pesquisador.
Ao mesmo tempo que pode ser de difícil leitura para iniciantes, o livro é alta-
mente recomendável e imperdível para todos aqueles que estão no momento
de reflexão e repensar sobre os resultados alcançados pela lingüística e o que se
pode fazer diante das novas demandas sociais, as quais acabam por determinar
também novas demandas dos estudos lingüísticos (GUIMARÃES, 2003)

Podemos ver que a sua estrutura é simples, composta de apenas oito parágrafos. No
primeiro, temos o que é resenhado, ou seja, o nome da obra. O segundo e o terceiro
parágrafos abordam o processo de composição da obra. O quarto traz o nome das pes-
soas que foram escolhidas para a entrevista. O quinto menciona as questões feitas às
autoridades em pesquisa. E os dois últimos são constituídos da nossa avaliação quanto
ao alcance da obra para o público que está se iniciando nas pesquisas acadêmicas e
para aqueles que já avançaram nos estudos em questão. Apesar de ter uma estrutura
simples, percebemos uma diferença em relação às resenhas sobre culinária: linguagem
específica da esfera acadêmica; linguagem mais formal; público-alvo.

LEVANTAMENTO DE INFORMAÇÕES
Título da resenha – Diálogos Imperdíveis – já indica positivamente o livro;
Título da obra – Conversa com linguistas, virtudes e controvérsias;
Organizadores – Antonio Carlos Xavier e Suzana Cortez;
Editora – Parábola;
Como é organizado – Entrevistas com linguistas de diferentes linhas teóricas;
Como foi feita a seleção dos entrevistados;
Exigência – De que a entrevista fosse feita oralmente no intento de captar as reais
convicções sobre os tópicos abordados;
Como foram escolhidos – Vinte anos de experiência como professores e pesquisadores;
Resultado dessa seleção – Fascinante por permitir ao leitor um passeio por divergentes
formas de encarar um mesmo fenômeno devido a diferentes linhas de pesquisa;
Como foram selecionados – Centros universitários, sem privilegiar uma ou outra região;
os entrevistados deveriam gozar de prestígio perante seus pares;
Nomes dos entrevistados: 10;
Perguntas feitas: 10;
Avaliação – Não se trata de uma espécie de introdução à linguística. Os textos apresentam
um grau de complexidade que certamente será melhor apreendido por pessoas já
apresentadas aos estudos linguísticos e aos seus objetos, métodos e resultados;

66
Gênero textual resenha:
Público-alvo – Quem não tiver uma noção sobre cada campo poderá não perceber a da sociedade para
importância do somatório resultante da fala de cada pesquisador; difícil leitura para a universidade
iniciantes;
Avaliação – Altamente recomendável para todos aqueles que estão no momento de
reflexão e repensar sobre os resultados alcançados pela linguística.

Observamos que a resenha em questão não apresenta aspectos negativos da obra,


muito provavelmente quando produzimos o texto julgamos que a obra estava bem or-
ganizada e de leitura agradável. Por fim, lembramos que existem os elementos básicos
de uma resenha, mas não existe uma receita ou um padrão que deva ser forçosamente
seguido. As escolhas do autor quanto aquilo que ele deseja falar/escrever sobre uma
obra são essenciais, e considerando que nossas experiências de leitura de um livro
resultarão sempre em leituras diversas, é certo que um mesmo livro, sendo resenhado
por 30 alunos de uma mesma turma, apresentará 30 resenhas, com diferentes aspectos
apontados.
Vejamos mais uma resenha de nossa autoria. A publicação ocorreu na mesma revis-
ta on-line Espaço Acadêmico. É importante frisar que a escolha dessas duas resenhas
de nossa autoria justifica-se como modelo para discussão e não por considerá-las isen-
tas de falhas.

Questões de uso e gramática: respondendo aos desafios, por Tânia Braga


Guimarães (2003):
 
Um “pulinho”, uma “passadinha” em uma livraria pode resultar em um encon-
tro casual que se revela uma grata surpresa. Foi que ocorreu com uma dessas
visitas rápidas nas quais nós – loucos por livros – juramos que só vamos dar
uma “olhadinha”. Tudo no diminutivo para aliviar a consciência.
Não tive como ignorar o lançamento do livro Ensino de gramática: descrição e
uso, organizado pelas pesquisadoras Silvia Rodrigues Vieira e Silvia Figueiredo
Brandão, porque o livro traz embasamento para nós que estamos em sala de
aula ensinando Gramática Tradicional - e Normativa - para nossos alunos sem
perder de vista a necessidade de que eles conheçam também as variantes em
uso, as formas lingüísticas que estão na boca do povo, e que, por isso mesmo,
criam tanta dificuldade em aprender e usar, de fato, as regras gramaticais, uma
vez que a aquisição de seus conceitos e de suas nomenclaturas parece apren-
dizado de uma língua estrangeira devido ao afastamento que há entre as for-
mas que a gramática tenta manter e as formas realmente usadas no cotidiano.
Aprender regras que, não raras vezes, são inexistentes no uso, até mesmo nas
situações mais formais, torna-se um dilema para o aluno. Este livro vem nos
trazer luz neste momento em que nos são colocados inúmeros desafios pelo
reconhecimento da complexidade que envolve os fatos e os usos da língua.

Dinah Callou cita João Ubaldo Ribeiro que assim fala sobre a gramática:
A gramática é a mais perfeita das loucuras, sempre inacabada e perplexa, vítima
eterna de si mesma e tendo de estar formulada antes de poder ser formulada

67
A PRODUÇÃO – especialmente se se acredita que no princípio era o Verbo. Estou, como já
TEXTUAL co ntei, estudando gramática e fico pasmo com os milagres de raciocínio
E O ENSINO
empregados para enquadrar em linguagem “objetiva” os fatos da língua. Alguns
convencem, outros não. Estes podem constituir esforços meritórios, mas se
trata de explicações que a gente sente serem meras aproximações de algo no
fundo inexprimível, irrotulável, inclassificável, impossível de compreender inte-
gralmente. Mas vou estudando, sou ignorante, há que aprender. Meu consolo é
que muitas coisas que me afligem devem afligir vocês também. Ou pelo menos
coisas parecidas (p. 15).

Este trecho, “desabafo?”, me faz lembrar de tantos outros textos que expressam
a relação dos escritores com a gramática, como, Gigolô das palavras, de Luis
Fernando Veríssimo; Nascer no Cairo, ser fêmea do cupim, de Rubem Braga; De
Mel a pior, de Fernando Sabino; Colocador de pronomes, de Monteiro Lobato,
além do ótimo Emília no país da Gramática, também de Monteiro Lobato, no
qual, sem querer, se faz uma visita ao país da Lingüística devido à compreensão
avançada do autor quanto aos fatos lingüísticos e a sua sujeição à mudança
lingüística.

Callou cita ainda Celso Cunha, gramático respeitadíssimo, que afirmou


O que está a matar o estudo do idioma em nossas escolas é que todo o ensino
se faz na base do certo e do errado, do que é o do que não é vernáculo [...].
Evitem-se os erros, os erros verdadeiros. Mas para isso só há um remédio já
preconizado por Jerpersen: ‘Nada de listas e de regras, repita-se o bom muitas
e muitas vezes’ (p. 14). Este trecho me recorda Machado de Assis, sobre o qual
se conta ter ficado espantado com a gramática de seu sobrinho. Como Machado
pôde ser alçado ao posto de maior escritor do Brasil sem ter o conhecimento
de gramática? É neste exato momento que entra a questão da exposição aos
bons modelos, Machado era leitor, leitor voraz. E por meio da exposição aos
bons modelos é possível depreender as formas valorizadas na língua sem que
necessariamente se saiba nomenclatura gramatical.
Ensino de Gramática: descrição e uso, muito bem pensado, conta com capítulos
de 11 docentes-pesquisadores do Setor de Língua Portuguesa do Departamento
de Letras Vernáculas da UFRJ e é organizado em quatro eixos-temáticos: a pri-
meira seção introduz a problemática e intitula-se Conceitos básicos, a segun-
da compreende a parte descritiva e recebeu o nome Questões de descrição
gramatical, a terceira constitui-se em parte teórica denominada Questões de
Teoria Gramatical e a última traz o texto como o lugar, o espaço privilegiado
de uso dos mesmos fatos gramaticais anteriormente citados e a seção denomi-
na-se a Questão do texto. As temáticas contempladas são: Gramática, variação
e normas; Saberes gramaticais na escola; Concordância nominal; Concordância
verbal; Pronomes Pessoais; Flexão e derivação: o grau; Classes de palavras; Ter-
mos da oração; Texto e contexto.
Em vários capítulos as definições gramaticais, pretensamente isentas de proble-
mas, são revisadas em seções denominadas O que diz a gramática tradicio-
nal: o cânone; a visão tradicional. Os pronomes, por exemplo, são apresen-
tados como nas gramáticas comportadas: a língua portuguesa dispõe de seis
pronomes para três pessoas do discurso no singular e no plural: eu, tu, ele, nós,
vós, eles. Eis que somos alertados “esse leque de pronomes, além de não incluir
formas amplamente utilizadas na linguagem coloquial, como é o caso de você/
vocês/a gente, concebe equivocadamente nós e vós como meros plurais de eu e
tu.” Após esta retomada são trazidos os outros olhares que as pesquisas socio-
lingüísticas vêm possibilitando nas análises e um quadro que representasse a
situação atual traria: eu, tu/você, ele/ela, nós/a gente, vocês, eles/elas, retirando
o vós, hoje restrito a textos específicos, como os religiosos. Enfim, refletiria

68
minimamente a reorganização que vem ocorrendo no sistema pronominal bra- Gênero textual resenha:
sileiro e para o qual ainda se faz vistas grossas nos materiais didáticos. da sociedade para
a universidade
Uma discussão que perpassa todas as classes de palavras são as definições se-
mânticas comumente empregadas no ensino e nem sempre satisfatórias para
classificar as palavras (atividade de reconhecimento na qual a escola dedica
amplos esforços) que estão nas gramáticas e nos livros didáticos como, por
exemplo, a do adjetivo que seria uma palavra que indica qualidade. Verbo, ad-
vérbio, olhadas de perto nenhuma dessas definições por nós conhecidas desde
as primeiras lições de gramáticas são satisfatórias. A autora desde capítulo traz
propostas de definições mais exatas e que possam mininizar a problemática.
Sabemos que um dos objetivos da escola é proporcionar a norma culta aos
alunos que nela estão e dela pretendem sair preparados para a atuação profis-
sional. A verdadeira questão é “como ensinar a gramática de forma mais signi-
ficativa sem lançar mão dos velhos métodos de “decoreba” e que concebem a
língua como algo acabado, tolhendo a possibilidade de análise?”
Esta obra é a prova de que descrições gramaticais podem e merecem ser feitas
com um olhar mais sofisticado, do que simplesmente insistir em um ensino que
apenas reproduza a tradição gramatical de sempre, e mostra que descrições
gramaticais mais apuradas, baseadas em estudos sociolingüísticos e não apenas
em autores consagrados da Literatura, são possíveis, embora saibamos que o
reflexo dessas discussões levará um tempo até que se veja aplicado em um
ensino de gramática mais eficaz.
Nas palavras das autoras:
já é possível enfrentar o grande desafio que se impôs quando uma grande mas-
sa de brasileiros trouxe às escolas seus falares, suas gramáticas particulares. Ao
se expor uma diversidade lingüística que, no ambiente escolar e nos livros didá-
ticos se fingia não existir, se tornou urgente uma mudança radical nas práticas
descritivas e pedagógicas. Este livro resulta do crescente interesse em atender
às exigências dessa mudança e em assumir uma posição objetiva ante a reali-
dade escolar.
Inteirar-se das discussões apresentadas nesta obra é um passo importante rumo
às respostas que precisamos encontrar. Tomara que em breve tenhamos outra
coletânea do mesmo grupo. Seria outra grata surpresa (GUIMARÃES, 2007).
Fonte: http://www.espacoacademico.com.br/079/79res_guimaraes.htm

Vejamos o levantamento das informações para análise:

Obra resenhada – Ensino de gramática: descrição e uso

Apresentação e recepção da obra – uma “passadinha” em uma livraria – grata surpresa.

Razão para a compra da obra – lançamento

Organizadoras – Silvia Rodrigues Vieira e Silvia Figueiredo Brandão

Público-alvo – professores de língua portuguesa

Avaliação da resenhista – traz luz nesse momento de desafios pelo reconhecimento da


complexidade que envolve os fatos e os usos da língua.

Citação – João Ubaldo Ribeiro – mostra relação do escritor com a gramática.

69
A PRODUÇÃO
TEXTUAL Outros textos que mostram a relação dos escritores com a gramática - Gigolô das
E O ENSINO palavras, de Luis Fernando Verissimo; Nascer no Cairo, ser fêmea do cupim, de Rubem
Braga; De Mel a pior, de Fernando Sabino; Colocador de pronomes, de Monteiro
Lobato, Emília no país da Gramática, de Monteiro Lobato.

Citação – Celso Cunha, gramático respeitadíssimo.

Outro exemplo da relação de escritor com a gramática – Machado de Assis – espantado


com a gramática de seu sobrinho.

Avaliação do resenhista quanto à organização da obra – muito bem pensada.

Fato da organização da obra – conta com capítulos de 11 docentes-pesquisadores do


Setor de Língua Portuguesa do Departamento de Letras Vernáculas da UFRJ.

Fato da organização da obra – em quatro eixos temáticos.

Fato – descrição da organização da obra: a primeira – Conceitos básicos; a segunda


– Questões de descrição gramatical; a terceira – Questões de Teoria Gramatical e
última Questão do texto.

Fato – As temáticas contempladas: Gramática, variação e normas; Saberes gramaticais


na escola; Concordância nominal; Concordância verbal; Pronomes Pessoais; Flexão e
derivação: o grau; Classes de palavras; Termos da oração; Texto e contexto.

Estrutura dos capítulos – O que diz a gramática tradicional: o cânone; a visão


tradicional.

Outros olhares – Pesquisas sociolinguísticas vêm possibilitando nas análises.

Avaliação da resenhista – A autora deste capítulo traz propostas de definições mais


exatas e que possam minimizar a problemática.

Perguntas que o livro se propõe a responder – “Como ensinar a gramática de forma


mais significativa sem lançar mão dos velhos métodos de “decoreba” e que concebem
a língua como algo acabado, tolhendo a possibilidade de análise?”.

Avaliação da resenhista – Essa obra é a prova de que descrições gramaticais podem


e merecem ser feitas com um olhar mais sofisticado, do que simplesmente insistir
em um ensino que apenas reproduza a tradição gramatical de sempre, e mostra que
descrições gramaticais mais apuradas, baseadas em estudos sociolinguísticos e não
apenas em autores consagrados da Literatura, são possíveis.

Avaliação da resenhista – Inteirar-se das discussões apresentadas nessa obra é um


passo importante rumo às respostas que precisamos encontrar.

Com este último texto, evidenciamos as partes constituintes de uma resenha: apre-
sentação da obra; do autor; a esfera de atuação do (s) autor (es); público-alvo, que
pode se interessar pela obra; avaliação da obra como um todo; avaliação da sua con-
tribuição; avaliação da organização, perspectiva teórica. Nossa resenha será tão mais

70
Gênero textual resenha:
completa quanto mais atentemos para esse detalhamento que situa os leitores de nos- da sociedade para
a universidade
sa resenha.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como mencionamos no início do capítulo, na nossa realidade do curso de Letras,
o gênero textual resenha está sempre presente, tanto na graduação quanto na pós-gra-
duação. Dessa maneira, procuramos explorar os textos na forma como aparecem co-
mumente na sociedade para chegarmos à discussão de tais textos na esfera acadêmica.
Esperamos que, mais do que escrever resenhas apenas com o propósito de entre-
gar para o professor, você possa tomar gosto por essa atividade e escrever suas rese-
nhas sempre que entrar em contato com uma nova obra literária.
Acreditamos que compreender a essência avaliativa desse tipo de texto é o ponto
primordial para adequá-lo ao universo acadêmico e às outras situações de interação
que você desejar participar. Dominar os passos para uma boa resenha é fundamental
para o seu crescimento acadêmico e para atuar em sociedade.

Referências

ANDRADE, Maria Margarida de. Como preparar trabalhos para cursos de pós-
graduação: noções práticas. São Paulo: Atlas, 1995.

CAMACHO, Roberto. Como lidar com resenhas negativas no comércio


eletrônico. [S.l.]: Ecommerce, 2009. Disponível em: <http://www.ecommerce.tv.br/
como-lidar-com-resenhas-negativas-no-comercio-eletronico>. Acesso em: 10 dez.
2009.

CARVALHO, Gisele de. Gênero como ação social em Miller e Bazerman: o conceito,
uma sugestão metodológica e um exemplo de aplicação: In. MEURER, J. L.; BONINI,
Adair; MOTTA-ROTH, Désirée (Org.). Gêneros: teorias, métodos, debates. São Paulo:
Parábola, 2005.

COSCARELLI, Carla Vianna; MITRE, Daniela. Oficina de leitura e produção de


textos: livro do professor. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2007.

71
A PRODUÇÃO ESCOBAR, Constance, Marakuthai: (mais) um thai que não é thai. São Paulo: [s.n.],
TEXTUAL
E O ENSINO 2010. Disponível em: <http://www.praquemquisermevisitar.com/brasiladentro_
marakuthai.asp>. Acesso em: 26 mar. 2010.

FORBES, Alexandra, O badalado restaurante Marakuthai em São Paulo: decepção.


São Paulo: [s.n.], 2010. Disponível em: <http://viajeaqui.abril.com.br/blog/boa-
vida/o-badalado-restaurante-marakuthai-em-sao-paulo-decepcao>. Acesso em: 26 de
março de 2010.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda, Novo dicionário da língua portuguesa. 3.


ed. Curitiba: Positivo, 2004.

GARCIA, Othon. Comunicação em prosa moderna: aprenda a escrever,


aprendendo a pensar. 18. ed. Rio de Janeiro: FGV, 2000.

GUIA BRASIL. São Paulo: Viaje Aqui, 2010. Disponível em: <http://viajeaqui.abril.
com.br/blog/guia-brasil> Acesso em: 26 mar. 2010.

GUIMARÃES, Tânia Braga. Diálogos imperdíveis. Revista Espaço Acadêmico, [S.l.],


n. 28, set. 2003. Disponível em: <http://www.espacoacademico.com.br/028/28res_
guimaraes.htm>. Acesso em: 14 mar. 2010.

GUIMARÃES, Tânia Braga. Questões de uso e gramática: respondendo aos desafios.


Revista Espaço Acadêmico, [S.l.], n. 79, set. 2007. Disponível em: <http://www.
espacoacademico.com.br/079/79res_guimaraes.htm>. Acesso em: 14 mar. 2010.

HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da língua


portuguesa. 1. ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009.

MANUAL escolar de redação: Folha de S. Paulo. São Paulo: Ática, 1994.

MANUAL da redação: Folha de S. Paulo. São Paulo: Publifolha, 2001.

MARCUSCHI, Luiz Antônio. Produção textual, análise de gêneros e compreensão.


São Paulo: Parábola, 2008.

72
SANTAELLA, Lucia. Navegar no ciberespaço: o perfil cognitivo do leitor imersivo. Gênero textual resenha:
da sociedade para
São Paulo: Paulus, 2004. a universidade

SOLÉ, Isabel. Estratégias de leitura. 6. ed. Porto Alegre: Art Med, 1998.

MOYSÉS, Carlos Alberto. Língua portuguesa: atividades de leitura e produção de


textos. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

Proposta de Atividade

1) Levando em consideração a estrutura básica do gênero textual estudado neste capítulo,


leia e analise se a resenha abaixo, de autoria de uma aluna de primeiro ano de graduação,
atende a uma estrutura mínima. Se perceber a ausência de elementos, aponte-a.
a) Faça um levantamento das informações.
b) Faça um levantamento das avaliações positivas ou negativas.

RESENHA

MARTINS, Maria Helena. O que é leitura. São Paulo: Brasiliense, 1986. 92p.

O prazer da leitura

A obra escrita por Maria Helena Martins (da editora Brasiliense, São Paulo, 1986)
tem como propósito mostrar as várias faces da leitura. É voltado para profissionais da
educação e estudantes.
Dividida em seis capítulos, no qual o ápice se encontra no quarto. No final do livro
há uma breve bibliografia para consulta.
A autora apresenta o leitor como decodificador não apenas de letras, mas de gestos,
de situações, do tempo, do espaço, enfim, fazemos leituras de tudo o que nos cerca
desde a mais tenra idade.
Martins revela esse espaço como algo mágico, como o aprendizado de Tarzan, de
Burroughs. Segundo a autora, começamos a organizar os conhecimentos adquiridos,
quando estabelecemos relações entre as experiências e tentamos resolver os problemas
que se nos apresentam, então estamos fazendo leituras, as quais nos habilitam basica-
mente a ler tudo. A psicanálise enfatiza que tudo quanto de fato impressionou a nossa
mente jamais é esquecido.
Martins declara que ler significa inteirar-se do mundo, deixar de ler pelos olhos de
outrem e aprender a dar sentido a ele.
A escritora aborda três níveis de leitura, a sensorial, a emocional e a racional.
A sensorial nos acompanha por toda a vida, pelo seu aspecto lúdico; as pessoas
compram livros por diversos motivos, tamanho, formato, visual e até pelo cheiro, é o
prazer pela simples posse da erudição, o que conta é a impressão em nossos sentidos.
A emocional é a mais comum de quem gosta de ler, talvez a que dê maior prazer,
nos identificamos com o que lemos. É essa que vem de encontro com as fantasias mais
comuns, podendo ser de evasão.

73
A PRODUÇÃO A racional foi concebida e é mantida por uma elite, a dos intelectuais, que reservam
TEXTUAL a si o direito de ditar normas quanto às escolhas literárias adequadas. Neste momento,
E O ENSINO
Martins salienta seu caráter reflexivo e dinâmico. Estabelece uma ponte entre o leitor e
o conhecimento, entre a reordenação do mundo objetivo. Na leitura racional, o leitor
visa o texto, tendo como propósito a indagação.
A obra é de linguagem clara e agradável, é apresentada para entendermos o quanto
é importante, lermos de forma abrangente favorecendo assim nossas capacidades de
compreensão do texto escrito, procurando aprimorá-la para que a leitura se torne cada
vez mais gratificante sendo prazerosa.

2) Agora que você está instrumentalizado dos elementos necessários para fazer uma resenha
adequada, está na hora de praticar. Procure o livro de Maria Helena Martins, O que é
leitura, da Editora Brasiliense. Faça a sua leitura da obra e a sua resenha.
a) Após a leitura da obra e a elaboração da sua resenha, faça uma comparação com a
resenha acima.

Anotações

74
4 O processo de
produção textual

Renilson José Menegassi

1 AS CONCEPÇÕES DE ESCRITA
O ensino da produção textual escrita em língua materna passou, ao longo da histó-
ria da educação brasileira, por várias concepções de escrita, que se estabeleceram em
função das concepções de linguagem e de ensino vigentes em cada período histórico.
Assim, são conhecidas quatro concepções de escrita:
- Escrita com foco na língua;
- Escrita como dom/inspiração;
- Escrita como consequência;
- Escrita como trabalho.
As duas primeiras concepções estão voltadas às pressuposições teórico-metodo-
lógicas da concepção de linguagem como expressão do pensamento (KOCH; ELIAS,
2009), em que o domínio de regras gramaticais é o princípio para a construção de
um texto escrito. Consequentemente, esse domínio é de poucos, somente daqueles
que apresentam “inspiração divina”, que nascem com “o dom de escrever”, conforme
determinavam as ideias platonianas que deram origem a essa metáfora. Por outro lado,
a concepção de escrita com consequência (SERCUNDES, 1997) é abordada pela con-
cepção de linguagem como instrumento de comunicação, em que basta a aquisição de
estruturas linguísticas de uma determinada língua para que um indivíduo esteja apto
a desenvolver um texto escrito. Por fim, a concepção de escrita como trabalho, que
é abordada na concepção interacionista de linguagem (GERALDI, 1993, 2001; FIAD;
MAYRINK-SABINSON, 1994; KOCH; ELIAS, 2009).

1.1 A escrita com foco na língua


É muito frequente um professor de Língua Portuguesa, ou até mesmo qualquer
pessoa que avalie textos escritos, ao se deparar como uma produção textual, tenha
como primeira reação corrigir, diretamente no texto, erros de grafia, desvios de con-
cordância e sintaxe. Tal postura evidencia a concepção de escrita com foco na língua

75
A PRODUÇÃO que essa pessoa tem internalizada como procedimento metodológico de trabalho com
TEXTUAL
E O ENSINO o texto escrito.
Para que essa concepção de estabeleça, são apresentados ao aluno muitas regras
gramaticais e vários exercícios de gramática com o fim de que internalize todas as
funções gramaticais e perspectivas linguísticas que a língua erudita fornece (KOCH;
ELIAS, 2009). Para tanto, este realiza inúmeros exercícios sobre sinais de pontuação,
grafia de palavras, concordância, regência, colocação pronominal e muitos outros tópi-
cos da gramática tradicional. Assim, com essas regras internalizadas, o aluno produzirá
seu texto dentro da norma padrão escrita. Por isso muitos alunos afirmam que escre-
ver é conhecer as regras gramaticais da língua, é ter um bom vocabulário, porque, na
realidade, são esses os critérios que normalmente são empregados para se avaliar seus
textos.
Exemplo de solicitação de produção textual nessa concepção ocorre em situações
como a descrita:

Os alunos trabalharam com dois exercícios que discutiam as regras de apresentação de


adjetivo anteposto e posposto ao substantivo. Num deles, havia atividades de adjetivos
pospostos; no outro, atividades com adjetivos antepostos. Em seguida, é oferecido um
comando de produção escrita ao aluno:

“Escreva algumas linhas sobre a responsabilidade do profissional em qualquer área de


trabalho. Não se esqueça de empregar adjetivos antepostos e pospostos, conforme a
necessidade da descrição realizada no texto.”

Nessa produção escrita, o aluno tem como objetivo apenas a escrita de poucas
linhas, porém deve-se atentar à utilização do adjetivo e às posições que ocupa na frase,
evidenciando-se a concepção de escrita com foco na língua.

1.2 A escrita como dom/inspiração divina


Nessa concepção, a produção textual escrita nasce de um título, de uma frase que
expõe um tema ao aluno para que produza um texto, sem qualquer atividade prévia
de sustentação de informações ou, até mesmo, de consolidação de ideias para o de-
senvolvimento do texto (SERCUNDES, 1997). Neste sentido, o autor do texto produz
apenas a partir das informações internalizadas sobre o assunto, que é pressuposto
como conhecido e divulgado pelos meios de comunicação, sem qualquer discussão
sobre o tema. De certa maneira, essa estratégia de produção ocupa o espaço de tempo
do aluno e mantém a disciplina na sala de aula, evitando que o aluno circule pela sala
e pela escola, fazendo com que o seu comportamento seja controlado pela escrita
que deve produzir, e não pela interação que deveria se estabelecer com a situação de
produção textual.

76
Nessa perspectiva, o autor, no caso o aluno, pensa que o ato de escrever é articular O processo de
produção textual
informações, de maneira a exteriorizar logicamente o pensamento, suas intenções,
sem levar em conta as experiências e os conhecimentos do leitor ou a interação que
envolve esse processo. Dessa forma, o compromisso com o ato de escrever se dilui, já
que o aluno é consciente de que o professor apenas irá recolher as redações e vistá-las,
apresentando a marca √ diretamente no texto, que significa “visto pelo professor”, do
verbo “ver”, e não “lido pelo professor”, como efetivamente deveria acontecer.
Um exemplo típico dessa concepção de escrita ocorre quando, na sala de aula, o
professor coloca no quadro uma frase como:

“Amazônia: o pulmão do mundo”

e solicita dos alunos a produção de uma redação sobre esse tema. O aluno deverá
buscar em seus conhecimentos e nas informações que conhece subsídios para escre-
ver um texto; para isso, basta que tenha o “dom divino” ou a “inspiração divina” para
produzi-lo, em uma recorrência a poderes espirituais divinos para escrever, conforme
sustentavam os antigos escribas dos templos religiosos. O resultado dessa abordagem
metodológica é um texto sem finalidade marcada, sem interlocutor definido, sem gê-
nero textual proposto e, consequentemente, sem objetivo para produção. Essa con-
cepção de escrita ocorreu como abordagem de trabalho por muitos anos e ainda é
empregada em muitas salas de aula.

1.3 A escrita como consequência


Nessa concepção, a escrita é uma consequência de um trabalho realizado na sala ou
extraclasse, de maneira homogeneizada. Na sala de aula, o aluno é conduzido à reali-
zação de uma pesquisa, a assistir a um filme, a participar de um debate (SERCUNDES,
1997). Na situação extraclasse, o aluno é levado a um passeio, a visitar determinado
lugar escolhido pela professora, enfim, a alguma atividade que o retire do perímetro
escolar. Em ambas as situações, a consequência por realizar uma atividade diferenciada
das tradicionais é a produção escrita, normalmente de um relatório, que será visto (√)
pelo professor, não necessariamente lido e corrigido. Assim, fica a impressão de que a
penalidade por ter realizado uma atividade motivadora de interação, dentro ou fora da
sala de aula, é a produção de um texto escrito.
Nessa perspectiva, o texto produzido pelo aluno é visto como:
- um registro escrito que serve para a atribuição de uma nota;
- um registro escrito que penaliza o aluno pela atividade extra realizada;
- um registro escrito que comprova que o aluno participou da atividade proposta,
não necessariamente que a compreendeu;
77
A PRODUÇÃO - um produto para a correção do professor;
TEXTUAL
E O ENSINO - um produto que leva o professor à comparação com os textos mais fracos;
- um produto da avaliação da atividade realizada.

Nessa concepção, não há consideração do tempo de sedimentação necessário


para a internalização dos conhecimentos e das informações que o aluno recebeu
( VYGOTSKY, 1998; SERCUNDES, 1997; MENEGASSI; OHUSCHI, 2008). O texto deve
ser escrito logo em seguida, entregue e avaliado com rapidez, para que uma nova ativi-
dade possa ser implementada em sala de aula. Neste sentido, desconsidera-se que cada
aluno tem seu próprio tempo de sedimentação de informações, o qual se estabelece
em função da finalidade proposta para o trabalho de produção escrita.
Um exemplo de trabalho com essa abordagem acontece quando o professor leva
os alunos de uma determinada série para a estação de tratamento de água da cidade,
para que aprendam de onde vem a água que bebem, como é tratada e distribuída
diretamente às casas dos moradores. Nesse processo, é comum observar os alunos
munidos de caderno ou prancheta e caneta anotando o que for possível das inúmeras
informações que o técnico da empresa de tratamento de água repassa. Nesse caso, a
preocupação em anotar informações para a produção do relatório a ser entregue é
maior do que a de aprender sobre o tratamento de água, pois a finalidade de estar
ali tem como consequência a produção do relatório a ser entregue ao professor, que
normalmente apenas o vista.

1.4 A escrita como trabalho


Nessa concepção, a escrita é considerada um processo contínuo de ensino e apren-
dizagem, em que há reais necessidades para o aluno escrever. Assim, as atividades
prévias são essenciais como pontos de partida para se desencadear uma proposta de
escrita a partir da interação (SERCUNDES, 1997). Nela, o texto é o ponto de partida
e de chegada a novas produções (GERALDI, 1993), constituindo-se também como o
lugar de interação aos participantes desse processo (BAKHTIN; VOLOCHINOV, 1992;
BAKHTIN, 2003; GERALDI, 1993); no caso, o professor, o aluno e o próprio texto em
construção.
Para que se produza o texto escrito, o autor passa pelas etapas do processo: plane-
jamento – execução do texto escrito – revisão – reescrita. Nelas, o professor auxilia
como co-produtor do texto, orientando sempre a finalidade, o interlocutor e o gênero
a ser produzido (MENEGASSI, 2003). Nesse âmbito, a escrita é um trabalho consciente,
deliberado, planejado, repensado, por isso a denominação “trabalho” para essa con-
cepção. É no trabalho de planejamento que as atividades prévias são aproveitadas e

78
orientadas para a execução da escrita. Nessa etapa, o aluno considera a finalidade, o in- O processo de
produção textual
terlocutor eleito e o gênero textual escolhido para trabalhar sobre o tema, a organiza-
ção composicional e o estilo de língua na produção textual (BAKHTIN, 2003). Por sua
vez, nos processos de revisão nasce a reescrita, que leva a modificações no texto inicial,
considerando-se os elementos já mencionados. Por isso essa concepção de escrita é
conhecida como “trabalho”, porque dá trabalho preparar, construir, revisar, reescrever
e avaliar um texto, por isso mesmo, ela é considerada como pertencente à abordagem
processual-discursiva de escrita, distinguindo-se das concepções já discutidas.
Como exemplo dessa concepção de escrita, observemos a descrição da atividade
que levou alunos à estação de tratamento de água e à produção do relatório advindo
desse trabalho. Evidentemente, essa proposta é uma ampliação daquela exposta na
concepção de escrita como consequência, que precisa ser adaptada à série, à fina-
lidade, ao interlocutor e ao gênero textual definidos previamente. A atividade está
adequada aos propósitos da concepção de escrita como trabalho, sendo pertinente às
propostas teórico-metodológicas atuais.

Tema: O tratamento da água que bebemos

I - Leitura e trabalho com textos envolvendo a temática sobre água em algu-


mas disciplinas, em uma relação interdisciplinar:
• Língua Portuguesa – poema, letra de música;
• Ciências – texto científico sobre a composição e o tratamento de água;
• História – o uso da água ao longo da história humana e as formas de trata-
mento empregadas;
• Geografia – as localizações e utilizações de mananciais de água para consu-
mo humano;
• Matemática – as medidas e formas de envasamento da água.

II - Delimitação da finalidade, do interlocutor e do gênero textual que será


produzido:
• Finalidade: apresentar como ocorre o processo de captação, tratamento,
armazenamento e distribuição da água para consumo humano;
• Interlocutor: alunos das séries que participaram da visita à estação de trata-
mento de água;
• Gênero textual: relato de experiência;
• Suporte textual: folha de papel sulfite;
• Meio de circulação social: quadro de madeira exposto no corredor da escola.

79
A PRODUÇÃO III - Delimitação de regras entre os participantes:
TEXTUAL
E O ENSINO a) Escribas: escolha de duas pessoas na sala que farão o papel de escribas, isto
é, aqueles que anotarão as informações importantes que os participantes
determinarem como relevantes. Devemos observar que não são anotações
que os escribas determinarão como pertinentes, mas sim aquelas que os
participantes, os alunos da sala, escolherem;
b) Participantes: não levarão material para anotações, contudo deverão repas-
sar aos escribas quais são as informações mais relevantes que são expostas
durante a visita. Um detalhe, nesse caso, é que as informações não podem
se repetir, o que leva cada participante a prestar atenção em quais delas já
foram apresentadas aos escribas.

IV - Planejamento do texto:
Em dia posterior, todas as anotações realizadas pelos escribas são expostas no
quadro, para visualização geral. A partir disso, inicia-se o processo de planejamen-
to do gênero textual escolhido:
a) levantamento de todas as informações no quadro;
b) observações de quais informações são repetidas;
c) eliminação das informações repetidas e/ou desarticuladas com o tema;
d) escolha de dez ou mais informações principais, que representem o conjunto
de informações levantadas;
e) encaminhamento da produção do relato de experiência.

V - Execução do texto:
• O aluno, de posse das dez principais informações levantadas na visita à
estação de tratamento de água, produz o texto solicitado, de maneira indi-
vidual ou coletiva, conforme orientação docente. Essa produção pode ser
realizada na sala de aula, ou até mesmo em casa.

VI - Revisão do texto:
• Os textos são revisados de duas maneiras: a) pelo próprio aluno; b) por um
de seus pares da sala de aula. Nessa revisão, deve-se observar que as dez in-
formações levantadas como as principais devem ser analisadas, para que se
verifique se estão constando completamente do texto produzido. Caso falte
uma delas, o aluno deve reescrever seu texto à luz desse levantamento. Ou-
tra situação é observar se, no texto produzido, há alguma informação que
não está suficientemente esclarecida, articulada, relacionada e coesa com o

80
texto construído. Caso isso aconteça, o processo de reescrita é ativado. O processo de
produção textual

VII - Avaliação do texto:


• Todo texto deve ser avaliado com critérios que sejam apresentados ante-
riormente ao aluno. Assim, devemos apresentar aos participantes o critério
inicial de que seu texto será avaliado a partir da exposição das dez informa-
ções consideradas mais relevantes para toda a classe. Com isso, o professor
faz a avaliação de um texto muito mais completo, já pensado e modificado
pelo aluno, em uma nítida configuração de que o processo de escrita está
sendo efetivamente implementado.

VIII - Circulação social do texto:


• Após todo esse trabalho, o texto é exposto no quadro de madeira no cor-
redor da escola, para que os alunos que não foram à estação de tratamento
de água conheçam como é o processo a partir dos relatos de experiências
apresentados à comunidade da escola.

Como podemos observar, o trabalho de produção textual escrita, nessa concepção,


é muito diferente daqueles descritos nas seções que discutem as demais concepções
de escrita. Com isso, podemos afirmar, categoricamente, que escrever é um trabalho
deliberado, pensado, interativo, dialógico e produtivo! Assim, essa é a proposta ideal
para a efetivação da produção de textos em situação de ensino.

2 AS CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO DOS TEXTOS


O produtor de um texto necessariamente precisa receber alguns dados para a rea-
lização de um texto mais completo, dentro de um contexto sociocomunicativo deter-
minado. Para tanto o professor, ou o material didático, lhe oferece alguns elementos
específicos, os quais, reunidos, recebem a denominação ‘condições de produção’, que
servem como orientação para o produtor no momento do planejamento, execução,
revisão e reescrita do seu texto. Assim, os elementos que compõem o comando de
produção textual são: finalidade, interlocutor, gênero textual, suporte do texto, circu-
lação social, posição do autor, definidos nas obras de Bakhtin e seu Círculo (BAKHTIN;
VOLOCHINOV, 1992; BAKHTIN, 2003). Cada um dos itens componentes dessas con-
dições é explicitado.

2.1 Os elementos das condições de produção


Finalidade: para que fim se vai escrever o texto, qual é o seu objetivo definido.

81
A PRODUÇÃO Normalmente, a finalidade não tem uma caracterização certa no material didático, sen-
TEXTUAL
E O ENSINO do determinada, na maioria dos casos, pelo professor a partir da exposição oral, da ex-
plicação do que é para ser feito na produção textual dos alunos. Assim, na discussão da
leitura compartilhada dos textos que adentram a sala de aula, já nascem as primeiras
manifestações de finalidade para se escrever um texto. Na discussão com os leitores,
à luz da realidade sócio-histórico-ideológica dos leitores e dos participantes da intera-
ção – texto-alunos-professor – surge a finalidade real e social para a produção de um
texto. Neste sentido, a determinação de uma finalidade de escrita deve originar-se do
conjunto de trocas estabelecidas entre os leitores e o texto. Isto significa que, muitas
vezes, a finalidade apresentada no material didático pode ser substituída pelo profes-
sor em função da realidade de seus alunos, configurando-se como uma perspectiva
pedagógica muito mais coerente.
É preciso que o professor e o aluno encontrem uma motivação para o trabalho a
ser executado. Com isso, o aluno deve perceber que seu texto é o resultado de uma
necessidade real de expressão escrita, não um exercício de imaginação somente, des-
vinculado completamente da realidade sócio-histórica em que vive, que não se traduz
em uma forma de interação com o próprio mundo. Sem a finalidade, corre-se o risco
de que o exercício de produção textual transforme-se em uma tarefa sem sentido,
penosa, o que, gradativamente, afasta o aluno da própria escrita. Para tal, o professor
precisa estar atento ao que acontece em sala de aula, ao mundo em que vivem seus
alunos, a fim de que possa tirar situações de escrita que façam algum sentido, ou que,
mesmo não sendo completamente reais, aproximem-se dessas situações e da realidade
econômica, social e cultural dos alunos.
Quando a finalidade da produção textual é definida, surge o segundo elemento das
condições de produção: para quem se escreve, o interlocutor.

Interlocutor: a pessoa a quem o produtor do texto se dirige; com quem vai dialo-
gar na escrita sobre a temática definida, sobre o texto lido; a quem argumenta, comen-
ta, critica as informações e ideias apresentadas no texto.
De acordo com Bakhtin; Volochinov (1992, p. 60), o “outro”, o interlocutor, pode
ser visto sob três perspectivas, como real, virtual e superior. O primeiro tipo é o “real”,
ou seja, aquele que tem uma imagem física e está presente durante o processo dialógi-
co. Por exemplo, em uma situação escolar, é possível dizer que o interlocutor real é o
professor, com o qual o aluno tem um contato face a face, direto. A questão aqui é fazer
com que esse interlocutor real professor seja visto como um mediador do processo de
produção de texto, como um co-produtor, não como o único leitor, com papel exclusi-
vo de corretor e avaliador do texto do aluno. Assim, o professor deve ter a consciência

82
de que está ao lado do aluno para ajudar na mediação da produção textual, auxiliando- O processo de
produção textual
o nas suas dúvidas e conduzindo-o à facção da escrita.
O segundo interlocutor é o “ideal/virtual”, que tem sua imagem construída pelo
aluno. Por exemplo, em um contexto de Concurso Vestibular, o interlocutor virtual do
aluno é a banca examinadora, que é responsável por ler o que foi produzido e atribuir
um conceito à avaliação. Desse modo, o aluno escreve um texto para alguém virtual
que não conhece, mas tem consciência de que esse interlocutor já traçou algumas
regras de produção que devem ser seguidas para que se tenha um bom texto. Logo,
observa-se que, mesmo não havendo a presença física desse interlocutor, ele interfere
diretamente na escrita do aluno, pois os estudantes escrevem com o intuito de agradar
à banca, que são professores de Língua Portuguesa, e o aluno conhece as característi-
cas desse interlocutor; consequentemente, espera ser aprovado.
O professor, interlocutor real no processo, auxilia o aluno na definição do interlo-
cutor virtual, que é, na verdade, o leitor a quem o texto se dirige. Dessa forma, tanto
o professor quanto o aluno devem ter esclarecido a quem se destina o texto que está
sendo produzido, para que se possam escolher as informações relevantes e o estilo de
linguagem próprio desse interlocutor, tão importante quanto o real.
A terceira forma de interlocutor é o superior, que se refere a um representante ofi-
cial responsável por constituir padrões e regras que são respeitados no meio social em
que o produtor do texto convive. No exemplo do Concurso Vestibular, o interlocutor
superior é a instituição de ensino superior, que impõe seus padrões e faz com que o
aluno os siga ao escrever seu texto. Segundo Bakhtin; Volochinov (1992, p. 112), o
indivíduo possui dentro de si um “auditório social” definido que rege todo o momento
de sua escrita, fazendo com que o aluno, pensando-se na situação de ensino, escreva
seguindo os parâmetros sociais. É necessário atentar para os padrões da instituição
para a qual se escreve para que o texto seja aceito; porém o aluno não pode deixar de
expor o seu pensamento e sua posição sobre o assunto, permanecendo preso às ideias
do texto-apoio, produzindo apenas a cópia do proposto pela instituição. O estudante
pode utilizar as informações da prova do Vestibular, mas, também, deve se posicionar
e demonstrar o que pensa acerca do assunto. Sobre essa questão, Garcez (1998, p. 77)
afirma que a noção de autoria, nos textos dos alunos, é difusa, porque, ao escrever, o
estudante realiza uma imitação dos textos lidos e dos comandos, não demonstrando,
assim, sua opinião sobre o assunto e não produzindo um texto com sua autoria em
virtude da extrema imagem que o interlocutor real e virtual produz em sua mente no
momento da enunciação.
Assim, o professor, na condição de interlocutor real do aluno, conduz as discussões
e a produção do texto considerando-se esse interlocutor superior, que determina as

83
A PRODUÇÃO formas de dizer e como dizer. Com essa orientação, o aluno consegue estabelecer pa-
TEXTUAL
E O ENSINO râmetros de avaliação de seu texto, a partir das regras sociais delimitadas à produção,
circulação e recepção dos textos no meio em que vive.
Para o trabalho com a produção textual, deve-se enfatizar a determinação dos in-
terlocutores real e virtual, considerando-se, é claro, o superior, como o delimitador
das formas textuais-discursivas do gênero escolhido para a interação. Em um possível
esquema, temos:

INTERLOCUTOR REAL

SUPERIOR

VIRTUAL

Gênero textual: definição do tipo de texto que será produzido, que já circula na
sociedade, considerando-se a realidade social e histórica em que vive o autor do texto
e seus leitores. O gênero é definido em função da finalidade e do interlocutor da escri-
ta, que são sempre delineados anteriormente. O gênero escolhido tem características
certas, apontadas por Bakhtin (2003):
• temática definida – o gênero escolhido comporta em si uma temática certa, isto
é, o tema é apresentado em um gênero específico; nem todo tema serve para
qualquer gênero discursivo; este define o estilo de temática a ser apresentada.
Na apresentação do tema, o autor do texto apresenta o recorte necessário, e o
faz à luz de suas necessidades, em função da finalidade e do interlocutor eleito;
• estrutura composicional definida – o gênero escolhido tem uma estrutura certa,
que é definida pela sociedade; assim, ao escolher determinado texto, este deve
necessariamente seguir a estrutura composicional que a sociedade estabeleceu;
neste sentido, em função da finalidade e do interlocutor, determinam-se:
- a distribuição das informações no texto, em sua ordem de importância de
apresentação;
- a composição geral (diagramação típica), fotos, ilustrações, gráficos e outros
tipos de figuras ou de recursos que utilizará, quando necessário;
- as características composicionais do gênero: o texto verbal, os elementos não-
verbais que o compõem, por exemplo: em uma reportagem de revista: tamanho

84
e tipo de letras, título, divisões do texto, foto, cores, posição na página, na revis- O processo de
produção textual
ta, tamanho do texto e das fotos, tipo de revista em que está publicada etc.

São características sócio-historicamente estabelecidas para o gênero, em função da


realidade em que ele circula;
• estilo de linguagem – adequação da linguagem, da variação linguística própria,
escolha de vocabulário, de estruturas em função do gênero textual definido, da
finalidade e do interlocutor.

Suporte material do texto: o texto circula sempre em um determinado espaço,


em um determinado veículo. Por exemplo, o texto de uma história da Magali tem
como suporte textual a revista de história em quadrinhos, o gibi, em que se encontra
para leitura. Um bilhete, outro exemplo, que deixamos em casa para nossa família, tem
como suporte textual um pedaço de papel pequeno. Já uma letra de música tem como
suporte textual o encarte que vem junto com o CD. Assim, a definição do suporte tex-
tual é parte inerente do projeto de produção de texto. Dessa forma, é necessário, em
função da definição do gênero escolhido, que se determine qual o suporte do texto
produzido, o que o articula com o meio social de sua circulação.

Circulação social: como o gênero produzido circulará na sociedade, definem-se


por quais meios ele chega ao seu interlocutor, isto é,
a) o suporte do texto no qual o gênero circula apresenta características determi-
nadas (papel, livro, embalagem, suporte metálico, de madeira, revista, jornal,
e-mail etc.);
b) a forma que chega ao interlocutor eleito; como o texto irá às mãos de seu
leitor-alvo.

Posição do autor: a posição de autor que o produtor do texto apresenta ao seu


leitor. O produtor de um texto geralmente deixa marcas de sua individualidade e de
seu mundo no texto que produz. Assim, através da materialidade linguística, consegue-
se descobrir qual a intenção do autor de determinado texto, assim como, também,
descobrir-se: a) sua posição frente a determinado tema; b) seus argumentos para sus-
tentar o ponto de vista; c) marcas de seu discurso sobre o tema discutido.
Com esses elementos em processo de consciência do autor, seu texto apresenta
maiores probabilidades de ser uma manifestação de linguagem escrita mais adequada
à situação sociocomunicativa em que se encontra.

85
A PRODUÇÃO 2.2 Condições de produção: redação x produção de texto
TEXTUAL
E O ENSINO Os elementos das condições de produção do texto escrito foram muito discutidos
por Geraldi (1993, p. 137), que os sistematizou em cinco:
a) “se tenha o que dizer” - o produtor do texto tenha conteúdo para expressar;
b) “se tenha uma razão para dizer o que se tem a dizer” – o produtor do texto
tenha uma finalidade definida para escrever;
c) “se tenha para quem dizer o que se tem a dizer” – o interlocutor seja marcado
em função da finalidade definida;
d) “o locutor se constitua como tal, enquanto sujeito que diz o que diz para quem
diz” – o produtor do texto se constitua como autor, que deixa suas marcas de
individualidade e posição no texto produzido;
e) “se escolham as estratégias” para produzir o texto;

No bojo da caracterização das condições de produção, Geraldi (1993; 2001) levan-


ta outra discussão, estabelecendo diferenças teórico-metodológicas entre “redação” e
“produção de texto”, termos normalmente empregados no meio escolar, sem distinção
explícita. Para o autor, redação são textos produzidos exclusivamente para a escola,
cuja finalidade é agradar o professor ou alcançar uma pontuação para ser aprovado; o
interlocutor é sempre o professor, sem se considerar o interlocutor virtual; o gênero
textual é sempre uma dissertação ou uma narração, com predominância da primeira,
ou até mesmo a não caracterização de um gênero textual; o suporte do texto é sempre
o caderno ou uma folha de caderno ou de sulfite solta; a circulação social é sempre a
sala de aula; a posição de autor é a de agradar ao professor. Neste sentido, são produ-
zidos textos artificiais, que não desenvolvem a escrita do aluno.
Por outro lado, no conceito de produção de texto, a construção é realizada na es-
cola, tendo a sociedade como alvo maior. Dessa forma, a finalidade é sempre definida
por uma determinada questão social real; o interlocutor real é o professor, contudo,
o virtual é marcado como um membro específico do corpo social; o gênero textual é
definido em função do interlocutor e do lugar de circulação do texto; por sua vez, o
suporte textual também é definido à luz dos elementos anteriores; e a circulação social
é marcada pelos membros do grupo social a que se deseja atingir. Com isso, a posição
de autor é assinalada como a de sujeito social que expõe sua opinião a partir da con-
trapalavra produzida em uma situação comunicativa definida.
Para elucidar as características que definem esses dois conceitos, observemos o
quadro sinótico, que apresenta e resume as diferenças entre redação e produção de
texto.

86
O processo de
produção textual
REDAÇÃO PRODUÇÃO DE TEXTO

- São textos produzidos para a escola. - O texto é o ponto de partida e de chega-


da para o processo de ensino e aprendiza-
- Na sua realização, há muitos exercícios
gem da língua escrita.
de escrita, como cópia, por exemplo, e
poucos textos produzidos efetivamente. - Na escrita, o aluno articula um ponto de
vista sobre o mundo, expondo-o ao leitor.
- Não se conta algo vivenciado pelo aluno,
pois isto não merece ser contado para - A escola é o lugar em que os textos são
outrem. produzidos e a sociedade é o lugar em
que circulam.
- A única razão para se escrever é mostrar
que sabe escrever; assim, a finalidade - A escrita é o espaço de interação entre o
para se expressar e o conteúdo dessa ex- autor e o interlocutor, tendo a mediação
pressão se anulam através da repetição do professor.
de palavras alheias.
- Em sala de aula, há discussões sobre as
- A escrita é artificial. leituras, entre aluno e professor, buscan-
do-se as palavras próprias do produtor
-  O produtor apresenta dificuldades na
para auxiliar na produção textual.
escolha e execução das estratégias para
escrever. - As respostas do professor são opiniões
pessoais sobre o texto, não são verdades
- O professor tem a função apenas de re-
a serem incorporadas pelo aluno.
visor do texto, apontando aspectos for-
mais. - As palavras escritas do aluno são camin-
hos possíveis de serem trilhados para a
- O aluno apenas apropria-se da língua
compreensão de seus saberes e as estra-
para organizar seus pensamentos e expô-
tégias escolhidas para a produção textual.
los na escrita.
- Os sentidos para o texto lido e o texto
- O professor é fonte de saber, enquanto o
produzido, considerando-se aqui que são
aluno é um receptáculo para receber esse
duas manifestações de linguagem dis-
saber.
tintas, são produzidos na interação entre
o texto e seus interlocutores.
- Alunos e professores aprendem e ensi-
nam uns aos outros com textos, em um
processo dialógico em que os sentidos
são produzidos em interação verbal.

Um exemplo de redação é o texto produzido por aluno da 7ª série, cujo proces-


so de produção não foi considerado a partir das condições de produção próprias. O
aluno apenas recebeu por escrito o comando que ordenava a produção de um texto a
partir de uma frase.

87
A PRODUÇÃO
TEXTUAL Recordando nossos estudos e nossas reflexões sobre o conteúdo, produza um pe-
E O ENSINO queno texto a partir dessa frase: “Argumentar é ordenar ideias”.

As nossas ideias de hoje em dia são muito baguncadas.


Com a argumentação nossa ideias ficam em ordem. Com o argumento além de você
arrumar suas ideias e também ter uma boa explicação se você quiser algo.
Ordenar nossas ideias seria também ordenar o nosso dia-a-dia corrido. Uma pessoas
que não tem seu pensamento arrumado tem varios problemas ao trabahar a pessoa
sente cansaso sem seu pensamento organizado a pessoa com o pensamento organizado
te seu dia-a-dia tranquilo no trabalho e em casa.

COMENTÁRIO DO PROFESSOR: Está bom, mas ainda pode melhorar!

Nesse texto, observamos que o aluno produziu uma escrita sem finalidade definida,
para um interlocutor único que é o professor, sem um gênero textual certo, consequen-
temente, sem o suporte textual e o meio de circulação social marcados. Com tudo isso
sem delimitação inicial, a posição do autor não se constitui no texto de maneira visível,
mesmo notando-se a manifestação de seu ponto de vista sobre a frase proposta para a
produção de texto: “a pessoa precisa ter pensamentos organizados para argumentar”,
porém não consegue expressá-lo adequadamente. Assim, esse texto é considerado uma
redação escolar à luz das características descritas no quadro, o qual resume e diferencia
redação de produção textual. Além do mais, a observação do professor “Está bom, mas
ainda pode melhorar!” não contribui em nada com o processo de escrita do texto, uma
vez que não oferece sugestões de melhoria ao aluno, apenas afirma que pode melhorar,
sem apontar exatamente o que fazer. Neste sentido, textos produzidos a partir da deli-
mitação falha das condições de produção levam o aluno à produção de uma redação.
O texto a seguir também é uma produção de aluno da 7ª série, em que o processo
que lhe deu origem é considerado e ao aluno é solicitada e permitida uma posição
definida sobre o texto. Dessa forma, o texto apresenta justificativa definida, com inter-
locutor marcado e gênero textual determinado; consequentemente, o suporte textual
e a circulação social passam a ser definidos.

Redija uma resposta argumentativa sobre o que você pensa a respeito do bullying,
considerando as leituras e estudos realizados em sala de aula. Seu texto será escrito
numa folha de papel sulfite, em até 15 linhas, e exposto no Jornal Mural do colégio para
que toda a comunidade escolar possa lê-lo, observando sua posição justificada sobre o
tema.

A nossa opinião sobre o bullying é que na maioria das vezes é uma agressão que
passa despercebida e pode deixar marcas no psicológico da pessoa, isso porque é uma
humilhação e ninguém gosta de ser humilhado e ter seus defeitos apontados. Por exem-
plo: uma pessoa com uma característica física que se destaca, como um nariz maior,
por ser muito magra ou obesa, em alguns casos essa agressão pode levar a depressão e
consequentemente o abandono dos estudos e da vida social.

88
Nesse texto, as condições de produção foram delimitadas no comando oferecido O processo de
produção textual
para que o aluno realizasse sua escrita:
• Finalidade: expor o que pensa a respeito do bullying;
• Interlocutor: real = o professor; virtual = a comunidade escolar;
• Gênero textual: resposta argumentativa;
• Suporte textual: papel sulfite;
• Circulação social: Jornal Mural da escola;
• Posição do autor: definir e posicionar-se sobre o que pensa a respeito do bullying.

Por apresentar os elementos no comando, o texto produzido teve maior determina-


ção em suas condições de produção iniciais, orientando o aluno ao que deveria fazer.
Dessa maneira, a diferença formal e de conteúdo entre os dois exemplos mostram
como os conceitos de redação e de produção textual são fundamentais para a compre-
ensão das condições de produção da escrita em situação de ensino.
A partir dessa distinção conceitual, muitos trabalhos sobre produção textual na
escola foram conduzidos, tendo-se a noção de que a escrita é trabalho, considerando-
se as etapas necessárias ao processo de produção de texto, sendo a proposta teórico-
metodológica mais coerente para a condução do ensino de escrita na escola.

3 O PROCESSO DE PRODUÇÃO TEXTUAL


A partir de estudos sobre a construção do texto escrito, realizados na década de
1980, no Brasil, iniciou-se uma preocupação em observar a produção do texto e seu
produto final como um processo que se compõe de etapas interligadas e recursivas e
não como um mero ato de escrita, como até então se propunha.
Os estudos realizados, especialmente em centros de pesquisas americanos e ingle-
ses, demonstraram, a partir de experiências em laboratórios de produção de textos,
que o processamento de construção de um texto passa por três grandes etapas: o
planejamento, a execução e a revisão. Para compreender essa visão processual, foram
concebidos modelos teóricos de base cognitiva que pretendem dar conta de como o
processamento da escrita ocorre no homem.
Esses modelos foram criados com fim ilustrativo, para explicar um processamento
cognitivo que muitas vezes não obedece rigidamente às etapas sistematicamente pro-
postas; são apenas referências visuais para a compreensão dos modelos teóricos, ser-
vindo como apoio didático. Caso não sejam vistos assim, eles servirão possivelmente
de estímulo a um treinamento mecânico da escrita, devido ao modo como as etapas
são propostas. Um leitor desavisado, sem tal consciência, que no caso pode ser um
professor, fará interpretações equivocadas, tendendo a compreender a escrita como

89
A PRODUÇÃO um conjunto de etapas rigidamente estabelecidas.
TEXTUAL
E O ENSINO Assim, para esclarecer como se concebe o processo de produção textual, passamos
a discutir cada uma de suas etapas.

Planejamento – No planejamento da produção textual, podemos pensar em duas


estratégias:
a) trabalho com textos junto ao aluno, com o objetivo de fundamentá-lo com infor-
mações necessárias à produção futura;
b) levantamento de informações no conhecimento de mundo do aluno sobre o
tema apresentado para produção de texto.

No primeiro caso, os textos escolhidos são base para que o aluno selecione quais
informações são úteis e necessárias a sua produção escrita. Nesse trabalho, o levanta-
mento de informações a partir do resumo é uma estratégia eficaz, que permite ao alu-
no o domínio geral das ideias do texto. A partir desse levantamento, o produtor deve
selecionar dentre todas quais podem ser aproveitadas em função de seu propósito co-
municativo, da finalidade marcada para a produção escrita. Nessa estratégia, tomamos
o cuidado para não escolher informações que não se articulam e se relacionam, o que
causa dificuldades ao autor no momento de executar sua escrita.
No segundo caso, muito mais trabalhoso, o aluno busca informações apenas na
sua memória, em seus conhecimentos prévios armazenados sobre o tema apresentado
para a produção textual. Nessa estratégia, o aluno levanta informações aleatoriamente
na sua mente, para depois dividi-las e categorizá-las conforme as necessidades do texto
que produzirá.
Na situação escolar, o planejamento para a primeira estratégia dá origem à produ-
ção de texto, enquanto que a segunda leva à produção de uma redação.

Execução – Nessa etapa do processo de escrita, o produtor efetiva a produção do


gênero textual solicitado, a partir da finalidade e do interlocutor definidos anterior-
mente. Com isso, depois de ter selecionadas as informações de que precisa, executa
a tarefa de escrever o texto. Não há uma maneira definida para essa construção, pois
cada indivíduo tem sua perspectiva idiossincrática, isto é, pessoal, própria de cada
indivíduo para a produção. O que há, certamente, são as regras de escrita que defi-
nem, a partir da variedade linguística eleita, as condutas de construção das frases, dos
parágrafos, enfim, do gênero textual em sua organização composicional típica. Neste
sentido, o aluno-produtor também leva em conta a coerência das informações apre-
sentadas, que são articuladas com elementos coesivos necessários, para que seu texto

90
apresente articulação e relação entre as ideias, em um nítido processo de progressão O processo de
produção textual
de informações no texto. O tempo de execução da produção escrita é variável de
indivíduo para indivíduo, sendo, muitas vezes, determinado pelo tempo que a escola
marca como certo. Assim, em uma situação de avaliação formal, como a prova mensal
ou um concurso público, há uma delimitação do tempo para a execução de todo o
processo de produção textual.

Revisão – Nessa etapa, o produtor atenta para a forma e o conteúdo do texto, em


um processo de interação consigo mesmo e com seu próprio texto. Na verdade, esta
seria a estratégia ideal para a revisão, em que o próprio autor faz o levantamento de
quais aspectos formais e de conteúdo devem ser alterados. Contudo, na prática esco-
lar, essa estratégia não está desenvolvida no aluno, por isso ele espera pelos comentá-
rios do professor sobre seu texto produzido. Assim, o professor aponta aspectos que
colaborem para a melhoria do texto do seu aluno.
É prática cultural no Brasil que todo texto revisado deve apresentar apontamentos
voltados para forma. Porém, a partir da concepção de escrita como trabalho e da con-
cepção teórico-metodológica de produção textual em sala de aula, os apontamentos
e comentários do professor sobre o texto do aluno devem apresentar questões rela-
cionadas à forma e também ao conteúdo, evitando-se a simples higienização do texto
( JESUS, 2001), o que o levaria a tomar a noção de redação. Dessa forma, o professor
deve ser consciente de que seu papel é o de leitor-corretor-avaliador que interage com
seu aluno através do texto escrito pelo educando, estabelecendo um diálogo que o
oriente à melhoria do seu texto.
Neste sentido, a revisão pode ser observada a partir de três pontos de vista
diferentes:
a) do professor – em que fica responsável único pelos apontamentos e comen-
tários no texto do aluno, com manifestações próprias sobre o que considera
necessário melhorar no texto;
b) do colega, dos pares – em que o parceiro da sala de aula, ou outra pessoa ligada
ao ensino, que não seja o professor, manifeste apontamentos e comentários so-
bre o texto do aluno, no sentido de colaborar com a melhoria do texto. É certo
que os apontamentos e comentários do colega são apresentados de maneira
diferente para o autor do texto, porém observamos que muitas das informações
que o colega oferece ao texto são próximas daquelas que o professor também
apresenta;
c) do aluno-produtor do texto – em que o próprio aluno, depois de amadurecidas
as estratégias de revisão e reescrita, aponta aspectos a serem melhorados em seu

91
A PRODUÇÃO texto. Essa consciência é decorrente do trabalho que se faz sobre o aluno, para
TEXTUAL
E O ENSINO que ganhe confiança e segurança na realização dessa etapa do processo de pro-
dução de texto. Na verdade, seria o ideal para se trabalhar com a escrita em sala
de aula. Para isso, é necessário todo um trabalho com procedimentos específicos
que levem os alunos à apropriação e ao desenvolvimento das estratégias que
abordem a revisão e a reescrita de textos por parte do professor em sala de aula.

Reescrita – Em muitas pesquisas, a reescrita é denominada retextualização, mas,


aqui, abordaremos essa etapa do processo de produção textual como sendo reescri-
ta por envolver aspectos linguísticos-discursivos na sua constituição. Dessa forma, a
reescrita não é somente a higienização do texto, no sentido de limpeza dos aspec-
tos formais que estão inadequados à norma padrão escrita do português. É, também,
acrescentar, substituir, suprimir e deslocar informações no texto que está em processo
de construção.
Na etapa da revisão, são apontados e comentados aspectos que auxiliam na re-
formulação do texto pelo produtor. Assim, tanto o professor quanto o colega, e mes-
mo o próprio aluno-produtor podem apontar a necessidade de se trabalhar o texto
com as operações linguístico-discursivas próprias do processo de reescrita, a seguir
comentadas:
a) acréscimo ou adição: pode tratar-se do acréscimo de um elemento gráfico,
acento, sinal de pontuação, grafema, como também de palavra, sintagma, frase,
parágrafo. Nessa operação, é solicitado ao produtor do texto que adicione ele-
mentos para elucidar informações que não ficaram esclarecidas, ou, até mesmo,
completar informações que não foram integralmente apresentadas ao leitor. É
certo que, além de ser uma operação linguisticamente definida por elementos
da língua, é uma estratégia solicitada pelo revisor e normalmente atendida pelo
produtor do texto com muita frequência;
b) substituição: trata-se da substituição de termos que não colaboram para a coe-
rência do texto. Nessa operação, o produtor, a partir das indicações de suges-
tões do revisor, ou de seu próprio processo de revisão, realiza substituição de
unidades diversas, como: acento, grafema, sílaba, palavra, sintagma, frases, para
que possa deixar seu texto com coesão e coerência necessárias à compreensão;
c) supressão: trata-se da retirada sem substituição de determinada unidade do tex-
to, como as da operação de substituição. Essa operação é empregada quando
algum elemento do texto o torna inadequado à produção, alterando sua coe-
rência essencial;
d) deslocamento: é a permuta de elementos que acabam por modificar a ordem no

92
processo de encadeamento das informações no texto. Essa operação transfere O processo de
produção textual
unidades do texto dentro do próprio corpo textual.

Avaliação: como última etapa do processo, a avaliação é o momento em que o


leitor, no caso o professor, o colega ou o próprio autor, qualificam o texto como ade-
quado à situação sociocomunicativa a que foi produzido.
Ainda sobre os processos de revisão e reescrita de textos em situação de ensino,
alguns princípios gerais devem ser observados:
1) Os estudantes podem ser treinados a apreciar a revisão;
2) A revisão deveria ser uma parte essencial da pedagogia da escrita;
3) Os estudantes podem ser treinados a apreciar a revisão como um processo de
descoberta de novos significados;
4) Comentário entre pares encoraja os alunos a escrever textos para leitores
específicos;
5) Comentário entre pares na primeira versão auxilia o aluno a valorizar o profes-
sor e seus colegas como colaboradores e não como avaliadores;
6) É necessária uma abordagem em duas versões de escrita para as tarefas iniciais;
7) É importante monitorar uma consciência crescente a fim de modificar os proce-
dimentos em sala de aula;
8) Comentários deveriam ser priorizados e estendidos a todas as versões, e o con-
teúdo deveria ser reconhecido como prioridade;
9) A conscientização dos procedimentos forma uma parte essencial do ensino de
escrita.
Neste sentido, a constituição e o estabelecimento do processo de produção textual
escrita em situação de ensino são realizados a partir da concepção de escrita como
trabalho pelo professor e pelos alunos.

4 PRÁTICA DE PRODUÇÃO TEXTUAL


Como exemplificação dos conceitos discutidos até aqui, tomemos a Prova de Re-
dação do Concurso Vestibular de Verão 2008 da Universidade Estadual de Maringá
(www.vestibular.uem.br), que solicitava a produção de dois gêneros textuais: resumo
e resposta interpretativa. Tomemos como exemplo a produção textual do resumo.

Prova de Redação – Verão 2008

REDAÇÃO
A coletânea de textos abaixo, retirados de fontes variadas, aborda a temática As
funções dos sonhos. Tendo-a como apoio, redija os gêneros textuais solicitados.

Mundos dos sonhos

93
A PRODUÇÃO O que é o sonho, como se manifesta e qual a sua função? Por que sonhamos e o
TEXTUAL que acontece enquanto sonhamos? Essas questões suscitam debates e pesquisas
E O ENSINO
há milhares de anos. Desde o Egito antigo, no tempo dos faraós, o sonho já era
objeto de estudos. Na Grécia, os famosos templos de Asclépios (deus da medi-
cina) recebiam pessoas em busca de conselho e cura, muitas vezes atribuída à
ajuda dos sonhos.
Estado de Minas, 11/4/2005.
(http://www.drashirleydecampos.com.br/noticias/15243)

Sonhar é preciso
Mais de 100 anos depois da psicanálise de Freud, pesquisadores afirmam que
sonhar é uma necessidade biológica, capaz de indicar também como funciona
a memória humana.
Sonhar é essencial à vida. Sem o sonho, morreríamos. A frase poderia ser credi-
tada a um poeta ou a um escritor, mas é do pesquisador Sérgio Tufik, diretor do
Instituto do Sono da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). (...)
Os motivos que levam o ser humano a sonhar e qual a função dos sonhos na
nossa vida, no entanto, ainda não foram desvendados. Mas o estudo dos sonhos
revelou, por exemplo, o fato de que temos uma consciência, quando estamos
acordados, e outra, que parte dos especialistas prefere chamar de não-consci-
ência, quando dormimos. É nessa hora que a nossa memória entra em prática,
colocando em sequência uma série de situações que vivemos durante o dia.
(http:/www.escutaanalitica.com.br/responsabilidade.htm)

O que dizem os sonhos


Claudia Jordão e Jonas Furtado
“Nós nos iludimos no dia-a-dia, trabalhamos com o que e com quem não gosta-
mos, temos que nos enquadrar nos padrões da sociedade. Os sonhos ajudam a
mostrar quem somos na essência, são um caminho para o autoconhecimento,
para a nossa verdade mais profunda”, afirma Kwasisnki, psicólogo e professor
de mitologia. (...)
“O sonho é uma simulação do futuro possível com base no passado conhe-
cido”, resume Sidarta Ribeiro, neurocientista e diretor científico do Instituto
Internacional de Neurociências Edmond e Lily Safra, em Natal, Rio Grande do
Norte. (...)
De importância comprovada para o fortalecimento da memória, os sonhos co-
meçam a ter seu papel reconhecido também na reestruturação dela, de forma a
gerar novos comportamentos. Ou seja: sonhar estimula a criatividade. “Durante
o sono de ondas lentas, não há sonhos, apenas pensamento no escuro. Quan-
do aumenta a atividade neural e as memórias começam a interagir, é como se
acendesse a luz do projetor e começasse a sessão cinema”, compara Ribeiro.
(ISTOÉ, n.º 2011, 21 de maio de 2008)

Sonhos
Por Isaac Ismar. 16/8/2007
A psicóloga Tatiana Vasconcelos Cordeiro explica que, para a psicanálise, o so-
nho é um meio pelo qual o inconsciente procura alertar a consciência para o
que ela não percebe ou não quer aceitar, e tenta, por compensação, equilibrar
a psique, a totalidade de fenômenos psíquicos. “Os sonhos trazem à tona os
complexos e sugerem alternativas para a consciência, cujo centro é o ego, rea-
lizar o que a pessoa é potencialmente. Ou seja, os sonhos são “avisos”, afirma
a psicóloga.
(http:/msn.bolsademulher.com/corpo/materia/sonhos/9708/1)

94
Sonhar O processo de
Sonhar é transportar-se em asas de ouro e aço produção textual
Aos páramos azuis da luz e da harmonia;
É ambicionar o céu; é dominar o espaço,
Num vôo poderoso e audaz da fantasia.

Fugir ao mundo vil, tão vil que, sem cansaço,


Engana, e menospreza, e zomba, e calunia;
Encastelar-se, enfim, no deslumbrante paço
De um sonho puro e bom, de paz e de alegria.

É ver no lago um mar, nas nuvens um castelo,


Na luz de um pirilampo um sol pequeno e belo;
É alçar, constantemente, o olhar ao céu profundo.

Sonhar é ter um grande ideal na inglória lida:


Tão grande que não cabe inteiro nesta vida,
Tão puro que não vive em plagas desse mundo.

(KOLODY, Helena. Viagem no espelho e vinte e um poemas inéditos. Curitiba-


PR: Criar Edições, 2001)

GÊNERO TEXTUAL 1

Redija um resumo, com até 15 linhas, que apresente as funções dos sonhos expos-
tas na coletânea de textos.

I - Planejamento do texto
Para que o processo de escrita se complete, o produtor inicialmente realiza o le-
vantamento das informações principais de cada uma dos fragmentos de texto, com a
finalidade de descobrir quais são as funções dos sonhos que servirão de suporte para
a realização do gênero textual resumo.
Levantamento das informações da coletânea de textos:

Texto 1: Mundos dos sonhos


1) Os sonhos ajudam com conselhos e curas.

Texto 2: Sonhar é preciso


4) Sonhar é uma necessidade biológica.
3) Sonhar indica como funciona a memória humana.

Texto 3: O que dizem os sonhos


4) Os sonhos ajudam a mostrar quem somos na essência; são o caminho para o
autoconhecimento.

95
A PRODUÇÃO 5) O sonho simula o futuro possível com base no passado conhecido.
TEXTUAL
E O ENSINO 6) O sonho reestrutura a memória.
7) Sonhar estimula a criatividade.

Texto 4: Sonhos
8) Os sonhos alertam e trazem alternativas para a consciência.

Texto 5: Sonhar
9) O sonho como objetivo/grande ideal de vida.

A partir desse levantamento, estabelece-se qual a ordem em que as informa-


ções serão expostas na construção do texto, para que as funções dos sonhos sejam
apresentadas.

Ordenamento das informações e das funções dos sonhos; estas são delineadas em grifo:
1) Os sonhos instigam a curiosidade humana.
2) Os egípcios e os gregos se interessavam por seus mistérios.
3) O porquê deles permanece desconhecido.
4) Sérgio Tufik afirma que eles são responsáveis à vida.
5) Especialistas definem o sono como um estado de não consciência, fundamental
à consolidação da memória.
6) Sidarta Ribeiro afirma que os sonhos são também responsáveis por reestruturar
as experiências vividas,
7) Estimula a criatividade.
8) Olhar da psicologia.
9) Kwasisnki afirma que os sonhos possibilitam ao homem conhecer-se melhor, ao
mostrar-lhe sua essência.
10) Análise psicanalítica,
11) Tatiana V. Cordeiro aponta para o equilíbrio que o sono proporciona.
12) O inconsciente só atinge o consciente por meio dos sonhos, alertando-o assim
sobre aquilo que não enxerga ou não admite, o que o torna mais completo.
13) Não apenas as ciências se preocupam com os sonhos.
14) Helena Kolody conduz o leitor a sua função catártica.
15) Escapar à dura realidade e se aconchegar em um mundo puro e de fantasia.

Observamos que as funções dos sonhos são apontadas no interior do levantamento


das informações principais da coletânea de textos. Com essa estratégia, o planejamento

96
do texto está concluído, bastando ao produtor a sua execução. O processo de
produção textual

II – Execução do texto
Com o planejamento realizado, o produtor executa a primeira versão do seu texto,
reunindo as informações:

Os sonhos instigam a curiosidade humana. Os egípcios e os gregos se interessa-


vam por seus mistérios. O porquê deles permanece desconhecido. No que concer-
ne às funções do sonho, para Sérgio Tufik eles são responsáveis à vida. Especialistas
definem o sono como um estado de não consciência. Sidarta Ribeiro afirma que os
sonhos são também responsáveis por reestruturar as experiências vividas, estimu-
lando a criatividade. Outro olhar possível é o de Kwasisnki, psicólogo e professor de
mitologia, que mostra que os sonhos possibilitam ao homem conhecer-se melhor, ao
mostrar-lhe sua essência. Já Tatiana V. Cordeiro aponta para o equilíbrio que o sono
proporciona. Segundo ela, o inconsciente só atinge o consciente por meio dos so-
nhos, alertando-o assim sobre aquilo que não enxerga ou não admite, o que o torna
mais completo. A poetisa Helena Kolody conduz o leitor a sua função catártica que
seria por meio deles que o homem poderia escapar à dura realidade e se aconchegar
em um mundo puro e de fantasia.

Nessa primeira versão, notamos que as informações sobre o sonho estão apontadas
no texto, assim como as suas funções; contudo, o gênero textual resumo ainda não
está adequadamente construído para ser enviado à avaliação. Dessa forma, o produtor
do texto possibilita o início da terceira etapa do processo de escrita: a revisão.

III – Revisão
Nessa etapa, o produtor realiza uma leitura mais atenta, observando se as informa-
ções da coletânea, principalmente as funções dos sonhos solicitadas, estão presentes
no seu texto. Para visualização, marcamos com um grifo as funções dos sonhos, como
mostra de revisão do produtor.

Os sonhos instigam a curiosidade humana. Os egípcios e os gregos se interessa-


vam por seus mistérios. O porquê deles permanece desconhecido. No que concer-
ne às funções do sonho, para Sérgio Tufik eles são responsáveis à vida. Especialistas
definem o sono como um estado de não consciência. Sidarta Ribeiro afirma que os
sonhos são também responsáveis por reestruturar as experiências vividas, estimulan-
do a criatividade. Um outro olhar possível é o de Kwasisnki, psicólogo e professor de
mitologia, que mostra que os sonhos possibilitam ao homem conhecer-se melhor, ao
mostrar-lhe sua essência. Já Tatiana V. Cordeiro aponta para o equilíbrio que o sono
proporciona. Segundo ela, o inconsciente só atinge o consciente por meio dos so-
nhos, alertando-o assim sobre aquilo que não enxerga ou não admite, o que o torna
mais completo. A poetisa Helena Kolody conduz o leitor a sua função catártica que
seria por meio deles que o homem poderia escapar à dura realidade e se aconchegar
em um mundo puro e de fantasia.

97
A PRODUÇÃO Ao continuar o processo de revisão, o produtor observa que seu texto ainda está
TEXTUAL
E O ENSINO incompleto, faltando-lhe alguns elementos coesivos que permitem uma fluência na
sua leitura e na compreensão das informações selecionadas da coletânea de textos.
Assim, sobre a versão revisada, o produtor aponta alguns comentários ou faz marcas
para melhorar o texto. Para visualização, os comentários e as marcas são apresentados
em itálico.

Os sonhos instigam a curiosidade humana. Os egípcios e os gregos na antigui-


dade se interessavam por seus mistérios. Com todo histórico e pesquisa, o porquê
deles permanece desconhecido. Todavia, no que concerne às funções do sonho,
para Sérgio Tufik, diretor da Unifesp, eles são responsáveis à vida. Especialistas
definem o sono como um estado de não consciência. Sidarta Ribeiro, neurocien-
tista, afirma que os sonhos são também responsáveis por reestruturar as experi-
ências vividas, estimulando a criatividade. Um outro olhar possível é o de Kwasis-
nki, psicólogo e professor de mitologia, que mostra que os sonhos possibilitam ao
homem conhecer-se melhor, ao mostrar-lhe sua essência. Já Tatiana V. Cordeiro,
psicanalista, aponta para o equilíbrio que o sono proporciona. Segundo ela, o in-
consciente só atinge o consciente por meio dos sonhos, alertando-o assim sobre
aquilo que não enxerga ou não admite, o que o torna mais completo. A poetisa
Helena Kolody conduz o leitor a sua função catártica que seria por meio deles que
o homem poderia escapar à dura realidade e se aconchegar em um mundo puro
e de fantasia.

Os apontamentos realizados na revisão servem como caminhos para a quarta etapa


do processo de escrita: a reescrita.

IV - Reescrita
Nessa etapa, os apontamentos e as alterações levantados na revisão são trabalhados
no texto, para que sua versão final seja apresentada para a avaliação. Assim, após o
trabalho de revisão, a reescrita apresenta um novo texto, com modificações em relação
à primeira versão.

98
O processo de
Os sonhos há muito instigam a curiosidade humana. Já os egípcios, à época dos produção textual
faraós, e os gregos, à Antiguidade, se interessavam por seus mistérios. E, apesar de
todo esse histórico e das inúmeras pesquisas a respeito, o porquê deles permanece
desconhecido. Todavia, no que concerne às funções do sonho, há avanços, sendo que,
para Sérgio Tufik, diretor do instituto do Sono da Unifesp, eles são responsáveis à vida.
Especialistas definem o sono como um estado de não consciência, fundamental à con-
solidação da memória. O neurocientista Sidarta Ribeiro vai além. Para ele, os sonhos
são também responsáveis por reestruturar as experiências vividas, estimulando, dessa
forma, a criatividade. Outro olhar possível sobre o fenômeno é o da psicologia. Para
Kwasisnki, psicólogo e professor de mitologia, os sonhos possibilitam ao homem conhe-
cer-se melhor, ao mostrar-lhe sua essência. Já em uma análise psicanalítica, Tatiana V.
Cordeiro aponta para o equilíbrio que o sono proporciona. Segundo ela, o inconsciente
só atinge o consciente por meio dos sonhos, alertando-o assim sobre aquilo que não
enxerga ou não admite, o que o torna mais completo. Mas não apenas as ciências se
preocupam com os sonhos. A partir de uma perspectiva artística, a poetisa Helena Ko-
lody conduz o leitor a sua função catártica. Seria por meio deles que o homem poderia
escapar à dura realidade e se aconchegar em um mundo puro e de fantasia.

Nessa versão, as modificações são nos aspectos formais e de conteúdo, fazendo


alterações em vários níveis para que o texto do resumo alcançasse o nível esperado
para esse gênero textual. Ao se comparar a versão inicial da etapa da execução com
essa versão oriunda da reescrita, notamos como o trabalho de produção textual foi re-
alizado a contento, a partir do domínio do processo de escrita por parte do produtor.
Dessa forma, o texto apresentado pelo candidato ao Concurso Vestibular é uma
produção de texto, não é uma redação. O título da prova é Redação, porém não apre-
senta a conotação oferecida por Geraldi, para os textos que são produzidos sem defini-
ções específicas de finalidade, interlocutor, gênero textual, suporte textual, circulação
social e posição do autor.
Por outro lado, ainda dentro da Prova de Redação, há candidatos que produzem
redações, na concepção de Geraldi. Nessa perspectiva, o produtor não realiza plane-
jamento do texto, não faz uso da revisão e do processo de reescrita, apenas apresenta
uma versão pronta e acabada de um texto, que não atende à finalidade e ao gênero
determinados pelo comando da prova. Assim, temos como exemplo que obteve sua
desclassificação no Concurso Vestibular, por não atender ao comendo proposto:

Algo bastante complexo para apenas uma explicação simples, os sonhos, alguns
nos dão prazeres e outros medos.
Os sonhos são estudados desde a antigüidade.
Vários pesquisadores famosos já aprofundaram o estudo dos sonhos, algumas con-
clusões parecidas, outras nem tanto.
É possível dizer que os sonhos nos causam grandes emoções que possam ou não
atuar em nosso comportamento ao despertarmos. Uma noite mal durmida devido a
um sonho ruim provávelmente acarretará num dia de mau-humor, ou pelo contrário,
um sonho ótimo e um dia satisfatório.
Sonhar, mais uma coisa incrível que o cérebro é capaz de sintetizar.

99
A PRODUÇÃO Nesse texto, sem definição específica de um gênero textual, não são apresentadas
TEXTUAL
E O ENSINO as funções dos sonhos solicitadas, consequentemente, as informações principais da
coletânea de textos também são desconsideradas. Nele, observamos que o autor teve
apenas a intenção de falar dos sonhos, inclusive trazendo informações que não esta-
vam na coletânea de textos, desconfigurando o gênero textual resumo, passando a
constituir um gênero da esfera argumentativa. São informações acrescidas à coletânea:
a) “algo complexo para apenas uma explicação simples”;
b) “os sonhos, alguns nos dão prazeres e outros medos”;
c) “uma noite mal durmida devido a um sonho ruim provavelmente acarretará num
dia de mau-humor, ou pelo contrário, um sonho ótimo e um dia satisfatório”;
d) “sonhar, mais uma coisa incrível que o cérebro é capaz de sintetizar”.
Com isso, o autor produziu uma redação escolar.

5 A PRODUÇÃO TEXTUAL COMO TRABALHO DE ESCRITA


Com os conceitos discutidos, observamos que a produção textual no contexto de
ensino deve considerar a concepção de escrita como trabalho. Consequentemente,
as condições de produção consideram a finalidade, o interlocutor, o gênero textual,
o suporte textual, a circulação social, a posição de autor como elementos essenciais
ao produtor, que realiza a construção de uma produção textual. Para isso, emprega o
processo de leitura, planejando o texto, executando sua escrita, revisando e reescre-
vendo as versões necessárias para que tenha consistência e coerência com a situação
comunicativa solicitada. Dessa forma, o processo de produção textual em situação de
ensino é constituído essencialmente pela concepção de escrita como trabalho.

Referências

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______. Estética da criação verbal. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

BAKHTIN, M.; VOLOCHINOV, M. Marxismo e Filosofia da linguagem. 6. ed. São


Paulo: Hucitec, 1992.

EVANGELISTA, A. A. M. et. al. Professor-leitor, aluno-autor: reflexões sobre avaliação


do texto escolar. Intermédio-cadernos Ceale, Belo Horizonte, ano 11, v. 3, out.
1998.

100
FIAD, R. S.; MAYRINK-SABINSON, M. L. T. A escrita como trabalho. In: MARTINS, M. O processo de
produção textual
H. (Org.). Questões de linguagem. 4. ed. São Paulo: Contexto, 1994. p. 54-63.

GARCEZ, L. H. C. A escrita e o outro: os modos de participação na construção do


texto. Brasília, DF: UNB, 1998.

GERALDI, J. W. Da redação à produção de textos. In: GERALDI, J. W.; CITELLI, B.


(Org.). Aprender e ensinar com textos de alunos. Vol. 1. São Paulo: Cortez, 1997,
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GERALDI, J. W. Portos de passagem. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

GERALDI, J. W.; CITELLI, B. (Org.). Aprender e ensinar com textos dos alunos. 4.
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JESUS, C. A. Reescrevendo o texto: a higienização da escrita. In: GERALDI, J. W.;


CITELLI, B. (Org.). Aprender e ensinar com textos dos alunos. 4. ed. São Paulo:
Cortez, 2001. v. 1. p. 99-117.

KOCH, Ingedore Vilaça & Vanda Maria ELIAS. Ler e escrever. Estratégias de
produção textual. São Paulo: Editora Contexto, 2009.

MENEGASSI, R. J. Professor e escrita: a construção de comandos de produção de


textos. Trabalhos em Lingüística aplicada, Campinas, SP, v. 42, p. 55-79, 2003.

MENEGASSI, R. J.; OHUSCHI, M. C. G. O ensino da escrita no curso de Letras.


Polifonia, Cuiabá, n. 15, p. 37-66, 2008.

SERCUNDES, M. M. Ensinando a escrever. In: GERALDI, J. W.; CITELLI, B. (Org.).


Aprender e ensinar com textos dos alunos. 4. ed. São Paulo: Cortez, 1997. v. 1.
p. 75-97.

VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes,


1988.

101
A PRODUÇÃO SÍTIOS NA INTERNET
TEXTUAL
E O ENSINO

www.alb.com.br – Associação de Leitura do Brasil

www.escrita.uem.br – Grupo de Pesquisa “Interação e Escrita”, Universidade Estadual


de Maringá

Proposta de Atividade

1) Tome a prova de Redação do Concurso Vestibular apresentada na seção 4 como referência


para esta atividade. Você produzirá um texto do gênero resumo, considerando cada uma
das etapas do processo de produção textual. Assim, você deve apresentar os passos do
planejamento, o texto produzido, o texto revisado e sua reescrita.

Anotações

102
5 Coesão-coerência-
contexto: tripé da
produção textual
Marilurdes Zanini

O texto, espaço de interação verbal, enunciado pleno de significação, organiza-se


coesa e coerentemente, ou seja, por meio de um arranjo linguístico, tecido com o ob-
jetivo de levar o leitor a construir sentidos mais próximos o quanto possível daqueles
que o autor deseja atingir. Essa concepção reafirma a compreensão de que os sentidos
do texto são construídos pela interação entre os sujeitos da atividade comunicativa –
autor e leitor – e que, nos processos de produção e de leitura de um texto, instauram-
se ações linguísticas, cognitivas e sociais, as quais tornam possível seu funcionamento
social.
O funcionamento social implica o funcionamento da linguagem e a consequente
adequação do texto ao contexto de produção – que diz respeito às circunstâncias em
que se envolve o autor – e de uso, concernentes às circunstâncias que envolvem o
leitor. Nessa perspectiva, entendemos que, na construção da coerência e da coesão de
um texto, o contexto é de suma importância. Por isso, neste trabalho, propomo-nos
a discutir, a partir de dois textos produzidos por duas crianças de oito anos de idade,
alunos da terceira série do Ensino Fundamental, em situação de ensino-aprendizagem,
os três elementos que alicerçam os processos de produção e de leitura: o contexto, a
coesão e a coerência textuais.

Texto 1

Vila Velha, 14/06/09

Oi Samuel que bom que você veio para cá, foi muito bom na quinta-feira não foi?
Gostei muito, muito mesmo da sua visita.
Foi a segunda vez que você veio para cá?
Você sabe onde eu morei? Morei, em Belo Horizonte, Caxias do Sul e Governador
Valadares. Você e meu amigão, você gosta de ver eu tocar bateria eu também gosto
de tocar para você.
Na minha bateria encontrei uma música maneira, você tem que vir aqui para ouvir
esse ritmo, e ficar mais dias aqui. Um beijo e tchau.

103
A PRODUÇÃO Texto 2
TEXTUAL
E O ENSINO

Vila Velha, 14/06/09

Oi Gabriela eu sou o Lucca, tenho 8 anos e moro em Vila Velha – ES. Tenho um
irmão que se chama Enzo. Ele é um pouco legal, toca bateria super bem. Vamos te co-
nhecer no Natal, estou doido para conhecer você e acho que o Enzo também. Os seus
pais estão bem? Eu acho que sim e que Deus abençoe toda a sua família.

Os textos 1 e 2, organizados no gênero carta pessoal ou familiar, têm como autores,


respectivamente, Enzo, que embora não assine a carta, é identificado em pistas forne-
cidas por ambos os textos – “[...] eu tocar bateria.[...] Na minha bateria encontrei...”
(Texto 1) – “Tenho um irmão que se chama Enzo. [...] toca bateria super bem” (Texto
2) – e Lucca, que também não assina a carta, porém, identifica-se ao iniciá-la.
Os autores dos dois textos, em sua organização, levam em conta os conhecimentos
prévios que têm os leitores, marcados explicitamente nos vocativos “Samuel”, no texto
1, e “Gabriela”, no texto 2. Segundo eles, os leitores têm também conhecimentos:
a) Sobre os temas abordados nas informações que apresentam – a visita de Samuel
à casa de Enzo em Vila Velha, os lugares em que Enzo morou, a sua paixão pela
bateria, a satisfação em tocar bateria para Samuel, no texto 1; e no texto 2, a apre-
sentação que Lucca faz à Gabriela, a quem promete visitar e conhecer no Natal.
b) Sobre o léxico da língua em que foram escritas as cartas – língua portuguesa.
c) Sobre o conhecimento que Samuel – leitor – tem sobre o autor – Enzo, no tex-
to 1; e no texto 2, que Gabriela tem de Lucca e de Enzo – a quem Lucca remete
Gabriela.

Acreditamos que essas pressuposições envolveram os autores no momento da pro-


dução de suas cartas, mediante a criação de uma situação de produção textual em sala
de aula. Sem entrar no mérito da eficácia que revela essa situação, atemo-nos à dis-
cussão dos elementos de organização do produto – as cartas escolhidas para apoiá-la.
Das múltiplas leituras atribuídas para um único texto, lançamos mão daquela que
os contextos de produção e de uso nos autorizam a realizar, voltando o olhar para as
pistas que os textos nos oferecem e o conhecimento de mundo que temos da situação
comunicativa evidenciada, dos autores e do contexto que os circunda, uma vez que
cada leitor constrói sentidos proporcionalmente ao seu saber acumulado. Dessa for-
ma, os sentidos atribuídos pelo leitor estarão tanto mais próximos das intenções do
autor quanto maior for o saber que têm um do outro, do contexto e do assunto. Esse
saber é contextual. Assim, para aqueles que se propuserem a ler as cartas, torna-se
importante conhecê-lo.

104
Contexto: ancoragem na construção dos sentidos do texto Coesão-coerência-
contexto: tripé da
Neste capítulo, o contexto refere-se, indistintamente, ao co-texto – entorno verbal produção textual

– e ao contexto cognitivo – os conhecimentos enciclopédico, episódico, procedural,


macro e superestrutural, compartilhados pelos parceiros da comunicação, uma vez que

“... tanto o co-texto, como a situação comunicativa, imediata ou mediata, bem


como as ações comunicativas e interacionais realizadas pelos interlocutores
passam a fazer parte do domínio cognitivo de cada um deles, isto é, têm uma
representação em sua memória, como acontece também com o contexto sócio-
histórico-cultural” ( VILELA; KOCH, 2001, p. 459).

Os autores dos textos 1 e 2 são Enzo e Lucca, respectivamente. Têm oito anos. São
irmãos: “Tenho um irmão que se chama Enzo.” – Informação explícita no texto 2, que
leva o leitor ao contexto e, implicitamente, à informação de que são gêmeos.
Cursam a terceira série do Ensino Fundamental em uma escola de Vila Velha, Espí-
rito Santo. Começa assim a (re)construção do contexto que envolve os autores e que,
como leitores, procuramos para aceitar, inclusive, os textos 1 e 2 como textos e com-
preendê-los no gênero com que os identificamos. Esse é um conjunto de informações
obtidas além do texto, para as quais os textos 1 e 2 apresentam algumas sinalizações:
– “Vila Velha”, o local onde foram escritas as cartas e onde os autores moram. Vila
Velha fica no ES (Estado do Espírito Santo), sigla indicada no texto 2: “... moro em Vila
Velha – ES”.
– “Tenho um irmão que se chama Enzo”. A aproximação dos dois textos faz com
que o leitor pressuponha o grau de parentesco entre ambos e a idade dos dois autores.
A (re)construção do contexto é realizada pelos conhecimentos prévios ativados pelas
pistas que os textos oferecem.
Dessa forma, temos informações a respeito de quem escreveu os textos, do lugar
onde foram escritos e onde moram seus autores.
Outras sinalizações textuais, ou pistas, orientam essa (re)construção do contexto
de produção, em que se consideram:
• O tempo – quando foram escritos os textos: “14/06/09”;
• O interlocutor – para quem os autores escrevem: “Samuel”, amiguinho de outra
cidade que veio visitar Enzo, em uma quinta-feira, e Gabriela, a quem Lucca pro-
mete visitar e deseja conhecer. Samuel e Gabriela são os interlocutores que se
constituem no “outro”, inserido na produção da carta, como uma das condições
para que o texto exista, conforme Geraldi (1996). Enzo sabe do outro, Samuel,
e Lucca, de Gabriela; por isso, o texto só se torna texto com a participação do
outro e daqueles que, por conhecerem o outro, participam da construção dos
seus significados, quando o leem.

105
A PRODUÇÃO • O objetivo dos autores – estabelecer interação comunicativa com Samuel: “que
TEXTUAL
E O ENSINO bom que você veio para cá, foi muito bom na quinta-feira não foi?”;
• Os temas – Enzo não se atém a um único, embora todos se entrelacem nas se-
quências textuais organizadoras da carta – parecem ser comuns a Enzo, autor,
e a Samuel, leitor explícito. No texto 2, Lucca parece saber que Gabriela não o
conhece, por isso, apresenta-se com mais detalhes, valendo-se de sequências
textuais mais descritivas.
• O gênero textual – carta pessoal: local, data, saudação e vocativo, as informa-
ções organizadas com um balanceamento satisfatório em relação ao autor, de
sequências textuais narrativas: “Gostei muito, muito mesmo da sua visita”; “Foi
a segunda vez que você veio para cá?”; “Morei, em Belo Horizonte, Caxias do
Sul e Governador Valadares”; “Na minha bateria encontrei uma música ma-
neira...”; sequências textuais expositivas-narrativas: “Você sabe onde eu morei?”;
sequências textuais argumentativas: “Você é meu amigão, você gosta de ver eu
tocar bateria eu também gosto de tocar para você.”; e até sequências textuais
injuntivas: “você tem que vir aqui para ouvir esse ritmo, e ficar mais dias aqui.”
Sequências essas organizadoras do gênero carta, no caso, pessoal. Gênero que se
encerra pela saudação final – “Um beijo e tchau”. Na carta de Enzo, não consta a
sua assinatura, sinalização de autoria e de fechamento do gênero.
Percebamos que as sinalizações textuais, ou pistas, abrem espaço para o leitor
construir com o autor os sentidos do texto, processamento textual circundado pelo
contexto, cuja importância se evidencia, já que, de acordo com Koch e Elias (2006,
p. 83), os seus “componentes [...] intervêm na comunicação sob a forma de saberes
ou modelos cognitivos (frames, esquemas)”; condicionam e transformam o discurso;
permitem a sua construção e a sua reconstrução durante a atividade discursiva. Assim,
na organização de seu texto, o autor vale-se de estratégias textuais de organização da
informação, de formulação, de referenciação, de balanceamento entre o explícito e o
implícito (KOCH, 2002), responsáveis pela tecelagem textual e concernem ao modo
como os autores distribuem e retomam as informações no texto, procurando atingir
seus objetivos.

Estratégias textuais de organização da informação


O autor distribui o material linguístico na superfície textual visando à informação.
Para isso, articula as informações compartilhadas por ele e pelo seu leitor com aquelas
que o “surpreenderão”, as novas, que, após conhecidas, tornam-se ancoragem de ou-
tras novas, em uma cadeia sucessiva delas. Há no processo um balanceamento entre o
conhecido e o novo, ou seja, o dado e o novo.

106
No corpo do texto, as informações são retomadas, remissiva – pistas superficiais Coesão-coerência-
contexto: tripé da
ativadoras dos conteúdos armazenados na memória, ou referencialmente – reativa- produção textual

ção de referentes cujo conteúdo semântico seja necessário para a compreensão das
sequências textuais que se sucedem, de modo que vão se formando cadeias coesivas
que auxiliam na progressão e na construção do sentido do texto.

Estratégias textuais de formulação


As estratégias textuais de formulação e de reformulação trazem para o texto inser-
ções – explicações – e de reformulação – reconstrução do que foi dito por meio de
repetições e parafraseamento – visando à melhor compreensão da mensagem.

Estratégias textuais de referenciação


A ancoragem – pontos de referência - das estratégias textuais de referenciação pode
ocorrer tanto no universo textual – referência endofórica, como também ao seu entor-
no – referência exofórica, por meio de cadeias intertextuais.

Estratégias de balanceamento entre o explícito e o implícito


Para Koch (2006, p. 42), quando o autor do texto estabelece “relações entre a infor-
mação textualmente expressa e conhecimentos prévios, pressupostos ou compartilha-
dos”, estabelece um balanceamento, um equilíbrio entre aquilo que deve ser explícito
e o que deve estar implícito no texto.
Essas relações são estabelecidas por meio de sinalizações que levam o interlocutor
a recorrer aos conhecimentos contextuais: a situação comunicativa, os “scripts” so-
ciais, os conhecimentos intertextuais e outros (KOCH, 2006).
As estratégias textuais são reconhecíveis nas sinalizações fornecidas pelo arranjo
linguístico tecido na superfície textual – a coesão textual.

Coesão textual: a tecelagem


A tecelagem textual entrelaça o material linguístico na superfície do texto, segundo
uma orientação semântica, e funciona como sinalizações colaborativas para a cons-
trução dos sentidos do texto. Assim, a coesão, embora não lhe seja garantia exclusiva,
materializa a coerência.
A coesão textual diz respeito, pois, ao arranjo linguístico que ocorre na linearidade
do texto: na organização das palavras nas orações, destas nos períodos e destes nos
parágrafos. É esse arranjo que auxilia a construção dos sentidos dos textos 1 e 2 e
permite reconhecer:
a) o que seus autores dizem, ou sobre o que dizem: “que bom que você veio para

107
A PRODUÇÃO cá, foi muito bom na quinta-feira não foi? Gostei muito, muito mesmo da sua
TEXTUAL
E O ENSINO visita....” (Texto 1); “eu sou o Lucca, tenho 8 anos e moro em Vila Velha – ES.
Tenho um irmão que se chama Enzo. (...) Vamos te conhecer no Natal, estou
doido para conhecer você e acho que o Enzo também.” (Texto 2);
b) a quem dizem: “Samuel” (Texto 1); “Gabriela” (Texto 2) – interlocutores
explícitos;
c) quando dizem: “14/06/09” – espaço temporal;
d) onde dizem: “Vila Velha” – espaço geográfico;
e) por que e para que dizem: “Foi a segunda vez que você veio para cá?”, ou seja,
o objetivo de estabelecer uma interação verbal e declarar sua amizade a Samuel
– “Você e meu amigão, você gosta de ver eu tocar bateria eu também gosto de
tocar para você”; e a finalidade – “você tem que vir aqui para ouvir esse ritmo,
e ficar mais dias aqui” (Texto 1), enquanto no texto 2, o autor objetiva se apre-
sentar, a fim de preparar o interlocutor para a visita que lhe fará no Natal: “estou
doido para conhecer você”;
f ) como dizem: os elementos que permitem reconhecer o gênero textual carta
pessoal ou familiar – data, vocativo, interação verbal, saudação final e assinatura
(nos textos, ausente).

A coesão diz respeito, portanto, à organização sintático-semântica do texto; isto é,


aos encaixamentos feitos na superfície do texto, como a escolha das palavras por Enzo
e por Lucca, as quais comportam significados segundo os objetivos pretendidos por
eles. É uma “tecelagem” feita de palavras visando à progressão do texto. Cada palavra
se junta à outra de modo que o sentido da antecedente se amplia e, assim, elas vão se
acolchetando entre si.
A coesão materializa os fatores da coerência, já que oferece ao leitor as “pistas” para
que ele compreenda e interprete o texto, segundo os objetivos do autor. É isso que
nos faz reafirmar que, se a coesão textual não é garantia para a construção da coerência
de um texto, ela é a grande responsável por nos orientar na construção dos sentidos,
da coerência.
O autor acrescenta informações novas – para aquele e naquele texto – ancorando-
se em informações que ele pressupõe – ou tem certeza – que o leitor conheça, ou que
já tenha sido apresentada no texto:
“Você sabe (o quê?) onde eu morei? Morei em Belo Horizonte, Caxias do Sul e
Governador Valadares” (Texto 1); “Tenho (o quê?) um irmão que se chama Enzo”
(Texto 2).
Esses fragmentos dos textos 1 e 2 tornam-se exemplos de encaixamentos

108
necessários para que materializem o que os seus autores objetivam transmitir aos seus Coesão-coerência-
contexto: tripé da
interlocutores. produção textual

No fragmento do texto 1, “você” é o tratamento dispensado ao interlocutor “Sa-


muel” – remissão pronominal – a que se liga “sabe” – configuração dos “processos da
realidade objetiva no seu enquadramento temporal” ( VILELA; KOCH, 2001, p. 64), em
torno da qual giram os demais vocábulos, que, por exigência de complementação de
sentido (sabe o quê?) faz com que lhe seja conectado “onde” e, sucessivamente, “eu
morei”. A conexão desse período ao seguinte se dá pela retomada de “morei” – repe-
tição da ação anterior.
O fragmento do texto 2 traz, por exigência semântica da ação “tenho”, “irmão”,
vocábulo recuperado por “que” e por “Enzo”.
Os encaixamentos acontecem mediante pontos de ancoragem textuais (explícitas,
coesivas) ou contextuais (implícitas, construídas pelo conhecimento de mundo ou
prévio).
Os textos 1 e 2, ao se organizarem, apresentam, por conseguinte, sinalizações que
facilitam o entendimento de que:
a) Elementos dos textos, ao serem substituídos por outros equivalentes, podem
apresentar instruções de conexão (nível sintático), marcadas por nomes que
“encapsulam” informações contidas em sequências expandidas explícitas ou im-
plícitas: “Na minha bateria encontrei uma música maneira, você tem que vir
aqui para ouvir esse ritmo,...” (Texto 1); “Vamos te conhecer no Natal” = 25
de dezembro, nascimento de Jesus, data em que, tradicionalmente, as famílias
cristãs se reúnem (Texto 2).
b) Os autores, para expandirem os textos, podem retomar vocábulos por meio
da sua repetição, o que caracteriza a reiteração, total ou parcial: no texto 1,
essas recuperações por repetição ocorrem em “você”, “eu”, “morei”, “bateria”,
pronomes, verbo e substantivo – recursos que a gramática põe à disposição dos
autores e dos leitores a fim de que lancem mão no momento da produção e da
recepção ou leitura do texto. No texto 2, “eu”.
c) O autor pode recuperar um termo ou uma sequência por meio da pronomina-
lização, desde que haja um contexto específico explicitamente no texto ou im-
plicitamente proposto: “...tenho um irmão que se chama Enzo. Ele é um pouco
legal...” (Texto 2); “música maneira, [...] esse ritmo...” (Texto 1).
d) No estabelecimento das relações sequenciais (nível pragmático), evidenciam-se
instruções de consequência, continuidade, indicadas pela expansão das frases,
por meio de outras conectadas pelas conjunções: “acho que o Enzo também.
(...) Eu acho que sim (...).]

109
A PRODUÇÃO e) A descrição definida é outra estratégia de progressão textual, marcada pela ên-
TEXTUAL
E O ENSINO fase que o autor deseja dar a certos traços ou características do referente: “meu
amigão” = “Samuel” (Texto 1); “Ele é um pouco legal” = “Enzo” (Texto 2).
f ) São os arranjos que mobilizam cada uma das partes estruturais do texto. Arran-
jos que serão tanto mais variados e sofisticados quanto maior for, no momento
da produção, o conhecimento linguístico e sobre a sua consequente adequação
à situação de uso que o autor detiver.

Assim, os arranjos linguísticos são diferentes, visto que a organização textual se faz
segundo as necessidades impostas pelas situações de interação verbal que ocorrem
nas várias esferas sociais nas quais os sujeitos – autor e leitor – circulam: os autores
dos textos 1 e 2 mobilizam recursos que fazem parte de seu conhecimento linguístico,
de mundo, enciclopédico, compatíveis às experiências adquiridas ao longo dos oito
anos que têm e da vida que têm em família e na sociedade.
Dessa discussão, resumimos que os textos 1 e 2 podem ser concebidos como uni-
dades semânticas, tendo em vista que os seus elementos coesivos, componentes tex-
tuais, organizam-se em um arranjo em que os significados vão sendo construídos de
forma dependente das relações estabelecidas por meio dos recursos gramaticais e por
meio das escolhas lexicais. Tal arranjo é construído por estratégias que implicam, den-
tre outras:
a) A referência situacional (exofórica) – o elemento que se encontra no texto re-
mete o leitor ao contexto: “Oi Samuel que bom que você veio para cá” = Vila
Velha (Texto 1); “ você tem que vir aqui para ouvir esse ritmo, e ficar mais dias
aqui” = Vila Velha – contextual, embora referida no início da carta (Texto 1).
b) A referência textual (endofórica) – ocorre quando o elemento referido se en-
contra no texto: “Tenho um irmão que se chama Enzo. Ele é um pouco legal”
(Texto 2).
c) A substituição – um vocábulo, ou mesmo uma oração inteira, é empregado em
lugar de outro no texto: “Tenho um irmão que se chama Enzo. Ele é um pouco
legal” (Texto 2). Neste caso, a referência textual ocorre com a substituição do
substantivo “irmão” pelo pronome relativo “que” e do substantivo “Enzo” pelo
pronome pessoal do caso reto “ele”.
d) A elipse – omissão de uma palavra, expressão ou mesmo de uma oração do tex-
to: “(Ele, meu irmão, Enzo) toca bateria...”; “(Eu) tenho um irmão...”; “(Nós)
vamos te conhecer no Natal” (Texto 2).
e) A conjunção – estabelecimento de relações por meio de conectores: “... tenho
8 anos e moro...” (Texto 2).

110
f ) A coesão lexical – é o arranjo construído mediante os mecanismos de repetição Coesão-coerência-
contexto: tripé da
de mesmo item lexical, por meio da sua substituição por sinônimos, pronomes, produção textual

hipônimos ou heterônimos: “... um irmão (...) Enzo. Ele...” (Texto 2).


g ) A coesão sequencial – procedimentos linguísticos que estabelecem relações en-
tre o que foi dito e aquilo que será dito: “... Gostei muito, muito da sua visita”
(Texto 1).
h) A colocação – uso de palavras cujo campo semântico é o mesmo “Os seus pais
estão bem? (...) Deus abençoe toda a sua família” (Texto 2).

Coesão e coerência: as relações entre a manifestação linguística e os


sentidos do texto
Os textos 1 e 2 mostram que a necessidade de sinalizações faz com que os autores
de textos se valham de fatores que se entrelaçam e são reconhecíveis, na superfície do
texto, orientados pela situação de interação e os entornos, contextos, deles e dos leito-
res. Isso implica aceitar a coesão, não como garantia absoluta de coerência, mas como
manifestação linguística – mecanismos lexicais e gramaticais de sua construção. Dessa
forma, se a construção dos sentidos se dá pelas relações estabelecidas com aquilo que
o texto escrito traz implícito, de um lado, o autor deve adequar os recursos expressi-
vos, as variedades da língua e o estilo ao leitor ao objetivo, enfim, ao contexto de uso
da situação comunicativa; de outro, o leitor lerá o texto reconhecendo esses recursos
expressivos, a variedade de língua e o estilo conforme a sua pertinência ao contexto de
uso, ou seja, a sua interpretação. Envolve-se aí o conhecimento compartilhado pelos
sujeitos da situação comunicativa, no qual se estabelece o princípio da interpretabili-
dade do texto, ou seja, a coerência textual.
Como princípio de interpretabilidade, a coerência textual trata do modo com que
os elementos subjacentes à superfície estão veiculados no texto, ou seja, a coesão
textual que o materializa.
O texto se organiza de forma coerente, segundo os pressupostos da Linguística
Textual, quando se reconhece nele:
1) A situacionalidade – ponte entre o mundo real e o mundo construído pelo
autor.
2) A intencionalidade – o objetivo (por que) e a finalidade (para que) do autor
ao escrever o seu texto.
3) A informatividade – distribuição da informação contida no texto e à previsibi-
lidade com que ela é representada.
4) A intertextualidade – modo pelo qual o texto se relaciona com outros textos,
com os seus conhecimentos prévios, com o mundo em que se insere, visto que

111
A PRODUÇÃO os textos se constroem em relação a outros textos e contextos já conhecidos.
TEXTUAL
E O ENSINO O momento em que o autor traz para o seu texto as suas leituras de mundo, as
relações que estabelece com suas próprias experiências e com as contidas em
outros textos e no que circunda tanto ele como o seu leitor.
5) A aceitabilidade – acordo cooperativo entre o autor e leitor que permite o
preenchimento dos vazios de comunicação que o texto apresenta e o torna
significativo e relevante ao leitor.
Para garantir a coerência textual, reiteradamente, estudiosos do tema recorrem às
metarregras de Charolles (1978), que retomamos aqui:
a) Repetição – retomada de elementos que garantam a unidade do texto, dando-
lhe continuidade por meio do apoio em um ponto explícito, que na sua superfí-
cie se manifesta pela repetição de termos, emprego de sinônimos, por exemplo.
b) Progressão – informações novas sobre o que já foi dito.
c) Não-contradição – uma informação não deve contradizer outra que pretende
que lhe seja compatível, bem como deverá sê-lo com o mundo que deseja re-
presentar. Por isso, conhecer o léxico da língua em que o texto é escrito torna-se
imprescindível aos sujeitos da comunicação – autor e leitor.
d) Relação – estabelecer relações de sentido entre as informações apresentadas é
outro princípio a ser observado, se o autor deseja produzir um texto coerente.

Coesão-coerência-contexto: tripé da produção textual


Texto é um enunciado pleno de significação, independente de sua extensão, pro-
duzido para satisfazer às necessidades provocadas pelas situações de interação verbal
que ocorrem nas várias esferas sociais pelas quais os sujeitos transitam. É um espaço
de interação verbal, no qual todas as ações linguísticas, cognitivas e sociais – estraté-
gias sociocognitivas – se entrelaçam de tal modo que autor e leitor recorrem a estraté-
gias capazes de cumprir os objetivos da interação pela linguagem e, juntos, constroem
os sentidos do texto.
Dessa forma, os textos 1 e 2, cartas produzidas por Enzo e Lucca, respectivamente,
preservados os espaços socioculturais que ocupam os seus autores – cumprem a sua
função comunicativa, uma vez que as materializaram com tudo aquilo que julgaram
ser necessário para a construção dos sentidos desejados, ancorando-se no contexto
em que confluem os saberes que os autores e seus leitores têm acumulado. Ambos
os textos, segundo o contexto de uso, estabeleceram relações, em um balanceamento
adequado e equilibrado, entre o explícito e o implícito.
Portanto, concluímos enfatizando que o texto não é simplesmente um amontoado
de frases, tampouco a construção de seus sentidos, mesmo sendo um jogo múltiplo

112
e interacional, é ilimitada e totalmente livre. O texto organiza-se, segundo princípios Coesão-coerência-
contexto: tripé da
gerais de dependência e independência sintática e semântica, uma vez que se alicerça produção textual

no tripé: coesão – evidentemente sintática e gramatical, bem como semântica, já que,


mesmo sem ser garantia de coerência, é responsável pelas relações estabelecidas entre
um elemento do texto e outro crucial para a sua interpretação, textual ou contextual;
coerência – sentidos construídos a partir dos conhecimentos compartilhados pelos
sujeitos da situação comunicativa; contexto – porto de ancoragem da produção tex-
tual. A coesão, pois, ajuda a estabelecer a coerência textual; entretanto, não a garante,
já que depende do conhecimento compartilhado pelo autor e pelo leitor do texto,
concernente ao contexto em que estão inseridos.

Referências

CHAROLLES, Michel. Introdução aos problemas da coerência dos textos. In: GALVES,
C. et al. (Org.). O texto: escrita e leitura. Campinas: Pontes, 1978.

GERALDI, João W. Linguagem e ensino: exercícios de militância e divulgação.


Campinas, SP: Mercado de Letras; ALB, 1996.

KOCH, Ingedore G. V. Desvendando os segredos do texto. São Paulo: Cortez,


2002.

KOCH, Ingedore G. V.; ELIAS, Vanda M. Ler e compreender os sentidos do texto.


São Paulo: Contexto, 2006.

TRAVAGLIA, Luiz Carlos. Gramática, ensino plural. São Paulo: Contexto, 2004.

VILELA, Mário; KOCH, Ingedore G. V. Gramática da Língua Portuguesa. Lisboa:


Almedina, 2001.

113
A PRODUÇÃO
TEXTUAL
E O ENSINO
Anotações

114
6 O parágrafo na
construção textual

Maria Aparecida Leite Mendes Cota (Faminas/BH)

Escrever é fácil: você começa com uma letra maiúscula e termina com um ponto final. No
meio você coloca ideias (Pablo Neruda).

1 A ESCRITA COMO ATO DE ENUNCIAÇÃO


Creio que você deve estar questionando o poeta e se perguntando como conceber
a escrita de forma tão simplista. E eu, do lado de cá da tela, fico tentando desenhar o
seu perfil e me indagando se você, caro aluno, também faz parte daquele coro de vozes
que reclama sempre da dificuldade de escrever. Ou ainda, se sente arrepios quando as
pessoas que o cercam lhe cobram habilidades de escrita ou insinuam que o aluno de
Letras sempre escreve bem. Ou, quem sabe, você adora escrever e será grande parceiro
nessa empreitada que agora se inicia...
Estamos aqui para tentar resolver esse problema e acabar de vez com esses fan-
tasmas que nos rodeiam ou para aperfeiçoar ainda mais a escrita... Gostaria de iniciar
nossa conversa com uma citação de Cristóvão Tezza:

115
A PRODUÇÃO Somos definidos pela linguagem e, no universo das variedades que compõem
TEXTUAL esse mundo linguístico e político chamado ‘língua portuguesa’, a língua padrão,
E O ENSINO
que a escrita representa, tem a função de nos colocar no mundo da História e
da civilização. A escrita é a mais ampla porta que se pode abrir para o mundo.

Como vimos, somos seres constituídos pela linguagem, no seu sentido mais amplo:
pensamos, sentimos e nos expressamos pela linguagem, por isso nos fazemos texto
diante do outro, que lê nossos gestos, fisionomias, atitudes... Mas e na escrita, como
se processam os textos? Como fazer com que ela nos abra as portas para o mundo ou
nos insira no mundo dos letrados? Como produzir textos adequados à situação de
comunicação?
Segundo Moacyr Scliar, escrever é “colocar as palavras uma ao lado da outra, é um
jeito de organizar o pensamento, mas é, sobretudo, um jogo, como aqueles jogos de
armar.” Vamos então direcionar nossa conversa para essa metáfora do jogo?
Sabemos que a comunicação é um jogo que envolve sempre interlocutores eu e
tu em um processo constante de inter-ação. Assim, comunicar é agir sobre o outro,
causar-lhe efeitos diversos. Por isso, o gesto de organizar as palavras uma ao lado
da outra requer habilidades diversas. É necessário, em um primeiro momento, saber
quem somos, que lugar social ocupamos (estudante de Letras, funcionário de uma em-
presa, professor...), quem é o nosso interlocutor, qual sua faixa etária, seu lugar social,
seus gostos, suas expectativas em relação ao texto que lhe é endereçado, que imagem
ele faz do autor, que efeitos pretendemos gerar no leitor, etc. Feito isso, precisamos
nos localizar no tempo e no espaço no aqui e no agora.
Abre-se, assim, o espaço que Benveniste (1989) denomina instância enunciativa, ou
seja, o eu e o tu situados no tempo e no espaço se apropriam da língua, fazem escolhas
de palavras para atingir os efeitos desejados.
Depois de traçado o perfil dos interlocutores, é necessário explicitar o objetivo
do texto: para que escrevemos? Pretendemos informar, ensinar, criticar, expor, negar,
descrever, narrar, argumentar, defender, acusar, ordenar... Como devemos dizer? Que
palavras surtirão melhor efeito? Feito isso, precisamos determinar quais serão as estra-
tégias utilizadas, o “como dizer”.
Para compreendermos melhor esse jogo do dizer, vamos ler o texto a seguir:

116
O parágrafo na
A maneira de dizer as coisas1 construção textual

Conta uma estória que um sultão sonhou ter perdido os dentes. Ao despertar,
mandou chamar um adivinho para lhe interpretar o pesadelo.
- Que desgraça senhor, exclamou o bruxo. Cada dente caído representa a perda de
um parente de vossa majestade.
- Mas que insolente, gritou o sultão enfurecido. Como te atreves a dizer-me seme-
lhante coisa? Vais levar cem chicotadas.
Ordenou, então, que trouxessem outro adivinho. Sabido, depois de ouvi-lo com
atenção, disse-lhe:
- Excelso Senhor! Grande felicidade vos está reservada, o sonho significa que ha-
veis de sobreviver a todos os vossos parentes.
O sultão sorriu feliz, deu cem moedas de ouro ao intérprete. Quando o felizardo
saía do palácio, um dos cortesãos comentou:
- Não é possível! A interpretação que você fez foi a mesma que seu colega havia
feito! Não entendo porque ao primeiro ele pagou com cem açoites e a você com cem
moedas!
O felizardo respondeu sorrindo:
- Tudo depende da maneira de dizer...

Podemos observar no texto a sagacidade e perspicácia do segundo adivinho na


escolha das palavras e na arte do dizer. Ele fez o cálculo perfeito: ouviu atentamente
o relato do sonho; determinou os papéis entre os sujeitos – de um lado o sultão rico
e bem sucedido ávido de boas notícias; do outro, ele, o adivinho, em uma condição
social inferior, um porta voz quase divino. A partir dessas informações, ele escolheu
meticulosamente cada uma das palavras, apagando o sentido negativo da morte dos
parentes e da solidão dela advinda. Dessa forma, conquistou a simpatia – e as moedas
– do sultão, ao contrário do bruxo, que não se preocupou com o modo de dizer.1
Assim como o felizardo do conto, devemos também aprender a jogar com as pa-
lavras, a fazer escolhas adequadas, ou seja, a dominar a linguagem. Você deve estar
se perguntando: “mas como fazer isso?”; “Que habilidades devemos desenvolver?”;
“Como saber se estamos organizando bem as palavras e ideias?”.
Resposta: planejando bem o texto a ser produzido! Esse é o nosso próximo passo.

2 PLANEJAMENTO TEXTUAL
Uma das formas de se cuidar da produção escrita é o planejamento textual. Como
organizar as ideias, introduzir, desenvolver e concluir o texto? O primeiro passo con-
siste em traçar um esboço, um esquema, que possibilite a visão global do texto. O ato

1 A maneira de dizer as coisas. Disponível em: <http://74.125.93.132/


search?q=cache:zdyevIOqoXMJ:www.afrid.faefi.ufu.br/jornal_online/n_026.
pdf+JEITINHO+DE+DIZER>. Acesso em: 31 ago. 2009

117
A PRODUÇÃO de planejar propicia ao autor a possibilidade de calcular os efeitos gerados no interlo-
TEXTUAL
E O ENSINO cutor. Daí surge a pergunta: como fazer?

2.1 Como planejar?


Um dos primeiros passos da escrita é determinar o tema a ser abordado. Imagi-
nemos um tema: a violência. Escolhido o tema, precisamos fazer o levantamento de
conhecimento prévio sobre o assunto. O que sabemos sobre o assunto? Que fontes
– livros e revistas – dispomos para consulta? Aí começa um exercício essencial: pesqui-
sar o tema. Ninguém escreve sobre assunto que não conhece! Certamente, ao iniciar
nossa pesquisa, vamos descobrir que é impossível tratar de tema tão amplo. Por isso,
Emediato (2004) sugere a criação de uma árvore temática. Observemos:

VIOLÊNCIA

Tipos Causas Consequências Soluções

Urbana Rural Policial Sociais Morais Políticas Insegurança Políticas Penais

Tráfico Disputa por terra Repressão Miséria Éticas Corrupção Sociais Sistema
Prisional

Fonte: Emediato, 2004, p. 90.

Assim, como vimos na árvore temática acima, há várias possibilidades de aborda-


gem do tema violência. Por isso, o segundo passo é recortar ou delimitar o tema.
Surgem então as ramificações, os galhos da árvore.
A tarefa agora é partir para o terceiro passo: a leitura minuciosa dos livros, jornais
e revistas sobre o tema. Vamos destacar as ideias principais, fazer esquemas e resumos
sobre os textos escolhidos.
Esse trabalho de pesquisa nos permite, além de desenvolver habilidades de leitura,
buscar informações sobre o tema, a matéria-prima para a construção do texto. Não
pense você, caro (a) aluno (a), que ler é perda de tempo. Ao ler ou estudar um texto,
estamos interiorizando novas estruturas, incorporando novas palavras ao nosso voca-
bulário e, sobretudo, construindo conhecimento.
Depois de ler sobre o tema violência, já somos capazes de apontar seus tipos, cau-
sas consequências e as possíveis soluções. Feito isso, partimos, então, para o quarto
passo: a seleção de um dos aspectos apontados. Se pretendermos tratar, por exemplo,

118
da violência urbana, teremos que selecionar também outra abordagem: consequências O parágrafo na
construção textual
da violência em determinada época e espaço.
Vejamos: o objetivo do nosso texto está definido: vamos mostrar as consequências
da violência urbana nas metrópoles brasileiras, nas últimas décadas. Assim, traçamos
os recortes no espaço (metrópoles brasileiras) e no tempo (últimas décadas).
Depois disso, começamos a trabalhar no quinto passo: que efeito pretendemos
causar: sensibilizar alguém para o problema, fazer refletir, causar impacto? Informar de
maneira mais objetiva? Formar opinião?
Sexto passo: para quem vamos escrever? Para um professor? Para o jornal da esco-
la? Ou para o jornal da cidade? Para uma revista de circulação nacional? Essa escolha vai
determinar a linguagem a ser utilizada: linguagem formal ou informal?
Sétimo passo: Como dizer isso de forma a atingirmos o objetivo traçado? Quantas
páginas vamos escrever? Se vamos escrever para o jornal, temos restrição de espaço.
Linhas, colunas? Em quantos parágrafos vamos organizar o texto? Em que caderno vai
figurar o texto? Quais textos aparecerão junto a ele? Quais os fatos estão em evidência
no momento?
Você já deve estar impaciente para colocar a “mão na massa”, ou melhor, no tecla-
do. Antes, vamos dar uma olhadinha na imagem a seguir:

Fonte: http://2.bp.blogspot.com/_fQgerUFXtJA/SUWy5suEwaI/AAAAAAAAFsM/A6b6TAprtfE/s400/jjj.jpg. Acesso em: 15 set. 2009

A partir da imagem, vamos registrar mentalmente todas as palavras que nos ocor-
rem sobre o tema violência urbana: crimes, assassinatos, tráfico de drogas, assalto à
mão armada, bala perdida, sequestros, favelas, condomínios fechados, insegurança,
medo, grades, cerca elétricas, polícia, câmeras, circuitos internos, lazer, tranquilidade,
muros, grades, segregação/separação social, descaso social, isolamento, miséria, de-
semprego, desqualificação profissional, luxo, indiferença, desigualdade social...
Agora que temos um número razoável de palavras, vamos agrupá-las: de um lado,
temos os condomínios fechados de alto luxo; de outro, a miséria, o desemprego...

119
A PRODUÇÃO Enfim, criamos um eixo temático ligado à desigualdade social. Percebemos um parado-
TEXTUAL
E O ENSINO xo: de um lado riqueza, de outro luxo. E os condomínios fechados? Por que aparece-
ram nessa lista? O que são? Que papel desempenham nesse contexto? Seriam mecanis-
mos de proteção? Será que intensificam a segurança? Ou intimidam os desfavorecidos
com o seu luxo?
Após tantas etapas, o texto ficou pronto. Veja se ele lhe parece bom.

A violência e as fortificações urbanas


Os condomínios fechados são espaços diferenciados utilizados como principal
mecanismo de defesa da sociedade contra a violência urbana. São construídos como
verdadeiras fortalezas, erguidas entre muros enormes, extensos portões, grades e so-
fisticados equipamentos de segurança. Como não bastasse todo esse aparato, ainda
se faz presente a figura do guarda, do segurança, que, junto aos circuitos de tevê com
câmeras espalhadas por todos os cantos, tudo vê e tudo controla.
Seria esse o mundo perfeito? Ou será que a sociedade se tornou refém do próprio
medo? São esses espaços a solução perfeita para o problema da insegurança, da falta
de proteção do cidadão? Se isolar por detrás dessas fortificações não seria o mesmo
que criar um mundo à parte e se segregar da sociedade? Seria essa uma tentativa de
eliminar o diferente e, sobretudo, de viver somente entre os iguais? Ou quem sabe até
de erguer, entre os muros físicos, os muros da incompreensão e da resistência armada
de sujeitos cada vez mais alienados e menos politizados?
Indiferentes a tais questionamentos, construtoras investem em empreendimentos
milionários e novos muros se erguem cada vez mais altos, mas sempre em nome da
proteção, da segurança, do conforto e do requinte e bem estar de um grupo seleto.
Daí surge a pergunta que não quer calar: seriam esses muros apenas fortificações
urbanas ou espelhos que refletem a repulsa, a indiferença e o descaso social diante
dos inúmeros problemas que assombram nossas metrópoles?
Texto escrito exclusivamente para este capítulo.

Dica de leitura:
Para saber mais sobre esse tema, leia o livro:

CALDEIRA, Teresa Pires do Rio. Cidade de muros: crime, segregação e cidadania em


São Paulo. São Paulo: Editora 34/Edusp, 2000. 400 p.

O texto foi produzido, e pode ser aprimorado. Todavia, o importante é que as


ideias se concretizaram no papel, os ajustes são feitos depois dessa etapa. Queríamos
apenas mostrar como é importante o planejamento e, principalmente, como ele se

120
constitui como forte aliado do autor no processo da escrita. Vamos pensar um pouco O parágrafo na
construção textual
sobre esse processo, fazendo as atividades a seguir.

Atividades:
1) Leia atentamente o texto A violência e as fortificações urbanas e responda às
seguintes questões sobre suas condições de produção:
• Qual o tema do texto?
• Como o tema foi delimitado?
• Que tipo de leitor o texto prevê?
• Que opinião o autor defende?
• Com que objetivo foi escrito o texto?
• Que efeito(s) pode gerar no leitor?
• A estratégia do “como dizer” foi apropriada?

2) Escreva para a autora um texto se posicionando sobre o tema. Você concorda


com as ideias por ela defendidas ou tem um posicionamento diferente? Você
tem a resposta para os questionamentos feitos? Faça o seu planejamento textual
e mãos à obra!

3) Vamos agora tratar da estruturação do texto em parágrafos.


• Quantos parágrafos têm o texto?
• Como você os identificou?
• Qual a importância dos parágrafos na organização textual?

Para responder a essas questões com maior segurança, estude com atenção os tó-
picos a seguir:

3 DEFINIÇÃO E OBJETIVOS DO PARÁGRAFO


É importante lembrar que todo texto, do mais simples bilhete a uma tese de douto-
rado, é composto por introdução, desenvolvimento e conclusão. Portanto, depois de
traçarmos o planejamento do texto a ser produzido, devemos nos ater à organização
dessas partes em parágrafos.
Vejamos o conceito de parágrafo:

121
A PRODUÇÃO
TEXTUAL “Parágrafo é a unidade de composição constituída por um ou mais períodos, em
E O ENSINO que se desenvolve determinada idéia central, a que se agregam outras, secundárias,
intimamente relacionadas pelo sentido e logicamente decorrentes delas.” (GARCIA
1976, p. 189).

O parágrafo é o conjunto de frases que formam uma sequência com sentido, com
lógica. É representado tipograficamente pelo símbolo § = signum sections (sinal de
separação ou de seções). (GARCIA 1976, p.189).

Conforme a ABNT NBR 10520 (2002), para a paragrafação de um trabalho científico


podem ser utilizados dois estilos: o parágrafo com recuo ou sem recuo da margem.
No caso de optarmos pelo parágrafo com recuo, deve-se recuar, na primeira linha
do parágrafo, 2 cm da margem esquerda. Já no caso do parágrafo sem recuo, ele deve
ser justificado, separando-se os parágrafos com 12 pts antes e depois.

Em um mesmo trabalho, qualquer que seja a modalidade, deve-se utilizar um só


estilo de paragrafação: com recuo da margem ou sem recuo.

O parágrafo ideal deve ter, no mínimo, três períodos: um para cada uma das par-
tes que o constituem (introdução, desenvolvimento e conclusão). Além disso, todo
parágrafo deve ser organizado em torno de uma única ideia e deve apresentar na sua
introdução um objetivo claro.
A ideia central do parágrafo é enunciada por meio de um período denominado tó-
pico frasal, no qual anunciamos o seu objetivo. O tópico frasal, ou frase-núcleo, orien-
ta ou governa o restante do parágrafo; dele nascem outros períodos secundários. Por-
tanto, o tópico frasal deve ser o roteiro para você desenvolver e concluir o parágrafo.
O parágrafo dissertativo ou parágrafo padrão tem como núcleo uma única ideia.
Essa ideia é exposta na introdução do parágrafo, desenvolvida ao longo dele e refor-
çada na sua conclusão.
A introdução normalmente é constituída de uma ou duas frases curtas, que expres-
sam, de maneira sintética, a ideia principal do parágrafo, definindo seu objetivo.
O desenvolvimento corresponde a uma ampliação da ideia principal, com apresen-
tação de ideias secundárias que a fundamentam ou esclarecem.
A conclusão retoma a ideia central, levando em consideração os diversos aspectos
selecionados no desenvolvimento.
Para não se afastar do objetivo proposto, escolha o critério para organizar as ideias:
você pretende definir, descrever ou enumerar aspectos do objeto, compará-lo com
outro, apresentar fatores positivos ou negativos, posicionar-se a favor ou contra de-
terminada situação, informar determinado fato... Depois disso, estabeleça a forma de

122
desenvolvimento do tema. É esse o momento de apresentar as circunstâncias e os O parágrafo na
construção textual
pormenores.

Observe os exemplos a seguir:


O objetivo é definir educação a distância (EAD). Veja como organizamos a introdu-
ção, o desenvolvimento e a conclusão:
em itálico, destacamos a introdução do parágrafo; em sublinhado, destacamos o
desenvolvimento do parágrafo em que apresentamos características da EAD e, em ne-
grito, concluímos apontando as vantagens da EAD.

Exemplo 1

Educação a distância é o processo de ensino-aprendizagem mediado por tec-


nologias que permitem a professores e alunos, separados espacial e/ou temporal-
mente, se interagirem por meio de diversas mídias, computador (internet), televi-
são, DVDs, apostila entre outros. Portanto, esse método de instrução propicia
a interação entre professor e aluno por meio de textos impressos, meios
eletrônicos, chat, fórum e outros meios de comunicação.

Já no exemplo 2, vamos apresentar um parágrafo organizado com o objetivo de


enumerar as vantagens da EAD.

Exemplo 2

Muitas pessoas, embora sintam a necessidade de voltar a estudar, relutam


em aceitar a educação a distância. Elas se esquecem de que essa modalidade de
ensino é bastante flexível e propicia ao aluno três vantagens: gerenciar com auto-
nomia o horário e o local de estudo, conforme necessidades de cada um; estudar
sem se preocupar em preestabelecer local ou horário fixo e conciliar atividades
profissionais, familiares e sociais com a graduação superior. Assim, o acesso à
educação se torna mais flexível e dinâmico, além de atender às mais diver-
sas necessidades e interesses.

Já no exemplo 3, vamos apresentar um parágrafo organizado com o objetivo de


descrever um link:

123
A PRODUÇÃO Exemplo 3
TEXTUAL
E O ENSINO

http://www.overmundo.com.br/estaticas/sobre_o_overmundo.php- O over-
mundo, é um site colaborativo. Um coletivo virtual. Seu objetivo é servir de canal
de expressão para a produção cultural do Brasil e de comunidades de brasilei-
ros espalhadas pelo mundo afora tornar-se visível em toda sua diversidade. Para
funcionar, ele precisa da comunidade de usuários sempre gerando conteúdos,
votando, disponibilizando músicas, filmes, textos, comentando tudo e trocando
informações de modo permanente.

Fonte: http://portaldoprofessor.mec.gov.br/links_interacao.html?categoria=204

Observe que a ideia foi desenvolvida de tal forma que não foi necessária a apresen-
tação de uma conclusão.

Já no exemplo 4, vamos apresentar um parágrafo organizado com o objetivo narrar


um fato:

Exemplo 4

A partir de 2011, o governo federal vai distribuir livros didáticos específicos


para a educação de jovens e adultos. As obras serão entregues nas escolas públi-
cas e entidades parceiras do programa Brasil Alfabetizado com turmas de ensino
fundamental. (...) As disciplinas das turmas de alfabetização contempladas serão
letramento e alfabetização linguística e alfabetização matemática. Os jovens e adul-
tos matriculados em séries do primeiro ao quinto ano do ensino fundamental re-
ceberão livros de língua portuguesa, matemática, ciências, artes, história e geogra-
fia. Além dessas matérias, os estudantes do sexto ao nono ano ganharão uma obra
de língua estrangeira (inglês ou espanhol). Todos os livros serão consumíveis e
não precisarão ser devolvidos ao fim do período letivo.

Fonte: adaptado de http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_


content&view=article&id=14324

Autores consagrados como Garcia (1976) e Campos e Soares (1982) sugerem ou-
tras formas de se organizar o parágrafo, mas acreditamos que o importante não é se

124
ater a fórmulas e sim à organização das ideias, apresentando-as de forma coerente e O parágrafo na
construção textual
coesa.

Atividades
1) Destaque, no parágrafo abaixo, a introdução, o desenvolvimento e a conclusão.
A comunicação mediada pelas tecnologias digitais merece ser mais investigada,
pois essas tecnologias já estão transformando as práticas pedagógicas. Atual-
mente, a mídia, os professores e até o governo reconhecem que os alunos leem
pouco, mas essas esferas também reconhecem o acesso desses alunos às tecno-
logias digitais. A Internet, por exemplo, está presente no cotidiano de nossos
alunos, pesquisas indicam que eles estão em constante busca de informação e,
para isso, são levados a ler e escrever, mas, de maneira geral, a escola ainda não
incorporou essa nova realidade. Assim, é possível apostar em uma interação
entre educação e tecnologias digitais.
SILVA, Adriana da. Blog educacional: o uso das novas tecnologias no ensino.

2) Sua tarefa agora é escrever um parágrafo para um blog ou revista semanal, defen-
dendo a importância da internet para o desenvolvimento da escrita.

Sentiu alguma dificuldade? Então, vamos por parte...


• Elabore o objetivo do texto: mostrar a importância da internet para o desenvol-
vimento da escrita.
• Primeiro passo: criar o tópico frasal:
- A internet, ao contrário do que se pensa, proporcionou o renascimento da
escrita.
• Segundo passo: planejar o desenvolvimento dessa ideia:
- Como fazer? Vamos mentalmente inserir um pois ou porque após o tópico
frasal. Dessa forma, vamos encontrar os argumentos que serão usados para con-
vencer o leitor do nosso objetivo:
• A internet proporcionou o renascimento da escrita, POIS propicia:
- novas formas de comunicação entre as pessoas;
- oportunidade de se vivenciar uma diversidade de situações de troca de
informações;
- o uso do e-mail como ferramenta de comunicação nas mais diversas situações
de comunicação;
- a oportunidade de interação social.

125
A PRODUÇÃO Agora, é só organizar:
TEXTUAL
E O ENSINO A Internet, ao contrário do que se pensa, proporcionou o renascimento da escrita.
Pessoas que fugiam do lápis agora são levadas a participar de bate-papos on-line, crian-
do uma escrita quase instantânea, em tempo real ou a escrever e-mails – os bilhetes
eletrônicos – que atendem as mais diversas situações e objetivos. Escrevem-se bilhetes
para amigos marcando encontros; reclamações ao fabricante do produto estragado;
cartas para jornais se posicionando sobre determinado ponto de vista e até mesmo
documentos oficiais de empresas divulgando decisões importantes para a tomada de
decisão. Dessa forma, a internet propicia não só a troca de informações, mas a intera-
ção social por meio da escrita.

3) Sua tarefa, agora, é escrever, para o jornal de sua cidade, dois textos, compostos
por apenas um parágrafo:
a) no primeiro, você vai mostrar a importância da EAD para a formação
profissional.
b) no segundo, você vai confrontar a EAD à educação presencial, se posicionan-
do favoravelmente a uma delas.

Autoavaliação
• Verifique se você apresentou claramente o objetivo do parágrafo;
• Observe se você desenvolveu o parágrafo de forma a atender o objetivo
proposto;
• Confira se a conclusão está coerente;
• Observe a coesão e a coerência das ideias.

4 QUALIDADES DO PARÁGRAFO
Uma das principais qualidades do parágrafo é a unidade. Para tanto, é necessário:
• Delimitar o assunto.
• Fixar o objetivo.
• Usar tópico frasal explícito.
• Evitar pormenores desnecessários.
• Evitar frases ou ideias entrecortadas.

Outra importante característica é clareza, que consiste na expressão das ideias de


maneira compreensível, de forma articulada e coesa. Para tanto, evite:
• Usar palavras de significado desconhecido;
• Palavras ou expressões vagas (negócio, coisa...);

126
• Repetição de ideias; O parágrafo na
construção textual
• Períodos muito longos;
• Palavras ou expressões ambíguas.
Obs. A coesão e a coerência são aspectos essenciais na construção de parágrafos
claros objetivos. Para desenvolver melhor essa habilidade, recorra ao capítulo 2 deste
livro.

5 O PARÁGRAFO E AS CITAÇÕES
Ao desenvolver nossas ideias, podemos também recorrer à citação, um artifício
bastante utilizado tanto na mídia quanto em textos de caráter científico: que consiste
em apresentar trechos escritos por outros autores ou depoimentos dados por alguém.
Fiorin e Savioli (2006, p. 25) afirmam que “todo texto é produto de criação coletiva: a
voz do seu produtor se manifesta ao lado de um coro de outras vozes que já trataram
do mesmo tema e com as quais se põe em acordo ou desacordo.”
Você pode observar como isso acontece durante nossas conversas ou enquanto es-
crevemos nossos textos. É comum utilizarmos a voz de outrem para ilustrar uma ideia,
dar um exemplo, relatar um fato. Por isso, nossas falas são marcadas por expressões:
“como dizia minha vó”; “como diz o ditado” ou “uma amiga me contou que”, “eu vi na
revista/jornal” ou ainda “me disseram que”, pois temos sempre necessidade de confe-
rir autoridade ao nosso discurso.
Nos textos escritos, isso não é diferente, só que costumamos usar expressões mais
formais como: “segundo dados do instituto tal”, “conforme reportagem da revista tal”,
“de acordo com Fulano”. A esse artifício de trazer para o nosso discurso/textos trechos
de outros discursos/texto denominamos de citação. Esse é um recurso muito utilizado
para desenvolver parágrafos em textos que circulam na esfera acadêmica.
Observe, no parágrafo a seguir, como as citações dos autores destacados integram
o texto e como contribuem para se atingir o objetivo proposto na introdução do
parágrafo:

Os blogs funcionam como instrumento de comunicação, pois, de acordo com


Baltazar e Aguaded (2005, p. 2), “possibilitam que todos nós tenhamos uma pa-
lavra a dizer, que todos tenhamos um espaço nosso na rede, sendo esse um dos
principais factores para o seu sucesso.” Também é importante lembrar que seu
sucesso está relacionado à facilidade de se criar um blog e ao fato de que qualquer
um com acesso à Internet pode criar seu, já que esse serviço pode ser encontrado
gratuitamente.
SILVA, Adriana da. Blog educacional: o uso das novas tecnologias no ensino (no prelo).

127
A PRODUÇÃO Podemos observar que a autora introduziu o parágrafo com o objetivo de mostrar
TEXTUAL
E O ENSINO que os blogs funcionam como instrumento de comunicação. Para desenvolver essa
ideia, a autora utilizou a voz de outro autor, nos informando não só a data de publica-
ção da obra de onde foi retirado o trecho citado, mas também a página onde o trecho
se encontra.
Esse recurso é bastante utilizado em texto de natureza científica, para se garantir
maior credibilidade às pesquisas. Por isso, quando você estiver lendo um texto e achar
uma ideia importante, anote-a, porque certamente ela poderá ser utilizada mais tarde
em forma de citação nos trabalhos que você produz ao longo do curso.
Acreditamos que agora você já deve estar se sentindo preparado para escrever tex-
tos dos mais diversos gêneros. Você se assustou ao ler essa frase? Esperamos que não,
pois se o texto é composto de vários parágrafos e você já aprendeu a escrever parágra-
fos, agora é só colocar a mão na massa e escrever sempre, pois como disse o poeta:
“Escrever é fácil: você começa com uma letra maiúscula e termina com um
ponto final. No meio você coloca ideias.”
Assim, se cada parágrafo é organizado em torno de uma única ideia, basta então
você organizar as ideias em vários parágrafos, seguindo sempre as orientações dadas.
Mas, ao terminar de escrever, lembre-se: você acaba de morrer como escritor e nascer
como leitor! O que isso significa? Significa que devemos sempre nos distanciar do texto
por nós produzido para fazermos uma leitura crítica contemplando todos os aspectos
que envolvem a produção textual, inclusive a revisão linguística.
Afinal, a escrita, como você deve ter percebido, é um processo. Não se produzem
textos em um passe de mágica. É necessário muito esforço e dedicação não só para
colocar as ideias no papel, mas também para avaliar nossos textos. Pensando nisso,
apresentamos a seguir algumas orientações, sugeridas por Val (1997), para a avaliação
de resumos e de resenhas. Acreditamos que essas podem ser devidamente adaptadas
a outros gêneros de textos.

6 DICAS PARA AUTOAVALIAÇÃO DE TEXTOS


1) Como você sinalizou para o futuro leitor qual é o tema central do texto lido?
2) Qual o eixo, o fio da meada do seu texto? Quando o leitor terminar de ler, de-
verá ter compreendido o quê?
3) Você seguiu a ordenação e a organização dada pelo autor? Se não, como se jus-
tificam a ordenação e a organização que você deu ao seu texto?
4) Que conceitos e explicações você registrou? São os mais relevantes para com-
preensão do pensamento do autor? Você anotou algum exemplo para ajuda
a entender ou lembrar a teoria? Qual? Por quê? O que você anotou é mesmo

128
relevante? O que você resolveu não anotar é mesmo dispensável? O parágrafo na
construção textual
5) Que informações você explicitou e qual você deixou implícitas? O que você
resolveu deixar implícito é resgatável pelo futuro leitor do seu resumo?
6) Como você sinalizou para o futuro leitor a organização e a hierarquia das ideias
do autor, a divisão do assunto em partes e subpartes?
7) Como você sinalizou para o leitor de que se trata cada parte e cada item? Usou
títulos e subtítulos, ou grifos, negritos, etc.?

Aspectos formais
1) Como você sinalizou a coesão entre as frases e parágrafos ou itens de seu
resumo?
2) Todos os termos anafóricos (isso, esta, esse, o mesmo, ele, lá, aquilo, etc.) têm
antecedente claro para o futuro leitor?
3) As expressões do tipo “esse problema, essa questão, esse fato, essa situação”
são adequadas para recuperar as ideias a que se referem (o que você chamou
de fato é fato mesmo, o que você chamou de problema é problema mesmo?).
O antecedente dessas expressões está presente no resumo e é fácil de ser recu-
perado pelo leitor?
4) Você explicitou as relações lógicas entre as ideias de cada item, ou de cada fra-
se, por meio de conectivos e articuladores, como: em função de, por causa de,
porque, consequentemente, portanto, logo, se, senão, quando, enquanto, mas,
no entanto, entretanto, apesar de, por oposição a, etc.? Se não usou articula-
dores, o futuro leitor conseguirá recuperar essas relações? Se usou, tem certeza
de ter empregado o articulador mais adequado para expressar a relação entre
as ideias?
5) A estrutura de cada frase está clara?
6) Todos os verbos têm um sujeito sintático identificável, mesmo os gerúndios e
os infinitivos?
7) Nos períodos compostos e nas frases subsequentes, o sujeito elíptico e oculto
coincide com o sujeito expresso mais próximo? (ou o pobre leitor terá que
adivinhar quando deve “trocar” de sujeito e qual sujeito deve atribuir a cada
verbo?)
8) Todos os sujeitos têm predicado?
9) Todos os períodos compostos têm oração principal?
10) As concordâncias verbais e nominais estão corretas? Nas frases na voz passiva,
foi feita a concordância padrão (não foram dadas as explicações suficientes, em
vez de não foi dado explicações suficiente)?

129
A PRODUÇÃO 11) E nos verbos que estão longe do sujeito e nos adjetivos que estão longe dos
TEXTUAL
E O ENSINO substantivos a que se referem, houve concordância?

Convenções gráficas
1) Você acionou o seu revisor ortográfico ou consultou um bom dicionário?
2) Pôs alguma vírgula separando sujeito de verbo?
3) Deixou de separar, com duas vírgulas, uma no começo outra no fim, os termos
longos que ficaram intercalados e as orações intercaladas?
4) Separou por vírgulas as orações subordinadas ou termos longos que foram des-
locados para o começo do período?
5) Separou por vírgulas os elementos de enumerações?
6) Separou por vírgulas apostos e termos, orações ou expressões explicativas do
tipo “isto é, ou melhor, ou seja?”
7) Se os termos foram intercalados, você colocou uma vírgula antes e outra depois
para sinalizar a intercalação?

Lembremos: o texto por nós produzido reflete a nossa imagem.

Referências

BRASIL. Ministério de Educação e cultura. Obras para a educação de jovens e


adultos serão distribuídas em 2011. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_
content&view=article&id=14324>. Acesso em: 17 set. 2009.

BENVENISTE, Émile. O aparelho formal da Enunciação. In: Problemas de


lingüística Geral II. São Paulo: Pontes, 1989. cap. 5. p. 81-92.

CAMPOS, Edson do Nascimento. SOARES, Magda Becker. Técnicas de redação: as


articulações linguísticas como técnica de pensamento. Rio de Janeiro: Livro Técnico,
1982. 192 p.

COSTA VAL, Maria da Graça. Módulo II – Segunda série. Programa-piloto de


inovação curricular e capacitação de professores do Ensino Médio. Belo
Horizonte: SEE-MG, 1997.

130
EMEDIATO, Wander: A fórmula do texto: redação, argumentação e leitura. São
Paulo: Geração Editorial, 2004. 296p.

FIORIN, J. L.; SAVIOLI, Francisco Platão. Lições de texto: leitura e redação. 5. ed. São
Paulo: Ática, 2006.

GARCIA, Othon Moacyr. Comunicação em prosa moderna : aprender a escrever,


aprendendo a pensar. 4. ed. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1976.

TEZZA, Cristovão. Porta aberta para o mundo.<http://linguaportuguesa.uol.com.


br/linguaportuguesa/gramatica-ortografia/18/imprime143754.asp.>. Acesso em: 31
ago 2009. Entrevista concedida à Luciana Lana Ramos.

SCLIAR, Moacir. Klick escritores. Disponível em: <http://www.klickescritores.com.


br/mscliar00.html>. Acesso em: 21 maio 2010.

Anotações

131
A PRODUÇÃO
TEXTUAL
E O ENSINO
Anotações

132

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