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Escola Teológica do Centro de Estudos Imaculada Conceição

Disciplina: Teologia Espiritual


Docente: Padre Elvis
Discente: Adamastor Bezerra Chaves Filho

O itinerário de Catarina

1. O presente trabalho foi realizado a partir da leitura do tratado: O Diálogo, de


Santa Catarina de Sena. Procuramos apreciar e identificar na obra elementos
fundamentais de um itinerário espiritual com foco na santidade e na perfeição.

2. Catarina se via como causadora, com seus pecados, de todos os males e


sofrimentos dos homens. Conhecendo-se profundamente, enxergava sua
própria imperfeição, e por isso envergonhava-se, odiava-se e se desprezava. Em
suas orações, se dirigia a Deus rogando sobre si o desagravo pelas suas faltas,
que causavam o sofrimento do próximo. Da mesma forma devemos ser
reconhecedores dos nossos pecados e de suas consequências. É preciso
entender que na maioria das vezes nossas faltas fazem o outro sofrer, e por
consequência, atacam o coração de Deus, que sofre, não por ser atingido
diretamente por nossas ofensas, mas por querer sentir-se, por amor, atingido
no exercício da compaixão.

3. Cabe salientar, que para discernimento, reconhecimento de suas fraquezas e a


consequente disposição de si para sofrer como expiação, Catarina desenvolve
um elevado nível de autoconhecimento. De fato, o Senhor por diversas vezes a
exortava que o caminho para conhecer a verdade e ter a experiência no ser de
Deus está no autoconhecimento - caminho que nunca deve ser abandonado.
Assim, entendemos a importância de procurar a verdade dentro de nós
mesmos, conhecendo profundamente todas as nossas nuances, o quanto
temos de beleza e semelhança com o Pai e o quanto adquirimos de feiura por
nossas fraquezas e pecados. Ademais, o autoconhecimento nos ajuda a fazer
crescer em nós a face Divina, a sermos mais santidade e menos pecado, a
sermos mais amor e menos desprezo, a sermos mais beleza e menos feiura.
Todo esse crescimento, providenciado pela caridade divina, passa
necessariamente pelo exercício profundo de humildade, pelo qual nos vemos
como um nada diante da majestade de Deus.

4. Conhecendo profundamente a si, reconhecendo-se pecadora e concorrente


causadora dos sofrimentos alheios, Catarina nos ensina, e aí está sua terceira
grande lição: é preciso reparar nossos pecados, as nossas culpas, e elas só são
reparadas pelo amor. Na sua proximidade com Deus, ela ouve de forma clara e
evidente que a culpa não se apaga pela simples penitência. De fato, sendo Deus
doador de amor infinito, sendo Deus o bem infinito, uma ofensa cometida
contra Deus precisaria de uma satisfação infinita, mais, por amor e com amor, a
satisfação acontece e as culpas são reparadas. É bem verdade que por muitas
vezes pretendemos ou oferecemos a Deus penitências, sacrifícios e
sofrimentos, que por si só, vazios de caridade, não alcançam a sua misericórdia.
Portanto, só o amor é capaz de provocar reparação e satisfação de nossas
culpas. Percebemos o movimento de Catarina justamente nesse sentido, ela
enxerga seu pecado, ama a Deus e sofre por vê-lo ofendido, ama o homem e
sofre por causa-lhe desgraça, e por amor, opta em sofrer dores e dificuldades,
procurando reparar a sua culpa.

5. Poucas palavras e muitas ações, eis o gosto de Deus. Catarina, no seu


itinerário espiritual, demonstra que as palavras, por elas próprias, caducam ao
saírem de nossas bocas. Porém, quando carregadas do amor, as palavras
revelam com as ações, e as virtudes se perpetuam na caridade. Devemos
procurar falar menos e agir mais, esboçar menos e agir mais;

6. Deus Pai, por Catarina de Sena, nos esclarece como atingir a perfeição. São os
degraus do amor. Ao longo de nossa trajetória poderemos nos deparar com os
três estados: o amor servil, que tem como esteio o temor, arrimado na antiga
Lei, mais que em Jesus se aperfeiçoa, e no amor transforma o temor nos
castigos em temor santo, ou seja, medo de ofender a Deus; o amor
interesseiro, pelo qual muitos amam a Deus, mais por interesse em suas
consolações, é um amor que não suporta dificuldades e oposições, não é amor
virtuoso; e por fim, o amor-amizade, fruto da perseverança na oração e nas
boas obras, nesse ápice Deus nos ama como amigos e a seus amigos revela-se
intimamente em seus segredos. Assim diz o Senhor a Catarina: “A amizade
íntima consiste nisto: que são dois corpos, mas uma só alma no amor, pois o
amor transforma (o amante) na coisa amada. E quando (os amigos) se tornam
uma só alma, entre eles já não haverá segredo. Por isso dizia meu Filho: ‘Viverei
e moraremos juntos’”. O amor-amizade, por sua vez, deve ser vivido e
alimentado na vigília de oração, no desapego das consolações e superação do
egoísmo espiritual;

7. Três são as atitudes fundamentais para que não impeçamos nosso próprio
aperfeiçoamento: não corrigir o próximo, se Deus não nos manifestar
expressamente por diversas vezes o defeito de alguém, nunca devemos falar
sobre tal falha diretamente à pessoa que julgamos possuí-la. Aos que nos
procuram devemos corrigi-los com conselhos sobre as virtudes, sendo firmes,
mas com ternura e mansidão. Devemos ser prudentes, para não condenarmos
os outros em mentiras; não julgar o interior do homem, ao rezarmos por
alguém, mesmo que o vejamos em estado de aridez, de abandono, não o
julguemos em pecado mortal, pois Deus revela que à vezes, quando julga
necessário, Ele se ausenta de determinada alma em suas consolações,
deixando-a na aridez, tristonha e vazia, para que ela progrida no amor; e
finalmente, respeitar a espiritualidade alheia, não devemos querer que as
outras pessoas vivam como nós vivemos, especialmente nas penitências e
mortificações, cada um tem o seu itinerário espiritual a seguir. As penitências
são instrumentos e não metas, não são os fundamentos da vida espiritual, cada
um, no seu autoconhecimento, encontrará seu caminho;

8. O respeito pelos sacerdotes é outro aspecto importante na santificação


pessoal, estes são ungidos de Deus e quem os ofende, ofende a Deus! O
respeito aos seus ungidos deve se fundamentar em Deus, pois mesmo diante
dos defeitos e pecados dos ministros divinos, a grandeza da Eucaristia não é
diminuída. Não podemos jamais perseguir os sacerdotes. Deus diz: “Não
toqueis nos meus cristos” (Sl 105, 15);

9. Outro fundamental exercício é crer na providência divina. Deus nos deu o


conforto de uma esperança. Crendo na nossa remissão pelo sangue do cordeiro
temos uma grande esperança e certeza de salvação. A providência divina,
desde a criação e sempre, cuidará das necessidades e da salvação dos homens.
Precisamos compreender que a ação providencial de Deus está em todos os
seres e que todos a ela são submissos. A providência reconstrói o homem nas
ações de Deus diante dos acontecimentos da vida. Assim, aqueles que servem e
só confiam em Deus, experimentam a providência mais profundamente do que
aqueles que servem porque esperam as consolações e compensações.

10. Por fim, Catarina nos apresenta a obediência como trilho para a perfeição, pois
a obediência como vocação mais perfeita se encontra no amoroso Verbo
encarnado. Assim como a desobediência tirou o homem da vida da graça, pela
obediência de Cristo até a morte e morte de cruz, é devolvida ao homem a vida
em abundância. Essa obediência é que deve ser o foco do servo de Deus. Assim
o nosso Deus diz: “... todos os que obedecem terão a vida por intermédio do
novo Homem, o amoroso Jesus Cristo, por mim colocado qual ponte, pois a
estrada do céu estava interrompida”.

11. Concluo, afirmado a enorme valia deste exercício de leitura, reflexão e


contemplação desse tratado. O Diálogo, na experiência de Catarina, acendeu
em meu coração o desejo de viver intensamente essas experiências, de buscar
de forma mais esclarecida um itinerário espiritual de fé e amor a Deus,
buscando uma concretude de atos, que frutificam no esteio do
autoconhecimento, da obediência, da reparação das minhas culpas, do respeito
aos meus pastores, da confiança na providência divina e do amor a Deus e ao
próximo que são fundidos e inseparáveis. Santa Catarina de Sena Rogai por
nós!

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